Modo, Modalidade, Modalização Autonomia Semânticodiscursiva

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    MODO, MODALIDADE, MODALIZAO: AUTONOMIA SEMNTICO-DISCURSIVA EM EXPRESSES VERBAIS

    Josel Maria da Silva14

    RESUMO:Os estudos clssicos que tratam de expresses verbais demonstram uma prtica que as coloca emsistemas fechados de anlise e classificao, considerando, de modo geral, apenas as categorias de Modo:indicativo e subjuntivo. Neste estudo, pretendemos, ainda que respeitando essa classificao presente naGramtica Normativa, ampliar as discusses sobre seu universo de aplicao, considerando tambm os aspectossemnticos identificveis nos discursos em geral. Alm do Modo, propomo-nos a provocar discusses sobre aModalidade e a Modalizao, buscando delinear alguns traos que nos permitem diferenciar um fenmeno dooutro. Para limitar essa investigao, fazemos uso de Pareceres Tcnicos e Jurdicos como corpus, vistos comogneros discursivos de uso frequente nas situaes formais do cotidiano profissional. Com esse intuito,exploramos os estudos de Bakhtin (2003), Cervoni (1989), Lyons (1970), Koch (2000, 2002), Castilho &Castilho (1993) e Bronckart (1999). Nesse corpus investigamos, em expresses verbais, seja em estruturassimples ou em estruturas complexas, a autonomia das ocorrncias do Modo, da Modalidade e da Modalizao,

    que, embora se mantenham sob o aspecto da forma, conservando sua identidade gramatical, expressam valoressemnticos, em busca de manifestar uma inteno ilocucionria, ou seja, o sentido idealizado pelo locutorprodutor de um enunciado.

    PALAVRAS-CHAVE:Modo. Modalidade. Modalizao. Expresses Verbais.

    ABSTRACT:Classic studies dealing with verbal expressions demonstrate a practice that puts them in closedsystems of analysis and classification, in a general way, considering only the following categories of Mood:indicative and subjunctive. In this study, we intend to, while respecting this classification in this NormativeGrammar, enlarge the discussions about their universe of application, also considering the semantic identifiedaspects in the discourses. Besides the mood, we propose to provoke discussion about the modality andmodalization, seeking to outline some features that allow us to differentiate one phenomenon from the other. Tolimit this research, we use technical and legal opinions as corpus, these opinions are considered as discursive

    genres used frequently in everyday formal situations. We explored the studies of Bakhtin (2003), Cervoni(1989), Lyons (1970), Koch (2000, 2002), Castillo & Castillo (1993) and Bronckart (1999). In this corpus, weinvestigated, in verbal expressions,whether in simple structures or complex structures, the autonomy of theoccurrences of the Mood, Modality and Modalization, that, although they remain under the aspect of form,retaining its grammaticalidentity, it expresses semantic values, seeking to express an illocutionary intention, inother words, the sense idealized by the producer locutor of the utterance.

    KEYWORDS: Mood. Modality. Modalization. Verbal Expressions.

    Introduo

    Muito se tem discutido sobre Modalidade e Modalizao. Por isso, e verificando quo

    produtivas tm sido essas discusses, propomo-nos a trazer algumas consideraes sobre

    esses aspectos, acrescentando algumas reflexes sobre o Modo, tendo em vista a aproximao

    sinttico-semntica entre esses fenmenos, se que assim podemos denomin-los. Com esse

    trabalho tambm ratificamos nossa ideia de que esses fenmenos no se substituem; cada um,

    embora se entrelacem, mantm sua autonomia semntica, pois investem de forma diferente no

    sentido expresso do enunciado

    14Professora Doutora do Instituto Federal de Educao da Paraba Joo Pessoa.

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    Este artigo parte de investigao feita em Pareceres Tcnicos e Jurdicos, quando

    exploramos a presena da Modalizao nesses gneros.

    Nossas discusses investem em expresses verbais presentes tanto em estruturas

    simples, quanto em estruturas complexas, ou seja, enunciados selecionados do corpusacima

    descrito. Partimos do princpio de que, nessas expresses verbais, mesmo em se classificando

    o Modo, do ponto de vista da Gramtica Normativa, podemos tambm identificar um

    processo de modalizao veiculado por modalidades. Assim, defendemos a ideia de que no

    se devem confundir esses trs segmentos, j que no funcionam com o mesmo propsito

    ilocucionrio.

    O Modo

    Comeamos discorrendo sobre o Modo, inicialmente nas frases simples e, em seguida,

    nas frases ou estruturas complexas. Essa separao se faz necessria porque tomamos como

    base terica os estudos de John Lyons (1970), que apresenta os modos indicativo e imperativo

    nas frases simples, mas o subjuntivo com carter de subordinao. Dessa forma, embora no

    seja essa nossa preocupao imediata verificar como se manifesta o modo isoladamente em

    frases simples ou em estruturas complexas, achamos conveniente sua sistematizao em

    sees secundrias, a fim de tambm facilitar nossa leitura.Aps as consideraes sobre o Modo, faremos nossa apreciao sobre a Modalidade e

    a Modalizao.

    O Modo nas frases simples

    Como regra geral, comum pensar-se em Modocomo algo apresentado e realizado

    pelo verbo, conforme a descrio da gramtica tradicional. Segundo Almeida (1989, p. 225),

    no captulo destinado ao estudo dos verbos, como a prpria palavra est dizendo, modonaconjugao de um verbo vem a ser a maneira por que se realiza a ao expressa por esse

    verbo. De trs maneiras podemos enunciar uma ao; da, os trs modos verbais.O autor

    descreve, a seguir, os modos indicativo, subjuntivo e imperativo.

    No dicionrio de Lingstica de Dubois (2001, p. 415), encontramos a seguinte

    definio para Modo: uma categoria gramatical, em geral associada ao verbo, e que traduz

    (1) o tipo de comunicao institudo pelo falante entre ele e seu interlocutor (estatuto da frase)

    ou (2) a atitude do falante com relao aos seus prprios enunciados.

