M&U06-Solidariedade, interesses e desenvolvimento político

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  • 8/6/2019 M&U06-Solidariedade, interesses e desenvolvimento poltico

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    Segunda parte

    DE VOLTA AO DESENVOLVIMENTO POLITICO

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    Captulo 5 deMercado e Utopia Fbio Wandele! "ei#

    SOLIDA"IEDADE$ INTE"ESSES E DESENVOLVIMENTO POL%TICO

    Vocs so muito inteligentes,mas vo presos assim mesmo.Fernando Sabino, O Encontro Marcado

    I -Desenvolvimento poltico?

    Em artigo de 1971, Samuel Huntington empreende a reviso da literatura sobre o

    tema do desenvolvimento poltico e cita, ao cabo, desalentado coment!rio de "an#$art

    %usto$, &ue, tendo deparado ele pr'prio com de( signi)icados distintos da&uela

    e*presso, a)irma &ue nove deles seriam demais.1 + coment!rio acrescentado por

    Huntington mais ctico- essa situao indicaria &ue provavelmente os dezseriam demais,

    isto , &ue talve( a pr'pria noo de desenvolvimento poltico devesse ser descartada. "e

    acordo com a discusso de Huntington, o conceito de desenvolvimento poltico seria ou

    supr)luo ou positivamente inconveniente. Supr)luo na&ueles casos em &ue identi)icado

    com um processo espec)ico, tal como institucionali(ao poltica ou incremento da

    participao poltica, /! &ue nada se gan0aria com a substituio de tais termos pela

    e*presso desenvolvimento poltico e inconveniente nos casos em &ue tomado como

    categoria abrangente, a envolver uma multiplicidade de processos diversos 2tais como a

    di)erenciao, a seculari(ao e a crescente autonomia dos elementos componentes de um

    sistema, na an!lise de 3abriel 4lmond5, /! &ue o uso de um r'tulo 6nico para tais

    processos tenderia a produ(ir enganadora impresso de coerncia e a insensibili(ar o

    analista para o &ue pode 0aver de problem!tico em suas relaes. 8om base em

    consideraes como essas, prope Huntington o retorno noo de :mudana; como

    , e emDesarrollo Econmico - Revista de Ciencias Sociales , no. ?>, vol. 1>, /ul0o@setembro de 197> em versoligeiramente di)erente, apareceu tambm em Aorge Bal!n 2org.5, Centro e Periferia no Desenvolvimento

    rasileiro. So Caulo, "DFE, 197>.1Samuel C. Huntington, :

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    designao mais ade&uada para os temas geralmente tratados em cone*o com

    :desenvolvimento poltico;.

    +utras ob/ees poderiam acrescentar@se s )ormuladas por Huntington. ma

    delas, a &ue se recorreu com )re&Gncia, re)ere@se sugesto de algo como um est!dio

    )inal no processo de trans)ormao poltica da sociedade &ue se ligaria ao conceito de

    desenvolvimento poltico. +utra se vincula ao )ato de &ue as tentativas de de)ini@lo tendem

    a ressentir@se da inter)erncia, consciente ou inadvertidamente, de pre)erncias

    condicionadas por )atores de ordem ideol'gica ou etnocntrica. Especialmente clara na

    abundante literatura norte@americana sobre o tema a identi)icao de caractersticas

    ideali(adas das democracias anglo@sa*nicas a americana em particular com a meta a

    ser alcanada no processo.

    "iante de todas essas di)iculdades, talve( a sugesto de Huntington &uanto aodestino a ser dado ao termo desenvolvimento poltico devesse ser acol0ida. %enunciar ao

    termo, porm, no signi)icaria negar o interesse de certas &uestes substantivas para as

    &uais se procurou resposta no debate em torno do conceito e s &uais no alude

    diretamente a e*presso :mudana poltica;. Falar de mudana poltica com respeito

    4rgentina da :guerra su/a;, por e*emplo, )atalmente evocar! &uestes di)erentes das &ue

    seriam evocadas pelo uso da mesma e*presso com respeito nio Sovitica, de um

    lado, ou Dnglaterra, de outro. Io obstante o car!ter e&uvoco das ressonJncias ligadas

    e*presso desenvolvimento poltico e a comple*idade das &uestes envolvidas em sua

    conceituao, no 0! como descon0ecer o )ato de &ue alguns pases e&uacionaram de

    maneira mais est!vel e relativamente consensual certos problemas b!sicos postos pela

    convivncia de seus membros, en&uanto outros se debatem em situaes &ue apresentam,

    em maior ou menor medida, o car!ter de impasse na con)rontao de pro/etos ou )oras

    sociais antagnicas ou envolvem a supresso violenta at &uandoK da possibilidade de

    se mani)estarem politicamente determinados interesses ou pro/etos. Este , sem d6vida,

    um problema &ue merece ateno, se o ob/etivo de con0ecimento da realidade poltica tem

    &ual&uer sentido.

    II - O dilema da a!"o coletiva e da or#aniza!"o poltica$ interesses e solidariedade

    3

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    @ 1 @

    m postulado cl!ssico da sociologia e das cincias sociais em geral, &ue est! pelo

    menos implcito em grande parte do trabal0o te'rico e emprico levado a cabo nessas

    disciplinas, o de &ue as coletividades agem para a promoo de seus interesses grupais

    ou coletivos. "ado um con/unto de indivduos cu/a situao ob/etiva os leva a terem em

    comum determinado interesse, o postulado condu( suposio de &ue tais indivduos,

    espontJnea e naturalmente, agiro de )orma a procurar assegurar a reali(ao de seu

    interesse comum. Cor certo, encontram@se na literatura sociol'gica e*emplos diversos de

    sensibilidade para o &ue pode 0aver de problem!tico na passagem da simples comunidade

    de interesses a!"ocoletiva, um dos &uais corresponde distino de Lar* entre :classe

    em si; e :classe para si;. 8ontudo, raramente se c0egou a tomar como tema a&uelapassagem mesma, isto , ao estudo dos re&uisitos necess!rios a &ue a ao orientada por

    ob/etivos comuns resulte da simples e*istncia de tais ob/etivos.

    m livro importante, da autoria de Lancur +lson, Ar., prope@se /ustamente

    e*plicitar os problemas envolvidos no postulado re)erido e )ormular uma teoria ade&uada

    da ao coletiva.M"e acordo com +lson, a vigncia de tal postulado estaria provavelmente

    baseada na suposio de &ue os indivduos &ue compem os grupos agem movidos por

    motivos egosticos, suposio esta &ual se acrescenta a de racionalidade do

    comportamento individual. 4s conse&Gncias de tais suposies so e*trapoladas para os

    grupos, coletividades ou categorias sociais, e a idia de &ue tais grupos agiro na de)esa

    de seus interesses vista como conse&Gncia l'gica da premissa re)erente ao

    comportamento individual egostico e racional. +lson revela o &ue 0! de logicamente

    inconsistente nessa e*trapolao e sustenta, em contraposio ao postulado mencionado,

    &ue, na medida em &ue se/am egoisticamente motivados e racionais, os indivduos n"o

    agiro :naturalmente; para a promoo do interesse comum. Dsso se deve a &ue, com o

    interesse comum, trata@se de um bem coletivo ou p%&lico, o &ual, por sua pr'pria

    nature(a, se assegurado para uma parcela &ual&uer de um con/unto de indivduos, estar!

    necessariamente assegurado para os demais. "a &ue o bem p6blico no represente por si

    mesmo, para indivduos egostas e racionais, estmulo su)iciente ao dispndio de energia

    ou dos recursos necess!rios sua consecuo. Em conse&Gncia, a presuno deve ser2Lancur +lson, Ar., '(e )o#ic of Collective *ction$ P+&lic oods and t(e '(eor of ro+ps , Iova Nor#-S0oc#en Boo#s, 19OP.

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    &ue a ao coletiva no se reali(ar!, a menos &ue 0a/a coero ou o &ue +lson denomina

    incentivos separados, &ue atuem seletivamente em termos individuais e permitam gan0os

    ou bene)cios individuais, derivados da participao na ao coletiva mas independentes da

    reali(ao do pr'prio bem coletivo como tal.

    + problema assim situado, &ue se re)ere ao con)lito entre interesses particulares e

    interesse comum para o caso da conduta racionalmente orientada, posto de maneira mais

    dram!tica na situao con0ecida na literatura dedicada teoria dos /ogos como o :dilema

    do prisioneiro;.=4, dois indivduos &ue tm a possibilidade de gan0o con/unto mediante a

    adoo de determinada lin0a de ao inscrita entre as alternativas &ue deparam so

    levados, em )uno dos estmulos ao guiada pelo interesse particular contidos na

    estrutura da situao, a adotar racionalmenteestratgias &ue redundam em desastre para

    ambos. + ponto talve( de maior interesse &ue o /ogo do dilema do prisioneiro torna claro &ue, embora a )orma usual de apresentao da situao em &ue os agentes se vem

    envolvidos supon0a a impossibilidade de comunicao entre eles, caso viessem a poder

    comunicar@se e c0egassem a estabelecer um pacto de ao condi(ente com o interesse

    comum, isso apenas signi)icaria, dada a estrutura da situao, &ue cada &ual teria motivos

    adicionais para agir de )orma a promover seu interesse pessoal e a )rustrar o interesse

    coletivo, e o pacto estabelecido estaria destinado a no ser observado, a menos &ue os

    agentes viessem a ser coagidos a observ!@lo.

    4 relevJncia dessas consideraes para o tema &ue pretendemos discutir reside em

    &ue elas apontam para o problema )undamental da convivncia poltica, problema este &ue

    est! necessariamente envolvido na discusso das &uestes associadas idia de

    desenvolvimento poltico, se/a &ual )or o r'tulo com &ue se dese/e design!@las. Q mais do

    &ue simplesmente curioso observar &ue o mesmo dilema encontrado na discusso da ao

    destinada a reali(ar o bem coletivo e na conduta dos participantes no /ogo do dilema do

    prisioneiro encontramos tambm na cl!ssica discusso de Hobbes sobre a transio do

    estado natural para a sociedade civil. Io outro o )oco de intenso debate, no &ual se

    empen0am numerosos autores, com respeito ao )undamento da teoria 0obbesiana da

    obrigao poltica.

    3ma e*posio do :dilema do prisioneiro;, acompan0ada da e*plorao das implicaes e limitaes dal'gica &ue l0e sub/acente, pode ser encontrada em 4natol %apoport,.i#(ts, ames, and De&ates, 4nn4rbor, Lic0igan, Lic0igan niversitR Cress, 19O1, pp. 17= e seguintes.

