Monografia DAC Em Mulheres Final

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ESCOLA BAHIANA DE MEDICINA E SADE PBLICA MARLIA MENEZES GUSMO

DOENA ARTERIAL CORONARIANA EM MULHERES:CARACTERSTICAS CLNICAS, FATORES DE RISCO E ACESSO AO TRATAMENTO

NOVEMBRO DE 2008 SALVADOR-BA

ESCOLA BAHIANA DE MEDICINA E SADE PBLICA MARLIA MENEZES GUSMO

DOENA ARTERIAL CORONARIANA EM MULHERES:CARACTERSTICAS CLNICAS, FATORES DE RISCO E ACESSO AO TRATAMENTOMonografia apresentada no Curso de Graduao de Medicina da Escola Bahiana de Medicina e Sade Pblica, como requisito parcial para a aprovao do 4 ano mdico. Orientadora: Profa. Dra. Marta Menezes.

Novembro de 2008 Salvador-BA

SUMRIO

RESUMO Introduo: As doenas cardiovasculares representam a principal causa de mortalidade e incapacidade no Brasil e no mundo, assumindo enorme impacto social, econmico e mdico. a principal causa de mortalidade entre mulheres, responsvel por cerca de 500.000 mortes nos Estados Unidos a cada ano. Estudos que analisem a evoluo da mortalidade por doena coronria em ambos os sexos ainda so escassos no Brasil. Objetivos: Descrever as caractersticas clnicas e fatores de risco de pacientes com diagnstico de doena arterial coronariana (DAC) admitidas em Servio de Referncia em Cardiologia, e comparar as caractersticas clnicas, fatores de risco e de acesso a tratamento de mulheres e homens que sofreram infarto agudo do miocrdio. Metodologia: Estudo descritivo, corte transversal de dados obtidos de pronturios de internamentos de pacientes com DAC no Hospital Ana Nery (HAN) entre setembro de 2007 e fevereiro de 2008. Obteno de dados do DATASUS referente aos internamentos por DAC e bitos ocorridos no mesmo perodo em Salvador. Resultados: A amostra era composta por 40% de mulheres, a idade mdia foi de 60,66 anos. A idade mdia no sexo feminino e no masculino eram respectivamente 62,86 anos e 59,18 anos. No sexo feminino angina instvel ocorreu em 34,8%, IAM com supra de ST em 30%, e IAM sem supra de ST em 20%. No sexo masculino, IAM com supra ocorreu em 36,8% pacientes, angina instvel em 23%, angina estvel em 22% e infarto sem supra de ST em 18%. Diabetes mellitus ocorreu em 50% das mulheres e 30,4% dos homens. Hipertenso arterial ocorreu em 93,5% das mulheres e 79,7% dos homens. A mdia de fatores de risco nos homens foi de 1,77 enquanto que nas mulheres foi de 2,20. No sexo feminino a angioplastia foi realizada em 41,3%. O tratamento clnico isolado foi realizado em 42% dos homens. O tratamento cirrgico foi realizado em 21,7% das mulheres e 20,3% dos homens. Dos 1146 pacientes internados na rede SUS com DAC entre setembro de 2007 a fevereiro de 2008 em Salvador, 40% eram mulheres. Dos pacientes que infartaram 46% eram mulheres. A letalidade encontrada para o IAM foi de 9,52% no sexo feminino e 5,75% no masculino. Concluso: A amostra de pacientes admitidos no HAN com diagnstico de DAC semelhante, quanto a gnero e idade, aos dados obtidos no DATASUS. Por outro lado, verificouse que dentre os pacientes com diagnstico de IAM, a freqncia de mulheres menor no atual estudo quando comparado com o encontrado no DATASUS. A faixa etria das mulheres com DAC e IAM foi inferior a que foi descrita na literatura, porm semelhante observada no

DATASUS. Em relao aos fatores de risco, as mulheres do atual estudo apresentam maior nmero de fatores de risco quando comparado com os homens, sobretudo diabetes e hipertenso arterial. Alm disso, diferenas no acesso ao tratamento para DAC no foram observadas entre os gneros no atual estudo. Apesar das limitaes do estudo pode-se concluir que estamos diante de um importante problema de sade pblica. PALAVRAS-CHAVE: doena arterial coronariana; infarto agudo do miocrdio; mulheres; fatores de risco.

6 1. INTRODUO

As doenas cardiovasculares representam importante causa de mortalidade e incapacidade em homens e mulheres no mundo todo. Sabe-se que a sua incidncia vem aumentando ao longo dos anos. Tal fato est associado a queda na mortalidade das doenas infecciosas, advinda de melhores condies de higiene, envelhecimento da populao, ausncia de controle adequado dos fatores de risco para doena cardiovascular e a mudanas nos hbitos de vida da populao, propiciando alimentao inadequada, inatividade fsica e suas conseqncias (Alexandre and ndio do Brasil 2005; Newby 2007; Mosca, Appel et al. 2008). As doenas cardiovasculares representam a principal causa de mortalidade e incapacidade no Brasil e no mundo, assumindo enorme impacto social, econmico e mdico. Segundo dados da Organizao Mundial da Sade (OMS), em 2002 ocorreram 16,7 milhes de bitos, dos quais 7,2 milhes foram por Doena Arterial Coronria (DAC). Nos pases em desenvolvimento, a incidncia do Infarto Agudo do Miocrdio (IAM) crescente, sendo uma questo preocupante em termos de sade pblica (Guimares, Avezum et al. 2006). A doena cardiovascular a principal causa de mortalidade entre mulheres, responsvel por cerca de 500.000 mortes nos Estados Unidos a cada ano, o que corresponde a mais mortes do que as causadas por acidente vascular enceflico, cncer de pulmo, doena pulmonar obstrutiva crnica e cncer de mama somadas (Newby 2007). Cerca de metade dessas mortes so causadas por doena arterial coronariana (DAC). Durante muitos anos pensou-se que a DAC fosse uma doena predominantemente do sexo masculino e que as mulheres s corriam risco de apresent-la em uma idade mais avanada. Entretanto verificou-se que a cada dia aumenta a incidncia de DAC no sexo feminino, bem como as taxas de mortalidade (Mosca, Appel et al. 2008; Rosamond, Flegal et al. 2008). Apesar da maior prevalncia da doena coronria em todas as idades entre os homens quando comparados com as mulheres, a doena coronria a maior causa de morte entre mulheres ps-menopausadas nos pases industrializados (Wenger 1996; Hanratty, Lawlor et al. 2000). Com o aumento da expectativa de vida, as mulheres passam cerca de um tero de suas