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    Mesmo falando sobre modo, a definio acima conduz o raciocnio para duas direes,

    conforme se pode ver adiante (DUBOIS, 2001, p. 415):

    No primeiro caso, omodo oumodalidadeda frase se exprime pela oposio entre (a)a assero expressa na frase assertiva, afirmativa ou negativa [...]; (b) a interrogaoexpressa numa frase interrogativa, afirmativa ou negativa [...]; (c) a ordem ou desejoexpresso numa frase imperativa ou optativa, afirmativa ou negativa. [...]

    No segundo caso, o modo, ou modalizao, se exprime pela oposio entre umaatitude do falante, que assume (que leva em conta) seus enunciados, e a do locutor,que no assume (que rejeita) parcial ou totalmente seus enunciados. Em portugus, omodo do enunciado assumido o indicativo; o modo do no-assumido , tambm, oindicativo (futuro do pretrito) nas frases indiretas: [...], e o subjuntivo ou o futurodo pretrito do indicativo nas frases indiretas: [...].A modalizao pode ser indicada tambm por outros meios: os advrbios [...], asintercaladas [...], as mudanas de registro (as aspas, na escrita), etc. O modo distinto das modalidades lgicas, em que o predicado contingente, provvel,

    necessrio, possvel (essa contingncia, essa probabilidade pode ser assumida ouno).

    A partir do que se disps acima, verifica-se que o modo ora se apresenta com traos de

    modalidade, ora de modalizao.

    Embora se tente fazer uma distino clara entre modo e modalidade, percebe-se que h

    uma tendncia a ampliar suas noes, uma vez que tais fenmenos no se encontram isolados,

    isto , no h como tratar verbos sem que seu sentido se manifeste de alguma forma no que se

    diz, no que se produz discursivamente.

    Para Lyons (1970, p. 235), o modo, como o tempo, frequentemente realizado pela

    flexo do verbo ou por sua modificao com ajuda de auxiliares. Esse processo faz com que

    as frases se distingam umas das outras, obedecendo a duas classes: as imperativas e as

    interrogativas. As primeiras so marcadas pelo modo porque no fazem nenhuma afirmao,

    mas exprimem ordens ou instrues (Viens ici! (Vem aqui!). Apesar dessa apresentao, o

    autor atenta para a dificuldade de se garantir a diferena entre o que h de declarativo (ou

    melhor seria dizer, imperativo) ou de instrucional nesse enunciado.

    Em relao s interrogativas, tambm o modo que lhes faria distinguir das frases

    declarativas. No entanto, tradicionalmente elas no so consideradas modais porque, na maior

    parte das lnguas (em destaque aqui o latim, o grego e o francs), a diferena sinttica entre a

    frase declarativa e a interrogativa se estabelece no emprego de diversos pronomes ou

    partculas interrogativas, ou ainda na organizao da frase, ou disposio na ordem das

    palavras, ou na entonao aplicada no discurso oral.

    Mesmo reconhecendo que os linguistas em geral no falam do modo interrogativo,

    Lyons insiste na ideia de que h uma modalidade expressa nas frases interrogativas, conforme

    se pode ver a seguir: Porm, de um ponto de vista mais geral, as frases interrogativas so

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    claramente modais; e se pode defini-las pelas modalidades suplementares que indicam o que o

    locutor espera15(LYONS, 1970, p. 236).

    Ao que parece, a distino entre modalidade e modo est no carter indicativo deste

    ltimo sobre a modalidade, ou seja, o modo que dir como ser realizada uma possvel

    modalidade. E ainda que haja uma concentrao do estudo sobre as categorias verbais, o autor

    cita escalas de modalidades para fazer presente a questo da inteno impressa no e pelo

    discurso. Segundo ele (Ibidem, loc.cit.),

    Ns constatamos que a atitude do locutor pode se marcar gramaticalmente demaneiras muito diversas nas diferentes lnguas. Podem-se estabelecer ao menos trs

    escalas de modalidade. A primeira essa do desejoe da inteno. o que ilustra oepitfioRequiescat in pace (Que ele possa repousar em paz): h uma oposio quese distingue do subjuntivo requiescatdo indicativo requiescit .(...) A segunda escala a da necessidade e daobrigao:Eu devo ir a Londres na prxima semana,etc.Aterceira a da certeza e dapossibilidade: Pode chover amanh, Ele deve estar aquietc.16

    A classificao em escalas (chelles) para essas diversas modalidades se deu, segundo

    Lyons (Ibidem, loc.cit.), pelo fato de que se pode subdividi-las em um nmero mais ou menos

    grande de classes, como certeza, probabilidade, possibilidade, ou diversos tipos de obrigao

    e de necessidade mais ou menos fortes etc.Algumas lnguas ainda podem reunir duas das escalas de modalidades

    (obrigatoriedade ou possibilidade, por exemplo), ou mesmo as trs (quando, s duas citadas,

    se pode acrescentar a escala do desejo) e ainda no lhes dar qualquer estatuto gramatical.

    Sobre essas possibilidades, diz o autor (Ibidem, loc.cit)

    Observe-se igualmente que h uma afinidade entre as frases imperativas e asmodalidades de desejo e de necessidade de uma parte, e entre as frasesinterrogativas e a modalidade de possibilidade de outra parte. Na verdade uma

    frase manifestadamente interrogativa como Queres vir aqui? (sem levar em conta asdiferenas de entonao) pode ser equivalente semanticamente frase imperativaVem aqui, queres? (ou simplesmenteVem aqui!)e se ter dificuldade em classificaruma modalidade em preferncia outra.17

    15No texto original: Mais, dun point de vue plus gnrale, les phrases interrogatives sont clairment modales ;et on peut les dfinir par des modalits supplmentaires qui indiquent ce que le locuteur attend . (A traduo

    para a lngua portuguesa de nossa responsabilidade)16...nous constatons que lattitude du locuteur peut se marquer grammaticalemente de faons trs diverses dansles diffrentes langues. On peut tablir au moins trs chelles de modalit. La premire est celle du souhaitet delintention. Cest quillustre lpitapheRequiescat in pace (puisse-t-il reposer em paix) : il y a opposition qui sedistingue du subjonctif requiescatet lindicatif requiescit. (...) La seconde chelle est celle de la necessit et de

    lobligation : Je dois aller Londres la semaine prochaine, etc. La troisime est celle de la certitudeet de lapossibilit :Il peut pleuvoir demain, Il doit tre ici etc17On remarquera galement quil y a une affinit entre les phrases impratives et les modalits de souhait etde ncessit dune part, et entre les phrases interrogatives et la modalit de possibilit dautre part. En