    5

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    Ao0n Clamenat(, por e*emplo, apegado psicologia :realista; e egostica em &ue

    pretende )undar@se a construo de Hobbes, busca estabelecer o )undamento da obrigao

    e da obedincia necess!ria instaurao da )igura 0obbesiana do soberano 2e,

    conse&Gentemente, da ordem5 em consideraes prudenciais e de interesse pr'prio.>"ado

    &ue o soberano no ter! poder para coagir os recalcitrantes a menos &ue os demais l0e

    obedeam, a motivao egostica correspondente necessidade de segurana ser! ra(o

    bastante para assegurar a obedincia destes 6ltimos- cada &ual tem interesse em &ue o

    soberano ten0a poder, o &ue no se dar! a menos &ue ele se/a obedecido logo, todos

    sero levados a obedecer. Em contraposio, autores como

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    moral, por contradit'ria &ue possa ser a vigncia de tais leis, assim entendidas, com a

    concepo do estado de nature(a como caracteri(ado pela :guerra de todos contra

    todos;.

    Se voltamos an!lise de +lson, a indagao &ue suas proposies suscitam di(

    respeito ao papel desempen0ado na ao coletiva por motivos de ordem moral 2como os

    &ue, na interpretao &ue do

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    de ordem moral ou ideol'gica, os indivduos podem ser levados a se prescreverem

    ob/etivos &ue remetem reali(ao do interesse coletivo , a nature(a do problema b!sico

    se modi)ica. Iaturalmente, +lson poderia contestar &ue o ob/etivo de sua an!lise seria

    precisamente revelar as condies em &ue interesses individuais e interesses coletivos se

    tornam compatveis, e &ue a noo de incentivos seletivos seria a&uela por meio da &ual se

    poderiam enunciar genericamente tais condies, &ue encontraramos no apenas no caso

    da ao compatvel com o bem coletivo moral ou ideologicamente motivada, mas tambm

    no caso em &ue essa ao motivada por e*pectativas de gan0o ou pelo estrito interesse

    individual. + ponto importante, porm, consiste em salientar a di)erena entre esses dois

    casos, di)erena &ue a colocao de ambos sob a rubrica de :incentivos seletivos; dei*a na

    sombra- no segundo caso temos o indivduo atuando em prol do interesse coletivo em

    )uno de uma bargan0a em &ue este l0e al0eio, en&uanto no primeiro o vemos atuandoem )uno de uma norma interior &ue l0e prescreve o interesse coletivo como ob/etivo

    mani)esto de sua ao, ainda &ue o comportamento correspondente possa ter, como

    pretende +lson, :)unes latentes; para o indivduo em &uesto.

    4 importJncia da diversidade de implicaes desses dois casos bastante clara. +

    caso em &ue o indivduo age em )uno de uma norma interior &ue l0e prescreve o

    interesse coletivo corresponde, em terminologia $eberiana, ao comunal, )undada em

    sentimentos de solidariedade. E a introduo da idia de solidariedade e da ao nela

    inspirada &ue altera os termos do problema discutido por +lson, permitindo situar

    )enmenos &ue a estrita perspectiva de interesses individuais tende a obscurecer.

    @ M @

    + e*ame das diversas )ormas pelas &uais a coordenao necess!ria ao coletiva

    assegurada, coordenao esta &ue envolve um problema de organi(ao e portanto de

    poder, redunda no estudo dos )undamentos do consentimento poltico ou da legitimidade

    de uma )orma &ual&uer de dominao e organi(ao poltica. Se tomarmos os )atores

    considerados por +lson como capa(es de indu(ir a ao coletiva 2a coero e os

    incentivos seletivos aos interesses individuais5 e dermos o devido desta&ue ao caso da

    ainda diminudas as c0ances de reali(ao de seus ob/etivos 2altrustas5.

    8

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    ao )undada na solidariedade, envolvendo consideraes de ordem moral ou ideol'gica,

    teremos os elementos de uma classi)icao aparentemente satis)at'ria de estruturas

    organi(acionais, re)erida s )ormas de poder &ue nelas se mani)estam e aos

    correspondentes )undamentos para a a&uiescncia ao poder e o envolvimento nas

    organi(aes em &uesto.

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    desenvolvimento poltico. Em sua )orma mais geral, tal problema consiste na reali(ao da

    pr'pria :)uno poltica; em &ual&uer sociedade dada, isto , envolve a &uesto de

    e&uacionar os problemas &ue derivam da :contiguidade; ou da ocupao em comum de

    determinado territ'rio, colocando@se em termos de se assegurar ade&uada :cooperao

    social@territorial; e de tornar vi!vel a coe*istncia no beligerante ou violenta de

    interesses diversos e de n6cleos solid!rios particulares, por meio da instaurao de alguma

    )orma de solidariedade mais ampla, de base territorial.P 4t o ponto em &ue se pode

    esperar consenso com respeito proposio de &ue teramos a o problema poltico

    )undamental, torna@se possvel pretender obter consenso igualmente com respeito noo

    de desenvolvimento poltico. Sem minimi(ar as )ormid!veis di)iculdades envolvidas, tal

    noo ter! necessariamente de estar re)erida ao maior ou menor *ito com &ue di)erentes

    coletividades de base territorial se revelam capa(es de en)rentar e e&uacionar a&ueleproblema. Em princpio, caberia levar a cabo a tare)a de avaliao desse *ito

    relativamente a &ual&uer sociedade, em no importa &uais circunstJncias 0ist'ricas. Ia

    pr!tica, porm, 0! evidentemente boas ra(es para &ue a discusso relativa a

    desenvolvimento poltico se inscreva nos parJmetros situados pela emergncia 0ist'rica do

    estado@nao como )orma de organi(ao poltica.

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    ma importante lin0a de desenvolvimento dos es)oros de teori(ao sobre a

    realidade poltica se tornou con0ecida sob os r'tulos de :nova economia poltica; e de

    :teoria da escol0a p6blica; 2p+&lic c(oice t(eor5. Sendo sobretudo um produto da

    atividade de economistas &ue se interessam pelos problemas da arena poltica, tais

    es)oros buscam constituir, na e*presso utili(ada por um dos autores &ue a eles se

    dedicam,1W uma :teoria estrita da poltica;, de car!ter a)irmativo e proposicional, em

    substituio aos abundantes :marcos de re)erncia; ou :es&uemas conceituais;, de car!ter

    antes de)inicional, &ue tm resultado dos es)oros c0amados te'ricos dos pr'prios

    cientistas polticos. + trabal0o de construo te'rica se tem a valido, naturalmente, da

    perspectiva e dos recursos pr'prios da cincia econmica. Fundam@se os autores na

    suposio de &ue a economia como cincia no se distinguiria por ocupar@se deste ou

    da&uele tipo de bens ou transaes distinguidos por caractersticas intrnsecas, mas antespor ocupar@se de &ual&uer tipo de situao em &ue um problema de escasse( ou raridade

    este/a envolvido. Essa de)inio permite incluir os problemas &ue tm classicamente

    constitudo o domnio da cincia poltica, onde se trata da con)rontao e do /ogo de

    atores relativamente a decises &ue so ob/eto de divergncias e cu/a colocao em pr!tica

    por meio dos centros de poder da coletividade envolve necessariamente a )rustrao, em

    maior ou menor medida, das pre)erncias de determinados atores. Ia )ormulao utili(ada

    em discusso das relaes entre a economia e as demais cincias sociais por um dos

    autores &ue se tm destacado no campo a &ue estamos nos re)erindo, :a teoria econmica

    2mais precisamente, a microeconmica5 , numa acepo )undamental, &uase uma teoria

    do comportamento racional;, sendo aplic!vel, portanto, sempre &ue ten0amos um

    problema de utili(ao de meios escassos para a consecuo de ob/etivos de &ual&uer

    nature(a 2status social ou poder poltico tanto &uanto bens materiais5.11

    "e acordo com essa orientao, os autores da p+&lic c(oice tm baseado seu

    trabal0o de construo te'rica na concepo de agentes polticos &ue atuam racionalmente

    na escol0a das lin0as de ao a serem adotadas nas transaes estabelecidas entre eles. Ia

    imagem predominante &ue emerge da crescente literatura pertinente, o (omo politic+s o

    103ordon

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    (omo economic+sdos economistas cl!ssicos transposto para a arena poltica, movendo@se

    e)icientemente na manipulao das condies &ue l0e o)erece o ambiente tendo em vista a

    reali(ao de seus interesses pr'prios. Cor certo, a racionalidade e a psicologia egosta

    &ue caracteri(am o (omo economic+scl!ssico no dei*am de ser submetidas a severo

    escrutnio, gan0ando mati(es &ue as resguardam das principais crticas dirigidas &uela

    concepo. 8ontudo, o ponto a salientar &ue as caractersticas atribudas aos atores

    polticos nas )ormulaes te'ricas da :nova economia poltica; levam a v@los como

    agentes em um mercado, como indivduos e organi(aes dotados de grande )le*ibilidade

    em seu comportamento, avessos a consideraes estran0as pr'pria l'gica do mercado

    em &ue atuam e transacionam e sempre prontos a uma boa bargan0a &ue l0es permita

    ma*imi(ar a reali(ao de seus ob/etivos. +s )atores de ordem a)etiva, moral ou ideol'gica

    so dei*ados de lado na medida em &ue poderiam signi)icar restries ao )uncionamentodo :mercado poltico; e ao livre /ogo dos interesses. Ios casos em &ue algum desses

    )atores considerado, como se d! com o )ator ideol'gico em importante volume de

    4nt0onR "o$ns,1Ma discusso tende a restringir@se ao papel por ele cumprido dentro da

    pr'pria l'gica do mercado poltico- em "o$ns, a ideologia no seno um instrumento a

    &ue recorrem os atores para incrementar a racionalidade de seu comportamento

    ma*imi(ador nas condies de incerte(a em &ue so )orados a atuar e tendo em vista os

    custos da obteno de in)ormaes.

    +ra, tal modelo envolve uma suposio )undamental. Ele supe &ue, na

    coletividade cu/a dinJmica poltica se trata de representar, ten0a sido resolvido o problema

    constitucional, isto , &ue 0a/a a adeso generali(ada s regras do /ogo e a vigncia e)etiva

    delas. + pleno )uncionamento do :mercado poltico;, como La* eber mostrou ocorrer

    com o mercado econmico convencional, implica a e*istncia de com+nidade entre os

    atores envolvidos, e*pressa no sentimento de constiturem um todo e na competio de

    todos contra todos, sem e*cluses a priorial0eias l'gica do /ogo de interesses. 4 rigor,

    no corresponderiam s e*igncias do modelo nem mesmo os casos de sociedades em

    &ue, embora o processo poltico se d num &uadro )ormal de regras de)inidas, os atores

    este/am divididos por cises ideol'gicas pro)undas &ue resultem em lin0as de intenso

    antagonismo entre eles, pois no 0averia ento a possibilidade de tratar a ideologia nos

    termos de "o$ns. + tipo de poltica a &ue corresponde o modelo seria ade&uadamente

    124nt0onR "o$ns,*n Economic '(eor of Democrac, Iova Nor#, Harper and %o$ Cublis0ers, 19?7.

