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Selltiz, Wrightsman e Cook Métodos de Pesquisa nas Relações Sociais Volume 1 Delineamentos de Pesquisa Organizadora da 4~ edição norte-americana: Louise H. Kidder Dados de Catalogação na Publicação (CIP) Internacional (Cãmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Coordenadores da 2~ edição brasileira: José Roberto Malufe Bernardete A. Gatti M552 v.I-3 2~ ed. 87-0126 CDD-300.72 Métodos de pesquisa nas relações sociais I Selltiz, Wrightsman e Cook ; organizadora da 4~ edição norte-americana Louise H. Kidder ; (tradutores Maria Martha Hubner d'Oliveira, Miriam Marinotti deI Rey); - 2~ ed. brasileira I coordenadores José Roberto Malufe, Bernardete A. Gatti. - São Paulo: EPU, 1987. Edição revista por Louise H. Kidder, com 6 novos capítulos de sua autoria. Bibliografia. Conteúdo: v. 1. Delineamentos de pesquisa - v. 2. Medidas na pesquisa social - v. 3. Análise de resul- tados. I. Ciências sociais - Pesquisa I. Selltiz, Claire. 11. Wrightsman, Lawrence Samuel. IH. Cook, Stuart Wellford, 1913 - IV. Kidder, Louise H. Índices para catálogo sistemático: 1. Ciências sociais: Pesquisa 300.72 2. Pesquisa social: Ciências sociais 300.72 3. Pesquisa social: Planejamento: Ciências sociais 300.72 4. Planejamento: Pesquisa social: Ciências sociais 300.72 (€J~ lUla ~ (€\D)lllrOrR<fR1 fP>(€\D)fR1~<Ó~II<CfR1 (€ lIJJrmIIW(€rR<~IIlr'rR<IIfR1IL1r\D)fR1o

Métodos de Pesquisa nas Relações Sociais

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Page 1: Métodos de Pesquisa nas Relações Sociais

Selltiz, Wrightsman e Cook

Métodos de Pesquisanas Relações Sociais

Volume 1Delineamentos de Pesquisa

Organizadora da4~ edição norte-americana:Louise H. Kidder

Dados de Catalogação na Publicação (CIP) Internacional(Cãmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Coordenadores da2~ edição brasileira:José Roberto MalufeBernardete A. Gatti

M552v.I-32~ed.

87-0126 CDD-300.72

Métodos de pesquisa nas relações sociais I Selltiz,Wrightsman e Cook ; organizadora da 4~ ediçãonorte-americana Louise H. Kidder ; (tradutoresMaria Martha Hubner d'Oliveira, Miriam MarinottideI Rey); - 2~ ed. brasileira I coordenadoresJosé Roberto Malufe, Bernardete A. Gatti. - SãoPaulo: EPU, 1987.Edição revista por Louise H. Kidder, com 6 novos

capítulos de sua autoria.Bibliografia.Conteúdo: v. 1. Delineamentos de pesquisa - v. 2.

Medidas na pesquisa social - v. 3. Análise de resul-tados.

I. Ciências sociais - Pesquisa I. Selltiz, Claire.11. Wrightsman, Lawrence Samuel. IH. Cook, StuartWellford, 1913 - IV. Kidder, Louise H.

Índices para catálogo sistemático:

1. Ciências sociais: Pesquisa 300.722. Pesquisa social: Ciências sociais 300.723. Pesquisa social: Planejamento: Ciências sociais

300.724. Planejamento: Pesquisa social: Ciências sociais

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Resumo

Delineamentos quase-experimentais for-necem um meio de estudar alguns trata-mentos sociais que naturalmente ocorrem.Eles são intermediários entre um experi-mento que possui alta validade interna e osfracos pré-experimentos que quase nãopossuem, no geral, validade interna.Quase-experimentos nos possibilitam des-cartar algumas ameaças à validade porqueeles incluem mais pontos de dados que ospré-experimentos. O número de delinea-mentos quase-experimentais que um pes-

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quisador criativo pode construir é ilimita-do. Apresentamos três tipos que são exten,sões de pré-experimentos, os quais mos-tram como pontos de dados adicionais tor-nam um delineamento, antes de difícil in-terpretação, interpretável. Um determina-do pesquisador pode delinear um quase-experimento, ainda não pensado, coletan-do dados de um número suficiente de su-jeitos, num tempo suficiente, para descar-tar muitas ameaças à validade interna, detal modo que mesmo sem a distribuiçãoaleatória será possível inferir causas eefeitos.

