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0 UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA UNEB DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS I PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDO DE LINGUAGENS CURSO DE MESTRADO EM ESTUDO DE LINGUAGENS ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ESTUDO DE LINGUAGENS NA VIDA COM TODAS AS LETRAS Manifestações Sociais da Escrita: Práticas Escolares e Usos Cotidianos SALVADOR 2009

NA VIDA COM TODAS AS LETRAS - Programa de Pós … · desenvolver atividades de leitura e de produção de textos na escola desvinculadas da realidade dos sujeitos, sob pena de estes

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS – I

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDO DE LINGUAGENS CURSO DE MESTRADO EM ESTUDO DE LINGUAGENS

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ESTUDO DE LINGUAGENS

NA VIDA COM TODAS AS LETRAS

Manifestações Sociais da Escrita: Práticas Escolares e Usos Cotidianos

SALVADOR 2009

1

UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS – I

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDO DE LINGUAGENS CURSO DE MESTRADO EM ESTUDO DE LINGUAGENS

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ESTUDO DE LINGUAGENS

LÍVIA DE CARVALHO MENDONÇA

Professora Orientadora: Drª Lígia Pellon de Lima Bulhões

NA VIDA COM TODAS AS LETRAS

Manifestações Sociais da Escrita: Práticas Escolares e Usos Cotidianos

Dissertação apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em Estudo de

Linguagens da Universidade do Estado

da Bahia, como parte dos requisitos para

obtenção do grau de Mestre em Estudo

de Linguagens. .

SALVADOR 2009

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EXAME DE DISSERTAÇÃO

MENDONÇA, Lívia de Carvalho. Na Vida Com Todas as Letras: Manifestações

Sociais da Escrita: Práticas Escolares e Usos Cotidianos. Dissertação de

Mestrado. Salvador: UNEB, 2009.

BANCA EXAMINADORA:

_______________________________________________________________

Professora Doutora Ligia Pellon de Lima Bulhões – Orientadora

_______________________________________________________________

Professora Doutora Carla Luzia Carneiro Borges - UEFS

_______________________________________________________________

Professor Doutor Gilberto Nazareno Telles Sobral – UNEB

3

FICHA CATALOGRÁFICA – Biblioteca Central da UNEB

Bibliotecária: Jacira Almeida Mendes – CRB: 5/592

Mendonça, Lívia de Carvalho

Na vida com todas as letras : manifestações sociais da escrita : práticas escolares e usos

cotidianos / Lívia de Carvalho Mendonça . - Salvador, 2009.

147f.

Orientadora: Lígia Pellon de Lima Bulhões.

Dissertação (Mestrado) - Universidade do Estado da Bahia. Departamento de Ciências

Humanas. Campus I. 2009.

Contém referências e anexos.

1. Escrita - Aspectos sociais. 2. Linguagem. 3. Letramento. 4. Família. 5. Escolas. 6.

Língua portuguesa. I. Bulhões, Lígia Pellon de Lima . II. Universidade do Estado da Bahia,

Departamento de Ciências Humanas.

CDD: 401.93

4

Para Carlos, Amor!

Para Lisane e Ângela, amores da minha vida.

Ao meu pai Luiz, tão distante, nunca esquecido e sempre amado.

5

AGRADECIMENTOS

A Deus, por tudo o que tenho, tudo o que sou e o que vier a ser. Ao meu querido esposo Carlos. À minha mãe Ângela. À minha família. Aos queridos irmãos. Aos amigos inestimáveis: Adelvino Ribeiro, Ivaneide Cardoso, Ivete Teixeira, Miriam Passos e Pompílio Filho. À Profª Drª. Ligia Pellon de Lima Bulhões, por realizar muito mais do que orientações; por promover inesquecíveis aprendizagens que levarei para a vida. À Profª Drª. América Lúcia Silva César. À Profª Drª Carla Luzia Carneiro Borges. À Profª Drª. Denise Zoghbi. Ao Profº Dr. Gilberto Nazareno Telles Sobral. À Profª Drª Rita de Cássia Ribeiro de Queiroz. À Profª Drª Rosa Helena Blanco Machado. Aos professores e funcionários do PPGEL. Às escolas, professoras, e alunos que fizeram parte desse estudo. Às comunidades: Sobradinho e Baraúna. Ao Srº José Mota Silva e Valéria Costa Pinho. À Secretaria de Educação do Município de Feira de Santana. Aos meus alunos, colegas de profissão e amigos da UNEB - Campus XXIII: Anaci Santana, Cássio Jânio, Carla Liane, Claudilson Souza, Jaci Leal, Káthia Flôr e Valtir Vieira.

6

RESUMO

Este trabalho é resultado de pesquisa etnográfica, de base qualitativa, sobre a escrita enquanto um conjunto de práticas sócio-históricas. O seu objeto são as atividades de escrita desenvolvidas por duas escolas municipais de Feira de Santana – BA, cujos alunos são dos bairros de Sobradinho e Baraúna, e a sua relação com os usos cotidianos de escrita destes sujeitos no espaço familiar e comunitário. Uma escola é de educação regular, enquanto a outra apresenta uma proposta alternativa de ensino. Foram entrevistados quatro alunos e sete pais de alunos que residem há mais de quinze anos nos dois bairros. Os objetivos do trabalho foram: investigar se as práticas escolares de escrita atendem aos propósitos discursivos dos sujeitos; qual a atitude assumida pelos sujeitos com relação às suas práticas escolares de escrita; quais os gêneros textuais de escrita são contemplados na escola, e se eles se identificam com os gêneros textuais que circulam na vida cotidiana dos sujeitos; e, qual a relação que se estabelece entre oralidade, escrita e contexto de interação verbal. O referencial teórico utilizado pela pesquisa diz respeito a concepções de escrita em uma perspectiva sócio-cultural e no contexto de diferentes práticas discursivas dos diferentes sujeitos, com base em uma seleção de autores. Foi feita pesquisa de campo que contou, no total, com dezesseis visitas aos bairros. Escolheu-se um grupo representativo de sujeitos de acordo com os seguintes fatores ou variáveis sociais: gênero, faixa etária, escolaridade, tempo de moradia no local, profissão e renda familiar. Foram realizadas entrevistas abertas com temas gerais referentes às relações familiares, práticas de lazer, função na comunidade, práticas religiosas e práticas de escrita. Considerou-se também como procedimento de pesquisa a observação da atitude dos sujeitos com relação às suas práticas sociais, em especial às suas experiências enquanto leitores e redatores, tanto no contexto escolar quanto em sua vida cotidiana. Concluiu-se que os fatores ou variáveis: idade dos alunos, profissão e espaço comunitário são pertinentes para caracterizar as práticas de escrita dos sujeitos investigados. E que a escola tradicional ainda fundamenta o trabalho em língua portuguesa em uma concepção tradicional de língua e escrita, já que privilegia o estudo de regras da gramática normativa. Concluiu-se também que a escola complementar tem uma visão contraditória de língua e de escrita, por desenvolver uma prática tradicional de ensino do português, ao mesmo tempo em que, teoricamente, adota o texto como unidade do trabalho com a língua, considerando-a na perspectiva dos usos, como sugerem os Parâmetros Curriculares Nacionais da Educação Básica (1997). Portanto, de um modo geral, concluiu-se que não há relação entre as escritas escolares e as práticas sociais de escrita que fazem parte do cotidiano dos sujeitos. Por isso, conhecer os indivíduos torna-se imprescindível, o que mostra que não se pode simplesmente querer desenvolver atividades de leitura e de produção de textos na escola desvinculadas da realidade dos sujeitos, sob pena de estes estarem fadados a não se tornarem redatores e leitores eficientes, ou seja, a serem excluídos da vida com todas as letras.

Palavras-chave: Contexto social – família - escola - escrita - gêneros de escrita.

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IN LIFE WITH ALL THE LETTERS: Social manifestations of reading and writing: school practice day by day.

ABSTRACT Such a paper has been made through a qualitative ethnography research about writing while a historic social practice, developed in two schools in Feira de Santana city from Sobradinho and Baraúna districts in order to perceive student´s writing day by day in school and community. Four students and seven parents have been interviewed. The main goal of such a research has been to verify whether the writing school practice has been coherent with student´s oral discourse practice and verbal interaction. Such visits have been executed sixteen times directed to specific groups including some factors such as age, gender , level of instruction, profession, familiar income through interviews about family, leisure practice, community, religion and writing practice as well as students´s social practice while readers and writers not only in the school but also in their day-by-day life. It was possible to realize that such factors investigated really help us to comprehend in a better way their writing process and that the teaching of Portuguese language is still traditional in which the text is the parameter in order to understand the language due to fact of following the traditional grammar within which the National Curriculum Parameters in elementary level demand it.( 1997).It has been possible perceive that there is no relation of the writing in such schools to its social practice. The fundamental thing is to know student´s reality and not only to promote activities in order to become and include them efficient writers and readers in society. Key-words: Social Context- family- school-writing-Types of writing.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................. 11 2 A ESCRITA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS .......................... 14

2.1 A Escrita em uma perspectiva histórico-cultural .............................. 14 2.2 A Escrita e os Gêneros Textuais ......................................................... 28 2.3 Os eventos de escrita: oralidade, escrita e contexto social .............. 33 2.4 Escrita e o contexto Escolar ................................................................ 38 3 A PESQUISA DE CAMPO E O CENÁRIO DA PESQUISA .......................... 48 3.1 A experiência de campo ....................................................................... 48 3.2 Cenário de Pesquisa ............................................................................ 53 3.2.1 A Comunidade: situação histórica e atual ................................. 53 3.2.2 O Centro de Educação Complementar e a Escola Municipal

Tradicional........................................................................................................59

4 A PESQUISA EM UMA PERSPECTIVA ETNOGRÁFICA: PROCEDIMENTOS E INSTRUMENTOS DE TRABALHO .............................. 62 5 DESCRIÇÃO DOS DADOS: OS SUJEITOS, AS PRÁTICAS SOCIAIS E AS PRÁTICAS DE ESCRITA ................................................................................ 66 5.1 Os sujeitos da pesquisa ..................................................................... 66 5.1.1 Dados gerais dos sujeitos pesquisados: alunos ....................... 66 5.1.2 Dados gerais sobre pais ou responsáveis dos alunos pesquisados ......................................................................................... 70 5.2 As práticas sociais dos sujeitos .......................................................... 72 5.2.1 As atividades de lazer ................................................................... 72 A Televisão: novelas e telejornais ............................................... 72 B Computador: jogos e contatos pessoais ................................. 73 C Rádio: notícias e entrevistas .................................................... 73 D Bares: comunidade e outros bairros ....................................... 73 E Viagens ....................................................................................... 74 5.2.2 Atividades profissionais dos pais ................................................ 74 5.2.3 As práticas sociais de escrita: recepção e produção de textos 74 5.2.3.1 Adultos ............................................................................... 74 A O que lêem, escrevem e copiam nos espaços do cotidiano............................................................................. 74 A.1 Textos do domínio religioso .................................... 75 A.1.1 Leituras compartilhadas .................................. 75 A.1.2 Leituras particulares ........................................ 80 A.1.3 Cópia de textos ................................................ 81 A.2 Textos do domínio jornalístico: boletim, jornal e revista ............................................................................. 82 A.3 Textos digitais: leitura e escrita em e-mails e chats 83 A.3.1 Cartas pessoais e comerciais ...................... 83 A.3.2- Textos utilitários: receitas e listas ............. 84 5.2.3.2 Crianças ........................................................................... 85

9

A O que lêem, escrevem e copiam no espaço do cotidiano ........................................................................... 85 B O que lêem, escrevem e copiam no domínio escolar tradicional ........................................................................ 90 B.1 Exercícios gramaticais ........................................ 90 B.2 Poesias copiadas do livro e da lousa ................. 92 C O que lêem, escrevem e copiam na escola complementar .................................................................. 93 C.1 Poesia ................................................................... 93 C.2 Textos instrutivos ................................................ 95 C.3 Contos infantis ..................................................... 96 C.4 Relatos e narrativas sobre temas específicos... 98 C.5 Reescrituras de narrativas ................................ 100 C.6 Fábulas ............................................................... 101 6 INTERPRETAÇÃO DOS DADOS ............................................................... 102 7 CONCLUSÃO ............................................................................................. 110 ANEXOS ........................................................................................................ 115 REFERÊNCIAS .............................................................................................. 143

10

LISTA DE QUADROS

Quadro 1- QUADRO GERAL DOS SUJEITOS PESQUISADOS:

ESTUDANTES ..................................................................................................68

Quadro 2- QUADRO GERAL DOS SUJEITOS PESQUISADOS: PAIS OU

RESPONSÁVEIS...............................................................................................70

Quadro 3- SISTEMATIZAÇÃO DOS DADOS BIO-SOCIAIS: SUJEITOS ALUNOS da Escola Parceira e do Centro de Educação Complementar – CEC 4ª série TURMA 07........................................................................................ 129

Quadro 4- SISTEMATIZAÇÃO DOS DADOS BIO-SOCIAIS: SUJEITOS ALUNOS da Escola Parceira e do Centro de Educação Complementar – CEC 4ª série TURMA 02......................................................................................... 130

Quadro 5- SISTEMATIZAÇÃO GERAL DOS DADOS BIO-SOCIAIS: SUJEITOS ALUNOS Todos da Escola Parceira do Centro de Educação Complementar– CEC 4ª série..........................................................................131

Quadro 6 - SISTEMATIZAÇÃO DAS ENTREVISTAS COM OS ALUNOS....135

Quadro 6.1 - SISTEMATIZAÇÃO DAS ENTREVISTAS COM OS

ALUNOS......................................................................................................... 136

Quadro 6.2- SISTEMATIZAÇÃO DAS ENTREVISTAS COM OS

ALUNOS......................................................................................................... 137

Quadro 6.3 - SISTEMATIZAÇÃO DAS ENTREVISTAS COM OS

ALUNOS......................................................................................................... 138

Quadro 7 - SISTEMATIZAÇÃO DE ENTREVISTAS COM PAIS OU

RESPONSÁVEIS............................................................................................ 139

11

1 INTRODUÇÃO

Este estudo possuiu como tema central as práticas de escrita

desenvolvidas no contexto escolar de duas escolas municipais da cidade de

Feira de Santana, e a sua relação com os usos cotidianos de escrita que

fizeram parte da realidade sócio-cultural dos sujeitos investigados.

Confrontar as manifestações da escrita presentes no contexto escolar

com as que circulam no cotidiano constituiu um desafio, pois em geral

privilegiam-se a recepção e a produção de textos feitas na escola. E estas,

muitas vezes, não consideram a realidade sócio-cultural dos sujeitos, o que se

reflete nas múltiplas significações que o ato de escrever tem para eles, já que o

sistema de ensino perpetua os textos escritos utilizados, em sua maioria, para

fins escolares ou para avaliação de aprendizagem, e possui como meta o

domínio da prosa formal.

O estudo das práticas de escrita desenvolvidas por pessoas de grupos

populares, mesmo realizado em contexto escolar, deve-se fundamentar em

uma concepção de escrita diferente da visão tradicional, que se baseia em

regras prescritas pela gramática normativa, é elitista, excludente, e serve como

modelo de ―língua‖ para toda a sociedade. Trata-se de conceitos arquitetados

sócio-historicamente que se reproduzem, se perpetuam, e servem de modelo

para toda a sociedade, porque são próprios de grupos de prestígio, que os

legitimam.

Dessa maneira, faz-se necessário compreender a língua e,

conseqüentemente, a escrita como parte da realidade social. Gnerre (1998)

coloca que para isso faz-se necessário refletir sobre as atitudes e crenças que

diversos grupos podem ter sobre a escrita, incluindo-se as concepções

compartilhadas pelas minorias letradas.

Nesse contexto, foi importante examinar como as pessoas desenvolveram

ou caracterizaram estas manifestações ativa e criativamente para que estas se

adaptassem aos seus propósitos e necessidades, de acordo com o contexto

discursivo em que se encontrassem. Observou-se, no entanto, que

tradicionalmente tem-se dado uma ênfase muito grande aos textos escritos

produzidos fora de contextos discursivos, ou seja, sem considerar a interação

entre seus interlocutores, no caso escritor(es) e leitor(es), embora haja, hoje

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em dia, um interesse crescente pelas diversas práticas de escrita,

considerando-se os contextos sócio-históricos em que ocorrem.

Nesta perspectiva, colocaram-se as seguintes questões:

1- Os sujeitos, no contexto escolar, adaptam as suas práticas de escrita aos

seus propósitos discursivos, considerando - se os usos sociais de escrita que

fazem parte da sua realidade sócio-cultural?

2- Qual a atitude assumida pelos sujeitos com relação às suas práticas

escolares de escrita?

3- Que gêneros textuais de escrita são contemplados na escola, e em que

medida eles se identificam com os gêneros textuais que circulam na vida

cotidiana dos sujeitos, constituindo para eles práticas significativas?

4- Qual a relação que se estabelece entre oralidade, escrita e contexto de

interação verbal, nas manifestações de escrita observadas?

A pesquisa que propusemos se baseou no pressuposto teórico geral de

que a língua é constitutiva da realidade social. Ela se referiu ao sujeito concreto

que é parte da realidade sócio-histórica, e aos diferentes usos que este fez da

língua nos diferentes contextos sócio-culturais.

Realizou-se um estudo etnográfico, no campo das pesquisas

qualitativas, e para tanto consideramos a etnografia uma abordagem de

investigação científica, de acordo com César (2001) e André (2004), que se

basearam em uma visão geral da cultura a partir da investigação dos homens

em sua vida cotidiana. A língua, neste sentido, é um fenômeno sócio-histórico

que faz parte das manifestações culturais próprias de determinado grupo

social.

Almejou-se, portanto, estudar o sujeito, considerado um ator social e as

suas práticas cotidianas, especificamente as práticas de escrita, próprias de

determinado contexto social. Um estudo desta natureza demandou observação

direta de práticas cotidianas de um grupo particular de sujeitos, através da

pesquisa de campo, para tentar revelar o significado e os valores de suas

ações.

O estudo das práticas escolares de escrita em confronto com as

manifestações cotidianas de escrita permite uma compreensão de como estas

atividades constituem diferentes práticas sociais e são por elas constituídas, de

acordo com os diferentes contextos de interação discursiva.

13

Assim sendo, este trabalho se refere à investigação da escrita enquanto

práticas sociais, constituídas e constitutivas da realidade histórico-cultural, ou

seja, as ações de escrita dos sujeitos não estão predeterminadas, podendo ser

desafiadas, reinterpretadas e alteradas pelos indivíduos. Baseia-se, portanto,

na concepção de língua enquanto ação e trabalho coletivo dos seus sujeitos.

Consideramos como universo da pesquisa duas escolas municipais: uma

com proposta de ensino tradicional e outra com sugestão de ensino

complementar, e o contexto familiar dos alunos investigados, que moram em

Sobradinho e Baraúna, duas comunidades da cidade de Feira de Santana.

Como sujeitos da pesquisa, consideramos um total de 04 (quatro) alunos das

respectivas escolas e 07 (sete) pais ou responsáveis por eles, que constituem

grupos representativos de pessoas que estudam na comunidade e pais que

residem por mais de quinze anos.

Pouco se sabe sobre os usos de escrita que fazem parte da vida cotidiana

das pessoas, principalmente as de grupos populares, que em sua maioria

freqüentam as escolas públicas. E, nesse sentido, as propostas de atividades

de recepção e de produção de textos feitas pelas instituições de ensino em

geral não consideram a diversidade cultural e lingüística dos sujeitos. Assim,

privilegiam-se alguns gêneros textuais legitimados pela escola, mas que são

considerados práticas estritamente escolares, para fins avaliativos, pela maioria

dos alunos.

Compreendemos, portanto, que este estudo, somado a muitos outros

estudos sobre diferentes manifestações de escrita, poderá contribuir para a

construção de um arcabouço teórico sobre a escrita, presente nos diversos

contextos de interação verbal, inclusive no espaço escolar.

Deve-se destacar a relevância social do trabalho que se propõe, já que

ele, ao sugerir reflexões teóricas sobre língua e, especificamente, sobre a

escrita, com base em dados da realidade e tendo como referência a escola

pública, poderá contribuir, conseqüentemente, para a elaboração de novas

propostas teórico-metodológicas para o ensino - aprendizagem da escrita.

14

2 A ESCRITA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS

2.1 A Escrita em uma perspectiva histórico-cultural

Este item do trabalho é constituído pela discussão dos textos que

apresentam, de modo geral, pontos de vistas de alguns autores que

compreendem as manifestações de escrita a partir de uma perspectiva

histórico-cultural, e que são considerados referência para a discussão sobre a

escrita neste contexto teórico.

De acordo com Street (1993), o campo de estudos sobre a escrita tem-se

expandido consideravelmente nos últimos anos, constituindo-se em novo

quadro da antropologia e das abordagens multi - culturais, que se apresentam

como alternativa às abordagens psicolingüísticas existentes anteriormente. Ele

argumenta que, de um lado, psicólogos e pedagogos focalizam em seus

trabalhos elementos que envolvem habilidades de leitura e escrita, ao passo

que antropólogos e sociolingüistas se concentram em questões sobre a própria

escrita.

Street (1993) faz referência aos estudos tradicionais sobre a língua,

baseado em concepção excludente sobre a escrita, a partir de um conjunto de

regras da gramática tradicional, que serve de modelo para a sociedade. Nesse

sentido, a escrita aqui é compreendida como uma entidade ‗neutra‘, que

representa uma tecnologia a ser dominada pelos indivíduos de acordo com as

necessidades institucionais do Estado. Esta concepção desconsidera os usos

específicos que são feitos em situações sócio-culturais concretas e representa

a reprodução de padrões históricos - culturais e de poder, próprios dos grupos

sociais de prestígio.

O autor aponta que pesquisas recentes em várias culturas têm mostrado

a criatividade, a originalidade e o estilo com que as pessoas utilizam a escrita

em atendimento aos seus vários interesses e necessidades. E os resultados

dessas investigações chamam a atenção para a ―neutralidade aparente‖

estabelecida a partir do que ele denomina ―modelo autônomo de escrita‖, que

se baseia em uma visão uniforme de escrita estabelecida dentro da sociedade.

Para tanto, Street sugere a necessidade de investimentos em pesquisas que

15

demonstrem situações de usos da língua e não naturalizem as ocorrências

ideológicas nas instâncias de utilização da linguagem escrita.

A escrita pressupõe redatores e leitores concretos e singulares em

determinados domínios discursivos. Nesta perspectiva sócio-cultural, os

estudos sobre o real significado das práticas de escrita nos usos cotidianos de

pessoas de diferentes grupos sociais estão de acordo com o modelo de

investigação defendido por Street (1993), que propõe que se estabeleçam

modelos teóricos que reconheçam o papel central das relações de poder nas

práticas da escrita. Nesta visão, tais atividades mudam o seu significado

quando estão em jogo as relações de domínio e autoridade na sociedade. Para

tanto, o autor sugere o ―modelo ideológico de escrita‖, que, em linhas gerais,

aponta a neutralidade aparente dessas práticas. A contribuição de um modelo

de escrita, nessa perspectiva, seria a de permitir que se elaborem

generalizações úteis sobre as manifestações da escrita que fazem parte da

realidade dos diversos grupos sociais, consideradas aqui como práticas

sociais.

Verifica-se que pouco se sabe sobre os usos de escrita e as práticas de

leitura que fazem parte da vida cotidiana das pessoas, principalmente as de

grupos populares, como é também a realidade da maioria dos grupos sociais

do Brasil. As escritas que se leva em conta são as que circulam no espaço

escolar. Contudo, abordagens de sociolingüistas e antropólogos que se

debruçam sobre o estudo das manifestações de escrita em diferentes culturas

têm demonstrado, segundo Street (1993), que a variação de gêneros de escrita

no contexto ocidental fornece o início de uma nova e menos restrita base de

dados para uma comparação inter-cultural. Deste modo, há vários

pesquisadores, como Heath (1983), interessados nessas manifestações de

escrita em diferentes culturas, visto que em abordagens anteriores foram

encontradas falhas nas investigações por se desconsiderar, de fato, como as

pessoas pensam e adaptam as habilidades de escrita às necessidades do seu

dia-a-dia.

As instituições escolares, principalmente no Brasil, têm desconsiderado a

perspectiva de que os alunos reconheçam as próprias habilidades de escrita e

assim, perpetuam ensinamentos em que as crianças se voltam para a escrita e

não estas se voltam para as crianças demonstrando, com isso, que a maneira

16

que se aprende a escrita na comunidade é conflituosa em relação ao ensino

proposto pela escola. Nesse sentido, podemos citar os resultados de pesquisa

propostos por Heath (1983), quando ela verificou que as comunidades de

Roadville e Trackton possuem diferentes orientações de letramento em casa e

na escola, o que refletiu diretamente no desempenho escolar das crianças. Em

Roadville, a partir da quarta série, começa a cair a atuação escolar das

crianças. O sucesso é garantido apenas nas três primeiras séries, pois

correspondem aos mesmos contextos situacionais dos eventos de letramento

que ocorrem na comunidade. Já as crianças de Trackton apresentam o

percentual de leitura mais baixo e demonstram bastante dificuldade nos

modelos de ensino escolar, pois nas orientações de letramento da comunidade

não há quaisquer exposições de participações de eventos de letramento que

envolva a leitura de livros infantis.

Desta forma, esses resultados demonstram que as manifestações sociais

de escrita que diferenciam usos cotidianos de práticas escolares ocasionarão

fracasso do desempenho dos sujeitos nas escolas.

A partir dessa visão, entende-se que a ausência desse conhecimento

prévio tem feito com que os interessados na escrita em uma perspectiva sócio-

cultural desconsiderem a criatividade de suas manifestações. Como resultado,

tem-se enfatizado o ensino da escrita com base em modelos pré-estabelecidos,

colocando supostamente seus usuários como objetos passivos e neutros

afetados por este tipo de atividade de produção.

Neste contexto é que Street (1993) propõe um modelo de escrita numa

perspectiva ideológica (‗ideological‘ model of literacy‘), que se situe na

intersecção entre as concepções teóricas da Antropologia e da Sociolingüística

de um lado e, do outro, as teorias do discurso e da etnografia.

Em conseqüência dessa concepção teórica, Street (1993) acaba por

fornecer as bases empíricas para o que ele denomina ‗modelo autônomo de

escrita‘ (‗autonomus‘ model of literacy), que contrapõe ao modelo ideológico

proposto por ele. O autor conceitua o modelo autônomo, em termos técnicos,

como sendo independente do contexto social e cujas conseqüências para a

sociedade e cognição podem ser provenientes de seu caráter intrínseco. De

acordo com Street,

17

The writers l characterise in this way do not necessarily themselves use the phrase ‗autonomous model of literacy‘ but I nevertheless found the term model useful to describe their perspective as it draws attention to the underlying coherence and relation- ship of ideas which on the surface might appear unconnected and hap-hazard. (STREET 1993, p.5)1

Olson (1977), no mesmo artigo, é citado como representante do modelo

autônomo de escrita justamente por ser aquele que tão bem advogou as

conseqüências da escrita para a sociedade, para o desenvolvimento cognitivo

dos indivíduos e para a língua em si mesma, conforme é possível se observar:

Olson holds enthusiastically to the strong version of the autonomus model, repeating in a recent article the claim that the media of communication, including writing, do not simply extend the existing structures of knowledge; they alter it. (…) writing did not simply extend the structure and uses of oral language and oral memory but altered the content and form in important ways(…) when writing began to serve the memory function, the mind could be redeployed to carry out more analytic activities such as examining contradictions and deriving logical implications. It is the availability of an explicit written record and its use for representing thought that impart to literacy its distinctive properties. (OLSON 1988, apud STREET, 1993, p.5-6)2.

