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Escolhi 10 poemas e poesias diferenciadas para trabalhar e enaltecer a cultura negra, o negro e o seu espaço. Por favor não se limitem aos poemas que ofereci, pois todos possuem ótimas obras que devem ser apreciadas. O dia da consciência negra é sem dúvidas uma data para refletir. Todo professor, profissional da educação ou aluno deve refletir o fato de que por séculos os negros foram escravizados e tiveram de viver sob constante privações que vão muito além da liberdade. Até que chegamos ao dia 13 de maio de 1888, o dia em que a princesa Isabel aboliu a escravidão no Brasil através da Lei Áurea. Essa lei decretou que todos os escravos fossem libertados em todo o país e, foi o primeiro passo na luta dos negros pela igualdade social. É notório que a abolição não resolveu todos os problemas existentes na época, mas cabe ao professor mostrar ao aluno que esse foi um passo importante na luta pela igualdade, uma luta que continua até os dias de hoje. Em 2011, a presidente Dilma Rousseff através da Casa Civil instituiu via decreto o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra. Historicamente falando faz pouquíssimo tempo e é de certo modo um marco que você profissional da educação ou aluno é testemunha dessas mudanças. Com base nisso e na reflexão sobre essa data tão importante, seguem 10 poesias sobre os negros, sua vida, cultura e seu devido espaço na sociedade. Os cinco primeiros são de autoria nacional, a outra metade é de autoria estrangeira. Negros palmares – poema de Ceiça Moraes

Negros palmares – poema de Ceiça Moraes

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Page 1: Negros palmares – poema de Ceiça Moraes

Escolhi 10 poemas e poesias diferenciadas para trabalhar e enaltecer a cultura negra, onegro e o seu espaço. Por favor não se limitem aos poemas que ofereci, pois todos possuemótimas obras que devem ser apreciadas.

O dia da consciência negra é sem dúvidas uma data para refletir. Todo professor,profissional da educação ou aluno deve refletir o fato de que por séculos os negros foramescravizados e tiveram de viver sob constante privações que vão muito além da liberdade.Até que chegamos ao dia 13 de maio de 1888, o dia em que a princesa Isabel aboliu aescravidão no Brasil através da Lei Áurea. Essa lei decretou que todos os escravos fossemlibertados em todo o país e, foi o primeiro passo na luta dos negros pela igualdade social. Énotório que a abolição não resolveu todos os problemas existentes na época, mas cabe aoprofessor mostrar ao aluno que esse foi um passo importante na luta pela igualdade, umaluta que continua até os dias de hoje.

Em 2011, a presidente Dilma Rousseff através da Casa Civil instituiu via decreto o DiaNacional de Zumbi e da Consciência Negra. Historicamente falando faz pouquíssimo tempoe é de certo modo um marco que você profissional da educação ou aluno é testemunhadessas mudanças. Com base nisso e na reflexão sobre essa data tão importante, seguem 10poesias sobre os negros, sua vida, cultura e seu devido espaço na sociedade. Os cincoprimeiros são de autoria nacional, a outra metade é de autoria estrangeira.

Negros palmares – poema de Ceiça Moraes

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O primeiro poema escolhido é de Ceiça Moraes, professora e poetisa brasileira que faz umbelo trabalho no âmbito de valorização da cultura afro-brasileira, do negro, de seu povo, suacultura e, sem dúvidas, é capaz de inspirar o aluno.

Negros PalmaresTer alma negra, ô meu irmão É ter malícia, muito molejo E a capoeira no coração. Amor àarte Arte é gingar E o berimbau, saber tocar. Fiz reverência ao mestre Nagô Fiz reverênciaao mestre Zumbi Eu tenho o toque da capoeira Gritando alto no coração. Tombar aqui,tombar acolá Levanta, negro! Não caia não! Em Roda- Grande se batizar São Bento Grande,

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te ajudar. Capoeirista! Não sabe não? É ter o toque no coração. Capoeiragem, não évadiagem É reviver sua negritude Reviver “o Rei dos Palmares” Ter “malandragem” sim!Pra se defender Se for possível, não atacar “Deixa pra lá” Se não tem jeito… Tem que atacarDá “uma benção” pra não esquecer Que foi uma defesa de escravo humilhado Quando feitorse dizia “endeusado”! Reviver negros palmares É reviver a Redenção Saber “o Toque”…saber jogar Treinar o “AÚ” pra se libertar “Pulo-do-gato” … ou “bananeira” “S Dobrado”…Meu Santo Amaro! “Pulo Mortal”! Iê, não caia não! “Ponte-pra-frente”… “Ponte-pra-trás”“Ponte-voltando” Isso é demais! Reviver a escravidão é reviver a redenção Quem meensinou foi o Mestre Zumbi Eu tenho o toque no coração!

Eu tenho o toque no coração!

Negro Soul e Orgulho Negro – Poemas deLuiz de Jesus

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Contemporâneo e com um estilo peculiar, sem muitas repetições ou excesso de floreiosfrasais, escolhi dois poemas de Luiz de Jesus, já que ele consegue se comunicar e se fazerentender com tranquilidade pelo aluno, trazendo sempre um debate em tom atual.