    12

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    descrito em termos da poltica :p's@ideol'gica; de &ue )alam v!rios autores

    contemporJneos, supostamente envolvendo grau elevado de :consensus on )undamentals;

    como re&uisito para &ue a atividade poltica se torne uma atividade de bargan0a e de puro

    con)ronto de interesses.1=Em outros termos, a condio de &ue a&ui se trata revela@se

    privilegiada no sentido de &ue nela se ac0a garantida, para a coletividade poltica em

    &uesto, a soluo do dilema proposto por +lson para a ao coletiva em geral.

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    de orientao da ao de seus membros, os &uais se voltaro )atalmente para outras

    &uestes em torno das &uais 0a/a maior divergncia.

    +ra, as organi(aes polticas de base territorial, em particular o estado@nao de

    nossos dias, so organi(aes &ue se definempela pretenso de contar com a adeso

    universal dos 0abitantes de determinado territ'rio. "a &ue, &uanto mais *ito ten0am em

    reali(ar seu pro/eto pr'prio, tanto mais tran&Gila ser! a adeso aos valores &ue propugnam

    e tanto menor a )ora mobili(adora destes, a menos &ue se/a possvel contrapor os valores

    pr'prios da unidade territorial em &uesto aos de outras unidades, produ(indo@se assim o

    desa)io necess!rio a sua revitali(ao 2guerras etc.5. Ia ausncia desse desa)io, o *ito de

    organi(aes do tipo considerado em assegurar o envolvimento valorativo de seus

    membros consiste /ustamente, de maneira aparentemente parado*al, em neutrali(ar o

    debate com respeito a valores en&uanto )undamentos da pr'pria organi(ao, com asubstituio da adeso vigorosa a di)erentes ideologias ou :subculturas; polticas por uma

    cultura poltica comum &ue tender! a assumir as caractersticas atribudas por 4lmond e

    Verba :cultura cvica;,1> de vigncia mais generali(ada mas associada a relativa

    indi)erena ou apatia por parte dos atores polticos, &ue passariam a estar mais voltados

    para seus interesses cotidianos. , /ul0o@de(embro de 19OO.

    14

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    interesse de um ator signi)ica :a ao pela &ual ele se distin#+ede outros atores, visando a

    mel0orar sua posio relativa no con)ronto com estes. 2...5 Cara &ue tal ao se/a possvel

    necess!rio &ue seus resultados se/am mensur!veis isto , passveis de serem avaliados

    em termos de mel(orou pior, de maisou menos e &ue o critrio de mensurao se/a

    comum ao ator e &ueles com respeito aos &uais o ator pretende mel0orar sua posio.

    2...5 m sistema de interesses comporta, portanto, um sistema de avaliaes comuns &ue

    servem a um con/unto de atores...;1O ou se/a, ele re&uer um sistema sub/acente de

    solidariedade, ainda &ue os ob/etivos &ue em tal sistema se compartil0am correspondam

    apenas s condies &ue permitem aos atores se empen0arem no /ogo de vantagens

    comparativas. Cor outro lado, contudo, a constituio de um sistema de solidariedade se

    d! pela re)erncia aos valores de um sistema de interesses, mediante o processo de

    )ormao do &ue Ci((orno denomina :!reas de igualdade;. 8om e)eito, :a&ueles &ueparticipam numa coletividade solid!ria colocam@se, en&uanto membros dela, como iguais

    perante os valores de um determinado sistema de interesses;. Em outras palavras, um

    sistema de solidariedade se constitui pela negao, ainda &ue numa !rea mnima, das

    desigualdades correspondentes a determinado sistema de interesses.17

    [ual, neste conte*to, o lugar da noo de ideologia, &ual vinculamos

    repetidamente a idia de solidariedade em passagens anterioresK Ela corresponde a

    doutrinas ou )ormas de pensamento relativamente estruturadas &ue delimitam o Jmbito do

    compartil0amento de )ins ou ob/etivos o Jmbito da solidariedade , /usti)icando@o em

    termos ticos, 0ist'ricos, :cient)icos; ou outros. +s elementos de emocionalidade,

    antagonismo e rigide( &ue com )re&Gncia se apontam no c0amado :pensamento

    ideol'gico; tm a ver, portanto, com o inevit!vel ob/etivo de separao e distino nele

    envolvido concomitantemente com o ob/etivo de solidariedade e aglutinao.

    @ M @

    [ual a relevJncia de tudo isso para a discusso sobre desenvolvimento polticoK 4

    proposio &ue a&ui &ueremos )ormular, e em torno da &ual nos parece possvel pretender

    obter consenso, a seguinte- o processo de desenvolvimento poltico deve ser entendido

    16Dbidem, pp. M?M@=.17Dbidem, p. M?O.

    15

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    16/42

    como o processo de instaurao e permanente e*panso do :mercado poltico;, no sentido

    em &ue vimos usando a e*presso a prop'sito das construes da teoria da p+&lic c(oice

    tal processo supe ou envolve a crescente e*panso e )ortalecimento da solidariedade de

    base territorial como condio para a eliminao de barreiras ao livre /ogo de interesses,

    derivadas de outros )ocos de solidariedade e antagonismo.

    Essa uma proposio ousada, certamente. Dnevitavelmente dar! a(o alegao

    de &ue a n)ase atribuda solidariedade territorial se deve a pre)erncias condicionadas

    ideologicamente. Cor outro lado, )!cil imaginar as resistncias &ue suscitar! de imediato

    ao erigir em padro do processo de desenvolvimento poltico algo &ue emerge da

    elaborao te'rica de autores &ue muito claramente se inspiram, em seu trabal0o, numa

    concepo ideali(ada da democracia poltica )ormal vigente na Europa ocidental e

    especialmente nos pases de lngua inglesa.%elativamente primeira ob/eo, nossa resposta a de &ue a )ormulao acima

    nos parece derivar do enunciado &ue )i(emos na seo anterior do &ue c0amamos o

    :problema poltico )undamental;- o e&uacionamento dos problemas &ue derivam da

    contiguidade em termos &ue assegurem a convivncia no@beligerante de interesses

    diversos e de n6cleos solid!rios particulares. Q, evidentemente, concebvel &ue se pre)ira,

    na escala &ue vai do consenso beligerJncia ou violncia, o p'lo correspondente a estas

    6ltimas. Carece claro, porm, &ue a e*travagJncia de se pretender )undar &ual&uer

    discusso supostamente poltica no estabelecimento de e&uivalncia entre esta pre)erncia

    e a oposta nos levaria a abandonar o domnio da cincia poltica para entrar no estudo de

    estratgia militar e de tcnicas de represso. Se nosso enunciado da :)uno poltica;

    merece acatamento, numa sociedade de escravos ou de represso total no 0! poltica.

    4 resposta 'bvia a essa maneira de )ormular a &uesto seria, naturalmente, a de

    &ue o estudo de problemas como estratgia militar ou tcnicas de represso 8parte da

    cincia poltica, sendo desnecess!rio assinalar &ue 0! um sentido trivial em &ue isso

    evidentemente certo. Io plano em &ue a&ui nos situamos, contudo, nosso prop'sito

    salientar o papel crucial &ue a idia de autonomia dos atores polticos desempen0a para a

    pr'pria de)inio do problema )undamental da vida poltica. S' e*iste problema poltico na

    medida em &ue temos, numa relao social, uma pluralidade de interesses divergentes &ue

    e)etivamente contam pelo menos potencialmente vale di(er, na medida em &ue os atores

    a &ue correspondem tais interesses so pelo menos potencialmente autnomos. 4 idia de

    16

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    17/42

    interesses divergentes, portanto, tra( necessariamente implcita, sob pena de tornar@se

    irrelevante, a idia de )undamental autonomia dos atores. Las se a pr'pria de)inio do

    problema poltico b!sico em termos da coe*istncia de interesses divergentes implica a

    suposio de agentes autnomos, tal de)inio necessariamente aponta para uma condio

    0ipottica na &ual uma )orma esclarecida de solidariedade se torna a garantia da igualdade

    e o 6nico )ator admissvel de coeso na vida poltica. 4 concepo de "a0rendor),

    segundo a &ual toda e &ual&uer relao de dominao potencialmente ilegtima, 1Ppode

    ser vista, dessa )orma, como a de)inio mesma da &uesto b!sica &ue se apresenta

    pr'pria cincia poltica como tal, e a viso tradicional desta 6ltima como a disciplina &ue

    se ocupa do problema do poder conserva sua valide( sob a condio de &ue a n)ase se

    deslo&ue do termo poder para o termo pro&lema.

  • 8/6/2019 M&U06-Solidariedade, interesses e desenvolvimento poltico

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    em termos de acesso di)erencial a recursos, e*erceria no sentido de tornar )ictcia a

    e*istncia de um mercado poltico capa( de assegurar o :livre; /ogo de interesses em

    particular, a metodologia individualista, um dos pilares das elaboraes dos autores em

    &uesto, tenderia a dissimular a relevJncia de &uestes postas pela e*istncia das classes

    sociais e de outros tipos de agrupamentos e oposies sociais.

    4pli&ue@se ou no tal ob/eo aos autores dap+&lic c(oice, lembremos &ue em

    nosso caso se trata de discutir desenvolvimento poltico. 4ssim, a eliminao dos

    obst!culos vigncia da solidariedade territorial vista como desa)io a ser en)rentado ao

    longo de um processo no &ual o mercado poltico se ampliar! sucessivamente, sendo

    possvel, em princpio, determinar a medida em &ue &ual&uer coletividade dada ter!

    avanado no processo pela medida em &ue ten0a tido *ito em eliminar tais obst!culos.

    Essa eliminao e a ampliao concomitante da solidariedade territorial tm, naturalmente,importantes implicaes de ordem estrutural, em cu/a discusso esperamos poder

    esclarecer e contornar as d6vidas &ue a utili(ao do modelo do mercado como uma

    espcie de :meta; do processo de desenvolvimento poltico suscite.

