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IDEIAS E FACTOS Joaquim Aguiar Movimentos internacionais de capitais — os investimentos directos dos Estados Unidos no mundo O investimento externo constitui um dos instrumentos funda- mentais de intervenção económica, de órbita privada, no campo internacional, aquele que mais facilmente transporta a lógica de um sistema de uma zona económica para outra. Para além disso, a actividade de investimento, dispersa por espaços que transcen- dem as limitações nacionais, está na base do significado interna- cionalista das relações económicas e, consequentemente, é um dado indispensável para a compreensão da estrutura económica mundial. Simultaneamente, o investimento externo define o estabeleci- mento de uma relação muito concreta entre as várias estruturas económicas que permite, por sua vez, uma subtil estrutura de dominação que parte das economias originárias dos capitais e incide sobre as economias receptoras. Como caso particular desta relação, pode-se afirmar que o investimento externo representa o processo mais imediato de controle das sub-estruturas económicas (isto é, das estruturas económicas nacionais) dentro de uma ló- gica capitalista, pois define a possibilidade objectiva de exploração desses mercados. Este quadro global, que relaciona um instrumento de inter- venção económica, de índole privada, com toda uma complexa política de controle e equilíbrios internacionais, apresenta, ainda, duas importantes particularidades: os fluxos de investimento têm repercussões profundas nos equilíbrios económicos, internos e ex- ternos, das sub-estruturas nacionais, especialmente através das influências que exercem sobre as balanças de pagamentos, o que significa que as zonas receptoras se encontram numa situação de forte dependência das zonas originárias (é uma estrutura de 141

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IDEIAS E FACTOS

JoaquimAguiar

Movimentos internacionaisde capitais

— os investimentos directos dosEstados Unidos no mundo

O investimento externo constitui um dos instrumentos funda-mentais de intervenção económica, de órbita privada, no campointernacional, aquele que mais facilmente transporta a lógica deum sistema de uma zona económica para outra. Para além disso,a actividade de investimento, dispersa por espaços que transcen-dem as limitações nacionais, está na base do significado interna-cionalista das relações económicas e, consequentemente, é um dadoindispensável para a compreensão da estrutura económica mundial.

Simultaneamente, o investimento externo define o estabeleci-mento de uma relação muito concreta entre as várias estruturaseconómicas que permite, por sua vez, uma subtil estrutura dedominação que parte das economias originárias dos capitais eincide sobre as economias receptoras. Como caso particular destarelação, pode-se afirmar que o investimento externo representa oprocesso mais imediato de controle das sub-estruturas económicas(isto é, das estruturas económicas nacionais) dentro de uma ló-gica capitalista, pois define a possibilidade objectiva de exploraçãodesses mercados.

Este quadro global, que relaciona um instrumento de inter-venção económica, de índole privada, com toda uma complexapolítica de controle e equilíbrios internacionais, apresenta, ainda,duas importantes particularidades: os fluxos de investimento têmrepercussões profundas nos equilíbrios económicos, internos e ex-ternos, das sub-estruturas nacionais, especialmente através dasinfluências que exercem sobre as balanças de pagamentos, o quesignifica que as zonas receptoras se encontram numa situaçãode forte dependência das zonas originárias (é uma estrutura de

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dominação financeira, mas que se repercute, de uma forma muitoclara, no estabelecimento de políticas de relações económicas in-ternacionais por parte da zona receptora, condicionados quer pelovalor quer pela utilização desses investimentos); a distribuição dosinvestimentos por sectores de actividade e, especialmente, porzonas geográficas, condiciona, de uma maneira fundamental, odestino económico de vastos espaços económicos, determinandoas possibilidades imediatas de aproveitamento das potencialidadeseconómicas aí existentes (estrutura de dominação económica to-tal) , facto tanto mais grave quanto menos progressos se fazem nosentido de definir sistemas de investimentos unilateralizados(ajuda) ou de processos de controle objectivos dos graus dedominação.