1 Os autores que eu caracterizo deste modo não adotam, necessariamente, a expressão

―modelo autônomo de escrita‖, embora eu ache o termo ‗modelo‘ útil para descrever a sua perspectiva, já que ele chama a atenção para a coerência e a relação de idéias que podem, superficialmente, parecer desconexas e aleatórias. 2Olson adere com entusiasmo à versão forte do modelo autônomo, repetindo em um artigo

recente a alegação de que os meios de comunicação, inclusive o escrito, não apenas ampliam o conhecimento das estruturas existentes; eles o alteram. (...) A escrita não apenas amplia a estrutura e os usos da linguagem oral e da memória oral, mas alteraram o conteúdo e a forma de maneira importante (...) quando a escrita começou a ter função de memória, a mente pôde ser utilizada para realizar mais atividades analíticas, tais como a análise de contradições e de suas implicações lógicas. É o acesso a um registro escrito explícito e o seu uso para representar o pensamento que conferem à escrita as suas propriedades distintivas.

18

A partir das concepções de Street (1993) sobre o modelo ideológico da

escrita, surgiram, após a década de 1980, inúmeros textos acadêmicos que

discutiam a relação entre escrita e oralidade como um continum, e não mais

como uma dicotomia. Contudo, os argumentos utilizados revelam que existe,

nessa transição, um fosso que diferencia letramento de oralidade, o que se

confirma com o fato de que muitos dos escritores, neste campo, continuaram a

representar o letramento como suficientemente diferente da oralidade, cujos

achados pouco diferem do clássico conceito da "grande divisão‖. Segundo o

autor,

This was to be explained by reference to

the methodological and theoretical assumptions that underlay their work: in particular a narrow definition of social context; the reification of literacy in itself at the expense of recognition of its location in structures of power and ideology, related to assumptions about the 'neutrality' of the object of study: and, from the point of view of linguistics, the restriction of 'meaning' to the level of syntax. (STREET 1993, p.4)3

Street (1993) estende a sua crítica ao conceito de continum ao citar

Besnier (1988), que argumenta que o conceito de um "continum" é inadequado,

porque as práticas de oralidade e de escrita não estão de fato alinhadas como

um ‗continum‘, mas se diferenciam de forma multidimensional em comunidades

de fala e através delas. Nessa concepção, portanto, a relação entre fala e

escrita não ocorre a partir da consideração do ‗continum‘, visto que ambas co-

ocorrem de forma complexa e mediadas pelo contexto. Ou seja, pressupomos,

a partir daí, que em diferentes contextos, como o da escola e o contexto

familiar, as relações entre fala e escrita irão diferir de acordo com as diversas

situações discursivas.

Os estudos histórico-culturais sobre a escrita abordam primeiramente o

impacto da escrita em sociedades ágrafas. Posteriormente passam a ter cunho

3Este era para ser explicado através da referência aos pressupostos teóricos e metodológicos

que fundamentam seu trabalho: em particular uma definição restrita de contexto social e a reificação da escrita em si, às custas do reconhecimento de sua localização em estruturas do poder e ideologia, relacionados a suposições sobre a ‗neutralidade‘ do objeto de estudo: e, a partir do ponto de vista da lingüística, a restrição do "significado" ao nível da sintaxe. (STREET 1993, p.4)

19

comparativo com base na noção de dicotomia entre escrita e oralidade para,

em seguida, novos estudos considerá-las a partir do conceito de ‗continum’, o

que é rejeitado por Street (1993), como vimos anteriormente a partir da citação

de Besnier (1988). Neste contexto, surge um amplo debate sobre as relações

entre cultura oral e cultura escrita. Assim sendo, autores como Havelock

(1963), Olson (1977), Ong (1982), dentre outros, por exemplo, destacam-se por

tratar deste mesmo tema.

Street (1993) cita Goody e Watt em seu artigo The Consequences of

literacy (2006[1963]) com relação à discussão sobre as práticas de escrita nas

sociedades antigas, orais ou letradas como, por exemplo, a sociedade grega,

até a difusão da escrita alfabética no mundo ocidental. Goody e Watt (2006

[1963]) deslocam o foco de seus estudos para as implicações dos usos da

escrita em culturas tradicionais específicas, letradas ou não-letradas, a partir do

modelo autônomo de escrita. O seu objetivo é o de ―discutir as conseqüências

históricas e funcionais mais significativas da escrita‖ (GOODY E WATT 2006

[1963], p.77). Coloca-se, como questão inicial, o argumento de que as críticas à

visão etnocêntrica da antropologia e sociologia não podem desconhecer a

distinção significativa entre sociedades letradas e não-letradas. Segundo eles:

Essa posição parece contrária à nossa observação pessoal; e assim, parece ser proveitoso investigar se não pode haver, mesmo do ponto de vista empírico e relativista, algum esclarecimento a ser derivado de uma consideração adicional a respeito de certos problemas históricos e analíticos relacionados com a dicotomia tradicional entre sociedades letradas e não-letradas. (GOODY E WATT 2006 [1963], p.12)

A questão central da obra colocada pelos autores relaciona-se às

transformações existentes nas sociedades a partir da inserção do sistema de

escrita alfabética, com relação à maneira de se pensar sobre o mundo. De

acordo com eles, ao se compararem as experiências das sociedades com e

sem escrita é possível verificar que nas primeiras o pensamento privado irá

propiciar o desenvolvimento do raciocínio lógico, uma vez que, com o registro

escrito, é possível objetivar e (re)significar as experiências a partir da sua

individualização, e selecionar atitudes ou valores importantes para determinada

20

cultura. Deste modo há menos individualização de experiência pessoal nas

culturas ágrafas do que nas culturas escritas, ou seja, a construção do

pensamento pessoal é estimulado por meio da atividade de escrita. O que

compreendemos, nesta perspectiva, é que a escrita encoraja o pensamento

pessoal; permite a objetivação da própria experiência e, substitui a memória

como registro permanente.

Por outro lado o pensamento não lógico seria uma questão para outras

investigações, uma vez que a escrita é vista por Goody e Watt (2006[1963])

como complementar à oralidade.

Percebe-se, portanto, o interesse dos autores em discutir se há

problemas históricos que possam ser decorrentes da dicotomia entre

sociedade letrada e não-letrada. Pressupõe-se, tomando por base os

argumentos expostos, que o advento da escrita alfabética tenha promovido o

desenvolvimento das culturas, já que representou um elemento central para a

constituição do que hoje se compreende por civilização ocidental. De acordo

com o artigo:

A escrita micênica desapareceu completamente após o século XII a.C., fato que foi possível por causa do uso muito restrito do letramento e da conexão próxima entre a escrita e administração palaciana. É duvidoso que uma perda como essa poderia ter ocorrido na Grécia após a introdução de uma escrita completamente alfabética, provavelmente no século VIII a. C. (GOODY E WATT 2006 [1963], p.30)

Goody e Watt (2006 [1963]), ao tratarem dos efeitos sociais da escrita

alfabética, afirmam que o desenvolvimento que as sociedades letradas

puderam alcançar foi de várias ordens, desde o intelectual até econômico,

como se pode notar: ―O uso extensivo da escrita (...) parece ter ocorrido em um

grande conjunto de atividades, tanto intelectuais quanto econômicas, por um

grande conjunto de pessoas‖ (GOODY E WATT 2006 [1963], p. 35).

O uso efetivo da escrita alfabética ocorreu inicial e gradualmente na

sociedade grega, e esteve aliada ao desenvolvimento da democracia grega,

uma vez que diversos povos tinham um sistema administrativo comum e

herança cultural unidos por intermédio da palavra escrita. ―A democracia como

nós a conhecemos, então, está desde o princípio associada à alfabetização

21

difundida‖ (GOODY E WATT 2006, [1963] p.58). Nesse sentido, a escrita

passou a ser o ―símbolo principal da distância‖ (GOODY E WATT 2006 [1963],

p.58), embora a sua difusão entre os diferentes grupos sociais tenha ocorrido

somente a partir da invenção da imprensa, no século XV.

Os efeitos sociais causados por uma sociedade letrada passaram a ser

descritos em diversas sociedades que a adotaram como um expoente de

desenvolvimento e ascensão, ou seja, como inovação cultural. Goody e Watt

(2006 [1963]) exemplificam bem essa situação com a afirmação de um egípcio

do primeiro império: ―Colocando a escrita em seu coração, você pode se

proteger do trabalho duro de qualquer tipo (...). O escriba está liberto das

tarefas manuais; é ele quem comanda.‖ (GORDON CHILDE 1942, apud

GOODY E WATT, 2006, p. 27).

Ao discutir acerca da relação entre cultura alfabética e pensamento grego

no momento histórico de transição do mundo helênico, Goody e Watt (2006

[1963]) verificam uma tensão entre o símbolo da tradição não letrada, a

memória, aqui entendida, como ―repositório da tradição cultural em uma

sociedade oral‖; e o alfabeto, símbolo maior de uma sociedade letrada e que

―torna possível ler e escrever facilmente sem qualquer ambigüidade todas as

coisas sobre as quais a sociedade possa falar‖. (GOODY E WATT 2006 [1963],

p. 48 e 31).

Estes autores argumentam que nas sociedades sem escrita a memória é

vista como individual e mediada pela herança cultural, sendo que o dado novo

é ajustado pelo sujeito ao dado antigo, através do processo de interpretação e

de eliminação, quando o que não tem mais relevância social é eliminado pelo

esquecimento. A linguagem, sobretudo o vocabulário, é considerada como um

mecanismo imprescindível nesse processo. A língua, no entendimento da

sociedade não-letrada, ―é desenvolvida em associação íntima com a

experiência da comunidade e é aprendida pelo indivíduo no contato face a face

com os outros membros‖ (GOODY E WATT 2006 [1963], p.17).

Ao longo do processo de difusão social da escrita, de acordo com Goody

e Watt (2006 [1963]), verifica-se que esta ocorre como ajuda à memória, já que

nas sociedades sem escrita mito e história mesclam-se, ou seja, os elementos

da herança cultural que não têm mais tanta importância na contemporaneidade

passam a ser esquecidos ou se transformam; e como os sujeitos de diferentes

22

gerações constroem seus próprios vocabulários, muitos elementos

pertencentes à sua própria história são resignificados ou totalmente

descartados. Assim, o que é diferenciador adquire um caráter conflituoso entre

as sociedades letradas e não letradas; bem como dentro dos próprios grupos

sociais ―protoletrados‖. O divisor de águas está no fato de que nas sociedades

sem escrita predomina a ―amnésia estrutural‖ ou sistema de eliminação, e nas

sociedades com escritas predomina o processo de ―acumulação‖.

Por outro lado, segundo os autores, o que se verifica internamente às

culturas alfabéticas são as tensões do tipo: barreira forte entre escritores e não-

escritores; manipulação das ferramentas de leitura e escrita como

diferenciadores sociais; a transmissão de valores e atitudes no contato face a

face em descompasso com as culturas letradas, que se dá pela transmissão de

conteúdos percebida apenas por uma porção limitada da sociedade; e divisão

entre os vários matizes de letramento e não letramento, com um foco mais

dramático na escola.

De uma maneira geral, ―a tensão social entre as orientações orais e

letradas na sociedade ocidental, de fato, é complementada pelo intelectual‖

(GOODY E WATT 2006 [1963], p. 66).

Compreende-se, de maneira geral, que, para Goody e Watt (2006[1963]),

a escrita, nas sociedades letradas, promove a identidade individual e expressa

um esforço intelectual através do qual os sujeitos selecionam, rejeitam ou

acomodam as idéias e atitudes de sua cultura.

Segundo os autores, a tensão entre oralidade e escrita acentua-se na

cultura ocidental, já que a tradição oral persiste além da tradição escrita. E a

relação entre essas duas tradições é fonte de antagonismo, uma vez que

constitui um problema para o mundo ocidental. Conclui-se, portanto, que eles

compreendem a escrita como ―adição‖, e não como uma alternativa para a

oralidade.

Observamos que a visão autônoma da escrita ainda persiste, em nossa

realidade, nos contextos escolares e nas demais instâncias da vida social, já

que a escrita é compreendida como sendo desvinculada da oralidade e não se

leva em conta que os usos cotidianos de escrita se relacionam com a oralidade

de maneira diversa de acordo com os grupos sócio-culturais de que fazem

23

parte, como, por exemplo, as práticas de escrita que compõem as práticas

religiosas no contexto estudado.

Gnerre (1998) também faz reflexões sobre a escrita em uma perspectiva

histórico-cultural e cita, em linhas gerais, estudos sócio-históricos,

antropológicos e psicológicos já feitos sobre o tema a partir da segunda metade

do século XX. Observa que o final dos anos 50 foi um período marcado pelo

surgimento de ―autores de áreas diferentes, os quais produziram um conjunto

de obras que se tornaram referência obrigatória (...) levando ao

estabelecimento hoje do campo de estudo da escrita‖ (GNERRE, 1998, p. 72).

O autor enfatiza, em linhas gerais, que aquilo que se conhece como

escrita de acordo com o modelo hegemônico ―coexistiu com outras formas de

comunicação visual que não consideramos escrita‖ (GNERRE, 1998, p. 43). E

que os estudos das práticas de escrita desenvolvidas por pessoas de grupos

populares fundamentam-se em uma concepção de escrita diferente da visão

tradicional, que se baseia em regras prescritas pela gramática normativa, é

elitista, excludente, e serve como modelo de ―língua‖ para toda a sociedade.

Segundo o autor,

temos que refletir tanto sobre as atitudes, as expectativas e as crenças que outros grupos étnicos, outras classes sociais ou outros grupos de idade podem ter sobre a escrita, como sobre as atitudes e as crenças sobre a escrita compartilhadas dentro da própria tradição escrita, elaborada por minorias letradas ligadas ao poder político e econômico. (...) temos que encontrar estratégias que contribuam para novas atitudes com relação à escrita, que sugiram hipóteses interessantes sobre o uso e as funções da escrita e que (...), tratem de preparar o contexto psicológico e sócio-cultural mais adequado para que ele se realize. (GNERRE 1998, p. 46,47e 60)

Neste sentido, a oposição entre os pensamentos ―primitivo‖ e ―civilizado‖

atribuídos aos povos com escrita e sem escrita serve apenas para dar um

―caráter quase mítico‖ à escrita (GNERRE, 1998, p. 71).

Gnerre (1998) considera os estudos de Goody e Watt (1963) por serem

representantes importantes de algumas posições teóricas sobre a escrita.

Contudo, ele critica esses autores por ―pensaram somente as conseqüências

24

da escrita nas sociedades como totalidades e não como grupos sociais

privilegiados que controlavam o poder de uso da escrita‖ (GNERRE, 1998, p.

73).

O autor coloca que ―é impossível fazer generalizações como ‗sociedades

com escrita‘ por acreditar ser esta uma interpretação simplista, segundo a qual

não existe um sistema de ―amnésia estrutural‖ em comunidades com escrita. E

argumenta que ―existe uma forma de amnésia que em geral é controlada por

alguns grupos sociais‖ (GNERRE, 1998, p.74).

Goody e Watt (2006[1963]), segundo Gnerre (1998), destacam o caráter

cumulativo do léxico presente em sociedades com tradição escrita, e o sistema

de adaptação funcional da língua em sociedades sem tradição de escrita.

Todavia,

estas observações sobre linguagem são válidas não somente para sociedades orais, mas também para muitos dialetos chamados não-padrões em sociedades em que uma tradição escrita ficaram estabelecidas. Novamente o problema principal está em pensar em termos de sociedades como um todo e tentar fazer grandes generalizações em lugar de olhar para realidades específicas. (GNERRE, 1998, p.75)

A hipótese dos gregos terem-se desenvolvido cognitivamente graças ao

uso da escrita alfabética - defendida por Goody e Watt (2006[1963]) - é, na

opinião de Gnerre, por demais simplista, pois não considera as diferenças

existentes nas sociedades e ―... deixará de incluir articulações importantes de

diferenças dentro das sociedades.‖ (GNERRE, 1998, p.76)

Deste modo, a tensão entre oralidade e escrita, presente nas sociedades

modernas, é uma realidade e não um problema. Portanto, é necessário que a

escrita não seja vista como adição, mas como uma alternativa à oralidade nos

diferentes grupos sócio-históricos.

Marcuschi (2003) propõe o estudo da escrita e da oralidade como um

conjunto de práticas que se complementam de maneira complexa. Nesse

sentido, a língua é concebida essencialmente como um fenômeno social, sejam

os seus usos feitos no contexto escolar ou nos demais domínios discursivos.

25

Para tanto, o autor distingue oralidade de letramento, de um lado, e fala de

escrita, do outro.

De acordo com Marcuschi (2003), a oralidade ―seria uma prática social

que se apresenta sob variadas formas e gêneros textuais fundados na

realidade sonora‖ (MARCUSCHI, 2003, p.25).

O letramento, por seu turno, ―envolve as mais diversas práticas da escrita

(nas suas variadas formas) na sociedade‖ (MARCUSCHI, 2003, p.25). Essas

práticas vão desde as que requerem um domínio rudimentar do código gráfico,

uma vez que um indivíduo que participa de maneira expressiva na sociedade

sabe, por exemplo, identificar o valor do dinheiro, reconhecer determinadas

marcas de produtos, tomar um ônibus, dentre outras situações que requeiram o

seu envolvimento ativo nos grupos sociais em que esteja inserido. Portanto,

considera-se letrado não apenas os que escrevem, mas todos os que

participam de maneira significativa de práticas de letramento.

Na mesma perspectiva, Soares (2004) ao tratar do conceito de

letramento, afirma que ter-se apropriado da escrita é diferente de ter aprendido

a ler e a escrever, uma vez que ―aprender a ler e escrever significa adquirir

uma tecnologia, a de decodificar em língua escrita e de decodificar a língua

escrita; apropriar-se da escrita é tornar a escrita ―própria‖, ou seja, é assumi-la

como sua ―propriedade‖ (SOARES, 2004, p. 39). Enfim, o domínio do código

gráfico, a partir de um aprendizado seria, portanto, um tipo de letramento, que

é considerado o letramento formal.

Já a fala, segundo Marcuschi (2003, p.25), seria uma ―forma de produção

textual-discursiva para fins comunicativos na modalidade oral‖. Essa produção

revela que além dos recursos expressivos, a única necessidade que há para

desenvolvê-la é o que existe no próprio ser humano, no caso o aparelho

fonador, pois representa o uso da língua por meio de sons.

A escrita, por sua vez, representa uma forma de ―produção textual-

discursiva para fins comunicativos com certas especificidades materiais e se

caracterizaria por sua constituição gráfica‖ (MARCUSCHI, 2003, p.25). De

acordo com o autor, ela é uma modalidade de uso da língua que complementa

a fala.

26

Logo, escrita e fala se relacionam com os ―modos de representarmos a

língua em sua condição de código‖ (MARCUSCHI, 2003, p.26), em seus

aspectos sonoro e gráfico.

O autor afirma que pouco se sabe sobre a influência e o espaço ocupado

pela escrita na sociedade, quais os diversos usos de oralidade e de escrita que

são feitos nos diferentes contextos, e a relação entre as diversas atividades

comunicativas, o que justifica a importância do seu estudo e fundamenta a

investigação que propomos. De fato, geralmente, relacionamos as escritas aos

usos referendados pela escola e as relacionamos às diversas instâncias da

vida social em detrimento dos usos cotidianos de escrita, que são parte

fundamental da vida de pessoas de grupos populares.

Ao fazer considerações teóricas sobre a escrita numa perspectiva

histórico-cultural, ele lembra que a sua importância para a vida das pessoas é

reconhecida até mesmo pelos sujeitos que não a dominam e, nesse caso, é

importante constatar que ―(...) a escrita, após se tornar um fenômeno de massa

e desejável a todos os seres humanos, passou a receber um status singular no

contexto das atividades cognitivas de um modo geral‖ (MARCUSCHI, 2003,

p.21).

A partir de certo ponto do artigo, o autor introduz o conceito de ‗escrita‘,

que passa a ter o significado de ‗letramento‘. Do mesmo modo, o presente

trabalho utilizará o termo ‗escrita‘ neste sentido mais amplo, por considerá-la

um conjunto de ―práticas e usos da língua com características próprias‖

(MARCUSCHI, 2003, p.17), mas que mantêm relação complexa com a

oralidade.

Nesta perspectiva, não se pode tratar as relações entre oralidade e

escrita como opostas, uma vez que ―Mais do que uma simples mudança de

perspectiva, isto representa a construção de um novo objeto de análise e uma

nova concepção de língua e de texto, agora vistos como um conjunto de

práticas sociais‖ (MARCUSCHI, 2003, p.15).

O estudo das práticas de escrita desenvolvidas por pessoas de

determinados grupos populares, em seus diferentes contextos, sejam eles orais

ou escritos, durante muito tempo fundamentou-se em uma concepção

dicotômica, predominando, segundo Marcuschi (2003), a noção da supremacia

cognitiva da escrita como um bem em si mesma. Este fato confirma a

27

compreensão de escrita construída social e historicamente pelas elites, que é

excludente e está de acordo com o que Street (1993) chama de ―modelo

autônomo de escrita‖, visto acima.

Por sua vez, o conceito de ―oralidade e letramento como atividades

interativas e complementares no contexto das práticas sociais e culturais‖, a

partir de determinado momento dos estudos sobre a escrita, representa uma

reação aos estudos propostos até então, em que se ―examinavam a oralidade e

a escrita como opostas‖ (MARCUSCHI, 2003, p. 16).

Para o autor, a análise da natureza das práticas de escrita não considera

a sua hegemonia com relação à oralidade, e nem leva em conta a escrita como

simples representação da fala. Antes, ―oralidade e escrita são práticas de usos

da língua com características próprias, mas não o suficiente para caracterizar

(...) uma dicotomia‖ (MARCUSCHI, 2003, p.17). Por isso, se coloca como

(...) mais relevante do que identificar primazias ou supremacias entre oralidade e letramento, e até mesmo mais importante do que observar oralidade e letramentos como simples modos de usos da língua é a tarefa de esclarecer a natureza das práticas sociais que envolvem o uso da língua (escrita e falada) de um modo geral. Essas práticas determinam o lugar, o papel e o grau de relevância da oralidade e das práticas do letramento numa sociedade e justificam que a questão da relação entre ambos seja posta no eixo de um contínuo sócio-histórico de práticas. Este contínuo poderia ser traduzido em outras imagens, por exemplo,na forma de uma gradação ou de uma mesclagem. Tudo dependerá do ponto de vista observado e das realidades comparadas. (MARCUSCHI, 2003, p.18)

A concepção de escrita aqui delineada baseia-se, portanto, na relação

não dicotômica entre oralidade e escrita, ou seja, em um continum, uma vez

que ―fala e escrita são atividades comunicativas e práticas sociais situadas;

segundo, em ambos os casos temos um uso real da língua.‖ (MARCUSCHI,

2003, p.21). Ressalta-se, porém, que a oposição a esta visão dicotômica é

feita também por outros autores através da noção de ‗contínuo‘, mas em seu

sentido linear, o que foi criticado por Street (1993) e não está de acordo com o

28

conceito de escrita apresentado por Marcuschi, pois, em linhas gerais, não

considera as relações complexas entre as práticas orais e escritas.

Marcuschi (2003) argumenta, ainda, que as questões relativas à oralidade

e à escrita não são simples de serem tratadas, pois existem diferentes

perspectivas teóricas que não são unânimes em relação a elas.

Assim sendo, as relações entre oralidade e escrita não representam um

objeto de estudos único, por não serem lineares e sim dinâmicas, e se

basearem em um ‗contínuo‘ que se manifesta entre elas.

Neste contexto, o autor destaca especificamente a visão

sociointeracionista que ―(...) a rigor não forma um conjunto teórico sistemático e

coerente, mas representa uma série de postulados um tanto desconexos e

difusos‖ (MARCUSCHI, 2003, p.32 e 33). Compreende-se que isto se dá, pois

as relações que se estabelecem entre a fala e a escrita ocorrem por intermédio

da perspectiva dialógica e seus fundamentos principais estão fundamentados

nos usos estratégicos que, por sua vez, envolvem: ―(...) funções interacionais,

envolvimento, negociação, situacionalidade, coerência e dinamicidade.‖

(MARCUSCHI, 2003, p.32 e 33). De acordo com o autor, este fenômeno tem o

proveito de se entender com maior nitidez a língua enquanto fenômeno

interativo e dinâmico, cujas atividades se desenvolvem em tempo real.

Portanto, pensar a língua, nesta perspectiva, nada mais é do que propor uma

unicidade entre elementos como: habilidade, técnica, cognição e aspectos

sócio-culturais e históricos, todos esses relacionados à escrita.

2.2 A Escrita e os Gêneros Textuais

Os gêneros textuais, segundo Marcuschi (2005), são fenômenos

históricos associados à vida cultural e social. Trata-se de produtos que

contribuem para as atividades desenvolvidas no dia-a-dia, ou seja, ―são

entidades sócio-discursivas e formas de ação social (...)‖ (MARCUSCHI, 2005,

p.19). De acordo com o autor, os gêneros são dinâmicos e altamente

maleáveis, pois surgem a partir das necessidades e das ―atividades sócio-

culturais, bem como na relação com inovações tecnológicas (...)‖

(MARCUSCHI, 2005, p.19).

29

Do ponto de vista histórico, o autor coloca que o que fez multiplicarem-se

os gêneros típicos da escrita foi a invenção da escrita alfabética no século VII

A.C, sendo ampliados com o florescimento da cultura impressa e,

posteriormente, a industrializada. Segundo o autor:

Hoje, em plena fase da denominada

cultura eletrônica, como o telefone, o gravador, o rádio, a TV e, particularmente o computador pessoal e sua aplicação mais notável, a internet, presenciamos uma explosão de novos gêneros e novas formas de comunicação, tanto na oralidade como na escrita. (MARCUSCHI 2005, p.19).

Portanto, de acordo com Marcuschi (2005), nos últimos dois séculos, as

novas tecnologias ligadas à comunicação estiveram na base para fomentar o

surgimento de novos gêneros. Entretanto, convém observar que não são as

tecnologias em si que fazem surgir os novos gêneros, mas uma demanda

crescente por seus usos nas atividades discursivas da vida diária.

Marcuschi (2005) compartilha com Bakhtin (1997) e Bronckart (1999) a

idéia de que ―é impossível se comunicar verbalmente a não ser por algum

gênero, assim como é impossível se comunicar verbalmente a não ser por

algum texto‖ (MARCUSCHI, 2005, p.19). O autor destaca que a postura teórica

que desenvolve se insere nos quadros da hipótese sócio-interativa da língua,

para a qual, em linhas gerais, ―os gêneros textuais se constituem como ações

sócio-discursivas para agir sobre o mundo, constituindo-o de algum modo‖

(MARCUSCHI, 2005, p.22).