4. Delineamentos de pesquisa de levantamento *

refere-se aqui ao conjunto de pessoas parao qual desejamos generalizar. Se pergun-tamos, por exemplo: "Qual é a distribui-ção de preferências por candidatos entre aspopulações com idade para votar nos Es-tados Unidos?", a população relevante étodo eleitor em potencial dos Estados Uni-dos. Se perguntamos: "O que determina asdiferenças entre jovens no desempenhoacadêmico?", a população relevante deve-ria ser pessoas na população que atingiramuma idade além da qual é impraticável quealmejem prosseguir na escolarização. A po-pulação relevante para a questão; "Comoo background familiar ou processos liga-dos com grupos de companheiros se rela-cionam com o desempenho acadêmico?"poderia ser a mesma da segunda questão.A expressão fenômenos que ocorrem na-turalmente refere-se aos processos de vidatal como ocorrem. Opõe-se às variáveis"manipuladas" dos experimentos discuti-dos no capítulo 2. Muitas variáveis medi-das em levantamentos são aquelas a quenos referimos como variáveis do sujeito na-quele capítulo.

Investigadores que realizam pesquisas delevantamento tipicamente coletam seus da-dos através de respostas verbais a questões

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Na pesquisa social, freqüentemente de-sejamos estar aptos a responder questõesacerca da distribuição da variável e das re-lações entre características de pessoas ougrupos da maneira como ocorrem em si-tuações naturais. Poderíamos perguntar,por exemplo, qual é a distribuição de pre-ferências por candidatos na população vo-tante dos Estados Unidos? Ou o que de-termina as diferenças entre jovens no to-cante a serem bons alunos na escola ou aograu de escolariedade que recebem? Ou oquanto o background familiar ou a vivên-cia com grupos de companheiros se rela-ciona com o desempenho escolar? Estes sãofenômenos que influenciam as interaçõesentre pessoas em sua vida diária. Pesquisade levantamento é a estratégia de pesquisadestinada a estudar tais fenômenos. Estecapítulo examina alguns delineamentos quecompõem as pesquisas de levantamento.

Para realizar pesquisas de levantamen-to, coletam-se dados de toda ou parte deuma população, a fim de avaliar a incidên-cia relativa, distribuição e inter-relações defenômenos que ocorrem naturalmente(Kerlinger, 1964). O termo população

*Este capítulo foi escrito por Leo Rigsby.

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predeterminadas feitas à maioria ou a to-dos os sujeitos de pesquisa. Opõe-se à en-trevista não estruturada, feita na observa-ção participante. As questões do observa-dor participante podem ser determinadas,num aspecto, por respostas dos informan-tes a questões prévias (vide capo 6). E pelofato de informantes de pesquisa de levan-tamento responderem às mesmas questões,que a incidência e distribuição de caracte-rísticas podem ser estudadas. No planeja-mento dos levantamentos dispende-se aten-ção cuidadosa tanto às palavras utilizadasnas questões como à maneira de apresentá-Ias aos informantes. Estes tópicos impor-tantes são abordados no capítulo 8. Umavez que os questionários de levantamentosão planejados antes do início da coleta dedados, pesquisas de levantamento não po-dem explorar com profundidade sentimen-tos ou interpretações de informantes damaneira como pode ser feito na observa-ção participante. Por outro lado, os dadossistemáticos coletados de cada informantepermitem a exploração de relações entrevariáveis que são medidas (por exemplo,educação relacionada a renda). Estas rela-ções não podem ser exploradas se cada in-formante ou situação não são medidos damesma maneira.

Algumas pesquisas de levantamento ten-tam ir além do relato de distribuições e re-lações para realizar a sua interpretação.Tais tentativas levantam o problema de ex-plicações baseadas em dados correlacio-nais; isto é, pesquisadores que realizam

.pesquisas de levantamento podem desejarexplicar o que determina a distribuição deocupações entre homem e mulheres nos Es-tados Unidos. Processos e característicasque ocorrem naturalmente (por exemplo,a influência de raça e sexo no nível de es-colaridade) não podem ser significativa-mente atribuídos aos sujeitos de pesquisae não podem ser manipulados em estudosde laboratório. A única maneira pela qualtais fenômenos podem ser estudados é atra-vés da sua ocorrência nos processos da vi-

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da real. Para estabelecer as relações destascaracterísticas com processos vitais impor_tantes, devem-se empregar outras técnicasque não a experimentação.