É fácil ver, portanto, que a análise dos fluxos de investi-mentos internacionais envolve a consideração de algumas dasgrandes questões históricas da modernidade, se não directamente,pelo menos de uma forma mediatisada: as dualidades desenvolvi-mento— sub-desenvolvimento, estruturas dominantes—, estrutu-ras dominadas, estruturas planetárias — estruturas nacionais, ló-gica quantitativa — lógica qualitativa.

No entanto, a validade destas relações teóricas aqui apontadassó poderá ser estabelecida quando se dispuser de uma informaçãode base muito detalhada sobre a medida destes fluxos monetários.Neste sentido, a publicação em 1969 de um estudo francês sobreeste tema, constitui um passo importante na clarificação dessasrelações.

A publicação intitula-se «Les investissements directs desEtats-Unis dans le Monde», com o subtítulo «évolution recente etperspectives pour 1975». Este estudo foi coordenado por D. deLaubier, do «Groupe de Prospectives sur les Echanges Internatio-naux» e é publicado por «La Documentation Française», n.° 20,1969. O plano de estudos desenvolve-se em torno de uma Introdu-ção, onde se define o objecto de análise e se fazem algumas consi-derações prévias, e de três partes: na primeira analisa-se a evolu-ção do conjunto dos investimentos directos dos U. S. A. de 1955a 1966, subdividida numa análise por sectores industriais e noutrapor regiões geográficas; a segunda parte restringe esta análise aoestudo das indústrias transformadoras pois é nesse sector que secentralizam os investimentos, externos e directos, americanos;finalmente, a terceira parte procura definir as linhas de evoluçãooestes valores até 1975, tendo como base os dados recolhidos até1966.

A informação que esta publicação nos traz, embora restritaaos investimentos a longo prazo, de origem privada e directos (ouseja, aplicada em filiais das empresas americanas), constitui umpasso importante para ultrapassar o nível de generalidades teó-ricas que, por vezes, nos afastam da caracterização objectiva do

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Movimentos de capitais privados ã longo prazo — 19<>5

C.E.E.

(milhões de dólares)

OutrosPaíses daEuropa Oc.

135

— 55

955

(265)

35

400

125

1 860

Japão

5(0

15

45

30

20

10

110

230

AméricaLatina

70

10

20

100

Anzas

10

30

20

310

10

10

10

120

Restodo Mundo

90

170

10

20

290

Total

600

1250

2 565

2 000

130

465

72)0

965

8 595

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Variação percentual dos movimentos de capitais privados entre 1960 e 1965

NT.° 3

DE

ses da Eu-dental

/atina

undo

USA

1101,6

48,0

30,6

100,0

13,3

100,0 0 )

3,3

48,4

Canadá

100,0

— 33,4

+

+

19,0

C.E.E.

50,0

—50,0

(109,4)

90,9

— 44,5

300,0 í1)

— 76,2

21.6

OutrosPaíses daEuropa Oc.

— 40,0

154,7

(—17,2)

— 68,2

300,»0

— 35,9

32,4

Japão

0

+

125,0

200,0

0

+

144,4

93,1

AmpricaLatina

— 30,0

+

— 88,9

-64,3

Anzas

4-

+

— 0,50

+

-83,4

0

Restodo Mundo

— 72,3

112,5

+

+

(1)33,3

- - 40,2

— 2-9

35,9

•62,3

26,6

116,7

— 10,6

620,0

— 32,0

2,8,4

iriação verificada de 1962 a 1965.

— Os sinais + e — significam Que um dos termos da comparação era nulo.

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estas limitações, os resultados atingidos serão elucidativos de ten-dências bem definidas.

