Monografia - Estratégias de Comunicação da Campanha Nacional de Prevenção e Combate Ao Trabalho Escravo Da CPT

Embed Size (px)

Citation preview

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    1/74

    0

    UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHOCENTRO DE CINCIAS SOCIAIS - CCSo

    DEPARTAMENTO DE COMUNICAO SOCIAL

    ANTONIO PAIVA DA SILVA

    ANLISE DAS ESTRATGIAS DE COMUNICAO DA CAMPANHA NACIONALDE PREVENO E COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO DA COMISSO

    PASTORAL DA TERRA (CPT)

    So Lus2014

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    2/74

    1

    ANTONIO PAIVA DA SILVA

    ANLISE DAS ESTRATGIAS DE COMUNICAO DA CAMPANHA NACIONALDE PREVENO E COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO DA COMISSO

    PASTORAL DA TERRA (CPT)

    Monografia apresentada ao Curso de ComunicaoSocial da Universidade Federal do Maranho paraobteno de grau de Bacharel em Relaes Pblicas.

    Orientadora: Profa. Mestre Flvia de Almeida Moura.

    So Lus2014

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    3/74

    2

    Silva, Antonio Paiva

    Anlise das estratgias de comunicao da Campanha Nacional dePreveno e Combate ao Trabalho Escravo da Comisso Pastoral da Terra(CPT) /Antonio Paiva da Silva. - So Lus, 2014.

    73f. : il.

    Monografia (Graduao em Comunicao Social) - Curso deComunicao Social, Universidade Federal do Maranho, 2014.

    1. Estratgias de comunicao. 2. Trabalho escravo. 3. Mobilizaosocial. I. Ttulo.

    CDU 316.77

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    4/74

    3

    ANTONIO PAIVA DA SILVA

    ANLISE DAS ESTRATGIAS DE COMUNICAO DA CAMPANHA NACIONALDE PREVENO E COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO DA COMISSO

    PASTORAL DA TERRA (CPT)

    Monografia apresentada ao Curso de Comunicao

    Social da Universidade Federal do Maranho paraobteno de grau de Bacharel em Relaes Pblicas.

    Aprovada em / /

    BANCA EXAMINADORA

    __________________________________________________Profa. Flvia de Almeida Moura (Orientadora)

    Mestre emUniversidade Federal do Maranho - UFMA

    ___________________________________________________

    Examinador 01

    __________________________________________________

    Examinador 02

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    5/74

    4

    AGRADECIMENTOS

    A Deus, Criador do universo, pelo dom da vida. Pela famlia que me deu,

    pela capacidade de sonhar e de acreditar nos meus sonhos. Por permitir que aquele

    menino mirrado, de cor amarelada, que comeou a sua luta numa escolinha de meia

    parede e cho de barro numa viela sem energia eltrica, longe de tudo e de todos,

    onde o dia era mais longo e a noite tinha o cu mais lindo j visto; aquele menino,

    que mesmo sendo filho de roceiros, desde cedo preferiu os livros enxada, e que,

    com a cara e a coragem deixou sua famlia e conseguiu entrar numa universidade

    pblica federal e surpreender queles que muitas vezes o deixaram triste, aodizerem que seus sonhos eram altos demais para serem alcanados. A Ele, o Pai,

    que me permitiu ser forte para encarar com dignidade todas as intempries

    superadas at aqui, a Ele, todo honra e glria, sempre!

    minha me, Antonia Paiva da Silva, que mesmo no tendo leitura (como

    ela mesma me falava), me ensinou desde cedo, que s atravs da educao eu

    conseguiria alcanar os meus objetivos. Ela, que sozinha criou e educou seus oito

    filhos e fez questo de ensinar a cada um deles que, na vida, dinheiro no vale maisque dignidade. Que tu vivas muitos anos, Senhora Paiva, para que eu consiga

    retribuir ao menos dez por cento de tudo o que me destes.

    minha v, meus irmos, tios e tias, primos, cunhados e cunhadas obrigado

    pela confiana e credibilidade que sempre depositaram em mim.

    Aos colegas da Residncia Estudantil da UFMA (REUFMA), que ao longo de

    quatro anos me ofereceram companhia e me ensinaram cada um sua maneira,

    lies que levarei por toda a vida. A todos vocs, e de forma especial a RibamarQuadros, Marcos Viniciuns e Renan Lavareda, irmos que a vida me deu, muito

    obrigado! Que a tradio desta casa, de formar grandes cidados se mantenha e

    que todos tenham muito sucesso.

    famlia Vigas: Andra, Marilu, Washington, Lisiane, Carlinhos e Dad,

    que me adotaram como filho, irmo e neto, e me ajudaram a sorrir nos momentos

    mais difceis, quando a saudade de casa doa no peito. A vocs, minha eterna

    gratido.

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    6/74

    5

    s bibliotecrias mais queridas da UFMA, Araceli e Teresa, que no perodo

    de dois anos como bolsista da Biblioteca Central, me proporcionaram momentos de

    alegria e aprendizagem. O carinho de vocs levarei sempre comigo.

    tia Zlia, um anjo que Deus colocou em minha vida disfarado de vizinha,

    e que tem sido uma das minhas alegrias dirias. Obrigado pelo carinho e dedicao!

    equipe do Laboratrio Ilha da Cincia, que me proporcionou momentos de

    grande aprendizado e companheirismo. Em especial, agradeo Gisele Cutrim, pela

    amizade e disponibilidade; ao professor Antonio Oliveira, pela oportunidade e a

    confiana que depositou em mim, pela ateno e prontido em colaborar com minha

    formao. Sou grato a todos!

    Ao professor Marcelo Carneiro, pelo apoio e pela generosidade dispensadaa mim em conceder uma bolsa de fomento do seu projeto para subsidiar minha

    pesquisa. Fica a minha gratido!

    Aos agentes da CPT entrevistados para este trabalho, em especial ao Frei

    Xavier Plassat, da CPT Araguaia-Tocantins e coordenador da Campanha objeto

    deste estudo, pela ateno e disponibilidade em colaborar com a realizao desta

    pesquisa.

    Aos meus amigos da UFMA, representados nominalmente pela minhaconterrnea, amiga, irm e fonte de inspirao, Ariadna Ferreira. Ari, viemos da

    mesma terra, carregamos os mesmos sonhos, compartilhamos das mesmas

    dificuldades, cursamos o mesmo curso, estamos ligados pelo mesmo amor, somos

    vencedores juntos.

    Aos meus queridos colegas de turma, Alexsandro Rodrigues, Daryanne

    Caldas, Denise Arajo, Dianna Sanny (uma relao de gonguice eterna), Flvio

    Mouran, Ivanna Castro, Ingrid, Natlia Coutinho, Patrcia Ribeiro, e, claro, minhasTats especiais: Thaysa Lopes, minha rainha do Nilo, Talyssa Soares, a ex-

    estagiria da Caixa mais linda do mundo e Talita Reis, a minha RP mais chique e

    elegante. Serei sempre o chinfrim buriticupuense mais paivificador que j

    conheceram. A vocs, amor eterno.

    E, por fim, aos meus mestres, professores e professoras que me ensinaram

    e me motivaram nesses quatros anos de graduao, em especial, professora

    Flvia Moura, que bem mais do que professora, orientadora tornou-se uma amiga,

    um espelho, um exemplo de ser humano que me servir de inspirao.

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    7/74

    6

    RESUMO

    Este trabalho tem por objetivo analisar as estratgias de comunicao da Campanha

    Nacional de preveno e combate ao Trabalho Escravo da Comisso Pastoral da

    Terra (CPT). O estudo feito a partir de pesquisa documental, entrevistas e

    questionrios com agentes e parceiros da CPT e com a coordenao da Campanha,

    alm da coleta de dados atravs da observao participante. A pesquisa visa

    compreender as principais aes e estratgias de comunicao desenvolvidas na/ e

    pela Campanha De olho aberto para no virar escravo, coordenada pela entidadedesde 1997, bem como verificar dentre os seus organizadores e demais pessoas

    envolvidas na execuo desta, a eficincia e os resultados alcanados por meio

    dessa iniciativa no processo de preveno e combate ao Trabalho Escravo

    Contemporneo no Brasil. Destaca-se nesse estudo a organizao de membros da

    sociedade civil, e o uso da comunicao no enfrentamento aos problemas sociais

    em paralelo s aes do Poder Pblico.

    Palavras-chave: Estratgias de comunicao. Trabalho escravo contemporneo.

    Mobilizao social.

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    8/74

    7

    ABSTRACT

    This work has its objectives to analyse the strategies of communication from the

    National Campaign towards the prevention and combat of slave labour from The

    Pastoral Land Commission (CPT). Our study was based on documental researches,

    interviews and questioners to the CPT agents and partners, but also with the

    campaigns coordination. Besides that, it is also based on the data collecting through

    a participative observation. This research aims to comprehend the main actions and

    strategies of communication developed in and by the campaign De olho aberto para

    no virar escravo, coordinated by that entity since 1997, as well as to verify amongsttheir organizers and people involved on its execution the efficiency and results

    accomplished through that initiative on the process of prevention and combat to

    contemporary slave labour in Brazil. We highlight, therefore, the organization of civil

    society and the usage of communication towards the confrontation of the social

    problems to actions from public authorities.

    Keywords: Communication strategies. Contemporary slavery labour. Socialmobilization.

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    9/74

    8

    LISTA DE SIGLAS

    CONATRAE - Comisso Nacional para a Erradicao do Trabalho Escravo

    CPT - Comisso Pastoral da Terra

    CDVDH/CB - Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos de Aailndia

    Carmen Bascran

    MTE - Ministrio do Trabalho e Emprego

    OIT - Organizao Internacional do Trabalho

    ONG - Organizao No Governamental

    PEC - Proposta de Emenda Constitucional

    RB - Reprter Brasil

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    10/74

    9

    LISTA DE ILUSTRAES

    p.

    Figura 1 - Sanfoninha da CPT/verso 2011.................................................. 38

    Grfico 1 - Formas de distribuio das estratgias de comunicao da

    Campanha da CPT........................................................................ 40

    Grfico 2 - Tipos de estratgias de comunicao utilizadas na Campanha

    da CPT.......................................................................................... 42Grfico 3 - Estratgias de comunicao indicada como mais eficiente na

    Campanha da CPT........................................................................ 42

    Figura 3 - Cartaz da Campanha da CPT....................................................... 43

    Figura 4 O Pulo do gato............................................................................... 47

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    11/74

    10

    SUMRIO

    p.