    @ = @

    + processo de estabelecimento da solidariedade territorial ampla, condio para o

    )uncionamento do mercado poltico, no um processo &ue se desenvolva no mero plano

    da sub/etividade dos atores envolvidos. + compartil0amento de interesses ou ob/etivos

    &ue tal solidariedade implica se d! concomitantemente com a emergncia de uma )orma

    &ual&uer de regulao capa( de prover um princpio ou critrio de igualdade &ue o torne

    possvel. Em outras palavras, assim como uma categoria de indivduos &ue compartil0a

    determinada condio ob/etiva no constitui um grupo e)etivo nem capa( de

    solidariedade en&uanto no d! origem a organi(aes &ue a representem, assim tambm a

    solidariedade territorial no possvel seno em nvel tosco en&uanto no se )aam

    presentes agncias capa(es de prover o )oco em torno do &ual se de)ina, pelo menos, a

    cidadania. 8omo sugere Ci((orno, seguindo %ousseau, s' e*iste sociedade na medida em

    &ue os participantes sabem &ue e*iste uma norma igual para todos,MW o &ue implica a

    e*istncia de agentes capa(es de coloc!@la em pr!tica.

    20Ci((orno, :Dntrodu(ione allo Studio della Cartecipa(ione Colitica;, p. M?O.

    18

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    Dsso signi)ica &ue a instaurao e a e*panso da solidariedade territorial

    necessariamente envolvem o processo de instit+cionaliza!"o poltica. "ois problemas

    podem ser destacados em cone*o com esse processo, os &uais correspondem a duas

    acepes &ue a e*presso costuma ter na literatura. + primeiro se re)ere e)etividade da

    presena da aparel0agem governamental, instaurao de um aparato &ue se possa

    constituir em )oco e)etivo de decises relevantes para toda a coletividade.

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    distinguidos, de instit+cionaliza!"o do poder e instit+cionaliza!"o da a+toridade,

    apontando essa distino para os graus diversos de acatamento, estabilidade e e)icincia

    &ue podem igualmente vir a obter )ormas de controle poltico &ue diferem&uanto ao grau

    em &ue os interesses &ue se trata de promover por meio delas so interesses e)etivamente

    compartil0ados pela coletividade correspondente, ou se/a, &uanto ao grau em &ue se

    )undam em e)etivasolidariedade. 4 idia de institucionali(ao do poder aponta, assim,

    oposta de institucionali(ao da autoridade, para uma situao &ue, caracteri(ando@se

    por grau relativamente redu(ido de coero direta, necessariamente envolve, em alguma

    medida, a manipulao ideol'gica. Voltaremos ao assunto adiante.

    4 esses dois aspectos do problema da institucionali(ao poltica correspondem,

    #rosso modo, no nvel estrutural, dois tipos de barreiras vigncia da solidariedade

    territorial ampla. + primeiro tem a ver com problemas de car!ter ecol'gico e relativos aograu de desenvolvimento da estrutura de comunicaes e intensi)icao das transaes

    de nature(a econmica no interior de uma coletividade dada. "ois casos e*tremos ilustram

    a relevJncia desse )ator- o caso de uma coletividade &ue no apresenta :)ronteiras;

    internas correspondentes a (onas de rare)ao acentuada das comunicaes e transaes

    entre seus membros, ac0ando@se bem integrada no Jmbito do territ'rio em relao ao &ual

    se de)ine a sua base )sica e o de outra &ue, embora abarcando determinado territ'rio na

    de)inio de sua base )sica, na verdade se apresenta )ragmentada e dispersa, compondo@se

    de :il0as; de comunicao mais intensa cercadas de populaes mais ou menos isoladas,

    com as &uais as comunicaes e transaes no se do seno precariamente. Io segundo

    caso teremos seguramente muito maiores di)iculdades para o desenvolvimento de ampla

    solidariedade re)erida ao marco da coletividade como um todo.

    + problema em &uesto consiste, assim, na necessidade de se )a(erem presentes,

    /unto generalidade dos membros potenciais da coletividade, os instrumentos

    organi(acionais e os smbolos de toda ordem em torno dos &uais se con)igura o pro/eto

    coletivo ou nos &uais se )unda a pretenso de determinada aparel0agem governamental de

    vir a constituir@se em )onte de decises &ue se tornem e)etivas em todo o Jmbito de

    determinado territ'rio. "o ponto de vista sub/etivo, essa :presena; tem implicaes

    importantes no sentido de contribuir para &ue, em alguma medida, a de)inio da pr'pria

    identidade pessoal dos membros se )aa por meio da re)erncia coletividade, como

    condio para a emergncia de uma e)etiva identidade coletiva. + processo a envolvido

    20

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    corresponde dimenso psicol'gica da noo de :mobili(ao social;, com a &ual se

    indica a substituio de um marco local ou :paro&uial; por um marco nacional na

    orientao dos atores. 8om o tipo de barreiras a&ui considerado, portanto, trata@se do &ue

    certos autores dedicados ao tema do desenvolvimento poltico tm designado em termos

    de nation-&+ildin#estate-&+ildin#e outros em termos da soluo dada aos problemas de

    :autoridade; e :identidade;.M>

    + segundo tipo de barreiras vigncia da solidariedade territorial ampla se re)ere

    e*istncia e ao vigor de )ocos particulares de solidariedade &ue compitam com a pr'pria

    organi(ao de base territorial.

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    solidariedade potencial ou real &ue tendem a apresentar@se como alternativos

    coletividade territorial &ue os abrange.

    Ias vicissitudes da e*perincia 0ist'rica de constituio e desenvolvimento do

    moderno estado nacional, este segundo tipo de barreiras solidariedade territorial, ainda

    &ue possa corresponder a solidariedades parciais de )undamentos os mais diversos, tende a

    consubstanciar@se em dois problemas especialmente relevantes. + primeiro corresponde a

    vnculos de nature(a tnica, &ue emergem como &uestes salientes em certas e*perincias

    0ist'ricas de construo nacional no Jmbito de determinado territ'rio. + segundo

    corresponde ao problema das classes sociais.

    + primeiro desses problemas tem sido ob/eto de estudo em cone*o com o tema

    geral da integrao nacional ou internacional, e naturalmente gan0ar! relevJncia medida

    &ue se consolide a tendncia, presente em car!ter incipiente no panorama internacionalcontemporJneo, )uso dos estados nacionais e*istentes em unidades de alcance

    territorial cada ve( mais amplo. Vale a pena destacar a&ui tais problemas para c0amar a

    ateno para o )ato de &ue a concepo de desenvolvimento poltico apresentada no est!

    necessariamente re)erida es)era correspondente ao estado@nao, a/ustando@se

    considerao da eventual e*panso do Jmbito no &ual se desenvolve o processo poltico

    para alm da&uela es)era. 4 re)erncia solidariedade territorial ampla e amplitude

    concomitante do :mercado poltico; leva naturalmente, na verdade, a visuali(ar uma

    possvel )ase de solidariedade e de e)etiva organi(ao poltica de alcance planet!rio,

    medida &ue se torne vi!vel a superao dos :)ocos particulares de solidariedade;

    correspondentes aos atuais estados nacionais. 4 esse respeito, ilustrativo da relevJncia

    da concepo a&ui adotada o )ato de &ue o perodo de maior estabilidade e moderao

    nas relaes internacionais posteriormente emergncia do estado@nao moderno

    corresponde talve( vigncia, nos sculos VDDD e D, do sistema con0ecido como de

    :balana de poder; ou :e&uilbrio de poder;, &ue representou clara apro*imao

    relativamente s condies envolvidas em nossa concepo do mercado poltico na es)era

    do sistema internacional de limites restritos ao cen!rio europeu.

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    diversos estados envolvidos 2cu/a relevJncia te'rica geral se tornar! mais clara adiante5 e

    de certa solidariedade b!sica resultante da 0omogeneidade cultural e ideol'gica, pela &ual

    o ambiente internacional europeu de ento contrasta vivamente com o panorama de

    0eterogeneidade e de cises ideol'gicas pro)undas do cen!rio internacional da maior parte

    do sculo .

    [uanto ao problema correspondente s classes sociais, constitui ele um problema

    de particular importJncia para o nosso tema por duas ra(es- por sua ubi&Gidade, por um

    lado, e pela clara implicao &ue acarreta, por outro, de desigualdades nas oportunidades

    vitais e de restries, na mesma medida, ao )uncionamento do mercado poltico.

    Iaturalmente, os obst!culos opostos por vnculos de nature(a tnica

    solidariedade territorial de Jmbito correspondente a uma sociedade &ual&uer /! envolvem

    &uestes de igualdade e desigualdade. 8omo se disse, trata@se com tais vnculos, assimcomo com as classes sociais, de )ocos de solidariedade capa(es de competir com a

    solidariedade demandada pela coletividade mais ampla em &ue se inserem. +ra, tal

    capacidade, o vigor &ue revelam os agrupamentos tnicos como n6cleos de solidariedade,

    deriva precisamente de &ue eles se constituem em pontos de re)erncia em termos dos

    &uais os indivduos passam a poder aglutinar@se e distinguir@se, percebendo@se como

    iguais em relao aos demais membros do grupo e como di)erentes com respeito a outros.

    4s concluses a &ue c0egamos acima, ao discutir o signi)icado do envolvimento

    :valorativo; nas organi(aes de &ue )ala Et(ioni, valem naturalmente para a solidariedade

    prestada a &ual&uer agrupamento social- ela est! sempre associada capacidade &ue ten0a

    o )oco particular de solidariedade em &uesto para apartar e distinguir um con/unto de

    indivduos com relao ao seu ambiente social mais amplo, o)erecendo@l0es ao mesmo

    tempo a possibilidade de se perceberem como iguais com relao a algum ponto de

    re)erncia &ue se torne socialmente relevante. Solidariedade, como vimos com Ci((orno,

    envolve sempre igualdade, se/a &ual )or o critrio em torno do &ual esta se de)ina.

    8ontudo, uma di)erena importante ocorre entre os agrupamentos tnicos e as

    classes sociais com respeito aos problemas centrais de &ue a&ui se trata. 4inda &ue a

    coe*istncia de grupos tnicos possa naturalmente tomar a )orma de domnio de uns sobre

    outros, com a estrutura de castas correspondendo ao caso de maior cristali(ao de

    relaes 0ier!r&uicas desse tipo, essa possibilidade no resulta de caractersticas

    intrnsecas ao relacionamento de tais grupos, sendo concebvel &ue sua coe*istncia se d

    23

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    em termos parit!rios no &ue se re)ere aos princpios da estrati)icao social. Celo menos

    nos casos, a &ue acima aludimos, em &ue determinados processos de constituio nacional

    se viram obstados por &uestes relacionadas a solidariedades tnicas, o problema

    envolvido tende a corresponder superao das resistncias o)erecidas por )atores como

    tradies ou lnguas distintas, sem implicaes necess

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    palavras, a &uesto consiste na e*tenso em &ue se torna possvel, em dada sociedade,

    substituir a re)erncia direta ao pr'prio indivduo pela re)erncia a certa condio &ue ele

    compartil0e com outros, ou a este ou a&uele agrupamento de &ue participe, para o )im de

    determinar as c0ances vitais de &ue des)ruta. 4ssim, a simples multiplicao dos )atores

    &ue seria necess!rio levar em conta ao se tratar de estabelecer a estrutura de desigualdade

    de determinada sociedade para ilustrar, o )ato de &ue devamos con0ecer, na avaliao

    das oportunidades &ue se o)erecem a certo indivduo, no apenas, por e*emplo, a maneira

    pela &ual ele se situa relativamente estrutura de propriedade, mas tambm, digamos, seu

    nvel de educao, a ocupao espec)ica &ue desempen0a etc. signi)ica um incremento

    na possibilidade de estabelecimento de solidariedade territorial ampla, representando uma

    e*panso no coe)iciente geral de igualdade da sociedade em &uesto. Dsso dispensa &ue

    nos concentremos mais detidamente no conceito mesmo de classe social- basta@nos amedida em &ue ocorra a predeterminao das c0ances vitais dos indivduos pela

    participao em determinada condio.