Conforme Marcuschi (2005), os chamados gêneros textuais emergentes

possuem identidade própria e instauram uma nova relação com os usos da

linguagem. É nesse sentido que Marcuschi afirma que, no contexto das

diversas mídias, emergem as formas de comunicação próprias ―com um certo

hibridismo que desafia as relações entre oralidade e escrita e inviabiliza de

forma definitiva a velha visão dicotômica (...)‖ (MARCUSCHI, 2005, p.21). Por

isso,

Inevitáveis relações entre escrita e contexto devem existir, fazendo surgir gêneros textuais e formas comunicativas, bem

30

como terminologias e expressões típicas. (MARCUSCHI, 2003, p.19).

Desta forma, Marcuschi (2003) sugere um contínuo de gêneros textuais

que corresponde a um ―eixo sócio-histórico de práticas (...)‖ (MARCUSCHI,

2003, p.18), em que se situa o que ele denominou domínios mistos, ou seja,

textos ―situados no entrecruzamento de fala e escrita‖ (MARCUSCHI, 2003,

p.18). Entre estes, há o que o autor chama de gêneros síncronos como, por

exemplo, os ‗chats‘, ou bate-papos on-line. Estes gêneros síncronos são novas

maneiras do homem se relacionar com a escrita, ―mas não propriamente uma

nova forma de escrita‖ (MARCUSCHI, 2003, p.18).

Além dessa relação complexa entre oralidade e escrita, também é

possível ―observar a maior integração entre os vários tipos de semioses: signos

verbais, sons, imagens e formas em movimento‖ (MARCUSCHI, 2005, p.21),

caracterizada por seus aspectos sócio-comunicativos e funcionais.

Porém, os novos gêneros ancoram-se em gêneros já existentes, só que

com novos objetivos. Temos, como exemplo, as mensagens eletrônicas

enviadas por e-mail, cujos antecessores são as cartas e os bilhetes, assim

como o telefonema, que tem na conversação a sua pré-existência.

Marcuschi (2005) faz a ressalva de que ―embora os gêneros textuais não

se caracterizem nem se definam por seus aspectos formais, sejam eles

estruturais ou lingüísticos, e sim sócio-comunicativos e funcionais, isso não

quer dizer que estejamos desprezando a forma‖ (MARCUSCHI, 2005, p.21).

Assim sendo, em alguns casos, ―são as formas que determinam o gênero e,

em outros tantos serão as funções. Contudo, haverá casos em que será o

próprio suporte ou o ambiente em que os textos aparecem que determinam o

gênero presente‖ (MARCUSCHI, 2005, p.21). Desta maneira, funções, formas

e suporte podem definir os gêneros que surjam na sociedade. Neste último

caso, por exemplo, um texto pode aparecer em uma ‗revista científica‘ e

constituir o ‗gênero artigo científico‘. Mas, esse mesmo texto, ao ser publicado

em um ‗jornal diário‘, se tornaria um ‗artigo de divulgação científica‘. Portanto,

embora sendo o mesmo texto, pertence a dois gêneros, uma vez que a sua

classificação é decorrente do suporte em que os textos são veiculados.

31

É importante destacar a noção de ‗domínio discursivo‘, que Marcuschi

(2005) distingue da noção de gênero textual. De acordo com o autor, domínio

discursivo constitui-se como ―(...) esfera ou instância de produção discursiva ou

atividade humana. Esses domínios não são textos nem discursos, mas

propiciam o surgimento de discursos bastante específicos. Do ponto de vista

dos domínios, falamos em discurso (...) religioso, literário, etc.‖ (MARCUSCHI,

2005, p. 23 e 24). Segundo o autor, as atividades religiosas, por exemplo,

―constituem práticas discursivas dentro das quais podemos identificar um

conjunto de gêneros textuais que, às vezes, lhe são próprios (em certos casos

exclusivos) como práticas ou rotinas comunicativas institucionalizadas‖

(MARCUSCHI, 2005, p.24).

Marcuschi (2005) frisa que, embora os gêneros sejam definidos a partir de

seus propósitos, funções, interesses e intenções, e não pelas formas, tem-se

que reconhecer ―o alto poder organizador das formas composicionais dos

gêneros‖ (MARCUSCHI, 2005, p.32). Nesse sentido, ele cita as três

características dos gêneros apresentadas por Bakhtin (1997), que são:

composição, estilo e conteúdo.

Portanto, Marcuschi (2005) propõe uma definição operacional de gênero

textual, em que predominam os critérios de ―ação prática, circulação sócio-

histórica, funcionalidade, conteúdo temático, estilo e composicionalidade,

sendo que os domínios discursivos são‖ as grandes esferas da atividade

humana em que os textos circulam‖ (MARCUSCHI, 2005, p.24 e 25).

Em suma, para Marcuschi (2005), ―gêneros são formas verbais de ação

social relativamente estáveis realizadas em textos situados em comunidades

de práticas sociais e em domínios discursivos específicos‖ (MARCUSCHI,

2005, p. 25).

Bakhtin (2003[1979]), na mesma perspectiva, defende, em linhas gerais,

que a linguagem se constitui pela prática social. Para o autor, o enunciado ou

texto é a unidade real da comunicação verbal, porque representa fenômeno

concreto da língua.

Bakhtin aborda a questão do uso da língua, relacionando-a a todas as

esferas da atividade humana. Para ele, a sua utilização refere-se aos

enunciados concretos e singulares, tanto orais como escritos, o que não

contradiz a noção de unidade da língua. Por seu turno, os enunciados refletem

32

condições que estão relacionadas a finalidades específicas de cada uma

destas esferas, levando em consideração o conteúdo temático, o estilo da

linguagem, a seleção de recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais e, acima

de tudo, a construção composicional. Nesse sentido, o autor considera que

―cada enunciado particular é individual, mas cada campo de utilização da

língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, os quais

denominamos gêneros do discurso‖ (BAKHTIN, 2003[1979], p.262).

Os gêneros do discurso são inesgotáveis, pois se relacionam às

atividades humanas. Então, conforme Bakhtin (2003[1979]), quanto mais

complexa e diferenciada cada esfera de comunicação, mais complexo e

diferenciado será um repertório de gêneros do discurso. Por essa razão, o

autor coloca como relevante a heterogeneidade dos gêneros do discurso orais

e escritos, o que impossibilita um plano exclusivo para o estudo de material

lingüístico concreto, ou seja, enunciados concretos (orais e escritos), de acordo

com diferentes esferas da atividade e da comunicação.

Não há, nesta perspectiva, enunciado inteiramente neutro, uma vez que o

seu sentido concreto reflete a relação de valores que os sujeitos mantêm com o

objeto do discurso, o que gera a escolha dos recursos lexicais, gramaticais e

composicionais do enunciado, ou seja, os seus aspectos expressivos.

Bakhtin (2003[1979]) diferencia gêneros discursivos primários ou simples

de gêneros discursivos secundários ou complexos. Os primários, como, por

exemplo, o diálogo cotidiano, a carta no romance, dentre outros, se formam

nas condições da comunicação discursiva imediata e podem integrar os

gêneros complexos. Já os secundários, absorvem e transformam os gêneros

primários, dado o seu surgimento ocorrer em um convívio cultural mais

complexo e relativamente muito desenvolvido e organizado,

predominantemente escrito. Estes, nestes casos, perdem a sua relação

imediata com a realidade existente e com a realidade dos enunciados alheios.

Ou seja, gêneros secundários são uma interface dos gêneros primários. São,

por exemplo, os romances, as pesquisas, etc.

Desta forma, há gêneros que ocorrem nas duas esferas de comunicação

verbal. E são nas comunicações interativas da vida diária que o processo

combinatório dos gêneros discursivos desenvolve-se com maior intensidade,

porque decorrem diretamente de formas representativas do mundo cotidiano.

33

Entretanto, de acordo com Bakhtin (2003[1979]) há gêneros do discurso

que requerem uma forma padronizada e apresentam condições menos

favoráveis para refletir a individualidade do falante ou de quem escreve, como,

por exemplo, os documentos oficiais ou de ordem militar, dentre outros. Neste

caso, os gêneros do discurso refletem apenas aspectos superficiais da

individualidade.

Os gêneros são sócio-culturalmente marcados, e qualquer mudança

social que exista os gêneros irão acompanhar e refletir. Por isso, ―as mudanças

históricas dos estilos da linguagem estão indissoluvelmente ligadas às

mudanças dos gêneros do discurso‖ (BAKHTIN, 2003[1979], p.267). Logo, há

uma capacidade transformadora dos gêneros, pois eles fazem revelações

significativas sobre os homens e as suas ações no tempo e no espaço.

Esta pesquisa, a partir das exposições teóricas sobre gêneros feitas, de

acordo com os autores citados, considerará os dados de escrita coletados e

observados em função dos diversos gêneros do discurso a que pertencem,

analisados aqui como entidades sócio-historicamente situadas, de acordo com

os sujeitos, as finalidades discursivas, e as diferentes esferas contextuais da

atividade e da comunicação (BAKHTIN, 2003[1979]), no caso, o domínio

familiar e o contexto escolar, embora se reconheça que os gêneros também

são caracterizados pelas suas formas composicionais e pelo estilo.

2.3 Os eventos de escrita: oralidade, escrita e contexto social

Este item do trabalho tratará da escrita enquanto conjunto de eventos que

constitui as práticas cotidianas de determinados grupos sociais. O conceito de

―evento de escrita‖ foi proposto por Heath no capítulo sobre Tradições de

Escrita do seu livro Ways with words: language, life and work in communities

and classrooms (1983), que se refere a estudo realizado em três comunidades

americanas pela autora, em meados da década de 1970.

Este estudo é considerado referência de pesquisa etnográfica sobre a

escrita enquanto conjunto de eventos que constituem as ações do cotidiano.

Pesquisadores, como Street (1993), Kleiman (1995), Rojo (2006), Signorini

(2006), Marcuschi (2006), Souza (2006), Terzi (2006), Magalhães (2006),

dentre outros que se interessam pelas práticas cotidianas de escrita enquanto

34

práticas sociais, citam este seu estudo. Por isto ser pertinente incluir a sua

resenha neste item do trabalho.

Trata-se de uma pesquisa desenvolvida nas cidades de Trackton,

Roadville e Maintown, sendo a primeira uma comunidade negra com dezessete

famílias e a segunda uma comunidade branca do mesmo tamanho.

Em Trackton, os eventos de escrita das crianças não são estimuladas

pelas mães. O que ocorre, geralmente, é a exposição das crianças às

conversas dos adultos sobre diferentes assuntos, inclusive quando estes se

referem a textos lidos por eles em voz alta. Durante a leitura dos textos em

espaço coletivo, como por exemplo, os referentes à correspondência recebida,

o seu sentido é negociado oralmente pelas pessoas presentes, que fazem

comentários e questionamentos sobre eles, com a finalidade de ajudar a decidir

a ação que deve advir destes textos, como as repostas a serem dadas,

providências a serem tomadas, etc.

Os únicos textos cujos sentidos não são negociados pelos adultos a partir

da sua leitura, em Trackton, são aqueles que se referem a vantagens ou

disputas, como: propostas de emprego ou imposto de renda. Ou seja,

The meaning of whatever is read is

interpreted jointly and socially: "What does it mean?" becomes "What does it say about me, or someone or something. I know, and what do I do?" But such meaning is not built individualIy, except in financial matters, because the community members share their experiences to build interpretive bridges from

print to practice.4 (HEATH, 1983, p. 232)

Posteriormente, como nas residências de Trackton não há acúmulo de

materiais de leitura, as cartas que foram lidas são queimadas, utilizadas para

outros fins, ou imediatamente descartadas.

Segundo Heath (1983), as crianças, em Trackton, não têm livros. Porém,

as crianças pequenas, em fase pré-escolar, participam de manifestações

4O significado de tudo o que se lê é interpretado conjunta e socialmente: "O que significa isso?"

se torna "O que isso diz sobre mim, ou alguém ou alguma coisa. Eu sei, e o que eu faço‖? Mas tal significado não é construído individualmente, exceto em operações financeiras, porque os membros da comunidade compartilham suas experiências para construir pontes de interpretação do impresso para a prática.

35

cotidianas de escrita quando "lêem para aprender", ou seja, quando

conseguem identificar rótulos de produtos alimentícios de supermercado,

mensagens da televisão, dentre outros eventos, tanto em casa como em locais

públicos como a praça, lojas e o supermercado. Elas aprendem a rivalizar na

leitura quando esta é um jogo de competição para testarem o conhecimento ou

para fazer um favor. Lembram-se do significado de uma sentença a partir da

recriação da cena e do contexto em que ocorrem. Os suportes em que se

encontram os textos, como, por exemplo, um pote ou lata, ajudam a leitura

destas crianças, em fase pré-escolar, graças às cores, ao tamanho e aos tipos

de letras, ou seja, à linguagem visual. Portanto, o significado da escrita está

intrinsecamente relacionado ao contexto e, especificamente, ao evento de que

faz parte.

Assim, para as crianças serem bem sucedidas em sua comunidade, elas

lêem o que precisam saber em sua vida cotidiana antes de irem para a escola,

no fluxo diário de comer, comprar e jogar. Em resumo, segundo Heath (1983),

as práticas constituídas por esta leitura é que fazem com que os sujeitos leiam

para aprender.

Os únicos textos disponíveis para as crianças em idade escolar e os

adultos de Trackton lerem são os utilizados pela igreja local durante os seus

cultos religiosos, como: pregação, canto e oração, inclusive com troca de

turnos de fala entre os seus participantes.

Esses eventos caracterizam-se, neste contexto específico, pela relação

entre oralidade, escrita e expressão corporal como, por exemplo, palmas e

dança, e leitura coletiva em voz alta, tanto é que quem não faz parte deste

grupo de fiéis não consegue acompanhá-lo. Desta maneira, as palavras

escritas são ação, e fundem-se criativamente com a oralidade:

(…)Preachers, men of music, and the best playsong performers claim they cannot stick to written text. Seemingly thoughts which were once shaped into words on paper become recomposed in each time and space. Abiding by the written word limits one's performance from being created a new with

36

each audience and setting. (HEATH, 1983, p. 233)5

Estes textos religiosos aproximam um público diversificado formado por

crianças, adultos, idosos e pessoas de escolaridade e profissões variadas, já

que fiéis de outras localidades freqüentam o templo.

O texto religioso é renovado, ressignificado a cada culto, mas ao mesmo

tempo cristaliza-se, já que permanece como significante, ou seja, preserva-se

enquanto forma. Por isto o caráter recorrente, mas, ao mesmo tempo, singular

dos eventos de escrita que constituem os cultos religiosos, e que fazem parte

das tradições de escrita de Trackton.

Desta forma, não há qualquer espaço ou tempo atribuído para a leitura;

suas ocorrências seguem o fluxo diário de interações sociais e de tomada de

decisão na comunidade.

Em Trackton, de acordo com Heath (1983), escreve-se pouco. Cartas ou

cartões são escritos apenas quando há impossibilidade de comunicação oral. O

que é característico de poucas mulheres jovens em Trackton é a troca de

cartas com mulheres de outras cidades. Cada carta trocada representa o turno

de um diálogo, e só as suas autoras entendem o seu significado, visto que

instauram um ritual de perguntas e respostas.

Em Roadville, de acordo com Heath (1983), a leitura é valorizada pelos

adultos. Os homens apresentam especial interesse por artigos que informem

sobre comércio, esporte, dentre outros. Já as mulheres voltam a sua atenção

para as matérias que envolvem, dentre outras coisas, a culinária.

Já as leituras em voz alta de histórias infantis feitas pelos pais, nesta

comunidade, acompanhadas de perguntas e respostas sobre os textos lidos,

são constantes na vida das crianças, e, normalmente, ocorrem com mais

intensidade até elas completarem os três anos de idade, quando ainda não

freqüentam a escola, ou seja, quando ainda não sabem ler e escrever.

Portanto, as situações que representam as primeiras experiências com a

escrita ocorrem à margem do ensino formal. E desde criança os sujeitos podem

5(...) Pregadores, músicos e os melhores performers das canções alegam que não podem

manter-se fiéis ao texto escrito. Aparentemente, pensamentos que uma vez foram colocados em palavras no papel se recompõem em cada tempo e espaço. Novas frases são criadas a partir da observância da escrita e se repetem a cada público e se apresentam com configurações variadas. (HEATH, 1983, p. 233)

37

ter contato com o material estocado nas casas, já que os adultos consideram

estes materiais e os seus usos importantes para o desenvolvimento intelectual

e espiritual de cada criança.

A partir dos três anos de idade, os eventos de escrita que serviam para

instruir e/ ou entreter não mais ocorrem com a mesma intensidade, uma vez

que as crianças passam a freqüentar a escola, e a atenção dos pais, que

promoviam atividades de leitura, não é mais a mesma, pois, para eles, haverá

sobreposição das experiências pré-escolares com as experiências que a escola

poderá promover. Neste contexto, as crianças, ao chegarem à escola,

demonstram um desempenho satisfatório nas atividades de escrita nas três

primeiras séries, o que corresponde às práticas encorajadas pela família, ao

passo que, da quarta série em diante, este desempenho piora para a maioria

das crianças, já que os pais deixam as atividades de escrita sob a

responsabilidade da escola.

Por sua vez, as práticas de produção textual, em Roadville,

diferentemente das de Trackton, servem não apenas de auxílio para a

memória, mas também para se estabelecerem interações entre os adultos. Os

textos escritos são cartas agendas, listas de compras e de telefones, bilhetes,

receitas, dentre outros.

Por fim, em Maintown, as atividades de escrita são valorizadas pelos

sujeitos em suas atividades cotidianas, e a expectativa dos pais é a de que

seus filhos desenvolvam estas práticas em eventos específicos, que começam

desde cedo, quando as crianças aprendem a conviver com a escrita como

entretenimento, até o seu aprendizado formal. Um exemplo do incentivo a

estes usos de escrita, de acordo com Heath (1983), é o de que, ao primeiro

sinal de interesse da criança por algum evento de escrita, em casa, o adulto

interrompe o que está fazendo para encorajá-la.

Podemos afirmar, nesta perspectiva, que cada comunidade possui

padrões próprios de uso da escrita de acordo com as diferentes relações entre

escrita, oralidade e os eventos em que ocorrem. Portanto, a pesquisa de Heath

(1983) mostra, em uma perspectiva etnográfica, que os diferentes grupos se

caracterizam pelas tradições de escrita que mantêm, baseadas nas formas de

negociação de seu significado, nos valores histórico-culturais que os

constituem, no poder de decidir sobre a ação, nos usos dos espaços e do

38

tempo, e nas relações entre os diferentes sujeitos, nos diversos eventos do

cotidiano.

Heath (1983) deixa claro que não podemos considerar as três

comunidades nem totalmente orais e nem totalmente letradas, visto que os

padrões de escrita se constituem historicamente dentro de cada grupo social e

mantêm relações complexas com oralidade, a partir dos seus usos em

contextos diversos do cotidiano.

O estudo etnográfico realizado por Heath (1983) sobre eventos de escrita,

mostra a possibilidade de se investigar e descrever as atividades de recepção

e produção de textos que são próprias de determinado grupo social. Nesta

perspectiva, é pertinente para o nosso trabalho observar quais as escritas

fazem parte da vida dos sujeitos investigados, e examinar se as práticas

escolares de escrita têm relação com estas escritas do cotidiano, ou se pelo

menos aquelas lhes são familiares e se têm significado para eles enquanto

textos.

2.4 Escrita e o contexto Escolar

Este sub-item do trabalho abordará, em linhas gerais, conceitos de

letramento, tendo em vista as práticas escolares de escrita.

Marcuschi (2003), como já visto no item 2.1, introduz o conceito de

escrita, que passa a ter o significado de letramento, considerado um processo

histórico e social que constitui grande parte das práticas culturais nos diversos

contextos de interação verbal, incluindo os contextos informais. Letramento,

portanto, representa um conjunto de práticas e, nesse caso, há mais de um

letramento.

Existem, por exemplo, ‗letramentos sociais‘ que se desenvolvem à

margem da Escola, e que não devem ser desconsiderados. Já a escrita, em

seu caráter institucional, é fruto de um aprendizado mediante ensino e requer o

domínio ativo e sistemático das habilidades de leitura e escrita, ou seja, da

modalidade escrita da língua.

Dessa maneira, a escrita, na escola, representa, portanto, a

manifestação formal do letramento. Possui, neste sentido, grande prestígio

cultural como bem inquestionável. A sua apropriação permite aos sujeitos

39

participarem ativa e sistematicamente de diversas atividades que requerem

diferentes usos da língua.

Em suma, ressalta-se que letramento não é sinônimo de aquisição de

escrita. Neste sentido, Marcuschi (2003) faz distinções entre padrões de

alfabetização e processos de letramento. Ou seja, entre a apropriação e

domínio formal das habilidades de leitura e escrita, ou de uma tecnologia, e os

usos e funções de escrita enquanto um conjunto de práticas sociais mais

amplas.

Marcuschi (2003) acrescenta que muito se conhece sobre o processo de

alfabetização no contexto escolar. Entretanto, pouco se sabe sobre a influência

e o espaço ocupado pela escrita na sociedade, sobre os usos de escrita que

são feitos nos diferentes contextos, enquanto práticas sociais situadas, e as

relações entre as diversas atividades comunicativas. Os diferentes usos sociais

de escrita merecem, portanto, ser investigados, para que se possa refletir sobre

as escritas que são propostas aos diferentes sujeitos pela Escola.

Kleiman, no artigo Os Significados do Letramento (1995), propõe o

conceito de letramento como prática social e eventos, relacionando a escrita

aos seus usos, às funções que estes exercem nos diferentes contextos e ao

impacto que historicamente provocam nos diversos grupos sociais. Neste

sentido, Kleiman (2006) observa que a escrita está presente na oralidade em

sociedades tecnológicas, como é o caso da nossa. E como exemplo da relação

complexa entre escrita e oralidade, a autora cita o fato do sujeito, ao escutar

notícias no rádio, estar participando de um evento de letramento, já que este se

constitui de marcas típicas da modalidade escrita da língua. Desta maneira, o

letramento adquire múltiplas funções e significados a depender dos contextos e

dos eventos de que faz parte.

Já em Kleiman (2006), presente em Rojo (2006), a autora refere-se a dois

projetos de pesquisa sobre o processo de letramento entre sujeitos letrados e

não-letrados. O seu objetivo maior é investigar como ocorre a inserção de

adultos não-escolarizados na prática letrada do contexto escolar

A escola, segundo Kleiman (2006), é uma instituição ou agência de

letramento que, dentre outras funções, aproxima a oralidade de sujeitos não-

alfabetizados da oralidade letrada de outras pessoas. Nesta perspectiva, ela

modifica a oralidade de seus alunos, tendo em vista as interações discursivas

40

que requerem um monitoramento da fala, por meio da introdução do código

escrito. Ou seja, a escola impõe marcas formais da fala letrada,

complementares às de outros registros em diferentes contextos, cuja função se

restringe às situações da sala de aula e, desta forma, introduz alguns gêneros

textuais com a finalidade de descrever tarefas independentes das situações

que requerem o uso efetivo ou cotidiano da língua.

A autora destaca, também, em seu texto, que a família letrada constitui ―a

agência de letramento mais eficiente para garantir o sucesso escolar‖

(KLEIMAN, 2006, p. 182). Neste contexto, as práticas de escrita fazem parte

das ações cotidianas dos sujeitos em eventos como: leitura de jornal, redação

de um bilhete, consulta a uma agenda como suporte para a memória, rabisco

como ocupação manual durante concentração, leituras de livros de cabeceira,

dentre muitos outros. Ou seja, ―para a criança cujo letramento se inicia no lar,

no processo de socialização primária, não procede a preocupação sobre se ela

aprenderá a ler ou não, muito presente, entretanto, nos pais de grupos

marginalizados‖. (KLEIMAN, 2006, p. 183).

Embora a escola seja uma instância de socialização e a mais importante

agência de letramento, sua maior preocupação não tem sido com o letramento

enquanto prática social, mas apenas com o aprendizado do letramento formal,

que corresponde à alfabetização, ou ao domínio do código gráfico, concebido

como a aquisição de uma competência individual que é imprescindível para o

sucesso e promoção na escola e na vida social. Entretanto, a autora destaca

que ―outras agências de letramento, como: a família, a igreja, a rua como lugar

de trabalho, mostram orientações de letramentos muito diferentes.‖ (KLEIMAN,

2006, p. 20)

As manifestações de letramento, em seu nível mais elementar, e que

ocorrem fora do contexto escolar, são próprias de sujeitos que, sem saberem

ler e escrever, ao freqüentar, por exemplo, templos ou grupos religiosos

passam a participar de eventos de escrita, os quais mantêm uma relação

peculiar com a oralidade e com o contexto discursivo, a partir da necessidade

que estas pessoas têm de assumir ou desempenhar funções que requerem

esse domínio específico.

41

Assim como se observam sujeitos que, sem qualquer conhecimento

digital passam, por exemplo, a fazer uso básico do computador, a partir da

necessidade de contato e utilização desta tecnologia.

Kleiman (2006) cita os estudos de Carraher & Schliemann (1998), os

quais observam crianças que resolvem cotidianamente problemas de

matemática a partir da interação com seus pais que têm barraca em feira e, em

um primeiro momento, os acompanham ao trabalho sem qualquer

envolvimento nas atividades da barraca. Entretanto, normalmente, a partir dos

dez anos, eles assumem determinadas atividades e passam ao exercício de

vendedores ambulantes, o que lhes garante apropriação de sistemas abstratos

de cálculos matemáticos em meio às interações com os responsáveis e

fregueses.

As situações descritas pelos autores em seu artigo, segundo Kleiman

(2006), como a do exemplo acima, mostram que os sujeitos obtêm eficiência

nas transações ligadas à sobrevivência, bem como se tornam competentes no

aprendizado de outras orientações de letramento, as quais são manifestações

―extremamente eficientes, porém muito diferentes dos sistemas utilizados pela

escola no processo de alfabetização.‖ (KLEIMAN, 2006, p. 20). Por essa razão,

segundo a autora, as práticas de escrita priorizadas pela escola sustentam um

modelo de letramento dominante, institucionalizado, considerado por muitos

pesquisadores parcial e equivocado, visto considerarem apenas um tipo de

letramento e desconsiderarem as práticas de letramento plural que estão

presentes nos movimentos populares e nos diferentes contextos sócio-

culturais.

Rojo (2006), em seu artigo, discute as concepções não valorizadas de

escrita: a escrita como um outro modo de falar. Ela trata de algumas

concepções valorizadas sobre escrita, ou seja, mitologias cristalizadas na

prática social em contextos institucionais, tais como: família, escola, dentre

outros. Trataremos das considerações teóricas sobre concepções de escrita

que a autora apresenta, sem, entretanto, levar em conta os exemplos extraídos

de pesquisa realizada por ela e que ilustram o seu texto, e as discussões que

se seguem daí.

Dentre as concepções valorizadas na prática social, nos contextos

institucionais, sobre a escrita enquanto objeto , destacam-se, por exemplo:

42

―aquela que o caracteriza como um artefato contraposto à ‗naturalidade‘ da fala

e aquela que o caracteriza como uma transposição (...) da língua oral‖ (ROJO,

2006, p. 66). Crenças e mitos correspondem a estas concepções valorizadas

da escrita, com relação à sua construção pela criança no processo de

letramento. Destacam-se, entre eles, o mito da escrita dependente da fala.