    1 INTRODUO...................................................................................... 11

    2 ESTRAT GIAS DE COMUNICAO EM REDES DE

    MOBILIZAO SOCIAL....................................................................... 16

    2.1 Estratgias de comunicao.............................................................. 16

    2.2 Mobilizao social...............................................................................20

    2.3 Redes.................................................................................................... 22

    2.4 Comunicao popular......................................................................... 24

    3 A CPT NO COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO NO BRASIL........ 26

    3.1 A Campanha Nacional de Preveno e Combate ao Trabalho

    Escravo: De olho aberto para no virar escravo.......................... 28

    3.2 Estratgias de Comunicao da Campanha: a Sanfoninha............ 30

    3.3 Abordagem e organizao da CPT ................................................... 33

    4 AN LISE DAS ESTRAT GIAS COMUNICACIONAIS DA

    CAMPANHA DA CPT........................................................................... 36

    4.1 Produtos e aes da Campanha da CPT........................................... 37

    4.2 Encontro de avaliao e planejamento da Campanha..................... 49

    5 CONSIDERAES FINAIS.................................................................. 51

    REFERNCIAS..................................................................................... 56

    APNDICES.......................................................................................... 59

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    12/74

    11

    1 INTRODUO

    A escravido no Brasil foi abolida legalmente em 13 de maio de 1888.

    Todavia, em pleno sculo 21, o pas ainda convive com esta prtica, que representa

    uma das mais perversas formas de explorao do ser humano, a chamada

    escravido contempornea, caracterizada no mais pelo trabalhador negro preso a

    correntes e submetido a fortes castigos, mas por situaes que tambm ferem a

    dignidade humana, como a explorao da mo-de-obra com imobilizao do

    trabalhador, nem sempre apenas por meio da coao fsica, mas tambm moral, na

    qual este submetido a exaustivas jornadas de trabalho e precrias condies de

    alojamento e alimentao, tendo ainda a sua liberdade de ir e vir restringida.Na escravido contempornea, no h distino de cor ou raa. No faz

    diferena se a pessoa negra, amarela ou branca, basta estar em situao de

    vulnerabilidade e cair nas falsas promessas de trabalho oferecidas por fazendeiros,

    pecuaristas e, mais recentemente, empresrios da construo civil, dentre outros.

    Vale ressaltar que as relaes entre classe e raa no Brasil esto imbricadas e,

    dessa forma, mesmo no sendo pr-condio para ser escravo, a grande maioria

    dos trabalhadores afrodescendente.As estatsticas do trabalho escravo contemporneo no Brasil so

    impressionantes. De acordo com dados recentes da CPT (Comisso Pastoral da

    Terra), em 2013, foram identificados 2.874 trabalhadores flagrados em regime de

    escravido. Desse total, 2.208 foram libertados (CPT, 2014).

    Na era da tecnologia, das grandes descobertas da Cincia, da capacidade

    de criao cada vez maior do homem, um gigantesco contraste a existncia ainda

    desse tipo de situao. Diante disso, a lentido e, s vezes, at omisso do PoderPblico na soluo de problemas sociais, acarreta no surgimento de iniciativas da

    sociedade civil organizada, pelos movimentos sociais, no enfretamento de mazelas

    da sociedade que se arrastam e se reconfiguram dcadas ps dcadas no pas.

    A realizao desta monografia, voltada temtica das estratgias de

    comunicao no combate ao trabalho escravo contemporneo, decorre da

    participao do estudante no projeto de pesquisa Representaes do trabalhador

    escravo (e acerca dele) em instncias miditicas e estratgias de comunicao em

    redes de denncia no Maranho, desenvolvido pelo Departamento de Comunicao

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    13/74

    12

    Social da Universidade Federal do Maranho, sob a coordenao da professora

    Flvia de Almeida Moura, orientadora deste trabalho.

    A oportunidade de integrar o projeto como bolsista 1 do Programa

    Institucional de Bolsas de Iniciao Cientfica (PIBIC) foi de grande relevncia para o

    estudante, ao passo que contribuiu para o seu amadurecimento enquanto

    acadmico e pesquisador, atravs do grupo de estudos, com reunies semanais

    com a participao de outros acadmicos, inclusive de outras reas do

    conhecimento e mediao da coordenadora. A vivncia no grupo propiciou a

    participao do estudante em eventos sobre o trabalho escravo, apresentao de

    trabalhos em encontros, seminrios, semanas cientficas, bem como a produo e

    publicao de artigos acerca desta temtica.Durante a realizao dos estudos, constatou-se a existncia de uma rede,

    composta por diversas entidades, em nvel nacional e internacional, que trabalha em

    prol da preveno e do combate ao trabalho escravo, como a ONG Reprter Brasil,

    a Comisso Pastoral da Terra (CPT), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-

    Terra (MST), a Organizao Internacional do Trabalho (OIT), o Centro de Defesa da

    Vida e dos Direitos Humanos de Aailndia Carmen Bascran (CDVDH/CB), entre

    outras.Surgiu, ento, o interesse em pesquisar uma das entidades componentes

    desta rede, a Comisso Pastoral da Terra (CPT), organizao da Igreja Catlica

    voltada defesa dos direitos humanos e da reforma agrria. Dessa forma, a

    pesquisa tem como o objetivo identificar as principais estratgias de comunicao da

    CPT no combate ao Trabalho Escravo, mais especificamente da Campanha De

    olho aberto para no virar escravo, coordenada pela entidade desde 1997. A

    Campanha voltada aos trabalhadores rurais em situao de vulnerabilidade e,mais recentemente, tambm, aos trabalhadores de zonas urbanas, devido grande

    incidncia da explorao da mo de obra na construo civil.

    Para este estudo, a construo do arcabouo terico-metodolgico baseou-

    se na escolha de categorias analticas que se apresentaram como fundamentais

    para a compreenso do objeto em questo; como os conceitos de estratgias de

    1 O estudante foi bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciao Cientfica (PIBIC), noperodo de agosto de 2012 a agosto de 2013, atravs de uma parceria com o projeto de pesquisaEstudo da organizao e funcionamento da rede de combate ao trabalho escravo no Maranho,coordenado pelo Prof. Dr. Marcelo Domingos Sampaio Carneiro, do Departamento de Sociologia eAntropologia da Universidade Federal do Maranho.

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    14/74

    13

    comunicao, mobilizao social, rede e comunicao popular, trabalhados por

    autores da Comunicao e das Cincias Sociais Aplicadas, como Mrcio Simeone

    Henriques (2007), Margarida Maria Krohling Kunsch (2003), Cicilia Maria Krohling

    Peruzzo (2004), Inesita Soares de Arajo (2002), Carlos Olavo Quandt e Queila

    Souza (2008), entre outros.

    Como metodologia, iniciou-se com a reviso bibliogrfica a partir de grupos

    de estudos para a construo da fundamentao terica fundamental para

    compreenso e discusso das categorias acima elencadas, estruturao de

    procedimentos de anlise do objeto e do material coletado no campo, bem como a

    observao das estratgias de comunicao utilizadas.

    Para a obteno de informaes e entendimento das estratgias decomunicao desenvolvidas na Campanha da CPT, foram realizadas pesquisa

    documental no portal da entidade, entrevistas com o Coordenador da Campanha,

    observao participante durante encontro com membros da CPT e aplicao de

    questionrio qualitativo.

    A realizao de entrevistas com o coordenador da Campanha foi uma

    ferramenta metodolgica importante, pois permitiu a apreenso de informaes

    indispensveis sobre a CPT, sua forma de organizao e articulao; sobre aCampanha e as suas estratgias comunicacionais, bem como os desdobramentos

    destas durante os anos. As entrevistas foram realizadas em 2011 pela coordenadora

    do projeto supracitado, e em So Lus, em junho de 2013, pelo estudante.

    A observao participante tambm foi uma estratgia importante para

    substanciar a pesquisa durante a participao do estudante em um evento da CPT,

    realizado em agosto de 2013, em Araguana - TO, onde este pode vivenciar por trs

    dias a rotina e a metodologia de avaliao da Campanha da CPT por agentes eparceiros da entidade. Foi uma experincia enriquecedora, pois permitiu um olhar

    mais prximo e detalhado do pesquisador sobre o seu objeto de estudo, no caso a

    Campanha da CPT.

    A observao participante se distingue da observao comum [...] namedida em que pressupe a integrao do investigador ao grupoinvestigado, ou seja, o pesquisador deixa de ser um observador externo dosacontecimentos e passa a fazer parte ativa deles. Esse tipo de coleta dedados muitas vezes leva o pesquisador a adotar temporariamente um estilode vida que prprio do grupo que est sendo pesquisado (BONI;

    QUARESMA, 2005, p. 4).

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    15/74

    14

    Com a aplicao de questionrio qualitativo com agentes e parceiros da CPT

    pode-se verificar a percepo destes em relao s estratgias comunicacionais

    desenvolvidas na Campanha, bem como os seus produtos de comunicao.

    Procurou-se saber se essas pessoas, que participam diretamente da construo

    dessas estratgias e produtos, e os utilizam no trabalho desenvolvido pela

    Campanha em suas reas de atuao, acreditam e esto satisfeitas com os

    resultados alcanados pelo trabalho. Para tanto, o questionrio foi estruturado com

    os seguintes aspectos: identificao do entrevistado, formao, rea e atividade de

    atuao na CPT, e percepo acerca das estratgias de comunicao da

    Campanha, a partir de seis questes subjetivas abertas.

    As etapas elencadas acima, desenvolvidas durante a pesquisa, resultaramna estruturao da presente monografia em trs captulos, alm da introduo e

    consideraes finais. No primeiro captulo, busca-se discutir teoricamente, fazendo

    as conexes possveis com o objeto em anlise, os conceitos fundamentais para a

    construo deste trabalho. So eles: estratgias de comunicao, mobilizao

    social, rede e comunicao popular. Desta forma, procura-se compreender o

    conceito de estratgias de comunicao, as questes inerentes mobilizao social,

    e a importncia de uma comunicao planejada estrategicamente em projetos queobjetivam a mobilizao de pessoas em prol de uma causa coletiva. Em seguida,

    buscando entender as relaes traadas entre organismos formais, com estrutura e

    localizao geogrfica diferente, mas que trabalham com propsitos iguais ou

    semelhantes, como o caso da CPT e as demais entidades que compem a rede

    de combate ao Trabalho Escravo em nvel nacional e internacional, adentra-se s

    discusses acerca das redes. E, por fim, para se ter melhor compreenso da

    concepo e desenvolvimento das estratgias de comunicao da Campanha daCPT, bem como do seu material de divulgao, da linguagem utilizada, da forma de

    abordagem dos pblicos, parte-se para o conceito e discusso em torno da

    comunicao popular.