A ampla variedade de situações e obje_tivos para a utilização de pesquisas de le-vantamentos pode ser vista nos seguintesexemplos:

1. Sociólogos coletam dados de uma amostra re-presentativa de membros do sexo masculino da forçade trabalho para estudar seu desempenho ocupacio-nal e em treinamentos.

2. Organizações especializadas em opinião públicarealizam estudos sobre a popularidade de vários can-didatos presidenciais entre potenciais eleitores.

3. Organizações de pesquisa de mercado realizamestudos sobre fumantes para descobrir que tipo de ci-garros desejam.

4. Pesquisadores em medicina realizam levantamen-tos na população do país para determinar a incidên-cia de características relacionadas a doenças.

5. Cientistas políticos entrevistam membros da Câ-mara dos Deputados para compreender por que umareforma foi adotada.

6. Uma revista feminina nacional solicita a seus lei-tores que respondam a um questionário que pede in-formações sobre suas aspirações ocupacionais.

7. Sociólogos políticos fazem levantamento de umaamostra de estudantes em grandes universidades paradeterminar se eles apóiam ou não a reinstituição dorecrutamento militar obrigatório nos Estados Unidos.

8. Uma organização nacional de avaliação de emis-soras (utilizando aparelhos mecânicos de registro emvez de questionários e entrevistas) mede a distribui-ção da audiência semanal de T.V.

9. Um pesquisador ligado ao setor de moradias fazum levantamento com hipotecários para determinaras proporções de seus empréstimos sob hipoteca naclasse baixa versus classes média e rica.

Alguns delineamentos de pesquisas delevantamento

o delineamento mais simples na pesqui-sa de levantamento procura determinar aincidência e distribuição de característicasou relações entre características. Quandoinvestigadores que realizam pesquisas de le-vantamento possuem estes objetivos limi-tados, eles apenas se preocupam em veri-ficar se as populações de seu estudo são re-presentativas das populações para as quaiseles desejam generalizar e se mediram pre-

cisamente as características que pretendemrelatar. As organizações de estudos de opi-nião pública de âmbito nacional, como aLou Harris Associates e o Gallup Institutefreqüentemente conduzem estudos que seencaixam neste modelo*. Estas organiza-Çõesnão raro são incumbidas pelos noti-ciários dos meios de comunicação de estu-dar a reação pública a questões atuais. Porexemplo, estudos recentes publicados nosjornais diários coletam opiniões de pessoassobre o poderio nuclear, falta de gasolina,se o plano militar deveria ser reinstaladoe o que os adultos consideram como osproblemas mais prementes deste país. O re-lato dos meios de comunicação de um es-tudo típico feito por uma destas organiza-ções consistirá das opiniões dos informan-tes tabuladas sucessivamente pelas seguin-tes características pessoais: raça, região dopaís que residem e tipo de ocupação. Em-bora tais estudos requeiram um planeja-mento e execução cuidadosos, eles não sus-citam problemas complexos de análise es-tatística ou interpretação. Todos os dadossão coletados numa única entrevista comcada informante, e tabulações muito sim-ples são apresentadas. Não há tentativa deexplicação sobre o porquê das pessoasapresentarem opiniões diferentes. Tais es-tudos meramente fornecem informaçõesúteis acerca dos elementos básicos das opi-niões e preferências públicas.

tabelecer conceitualmente um delineamen-to de pesquisa. Um delineamento comumde pesquisa de levantamento que procuraexplicar e interpretar relações está muitopróximo de um dos delineamentos pré-experimentais de Campbell e Stanley - acomparação com grupo estático.

Delineamentos de comparação com grupoestático

Quando se necessita mais do que simplesdistribuições e tabulações é necessário es-

* No Brasil são conhecidos institutos semelhantes. De-vemos lembrar os diferentes estudos por levantamentoque são feitos pela Fundação Instituto Brasileiro deGeografia e Estatística (IBGE), em especial as Pes-quisas Nacionais por Amostra de Domicílio (PNAD),os estudos do Departamento Inter-Sindical de Estu-dos Econômicos, Sociais e Estatísticos (DIEESE),além de outros órgãos como o SEEC (Serviço de Es-tatística da Educação e Cultura) e unidades de dife-rentes universidades brasileiras (N. dos Coords.)

x OO

Se imaginamos este delineamento comum X que ocorra naturalmente em váriosníveis (por exemplo, sexo feminino e mas-culino, ou nível sócio-econômico baixo,médio, alto), ele se transforma no seguinte:

X, ------------------O I

X2 ------------------ O2

Este delineamento mostra dois ou maisgrupos de comparação definidos por seuvalor de X. Pode-se comparar os escoresO nos dois grupos para verificar se há umarelação entre X e O.