Segundo Rojo, este se refere a um processo considerado natural e primitivo, ou

seja, a construção da escrita pelo sujeito em seu desenvolvimento desde a

fecundação até a maturidade para a reprodução só é possível tardiamente,

escolarmente. Desta maneira, esse processo se dá como aprendizado ―a partir

de técnicas (métodos, quaisquer que estes sejam), planejadas artificialmente‖

(ROJO, 2006, p. 66).

Um outro mito é o da escrita estando em segundo lugar em relação à fala,

por isso ―a escrita teria relações (uni) lineares (da fala para a escrita) e

regulares, não discursivas, mas representacionais, com esta primeira

modalidade‖ (ROJO, 2006, p. 66).

Outra concepção valorizada sobre a escrita é a que a caracteriza como

independente e acessível ao conhecimento geral, e que sustenta o mito de que

ela ―seria em si transparente e acessível imediatamente à criança, desde que

apresentada por ‗boas técnicas‘ (métodos)‖. (ROJO, 2006, p. 67).

Rojo ainda menciona a concepção que caracteriza o ―objeto‖ escrita como

uma forma simplificada e ‗arbitrária‘ de desenho, que evolui do pictograma ao

alfabetário. A escrita, portanto, seria um aparato gráfico arbitrário. Neste

contexto, ―seria mais ‗natural‘ que a ‗etapa‘ de grafização da fala como signo –

a escrita - sucedesse à ‗etapa‘ de grafização do mundo como símbolo‖ (ROJO,

2006, p. 66 e 67).

Assim, essas concepções institucionalizadas, e, por essa razão,

valorizadas, ainda se fazem presentes tanto na prática educativa quanto no

senso comum ou mesmo nos estudos acadêmicos sobre o campo da escrita.

A noção mais recente de letramento contrapõe-se às concepções míticas

sobre a escrita como as vistas acima, segundo Rojo (2006), e está de acordo

com a noção de letramento proposta por Kleiman (1995), que o caracteriza

como prática social e eventos que relacionam a escrita aos seus usos, às

funções que estes exercem nos diferentes contextos e ao impacto que

historicamente provocam nos diversos grupos sociais.

43

Esta noção mais recente de letramento contrapõe-se às concepções

institucionalizadas de escrita enquanto objeto. Segundo Catach (1986, p. 14),

por exemplo, para uma dada língua existirá um dado sistema gráfico

correspondente, ou seja, a questão seria apenas de mudança de ‗forma de

expressão‘ (de significantes), ou mesmo de signos lingüísticos (significantes e

significados).

Por outro lado, tendo em vista o processo de letramento emergente, há

autores, como os citados Garnton & Pratt (1989), que enfatizam a continuidade

entre as modalidades falada e escrita da língua, ao lembrar, dentre outras

questões, que se espera de pessoas letradas que demonstrem domínio da

linguagem falada. A autora também cita Lentin (1986, p. 114-117), quando ele

fala de um mesmo sistema sintático ainda imperfeitamente conhecido que rege

a língua oral e a língua escrita, as quais são consideradas como um conjunto

de variantes enunciativas ajustadas pelos sujeitos às necessidades do uso em

contextos discursivos. O autor considera que, de modo geral, as pessoas

dispõem de três conjuntos de variantes enunciativas (enunciações que podem

ser faladas ou escritas, e as que podem ser faladas e escritas), que ocorrem

em número praticamente ilimitado.

Logo a seguir, Rojo critica Lentin, no mesmo trabalho, quando este trata

do domínio da escrita pela criança. Segundo o seu pressuposto de base

socioconstrutivista, a criança passa automaticamente, sem ruptura, de

falar/pensar para pensar/ler /escrever, o que lhe exige autonomia enquanto

leitor e/ou enunciador de escrita, a partir de um treinamento realizado na

interação constante entre ela e o adulto, que lhe tenha garantido o domínio oral

do sistema sintático da língua. Segundo Rojo (2006), esta é uma visão

(uni)linear da relação entre oralidade e escrita, que se baseia numa visão geral

das exigências sócio-históricas para a construção da escrita com relação a um

povo ou aos sujeitos, e, por outro lado, nas necessidades discursivas que as

cercam.

Deste modo, ―concepções bastante variadas sobre o objeto ‗escrita‘

emergem nas interações sociais adulto/criança, e como estas são, por meio

dos mesmos procedimentos interacionais, desvalorizadas, ou cristalizadas /

mitificadas‖ (ROJO, 2006, p. 69). De acordo com Rojo, parte dessas

44

concepções se refere aos poderes da própria criança ―a quem nem sempre é

permitido ‗brincar‘ de ler/ escrever‖ (ROJO, 2006, p. 69).

Nesse sentido, Rojo (2006) critica, através de Lemos (1988), o fato de se

considerar a oralidade como um processo natural que precede a educação

formal da escrita. Assim, a autora coloca que é necessário pensar no jogo do

faz- de- conta no desenvolvimento do letramento, bem como no grau de

letramento das instituições sociais, tais como: família, (pré) escola, etc, em que

a criança esteja inserida. Deve-se pensar, portanto, nas práticas de leitura e de

escrita que fazem parte de seu cotidiano, e nas diferentes formas de

participação em práticas orais nas quais estas práticas de letramento ganham

significado.

Portanto, de acordo com Rojo (2006), o modo de participação oral de

crianças nas práticas de leitura/escritura que dependem do grau de letramento

escolar e/ou pré-escolar e familiar é que caracterizará a construção de uma

relação com a escrita enquanto prática discursiva e enquanto objeto.

São nas práticas orais, que Rojo enfatiza a importância do faz- de- conta

que se lê e se escreve. Para o processo de letramento emergente, são nelas

que se estabelecem ou não o sentido do objeto e das práticas de escrita para a

criança. Logo, estes jogos permitem às crianças desempenharem diversos

papéis: daqueles que fazem de conta que lêem e escrevem, dos que lêem e

escrevem, e dos que não podem porque não sabem, nas diferentes instituições

sociais. Assim,

―É na presença/ausência do brincar de ler para a criança (jogos de contar), no brincar de ler com a criança, no brincar de desenhar e escrever (jogos de faz-de-conta) que se reencontra o sentido social da escrita daquela subcultura letrada‖ (ROJO, 2006, p. 71).

Quanto à abordagem da escrita no contexto escolar, podemos considerar,

em linhas gerais, tendo em vista a nossa pesquisa, os Parâmetros Curriculares

Nacionais da Educação Básica (1997), neste caso, os direcionados para o 1º e

2º ciclos que tratam, dentre outras questões, das concepções teóricas sobre

língua, escrita e texto que devem subsidiar o trabalho com língua escrita neste

espaço.

45

Segundo um dos seus objetivos gerais, a escola deve priorizar o uso das

diferentes linguagens como meio para o sujeito se expressar e se comunicar,

atendendo às diferentes intenções e situações de comunicação. Diante disso, o

Ministério da Educação estabelece como meta, a ser atingida ao longo dos oito

anos do ensino fundamental, que os alunos ampliem a sua competência

comunicativa, tendo em vista as diferentes instâncias da vida social, a fim de

obter acesso aos bens culturais e alcançar a participação plena no mundo

letrado. Assim, para que essa perspectiva se concretize, o ensino de Língua

Portuguesa deve ―utilizar diferentes registros, inclusive os mais formais da

variedade lingüística valorizada socialmente, sabendo adequá-los às

circunstâncias da situação comunicativa de que participam‖ (PCN, 1997, p.41).

Nesse sentido, os Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN (1997)

compreendem a língua enquanto um conjunto de usos orais e escritos

significativos que constituem práticas complementares, respeitando-se a

realidade lingüística dos falantes e os diversos contextos discursivos em que se

encontrem.

No que se refere às práticas de leitura e de escrita que se desenvolvem

no espaço escolar, o documento chama a atenção para o fato de que:

A relação que se estabelece entre leitura e escrita(...) não é mecânica: alguém que lê muito não é, automaticamente, alguém que escreve bem (...). É nesse contexto — considerando que o ensino deve ter como meta formar leitores que sejam também capazes de produzir textos coerentes, coesos, adequados e ortograficamente escritos - que a relação entre essas duas atividades deve ser compreendida. (PCN, 1997, p.40)

Deste modo, assim como não é mecânica a relação entre escrita,

oralidade, e seus usos fazem parte do contexto em que ocorrem, não há como

se legitimar uma separação entre as práticas de escrita e os usos efetivos da

comunicação humana. O texto escrito, nesta perspectiva, representa a

concretização de um discurso, situado sócio-historicamente .

Nesse sentido, não é papel da escola reproduzir irrefletida ou

automaticamente os aspectos gramaticais da língua, mas se constitui como

46

espaço modelizador dos eventos de escrita, como convém assinalar o que nos

trazem a esse respeito os PCN (1997), em que o trabalho com a leitura e a

escrita tem como finalidade a formação de leitores e escritores competentes,

visto que ― a possibilidade de produzirem textos eficazes tem sua origem na

prática de leitura, espaço de construção da intertextualidade e fonte de

referências modelizadoras.‖ (PCN, 1997, p.40)

A despeito do mito que caracteriza a escrita como transposição da língua

oral, os Parâmetros Curriculares Nacionais colocam que a escrita não é o

espelho da fala. O escritor competente será caracterizado como aquele que

planeja o seu discurso, bem como o seu texto em função do uso prático a que

se destina, sem desconsiderar as características específicas do gênero. É

aquele que olha para o próprio texto com um objetivo e verifica elementos que

o tornam adequado ou inadequado. Reprovando-o, o próprio sujeito o

reconstrói até considerá-lo satisfatório para a situação discursiva de que faz

parte.

Logo, partindo-se do pressuposto de que a concepção de evento de

escrita não se legitima apenas no contexto escolar, mas nos usos práticos,

observando a sua funcionalidade, conforme asseguram os PCN (1997), é

possível considerar que o aprendizado da escrita se dá no processo de

interação e é historicamente construído pelos sujeitos que a utilizam.

Portanto, as recomendações para o contexto escolar, presentes nesse

documento, servem de orientação para o trabalho com língua em sala de aula,

bem como têm uma visão de escrita que se relaciona com o conceito de

letramento até aqui visto.

Observa-se, no entanto, no processo de ensino-aprendizagem da língua

portuguesa, que o domínio teórico da maioria dos professores sobre os

conceitos de língua e escrita em que se baseia este documento ainda não se

transformou em domínio prático nas escolas públicas, uma vez que muitos

professores ainda trabalham com uma perspectiva conservadora e excludente

de língua, que não leva em conta as práticas cotidianas de escrita dos

alunos que se desenvolvem no contexto familiar, na rua, e nas demais

instâncias da vida social. Tradicionalmente, tem-se dado uma ênfase muito

grande aos textos escritos produzidos fora de contextos discursivos, ou seja,

sem considerar a interação entre seus interlocutores, no caso escritor(es) e

47

leitor(es). Ausentam-se da prática institucional de escolarização das primeiras

séries do ensino básico da rede pública as práticas de leitura e escrita que

envolvam interlocutores reais, incluindo os professores, os quais sejam

capazes de interagir através dos textos escritos de acordo com os seus

propósitos discursivos.

Nesta perspectiva, nosso trabalho poderá contribuir para o estudo das

práticas escolares de escrita, levando em conta as manifestações de

escrita que se desenvolvem no contexto familiar dos sujeitos, ao questionar se

existe uma relação entre estas atividades, e se as escritas escolares têm

significados para eles, considerando estes diferentes domínios discursivos.

Além disso, promover o reconhecimento da história oral das comunidades

pesquisadas; subsidiar o trabalho docente e, dentre outras coisas, possibilitar a

reflexão de que o contexto social em que o sujeito está inserido tem muito a

colaborar com relação ao ensino e aprendizagem da língua escrita.

48

3 A PESQUISA DE CAMPO E O CENÁRIO DA PESQUISA

3.1 A experiência de campo

O primeiro contato que estabelecemos com o campo ocorreu a partir do

pedido de autorização à Secretaria de Educação do Município da cidade de

Feira de Santana para que fosse possível o acesso às escolas pesquisadas. A

partir de então, em 2007.1, realizamos uma pesquisa-piloto para coletar e

testar os primeiros dados, de acordo com os objetivos traçados,

especificamente no que se refere ao contexto escolar. Fizemos contato nas

escolas com um total de dez pessoas: duas diretoras, sendo uma do Centro de

Educação Complementar e a outra da escola municipal, uma coordenadora,

uma psicopedagoga, um secretário administrativo do Centro de Educação

Complementar, e cinco professoras, sendo três do Centro de Educação

Complementar e duas da escola municipal. Aplicamos questionários aos

professores, e realizamos entrevistas com os demais.

Apesar de coletarmos dados dos docentes das duas escolas, não os

consideramos nessa pesquisa, uma vez que os nossos sujeitos foram os

alunos e as pessoas de seu contexto familiar. É importante mencionar, no

entanto, que estes professores, apesar de não serem sujeitos da pesquisa,

deram contribuição ao trabalho, pois conhecem os alunos selecionados pelo

pesquisador, e puderam auxiliar na sua descrição e na aplicação de alguns

questionários sobre dados bio-sociais.

Posteriormente, entre 2007.1 e 2007.2, além das dezessete visitas para a

realização da pesquisa-piloto, fizemos, no total, vinte visitas, seguidas de

observações, ao Centro de Educação Complementar e à Escola de Ensino

Tradicional. Nestes locais, houve quarenta e um minutos e quarenta e dois

segundos de gravações só com os alunos que são sujeitos da pesquisa e que

pertencem às duas escolas.

Salientamos que as visitas ao campo nem sempre foram produtivas, pois

muitas vezes deparamos com escola fechada por conta da greve de

professores, ausência desses profissionais em dias de aula, dentre outras

situações. Porém, a investigação nas escolas foi fácil de ser realizada, uma vez

que fatores como segurança, facilidade de se obterem informações precisas e

49

de se poder contar com a colaboração de outras pessoas, dentre outros,

contribuíram para tanto.

Fizemos vinte sessões de gravação de 20 aulas, sendo cinco na escola

municipal e quinze no Centro de Educação Complementar. Realizamos quatro

entrevistas, e aplicamos quatro questionários sobre dados pessoais a estes

sujeitos. Quatro sessões de gravação e quatro entrevistas foram realizadas

com os sujeitos pais e/ou responsáveis, três questionários foram aplicados aos

professores do Centro de Educação Complementar, e dois questionários

aplicados aos professores da Escola municipal. Cada sujeito foi entrevistado

uma vez e, a depender da sua disponibilidade, as entrevistas ocorreram outras

vezes.

A escolha das escolas justifica-se, inicialmente, por ser uma ação

pioneira na cidade em que, através da educação, objetiva-se diminuir a

vulnerabilidade social dos bairros onde estão localizadas. Ao passo que,

conhecer o contexto familiar dos alunos envolvidos na pesquisa foi possível

desde o início do estudo, pois forneceu indícios de como se estabelecem as

relações com os usos cotidianos das práticas de escrita que fazem parte da

realidade sócio-cultural de cada sujeito.

Antes de pesquisarmos as escolas, não as conhecíamos, apenas

ouvíamos falar delas, sobretudo da escola complementar, que foi construída

estrategicamente para atender aos bairros adjacentes, especificamente o da

Baraúna, comunidade de baixa renda conhecida de todos os moradores da

cidade. Entretanto, a construção de um Centro de Educação Complementar,

nesse lugar, causou uma corrida de diversas comunidades para ali, em que

todos, de diferentes classes sociais e de bairros distantes, iam em busca de

alternativa gratuita com educação diferenciada e de qualidade.

Por estarmos envolvidos com o trabalho em educação, termos nascido e

crescido em uma cidade em que foi possível observarmos o desenvolvimento

em vários setores, mas não tanto na educação, após a construção da

Universidade Estadual de Feira de Santana - UEFS, nenhuma iniciativa na

cidade em educação foi objeto de repercussão, curiosidade e de esperança

para a sociedade. Dessa maneira, ao nos colocarmos na posição de

pesquisador, o trabalho de campo já se colocava diante de nós, visto que

nenhum estudo de envergadura ainda tinha sido desenvolvido nesse local.

50

Os procedimentos e instrumentos de trabalho utilizados e necessários

nessa trajetória foram pensados a partir da realização de uma pesquisa-piloto,

em que conhecemos in loco o Centro de Educação Complementar. Durante a

visita inicial fomos apresentadas ao Sr. V., responsável pela infra-estrutura do

prédio e que nos apresentou à coordenadora pedagógica, bem como nos

permitiu realizar com ele a nossa primeira entrevista, e nos narrou as primeiras

histórias de um local que, até então, só era real no nosso desejo de conhecê-

lo.

Nesse momento, sentimos que, possivelmente, muitos anseios

poderiam ser correspondidos, e um deles é que, finalmente, tudo o que se

discutia na academia sobre Educação poderia começar a ser posto em prática

naquele contexto escolar. E este sentimento se deu ao observarmos a

estrutura física do prédio, os profissionais envolvidos, a proposta pedagógica

da escola a nós apresentada por intermédio da coordenadora e,

principalmente, a clientela que o Centro se propunha a atender.

A sensação de ouvir a proposta pedagógica após observar a escola é a

de que por ali funcionava tudo muito bem. Pensamos que, certamente, os

alunos seriam privilegiados por poder estudar ali, e que a demanda para

estudar naquele local deveria ser imensa, a ponto de quem ali estudasse

jamais quisesse sair ou voltar para a escola regular.

Posteriormente, a coordenadora orientou- nos para que nos dirigíssemos

à Secretaria de Educação do Município, pois lá alguns dados estariam ao

nosso alcance e a visão do Centro se tornaria mais concreta. Lá fomos

encaminhados a um de seus setores, o NAE: Núcleo de Apoio ao Estudante.

Coletamos dados referentes ao Projeto de Gerenciamento e

funcionamento do CEC, as escolas que ele atende, os objetivos daquela

instituição, quem são os alunos que fazem parte daquele contexto e quem são

os professores e demais pessoas envolvidas no projeto e, por fim, recolhemos

alguns dados referentes ao trabalho com escrita desenvolvido naquele contexto

específico.

Após esses contatos iniciais, passamos a realizar as observações tanto

no Centro de Educação Complementar – CEC, bem como na escola tradicional

do município atendida por ele. Contudo, tivemos dificuldade com relação à

assiduidade dos alunos à escola complementar, devido ao fato de esta ser uma

51

instituição com pretensa proposta de complementação ao ensino regular, mas

que não oferece aos alunos e a seus pais qualquer incentivo através do

Governo Federal, uma vez que já o recebem ao freqüentar a escola regular, o

que contribui para a evasão escolar no contexto complementar de ensino. Por

outro lado, dentre os fatores selecionados que cooperam para a freqüência ao

espaço complementar destacamos: o incentivo da família, a alimentação

garantida e as atividades desenvolvidas, que se diferenciam daquelas

elaboradas na escola tradicional.

O contexto comunitário demandou mais trabalho, pois algumas ruas da

comunidade Baraúna são de difícil localização, há mudanças de endereços dos

alunos não informadas pelas escolas, muitas vezes não foram encontrados os

sujeitos da pesquisa, que são os pais ou responsáveis pelos alunos, e alguns

sujeitos adultos selecionados tiveram receio de falar, além do perigo da entrada

do pesquisador em uma das comunidades, Baraúna, por conta da falta de

segurança com relação à presença rotineira de bandidos nesta área. Assim, foi

difícil e, às vezes, inviável o acesso de carro a algumas ruas dos bairros

pesquisados com instrumentos de trabalho, como câmera fotográfica, dentre

outros.

Houve momentos do trabalho de campo em que o desejo era tão grande

de registrar a comunidade através de imagens, que nos escondíamos para

fotografar. Nos colocávamos em distância considerada segura e, até onde o

carro poderia estar, de dentro dele, aumentávamos o zoom da máquina ao

máximo que ela oferecia e registrávamos as imagens, embora a maioria não

tenha ficado com boa visibilidade. Em outros momentos, a gravação das

entrevistas com os sujeitos, no campo, só foi possível com a utilização de um

gravador de 4,5 cm de altura por 3,0 cm de largura escondido embaixo da

roupa, sempre bem folgada. Nesses casos, auxiliou bastante o fato de os

alunos conviverem no contexto escolar com o pesquisador e o reconhecerem,

a ponto de facilitarem a sua circulação nesses espaços.

O contato com os bairros ocorreu a partir das visitas às residências dos

alunos. A entrada na comunidade do Sobradinho foi mais tranqüila do que na

Comunidade Baraúna, devido aos problemas de segurança já mencionados.

Realizamos uma média de quatro visitas à residência dos sujeitos, e a primeira

visita ocorreu para o reconhecimento destas localidades, sendo que a segunda

52

visita teve como objetivo a apresentação do pesquisador aos pais e/ou

responsáveis pelos sujeitos investigados, e na terceira visita realizamos as

entrevistas.

Na quarta visita, coletamos os textos produzidos pelos sujeitos. De modo

geral, houve grande dificuldade de coletarmos textos produzidos ou lidos pelos

sujeitos, porque observamos neles comportamentos e atitudes que

demonstraram insegurança, medo, vergonha ou timidez por se exporem ao

pesquisador, ou mesmo pelo fato de só considerarem textos escritos aqueles

legitimados pela instituição escolar, embora alguns textos tenham sido

recolhidos ou documentados nos contextos da pesquisa.

Fizemos também entrevistas com duas pessoas idosas que são

moradoras antigas dos bairros Baraúna e Sobradinho. Essas entrevistas

serviram para a coleta de dados sobre a história oral destas localidades, pois a

maior parte dos registros históricos sobre elas não se localiza em acervo

público.

Encontrar sujeitos com o perfil para a coleta de dados desta natureza se

constituiu em grande desafio para a realização desse trabalho, pois descobrir

moradores mais velhos que possuíssem todas as informações relevantes para

a pesquisa demandou muitos meses de busca e, quando os encontramos, ou

eles não tinham tempo de moradia suficiente, ou não possuíam conhecimento

relevante sobre o bairro.

Além disso, realizamos duas visitas ao bairro vizinho do Cruzeiro, por

localizar-se próximo às comunidades pesquisadas. Lá se encontra a Paróquia

do Bonfim, em que foi possível encontrar em seu livro de canto um mapa,

conforme anexo 01, com as localizações de parte dos bairros de Feira de

Santana, dentre eles os pesquisados. Esta igreja, por existir há cento e cinco

anos, serve de matriz para inúmeras capelas mais recentes construídas nos

bairros circunvizinhos, além de funcionar como sede para aqueles bairros que

não possuem nenhum templo católico. Houve resistência e, até mesmo, temor

por parte da administração desta igreja em contribuir com qualquer dado

gravado ou fotografado sobre a comunidade, o que não é uma atitude comum

por parte de entidades religiosas. Ao buscarmos informações com sujeitos da

comunidade externa sobre uma possível razão para este comportamento, foi-

53

nos dito que o padre local tinha sido afastado do próprio clero por questões

administrativas.

De um modo geral, podemos afirmar que o contato com os sujeitos

durante as entrevistas se deu de forma tranqüila, uma vez que estes não se

negaram a receber o pesquisador em suas casas e a responder as perguntas

durante as entrevistas. Entretanto, salientamos que alguns sujeitos da pesquisa

deram respostas evasivas, ou mesmo algumas que não correspondem à

verdade, de acordo com a observação do pesquisador, enquanto outros

silenciaram ao responder sobre a comunidade ou então sobre as suas práticas

de escrita.

3.2 O Cenário da Pesquisa

3.2.1 A Comunidade: situação histórica e atual

As comunidades de Baraúna e Sobradinho fazem parte dos cerca de

quarenta e quatro bairros localizados na cidade de Feira de Santana. Situada

na zona de planície entre o recôncavo e os tabuleiros semi-áridos do nordeste

baiano, este município de 1.344 km2, e, em sua sede municipal, com 111 km2,

possui, de acordo com o censo de julho de 2006, 535.820 habitantes e é

circundada por uma rodovia denominada Avenida Eduardo Fróes da Motta,

mais conhecida como Avenida Contorno ou Anel de Contorno. Esta avenida

demarca a área central da área periférica da cidade e é a principal via de

entrada e saída da cidade, conforme se observa no anexo 02. Distante da

capital em aproximadamente 108 km, Feira de Santana possui cerca de

sessenta e dois sub-bairros.

A partir do Projeto da Lei Complementar nº 018 de 18 de Julho de 2004,

presente no anexo 03, de autoria do Poder Executivo, pode-se encontrar a

delimitação dos bairros da cidade de Feira de Santana.

Nesse contexto, a comunidade de Baraúna, com uma média de cem

anos de idade, tem o seu ponto inicial no encontro da Rua Bartolomeu de

Gusmão com a Avenida Eduardo Fróes da Motta, e daí segue pela Avenida

Eduardo Fróes da Motta, Avenida José Falcão da Silva, Rua Carlos Valadares,

Rua São José, Rua Artur de Assis, Rua Voluntários da Pátria, Rua Marquês de

54

Abrantes, Rua João Vital, Rua Pojuca, e Rua Bartolomeu de Gusmão até o

ponto inicial. Situa-se entre o bairro Sobradinho e a Avenida José Falcão da

Silva, locais privilegiados , dentre outras coisas, por sua localização na cidade

de Feira de Santana.

A partir do relato oral da história do bairro feita por moradores lá nascidos

e criados há mais de 60 anos, sabe-se que a comunidade de Baraúna ganhou

esse nome em decorrência da presença dos muitos pés de árvore conhecidos

como baraúna. Hoje, há um número bastante reduzido dessa espécie no local,

pois cedeu lugar para os estabelecimentos comerciais e residências ali

presentes. Sabe-se também que seus antigos moradores e fundadores foram o

Sr. Afonso do Vinho, com a sua chácara, e a Srª Pombinha, hoje com 100 anos

de idade.

Segundo antigos moradores, este bairro surgiu porque em seu local havia

uma estrada chamada ―Boiadeiro‖, que servia de atalho para a passagem de

pessoas e de animais que iam ser comercializados na antiga Feira do Gado, ali

próxima. Esta era uma área privilegiada por abrigar nascentes de água, e as

pessoas que passavam por essa estrada precisavam conservar as carnes com

o sal, e isto fomentou a criação de salgadores em seus arredores, o que deu

início ao povoamento.

Baraúna possui terreno acidentado e grandes quantidades de pedras em

seu subsolo, o que levou as pessoas, durante muito tempo, a não quererem

construir as suas residências ali. Pode-se constatar esse fato hoje em dia, uma

vez que a construção do sistema de esgotos está sendo concluída agora neste

local.

Contudo, um dos antigos prefeitos da cidade, Colbert Martins da Silva,

em parceria com o Governo Federal, promoveu um mutirão com os

pretendentes a moradores e com algumas pessoas que já estavam residindo

neste bairro sem estrutura segura para as suas residências. Esses mutirões

ocorriam aos finais de semana e originaram, aproximadamente, vinte casas.

Nesse processo, promoveu-se a construção de um total de cerca de cento e

cinqüenta moradias populares com uma boa infra-estrutura.