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    perspectiva mais ampla, o pr'prio estado@nao, correspondendo sem d6vida a uma

    condio no volunt!ria de &ue os indivduos participam, surge como novo )oco

    partic+larde solidariedade em oposio a uma concebvel solidariedade planet!ria.

    4ssim, a re)erncia coe*istncia de :n6cleos solid!rios particulares; contida no

    enunciado antes apresentado do e&uacionamento da :)uno poltica; aponta, na

    perspectiva de desenvolvimento poltico, para interesses grupais correspondentes a grupos

    de nature(a volunt!ria, estando sub/acente a suposio de &ue se trata de coali(es

    relativamente inst!veis e cambiantes em sua composio e durao. 4inda &ue a situao

    a&ui descrita possa merecer a &uali)icao de ut'pica, a presuno envolvida ,

    naturalmente, a de &ue seria possvel, em princpio, pretender estabelecer graus diversos

    de apro*imao a ela no estudo de sociedades concretas particulares.

    @ > @

    m problema importante para o tema geral a&ui discutido no )oi ainda seno

    mencionado passageiramente em algumas oportunidades, apesar de ter estado sub/acente a

    diversos aspectos de nossa discusso.

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    di)erentes estruturas &ue se possam distinguir, se partimos da suposio de &ue o )ato de

    &ue no encontremos a coero :pura e simples; no signi)ica ausncia de coeroK

    Seria possvel introdu(ir o debate desse ponto propondo &ue a situao acima

    descrita em termos da vigncia da :cultura cvica; de &ue )alam 4lmond e Verba

    2caracteri(ada pela a&uiescncia mais generali(ada, ainda &ue relativamente ap!tica, aos

    componentes b!sicos da organi(ao poltica5 envolveria, em contraste com a situao em

    &ue os atores polticos aderem vigorosamente a di)erentes ideologias, a presena de menor

    coe)iciente de coero no processo poltico. Cor um aspecto isso parece bastante claro- a

    situao em &ue temos a populao cindida em torno de ideologias diversas, nas &uais se

    propem ob/etivos distintos para a pr'pria organi(ao poltica, necessariamente encerra

    um grau comparativamente elevado de )rustrao de pre)erncias intensas de parcelas

    ponder!veis de atores polticos, se/a nas condies em &ue alguma das ideologias politicamente dominante 2sem poder impor@se de ve(, contudo, caso em &ue a pr'pria

    de)inio da situao se veria alterada5, se/a na condio correspondente a um impasse ou

    empate entre as di)erentes )oras em con)ronto. + grau de )rustrao inevit!vel de

    pre)erncias intensas ir! )atalmente redu(ir@se na medida em &ue os problemas &ue se

    apresentam como &uestes vivas e merecedoras da ateno dos atores passem a situar@se,

    como se d! no primeiro caso, no plano de interesses passveis de serem ob/eto de

    negociao e bargan0a 2o plano :operacional;, por contraste com o :constitucional;, na

    terminologia de Buc0anan e

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    Io plano da elaborao de modelos te'ricos possvel resolver por 0ip'tese o

    problema- a plena vigncia do mercado poltico pode ser descrita de )orma a incluir a

    ma*imi(ao da igualdade como re&uisito para a eliminao de )ocos particulares de

    solidariedade e antagonismo. ma viso dinJmica ou processual do problema, porm,

    e*ige &ue se ten0am em conta as indagaes suscitadas pelo tema da institucionali(ao

    poltica, especi)icamente o )ato de &ue esta pode corresponder, nos termos da distino

    anteriormente estabelecida, tanto a institucionali(ao da autoridade &uanto a

    institucionali(ao do poder, envolvendo graus diversos de promoo de ob/etivos

    compartil0ados ou de solidariedade e)etiva, ou, ao revs, de manipulao.

    Seria evidentemente impr'prio pretender considerar a&ui certas rami)icaes mais

    comple*as do problema, onde a coero e portanto algum tipo de desigualdade surge

    como condio da pr'pria vida social organi(ada e como ingrediente inevit!vel, medianteo processo de sociali(ao, da pr'pria de)inio da identidade pessoal em termos da &ual

    &ual&uer pro/eto de autonomia individual necessariamente se estabelecer!. Se partimos de

    suposies realistas com respeito inevitabilidade da coero e de alguma medida de

    desigualdade, suposies estas &ue no so incompatveis com a pretenso de redu(ir o

    grau de predeterminao da desigualdade por )atores como os &ue tm a ver com o

    problema geral da estrati)icao social, a &uesto a de se a e*istncia de desigualdades

    ob/etivas em condies de consenso implica necessariamente manipulao e :)alsa

    conscincia; ou se, ao contr!rio, seria possvel )alar de :conscincia ade&uada; ainda &ue

    esta envolvesse o recon0ecimento e alguma )orma de aceitao de tais desigualdades. Essa

    maneira de colocar o problema evoca )atalmente a vel0a &uesto da possibilidade de se

    )alar de :interesses ob/etivos;, &ue seriam imput!veis a este ou a&uele indivduo ou

    con/unto de indivduos independentemente de sua pr'pria percepo ou pre)erncia

    e*pressa. %esponder a)irmativamente indagao a contida redundaria, naturalmente, em

    dar acol0ida manipulao mais total ao totalitarismo e ao terror em nome da ob/eo

    manipulao.

    Dsso no signi)ica, porm, &ue este/amos impossibilitados de )a(er uso signi)icativo

    da idia de manipulao e de )alsa conscincia na caracteri(ao da situao prevalecente

    em determinada sociedade. m estudo de Lic0ael Lann, no &ual se empreende ampla

    discusso dos dados de numerosas pes&uisas empricas relacionadas com o suposto

    )undamento consensual das democracias inglesa e americana, mostra de maneira

    28

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    ine&uvoca o sentido rigoroso e a utili(ao emprica precisa &ue podem ser dados a tais

    noes.MO8omo argumenta Lann com relao ao tema da possvel )alsa conscincia por

    parte da classe trabal0adora dos pases em &uesto, :o conceito de )alsa conscincia

    v!lido se podemos demonstrar duas de trs coisas- &ue um processo e)etivo de

    doutrinao ocorre &ue ele ou resulta claramente na mudana dos valores da classe

    trabal0adora ou, reali(ando@se de maneira incompleta, dei*a os valores &ue so ob/eto de

    doutrinao em con)lito com valores XdesviantesT na mente do trabal0ador e, em terceiro

    lugar, &ue se/amos capa(es, em am&osos casos, de ordenar os con/untos rivais de valores

    relativamente a sua XautenticidadeT para o trabal0ador, se &ueremos poder decidir &ual

    deles o mais XverdadeiroT;.M7

    4pesar da di)iculdade da tare)a, a reviso &ue )a( Lann salienta como o material

    emprico reunido nas pes&uisas por ele discutidas no apenas mostra o &ue relativamente simples o processo de doutrinao e manipulao, &ue tem lugar por meio

    de instituies como as escolas e a imprensa, mas tambm os e)eitos &ue dele resultam em

    termos de )alsa conscincia. Esses e)eitos se revelam, no plano psicol'gico, na ntida

    es&ui(o)renia &ue tende a caracteri(ar a postura dos trabal0adores dos dois pases

    estudados perante os valores dominantes em suas respectivas sociedades- mani)estando

    adeso a tais valores &uando )ormulados em termos de princpios abstratos, repudiam@nos

    &uando os mesmos valores so transpostos em termos de problemas de imediata

    relevJncia para sua vida cotidiana e suas atividades concretas como trabal0adores.

    E*iste, assim, sem a necessidade do recurso problem!tica noo de interesses

    ob/etivos, a possibilidade de se &uali)icar, em termos empricos, a nature(a do consenso

    eventualmente obtido em dada sociedade. Las 0! outro aspecto relevante com respeito ao

    problema da manipulao, aspecto este &ue, embora vinculado em 6ltima an!lise &uesto

    das relaes entre a&uiescncia sub/etiva e igualdade ob/etiva, deve ser tratado

    independentemente dela. %e)erimo@nos ao )ato de &ue, mesmo numa sociedade em &ue

    0ipoteticamente se reali(e o limite m!*imo concebvel de igualdade de oportunidades,

    poderia ainda mani)estar@se uma )orma :residual; de manipulao, &ue teria a ver com os

    mecanismos institucionais de encamin0amento dos problemas a serem ob/eto de

    26Lic0ael Lann, :

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    deliberao por parte das agncias de deciso da coletividade. MP

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    de)inem estreitos :canais; de solidariedade ao longo dos &uais se estende precariamente o

    mercado poltico e se processa o /ogo de interesses, canais estes correspondentes aos

    e*guos recursos de comunicao &ue con)iguram a limitada integrao e*istente. Entre

    esses canais tende a tomar vulto o &ue di( respeito a relaes de tipo clientelstico, em &ue

    o vnculo pessoal caracterstico da poltica pr@ideol'gica amplia seu alcance para alm de

    simples relaes de vi(in0ana e parentesco, dando origem a redes de relaes de

    dependncia e intercJmbio &ue envolvem clientes e :patres;. "o ponto de vista do

    processo de institucionali(ao poltica, assumem relevJncia, a&ui, os problemas

    relacionados com a institucionali(ao do poder.