Suponha que X nesse diagrama represen-te a ocupação (operário e funcionário deescritório e O represente renda. Se os gru-pos diferirem na renda, será tentador in-terpretar esta diferença como sendo o efei-to da ocupação sobre a renda. Tal inter-pretação seria análoga nessa interpretaçãodos efeitos de X num experimento. A difi-culdade de interpretar os resultados de umacomparação com grupo estático esta napossibilidade de haver outras diferenças en-tre os grupos das duas ocupações que tam-bém poderiam afetar a renda. Tais diferen-ças são explicações rivais plausíveis paraquaisquer diferenças na renda entre os gru-pos. Há três critérios para inferir causação.São os seguintes: 1) que X e Oco-variem,2) que X preceda O no tempo e 3) que nãohaja hipóteses alternativas para as diferen-ças entre os grupos em O. Dizer que duasvariáveis co-variam significa dizer que há

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uma tendência de que certos valores ou ní-veis de uma variável ocorram junto comdeterminados valores ou níveis da outra va-riável. Por exemplo, dizer que educação erenda co-variam (ou que são correlaciona-das) é dizer que há alguma tendência paraque níveis mais baixos de renda ocorramcom níveis de escolaridade mais baixos eque níveis mais altos de renda tendem aocorrer com níveis de escolaridade mais al-tos. O delineamento correlacional básicoda pesquisa de levantamento quase semprepode atender ao primeiro destes três crité-rios. Leitores que já tiveram cursos de es-tatísticas podem recordar a intransigentemáxima dos professores de estatística:"Correlação não demonstra causação". Aeste truísmo deveria ser acrescentada a afir-mação de que causação não implica emcorrelação. Assim, a demonstração de umacorrelação entre duas variáveis, utilizando-se diferentes populações e diferentes con-dições de pesquisa, certamente emprestacrédito a uma hipótese causal envolvendoas duas variáveis. Cada exemplo do tipo éum teste de hipótese que poderia refutá-Ia(CampbelI e Stanley, 1963, p. 234). Alémdisso, cada exemplo do tipo deve ser exa-minado quanto a explicações alternativasplausíveis, antes de se propor qualquer ten-tativa de interpretação causal.

Deve-se fazer um comentário acerca dasuposição de seqüência temporal neste de-lineamento. Na verdade, X e O são medi-dos aproximadamente ao mesmo tempo,ou seja, é provável que cada um seja me-dido por respostas em um questionário.Neste sentido, não se pode dizer que X vemantes de O no tempo. O investigador querealiza pesquisas de levantamento deve su-por que X, tal como é medido no levanta-mento, influenciou o informante comoparte de seus processos de vida anteriores.Algumas vezes pode-se determinar, emproblemas estudados através de pesquisa delevantamento, que X precedeu O no tem-po. Por exemplo, para a maioria dos norte-americanos o fim dos estudos antecede o

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início de seu primeiro emprego de tempointegral. Se usássemos dados de levantame-,to para estudar o desempenho ocupacionalde trabalhadores norte-americanos, pode-ríamos dizer que para a maioria dos norte-americanos de sexo masculino o nível deescolaridade precede a colocação ocupacio,nal. Mesmo assim, esta seqüência tempo-ral não descreve parte da população. Al-gumas pessoas que atingem tardiamente onível de escolaridade superior trabalham pe-ríodo integral em empregos que eles consi-deram como permanente antes de ingres-sarem na ou completar a faculdade. À me-dida que os informantes não são homogê-neos em relação a seqüência de escolarida-de e primeiro emprego, há ambigüidade nainterpretação da relação entre eles. Tal am-bigüidade é uma razão para que investiga-dores que realizampesquisa de levantamentotenham cautela ao fazer inferências causaisa partir deste tipo de pesquisa.