Entretanto, o que parecia um grande projeto de utilidade pública, findada

a construção das moradias, serviu de base para um grave problema social,

pois seus proprietários passaram a vender as suas casas, uma vez que os

55

valores por elas oferecidos eram bem maiores do que realmente valiam. Esse

fato se deu, de acordo com antigos residentes, porque o dinheiro dos

traficantes de drogas promoveu um comércio bastante vantajoso e lucrativo

para os moradores, uma vez que com o valor de uma casa, em Baraúna,

compravam-se duas em outro bairro e ainda sobrava dinheiro. Pouco a pouco,

o perfil dos habitantes deste local mudou. E, constatado este fato pelas

autoridades públicas, uma vez que este bairro ficou conhecido pelo alto índice

de violência e periculosidade devido ao tráfico de drogas, houve uma

intensificação de combate a essas práticas, a partir de medidas sócio-

educativas.

Nesse sentido, o governo municipal atraiu, nos últimos anos, políticas de

integração e sociabilização dos sujeitos residentes em Baraúna. Hoje pode-se

contar, além do CEC, com uma creche que atende a uma média de oitenta a

cem crianças, uma escola municipal, uma escola estadual, e um lar de idosos

que recebe cerca de oitenta pessoas com mais de sessenta anos, que passam

o dia lá e à noite retornam para as suas residências.

A falta de segurança no bairro, pela ausência de módulos policiais, é

reconhecida pelos moradores, que são atendidos pelo policiamento do posto

existente na comunidade do Sobradinho.

Na área da saúde pode-se contar com um posto médico, auxiliando-o

nesse trabalho quinze agentes comunitários que trabalham por ruas

específicas, e seis agentes de combate à dengue da Superintendência de

Campanhas de Saúde Pública - SUCAM, Brasília, Brasil.

Como atividades de lazer oferecidas à comunidade, pode-se contar com

um campo de futebol, com a Estação da Música, Clube Riachuelo e a Escola

de Samba. Atualmente, está em fase de conclusão um empreendimento

municipal de aproveitamento dos espelhos d‘água potáveis ali existentes para a

construção de mais uma área de diversão, com pedalinhos, etc, uma vez que

essa área se localiza próximo ao maior complexo de viadutos em construção

na cidade de Feira de Santana.

Salienta-se que, apesar das associações de moradores serem relevantes

para uma comunidade por representá-la legitimamente junto às instituições

públicas, os moradores de Baraúna não possuem uma liderança comunitária

56

que atue de maneira eficaz. O que existe lá são tentativas de organização de

uma associação de moradores.

Com relação às práticas religiosas, é possível encontrar uma média de

cinco igrejas evangélicas de denominações diferentes que visam à reflexão

teológico-social de suas ações, desenvolvem com as crianças atividades de

lazer, recreação e de ensino, oferecem curso de alfabetização de adultos,

auxílio-alimentação aos carentes, além de outros movimentos e atividades de

socialização de seus moradores.

Além das igrejas evangélicas, há um templo da igreja católica que foi

desmembrado da igreja do atual Alto do Cruzeiro, um bairro próximo, e que

teve a sua sede erguida em 1º de janeiro de 1903 e inaugurada em 03 de maio

de 1918. Destaca-se o fato de que uma das imagens presentes nessa igreja,

adquirida em Portugal pelo benfeitor Joviano Ferreira Pinto, foi transladada

para a matriz de Santana e, durante a II Guerra Mundial, foi oferecida pela

sociedade feirense à guarnição de prata como ex-voto de paz. A área dessa

igreja compreende 6.130.685 m² e agrega uma população de 57.872 pessoas,

perfazendo um total de 16.680 residências e uma média de 3,46 pessoas por

residência, registrando um crescimento populacional de 12% no período de

1996 a 2000, enquanto que o crescimento da cidade foi de 1,98%, de acordo

com dados fornecidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)

no censo 2000. Nesses quarenta anos de paróquia, a igreja católica tem

desenvolvido atividades pastorais, realização de cursos profissionalizantes,

oficinas de alfabetização de adultos, cursinhos pré-vestibular comunitário,

feiras e festas para a construção de capelas, dentre elas a erguida no bairro

Baraúna. Esta igreja atende a mais de 14 comunidades vizinhas, e entre elas

encontram-se as comunidades de Sobradinho e Baraúna, locais caracterizados

por seus díspares aspectos sócio-culturais.

Todos esses esforços auxiliam, sobretudo, os ―parrudinhos‖, assim

denominados pelos próprios moradores como sendo a camada pobre da

população.

Baraúna ainda conta com um forte comércio, com cerca de cinco

mercados de grande porte e uma média de duzentos estabelecimentos

comerciais de vários tipos. Ressalta-se que o último censo contabilizou 7.125

habitantes nesta comunidade, e a estimativa dos seus antigos moradores é a

57

de que existam cerca de vinte sessões eleitorais com cerca de seis mil

votantes na região. Pode-se conferir grande parte das áreas descritas em

Baraúna, através de fotografias no anexo 04.

Já o bairro do Sobradinho tem como ponto inicial o encontro da Avenida

Eduardo Fróes da Mota com a Rua Bartolomeu de Gusmão, seguindo daí pela

Rua Bartolomeu de Gusmão, Rua Pojuca, Rua João Vital, Rua Marquês de

Abrantes, Rua Voluntários da Pátria, Avenida Padre José Anchieta (Avenida

Canal), Rua Marquês de Bragança, Rua Joaquim Laranjeiras, Rua Investigador

Bandeira, Rua Landulfo Alves, Avenida Eduardo Fróes da Mota (Antiga

Avenida do Contorno), até o ponto inicial.

Sua localização ocorre entre os bairros Baraúna, Cruzeiro e Jardim

Cruzeiro. E, atualmente, a sua extensão atingiu a expansão para além do anel

de contorno da cidade.

Atualmente, o primeiro motorista de marinete da cidade de Feira de

Santana, Srº Pedro, mora no bairro Sobradinho. Hoje, com 104 anos de idade,

é reconhecido como uma pessoa ilustre dentro desse grupo, por fazer parte da

história da cidade e desta comunidade que, segundo antigos moradores,

possui mais de cento e dez anos.

De acordo com os relatos orais colhidos sobre a sua história, sabe-se

que o bairro tem este nome porque ali se localizava um sobrado antigo e mal

assombrado que assustava toda a antiga população da Feira de Santana. Na

verdade, essa parte da história foi espalhada como uma lenda, pois os antigos

moradores explicam que no ano de 1900 houve uma grande epidemia e, como

se construiu, por conta deste fato, um cemitério no alto e longe da cidade, ao

qual, para se chegar, tinha-se que passar por uma grande área de terra em que

eram jogados os ossos de boi provenientes da feira do gado, conhecida como

campo do osso, pensava-se que estes eram ossos humanos que se

desenterravam e retornavam à superfície. Este fato causava no imaginário

popular uma impressão forte, que resultou em inúmeras histórias a esse

respeito, inclusive a de se afirmar que havia sobrado mal assombrado no local.

Por outro lado, outra versão contesta a primeira e afirma que o local onde

hoje é o bairro do Sobradinho tem esse nome por ter sediado um sobrado dos

padres Jesuítas que servia como depósito do ouro trazido pelos tropeiros das

minas de Mundo Novo e Jacobina.

58

Este bairro fazia parte de uma grande fazenda com muitas tarefas, todas

pertencentes às duas famílias: Coriolano de Carvalho e Maia. Compreende

área bastante privilegiada por ser plana e sem acidentes geográficos que

impeçam construções de residências. Uma das primeiras construções

erguidas, promovida por doação de terrenos feita pelas famílias Coriolano de

Carvalho e Maia, foi a do Seminário Teológico Batista Baianos, onde funciona a

Faculdade de Teologia, que oferece cursos de bacharelado em Teologia e pós-

graduação, mestrado e doutorado em Teologia.

Em seguida, foi doada pelas duas famílias outra extensão de terra

destinada à construção de um cemitério, denominado São Jorge e apelidado

pelos seus moradores de ―Bocão‖.

Posteriormente, procedeu-se a uma outra doação para a construção de

uma feira-livre, que funciona sempre aos domingos. Em frente à área da feira-

livre, construiu-se há quarenta e seis anos a segunda Igreja Batista da cidade

de Feira de Santana. Com cerca de quinhentos e cinqüenta fiéis, esta igreja

realiza um trabalho sócio-religioso em benefício da comunidade e da sociedade

como um todo, pois oferece tanto ao próprio bairro, como às demais

comunidades, cursos de capacitação, aperfeiçoamento, edificações de escolas,

dentre outros.

A doação de terras pelos Coriolano de Carvalho e Maia proporcionou

também a criação do Centro de Educação Assis Chateaubriand, colégio

estadual da cidade de Feira de Santana, que não faz parte das escolas

estudadas durante a pesquisa. Entretanto, a relevância desse colégio se dá por

atender a grande parte da sociedade feirense com inúmeros cursos, e a sua

história tem demonstrado um grande interesse da comunidade por ele, uma

vez que há um alto índice de aprovação de seus alunos nos vestibulares das

universidades públicas, sem a necessidade de passarem por cursinhos pré-

vestibulares. A grande dimensão desta instituição possibilitou o seu

desmembramento em uma outra escola, denominada Carmem. Esta atende

parte do público pertencente ao ensino fundamental de 5ª à 8ª séries.

Com relação ao comércio, a comunidade do Sobradinho possui as mais

famosas redes de supermercados, inclusive uma loja da rede G. Barbosa,

inaugurada recentemente, como também investe forte no comércio de material

de construção, postos de gasolina e atacadão de alimentos - bem maior que os

59

supermercados convencionais e que serve para a compra de alimentos, dentre

outros.

Atualmente Sobradinho é um bairro nobre formado por pessoas de classe

média, com renda que atinge aproximadamente doze salários mínimos, e

também de renda mais elevada. O perfil social do bairro, em linhas bem gerais,

é de moradores que são comerciantes, pequenos e médios empresários,

dentre outros. Pode-se conferir grande parte das áreas descritas em

Sobradinho, através de fotografias no anexo 05.

3.2.2. O Centro de Educação Complementar e a Escola Municipal

Tradicional

O Centro de educação Complementar – CEC Dom Silvério Albuquerque é

uma instituição da Rede Municipal de Ensino da cidade de Feira de Santana, e

funciona no bairro de Baraúna.

A sua criação tem origem em recente estudo sobre índice de

vulnerabilidade social, que é bastante alta em Baraúna, e, nesse sentido

buscou-se um espaço neste bairro que abrigasse a construção de um Projeto

de Educação Complementar. O local encontrado pertencia à Paróquia Sr. dos

Passos, que cedeu parte de um terreno e originou o Centro de Educação

Complementar Dom Silvério de Albuquerque ou CEC, local onde se

desenvolveu parte da pesquisa.

Ele foi construído em uma parceria entre a Prefeitura e a Fundação José

Carvalho e acolhe crianças das escolas públicas municipais Antonio Elói da

Costa e Elizabeth Johnson, que são matriculadas no turno oposto ao da escola

convencional. No CEC eles participam de uma série de atividades sócio-

educativas e são acompanhadas por professores em atividades de reforço

escolar.

O CEC possui excelentes instalações e está em perfeito estado de

conservação, já que não se percebe o menor risco de lápis ou caneta nas

paredes ou cadeiras escolares. Funciona nos turnos matutino e vespertino e

tem a peculiaridade de atender, em horário oposto ao que o aluno estuda na

escola regular, aqueles com dificuldades de aprendizado.

60

O projeto pedagógico da instituição inicialmente propôs que cada turma

fosse dividida a partir do nível de dificuldades apresentadas através de

diagnósticos dos professores, e que as atividades elaboradas pelos docentes

servissem para dirimir tais dificuldades. Entretanto, no ano de 2007, a pedido

dos pais, esta organização foi modificada em caráter experimental, para que a

escola funcionasse por divisão de turmas em série e não mais pelo nível de

dificuldades apresentadas, a fim de auxiliar nas tarefas encaminhadas para

casa pela escola regular, uma vez que os pais alegavam que em casa seus

filhos não tinham tempo de realizar essas atividades.

As aulas no CEC dispõem em cada turma de uma professora de matérias

gerais que auxilia nas tarefas de casa, outra de língua portuguesa, e

―oficineiros‖ para trabalhar com artes, música, teatro e informática. São ao todo

treze professores, sendo nove da rede municipal e quatro ―oficineiros‖.

A escola possui treze salas ao todo, sendo que cinco salas abrigam as

aulas de língua portuguesa e as aulas que auxiliam nas tarefas de casa, duas

salas são para as aulas de informática, uma para a aula música, além de um

auditório, um teatro, uma sala para artes, uma para meio ambiente, uma sala

para o funcionamento da psicopedagogia, uma quadra de esportes, um

refeitório, banheiros masculinos e femininos, e um pátio em que todas as

manhãs as crianças são acolhidas e dão início às rotinas de trabalho. Existe a

parte administrativa onde há uma sala de recepção, uma secretaria, sala

cozinha e banheiro para os professores, e uma sala da direção. Há uma guarita

com vigilantes e uma grande área não construída para a circulação e recreação

das crianças. Grande parte das instalações do Centro de Educação

Complementar - CEC pode ser conferida no anexo 06.

O CEC atende a um total de 200 a 250 crianças que são matriculadas

pelos responsáveis a partir do encaminhamento dado por duas escolas

municipais regulares já mencionadas. Os funcionários que atendem a essa

clientela são três merendeiras, uma psicopedagoga, uma coordenadora

pedagógica, uma diretora geral e um diretor administrativo.

A escola tradicional Elizabeth Johnson localiza-se no bairro Sobradinho e

atende as quatro primeiras séries do ensino fundamental, nos turnos matutino,

vespertino e noturno com a educação de jovens e adultos (EJA). Os alunos que

61

possuem dificuldades no acompanhamento das disciplinas nessa escola são

recomendados a freqüentar o Centro de Educação Complementar.

Ela funciona em um prédio alugado pela Prefeitura Municipal de Feira de

Santana na comunidade do Sobradinho. Atende a quatrocentos e quatorze

alunos matriculados nos três turnos, sendo o horário da noite destinado para os

que estão na faixa-etária acima de quinze anos. Possui uma secretaria, uma

garagem, uma área que dá acesso às sete salas de aula que estão distribuídas

no térreo e primeiro andar. Pode-se perceber que as salas estão conservadas

e pintadas. Contudo, há pouco espaço em seu interior, dada a quantidade de

alunos, e elas são abafadas, uma vez que só dispõem de ventiladores sem

muitas janelas que possam auxiliar na circulação do ar.

Os funcionários que atendem a essa escola são quatro auxiliares

administrativos, cinco agentes de serviços gerais, uma secretária escolar, uma

diretora e uma vice-diretora. Os professores são em número de quatorze,

sendo onze desses da rede municipal de Feira de Santana e três estagiários.

Grande parte das instalações da Escola Municipal Elizabeth Johnson pode ser

conferida no anexo 07.

62

4 A PESQUISA EM UMA PERSPECTIVA ETNOGRÁFICA:

PROCEDIMENTOS E INSTRUMENTOS DE TRABALHO

A pesquisa qualitativa que se propõe é de cunho etnográfico, e tem como

objeto as manifestações de escrita que circulam no cotidiano de determinados

sujeitos, tanto no contexto escolar quanto no contexto familiar de sujeitos de

duas comunidades.

Segundo César (2001), o trabalho etnográfico não é uma abordagem

narrativa cronológica, a partir da organização de fatos em um relatório. Trata-se

do acompanhamento do outro, com descrição de trajetória entre pesquisador e

pesquisado, a fim de que seja possível pinçar pontos que, uma vez

interligados, produzam sentido.

Na compreensão do já vivido, pode-se afirmar que esta pesquisa baseou-

se em uma rica experiência do campo. Através dela obtiveram-se dados sobre

as práticas de escrita que fazem parte do contexto escolar de alguns alunos, e

da vida cotidiana de suas famílias no espaço comunitário.

De acordo com André, em seu trabalho sobre Etnografia da Prática

Escolar (2004), há várias razões para a utilização de uma pesquisa de base

etnográfica no contexto específico da escola. A primeira delas leva em

consideração um contato direto do pesquisador com a situação pesquisada. A

segunda razão está fundamentada na possibilidade de documentar o não

documentado. Nesse sentido, a autora explica a possibilidade, dentre outras,

da descrição de ações de seus atores sociais, bem como da sua própria

linguagem. A terceira razão é a possibilidade que se tem de compreender

como se dão as relações de dominação e resistência e as atitudes de valores e

crenças daqueles que fazem parte do universo pesquisado. O quarto motivo é

se poder enxergar o universo pesquisado com uma lente de aumento e poder

compreender as interações presentes no dia-a-dia, em que as relações são

(re)construídas e modificadas. Já a quinta razão se volta para a possibilidade

de ruptura com uma visão estática caracterizada por pluralidade de linguagens

e objetivos conflitantes. De um modo geral, as considerações sobre a pesquisa

com perspectiva etnográfica na escola são de que:

63

O estudo da prática escolar não pode se restringir a um mero retrato do que se passa no seu cotidiano, mas se deve envolver um processo de reconstrução dessa prática, desvelando suas múltiplas dimensões, refazendo seu movimento, apontando suas contradições, recuperando a força viva que nela está presente. (ANDRÉ, 2004, p. 42)

Se um dos interesses centrais da descrição etnográfica é documentar o

que realmente acontece num dado grupo social, é possível com ela completar

as vestes com as quais o pesquisador vai a campo. Não só por essa razão,

mas também por outras.

A primeira está na relação que se estabelece entre o método e o sujeito.

A multiplicidade presente numa dada situação faz com que a investigação do

objeto deixe de lado o enfoque nas variáveis isoladas para considerá-las em

seu conjunto e em sua relação dinâmica. ―Deslocou, assim, o foco de atenção

das partes para o todo e dos elementos isolados para a sua inter-relação‖

(ANDRÉ, 2002, p.103).

A segunda decorre da ―atitude aberta e flexível‖ que deve manter o

pesquisador durante a coleta e análise de dados, o que lhe permite detectar

ângulos novos do problema estudado.

Erickson (1989) concebe a etnografia não como uma técnica ou um

conjunto delas e, sim, como método, com fundamentos teóricos que fazem dela

uma pesquisa interpretativa ou qualitativa e a distinguem de uma simples

técnica: ―Aquilo que torna este trabalho interpretativo ou qualitativo é o foco e a

intenção e menos o procedimento na coleta de dados, isto é, uma técnica de

pesquisa não constitui um método de pesquisa‖ (p.78).

Goldenberg (1997) trata da pesquisa qualitativa em ciências sociais, e

afirma que através dela é possível a reconstrução da experiência diária. Nesse

tipo de estudo, existe uma preocupação do pesquisador com o grupo social

pesquisado, sendo, portanto, necessário aprofundamento no campo para a

compreensão do vivido. Desta maneira, o ambiente natural é concebido como

fonte direta de dados e o pesquisador como seu principal instrumento. A

pesquisa qualitativa pressupõe o contato direto e prolongado do pesquisador

com o ambiente e a situação que está sendo investigada. Pesquisas desta

ordem são ricas em descrições de pessoas, situações e acontecimentos.

64

Trazem fotografias, entrevistas transcritas, depoimentos e documentos

variados. O processo da pesquisa e o significado que as pessoas dão às

coisas e a sua vida são focos de interesse do pesquisador, observando como

determinado problema se manifesta nas interações cotidianas.

Esta autora, ao tratar do ponto de vista do pesquisador, coloca que o

objeto de pesquisa, na abordagem qualitativa, não é uma realidade totalmente

exterior ou objetiva, e, sim, fruto de um processo de intersubjetividade, ou seja,

nele se faz um esforço controlado para conter a subjetividade através da sua

objetivação, como propõe Bourdieu: ―Trata-se de um esforço porque não é

possível realizá-lo plenamente, mas é essencial conservar-se esta meta, para

não fazer do objeto construído um objeto inventado‖ (BOURDIEU apud

GOLDENBERG, 1997, p. 45).

Sobre a intersubjetividade de que trata Goldenberg, ao falar de pesquisa

qualitativa, Souza (2006), em seu estudo Para uma ecologia da escrita

indígena: a escrita multimodal Kaxinawá, afirma:

A etnografia exige que, ao observar um fato sociocultural, o sujeito observador se divida em sujeito e objeto; o objeto etnográfico, dessa forma, é fruto da capacidade do sujeito observador de se tornar objeto indefinidamente sem nunca se abolir como sujeito (SOUZA, 2006, p. 171)

Desta forma, este sujeito de que trata o autor é o próprio pesquisador

imerso no processo da intersubjetividade.

Segundo Goldenberg (1997), a simples escolha de um objeto já é

sinônimo de valor, na medida em que ele é destacado entre outros objetos

possíveis, e está de acordo com o contexto da pesquisa e o momento sócio-

histórico. E quanto mais o pesquisador tiver consciência e especificar as suas

escolhas e preferências pessoais, além das considerações teóricas, mais ele

evitará a parcialidade ao julgar. Em síntese, ―a totalidade de qualquer objeto de

estudo é uma construção do pesquisador, definida em termos do que lhe

parece mais útil para responder ao seu problema de pesquisa‖

(GOLDENBERG, 1997, p.51). De um modo geral, para a autora, é o conjunto

de diferentes pontos de vista, e diferentes maneiras de se coletar e analisar os

65

dados, tanto qualitativa quanto quantitativamente, que permite uma idéia mais

ampla e inteligível da complexidade de um problema.

Neste trabalho, para a investigação da escrita enquanto conjunto de

práticas sociais, constituídas e constitutivas da realidade histórico-cultural de

pessoas de determinado grupo social, adotou-se, como procedimento de

pesquisa para a escolha dos sujeitos e coleta de dados, a pré-definição e

utilização das variáveis sociais ou fatores: gênero, faixa etária, escolaridade,

local e tempo de moradia, profissão e renda familiar.

Escolheu-se previamente também o seguinte conjunto de temas gerais a

serem abordados com os sujeitos através de entrevistas abertas: relações

familiares, práticas de lazer, função na comunidade, práticas religiosas, tempo

de moradia na comunidade e práticas de escrita.

Foram também considerados como procedimentos de pesquisa, para a

coleta de dados, a observação das atitudes assumidas pelos sujeitos com

relação às suas ações, atividades, práticas sociais, em especial às suas

experiências enquanto leitores e redatores, tanto no contexto escolar quanto

em sua vida cotidiana. E também o que não foi dito, as hesitações, ou seja, o

que esteve implícito nos atos e nas falas e que se prestou à interpretação do

pesquisador. E que não pode ser pré-estabelecido pela pesquisa, pois se

revela durante o trabalho de campo.

Como instrumentos de trabalho, utilizou-se:

a) O gravador, na primeira etapa do estudo, para o registro das

entrevistas;

b) Questionários semi-estruturados aplicados aos sujeitos nas escolas,

conforme o anexo 08;

c) Textos escritos que circulam no contexto escolar e no contexto familiar,

e que foram recolhidos durante a pesquisa.

66

5 DESCRIÇÃO DOS DADOS: OS SUJEITOS, AS PRÁTICAS SOCIAIS E AS

PRÁTICAS DE ESCRITA

5.1 Os sujeitos da pesquisa:

Os critérios utilizados para a escolha dos sujeitos foram, entre os alunos,

que estudem na escola municipal com ensino tradicional, no turno vespertino,

que freqüentem a escola com proposta de ensino complementar no turno

matutino, cursem a 4ª série do ensino fundamental, e tenham nascido e/ou sido

criados em seus bairros. Já os critérios para a escolha dos adultos foram a

idade mínima de 42 anos de idade, que sejam moradores há mais de quinze

anos dos bairros Baraúnas, o qual apresenta grande vulnerabilidade social, e

Sobradinho, que apresenta menor vulnerabilidade social em relação a

Baraúnas, e que sejam pais ou os responsáveis pelos alunos investigados. As

variáveis bio-sociais utilizadas para a classificação dos sujeitos foram: gênero,

renda familiar, profissão, local de moradia e escolaridade, sendo que esta

última só foi aplicada aos dados dos adultos, já que os alunos cursam a mesma

série escolar. Observa-se que idade não funciona como variável da pesquisa

para o grupo de alunos sujeitos, pois estes pertencem à mesma faixa-etária.

Todos os dados sobre os sujeitos descritos, respectivamente, nos

quadros 1 e 2 abaixo, foram fornecidos por estes durante entrevista e aplicação

de questionário. Os dados referentes aos pais ou responsáveis foram coletados

através de entrevistas gravadas pelo pesquisador durante visitas às suas

residências, que foram transcritas e, posteriormente, sistematizadas no quadro

07 que encontra-se no anexo 15.

5.1.1 Dados gerais dos sujeitos pesquisados: alunos

Realizaram-se entrevistas gravadas com cinco alunos sujeitos, sendo três

do gênero feminino e dois do masculino. Ressalta-se que foram considerados

pela pesquisa apenas quatro deles, uma vez que um aluno evadiu da escola

complementar já próximo ao final do ano letivo. Optou-se, portanto, por

escolher aqueles alunos que fossem assíduos às duas escolas.

67

Para a sistematização dos dados presentes no quadro 1 a seguir, em um

primeiro momento, fez-se o levantamento total dos dados de todos os sujeitos

das duas escolas, conforme o quadro 3, presente no anexo 09, e quadro 4, no

anexo 10, ambos para os sujeitos da escola complementar. Para todos os

sujeitos da 4ª série da escola tradicional presentes no quadro 5, conforme

anexo 11. A evasão, principalmente na escola complementar, é muito grande,

conforme se constata no G1: gráfico demonstrativo de evasão, no anexo 12.

68

QUADRO 1

QUADRO GERAL DOS SUJEITOS PESQUISADOS:

ESTUDANTES

NO

ME

DO

S A

LU

NO

S

TU

RN

O E

M Q

UE

ES

TU

DA

M

NE

RO

IDA

DE

VIDA ESCOLAR:

0 - Não é repetente

1- Repetente nesta série

2 - Repetente em

outra série

3 - Parou de estudar

0 1 2 3

BA

IRR

O E

M Q

UE

MO

RA

M

TE

MP

O D

E M

OR

AD

IA N

O B

AIR

RO

ALUNO TRABA

LHADOR

SIM NÃO

TIP

O D

E T

RA

BA

LH

O R

EA

LIZ

AD

O

RESPON SÁVEIS

1- Pai e Mãe X (Só Pai / Só Mãe :

Especificar) 2- Parentes: Especificar 3- Outros

1 2 3

QU

AN

TID

AD

E D

E M

OR

AD

OR

ES

NA

RE

SID

ÊN

CIA

A.

Matutino

e Vespertino

Feminino

12

anos

X 1x

Baraúna

Rua Petronílio Pinto Nº

400

Mais de 50 anos que

seus responsáveis residem ali

X

_

X

04 Pessoas

J.

Matutino

e Vespertino

Feminino

12

anos

X 1x

Sobradinho Rua Úrsula Catarina Nº 413

Mais de

quinze anos que seus

responsáveis residem ali

X

_ X

03

Pessoas

M.

Matutino

e Vespertino

Masculino

12

anos

X

Sobradinho

Rua Landulfo Alves Nº Nº 684

Mais de

trinta anos que seus

responsáveis residem ali

X

Gravação de CD e

DVD

X

04 Pessoas

R.