7 vidas no estado de ps-menopausa, perodo em que so mais freqentes manifestaes que colocam a mulher em risco maior para doena aterosclertica (Giannini 1996; Wenger 1996). Na dcada de 50 a coronariopatia era claramente muito menos prevalente entre mulheres e inicialmente parecia distintamente rara entre mulheres antes da menopausa, a no ser que condies metablicas especficas (dislipidemias familiares, diabetes mellitus) estivessem presentes (Giannini 1996; Wexler 1999). A baixa prevalncia de doena coronria em mulheres jovens e de meia-idade, quando esto protegidas pelos hormnios femininos, leva muitos mdicos a valorizar menos a queixa de dor precordial numa mulher como possvel doena coronria (Lima and Nussbacher 1996). Durante muito tempo, essa foi a justificativa biolgica para o descuido em relao ateno para o diagnstico de coronariopatia em mulheres (Zorzetto 2006). Nos ltimos 15 anos, a sade feminina passou a receber mais ateno, inclusive das prprias mulheres, quando os mdicos notaram que existia uma diferena significativa na probabilidade de receber tratamento para o IAM, que era cerca de 6 vezes maior entre o pblico masculino que o feminino. Ento, comearam a questionar se o corao das mulheres seria mais resistente do que o dos homens. Estudos que surgiram no incio da dcada de 1990 mostraram que a doena isqumica do corao ocorre, tambm, de maneira significativa entre as mulheres, ajudando os mdicos e pacientes a reverem conceitos e preconceitos, como o de que o infarto era problema exclusivo da populao masculina (Smanio and Mastrocolla 2005; Zorzetto 2006). Hoje se sabe que existem, entre os sexos, diferenas importantes: a doena coronria ocorre em idades mais avanadas nas mulheres do que nos homens, em mdia 10 anos mais tarde na mulher (Lima and Nussbacher 1996; Souza, Tanajura et al. 1996; Wenger 1996), as mulheres exibem maior prevalncia de comorbidades que influenciam o prognstico (diabetes e hipertenso, entre outras), tm maior incidncia de infartos prvios no identificados e maior proporo de ataques cardacos fatais (mais de dois teros das mortes sbitas, no sexo feminino, no so precedidos de manifestaes de doena coronria). Alm disso, quando sofrem um infarto, as mulheres apresentam pior prognstico, com maior incidncia de mortalidade precoce e tardia, maior ndice de reinfarto, maior incidncia de insuficincia cardaca e de acidente vascular cerebral (Souza, Tanajura et al. 1996). Pode-se destacar ainda pior resposta inibio plaquetria

8 induzida pela aspirina quando comparadas com homens. bastante discutido se esse pior prognstico pode ser causado por uma diferena biolgica de fato, colocando a mulher num patamar de risco maior, no explicado pelos fatores de risco conhecidos (Lima and Nussbacher 1996). De fato, as particularidades so tantas, que a doena coronria no sexo feminino parece ser outra afeco em relao dos homens (Souza, Tanajura et al. 1996). Estudos revelaram que, o prognstico, aps procedimentos de revascularizao do miocrdio (tanto angioplastia como cirurgia de revascularizao do miocrdio), pior nas mulheres (Lima and Nussbacher 1996; Mieres, Shaw et al. 2005). Alm de maior mdia de idade entre as mulheres o pior prognstico est relacionada ao fato das mulheres apresentam mais fatores de risco, especialmente hipertenso arterial e diabetes mellitus. Alm disso, estes procedimentos, geralmente, so indicados em mulheres, quando estas esto mais sintomticas, ou seja, com mais manifestao anginosa, e com pior funo ventricular do que os homens (Lima and Nussbacher 1996). Existem os fatores de risco tradicionais, assim como fatores de risco exclusivos do sexo feminino. Os fatores de risco coronrios clssicos so os mesmos para homens e mulheres, incluindo idade avanada, dislipidemia, diabetes, histria familiar de doena coronria precoce, obesidade e sedentarismo (Wenger 1996; Duvall 2003; Smanio and Mastrocolla 2005). J os fatores de risco especficos do sexo feminino incluem contraceptivos orais e menopausa. Apesar dos fatores de risco serem similares para ambos os sexos, existem diferenas quanto prevalncia e magnitude do efeito (Duvall 2003). Nos Estados Unidos, se tem observado um declnio na mortalidade por doena coronria nos ltimos anos, pela melhora da terapia para essa doena e diminuio dos fatores de risco coronrios, porm menos pronunciado nas mulheres do que nos homens (Wenger 1996; Duvall 2003). Apesar de existirem informaes disponveis sobre mortalidade por causas especficas, estudos que analisem a evoluo da mortalidade por doena coronria em ambos os sexos ainda so escassos no Brasil. fundamental tanto conhecer o panorama mundial do IAM como o nacional e regional. No Brasil e no Mundo, o IAM possui relevante impacto em termos de mortalidade e nmero de

9 hospitalizaes. Os fatores de risco para IAM podem diferir em todos os lugares do mundo e o seu impacto pode ser substancialmente diferente. Os fatores protetores para DAC, tambm, podem ser diferentes entre as diversas regies (Guimares, Avezum et al. 2006). importante conhecer mais detalhes da doena coronariana nas mulheres em nosso meio, assim como caracterizar melhor os fatores de risco mais prevalentes e seu impacto sobre a DAC, com o objetivo de nortear medidas de sade pblica que dem melhor suporte de tratamento para a populao feminina. 2. OBJETIVOS Principais: a) Descrever as caractersticas clnicas e fatores de risco de pacientes com diagnstico de DAC admitidas em Servio de Referncia em Cardiologia; b) Comparar as caractersticas clnicas, fatores de risco e de acesso a tratamento de mulheres e homens que sofreram infarto agudo do miocrdio no referido servio Secundrio: Comparar idade e gnero dos pacientes atendidos no Servio de Cardiologia, com pacientes admitidos em Hospitais Pblicos de Salvador, com diagnstico de DAC em geral e IAM no mesmo perodo do estudo, dados obtidos no DATASUS.