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    Poder-se-ia dizer que se confundem as noes semnticas de desejo e de necessidade

    ao se observarem as duas construes interrogativa e imperativa marcadas acima (sem

    levar em conta, como fez o autor, as diferenas de entonao), o que provoca, ento, a

    denominao de uma modalidade em detrimento de outra sem haver qualquer garantia de sua

    propriedade, ou seja, tanto se pode atribuir ao verbo de uma frase desse tipo a modalidade

    imperativa como a interrogativa, e tanto uma quanto a outra esboam o que espera o locutor

    nas instncias comunicativas de que faz parte.

    Situao semelhante pode ser percebida entre frases declarativas com noo de

    imperativo, sutilmente aplicada no discurso sem identificao clara da pessoa verbal que

    assuma seu teor. o que, a ttulo de exemplificao, podemos extrair de um dos exemplares

    do corpus deste trabalho.

    (PJ-16, Anexo A, p. 192)1

    Via de regra, podemos identificar ou classificar o verbo recomendarcomo marcado

    pelo modo indicativo, com noo de declarao. No entanto, h que se levar em conta o fatode o verbo, em sua prpria essncia semntica, abrir caminho para a leitura no s de um

    conselho, prximo ao desejo do locutor de que algo seja feito, mas ainda permitir associao

    com o trao de obrigatoriedade que o fato exige, reforado, inclusive pelos termos seguintes :

    instruir Ao Penal.

    O que, de certa forma, bloqueia o valor do imperativo justamente a ausncia de um

    elemento gramatical ou discursivo que assuma o dito: o ato de recomendar. Ainda assim, tal

    estratgia no anula o carter sugestivo e, partindo de uma autoridade o parecerista, no caso

    , a noo do que deveser feito para atingir os envolvidos no caso analisado.

    De volta s consideraes de Lyons, verificamos, em resumo, que o autor trata

    modalidade como consequncia da aplicao do modo, e as frases que trazem esse trao so

    aquelas que expressam alguma atitude do locutor.

    Bronckart (1999), embora no trate exatamente do modo na perspectiva como o

    apresentamos a partir de Lyons, menciona que, s quatro funes de modalizao (lgicas,

    fait, une phrase manifestement interrogative comme Veux-tu venir ici ? (sans tenir compte des diffrencesdintonation) peut tre quivalente semantiquement la phrase imprative Viens ici, veux-tu ?(ou simplementViens ici !) et on a du mal la classe dans une modalit plutt quune autre

    Outrossim, recomenda a remessa de cpias ao Ministrio Pblico para instruir Ao

    Penal (grifo nosso).

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    denticas, apreciativas e pragmticas), alguns autores acrescentam as modalidades de

    enunciado, isto , os valores modais associados aos quatro tipos de frases identificveis na

    microssintaxe: frases declarativas, exclamativas, imperativas e interrogativas(Idem, p. 335).

    Segundo ele, essa teoria apresenta as frases declarativas como no portadoras de qualquer

    valor suplementar, enquanto que as exclamativas, imperativas e interrogativas teriam esse

    valor em sua essncia, pois que traduziriam uma ordem, um pedido, um espanto etc., isto, ,

    manifestariam seu valor ilocucional.

    Para Bronckart, o valor ilocucional no est expresso no tipo sinttico a que pertence

    uma frase, afinal uma frase declarativa pode expressar uma ordem, uma frase interrogativa

    pode expressar um pedido, um desejo. Alm do mais, os valores ilocucionais expressos em

    uma frase so, segundo o autor, potencialmente infinitos, pois designam a espcie de ato

    comunicativo semiotizado no texto,assim como ilimitado o nmero dessas espcies de atos

    (Ibidem,loc.cit.).

    Constata-se que, ao tratar de outras modalidades (presumimos aqui que se trata das

    lgicas), Lyons as distribui em escalas: de desejo ou de inteno, de necessidade ou de

    obrigao, e de certeza ou possibilidade, embora sem correspondncia imediata. Embora no

    distribua as modalidades em escalas como fez Lyons , ideia semelhante tambm

    observada em Bronckart, que, se referindo a tipos de frases, reconhece, com exceo da frasedeclarativa, a presena de valores ilocucionais na atividade discursiva.

    O Modo nas estruturas complexas

    At ento, os comentrios fizeram referncia s frases simples. Nas estruturas

    complexas, a referncia feita em relao ao estatuto de modalidade impressa ao subjuntivo

    em francs.

    Lyons diz no haver qualquer critrio que justifique a presena do subjuntivo reconhecido como um modo em lugar do indicativo, a no ser pela ideia de que o termo

    tradicional subjuntivo vem da traduo latina da palavra grega que significava

    subordinao, logo era o subjuntivo o modo da subordinao por excelncia. O indicativo

    como forma no-marcada no apresenta, portanto, modalidade (LYONS, 1970, p. 235). A

    ttulo de exemplo, ele apresenta a situao do indicativo e do subjuntivo: o primeiro

    ocorrendo, em francs, nas frases afirmativas ; e o segundo, nas frases negativas. D como

    exemplo :Je crois quil vient (Eu creio que ele vem.) versusJe ne crois pas quil vienne (Eu

    no creio que ele venha) (Idem, ibidem, p. 239). Observa-se que o nico elemento que

    provocou a diferena da aplicao verbal entre as duas frases foi a partcula de negao.