Matutino

e Vespertino

Masculino

15

anos

X 1x

X 1x

Baraúna

Rua Avenida

Riachuelo Nº 502

Mais de 30 anos que

seus responsáveis residem ali

X

_ X

05

Pessoas

69

Observa-se, com relação ao Quadro 1 descrito acima, que:

1- Foram escolhidos como sujeitos o aluno R. e a aluna A., que

moram na comunidade Baraúna, e o aluno M. e a aluna J., que moram em

Sobradinho.

2- No que se refere à vida escolar, observa-se que A. e J. repetiram

de ano uma vez só em outra série, ao passo que M. não é repetente e R. é

multi – repetente, ou seja, repetiu mais de uma vez a mesma série e uma vez

só em outra série.

3- Todos os sujeitos freqüentam a escola tradicional pela tarde. No

turno matutino, cursam a escola complementar. Eles estão na 4ª série do

ensino fundamental.

4- Somente M. é trabalhador, pois trabalha em casa, informalmente,

com gravação de CD e DVD.

5- A. M. e R. são criados pelo pai e pela mãe e J. pela tia. Apesar

de A. morar também com o pai, ela é criada apenas pela mãe, pois a presença

deste pai em casa é esporádica, além de ele apresentar problemas por

consumo excessivo de bebidas alcoólicas .

6- Verifica-se que a família de M. e a de A. são constituídas, cada

uma delas, por quatro pessoas. A família de J. é formada por três pessoas, e

a de R. por cinco pessoas. Portanto, os alunos pesquisados fazem parte de

um mesmo padrão familiar.

70

5.1.2 Dados gerais sobre pais ou responsáveis dos alunos pesquisados

QUADRO 2

QUADRO GERAL DOS SUJEITOS PESQUISADOS:

PAIS OU RESPONSÁVEIS

NO

ME

NO

ME

DO

S A

LU

NO

S P

EL

OS

QU

AIS

O R

ES

PO

NS

ÁV

EIS

IDA

DE

G

ÊN

ER

O

BA

IRR

O E

M Q

UE

MO

RA

M

TE

MP

O D

E M

OR

AD

IA N

O

BA

IRR

O

RENDA FAMILIAR

0-Abaixo de um salário

mínimo 1-Um salário

mínimo 2-Dois

salários mínimos

3-Acima de três salários

mínimos 0 1 2 3

ES

CO

LA

RID

AD

E

PR

OF

ISS

ÃO

DO

S

RE

SP

ON

VE

IS

QU

AN

TID

AD

E D

E M

OR

AD

OR

ES

NA

RE

SID

ÊN

CIA

Mãe: A.L

Pai: N.L

01- A.

Mãe:

40 anos

Pai: 45 anos

Feminino

____________

Masculino

Baraúna

Rua Petronílio Pinto Nº 400

Mais de

cinqüenta anos. Antes de A.L. nascer, os

pais já moravam no

bairro

X

Mãe:

Até a 5ª série

Pai: Até a 5ª série

Mãe

=Vendedora em Loja de confecção

Pai = Mecânico/

04 Pessoas

Mãe:

J.P.Q.

Pai: Ø _____

02- J.

Mãe:

40 anos

Pai: Ø ______

Feminino

____________

Não tem pai

Sobradinho Rua Úrsula Catarina Nº

413

Mais de quinze

anos

X

Mãe:

Ensino Superior em

Contabilidade

Pai: Ø

Mãe

=Contadora

Pai: Ø

03 Pessoas

Mãe: A.O.L

Pai:

M.B dos S.

03- M.

Mãe:

44 anos

Pai: 77 anos

Feminino ___________

Masculino

Sobradinho Rua Landulfo Alves Nº Nº

684

Mais de trinta

anos

X

Mãe:

Até a 4ª série

Pai: Até a 4ª série

Mãe = Comerciante

(fornece marmitas/ Pai = Aposentado da Petrobrás, sem profissão especificada

04 Pessoas

Mãe: L.L.G

Pai: R.E

04-R.

Mãe:

37 anos

Pai: 40 anos

Feminino

____________

Masculino

Baraúna

Rua Avenida Riachuelo Nº

502

Mais de trinta

anos

X

Mãe:

Até a 8ª série

Pai: Até a 2ª série

Mãe = Dona

de casa Pai =

Açougueiro

05 Pessoas

71

Observa-se, com relação ao quadro 2 descrito acima, que:

1- Os dados dos pais foram fornecidos pelas suas respectivas

esposas, uma vez que raramente estes foram encontrados nos horários

marcados para as entrevistas, por não terem horário fixo para retornar do

trabalho.

2- Os sujeitos A., M, e R. moram com seus pais e mães. A aluna J.

reside com uma conhecida da família, a quem chama de tia. Trata-se de uma

senhora que exerce o papel de mãe, mas com a qual não possui qualquer

parentesco. Esta senhora a trouxe de uma comunidade extremamente pobre,

de um interior fora da cidade de Feira de Santana e o tempo de convívio com

ela é de aproximadamente dois anos. Esse dado só apareceu na pesquisa de

campo feita na comunidade onde reside, visto que a menina, até então, só

chamava a sua responsável de tia, sendo que foi esta senhora quem

esclareceu o fato. Desta maneira, a partir de agora, esta tia será tratada como

mãe da aluna investigada.

3- Os pais de M e a mãe de J. moram no Sobradinho, e os pais de A

e de R moram em Baraúna, de acordo também com o quadro 1.

4- Os pais de J., M. e R. possuem renda familiar acima de três

salários mínimos, e só os pais da aluna A. possui renda familiar de até dois

salários mínimos.

5- O nível de escolaridade dos sujeitos vai da 2ª série do ensino

fundamental ao nível superior. Constata-se que o nível de escolaridade dos

pais é mais baixo do que o nível de escolaridade das mães, já que um pai

estudou até a 4ª série, outro até a 5ª série, e um terceiro até a 2ª série do

ensino fundamental ou 1º ciclo, ao passo que três mães possuem,

respectivamente, a 4ª, 5ª e 8ª séries do ensino fundamental, enquanto uma

outra o nível superior em Contabilidade. Assim, o nível escolaridade é variável

entre os adultos e está relacionado à variável ‗gênero‘.

6- A idade dos sujeitos adultos varia de trinta e cinco a quarenta e

quatro anos, com exceção de M.B. dos S., que tem setenta e sete anos de

idade. Ou seja, o fator idade é variável da pesquisa considerando-se este

sujeito em relação aos outros, que pertencem a outra faixa etária.

72

5.2 As práticas sociais dos sujeitos

Neste item foram consideradas as práticas que fazem parte da vida

cotidiana e familiar dos sujeitos alunos, pais e/ou responsáveis e que se

referem, principalmente, aos temas abordados nas entrevistas, incluindo as

atividades de recepção e produção de textos, que as constituem e por elas são

constituídas.

A partir das entrevistas e aplicação de questionários, recolheram-se

dados sobre o que os sujeitos efetivamente lêem ou escrevem nos contextos

escolar e familiar, e sobre as suas práticas religiosas e de lazer, assim como as

atividades remuneradas ou profissão que tenham. Foram também recolhidos

dados sobre a atitude dos sujeitos com relação às práticas sociais

mencionadas, especificamente sobre a atitude dos alunos com relação às suas

práticas de recepção e produção de textos no contexto escolar e no contexto

familiar, e de seus pais e/ou responsáveis acerca das escritas que circulam em

sua vida diária.

Os dados sobre as atividades do cotidiano dos alunos foram

sistematizadas nos quadros 6, itens 6.1, 6.2 e 6.3 descritos no anexo 13. Essas

práticas se referem às ações dos sujeitos e expressam a sua singularidade no

contexto em que vivem e estudam.

5.2.1 As atividades de lazer

Observa-se que, embora o índice elevado de criminalidade no bairro

Baraúna seja alto, as principais atividades de lazer dos sujeitos ocorrem em

seu espaço. No bairro Sobradinho, ao contrário, muitos moradores saem, a

lazer, para outros locais. As principais atividades citadas foram:

A Televisão: novelas e telejornais

Todos os alunos gostam de assistir à televisão, preferencialmente aos

desenhos animados.

Entre os adultos, apenas as mulheres assistem preferencialmente às

novelas e, em segundo lugar, ao telejornal. Observa-se que J.P.Q., a única que

73

tem curso superior, disse se sentir pouco à vontade para assistir à TV, por

considerar perda de tempo, embora goste dos programas acima citados.

B Computador: jogos e contatos pessoais

O uso do computador foi a segunda atividade de lazer mais citada pelos

sujeitos, principalmente os do bairro Sobradinho, que possuem computador em

casa ao contrário dos sujeitos de Baraúna, que precisam ir à lan house para

utilizá-lo.

Entre os adultos, as duas mães J.P.Q e A.O.L., que moram no bairro

Sobradinho, disseram utilizar o computador em momentos de folga das

atividades diárias para trocar e-mails e participar de chats.

Do grupo de alunos, apenas os meninos M. e R. gostam de vídeo-game.

As meninas não declararam utilizar o micro. Ou seja, de todos os sujeitos

pesquisados de Baraúna, R. é o único que tem acesso a esse instrumento.

C Rádio: notícias e entrevistas

De todos os sujeitos, apenas L.L.G., que é dona-de-casa sem profissão,

passa a maior parte do tempo escutando música popular brasileira e

programas locais de entrevistas e notícias. Fato inclusive constatado durante a

entrevista, já que esta foi realizada com fundo musical que, em certos

momentos, impediu que se escutasse o que estava sendo dito, sendo

necessário L.L.G. desligar o rádio.

D Bares: comunidade e outros bairros

N.L e R.E., pais de A. e R. e moradores de Baraúna, são os únicos

sujeitos adultos da pesquisa que costumam freqüentar bares do local, que

constituem um universo predominantemente masculino.

Já A.O.L., mãe de M., costuma freqüentar bares fora de Sobradinho, onde

mora, para participar de sessões de Karaoquê.

74

E- Viagens

Essa foi a atividade de lazer mais citada pelas famílias de Sobradinho.

A.O.L. e sua família costumam ir à praia para veranear no litoral, e a

família de J.P.Q. participa de excursões a outras cidades do interior da Bahia

organizadas por grupo de amigos.

5.2.2 Atividades profissionais dos pais

Os homens, ao contrário das mulheres, saem do bairro para trabalhar,

sendo que N.L. é mecânico e R.E. é açougueiro. M.B.S. fica em casa durante a

semana, porque é aposentado da Petrobras, sem profissão especificada pela

pesquisa.

As mulheres, dentro do ambiente doméstico, exercem atividades

remuneradas, sendo que A.L. é vendedora de confecção em pequena loja da

vizinhança, J.P.Q. é contadora com escritório montado na própria residência, e

A.O.L. comercializa marmitas em sua própria casa. L.L.G. é a única mãe que

não trabalha fora, ou seja, é dona-de-casa.

Convém ressaltar que, apesar de essas três mulheres exercerem

atividades remuneradas dentro de casa, J.P.Q e A.O.L., que moram no bairro

Sobradinho, também saem de casa para trabalhar: J.P.Q presta serviços fora

como contadora e A.O.L tem um quiosque na praia de Bom Jesus, e aproveita

as oportunidades de lazer da família para vender refeições. Observa-se que

estas duas mães usam o computador para exercer tais atividades.

5.2.3 As práticas sociais de escrita: recepção e produção de textos

Nesse item, serão descritos os dados coletados sobre usos e atitudes

dos alunos referentes às escritas escolares e às manifestações de escrita que

fazem parte do contexto familiar de todos os sujeitos.

5.2.3.1 Adultos:

A O que lêem, escrevem e copiam nos espaços do cotidiano

75

Observa-se que somente A.L. e A.O.L entregaram textos à pesquisa, já que os

demais sujeitos não se sentiram à vontade para tanto.

A.1 Textos do domínio religioso

As atividades religiosas que fazem parte do cotidiano da maioria dos

sujeitos adultos entrevistados são constituídas por práticas de escrita. Por isso,

são descritas nesse item.

A.1.1 Leituras compartilhadas

Apenas A.L e A.O.L disponibilizaram textos referentes a este item.

A.L., J.P.Q., A.O.L. e M.B.S disseram ler em grupo, durante os cultos na

Igreja, em trechos da Bíblia e em revistas de estudos bíblicos, por exemplo,

salmos, orações, e hinos religiosos, sendo estes últimos cantados e

acompanhados por movimento corporal. Todas as crianças acompanham e

participam juntos com suas mães dessas atividades. Neste contexto, é feita a

leitura dos textos em voz alta por dirigentes da Igreja, que é acompanhada

silenciosamente, ou em voz alta, pelo grupo de leitores. Após a leitura dos

textos Bíblicos, o seu sentido é negociado pelos sujeitos ali presentes a partir

de comentários e preleção que são feitos.

J.P.Q. afirmou que, além da Bíblia, tudo o que lê está relacionado ao seu

trabalho em contabilidade, que não pode ser divulgado. Por isto, ela não nos

forneceu nenhum texto.

J.P.Q. também participa das leituras compartilhadas de relatórios

financeiros de prestação das contas da igreja que freqüenta, com entradas e

saídas de verbas, decorrentes das doações dos fiéis, e que são realizadas em

sessões específicas por seu dirigente para a aprovação pelos membros do

templo.

A.L. apenas nos mostrou a Bíblia lida nos cultos, e disse que ela era igual

a todas as outras e que, por isso, seria fácil saber o seu conteúdo. Porém nos

entregou letras de hinos que são lidos coletivamente ao se cantar, conforme o

exemplo 01 abaixo:

76

EXEMPLO 01

77

A.O.L., embora apenas acompanhe o seu marido, deficiente visual, nos

cultos da igreja, lê para ele em casa textos religiosos, como os salmos do

exemplo 2 abaixo, e juntos os interpretam.

EXEMPLO 02

78

A.O.L. também apresentou à pesquisa um texto de auto-ajuda de

inspiração religiosa, e um livro de orientação espiritual, que ela também lê para

o seu marido, conforme exemplos 03 e 04 a seguir.

EXEMPLO 03

79

EXEMPLO 04

80

A.1.2 Leituras particulares

A.L., J.P.Q.e A.O.L. e M.B.S disseram fazer leituras individuais de trechos

da Bíblia, principalmente dos Salmos, que servem para a meditação e

preparação em casa para a participação nos cultos. Vide a cópia de panfleto

religioso no exemplo 05 abaixo, entregue por A.O.L.

EXEMPLO 05

81

A.1.3 Cópia de textos

Somente A.O.L declarou que copia textos bíblicos, que depois são

recitados em voz alta como orações, junto com o marido, como se pode

verificar no exemplo 06 a seguir:

EXEMPLO 06

82

A.2 Textos do domínio jornalístico: boletim, jornal e revista

Apenas A.O.L disponibilizou textos de que trata este item.

Todas as mães disseram ler esporadicamente, em consultórios médicos

e outros locais, revistas como o periódico Sabrina, que é destinado a mulheres

preferencialmente de grupos populares. Nessas revistas elas lêem reportagens

sobre a vida dos artistas, dicas de beleza e sobre prevenção de doenças,

contos, resumos de novelas, etc.

A leitura de reportagens policiais em jornais diários só é feita por A.O.L.,

em voz alta, para o marido. Ela também lê para ele o boletim mensal da

Petros, fundação da Petrobras, que se constitui em uma ligação com o mundo

do trabalho para M.B.S., de acordo com exemplo 07 abaixo.

EXEMPLO 07

83

A.3 Textos digitais: leitura e escrita em e-mails e chats

A.O.L e J.P.Q, moradoras de Sobradinho, dizem que participam de

chats, sendo que. A.O.L troca e-mails com a irmã e J.P.Q. usa o e-mail

como ferramenta de trabalho.

A.3.1 Cartas pessoais e comerciais

Todos os sujeitos disseram ler e escrever ao trocar cartas com pessoas

da família, mas não disponibilizaram nenhuma para a pesquisa. Somente

A.O.L. entregou o envelope de uma carta comercial da Câmara Municipal a

ela endereçada, de acordo com o exemplo 08 abaixo.

EXEMPLO 08

84

A.3.2 Textos utilitários: receitas e listas

Todas as mães dizem que fazem cópias de receitas e escrevem listas de

compras, embora não tenham apresentado nenhum destes textos para a

pesquisa, com exceção de A.O.L, que disponibilizou o seu livro de receitas, que

ela lê de vez em quando, de acordo com o exemplo 09 a seguir:

EXEMPLO 09

85

5.2.3.2 Crianças:

A O que lêem, escrevem e copiam no espaço do cotidiano

R falou muito pouco sobre as suas experiências de escrita, parecendo

contrariado com o tema, e mostrou desinteresse, mesmo quando provocado,

em falar sobre as atividades de leitura e escrita desenvolvidas nos dois

contextos escolares: na escola complementar e na escola tradicional. As suas

respostas foram lacônicas, em um discurso ‗pronto‘, pois, ao ser questionado

sobre as suas práticas de produção e recepção de textos fora da escola, R.

afirmou sucintamente que gostava de ler os romances infantis de Monteiro

Lobato, embora não tenha conseguido apontar um título do autor. Acrescentou

que pedia ao pai para levá-lo para a Biblioteca Municipal, e que retirava livros

emprestados na biblioteca da escola e os lia lá mesmo.

Durante uma das atividades da escola complementar referente à

produção de textos instrutivos, escritos a partir de desenhos como pretexto

para a formação de hábitos de higiene, a professora escreveu o seguinte na

folha do trabalho de R., conforme o exemplo 10 abaixo:

86

EXEMPLO 10

87

R. se sentiu mais à vontade ao contar que vai a lan houses participar

de jogos virtuais e que joga bola no Centro de Educação Complementar - CEC.

Ao questionarmos a sua professora sobre o seu desempenho em atividades de

escrita no CEC, fomos informados de que ele é apenas copista, já tendo

repetido de ano mais de uma vez por conta desta situação.

A. também tentou se esquivar das perguntas sobre as suas atividades

de recepção e produção de textos fora da escola. Ela também disse que lia

romances infantis de Monteiro Lobato e freqüentava a Biblioteca Municipal com

o seu pai. Entretanto, sua mãe, ao ser entrevistada, afirmou que o único livro

que havia em casa para ler era a Bíblia, conforme descrito no item A.1.1 sobre

leituras compartilhadas, e que, recentemente, tinha jogado fora todos os livros

e papéis que possuía. E, segundo a avó de A., o pai de A. demorava a

aparecer em casa por ter problemas com álcool e, portanto, nunca a

acompanhou à biblioteca.

Porém, A. copia versinhos de poesias em casa, como mostra o exemplo

11 abaixo:

88

EXEMPLO 11

89

J. disse que as suas atividades de recepção e produção de textos em

casa se resumiam a exercícios da escola.

Entretanto, ela mostrou que gosta de escrever o que denomina conto,

mas que, na verdade, trata-se de depoimento, como no exemplo 12 abaixo.

Observa-se que o texto se refere às suas experiências no contexto da

escola alternativa.

EXEMPLO 12

90

Já M. afirmou preferir escutar as histórias da literatura infantil que são

contadas pela professora, do que ler textos. Observa-se que este aluno

costuma ouvir a mãe ler em voz alta para o seu pai, que é deficiente visual.

Ele também disse que costuma escrever e-mails e participar de jogos

virtuais na lan-house, sendo que também escreve e - mails em seu computador

em casa.

J. lê textos bíblicos diariamente em casa e faz contas que a mãe passa

para ela.

Observa-se que A. participa de leituras compartilhadas e em voz alta de

textos bíblicos, nas classes infantis de leitura da igreja que freqüenta.

A O que lêem, escrevem e copiam no domínio escolar tradicional

Nesse contexto específico, as únicas atividades de recepção e produção

de textos citadas pelos alunos A., J., M. e R. foram cópias de exercícios

gramaticais e de poesias do livro ou da lousa.

B.1 Exercícios gramaticais

Essas atividades escritas têm como objetivo o de ensinar regras da

gramática normativa. Importante acrescentar que elas foram fornecidas pelas

alunas J. e A. respectivamente, de acordo com os exemplos 13 e 14 abaixo,

após perguntarmos a elas, na escola, o que consideravam ser um texto.

91

EXEMPLO 13

92

B.2 Poesias copiadas do livro e da lousa:

EXEMPLO 14

93

A O que lêem, escrevem e copiam na escola complementar

Nesse contexto, as atividades de recepção e produção de textos são mais

diversificadas, pois quando questionados sobre o que consideravam texto, os

alunos citaram:

C.1 Poesia

Refere-se à atividade oral seguida de leitura e cópia de poesia, como

pretexto para a realização de atividade gramatical, de acordo com os textos no

exemplo 15 baixo, entregues por A.

94

EXEMPLO 15

95

C.2 Textos instrutivos

Estes textos são escritos a partir de desenhos, como pretexto para

formar hábitos de higiene, como o do exemplo 16 abaixo, entregue pelo aluno

M:

EXEMPLO 16

96

C.3 Contos infantis

Este texto e desenhos feitos por M. e A. são escritos pelos alunos a

partir da leitura de clássicos da literatura infantil.

EXEMPLO 17

97

EXEMPLO 18

98

C.4 Relatos e narrativas sobre temas específicos

Desenhos e textos escritos a partir de atividade oral desenvolvida pela

professora em classe sobre temas pré-definidos, como a construção da própria

identidade e monstros que existem na sociedade, de acordo com os exemplos

19 a seguir, entregue pelos alunos R e J e 20 entregue pelos sujeitos do CEC,

mas sem identificação.

EXEMPLO 19

99

EXEMPLO 20

100

C.5 Reescrituras de narrativas

Correspondem a textos produzidos pelos alunos a partir de textos

modelizadores. Tratam-se de cópias de fragmentos escritos pelos alunos, mas

que foram digitados pela professora para reescrita com correção dentro dos

padrões normativos, conforme demonstra o exemplo 21 abaixo, entregue pelo

aluno R.

EXEMPLO 21

101

C.6 Fábulas

O Projeto ―A Magia das Fábulas‖ utiliza fábulas como pretexto para que

os alunos escrevam textos diversos, de conteúdo edificante. Para tanto, as

crianças antes cantam, vêem filmes e ouvem músicas, e depois fazem a sua

encenação. O exemplo 22 abaixo refere-se a um rap escrito por J., para ser

cantado com uma performance corporal específica para este gênero de texto.

Observa-se que o professor identifica erroneamente o texto como ―happy”, em

vez de rap.

EXEMPLO 22

102

6 INTERPRETAÇÃO DOS DADOS

Com base na descrição de dados, pode-se afirmar que as experiências

de escrita e o desempenho escolar dos sujeitos alunos relacionam-se às

experiências de leitura e produção de textos realizadas no contexto familiar,

geralmente sob a influência das mães e, no caso de M., também do pai.

Os dados mostram que a variável escolaridade dos adultos não é

pertinente para caracterizar as experiências de escrita no contexto familiar,

uma vez que a maioria do que J.P.Q, que tem nível superior, lê e escreve se

relaciona às atividades de seu trabalho. Até mesmo as práticas religiosas que

desenvolve se voltam para o exercício de seu ofício de contadora e se restringe

à leitura individual da Bíblia em casa. A.O.L, por sua vez, só tem a 4ª série,

mas a sua experiência de leitura em casa é bem maior do que a de J.P.Q, já

que as leituras de diferentes textos que faz para o marido fazem parte do

cotidiano da família .

Nesse contexto, a experiência maior com a escrita do cotidiano de J.

refere -se a deveres da escola sobre as questões gramaticais da língua. A sua

mãe às vezes também lê a Bíblia com ela em casa, e cobra de J. esta leitura

para a sua formação religiosa e para exercícios de língua.

Já M., único menino entrevistado que nunca repetiu de ano, prefere

escutar histórias contadas pela professora do que ler e escrever na escola,

porque, conforme dito anteriormente, ele ouve, desde criança, a mãe ler para o

pai narrativas bíblicas, jornais e os boletins, cartas e panfletos relativos ao

mundo do trabalho de M.B.S. A sua experiência de leitura e escrita familiar é

maior do que a de seus colegas pesquisados, já que M. escreve e-mails em

casa e na lan-house, participa de jogos virtuais, além de ainda acompanhar os

pais nas idas à Igreja, onde participa das leituras compartilhadas de trechos da

Bíblia, orações, hinos, etc.

O contexto comunitário e familiar é importante para caracterizar as

escritas que circulam no ambiente doméstico, pois se relaciona às experiências

de escrita das mães entrevistadas. As de Baraúna, AL e L.L.G., só escrevem

esporadicamente textos utilitários, como agenda de telefone, receitas e listas

de compras, e lêem só de vez em quando jornais e revistas, quando têm

acesso a eles, e as atividades escolares dos filhos. LLG inclusive é a única

103

mãe que não participa de atividades religiosas, a não ser esporadicamente e a

convite, sendo que AL faz leituras de textos religiosos só durante os cultos na

igreja, em voz alta, junto aos demais fiéis e, em casa, descarta todos os

materiais de leitura e escrita que não têm mais serventia imediata para ela.

Este tipo de realidade influencia tanto A. como R., pois ambos são copistas e

não estão familiarizados com a escrita circulando no seu cotidiano familiar.

A., em casa, além dos deveres escolares, se restringe a fazer cópia de

poesia, conforme exemplo 11 da descrição dos dados, embora participe de

leituras compartilhadas em voz alta, de textos bíblicos na Igreja que a mãe

freqüenta, e de classes de leitura bíblica neste contexto religioso.

R., por sua vez, é multi- repetente, não possui nenhuma experiência de

leitura em cultos religiosos e, em casa, apenas tenta cumprir as atividades

escolares. Ou seja, as suas únicas referências de escrita são oportunizadas

pelo contexto escolar. Ele apresenta um discurso lacônico sobre as suas

leituras e mostra desinteresse por qualquer atividade de leitura e produção de

textos.

J., de Sobradinho, ao contrário, lê narrativas bíblicas e tenta produzir

textos em casa, enquanto M. escuta as leituras em voz alta da mãe e tem como

rotina a escrita de textos dos chamados gêneros digitais, como e-mails, e

outros.

Pode-se acrescentar que os sujeitos de Baraúna estão mais restritos ao

ambiente comunitário e familiar do que os outros de Sobradinho, que saem

mais e, portanto, têm mais referências de atividades sociais de outros locais e

de outras pessoas do que eles, nas quais se incluem as ações de escrita.

O fator idade é importante para caracterizar os sujeitos alunos e suas

experiências com a escrita, pois R. está fora da idade /série e não tem

nenhuma identificação com os textos lidos na escola complementar, em sua

maioria textos clássicos da literatura infantil, que geralmente são

acompanhados de atividades a serem realizadas a partir de desenhos que

estão fora da realidade de um adolescente de 15 anos, ao contrário dos outros

sujeitos. Esta situação é extremamente perversa, visto que quanto mais o

sujeito avança de idade, menos ele aprende, pois a escola se afasta cada vez

mais de sua realidade pessoal, já que nivela pessoas.

104

O fator profissão, no contexto em estudo, é pertinente para a observação

das experiências familiares de leitura e produção de texto. M.B.S. só estudou

até a 4ª série, porém a sua experiência de trabalho ajuda na sua formação de

leitor a partir da leitura em voz alta de boletins e jornais da Petrobras que AOL

faz para ele. Esta experiência de leitura, por sua vez, é reforçada por AOL, que

também só possuindo a 4ª série, usa o computador em casa para escrever

textos referentes à sua profissão de vendedora de alimentos, além de se

comunicar com parentes que estão distantes. E seu filho M., ao trabalhar no

espaço doméstico com CDs e DVDs, utiliza o computador para exercer esta

atividade profissional através da leitura e produção de textos de gêneros

digitais, tais como e-mails e chats. Acrescenta-se a isso, o fato de que J.P.Q.

realiza leituras particulares referentes à sua profissão de contadora em casa,

embora estas não influenciem as experiências familiares de escrita da sua filha

J.