Se o tipo de objetivo de alguém limita-se a determinar a incidência ou distribui-ção de características, digamos, por exem-plo, o número ou proporção de homens emulheres numa dada ocupação, o delinea-mento é perfeitamente adequado para for-necer a resposta. Mesmo quando alguémdeseja verificar o grau de co-variação en-tre variáveis, este delineamento é adequa-do ao propósito. Assim, ao usar este deli-neamento, pode-se prontamente coletar da-dos a partir dos quais se calcula o grau decorrelação entre medidas do backgroundfamiliar (renda, nível de escolaridade dospais) e desempenho na escola (notas, mé-dias de notas). É quando se deseja ir alémdo cálculo de relações para a interpretaçãodelas, que se encontram as limitações paraeste delineamento de pesquisa.

Delineamento de painel

Para se encontrar o critério da ordemtemporal a fim de se estabelecer causação,podemos usar um segundo delineamentocomum de levantamento, denominado de-

lineamento de painel. Este delineamento le-va em conta o tempo e mudanças no de-correr do tempo, coletando dados nos Xse Os em dois ou mais pontos no tempo.

Xll

Xl2 Xl3 O Xl2 Xl3 O Xl2 O

------------------------------------------------------------

X2l

X22 X23 O X22 X23 O X23 O

O primeiro dos dois índices dos Xs indi-ca o nível da variável, por exemplo, parao sexo, feminino e masculino. Uma deter-minada variável pode assumir, é claro,mais que dois valores. Se a variável fosseidade, quando feito o levantamento pelaprimeira vez ela poderia assumir tantos va-lores quantos estavam representados naamplitude de idade entre os informantespesquisadores. O segundo índice representaa identificação da variável. No diagramaprecedente, informações sobre as variáveisX, X2 e X3 foram coletadas na primeiraentrevista; X2 e X3 na segunda; e assimpor diante. O que se apreende neste diagra-ma é que os dados em um número de Xse talvez em um número de Os são coleta-dos em um número de pontos no tempo.Alguns Xs são variáveis cujos valores nãose espera que mudem como, por exemplo,sexo e raça. Outros são Xs cujos valorespodem mudar para algumas pessoas, co-mo no caso de status profissional e nívelde escolaridade. Por fim, algumas das va-riáveis são como os Os da pesquisa experi-mental, cujos valores se esperaria mudarquando valores de X mudassem, como ocaso do nível de renda. Um dos estudos ini-ciais sobre o comportamento de votar nosEstados Unidos utilizou este delineamen-to para observar Xs do tipo background declasse, religião, e exposição aos apelos decampanhas políticas e Os do tipo intençãode votar e preferências por candidatos (Be-relson, Lazarsfeld e McPhee, 1954).

Estudos utilizando delineamentos de pai-nel vêm sendo cada vez mais utilizados napesquisa de processos complexos, tais co-

mo mudanças de empregos e mudanças nospadrões dos gastos do consumidor. Porexemplo, o National Longitudinal Surveysof Labor Market Experience é um estudoque utiliza entrevistas anuais ou entrevis-tas bianuais de vários grupos na popula-ção norte-americana. Grupos diferentestêm sido estudados porque encontram ti-pos diferentes de problemas de mercado detrabalho. "Para as duas coortes de jovensestes problemas giram em torno do proces-so de escolha ocupacional e incluem tantoa preparação para o trabalho como o pe-ríodo freqüentemente difícil de acomoda-ção ao mercado de trabalho e o término doperíodo de escolarização formal. Os pro-blemas especiais dos homens de meia-idadeoriginam-se em parte do fato de suas ha-bilidades tornarem-se obsoletas, na cres-cente incidência de problemas de saúde ena discriminação nos empregos, tudo issose refletindo no declínio das freqüências departicipação da força de trabalho e na du-ração do desemprego, quando ocorre aci-ma da média. Para as mulheres, os proble-mas de mercado de trabalho são aqueles re-lacionados à reintegração de mulheres ca-sadas na força de trabalho, as quais sen-tem que seus filhos não mais requerem suaconstante presença no lar" (Center for Hu-man Resource Research, 1977). Este estu-do é subvencionado pelo US Departmentof Labor e tem por objetivo fornecer umabase para o entendimento de questões maisgerais que afetam trabalhadores da forçade trabalho norte-americana, bem comoproblemas específicos que atingem os gru-pos estudados. Mesmo questões que não fi-zessem parte do delineamento do estudooriginal poderiam ser incluídas nas reentre-vistas anuais para dar flexibilidade ao de-lineamento de pesquisa. Alguns dos resul-tados da continuidade são usados pelos res-ponsáveis pelas linhas de ação do Depart-ment of Labor para formular mudanças napolítica econômica do governo federal epara avaliar a política atual.