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    Para justificar a negao como um critrio que faz do subjuntivo um modo e no uma

    forma verbal, citamos o prprio Lyons (Ibidem,pp. 239-240):

    Podem-se distinguir trs possibilidades para as lnguas nas quais um conjunto deformas verbais se encontra sobretudo nas proposies subordinadas. (1) Asdistribuies de um conjunto de formas A e de um conjunto de formas B podem em

    parte ser complementares em parte se suplantar; e a distino pode ser modal noscontextos onde essas formas esto em oposio (...). (2) A ocorrncia seja de A sejade B nas proposies subordinadas pode estar em correlao com uma diferena demodalidade que igualmente indicada alis na frase (...), (3) Pode no haverqualquer espcie de correlao entre a ocorrncia de um conjunto especfico deformas e a modalidade do contexto pelo qual elas so determinadas. Neste caso nose descreveria a diferena entre A e B como modal ainda que se pudesse entretantoempregar o subjuntivo para se designar o conjunto das formas que so mais oumenos limitadas s proposies subordinadas18.

    Para exemplificar a condio (1), Lyons cita a oposio entre o subjuntivo e oindicativo que, em latim, era mais marcada. No francs, no entanto, a escolha entre um ou

    outro no parte exatamente dessa oposio (uma vez que as formas verbais ora podem se

    complementar, ora podem ser substitudas umas pela outras), mas de outros fatores na maioria

    das proposies subordinadas o autor no faz referncia, no entanto, a esses fatores. na

    condio (2) que vemos que se inclui a negao, uma vez que, inscrita na prpria frase,

    exprime a dvida do locutor em oposio segurana relativa da frase afirmativa. Seria,

    ento, essa impresso de dvida que caracterizaria o subjuntivo como portador de umamodalizao.

    Ainda que atenda s duas primeiras condies acima expostas, fazendo com que o

    subjuntivo seja considerado como um modo, analisado o termo em si mesmo, segundo o

    linguista, ele no porta qualquer nuance de modalidade, haja vista a possibilidade expressa na

    condio (3) que trata justamente da ausncia de correlao entre a ocorrncia de um

    conjunto de formas verbais e a implicao do contexto sobre estas, de modo que se pode

    empregar o termosubjuntivo s formas mais ou menos limitadas s proposies subordinadas,

    mas no obrigatoriamente como modo(LYONS, 1970, p. 240).

    18 On peut distinguer trois possibilits pour les langues dans lesquelles un ensemble de formes verbales serencontre surtout dans les propositions subordonnes. (1) les distributions dun ensemble de formes A et dunensemble de formes B peuvent en partie tre complmentaires et en partie se chevaucher ; et la distinction peuttre modale dans les contextes o ces formes sont en opposition. (...). (2) Locurrence soit de A soit de B dansles propositions subordonnes peut tre en corrlation avec une diffrence de modalit qui est galement

    indique ailleurs dans la phrase. (...) (3) Il peut ny avoir aucune espce de corrlation entre locurrence dunensemble spcifique de formes et la modalit du contexte par lequel elles sont determines. Dans ce cas, on nedcrirait pas la diffrence entre A et B comme modale bien quon puisse cependant employer le terme

    subjonctifIpour dsigner lensemble des formes qui sont plus ou moins limites aux propositions subordonnes.

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    De certa forma, o que leva ao emprego de uma forma especfica do verbo so os

    traos sintticos, j que a ocorrncia de certa forma especfica no pode, por ela mesma,

    portar uma distino de modalidade19(Idem, ibidem, p. 239).

    O que se pode concluir dessa discusso? Apesar de falar em modalidade, Lyons no a

    apresenta como participando, nas estruturas complexas, do que chamamos de enunciado. Sua

    concepo sobre o fenmeno se restringe a determinar o modo com que se pode apresentar

    um verbo, discutindo, inclusive, sua pertinncia ou no nessa categoria de modalidade. Uma

    vez analisando as estruturas complexas, a insero do primeiro grupo verbal o que

    tradicionalmente chamamos de orao principal, conforme a gramtica normativa no o

    objeto de anlise do autor; sua anlise recai exatamente sobre a segunda assertiva ou orao

    subordinada, ainda seguindo a orientao da gramtica normativa , que encerra um modo(indicativo ou subjuntivo) a partir de algumas condies que viriam expressas no primeiro

    grupo, o da orao principal. Lyons parece no reconhecer essa obrigatoriedade do subjuntivo

    em todas as circunstncias em que esta forma verbal acontece, ou seja, a noo de

    subordinao apresentada pelos gregos e latinos e que inferiam a capacidade modal ao

    subjuntivo no mantm sua ideia original.

    No h como negar que, de alguma forma, Lyons tambm v a modalidade como uma

    caracterstica da atitude de um dado locutor (ainda que considere tal modalidade comosuplementar), ou seja, haver traos de modalidade quando o locutor quiser expressar : a) um

    desejo ; b) uma necessidade ou obrigao ; e c) uma certeza ou possibilidade, conforme visto

    anteriormente ao se apresentarem as escalas de modalidades (cf. p.33). Para se utilizar o

    imperativo ou as frases interrogativas, h sempre um propsito que deveria ser percebido pelo

    interlocutor na atividade interlocutiva que vivencia. Entretanto, essa modalidade de que trata

    Lyons parece ter mais relao com as atitudes ilocucionrias (valores ilocucionrios, para

    Lyons) adiante apresentadas por Cervoni, que tambm no considera o modo como definidorde modalidade, conforme se ver na apresentao do assunto na seo 4.1.

    19locurrence de cette forme spcifique ne peut pas, par elle-mme, porter une distinction de modalit

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    As Modalidades aspectos gerais

    Para falar sobre as Modalidades, comeamos com o trabalho de Castilho & Castilho 20

    (1993, p. 217) os quais declaram:

    A Gramtica Tradicional reconhece dois grandes componentes na sentena: ocomponente proposicional, constitudo de sujeito + predicado (=dictum), e ocomponente modal, que uma qualificao do contedo da forma de P, de acordocom o julgamento do falante (=modus). Esse julgamento se expressa de doismodos:1) o falante apresenta o contedo proposicional numa forma assertiva(afirmativa ou negativa), interrogativa (polar ou no-polar) e jussiva (imperativa ouoptativa); (2) o falante expressa seu relacionamento com o contedo proposicional,avaliando seu teor de verdade ou expressando seu julgamento sobre a formaescolhida para a verbalizao desse contedo.

    s duas formas de julgamento Castilho & Castilho denominam estratgias: a primeira

    referindo-se modalidade, a segunda, modalizao. Os mesmos autores, entretanto,

    utilizam os termos sinonimamente, alegando que sempre h uma avaliao prvia do falante

    sobre o contedo da proposio que ele vai veicular, decorrendo daqui suas decises sobre

    afirmar, negar, interrogar (...) etc.(Ibidem, loc.cit.).