    No segundo captulo, apresenta-se a Comisso Pastoral da Terra (CPT), seu

    histrico, desde a sua origem, misso e objetivos, sua atuao concreta na busca

    por justia social ao homem do campo e nas aes de preveno e no combate ao

    Trabalho Escravo. Em seguida, trata-se da concepo da Campanha De olho

    aberto para no virar escravo, coordenada pela entidade a partir de 1997, bem

    como das suas estratgias comunicacionais, material de divulgao e formas de

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    16/74

    15

    articulao de parceiros no enfrentamento do problema e das suas aes voltadas

    para chamar a ateno da opinio pblica, em nvel nacional e internacional, sobre o

    trabalho escravo no pas.

    No terceiro e ltimo captulo, analisa-se a atuao da CPT na rede de

    combate ao trabalho escravo, especialmente as aes e estratgias de comunicao

    da Campanha da entidade, observando a sua forma de atuao e o seu

    comportamento em relao aos diferentes pblicos. Tambm no captulo trs

    apresenta-se e discute-se o resultado da pesquisa qualitativa realizada com agentes

    e parceiros da CPT atravs de questionrio, que buscou verificar a opinio dessas

    pessoas sobre a Campanha Nacional de preveno e combate ao Trabalho Escravo,

    da CPT.Esta monografia traz um tema que no muito debatido na sociedade e

    pouco mencionado nos estudos de Comunicao. Portanto, acredita-se na

    importncia e relevncia desse tipo de trabalho, visto que contribui para a divulgao

    de iniciativas interessantes, como as da CPT no enfrentamento dessa antiga, porm

    ainda resistente mazela social, muitas vezes negligenciada pelo poder pblico.

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    17/74

    16

    2 ESTRATGIAS DE COMUNICAO EM REDES DE MOBILIZAO SOCIAL

    Para o desenvolvimento deste trabalho faz-se necessrio promover a

    discusso entre conceitos fundamentais para a compreenso das estratgias de

    comunicao desenvolvidas na Campanha Nacional de Preveno e Combate ao

    Trabalho Escravo, De olho para no virar escravo, pela Comisso Pastoral da

    Terra (CPT), a comear pelo entendimento do que sejam as estratgias de

    comunicao e o seu uso nos projetos de mobilizao social, bem como as

    discusses acerca dos conceitos de rede e comunicao popular.

    2.1 Estratgias de comunicao

    Para Baldissera (2001) por comunicao, entende-se o processo de

    construo e disputa de sentidos. Para ele, a questo da disputa de sentidos pode

    ser pensada sob a perspectiva de que os interlocutores, nas prticas

    comunicacionais, sempre estabelecem relaes de fora. Nas campanhas, nos

    projetos de mobilizao social, a comunicao precisa ser instituda como fluxo e,

    no, reduzida a um sistema de informaes. Isto , o processo comunicacional dialgico, no deve se restringir a um circuito, em que as informaes so

    despejadas de cima para baixo, sem se levar em considerao os pblicos

    envolvidos.

    Baseados em Frana (2002), pode-se olhar a comunicao sob duas

    perspectivas: a informacional e a relacional. A primeira vista como um processo de

    troca de informaes entre um emissor para um receptor e a relacional, que para,

    alm disto, v a comunicao como um processo de produo de sentidos entre ossujeitos interlocutores, considerando o contexto sociocultural em que estes esto

    inseridos. De acordo a perspectiva relacional, Frana (2002) acrescenta que a

    comunicao compreende um processo de produo e compartilhamento de sentido

    entre sujeitos e interlocutores, realizado por meio de uma materialidade simblica

    (da produo de discursos) e inserido em determinado contexto sobre o qual atua e

    do qual recebe os reflexos.

    Henriques (2007) afirma que a comunicao, mais que uma transferncia de

    informaes, se configura como um espao de trocas mtuas entre os sujeitos

    interlocutores, onde no h um detentor nico do conhecimento, mas cada um tem

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    18/74

    17

    contribuies importantes a oferecer. Partindo-se desse entendimento, o referido

    autor discorre:

    [...] o carter dialgico da comunicao no apenas a transferncia do

    saber, mas um encontro de sujeitos interlocutores na medida em quedefende uma causa de interesse mtuo. A comunicao dialgica, nestesentido, libertadora, uma vez que no invade ou manipula o outro, masbusca problematizar o conhecimento de uma realidade, explic-la etransform-la. (HENRIQUES, 2007, p.23).

    Nesta mesma linha de pensamento, Peruzzo (2004) defende que a

    comunicao se configura como uma ferramenta importante de uma democracia,

    uma vez que esta possibilita a organizao e convocao de vontades bem como o

    protagonismo do cidado no processo de mobilizao por mudana em uma dada

    realidade.[...] a comunicao mais que meios e mensagens, pois se realiza comoparte de uma dinmica de organizao e mobilizao social; est imbudode uma proposta de transformao social e, ao mesmo tempo, deconstruo de uma sociedade mais justa; abre a possibilidade para aparticipao ativa do cidado comum como protagonista do processo.(PERUZZO, 2004, P.20-21).

    Mas, afinal, o que seriam as estratgias de comunicao?

    Antes de se definir estratgias de comunicao torna-se oportuno conceituar

    estratgias. Na literatura, o termo estratgia tem diversas definies e no h umauniformidade entre elas. Como afirma Hambrick (1983 apud NICOLAU, 2001)

    estratgia um conceito multidimensional e situacional e isso dificulta uma definio

    de consenso. Bueno (2009) entende estratgia como a arte de definir e aplicar

    recursos com o intuito de atingir objetivos previamente estabelecidos. Por sua vez,

    Thietart (1984 apud NICOLAU, 2001) considera estratgia como o conjunto de

    decises e aes relativas escolha dos meios e articulao de recursos com

    vista a atingir um objetivo.

    Partindo desse entendimento, pode-se adentrar ao conceito de estratgia de

    comunicao. Para Corrado (1994), a estratgia de comunicao deve compor um

    plano da organizao, que vai nortear suas aes, definindo quem, quando, como e

    para quem se vai comunicar. E esclarece:

    [...] consiste no plano da empresa para transmitir as notcias para seuspblicos. A estratgia define quem so esses pblicos, por que importantecomunicar-se com eles, quando e onde a comunicao deve acontecer,quem o responsvel pelas comunicaes, o que deve ser dito e qual ovnculo com as metas comerciais.

    Como se pode ver, a definio de Corrado (1994) voltada para o setor

    empresarial. Nas discusses do objeto em estudo, devem-se pensar as estratgias

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    19/74

    18

    de comunicao como algo mais abrangente, voltada ao social, como defende

    Bueno (2009) ao considerar que:

    [...] a comunicao estratgica (pelo menos no conceito em que a temos

    formulado) se afirma melhor (ou est mais potencializada) com a teoriasistmica de estratgia, j que ela maximiza a importncia das condiessociais, d nfase dimenso cultural e aceita o planejamento multifatorialou seja, no limita ou prioriza a vertente econmica ou financeira.

    A partir das consideraes acima, pode-se pensar as estratgias de

    comunicao como um comportamento racional e planejado, baseado em uma

    pesquisa dos pblicos, bem como do ambiente em que este est inserido,

    considerando as suas relaes socioculturais, adotado por aquele que deseja

    comunicar, fazer ser ouvido, para resolver possveis problemas comunicativos em

    busca de atingir o seu objetivo. Assim, utilizar a comunicao de forma estratgica

    saber, antes de tudo, para quem se est comunicando; fazer uma anlise

    minuciosa dos pblicos a que se quer atingir. S assim ser possvel, dentre outros,

    verificar as possveis barreiras, o grau de dificuldades a serem enfrentadas durante

    o processo de mobilizao/convencimento.

    claro que esse no pode ser um processo simples, feito de forma intuitiva,

    mas deve ser resultado de um planejamento que Kunsch (2003) define como um

    processo tcnico, racional, lgico e poltico - como um ato de inteligncia, em suma.

    O exerccio da aplicao do processo de planejamento estratgico muito

    proveitoso, pois permite equacionar uma srie de coisas, sobretudo produzir uma

    anlise estratgica capaz de construir um diagnstico situacional com indicativos

    das ameaas, demandas e oportunidades do ambiente externo, e, ao mesmo tempo,

    avaliar o nvel de resposta que uma organizao possui em relao s suas

    possibilidades e fraquezas (KUNSCH, 2003).

    Sobre o planejamento da comunicao, afirma-se que deve existir no sentidode permitir a tomada de posies a respeito de questes crticas e estratgicas e de

    motivar, associar e integrar os diversos pblicos atravs da criao, da manuteno

    e do fortalecimento dos vnculos de cada pblico com o projeto institudo

    (HENRIQUES, 2007, p. 40). a partir deste planejamento que ser possvel

    estabelecer metas e objetivos a serem atingidos em dado espao de tempo. Neste

    processo imprescindvel a definio dos pblicos a serem alcanados.

    Para a classificao dos pblicos da Campanha Nacional de Preveno eCombate ao Trabalho, da CPT, utilizaram-se os conceitos de Henriques (2007), que

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    20/74

    19

    prope uma diviso de pblicos diferente dos modelos clssicos. Para o autor, o

    modelo clssico de diviso de pblicos, baseado nas categorias tradicionais de

    pblico interno, externo e misto, no se aplica aos movimentos sociais, devido

    serem estes uma instituio aberta e descentralizada, o que torna invivel definir o

    que se encontra em suas fronteiras internas e o que se projeta para fora dela, no

    sendo possvel distinguir o interno do externo. Para tanto, Henriques (2007) prope

    uma diviso a partir de trs nveis de aproximao, a saber:

    A) Beneficiados (B) - o pblico entendido como sendo todas aspessoas e instituies que podem ser localizadas dentro do mbitoespacial que o projeto delimita para a sua atuao. B) Legitimadores(L) - grupo de pessoas ou instituies que, localizados dentro dombito espacial do projeto, no apenas se beneficiam com os seus

    resultados ou dispem-se a legitimar a sua existncia, mas,possuindo informaes acerca de sua existncia e operao, socapazes de reconhec-lo e julg-lo como til e importante, podendose converter em colaboradores diretos em qualquer tempo. c)Geradores (G) - grupo de pessoas ou instituies que, localizadasdentro do que se define como mbito espacial do projeto, no apenasse beneficiam com os seus resultados ou dispem-se a legitimar asua existncia, mas efetivamente organizam e realizam aes emnome do projeto.