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Outro estudo de painel de comparável al-cance e importância nacional é o PanelStudy of lncome Dynamics, conduzido pe-lo Institute for Survey Research na Univer-sity of Michigan (Morgan e Duncan, 1980).Baseado em entrevistas anuais com 5.000famílias norte-americanas, este estudo co-letou dados econômicos e sociais sobre asfamílias e seus membros individuais, des-de 1969. O estudo produziu uma quanti-dade massiva de dados, incluindo informa-ções sobre coisas como longos e curtos pe-ríodos de desemprego, jornada de traba-lho do chefe de família, uso de vales-refeições, casa própria, mobilidade residen-cial, cuidados com as crianças, mudançasna composição da família, impostos, desi-gualdade de renda, tendências nos gastoscom alimentação e os efeitos econômicosde preços mais altos da gasolina. Assim co-mo National Longitudinal Survey of La-bor Market Experience, o Panel Study oflncome Dynamics é subvencionado poragências do governo federal que estão in-teressadas nos dados que os ajudem a de-finir e avaliar linhas de ação econômicas.

Nos levantamentos de delineamento depainel, tipos especiais de análises detalha-das de mudanças a nível de algumas das va-riáveis podem gerar insights úteis sobreprocessos de mudança. Contudo, a elimi-nação de hipóteses alternativas continuaproblemática. Há dois problemas princi-pais. Em primeiro lugar, pode ser que otempo transcorrido entre entrevistas no de-lineamento de painel não corresponda aoperíodo de tempo necessário para dizer seuma variável afetou outra. Por exemplo,suponha que alguém estivesse reentrevis-tando a intervalos de um ano e descobris-se que tanto os débitos do consumidor (pe-la compra de um novo carro), como o nú-mero de adultos na família que estavamempregados, aumentou desde a última en-trevista. Não estaria claro se o membro adi-cional da família foi trabalhar a fim de quepudesse comprar um novo carro, ou se onovo carro foi comprado para permitir que

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o membro da fanulia fosse trabalhar (ou, tal-vez, ambos). O segundoproblema é que podehaver outras diferenças importantes entreos grupos de comparação definidos pelosXs que não tenham sido levadas em conta.

Delineamento de pseudopainel transversal

O delineamento de série temporal ou depainel, recém-apresentado, em combinaçãocom uma idéia de um artigo de Glock(1967) acerca do uso de pesquisas de levan-tamento em sociologia, produz um delinea-mento ligeiramente diferente que represen-ta outro delineamento comumente empre-gado em pesquisas de levantamento. É umdelineamento onde as variáveis represen-tam fenômenos que ocorreram ao longo deum período de tempo:

A] B] C] D] E] ...A2 B2 C2 D2 E2 •••

A3 B3 C3 D3 E3 ...

An B; C; Dn E; ...

A dimensão horizontal ainda represen-ta a passagem do tempo, mas é um tempoconforme considerado pelo pesquisador.Cada Ai assume diversos valores ou rotu-lações. Está implícito que as variáveis de-nominadas A "ocorreram" antes e apro-ximadamente ao mesmo tempo, que variá-veis B ocorreram mais tarde, que variáveisC ocorreram mais tarde ainda e assim pordiante. Um exemplo pode tornar isto maisclaro.

Blau e Duncan (1967) estudaram os efei-tos de um grande número de variáveis so-bre o nível de colocação ocupacional de ho-mens norte-americanos durante o início atémeados deste século. Sua teoria colocou asvariáveis-chave numa seqüência temporal,como está representado na figura 4.1. Es-ta figura apresenta uma interpretação desua teoria derivada da análise dos dadosapresentada em seu livro. O primeiro con-junto de variáveis (os As) resume as ín-

Raça-etniaSexoNível de escolaridade dos paisTipo de escola freqüentada antes dos 16 anosOrdem de nascimento e número de irmãosComposição da família do informante quando este tinha a idade de

16 anosTamanho da cidade de residência quando estava com 16 anos de

idadeDécada quando o informante tinha 16 anosNível de escolaridade do irmão mais velhoOcupação do pai quando o informante tinha 16 anos

Nível de escolaridade do informante

Primeiro emprego do informanteEstado civil do informante

Residência do informante em 1962Emprego do informante em 1962

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americana, ao longo da primeira metade doséculo XX. É difícil imaginar como qual-quer parte importante daquele processo po-deria ter sido estudada em condições expe-rimentais de laboratório.