    Embora se faa referncia ao conceito de modo, na descrio constante do dicionrio

    Dubois e nas conceituaes de Lyons e Castilho & Castilho, verifica-se uma expanso

    desse conceito, fazendo aparecer os termos Modalidade e Modalizao.

    Segundo o dicionrio Dubois (2001, pp. 413-414), na gramtica gerativa, a

    modalidade , com o ncleo, um constituinte imediato da frase de base.(...). Como

    constituinte, ele define, portanto, o tipo de frase ou o estatuto da frase: a frase interrogativa,

    declarativa, exclamativa, imperativa e facultativamente enftica, negativa ou passiva.

    Jean Cervoni (1989, p. 53), ao tratar das modalidades, em princpio apresenta a ideia

    de que num enunciado se pode distinguir um dito(contedo proposicional) e uma modalidade

    (ponto de vista do sujeito falante sobre este contedo)21. Em breve passagem, Cervoni

    (Ibidem,p. 55) faz, tambm, referncia ao modo, ao falar dos verbos querer, dever, poder esaberque, em francs, melhor correspondem descrio de tipos de atitudes que explicam o

    funcionamento da narrativa. Esses verbos, mais adiante, merecero especial ateno por parte

    20 Importante atentarmos para o fato de que estes autores esto reapresentando conceitos de Charles Bally,conforme podemos verificar em Flores & Teixeira (2005, p. 17), quando lemos: Bally v na orao duas partes:a do dictum, base da orao, e a do modus, operao do falante sobre o dictum. Esses conceitos j haviam sidoconsiderados por Cervoni (1989, p. 54), quando este cita a obra Linguistique gnrale et linguistique franaise

    (1 ed. 1932), onde Bally retoma os mesmos termos moduse dictum utilizados na Idade Mdia, para fazerdistino entre aforma e a matriados enunciados para constituir a base de sua teoria da enunciao.21Ratifica-se aqui a concepo de Charles Bally, j referendada na pgina anterior (Cf. nota de rodap 16).

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    deste e de outros autores, pois, mesmo em outras lnguas diferentes do francs, se tem

    percebido sua influncia em um enunciado.

    Outro ponto de vista a ser considerado o de Koch. A autora no fala em modo

    especificamente; trata a questo a partir j das modalidades. Na viso da linguista (KOCH,

    2002, p. 86), atravs das modalidades que o locutor marca uma distncia relativa em relao

    ao enunciado, expressando seu maior ou menor engajamento com o que diz. E acrescenta

    (Idem, ibidem, loc. cit.): O recurso s modalidades (...) permite, ainda, introduzir

    modalizaes produzidas por outras vozes incorporadas ao seu discurso, isto , oriundas de

    enunciadores diferentes....

    Ao fazer referncia introduo de modalizaes, Koch (Ibidem, p. 78) permite que se

    entenda modalidade como algo distinto de modalizao, e possivelmente modo comomodalidade, ao fazer referncia face subjetiva de conceitos dos modos denticos e

    axiolgicos, conforme se pode ver em seu texto: Enquanto os modos alticos se referem aos

    objetos do pensamento e os epistmicos, ao prprio pensamento, os modos denticos e

    axiolgicos referem-se a conceitos que constituem como que a sua face subjetiva (...).

    Impossvel no se prender ideia de subjetividade transposta pelas palavras de Koch.

    Seja falando sobre modo, seja sobre modalidade, ou mesmo introduzindo a noo de

    modalizao (isolando-os ou fundindo-os), a autora concebe a presena no s de objetos dopensamento mas ainda do prprio pensamento, logo a presena mesma do locutor, visto que

    entendemos no haver como se manifestarem quaisquer dos fenmenos acima, se no houver

    um autor/locutor para realiz-los.

    Conforme j previsto, a delimitao exata do alcance nocional de modo e de

    modalidade no facilmente determinvel. Alis, h frequente flutuao entre as opinies dos

    autores, exigindo uma observao cuidadosa quando da ocorrncia de cada um desses

    fenmenos lingusticos, influenciando diretamente sobre os enunciados reais, porque sociais ehistricos, ou mesmo sendo responsveis por sua construo. Alm desses fenmenos, deve-

    se, tambm, levar-se em conta que h, ainda, um terceiro elemento presente nesse movimento

    argumentativo-discursivo: a modalizao.

    A ModalizaoTanto quanto o conceito de modo e de modalidades, o conceito de modalizao,

    conforme j dissemos, no est definido, ou, pelo menos, ainda no se pode assegurar uma

    pacificidade de opinies entre todos os que se preocuparam com tal estudo. Assim, para

    tentarmos expor de que forma estaremos tratando, no s o modo e as modalidades mas

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    tambm a modalizao, faremos uma breve apreciao sobre as pesquisas desenvolvidas por

    alguns estudiosos. Comeamos pela definio constante do dicionrio de Dubois.

    Em seu Dicionrio de Lingstica, Dubois (2001, p. 414) apresenta a modalizao

    como a marca dada pelo sujeito a seu enunciado.Conforme o autor, pode-se partir de trs

    diferentes conceitos envolvidos no processo da enunciao (ato de produo do texto pelo

    falante) para se compreender a noo de modalizao. Assim se pode ler em seu Dicionrio

    de Lingstica (Ibidem, loc. cit.):

    (1) O conceito de distncia considera a relao entre sujeito e mundo por intermdiodo enunciado (...); (2) o conceito de transparncia estuda a presena ou oapagamento do sujeito de enunciao; (3) o conceito de tenso registra as relaesentre falante e ouvinte por meio do texto:ser/estare termarcaro a tenso mnima;

    os auxiliares querer, poder, etc., a tenso mxima. (...).