Negro SoulSou um negro no tronco da demagogia Levando chibatadas de hipocrisia Preso na senzalada indiferença E transportado

no navio da ofensa.

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Orgulho NegroOrgulho negro, não é supremacia Nem sinônimo, de raça superior É ter orgulho desta nobreetnia,

Que aboliu todo o rancor…

Olorum Ekê – poema de Solano Trindade

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Page 7: Negros palmares – poema de Ceiça Moraes

Solano Trindade é basicamente um embaixador da cultura afro-brasileira. Seu currículoconta com poesia, folclore, pintura, teatro e cinema, e sua linguagem está repleta demusicalidade e oralidade. Em geral, os alunos se encantam ao ter que declamar seus textos,que trazem consigo muito do vocabulário próprio do povo africano.

Olorum EkêOlorum Ekê – disse. Olorum Ekê Eu sou poeta do povo Olorum EkêA minha bandeira É decor de sangue Olorum Ekê Olorum Ekê Da cor da revolução

Olorum Ekê

Meus avós foram escravos Olorum Ekê Olorum Ekê Eu ainda escravo sou Olorum EkêOlorum Ekê Os meus filhos não serão Olorum Ekê

Olorum Ekê

Nota: os dizeres “Olorum Ekê“ são uma expressão Iorubá que significa “povo do santoguerreiro”.

Se tu tens consciência – poema de ValterAlves da Silva

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Mais um brasileiro que escreve sobre a cultura afro-brasileira e luta com as palavras contrao preconceito. Como racismo, discriminação e preconceito ainda são realidades em nossopaís, cabe ao professor levar esse tema para dialogar com seus alunos, captar suas opiniõese conscientiza-los da maneira mais bela que é poesia e a arte.

Se tu tens consciênciaSe tu tens consciência, respeite tua própria natureza. Assuma tua beleza que muitosdesejariam ter. Se tu tens consciência, respeite o negro, Afrodescendente e toda gente Quevive acorrentado pelo preconceito da cor. Mas se tu tens consciência, Assuma suaidentidade E veja seu valor. Já que negro quando pinta, Tem três vezes trinta. Assim diziameu avô. Viver muito pra ti é mais

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Dádiva do nosso Criador.

Eu, Também e Negro – Poemas de LangstonHughes

Meu predileto, esse estadunidense é reconhecido por ter um repertório extenso e ter sidoum grande líder do movimento cultural de valorização da cultura afro-americana em seupaís. Os casos são peculiarmente interessantes para discussão entre aluno e professor, pois,lá o preconceito contava com dois polos que incluíam um extremo racismo que incorporavasegregação racial. Negros, por exemplo, nasciam em hospitais separados, estudavam em

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escolas para negros e nos ônibus sempre se sentavam nos fundos. Por isso os itens 6 e 7 sãoobras de Langston

Eu, TambémEu, também, canto a América Eu sou o irmão mais preto. Quando chegam as visitas, Memandam comer na cozinha. Mas eu rio E como bem, E vou ficando mais forte.Amanhã,Quando chegarem as visitas Me sentarei à mesa. Ninguém ousará, então, me dizer,

“Vá comer na cozinha”.

Além do mais, Eles verão quão bonito eu sou

E se envergonharão –

Eu, também, sou a América.

NegroSou Negro: Negro como a noite é negra, Negro como as profundezas da minha África.Fuiescravo: Cesar me disse para manter os degraus da sua porta limpos.

Eu engraxei as botas de Washington.

Fui operário: Sob minhas mãos ergueram-se as pirâmides.

Eu fiz a argamassa do Woolworth Building.

Fui cantor: Durante todo o caminho da África até a Geórgia Carreguei minhas canções dedor.

Criei o ragtime.

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Fui vítima: Os belgas cortaram minhas mãos no Congo Estão me linchando agora noMississipi. Sou Negro Negro como a noite é negra

Negro como as profundezas da minha África.

Um dia – Poema de Emmelie Prophéte

Essa haitiana que inspira e contagia tem grande representatividade em seu país e é motivode orgulho por lá, mesmo em meio a tantas catástrofes vividas no país. Vale à penaapresenta-la aos alunos.

Um diaUm dia, lembra-te desta cidade despedaçada entre o ruído a estupidez e a dor. Criamos ainfidelidade, o azul das calçadas de um outro continente. A loucura tornou-se útil. Nos

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esforçamos para desenhar as portas de saídaDesde teus olhos

o vazio se reinventará.

Ouvi as orações do nosso sexo sufocada pelo peso das palavras o buraco no vosso jeans azulé a única janela que leva à esperança. Nós sonhamos todos com as calçadas. Os gritos denossa nudez são inúteis

Como vossos silêncios.