    Sendo a campanha da CPT voltada aos trabalhadores em situao

    vulnervel ao trabalho anlogo escravido, nessa primeira categoria encontram-se

    os trabalhadores (inicialmente trabalhadores rurais, mas estendendo-se a outros

    trabalhadores, como por exemplo, da construo civil), e a famlia deles, que so

    beneficiados pelas aes de fiscalizao da campanha, tanto pela questo de

    resgate e indenizao financeira, quanto pelo trabalho de informao/preveno.

    Os legitimadores seriam a comunidade, associaes, sindicatos, conselhos,

    etc., que se beneficiam do combate ao TE por meio de aes e projetos sociais

    promovidos em prol disto, a exemplo do Escravo, nem Pensar da Reprter Brasi l,

    desenvolvido com lideranas comunitrias e grupos escolares, em Aailndia - MA,dentre outros.

    Na categoria dos geradores, pode-se pensar nos ncleos regionais da CPT,

    bem com as organizaes parceiras no desenvolvimento da campanha, como o

    CDVDH/CB (Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos de Aailndia/

    Carmen Bscaran), a ONG Reprter Brasil, grupos que no apenas so

    beneficiados, mas tambm se propem a contribuir efetivamente com o combate ao

    trabalho escravo.

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    21/74

    20

    Essa definio e o conhecimento mnimo dos pblicos a serem trabalhados

    so fatores imprescindveis em qualquer projeto de mobilizao. Segundo Varo

    (2013), o mapeamento dos pblicos de suma importncia, pois isto dar um

    subsdio de informaes necessrias para se definir e direcionar as aes

    comunicacionais do movimento mobilizador. Partindo deste cenrio, onde j se

    encontram mapeados os pblicos, Henriques (2007) defende que, o planejamento

    da comunicao deve, antes de tudo, seguir preceitos ticos, podendo ser

    considerado, a partir da, um dos principais instrumentos para auxiliar o movimento

    em seu projeto de transformao da realidade.

    2.2 Mobilizao social

    Segundo Henriques (2007), Mobilizao social se constitui num processo

    pelo qual se convoca pessoas ou grupos de pessoas a lutarem juntas, em consenso,

    em busca de se alcanar um objetivo comum a todas elas, seja para conquistar

    melhorias comunidade em que vivem, seja para mudar a realidade desta

    comunidade.

    Os movimentos sociais necessitam, por natureza, de intensa mobilizaopara atrair e manter pessoas engajadas nas causas que defendem. Nesse processo,

    a comunicao assume funes especficas, a fim de dinamizar a mobilizao e

    potencializar os movimentos, para que estes no se tornem simples sequncias de

    aes e reaes desarticuladas de pouca representatividade (HENRIQUES, 2007, p.

    20).

    Essas estratgias de mobilizao esto presentes na Campanha da CPT,

    que objetiva o engajamento de pessoas e entidades na preveno e no combate aotrabalho escravo atravs da sensibilizao de multiplicadores e parceiros. A esse

    respeito, Xavier Plassat, coordenador da Campanha da CPT, afirma em entrevista

    concedida durante o desenvolvimento desta pesquisa, em 2011, que so

    aproveitadas todas as oportunidades possveis de apario pblica da campanha

    (entrevistas, debates, prmios) para pautar a mdia, tanto nacional como

    internacional com bastante comunicao voltada para Europa e EUA, onde a CPT

    tem, segundo ele, parceiros eficazes, como: Free the Slaves, AntiSlavery

    International, CRS, Trocaire, Fastenopfer (ONGs e agncias de fomentos).

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    22/74

    21

    No processo de mobilizao de pessoas necessria uma comunicao

    estrategicamente planejada na estruturao de um projeto mobilizador, uma vez que

    as pessoas precisam se sentir parte do movimento e abraar verdadeiramente a sua

    causa, ou seja:

    Sendo a participao uma condio intrnseca e essencial para amobilizao, a principal funo da comunicao em um projeto demobilizao gerar e manter vnculos entre os movimentos e seus pblicos,por meio do reconhecimento da existncia e importncia de cada um e docompartilhamento de sentidos e valores (HENRIQUES, 2007, p. 20).

    Isto , no existe a participao popular quando as pessoas no se sentem

    parte do movimento, quando no se reconhecem nele e no se percebem capazes e

    responsveis de fazer a mudana acontecer ao seu redor. Isso o que Henriques(2007) define como corresponsabilidade, quando o pblico age por se sentir

    responsvel pelo sucesso do projeto, entendendo sua participao como essencial

    ao todo. Para tanto, o autor prope que, a comunicao deve ser planejada para

    estimular a participao destes pblicos, devendo estar orientada pelo sentimento

    de corresponsabilidade. Mas, alm disso, Braga; Henriques; Mafra (2004) ressaltam

    que, para que se efetive a participao, valores e vises semelhantes entre os

    participantes de um projeto so fundamentais. Ou seja, para que pessoas se

    mobilizem e tomem a deciso de se engajarem em algum movimento, preciso no

    s que essas elas tenham carncias e problemas em comum, mas que

    compartilhem valores e vises de mundo semelhantes.

    No caso da Campanha Nacional de Preveno e Combate ao Trabalho

    Escravo, mais do que alcanar os trabalhadores suscetveis a essa forma de

    trabalho (trabalho escravo), preveni-los de se submeter a essa condio, bem como

    resgatar aqueles que j caram nas armadilhas dessa prtica que, infelizmente

    recorrente, se faz necessrio tambm um trabalho de convencimento da sociedade,

    de forma geral, de que esta uma questo que a atinge diretamente, uma vez que,

    mesmo inconscientemente ou no, as pessoas acabam colaborando com tal

    prtica quando, por exemplo, consomem/utilizam um produto de uma

    empresa/organizao que se utiliza de mo-de-obra escrava. Do mesmo modo, o

    trabalhador muitas vezes no se reconhece como escravizado e, em muitos casos,

    naturaliza a condio de explorao.

    Sabe-se que obrigao dos poderes executivo, judicirio e legislativo,

    institurem em conjunto ou a partir de suas competncias, mecanismos de combate

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    23/74

    22

    e erradicao ao trabalho em condio anloga a de escravo, todavia tarefa

    tambm da sociedade discutir e refletir acerca de tal tema.

    2.3 Redes

    A Comisso Pastoral da Terra (CPT) faz parte de uma rede de denncia da

    explorao da mo de obra escrava, composta por vrias entidades que atuam em

    todo o pas no combate e preveno do trabalho escravo, a Comisso Nacional para

    a Erradicao do Trabalho Escravo (CONATRAE), rgo colegiado vinculado

    Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidncia da Repblica.

    Para se pensar as relaes entre as entidades que compe essa rede,recorreu-se a autores que conceituam e discutem a temtica, numa abordagem

    diferente da que comumente empregada nos estudos sobre a tecnologia da

    informao, mas sob a tica de autores ligados aos campos da Antropologia,

    Sociologia e Comunicao.

    Para Aguiar (2007), redes sociais so, antes de tudo, relaes entre

    pessoas, estejam elas interagindo em causa prpria, em defesa de outrem ou em

    nome de uma organizao, mediadas ou no por sistemas informatizados; somtodos de interao que sempre visam algum tipo de mudana concreta na vida

    das pessoas, no coletivo e/ou nas organizaes participantes. As redes sociais

    podem ser formais ou informais, ressaltando-se que:

    As interaes de indivduos em suas relaes cotidianas - familiares,comunitrias, em crculos de amizades, trabalho, estudo, militncia, etc. -caracterizam as redes sociais informais, que surgem espontaneamente, sobas demandas das subjetividades, das necessidades e das identidades. Masredes sociais tambm podem ser constitudas de forma intencional, comoindica o verbo to network (de difcil traduo para o portugus). Ou seja,

    podem ser fomentadas por indivduos ou grupos com poder de liderana, quearticulam pessoas em torno de interesses, projetos e/ou objetivos comuns(AGUIAR, 2007, p. 2-3).

    Pode-se afirmar que a rede de combate ao trabalho escravo, da qual a CPT

    faz parte, uma rede social formal, composta por entidades, grupos de pessoas,

    geralmente com a presena de lideranas, que trabalham visando articular e

    mobilizar mais pessoas para lutar pela causa. Quandt; Souza (2008) afirmam que

    recentemente os movimentos da sociedade civil na busca por solues para

    problemas sociais crnicos como fome, misria e violncia tm contribudo para uminteresse ainda maior nas redes sociais e suas propriedades. O que um fator

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    24/74

    23

    positivo para o enfrentamento de problemas muitas vezes negligenciados pelos

    gestores pblicos, fato que pode ser explicado por interesses pessoais ou de

    terceiros que poderiam ser afetados no caso de polticas combativas mais duras em

    relao, por exemplo, a prtica de escravido por grandes latifundirios. Um

    exemplo pontual disto foi a luta incessante da bancada ruralista do Congresso

    Nacional, que por uma dcada tentou barrar a PEC do Trabalho Escravo, enfim

    aprovada em 2014, mas ainda sob a tentativa de esvaziamento da emenda, por

    parte dessa bancada, que busca diminuir as situaes em que ela poderia ser

    aplicada.

    Para Arajo (2002), a compreenso de redes permite melhor compreenso

    da produo dos sentidos sociais e, em decorrncia, a prpria prtica social.Segundo ela, nas redes que so lanadas as questes sociais para debates e

    onde so travadas as disputas em busca de foras aliadas a fim de se reforar a luta

    por determinados objetivos, justificando-se que:

    Redes so espaos sociais e, como tais, so arena dos embates sociais ede lutas polticas. So espaos de articulao de campos e eixos de poder.Redes possibilitam tanto a reproduo quanto a transformao das relaesde poder. Os ajustes, as mediaes, as negociaes, as apropriaes, oprocesso poltico, enfim, feito ao nvel do territrio concreto, no nvel local.[...].