Observa-se que a variável gênero entre os adultos não é pertinente,

nesse estudo, para observar as suas práticas cotidianas de escrita, já que os

dados revelaram que apenas um homem está presente no contexto familiar, e

que os demais só vão para casa para dormir, pois passam o dia trabalhando, e

nos fins de semana também se ausentam do lar. Com relação aos alunos

entrevistados, as práticas sociais e as práticas escolares de escrita não

mostraram diferenças relevantes que fossem decorrentes desta variável,

provavelmente devido ao número reduzido de sujeitos.

Pode-se constatar que a concepção tradicional de língua e de texto em

geral ainda fundamenta o trabalho em língua portuguesa nas escolas. Segundo

Koch (2003), há a concepção tradicional, a concepção estrutural e a concepção

interacionista de língua. A primeira concepção, de acordo com Travaglia

(2002), situa a linguagem como expressão do pensamento. Ou seja, não se

expressar de determinada maneira é sinônimo de não pensar direito e, em

conseqüência, da linguagem não ter lógica. Esta concepção tradicional

constituiu-se historicamente, ancorada na tradição gramatical, e refere-se a um

corpo de regras de como deve ser a língua. Ela é de base escrita e pautada na

literatura clássica, ou no cânone, e serve de modelo para toda a sociedade.

Esta concepção de língua não tem caráter científico, porque faz julgamento de

valor tendo como referência a linguagem de grupos sociais de prestígio.

105

As outras duas concepções de língua têm caráter científico, já que se

fundamentam nos estudos lingüísticos, embora correspondam a pontos de

vista diferentes sobre como a língua se estrutura ou como é usada pelos

sujeitos. Elas não se preocupam em como a língua deve ser e nem levam em

conta critérios históricos e puristas em suas análises. Uma destas concepções

refere-se à corrente estruturalista dos estudos da língua, que a concebe na

perspectiva da homogeneidade. Segundo Travaglia (2002, p.22), esta diz

respeito à língua como instrumento de comunicação, o que mostra que ―nessa

concepção a língua é vista como um código, ou seja, como um conjunto de

signos que se combinam segundo regras, o que é capaz de transmitir uma

mensagem, informações de um emissor a um receptor.‖

A outra concepção, que fundamenta este trabalho, refere-se à língua na

perspectiva dos usos e dos sujeitos, ou seja, baseia-se na sua

heterogeneidade. A língua aqui é interpretada como sendo sócio-

historicamente situada, e resultado de um processo de interação entre os

sujeitos.

Observa-se que as escritas do contexto familiar e comunitário – no caso o

contexto religioso – diferenciam-se muito dos textos tradicionalmente

trabalhados na escola, que em geral atendem ao objetivo final de servirem de

pretexto para o ensino de regras gramaticais.

Os sujeitos R e A, que só lêem textos escolares e são copistas, citam um

autor clássico de obras infantis que nunca leram, como sua referência de

leitura. J., por sua vez, relaciona o que lê e escreve em casa a exercícios

escolares, e o que chama de ‗conto‘, visto no exemplo 12, na verdade é um

depoimento composto de fragmentos de textos sobre a sua experiência

escolar. E M. cita as histórias contadas pela professora como texto de que

gosta. E todos os textos lembrados são considerados pretextos para trabalhos

de análise de língua e para formação de hábitos entre os alunos.

Nesta perspectiva, tanto as crianças quanto seus pais não consideram as

escritas religiosas que fazem parte do contexto familiar ou comunitário como

sendo práticas de leitura e escrita, pois quando questionados sobre elas,

fizeram questão de deixar claro que estas são atividades da igreja. Por isso,

enxergam-nas como sendo parte de um ritual litúrgico. Assim como e-mails e

106

outros textos virtuais, que são considerados ferramentas de trabalho ou formas

de lazer.

Verifica-se ainda, que nos rituais das igrejas freqüentadas pelos adultos

as leituras religiosas são coletivas – em voz alta - ou individuais. Desta forma,

em casa ou na igreja, são constituídas, muitas vezes, de outras linguagens

como o canto, gestos e dança. Assim, as relações entre oralidade, escrita, e

outras linguagens dependem do contexto em que se realizam, são ações sócio-

culturalmente situadas de sujeitos singulares. Heath (1983), como visto antes,

mostra que diferentes comunidades, como as que ela estudou, possuem

diferentes orientações de letramento em casa e na escola, baseadas nos

valores culturais e tradições de escrita próprios de cada contexto.

Pode-se acrescentar também, que alguns gêneros textuais digitais,

surgidos recentemente, como os e-mails e chats, representam uma nova

relação dos sujeitos com a escrita em suas práticas cotidianas, incluindo as

suas atividades profissionais, como argumenta Marchuschi (2001), em um

contexto multimídia, de acordo com as diferentes instâncias sócio-culturais, e

seus textos hoje são uma realidade na vida contemporânea .

E esta realidade diversa do cotidiano dos diferentes sujeitos não é

considerada pela escola, já que tradicionalmente não leva em conta, nas

primeiras séries, textos de gêneros discursivos que possam se constituir em

práticas significativas para formar bons leitores e redatores, mas sim para ser

pretexto para o trabalho edificante de formação de bons hábitos e conceitos, e

de aprendizado de regras gramaticais.

Os escritos dos exemplos 13 e 14, fornecidos por J. e A., e considerados

exemplos de textos pelos sujeitos, são, respectivamente, exercícios

gramaticais e cópia de uma poesia, que funciona como treino ortográfico. A

noção de texto construída pelos alunos na escola tradicional, portanto,

confunde-se com a noção de escrita escolar, que aqui serve prioritariamente

para avaliar o domínio do código ortográfico e de regras gramaticais, e não

para formar leitores e produtores de texto.

Os dados mostram que a escola complementar tenta se basear em uma

concepção de ensino diferenciada da instrução tradicional. Entretanto,

observamos que os pais exigem que seus filhos façam exercícios gramaticais e

demais exercícios da escola tradicional. Para eles, este deve ser o papel da

107

escola complementar, o de reforçar conteúdos, e não o de formar leitores e

redatores eficientes, ou seja, o de oferecer mais recursos tendo em vista a

escola tradicional, visto ser esta a referência de ensino.

O texto, na escola complementar, é considerado pelo professor a unidade

de trabalho em língua portuguesa, o que amplia a visão de língua escrita do

aluno, antes restrita, pois ele o estuda aqui na perspectiva dos gêneros

textuais. Contudo, o texto ainda é geralmente utilizado nesta escola como

pretexto para o ensino de algo, como é o caso do exemplo 15, fornecido por A.,

que é uma cópia de poesia, a qual serve de motivo para a realização de

atividade gramatical, e do exemplo 16, de texto instrutivo, cujo objetivo foi o de

se escreverem alguns trechos sobre alguma situação vivenciada em sala de

aula, a partir de desenhos, com o pretexto de formar hábitos de higiene.

Além deles, pode-se observar o texto do exemplo 19, referente a relatos

e narrativas sobre temas específicos, cujos desenhos e textos foram escritos a

partir da pré-definição e exploração de temas pela professora em atividade oral

desenvolvida em classe, como a construção da própria identidade e da

necessidade de combate à violência na sociedade. Assim como o exemplo 21,

de reescrituras de narrativas a partir de textos modelizadores, que são cópias

de fragmentos escritos pelos alunos e digitados pela professora para a

aplicação de exercícios de reconstrução de parágrafos.

Assim, os textos dos exemplos 12, 13, 14, 15, 16, 19 e 21 não têm o

objetivo de formar leitores e redatores eficientes. O texto escrito reduziu-se ao

trabalho de treino ortográfico, estudo gramatical, discussão de temas para a

formação pessoal do aluno e para exercícios de construção frasal.

No que se refere aos contos infantis, produzidos por A. e M., de acordo

com o exemplo 17, seguido pela ilustração mostrada no exemplo 18 da

descrição dos dados, observa-se que se trata de uma narrativa construída a

partir da história de Chapeuzinho Vermelho. Verifica-se que os sujeitos não têm

oportunidade de construir a sua própria narrativa porque, ao escreverem o

conto, fazem-no a partir de fragmentos de clássicos da literatura infantil, que

conhecem desde a fase pré-escolar, como é o caso aqui da história de

Joãozinho e Maria, e de outras leituras feitas na escola para a formação de

conceitos, como a necessidade de preservação do meio ambiente, já que há a

108

referência à ação de carpinteiro malvado que levou Chapeuzinho branco para

desmatar a floresta.

Os únicos textos criativos, dentre os entregues para a pesquisa, foram os

dos exemplos 20 e 22. O texto do exemplo 20 é um conto com estrutura

narrativa própria deste gênero, que inicia com ―era uma vez‖ e conclui com o

tradicional ―felizes para sempre‖, e que foi baseado no desenho animado

Shrek, com o qual os alunos estão familiarizados graças à mídia eletrônica. A

produção deste texto permitiu aflorar a criatividade do aluno, como mostra o

trecho: ―o monstro Shrek gosta comer 30 abacaxi, 25 bananas, 05 mangas, 10

copos de suco de lama misturado com adubo de boi‖. O texto não serviu de

pretexto para outras atividades, e então o(s) aluno(s) puderam se expressar

livremente sobre um personagem já conhecido.

O texto do exemplo 22 refere-se a um rap (rhythm and poetry - ritmo e

poesia) que foi escrito a partir de um trabalho oral feito antes em classe com

base em uma fábula. Por isso, traz a questão da não violência como tema, a

partir do fundo moral da fábula.

Ele é exemplo de gênero de escrita híbrido porque, embora utilize o meio

gráfico, tem concepção oral, segundo Marcuschi (2005). Os estudantes estão

familiarizados no seu cotidiano com o rap, que surgiu como dança nas festas

das ruas de grupos populares, e é escrito em versos rimados, já que tem como

objetivo produzir ritmo e oportunizar o trabalho da expressão corporal por meio

da música e da dança.

Assim sendo, embora a fábula seja comentada oralmente e lida em classe

com objetivo de se discutir o seu fundo moral, a possibilidade de situar o texto

em outro gênero, como o rap, oportunizou aos alunos, a construção de um

texto original, próprio, bem como o uso criativo da língua escrita.

Souza (2006) coloca que há várias maneiras diferentes de se construir o

significado. Estas envolvem formas diferentes de engajamento corporal com o

mundo, ou seja, segundo o autor não é apenas por meio da visão, como ocorre

na escrita, ou da audição como ocorre com a fala, mas através do tato, do

olfato, do gosto, da sensação, o que ele chama de sinestesia, são

consideradas forma especiais dos homens compreenderem e se relacionarem

com o mundo.

109

A escola tradicional, portanto, tem uma visão mitificada e cristalizada de

escrita, conforme Rojo (2006). Segundo ela, deve-se pensar nas práticas de

leitura e de escrita que fazem parte do cotidiano das pessoas, e nas diferentes

formas de participação em práticas orais nas quais estas práticas de letramento

ganham significado. Portanto, o modo de participação oral de crianças nas

práticas de leitura e escritura é que caracterizará a construção de uma relação

com a escrita enquanto prática discursiva e enquanto objeto.

Já a escola complementar baseia-se em um conceito de escrita

contraditório, pois, ao buscar atender à expectativa dos pais, acaba por adotar

uma visão tradicional de língua em sua prática de ensino. Ao mesmo tempo, ao

recuperar o texto como unidade do trabalho em Língua Portuguesa, tenta

acatar o que sugerem os Parâmetros Curriculares Nacionais da Educação

Básica (1997), neste caso, os direcionados para o 1º e 2º ciclos quando tratam,

dentre outras questões, de concepções teóricas sobre língua, escrita e texto

baseadas em estudos lingüísticos. Assim, a escola complementar propõe-se a

inovar no nível teórico, mas não consegue fazê-lo satisfatoriamente em sala de

aula, no domínio prático dos procedimentos de ensino-aprendizagem do

português.

De acordo com Soares (2004), ter-se apropriado da escrita é diferente de

ter aprendido a ler e a escrever, uma vez que ―aprender a ler e escrever

significa adquirir uma tecnologia, a de decodificar em língua escrita e de

decodificar a língua escrita; apropriar-se da escrita é tornar a escrita ―própria‖,

ou seja, é assumi-la como sua ―propriedade‖ (SOARES, 2004, p. 39).

110

7 CONCLUSÃO

A pesquisa de cunho etnográfico apresentada interpreta as práticas de

escrita como uma realidade constituída e constitutiva pelas demais práticas

sociais e pela realidade histórica e cultural, na qual a escrita dos sujeitos não é

neutra, mas pode ser desafiada, reinterpretada e alterada pelos indivíduos.

Deste modo, considera a interação e o trabalho coletivo dos seus

sujeitos, que convivem em duas comunidades específicas urbanas da cidade

de Feira de Santana, e que partilham o mesmo espaço escolar. Assim,

considera a língua, enquanto fala e escrita, integrante das práticas históricas e

sociais vividas nas singularidades de seus contextos.

Os dados coletados em campo e a sua interpretação, com base na

fundamentação teórica, constituíram a abordagem do tema proposto. E, de

acordo com a análise realizada, foi possível verificar-se que as ações dos

sujeitos em sua vida cotidiana e comunitária, determinam os usos que eles

fazem da escrita, e são por ela constituídas, com base nos conhecimentos não

apenas gramaticais, mas também sociolingüísticos, que orientam as

estratégias elaboradas para a apreensão destas escritas ordinárias em

contextos discursivos situados. Têm-se, como exemplo, os textos escritos que

são do domínio religioso e que fazem parte do espaço comunitário e familiar de

alguns sujeitos, ou seja, de sua vida religiosa.

Nesta perspectiva, os usos cotidianos de escrita relacionam-se com a

oralidade de maneira diversa, ou seja, de acordo com os grupos sócio-culturais

e com os diferentes contextos sócio-discursivos de que fazem parte, como, por

exemplo, as práticas compartilhados pelos sujeitos e constituídas por textos de

gêneros religiosos e de gêneros digitais, sendo os últimos ações que fazem

parte dos contextos de trabalho e de lazer. Observa-se, portanto, que estes são

textos escritos híbridos porque embora utilizem o meio gráfico, possuem

concepção oral. É nesse sentido que Marcuschi (2005) coloca que as situações

que envolvem as diversas mídias fazem emergir diferentes formas de

comunicação que são próprias dos sujeitos, apresentando um certo hibridismo

que desafia as relações entre oralidade, escrita e contexto.

Entretanto, as experiências de escrita dos alunos na escola confrontam-

se com as experiências de leitura e produção de textos vivenciadas no

111

contexto familiar, geralmente sob a influência das mães, e no contexto

comunitário a que pertencem estas crianças. Ou seja, as escritas que circulam

cotidianamente na família e na comunidade não se relacionam, na maior parte

das vezes, às escritas escolares, sobretudo às da escola tradicional. Tanto que

os textos que circulam nos espaços do cotidiano, como os do campo religioso,

não são considerados como sendo práticas de leitura e escrita pelos sujeitos,

mas apenas atividades litúrgicas. O mesmo ocorre com os e-mails e outros

textos virtuais, que são considerados apenas ferramentas de trabalho ou

formas de lazer

A escola tradicional ainda fundamenta o trabalho em língua portuguesa na

concepção tradicional de língua, em que há juízo de valor, porque se tem como

referência a linguagem de grupos sociais de prestígio, e como modelo a escrita

tradicional, que se baseia em regras da gramática normativa. Nesse caso, o

objetivo é o domínio destas regras com base em frases de textos escritos

apresentados em classe. Nota-se, desse modo, a clara oposição entre o

cotidiano vivido pelos alunos e o ensino escolar.

As escolas, em geral, principalmente a escola tradicional, não levam em

conta os usos sociais da escrita que fazem parte do contexto sociolingüístico

dos alunos, e que têm significado para eles. Nivela-os na avaliação de

desempenho, tratando-os, por isto mesmo, desigualmente. De um modo geral,

as práticas de escrita pautadas na visão tradicional de língua não atendem aos

propósitos comunicativos dos sujeitos, sobretudo os de instituições públicas, ao

priorizar gêneros de escrita que são próprios do campo escolar, como é o caso

dos clássicos da literatura infantil, muito presentes neste contexto e que os

alunos conhecem desde a fase pré-escolar, chegando à adolescência tendo -

os como modelo de escrita escolar.

Assim, a atitude assumida pelos sujeitos em relação a estas práticas é de

indiferença ou estranhamento, pois elas lhes são artificiais, servindo, dentre

outras coisas, para teste de habilidades referentes ao domínio do código

gráfico.

Já a escola complementar propõe uma concepção de ensino diferenciada

da instrução tradicional, principalmente porque tem como unidade de trabalho o

texto. Entretanto, este ainda é utilizado prioritariamente nesta escola como

pretexto, por exemplo, para a formação pessoal, para a aquisição de hábitos de

112

higiene, e mesmo para o reforço do trabalho de análise de língua desenvolvido

pela escola tradicional. Observa-se, portanto, que a abordagem da escrita que

adota no processo de ensino-aprendizagem é contraditória, por se basear em

uma visão ainda tradicional de língua em sua prática de ensino, ao mesmo

tempo em que teoricamente adota o texto como unidade do trabalho,

considerando a língua na perspectiva dos usos, em suas aulas de Língua

Portuguesa, conforme sugerem os Parâmetros Curriculares Nacionais da

Educação Básica (1997). Assim, o Centro de Educação Complementar faz jus

ao seu nome, quando reafirma o papel da escola tradicional ao funcionar como

reforço de suas aulas, embora no contexto das práticas textuais.

Por outro lado, os dados da pesquisa também apontam uma alternativa

de trabalho em língua portuguesa no contexto desta escola que ultrapassa a

concepção tradicional de escrita e de práticas de texto aqui citadas. Assim, a

escola complementar acerta, quando permite em alguns momentos que as

crianças se expressem criativamente a partir de determinados situações e/ou

gêneros que lhes são familiares.

Como exemplo, podemos citar o rap, gênero de escrita que interage com

a oralidade e também com outras linguagens em determinados contextos

discursivos, ou em um espaço multidimensional que lhes é próprio. Embora a

escola utilize o seu conteúdo como pretexto para o ensinamento moral da

fábula em que se baseia, ele oportuniza a construção de textos significativos

para os alunos de grupos populares, já que fazem parte da sua realidade

cotidiana.

Pode-se também citar como exemplo o conto baseado no desenho

animado Shrek, que foi escrito pelos alunos de forma criativa, já que não serviu

de pretexto para a realização de outras atividades e se baseou em personagem

de desenho animado conhecido de todos, graças à mídia eletrônica.

Com relação aos fatores utilizados para caracterizar as práticas de escrita

nesta pesquisa, mostraram-se pertinentes a idade dos alunos, a profissão dos

adultos e de um aluno, e o espaço comunitário.

Assim, as práticas escolares de escrita desenvolvidas nos dois contextos

escolares não se relacionam à idade de R, pois ele está fora e idade-série e as

atividades propostas afastam-se de suas atividades cotidianas e de seus

interesses pessoais.

113

Já o fator profissão mostrou-se pertinente para a análise dos dados,

porque a escrita faz parte do trabalho profissional de J.P.Q e A.O.L, e

oportuniza a M.B. dos S. a leitura de escritas relacionadas ao mundo do

trabalho, que são extensivas à sua mulher, enquanto M. lê e escreve no

computador regularmente para a gravação de CDs e DVDs que comercializa.

Verifica-se que o meio social é pertinente para a observação das práticas

de escrita, nesta pesquisa, pois os adultos de Baraúna entrevistados interagem

menos com outros espaços do que os sujeitos de Sobradinho, ou seja, as suas

atividades são mais localizadas e as suas práticas de escrita restringem-se ao

campo religioso do espaço comunitário - com exceção das escritas esporádicas

de gêneros utilitários, como as listas, por exemplo. Em Sobradinho, por sua

vez, as pessoas freqüentam mais outros espaços ou ambientes, e a escrita

também faz parte do espaço familiar, principalmente a escrita de textos de

gêneros que constituem o mundo do trabalho e o campo religioso dos adultos.

E as práticas de escrita das crianças investigadas refletem esta realidade, pois,

como se observou, as únicas copistas são justamente as de Baraúna, as que

não têm acesso a materiais de leitura e escrita e que não compartilham com as

mães nenhum cotidiano de leitura e de produção de textos.

A partir dos dados analisados, observamos que a Escola não leva em

conta fatores bio-sociais como a idade, no caso, e outros referentes à vida

social dos diversos sujeitos para, com isso, conhecer a realidade

sociolingüística dos alunos. Este fato explica o nivelamento a que eles são

submetidos, tanto com relação ao fator idade/série como com relação às

escritas que compõem o seu universo familiar e comunitário, o que inclui as

experiências diversas de leitura e de produção de textos dos pais, tanto no

espaço escolar, como na vida cotidiana, assim como nos diferentes bairros em

que vivem.

Em suma, pode-se afirmar que se faz necessário discutir, sobretudo, o

ensino da língua escrita em situações concretas de uso, como é o caso dos

contextos do trabalho, da família, dentre outros, tomando-se por base os

postulados teóricos provenientes dos resultados de variadas pesquisas sobre

situações específicas de uso da língua em diferentes manifestações sociais, a

fim de se promover propostas reais de intervenção no ensino formal. Nesse

sentido, Kleiman (2006) afirma que a família muito tem a contribuir, visto que

114

esta constitui a agência de letramento mais eficiente que garante o sucesso

escolar. Nela, as práticas e os usos da escrita são fatos presentes no cotidiano

e inseparáveis de outros fatores e prazeres.

Portanto, a escola deve educar por meio de um ensino que se aproxime

da realidade de seus alunos, visto se tratar de um universo dinâmico,

constituído e constitutivo de sujeitos que agem sobre ele resignificando-o.

Nesse universo se coloca a escrita enquanto prática. Por isso, se faz

necessário conhecer e conquistar esses sujeitos, não o contrário. Não se trata

de simplesmente lhes transmitir informações desvinculadas da realidade de

que fazem parte, mesmo se referindo ao ensino da língua. Trata-se de dar a

palavra ao aluno, de modo que esta o instrumentalize para a vida nos

diferentes contextos e com todas as letras.

115

Anexos

116

ANEXO 01

LOCALIZAÇÕES DE PARTE DOS BAIRROS DA CIDADE DE FEIRA DE

SANTANA

FONTE: Livro de Canto da Paróquia do Bonfim, situada no Alto do bairro

Cruzeiro.

117

ANEXO 02

MAPA DA LOCALIZAÇÃO DO ANEL DE CONTORNO DA CIDADE DE FEIRA DE SANTANA

FONTE: Disponível em:<htpp://www.uefs.br/antares/comochegar.htm>. Acesso em: 25 de fev. 2009, 17:00h

118

ANEXO 03

PROJETO DA LEI COMPLEMENTAR Nº 018 DE 18 DE JULHO DE 2004: DELIMITAÇÃO DOS BAIRROS DA CIDADE DE

FEIRA DE SANTANA

119

120

121

122

FONTE: Disponível em:<htpp:// www.feiradesantana.ba.gov.br/leispdf/leicomp/leicomp18.pdf>. Acesso em: 25 de fev. 2009, 17:00

123

ANEXO 04 ÁREAS DESCRITAS EM BARAÚNA

Ruas do bairro Baraúna

Ponto comercial no bairro Baraúna. Escola Estadual no bairro Baraúna

Estação da Música no bairro Baraúna. Empreendimento municipal d aproveitamento

dos espelhos d’água potáveis no bairro Baraúna

Posto de saúde no bairro Baraúna. Complexo viário Prefeito José Ronaldo de Carvalho próximo ao bairro Baraúna

124

ANEXO 05

ÁREAS DESCRITAS EM SOBRADINHO

Posto Policial no bairro Sobradinho. Cemitério São Jorge no bairro Sobradinho.

Seminário teológico no bairro Sobradinho. Igreja Batista no bairro Sobradinho.

Casa comercial no bairro Sobradinho. Local da feira livre no bairro Sobradinho.

125

ANEXO 06 CENTRO DE EDUCAÇÃO COMPLEMENTAR – CEC

Centro de Educação Complementar – CEC no bairro Baraúna

Início das aulas no CEC. Área de acolhimentos aos alunos

Refeitório do CEC.

Sala de Informática do CEC. Sala de música do CEC.

126

Sala de meio ambiente do CEC. Sala de artes do CEC.

Sala de Informática do atendimento Sala de matemática do CEC psicopedagógico do CEC.

Sala de Leitura e escrita do CEC.

Momento de dramatização a partir dos textos construídos pelos alunos do CEC.

127

ANEXO 07

ESCOLA MUNICIPAL ELIZABETH JOHNSON

Escola municipal tradicional Secretaria da escola municipal no bairro Sobradinho.

Sala de aula da escola municipal Parte externa onde se localizam as salas de aula da escola municipal

Garagem da Escola Municipal.

128

ANEXO 08 QUESTIONÁRIO APLICADO AO SUJEITO ALUNO NO CONTEXTO

ESCOLAR

UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA MESTRADO EM ESTUDO DE LINGUAGENS

LINHA DE PESQUISA II: LINGUAGENS, DISCURSO E SOCIEDADE.

PESQUISA DE CAMPO QUESTIONÁRIO APLICADO AO ALUNO

UNIDADE ESCOLAR _______________________________________ 01- SÉRIE:______do Ensino Fundamental TURNO DE ESTUDO: ( ) Manhã ( ) Tarde

02- NOME DO ALUNO(A): _____________________________________________________

03- SEXO: ( ) MASCULINO ( ) FEMININO

04- DATA DE NASCIMENTO: ______/_____/ 19_____ IDADE:_________anos

05- VIDA ESCOLAR: Já repetiu essa série alguma vez? ( )SIM ________vezes

( ) NÃO

Já repetiu outra(s) séries alguma vez? ( )SIM ________vezes

( ) NÃO

Freqüenta o CEC ( Centro de Educação Complementar)? ( ) SIM

( ) NÃO

Já parou de estudar alguma vez? ( ) SIM. Em que série estava?_________série

( ) NÃO

06- BAIRRO EM QUE MORA:___________________________________________________

07- TEMPO DE MORADIA NO BAIRRO: _____________ Meses OU ___________ANO(S)

08- TRABALHA OU JÁ TRABALHOU EM ALGUM SERVIÇO PARA AJUDAR A FAMÍLIA?