    8om a poltica ideol'gica, temos, numa estrutura em &ue se preservam marcadas

    desigualdades, o processo de mobili(ao social e integrao territorial levado a um ponto

    avanado, do &ue deriva a preponderJncia &ue passam a assumir laos de nature(auniversalstica, relativos sobretudo s posies de classe, sobre as ligaes pessoais e

    particularsticas na determinao dos )ocos de solidariedade relevantes no processo

    poltico. Ia medida em &ue se atuali(am as caractersticas pr'prias deste est!dio,

    ideologias de crescente so)isticao vm a de)inir os marcos de lealdade e as lin0as de

    antagonismo do sistema. Em termos das duas dimenses da noo de institucionali(ao

    poltica, as &uestes )undamentais &ue agora se colocam no processo poltico di(em

    respeito institucionali(ao da autoridade, re)erindo@se, em 6ltima an!lise, aos temas da

    igualdade e da legitimidade. Lais imediatamente, porm, do ponto de vista dos )ocos

    dominantes de interesses em torno dos &uais se desenvolveu o processo de integrao

    correspondente ao est!dio anterior, a emergncia da poltica ideol'gica recoloca o

    problema da institucionali(ao do poder, na medida em &ue ela d! origem argGio ou

    contestao com respeito )orma espec)ica de organi(ao poltica em termos da &ual

    a&uele processo se cumpriu ou &ue dele resulta. "e acordo com as di)erentes categorias

    de atores polticos em nome dos &uais, de maneira sucessiva ou parcialmente

    concomitante, se promove essa contestao 2:classes mdias;, trabal0adores urbanos,

    camponeses etc.5, bem como com o grau de *ito obtido pelos )ocos dominantes de

    interesses em subsistir ou rea)irmar@se como poder institucionali(ado atravs das

    vicissitudes deste est!dio, a poltica ideol'gica assume caractersticas diversas.

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    poder, as situaes &ue Huntington descreve em termos de :pretorianismo radical; e

    :pretorianismo de massas;, caracteri(adas pela emergncia, respectivamente, dos )ocos de

    interesses e solidariedade correspondentes s :classes mdias; e s :classes populares;. A!

    em nveis de mais bem sucedida institucionali(ao do poder, &ue podem apro*imar@se em

    graus diversos da superao da poltica ideol'gica e do ideal de e)etiva institucionali(ao

    da autoridade de acordo com as )ormas em &ue nelas se combinem os ingredientes de

    coero, desigualdade e manipulao, teramos situaes &ue poderamos designar em

    termos de :poltica de partidos ideol'gicos; para casos como os correspondentes, por

    e*emplo, poltica )rancesa e italiana contemporJnea :sistemas de mobili(ao;, para os

    casos de sistemas resultantes de revolues de bases populares e )undados em intensa

    mobili(ao simb'lica e :cultura cvica;, para casos como os contemplados por 4lmond e

    Verba. "e maneira geral, a dinJmica da poltica ideol'gica, cu/o clma* pode ser vistocomo correspondendo :poltica de partidos ideol'gicos;, tem implicaes relativamente

    comple*as para a concepo do mercado poltico &ue a&ui se adota, das &uais nos

    ocuparemos adiante- representando, por um lado, a e*panso dele com relao ao est!dio

    anterior, limita@o, por outro lado, de maneira importante.

    Finalmente, a :poltica p's@ideol'gica; corresponde vigncia do &ue designamos

    antes pela e*presso :solidariedade territorial plena;, envolvendo o cumprimento cabal do

    processo de mobili(ao e integrao territorial e a ausncia de )ocos internos de

    solidariedade capa(es de competir com a pr'pria sociedade pela lealdade dos atores, com

    a igualdade e a :intercambiabilidade; destes levadas a um grau m!*imo. Em sua )orma

    plena consiste, naturalmente, numa condio 0ipottica, cu/as caractersticas se a/ustam ao

    modelo do mercado poltico e do livre /ogo de interesses anteriormente apresentado.

    4 idia mestra em torno da &ual se estabelece a distino entre os est!dios a do

    grau de e*panso do mercado poltico, a &ual se v )acilitada ou entravada de acordo com

    o alcance mais ou menos restrito das )ormas de solidariedade prevalecentes. Essa

    perspectiva permite tra(er lu( nova a certos problemas reiteradamente deparados na

    an!lise do processo de trans)ormao poltica.

    ma &uesto &ue tem envolvido di)iculdades nessa an!lise, &uer se trate do caso

    brasileiro ou de outros conte*tos :subdesenvolvidos;, a da interpretao do signi)icado

    da passagem da poltica :tradicional; a novas )ormas de se processar o /ogo poltico. Em

    geral, a an!lise tende a apontar a vigncia, na poltica tradicional, de arran/os de tipo

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    clientelstico, caracteri(ados pelos vnculos de dependncia pessoal a &ue acima aludimos,

    e a salientar o papel de mediao a e*ercido pelo :patro; entre a populao

    territorialmente dispersa e os centros de poder da coletividade. Io caso brasileiro, a

    situao con0ecida como coronelismo se en&uadra, naturalmente, nesse )oco. Ia situao

    assim descrita, destacam@se ento os elementos de bargan0a e de /ogo pragm!tico de

    interesses &ue a caracteri(am, os &uais, na medida em &ue no se a/ustam aos traos

    atribudos ao modelo do processo poltico orientado por consideraes de ordem

    ideol'gica, so vistos como indicativos, em si mesmos, do est!dio de atraso ou

    :subdesenvolvimento; pr'prio da poltica tradicional. 4 poltica ideol'gica, entendida

    simplesmente como a&uela &ue se desenrola de acordo com :valores; e sem discusso

    e*plcita do &ue isso signi)ica, erigida em meta do processo de desenvolvimento poltico

    e contraposta de maneira no muito clara a uma :poltica de interesses; de &ue ela,rigorosamente, no )aria parte.

    +ra, a impropriedade disso se torna evidente &uando o paradigma assim

    estabelecido de poltica ideol'gica con)rontado no mais com a poltica :tradicional;,

    mas com o caso de pases em &ue o processo poltico se distingue pelo arrefecimentoda

    disputa ideol'gica intensa prevalecente em momentos anteriores de sua 0ist'ria poltica. 4

    evoluo do movimento social@democr!tico na 4leman0a o car!ter de :subcultura;, em

    &ue convivem ob/etivos revolucion!rios ret'ricos com a coe*istncia crescentemente

    pragm!tica com o stat+s 9+o, &ue marcou o movimento comunista em determinadas

    regies da Dt!liaM9dados como esses apontam para um estado de coisas &ue a perspectiva

    recm@discutida no pode ver seno em termos de degenerescncia da poltica ideol'gica,

    erigida em poltica :autntica;, o &ue d! origem a di)iculdades insuper!veis. Sem d6vida,

    ocorrncias dessa nature(a podem corresponder, em princpio, a casos de )alsa conscincia

    resultantes de um processo de manipulao bem sucedido seria di)icilmente sustent!vel,

    porm, a pretenso de redu(ir todos os numerosos e*emplos da tendncia &ue elas

    representam a simples manipulao, negando@l0es &ual&uer substrato de e)etiva reduo

    das desigualdades sociais.

    4 perspectiva &ue a&ui se propugna escapa de tais di)iculdades. 4 poltica

    ideol'gica representa evidentemente um avano com respeito poltica tradicional na

    29Sobre a noo de subcultura, nesse sentido, ve/am@se o artigo citado de Ci((orno e os trabal0os de seuscolaboradores, includos no mesmo n6mero de 7+aderni di Sociolo#ia, destinados an!lise de dadosempricos.

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    medida em &ue com ela se amplia o Jmbito das relaes solid!rias de um marco

    particularstico restrito para outro de)inido por critrios de nature(a universalstica. Q

    claro, porm e no seria necess!rio salient!@lo no )ossem as con)uses in/usti)icadas

    &ue a&ui se estabelecem , &ue o /ogo de interesses continua a dar@se. [uanto mais e)etivo

    se/a o apelo solidariedade grupal, &uer de classe ou de outro tipo, contido nas

    ideologias, isto , &uanto mais bem sucedidas se/am estas 6ltimas em promover a e)etiva

    identi)icao dos interesses individuais com os interesses grupais 2*ito este &ue tende a

    corresponder sobretudo aos momentos iniciais de intensa mobili(ao ideol'gica5, tanto

    maiores restries isso implicar! e a&ui est! o aspecto da poltica ideol'gica &ue

    apreendido e salientado na oposio entre poltica ideol'gica e :poltica de interesses;

    ao mercado poltico, no sentido de &ue tanto menos propcias sero as condies

    ocorrncia do &ue se e*prime pela idia de =o#ode interesses, envolvendo bargan0a &uenormalmente re&uer compromisso com respeito aos ob/etivos grupais. Em condies

    normais, contudo, o /ogo de interesses, nesse sentido, se dar! mesmo ao longo das lin0as

    &ue separam os diversos n6cleos ideologicamente solid!rios. 4lm disso, superado apenas

    o momento de maior espontaneidade correspondente irrupo do movimento ideol'gico

    e de intensa iguali(ao &ue a ele se associa, o /ogo de interesses passar! inevitavelmente

    a dar@se dentro do pr'prio movimento, e o car!ter pac)ico e )ora de &uesto da adeso

    generali(ada aos ob/etivos coletivos no representar! seno um estmulo nessa direo-

    no outra a constatao b!sica envolvida na reiterao das tendncias burocrati(antes e

    oligar&ui(antes &ue caracteri(ariam os movimentos ideol'gicos, )enmeno com respeito

    ao &ual se impe a re)erncia a %obert Lic0els. Finalmente, preciso ter em mente a

    possibilidade 'bvia de &ue a con)rontao ideol'gica se resolva pela vit'ria de um dos

    contendores, ao cabo, por e*emplo, de um processo de nature(a revolucion!ria,

    supostamente criando@se condies para a reorgani(ao da sociedade de )orma a se

    tornar possvel, como corresponde naturalmente aos ob/etivos de um movimento

    revolucion!rio, a instaurao da :solidariedade territorial plena; em novos termos.

    Estariam os partid!rios do paradigma de poltica ideol'gica em discusso preparados para

    recon0ecer tambm a&ui a :degenerescncia; da poltica ideol'gicaK 8omo conciliar a

    oposio entre poltica ideol'gica e poltica de interesses, na&ueles termos, com a

    suposio )re&Gente de &ue os atores envolvidos na primeira buscam precisamente criar

    condies nas &uais o processo poltico tender! a trans)ormar@se no simples /ogo de

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    interesses, mediante a eliminao de )ocos particulares de solidariedade pela adeso

    universal ao n6cleo de solidariedade a &ue cada &ual se vinculaK

    4 concluso um trusmo, o &ual, porm, no conte*to da presente discusso, tem

    rami)icaes &ue talve( no o se/am na mesma medida- poltica interesse, /ogo de

    interesses mas /ogo de interesse &ue supe marcos solid!rios desenvolvimento poltico

    a eliminao das barreiras de &ual&uer tipo ao estrito /ogo de interesses, o &ue implica a

    e*panso da solidariedade dito em termos do aparente parado*o anteriormente

    destacado, cu/a )eio parado*al se ter! dissipado, esperamos, ao cabo desta discusso,

    desenvolvimento poltico a e*panso tanto do :puro; /ogo de interesses &uanto da

    solidariedade. 4ssim, o &ue 0! de especi)icamente :subdesenvolvido; na poltica

    clientelista, em geral, e no :arran/o coronelista; brasileiro, em particular, no o )ato de

    &ue o processo poltico assuma a as caractersticas de bargan0a e de /ogo pragm!tico deinteresses, mas antes o )ato de &ue tal /ogo se d de )orma restrita a determinados canais

    &ue signi)icam limitaes ao mercado poltico. Cor seu turno, a poltica p's@ideol'gica, na

    perspectiva apresentada e com as &uali)icaes estruturais atribudas ao est!dio assim

    descrito, deve ser vista como representando um real passo )rente no processo de

    desenvolvimento.