    Olhando para o objeto em anlise, percebe-se que a CPT age politicamente

    em diversos momentos na rede, inclusive na luta pela aprovao da PEC 438, e em

    diversas outras ocasies como mediadora da questo do trabalho escravo junto a

    organismos internacionais, como a Organizao Internacional do Trabalho (OIT),

    Organizao das Naes Unidas (ONU), por exemplo. O que , claramente, a

    convocao de poderes maiores em prol da causa.

    Quandt; Souza (2008) propem que, na anlise das redes sociais, mais

    importante que os atores so as relaes sociais estabelecidas entre eles. Ainda

    para os autores, o conceito de redes sociais passa pelo entendimento de estruturas

    dinmicas e complexas formadas por pessoas com valores e/ou objetivos em

    comum, interligadas de forma horizontal e predominantemente descentralizada,

    embora seja possvel identificar hierarquias e centralidades na formao das redes.

    Baseados nesta anlise e trazendo para o objeto em questo, pode-se

    identificar na rede de combate ao trabalho escravo, a CPT, com os seus agentes

    centrais distribudos pelo pas, repassando e propondo aes aos parceiros (demais

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    25/74

    24

    atores), como a Reprter Brasil e o CDVHD/CB, por exemplo, alm dos

    trabalhadores, pblico de interesse da entidade.

    2.4 Comunicao popular

    A comunicao popular nasce como uma forma alternativa de comunicao

    para os grupos minoritrios, que tm nela, o seu canal prprio de mobilizao. [...]

    representa uma forma alternativa de comunicao e tem sua origem nos

    movimentos populares dos anos de 1970 e 1980, no Brasil e na Amrica Latina

    como um todo. [...] no se caracteriza como um tipo qualquer de mdia, mas como

    um processo de comunicao que emerge da ao dos grupos populares. Essaao tem carter mobilizador coletivo na figura dos movimentos e organizaes

    populares, que perpassa e perpassada por canais prprios de comunicao

    (PERUZZO, 2006, p.1).

    Silva; Moura (2013) relatam que a comunicao popular tem um longo

    histrico de luta e busca pela democratizao da comunicao. As autoras resgatam

    que, no Brasil, a comunicao e os movimentos sociais ganham maior impulso

    durante o perodo ditatorial, em que a sociedade teve os principais direitos cessadospela forma de governo vigente. Segundo elas, neste momento, a comunicao

    popular surge como forma de resistncia fazendo contraponto censura e

    manipulao dos meios de comunicao, possuindo grande atuao; o que significa

    mudana do posicionamento da sociedade, passando a ser mais crtica no modo de

    se posicionar.

    A comunicao popular recebe outras denominaes, em diferentes

    momentos, mas o sentido poltico dos termos sempre o mesmo. [...] foi tambmdenominada de alternativa, participativa, horizontal, comunitria e dialgica,

    dependendo do lugar social e do tipo de prtica em questo. Porm, o sentido

    poltico o mesmo, ou seja, o fato de tratar-se de uma forma de expresso de

    segmentos excludos da populao, mas em processo de mobilizao visando

    atingir seus interesses e suprir necessidades de sobrevivncia e de participao

    poltica (PERUZZO, 2006, p. 2). A autora torna claro que desde o final do sculo 20,

    a comunicao popular ganhou termos sinnimos aqui no Brasil, passando a ser

    chamada sistematicamente de comunicao comunitria, dentre outras

    denominaes existentes. Ressalta ainda que, o uso indistinto dos termos, em

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    26/74

    25

    diferentes contextos e sua apropriao pela grande mdia, para designar produes

    prprias, por exemplo, requer a imerso na origem do termo de origem da

    comunicao popular. E se posiciona a respeito:

    prudente recorrer ao status original dessa modalidade comunicativa naAmrica Latina, bem como aos conceitos de comunidade, para acaracterizao mais adequada do processo. Historicamente o adjetivopopular denotou tratar-se de comunicao do povo, feita por ele e paraele, por meio de suas organizaes e movimentos emancipatrios visando transformao das estruturas opressivas e condies desumanas desobrevivncia. (PERUZZO, 2006, p. 2).

    Os meios de comunicao populares, por se constiturem como ferramentas

    comunicacionais do povo, feitas pelo povo, tornam-se uma alternativa acessvel e

    importante queles que no possuem voz nas grandes mdias e propiciam, comodefendem Silva; Moura (2012), a participao direta do cidado, que agora tem um

    aliado na luta pela transformao social da comunidade em seu entorno.

    Embora a comunicao popular seja antagnica comunicao massiva,

    com princpios e processos distintos, Peruzzo (1998) afirma que os dois processos

    comunicativos no se repelem, mas coexistem e se complementam e,

    oportunamente afirma:

    Na prtica, os meios de comunicao popular, apesar de sua importncia ede seu significado poltico, no chegam a colocar-se como forassuperadoras dos meios massivos. Os dois so complementares e noexcludentes. Os grandes veculos, por um lado, fazem-se necessrios, porexemplo, mas no conseguem suprir todas as necessidades em nvel decomunidade e de movimentos sociais organizados. (PERUZZO, 1998, p.130).

    Nas estratgias comunicacionais da CPT, percebe-se claramente o uso dos

    dois meios de comunicao; do primeiro (comunicao popular), nos produtos

    destinados aos trabalhadores, como so o caso da sanfoninha e dos demais

    produtos da Campanha em anlise, e do segundo (comunicao massiva), nadivulgao de aes e dados estatsticos referentes s denncias e combate ao

    trabalho escravo, como forma de chamar a ateno da opinio pblica ao problema.

    Em suma, como defende Peruzzo (2006) a comunicao popular se traduz

    na voz das periferias, classes subalternas, realizada num processo de luta de

    classes. E o que faz a comunicao ser popular sua insero num contexto

    alternativo, caracterizado por sua tendncia a romper a ordem do capital, integrar

    aquilo que o fragmenta. Isto a comunicao popular difere (pelo menos na teoria)dos grandes meios massivos patrocinados pelo capital. Ela, por sua vez, feita pelo

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    27/74

    26

    povo, e sua sobrevivncia (falando de recurso, tanto humano, quanto material)

    depende, no geral, do povo.

    3 A CPT NO COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO NO BRASIL

    A Comisso Pastoral da Terra (CPT) um rgo da Conferncia Nacional

    dos Bispos do Brasil (CNBB), vinculado Comisso Episcopal para o Servio da

    Caridade, da Justia e da Paz e compe o quadro de entidades da Comisso

    Nacional para a Erradicao do Trabalho Escravo (CONATRAE), sendo responsvel

    por receber e encaminhar denncias de trabalhadores, produzindo regularmente

    estatsticas sobre a dimenso do problema no pas.A CPT est inserida, de forma atuante, na rede de denncia da explorao

    da mo-de-obra escrava, composta por vrias entidades que atuam em todo o pas

    no combate e preveno ao trabalho escravo contemporneo, entendido aqui como

    todas as formas de explorao em que h imobilizao da mo-de-obra por meio da

    coao fsica e/ou moral, da restrio da capacidade de ir e vir dos subordinados e

    da limitao de sua liberdade de oferecer a outros seus servios (ESTERCI, 1994).

    A presena das ONGs - entendidas como assessoria e apoio aosmovimentos populares - nos movimentos sociais desde a dcada 70, tem crescido

    de forma notria nos ltimos anos, o que refletiu numa maior visibilidade deles. A

    esse respeito, descreve-se:

    [...] na virada dos anos 70/80, essas entidades voltam os seusinvestimentos para a atuao no campo dos movimentos sociais que entocrescem pelo pas (como o sindical urbano e rural, os de luta pela terra e osde moradores de reas perifricas das cidades), padro que passa apredominar largamente sobre a ao do tipo comunitrio localizado (que, noentanto, nunca ser de todo abandonada): tanto , que passam a se auto

    classificar como entidades a servio do Movimento Popular (LANDIM,1998, p. 41).

    Neste cenrio, esto inseridas as Organizaes No-Governamentais

    (ONGs) que buscam agir paralelamente ao Estado na busca de solues para esses

    problemas. Tais organizaes esto inseridas no chamado Terceiro Setor, que surge

    em decorrncia da impotncia do sistema e pela crescente conscientizao da

    sociedade civil, e se apresenta como forma alternativa de organizao para atender

    propsitos coletivos. Assim sendo, torna-se pertinente esclarecer:

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    28/74

    27

    O Terceiro Setor uma parcela da sociedade formada por um conjunto deorganizaes da sociedade civil, no-governamentais, de direitos privados esem fins lucrativos que atende propsitos pblicos margem do aparelhoformal do Estado. Justifica-se como terceiro porque no est na condiode primeiro - O Estado; to pouco representa o segundo integrado pela

    iniciativa privada (LIMA, 2004, p.98).

    Juridicamente, as ONGs so sociedades civis sem fins lucrativos e

    enquadram-se na legislao referente a esse tipo de organizao. Essas sociedades

    so formalmente reconhecidas pelo Cdigo Civil Brasileiro de 1916, enquanto

    pessoas jurdicas de direito privado sem fins econmicos. Compreendem, segundo o

    art.16, I - As sociedades civis, religiosas, pias, morais, cientficas ou literrias, as

    associaes de utilidade pblica e as fundaes. As ONGs, dessa forma, podero

    escolher o registro legal seja de sociedades civis (ou associaes, a lei usa as duasexpresses transitivamente), seja de fundaes - o que menos frequente

    (LANDIM,1998).

    A forte e crescente presena de entidades do Terceiro Setor em aes

    sociais pode ser explicada, pelo fato de a sociedade civil organizada enfrentar

    dificuldades por falta de novas definies metodolgicas em relao ao diagnstico

    e ao planejamento da comunicao. Uma viso a partir dos pblicos (e no dos

    instrumentos) parece ser extremamente til para posicionar estas questes sob umatica humanista e verdadeiramente interessada na participao ampla e democrtica

    (HENRIQUES, 2007, p.13).

    Tal preocupao pode ser observada em alguns produtos de comunicao

    da CPT, como por exemplo, na sanfoninha, que se utiliza do cotidiano e da

    linguagem do trabalhador rural a fim de conseguir passar a sua mensagem.