Zonas atractivas e repulsivas: as zonas que apresentam fluxosde entrada negativos são os USA (-2,9%), a América Latina(-10,6%) e o Resto do Mundo (-32,0%). O valor determinadopara os USA terá uma possível explicação no facto de não existirum longo excedente de capitais nas outras zonas capazes de seremaí investidos e, cumulativamente, no facto de, nessas outras zonasexistir um forte efeito atractivo (esforços de desenvolvimento);ainda, devemos não esquecer que os investimentos aqui referidossão apenas os directos (em filiais) e a longo prazo; ora é, compara-tivamente mais fácil, mais barato e mais rentável um investimentoem mercados pouco desenvolvidos do que no mercado americano,muito sofisticado e integrado. Assim, apenas o Canadá e a CEEapresentam fluxos positivos, embora partam de bases relativa-mente baixas (50 e 90 milhões de dólares, respectivamente), sendoo fluxo negativo dos países da Europa Ocidental não integradosno Mercado Comum (especialmente da Grã-Bretanha, que passade um valor positivo de 50 milhões de dólares para um desinvesti-mento de 460 milhões) e da América Latina (que passa de 100para 70 milhões) muito mais importante. Nestes dois últimos casosé de admitir um efeito de alteração dos fluxos por dificuldadeseconómicas internas (Grã-Bretanha) e por aumento da atracçãointerna (América Latina). A característica repulsiva da AméricaLatina encontra a sua justificação fundamental na quebra dosinvestimentos europeus, que passam de 200 milhões de dólares para85 milhões. A explicação é complexa, mas também aqui deverãojogar os factores de atracção de outros mercados (neste caso, ospróprios mercados europeus) e, provavelmente, a insegurança po-lítica das zonas latino-americanas.

Finalmente, a forte variação negativa em relação aos paísesdo Resto do Mundo aparece como extremamente significativa daincapacidade de resolução da questão do subdesenvolvimento porparte das estruturas capitalistas privadas: o forte decréscimo deinvestimentos nessas zonas é exactamente o oposto daquilo queseria necessário se existisse uma política coerente de desenvolvi-mento. Na impossibilidade de encontrar uma explicação genéricapara este valor negativo (estruturas económicas diferentes estãoaqui incluídas na mesma designação estatística) apontaremos al-guns dos factores que nele incidem: a ruptura dos laços colonia-listas primários, a instabilidade política, a dificuldade de realizaçãode políticas económicas de desenvolvimento, nessas zonas, que tor-nou pouco rentáveis alguns dos investimentos efectuados a partirda década de 50, a predominância de exploração de matérias primasfortemente monopolizadas pelos USA (como veremos a frente, osinvestimentos americanos nessas zonas são quase exclusivamentededicados à indústria do petróleo ou das explorações mineiras) ou

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com baixos coeficientes de capital técnico e, como cúpula, o carác-ter primitivo das estruturas económicas autóctones.

Como zonas atractivas encontramos a zona ANZAS compostapela Austrália, Nova Zelândia e África do Sul) e o Japão, comfortes variações de fluxos mas com reduzida importância absoluta,o Canadá, essencialmente dependente dos investimentos america-nos, e a zona europeia, sem dúvida a mais importante. Em 1960,os capitais entrados nessa zona representavam 47,2 % do movi-mento total; em 1965, esse valor tinha aumentado para 53,1%;estabelecendo a separação entre a CEE e os restantes países daEuropa Ocidental, encontramos os seguintes valores: em 1960 osvalores para as duas zonas eram idênticos (23,6%), mas em 1965a CEE recebia 29,8 % dos capitais movimentados em todo o Mundo,enquanto que os restantes países europeus recebiam 23,3 %. Daquise deduz uma clara preponderância dos mercados europeus e, emespecial, da CEE; enquanto o fluxo para a CEE apresenta umacréscimo de 62,3 %, para os restantes países europeus atinge ape-nas 27,4 % em relação a 1960. Analisando os componentes destesfluxos pode-se verificar que o aumento dos investimentos ameri-canos é maior na CEE (48,0%) do que nos restantes países euro-peus (30,6%) e, ainda, que nos movimentos internos europeus, oaumento dos investimentos da CEE nos restantes países (395,5 %)é superior ao aumento dos investimentos no sentido inverso(154,7%), o que coloca, inequivocamente, a zona CEE na posiçãoestratégica em relação à Europa Ocidental.