10 3. REVISO DA LITERATURA 3.1 Epidemiologia Somente nos EUA mais de meio milho de mulheres morrem a cada ano decorrente de doenas cardiovasculares (Alexandre and ndio do Brasil 2005). O IAM constitui importante parcela das doenas cardiovasculares, e em 2004 levou 156.816 americanos ao bito. estimado que 770.000 americanos iro apresentar em 2008 um novo episdio da doena e aproximadamente 430.000 iro apresentar um episdio recorrente. Alm disso, um adicional de cerca de 190.000 IAM silenciosos ocorrem a cada ano nos EUA (Rosamond, Flegal et al. 2008). No Brasil as DCV so a principal causa de morte para ambos os sexos. Dentre essas causas destaca-se o IAM nos homens e as doenas crebro-vasculares nas mulheres (Alexandre and ndio do Brasil 2005). No ano de 2007 houve 62.166 internaes por IAM nos hospitais da rede pblica no Brasil, dessas, 22.910 eram pacientes do sexo feminino (correspondendo a 36,85% das internaes por IAM). Na Bahia, dos 2739 internamentos por IAM em 2007, 43,19% eram mulheres, o que demonstra que em nosso meio a prevalncia de IAM na populao feminina est se aproximando da masculina (DATASUS). As taxas de mortalidade vm caindo nos EUA desde 1968. A mortalidade hospitalar por IAM caiu de 11,2% para 9,4% durante a dcada de 90. A morte sbita 3 a 4 vezes mais comum em homens do que em mulheres e 50% dos homens e 64% das mulheres no apresentavam sintomas anteriores de DAC. Entretanto essa disparidade entre os sexos decai com o avanar da idade (Rosamond, Flegal et al. 2008). Apesar do IAM ter predomnio no sexo masculino, observa-se que a mortalidade no sexo feminino maior. A mortalidade hospitalar nas mulheres mais alta (9,3% contra 6,2%) (Rosamond, Flegal et al. 2008). Um estudo norte-americano encontrou uma mortalidade em 3 meses de 11% para as mulheres e de 5% para os homens. Neste estudo atribuiu-se a mortalidade mais elevada ao fato das mulheres serem mais idosas (Neill and Adgey 2008).

11 No Brasil a mortalidade por DAC vem decaindo tambm. Em Salvador houve uma queda de 10% na mortalidade entre os perodos de 1985-1988 e 1989-1992, e subsequentemente de 20% para 1993-1996 (Passos, Lopes et al. 2000). Embora a tendncia de declnio da mortalidade atribuda ao infarto agudo do miocrdio ao longo dos anos venha ocorrendo em ambos os sexos, o percentual de reduo relativo ao perodo anterior tem sido maior no sexo masculino do que no feminino (Passos, Lopes et al. 2000; Alexandre and ndio do Brasil 2005). Alm disso, a taxa de letalidade no sexo feminino tambm superior. Em 2007 a taxa de letalidade por IAM no Brasil foi de 16,8 no sexo feminino contra 12,79 no sexo masculino (DATASUS). Outro agravante no sexo feminino a recorrncia dos infartos (Conti, Solimene et al. 2002; Alexandre and ndio do Brasil 2005; Rosenfeld, Lindauer et al. 2005; Rosamond, Flegal et al. 2008). Nos indivduos que j apresentaram um primeiro IAM o percentual de recorrncia em 5 anos de 16% em homens e 22% em mulheres na faixa dos 40 aos 69 anos (Rosamond, Flegal et al. 2008). 3.2 Fatores de Risco 3.2.1 Idade Sabe-se que aps a menopausa h um aumento na incidncia de DAC, fato este que atribudo a modificaes hormonais, circulatrias e sangneas que aumentam a chance de eventos pr-aterognicos e pr-trombticos (Mosca, Collins et al. 2001; Lokkegaard, Pedersen et al. 2003; Alexandre and ndio do Brasil 2005). As mulheres apresentam DAC de forma geral com em mdia 10 anos a mais do que os homens, este intervalo aumenta para 20 anos de diferena para situaes mais graves como IAM e morte sbita (Rosamond, Flegal et al. 2008). A ocorrncia de IAM em mulheres mais idosas seria uma das explicaes para a mortalidade no sexo feminino ser mais elevada (Neill and Adgey 2008). A idade avanada tambm implica na maior associao de co-morbidades, (Franklin, Larson et al. 2001; Conti, Solimene et al. 2002; Alexandre and ndio do Brasil 2005; Neill and Adgey 2008) bem como em manifestaes clnicas atpicas de modo a comprometer o prognstico (Conti, Solimene et al. 2002; Robinson, Wallace et al. 2008).

12 3.2.2 Dislipidemias Baixos nveis de HDL-colesterol so preditivos de DAC em mulheres e aparentam ser um fator de risco mais importante para mulheres acima de 65 anos do que em homens com a mesma faixa etria (Mosca, Appel et al. 2008). O LDL-colesterol a principal lipoprotena aterognica tanto em homens como em mulheres. Nos EUA os nveis de LDL-c so mais elevados em homens do que mulheres at os 55 anos, aps essa idade eles passam a ser mais elevados nas mulheres. Triglicrides (TG) e HDL-c esto tambm significativamente associados com risco cardiovascular. Nveis mdios de TG so mais elevados no sexo masculino, embora a diferena diminua com a idade. Entretanto a associao de TG com risco cardiovascular mais importante em mulheres do que em homens (Mosca 2005). Em uma metanlise com 17 estudos populacionais, um aumento de 89mg/dL nos TG est associado a um aumento de 76% no risco cardiovascular para mulheres e de 32% em homens (Hokanson and Austin 1996). Mesmo aps ajuste para outros fatores de risco como o HDL-c, os TG permaneceram associados a um aumento no risco para DAC em mulheres (37%) e homens (14%) (Mosca 2005). 3.2.3 Hipertenso Arterial A hipertenso arterial o fator de risco cardiovascular mais prevalente na populao adulta, de tal forma que um a cada trs adultos portador de hipertenso arterial sistmica (HAS) (Alexandre and ndio do Brasil 2005; Rosamond, Flegal et al. 2008). No sexo feminino a prevalncia de HAS maior principalmente aps a quinta e sexta dcadas de vida e a hipertenso sistlica e a presso de pulso passam a constituir um forte preditor de risco cardiovascular (Franklin, Larson et al. 2001). Em Salvador, um estudo realizado entre 1999 e 2000 encontrou uma prevalncia de 31,7% de HAS em mulheres (Lessa, Magalhes et al. 2006). 3.2.4 Tabagismo O tabagismo uma conhecida causa de DAC (Alexandre and ndio do Brasil 2005; Mosca, Appel et al. 2008; Rosamond, Flegal et al. 2008). Sabe-se que os tabagistas tem de 2 a 4 vezes mais chance de desenvolver essa doena. Isso ocorre, pois o fumo causa estreitamento dos vasos sangneos, o que leva a uma reduo na perfuso tecidual (CDC 2008). O hbito de fumar

13 est fortemente associado a um aparecimento precoce de DAC (Conti, Solimene et al. 2002; Mosca, Appel et al. 2008). Apesar do tabagismo predominar no sexo masculino, a quantidade de mulheres fumantes vem aumentando no Brasil, sobretudo nas regies mais desenvolvidas (Mendona, Casado et al. 2004). At algumas dcadas atrs, acreditava-se que os efeitos da dependncia do tabaco eram mais fortes nos homens, mas medida que novas geraes de fumantes foram chegando verificou-se que, as mulheres so igualmente ou mais suscetveis aos malefcios do fumo, devido s peculiaridades prprias do sexo, como a gestao e o uso da plula anticoncepcional (Cncer; INCA).