    Observando-se os conceitos acima distncia, transparnciae tenso, verifica-se

    que se referem ao grau de engajamentoque o locutor estabelece com o prprio enunciado e

    com seu interlocutor, a partir das crenas que ele espera serem aceitas por este ltimo. Essa

    relao com o dito se efetua num movimento ora de explicitude ora de atenuncia e at

    mesmo de ofuscamento total das impresses ou da presena do locutor, veiculados pela

    prpria enunciao, material real construdo a partir de elementos lingusticos e

    paralingusticos (como as entonaes no texto oral, a pontuao no texto escrito, entre outros).O locutor, atravs da modalizao, pode, portanto, se expor totalmente, parcialmente ou tentar

    eximir-se de qualquer vnculo com o que profere.

    No conceito de distncia, h um limite mximo em que o sujeito se apresenta

    totalmente distante de seu enunciado, ou seja, considera seu enunciado como parte integrante

    de um mundo distinto dele mesmo; e um limite mnimo em que se percebe o sujeito

    assumindo totalmente seu enunciado, isto , diminuindo a distncia entre si e o enunciado

    produzido.Se, com seu enunciado, o locutor permite que se perceba de que lugar ele fala (a

    favor ou contra, ou tentando tornar-se ou parecer neutro), ento, ou ele se aproxima do que

    diz, deixando claro qual sua inteno, envolvendo-se com o dito, ou ele se distancia, fazendo

    um caminho oposto, ou seja, desengajando-se do dito, ofuscando, ento, a dita transparncia.

    Em relao ao conceito de transparncia, o locutor pode deixar que seja identificado

    seu comprometimento com o dito, como no uso de expresses do tipo Eu creio..., Eu

    acredito que..., Eu garanto que..., ou de outros recursos de no comprometimento, quando

    se protege com o uso de expresses como possvel que..., Parece que..., Seria

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    interessante que..., entre outros artifcios. Assim, o conceito de transparncia tem a ver com

    o locutor mesmo, com sua prpria presena no processo enunciativo.

    J o conceito de tensotem a ver com a atuao do locutorsobre seu interlocutor. A

    tenso ser mxima quando o locutor tentar deixar sua marca de ao sobre o outro, e isso

    poder ficar claro quando utilizar verbos como querer,poder, deveretc. o caso de situaes

    como a que se v em Todos devem se manter calados. Ser mnima quando no se registrar

    grande interesse de ao sobre o interlocutor; os verbos que faro parte de enunciados cujo

    conceito de tenso se mostre mnimo sero ser/estar e ter. Como exemplo, podemos citar uma

    construo do tipo Seria bom que todos se mantivessem calados. Neste ltimo exemplo,

    observamos a construo de um ato indireto, ou seja, a presena de performativo implcito.

    Com uma observao um pouco mais cuidadosa, sobre esse ltimo enunciado, pode-seconstatar uma interferncia do locutor sobre seu(s) interlocutor(es), deixando implcito um

    pedido ou uma ordem para expressar sua vontade de que houvesse silncio, de se omitir algo

    que no devesse ser dito, entre outras leituras possveis estabelecidas pelo contexto ou

    situao de uso.

    H que se fazer um breve comentrio sobre o verbo TER. Entendemos que, em alguns

    casos, esse verbo pode estabelecer uma tenso mxima. Se se produz algo do tipo: Tem de

    haver... ou Voc tem de fazer... ou algo similar, cuja tenso aparece no tempo daconjugao verbal, percebe-se que o verbo TER, nessas construes, ser entendido como

    dever, logo haver uma relao locutor/interlocutor totalmente tensa, comprometendo-os entre

    si.

    Isto se pode comprovar pela passagem abaixo:

    (PT-01, Anexo A, p. 131)

    O extrato acima (PT-01) permite que se vejam, com clareza, os graus de tenso

    (originando obrigatoriedade); engajamento (o locutor se envolve claramente, e no emprega

    meios-termos para dizer qual sua posio em relao ao caso); e de transparncia do locutor

    em relao ao que diz (com a forma verbal grifada acima, o locutor expressa o que pensa e o

    Para que o(a) estudante tenha acesso ao ensino superior, tenha oportunidade de sequalificar, mantendo o seu status de universitrio(a) no Brasil, e obter (sic) o ttulode bacharel em direito, ter que se submeter ao concurso vestibular, apenas isto,conforme exige a legislao (grifo nosso).

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    que espera que seja realizado pelo interessado, alis, a soluo indicada pelo parecerista

    simples apenas isto , mas a nica possvel para se resolver o problema em anlise).

    A noo de engajamento parece manifestar-se claramente nos conceitos de distncia e

    transparncia, j que se referem relao que h entre o locutor e seu enunciado, ou ao

    processo de enunciao. Em sua atitude de produo discursiva, o locutor j se predispe, ou

    no, a se deixar envolver pelo que pretende dizer;de outra forma, o que esse mesmo locutor

    pretende com seu enunciado ser ou poder ser lido, percebido pelo interlocutor, atravs das

    marcas impressas nessa produo, o que se traduz pelo conceito da transparncia.

    primeira vista, o conceito de tenso no teria maior relao com o engajamento

    tratado dessa forma, j que esse aspecto parece no ser considerado, dentro dessa perspectiva,

    a partir da relao entre o locutor e seu enunciado, mas sim entre o locutor e interlocutor.Mas, como agir sobre o interlocutor se este no percebe quanto h de comprometimento do

    locutor com o que ele prprio declara, postula, defende, ou, num caminho inverso, parece no

    faz-lo, com um fim especfico, de no se comprometer com o dito, mas ainda assim atuar

    sobre sua plateia?

    O conceito de tenso pode nos sugerir a obrigao, a certeza, a possibilidade ou o

    convite ao envolvimento moral, cultural ou mesmo afetivo por parte do locutor com a

    inteno de agir sobre o interlocutor, induzindo-o a uma participao, ou no, dentro do dito,considerando os graus de tenso mxima e mnima dispostos nessa relao.