Zonas originárias e receptoras: retomando a análise dos qua-dros 2 A e 2 B é imediato verificar-se que as zonas originárias decapitais são os USA, a Europa Ocidental não integrada no Mer-cado Comum, a CEE e o Japão que apresentam, também, fortesacréscimos positivos no fluxo da saída. Contudo, como zonas ori-ginárias puras encontramos os USA e o Japão (com saldos ne-gativos) .

Como zonas receptoras registam-se a CEE, os países daEuropa não incluídos no Mercado Comum, o Canadá, os países doResto do Mundo, a zona ANZAS e a América Latina. Repare-se,contudo, que quer a América Latina quer os países do Resto doMundo apresentam variações dos fluxos de entrada negativos de1960 a 1965.

No quadro n.° 4 registamos as conclusões desta análise, ins-crevendo também uma tentativa de classificação estrutural daszonas consideradas. Como é evidente, trata-se de uma classificaçãorauito lata, já que os índices utilizados não permitem uma definiçãoobjectiva das características fundamentais de cada organizaçãoeconómica.

Definido o panorama global da circulação de capitais, passa-remos agora a fazer uma análise restrita aos investimentos exter-nos, privados, a longo prazo e directos, realizados pelos USA que,

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Análise dos fluxos de investimentos externos

QUADRO N.*1 4

PAÍSESENTRADAS

1965(% Total)

ENTRADASVARIAÇÃO

«L960/1965 (<%,)

SAÍDAS1965

(% Total)

SAÍDASVARIAÇÃO

1960/1965 (%)CLASSIFICAÇÃO ESTRUTURAL

USA ...

Canadá .

CEE

Europa Ocidental

Japão

América Latina ...

ANZAS

Resto do Mundo ..

Total

5,8

14,5

29,8

23,3

- 2,9

+ 35,9

+ 62,3

+ 27,4

1,5

54

8,4

11,2

+ 116,7

— 10,6

+ 620,0

— 32.0

100,0 + 28,4

49,6

2,9

16,7

21,7

3,3

1,2

1,4

3,4

100,0

+ 4(8,4

+ 19,0

+ 21,6

+ 32,4

+ 93,1

— 64,3

0

— 40,2

+ 28,4

Repulsiva originária, em expansão

Atractiva, receptora» em expansão

Atractiva, receptora/originária, em ex-pansão

Atractiva, originária/receptora, em ex-pansão

Atractiva, originária, em expansão

Repulsiva, receptora, em contracção

Atractiva, receptora, em expansão

Repulsiva, receptora, em contracção

•fe

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como se viu, representam, em 1965, 49,6 % da circulação mundialdesta classe de capitais.

No Quadro n.° 5 registam-se os valores sectoriais dos movi-mentos de capitais em 1955 e em 1966 e, ainda, os valores percen-tuais de variação entre esses dois períodos. As indústrias domi-nantes, quer quanto ao valor acumulado dos investimentos, querquanto à importância dos novos investimentos, são as indústriastransformadoras e a indústria dos petróleos, com predomínio dosector das transformadoras nas duas séries consideradas. Em re-lação às taxas de lucro, a posição dominante é ocupada pelas explo-rações minerais, que de 1960 a 1966 passavam de uma taxa de13,8 % anual a 17,5 %. Segue-se a indústria do petróleo, com taxasde lucro anuais que oscilam entre 12% e 13%; no entanto, estevalor deve ser corrigido tendo em conta que, nos investimentosefectuados no Canadá, a taxa de lucro média, nesta indústria, éde apenas 5%.