( )SIM Fazendo o quê?_____________________________________________

( ) NÃO

09- RENDA FAMILIAR

( ) Abaixo de um salário mínimo ( ) Um salário mínimo

( ) Dois salários mínimos ( ) Acima de Três salários mínimos

10- QUEM SÃO SEUS RESPONSÁVEIS:

( ) PAI E MÃE ( ) SÓ PAI ( ) SÓ MÃE ( ) AVÔ ( )AVÓ

( ) TIO E TIA ( ) SÓ TIA ( ) SÓ TIO

( ) IRMÃO ( ) IRMÃ ( )OUTROS

11- SEUS RESPONSÁVEIS TRABALHAM? ( ) SIM

( ) NÃO

Qual a profissão deles, ou seja, o que eles fazem?____________________________________

12- QUANTAS PESSOAS MORAM EM SUA CASA? ____________________PESSSOAS

129

ANEXO 09 Quadro 3

SISTEMATIZAÇÃO DOS DADOS BIO-SOCIAIS: SUJEITOS ALUNOS

Escola Parceira e do Centro de Educação Complementar – CEC 4ª série TURMA 07

NO

ME

DO

S A

LU

NO

S

ES

CO

LA

EM

QU

E

ES

TU

DA

M

TU

RN

O E

M Q

UE

ES

TU

DA

M

NE

RO

IDA

DE

VIDA ESCOLAR: 0 - Não é repetente 1- Repetente nesta

série 2 - Repetente em outra

série 3 - Parou de estudar

0 1 2 3

BA

IRR

O E

M Q

UE

M

OR

AM

FO

NE

TE

MP

O D

E M

OR

AD

IA

NO

BA

IRR

O

ALUNO TRABA

LHADOR

SIM NÃO

TIP

O D

E T

RA

BA

LH

O

RE

AL

IZA

DO

RENDA FAMILIAR☼ 0-Abaixo de um salário mínimo 1-Um salário

mínimo 2-Dois salários

mínimos 3-Acima de três

salários mínimos 0 1 2 3

RESPON SÁVEIS

1- Pai e Mãe X (Só Pai / Só Mãe :

Especificar) 2- Parentes: Especificar 3- Outros

1 2 3

PR

OF

ISS

ÃO

DO

S

RE

SP

ON

VE

IS

QU

AN

TID

AD

E D

E

MO

RA

DO

RE

S N

A

RE

SID

ÊN

CIA

01-A. M. S. L.

CEC/

Elizabeth Johnson

Matutino

Feminino

12

anos

X 1x

Baraúna

Rua Petronílio Pinto Nº

400

_

12

anos

X

_

X

X

Dono de Oficina/ Dona de

Loja

04 Pessoas

02- J. S. de O.

CEC/

Elizabeth Johnson

Matutino

Feminino

12

anos

X 1x

Sobradinho Rua Úrsula

Catarina Nº 413

3225-6552

12

anos

X

_ X

X

Contadora

02

Pessoas

03-R. V. dos S. C. C.

CEC/

Elizabeth Johnson

Matutino

Feminino

10

anos

X

Sobradinho Rua José de Freitas Moreira Nº

250

9131- 6705

05

anos

X

-

X

Tia

Trab. Em Clínica

03

Pessoas

04-R. G. F.

CEC/

Elizabeth Johnson

Matutino

Masculino

15

anos

X 1x

X 1x

Baraúna

Rua Avenida

Riachuelo Nº 502

-

13

anos

X

_ X

X

Gerente

05

Pessoas

05- M. L. dos S.

CEC/

Elizabeth Johnson

Matutino

Masculino

12

anos

X

Sobradinho

Rua Ladulfo Alves Nº

684

3488- 3087

06

anos

X

Gravação de CD e

DVD

X

X

?

04

Pessoas

130

ANEXO 10 Quadro 04

SISTEMATIZAÇÃO DOS DADOS BIO-SOCIAIS: SUJEITOS ALUNOS Escola Parceira e do Centro de Educação Complementar – CEC 4ª série TURMA 02

NO

ME

DO

S A

LU

NO

S

ES

CO

LA

EM

QU

E E

ST

UD

AM

TU

RN

O E

M Q

UE

ES

TU

DA

M

NE

RO

IDA

DE

VIDA

ESCOLAR:

0 - Não é repetente

1- Repetente nesta série

2 - Repetente em outra série 3 - Parou de

estudar 0 1 2 3 B

AIR

RO

EM

QU

E M

OR

AM

FO

NE

TE

MP

O D

E M

OR

AD

IA N

O B

AIR

RO

ALUNO TRABA

LHADOR

SIM NÃO

TIP

O D

E T

RA

BA

LH

O R

EA

LIZ

AD

O

RENDA

FAMILIAR 0-Abaixo de um salário

mínimo 1-Um

salário mínimo 2-Dois

salários mínimos 3-Acima de três salários

mínimos 0 1 2 3

RESPON SÁVEIS

1- Pai e Mãe X (Só Pai / Só

Mãe : Especificar) 2- Parentes: Especificar 3- Outros

1 2 3 P

RO

FIS

O D

OS

RE

SP

ON

VE

IS#

QU

AN

TID

AD

E D

E M

OR

AD

OR

ES

NA

RE

SID

ÊN

CIA

06- I. K. S. dos S.

CEC/

Elizabeth Johnson

Vespertino

Feminino

10

anos

Baraúnas

Rua Imperial Nº

121 /02

3614-6465

07- R. de J. S.

CEC/

Elizabeth Johnson

Vespertino

11 anos

Sobradinho Rua Rosa de Saron Nº 141

3488-1170

08- D. K. A.C.

CEC/

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

11

anos

X

Jardim

Cruzeiro Rua

Pojuca S/N

9132-3623

1 ano

X

-

X

X

Vendedores

04

pessoas

09-W. de M. M.

CEC/

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

10 anos

X

Jardim

Cruzeiro Rua

Esplanada Nº 465

3483-0206

7 anos

X

- X

X

Vendedora

05

pessoas

10-R. de J. N.

CEC/

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

13anos

Galiléia

Rua 19 de Maio Nº 27

3223-3737

131

ANEXO 11 Quadro 05

SISTEMATIZAÇÃO GERAL DOS DADOS BIO-SOCIAIS: SUJEITOS ALUNOS

Todos da Escola Parceira do Centro de Educação Complementar– CEC 4ª série Total de sujeitos entrevistados = 30

NO

ME

DO

S

AL

UN

OS

ES

CO

LA

EM

QU

E

ES

TU

DA

M

TU

RN

O E

M Q

UE

ES

TU

DA

M

NE

RO

IDA

DE

VIDA

ESCOLAR: 0 - Não é repetente 1- Repetente nesta

série 2 - Repetente em

outra série 3 - Parou de estudar

0 1 2 3 BA

IRR

O E

M Q

UE

MO

RA

M

TE

MP

O D

E

MO

RA

DIA

NO

BA

IRR

O

ALUNO

TRABA

LHADOR

SIM

NÃO

TIP

O D

E

TR

AB

AL

HO

RE

AL

IZA

DO

RENDA

FAMILIAR 0-Abaixo de um salário mínimo 1-Um salário

mínimo 2-Dois salários

mínimos 3-Acima de três

salários mínimos 0 1 2 3

RESPON

SÁVEIS 1- Pai e Mãe X (Só Pai / Só Mãe : Especificar)

2- Parentes: Especificar 3- Outros

1 2 3 PR

OF

ISS

ÃO

DO

S

RE

SP

ON

VE

IS#

QU

AN

TID

AD

E D

E

MO

RA

DO

RE

S N

A

RE

SID

ÊN

CIA

01- A. C. da S.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Feminino

13

anos

X 1x

Santa Cruz

3 anos

X

Babá

X

X

Bancário/ Dona de

loja

07

pessoas

02- B. B. B.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Feminino

12

anos

X 2x

Sobradinho

2 anos

X

-

X

IRMÃ

Vendedora

04

pessoas

03- D.R.S. Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

10 anos

X

Baraúnas

10 anos

X

-

X

AVÓ

Radialista

07

pessoas

04- D.K.A

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

11 anos

X

Jardim Cruzeiro

1 ano

X

-

X

X

Vendedores

04

pessoas

05- E.S.S.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

12

anos

X

2X

Baraúnas

12

anos

X

Oficina

X

AVÓ

Dona de casa

07

pessoas

06- E. O. E.S.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

10

anos

X

2X

Baraúnas

3 anos

X

Vendedor de

Pastel

X

X

Trabalho

Doméstico

07

pessoas

07- G.G.de J.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

11

anos

X 1x

Jardim

Cruzeiro

11

anos

X

-

X

X

Vendedor

04 pessoas

08- G. C.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Feminino

11

anos

X 2x

Sobradinho

10

anos

X

-

X

X

Policial/ Dona de

casa

05

pessoas

09- I. L. N. dos s.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

10

anos

X

Jardim

Cruzeiro

4

meses

X

-

X

Guarda

04

pessoas

10- Í. A. N.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

12

anos

X 2x

Baraúnas

12

anos

X

Entregador de Pastel

X

X

Faz Pastel

04

pessoas

132

11- J.C.S.S.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

10

anos

X

Jardim

Cruzeiro

12 anos

X

-

X

Centro de

Abastecimento

04 pessoas

12-J.R.A.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Feminino

X

Gabriela

10

anos

X

-

X

MÃE

Dona de Casa

04

pessoas

13-J.J.L.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Feminino

10

anos

X

Sobradinho

8 anos

X

-

X

X

Eletricista

05

pessoas

14-K. L.M. P.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Feminino

10

anos

X

Jardim Cruzeiro

8 anos

X

-

X

X

Vendedor De

Calçados

04

pessoas

15-K. P. S.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Feminino

10

anos

X

Jardim

Cruzeiro

12

anos

X

-

X

X

Frigorífico/vendedor

11

pessoas

16-L.A.L

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

12

anos

X

2X

Baraúnas

12

anos

X

Vendedor de

Roupa

X

X

?

10

pessoas

17-L.C.P

Elizabeth Johnson

Vespertino

Feminino

9

anos

X

Jardim

Cruzeiro

10 anos

X

-

X

X

Pedreiro

06

pessoas

18-L.N.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Feminino

9

anos

X

Sobradinho

9 anos

X

-

X

MÃE

Doméstica

02

pessoas

19-M.D.T.M.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

10

anos

X

Gabriela

2

meses

X

-

X

MÃE

Diarista

04

pessoas

20-M. E. M. S. S.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

10

anos

X

Sobradinho

10

anos

X

-

X

X

Gerente

05

pessoas

21-M. S.M.S. Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

11 anos

X

1X

Sucupira

11

anos

X

Envernizando

cadeira

X

X

Faz Cadeira

05

pessoas

22-M.S.C.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Feminino

10

anos

X

Galiléia

10 anos

X

-

X

X

Ferralheiro/dona de

casa

05

pessoas

23-M. O.M

Elizabeth Johnson

Vespertino

Feminino

10

anos

X

Jardim

Cruzeiro

2 anos

X

-

?

MÃE

Combista

24-N.F.S.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

12

anos

X

2X

Sobradinho

5 anos

X

-

X

X

Oficina e Treiler

06

pessoas

25-P.C.R.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

14

anos

X

1X

Baraúnas

14

anos

X

X

X

Lanches

10

pessoas

133

26-R.S.C

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

11

anos

X

-

-

-

-

-

-

-

-

-

-

-

-

-

-

27-S.S.S.S Elizabeth Johnson

Vespertino

Feminino

9

anos

X

Baraúnas

2 anos

X

-

-

-

-

-

X

-

04

pessoas

28-T.S.O. Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

12

anos

X

3X

Galiléia

8 anos

X

Lavar

banheiro e varrer casa

X

X

Pintor

06 pessoas

29-W.N.R.R

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

11

anos

X 1x

Sobradinho

11

anos

X

-

X

AVÓ

Pintor/dona de casa

08

pessoas

30-W.M.M.

Elizabeth Johnson

Vespertino

Masculino

10 anos

X

Jardim

Cruzeiro

7 anos

X

- X

X

Vendedora

05

pessoas

? = Não especificou/ Incompreensível

134

ANEXO 12

G1- GRÁFICO DEMONSTRATIVO DE EVASÃO DA ESCOLA COMPLEMENTAR

FONTE: Secretaria do Centro de Educação Complementar Dom Silvério Albuquerque - CEC

135

ANEXO 13 QUADRO 6 : SISTEMATIZAÇÃO DAS ENTREVISTAS COM OS ALUNOS

NOME DO ALUNO

MODALIDADE DA

ENTREVISTA

QUESTÕES DAS ENTREVISTAS

1- O que você gosta de fazer para se distrair quando

não está trabalhando, estudando ou brincando?

2- O que gosta de

fazer diariamente?

3- E seus

responsáveis (tia) freqüentam

Igreja?

4- Na Igreja eles pedem algum tipo de coisa

para elas lerem e escreverem?

5- Sua tia lê e escreve na

igreja?

6-

Você já viu sua tia fazer algumas anotações além

do Estudo Bíblico?

7-

Ela já pediu para você fazer

alguma anotação escrita?

8- Para que vocês escrevem

em casa?

J.

Gravada

Só faço estudar,

assistir ,a s vezes, e dormir...

Dormir. Porque

minha tia me bota para fazer dever,

tabuada e eu prefiro dormir, do

que estudar.

Da minha casa só

minha mãe e minha tia é evangélica.

Só no Estudo

Bíblico

Na hora do culto. No estudo Bíblico ela leva uma folha e anota o estudo bíblico. Quando

ora também, pois ela pede.

Já. Quando ela

ora. Ela faz pedido escrito.

Minha tia me pediu para eu

colocar o nome de meus pais e eu

coloquei.

Para estudar e fazer dever,

história

ATIVIDADES DE LAZER ou PRÁTICAS DO COTIDIANO

ATIVIDADES / PRÁTICAS

RELIGIOSAS DOS PAIS E/OU RESPONSÁVEIS

O QUE DIZEM OS ALUNOS DAS PRÁTICAS DE

RECEPÇÃO E PRODUÇÃO DE TEXTOS DOS SEUS PAIS

E/OU RESPONSÁVEIS

O QUE DIZEM OS ALUNOS DAS

PRÓPRIAS PRÁTICAS DE

RECEPÇÃO E PRODUÇÃO DE

TEXTOS

09-Na escola você gosta de escrever?

10-E em casa você faz história?

11 - Como a escrita aparece

na casa de vocês?

12- Vocês costumam

receber muitas cartas?

Gosto. Mas às vezes eu reclamo, porque dia de sexta não é dia de fazer

dever.Os dias de dever é terça, quarta e quinta.

Não. Tenho diário,

mas não...

Pelo correio, recibo de água, de

luz...

Às vezes

O QUE DIZEM OS ALUNOS DAS PRÓPRIAS PRÁTICAS DE

RECEPÇÃO E PRODUÇÃO DE TEXTOS

O QUE DIZEM OS ALUNOS DAS PRÁTICAS DE RECEPÇÃO E

PRODUÇÃO DE TEXTOS QUE CIRCULAM NO CONTEXTO FAMILIAR

136

QUADRO 6.1: SISTEMATIZAÇÃO DAS ENTREVISTAS COM OS ALUNOS

NOME DO ALUNO

MODALIDADE DA

ENTREVISTA

QUESTÕES DAS ENTREVISTAS

1- O que você gosta

de fazer normalmente

para se distrair quando não está

trabalhando, estudando ou brincando?

2- O que você mais

gosta de fazer diariamente?

3- Que tipo de desenho?

4- O que as três espiãs mais

fazem e falam para que você goste delas?

5- E os livros, quais

você mais gosta?

6- Os livros que

você lê ficam em sua casa ou só

tem oportunidade de

ler na escola?

7- O que você escreve?

8- Seus pais

freqüentam igreja?

A.

Gravada

Gosto de brincar, ler livro e assistir

TV.

Assistir desenho e escrever no diário.

Eu tenho dois

Três espiãs...

Proteger.

Monteiro Lobato

(...)

Eu peço ao meu pai para me levar

na Biblioteca, peço emprestado

e leio aqui.

Escrevo história, que depois que escrevo perde a

graça.

Só minha mãe

ATIVIDADES DE LAZER ou

PRÁTICAS DO COTIDIANO

O QUE DIZEM OS ALUNOS DAS PRÓPRIAS

PRÁTICAS DE RECEPÇÃO E PRODUÇÃO DE TEXTOS

ATIVIDADES / PRÁTICAS

RELIGIOSAS DOS PAIS E/OU RESPONSÁVEIS

9-

Seu pai lê e escreve? O quê?

10- Como a escrita aparece

na casa de vocês?

11 – E revista, elas aparecem?

12- O que vocês mais escrevem

em casa?

Sim. Não lembro, coisas do serviço

dele. Silêncio e cabeça baixa!

Livros do colégio... Só de novela. Quem gosta de

comprar é minha mãe

Escrevo bilhetes.

O QUE DIZEM OS ALUNOS DAS

PRÁTICAS DE RECEPÇÃO E

PRODUÇÃO DE TEXTOS DOS SEUS

PAIS E/OU RESPONSÁVEIS

O QUE DIZEM OS ALUNOS DAS PRÁTICAS DE

RECEPÇÃO E PRODUÇÃO DE TEXTOS QUE CIRCULAM

NO CONTEXTO FAMILIAR

137

QUADRO 6.2: SISTEMATIZAÇÃO DAS ENTREVISTAS COM OS ALUNOS

NOME DO ALUNO

MODALIDADE DA

ENTREVISTA

QUESTÕES DAS ENTREVISTAS

1- O que você gosta

de fazer normalmente

para se distrair quando não está

trabalhando, estudando ou brincando?

2- O que você mais gosta de assistir

na TV?

3- Que tipo de desenho?

4- O que as três espiãs mais

fazem e falam para que você goste delas?

5- E os livros, quais

você mais gosta?

6- Os livros que

você lê ficam em sua casa ou só

tem oportunidade de

ler na escola?

7- O que vocês mais escrevem

em casa?

8- Seus pais

freqüentam igreja?

R.

Gravada

Brincar de bola,

jogar na lan house e assistir TV. Eu escrevo no diário

e tenho dois.

Desenho

Três espiãs...

Proteger.

Monteiro Lobato

Eu peço ao meu pai para me levar

na Biblioteca, peço emprestado

e leio aqui.

Escrevo bilhetes.

Só minha mãe,

mas não sei onde.

ATIVIDADES DE LAZER ou

PRÁTICAS DO COTIDIANO

O QUE DIZEM OS ALUNOS DAS PRÓPRIAS PRÁTICAS DE RECEPÇÃO E PRODUÇÃO DE TEXTOS

ATIVIDADES /

PRÁTICAS RELIGIOSAS DOS

PAIS E/OU RESPONSÁVEIS

9-

Seu pai lê e escreve? O quê?

10- Como a escrita aparece

na casa de vocês?

11 – E revista, elas aparecem?

Sim. Não lembro, coisas do serviço dele. Silêncio e cabeça baixa!

Livros do colégio... Só de novela. Quem gosta de

comprar é minha mãe

O QUE DIZEM OS ALUNOS DAS PRÁTICAS DE RECEPÇÃO E

PRODUÇÃO DE TEXTOS DOS SEUS

PAIS E/OU RESPONSÁVEIS

O QUE DIZEM OS ALUNOS DAS PRÁTICAS DE RECEPÇÃO E

PRODUÇÃO DE TEXTOS QUE CIRCULAM NO CONTEXTO FAMILIAR

138

QUADRO 6.3: SISTEMATIZAÇÃO DAS ENTREVISTAS COM OS ALUNOS

NOME DO ALUNO

MODALIDADE DA

ENTREVISTA

QUESTÕES DAS ENTREVISTAS

1- O que você gosta

de fazer normalmente

para se distrair quando não está

trabalhando, estudando ou brincando?

2- Seus pais

freqüentam Igreja?

3- Seu pai s

freqüentam igreja?

4-

Seu pai lê e escreve? O quê?

5- Quais são as formas que a

escrita aparece na casa de

vocês?

6- O que você gosta de

escrever?

7- No estudo, o que você mais gosta de fazer?

8-Na escola, para quem você escreve?

M.

Gravada

Jogar na lan-

house assistir TV. Assistir desenho e usar o computador

Só meu pai vai à

Universal

Minha mãe,as

vezes

Sim. Não lembro, coisas do serviço dele. Silêncio e cabeça baixa!

Através dos pedidos e das cartas para a

Igreja.

Não gosto de escrever, pois a

minha letra é feia

História contada Para a professora, para minha mãe e

eu.

ATIVIDADES DE

LAZER ou PRÁTICAS DO

COTIDIANO

ATIVIDADES / PRÁTICAS RELIGIOSAS DOS PAIS E/OU

RESPONSÁVEIS

O QUE DIZEM OS

ALUNOS DAS PRÁTICAS DE RECEPÇÃO E

PRODUÇÃO DE TEXTOS DOS SEUS

PAIS E/OU RESPONSÁVEIS

O QUE DIZEM OS ALUNOS DAS PRÓPRIAS PRÁTICAS DE RECEPÇÃO E

PRODUÇÃO DE TEXTOS

09- E em sua casa, de que forma vocês escrevem?

10-Por que você usa a tecnologia para escrever?

Pelos torpedos que eu mando no celular e pelo computador mando algumas

mensagens na lan house ou em casa.

Para me informar, saber mais.

O QUE DIZEM OS ALUNOS DAS PRÁTICAS DE RECEPÇÃO E PRODUÇÃO DE TEXTOS QUE CIRCULAM

NO CONTEXTO FAMILIAR

139

ANEXO 14 Quadro 7

SISTEMATIZAÇÃO DE ENTREVISTAS COM PAIS OU RESPONSÁVEIS

NO

ME

DO

S

AL

UN

OS

NO

ME

DO

S

RE

SP

ON

VE

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É A

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S

AT

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DE

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OD

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E

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CE

ÃO

DE

TE

XT

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AB

AL

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FR

EQ

ÜE

NT

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OU

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DE

TE

XT

OS

LID

OS

E/O

U

PR

OD

UZ

IDO

S

INF

OR

MA

LM

EN

TE

01- A.

Mãe: A.L

Pai: N.L

É normal

Não, só a mãe que é

diaconisa na

Igreja

Sim.

Batista Nova

esperança

De casa para a Igreja e assistir

TV

Importante é né? Mas eu

saio direto

(mãe) e não tem

nem tempo

de ver a filha

direito.

Na

leitura da Bíblia e a filha

que ajuda a

professora da

Igreja na classe

de crianças

Não,

pois é a dona da loja que faz tudo

o que precisa

lá.

Mãe: Até

a 5ª série

Pai: Até

a 5ª série

Os

desenhos e os

demais que

passam no

domingo

A TV

ajuda no lazer.

Só a

Igreja.

Não. Os livros e papéis

que tinham

eu joguei fora.

Sim.

Lemos a Bíblia e fazemos pedidos

Poesia

da minha filha,

algumas frases, cartas

02- J.

Mãe:

J.P.Q.

Pai: -----------

De vez

em quando

tem assalto,

uma cliente minha

foi assaltad

a em pleno dia!

Sou

contadora da

Igreja

Sim.

Batista

Piscina que tem

aqui, assiste

TV, passeios da Igreja e outros

Eu

costumo ensinar

os deveres e passar contas

para ela. Além disso,

costumamos ler a Bíblia.

Ela

gosta de ficar no quarto e escrever coisas

dela e eu no meu trabalho com os

números.

Nos

documentos que eu faço do meu trabalho em casa.

Eu tenho ensino

superior em

contabilidade

Pouco paro para

assistir, pois eu

não tenho

tempo.

Se não fosse o

computador eu

não realizaria meu

trabalho, pois eu trabalho em casa mesmo.

Igreja,

passeios e

viagens que

realizo de vez

em quando

Não

Sim. A Bíblia e

na prestaçã

o de contas

da Igreja.

Agenda telefônic

a, bilhetes, pedidos

da Igreja,

recados.

03- R.

Mãe:

L.L.G.

Pai: R.B.S.

É normal

Não.

Nas

vezes sim, mas a maior

parte não.

Os

meninos brincam de bola, vãopara

a lan house,

brincam de

vídeo- game, e vão para o campo

da

Não

respondeu

Não

gosto de escrever. Gosto mais de ler os

livros do colégio

e as atividades dos filhos.

Eu sou dona de casa e

não escrevo.

Meu esposo

é cortador de carne e faz as contas

Mãe: Até

a 8ª série

Pai: Até

a 2ª série

Novela e

jornal

Não

respondeu

Não.

Não.

Ø

Agenda telefônic

a e os deveres

da escola.

140

escola jogar bola

aqui ao lado. Além disso,

assistem TV,

ouvem program

a de rádio,

música e vão para a casa

de minha mãe.

04- M.

Mãe:

A. O. L

Pai: M.B. dos

S.

É

maravilhosa, é

perto do CEC

Não. Na Igreja meu

esposo só

freqüenta os

cultos religioso

s

Mãe: Não

Pai:

Igreja Universl

a

Tendo

tempo, a gente

vai para a priai

de Bom Jesus. Para mim

(mãe) é

só trabalho,

pois a gente

tem um quiosque. Sobre outras

atividades

minha filha,

não tem condiçõ

es!

No

colégio eu ( mãe) estou

sempre presente

. E através

do

telefone , caso

aconteça

alguma coisa.

Aqui todo

mundo estuda. O único que não estuda é seu M. (Pai)

Olha

bem, eu ainda não

coloquei uma

placa, não

divulguei a

entrega

de marmita que eu faço,

porque a minha casa

estava em

reforma, não

acabei a reforma

dela ainda.

Os pedidos

da marmita são por telefone

e eu memoriz

Mãe:

Porque eu tenho arrependimento de não

ter estudos, porém

eu volto

atrás, porque

eu trabalhei

desde os 8

anos de idade... Ainda

me alfabetiz

ei, estudei

pelo menos até a 4ª série, a daquele tempo!

Mas tudo com

muita luta e

Mãe:

Jornal Nacional

, que não é

sempre, eu não tenho

paciência, prefiro

estar no computa

dor

Pai: Assiste muito a

televisão.

Com o

computador

melhorou muito... eu uso

pra conversa

r com

as pessoas. Eu tenho

uma prima lá

em Blumena

u e já mora a

30 anos. Então eu uso mais

para conversar. Tem os

meus sobrinho

s que estão em Salvador.

Então você

sabe que a gente tem que

ir lendo e escreven

Mãe: Eu...

uma vez ou outra eu vou

ao Chique

Bar, Papo

Dez, 14

BIZ, Karaoqu

ê,a pesar de

não cantar,

mas gosto de

dar risada e

me divertir.

Pai: Vai para a Igreja.

Não.

Mas eu leio o

jornal da Igreja

Universal. Eu até

tinha assinatu

ra da

revista, mas eu

cancelei, porque

só vinha propaga

nda. Tinha

mais ou menos

um ano. Foi mais

ou menos

em 2006. Era a

revista Marie Clair

Meu

marido não

enxerga 30% da

visão. Aí eu leio a

Bíblia para ele

para

Ele e ele escuta.

Os pedidos

da Igreja, sou eu

que escrevo para ele também.

Recados

que meus filhos

deixam. Anotaçõ

es de números

de telefone. Alguns estudos bíblicos

e pensamentos.

141

o a

maioria. muito

esforço, mas

chegou uma

hora e eu tava

cansada, eu

disse: -olhe, pare: uma

coisa ou outra.

Pai: A

mesma coisa

do né? As vezes

meu marido acha

ruim e diz: - Ah!, porque a sua vida

é computa

dor ( SILÊNCI

O) Depois

ele volta e diz: -

realmente hoje

tudo é o computador. Ele

não serve só pra mim. Se tem

uma pesquisa

dos filhos, o professo

r pede um livro que não tem, aí

você vai e em um instante consegue. Isso tudo

facilita. Ah! Eu

também vendo

minhas marmitas

pelo computa

dor!

142

REFERÊNCIAS

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