14 3.2.5 Diabetes Mellitus O Diabetes Mellitus (DM) est intimamente associado a morbi-mortalidade

cardiovascular (Conti, Solimene et al. 2002; Almdal, Scharling et al. 2004; Juutilainen, Kortelainen et al. 2004; Alexandre and ndio do Brasil 2005). Em indivduos com DM tipo 2 o risco de ter um episdio de IAM ou AVC aumentado de 2 a 3 vezes e o risco de morte aumenta 2 vezes, independente da existncia de outros fatores de risco cardiovascular (Almdal, Scharling et al. 2004). Desse modo, apenas a presena do diabetes classifica os pacientes em fator de risco muito alto para desenvolvimento de DAC de acordo com o Score de Framingham (Wilson, D'Agostino et al. 1998). Nas mulheres, o DM tem impacto maior no aumento do risco cardiovascular do que nos homens (Lokkegaard, Pedersen et al. 2003; Almdal, Scharling et al. 2004; Juutilainen, Kortelainen et al. 2004). Isso deve ao fato de que alteraes induzidas pelo DM como diminuio no HDL-c, aumento dos TG, LDL-c e da presso sangunea so mais pronunciados no sexo feminino. Alm disso, mulheres diabticas sofrem mais os efeitos nos mecanismos protetores da parede vascular, levando a aterognese e trombognese (Juutilainen, Kortelainen et al. 2004). Outro agravante que em mulheres diabticas em uso de terapia de reposio hormonal h um aumento na mortalidade por doena cardiovascular (Lokkegaard, Pedersen et al. 2003). 3.2.6 Sedentarismo A inatividade fsica mais comum no sexo feminino do que no masculino (Activity; Alexandre and ndio do Brasil 2005; Mosca, Appel et al. 2008). Mais de 60% das mulheres americanas no praticam a quantidade recomendada de atividade fsica, e 25% no fazem atividade alguma. Sabe-se que a prtica de atividade fsica reduz o risco de morte por DAC, desenvolvimento de hipertenso, cncer de clon e diabetes, logo recomendada na preveno desses eventos (Activity; Mosca, Appel et al. 2008). Um benefcio adicional da prtica de exerccios fsicos a reduo de sintomas de ansiedade e depresso, promovendo melhoria do humor e sentimentos de bem-estar (Activity). Ansiedade e depresso tm uma alta prevalncia no sexo feminino e esto associadas a DAC (Lett, Blumenthal et al. 2004; Naqvi, Merz et al. 2005).

15 3.2.7 Obesidade As medidas de distribuio regional da gordura esto associadas de forma independente com o risco de DAC em mulheres. Em uma Coorte constatou-se que tanto a relao cinturaquadril quanto a circunferncia abdominal esto associados com um risco aumentado de DAC, mesmo aps controle do IMC. Ambas essas medidas so mais fortemente associadas ao risco de DAC em mulheres com menos de 60 anos do que nas mais idosas (Rexrode, Carey et al. 1998). A obesidade muitas vezes est associada a hipertenso, resistncia insulnica e dislipidemia configurando a sndrome metablica, a qual um conhecido preditor de risco cardiovascular (Rexrode, Carey et al. 1998; Mosca, Collins et al. 2001; Alexandre and ndio do Brasil 2005). 3.2.8 Terapia de Reposio Hormonal A incidncia de DAC aumenta aps a menopausa. Isso sugere que os hormnios sexuais exeram um papel protetor do sistema cardiovascular. Foi elaborada ento uma hiptese de que a reposio desses hormnios traria benefcios ao aparelho circulatrio (Mosca, Collins et al. 2001; Ouyang, Michos et al. 2006; Bonduki, Loureno et al. 2007). Inicialmente estudos observacionais concluram que a terapia de reposio hormonal (TRH) diminuiria o risco cardiovascular (Bonduki, Loureno et al. 2007). Sabe-se que o estrognio pode limitar o aparecimento da aterosclerose nos vasos bem como melhorar o colesterol (entretanto causa aumento dos triglicrides) (Mosca, Collins et al. 2001). Posteriormente foram feitos ensaios clnicos que no confirmaram essa hiptese. Em alguns estudos a TRH teve efeito nulo, prejudicial ao sistema cardiovascular ou aumento de mortalidade por efeitos adversos (neoplasias por exemplo) (Lokkegaard, Pedersen et al. 2003; Ouyang, Michos et al. 2006; Bonduki, Loureno et al. 2007). A American Heart Association no aconselha o uso de TRH na preveno secundria das DCV (Mosca, Collins et al. 2001). Alguns estudos referem inclusive pior prognstico no uso de TRH em pacientes diabticas (Lokkegaard, Pedersen et al. 2003). Na preveno primria no existem recomendaes claras ao uso, porm caso se deseje utilizar a TRH benefcios no coronarianos tambm devem estar envolvidos (Mosca, Collins et al. 2001).

16 3.2.9 Fatores Psicossociais e Comportamentais A depresso aumenta o risco de desenvolver DAC tanto em homens como mulheres independente de outros fatores de risco associados (Lett, Blumenthal et al. 2004; Rosengren, Hawken et al. 2004; Naqvi, Merz et al. 2005). Entretanto, a prevalncia de depresso maior na populao duas vezes maior em mulheres do que em homens. Alm disso, a apresentao clnica de depresso nas mulheres inclui mais sintomas atpicos, ansiedade e distrbios alimentares e episdios depressivos mais longos e mais recorrentes. Estes sintomas se tornam mais graves em mulheres que j tiveram IAM se comparados com os homens que tiveram IAM. Estudos mostram que as taxas de depresso dobram nas mulheres diabticas, e aceleram o aparecimento de DAC nessa populao (Naqvi, Merz et al. 2005). Outros fatores psicossociais agravantes so que as mulheres tendem mais a minimizar o impacto da doena e a atrasar a procura pelo tratamento e evitam incomodar os outros sobre os seus problemas cardacos (Naqvi, Merz et al. 2005; Rosenfeld, Lindauer et al. 2005). 3.3 Manifestaes Clnicas da DAC na Mulher Diversos sintomas so associados com IAM em ambos os sexos, sobretudo dor precordial em presso ou aperto que pode se irradiar para pescoo, ombros, costas, braos, ou mandbula. Palpitaes, dispnia, pirose, nuseas, vmitos, dor abdominal, sudorese e tontura podem tambm estar associados dor precordial num quadro tpico de IAM. Nas mulheres h maior ocorrncia de sintomatologia atpica do que nos homens, que consiste em sintomas inespecficos como a fadiga ou sintomas gastrintestinais (nuseas, vmitos, pirose, dor abdominal), dor referida na ausncia de dor precordial (Newby 2007). A idade mais avanada na apresentao clnica da doena e uma maior prevalncia de comorbidades podem levar as manifestaes atpicas apresentadas freqentemente no sexo feminino (Juutilainen, Kortelainen et al. 2004; Neill and Adgey 2008). Os sintomas atpicos so responsveis pela dificuldade relatada por muitas mulheres em identificar um IAM. Essa dificuldade o que muitas vezes leva as mulheres a pensarem em outras causas menos graves para o sintomas apresentados e provoca a demora em procurar assistncia mdica (Alexandre and ndio do Brasil 2005; Mieres, Shaw et al. 2005; Rosenfeld, Lindauer et al. 2005). Tambm os