Finalmente, as indústrias transformadoras têm uma taxa delucro de 11 %; o facto de ser neste sector que se verificam os maio-res valores de investimentos, apesar de apresentar a mais baixataxa de lucro, tem uma explicação provável nas fortes perspectivasde crescimento do sector, que compensam uma mais reduzida taxade lucro a curto prazo; e no papel estratégico que uma posição com-petitiva neste sector possibilita; além disso, deve-se também terem conta que os investimentos nas indústrias mineiras e petrolí-feras dependem de variados factores, alguns dos quais muito ins-táveis: nível óptimo de exploração, conhecimentos técnicos (deexploração e prospecção), controle de mercados, estabilidade polí-tica dos países onde essas explorações se localizam, etc..

Nos sectores considerados no Quadro n.° 5 verifica-se, ainda,um forte crescimento do sector «comércio», entre 1955 e 1966,embora os valores absolutos dos investimentos sejam muito redu-zidos, o que, aliás, é normal para esse sector.

Considerando, globalmente, as séries do Quadro n.° 5 consta-ta-se imediatamente que elas crescem, embora essas variações po-sitivas apresentem diferenças bastante significativas. Da compara-ção entre o crescimento da rubrica «Valor de Balanço», que incluitodos os investimentos americanos, públicos e privados, com o cres-cimento da rubrica «Investimentos Directos», constata-se o au-mento de importância destes últimos no plano das relações econó-micas internacionais americanas; este resultado deverá ser o pro-duto de duas forças contrárias: a restrição de despesas do governoamericano e um forte aumento do investimento privado no exterior,como forma de aproveitamento de rendimentos disponíveis para aexploração e o controle de novos mercados.

A comparação das séries «Novos Investimentos» e «LucrosTotais» denota um certo paralelismo, o que confirma a relaçãohabitualmente existente entre os dois valores.

250

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Análise sectorial dos investimentos externos americanos privados,a longo prazo, no período 1965/1966

QUADRO N.° 5

RUBRICAS

1 — Valor de Balanço ...Investimentos directosMinasPetróleoServiços Públicos . ...ComércioDiversosInd. Transiorimad. ...

2 — Novos Investimen-tos (1)

MinasPetróleo

Diversos (2)Ind. Transformad. ...

3 — Lucros TotaisMinasPetróleoDiversosInd. Transformad. ...

í — Lucros RepatriadosMinasPetróleoInd. Transformad. ...Diversos

1955

39 17019 4002 2005 80016001 3002 0006 500

4 8:20420

2 3210190540

1 350

2 8502910

1240500820

1 980210

1 040330400

o/o Total

100,011,329,9

8,26,7

10.333,5

100,08,7

48,13,9

11,228,0

100,010£43,517,52!8,8

100,010,652,51*6,720,2

196C

96 75054 5604 135

16 2652 2854 7055120

22 (050

8 770810

2 560500275

4 625

5 680660

186010604 625

4 045520

178062!5

11210

(milhões

% Total

100,07,6

29,84,28S9,4

40,4

100,09,2

29,25,73,1

52,7

100,011,632,718,737,0

100,012,9414,015,527,7

de dólares)

Variação1965/1966

147,0181,2

!88.0180,4

42,8261,9156,0239,2

81,992,910,3

163,1-49,1242,5

99 j2127,550,0

112,0156,0

104,2147,6

71>189,3

180,0

1 De 1957 a 1966.2 Inclui serviços públicos.

151

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Finalmente, comparando as duas séries dos lucros, «LucrosTotais» e «Lucros Repatriados», verifica-se que esta última au-menta mais que a primeira o que significa que, dos lucros derivadosda actividade industrial, uma maior parte é enviada para o paísde origem, saindo, portanto, do circuito económico do país receptordos capitais; assim se confirma uma outra relação habitual nasanálises dos mecanismos e sistemas de colonização. Pela enormeimportância que essa relação tem na compreensão das relaçõeseconómicas internacionais, registam-se no Quadro n.° 6 as per-centagens dos rendimentos repatriados em relação aos lucros to-tais e a variação unificada entre 1955 e 1966.