    Os conceitos acima discutidos nos atentam para o fato de que o engajamento do

    locutor com seu interlocutor e com seu prprio enunciado passa, sim, pelas trs correntes: de

    distncia, transparncia e tenso. E esses conceitos estaro se materializando no processo da

    modalizao, atravs de elementos lingustico-discursivos, responsveis, consequentemente,

    pelo sentido que j se esperava alcanar a partir de sua seleo.

    O conceito de transparncia, referindo-se diretamente ao engajamento do locutor como dito, pode, levando-se em conta os graus de transparncia, passar pelos critrios do possvel

    e do provvel, enfim pelo valor da crena, o que sugere a modalidade epistmica. Essa

    modalidade tambm estaria representada ou incutida no conceito de distncia, a partir,

    tambm, do grau de envolvimento do locutor em relao ao seu enunciado. O conceito de

    tenso pode realizar-se plenamente na modalidade dentica eixo do obrigatrio, do

    permitido, enfim dos deveres, o que ratifica a noo de influncia do locutor sobre o outro.

    Encontramos, ainda em Dubois (2001, p. 414), a seguinte informao sobre

    modalizao, que poderia ratificar o que conclumos anteriormente:

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    O conceito de modalizao serve para a anlise dos meios utilizados, para traduzir oprocesso de enunciao. A adeso do falante a seu discurso sentida pelointerlocutor ora como sublinhada, ora como evidente, ora em baixa: da mesmaforma que o conceito de tenso explica oposio entre o orador que age sobre seu

    pblico e o que ignora seu pblico, o conceito de modalizao permite dar conta

    da percepo pelo interlocutor do fato de que o orador cr, insiste no que diz.

    Percebe-se, ento, entre o que se l em Dubois acima e o que postula Koch ao

    tratar de modalizao, uma mesma noo sobre os referido conceitos, ainda que os autores

    no os apresentem da mesma forma.

    Para Koch (2002, p. 85), na produo de um enunciado, o locutor manifesta suas

    intenes e sua atitude atravs de sucessivos atos ilocucionrios de modalizao que se

    atualizam por meio dos diversos modos de lexicalizao que a lngua oferece. A autora

    considera esses modos de lexicalizao tambm como lexicalizaes de modalidades.Entendemos essas ltimas exatamente como unidades formadas de elementos lingusticos

    que, em sua forma final, constituem a face do enunciado, a substncia concreta e real que

    serve de aporte para a atividade dialgica, permitindo o acordo ou o contraponto, a rplica, a

    aceitao, a interao enfim.

    Em artigo publicado, Guimares (2001, p. 65) indica sua ideia de modalizao como

    processo (aqui encontramos eco na compreenso que tivemos de Koch e que expomos

    acima),apontando o uso do termo como tal ora numa acepo restrita, bem prximo da suasignificao no campo da Lgica modal, ora numa acepo ampla, abrangendo tambm a

    modalidade de frase, a que ela denomina modalidade lato sensu. Em outro ponto de seu

    artigo, a autora (GUIMARES, 2001, p.68) introduz seu conceito de modalizadores, assim

    exposto: Recobramos, ento, neste ponto, a noo de modalizadores como podendo ser

    identificada com todos os elementos lingsticos que funcionam como indicadores das

    intenes, dos sentimentos e das atitudes do enunciador no que diz respeito a seu discurso.

    Em suma, quer nos parecer que h uma harmonia pelo menos entre as trs posiesacima a primeira descrita no dicionrio de Dubois, a segunda defendida por Koch e a

    terceira apresentada por Guimares22, sobre o fato de a modalizao se configurar como um

    processo que se manifesta atravs de modalidades, estas representadas, por sua vez, por

    elementos lingusticos os modalizadores. Esta ltima autora ainda acrescenta que a

    modalidade extrapola o mbito do estritamente lingstico o que inviabiliza sua anlise em

    22Atentamos para o fato de, nesta parte do trabalho, termos feito uma pequena relao comparativa apenas entre

    Dubois, Koch e Guimares, apesar de tambm outros autores nos servirem de suporte terico. A no inclusodos demais nessa perspectiva comparativa se explica devido forma particular com que estes ltimosapresentam a modalizao, os quais exigem, de nossa parte, uma leitura mais detalhada, como o caso de JeanCervoni (l989), que parte da Lgica Modal e se estende at a Teoria dos Atos de Fala, de Austin.

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    dimenses radicais e estanques (GUIMARES, 2001, p. 75). Pode-se entender, portanto,

    que a interao no se constitui somente de elementos lingustico-discursivos, h ainda os

    paralingusticos assim como os extralingusticos, o que significa dizer as expresses faciais,

    os gestos, a entonao de voz no discurso oral etc.

    Nos estudos de Bronckart, observamos que este autor usa modalizao por

    modalidade, assim como Castilho & Castilho, embora no apresente, ao contrrio destes

    ltimos, qualquer motivo para tal procedimento.

    Nos termos de Bronckart (1999, p. 330), assim est disposto o assunto:

    As modalizaes tm como finalidade geral traduzir, a partir de qualquer vozenunciativa, os diversos comentrios ou avaliaesformulados a respeito de alguns

    elementos do contedo temtico. (...) Portanto, as modalizaes pertencem dimenso configuracional do texto, contribuindo para o estabelecimento de suacoerncia pragmtica ou interativa e orientando o destinatrio na interpretao deseu contedo temtico (grifos do autor).

    Em suma, seja utilizando o termo modalidade, seja modalizao, as discusses

    anteriores mostram um ponto vital em sua apresentao: a interatividade. As atividades

    discursivas esto intimamente ligadas s interpretaes, avaliaes e, principalmente, s

    intenes dos interlocutores. O jogo presencial locutor/interlocutor, com recursos lingusticos

    expressos ou recursos extralingusticos, monitorado pelos participantes que se valem da

    modalizao para dirigir o sentido de seus enunciados, afetando, expressa ou implicitamente,

    o outro.

    Em anliseVejamos algumas transcries do corpusque podem nos ajudar a entender a realizao

    individual de cada segmento modo, modalidade, modalizao nas expresses verbais

    selecionadas.