    I - *+toritarismo e 2rasil rande3

    Cara muitos dos autores &ue se tm curvado sobre o panorama poltico brasileiro

    atual, a &uesto b!sica tem sido a de at &ue ponto o regime implantado em 19O>

    e&uivaleria a um caso de continuidade ou descontinuidade com respeito s :reais;

    tendncias evolutivas do processo poltico brasileiro no perodo de algumas dcadas.

    %epresentaria o perodo &ue vai de 19>? a 19O> um 0iato cu/a caracterstica de relativa

    abertura apenas dissimularia os componentes autorit!rios )undamentais do sistema vigente

    pelo menos desde 3et6lio Vargas e &ue teriam sido consolidados e e*purgados de

    elementos esp6rios no regime autorit!rio agora em vigorK +u deveria este 6ltimo ser

    interpretado como nova reverso de tendncias democrati(antes &ue se viriam

    consolidando anteriormente, uma ve( superado o revs representado pelo perodo

    getulistaK 4 resposta para tais &uestes s ve(es procurada, sobrepondo@se certa

    tem!tica do gosto de te'ricos recentes do processo de desenvolvimento poltico a uma

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    tradio de pensamento de ra(es brasileiras relativamente remotas, nas caractersticas de

    uma :cultura poltica; brasileira de origens seculares.=W8om a ampliao do )oco no &ue

    se re)ere ao perodo de tempo abrangido, esse debate se reprodu( parcialmente na

    discusso, &ue de tempos em tempos se retoma, sobre o primado relativo do :estado; ou

    da :sociedade; na evoluo 0ist'rica do pas ou, para retomar os termos em &ue mais

    recentemente se )ormulou a &uesto, sobre o predomnio, nessa evoluo, das

    caractersticas de :representao; ou :cooptao;.=1

    4 discusso precedente nos parece prover um marco de re)erncia 6til para situar

    ade&uadamente o alcance das &uestes envolvidas em tais debates. 4 nosso ver, o &ue no

    se tem percebido claramente &ue as duas verses do debate, com o alcance diverso &ue

    tende a ad&uirir &uanto ao perodo abrangido nas interpretaes divergentes, re)erem@se a

    dois est!dios distintos do processo de desenvolvimento poltico do pas. + problemaenvolvido na discusso relacionada com estado ou sociedade, patriarcalismo ou estamento

    burocr!tico, prioritariamente um problema de institucionali(ao do poder ou state-

    &+ildin#, correspondendo basicamente ao primeiro tipo de obst!culos ao estabelecimento

    do mercado poltico &ue acima salientamos e s condies &ue associamos ao est!dio da

    poltica :tradicional; ou pr@ideol'gica. Cor seu turno, o problema de autoritarismo ou

    democracia coloca@se no momento em &ue o desenrolar do processo de desenvolvimento

    propicia as condies para a emergncia da poltica ideol'gica.

    Io nos ocuparemos a&ui dos condicionantes estruturais, a longo pra(o, da )orma

    espec)ica assumida pela transio brasileira para o est!dio ideol'gico.=M 8ontudo, o

    diagn'stico dos )atores &ue levam ao autoritarismo alemo reali(ado por Barrington

    Loore parece apreender muitas das causas &ue e*plicam a orientao autorit!ria da

    evoluo brasileira.==4 agricultura comercial implantada com base num sistema de tipo

    la&or-repressive, assentado na represso do trabal0o, de &ue a escravido representa o

    caso limite a propenso )uso, a certa altura do processo de consolidao do :centro;

    30Ve/a@se, a respeito, C0illippe 8. Sc0mitter,Interest Conflict and Political C(an#e in razil, Stan)ord,8al., Stan)ord niversitR Cress, 1971, especialmente o captulo =, com o amplo recurso &ue a se )a( aautores brasileiros, especialmente +liveira Vianna do mesmo autor, :

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    poltico, entre os interesses da aristocracia agr!ria e da burocracia central, &ue se daria

    entre n's com a simbiose entre a c0amada ordem patriarcal e as instituies polticas

    mon!r&uicas a coali(o posterior entre setores da aristocracia rural e os interesses

    comerciais e industriais emergentes teramos a )atores &ue )avoreceriam o

    estabelecimento do &ue +rgans#i denominou :poltica sincr!tica;,=>marcada pela coali(o

    ampla entre di)erentes setores da elite e por sua inclinao, nos termos de Loore,

    moderni(ao conservadora, comprometida com o m!*imo possvel de preservao da

    estrutura tradicional e buscando o estabelecimento de uma autoridade )orte e o

    desenvolvimento e a racionali(ao do sistema administrativo. +bservemos de passagem

    &ue a pr'pria relevJncia, para o diagn'stico da evoluo brasileira, da an!lise de

    Barrington Loore, com sua n)ase em )atores de nature(a estrutural, vem contrapor@se s

    interpretaes &ue buscam atribuir essa evoluo s caractersticas da :cultura polticabrasileira;. Sem pretender negar a importJncia 'bvia dos )atores de ordem sub/etiva para

    problemas como o &ue a&ui nos ocupam, uma noo como esta no pode seno suscitar

    ob/ees na medida em &ue, sob pena de tornar@se supr)lua, deve atribuir aos

    componentes da :cultura poltica; um grau inaceit!vel de durabilidade e autonomia em

    relao a seu substrato estrutural.

    Se/a como )or, o marco de re)erncia adotado nos permite ver o regime autorit!rio

    de 19O>, assim como o :tenentismo;, o perodo getulista e o interregno democr!tico &ue

    l0e sucedeu, como vicissitude entre outras &ue se seguem ao ingresso do pas na )ase da

    poltica ideol'gica. Sua circunstJncia b!sica est! dada pelo vigor assumido, uma ve(

    levada a um ponto de relativo avano a integrao no sentido territorial e a :presena;

    governamental,=?pelo processo de mobili(ao social e pelas demandas de participao e

    igualdade associadas emergncia de novos )ocos de solidariedade &ue ele )aculta. 4o

    alterar a de)inio do Jmbito do sistema poltico, trans)ormando atores polticos potenciais

    em reais, a mobili(ao social reabre a &uesto relativa aos )undamentos do pr'prio

    sistema e de sua )orma espec)ica de organi(ao. "a resulta a ideologi(ao do processo

    poltico e a caracterstica revolucion!ria &ue passa distingui@lo, com a con)rontao de

    pro/etos diversos de implantao da :solidariedade territorial plena;.

    344. F. U. +rgans#i, '(e Sta#es of Political Development, Iova Nor#, 4l)red 4. Unop), 19O?.35ma discusso desse processo se encontra em 4ntnio +ct!vio 8intra, :4 Dntegrao do CrocessoColtico do Brasil- 4lgumas Hip'teses Dnspiradas na iteratura;,Revista de *dministra!"o P%&lica, vol.?, no. M, /ul0o@de(embro de 1971.

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    Iessa perspectiva, o es)oro de desmobili(ao poltica empreendido pelo regime

    de 19O> surge como tentativa de implantao )orosa do mercado poltico

    desideologi(ado em circunstJncias em &ue est! longe de ter soluo o problema da

    solidariedade territorial e em &ue, ao contr!rio, tal problema se agua com a intensi)icao

    do processo de mobili(ao social. 4 n)ase com &ue, na propaganda do regime, se

    salienta o apelo solidariedade territorial e nacional, com seu conte6do u)anista e de

    participao simb'lica, a/usta@se naturalmente a este &uadro, representando a tentativa de

    obstar a atrao e*ercida por ideologias ativistas e orientadas pelo tema da igualdade

    mediante o recurso a uma ideologia de Jmbito nacional e de caractersticas

    :consumat'rias;, dirigida identidade pessoal dos atores e possibilidade de con)orm!@la

    pela re)erncia participao em um marco coletivo ideali(ado.=O

    [ue di(er a respeito das perspectivas de :institucionali(ao; do regime e deestabili(ao do clebre :modelo poltico brasileiro;K Io debate 0avido em torno do tema,

    o &ual tem sido protagoni(ado sobretudo por )iguras presumivelmente interessadas na

    permanncia de seus traos b!sicos, com a introduo de certas modi)icaes destinadas a

    assegurar@l0e maior :abertura; e a redu(ir@l0e o :coe)iciente de arbtrio;, nada 0!,

    naturalmente, &ue sugira a distino &ue procuramos estabelecer entre a

    institucionali(ao da autoridade e a mera institucionali(ao do poder.

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    com a dissociao entre a lealdade demandada ou prestada, por um lado, e o grau em &ue

    o sistema se mostra capa( de promover e)etivamente os diversos interesses &ue nele

    convivem, por outro.

    Cara comear por esta &uesto, o aspecto manipulativo do regime de 19O>

    bastante claro no &ue se re)ere ao es)oro de propaganda mencionado. 4 dissociao entre

    a demanda de lealdade e &ual&uer preocupao igualit!ria alcana o ponto da ironia na

    superposio de slo#anscomo :voc tambm est! participando; )igura da lavadeira em

    seu trabal0o.=7"e maneira consistente com a legitimao assim buscada, o debate em

    torno da institucionali(ao poltica se limita introduo de modi)icaes nos arran/os

    )ormais &ue se conciliem com os limites do pro/eto espec)ico de desenvolvimento do pas

    &ue vem sendo adotado por seus dirigentes. Ia medida em &ue este 6ltimo se orienta em

    direo nitidamente elitista, assentando@se na e*panso concentrada da ri&ue(a nacional enum mercado interno restrito e remetendo para um )uturo indeterminado &ual&uer

    preocupao distributivista, no cabe esperar &ue tais modi)icaes se ven0am a consumar

    no sentido de permitir &ue se tornem e)etivamente vocais certos interesses marginali(ados,

    capacitando@os, assim, a criar obst!culos continuidade do processo. Carece in)undada,

    portanto, &ual&uer idia de &ue eventuais recomposies )ormais do sistema vigente

    viessem a poder ser interpretadas, em )uturo visvel, em termos de e)etiva instaurao de

    um processo de institucionali(ao da autoridade no sentido &ue a&ui damos e*presso.