Nas páginas precedentes esboçamos osmodelos mais comuns em pesquisas de le-vantamento. O investigador que realizapesquisas de levantamento procura enten-der e generalizar a partir dos processos"naturais" que ocorreram, (por exemplo,realização educacional ou ocupacional) ouque estão ocorrendo, por exemplo, umapesquisa de opinião pública pré-eleitoral.Freqüentemente, os processos de interessesocorrem ao longo de uma geração ou devárias gerações. Uma multiplicidade de in-fluências, reconhecidas ou não, podem in-terferir nos processos estudados. Isto seopõe a situações com as quais os pesquisa-dores experimentais se deparam. Com oisolamento do laboratório e controle sobreexposições a estímulos, eles podem simpli-ficar muito as influências que afetam osprocessos em estudo.

Como os pesquisadores que realizampesquisas de levantamento podem alcançarvalidade interna sob estas circunstâncias?Uma estratégia freqüentemente emprega-

Figura 4./. Seqüência temporal da atuação de variáveis incluídas em The American Occupational Structure,de Blau e Duncan.

fluências na vida de rapazes jovens ante-riores à época em que começaram a toma-da de decisões cruciais que determinariamo grau de escolaridade que iriam atingir eo tipo de trabalho que pretendiam exercerquando adultos. Em seguida vem o nívelde escolaridade dos informantes (os Bs). Aspróximas duas variáveis são o nível de pres-tígio do primeiro emprego dos informan-tes e seu estado civil naquela época (os Cs).Finalmente vem o nível de prestígio dosempregos dos informantes em 1962 e seuslocais de residência nesse ano (os Ds). Blaue Duncan argumentaram que o back-ground familiar determinou o nível de es-colaridade e que o background familiar enível de escolaridade juntos determinaramo nível conseguido no primeiro emprego.Eles ainda argumentaram que o back-ground familiar, nível de escolaridade e oprimeiro emprego determinaram o nível derealização ocupacional na época do estu-do (1962). Em nenhuma de suas análisesas variáveis eram manipuladas ou, paraaquele assunto manipuláveis. A pesquisados autores foi dirigida para a descobertae compreensão dos padrões de desempenhoeducacional e ocupacional em homens per-tencentes à força de trabalho norte-

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da por eles é evitar completamente afirma-ções causais. Isto resulta em formulaçõesdas conclusões de pesquisas que não vãoalém de descrevê-Ias simplesmente em ter-mos de resultados estatísticos (X está rela-cionada a Y levando-se em conta A e B)Esta estratégia procura evitar, e não en-frentar, o problema da validade interna.Obviamente, contudo, é necessário algumcuidado ao extrair conclusões dos levanta-mentos onde são fornecidas explicações pa-ra os fenômenos sociais. Não apenas a aná-lise de dados deve sustentar as conclusõesque o pesquisador oferece, mas ela deve-ria, quando possível, eliminar explicaçõesalternativas através de controles estatísti-cos apropriados. Em função da necessida-de de se cientizar das hipóteses alternati-vas visando verificar a sua plausibilidade,é essencial que se saiba acerca do proble-ma de pesquisa tanto quanto for possívelsaber. Uma pesquisa através da bibliogra-fia cobrindo as várias abordagens teóricasdeveria produzir hipóteses rivais plausíveis,diretrizes para conexões causais etc... Umasólida revisão na bibliografia substantivada área do problema é provavelmente opasso mais crucial para o aumento da va-lidade interna de pesquisas de levantamen-to. Traduzir aquela bibliografia em medi-das e operações estatísticas apropriadas se-ria um passo subseqüente crucial.

Resumo

O poder da pesquisa de levantamento es-tá em responder questões de fato e em de-terminar a distribuição das característicasde populações. Em aplicações deste tipo,questões de validade interna não são colo-cadas. Não há inferências causais. Uma vezque estratégias de levantamento prestam-se facilmente a sessões de coleta de dadosextensas e difusas (entrevistas), a validadeexterna pode ser aumentada através do usode planos de amostragem probabilística.Nenhuma outra estratégia de pesquisa seiguala à força da pesquisa de levantamen-

to em seu potencial de obtenção da valida_de externa.