    A criao oficial da CPT aconteceu em 1975, durante a XIV Assembleia

    Geral da CNBB, que procurava estabelecer uma Comisso Pastoral que se

    posicionasse contra a explorao latifundiria e em favor dos posseiros nos conflitos

    do campo principalmente no eixo Centro Oeste - Norte. De acordo com o histrico

    da entidade, a CPT tem como objetivos centrais: a promoo da vida dos seres

    humanos e do planeta terra; a construo de prticas e valores no meio rural que

    criem novas relaes entre pessoas, famlias, comunidades e povos numa

    perspectiva de solidariedade; o protagonismo dos camponeses e dos trabalhadores;

    o enfrentamento ao modelo predador do ambiente e escravizador da vida de

    pessoas e comunidades; o fortalecimento do trabalho de base junto s comunidades

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    29/74

    28

    camponesas e as atingidas pelos grandes projetos, promovendo o protagonismo dos

    trabalhadores, sua organizao e articulao (CPT, 2010).

    A entidade tambm acompanha, apoia e estimula a defesa dos territrios

    das comunidades tradicionais como espaos de reproduo da vida e de relaes

    econmicas, religiosas, culturais, sociais e polticas solidrias; a articulao dos

    movimentos sociais do campo com os da cidade, atravs da participao em redes e

    fruns; mobilizao, apoios e respaldos aos camponeses e a suas organizaes, em

    todos os nveis da sociedade e da mdia, tambm no estrangeiro; alm da promoo

    da participao da sociedade nos projetos de lei de iniciativa popular, como no da

    reforma poltica e nas consultas democrticas atravs de campanhas, referendos e

    plebiscitos, dentre outros (CPT, 2010).

    3.1 A Campanha Nacional de Preveno e Combate ao Trabalho Escravo: De

    olho aberto para no virar escravo

    Desde a sua fundao, a Comisso Pastoral da Terra luta contra a

    permanncia do trabalho escravo no Brasil. A primeira denncia conhecida sobre

    conceito moderno de trabalho escravo de 1972, realizada por Dom PedroCasaldaliga, de acordo com o critrio dvida impagvel.

    Para intensificar ainda mais o trabalho de combate e preveno

    explorao da mo-de-obra escrava, a CPT lanou e coordena desde 1997 a

    Campanha Nacional de Preveno e Combate ao Trabalho Escravo: De olho aberto

    para no virar escravo. Segundo a entidade, a campanha foi uma experincia

    inovadora, realizada na Grande Regio Norte, visando articular estratgias de

    trabalho que prevenissem e combatessem o trabalho escravo nos Estados deMaranho, Tocantins, Par e Mato Grosso. O foco nessa regio se justifica, segundo

    a CPT, pela preferncia desses estados pelos aliciadores.

    Essa Campanha partia da observao - de novo confirmada pelos casos

    flagrados de 1997 para c no sul do Par - de que Maranho e Tocantins so

    regies preferenciais de aliciamento, fornecedores de mo de obra, para as

    empreitas realizadas no Par e Mato Grosso, em regies cada vez mais distantes

    (ex.: regio do alto Xingu) (CPT, 2010).

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    30/74

    29

    A campanha apoiada em material didtico, como de sensibilizao, voltado

    para os trabalhadores em situao vulnervel; de orientao para monitores da

    Campanha, alm de divulgao, para opinio pblica da sociedade em geral.

    De acordo com a CPT, a Campanha teve desdobramentos diferenciados

    conforme a regio envolvida, desde encontros de sensibilizao e primeiras

    orientaes, encontros de capacitao nas regies de incidncia de trabalho

    escravo, at acompanhamento de operaes de resgate e das pendncias que

    delas decorrem, como aes criminais e trabalhistas, orientao s vtimas, proteo

    a testemunhas e/ou vtimas.

    A referida campanha, segundo o seu coordenador, Xavier Plassat, teve

    incio formalmente em 1997, como resultado de um processo de discusso dasCPTs da Grande Regio Norte (PA, MA, TO), inicialmente provocado pela CPT do

    sul-Par, em relao necessidade de se articularem na preveno e combate ao

    trabalho escravo, de acordo com a posio de cada estado ao longo da rota do

    aliciamento e da escravizao (estados emissores e estados receptores de mo-de-

    obra). Porm, a atuao estratgica da CPT em relao ao trabalho escravo vem

    desde muitos anos antes, a saber:

    A primeira grande denncia foi em 1984, o caso da fazenda da Vale do RioCristalino, da Volkswagen, no Sul do Par. Os pees conseguiram escapara p da fazenda e foram parar em So Flix do Araguaia. Houvemobilizao e a ideia de flagrar os responsveis foi frustrada. Na poca, ogovernador do Para era Jader Barbalho. No se conseguiu fazer o flagrante,ento convocou-se a imprensa nacional e internacional e se fez a denncia.Havia indcios de que eram 600 trabalhadores. Mais tarde, uma matriapublicada na Alemanha afirmou que havia 800 trabalhadores escravizados(CPT, 2010).

    Segundo a CPT, a Campanha tem, desde o seu incio, como aes

    prioritrias, a denncia e divulgao de casos concretos a partir de relatos defugitivos colhidos principalmente no MT (Prelazia de So Flix do Araguaia) e no sul-

    Par (Conceio do Araguaia, Rio Maria, Marab), e, esporadicamente, no MA e

    TO, hoje no mais de forma espordica, visto a forte incidncia de casos nos dois

    estados; o caso emblemtico da Volkswagen em 1984; cobrana das autoridades do

    Executivo, do Legislativo e do Judicirio, por meio de dossis, manifestaes

    pblicas, audincias; carta de Dom Pedro (1971); denncias aos Ministros da

    Justia, do Trabalho e da Reforma Agrria (caso STR Porto Nacional, 1987);

    formao do Frum nacional contra a Violncia no Campo (1991); Seminrio

    nacional TE na Cmara dos deputados (1994): utilizao das mediaes e espaos

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    31/74

    30

    internacionais disponveis para pressionar, contornar e vencer a omisso das

    autoridades brasileiras (OIT, OEA, ONU): denncia na ONU, OIT e Parlamento

    europeu (1993 via Marcelo Lavnre, presidente da OAB); caso Jos Pereira na

    CIDH da OEA (1994); caso Brasil Verde (1998) e o planejamento e realizao de

    aes de divulgao e sensibilizao da opinio pblica. Sobre esta ltima ao da

    Campanha, Plassat (2011) relata:

    Em 2002 iniciamos com Binka Le Breton a preparao do livro VidasRoubadas (Loyola, 2003), com lanamentos realizados em 10 capitais, epublicao de verses inglesa, italiana, francesa; em 2005/06 realizamosem mutiro o vdeo Aprisionados por Promessas (co-produo CPT,Witness e Cejil); multiplicamos seminrios e eventos, inseres na mdia,com passagens no Fantstico, Globo Reprter, Programa do J, entre

    outros.

    Outra grande ao e, talvez a mais substancial da Campanha, a

    construo e articulao de uma rede de entidades engajadas na preveno e no

    combate ao TE e capacitao de multiplicadores, como a formao do Frum

    Nacional contra a Violncia no Campo (1991); a construo de parcerias com o

    CDVDH/CB (1997), na realizao das duas Conferncias Inter-participativas de

    Aailndia em 2002 e 2007; com a ONG Reprter Brasil, na produo de

    informaes e dados, e na realizao de programas preventivos, como o E scravo,nem Pensar e capacitao de agentes associativos, professores, agentes de

    pastoral, lideranas sindicais nos municpios mais atingidos pelo problema

    (PLASSAT, 2011).

    3.2 Estratgias de Comunicao da Campanha: a Sanfoninha

    A Campanha De olho aberto para no virar escravo no possui um planode comunicao formalmente estruturado, conforme comenta Plassat (2011).

    No h uma real estratgia de comunicao formalizada, mas existem simvrias aes, bem como produtos de comunicao, planejadas nessesentido, como por exemplo, instrumentos de divulgao (sanfoninha, cartaz,calendrio, banners) e logomarca (garoto-propaganda, lema De Olhoaberto para no virar escravo); uma poltica de ampla disponibilizao dosdados disponveis (desde que no considerados confidenciais ou de risco);elaborao de notas pblicas de acordo com as necessidades conjunturais;aproveitamento das oportunidades de apario pblica da campanha(entrevistas, debates, prmios) para pautar a mdia, tanto nacional comointernacional com bastante comunicao voltada para Europa e EUA, ondeh parceiros eficazes, como a Free the Slaves, AntiSlavery International,CRS, Trocaire, Fastenopfer, entre outras.

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    32/74

    31

    Um dos produtos da campanha a chamada sanfoninha, um material

    impresso dobrado em vrias partes, que cabe no bolso e que conta, por intermdio

    de uma histria em quadrinhos (HQ), uma histria bem conhecida dentre os

    trabalhadores escravizados: um agenciador que convida um grupo de trabalhadores

    para uma empreitada prometendo verbalmente algumas condies de trabalho, mas,

    que chegando ao local, no era nada daquilo que prometia. Situaes de maus

    tratos, desrespeito dignidade humana, condies insalubres de trabalho

    (alojamento, alimentao) e demais so tratadas no HQ que, ao final, indica a

    denncia como a melhor soluo: Diga no escravido. Obrigar algum a

    trabalhar por dvida ou mediante fraude ou violncia ou em condies degradantes

    crime. Impedir sua sada crime. Denuncie! (CPT, 2011).O material ainda possui, nas pginas posteriores, outras informaes

    referentes a contrato de trabalho, acordo coletivo, carteira assinada, alm de

    telefones e endereos teis de entidades que compem a rede de denncia,

    distribudas pelo pas. (Figura 1)

    A escolha da sanfoninha como principal forma de divulgao da campanha

    se deve, em primeiro plano facilidade, tanto na leitura, devido ser uma linguagem

    mais dinmica e ldica, como no caso dos quadrinhos que possibilitam maisdescontrao no acesso a informao, e na praticidade, pelo seu formato o que

    facilita no processo de distribuio e manuseio do material.

    A sanfoninha destinada ao trabalhador em situao de risco, sendo que

    para chegar a este trabalhador, depende de equipes, sindicatos, associaes

    parceiras e dos prprios trabalhadores que, muitas vezes, pedem para seus colegas.

    Todas as equipes da Campanha recebem uma quantidade suficiente para seu

    trabalho e de seus parceiros regionais e a distribuio feita de mo em mo,mediante uma conversa de quem entrega. Alguns fiscais distribuem aos

    trabalhadores resgatados no ato da fiscalizao.

    A comunicao representa um mecanismo de suma importncia para o

    desenvolvimento de aes coletivas e de carter social, portanto, as estratgias

    estabelecidas nesse mbito consistem numa forma de fortalecer esses processos.