    + autoritarismo em vigor, como bastante claro, no representa a rede)inio das

    relaes entre sociedade e estado de )orma a levar este 6ltimo a pairar sobre a&uela como

    !rbitro a um tempo poderoso e in)enso ao en)rentamento de interesses &ue ali se d!. 4o

    contr!rio, ele corresponde, em sua substJncia, como se mostrou com preciso em an!lises

    anteriores,=P ao predomnio )oroso de alguns dos )ocos de interesses &ue passam a

    en)rentar@se com a inaugurao da poltica ideol'gica sobre outros, sendo precisamente

    este o sentido em &ue cabe v@lo como vicissitude desta 6ltima.374 impresso &ue se tem dos resultados da propaganda do regime autorit!rio parece /usti)icar a 0ip'tese

    de &ue pes&uisas empricas encontrariam /unto a amplas camadas da populao, bem provavelmente, aes&ui(o)renia de &ue )ala Lann a prop'sito dos trabal0adores americanos- apoio aos termos abstratos em&ue a poltica do regime se procura /usti)icar propagandisticamente e rep6dio &uela poltica ao nvel desuas conse&Gncias para a vida cotidiana.38Ve/am@se os trabal0os de Fernando Henri&ue 8ardoso- :+ Lodelo Coltico Brasileiro;, captulo DDD dolivro do mesmo ttulo 2So Caulo, "i)uso Europia do ivro, 197M5, e especialmente :Estado eSociedade;, trabal0o apresentado ao Semin!rio sobre Dndicadores Sociais do "esenvolvimento Iacionalna 4mrica atina, promovido pelo Dnternational Social Science %esearc0 8ouncil, %io de Aaneiro, maiode 197M 2publicado posteriormente como captulo V de F. H. 8ardoso,*+toritarismo e Democratiza!"o,%io de Aaneiro, Ca( e

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    Dsso no signi)ica, porm, &ue o regime no conte com a possibilidade de vir a

    institucionali(ar@se, no sentido de poder institucionali(ado &ue acima estabelecemos, ou

    se/a, no sentido da recomposio da possibilidade de e*erccio est!vel e no meramente

    coercitivo do poder &ue se v comprometida com a emergncia da poltica ideol'gica.

    Celo lado dos dispositivos )ormais, em primeiro lugar, parece no caber d6vida &uanto

    e*e&uilibilidade de certas re)ormulaes &ue poderiam redundar em relativa :abertura; e

    alguma intensi)icao da sensibilidade a determinados )ocos de interesses antes

    marginali(ados sem &ue se comprometa o controle e*ercido sobre os rumos impressos ao

    processo de e*panso econmica do pas.=9Cor outro lado, diversos )atores concorrem

    para o incremento das c0ances de &ue o regime se/a ob/eto de crescente a&uiescncia. m

    ingrediente importante da institucionali(ao do poder consiste no simples re)le*o de

    caractersticas como a capacidade de coero e de mobili(ao de recursos do poderemsentido estrito sobre o plano da sub/etividade dos atores envolvidos. Em conse&Gncia, a

    pr'pria capacidade &ue o regime mani)esta de permanecer, sem ser alvo de contestao

    e)ica(, tende a aumentar o &ue se poderia c0amar sua :credibilidade; e a intensi)icar o

    grau em &ue vem a des)rutar da )orma de a&uiescncia passiva &ue deriva de sua aparncia

    de algo natural, necess!rio ou inevit!vel. + processo correspondente poderia ser descrito

    em termos de tradicionaliza!"odo poder, e*presso tambm inspirada em Buc#leR e com

    a &ual se salienta a sano popular de &ue passa a go(ar um poder &ue conserva, no

    entanto, a caracterstica de arbtrio nas decises &ue dele emanam.>W 4o )ator de

    institucionali(ao representado por tal processo se acrescenta o potencial de mobili(ao

    psicol'gica e de identi)icao contido nos temas patri'ticos em &ue se concentra a

    propaganda do regime, sobretudo associados aos *itos obtidos no tocante e*panso

    econmica.

    4ssim, a combinao de coero direta, manipulao simb'lica e e)ic!cia

    econmica poderia vir a criar em pra(o relativamente curto as condies sub/etivas

    propcias consolidao do regime e a e*perimentos de abertura no plano de suas

    regulaes )ormais. [ue esperar, numa perspectiva de desenvolvimento poltico a mais

    39Ve/a@se a pormenori(ada sugesto de mecanismos )ormais destinados a redu(ir o coe)iciente de arbtriodo regime e a incrementar sua representatividade )eita por %oberto de +liveira 8ampos em con)erncia

    pronunciada na Escola Superior de 3uerra sob o ttulo :Dnstituies Colticas nos Cases em"esenvolvimento- m Cro/eto para o Brasil; 2ES3, mimeogra)ado5.40Ve/a@se BucleR, Sociolo# and Modern Sstems '(eor, p. 19M, onde se encontra a distino entre:autoridade tradicional; e :poder tradicional;.

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    longo pra(o, dessa possvel consolidaoK Em &ue medida redundaria ela na e)etiva

    possibilidade de &ue o :modelo; b!sico em vigor viesse a representar o parJmetro capa(

    de en&uadrar duradouramente o processo poltico at a eventual superao de sua atual

    caracterstica pretorianaK Lais amplamente, at &ue ponto ela auguraria, nessa perspectiva

    de longo pra(o, a reduo do coe)iciente de manipulao, redundando a possvel

    institucionali(ao do poder em avanos na direo da institucionali(ao da autoridade e

    do acesso ao mercado poltico igualit!rio &ue visuali(amos na poltica p's@ideol'gicaK

    Iaturalmente, na medida em &ue o sistema mani)estasse a capacidade de

    preservar@se em seus componentes b!sicos com o grau de permanncia a&ui contemplado

    estariam comprometidas as c0ances de estabelecimento, em )uturo imagin!vel, de

    &ual&uer )orma de organi(ao sociopoltica &ue pudesse representar apro*imao

    signi)icativa ao ideal igualit!rio mencionado. 4 evoluo &ue teramos em tal caso poderiatalve( redundar na emergncia de alguma )orma de :cultura cvica;, a &ual estaria,

    contudo, dadas as opes estruturais a &ue correspondem a vigncia e o desenvolvimento

    do atual :modelo;, assentada sobre a cristali(ao de pro)undas desigualdades sociais,

    mesmo se capa( de assegurar, em termos absolutos, a elevao geral dos nveis de vida da

    populao.

    4 vari!vel decisiva para &ue o processo se encamin0e nessa ou em outras direes

    concebveis parece consistir no grau de dinamismo econmico &ue o modelo se mostre

    capa( de sustentar. 4lm da contribuio direta do *ito obtido na es)era econmica para

    as possibilidades imediatas de manipulao simb'lica, dele depende, naturalmente, a

    possibilidade de &ue a evoluo do pas ven0a a assumir a )eio de um /ogo de soma

    vari!vel &ue o)erea a todos a oportunidade de gan0os absolutos e )ornea o substrato

    para a emergncia da :cultura cvica; recm@mencionada, &ue no pode esperar basear@se

    na pura manipulao. Se e*clumos a possibilidade de &ue um processo econmico

    realmente dinJmico conviva por pra(o mais longo com a total marginali(ao de parcelas

    ponder!veis da populao sem suscitar tenses insustent!veis, isso re&uer &ue a e*panso

    econmica no apenas se caracteri(e por grande dinamismo, mas tambm pela di)uso

    substancial, ainda &ue desigual, de seus bene)cios.

    4 interrupo ou reverso das tendncias e*pansionistas na es)era econmica seria

    uma das possibilidades a serem consideradas. [uanto mais cedo ven0a a ocorrer e &uanto

    menor se/a, em conse&Gncia, o grau de institucionali(ao alcanado, no sentido da

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    :tradicionali(ao; do poder e de certa dose de legitimao derivada de e*perincias bem

    sucedidas de :abertura;, tanto maiores sero as probabilidades de &ue se ven0a a recair

    nas condies &ue se encontram na rai( do presente &uadro de rigide( poltica. "ois

    rumos podem ser considerados a partir da. Io primeiro teramos a elevao do

    coe)iciente de coero direta, nos termos do cen!rio de ciclos de e*perincias de abertura

    sucedidas por novas )ases de enri/ecimento elaborado por 4rpad von a(ar, >1com o risco

    da de)lagrao de es)oros de mobili(ao organi(acional e ideol'gica de cun0o totalit!rio

    e )ascisti(ante. Io outro, as di)iculdades econmicas ense/ariam o agravamento dos riscos

    de )racionamento e dissenso internamente corporao militar 2cu/o car!ter de :sistema

    de interesses; tende a intensi)icar@se com o simples controle militar continuado por ela

    e*ercido, em contraste com o :sistema de solidariedade; e o corpo coeso &ue era

    en&uanto representava um ator relevante entre outros no /ogo poltico anteriormenteaberto5, aumentando as c0ances de eventual abdicao do regime como tal e opo pela

    abertura democr!tica mais conse&Gente.>M

    Cor outro lado, a alternativa da continuidade da e*panso econmica no

    garantia de &ue o processo se encamin0e no rumo do estabelecimento da :cultura cvica;.

    Se essa e*panso no bastante acelerada ou no se di)undem su)icientemente os gan0os

    &ue l0e correspondem, a pr'pria mel0oria absoluta das condies gerais de vida de

    determinadas parcelas da populao, com suas conse&Gncias no plano da mobili(ao

    psicol'gica, pode resultar na rea)irmao da relevJncia social do tema da igualdade. 4s

    condies &ue da emergiriam poderiam )avorecer 2na suposio problem!tica de relativa

    estabilidade institucional mesmo no sentido da mera institucionali(ao do poder5 o

    estabelecimento da poltica ideol'gica em est!dio mais avanado, com a presena, dentro

    de um marco institucional &ue en&uadre com maior ou menor e)etividade o processo

    poltico, de organi(aes e coali(es de )oras &ue de)inam de maneira est!vel as lin0as de

    antagonismo e solidariedade do sistema.

    414rpad von a(ar, :atin 4merca and t0e Colitics o) Cost@4ut0oritarianism- 4 Lodel )or"ecompression;, Comparative Political St+dies, vol. D, no. =, outubro de 19OP.42E*ame mais elaborado dos dilemas &ue cercavam a eventual abertura democr!tica do regime de 19O>

    pode ser encontrado em dois te*tos posteriores do autor- :8lasse Social e +po Cartid!ria;, em F!bio .%eis 2org 5 O P tid R i * ) i d P El it l il i So Caulo Smbolo