17 prprios profissionais de sade podem subestimar os sintomas de infarto quando ocorrem no sexo feminino, acreditando que DAC seja menos freqente nessa populao. 3.4 Testes Diagnsticos Reconhecidamente a mulher tem menor probabilidade de apresentar DAC do que um homem com a mesma idade (abaixo da stima dcada de vida) (Arajo, Soeiro et al. 2006). Portanto as indicaes para realizao de testes de triagem como teste ergomtrico ou ecocardiografia podem variar a depender da probabilidade pr-teste do paciente. O que vai determinar essa probabilidade o escore de risco de Framingham, classificando em baixo, intermedirio ou alto risco. As mulheres sintomticas somente so submetidas a teste ergomtrico caso apresentem pelo menos risco intermedirio, j as assintomticas so indicadas para o teste se forem de alto risco, visto que a probabilidade pr-teste nesse grupo inferior. O valor preditivo negativo no sexo feminino maior, portanto nos resultados negativos a chance de haver a doena muito baixa (Redberg 1999; Mieres, Shaw et al. 2005; Newby 2007). Por outro lado, h uma maior prevalncia de resultados falsos-positivos no sexo feminino o que poderia desvalorizar o teste. Devido ao fato dos estudos para testes diagnsticos terem sido feitos baseados em sua maioria em parmetros do sexo masculino, estes talvez merecessem uma melhor adaptao para aplicao no sexo feminino. Na literatura alguns estudos analisaram o vis de gnero na indicao de exames diagnsticos nas mulheres. Os homens tm 10 vezes mais chance de serem indicados para coronariografia aps uma cintilografia de esforo com resultado anormal do que as mulheres. Da mesma forma, no estudo SAVE encontrou-se que embora as mulheres tivessem maior limitao da atividade fsica devido a angina, elas foram menos indicadas a coronariografia do que os homens. Conseqentemente, menos mulheres foram submetidas a tratamento cirrgico, visto que a coronariografia um pr-requisito. Em outro estudo observou-se que os homens so indicados para cateterismo cardaco entre 15% a 28% mais do que as mulheres (Redberg 1999). 3.5 Tratamento

18 O tratamento realizado para DAC pode ser clnico ou invasivo (angioplastia ou cirurgia). O tratamento clnico utiliza medicaes como aspirina, heparina, trombolticos, betabloqueadores, IECAs e estatinas. Alguns artigos referem que h tanto maior dificuldade no acesso aos tipos de tratamento como maiores complicaes destes em mulheres. Em relao ao tratamento com trombolticos, muitos estudos sugerem que as mulheres recebem tromblise em menor freqncia do que os homens, devido ao fato de menos mulheres terem indicao para essa teraputica. Uma das causas dessa menor indicao o fato de as mulheres terem menos IAM com supra de ST evidenciado no ECG (Bell and Nappi 2000; Rosenfeld, Lindauer et al. 2005; Neill and Adgey 2008). Outros fatores como a demora na procura por assistncia aps incio dos sintomas, algo que ocorre com freqncia no sexo feminino, tambm influenciam na menor utilizao de trombolticos.(Rosenfeld, Lindauer et al. 2005) Mesmo entre as pacientes com indicao de tromblise esta foi menos realizada do que nos homens em alguns estudos (Bell and Nappi 2000). Estudos realizados nos EUA mostraram que as mulheres tem menos chance de serem submetidas a procedimentos cardacos invasivos do que os homens. Os investigadores do estudo SAVE (Survival and Ventricular Enlargement) encontraram que mesmo que as mulheres tivessem a mesma chance dos homens em ter angina e serem tratadas com drogas anti-anginosas como os homens, elas tinham menos chance de serem submetidas a procedimentos diagnsticos invasivos ou de reperfuso. Menos mulheres so submetidas a cateterismo ou cirurgia de revascularizao miocrdica, mesmo tendo maior incapacidade funcional da angina (Bell and Nappi 2000).

19 4. PACIENTES E MTODOS 4.1 Pacientes do Estudo Foram identificados os registros dos pronturios dos pacientes admitidos no Hospital Ana Nery com diagnstico de infarto agudo do miocrdio (IAM), angina estvel e angina instvel entre setembro de 2007 a fevereiro de 2008. Foram excludos da anlise os pronturios no localizados no momento da pesquisa. Como base de comparao, realizado levantamento em banco de dados secundrios do DATASUS, utilizando os mesmos critrios diagnsticos. 4.2 Dados Colhidos Utilizado como desenho de estudo descritivo de corte transversal retrospectivo. Os dados foram obtidos dos registros dos pronturios utilizando uma ficha previamente padronizada (em anexo). Os dados considerados foram: sexo, idade, fatores de risco cardiovascular (hipertenso, diabetes mellitus, tabagismo, obesidade e dislipidemia), manifestaes clnicas de DAC (angina estvel, angina instvel, IAM com supra de ST, IAM sem supra de ST), exames complementares e tratamento utilizado. 4.3 Caractersticas do Hospital O Hospital Ana Nery conta com uma unidade especializada em cardiologia que atende exclusivamente a rede SUS. Dispe de unidade de pronto-atendimento de emergncia cardiolgica, unidade de internao e terapia intensiva, cirurgia cardaca, exames complementares em cardiologia e ambulatrio. Possui sistema de registro de pronturios informatizado e arquivo mdico estruturado.

20 4.4 DATASUS Foram analisados dados de internaes nos hospitais da rede SUS atravs do sistema do DATASUS disponvel na pgina www.datasus.gov.br. Esses dados correspondiam ao perodo de setembro de 2007 a fevereiro de 2008 e referiam-se ao diagnstico de IAM e outras doenas isqumicas do corao em homens e mulheres em Salvador. Foi considerado como DAC a soma dos dados encontrados para IAM e outras doenas isqumicas do corao. 4.5 Anlise Estatstica A anlise dos dados foi realizada no programa SPSS 15.0. Foi utilizado na comparao das mdias o teste T de student. Para as variveis paramtricas usou-se o qui-quadrado, e para as no-paramtricas o teste exato de Fisher. 4.3.6 Aspectos ticos O projeto foi aprovado pelo comit de tica e pesquisa da Escola Bahiana de Medicina e Sade Pblica.