Do povo buscamos a força – Poema deAgostinho Neto

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Um homem que lutou para libertar o seu país, a Angola e demonstra em versos asvicissitudes dessa batalha. Para o professor é interessante trabalhar com obras de pessoasque lutaram pela liberdade e saíram vitoriosos, pois isso mostra ao aluno que buscar adignidade humana não é uma utopia, é uma necessidade. Agostinho Neto tornou-se oprimeiro presidente de seu país.

Do povo buscamos a forçaNão basta que seja pura e justa a nossa causa. É necessário que a pureza e a justiça existamdentro de nós.Dos que vieram e conosco se aliaram muitos traziam sombras no olhar

intenções estranhas.

Para alguns deles a razão da luta era só ódio: um ódio antigo centrado e surdo

como uma lança.

Para alguns outros era uma bolsa bolsa vazia (queriam enchê-la) queriam enchê-la comcoisas sujas

inconfessáveis.

Outros viemos. Lutar para nós é ver aquilo que o Povo quer realizado. É ter a terra ondenascemos. É sermos livres pra trabalhar. É ter pra nós o que criamos lutar pra nós é umdestino – é uma ponte entre a descrença e a certeza do mundo novo. Na mesma barca nosencontramos.

Todos concordam – vamos lutar.

Lutar pra quê? Pra dar vazão ao ódio antigo? ou pra ganharmos a liberdade

e ter pra nós o que criamos?

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Na mesma barca nos encontramos. Quem há de ser o timoneiro? Ah, as tramas que elesteceram!

Ah, as lutas que aí travamos!

Mantivemo-nos firmes: no povo buscaremos a força

e a razão.

Inexoravelmente como uma onda que ninguém trava vencemos.

O Povo tomou a direção da barca.

Mas a lição lá está, foi aprendida: Não basta que seja pura e justa a nossa causa. Énecessário que a pureza e a justiça

existam dentro de nós.

Me gritaram negra – poema de VictoriaSanta Cruz

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Esse último poema que escolhi, quando lido, exige uma atenção maior por parte do aluno oumesmo do professor, já que as nuances do eu-lírico se misturam e tem muitas emoçõesespalhadas, o que permite vários trabalhos em sala… Sendo assim, sugiro também o vídeodo youtube, que leva grande impacto ao espectador e permite uma discussão maisacelerada.

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Me gritaram negraTinha sete anos apenas, apenas sete anos, Que sete anos! Não chegava nem a cinco! Derepente umas vozes na rua me gritaram Negra! Negra! Negra! Negra! Negra! Negra!Negra! Negra! “Por acaso sou negra?” – me disse SIM! “Que coisa é ser negra?” Negra! Eeu não sabia a triste verdade que aquilo escondia. Negra! E me senti negra, Negra! Comoeles diziam Negra! E retrocedi Negra! Como eles queriam Negra! E odiei meus cabelos emeus lábios grossos e mirei apenada minha carne tostada E retrocedi Negra! E retrocedi…Negra! Negra! Negra! Negra! Negra! Negra! Negra! Negra! Negra! Negra! Negra! Negra!Negra! Negra! Negra! E passava o tempo, e sempre amargurada Continuava levando nasminhas costas minha pesada carga E como pesava!… Alisei o cabelo, Passei pó na cara, eentre minhas entranhas sempre ressoava a mesma palavra Negra! Negra! Negra! Negra!Negra! Negra! Negra! Até que um dia que retrocedia, retrocedia e que ia cair Negra!Negra! Negra! Negra! Negra! Negra! Negra! Negra! Negra! Negra! Negra! Negra! Negra!Negra! Negra! E daí? E daí? Negra! Sim Negra! Sou Negra! Negra! Negra! Negra souNegra! Sim Negra! Sou Negra! Negra! Negra! Negra sou De hoje em diante não queroalisar meu cabelo Não quero E vou rir daqueles, que por evitar – segundo eles – que porevitar-nos algum dissabor Chamam aos negros de gente de cor E de que cor! Negra! E comosoa lindo! Negro! E que ritmo tem! Negro! Negro! Negro! Negro! Negro! Negro! Negro!Negro! Negro! Negro! Negro! Negro! Negro! Negro! Negro! Afinal Afinal compreendi AfinalJá não retrocedo Afinal E avanço segura Afinal Avanço e espero Afinal E bendigo aos céusporque quis Deus que negro azeviche fosse minha cor E já compreendi Afinal, Já tenho achave! Negro! Negro! Negro! Negro! Negro! Negro! Negro! Negro! Negro! Negro! Negro!Negro! Negro, Negro

Negra sou!

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Obrigado por ler até aqui!Na educação se faz necessário à análise e percepção dos fatos. A arte é capaz de transmitira realidade de forma muito simples. O professor tem o poder de apresentar os fatos paraseus alunos, dando-lhes a oportunidade de aprender mais sobre sua própria história eperceber o mundo de maneira diferente.

Essa seleção revela a todos nós os sentimentos de um povo que por séculos foi escravizado etem sido vítima de racismo e intolerância. Mas, ao longo do tempo estão havendo conquistasque alimentam ainda mais o desejo pela igualdade.