    O fazer comunicativo, mais do que informar, toma por tarefa criar uma interao

    prpria entre estes projetos e seus pblicos, atravs do compartilhamento de

    sentidos e valores (HENRIQUES, 2007, p. 34). Isto , no basta apenas repassar o

    material informativo aos trabalhadores, mas necessrio que este material, bem

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    33/74

    32

    como a maneira como ele chega e apresentado ao trabalhador, seja capaz de

    produzir sentido para ele, que proporcione uma identificao do trabalhador com o

    contedo do material.

    A CPT utiliza ainda outras formas de veiculao das suas atividades, como

    cartazes, folders, banners, logomarcas, garoto-propaganda, e o lema De Olho

    aberto para no virar escravo com a finalidade de diversificar e maximizar o poder

    de alcance da campanha, que busca levar informao aos trabalhadores que sofrem

    com o trabalho forado e que no conhecem a prpria realidade e os direitos

    trabalhistas que lhes assistem. A entidade tem tambm como estratgia a

    disponibilizao do seu banco de dados, exceto no caso de documentos

    confidenciais ou que representam algum tipo de risco, voltada para a formao deopinio mais especializada, como no caso de cientistas e pesquisadores das

    universidades,

    Em cada regio, as aes da Campanha se do de formas diversas. [...] a

    Campanha tem desdobramentos diferenciados conforme a regio envolvida desde

    encontros de sensibilizao e primeiras orientaes, encontros de capacitao nas

    regies de incidncia de trabalho escravo at acompanhamento de operaes de

    resgate e das pendncias que delas decorrem (aes criminais e trabalhistas,orientao s vtimas, proteo a testemunhas e/ou vtimas) (CPT, 2010).

    3.3 Abordagem e organizao da CPT

    Sobre a forma de organizao do banco de dados de denncia e casos de

    trabalho escravo, afirma-se que os dados referentes a denncias so

    sistematicamente levantados desde a primeira denncia recebida, mas que s em1995, com a criao do Grupo Mvel, que passou a existir um acompanhamento

    sistemtico dos dados nacionais. Afirma-se tambm que a partir de 2007, as

    denncias recebidas pela equipe da Campanha passaram a ser padronizadas,

    considerando-se que:

    [...] toda equipe da Campanha, ao receber denncia, obedece a uma rotinadefinida em comum: contedo e estrutura-padronizada (a partir de 2007,conforme modelo definido junto com a SIT/MTE), envio imediato para a SITem Braslia e para a Coordenao da Campanha, que monitora asdenncias em tempo real (PLASSAT, 2011).

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    34/74

    33

    Segundo Plassat (2011), embora as primeiras referncias de denncias

    datarem desde a dcada de 70, somente com as fiscalizaes realizadas pelo Grupo

    Mvel, a partir de 1995, que as especulaes sobre possveis casos de trabalho

    escravo do lugar a registros legais de imposio de trabalho forado por meio de

    autos de fiscalizao e da coleta de provas que qualificam a situao anloga de

    escravo previstas no Cdigo Penal. Sobre o banco de dados, afirma que possui uma

    configurao muito simples objetivando facilitar e agilizar seu funcionamento,

    identificando-se [...] uma planilha Excel com umas 25 colunas identificando para

    cada caso, as caractersticas essenciais que interessam para o monitoramento:

    data, que fazenda, que proprietrio, que gato, onde, quantos trabalhadores, grau de

    gravidade (1, 2, 3), data de fiscalizao e por quem, quantos resgatados, valor pago,atividade ou servio desenvolvido.

    O processamento dos casos registrados possvel graas a algumas

    frmulas instaladas na planilha, que permitem uma anlise consolidada do ano (e

    dos vrios anos, acumulados desde 2000) e constantemente atualizada por fonte,

    status da fiscalizao, Estado, municpio, atividade e grande regio. A Campanha

    vem agregando aos poucos mais e mais equipes da CPT, tanto pela crescente

    capacidade de interveno que adquire em funo da captao de maiores recursose da notoriedade, quanto pelo descobrimento do trabalho escravo em novas reas

    do pas (PLASSAT, 2011).

    Em 2003, em funo das campanhas contra o trabalho escravo empreendido

    pela prpria CPT e da presso imposta pelo Comit dos Expertos da OIT

    (Organizao Internacional do Trabalho), pela Comisso interamericana da OEA

    (Organizao dos Estados Americanos) e sob cobranas da Comisso Especial do

    Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), se estabelece umPlano Nacional de Erradicao e a denncia ao trabalho escravo ganha consistncia

    e se converte numa luta pelo Brasil afora, que faz com que o carter naturalizado ou

    mesmo cultural imposto aos indivduos escravizados, enquanto condio de

    tratamento desumano e degradante, tanto para sociedade como para eles prprios,

    pudesse ser profundamente revisto. Em 2003, aumentou consideravelmente o

    nmero de reportagens e discursos oficiais sobre o problema no pas e, por parte do

    governo, expresses tais como trabalho forado ou semiescravo, foram substitudas

    simplesmente por trabalho escravo (REZENDE, 2003).

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    35/74

    34

    O resultado dessa nova abordagem o incio de um processo que se reflete

    na libertao de um grande nmero de trabalhadores em situao de escravido.

    Graas s evidncias adquiridas por intermdio da fiscalizao, a condio anloga

    de trabalho escravo tomou forma mediante lei aprovada em dezembro de 2003, ao

    estabelecer formalmente as figuras que definem essa condio: negao da

    liberdade do trabalhador (o trabalho forado) e violao da sua dignidade (o trabalho

    degradante). Com essa conquista no campo judicial esses critrios passam a

    configurar no arcabouo legal, isto , est tipificado como crime e descrito no artigo

    149 do Cdigo Penal Brasileiro - CPB.

    Dentro da estratgia organizacional da rede de combate ao trabalho

    escravo, existe uma relao de nomes designada como lista suja. Trata -se doCadastro de Empregadores da Portaria Interministerial, regulado pela Portaria

    02/2011, do Ministrio do Trabalho e Emprego (MTE) e Secretaria de Direitos

    Humanos da Presidncia da Repblica (SDH/PR), criado pelo Governo Federal, em

    novembro de 2003, com o objetivo de dar transparncia s aes do poder pblico

    no combate ao trabalho escravo. A relao traz os empregadores flagrados com

    esse tipo de mo de obra e que tiveram oportunidade de se defender em primeira e

    segunda instncia administrativa, antes de ser confirmado o conjunto de autuaesque configuraram condies anlogas s de escravo (ONG REPRTER BRASIL,

    2005).

    A lista suja contribui para que as empresas signatrias do Pacto Nacional

    para a Erradicao do Trabalho Escravo verifiquem, por meio de consulta, se

    determinada propriedade est na relao e, assim, exclurem esta da lista de

    fornecedores. Segundo a ONG Reprter Brasil (2005) at o Pacto Nacional ser

    criado, o sistema de combate ao trabalho escravo no havia envolvido o setorempresarial. A ONG afirma que os estudos de cadeia produtiva e o Pacto Nacional

    tornaram possvel o combate escravido atravs do seu vis comercial. E que,

    com eles, a sociedade pode atingir quem lucra restringindo a liberdade de outros. A

    incluso na lista s possvel aps o esgotamento de todos os recursos contra a

    prpria fiscalizao e o prazo de permanncia na lista de no mnimo dois anos e a

    sada aps esse prazo s efetivada no caso do cumprimento de todas as

    obrigaes ligadas s infraes anteriores e seno for atestada reincidncia. A lista

    atualizada semestralmente pelo Ministrio do Trabalho e do Emprego (MTE),

    podendo haver a excluso e/ou incluso de novos nomes. Na ltima atualizao,

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    36/74

    35

    divulgada em julho do corrente ano, a listagem sofreu alteraes, com 91 novos

    nomes includos e 48, excludos, entre pessoas jurdicas e fsicas, ficando na lista

    suja, exatos 609 nomes (VICENTE, 2014).

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    37/74

    36

    4 ANLISE DAS ESTRATGIAS COMUNICACIONAIS DA CAMPANHA DA CPT

    Como j visto anteriormente, a Campanha Nacional de Preveno e

    Combate ao Trabalho Escravo De olho aberto para no virar escravo foi criada e

    coordenada pela CPT desde 1997 e, tem como propsito, segundo Plassat (2011), a

    construo e a articulao, a partir de uma grande mobilizao e sensibilizao de

    multiplicadores e parceiros, de uma rede de entidades engajadas na preveno e no

    combate ao trabalho escravo.

    A campanha da CPT, assim como a maioria das campanhas sociais, busca

    fazer um trabalho de educao. Como determina a Constituio Brasileira de 1988,

    em seu artigo 205, a educao direito de todos e dever do Estado e da famlia,mas esta dever ser promovida e incentivada com a colaborao da sociedade,

    visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exerccio da

    cidadania e sua qualificao para o trabalho. Neste cenrio, visvel a grande

    participao das Organizaes No governamentais (ONGs), e um exemplo a CPT

    que desde a sua origem, em 1975, tem sido uma defensora das causas sociais.

    A Campanha se prope educar os trabalhadores vulnerveis a condies

    anlogas de escravido, por meio das suas aes, fornecendo esclarecimentos arespeito do trabalho decente, e das formas de superexplorao do trabalho,

    incentivando a realizao de denncias, prevenindo-os contra os riscos que possam

    vir a ameaar esses trabalhadores e suas famlias. Tambm procura fornecer dados

    referentes a essa prtica no pas, bem como participando de articulaes em prol de

    polticas sociais que solucionem problemas base do trabalho escravo e que resultem

    na elaborao de polticas pblicas para a reinsero social de trabalhadores

    resgatados dessa situao, visto que apenas resgatar o trabalhador da condio deescravo e no lhe oferecer oportunidades de trabalho (de formao, capacitao)

    no soluciona o problema. O trabalhador resgatado muitas vezes acaba se

    submetendo novamente situao de onde foi retirado.

    Vale ressaltar que a Campanha no se restringe a um pblico especfico (os

    trabalhadores vulnerveis), mas busca atingir tambm a sociedade, de modo geral,

    que, direta ou indiretamente afetada com esse problema e, de certa forma

    tambm corresponsvel por ele. Assim, percebe-se que os princpios da Campanha

    esto voltados para um trabalho educativo, que para alm de prevenir, consiga, ou

    pelo menos busque modificar disposies culturais, atitudes, educar sujeitos sociais

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    38/74

    37

    envolvidos direta ou indiretamente com a questo do trabalho escravo, de forma a

    criar uma viso coerente a respeito desta problemtica, sem reduzir esses

    trabalhadores a vtimas, mas compreender que o trabalho escravo ainda existe,

    recorrente e que a mobilizao e participao de toda a sociedade fundamental

    para o extermnio desta prtica.