21 5. RESULTADOS: No perodo de setembro de 2007 a fevereiro de 2008 foram admitidos e cadastrados no registro geral do Hospital Ana Nery 237 pacientes com CID correspondente aos diagnsticos de infarto agudo do miocrdio (IAM), angina instvel e angina instvel. Desses pacientes, 89 (37,55%) correspondiam ao sexo feminino e 148 (62,45%) correspondiam ao sexo masculino. Foram localizados 115 (48,52%) pronturios que compuseram a amostra de anlise. 4.1. Caracterizao da Amostra A amostra era composta por 46 (40%) de mulheres e 69 (60%) de homens. A idade mdia do grupo foi de 60,66 anos ( 9,89), e a idade mdia no sexo feminino e no masculino eram respectivamente 62,86 anos e 59,18 anos, (p=0,05). Entre as mulheres houve 19 (41,3%) casos na faixa etria entre 60 e 69 anos. Entre os homens 30 (43,48%) casos ocorreram dos 50 aos 59 anos. A distribuio por faixa etria de acordo com o gnero pode ser vista na figura 1.

Figura 1 Distribuio da amostra geral em faixas etrias de acordo com o gnero.

O diagnstico mais encontrado na amostra total foi IAM com supradesnivelamento de ST (IAM C SS), com 39 (33,9%) pacientes, seguido de angina instvel (AI) com 32 (27,8%), angina estvel (AE) com 22 (19,1%) e IAM sem supra de ST (IAM S SS) com 21 (18,3%) (Quadro 1). Entre os pacientes com diagnstico de IAM 25 (37,3%) eram do sexo feminino e 37 (62,7%) do

22 sexo masculino. A idade mdia encontrada nos pacientes com IAM (com ou sem supra) foi de 60,5 anos ( 8,97) para os homens e 62,77 anos ( 11,02) para as mulheres (p=0,395). Quadro 1: Caractersticas gerais dos pacientes estudados Sexo Mulheres: 40 (40 %) Homens: 69 (60%) Mdia de idade Geral: 60,66 ( 9,98) anos Mulheres: 62,86 Homens: 59,18 Manifestao Clnica IAM C SS: 39 (33,9%) AE: 32 (27,8%)Quadro 1 Caractersticas dos pacientes estudados

AI: 32 (27,8%) IAM S SS: 21 (18,3%)

4.2 Diagnstico e Gnero No sexo feminino predominou a angina instvel com 34,8% (N=16), seguido de IAM com supra de ST (30%; N=14), IAM sem supra de ST (20%; N=9) e angina estvel (15%; N=7) (figura 2).

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Figura 2 - Diagnsticos encontrados no sexo feminino. IAM S SS = Infarto Agudo do Miocrdio sem supradesnivelamento de ST; IAM C SS = Infarto agudo do miocrdio com supra; AE = angina estvel; AI= angina instvel.

No sexo masculino, o diagnstico mais prevalente foi o IAM com supra, que ocorreu em 25 pacientes (36,8%), seguido de angina instvel (23%; N=16), angina estvel (22%; N=15) e infarto sem supra de ST (18%; N=12) (figura 3).

Figura 3 - Diagnsticos encontrados no sexo masculino. IAM S SS = Infarto Agudo do Miocrdio sem supradesnivelamento de ST; IAM C SS = Infarto agudo do miocrdio com supra; AE = angina estvel; AI= angina instvel.

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4.3 Fatores de Risco e Gnero Os fatores de risco analisados foram presena de diabetes mellitus, hipertenso arterial, dislipidemia, obesidade e tabagismo. Na amostra estudada 44 pacientes (38,3%) eram diabticos, 98 (85,2%) hipertensos, 41 (35,7%) informavam serem dislipidmicos, 19 (16,5%) obesos e 20 (20,9%) tabagistas. Diabetes mellitus ocorreu em 23 (50%) mulheres e 21 (30,4%) homens (p=0,034). Hipertenso arterial ocorreu em 43 (93,5%) mulheres e 55 (79,7%) homens (p=0,035). Dislipidemia esteve presente em 29 (45,7%) mulheres e 20 (29%) homens (p=0,068). Obesidade foi encontrada em 10 (21,7%) mulheres e 9 (13%) homens (p=0,219). A presena de tabagismo foi referida em 6 (13%) mulheres e 18 (26,1%) (p=0,092). (Quadro 2) Quadro 2: Fatores de risco para DAC em mulheres e homens Fatores de Risco DAC Diabete mellitus Hipertenso Arterial Dislipidemia Obesidade Tabagismo Mulheres 23 (50%) 43 (93,5%) 29 (45,7%) 10 (21,7) 6 (13%) Homens 21 (30,4%) 55 (79,7%) 20 (29%) 9 (13%) 18 (26,1%) p 0,034 0,035 0,068 0,219 0,092

Todas as 46 mulheres possuam ao menos um fator de risco, enquanto que 10 (14,49%) homens no apresentavam nenhum fator de risco (p=0,022) (figura 3). A mdia de fatores de risco nos homens foi de 1,77 enquanto que nas mulheres foi de 2,20 (p=0,007).

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Figura 4 Quantidade de Fatores de Risco no sexo masculino (M) e no sexo feminino (F) (%). P=0,002

4.4 Exames Laboratoriais Os resultados referentes aos exames laboratoriais esto demonstrados na tabela 1. A mdia do HDL estava mais elevada no sexo feminino (48,5 mg/dL), com diferena estatisticamente significante (p=0,006). No sexo feminino, as mdias dos nveis de triglicrides, glicemia, LDL, creatinina e colesterol total foram respectivamente: 134,93 mg/dL, 133,88 mg/dL, 129,53 mg/dL, 1,04 e 202,61 mg/dL.Tabela 1 Mdias dos Resultados dos Exames Laboratoriais de Acordo com o Gnero

Sexo Feminin o NTG Glicemi a LDL-c HDL-c Creatini na Sdio Potssio CT

Masculino Mdia134,93 67,34 133,88 52,4 129,53 45,21 48,85 12,08 1,04 0,52 140,28 5,71 4,2 0,83 202,61 50,89

N32 55 22 26 66 64 63 38

Mdia151,44 74,81 140,75 76,47 142,75 43,96 40,19 9,44 1,2 0,44 140,61 5,42 4,13 0,56 189,45 57,54

Valor de p0,375 0,603 0,321 0,006 0,092 0,763 0,568 0,339

2841 24 26 42 43 42 28

*Triglicrides (TG), Colesterol Total (CT)