Análise sectorial dos lucros repatriados

QUADRO N.° 6

SECTORES

MinasPetróleoDiversosIndúst. Transfo<rmàdoras

Total

1955

72,483,866J048,7

69,4

1966

78,795,6&8,953,3

71,2

Variação

6,311,8

— 7,14,6

1,8

Da sua análise se conclui que os lucros repatriados em 1966atingem 71,2 % dos lucros totais, com especial relevância para osector das indústrias petrolíferas, que repatriam a quase totalidadedos seus lucros (95,6%). Pelo contrário, as indústrias transfor-madoras repatriam apenas 53,3 % dos seus lucros, o que sugerea ideia de procurarem essas unidades uma posição de relativa auto--suficiência, até porque os mercados que utilizam e a estruturada sua produção não são compatíveis com políticas económicasde colonização pura («deseobrir-explorar-levar») do tipo da que éposta em prática no sector dos petróleos. De qualquer modo, osignificado total destes valores é claramente unívoco: apesar dainternacionalização da lógica capitalista, o vínculo nacionalista docapital conserva toda a sua potência.

Caracterizada, numa primeira e breve aproximação, a estru-tura sectorial dos investimentos americanos, passaremos à suaanálise regional. No Quadro n,° 7 encontra-se uma distribuição,por zonas, dos fluxos de capitais americanos, privados, directos,e a longo prazo.

Em relação aos valores de balanço, e considerando apenas osinvestimentos directos, a zona privilegiada é a Europa, com umganho percentual de 14,2% e o mais alto índice de variação

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Análise regional dos investimentos externos americanos, privadose a longo prazo, no período 1965/1966

QUADRO N.° 7

RUBRICAS 1955 o/o Total 1966 TotalVariação1955/1966

1 — Valor de BaJiançoInvestimentos directosCanadáAmérica Latina e Di-versos

ÁfricaÁsiaOceaniaEuropaCEEG. BOutros

2 — Novoís Investimen-tos

CanadáAmérica Latina ...Outras ZonasEuropa

3 — Lucro© TotaisCanadáAmérica Latina .Outra® Zonas ... .EuropaCEEG. BOutros

4 — Lucros RepatriadosCanadáAmérica Latina ...EuropaOutras ZonasCEEG. BOutros

3917019 4006 6i00

6 410570

2 2356100

3 0001 1 5 01 4 3 0

420

4 8201 5 %1 685

640900

2 8506)00,9108604801502i80

50

1 980300740680260

85J'50

25

100,033,5

33,02,9

11,53,1

15,55,9742,2

96 75054 56016 840

114702 0803 8902 060

16 20107 5905 0502 960

100,030,9

21,03,87,13,8

29,713,910,4

5,4

100,033,13>5,013,318,7

100,021,131,930,216,8

5,39,8

100,015,237,434,313,1

4>37,6

8 7702 3701 0902 0103 300

100,027,012,4212,937,6

5 680124012602O201160

4354802Í95

4 045765

11101445

725315250160

100,021,822,23!5,620,4

7.77,65,2

100,018,927,435,717,9

7,86,24,(0

147,0181,2159,0

78,9264,9

74,0243,34410,0560,0295.1604,7

81,948,5

214,0266,6

99,2106,6

38,4134^8141,6190,0

53,5490,0

1(04,2155,050,0

112,5178.8270,5

Í540,0

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(440,0 %) no período analisado. Dentro da Europa, a CEE tem omaior poder atractivo, com um ganho percentual de 8 %, emborao índice de variação mais alto pertença ao grupo «Outros» com604,7%.

As zonas menos atractivas são o grupo América Latina eDiversos com uma perda percentual de 12 % e a Ãsia, com umaperda de 4,4%, apresentando, simultaneamente, os mais baixosíndices de variação (78,9% e 74,0%, respectivamente). As zonasÁfrica e Oceania mantêm-se quase estacionárias em importânciapercentual no total dos investimentos americanos mas apresentamíndices de variação bastante elevados 264,9 % e 243,3 %, respec-tivamente. Estas conclusões gerais não sofrem alteração significa-tiva se considerarmos os valores da rubrica «Novos Investimentos»,como seria de esperar; a única diferença reside no facto de esteíndice dar uma indicação mais imediata da orientação dos fluxos.

Contudo, se analisarmos a repartição percentual dos lucrostotais, notaremos uma significativa alteração: enquanto que oconjunto América Latina, África, Ãsia e Oceania representam25,7 % do valor acumulado dos investimentos americanos no exte-rior, contribuem com 57,8 % dos lucros derivados desses investi-mentos. Pelo contrário, a Europa, que recebe 29,7 % dos investi-mentos, contribui apenas com 20,4 % dos lucros. Esta relaçãotorna-se, ainda, mais definitiva, se repararmos que, do total dosrendimentos repatriados para os USA, 63,1% saiem do grupoAmérica Latina, Ãfrica» Ãsia e Oceania, enquanto que da Europaapenas saiem 17,9%.

Pode-se esclarecer melhor esta situação utilizando os valoresdos rendimentos que são repatriados em comparação com os lucrostotais obtidos em cada zona (Quadro n.° 8).

Análise regional dos lucros repatriados

QUADRO N.° 8

REGIÕES

CanadáAmérica Latina .Outras Zonas . ...Europa

CEEG. BOutros

Total ...

(Percentagens)

1955

50,081.379$54,156,653,550,0

69,4

1966

61,688,0711,562,572,458,154,2

71,2

Variação

11,66,7

- 7 , 584

15,84,642

1,8

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Como se vê, é na América Latina e no grupo Outras Zonasque os fluxos de repatriamento são mais fortes: de todos os lucrosaí realizados, 88,0 % no caso da América Latina e 71,5 % no casodas Outras Zonas são devolvidos aos USA, desaparecendo do cir-cuito económico das zonas onde foram criados; para além disso,constata-se que, no caso da América Latina a taxa de aumentodos repatriamentos é crescente, reforçando ainda mais o vínculoda dominação. Aliás, mesmo para as Outras Zonas, mais favoreci-das pela política americana, as taxas de retirada dos lucros apre-sentam valores muito consideráveis, significativos dos tipos derelações económicas que acompanham os investimentos privadosamericanos a longo prazo.

Na publicação consultada faz-se, também, uma referência àdistribuição das indústrias transformadoras por algumas regiõeseconómicas que nos parece muito importante, na medida em queo sector das transformadoras é o que utiliza maiores valores acu-mulados dos investimentos americanos no exterior. Essa análiseencontra-se registada no Quadro n.° 9.

O facto mais saliente neste quadro é a importância crescenteda Europa como mercado receptor dos investimentos americanosem indústrias transformadoras, constituindo em 1964 a zona maisimportante em percentagens de investimentos acumulados (emvalor de balanço), posição ocupada pelo Canadá até 1963; e, comose vê no Quadro 9 A, o crescimento dos investimentos na Europaé contrabalançado pela diminuição acentuada dos investimentosno Canadá,

Dos investimentos realizados na Europa, as orientações do-minantes, desde 1957, são as indústrias de materiais de transporte(27,1%), de construções mecânicas (18,1%) e de produtos quí-micos (16,4%), a uma grande distância das outras actividades.Em relação ao Canadá há um alto valor regional para a indústriado papel (14,8 %) e que representa 81,3 % dos investimentos ex-ternos americanos nesta indústria; repare-se, também, que a dis-tribuição dos investimentos no Canadá, no sector das transforma-doras, é relativamente homogénea, significando um equilíbrio deexploração das oportunidades que deverá estar relacionado coma maior antiguidade do fluxo de investimentos para o Canadá. NaAmérica Latina há três actividades claramente dominantes: asquímicas, os materiais de transporte e as indústrias alimentares;contudo, em valor global, a concentração dos investimentos ame-ricanos é, aqui, muito pequena; basta reparar que uma percenta-gem regional de 12,6 % nas indústrias alimentares na AméricaLatina representa 22,6 % do total dos investimentos externosamericanos nesta actividade, em todo o mundo, enquanto que umapercentagem regional de 8,4 % no Canadá equivale a 37,3 % dototal investido nas indústrias alimentares.

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QUADRO N.° 9

REGIÕES

SECTORES

Indústrias alimentares ...

Papel

Químicas

Borracha

Metalurgia ...

Const. mecânicas ...

Const. eléctricas ...

Material de transporte

Outros

CANADÁ

c/n Total % Região

37,3

81,3

32,9

25,9

53,8

27,1

22,7

37,3

36,7

8,4

14,8

16,3

2.8

15,9

8,9

8,1

12,2

12,6

100,0

Variação% Total1957/1964

— 6,8

— 5,5

— 13,8

— 7,8

— 17,4

— 8,0

— 7,2

— 10,4

— 10,4

— 12,3

AMÉRICA LATINA

o/o Total % Região\

22*6

6,8

22,1

216,7

8^

6,4

15,6

12,8

16,9

14,9

12,6

2,6

27,1

7,1

6,0

5,2

8,2

17,1

14,1

100,0

Variação% Total1957/1964

- 4 , 9

0,3

— 2,2

- 7 , 0

1,8

1,0

- 2 , 8

— 1,6

- 2 , 4

OUTRAS ZONAS

% Total % Região

12,2

4,í)

10,0

22,2

8,2

8,0

8,0

114

7,5

9,6

Variaçãoo/o Total1957/1964

4,4

1,8

4,2

4,4

4,9

1,5

1,0

-4,9

1,4

7,6

EUROPA

VariaçãoTotal % Região % Total

1957/1964

27,9

8,9

35,0

25,2

29,8

58,5

3(8,4

53,1

38,8

5,9

1,7

16,4

2,6

8,3

18,1

7,7

27,1

12,2

100,0

73

3,4

11,8

10,2

10,7

5.5

9,0

13,7

11,4

11,4

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Análise regional dos lucros repatriados

QUADRO N.° 9 A

~ ~ ^ ^ — - — ^ _ ^ ANOS

REGIÕES ~~~"^—-___

Europa,

Canadá

América Latina

Outras Zonas

1957

27,4

49,0

16,0

7,6

100,0

1959

30,3

47,0

14,6

8,1

100,0

1960

34,1

43,3

14,-6

Sfi

100,0

1961

35.5

42,3

14,2

8,0

100,0

1962

36,8

40,1

14,7

8,4

100,0

1963

37,9

38,6

14,8

8,7

100,0

1964

38,8

36,7

14,9

9,6

100,0

Todos estes índices, quer analisados individualmente quer inte-grados numa visão global, classificam uma situação que é, certa-mente, conhecida na generalidade, mas a que nem sempre é pos-sível transmitir um concretismo tão evidente. Como toda a infor-mação predominantemente estatística, o valor deste trabalho estárelativisado pelas limitações do universo estudado; depois, o carác-ter fulcral que os valores das transferências internacionais decapitais assumem na lógica capitalista obriga a que uma certafamiliaridade com os resultados globais seja esperável. No entanto,a sua concretização é, ainda, significativa, para além do seu carác-ter repetitivo e parcializado.

SérgioLopes

"Brain-drain"!

— a fuga de cérebros paraos Estados Unidos

1. Elaborou-se a presente nota com o propósito de divulgaralguns números publicados em documentos oficiais norte-america-nos, e de sugerir qual a nossa situação perante a fuga de cérebrospara os Estados Unidos. Não se pretendeu fazer um estudo sobreas causas e implicações do «brain-drain», mas procura-se, con-tudo, esboçar algumas das suas coordenadas.

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