    (PJ-10, Anexo A, p. 180)

    O verbo opinaraparece no indicativo, denunciando uma ao presente e declarativa do

    locutor. Do ponto de vista gramatical, e seguindo a perspectiva de Lyons, no h qualquer

    indcio de modalidade nesse enunciado.

    Neste sentido, no havendo mparo (sic) legal para a dispensa dos eventuais cargosincidentes sobre o valor originrio da TCFA nos termos requeridos, opinopela cobranacom as correes regimentais, a contar at a data de 14.01.2002, data efetiva dorequerimento da interessada.(grifos de sublinhado do parecerista)

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    Numa viso pragmtica, no se pode, entretanto, ignorar o carter de deciso

    implcito no verbo, dando ao solicitante condies de agir conforme as orientaes do

    Parecerista, o que, de certa forma, tranquiliza e respalda o responsvel pela cobrana citada no

    Parecer em questo.

    Assim, o fato de o verbo estar no modo indicativo no elemento preponderante para

    a ao do requerente da consulta, porm, do ponto de vista semntico, funciona como uma

    orientao irrefutvel, assegurando a esse requerente condies de agir com base em uma

    opinio indiscutvel, autorizada, logo repleta de razes plausveis e convincentes.

    (PJ-06, p. 161)

    O futuro do pretrito, um dos tempos do indicativo, teria como indicao original

    informar que algo no foi feito de forma adequada. Se se fosse considerar apenas a forma

    verbal, possvel que no se vissem outros sentidos enunciativos aqui expressos. Faz

    necessrio, portanto, analisar o contedo semntico do verbo ter, deixando clara a

    obrigatoriedade de que se reveste a expresso verbal. A fora ilocucionria desse verbo no se

    perde, ou seja, o significado expresso pelo tempo verbal continua sendo o de passado no

    realizado, presumvel no campo das possibilidades.

    Mais uma vez constata-se que modo e tempo verbais, por si ss, no se

    responsabilizam pela presena da modalidade, mas essa presena pode ser requerida se

    examinada a inteno do locutor, realizando, portanto, o processo de modalizao, j que

    deixa implcito o que intenta o locutor, isto , um ato de crtica, recomendao, ordem, desejo,

    expandindo-se para a modalidade da obrigao.

    (PT-05, p. 159)

    A modalidade epistmica quase-asseverativa acontece quando se imprime um

    distanciamento do locutor em relao ao dito, ao prprio enunciado. Assim, o verbo poder,

    em suas variadas formas de aplicao, quase sempre imprime esse valor semntico. No casoacima, o modo do subjuntivo demonstra bem o domnio das possibilidades, o que, neste caso,

    Esta Coordenao teria que visitar a obra in loco, antes da concluso dos trabalhosexecutados [...].

    Pensa-se, igualmente, em fazer uso responsvel da autonomia acadmica, [...]permitindo que cada estudante possa fazer escolhas para melhor aproveitar suashabilidades, sanar deficincias e realizar desejos pessoais.

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    utilizado pelo locutor para exprimir sua impresso sobre algo que cabe a outrem, ou seja, o

    prprio locutor confirma uma relao intrnseca entre o modo verbal, a modalidade e a

    modalizao.

    (PT-04, p. 153)

    A expresso verbal dever ser est formada de verbo auxiliar no futuro do presente do

    indicativo, o que, a priori, por ser uma das formas do indicativo, no conduz a uma

    modalizao imediata, se no fosse marcada, essa expresso, pelo verbo dever, cuja fora

    dentica inconfundvel, exprimindo claramente uma exigncia. Observe-se tambm que h

    ainda uma ratificao dessa modalizao auxiliada pelo advrbio rigorosamente.

    Enfim, em todos os excertos selecionados verificamos presena de modos verbais que,

    individualmente, carregam sua matiz, sua essncia, mas, conforme as intenes do locutor,

    podem informar muito mais do que os limites postos pela significao da superfcie formal.

    Consideraes finais

    Uma vez definidos as tnues linhas de demarcao entre essas trs categorias, tratamoso modocomo o trao mesmo da categoria do verbo, podendo manifestar uma modalidade.

    Logo, enquanto situado nas instncias do verbo, o modo indicativo ser considerado para

    indicar algo que pertence ao campo da existncia, do realizvel; ser visto ainda como agente

    das relaes entre locutor/interlocutor, permitindo prever sua ligao, em graus, com o dito; o

    modo do subjuntivo para aplicar a modalidade da possibilidade, do virtual; e o modo

    imperativo, demonstrando total engajamento do locutor com seu enunciado e com seu

    interlocutor, levando-se em conta as intenes de ordem ou de desejo.

    Enfim, consideramos modalidade a manobra discursiva que, expressa ou

    implicitamente, permite sua identificao no enunciado, agindo intencionalmente, muitas

    vezes, sobre o interlocutor, concretizando a modalizao, esta ltima entendida em nosso

    trabalho como um processo responsvel pelo efeito que pretendemos causar, ou inteno que

    pretendemos manifestar atravs do enunciado produzido, ou seja, seu efeito sobre o outro,

    enfim sobre uma plateia, com a qual interagimos, socialmente, em nossa atividade discursiva.

    O mnimo de duzentos dias dever ser rigorosamente cumprido, mesmo se dissoimplicar defasagem entre o ano letivo e o ano civil (...).

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    Referncias

    BAKHTIN, Mikhail. Esttica da Criao Verbal.4 ed. So Paulo: Martins Fontes, 2003.

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    BRONCKART, Jean-Paul. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um

    interacionismo scio-discursivo. Trad. Anna Rachel Machado et al. So Paulo: EDUC, 1999.

    CASTILHO. Ataliba C. de & CASTILHO, Clia M. M. de. Advrbios Modalizadores. In:

    ILARI, Rodolfo (org.). Gramtica do Portugus Falado. Vol. II. Nveis de Anlise

    Lingstica. Campinas: Unicamp, 1993.

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    Cultrix, 2001.GUIMARES, Elisa. Expresso modalizadora no discurso de divulgao cientfica . In:

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    KOCH, Ingedore G. V. Desvendando os segredos do texto.So Paulo: Cortez, 2002.

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    LYONS, John. Linguistique Gnrale: introduction la linguistique thorique. Trad.

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