26 4.5 Tratamento Os tratamentos analisados foram: tratamento clnico apenas, o cirrgico (cirurgia de revascularizao miocrdica) e a angioplastia de coronrias. Tromblise foi realizada em apenas 3 casos nesse perodo (todos os 3 do sexo masculino). No sexo feminino a forma de tratamento mais utilizada foi a angioplastia (41,3%; N=19) enquanto que no sexo masculino predominou o tratamento clnico isolado (42%; N=29), entretanto estes valores no obtiveram valor de p estatisticamente significativo. O nico dado com valor estatstico significativo foi o tratamento cirrgico, cujos percentuais para cada sexo eram valores bastante prximos (sexo feminino = 21,7%, sexo masculino = 20,3%, p=0,035) (tabela 3).Tabela 2 tratamento realizado de acordo com o sexo Sexo Feminino Sexo Masculino (N) (N) Clnico 37% (17) 42% (29) Cirrgico 21,7% (10) 20,3% (12) Angioplas 41,3% (19) 37,7% (25) tia

Valor de p 0,296 0,035 0,52

O tratamento realizado somente entre os pacientes que sofreram infarto foi distribudo conforme a tabela 4. O tratamento clnico isolado foi mais realizado nos pacientes do sexo masculino (51,4%; N=19), enquanto o tratamento cirrgico e a angioplastia foram mais realizados no sexo feminino com respectivamente 27,3% (N=6) e 36,4% (N=8). Ainda assim, as mulheres foram submetidas ao tratamento clnico na mesma proporo da angioplastia (36,4%; N=8).Tabela 3 tratamento realizado entre os pacientes com IAM de acordo com o sexo Sexo Feminino Sexo Masculino (N) (N) Clnico 36,4% (8) 51,4% (19) Cirrgico 27,3% (6) 8,1% (3) Angioplas 36,4% (8) 40,5% (15) tia

*p=0,131 4.6 Levantamento de Dados no DATASUS

27 Um total de 1146 pacientes foram internados na rede SUS com diagnstico de IAM ou outras doenas isqumicas do corao entre o perodo de setembro de 2007 a fevereiro de 2008 em Salvador. Desses, 460 (40%) eram mulheres e 686 (60%) eram homens. Nesse perodo foram internados 321 pacientes com IAM, sendo que 147 (46%) eram do sexo feminino e 174 (54%) eram do sexo masculino. Houve 24 bitos decorrentes de IAM, 14 bitos ocorreram no sexo feminino enquanto que 10 bitos ocorreram no sexo masculino. A taxa de letalidade encontrada para o IAM foi de 9,52% para o sexo feminino e 5,75% para o sexo masculino. A distribuio de DAC por faixa etria pode ser vista na figura 5. A distribuio de idade do IAM por faixa etria pode ser vista na figura 6.

Figura 5 Distribuio de DAC em faixas etrias de acordo com o gnero.

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Figura 6 IAM por faixa etria.

29 6. DISCUSSO Houve predomnio do sexo masculino na amostra (60% vs. 40%) e este dado reflete a maior prevalncia de DAC no sexo masculino que tambm est de acordo com outros estudos realizados (Conti, Solimene et al. 2002; Alexandre and ndio do Brasil 2005; Rosamond, Flegal et al. 2008). No DATASUS foi encontrada uma proporo idntica para o mesmo perodo (60% de homens e 40% de mulheres), quando foi pesquisada a soma de infartos e outras doenas isqumicas do corao. Analisando-se somente o diagnstico de IAM pode-se observar que a distribuio entre os sexos no estudo (37,3% para o sexo feminino e 62,7% para o sexo masculino) foi em proporo semelhante a de outros estudos, nos quais os valores encontrados para o sexo feminino variaram de 31% a 42% (Passos, Lopes et al. 1998; Passos, Lopes et al. 1998; Neill and Adgey 2008). Entretanto, dados do DATASUS referentes internao por IAM em Salvador no mesmo perodo, no corresponderam a essa proporo, evidenciando uma distribuio mais igualitria entre os sexos (46% para o sexo feminino e 54% para o sexo masculino) (DATASUS). Essa diferena poderia ser explicada pela alta taxa de letalidade do IAM no sexo feminino, o que impediria as mulheres de chegarem a unidades de referncia mais especializadas como o hospital Ana Nery. As mulheres com IAM morrem mais do que os homens com IAM e, de acordo com dados obtidos pelo DATASUS, a taxa de letalidade foi tambm mais elevada nas mulheres em Salvador no perodo de setembro de 2007 a fevereiro de 2008 (9,52% vs. 5,75%) (DATASUS; Passos, Lopes et al. 1998; Passos, Lopes et al. 1998). A mdia de idade encontrada no sexo feminino foi mais elevada do que no sexo masculino (62,86 anos vs. 59,18 anos), e ainda assim, est abaixo da idade referida na literatura para aparecimento de DAC nas mulheres (entre 66 a 70 anos) (Alexandre and ndio do Brasil 2005; Newby 2007; Rosamond, Flegal et al. 2008). Alm disso, na maioria dos artigos h referncias de que as mulheres so cerca de 5 a 10 anos mais velhas do que os homens (Redberg 1999). Quando avaliado apenas o subgrupo que teve IAM, a mdia de idade (62,7 anos para as mulheres e 60,05 para os homens) foi prxima aos valores encontrados na amostra total de pacientes com DAC. Em um estudo semelhante com pacientes que tiveram infarto, realizado por Passos e col. entre 1992 e 1996 em Salvador, a idade mdia para o sexo feminino foi de 66 anos enquanto que a do sexo masculino foi de 59,7 anos (Passos, Lopes et al. 1998). Embora o estudo de Passos e col. apresente uma mdia de idade para o sexo feminino superior a encontrada no