    Para tanto, a CPT conta com aes pontuais como oficinas de formao de

    agentes para o trabalho de preveno e combate a essa prtica aproveitamento dos

    espaos pblicos, como eventos e da mdia para plublicizao do problema e,

    consequentemente chamar a opinio pblica para debater o tema. Percebe-se aqui,

    a importncia de um planejamento, que permita a tomada de posies a respeito

    dessas aes e estratgias que motivem e integrem os diversos organismos sociaisem prol dessa causa (combate ao trabalho escravo), como defende Henriques

    (2007).

    Para o referido autor, essa integrao se d atravs da criao, da

    manuteno e do fortalecimento dos vnculos de cada pblico com o projeto

    institudo. Talvez a ausncia de uma ou mais estratgias da CPT nesse sentido, de

    integrar, de forma mais consistente os diversos setores sociais luta, seja um dos

    pontos fracos da Campanha.

    4.1 Produtos e aes da Campanha da CPT

    A Campanha da CPT no possui, segundo o coordenador Xavier Plassat,

    um planejamento estratgico formalizado das suas aes. Entretanto, foram

    identificados durante a pesquisa alguns produtos de comunicao confeccionados

    estrategicamente para a preveno da explorao da mo de obra escrava junto aostrabalhadores. Mostra-se abaixo, os principais produtos da campanha:

    Figura 2 - Sanfoninha da CPT/verso 2011.

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    39/74

    38

    Fonte: CPT Nacional, 2011.

    A sanfoninha, como j descrita anteriormente, um material impresso

    dobrado em vrias partes, que atravs de uma histria em quadrinhos (HQ),

    descreve situaes comuns entre os trabalhadores escravizados, e os incentiva a

    denunciar o trabalho escravo, como tambm prevenir outros trabalhadores de se

    submeterem ao trabalho em situao anloga escravido.

    Constata-se aqui, a compreenso da CPT de que as estratgiascomunicacionais da Campanha precisam atuar no campo da dialogicidade, se

    apropriando do contexto sociocultural do seu interlocutor (o trabalhador), sem

    invaso cultural, sem imposio de valores desconhecidos por eles, por

    compreender que a comunicao adequada mobilizao social , antes de tudo,

    dialgica, libertadora e educativa (HENRIQUES, 2007, p. 25).

    De acordo com Plassat (2011), a primeira verso da sanfoninha foi

    produzida no ano de 1998. Desde ento ela reproduzida e atualizada a cada ano.

    O material, segundo ele, foi uma criao coletiva, que nasceu das discusses da

    Coordenao da Campanha acerca da necessidade de um instrumento simples,

    com informaes bsicas, destinado a um trabalhador em situao vulnervel,

    geralmente analfabeto ou com baixo grau de instruo, sendo esta a principal

    justificativa para o uso da histria em quadrinhos, permitindo que o trabalhador

    tenha condies de se identificar, mesmo ser conseguir ler, como este trabalhador

    iludido e escravizado.

    Plassat (2011) explica tambm que, o formato da safoninha foi inspirado em

    um material publicitrio, com formato de carto telefnico, que trazia um espelho na

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    40/74

    39

    capa e informaes na parte interna. [...] trazia at 2009, um calendrio do ano no

    lugar do espelho, mas que para evitar o vencimento antecipado da edio, o espelho

    foi substitudo por uma mensagem e um desenho.

    Ressalta-se aqui, que a comunicao no se faz necessariamente com texto

    escrito; o uso de um desenho em um material destinado a um pblico com grande

    incidncia de analfabetismo (trabalhadores rurais) agrega muito a ele, visto que

    capaz de produzir sentidos para os interlocutores, principalmente quando se

    considera o contexto sociocultural em que estes esto inseridos (FRANA, 2002).

    Sobre a forma como a sanfoninha distribuda aos trabalhadores, explica-se

    que esse trabalho feito por membros da CPT, sindicatos, associaes parceiras,

    por alguns fiscais do trabalho e dos prprios trabalhadores que, muitas vezes pedempara seus colegas. Segundo ele, todas as equipes da Campanha recebem uma

    quantidade suficiente para seu trabalho e de seus parceiros regionais; essa

    distribuio feita de mo em mo, mediante uma conversa de quem entrega. Para

    a obteno desse e outros tipos de informao referentes Campanha, utilizou-se

    como metodologia a pesquisa qualitativa, por meio da qual, buscou-se verificar,

    dentre os membros da CPT e organizadores da Campanha, a percepo destes

    sobre as estratgias e os produtos de comunicao utilizados pela Campanha notrabalho de preveno e combate ao trabalho escravo (PLASSAT, 2011).

    A pesquisa utilizou como tcnica para coleta de dados um questionrio

    qualitativo, cuja estruturao foi constituda por: nome, ocupao, funo

    desempenhada na Campanha da CPT e seis questes subjetivas, aplicado a treze

    (13) dos 18 participantes do Encontro de Avaliao e Planejamento da Campanha,

    realizado em agosto de 2013, em Araguana (TO), entre agentes e parceiros da

    CPT. (APNDICE A)A pesquisa tambm compunha o plano de trabalho do estudante, que na

    ocasio era bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciao Cientfica

    (PIBIC), numa parceria entre o Projeto de Pesquisa Representaes do trabalhador

    escravo (e acerca dele) em instncias miditicas e estratgias de comunicao em

    redes de denncia no Maranho e o Projeto de Pesquisa Estudo da organizao e

    funcionamento da rede de combate ao trabalho escravo no maranho.

    A partir da tabulao dos dados foi possvel verificar que a Campanha tem

    conseguido um alto grau de satisfao entre os membros da CPT, e que as suas

    estratgias de comunicao tambm so bem vistas, embora, segundo a maioria

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    41/74

    40

    dos entrevistados, precisam ser aperfeioadas. Percebe-se que a Campanha possui

    como estratgia de distribuio do material, a comunicao dirigida. Para 46% dos

    entrevistados, o material da Campanha (as estratgias de comunicao)

    distribudo diretamente ao trabalhador, corpo a corpo, o que permite a explicao e

    discusso acerca do contedo. Os outros 54% afirmaram que distribuem o material

    em palestras e eventos sobre o tema, o que permite afirmar que o material

    repassado diretamente aos agentes colaboradores da Campanha, sejam eles

    parceiros ou mesmo, os demais membros da sociedade civil, dispostos a contribuir

    com a causa. (Grfico 1)

    Grfico 1 - Formas de distribuio das estratgias de comunicao da Campanha da CPT.

    Henriques (2007) afirma que a comunicao dirigida, a interao face-a-face

    retoma os contextos interativos de co-presena, promovendo uma maior

    proximidade entre os indivduos e possibilitando aes mais coesas, isto , a

    presena fsica do agente, a sua proximidade e credibilidade com o interlocutor traz

    mais consistncia ao material que dele recebido.

    Percebe-se tambm que, diferentes atores da rede (equipes da CPT,

    sindicatos, associaes parceiras, fiscais do trabalho, os prprios trabalhadores) so

    envolvidos nesse trabalho. Como defendem Quandt; Sousa (2008) [...] estar

    localizado em um ponto estratgico da rede muitas vezes mais importante que

    estar localizado em algum determinado nvel hierrquico, mesmo que superior. Isto

    , a proximidade e o grau de credibilidade de quem distribui o material com o

    trabalhador so fatores importantes para a sua aceitao. O que vai ao encontro

    com o pensamento de Quandt; Sousa (2008) quando afirmam que esses atores que

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    42/74

    41

    atuam como ns conectores entre diferentes subgrupos da rede ou entre redes so

    pontos de influncia sobre a estrutura como um todo, seja no papel de agentes de

    transferncia de informao, seja como pontos crticos de falha.

    Sobre a tiragem da sanfoninha, Plassat (2011) relata que entre os anos de

    1999 e 2005, a sanfoninha tinha uma tiragem anual de 25 a 40.000 exemplares e,

    que em 2011, a mdia de tiragem j era de 100.000. Uma constatao de que a

    sanfoninha tem tido uma boa recepo do pblico de interesse, se demonstrando

    como uma boa estratgia da Campanha. O material impresso numa grfica em

    Curitiba-PR e ultimamente tem sido custeado com recursos oriundos de Termo de

    Ajuste de Conduta (TAC), mas j houve cooperao por parte da Secretaria Especial

    dos Direitos Humanos (SEDH) e de instituies religiosas.A sanfoninha um dos produtos da campanha com excelente aceitao do

    pblico. o tipo de artigo que no vai para o lixo ou no abandonado no cho;

    pela forma de distribuio personalizada e pelo contedo e utilidade evidente, e

    tambm o aspecto agradvel e o material resistente, tem longa vida no bolso do

    trabalhador. Muitos denunciantes se referem explicitamente sanfoninha para

    explicar como chegaram at nosso escritrio ou nosso telefone (PLASSAT, 2011).

    Na pesquisa qualitativa, a sanfoninha se destaca como o material educativomais utilizado e tambm considerado o mais eficiente na opinio dos 13

    entrevistados (o encontro teve a participao de 18 membros), por utilizar uma

    linguagem coloquial, vrias informaes teis sobre o que pode ser considerado

    trabalho escravo, telefones e endereos para denncia, alm de ser fcil de

    manusear e guardar.

    Quando questionados de forma aberta (sem listar estratgias e/ou produtos),

    sobre as estratgias de comunicao da Campanha utilizadas em suas reas deatuao, a sanfoninha foi citada por 100% dos entrevistados, conforme indica o

    grfico 2.

  • 7/24/2019 Monografia - Estratgias de Comunicao da Campanha Nacional de Preveno e Combate Ao Trabalho Escravo

    43/74

    42

    Grfico 2 - Tipos de estratgias de comunicao utilizadas na Campanha da

    CPT.

    A sanfoninha foi citada tambm pela maioria (43% dos entrevistados) comosendo a estratgia de comunicao mais eficiente da Campanha junto aos

    trabalhadores. (Grfico 3)

    Grfico 3 - Estratgias de comunicao indicada como mais eficiente na

    Campanha da CPT.

    Vale ressaltar que, 22% dos entrevistados acreditam que todas asestratgias da Campanha so eficientes, o que representa que mais membros, alm

    dos 43% concor