Quando os objetivos da pesquisa de le-vantamento são ampliados, para incluir in-terpretação e análise causal de correlaçõesa validade interna torna-se importante:Uma vez que a pesquisa de levantamentolida principalmente com variáveis que OCor-rem naturalmente, e que não podem ser ca-sualizadas e manipuladas, tanto a seqüên-cia temporal de ocorrência como as expli-cações alternativas para as relaçõestornam-se problemáticas. Por outro lado,muitos problemas de pesquisa nas ciênciassociais importantes e interessantes não po-dem ser submetidos à simulação em situa-ções de laboratório. Nenhum cientista so-cial de orientação experimental ainda con-seguiu encontrar uma maneira de simularos efeitos de vida real de ter sido criado napobreza versus na riqueza, de ter nascidomulher versus homem etc. Quando ocor-rem processos, tais como a realização ocu-pacional durante uma vida, não se podeestudá-los por outras técnicas de pesquisaque não o levantamento.

Muitas das ações de pesquisa onde a pes-quisa de levantamento é a alternativa lógi-ca, são áreas onde o pesquisador deseja fa-zer inferências causais. Tais inferênciasnunca podem ser feitas neste tipo de pes-quisa com a mesma certeza com que sãofeitas na pesquisa experimental. Contudo,podem-se empregar certas estratégias paraaumentar a validade interna da pesquisa delevantamento. Em alguns problemas depesquisa, a ordem temporal das variáveispode ser determinada coletando-se dadosdurante um certo período de tempo. Emoutras, hipóteses alternativas podem se tor-nar menos convincentes através de contro-les estatísticos. A validade interna e exter-na de programas de pesquisa ou de tradi-ções de pesquisa de longa duração podemser melhor avaliadas do que os resultadosde casos isolados de pesquisa de levanta-mentos.

5. Pesquisa de avaliação

A pesquisa de avaliação difere das ou-tras formas de pesquisa que discutimos nãopor seus métodos mas por seus objetivos,por seu emprego e por sua relação com ins-tituições políticas e sociais. É pesquisa apli-cada. A maior parte do que discutimos noscapítulos anteriores era pesquisa básica. Apesquisa básica é realizada para aumentarnosso corpo de conhecimento, testar hipó-teses, construir teorias e talvez descobrir al-guma aplicação prática no futuro. Mas,mesmo sem qualquer aplicação prática emvista, a pesquisa básica é realizada comoum fim em si mesma. A pesquisa aplica-da, conforme o próprio nome sugere, é rea-lizada por razões práticas -r-r- para produ-zir descobertas que sejam aplicáveis, prá-ticas e de utilidade imediata. A pesquisa deavaliação é um tipo especial de pesquisaaplicada, elaborada para avaliar progra-mas, geralmente programas sociais de me-lhoramentos tais como: educação remedia-tória, reformas no bem-estar social, méto-dos de ensino inovadores, sistema de dis-tribuição de serviços de saúde, programasde treinamento de pessoal e afins. Os re-sultados de pesquisas de avaliação não sedestinam meramente a incrementar nossoCorpo de conhecimentos ou a desenvolverteorias. Eles são usados, muitas vezes ime-

diatamente, para decidir se os programasdevem parar ou continuar, se as verbas de-vem ser aumentadas ou diminuídas, se épreciso contratar ou despedir pessoas - tu-do isso com base no atendimento do pro-grama àquilo para que fora destinado.

Muita pesquisa de avaliação é pesquisade mercado - projetada para levantar aspreferências das pessoas por produtos co-merciais ou técnicas de propaganda. Em-bora pudéssemos classificar todas essaspesquisas como pesquisas de avaliação pe-lo motivo de estarem avaliando alguma coi-sa (por exemplo, avaliando um produto ouuma propaganda) não as incluímos nestecapítulo. Ao invés disto, estamos preocu-pados aqui com a avaliação de programassociais que têm implicações para linhas deação social. É a conexão com linhas deação social, verbas e decisões referentes apessoal que torna a pesquisa de avaliaçãodiferente tanto da pesquisa básica como deoutras pesquisas aplicadas.

Avaliação formativa e somativa

Há duas categorias gerais de pesquisa deavaliação denominadas pesquisas somati-va e jormativa ou pesquisa dos resultados

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