30 presente estudo, observa-se que a do sexo masculino semelhante a encontrada no Hospital Ana Nery. Dados do DATASUS referentes ao internamento por DAC entre setembro de 2007 e fevereiro de 2008 evidenciaram uma maior quantidade de pacientes do sexo masculino na faixa etria de 50 a 59 anos, e do sexo feminino na faixa de 60 a 69 anos. Estes dados corroboram com os achados do atual estudo, visto que quando feita a comparao por faixa etria a distribuio foi semelhante. Esta diminuio na mdia de idade das mulheres em relao a outros estudos pode estar associada a um nmero maior de fatores de risco encontrados nesse grupo que poderia contribuir na maior precocidade da manifestao clnica da DAC. Em relao aos tipos de manifestao de DAC foi observada em nosso estudo uma predominncia de IAM com supra de ST na amostra geral. Esse foi tambm o tipo de IAM mais encontrado nas mulheres deste estudo. Esse resultado diverge da literatura, onde se refere que mulheres costumam apresentar mais IAM sem supra (Neill and Adgey 2008). Vrios autores referem as dificuldades de diagnstico de IAM em mulheres que apresentam manifestaes atpicas da doena, buscam tardiamente atendimento e apresentam com maior freqncia IAM sem supra de ST (Banks 2008). Por se tratar de unidade de referncia especializada, existe mais chance de encaminhamento de IAM com supra de ST por serem mais facilmente identificados. Foi observada na amostra geral que diabetes e hipertenso apresentavam prevalncia mais elevada do que a encontrada por Yusuf e col. no INTERHEART, que avaliou fatores de risco relacionados com IAM em vrios lugares do mundo. Enquanto que no atual estudo, a prevalncia de diabetes foi de 38,3% e hipertenso 85,2%, no INTERHEART essas prevalncias foram respectivamente 18,45% e 39,2% (Yusuf, Hawken et al. 2004). Tais dados sugerem que diabetes e hipertenso so fatores de risco importantes para DAC em nosso meio. Com relao ao tabagismo, observamos menor prevalncia (20,9%), quando comparado com a populao do INTERHEART (45,17%) (Yusuf, Hawken et al. 2004). Diabetes foi um fator de risco significativamente mais freqente no sexo feminino do que no masculino (50,0% vs. 30,4% p=0,034), bem como a hipertenso arterial sistmica (93,5% vs. 79,7% p=0,035). O diabetes um fator de risco que tem mais impacto no surgimento da DAC nas mulheres do que nos homens. Mulheres diabticas tm risco relativo de 5,4% de evoluir com DAC, enquanto nos homens o risco relativo observado de 2,4% (Wilson, D'Agostino et al.

31 1998; Redberg 1999). Em um estudo de base populacional realizado por Lessa e cols. com 1439 pessoas, verificou-se uma alta prevalncia de HAS em mulheres da populao de Salvador (31,7%), evidenciando a importncia desse fator de risco em Salvador (Lessa, Magalhes et al. 2006). Embora sem significncia estatstica, verificou-se entre as mulheres maior freqncia de dislipidemia quando comparada com os homens (45,7% vs. 29%), o mesmo foi observado quanto a obesidade (21,7% vs. 13%) no atual estudo. O predomnio desses fatores de risco no sexo feminino foi observado em um estudo realizado por Juutilainen e col, onde houve uma maior prevalncia de hipertenso, dislipidemia e obesidade no sexo feminino (Juutilainen, Kortelainen et al. 2004). Foi identificado menor nmero de mulheres tabagistas no grupo (13% vs. 26,1% p=0,92), o que est de acordo com o que referido em outros estudos (Cncer; CDC 2008; Rosamond, Flegal et al. 2008). Entretanto sabe-se que nas mulheres o fumo igualmente prejudicial sendo causa importante de surgimento precoce de DAC (CDC 2008). As mulheres tm mais fatores de risco do que os homens tendo em mdia 2,2 fatores de risco contra 1,77 apresentados pelos homens (p=0,022). Essa maior prevalncia de fatores de risco vista em outros trabalhos e por vezes os autores atribuem ao fato das mulheres apresentarem a idade mais avanada do que os homens (Wilson, D'Agostino et al. 1998; Franklin, Larson et al. 2001; Alexandre and ndio do Brasil 2005; Mosca, Appel et al. 2008; Neill and Adgey 2008). Entretanto, neste estudo a idade mdia no sexo feminino foi por volta dos 62 anos, enquanto na maioria dos estudos essa idade est entre 66 a 70 anos (Alexandre and ndio do Brasil 2005; Newby 2007; Rosamond, Flegal et al. 2008). Uma possvel explicao para essa idade a maior ocorrncia de fatores de risco no grupo do sexo feminino encontrada na nossa amostra, esses fatores (principalmente diabetes e hipertenso) antecipariam o surgimento da doena. A presena de fatores de risco no sexo feminino poderia ser considerada um determinante no aparecimento de DAC, visto que todas as 46 mulheres da pesquisa apresentaram pelo menos 1 fator de risco. Este fato no foi observado no sexo masculino, pois 14 homens apresentaram DAC sem ter nenhum dos fatores de risco pesquisados (diabetes, HAS, obesidade, dislipidemia e tabagismo). Entretanto, devido a limitaes das informaes do pronturio, no puderam ser analisados outros fatores de risco para DAC como histria familiar de DAC precoce, que poderia estar presente nesses 14 pacientes do sexo masculino.

32 Diferente de outros estudos as mulheres no foram menos submetidas a tratamento invasivo. Enquanto que neste estudo as mulheres com DAC foram mais submetidas a angioplastia (41,3% vs. 37,7%). No estudo realizado por Conti e cols. houve menos tromblise e angioplastia no sexo feminino, e maior proporo de cirurgias de revascularizao miocrdica em mulheres (Conti, Solimene et al. 2002). Entretanto entre os pacientes infartados pode-se observar que no sexo feminino as formas de tratamento mais utilizadas foram o clnico isolado e a angioplastia. O tratamento cirrgico foi o menos utilizado nos dois sexos entre os pacientes infartados e esteve muito pouco presente no sexo masculino (3 casos). Portanto podemos concluir que as mulheres atendidas no Ana Nery por DAC no tiveram desvantagens em relao ao tratamento realizado no sexo masculino. As limitaes do trabalho foram devido a falta de dados importantes no pronturio, como por exemplo, histria familiar de DAC precoce, alguns resultados de exames laboratoriais ou informaes sobre uso prvio de medicaes. O estudo tambm no abrangeu os bitos o que seria interessante para avaliar a letalidade de DAC e compar-la entre homens e mulheres. 7. CONCLUSO Atravs deste trabalho, pode-se concluir que a amostra de pacientes admitidos no HAN com diagnstico de DAC semelhante, quanto a gnero e idade, aos dados obtidos no DATASUS referentes aos internamentos com mesmo diagnstico e perodo na cidade de Salvador. Por outro lado, verificou-se que dentre os pacientes com diagnstico de IAM, a freqncia de mulheres menor no atual estudo quando comparado com o encontrado no DATASUS. A faixa etria das mulheres com DAC e IAM foi inferior a que foi descrita na literatura, porm semelhante observada no DATASUS. Em relao aos fatores de risco, as mulheres do atual estudo apresentam maior nmero de fatores de risco quando comparado com os homens, sobretudo diabetes e hipertenso arterial. Alm disso, diferenas no acesso ao tratamento para DAC no foram observadas entre os gneros no atual estudo. Apesar das limitaes do estudo pode-se concluir que estamos diante de um importante problema de sade pblica.

33 Para melhor elucidao da situao da mulher em relao a DAC em nosso meio faz-se necessria uma ampliao do estudo, com desenho prospectivo e com melhor registro dos dados, avaliando tambm letalidade da doena e sua recorrncia.

34 8. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS