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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE MESTRADO EM LETRAS JÚLIA PACHECO RINALDI HARRY POTTER ENTRE O ESPELHO LITERÁRIO E O CINEMATOGRÁFICO São Paulo 2017

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

MESTRADO EM LETRAS

JÚLIA PACHECO RINALDI

HARRY POTTER ENTRE O ESPELHO LITERÁRIO E O CINEMATOGRÁFICO

São Paulo

2017

2

JÚLIA PACHECO RINALDI

HARRY POTTER ENTRE O ESPELHO LITERÁRIO E O CINEMATOGRÁFICO

São Paulo

2017

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

MESTRADO EM LETRAS

JÚLIA PACHECO RINALDI

HARRY POTTER ENTRE O ESPELHO LITERÁRIO E O CINEMATOGRÁFICO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Presbiteriana Mackenzie, para obtenção de título de Mestre em Letras.

Orientador: Prof. Dr. Alexandre Huady Torres Guimarães

São Paulo

2017

4

R578h Rinaldi, Júlia Pacheco. Harry Potter entre o espelho literário e o cinematográfico /

Júlia Pacheco Rinaldi – São Paulo, 2017. 159 f. : il. ; 30 cm.

Dissertação (Mestrado em Letras) - Universidade

Presbiteriana Mackenzie, 2017. Referência bibliográfica: p. 142-147.

1. Harry Potter. 2. Tradução intersemiótica. 3.

Literatura infanto-juvenil. 4. Cinema. Título.

CDD 809.89282

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JÚLIA PACHECO RINALDI

HARRY POTTER ENTRE O ESPELHO LITERÁRIO E O CINEMATOGRÁFICO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Presbiteriana Mackenzie, para obtenção de título de Mestre em Letras.

Banca Examinadora

___________________________________________

Profa. Dra. Regina Helena Pires de Brito

Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM)

___________________________________________

Prof. Dr. Marlon Luiz Clasen Muraro

Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM)

___________________________________________

Profa. Dra. Tatiana Cabral Couto

Centro Universitário SENAC

6

Para uma mente bem estruturada, a morte é apenas uma

aventura seguinte... disse J. K. Rowling, a autora que nos

inspirou a realizar este trabalho.

Professor Alê (porque “senhor”, nunca!) foi se aventurar,

deixando seus monstrinhos (orientandos) órfãos, mas com

parte de sua sabedoria para espalhar e para fazer do

mundo um lugar melhor. Que seus novos mundos mágicos

sejam repletos de montanhas-russas e #traçosdebeleza...

7

JÚLIA PACHECO RINALDI

HARRY POTTER ENTRE O ESPELHO LITERÁRIO E O CINEMATOGRÁFICO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Presbiteriana Mackenzie, para obtenção de título de Mestre em Letras.

Banca Examinadora

___________________________________________

Prof.Dr. Alexandre Huady Torres Guimarães- Orientador

Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM)

___________________________________________

Prof. Dr. Marlon Luiz Clasen Muraro

Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM)

___________________________________________

Profa. Dra. Tatiana Cabral Couto

Centro Universitário SENAC

8

Ao Lucca, que possa se aventurar em muitos mundos

mágicos.

9

AGRADECIMENTOS

No filme Harry Potter e a Ordem da Fênix, após o protagonista enfrentar seu maior

inimigo, ainda restam medos para derrotá-lo futuramente. Apesar disso, ele reflete:

“Apesar de termos uma batalha pela frente, temos algo que Voldemort não tem: algo

pelo qual vale a pena lutar.”, referindo-se à família e aos amigos. A minha luta seria

por todos os que me despertam a gratidão.

Aos meus pais, Priscila e Celso, por me apoiarem e fornecerem tudo o que eu

preciso. Vocês não medem esforços para me ver feliz e eu espero algum dia poder

retribuí-los. Queria que vocês fossem eternos...

Ao Duds, por todo carinho, apoio e incentivo no meio acadêmico, profissional e

pessoal. Que a força esteja sempre com você (e conosco)...

À minha irmã, Bárbara, e meu cunhado, Alexandre, que tantas vezes imergiram-se

junto a mim em vários mundos mágicos e que também me deram um dos melhores

presentes: a oportunidade de reviver a infância com o Lucca...

À minha vó Lúcia, por todos os almoços e tardes gostosas que passamos nestes

últimos anos e que me fazem tão bem...

À minha vó Zezé, que hoje me acompanha de outro lugar, mas que sempre estará

comigo onde eu for...

Tatah e Kat, vocês são presentes lindos que o Mackenzie me deu, me apoiaram de

forma surpreendente nesse percurso. Obrigada!

À Jubs e Carol, companheiras que me ajudam a alcançar todas as metas...

À Tati, Regiane, Sarah e Jéssica, pelo apoio desde o final da graduação...

À Mari, Tales, Fê e todo o pessoal do mestrado, pelas incansáveis horas de

compartilhamento de angústias, medos, vontades e conquistas...

Aos membros de minha banca, professora Regina Helena Pires de Brito, professor

Marlon Luiz Clasen Muraro e professora Tatiana Cabral Couto pela delicadeza em

transmitir seus conselhos para um trabalho mais satisfatório.

Por fim, ao meu orientador, professor Alexandre Huady, por ter aceitado,

novamente, esta parceria que percorre mundos mágicos.

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O espírito sem limites é o maior tesouro do homem.

J. K. Rowling

11

Resumo

O presente trabalho, centrado na área de pesquisa Língua, literatura e sociedade:

discurso na comunicação, discurso religioso, discurso pedagógico, discurso político;

tem como objeto de estudo a obra literária e a obra cinematográfica Harry Potter e a

Ordem da Fênix, quinto volume da narrativa inicializada pela autora inglesa J.K.

Rowling a partir da década de 1990 e que foi adaptada para o cinema a partir dos

anos 2000. Para a realização da pesquisa foi selecionado um fragmento da obra

literária, presente especificadamente no quinto volume da série, intitulado Harry

Potter e a Ordem da Fênix, em que o jovem Harry tem que duelar contra o seu

principal inimigo dentro de seu próprio corpo. Esta passagem possibilita

compreender que a personagem passa por uma crise de identidade: Harry Potter

recebeu quando bebê alguns poderes mágicos de seu inimigo quando este tentou

matá-lo, e ao passar a conviver repentinamente com uma mistura de sentimentos

bons (amor, amizade, coragem) e ruins (raiva, medo, insegurança) que oscilam

rapidamente, acredita que Voldemort exerce de algum modo um controle sobre si.

Harry Potter acredita que está pendendo para o mal, assim como aconteceu com

seu inimigo, mas sabe que deve lutar para derrotar Voldemort e os Comensais da

Morte e reestabelecer a paz no mundo bruxo. Desta forma, abordar-se-á também

este momento no filme (intitulado pelo mesmo nome) buscando entender como a

essência do fragmento literário foi transposta para linguagem audiovisual, utilizando,

como base teórica principal, a Tradução Intersemiótica de Julio Plaza.

Palavras-chave: Harry Potter, Tradução Intersemiótica, Literatura infanto-juvenil,

cinema.

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Abstract

This development work focused on the research areas Language, Literature and

Society: speech communication, religious discourse, pedagogical discourse, political

discourse; has as its object of study the literary and cinematographic work Harry

Potter and the Order of the Phoenix, the fifth volume of the narrative initialized by the

British author J. K. Rowling from the 1990s and adapted for the cinema from the

2000s. To the research, it was selected a piece from the literary work, this specifically

in the fifth volume of the series, entitled Harry Potter and the Order of the Phoenix,

where the young Harry Potter has fight against your main enemy inside your own

body. This passage makes it possible to understand that the character goes through

an identity crisis: Harry Potter received when baby some magical powers from his

enemy when he tried to kill him, and he suddenly lives with a mixture of good feelings

(love, friendship, courage) and bad feelings (anger, fear, insecurity) that oscillates

fast, and he believes that Voldemort, somehow, exerts control over them. Harry

Potter believes he is leaning toward evil, as well as with your enemy, but knows he

must fight to defeat Voldemort and the Death Eaters and restore peace in the

wizarding world. In this way, it will be addressed also this point in the film (entitled by

the same name) trying to understand how the essence of the literary fragment was

transposed into the visual language, using as the main theoretical basis, the

translation Intersemiotic by Julio Plaza.

Keywords: Harry Potter, Intersemiotic translation, children's literature, cinema.

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SUMÁRIO

O menino que sobreviveu (Introdução) 14

1. EXPRESSO DE HOGWARTS 21

1.1 Harry Potter no mercado literário Infanto-juvenil 22

1.2 Harry Potter no mercado literário BestSeller 33

1.3 Capas da Ordem da Fênix 41

1.4 A saga literária de Harry Potter 49

2. PENSEIRA 60

2.1 O feitiço do cinema 61

2.2 Harry Potter no mercado cinematográfico 73

2.3 A Ordem da Fênix no mercado cinematográfico 84

2.4 Pôsteres da Ordem da Fênix 86

3. TRANSFIGURAÇÃO 93

3.1 A magia 94

3.2 Um espelho literário no Largo Grimmauld, 12 106

3.3 Um espelho audiovisual no Largo Grimmauld, 12 109

3.4 Dentro do reflexo literário 118

3.5 Dentro do reflexo audiovisual 123

Lumus (Considerações Finais) 132

Chapéu Seletor (Referências Bibliográficas) 141

Mapa do Maroto (Glossário) 148

Apêndice 153

14

O MENINO QUE SOBREVIVEU - Introdução

[...] Sua mãozinha agarrou a carta ao lado mas ele continuou a dormir, sem saber que era especial, sem saber que era famoso, sem saber que iria acordar dentro de poucas horas com o grito da Sra. Dursley ao abrir a porta da frente para pôr as garrafas de leite do lado de fora, nem que passaria as próximas semanas levando cutucadas e beliscões do primo Duda... ele não podia saber que, neste mesmo instante, havia pessoas se reunindo em segredo em todo o país que erguiam os copos e diziam com vozes abafadas: - A Harry Potter: o menino que sobreviveu! (ROWLING, 1997, p. 20)

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O Menino Que Sobreviveu

Joanne Kathleen Rowling, ou J. K. Rowling, conforme assina suas obras; publicou o

primeiro livro da série, Harry Potter e a Pedra Filosofal, em 1997. Tentou publicar a

história do menino bruxo em doze editoras que recusaram o primeiro livro por

afirmarem que, se publicado, seria um fracasso de vendas. Quando a editora

Bloomsbury aceitou, lançou a primeira edição que foi considerada bastante pequena

para os padrões de literatura vendida na Inglaterra, cerca de 500 exemplares. O

livro popularizou-se e tornou-se um dos mais vendidos na época, o que contribuiu

para que o sucesso da saga continuasse com o lançamento dos volumes seguintes

em 1998, 1999 e no ano 2000. Mesmo depois do anúncio da adaptação para o

cinema, a série literária foi continuada, tendo lançamento dos volumes seguintes em

2003, 2005 e 2007.

Em 1999, Rowling vendeu os direitos para filmar o primeiro livro da série para a

Warner Bros. Houve especulações sobre o formato que a série deveria ter ao ser

adaptada para o cinema. A princípio seria em animação, porém em decisão conjunta

com a escritora e produtores, escolheram um filme com atores e atrizes reais,

apesar dos desafios que foram colocados no papel em vista aos diversos cenários,

espaços e criaturas que deveriam ser apresentadas com a ajuda de efeitos

especiais. O diretor Chris Columbus foi o escolhido para levar a história de Harry

Potter aos cinemas, e dirigiu os dois primeiros longas, que foram lançados,

respectivamente, em 2001 e 2002.

Ainda em 2001, J. K. Rowling publicou outros dois livros que não fazem parte da

sequencia da série, mas que são pertencentes ao mesmo universo relatado de Harry

Potter. Os livros, Quadribol Através dos Séculos e Animais Fantásticos e Onde

Habitam foram escritos em formato de livro didático: o primeiro traça uma leitura

linear da história do Quadribol, esporte praticado pelos bruxos, e o segundo é

montado como uma enciclopédia sobre os animais e criaturas mágicas desenvolvido

por um bruxo estudioso.

Em julho de 2007 o sétimo e último livro da série foi publicado. Este, quando

adaptado para o cinema, foi dividido em duas partes, lançadas respectivamente em

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2010 e 2011. Com o lançamento do último volume da saga, J. K. Rowling publicou

um livro de contos chamado Os Contos de Beedle, o Bardo, mencionado em Harry

Potter e as Relíquias da Morte como um livro destinado às crianças do universo

bruxo.

No ano 2008, a Warner Bros. Entertainment Inc. e a Universal Orlando Resort

anunciaram em parceria a construção de um mundo dentro do parque temático

Universal’s Island of Adventure, que formou o chamado The Wizarding World of

Harry Potter – Hogsmeade, o qual foi inaugurado em 2010 e que reproduz o vilarejo

próximo à Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts, também construído no local.

Com a repercussão da inauguração e com o grande número de visitantes que o

parque recebe, em 2014 houve uma ampliação do mundo de Harry Potter no

complexo da Flórida, desta vez no segundo parque, o Universal Studios Flórida, e

que deu origem ao The Wizarding World of Harry Potter – Diagon Alley, uma

reprodução do centro de compras frequentado pelos bruxos no mundo mágico

descrito nos livros e que também aparece nos filmes.

Hoje, além dos dois mundos localizados nos parques da Flórida, há também um

mundo no parque da Universal Studios de Tokyo, no Japão, e em Los Angeles,

Califórnia também nos Estados Unidos. Além disso, os Estúdios Leavesden em

Londres, local de filmagem de grande parte dos filmes de Harry Potter, abriram suas

portas para o público, expondo figurinos, permitindo que os visitantes percorram os

cenários e tenham contato com o que era feito atrás das câmeras.

Em 2009, com a afirmação da autora de que não publicaria mais livros da série,

Rowling lançou o site interativo Pottermore, contendo, inclusive, conteúdos inéditos

sobre personagens da série. Pottermore funcionou, de início, como uma espécie de

jogo online que fazia a reconstrução dos passos do protagonista pelos livros. Tudo

era salvo a partir de uma conta individual. Com esta, o usuário era selecionado para

uma casa de Hogwarts e acumulava pontos no decorrer em que avançava nos

episódios. Hoje Pottermore tem um caráter de plataforma de conteúdos e narrativas

especiais inéditas sobre o mundo mágico criado por Rowling.

Em 2015, a autora anunciou que faria uma oitava história de Harry Potter junto a

dois roteiristas para que esta fosse lançada em forma de peça de teatro em Londres.

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Já em 2016, ainda com muitos rumores sobre o enredo da peça, a autora anunciou

que o roteiro seria publicado em forma de livro para todo o mundo. Em 31 de julho

do mesmo ano, data de aniversário da autora e de seu protagonista fictício, Harry

Potter and the Cursed Child (Harry Potter e a Criança Amaldiçoada, traduzido pela

editora brasileira responsável pela versão em português da série) estreou nos palcos

londrinos e foi publicado.

Os livros de Harry Potter foram traduzidos para 78 idiomas e são distribuídos por

vários países do mundo. J. K. Rowling trabalha atualmente com conteúdos que são

disponibilizados no Pottermore e também na continuação do roteiro para a

adaptação para o cinema do livro publicado em 2001, Animais Fantásticos e Onde

Habitam, que se transformará em cinco filmes ambientados no mesmo mundo

mágico, tendo o primeiro estreado em novembro de 20161.

Do ponto de vista do temático, Harry Potter aborda a questão da jornada do herói:

não há a presença apenas de uma, mas de várias figuras heroicas que podem ser

aproximadas aos heróis clássicos, mas também há uma fusão de temas

contemporâneos, modernos, como a crise de identidade, o amadurecimento, a

passagem para a vida adulta.

O objetivo geral desta pesquisa visa compreender formas distintas de manifestações

(literatura e cinema) de uma mesma narrativa e como esta trata as questões

temáticas principais e sua relação com o público leitor e espectador. Para isso, o

fragmento será apresentado em sua vertente literária (proveniente do livro) e em sua

vertente audiovisual (da cena pertencente ao filme que adapta o momento literário).

A passagem literária e o fragmento cinematográfico que a adapta são um exemplo,

um recorte da manifestação dos temas de Harry Potter e que podem exemplificar

como a saga acompanha o seu público leitor/espectador principal: os jovens em

idade de formação.

A referência principal para a produção desta pesquisa será buscada a partir das

contribuições de Julio Plaza acerca da tradução intersemiótica, uma vez que a

passagem entre as mídias a serem estudadas consiste na tradução entre linguagens

distintas. 1 Uma linha do tempo demarcando os grandes acontecimentos da saga Harry Potter encontra-se em Apêndice neste trabalho acadêmico.

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Releva-se a importância deste trabalho visando à importância cultural que as duas

formas midiáticas exercem no mundo. A literatura e o cinema são duas

manifestações de escrita, dois meios de comunicação que abordam linguagens

diferentes e que sofreram transformações ao longo dos anos, e são muito presentes

tanto como forma de apropriação cultural quanto como forma de entretenimento, não

apenas no contexto brasileiro, mas também no mundial.

Também justifica-se o fato da importância cultural do objeto de estudo, a saga Harry

Potter, em vista a sua popularidade e recorrência até os dias de hoje: mesmo após o

lançamento do último volume da série em 2007 e do último filme em 2011, ainda há

procura pelo tema na internet, redes sociais e também nas livrarias e espectadores

por programas de assinatura online para exibição de filmes e séries (tais como a

rede Netflix). Além disso, a saga possibilita a geração de novos produtos e também

a adaptação para outros meios.

Assim, esta pesquisa poderá contribuir com os estudos destes temas recorrentes,

bem como poderá apontar novas possibilidades de estudo para a série Harry Potter

(uma vez que ainda é tratada com certo preconceito por seu conteúdo literário ser

considerado inadequado por alguns estudiosos – por ser considerado um Best-

seller) e também por apresentar uma vertente nos estudos de processos de

adaptação entre literatura e cinema, ampliando, assim, um novo estudo de

comparação temática, sintática, semântica e interdisciplinar que contribuirá para a

área de Letras em conjunto com as demais áreas.

O primeiro capítulo deste trabalho intitula-se por Expresso de Hogwarts, meio de

transporte da narrativa de J. K. Rowling que leva os estudantes para Hogwarts,

assim sendo, uma porta de entrada para o mundo mágico. Nesta primeira parte

trataremos Harry Potter enquanto obra literária e produto mercadológico e

abordaremos em duas vertentes: literatura infanto-juvenil (em vista o conteúdo e o

estilo que compõem a narrativa) e literatura Best-seller (por atender a regra que visa

à alta produção para atender o consumo massificado). O capítulo trará, também, um

breve estudo das capas dos livros do quinto volume, de onde o fragmento escolhido

foi selecionado em suas edições precursoras americanas, publicada pela editora

Scholastic, cuja mesma capa foi atribuída para a edição brasileira pela editora Rocco

e com arte e ilustrações originais de Mary GrandPré e também de sua edição

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britânica, publicada pela editora Bloomsbur com arte e ilustrações por Jason

Cockcroft. Tal análise das capas foi realizada com a finalidade de identificar pontos

relevantes que pudessem gerar alguma contribuição para a interpretação da parte

final deste trabalho.

O segundo capítulo tem por título a palavra Penseira, objeto mágico presente na

narrativa de Rowling que funciona como um modo de reviver memórias do passado,

mas sem alterá-las. O bruxo que utiliza a Penseira “assiste” a essas lembranças,

como a um filme. Por esse motivo, essa segunda parte do trabalho também tratará

de Harry Potter, porém enquanto obra fílmica e produto cinematográfico. Será

traçado um histórico sobre o percurso do cinema, levando em consideração a

necessidade do homem em fazer registros e colocar imagens em movimento desde

os seus primórdios. Assim como na primeira parte, foi realizado estudo acerca das

capas dos livros de Harry Potter e a Ordem da Fênix, aqui será também apresentado

um breve estudo dos pôsteres do filme que o adapta, com a finalidade de gerar

novas possibilidades de interpretações que pudessem ser acrescentadas ao final do

trabalho.

O terceiro capítulo intitula-se Transfiguração, disciplina escolar da Escola de Magia e

Bruxaria de Hogwarts que ensina a transformar objetos em outros. O conteúdo

dessa terceira parte levanta questões sobre o processo de adaptação entre mídias

distintas, ou seja, o processo de tradução intersemiótica, fundamentadas pelas

contribuições de Julio Plaza, entre o fragmento escolhido e sua adaptação para o

cinema, logo, compreenderemos sobre a transformação de um objeto (literatura) em

outro (cinema). Para isso serão apresentadas duas análises, a do fragmento literário

e a cena fílmica para, então, termos clareza para compreender o que ocorreu nessa

passagem. Observaremos questões de transposição de tensões, da emoção, das

temáticas existentes naquele momento da narrativa e que envolvem a saga Harry

Potter de modo geral.

Esta dissertação encerra-se com um capítulo conclusivo que tem por título Lumus,

feitiço do mundo de Harry Potter que acende uma luz e que, simbolicamente, ilumina

um novo conhecimento com o resultado desse trabalho.

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Ao final deste trabalho encontramos um glossário com uma breve explicação dos

principais nomes e termos utilizados aqui, retirados e utilizados nos livros da série

Harry Potter. Além do glossário, está disponível em Apêndice alguns exemplos de

planos de aulas que aplicam Harry Potter no ensino da educação básica brasileira.

Por fim, depois de todo o percurso de Harry Potter, desde a primeira frase que fora

escrita por Rowling na mesa de um café londrino até os produtos que, até hoje, são

lançados e também das adaptações realizadas, o legado da jornada do menino

bruxo prevalece. Na história de J.K. Rowling, o personagem Harry Potter é

conhecido no círculo bruxo como o menino que sobreviveu, uma vez que escapou

da morte do mais temível entre os bruxos, Voldemort, graças ao amor de sua mãe,

assassinada pelo Lord das Trevas.

No mundo trouxa (termo utilizados pelas personagens bruxas da série que se

referem a pessoas não dotadas de poderes mágicos), Harry Potter também passou

e passa por testes de sobrevivência: desde a recusa das editoras que Rowling

procurou inicialmente para publicar sua obra, a permanência da audiência dos

espectadores com o lançamentos dos novos filmes, a passagem entre uma geração

e outra com o avançar dos anos (pais que leram os livros passaram os mesmos aos

seus filhos e o mesmo vale para os filmes) etc. Devido a estes e outros dados, Harry

Potter é o menino que sobreviveu em vários mundos, mas podemos dizer que

também é o menino que sobrevive.

21

1. EXPRESSO DE HOGWARTS

— Olá, querido. É a primeira vez que vai a Hogwarts? O Rony é novo também.

Ela apontou o último filho, o mais moço. Era alto, magro e desengonçado, com sardas, mãos e pés grandes e um nariz comprido.

— É — respondeu Harry, — A coisa é, a coisa é que não sei como...

— Como chegar à plataforma? — disse ela com bondade, e Harry concordou com a cabeça.

— Não se preocupe. Basta caminhar diretamente para a barreira entre as plataformas nove e dez. Não pare e não tenha medo de bater nela, isto é muito importante. Melhor fazer isso meio correndo se estiver nervoso. Vá, vá antes de Rony.

— Hum... Ok.

E Harry virou o carrinho e encarou a barreira. Parecia muito sólida. Ele começou a andar em direção a ela. As pessoas a caminho das plataformas nove e dez o empurravam. Harry apressou o passo. Ia bater direto no coletor de bilhetes e então ia se complicar, curvando-se para o caminho ele desatou a correr, a barreira estava cada vez mais próxima. Não poderia parar, o carrinho estava descontrolado, ele estava a um passo de distância, fechou os olhos se preparando para a colisão..

E ela não aconteceu... Ele continuou correndo. Abriu os olhos.

Uma locomotiva vermelha a vapor estava parada à plataforma apinhada de gente. Um letreiro no alto informava “Expresso de Hogwarts 11 horas”. Harry olhou para trás e viu um arco de ferro forjado no lugar onde estivera o coletor de bilhetes com os dizeres “Plataforma 9 e ½”. Conseguira. (ROWLING, 2000, p. 84)

22

1.1 Harry Potter no mercado literário Infanto-juvenil

Antes de compreendermos Harry Potter no cenário de literatura infanto-juvenil,

ressaltamos uma breve história do livro e da leitura que vem sido percorrida há

aproximadamente seis mil anos, desde os primórdios da necessidade do homem em

realizar registros com a ajuda de vários instrumentos e diferentes materiais. Esses

registros permitiram a difusão de culturas, experiências etc.

Alguns destes tipos de registros foram feitos em tijolos de barro, pelos sumérios, os

indianos em folhas de palmeiras, os povos maias e astecas utilizavam madeira e

casca de árvores, os romanos tábuas de madeira.

Um dos materiais mais interessantes e que teve origem do antigo Egito, perto do

ano 2200 a.C. é o papiro, considerado uma tecnologia avançada para a época. Era

feito de fibras unidas que formavam uma superfície lisa e resistente, retiradas

próximas ao rio Nilo. Essas fibras poderiam gerar rolos com muitos metros de

comprimento. Do nome em latim deu-se o nome papel para a era atual.

Conforme a tecnologia avançava, novos materiais foram sendo descobertos que

contribuíam para a finalidade de realizar registros. O pergaminho foi um tipo desses

materiais que se assemelhavam às características do papiro. O pergaminho, feito de

pele de carneiro, permitiu que várias páginas pudessem ser juntadas, formando uma

espécie de livro.

Apesar da semelhança do papiro com o papel, o que conhecemos como o nosso

papel atualmente teve origem na China no início do século II. A matéria-prima era

fibra retirada de cascas de algumas árvores misturada com água. Essa mistura, já

semelhante a uma pasta era despejada em um recipiente com uma superfície lisa e

quando seca formava o material semelhante ao papel que temos hoje.

Atualmente o papel ainda é considerado o principal suporte para registros de

culturas, experiências, informações, conhecimento e atividade humana. Dados

históricos revelam que próximo ao ano de 1150 que os árabes foram os primeiros a

instalarem fábricas de papel, após o período de invasão da Península Ibérica. Com a

23

expansão do uso desse material quando o comércio europeu o tornou público,

houve grande interesse em utilizá-lo para divulgação literária.

Gutenberg deu um grande passo ao inventar a tipografia, ou seja, o processo de

impressão de caracteres. Tal descoberta foi o marco da Idade Moderna e partir dali

o mundo não seria mais o mesmo. Segundo registros, o primeiro exemplar impresso

foi feito em 1442 e desde então novos exemplares foram aparecendo, inclusive com

a fundação de uma Werk der Buchei, fábrica de livros a partir de tradução livre do

alemão. Dentre as produções podemos citar a famosa Bíblia de Gutenberg.

Já no século XIX a matéria-prima principal do papel já passava por processos

químicos e passou a ser feito de uma pasta de madeira formando a celulose, o que

tornou seu custo mais barato e mais acessível. Com isso, o acesso a informação

tornou-se mais amplo. O uso do papel predominava e ainda predomina com a

impressão de livros e também de jornais.

Em relação à leitura como hábito e como experiência, o Instituto Pró-livro realizou

em 2011 a 3ª edição da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil2 levantou os dados

acerca do seguinte perfil da população: 52% pertencentes ao sexo feminino e 48%

ao sexo masculino entre os quais 25% com idade entre 05 a 17 anos, 13% entre 18

a 24, 9% entre 25 a 29, 16% entre 30 a 39, 14% entre 40 a 49, 18% entre 50 a 69 e

5% dos 70 anos ou mais. Nesse perfil, 2% pertenciam a Classe A, 23% pertencia a

Classe B, 51% a Classe C e 24% as Classes D e E. A Pesquisa de 2011 traz em

seu levantamento que neste perfil, 58% consideram-se leitores frequentes.

É interessante ressaltar a informação que a pesquisa levantou de que no Brasil o

número de leitores é maior ao número de não-leitores entre os 5 aos 24 anos e de

que a média de livros lidos por todos os entrevistados (considerando livros didáticos,

religiosos, literatura e outros) é de 4,0 livros por habitante/ano.

O “tipo de livro” * mais lido visando o total dos entrevistados é a Bíblia, seguido por

livros didáticos e romances. Livros infantis estão na sexta posição, citado por 22%

do total dos entrevistados e livros juvenis na 13ª posição, citado por 11%. Vale

2 Única pesquisa, em âmbito nacional, que tem por objetivo avaliar o comportamento leitor do brasileiro. É uma contribuição do mercado editorial brasileiro que estimula reflexões, decisões e intervenções para o incentivo da leitura e melhorar os indicadores atuais. Tornou-se referência ao tratar do comportamento leitor no país, desde seu lançamento em 2001 e, desde então deve outras duas edições, em 2007 e em 2011.

24

ressaltar que com base nas porcentagens de leitores nas faixas etárias entre 05 a 10

anos, 66% citaram os livros infantis, 34% entre 11 a 13 anos, 11% entre 14 e 17 e

10% entre 18 e 24 anos. 11% das crianças entre 05 a 10 anos citaram livros juvenis,

28% entre 11 e 13, 26% entre 14 e 17 anos e 7% entre 18 e 24 anos.

A Pesquisa levantou ainda o nome do último livro lido pelos entrevistados até então,

e a saga Harry Potter é citada na 10ª posição entre os livros citados:

Imagem 1: Harry Potter citado como último livro lido na Pesquisa do Instituto Pró-livro de 2011. Disponível em:

http://prolivro.org.br/home/images/relatorios_boletins/3_ed_pesquisa_retratos_leitura_IPL.pdf. Acesso em 01.06.2016.

Entre os últimos livros lidos pelos entrevistados também encontramos outros

grandes BestSellers, como os livros da saga Crepúsculo (Crepúsculo, Lua Nova,

Eclipse e Amanhecer), A Cabana, A Menina que Roubava Livros, Marley & Eu.

A pesquisa Retratos da Leitura no Brasil levantou ainda de seus entrevistados qual

foi o livro mais marcante de suas vidas, conforme consta a tabela abaixo. A saga

25

Harry Potter é citada em 8º lugar como livro mais marcante dentre um total de 844

livros citados na pesquisa:

Imagem 2: Harry Potter como livro mais marcante entre os entrevistados na Pesquisa do Instituto Pró-livro de 2011. Disponível em:

http://prolivro.org.br/home/images/relatorios_boletins/3_ed_pesquisa_retratos_leitura_IPL.pdf. Acesso em 01.06.2016.

Aqui, trataremos de Harry Potter a partir de um ponto de vista amplo do conceito

literário. Sob essa ótica, aprofundar-nos-emos na série literária em duas vertentes

mercadológicas, nas quais as obras de J. K. Rowling podem ser encaixadas, a

saber: no mercado literário infanto-juvenil e no mercado BestSeller. A primeira

vertente será relacionada ao conteúdo que aborda e ao público-alvo da série, já pela

segunda vertente serão levados em consideração os aspectos de vendas,

popularização e massificação que Harry Potter ganhou ao longo do tempo.

Nesta primeira parte vislumbraremos a primeira vertente em que encaixamos a série

Harry Potter, a de pertencente ao mercado literário infanto-juvenil. Essa vertente é

tratada por Ceccantini (2004, p. 20) como “um tipo de literatura cujas fronteiras são

26

muito nebulosas [...] e seu público principal, a ‘criança-leitora’, é igualmente

escorregadio”, justamente pela complexidade que está em seu bojo.

Primeiramente, quando pensamos em literatura, logo remetemo-nos ao termo e sua

definição. Hunt articula o seguinte pensamento:

Para muitos leitores, não está claro que é difícil especificar se um texto é ou não “literatura” apenas por observá-lo. É mais importante o valor que se atribui a ele do que as características que possui. [...] É o contexto cultural que determina a classificação. (HUNT, 2010, p. 84)

Essa discussão acerca do termo é muito presente no meio acadêmico para que seja

compreendido o que de fato é o objeto de estudo de muitas linhas de pesquisa. Há

levantamentos sobre o que deve ser ressaltado ao apontar que determinada obra

possa ser considerada literatura, entre eles o período histórico em que ela está

inserida, sua estilística, sua funcionalidade. Vale ressaltar, também, que muitos

conteúdos podem não ser produzidos com a finalidade de ser literatura, mas que

passam a se tornar com o decorrer do tempo como, por exemplo, as epístolas.

Ainda sobre o assunto, Lajolo (2001) ressalta:

[...] é cada um no silêncio ou na algazarra de suas leituras, que torna literários alguns textos com que se encontra na vida. Às vezes o gesto individual coincide com o gesto oficial de literarizar um texto. Outras vezes não coincide. E cada um que decida a qual gesto – se o próprio, se o alheio – vai ser fiel e solidário! (LAJOLO, 2001, p. 48).

Com esse levantamento sobre literatura surge outra questão: Harry Potter é ou não

literatura?

Desde o início das primeiras publicações de J. K. Rowling do universo Harry Potter

essa dúvida é presente nos meios acadêmicos, em particular da área de Letras.

Recentemente, a autora Ruth Rocha realizou uma declaração em sua conta em uma

rede social apontando que a série Harry Potter não é literatura.

27

Imagem 3: Declaração da autora Ruth Rocha alegando que Harry Potter não é literatura. Matéria

divulgada pela Veja São Paulo em abril de 2015. Disponível em: http://vejasp.abril.com.br/blogs/pop/2015/04/28/ruth-rocha-harry-potter-polemica. Acesso em

06.04.2016.

A declaração da autora repercutiu e gerou discussão entre fãs da série de Rowling.

Ao alegar que a saga é “modismo”, Ruth Rocha remete a diversas outras sagas que

trilharam um percurso semelhante a Harry Potter. As sagas Crepúsculo, Jogos

Vorazes, Divergente, Percy Jackson, entre outras, foram também publicadas

anteriormente à propostas de adaptação para o cinema, e seus filmes geraram

lucros exorbitantes e as vendas dos livros, consequentemente cresceram sob o

ponto de vista das vendagens.

Ainda acerca da literatura, Guimarães nos permite refletir ainda:

Assim sendo, a literatura, que da mesma forma pode ser um termo utilizado para fazer referência a um conjunto de textos (esse fato

28

pode ser observado em exemplos como literatura brasileira, literatura jurídica, literatura médica), não pode ser aprisionada e não pode aprisionar o leitor, deixando de lado o sabor da leitura em prol de um conjunto de fórmulas e definições. (GUIMARÃES, 2012, p. 38)

A saga de J. K. Rowling está inserida em um momento histórico (final do século XX

e início do século XXI), possui características próprias em sua escrita e o tema que é

proposto pode ser aproximado aos temas de C. S. Lewis, J. R. R. Tolkien – também

autores do século XX – se levarmos em conta que em suas obras os espaços são

diferenciados do mundo real, personagens não são meros seres humanos, há a

presença de criaturas, objetos e particularidades individualmente inseridos naquele

mundo criado, entre outras características, o que pode compreender um conjunto de

textos de mesmas características.

O sabor da leitura dito por Guimarães remete ao desfruto do ato de ler, de se

identificar com o tema, da reflexão gerada que pode ser levada para além das

páginas, para a vida do indivíduo. Hunt discute sobre o valor que atribuímos a uma

obra, além de suas características. Harry Potter foi capaz de atingir diversos meios

como o audiovisual (cinema, games) o presencial (construção de diferentes mundos

em parques temáticos, criação e comercialização de produtos originados na obra

literária), o teatro (lançamento em julho de 2016 da peça que será a continuação da

narrativa), além de que fora capaz de expandir também pelo meio literário: J. K.

Rowling publicou outros três livros que seriam pertencentes ao mundo de Harry

Potter – Animais Fantásticos e Onde Habitam, Os Contos de Beedle, o Bardo e

Quadribol Através dos Séculos – e outras publicações sobre a saga provenientes de

diversos autores também foram lançadas – um livro de cartas, escritas por fãs,

destinadas ao menino bruxo, livros sobre a adaptação para os filmes que contam o

processo de realização de um filme com temas fantásticos etc.

Estes diversos meios atingidos atribuem um valor cultural a Harry Potter, pois a série

foi capaz de fazer com que pessoas de todas as idades, mesmo não sendo o

público-alvo da série, saibam quem é o personagem, o que ele é (um menino que é

bruxo), o que confere, também, um valor histórico à saga pelo impacto que teve em

quase duas décadas de publicação. Outro valor que pode ser atribuído à saga de

Rowling é o educacional, pois o gosto e interesse pelas versões cinematográficas,

29

games e experiência no mundo do parque temático levaram muitos jovens a querer

conhecer o produto que originou aquela narrativa assistida, vista e sentida, logo, o

texto original de J. K. Rowling.

São fatos como os levantados anteriormente que deveriam ser levados em

consideração quando o paradigma, de preconceito para com a literatura infantil é

levado em consideração quando falam que a mesma não é literatura. Hunt (2010, p.

69) traz um pensamento que permite refletir a respeito: “[...] a premissa tácita de

que, ‘se é literatura, não pode ser para criança’, e o paradoxo de que a ‘literatura’

deve ser a ‘melhor’, mas as crianças não podem tê-la”.

Deve ser levado em consideração o público para as quais as obras compreendidas

como literatura infantil ou infanto-juvenil são destinadas e deve-se ressaltar que são

obras escritas por adultos, que já têm um ‘controle’ maior dos valores morais que

serão transpostos para o público, uma vez que deve ser respeitado o controle dos

valores e compreensão dos mesmos visando cada estágio do crescimento:

Na maioria das vezes, podemos dizer que, em estágios diferentes, as crianças terão atitudes variadas em relação à morte, ao medo, ao sexo, a perspectivas, ao egocentrismo, à casualidade etc. Serão mais abertas ao pensamento radical e aos modos de entender os textos, serão mais flexíveis [...]. (HUNT, 2010, p. 91-92)

Além dos estágios que nos dizem respeito à idade, há também a questão de

compreensão de mundo que o público terá, dentre outras razões, também pela

época em que vivem. É importante compreender que, por exemplo, as crianças ou

os jovens do século XX são diferentes das crianças e jovens do século XXI por

motivos culturais, históricos, sociais, econômicos, dentre outros. A criança que leu

alguma obra do Sítio do Picapau Amarelo na segunda metade do século XX tinha

uma perspectiva de mundo diferente da que uma criança que lê a mesma obra hoje,

com a mesma idade. Da mesma forma, as crianças e os jovens de hoje estão lendo

Harry Potter e interpretando com os recursos que possuem individualmente, que

serão diferentes do público de mesma idade nos próximos anos. Sobre o assunto,

Guimarães nos permite a reflexão:

30

Precisa-se pensar que a literatura sofre mudanças no correr de sua história. Da mesma maneira que o homem mudou com o passar do tempo, a literatura, produto desse homem, também sofreu

alterações. (GUIMARÃES, 2012, p. 36).

Acerca da reflexão que questiona se Harry Potter é ou não literatura, devemos

lembrar os principais motivos pelos quais a saga é criticada, dentre eles a sua

entrada para o que chamamos de cultura pop. Com a adaptação dos livros para o

cinema, criação de games, construção de brinquedos e mundos em parques

temáticos, a série Harry Potter tornou-se cada vez mais popular, cada vez mais

visível ao público e, com isso, mais pessoas passaram a conhecer e admirar. O

acesso aos conteúdos também se tornou mais fácil e rápido com o avanço da

tecnologia (hoje em dia além da leitura por meios físicos também há a possibilidade

de e-books dando acesso por plataformas digitais e até mesmo por smartphones).

Tal categorização passou a gerar cada vez mais lucro à franquia que se tornou uma

das sagas mais rentáveis de todos os tempos.

Por trás de todo o lucro gerado por Harry Potter relembramos o que podemos

aproximar do conceito literatura já mencionado anteriormente: a inserção em um

período histórico, uma linguagem própria que mostra as características da narrativa

e uma linguagem apropriada para o público-alvo. Devemos ressaltar também outros

pontos que aproximam Harry Potter à literatura.

A saga possui conteúdo que dialoga com o gênero épico, ou seja, notamos a

presença de um herói com seus ideais que passa por diversas provações e desafios

e que também enfrenta o seu destino e luta por uma nação em comum. O conteúdo

narrativo também dialoga com questões modernas como a questão da crise de

identidade. Dessa forma dialógica com demais gêneros literários. A saga Harry

Potter possui um caráter inovador tratando de temas recorrentes permitindo,

inclusive, discussões relevantes. Tal construção narrativa atraiu pessoas de várias

faixas etárias, principalmente os jovens, uma vez que o protagonista e seus colegas

também têm esta idade. Por atrair os jovens, a saga Harry Potter pode ser a porta

de entrada ou um estímulo para o cultivo do gosto da leitura.

Por estes motivos defendemos a ideia de que a saga Harry Potter encaixa-se na

vertente literária por ter alcançado patamares surpreendentes e por possuir o seu

31

valor cultural. Do ponto de vista do conteúdo, o mesmo tange textos clássicos à

vertentes modernas, o que chama seu público leitor de características modernas à

assuntos e temas épicos.

Hunt (2010, p. 109) diz sobre a compreensão do sentido do texto que os leitores

mais jovens geram: “[...] devemos considerar também a intertextualidade, ou seja, o

que se passa entre textos. [...] O que encontramos num texto depende de como o

lemos [...]”. A criança de hoje poderá ter um conhecimento enciclopédico também

mais avançado por conta da disseminação de informação e pela facilidade de ter

acesso a estas com a colaboração de recursos como televisão, internet etc.

Com essa reflexão, vale ressaltar novamente que uma mesma obra promoverá uma

interação diferente com seus leitores de acordo com a época vivida no presente, no

conhecimento de mundo e no contexto singular de cada um, o que dá um caráter

imediato ao livro infantil: “E o imediato tende a ser efêmero e interagir com a cultura

imediata” (HUNT, 2010, p. 96).

Para compreender, por fim, a vertente infanto-juvenil de Harry Potter, podemos levar

em consideração o seu conteúdo quando Hunt (2010, p. 116) afirma “O público

implícito em ‘literatura infantil’ é um público em desenvolvimento”. O protagonista da

série também está em desenvolvimento: ao decorrer dos sete livros ele passa por

uma série de descobertas – descobre o seu mundo e descobre a si mesmo, procura

se conhecer como menino – emocionalmente e fisicamente, está passando por uma

transição – e também como bruxo – se ele é um bruxo bom ou das trevas –, busca

compreender seus limites, enfrentar seus medos, enfrentar o novo, estabelece

objetivos, entre outras características que traçam a trajetória de uma pessoa em

desenvolvimento.

Além disso, Harry Potter passa pelo enfrentamento escolar, encontra novos colegas

com quem deve se relacionar (e, eventualmente deverá escolher aqueles que

também não deverá estabelecer confiança), apresenta facilidades e dificuldades em

disciplinas escolares, ao final da série passa pela reflexão de qual carreira deverá

seguir, tem envolvimentos amorosos, entre outros acontecimentos.

Os colegas de Harry Potter permitem a identificação de vários paradigmas que

configuram as diferentes crianças e jovens: a menina estudiosa, o amigo engraçado,

32

ou mesmo os deslocados e diferentes como Neville e Luna, e outros característicos.

Tais fatos enfrentados e relatados durante a saga de Rowling permitem interação e

identificação de seu leitor.

Crianças e jovens passam a questionar quem são, passando, inclusive, por uma

crise de identidade, são apresentados a novos meios, novas pessoas, novas

experiências e no primeiro momento podem levantar o questionamento de saber se

aquilo é bom ou ruim, se é o bem ou o mal, assim como Harry Potter, eles querem

compreender a si mesmos, começam a levantar que suas escolhas refletirão em seu

futuro, em sua própria conduta.

Assim, podemos afirmar que a saga Harry Potter contribui para o seguinte sentido,

conforme o ressaltado por Hunt (2010, p. 85): “[...] o livro será usado não para

acolher ou modificar nossas opiniões, mas para formar as opiniões da criança”. Por

todos os enfrentamentos acometidos na série e os valores que a narrativa transmite,

especialmente o bem contra o mal, o leitor em desenvolvimento poderá identificar-se

com o conteúdo, com as personagens, promovendo uma leitura agradável,

prazerosa e estimulante até mesmo no sentido de imaginação, por apresentar um

mundo diferente.

33

1.2 Harry Potter no mercado literário BestSeller

Devemos ressaltar de início, novamente, de que J. K. Rowling teve sua história

recusada por diversas editoras antes de ser aceita pela Bloomsbury. O primeiro livro

popularizou-se e tornou-se um dos mais vendidos na época, o que contribuiu para

que o sucesso da saga continuasse com o lançamento dos volumes seguintes em

1998, 1999 e no ano 2000. Mesmo depois do anúncio da adaptação para o cinema,

a série literária foi continuada tendo lançamento dos volumes seguintes em 2003,

2005 e 2007.

Em termos atuais, nota-se que a saga Harry Potter mantém-se em rankings de livros

mais vendidos, nove anos após o lançamento do último volume da série. Em março

de 2016, o último volume, Harry Potter e as Relíquias da Morte, ocupou, segundo o

site ranker.com3, ocupava a 21ª posição na lista de Best Selling Books of All Time

(livros mais vendidos de todos os tempos), liderados por clássicos de Charles

Dickens, Tolkien e Agatha Christie. Ressalta-se que livros religiosos como a Bíblia e

o Alcorão não foram acrescentados.

3 Plataforma online que disponibiliza listas organizadas em grupos ou individuais e também por meio de votações. Muitas das listas disponíveis no site são baseadas em vertentes de economia, mas também há listas desenvolvidas com conteúdo de entretenimento.

34

Imagem 4: Harry Potter and the Deathly Hallows na 21a posição na lista de Livros Mais Vendidos de

Todos os Tempos. Disponível em: http://www.ranker.com/list/best-selling-books-of-all-time. Acesso em 15.03.2016.

Outro recorde curioso do último livro da série foi registrado no Guinnes World

Records. Em 21 de julho de 2007, data do lançamento do último volume no

hemisfério norte, Reino Unido e Estados Unidos, países do idioma original da

escritora, fora registrada o maior número de vendas de um título em apenas 24

horas, dando, assim, a Harry Potter and the Deathly Hallows o título de Fastest

Selling Book of Fiction in 24 hours, livro de ficção mais vendido em 24 horas, tendo

arrecadado um valor de U$ 8.300.000,00.

35

Imagem 5: Recorde atribuído ao livro Harry Potter and the Deathly Hallowsem julho de 2007 como

livro de ficção mais vendido em 24 horas. Disponível em: http://www.guinnessworldrecords.com/world-records/fastest-selling-book-of-fiction-in-24-hours.

Acesso em 15.03.2016.

O mesmo site que trouxe o último volume de Harry Potter como um dos livros mais

vendidos de todos os tempos também propôs um ranking das séries literárias de

categoria infantil e infanto-juvenil mais vendidas até hoje. Nesta, a série de J. K.

Rowling aparece em destaque na primeira posição.

Imagem 6: A série Harry Potter de J.K.Rowling no topo do ranking de séries de livros mais vendidas. Disponível em: http://www.ranker.com/list/best-selling-book-series-of-all-time. Acesso em 15.03.2015.

36

A Amazon, empresa americana transnacional de vendas de produtos online atualiza

diariamente em sua página inicial os destaques dos principais itens que são

vendidos em cada departamento da loja. No departamento de vendas de livros de

literatura infantil ou infanto-juvenil, Harry Potter mantém o destaque nos diversos

volumes da série como Best Sellers (melhor vendidos), especialmente no formato

Kindle, plataforma desenvolvida pela própria empresa para leitura de livros em

formato digital (e-readres). Nos serviços da Amazon, o consumidor pode avaliar o

produto de acordo com a sua experiência com o mesmo, avaliando com o critério de

atribuição de estrelas as suas preferências. Os livros da série de Rowling recebem,

também, boa avaliação por seus consumidores, levando em consideração as

estrelas concedidas pelos mesmos.

Imagem 7: O primeiro livro da saga Harry Potter na terceira posição no ranking de vendas do site

Amazon. Harry Potter and the Cursed Child, livro que adapta a peça inspirada no universo da saga lançado em Julho de 2016 aparece na segunda posição como pré-venda em Maio de 2016.

Disponível em: http://www.amazon.com/gp/bestsellers/books/. Acesso em 15.03.2015.

37

Imagem 8: Terceiro volume da série Harry Potter classificado na sexta posição, segundo volume em sétima posição e o quarto volume classificado em nono no ranking da Amazon. em:

http://www.amazon.com/gp/bestsellers/books. Acesso em 15.03.2015.

Imagem 9: Quinto e sétimo volumes da saga Harry Potter nas respectivas décima e décima segunda

posição no ranking da Amazon. Disponível em: http://www.amazon.com/gp/bestsellers/books. Acesso em 15.03.2015.

38

Imagem 10: Sexto livro da saga Harry Potter na 17ª posição no ranking da Amazon. Disponível em: http://www.amazon.com/gp/bestsellers/books. Acesso em 15.03.2015.

Nesta mesma lista da Amazon, nota-se o destaque para Harry Potter and The

Cursed Child. Em 2015, foi anunciada a elaboração de uma peça teatral que

contaria, novamente, uma narrativa que se passaria no mesmo mundo de Harry

Potter, cujo roteiro também está sendo montado por J. K. Rowling em parceria com

Jack Thorne e será dirigida por John Tiffany. Muito foi especulado acerca do

conteúdo da peça em questão até que em outubro de 2015 quando foi revelado que

a peça será passada a partir do final de Harry Potter e as Relíquias da Morte, ou

seja, com o protagonista já adulto e com seus filhos em idade escolar (fonte:

http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2015/10/1697602-peca-de-teatro-sobre-harry-

potter-comecara-onde-setimo-livro-parou.shtml. Acesso em 10.02.2016).

A estreia da peça e o lançamento do roteiro em forma de livro foram em 31de julho

de 2016 na cidade de Londres e a exibição é dividida em duas partes. Quando, em

fevereiro de 2016, J. K. Rowling revelou no site Pottermore que a peça também seria

transposta em forma de livro (roteiro da peça), as pré-vendas iniciaram-se no site

Amazon e também no Waterstone, atingindo a liderança de vendas cinco meses

antes do lançamento.

39

Imagem 11: Cartaz oficial da peça Harry Potter and the Cursed Child divulgado inicialmente pelo site Pottermore. Disponível em: http://www.harrypottertheplay.com. Acesso em 12.02.2016.

Em fevereiro de 2016, a Folha de São Paulo, em sua plataforma online, revelou a

informação atualizada de que os livros de Harry Potter atingiram cerca de 450

milhões de exemplares vendidos pelo mundo nas 78 línguas para as quais foi

traduzida (fonte: http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2016/02/1738669-novo-livro-

de-harry-potter-ja-lidera-as-vendas-5-meses-antes-do-lancamento.shtml. Acesso em

12.02.2016).

Em vista da importância da saga Harry Potter frente ao mercado de livros, podemos

encaixar a série literária também como um BestSeller. Fisher (2005, p. 276) nos traz

a seguinte constatação: "o livro moderno pode ser considerado, de fato, a

mercadoria global definitiva, uma moeda.".

Harry Potter foi capaz de atingir maior disponibilidade de comunicação global, sua

distribuição foi massificada, capaz de ser acessível por ser traduzida para diversos

idiomas, com a divulgação feita por diversas estratégias de marketing que foram

contribuídas, dentre outros motivos, pela presença da narrativa no meio

cinematográfico.

Com a adaptação para os cinemas, a saga de livros de J. K. Rowling conseguiu uma

captação de público mais ampla do que os frequentadores habituais de livrarias. A

40

recepção do público pelos filmes permitiu que as livrarias mundiais dedicassem

grandes espaços em seus estabelecimentos à obra literária, conforme aponta o

mesmo autor (2005, p. 191): “para uma produção em massa de páginas de papel

impressas, [...] objetivo era ter lucro, aumentando a produção com criatividade, a fim

de maximizar as vendas.”.

As estratégias de marketing nas vendas dos livros, bem como o incentivo

proveniente das adaptações cinematográficas e até mesmo pelo interesse do

conteúdo da narrativa contribuiu para que os jovens começassem a cultivar o

interesse por leitura, consequentemente por literatura e por cinema.

Podemos dizer, então, que esta vertente literária, a de Best-sellers, contribuiu, no

caso de Harry Potter e contribui até hoje também para a formação de novos leitores

que, posteriormente, poderão tornar-se, ou se tornarão leitores críticos, capazes de

ler e compreender o mundo, e Paulo Freire (1995, p. 11) reflete a importância de

leitores críticos na sociedade: “a leitura crítica de mundo precede a leitura da

palavra, pois linguagem e realidade se ligam dinamicamente”.

41

1.3 Capas da Ordem da Fênix

As capas dos livros permitem aos leitores uma infinita possibilidade de interpretação

do texto em si, sendo elas, segundo Genette (2009) paratextos editoriais que são

diversos elementos que acompanham o texto. Alguns desses elementos são

verbais, como títulos e subtítulos, nome do autor, comentários da crítica, ou também

podem ser elementos não-verbais, como ilustrações, formas distribuídas, conjunto

de cores etc.

Essas capas apresentam signos e estes, ali presentes, não têm a finalidade de

delimitar o universo descrito na narrativa, ou seja, os signos componentes na capa

não definem o objeto, conforme nos sugere:

Defino um signo como qualquer coisa que, de um lado, é assim determinada por um objeto e de outro, assim determina uma ideia na mente de uma pessoa, esta última determinação, que denomino o interpretante do signo, é, desse modo, mediatamente determinada por aquele objeto. Um signo assim tem relação triádica com seu

objeto e com seu interpretante. (PEIRCE, 1987, p. 07)

Segundo os estudos de Powers (2008) que mostram as transformações que as

capas foram sofrendo ao longo dos séculos, nota-se o gosto dos leitores pela ideia

da estética da capa, os compradores passaram a atribuir uma preferência sobre esta

questão. Isso foi notado, ao passo em que a literatura foi atingindo novos leitores e

novas vertentes, também com o público infantil.

Segundo o autor (2008, p. 12), “os livros para crianças haviam apontado o caminho

para um tratamento decorativo da capa” e, com isso, as capas, mesmo para os

adultos, passaram a projetos mais elaborados, ademais, capas de livros, além de

protejê-los, são atrativos comerciais que chamam a atenção dos leitores e

compradores.

Lindnen fala sobre o que a capa de um livro pode influenciar na leitura:

42

[a capa] constitui antes de mais nada um dos espaços determinantes em que se estabelece o pacto da leitura. Ela transmite informações que permitem apreender o tipo de discurso, o estilo de ilustração, o gênero... situando assim o leitor numa certa expectativa. (LINDEN 2011, p. 57)

As capas de nosso objeto de estudo, Harry Potter e a Ordem da Fênix, podem ser

consideradas como recurso de compreensão do texto de J. K. Rowling e não como

uma retratação concreta e exata do mesmo.

No caso das edições de Harry Potter, cada uma segue um padrão que fornece uma

identidade visual ao conjunto dos sete livros que compõem a saga que vão de

encontro a edição que pertencem. Mesclam uma combinação de elementos textuais,

como o título do livro, e elementos não verbais, imagéticos, como gravuras,

ilustrações etc. As capas das principais edições destacam-se a seguir:

Imagem 12: Primeira edição americana do quinto volume da série Harry Potter, lançada em 2003.

Disponível em: http://harrypotterfanzone.com/book-5/cover-art. Acesso em 12.02.2016.

43

Imagem 13: Primeira edição britânica infanto-juvenil do quinto volume da série Harry Potter, lançada

em 2003. Disponível em: https://thoughtexplosion101.wordpress.com/2016/04/01/30-day-harry-potter-challenge-1. Acesso em 12.02.2016

Imagem 14: Primeira edição britânica para adultos do quinto volume da série Harry Potter, lançada em 2003. Disponível em: http://harrypotternewbook.com/harry-potter-and-the-order-of-the-phoenix.

Acesso em 12.02.2016.

44

Imagem 15: Edição especial americana do quinto volume da série Harry Potter, lançada em 2013 em celebração aos 15 anos do lançamento do primeiro livro da saga (cada volume ganhou uma nova capa). Disponível em: https://psychoreader.wordpress.com/2014/01/12/diferencas-entre-a-serie-

adulta-e-infantil-de-harry-potter. Acesso em 12.02.2016.

Imagem 16: Edição especial para várias partes do mundo do quinto volume da série Harry Potter,

lançada em 2013 junto com os demais volumes da saga. Disponível em: https://psychoreader.wordpress.com/2014/01/12/diferencas-entre-a-serie-adulta-e-infantil-de-harry-

potter/. Acesso em 12.02.2016.

45

Imagem 17: Edição limitada conhecida como a Signature Edition feita para várias partes do mundo do quinto volume da série Harry Potter, lançada em 2012 junto com os demais volumes da saga.

Disponível em: https://psychoreader.wordpress.com/2014/01/12/diferencas-entre-a-serie-adulta-e-infantil-de-harry-potter. Acesso em 12.02.2016.

Ressaltando o fato de que as capas são paratextos, ou seja, acompanham o texto (a

narrativa de J. K. Rowling), estas também precisam acompanhar o público-alvo para

o qual a obra será dedicada. Desse modo há a projeção de capas diferentes que

dialoguem com seus leitores.

Foram escolhidas três capas para o levantamento de uma breve análise, todas as

incluídas são primeiras edições do quinto volume da série Harry Potter, ou seja,

capas precursoras, que vieram antes mesmo de haver a adaptação para o filme,

publicadas em 2003.

Primeira edição americana de Harry Potter e a Ordem da Fênix (Imagem 12)

As capas das edições americanas são as mesmas quando publicadas no Brasil. A

identidade visual com os demais livros da série de edição mantém-se: título ao topo

e centralizado, fonte do título ilustra um formato de raio, significando a cicatriz de

46

Harry Potter que tem a mesma forma, subtítulo que acompanha os elementos

visuais que compõem a capa.

Uma ilustração do protagonista, também padrão da edição americana, incide-se ao

centro. Harry Potter é representado não como se estivesse de costas, mas como

num movimento em que estaria virando para verificar alguma coisa, semelhante a

uma posição de defesa. Do plano do olhar, o leitor está um pouco acima de Harry

Potter. O fato de o menino estar em posição de defesa também o deixa menor.

A cena em questão retratada na capa é o momento em que Ninfadora Tonks, Alastor

Moody e Remo Lupin, estes dois últimos ex-professores de Defesa Contra as Artes

das Trevas dos anos letivos anteriores, regatam Harry Potter na casa dos tios

Dursleys, narrado no capítulo 3 do livro.

A cor azul predomina na capa e seus tons variam do claro para o escuro

dependendo do foco e da incidência de luz no ambiente retratado. A cor azul remete

a noite, que logo tange a ideia de escuridão. Na narrativa da saga Harry Potter a

escuridão está associada ao mal. Harry Potter, na capa, está rodeado pelas trevas,

porém há pontos de iluminação ocasionados por velas, sendo que estas estão no

primeiro plano da ilustração.

As velas estão em tons mais claros (por apresentarem “mais luz”), bem como a face

esquerda do garoto que está virada para as mesmas. As áreas mais escuras

ganham um tom mais sombrio, contribuindo, inclusive, para o ar de mistério que a

capa ocasiona.

Vale ressaltar que algumas das velas estão deformadas, podendo remeter ao

movimento em que o garoto está fazendo ao olhar para trás em posição de defesa

(no momento, os professores estão abrindo a porta de maneira cuidadosa do quarto

e o garoto percebe).

Levando em consideração o fato de que a cor azul remete a escuridão, logo, ao mal

na saga Harry Potter, os pontos de luz podem ser chamas de esperança em meio às

trevas, remetendo também aos professores, que dão luz, saberia ao garoto e que

estão se fazendo presentes na cena em questão e no decorrer da narrativa.

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Primeira edição britânica infanto-juvenil do quinto volume da série Harry Potter

(Imagem 13)

Como é uma edição cujo público alvo é o infantil e juvenil há um forte apelo visual

promovido pelas ilustrações e pelas cores fortes.

Diferente da edição americana, o protagonista não está representado na capa.

A primeira edição infanto-juvenil e apresenta o predomínio de cores quentes e

vibrantes, especialmente o amarelo, laranja e o vermelho, ou seja, cores que

remetem de imediato ao fogo. Rousseau (2002) exprime que a cor vermelha remete

de fato ao fogo que inspira, purifica e regenera, logo, há uma associação com a ave

mitológica fênix.

A ilustração central mostra uma fênix, ave que quando chega a hora de morrer pega

fogo e depois renasce das próprias cinzas. Na parte inferior da capa, é ilustrado o

fogo. A presença da fênix retratada aqui remete de imediato ao título do livro, que

traz o nome Ordem da Fênix, e trata-se de uma organização de bruxos e bruxas que

se uniram no passado para combater Lord Voldemort. Com o decorrer da leitura da

narrativa, acompanha-se que a Ordem da Fênix está disposta a voltar a lutar, já que

o Lord das Trevas retornou.

A fênix, aqui, pode remeter a essa volta da organização de bruxos, a volta da luta

contra o mal, podendo simbolizar o bem que renasce das cinzas quando morreu no

passado, que se ascende como um fogo para trazer o bem de volta à nação bruxa.

Primeira edição britânica para adultos do quinto volume da série Harry Potter

(Imagem 14)

O que difere a edição adulta da edição infanto-juvenil é a capa, o conteúdo da

narrativa é exatamente o mesmo para ambos os públicos. A versão adulta dos livros

tem como público alvo pessoas mais velhas. As capas dos livros são apresentadas

de forma mais sóbria, sem cores fortes e chamativas, os tons mais escuros são

predominantes, os objetos apresentados dão ar de seriedade.

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A capa do quinto volume da série Harry Potter em sua edição britânica para adultos

também segue os padrões identitários da edição: elementos textuais na parte

superior, fundo com tons oscilantes de preto a cinza escuros e um único objeto

central que tenha relação com o conteúdo da narrativa de cada volume.

Conforme citado, o fundo é escuro e assemelha-se a nuvens de chuva prestes a

uma grande tempestade. Na narrativa de Harry Potter, quando os bruxos das traves

conjuram a Marca Negra, sinal de que Voldemort precisa de seus seguidores,

nuvens de tempestades como a representada na capa são formadas. As nuvens e

os tons de cores utilizados, que contribuem para um ar de seriedade, remetem ao

mal existente no mundo de Harry Potter.

Podemos levar em consideração a mesma interpretação proposta para a edição

britânica para crianças, com o adendo de que a fênix quebra o fundo de nuvens de

tempestade, podendo estas ter sido provocadas pelos seguidores de Lord

Voldemort, e, então, aqui a fênix também faria sobressair a questão do bem contra o

mal, que mesmo sob uma tempestade forte provocada pelo mal, a fênix renasce das

próprias cinzas, o bem é forte e luta por sua sobrevivência.

Em ambos os casos das edições infanto-juvenil e adulta de Harry Potter e a Ordem

da Fênix, o mundo, representado pela noite, pela escuridão, pelas nuvens de

tempestade têm uma quebra do mal pelas chamas da fênix, que é a parte da força

do bem renascendo.

49

1.4 A saga literária de Harry Potter

A série literária é composta por sete livros que narram a história de Harry Potter,

menino órfão que mora com os tios que o maltratam. Em seu aniversario de onze

anos, descobre que é bruxo e é convidado a estudar na Escola de Magia e Bruxaria

de Hogwarts. Logo, depara com fatos sobre seu passado e descobre que é

conhecido entre os bruxos como o menino que sobreviveu:

[...] Sua mãozinha agarrou a carta ao lado mas ele continuou a dormir, sem saber que era especial, sem saber que era famoso, sem saber que iria acordar dentro de poucas horas com o grito da Sra. Dursley ao abrir a porta da frente para pôr as garrafas de leite do lado de fora, nem que passaria as próximas semanas levando cutucadas e beliscões do primo Duda... ele não podia saber que, neste mesmo instante, havia pessoas se reunindo em segredo em todo o país que erguiam os copos e diziam com vozes abafadas:

- A Harry Potter: o menino que sobreviveu! (ROWLING, 1997, p. 20)

Harry Potter descobre a real causa da morte de seus pais e que ele também sofreu

uma tentativa de assassinato pelo mesmo bruxo, Voldemort. O garoto, ao longo dos

anos que estuda em Hogwarts (cada ano escolar é relatado em um livro), passa e

enfrenta desafios que o fazem lutar por sua vida, pela vida de seus amigos e pela

nação bruxa de modo geral. Confronta com o seu inimigo de várias maneiras,

mesmo o bruxo tendo assumido outras formas para ser enfrentado.

No primeiro livro, Harry Potter e a Pedra Filosofal, o garoto descobre que Hogwarts

guarda um objeto mágico, a pedra filosofal, que é capaz de imortalizar as pessoas

que bebem o elixir que ela produz. Harry Potter e os colegas descobrem que uma

parte de Voldemort, que o garoto descobre posteriormente, ocupa o corpo de um de

seus professores, deseja arduamente este objeto para tornar-se imortal. O trio de

amigos consegue ultrapassar os desafios postos por Dumbledore para chegar à

pedra filosofal e Harry Potter duela com seu inimigo para que o mesmo não

conseguisse o objeto. Além do duelo, Harry Potter enfrenta o desafio da tentação,

50

Voldemort promete que, se conseguir a pedra filosofal, faria com que os pais do

garoto voltassem a vida.

Em Harry Potter e a Câmara Secreta o garoto retorna para a escola após receber a

visita de um elfo doméstico que pediu incansavelmente para que não voltasse a

Hogwarts. Chegando lá, Harry Potter, os colegas e professores recebem uma

ameaça de uma frase escrita na parede com sangue, a qual se referia aos nascidos

trouxas (2000, p. 122): “A CÂMARA DOS SEGREDOS FOI ABERTA. INIMIGOS DO

HERDEIRO, CUIDADO.”. Com o passar do ano, as ameaças foram tornando-se

frequentes e alunos nascidos trouxas eram petrificados misteriosamente, incluindo

Hermione Granger. Harry Potter descobre que a Câmara Secreta abriga um

basilisco, criatura que está petrificando os alunos nascidos trouxa sob comando do

Herdeiro de Sonserina. O garoto e Ron Weasley descobrem a entrada para a

câmara, a qual descobriram graças a descoberta de que Harry Potter conseguia

falar a língua das cobras, poder herdado de Voldemort na noite em que o mesmo

tentou matá-lo e que assassinou seus pais. Na Câmara dos Secreta o garoto

descobre que o tal Herdeiro de Sonserina é Voldemort, uma parte dele, uma

memória, havia retornado, com a ajuda de um diário. Harry Potter luta com o

basilisco e destrói o diário, destruindo também essa memória que permitia o retorno

de seu inimigo.

No terceiro livro, Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban, o garoto é alertado pela

fuga de um bruxo da prisão de Azkaban, Sirius Black. Durante o ano letivo, Harry

Potter é alertado a tomar cuidado com o bruxo e também para não procurá-lo, sem

saber exatamente o porquê. Harry Potter descobre que Black é seu padrinho e que

fora ele quem contou a Voldemort, no passado, o local em que Lilian e James Potter

estavam escondidos. Harry Potter desejou, então, encontrar-se com Sirius Black

para vingança. Em uma determinada noite o garoto e seus colegas são levados a

Casa dos Gritos, local onde está Sirius Black. Na mesma noite, o então professor de

Defesa Contra as Artes das Trevas, Remo Lupin, juntamente com Sirius Black

contam ao menino o que realmente aconteceu, que na verdade fora Peter Pettigrew

que contou ao Lord das Trevas o esconderijo dos pais de Harry Potter e que, assim,

ele quem traiua a confiança dos Potter. Com a verdade revelada, Harry Potter ajuda

Sirius Black a fugir, para que não retornasse a prisão de Azkaban, porém Pettigrew

consegue escapar.

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Em Harry Potter e o Cálice de Fogo há uma ameaça na Copa Mundial de Quadribol:

comensais da morte atacaram o local e a Marca Negra, marca de Voldemort, fora

invocada, sinalizando o retorno do Lord das Trevas. Em Hogwarts, a escola sedia

uma edição do Torneio Tribruxo, competição entre jovens estudantes maiores de 17

anos, com isso, Hogwarts recebe outros alunos de outras duas escolas. O torneiro

gira em torno de três campeões, um de cada escola, com três competições

diferentes que testam suas forças e habilidades mágicas. Harry Potter, porém, é

sorteado para participar do Torneiro Tribruxo. Em uma das competições, Harry

Potter e Cedrico Diggory, aluno de Hogwarts também competidor, acabam parando

em um cemitério, o qual Harry Potter já havia sonhado várias vezes anteriormente.

Lá, Petter Pettigrew realiza um ritual que resulta no ressurgimento de Voldemort.

Cedrico Diggory, ao tentar ajudar Harry Potter, acaba sendo assassinado. Com a

volta do Lord das Trevas e dos Comensais da Morte, o garoto decide enfrentá-lo

apesar de todos os seus medos. Harry Potter tem, finamente, a consciência de que

tem maturidade de enfrentar seu inimigo, se defender e lutar pelo que acredita.

Harry continuou agachado atrás da lápide e percebeu que chegara ao seu fim. Não havia esperança... nenhuma ajuda de ninguém. Quando ouviu Voldemort chegar ainda mais perto, ele soube apenas uma coisa que transcendeu o medo e a razão – ele não ia morrer agachado ali como uma criança brincando de esconde-esconde, não ia morrer ajoelhado aos pés de Voldemort... ia morrer de pé como seu pai, e ia morrer tentando se defender, mesmo que não houvesse defesa alguma possível... (ROWLING, 2001, p. 526).

Neste momento ocorre o Priori Incantatem, Harry Potter consegue enxergar as

ultimas pessoas que Voldemort matou, incluindo seus pais e Cedrico Diggory.

O quinto volume da série começa em meados do mês de agosto de 1995, enquanto

Harry Potter ainda está passando as férias de verão na casa dos seus tios em Little

Whinging. Em um determinado dia, acaba desconfiando de que seu primo Duddley

está envolvido com alguns outros garotos de má conduta e eles acabam tendo um

rápido enfrentamento verbal. Aqui há um primeiro momento de fúria da parte de

Harry Potter, que o toma quase que involuntariamente, devido às maldades ditas por

52

Duddley a respeito de sua família e de seus amigos e, por conta disso, ameaça seu

primo com sua varinha:

- Eu ouvi você à noite passada – disse Duda sem fôlego – Falando durante o sono. Gemendo.

- Como assim? – repetiu Harry, mas com uma sensação de frio e afundamento no estômago. Tornara a visitar o cemitério em sonhos, na noite anterior.

Duda soltou uma gargalhada rouca, depois fez uma voz de falsete e lamúria.

- Não matem Cedrico! Não matem Cedrico! Quem é Cedrico... seu namorado?

- Eu... você está mentindo – contestou Harry maquinalmente. Mas sua boca secara. Sabia que o primo não estava mentindo. De que outra forma poderia saber o nome de Cedrico?

- Papai! Me ajude, papai! Ele vai me matar, papai! Buuuu!

- Cala a boca – disse Harry em voz baixa. – Cala a boca, Duda, estou te avisando!

- Vem me ajudar, papai! Mamãe, vem me ajudar! Ele matou Cedrico! Papai, me ajude! Ele vai... Não aponta essa coisa pra mim!

Duda recuou contra a parede da travessa. Harry estava apontando a varinha diretamente para o seu coração. Ele sentia catorze anos de ódio ao primo palpitarem em suas veias [...].

- Nunca mais volte a falar nisso – rosnou Harry. – Está me entendendo?

- Aponte essa coisa para outro lado!

- Eu perguntei, você me entendeu?

- Aponte isso para outro lado!

- VOCÊ ME ENTENDEU? (ROWLING, 2003, p. 18).

Momentaneamente, o tempo quente de verão sofre uma alteração e Harry Potter e

Duddley são atacados por Dementadores. Harry Potter, no entanto, consegue repelir

as criaturas com um feitiço, salvando a si e a Duddley. Com a realização do

ocorrido, ao tentar proteger a si e a seu primo, Harry Potter infringi uma das leis

bruxas mais severas de que é proibido realizar magia na presença de um trouxa, ou

seja, de quem não é bruxo (sendo este, Duddley) e sofre uma expulsão da Escola

53

de Magia e Bruxaria de Hogwarts. Porém, Harry é convidado a se apresentar

perante um tribunal no Ministério da Magia, que irá analisar a situação. Assim,

alguns de seus antigos professores buscam-no na casa dos seus tios e transferem-

no para o Largo Grimmauld número 12, a sede da Ordem da Fênix.

A Ordem da Fênix é uma sociedade secreta que fora organizada por Dumbledore no

momento de ascensão de Lord Voldemort na Primeira Guerra Bruxa e reunia

grandes bruxos e bruxas com o intuito de juntar forças para derrotar o Lord

Voldemort. A Ordem da Fênix reunia-se quando necessário no endereço em

Londres no passado, e depois da volta do Lord das Trevas no último desafio do

Torneio Tribruxo e com a morte de Cedrico Diggory, os bruxos voltaram a reunirem-

se.

Segundo o Guia completo do saga Harry Potter por Grossi, a fênix é uma ave com

características que merecem destaque:

[...] capaz de viver muito e muitos anos graças a uma característica especial: ela se regenera. Seu corpo pega fogo e renasce das cinzas. [...] suas lágrimas têm [...] poder curativo e que seu canto aumenta a coragem daqueles que são puros de coração. Quando alguém em perigo dá uma prova de lealdade ao dono da uma fênix, [...] ela virá em seu auxílio. (GROSSI, 2005, p. 56)

Além de Dumbledore, fundador da Ordem da Fênix possuir uma fênix chamada

Fawkes, a qual, inclusive, ajudou a salvar Harry Potter em seu segundo ano letivo na

Câmara Secreta, podemos interpretar o nome da associação secreta como uma

referência ao ato de renascer, ou seja, a sociedade fora criada para reestabelecer

um bem à nação bruxa – fazer o bem renascer das cinzas devido à situação de

morte –, fazer o mal curar-se. Ademais, os bruxos associados à Ordem da Fênix são

puros de coração, visam esse bem e o reestabelecimento da paz na nação bruxa.

Ao chegar à sede, Harry Potter encontra Rony e Hermione, que revelam que

souberam de reuniões da associação durante as férias em segredo. Harry Potter,

então, tem mais um momento de ira.

54

- ENTÃO VOCÊS NÃO TÊM PARTICIPADO DAS REUNIÕES, GRANDE COISA! ESTIVERAM AQUI O TEMPO TODO, NÃO FOI? ESTIVERAM JUNTOS O TEMPO TODO! AGORA, EU, FIQUEI ENCALHADO NA RUA DOS ALFENEIROS O MÊS INTEIRO! E JÁ RESOLVI MUITO MAIS DO QUE VOCÊS JAMAIS CONSEGUIRAM E DUMBLEDORE SABE DISSO – QUEM SALVOU A PEDRA FILOSOFAL? QUEM SE LIVROU DE RIDDLE? QUEM SALVOU A PELE DE VOCÊS DOIS DOS DEMENTADORES?

Cada pensamento amargurado e cheio de rancor que Harry tivera no último mês foi saindo de dentro dele: sua frustração com a falta de notícias, a mágoa de que todos tinham estado juntos sem ele, sua fúria por estar sendo seguido e ninguém lhe informar – todos os sentimentos de que sentia uma certa vergonha extravasaram. [...]

- QUEM FOI QUE TEVE QUE PASSAR POR DRAGÕES E ESFINGES E OUTRAS COISAS REPUGNANTES ANO PASSADO? QUEM VIU ELE VOLTAR? QUEM TEVE QUE ESCAPAR DELE? EU!

Rony ficou ali parado, com o queixo meio caído, visivelmente chocado e sem saber o que responder, enquanto Hermione parecia à beira das lágrimas.

- MAS POR QUE EU DEVERIA SABER O QUE ESTÁ ACONTECENDO? POR QUE ALGUEM SE DARIA O TRABALHO DE ME DIZER O QUE ANDOU ACONTECENDO?

- Harry, nós queríamos lhe dizer, nós realmente queríamos – começou Hermione.

- NÃO PODEM TER QUERIDO TANTO ASSIM, PODEM, OU TERIAM ME MANDADO UMA CORUJA, MAS DUMBLEDORE FEZ VOCÊS JURAREM...

- Fez mesmo...

- DURANTE QUATRO SEMANAS EU FIQUEI ENTALADO NA RUA DOS ALFENEIROS, PESCANDO JORNAIS NAS LIXEIRAS PARA TENTAR DESCOBRIR O QUE ESTAVA ACONTECENDO...

- Nós queríamos...

- SUPONHO QUE VOCÊS TÊM SE DIVERTIDO PARA VALER, NÃO TÊM, ESCONDIDOS AQUI JUNTOS... (ROWLING, 2003, p. 58-59)

O narrador, neste momento, descreve que os pensamentos de Harry são

amargurados, cheio de rancor e frustrantes. Logo, os demais membros da Ordem da

Fênix resolvem contar a Harry Potter que acreditam que Voldemort está reunindo

forças, um exercito para conquistar algo que necessita.

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Após sua audiência no Ministério da Magia que acabou permitindo que Harry Potter

não entregasse sua varinha (ou seja, não seria expulso de Hogwarts) com a

contribuição de Dumbledore que defendeu o garoto, mas o evitou em tribunal, Harry

Potter retorna ao quinto ano letivo na Escola. Lá, descobre que alguns de seus

colegas não acreditam na sua versão, no seu ponto de vista de que Voldemort, de

fato, retornou e, inclusive, tem uma reação de raiva ao discutir com Simas, que

afirma que quase fora impedido de voltar para o ano escolar por falta de segurança,

devido à história que foi divulgada pelo jornal O Profeta Diário, jornal mais popular

do mundo bruxo, não proceder com o que realmente ocorreu: o jornal defende que

Voldemort não retornou, que a morte do garoto Diggory fora um acidente e que

Dumbledore não está em seu perfeito juízo).

A nova professora de Defesa Contra as Artes das Trevas, Dolores Umbridge, que

esteve presente em seu julgamento no Ministério da Magia e votara contra Harry

Potter ser livre de todas as acusações, também defende firme o lado de que Lord

Voldemort não retornou. Harry Potter, em sua aula, assume a posição querendo

defender fortemente seu lado, chegando a demonstrar raiva da dúvida da

professora.

Com o decorrer do ano letivo, a professora Umbridge instaura regras severas aos

estudantes de Hogwarts, suas aulas de Defesa Contra as Artes das Trevas não

envolviam prática, apenas teoria, e seus atos na escola estavam sendo

supervisados pelo Ministério da Magia. Parte dos estudantes fica insatisfeita com a

conduta da professora e decidem se unir a um grupo organizado por Rony Weasley

e Hermione Granger para que pudessem treinar feitiços e preparar-se para uma

possível luta futura com o inimigo. Os amigos pedem para Harry Potter comandar o

grupo, já que apresenta facilidade para realizar feitiços e por ter experiência contra

as artes das trevas. O garoto concorda, apesar de ainda se demonstrar irritado com

alguns colegas que não acreditam nele, e assim é formada a Armada de

Dumbledore.

Após um tempo, Harry Potter teve um sonho em que atacava um homem no chão

com muita agressividade:

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O sonho mudou.

Ele sentiu seu corpo liso, forte, flexível. Estava deslizando entre barras de metal brilhante, pela pedra fria e escura... colado no chão, deslizando de barriga... estava escuro... contudo podia ver objetos à sua volta que refulgiam em cores estranhas e vibrantes... ele estava virando a cabeça... ao primeiro relance via um corredor vazio... mas não...havia um homem sentado no chão mais adiante, o queixo caído sobre o peito, seu contorno brilhando no escuro...

Harry estirou a língua... provou o cheiro do homem no ar... estava vivo, mas atordoado... sentado à porta no fim do corredor...

Harry sentia vontade de morder o homem... mas precisava controlar o impulso... tinha coisa mais importante pra fazer...

O homem estava se mexendo... uma capa prateada caiu de suas pernas quando ele se pôs em pé; e Harry viu seu contorno vibrante e difuso elevar-se acima de sua cabeça, viu-o tirar uma varinha do cinto... não teve escolha... recuou ganhando altura do chão e atacou-o uma vez, duas, três, enterrando suas presas na carne do homem, sentindo as costelas se partirem sob suas mandíbulas, sentindo o sangue jorrar quente...

O homem gritou de dor... depois se calou... tombou de costas contra a parede... o sangue manchou o chão...

Sua cicatriz doía horrivelmente... parecia que ia se romper...

- Harry! HARRY!

Ele abriu os olhos. (ROWLING, 2003, p. 379-380)

Toda a violência que provocou ao homem, que identificou como Arthur Weasley, pai

de seu amigo Rony Weasley, fê-lo sangrar e sofrer. Posteriormente, Harry concluiu

que ele realizara o ataque em Arthur Weasley na forma de uma cobra. Harry Potter

insistiu ao dizer que o ocorrido não fora meramente um pesadelo, mas que fora real.

Assim, Dumbledore descobriu que o pai de seu amigo realmente sofrera um ataque

e que seria levado a um hospital. Tal episódio gerou uma reflexão pelos membros da

Ordem da Fênix, pois Harry Potter não estava vendo o ataque, vendo a cobra, ele

estaria realizando o ataque e ele era a cobra, assim, poderia estar sendo possuído

por Lord Voldemort.

Após retornar a Hogwarts, Harry Potter é indicado a realizar um procedimento

chamado Oclumência, que funcionaria como um treino para aprender a evitar que

Voldemort entrasse em sua mente. Nestas aulas, Snape penetraria por meio de um

feitiço nas memórias de Harry Potter e o garoto teria de tentar combater este ataque.

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Em uma das reuniões da Armada de Dumbledore, a professora Umbridge descobre

a organização estudantil após a aluna Marieta Edgecombe delatar o grupo. A

professora, então, ordena uma sentença de prisão a Dumbledore, pois acredita que

ele está conspirando contra ela. Harry Potter tenta, ainda assim, resolver o assunto,

porém Dumbledore insiste em deixar Hogwarts para que os alunos não sofressem a

culpa. Dessa forma, Dolores Umbridge assume a direção da escola.

Em um dado momento, Harry Potter está realizando um exame institucional e

adormece, tendo mais uma visão. Nesta, vê Sirius Black no Ministério da Magia

sendo ameaçado por Voldemort, exige que Black entregue algo a ele e o força com

uma maldição da tortura. Hermione Granger, a princípio, acredita que o inimigo

manipulou a visão de Harry Potter, mas o garoto insiste em ter que fazer algo.

Após tentar escapar de Hogwarts e ser pego pela professora Umbridge, Hermione

Granger bola um plano que os levam para a Floresta Proibida, onde o irmão de

Hagrid, o gigante Grope ajuda para que fossem liberados para sair de Hogwarts

enquanto a professora estava sob custódia de centauros. Assim, escapam com

testrálios para Londres rumo ao Ministério da Magia, onde, supostamente, Sirius

Black estaria.

Ao chegar ao Ministério da Magia, Harry Potter e os colegas que foram junto

dirigem-se ao Departamento de Mistérios e entram na Sala das Profecias. Lá,

encontra uma esfera de vidro, uma profecia, com o seu nome. Nesse momento,

Comensais da Morte surgem na sala e exigem que Harry Potter entregue a profecia.

O grupo que está com o garoto luta bravamente contra os seguidores de Voldemort,

porém a esfera pertencente a profecia de Harry Potter se quebra. Junto ao grupo de

alunos também está Sirius Black, que surgiu para tentar resgatar os garotos. Harry

Potter, então, ao tentar encaminhar seus colegas para um local onde estivessem a

salvo, vê que a bruxa Bellatrix Lestrange, ao estar lutando com Sirius Black, atinge-o

com a maldição da morte.

Em seguida, Dumbledore chega ao local e Voldemort aparece. Os dois bruxos

instauram um duelo violento por meio de feitiços e produção de armadilhas um

contra o outro, Dumbledore o fez para defender Harry Potter, e Voldemort desejaria,

assim, conquistar a profecia retirada da Sala das Profecias e também atingir o

garoto. Infeliz no duelo, Voldemort desaparece.

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Logo após, Harry Potter sente sua cicatriz estourar como nunca antes, a dor é

imensurável, sente como se uma criatura o estivesse envolvendo como se fossem

um só e, naquele momento, sentiu como se Voldemort estivesse em si próprio.

Desejou arduamente morrer para cessar aquela dor. Aquele sofrimento passou ao

ver uma imagem de Sirius Black em sua mente. Após esse ocorrido, o ministro da

magia chega ao local e se espanta ao ver Dumbledore e Harry Potter extremamente

abatido. Fica impressionado ao constatar que ali estava o Lord das Trevas, uma vez

que defendia a versão de que o mesmo não havia retornado.

Após retornar a Hogwarts, Harry Potter junta-se a Dumbledore para compreender o

ocorrido. O garoto demonstra muita raiva, estava angustiado e abalado com a morte

de seu padrinho, queria que aquilo tudo acabasse. Dumbledore, então, revela a

Harry Potter o que continha na profecia que fora perdida: a única pessoa que

poderia derrotar Voldemort seria um menino nascido no fim do mês de julho de

dezesseis anos anteriores, cujos pais teriam lutado contra o bruxo anteriormente.

Dessa forma, haveria, assim, duas opções: Harry Potter ou Neville Longbottom,

porém Dumbledore acreditou que Harry Potter fora o escolhido pela marca de

violência deixada no garoto, sua cicatriz em forma de raio, que seria um ligamento

entre os dois. No final, a profecia dizia que um teria de matar ao outro para

sobreviver:

“Aquele com o poder de vencer o Lorde das Trevas se aproxima... nascido dos que o desafiaram três vezes, nascido ao terminar o sétimo mês... e o Lorde das Trevas o marcará como seu igual, mas ele terá um poder que o Lorde das Trevas desconhece... e um dos dois deverá morrer na mão do outro, pois nenhum poderá viver enquanto o outro sobreviver... aquele com o poder de vencer o Lorde das Trevas nascerá quando o sétimo mês terminar...”. (ROWLING, 2003, p. 679)

Neste quinto volume de Harry Potter, notamos que o garoto está passando por uma

fase de autoconhecimento: ele passa por fases do crescimento, como ter que refletir

sobre sua futura carreira profissional, ter que se dedicar aos estudos para atingir um

bom nível nos exames, ter o primeiro envolvimento amoroso com uma garota da

escola. Além disso, este autoconhecimento também está na forma com que Harry

59

Potter olha para si mesmo, pois compreende que ele também possui as

características de Voldemort.

Nota-se, também, que neste volume da saga, Harry Potter demonstra-se com ira em

vários momentos, podendo ainda ser ressaltada como uma característica peculiar

que também apresenta seu inimigo. Em parte destes momentos em que sente raiva,

esta parece ser sentida de forma incontrolável, involuntariamente. No texto de J. K.

Rowling, esses momentos de ira são demarcados, inclusive, por letras maiúsculas.

Tais acontecimentos permitem compreender que Harry Potter está passando por

uma crise de identidade, pois está debatendo contra si mesmo as transformações

pelas quais está passando, ele deseja compreender o que está acontecendo, ele

não sabe mais quem é. Suas características estão em transformação, ele descobre

coisas e fatos novos que comprometem o seu eu.

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2. PENSEIRA

– Isso? Chama-se Penseira, às vezes eu acho, e tenho certeza de que você conhece a sensação, que simplesmente há pensamentos e lembranças demais enchendo minha cabeça.

– Hum – fez Harry, que não podia realmente dizer que já tivesse sentido nada igual.

– Nessas ocasiões – continuou Dumbledore indicando a bacia de pedra – uso a Penseira. Escoo o excesso de pensamentos da mente, despejo-os na bacia e examino-os com vagar. Assim fica mais fácil identificar padrões e ligações, compreende, quando estão sob esta forma.

– O senhor quer dizer... que isso aí são os seus pensamentos? – disse Harry, olhando a substância branca que redemoinhava na bacia.

– Sem dúvida. Deixe-me mostrar. (ROWLING, 2001, p. 475).

61

2.1 O feitiço do cinema

O primeiro filme da série Harry Potter foi lançado em 2001, mais de um século após

os primeiros passos que desenvolveram a linguagem cinematográfica do modo que

o conhecemos hoje em dia. Aqui nos é importante compreender este percurso pelo

qual o cinema passou até o contexto atual, em que a série cinematográfica de

Rowling foi inserida.

O cinema vivenciou várias mudanças desde as primeiras ideias de que o poderia vir

a se tornar e continua, atualmente, em transformações constantes. Vale ressaltar,

entretanto, que a origem do cinema deu-se por conta de importantes passos de

descobertas e necessidades do homem em séculos anteriores.

Precedente aos inventos modernos do homem para o registro de imagens e

movimentos, o homem primitivo tinha a necessidade de fazer seus registros

cotidianos, porém com uma limitação de recursos ou instrumentos que pudessem

auxiliar o homem para realizá-lo.

Na pré-história, o homem utilizava as paredes de grutas e cavernas para realizar

seus registros. Apesar de serem elementos muito simples, com pouca diversidade

de cores, formas, detalhes, é possível identificar, na grande maioria, figuras de

animais e de pessoas. Muito ainda é questionado a respeito da significação destes

elementos, mas acredita-se que essas gravuras e pinturas rupestres representam a

cultura dos homens daquela época, as atividades que realizavam em seus

cotidianos, como a caça, rituais etc.

Esses registros de ações de movimentos era possível graças à configuração das

imagens distribuídas nas paredes com a luz e sombras dentro das cavernas. Aqui há

a primeira necessidade de o homem gravar algo, ainda que somente pelo uso de

imagens.

A respeito, Wachtel reflete:

os artistas do Paleolítico tinham os instrumentos do pintor, mas olhos e a mente do cineasta. Nas entranhas da terra, eles construíam

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imagens que parecem se mover, imagens que 'cortavam' para outras imagens ou dissolviam-se em outras imagens, ou ainda podiam desaparecer e reaparecer. (1993, p. 140).

Posteriormente, as pinturas do antigo Egito ganhavam formas por esculturas e

ilustrações bidimensionais. Os traços dos desenhos eram mais bem definidos, havia

diversidade nas cores e formas, os elementos apresentavam simetria. As pinturas,

distribuídas em espaços arquitetônicos importantes para aquela civilização, tinham o

caráter simbólico, remetendo ao plano místico da pós-morte.

Com a mesma necessidade de gravar eventos e atividades cotidianas e culturais,

outros povos também deixaram seus registros, cada qual com suas características e

peculiaridades. Assim, o povo antigo que habitou a ilha grega de Creta deixou para a

humanidade um grande sítio arqueológico com diversos afrescos, ou seja, gravuras

em gesso, nas paredes, que apresentavam uma antiga civilização em atividades

com animais.

Outro registro antigo que merece destaque é a Tapeçaria de Bayeux, que mostra

não apenas um evento específico, mas um episódio da Normandia do século XI. As

imagens no grande tapete narram o período histórico da Batalha de Hastings, que

cravou uma luta pelo poder entre o exército franco-normando de Guilherme II e o

exército inglês do rei Haroldo II. A tapeçaria não apenas ilustra o episódio da

batalha, mas o seu prelúdio e prólogo.

63

Imagem 18: Visitantes no Musée de la Tapisserie de Bayeux, onde a Tapeçaria de Bayeux se encontra na Normandia. Nota-se a disposição das imagens na tapeçaria como uma narrativa. Disponível em: https://bordadologia.files.wordpress.com/2014/10/bayeux-tapestry-museum-

bordadologia-002.jpg. Acesso em 11.05.2016.

Imagem 19: Extrato da Tapeçaria de Bayeux. Disponível em:

https://bordadologia.files.wordpress.com/2014/10/tapec3a7aria-bayeux-histc3b3ria-bordadologia-006.jpg. Acesso em 11.05.2016.

Se compararmos a parâmetros atuais, a Tapeçaria de Bayeux aproxima-se ao que

conhecemos como storyboard no cinema, um conjunto de cenas que compõem uma

narrativa por meio de uma sequência de imagens, geralmente utilizadas para pré-

visualizar um filme. A seguir temos um fragmento do storyboard original, ainda em

64

fase de desenho, do quinto filme da saga Harry Potter, ilustrando a primeira cena do

longa:

Imagem 20: Modelo de storyboard da primeira cena do filme Harry Potter e a Ordem da Fênix.

Disponível em: https://samturner01.files.wordpress.com/2014/10/fullsizerender.jpg. Acesso em 11.05.2016.

É importante ressaltar, novamente, a necessidade que o homem tinha (e mantém

até hoje) de registrar a realidade, ou seja, o cotidiano, a cultura e para fins de

entretenimento e que, com o passar dos anos, os recursos e instrumentos para

realizar estes registros sofreram alterações, porque a necessidade do homem foi

ficando maior, ainda mais com a procura de não realizar registros e formas

narrativas totalmente estáticas, mas com movimentos e dinamicidade.

Carrière traz uma reflexão que nos permite compreender um dos propósitos do

cinema:

65

Inicialmente, o que surpreendia as pessoas quanto ao cinema era a capacidade deste de reproduzir a realidade. [...] No cinema, tudo parece simples. Para descrever, basta fazer a câmera funcionar.

Mas para descrever o quê? A realidade? Uma imagem achatada da realidade? [...] Na qual a realidade é peneirada por uma rede de palavras, não é mais densa, profunda e, afinal, mais palpável, do que uma vagarosa panorâmica sobre os objetos? (2014, p. 170)

Compreendendo o cinema como uma forma de representação da realidade, logo

entendemos que essa é uma forma de registro da realidade, e uma manifestação

e/ou representação artística, que o homem desenvolveu com a ajuda de recursos,

máquinas especiais que foram sendo descobertas e incrementadas com a evolução

da tecnologia de cada época. Estes recursos podem ser apontados mesmo na

época pré-cinema, conforme explicita Machado:

A história da invenção técnica do cinema não abrange apenas pesquisas científicas de laboratório ou investimentos na área industrial, mas também um universo mais exótico, onde se incluem ainda o mediunismo, a fantasmagoria ([...] projeções[...]), várias modalidades de espetáculos de massa, os fabricantes de brinquedos e adornos de mesa [...] (1997, p. 15).

Um dos fundamentos mais antigos que podemos compreender como precursor do

cinema dá-se com a antiga cultura oriental de jogo de sombras, tratando-se de

projeções sobre as paredes que consistiam de recortes manipulados, postos em

oposição a um foco de luz, como uma lamparina ou fogueira. As pessoas que

geralmente conduziam, propunham algum tipo de narrativa que acompanhasse as

figuras projetadas.

Na mesma ideia de projeção sobre superfície que no século XV Leonardo da Vinci

idealizou o desenvolvimento da caverna de Platão em Câmara Escura, porém foi

Della Posta, no século seguinte, que divulgou estes princípios. Segundo A República

de Platão, o mito da caverna é baseado na captação da existência do mundo

sensível e do mundo conhecido pela razão. Nesta, homens nascidos prisioneiros

66

veem projeções das paredes das cavernas em que moram geradas a partir de uma

fogueira e com estas sombras acabam por gerar e refletir sobre situações.

Lo Duca articula a questão da caverna de Platão na história do cinema salientando

também o teatro de sombras:

[...] a caverna de Platão em câmara escura – Platão descreve perfeitamente uma sala de projeção de sombras chinesas. Surgiu até que reduzisse a um buraquinho a abertura em seu antro [...] Platão, desenvolvendo seu fundo da caverna, teria obtido um filme gigantesco. (LO DUCA, 1949, p. 06)

A Câmara Escura consistia de uma caixa com uma abertura circular pequena

coberta por uma lente. Por esta abertura passava-se os raios produzidos por objetos

exteriores. Dentro dessa câmara, assim, eram projetadas as imagens invertidas na

realidade.

Foi com a contribuição de Athanasius Kirchner, no século XVII, que o oposto foi

desenvolvido: as projeções passaram a ser realizadas do lado de fora da caixa a

partir de uma vela inserida em seu interior que emitia luz a uma lâmina de vidro com

imagens desenhadas. Conhecemos esse mecanismo como Lanterna Mágica.

Com a chegada do século XIX vários inventores desenvolveram novas máquinas

que permitiam novos recursos de projeções e movimentação de imagens. Ainda

nesse século a fotografia é elaborada, sendo a primeira da história registrada em

1826 por Joseph Nicéphore Niépce, com exposição ao sol de 6 a 8 horas. Com o

decorrer dos anos, esse tempo de exposição foi reduzindo e ao final daquele século,

em 1888, George Eastman desenvolve o primeiro aparelho fotográfico a filme,

permitindo maior acesso à população.

Em 1832 Plateau desenvolve um mecanismo, chamado de Fenacitoscópio, que,

quando em movimentos circulares, dá a ilusão de ótica de que a imagem inserida

em seu interior está em movimento, promovida pela sucessão de imagens que

decorrem uma ação.

67

Em 1877 Émile Reynaud apresenta o Praxinoscópio, uma máquina circular com

imagens em seu interior e uma série de espelhos em seu centro e que, quando em

movimento, promove uma ilusão de ótica que faz parecer que as imagens estão

sendo sucedidas.

Outro passo que merece destaque é o desenvolvimento do Fuzil Fotográfico por

Étienne-Jules Marey disposto ao longo de uma pista de corrida, disparando

sucessivamente 24 disparos consecutivos de 24 máquinas diferentes, formando

fotografias que registram a ação dos movimentos.

O Cinetoscópio de Thomas Edison (1890) e o Cinematógrafo dos irmãos Lumière

(1895) marcaram o fim do século XIX. O primeiro tinha um visor individual,

permitindo somente um espectador por vez, exibia uma tira de filmes em looping em

seu interior. Edison realizou a produção destes pequenos filmes para exibir em sua

máquina dentro de um pequeno estúdio que ficou conhecido como o primeiro da

história do cinema do mundo, conhecido como Black Maria. O Cinematógrafo fazia

os filmetes e ganhou ampla divulgação. Os irmãos Lumière eram negociantes e

fizeram publicidade do que sua máquina era capaz de produzir, fazendo com que

em 28 de dezembro de 1895, data de demonstração para o público, ganhasse

destaque.

Sabendo das transições pelas quais vários recursos foram desenvolvidos e

aprimorados para que chegassem ao cinema mais próximo do que conhecemos

hoje, compreendemos que não houve um único precursor ou responsável, conforme

ressalta Mascarello:

Não existiu um único descobridor do cinema, e os aparatos que a invenção envolve não surgiram repentinamente num único lugar. Uma conjunção de circunstâncias técnicas aconteceu [...] vários inventores passaram a mostrar os resultados de suas pesquisas na busca da projeção de imagens em movimento [...]. (2013, p. 18).

Com a repercussão dos acontecimentos promovidos pelo invento dos irmãos

Lumière, novos olhares foram se atentando para a novidade, e um dos destaques é

George Mèliés. Lo Duca (1949, p. 16) coloca-nos o seguinte ponto: “Com Lumière

68

nasceu o cinematógrafo. Com Mèliés nasce o espetáculo cinematográfico, o

cinema”.

Mèliés, mágico e encenador, ficou atraído pelo desenho, pela máquina e pela ideia

de espetáculo que a invenção proporcionava. Com centenas de filmes realizados,

muitas destas produções eram de caráter ficcional, apresentando criaturas e

mundos diferentes além de atmosferas que se aproximavam a do fantástico. A

estrutura de seus filmes aproximava-se a do teatro. Mèliés descobriu por acidente o

truque da substituição, o que contribuiu ainda mais para a inclusão de novos

espetáculos visuais para os espectadores juntamente com efeitos especiais

realizando durante as filmagens.

Conforme o aprimoramento das técnicas mais preliminares com a junção de outras

linguagens e culturas (como o teatro, atrações de feiras), a fonte de espetáculos foi

transformando-se até chegar a um patamar de manifestação artística. Mascarello

afirma, a respeito:

Os filmes teriam aos poucos superado suas limitações iniciais e se transformando em arte ao encontrar os princípios específicos de sua linguagem, ligados ao manejo da montagem como elemento fundamental da narrativa. (2013, p. 22).

No começo do século seguinte, alguns estúdios de filmes foram instalando-se. A

área conhecida hoje em dia por Hollywood, localizada em Los Angeles, Califórnia,

era na época muito barata e permitiu o crescimento abundante destes estúdios,

incluindo Fox, Universal, Paramount, The Walt Disney Company, que, mais à frente,

ganharia destaque com filmes de animação que chamou a atenção especialmente

do público infantil; e da Warner Bros.

A Warner Bros, companhia que nos anos 2000 proporcionou a adaptação dos filmes

de Harry Potter fora fundada em 4 de abril de 1923 pelos irmãos poloneses e judeus

Albert, Sam, Harry e Jack Warner, que já haviam aberto seu primeiro cinema em

1903.

69

Com a chegada da década de 1920, novos gêneros de filmes foram surgindo, como

o western, policial, comédia, entre outros. Com a força do crescimento dos estúdios

de Hollywood um novo fenômeno surgiu, o star system, ou seja, a sistematização de

estrelas, de modelos que encantavam os espectadores, fabricando, assim, estrelas

de cinema.

Até o começo dos anos 1930, o cinema ganhou força também na Europa, sendo

influenciado pelas vanguardas predominantes de cada lugar: o cinema francês foi

marcado pelo impressionismo, o alemão pelo expressionismo e o espanhol pelo

olhar surrealista.

A época ainda foi marcada pela chegada da era do som no cinema, com o

aprimoramento do recurso da sincronização junto à imagem. Com a chegada do

som um novo gênero surgiu e ganhou destaque: o musical. A Warner Bros.

conseguiu a partir da sincronização dos sons inserir alguns diálogos em seus filmes,

sendo o pioneiro o filme The Jazz Singer (1927).

A década de 1950 ficou marcada pela popularização da televisão e esta expansão

contribuiu para uma substituição dos meios para entretenimento, ou seja, a

população agora recorria à televisão para o lazer e para a informação. Com o tempo,

houve uma predominante crise nos estúdios de Hollywood por influência, além da

atenção dos mais jovens pelo cinema – o que aumentou a frequência destes nas

salas, pela substituição do cinema. Mascarello sintetiza essa informação:

Se na década de 1950 o cinema fora substituído pela TV como principal fonte de entretenimento nos EUA, na de 1960, a própria ida ao cinema sofre profundas alterações, com destaque para dois efeitos do processo de suburbanização da classe média – a obsolescência das salas das grandes cidades e o estabelecimento do circuito drive-in (que irão aprofundar o fenômeno da juvenilização das audiências) – e para a consolidação do espaço mercadológico do cinema de arte e ensaio. (MASCARELLO, 2013, p. 345).

Hollywood verificou uma presença maior do público juvenil nas salas de cinema e os

estúdios viram, assim, uma oportunidade de investir naqueles jovens de uma

70

geração de uma frente pós-contracultura uma nova fonte de sobrevivência do

cinema. Então, no começo dos anos 1970, surge a aposta dos blockbusters.

Em inglês, block em tradução literal dá-se por blocos, buster em português podemos

dizer que remete à explosão. O termo blockbuster, assim, pode ser associado a

sucesso (remetido à explosão) que tomam blocos, quarteirões, logo, do ponto de

vista do mercado cinematográfico, filmes que fazem sucesso e dobram quarteirões

(blocos) devido à grande audiência.

Essa nova era de filmes superava questões de valores tanto em questões de

produção quanto em estratégias de marketing. Os filmes, mais elaborados, mais

divulgados e acessados pelo público promoveram ótimas bilheterias primeiramente

com filmes de temáticas catastróficas, a citar O destino do Poseidon (1972),

Terremoto (1974), entre outros.

Com a questão dos blockbusters em alta, três eventos merecem destaque: o

lançamento do filme Tubarão (1975) de Steven Spielberg, que investe fortemente na

questão da publicidade em massa, o filme Os Embalos de Sábado a Noite (1977) de

John Badham, que renova a possibilidade de mistura e da aproximação de filme com

música; e Star Wars (1977) de George Lucas, que investiu na criação dos chamados

filmes-franquia.

Segundo Mascarello (2013, p. 347), esses filmes-franquia têm uma característica

peculiar que marca a história do cinema: “dando início ao florescimento da indústria

de negócios conexos – intimamente associada [...] à prática das reprises ou

sequências.”.

Em parâmetros atuais, a frequência de filmes-franquia ainda é destaque no cinema.

Os filmes de Harry Potter, iniciados com Harry Potter e a Pedra Filosofal e baseados

nos sete livros de J. K. Rowling tiveram as sequencias dos volumes da obra literária

adaptadas, sendo assim, considerado um filme-franquia.

Além disso, do ponto de vista de sucesso de bilheteria, Harry Potter pode ser

considerado um blockbuster pelo lucro rendido e também houve um forte

investimento de marketing, especialmente depois do sucesso do primeiro longa da

série, tendo sido divulgado por diversos meios como televisão, revistas, jornais, além

da importante disseminação nas próprias salas de cinema com os comerciais,

71

trailers e pela exposição de pôsteres que promoviam o interesse e a curiosidade do

público.

O público juvenil é destaque com os filmes de Harry Potter. É o mesmo público que

permite que o fenômeno de livros Best Sellers adaptados para o cinema esteja

popularizando e ganhando força, especialmente a partir dos anos 2000. A citar como

exemplo temos As Crônicas de Nárnia – 2005, 2008 e 2010 –; sagas como Jogos

Vorazes – 2012, 2013, 2014 e 2015 –; Divergente – 2014, 2015, 2016 –; Percy

Jackson – 2010 e 2013 –; Desventuras em Série – 2004 –; a própria saga Harry

Potter, entre outras. Séries adaptadas dos quadrinhos como os da Marvel e da DC

Comics também recebem grande destaque pelo sucesso de bilheteria. A reprodução

do conteúdo literário em outra linguagem (no caso o cinematográfico) permite maior

acesso à população. É importante ressaltar novamente que estas obras

cinematográficas contribuem para o crescimento do número da formação de leitores,

uma vez que, com o interesse pelo filme, os jovens podem buscar a forma que

originou aquela estória que assistiram, seja romance, quadrinho ou game.

Os exemplos citados anteriormente, entre outros, são também exemplos de atuais

blockbusters não apenas pela questão do conteúdo, mas visam também o sucesso

de bilheteria, modo de promoção, o grande investimento das produtoras para que o

filme se concretize.

Em relação à rotina cultural dos brasileiros, segundo a Pesquisa Nacional sobre

Hábitos Culturais feita pela Fecomércio RJ e Ipsos4, em dezembro de 2015, foi

demonstrado que as pessoas que não realizam programas de lazer cultural

passaram a frequentar mais os cinemas, essa porcentagem da população cresceu

100% nos últimos oito anos (de 17% para 35% dos brasileiros que não possuem

hábitos cultuais). O motivo principal, ressaltado pela pesquisa, deste "não consumo"

de bens cultuais se dá, justamente, pela falta de hábito.

Dos brasileiros que frequentam as salas de cinema atualmente, foi apontado pelo

Ipobe, em fevereiro de 2016 (pesquisa realizada entre 2014 e 2015), que 68% dos

espectadores têm preferência e costumam assistir com frequência filmes do gênero

4 Disponível em http://empreendedor.com.br/noticia/pesquisa-revela-habitos-culturais-dos-brasileiros, com acesso em 02.12.2016.

72

de ação ou aventura, seguido por filmes de comédia (50%), animações (28%),

comédias românticas (27%) e ficção científica (25%).

Imagem 21: Gráfico da pesquisa feita pelo Ibope sobre as preferências de gênero de filmes dos

brasileiros. Disponível em: http://arte.folha.uol.com.br/graficos/3Ux6L/?w=620&h=455. Acesso em 02.12.2016.

Por fim, mesmo após o lançamento do sétimo livro em 2007 e do oitavo e último

filme em 2011 a saga Harry Potter mantém-se recorrente no contexto cultural de

pessoas de diferentes idades. Além do conteúdo, os livros e os filmes, hoje há

muitas páginas sobre o tema na internet, em redes sociais e também nas livrarias.

Espectadores podem ter acesso aos filmes por meio de programas de assinatura

online para exibição de filmes e séries (como a rede Netflix). A saga possibilita a

geração de novos produtos e também a sua adaptação para outros meios onde os

ambientes relatados nas narrativas, tanto na literatura quanto nos filmes, são

recriados.

73

2.2 Harry Potter no mercado cinematográfico

David Heyman, produtor cinematográfico, havia concordado em ler o manuscrito

ainda não publicado de Harry Potter e a Pedra Filosofal em 1997 devido a sugestões

de sua assistente. Ainda no mesmo ano, entrou em contato com a Warner Bros. e

conseguiu um acordo para negociações dos direitos autorais de Harry Potter para

que a narrativa de J. K. Rowling fosse adaptada para o cinema.

Em 2000, após a recusa de vários roteiristas em produzir um roteiro adaptado da

obra de Rowling, cujo primeiro volume da série circulava em sua primeira edição

ainda sem muita popularidade, o profissional foi escolhido, bem como diretor que

estaria responsável por apresentar a história de Harry Potter para o mundo

cinematográfico.

Cerca de 50 diretores demonstraram interesse inicial para dirigir o primeiro longa da

série, incluindo Steven Spielberg, entretanto o diretor escolhido foi Chris Columbus

que possuía uma visão de direção voltada mais para o lado familiar, seus filmes

destinados ao público infanto-juvenil (a citar: Esqueceram de Mim, Uma Babá Quase

Perfeita) possuem uma linguagem próxima ao público, o que, na época, buscavam

para a adaptação de Harry Potter.

Segundo o site inglês imdb.com 5 , Harry Potter e a Pedra Filosofal teve um

orçamento próximo a U$125.000.000,00 e rendeu no primeiro final de semana em

sua estreia em novembro de 2001 cerca de £16.335.627 (aproximadamente

U$23.500.000,00).

Com o passar dos anos e das adaptações dos volumes seguintes, a série em sua

forma cinematográfica, totalizando oito filmes (em vista que o sétimo e último livro foi

adaptado para os cinemas em duas partes) teve quatro diretores, além de Chris

Columbus que dirigiu os dois primeiros longas, dentre eles Alfonso Cuarón, diretor

mexicano com uma visão bastante diferente e uma linguagem menos infantil e mais

5 Plataforma online originária do Reino Unido que aborda conteúdos de cinema e televisão

com dados oficiais. Hoje conta com a tradução para outros idiomas e está disponível também de modo mobile em forma de aplicativos para smartphones, facilitando o acesso para seus usuários. A plataforma, hoje pertencente ao grupo da Amazon, também está disponível através de redes sociais.

74

obscura, Mike Newell e David Yates, responsável pelos quatro últimos filmes da

franquia.

De acordo com o imdb.com (online, 2016), juntando todos os valores, a série em oito

filmes de Harry Potter custou cerca de U$1.280.580.000,00. O lucro com o primeiro

final de semana de exibição de cada filme arrecadou aproximadamente

U$335.200.000,00 e teve uma arrecadação bruta próxima aos U$7.667.305.000,00

por todo o mundo.

A série cinematográfica de Harry Potter ganhou proporções grandiosas, não sendo

apenas produções simples do cinema inglês, recebendo reconhecimento por

Hollywood. Ao todo, os filmes de Harry Potter foram indicados a 12 Oscars nas

categorias técnicas, porém não recebeu os prêmios, e também em vários BAFTA

Film Awards.

O sucesso que atingiu os filmes de Harry Potter incluem os longas no decorrer da

lista com 100 primeiros filmes no ranking mundial de maiores bilheterias da história

do cinema divulgada pelo site boxofficemojo.com6.

Imagem 22: Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte 2 na 8ª posição no ranking mundial de bilheterias. Disponível em: http://www.boxofficemojo.com/alltime/world. Acesso em 25.04.2016.

6 O site americano divulga a lista atualizada diariamente do ranking mundial de bilheterias do cinema. A empresa Amazon é proprietária da plataforma online.

75

Imagem 23: Harry Potter e a Pedra Filosofal na 26ª posição e Harry Potter e as Relíquias da Morte –

Parte 1 na 29ª posição no ranking mundial de bilheterias. Disponível em: http://www.boxofficemojo.com/alltime/world. Acesso em 25.04.2016.

Imagem 24: Harry Potter e a Ordem da Fênix na 32ª posição, Harry Potter e o Enigma do Príncipe na

34ª posição, Harry Potter e o Cálice de Fogo na 38ª posição e Harry Potter e a Câmara Secreta na 42ª posição no ranking mundial de bilheterias. Disponível em:

http://www.boxofficemojo.com/alltime/world. Acesso em 25.04.2016.

76

Imagem 25: Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban na 55ª posição no ranking mundial de bilheterias. Disponível em: http://www.boxofficemojo.com/alltime/world. Acesso em 25.04.2016.

A tabela a seguir, baseada no mesmo site (online – acesso em 25.04.2016) mostra

uma relação de algumas das principais sagas cinematográficas e suas respectivas

posições no ranking mundial de bilheterias (entre as 100 primeiras colocações):

77

Star Wars Episódio VII: O Despertar da Força (2015) – 3ª posição

Star Wars Episódio I: A Ameaça Fantasma (1999) – 22ª posição

Star Wars Episódio III: A Vingança dos Sith (2005) – 50ª posição

Star Wars Episódio IV: Uma Nova Esperança (1977) – 62ª posição

Star Wars Episódio II: O Ataque dos Clones (2002) – 97ª posição

Os Vingadores (2012) – 5ª posição

Os Vingadores: Era de Ultron (2015) – 7ª posição

Homem de Ferro 3 (2013) – 10ª posição

O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei (2003) – 13ª posição

O Senhor dos Anéis: As Duas Torres (2002) – 37ª posição

O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel (2001) – 45ª posição

Jogos Vorazes: Em Chamas (2013) – 47ª posição

Jogos Vorazes: A Esperança - Parte 1 (2014) – 69ª posição

Jogos Vorazes (2012) – 86ª posição

Jogos Vorazes: A Esperança - Parte 2 (2015) – 96ª posição

007: Skyfall (2012): 14ª posição

007: Spectre (2015): 42ª posição

O Hobbit: Uma Jornada Inesperada (2012) – 24ª posição

O Hobbit: A Desolação de Smaug (2013) – 32ª posição

O Hobbit: A Batalha dos Cinco Exércitos (2014) – 33ª posição

A Saga Crepúsculo: Amanhecer - Parte 2 (2012) – 52ª posição

A Saga Crepúsculo: Amanhecer - Parte 1 (2011) – 79ª posição

78

Ainda sobre ranking de bilheterias, a Forbes Brasil 7 inclui a série Harry Potter como

uma das franquias de filmes que mais arrecadaram na história do cinema. Os filmes-

franquia tornaram-se populares a partir dos anos 1970, com a expansão de filmes

considerados blockbusters, como Star Wars e Tubarão, lançados nesta época. Com

o passar dos anos, o número de blockbusters cresceu, incluindo o fato de novos

filmes adaptados de grandes BestSellers literários e também de quadrinhos

internacionalmente populares. Nesta lista, a saga Harry Potter está posicionada em

2º lugar, ficando atrás apenas dos filmes da franquia Marvel, que adapta histórias

em quadrinhos, estando junto com outras grandes franquias do cinema como 007, O

Hobbit, entre outros.

7 Revista conceituada de negócios e economia mundial.

A Saga Crepúsculo: Lua Nova (2009) – 81ª posição

A Saga Crepúsculo: Eclipse (2010) – 83ª posição

Transformers (2007) – 82ª posição

Transformers 2: A Vingança dos Derrotados (2009) – 51ª posição

Transformers 3: O Lado Oculto da Lua (2011) – 12ª posição

Tranformers 4: Era da Extinção (2014) – 15ª posição

79

Imagem 26: Harry Potter na 2ª posição no ranking de maiores franquias do cinema. Disponível em: http://www.forbes.com.br/listas/2015/08/15-franquias-do-cinema-que-mais-arrecadaram-ate-

hoje/#foto2. Acesso em 13.03.2016.

Lembrando-se do importante fato de que a produção cinematográfica de Harry

Potter adaptou a série literária de J. K. Rowling, ressalta-se o momento em que a

franquia foi inserida no mercado cinematográfico. Com os anos 2000, o cinema

apostou em diversas sagas literárias infanto-juvenis que se tornaram mundialmente

BestSellers para adaptação para o cinema. Dentre as outras, além de Harry Potter,

podemos citar a saga Crepúsculo, de Stephanie Meyer; a trilogia Jogos Vorazes, de

Suzanne Collins; O Hobbit, de Tolkien; As Crônicas de Nárnia, de C. S. Lewis; Alice

80

no País das Maravilhas, de Lewis Carroll; Percy Jackson, de Rick Riodan; a saga

Divergente, de Veronica Roth dentre outras.

Uma lista também feita pela Forbes Brasil revela quatro filmes da série Harry Potter

entre as 10 maiores bilheterias de livros que viraram filmes.

Imagem 27: Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte 2 em 1º lugar no ranking de adaptações

literárias de maior bilheteria de todos os tempos. Disponível em: http://www.forbes.com.br/listas/2015/09/10-maiores-bilheterias-de-livros-que-viraram-filmes/#foto1.

Acesso em 13.03.2016.

81

Imagem 28: Harry Potter e a Pedra Filosofal em 6º lugar no ranking de adaptações literárias de maior bilheteria de todos os tempos. Disponível em: http://www.forbes.com.br/listas/2015/09/10-maiores-

bilheterias-de-livros-que-viraram-filmes/#foto6. Acesso em 13.03.2016.

82

Imagem 29: Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte 1 em 8º lugar no ranking de adaptações

literárias de maior bilheteria de todos os tempos. Disponível em: http://www.forbes.com.br/listas/2015/09/10-maiores-bilheterias-de-livros-que-viraram-filmes/#foto8.

Acesso em 13.03.2016.

83

Imagem 30: Harry Potter e Ordem da Fênix em 10º lugar no ranking de adaptações literárias de maior bilheteria de todos os tempos. Disponível em: http://www.forbes.com.br/listas/2015/09/10-

maiores-bilheterias-de-livros-que-viraram-filmes/#foto10. Acesso em 13.03.2016.

84

2.3 A Ordem da Fênix no mercado cinematográfico

A adaptação do quinto volume da série Harry Potter começou a ser filmada em

fevereiro de 2006 por David Yates, que enfrentaria o grande desafio de adaptar o

livro mais longo da saga (na primeira edição brasileira, o livro atinge 702 páginas, na

americana 870 e na britânica 900), e possivelmente o mais detalhado até então e

que continha partes necessárias para o entendimento da narrativa posteriormente.

Yates adaptou o quinto volume em um filme de duas horas e dezoito minutos, o filme

da série de menor duração até então, optando por reduzir passagens que não

interfeririam na compreensão da história para os espectadores, também realizou

junções de elementos que possibilitaram uma experiência plena do universo do

quinto livro de Rowling. O diretor buscou desta maneira, não comprometer uma

narrativa longa e detalhada e também agradar os fãs da série.

O longa fora anunciado para estrear em 13 de julho de 2007. Com a repercussão e

expectativas dos fãs da saga para o novo filme, a Warner Bros. decidiu, de modo

excepcional, alterar a data do lançamento de Harry Potter e a Ordem da Fênix no

mundo todo.

Com menos de um mês para a chegada do filme nos cinemas, mesmo com toda a

divulgação de pôsteres, comerciais, teasers e trailers para cinema e televisão, a data

de estreia passou para o dia 11 de julho de 2007.

A data escolhida marcaria dez dias para o lançamento do sétimo e último livro da

saga na Inglaterra e nos Estados Unidos. Harry Potter e as Relíquias da Morte

chegaria às livrarias no dia 21 de julho do mesmo ano. Os fãs foram, então,

bombardeados por divulgações do lançamento do novo livro e também do novo

filme. Na época, inclusive no Brasil, o surgimento e lançamento de produtos

derivados da série surgiram nas mais diversas prateleiras, tais como álbum de

figurinhas do quinto filme, materiais escolares, revistas e almanaques colecionáveis

sobre a série, entre outros.

Mesmo com a alteração da data do lançamento do filme, Harry Potter e a Ordem da

Fênix arrecadou, de acordo com o imdb.com (online, 2016), em seu primeiro final de

85

semana, um valor estimado de £16.493.305,00 (aproximadamente

U$32.000.000,00), valor superior a todos os filmes da série lançados até então em

suas respectivas datas de estreia. Com o orçamento inicialmente cotado em

aproximadamente U$150.000.000,00, o filme lucrou, no total e no mundo todo, um

valor bruto de cerca de U$937.000.866,00.

Em visões atuais, o filme Harry Potter e a Ordem da Fênix atingiu 79% de críticas

positivas pelo Tomatometer8 do site rottentomatoes.com9, e, apesar de esta ser a

menor nota entre todos os filmes de Harry Potter pelo site americano, o longa atingiu

81% de votos positivos pelo julgamento da audiência geral da plataforma e ganhou o

selo Fresh dos críticos, apenas concedido aos filmes bem avaliados (acima dos 70%

pelo Tomatometer) no Rotten Tomatoes.

Imagem 31: Avaliação de Harry Potter e a Ordem da Fênix do site Rotten Tomatoes. Disponível em:

http://www.rottentomatoes.com/m/harry_potter_and_the_order_of_the_phoenix/. Acesso em 14.03.2016.

8 “Termômetro” do site rottentomatoes.com que demonstra a aprovação de um filme segundo críticos certificados por várias associações e aclamados de várias partes do mundo. 9 Site americano de propriedade da NBCUniversal e Warner Bros. que coleta opiniões online de críticos de cinema e televisão certificados por várias associações. O nome faz referência ao ato de atirar tomates em atrações não aprovadas pelo público.

86

2.4 Pôsteres da Ordem da Fênix

Pôsteres de filmes podem ser aproximados à capas de livros no sentido de que

formam um convite visual ao leitor, ou no caso espectador, a experimentar aquela

produção. Um pôster cinematográfico também poderá contar com alguns paratextos

verbais: nome do diretor, atores e atrizes principais, não somente como um

informativo, mas, dependendo da popularidade dos mesmos, também como uma

estratégia de chamar a atenção do público. Também poderão aparecer data e

lançamento, nome da distribuidora, caso o filme seja adaptado de alguma outra

mídia, como livros, o nome do autor também poderá aparecer (bem como

informativo ou estratégia).

Segue abaixo alguns dos principais pôsteres de Harry Potter e a Ordem da Fênix:

Imagem 32: Teaser pôster do filme Harry Potter e a Ordem da Fênix. Disponível em:

http://www.adorocinema.com/filmes/filme-58608/fotos. Acesso em: 14.12.2015.

87

Imagem 33: Pôster do filme Harry Potter e a Ordem da Fênix para os cinemas brasileros. Disponível

em: http://www.adorocinema.com/filmes/filme-58608/fotos. Acesso em: 14.12.2015.

Imagem 34: Pôster final do filme Harry Potter e a Ordem da Fênix para os cinemas brasileros. Disponível em: http://www.adorocinema.com/filmes/filme-58608/fotos. Acesso em: 14.12.2015.

88

Teaser pôster de Harry Potter e a Ordem da Fênix para os cinemas (Imagem 32)

O que chamamos de teasers, de acordo com Luzzi (2001) seriam um anúncio do

anúncio, ou seja, um teaser promove suspense anterior ao produto principal. No

caso dos teaser pôsteres, eles são lançados anteriormente aos pôsteres oficiais, que

são aqueles que ganham destaque nas salas de cinemas na época de exibição. Os

teaser pôsteres são marcados por elementos enigmáticos que aguçam a curiosidade

de público, podendo conter uma frase de efeito, uma única imagem, algum conceito

minimalista que represente uma parte do todo do filme etc.

O teaser pôster de Harry Potter e a Ordem da Fênix tem a predominância de um

fundo preto, do centro deste fundo surge Lord Voldemort, porém ele não está

simplesmente inserido neste fundo, ele brota dele. Sua capa também é preta, o que

permite também a mistura com esse fundo. Pela luz produzida pela varinha

conseguimos perceber que se trata do Lord das Trevas. A personagem não é

apenas retratada como uma fotografia, e sim é a personagem no momento de sua

ação, no momento em que está fazendo sua magia.

Lord Voldemort está observando o observador com o ar de como estivesse olhando

para seu inimigo, ou seja, o observador do pôster faz o papel de Harry Potter, o

observador está sendo encarado, como um convite ao enfrentamento. No caso, o

pôster promove um convite ao espectador a acompanhar o enfrentamento que esta

por vir no filme.

O foco é um contra plongeé, ou seja, Voldemort está sendo visto de cima, o que

valoriza ainda mais o seu poder, a sua maldade, a sua pessoa.

Há poucos elementos textuais no pôster, entre eles o título do filme, data de

lançamento, o site e os dizeres "Você perderá tudo", citação marcante em Harry

Potter e a Ordem da Fênix que Voldemort dirige a Harry Potter no momento em que

há um duelo entre eles na mente do garoto quando no Ministério da Magia. A frase,

como é dirigida ao garoto, no momento do pôster é dirigida ao observador, que é

instigado a partir do enfrentamento com o inimigo.

Esse teaser pôster cria um clima de mistério em torno dos elementos que o compõe,

que fazem com que o frequentador do cinema e futuro espectador daquele filme crie

89

expectativas e formule possíveis interpretações para compreender e solucionar os

mistérios criados a partir daquele pôster até que se possa assistir ao filme.

Toutain (2007, p. 92) articula essa possibilidade: “Este processo de captar,

representar e interpretar a informação é simultâneo, permanente, contínuo;

pressupõe um sistema de significação.”.

Quando os filmes geralmente são lançados nos cinemas são escolhidos alguns

pôsteres para ilustrarem as salas, indicando que aquele filme encontra-se ali em

exibição. A escolha desses pôsteres oficiais pode depender do país em que o filme

será exibido.

Primeiro pôster oficial de Harry Potter e a Ordem da Fênix para os cinemas (Imagem

33)

Esse primeiro pôster oficial do quinto longa adaptado da série Harry Potter possui

uma atmosfera diferente do teaser pôster, chama a atenção pelas cores, pela

presença do protagonista e de seus colegas de escola.

A presença de Rony e Gina Weasley, Hermione Granger, Neville Longbotton e Luna

Lovegood dão uma ideia de força: Harry Potter não está sozinho na busca de seu

objetivo, ele agora tem uma equipe consigo, a qual o ajudará em sua jornada e

todos terão a proteção de uns aos outros caso o mal, os bruxos das trevas, decidam

atacar.

O cenário é o Ministério da Magia, quando Harry Potter e seus colegas escapam de

Hogwarts para tentar resgatar Sirius Black, após o garoto ter sua mente invadida

pelo inimigo mostrando que estava mantendo seu padrinho como refém. Há luz por

trás e ao lado das personagens, porém não a luz vinda pela frente. A fotografia dá a

sensação de que o caminho vindo pela frente da equipe está escuro, o que remete

ao lado sombrio, perigoso, desconhecido, e também ás trevas de Lord Voldemort e

seus seguidores.

Esse jogo de luzes remete a ideia de que a luz acompanha a equipe de Harry Potter,

não somente por eles serem o bem, a luta contra as trevas, mas também remetem a

sabedoria que eles trazem pela instrução de seus professores mentores. O escuro é

90

o desconhecido que vem pela frente, o destino de cada um deles, impossível de

saber o que virá.

Harry Potter, porém, tem em suas mãos dois objetos que poderão ajudá-lo nesse

desconhecido: sua varinha, ou seja, sua arma de proteção pessoal, de proteção aos

seus colegas, que abrirá seu caminho e iluminará a escuridão, e também a profecia,

objeto que diz sobre seu futuro e o futuro do Lord das Trevas. Com a profecia em

mãos, há também o simbolismo de que Harry Potter está com o seu destino nas

mãos, que ele deverá cumprir o objetivo de derrotar o seu inimigo e livrar a nação

bruxa das trevas.

As personagens estão em um leve contra plongeé, o que traz a ideia de

enfrentamento, demonstrando que os mesmos têm coragem. O queixo de Harry

Potter e dos colegas está levemente para cima, como se estivessem encarando o

perigo, ressaltando ainda mais a ideia de determinação.

A frase “A rebelião vai começar” é uma amostra do conteúdo que está por vir no

filme. O espectador que assistiu ao filme anterior sabe das circunstâncias que o

garoto terá que enfrentar nesse quinto filme, porém ao dizer que haverá uma

rebelião, dará a ideia ao espectador de que um conjunto irá contra algo. No caso, a

rebelião acontecerá para desconstruir algo que já está constituído, o mal.

Pôster final de Harry Potter e a Ordem da Fênix para os cinemas (Imagem 34)

Vemos Harry Potter e sua equipe formada por seus colegas de Hogwarts, só que,

diferente do outro pôster oficial, anteriormente apresentado neste trabalho, as

personagens estão com suas vestes da escola. Simbolicamente, podemos dizer que

as roupas da escola podem ser comparadas a uma armadura, a um uniforme de

exército que dá igualdade a todos, mostrando que são uma legião de alunos que

buscam o bem e que defendem a “bandeira” que vestem: a bandeira da escola,

defendem seus colegas, a nova geração bruxa que luta contra o mal. Se levarmos

em consideração o contexto da narrativa desse quinto longa, essa legião de alunos

que se juntam para combater o mal são a chamada Armada de Dumbledore,

organizada por Hermione Granger e Rony Weasley para que Harry Potter ajude os

91

demais colegas a praticar para futuras possíveis lutas contra Lord Voldemort e seus

seguidores.

Também diferente do outro pôster oficial, as personagens não estão em um

momento da narrativa, mas estão inseridos numa fotografia, perceptível pelas

imagens sangradas.

Em primeiro plano enxergamos a principal arma de proteção de Harry Potter, sua

varinha. Além disso, seus colegas também estão com as varinhas a postos, prontos

para qualquer enfrentamento que esteja por vir.

Observamos aqui as personagens de baixo para cima, e o olhar de Harry Potter

ganha destaque pela seriedade que leva. A parte direita de seu rosto está

escurecida devido a falta de foco de luz: há iluminação aos lados e de trás. Se

pensarmos novamente no contexto da narrativa, sabemos que é um momento em

que Harry Potter está enfrentando uma crise de identidade, ele se questiona se está

pendendo para o lado das trevas após a reflexão de que tem muitas características

semelhantes ao seu inimigo. Essa parte “obscura” do rosto de Harry Potter pode

remeter ao outro lado que Harry Potter acredita que está dentro de si, o lado

sombrio, o lado das trevas. Por outro lado, a face esquerda do menino está

iluminada, já aproximando a ideia do bem, o lado que acredita de fato fazer parte e

pelo qual vale a pena lutar.

Em geral, pôsteres têm também o objetivo de promover um atrativo aos

espectadores, estimular as pessoas a querer assistir ao filme, a desvendar os

mistérios por trás de suas frases e imagens enigmáticas. Por esse conjunto de

elementos presentes nos pôsteres que podem influenciar o possível público-alvo,

ressalta-se Bakhtin:

Não se pode construir uma enunciação sem modalidade apreciativa. Toda enunciação compreende antes de mais nada uma orientação apreciativa. É por isso que, na enunciação viva, cada elemento contém ao mesmo tempo um sentido e uma apreciação. (BAKHTIN, 2012, p. 140).

92

Esse contato também permite que o espectador crie expectativas e busque as

respostas para os mistérios. Sobre isso, Morin reflete:

O espectador ativo colabora tanto quanto autores de uma produção. [...] Assim, o espectador que reliza o filme, confere-lhe todas as racionalizações da percepção, e irrealiza, ao mesmo tempo, esta realidade que acabou de fabricar, situa-a entra-empiricamente, vive-a afetiva e não praticamente, interioriza as suas respostas em vez de as exteriorizar em atos. (MORIN, 1997, p. 182).

Por fim, podemos dizer que há um envolvimento simbólico do público-alvo pelo filme

mesmo anterior a experiência propriamente dita, ou seja, mesmo antes de se assistir

ao filme a pessoa se envolve naquele mundo.

93

3. TRANSFIGURAÇÃO

Do outro lado de Harry, Percy e Hermione conversavam sobre as aulas.

— Espero que elas comecem logo, tem tanta coisa para a gente aprender, estou muito interessada em Transfiguração, sabe, transformar uma coisa em outra, claro, dizem que é muito difícil, a pessoa começa aos poucos, fósforos em agulhas e coisas pequenas assim. (ROWLING, 2000, p. 111)

94

3.1 A magia

Na saga Harry Potter uma das disciplinas ensinadas na Escola de Magia e Bruxaria

de Hogwarts é a Transfiguração. Nestas aulas, os alunos aprendem a transformar

objetos e seres em outras formas distintas do que eram inicialmente. Aqui,

aproximaremos a magia da Transfiguração ao processo de transformação de um

texto em uma forma para outro meio distinto, como é o caso de nosso objeto de

estudo em questão, a transposição de um produto literário para um filme.

Nesta parte do trabalho procuraremos compreender o processo que Harry Potter

texto literário passou para se tornar produto cinematográfico. Para entender melhor

a relação estabelecida entre os livros de Harry Potter e os demais produtos e mídias

para as quais a obra foi transposta, não apenas os filmes, abordaremos as

definições de Genette (2012, p. 18) que estabelece "por hiper-textualidade toda

relação que une um texto B ([...] hipertexto) a um texto anterior A ([...] hipotexto) do

qual ele brota [...].". Sendo assim, consideramos aqui a série literária Harry Potter

(os sete livros pertencentes à narrativa publicados por Rowling entre os anos 1997 e

2007) como "texto A", ou seja, o hipotexto (produto original).

As diversas adaptações dos livros em forma de filmes, parque temático e site,

games, peça de teatro e livros publicados pela própria autora da série que são obras

pertencentes ao mundo bruxo, mas que não narram a história de Harry Potter serão

tidas como "textos B", portanto, como hipertextos. O gráfico a seguir passa a ilustrar

este conceito:

95

Gráfico 1: Exemplo dos objetos de estudo em relação de hipertextualidade.

Série literária Harry Potter

(livros lançados entre 1997 e 2007)

Adaptações cinematográficas da série Harry Potter

(filmes lançados entre 2001 e 2012).

The Wizarding World of Harry Potter

(mundos em parques temáticos inaugurados em 2010 e 2014).

Pottermore

(site interativo e com conteúdos inéditos lançado em 2009).

Livros que se passam no mesmo universo de Harry Potter, mas que não narram a história da

personagem.

(Exemplos: Quadribol Através dos Séculos e Animais Fantásticos e

Onde Habitam, lançados em 2001).

Video games

(lançados entre 2001 e 2012, após a estreia dos filmes). Outros produtos.

Hipotexto (texto original)

Hipertextos (textos baseados no orginal)

96

Genette (2012, p. 22) ainda caracteriza a definição de hipertexto como "todo texto

derivado de um texto anterior por trans-formação simples [...] ou por transformação

indireta [...].". No caso de nosso objeto de estudo, o processo foi a transformação de

uma mídia (literária) em outra plataforma, outra mídia (cinematográfica), ou seja, a

transformação de um sistema em outros.

O termo "mídia" utilizado anteriormente pode ser definido:

[...] como um meio de comunicação convencionalmente distinto, especificado não só por canais (ou um canal) de comunicação particular(es), mas também pelo uso de um ou mais sistemas semióticos que servem para transmitir mensagens culturais. (CLÜVER, 2006, p. 34)

Entendendo que nesse processo diferentes mídias estão envolvidas, ou seja, são

diferentes canais de comunicação, a transposição da obra literária Harry Potter para

demais mídias estabelecem uma relação de intermidialidade, pois há processo de

transcodificar uma mídia a outra diferente.

Termo genérico para todos aqueles fenômenos que (como indica o prefixo inter-) de alguma maneira acontecem entre as mídias. ‘Intermidiático’, portanto, designa aquelas configurações que têm a ver com o cruzamento de fronteiras entre as mídias [...]. (RAJEWSKY, 2012, p. 18).

Ainda sobre a relação de transformação entre mídias, é importante salientar que

para se tornar um produto cinematográfico, o produto literário Harry Potter passou

por um processo de adaptação. Tendo em vista a consideração feita por Hutcheon

(2011, p. 09), devemos compreender como “uma forma de transcodificação de um

sistema de comunicação para outro.”.

Vale ressaltar que processos de adaptação são de extrema importância para o meio

cultural, pois são capazes de conservar, renovar, recontar histórias através de

gerações, conforme explica a mesma autora:

97

A adaptação é (e sempre foi) central para a imaginação humana em todas as culturas. Nós não apenas contamos, como também recontamos nossas histórias. E recontar quase sempre significa adaptar – “ajustar” as histórias para que agradem ao seu novo público. (HUTCHEON, 2011, p. 10)

Como tratamos de uma passagem de livro para filme, podemos falar que os dois

meios midiáticos podem possuir algumas características que se aproximam. Brito

(2006, p. 07) afirma que existem afinidades semióticas entre o cinema e a literatura:

entre a verbalidade da literatura e a iconicidade do cinema. O autor expõe seu

levantamento em relação ao cinema:

Uma arte heterogênea que soma características básicas das outras modalidades de arte existentes, um autentico compósito que sintetiza em si mesmo, entre outras coisas: a plasticidade da pintura, o movimento e o ritmo da música e da dança, a (pseudo)tridimensionalidade da escultura e a arquitetura, a dramaticidade do teatro e a narratividade da literatura. (BRITO, 2006, p. 135).

Por esse ponto de vista compreendemos que o cinema traz em sua completude

diversas características que se aproximam de outras reproduções midiáticas e

consegue ser capaz de reproduzir uma ideia, um pensamento, uma história com as

mesmas características das demais artes em conjunto.

Eagleton (1994, p. 04) ressalta uma das características da literatura como: “Uma

reunião mais ou menos arbitrária de ‘artifícios’ [...]. Os ‘artifícios’ incluem som,

imagens, ritmo, sintaxe, métrica, rima, técnicas narrativas; [...].”. A partir desta fala

conseguimos aproximar a literatura com o cinema, uma vez que o mesmo é

“constituído” de uma base de sons e imagens, o ritmo pode ser assemelhado ao

desenrolar do filme, a sequência de conteúdos narrados, a sintaxe compara-se à

linguagem utilizada, porque bem como existe uma linguagem literária há uma

linguagem cinematográfica, a métrica e a rima, como características de uma

98

construção poética no cinema também pode ser aproximada à sua linguagem,

técnicas narrativas também estão presentes na construção do conteúdo de um filme.

A referência principal para nossa melhor compreensão será buscada a partir das

contribuições de Julio Plaza acerca da Tradução Intersemiótica, uma vez que a

passagem entre as mídias a serem estudadas consiste na tradução entre linguagens

distintas (2010, p. 11): “A Tradução Intersemiótica [...] consiste na interpretação dos

signos verbais por meio de sistemas de signos não verbais, ou de um sistema de

signos para outro.”. Ainda sobre a definição, o mesmo autor reflete:

A Tradução Intersemiótica se pauta, então, pelo uso material dos suportes, cujas qualidades e estruturas são os interpretantes dos signos que absorvem [...]. Diz mais respeito às transmutações intersígnicas do que exclusivamente à passagem de signos linguísticos para não-linguisticos. (PLAZA, 2010, p. 67).

No caso de nosso objeto de estudo, estamos trabalhando a partir de um sistema

trabalhado com signos verbais – Harry Potter literatura – que passa a ser

interpretado com signos não verbais – Harry Potter filme (que podemos considerá-lo

como “adaptador” do primeiro meio) – portanto, dizemos que há transmutações

intersígnicas, no caso, o processo pode ser caractreizado como uma tradução.

Diferente de uma tradução entre dois idiomas, ou seja, de uma tradução interlingual,

a qual ocorre um processo em um mesmo meio, na tradução intersemiótica são

levadas em consideração as relações entre sentidos em meios e códigos distintos. O

ato tradutório seria o intervalo entre uma imagem passada para uma nova imagem,

essa imagem passada exerce uma influência no produto presente, sendo este

paralelo e recíproco ao original, mas ainda assim autônomo. Sobre isso, Plaza

articula:

Tradução é [...] repensar a configuração de escolhas do original, transmutando-a numa outra configuração seletiva e sintética. [...] Criação e tradução se confundem num único objeto: renovar [...]. (PLAZA, 2010, p. 40).

99

Ressaltamos novamente que numa tradução intersemiótica ocorre uma tradução

entre diferentes signos, tendo este como algo que representa uma ideia a partir de

um veículo que o comunica. Salientando que, em uma tradução o processo é crítico-

criativo, entendemos que o tradutor deverá ter um original como leitura base a qual

fará uma nova leitura, ou seja, uma releitura, uma reescritura, uma re-produção e

esse novo produto exigirá do mesmo novas características que tornarão o novo não

apenas como autêntico, mas como um complemento. Essa complementaridade

entre o original e a tradução propõe um trânsito de sentidos e formas, criando um

diálogo entre os signos, uma reescritura da história.

A seguir será ilustrado por meio de um gráfico, exemplificado a partir de nosso

objeto de estudo, Harry Potter e a Ordem da Fênix, a questão da criação no

processo de tradução intersemiótica conforme explicado por Julio Plaza (2010, p

08):

Na medida em que a criação encara a história como linguagem, no que se diz respeito a tradução, podemos aqui estabelecer um paralelo entre o passado como ícone, como possibilidade como original a ser traduzido, o presente como índico, como tensão criativo-tradutora, como momento operacional e o futuro como símbolo, quer dizer, a criação à procura de um leitor.

100

Gráfico 2: Exemplo dos objetos de estudo em um processo de tradução intersemiótica.

Nesse processo de tradução entre meios, ressalta-se que houve uma adaptação,

logo o novo signo produzido (o filme) representa o seu objeto original (livro) em outra

linguagem distinta que, apesar de se aproximarem, conforme discutido

anteriormente, não são idênticas e diferem-se em certos aspectos, podendo atribuir,

inclusive, novas qualidades materiais que permitirão interpretações na relação entre

os signos ou até mesmo novas interpretações conforme defende Julia Plaza (2010,

p. 23): "A linguagem, que acentua seus caracteres materiais, distrai-se da

incompletude do signo e dos significados fechados para tornar-se completa e aberta

à interpretação.".

O momento operacional se caracteriza por uma tensão criativo-tradutora porque o

tradutor deverá encontrar alternativas que realizem a passagem de um meio para o

outro em sua completude através de procedimentos de transição de linguagens,

códigos, meios e formas. Nesse processo há uma "expansão das artes" para que a

Objeto Original: livro Harry Potter e a Ordem da Fênix (escrito) por J. K. Rowling.

Objeto Traduzido: filme Harry Potter e a Ordem da Fênix (dirigido) por David Yates.

PASSADO - ÍCONE

FUTURO - SÍMBOLO

Processo de tradução:

passagem entre livro e filme: tensão criativo-tradutora,

momento operacional.

PRESENTE - ÍNDICO

101

cultura do original seja preservada, mas que trará novos sentidos no produto

traduzido.

No momento da tradução, o tradutor realiza recursos como a colagem, a montagem,

a interferência, as apropriações, as integrações, as fusões de personagens, os

espaços da própria narrativa etc. Esses recursos são utilizados, na mesma forma,

porque é impossível manter cem por cento do conteúdo em uma tradução entre

meios.

No caso de nosso objeto de estudo, Harry Potter e a Ordem da Fênix foi o livro

publicado mais extenso da série e sua tradução intersemiótica, para o filme, resultou

no filme de menor tempo de duração. Se o filme adaptasse cem por cento do

conteúdo do livro, ele provavelmente teria maior tempo de duração, podendo tornar-

se um produto exaustivo para o receptor. O diretor (tradutor) teve o cuidado de

manter o conteúdo em uma sequência correta para que os espectadores

conseguissem acompanhar a trama de forma satisfatória, clara e que não fosse

cansativa.

Citando um exemplo com o próprio livro Harry Potter e a Ordem da Fênix, há um

momento em que Harry Potter e os colegas realizam algumas reuniões secretas

para treinar Defesa Contra as Artes das Trevas e são descobertos porque a aluna

Marieta Edgecombe (não mencionada nos filmes) conta secretamente à professora

Umbridge sobre os encontros, após a mesma ter proibido reuniões ilícitas dos

estudantes em Hogwarts.

No momento relatado no livro, Harry Potter, a professora Umbridge, o Ministro da

Magia e Marieta Edgecombe estão em uma sala e a expressão "dedo duro" surge

como marcas no rosto da menina, e Harry Potter então descobre que a colega

contou. No filme, quem conta sobre as reuniões à professora Umbridge é a aluna

Cho Chang, menina pela qual Harry Potter está apaixonado naquele momento da

narrativa. Após descobrir que a garota contou à professora, os colegas da Armada

de Dumbledore passam a deixá-la de lado, porém com o decorrer do enredo

descobre-se que, na verdade, Cho Chang foi interrogada pela professora Umbridge

sob efeito da poção Veritasserum, que não a deixa contar mentiras:

102

Quando Marieta ergueu a cabeça, Fudge deu um salto para trás chocado, quase se estatelando na lareira. Em seguida praguejou e sapateou na bainha da capa que começava a fumegar. Marieta deu um guincho e puxou o decote das vestes até os olhos, mas não antes de todos verem que seu rosto estava terrivelmente desfigurado por uma quantidade de pústulas roxas muito juntas que cobriam seu nariz e suas faces formando a palavra “DEDO-DURO”.

- Não se incomode com as marcas agora, querida – disse Umbridge impaciente -, tire as vestes de cima da boca e conte ao ministro.

Mas Marieta soltou um outro guincho abafado e sacudiu a cabeça freneticamente.

- Ah, muito bem, sua tolinha, eu contarei – disse Umbridge com rispidez [...] – Bom, a senhorita Edgecombe aqui veio a minha sala pouco depois do jantar hoje à noite e me disse que queria contar uma coisa. Contou que se eu fosse a uma sala secreta no sétimo andar, às vezes conhecida como Sala Precisa, eu descobriria algo que me interessaria. [...]. (ROWLING, 2003, p. 497).

Imagem 35: Momento da cena do filmes Harry Potter e a Ordem da Fênix em que Cho Chang é

acusada de ser a “dedo-duro”. Disponível em: http://galeria.potterish.com. Acesso em 20.08.2016.

Neste episódio citado anteriormente, o diretor realizou uma fusão de personagens

(uma vez que Cho Chang passou, em um momento, a ser a "dedo-duro"),

apropriações de elementos da narrativa (sob a ótica geral de Harry Potter) ao

103

colocar a poção Veritasserum como "responsável" pela menina ter contado a

verdade.

A cena escolhida para este trabalho também passa por esses recursos, já que

passou do livro para o filme. O momento em questão ainda é privilegiado graças aos

recursos próprios que o cinema permite existir, efeitos especiais, movimentação e

posição da câmera, a montagem das cenas em flashbacks que mostram outros

tempos, não só o tempo presente na narrativa etc. Tais recursos deixam a cena

recriada no filme rica, com detalhes, com uma grande dimensão, mas isso não

significa que o original, a cena literária, seja pobre ou que não tenha qualidade. Julio

Plaza nos ajuda a entender:

O caráter tátil-sensorial, inclusivo e abrangente, das formas eletrônicas permite dialogar em ritmo “intervisual”, “intertextual” e “intersensorial” como vários códigos de informação. [...] É nesses intervalos que o meio adquire a sua real dimensão, a sua qualidade, pois cada mensagem engole [...] as anteriores, já que estão formadas pela mesma energia.

[...] para caracterizar as formas tecnológicas da atualidade como formas re-correntes da história, como formas tecnológicas tradutoras, elas mesmas, da história. [...] passado-presente-futuro ou original-tradução-recepção, estão necessariamente atravessados pelos meios de produção social e artística. (PLAZA, 2010, p. 13).

A experiência de passagem de um recurso verbal, como o texto literário de Harry

Potter, para um texto como o cinema permite uma criação visual do que é narrado

sob o olhar de um diretor. Quando é lido primeiramente o texto verbal, o leitor cria,

imagina, especula detalhes de uma cena de acordo com o que está contado e

também pelas múltiplas interpretações que a leitura do texto verbal permite. Com o

filme, sob o ponto de vista da visualidade, a interpretação feita pelo leitor com o texto

original, ou seja, a interpretação prévia ou posterior que o leitor faz do texto original

não implica uma interpretação correta ou incorreta. Deste modo há uma relação

entre os visuais "causados" pelas leituras entre os dois textos: livro e filme.

Vale ressaltar que a intenção deste trabalho ao analisar a passagem de uma cena

literária para o meio cinematográfico não visa saber se a adaptação foi fiel. A

questão da fidelidade em uma operação tradutora entre linguagens distintas possui

104

um caráter mais ideológico, uma vez que um novo signo surgirá por estar

"apontando" ao objeto original, ou seja, o signo que adapta criará uma verdade

própria.

Essa "nova" verdade criada pelo objeto não "rouba a luz" do objeto original. Se

pensarmos na cena escolhida para este trabalho, em seu meio literário conseguimos

compreender os sentimentos e sensações que Harry Potter tem naquele momento

pela descrição que é feita: o garoto sente como se estivesse sido apertado por uma

criatura de olhos vermelhos: “Ele foi levado ao saguão, preso nas espirais de uma

criatura de olhos vermelhos tão apertadas que ele não sabia onde terminava o seu

corpo e começava o da criatura [...].” (ROWLING, 2003, p. 660), porém na

adaptação cinematográfica não é retratada tal criatura conforme o que fora descrito

no livro. No filme, o garoto sente dores como se estivessem tentando entrar em seu

corpo e em sua mente, contorce de sofrimento.

No texto literário, as dores cedem quando Harry Potter lembra-se de Sirius Black, e

é descrito que seu coração encheu de emoção: “E reverei Sirius. E o coração de

Harry se encheu de emoção, as espirais da criatura se afrouxaram, a dor

desapareceu [...].” (ROWLING, 2003, p. 660). Na adaptação cinematográfica, Harry

Potter não apenas lembra-se de Sirius Black, mas seu sentimento de emoção é

despertado ao olhar para os amigos que estão na sala observando-o, lembra de

momentos com os colegas, pensa em seus pais: a emoção de ter amor e amizade

derrota o sofrimento e pensamentos ruins que Voldemort está ocasionando em sua

mente, pois é mais forte que o mal.

Tais exemplos mostram que a releitura criada pelo diretor do filme daquela cena não

foram transpostas ipisis literis, mas houve uma interpretação que tange e

complementa o original. Brito propõe:

Partindo do princípio de que estilo se define pela fusão de forma e fundo, conclui que toda fidelidade é ilusória, e sequer desejável. O que cabe ao cineasta fazer é encontrar equivalentes cinematográficos ao original, pois sendo o filme uma ‘tradução estética do romance para outra linguagem’, fundada numa simpática fundamental do cineasta pela romancista, trata-se de respeitar o espírito do romance adaptado, a fidelidade do autor consistindo

105

apenas em inventar e articular os elementos audiovisuais que ele não desautorizaria. (2006, p. 148)

Assim, compreendemos que as interpretações propostas no filme, sendo elas

"novas" verdades trazidas pelo tradutor, não fazem com que estas sejam infiéis ao

original por serem "mais amplas" ou "mais reduzidas", pois a essência, a proposta

daquela cena foi mantida. Julio Plaza explicita:

A tradução mantém uma relação íntima com o seu original, ao qual deve sua existência, mas é nela que “a vida do original alcança sua expansão póstuma mais vasta e sempre renovada; [...]

Já do ponto de vista da poética da tradução, o aumento ou diminuição da informação estética fornece-nos o nível e a qualidade da operação tradutora que pode ser vista como complementação do signo traduzido. (2010, p. 32-33).

Assim sendo, não nos caberá aqui julgar se a cena literária transposta para o

cinema fora retratada fielmente no que se diz respeito à descrição e dos detalhes

que envolvem o fragmento, e sim se a intenção da cena, quando colocada em seu

original, foi preservada, se a mensagem que o autor planejou para aquele momento

no objeto original (do momento passado, tido como ícone) está intrínseca no objeto

traduzido (tido como símbolo do original).

106

3.2 Um espelho literário no Largo Grimmauld, 12

Na saga Harry Potter as reuniões realizadas pela sociedade secreta Ordem da Fênix

para levantar questões sobre como derrotar o Lord das Trevas ocorrem na antiga

casa da família de Sirius Black, localizada no Largo Grimmauld número 12, uma

casa que só é visível para os bruxos. Aqui neste trabalho o Largo Grimmauld

mostrará os nossos objetos de estudo, sendo nesta primeira parte o trecho literário.

O fragmento para estudo ocorre, na narrativa literária, no espaço do Ministério da

Magia, após Harry Potter e seus colegas saírem escondidos de Hogwarts (sob

vigilância da professora Dolores Umbridge). Ainda na escola, Harry Potter teve uma

visão, gerada e controlada por Voldemort, de que o seu inimigo estava fazendo

Sirius Black, seu padrinho como refém, pois desejava algo, uma espécie de arma ou

objetvo, que o garoto ainda desconhecia o que era. Voldemort ameaçava matar

Sirius Black. Harry Potter, querendo salvar o padrinho, escapa da escola após

enfrentar sua professora e chega ao Ministério da Magia.

Lá, entra na Sala de Mistérios e encontra uma profecia com seu nome, a qual

somente poderia ser retirada por ele. Neste momento, seguidores de Voldemort, os

Comensais da Morte, surgem e tentam tomar a profecia do garoto. Relutante, Harry

Potter e os amigos escapam e lutam com os Comensais da Morte. Em seguida,

alguns membros da Ordem da Fênix aparecem e ajudam os garotos na batalha, é

quando Bellatrix Lestrange, uma das seguidoras de Voldemort, mata Sirius Black.

Com o objetivo de encontrar diferenças que pudessem alterar ou criar novos

sentidos ao momento literário escolhido, serão apresentados, a seguir, o mesmo

fragmento selecionado de três edições distintas, todas pioneiras: a edição brasileira,

a americana e a inglesa. Não foram encontradas diferenças significativas que

alterassem a compreensão do leitor. As principais diferenças se dão, principalmente,

pela pontuação comum das literaturas inglesas e americanas que diferem do que é

comum para a leitura de Língua Portuguesa.

107

Primeira edição

brasileira

Primeira edição inglesa Primeira edição

americana

Então a cicatriz de Harry

estourou e ele sentiu que

estava morto: era uma dor

que superava a imaginação,

uma dor que superava a

capacidade de sofrer...

Ele foi levado ao saguão,

preso nas espirais de uma

criatura de olhos vermelhos

tão apertadas que ele não

sabia onde terminava o seu

corpo e começava o da

criatura: estavam fundidos,

unidos pela dor e não havia

saída...

E quando a criatura falou,

usou a boca de Harry,

fazendo com que, em sua

agonia, o garoto sentisse o

queixo mexer.

- Me mate agora,

Dumbledore...

Cego e moribundo, cada

parte do seu corpo gritando

por alívio, Harry sentiu a

criatura usando-o mais uma

vez...

- Se a morte não é nada,

Dumbledore, mate o

garoto...

Faça a dor passar, pensou

Harry... faça ele nos matar...

acabe com isso,

Dumbledore... a morte não é

nada em comparação...

E reverei Sirius.

E o coração de Harry se

Then Harry's scar burst open

and he knew he was dead: it

was pain beyond imagining,

pain past endurance -'

He was gone from the hall,

he was locked in the coils of

a creature with red eyes, so

tightly bound that Harry did

not know where his body

ended and the creature

began: they were fused

together , bound by pain,

and there was no escape -'

And when the creature

spoke, it used Harry's

mounth, so that in his agony

he felt his jaw move...

'Kill me now, Dumbledore...'

Blinded and dying, every part

of him screaming for release,

Harry felt the creature use

him again...

'Kill me now, Dumbledore,

kill the boy...'

Let the pain stop, thought

Harry... let him kill us... end

it, Dumbledorer... death is

nothing compared to this...

And I'll see Sirius again...

And as Harry's heart filled

And then Harry’s scar burst

open. He knew he was dead:

it was pain beyond

imagining, pain past

endurance —

He was gone from the hall,

he was locked in the coils of

a creature with red eyes, so

tightly bound that Harry did

not know where his body

ended and the creature’s

began. They were fused

together,bound by pain, and

there was no escape —

And when the creature

spoke, it used Harry’s mouth,

so that in his agony he felt

his jaw move. . . .

“Kill me now, Dumbledore. . .

.”

Blinded and dying, every part

of him screaming for release,

Harry felt the creature use

him again. . . .

“If death is nothing,

Dumbledore, kill the boy. . .

.”

Let the pain stop, thought

Harry. Let him kill us. . . .

End it, Dumbledore. . . .

Death is nothing compared

to this. . . .

And I’ll see Sirius again. . . .

And as Harry’s heart filled

108

encheu de emoção, as

espirais da criatura se

afrouxaram, a dor

desapareceu; ele estava

deitado sobre o gelo e não

madeira...

E havia vozes ecoando pelo

saguão, mais vozes do que

deveria haver... Harry abriu

os olhos, viu seus óculos

junto ao calcanhar da

estátua sem cabeça que o

guardava, mas que agora

estava caída de costas no

chão, rachada e imóvel. Pôs

os óculos, erguei

ligeiramente a cabeça e

descobriu o nariz torto de

Dumbledore a centímetros

do dele.

- Você está bem, Harry?

- Estou – disse Harry,

tremendo com tanta

violência que não conseguia

manter a cabeça em pé

direito. – Estou... onde está

Voldemort, onde... quem são

esses... que é...

(ROWLING, 2003, p. 660).

with emotion, the creatures

coils loosened, the pain was

gone; Harry was lying face

down on the floor, his

glasses gone, shivering as

though he lay upon ice, not

wood...

And there were voices

echoing through the hall,

more voices than there

should have been... Harry

opened his eyes, saw his

glasses lying by the heel of

the headless statue that had

been guarding him, but

which now lay flat on its

back, cracked and immobile.

He put them on and raised

his head a little to find

Dumbledore's crooked nose

inches from his own.

'Are you all right, Harry?'

'Yes', said Harry, shaking

sdo violently he could not

hold his head up properly.

'Yeah, I'm - where's

Voldemort, where - who are

all these - what's -'

(ROWLING, 2003, p. 848).

with emotion, the creature’s

coils loosened, the pain was

gone, Harry was lying

facedown on the floor, his

glasses gone, shivering as

though he lay upon ice, not

wood. . . .

And there were voices

echoing through the hall,

more voices than there

should have been: Harry

opened his eyes, saw his

glasses lying at the heel of

the headless statue that had

been guarding him, but

which now lay flat on its

back, cracked and immobile.

He put them on and raised

his head an inch to find

Dumbledore’s crooked nose

inches from his own.

“Are you all right, Harry?”

“Yes,” said Harry, shaking so

violently he could not hold

his head up properly. “Yeah,

I’m — where’s Voldemort,

where — who are all these

— what’s —”

(ROWLING, 2003, p. 816).

109

3.3 Um espelho audiovisual no Largo Grimmauld, 12

Bem como o item Espelho Literário trouxe o fragmento retirado do livro para estudo,

o Espelho Audiovisual agora apresentará a cena fílmica de Harry Potter e a Ordem

da Fênix.

A cena recortada 10 adapta o momento literário em que Harry Potter está no

Ministério da Magia com os colegas de Hogwarts após lutarem com Comensais da

Morte. No filme, Dumbledore aparece e luta com Voldemort, que desaparece e

passa a atacar a mente de Harry Potter.

10 Para melhor visualização e análise da cena, ela está apresentada neste trabalho quadro a quadro. Os mesmos foram retirados do site Potterwish (disponível em: http://galeria.potterish.com/thumbnails.php?album=4789 e com acesso em 23.04.2016), uma plataforma online feita por fãs da série Harry Potter que têm o objetivo de apresentar notícias e novidades da saga em primeira mão. O site está no ar há 13 anos e disponibiliza uma galeria de fotos que incluem os frames de todos os filmes de Harry Potter. Os diálogos foram incluídos pelos autores. No filme, a cena se inicia aos 2:00:34 aos 2:03:26.

110

Você perdeu, velhote. Harry?

111

112

(Voldemort) Tão fraco.

(Voldemort) Tão vulnerável.

(Voldemort) Olhe para mim.

113

Harry, não é como vocês são

semelhantes, são as diferenças.

Harry?

114

Você é o fraco...

115

... você nunca conhecerá o amor ou a

amizade.

E eu sinto pena de você.

116

Você é um tolo, Harry Potter.

117

E você perderá tudo.

Ele voltou!

118

3.4 Dentro do reflexo literário

O fragmento inicia-se com a menção da cicatriz em forma de raio na testa de Harry

Potter, que adquiriu ainda quando bebê na noite em que seus pais foram

assassinados por Voldemort. A cicatriz foi gerada quando o bruxo tentou matar o

garoto com a maldição imperdoável da morte (conhecida pelo feitiço Avada

Kedrava), porém isto foi impedido porque Lilian Potter tentou salvar seu filho. Por

este ato de amor da mãe, Harry Potter sobrevivera à maldição imperdoável.

Ao longo de toda a saga literária, quando Harry Potter sente dor em sua cicatriz, o

garoto interpreta esse sinal como uma forma de alerta para o perigo ou da presença

de seu principal inimigo. No momento do fragmento, a escolha do léxico “estourou”

para explicar a sensação de dor que surgiu de repente desperta no leitor essa

presença do inimigo seguida por uma sofrida dor.

Na descrição “Então a cicatriz de Harry estourou e ele sentiu que estava morto: era

uma dor que superava a imaginação, uma dor que superava a capacidade de

sofrer...” (Rowling, 2003, p. 660) compreendemos que aquela não era uma simples

dor, semelhante àquelas sentidas em momentos anteriores da série literária. Esta

era uma dor que superava o que Harry acreditava ser o limite do que se pode

aguentar, era uma dor que superava os limites físicos do corpo do garoto. A

presença de reticências ao final do parágrafo representa esta dor infinita,

indescritível por meio de palavras. É uma dor tão intensa que palavras não são

capazes de reproduzir a sensação, vai além do que é descrito, dá a sensação de

não ter fim.

Em seguida, é narrado que Harry é tirado do espaço em que está por uma criatura:

“Ele foi levado do saguão, preso nas espirais de uma criatura de olhos vermelhos

[...].” (Rowling, 2003, p. 660). Há um destaque da cor dos olhos da criatura, que são

vermelhos. A cor vermelha na literatura, tendo destaque à literatura fantástica, é

associada ao que é mágico ou ao irreal. Na antiguidade, o vermelho era a cor dos

mantos que cobriam túmulos, pois havia uma crença que acreditava que, assim,

aqueles mortos poderiam ter uma vida póstuma. Segundo Pedrosa (2010), o

vermelho remete ao perigo. A cor vermelha também simboliza o orgulho, a violência,

a agressividade e o poder.

119

No caso desta criatura, o vermelho está compenetrado no olhar, dentro da criatura,

esta que arrasta Harry Potter para uma condição de violência cada vez mais intensa,

tão intensa que seria capaz de suprir as barreiras da própria vida, como se a criatura

estivesse levando Harry Potter para uma condição em que sentiria dor mesmo após

a morte, assim como os mortos da antiguidade também teriam a possibilidade de ter

uma vida pós-túmulo, Harry Potter teria que continuar a sofrer mesmo pós a morte.

Em seguida, é descrita uma sensação de corpo único: “[...] preso nas espirais de

uma criatura de olhos vermelhos tão apertadas que ele não sabia onde terminava o

seu corpo e começava o da criatura, estavam fundidos, unidos pela dor e não havia

saída.” (ROWLING, 2003, p. 660). Harry Potter está preso à criatura por meio de

espirais, ou seja, preso por um mecanismo que dificulta a saída ou qualquer

movimento. Ao ler esta descrição, o leitor poderá, inclusive, ter uma sensação

sinestésica de desconforto ao imaginar um mecanismo espiral intrínseco à pele

humana, permitindo sentir o mesmo desconforto ou parte da dor sentida pela

personagem naquele momento. Preso pelo mecanismo espiral de modo tão

apertado, Harry Potter e a criatura que o arrasta agora são apenas um único corpo,

envolvido especialmente pela dor que está sentindo.

Tal descrição da criatura pode remeter também à figura de uma cobra, animal muito

citado na saga Harry Potter. Voldemort pertenceu à casa Sonserina quando estudou

em Hogwarts, e o símbolo desta casa é uma cobra. Os alunos desta são astutos e

audaciosos, como a índole do animal que a representa. Quando se torna poderoso,

Voldemort criou Naggini, uma cobra que, na verdade, abriga parte de sua alma e

marca presença em alguns momentos na série literária e cinematográfica, sempre

acompanhando o Lord das Trevas. Harry Potter, por sua vez, também consegue

falar a língua das cobras, bem como Voldemort, e quando entrou em Hogwarts, o

Chapéu Seletor induziu que o colocaria também na casa Sonserina, porém não o fez

por pedido do garoto. Com o decorrer da série, figuras de cobra estão presentes na

obra. Em Harry Potter e a Ordem da Fênix, quando Voldemort possui a mente do

garoto pela primeira vez, ele manipula o sonho para que o garoto não veja o ataque

e sim ataque uma pessoa, Arthur Weasley, porém não como ser humano, mas como

uma cobra. Deste modo, a figura de cobra pode representar o lado mal que Harry

Potter abriga dentro de si: o fato de que ele também abriga uma parte da alma de

Voldemort consigo. No caso da criatura que o cerca nesta passagem, podemos

120

afirmar que pode representar o conflito e combate que enfrenta ao lutar contra o seu

inimigo dentro de si próprio.

Neste mesmo sentindo de junção de dois corpos em um só, no fato narrado seguinte

entendemos que a criatura agora está falando, e está utilizando o corpo, a boca de

Harry Potter como um instrumento para se comunicar: “E quando a criatura falou,

usou a boca de Harry, fazendo com que, em sua agonia, o garoto sentisse o queixo

mexer.” (ROWLING, 2003, p. 660). Neste momento, percebe-se que há a perda do

arbítrio, ou seja, há a perda do domínio próprio, a criatura toma posse do garoto que

passa a agir em função do dominador. A fala dita no momento seguinte “– Me mate

agora, Dumbledore...” (ROWLING, 2003, p. 660) pode ser considerada ambígua,

aqui não há a certeza exata de quem está falando, podendo ser levantadas duas

opções: a primeira pode ser a fala de Voldemort, que possui agora Harry Potter,

induzindo o bruxo Dumbledore a matar o garoto, fazendo-o pensar que é um pedido

do próprio Harry Potter, e a segunda pode ser a fala do próprio Harry Potter

implorando e rendendo-se à própria morte para que aquela dor e aquele sofrimento

acabem.

No momento seguinte, a súplica para aquela dor parar é renovada em “[...] cada

parte do seu corpo gritando por alívio [...]” (ROWLING, 2003, p. 660). Aqui ocorre

uma personificação do corpo: ele grita, ele sofre (assim como Harry Potter sofre), ele

pede para que aquilo pare.

Ainda na ideia de posse, a criatura usa o garoto mais uma vez, dizendo: “ – Se a

morte não é nada, Dumbledore, mate o garoto...” (ROWLING, 2003, p. 660). Desta

vez fica claro de que é a voz de Lord Voldemort através do menino que é possuído,

fato que nos permite compreender que no momento anterior também é a voz do

inimigo de Harry Potter manifestando-se. Há uma aproximação entre a dor e a

morte. No caso, a morte seria capaz de acabar com aquela dor, a dor da morte é

mais leve se comparada ao sofrimento daquele momento. Logo em seguida, como

se fosse uma continuação da construção da fala de Voldemort no corpo de Harry

Potter, ocorre a narração vinda de seu pensamento: “Faça a dor passar, pensou

Harry... faça ele nos matar... acabe com isso, Dumbledore... a morte não é nada em

comparação...” (Rowling, 2003, p. 660). A expressão da partícula “nos” permite

compreender que ainda há a junção de ambos como se estivessem em um corpo só.

121

Aqui há um sentimento de redenção, de desistência, Harry Potter não tem mais

forças para continuar lutando contra aquela posse ou contra aquela dor, ele estaria

disposto a se render à própria morte se este fosse um meio de escapatória do

sofrimento e também para a derrota de seu inimigo: ao encerrar sua dor por meio da

morte, haveria, assim, a possibilidade de derrotar Voldemort, uma vez que os dois,

ali, eram um só. A morte é novamente remetida quando é afirmado que “ [...] a morte

não é nada em comparação...” (ROWLING, 2003, p. 660), ou seja, a dor e o

sofrimento eram muito mais intensos do que a morte seria.

Em seguida, há uma pausa na descrição do sofrimento: “E reverei Sirius.”

(ROWLING, 2003, p. 660). No momento anterior, a morte seria uma porta de saída

do sofrimento que Harry estava passando, ou seja, ao alcançar a morte escaparia da

dor. O sentimento de desejo de morte agora acometeu um novo pensamento a Harry

Potter, esta também traria o seu padrinho recém-morto de volta e faria com que os

dois estivessem juntos novamente. Sirius Black, padrinho de Harry Potter,

assassinado momentos antes pela bruxa Bellatrix Lestrange, era o que Harry Potter

compreendia como o que sobrou de sua família, dizia que sua entidade familiar

resumia-se apenas a ele. Na presença de Sirius Black, Harry Potter sentia-se feliz,

acolhido, tratado com o carinho que seus tios Dursleys nunca lhe haviam dado.

A descrição seguinte, “E o coração de Harry se encheu de emoção.” (ROWLING,

2003, p. 660), logo estabelece uma quebra do sofrimento do garoto, o que passa a

ser ressaltado é seu coração, que agora não está mais dominado com dor, com

sofrimento e pensamentos ruins, agora ele está cheio de emoção. O autor C. S.

Lewis (1996, p. 24) revela-nos uma definição do termo emoção: “Emoção [...] pode

ser definido como alternância de tensão e relaxamento da ansiedade imaginada”. A

palavra emoção remete ao sentimento de comoção, vinda aqui no caso a partir de

um abalo afetivo, pois Harry Potter sentia muito carinho por Sirius Black, sentia-se

feliz e confortável com sua presença e, ao remeter a recente morte do mesmo, o

garoto tem essa agitação dos sentimentos bons e ruins.

Quando a figura de seu padrinho toma conta da mente de Harry Potter, o sofrimento

passa, ou seja, a cura disto pode ser esclarecida pelo sentimento de amor delineado

entre Harry Potter e Sirius Black. Ao ver Sirius Black em seus pensamentos, a

criatura afrouxa-se, agora a sensação de que são apenas um só passou, ou seja,

122

Harry Potter volta a ter arbítrio e encontra-se deitado, sem os óculos, como se

tivesse acabado de despertar de um sono.

Harry Potter buscou reconhecer o ambiente ao seu redor, já que este passou de um

espaço apertado, ambiente fechado, justo, em que dois corpos estariam ocupando o

mesmo lugar, para, novamente, o saguão do Ministério da Magia. Quando

reconhece o espaço em que se encontra, percebe alterações nele: a estátua que

antes o guardava agora está caída, quebrada, como se algum tipo de violência

tivesse passado por ali: a violência que o atingiu dentro de seu corpo, que causou-

lhe toda aquela dor, também foi manifestada no saguão.

123

3.5 Dentro do reflexo audiovisual

Esta cena do filme Harry Potter e a Ordem da Fênix (minutagem: 2:00:34 até

2:03:26) é marcada por muitos cortes e muitos flashbacks, ou seja, flashes que

remetem a momentos anteriores (que aconteceram naquele mesmo filme ou

anteriormente na narrativa). A trilha sonora é um elemento marcante na cena: ela é

marcada por tons graves, que remetem ao mal, o que causa impacto ao espectador,

preparando-o e ressaltando a tensão do momento vivenciado pelo protagonista,

apontando que o mal e que o Lord das Trevas estão ali presentes de algum modo

(mesmo não sendo mostrados).

A cena começa com um plano aberto focalizando Voldemort desaparecendo. O

espectador vê este momento por trás de Harry Potter e de Dumbledore. Há então

um corte que focaliza o chão e, com um movimento travelling, a câmera chega até o

garoto e seu professor e, logo em seguida, um corte que focaliza Harry Potter em

plano médio. O garoto começa a se contorcer e grunhe de dor, ele faz um

movimento que simula como se algo estivesse entrando em seu corpo violentamente

até que desequilibra e cai no chão. Há um corte para o professor Dumbledore, que

olha rapidamente para trás, preocupado com Harry Potter. O corte que vem em

seguida focaliza o garoto no chão, conseguimos ver todo seu corpo em plano médio,

e percebemos sua movimentação, como se estivesse tentando escapar de algo que

o prende ao chão e, rapidamente, a câmera fecha em close no rosto do garoto.

Antes que a câmera termine este movimento, há um corte para Dumbledore, que

agora ajoelha e fica perto do garoto, que sofre. Neste momento, em que a câmera

retorna para o menino, o mesmo Harry Potter. Não está em um plano fechado

porque ainda vemos seu corpo todo no chão, porém o movimento de câmera

anterior contribuiu para que o espectador já estivesse com um olhar posicionado no

local que agora destaca os olhos do menino, que estão revirados, com uma cor

diferente. O menino está focado no plano do olhar do espectador, porém sua cabeça

está erguida (seu corpo está no chão) e a impressão que temos é de que o menino

está passando um ar de superioridade, de poder.

Nesta cena compreendemos que o corpo de Harry Potter está sendo “possuído” de

alguma forma por forças superiores a si mesmo e então entendemos que se trata de

124

Voldemort invadindo sua mente. Ele então diz: “Você perdeu, velhote.” (2:00:51)

dirigindo-se a Dumbledore. A cabeça erguida de Harry Potter dá a entender que é

Voldemort levantando do chão, erguendo-se, mesmo após batalhar contra

Dumbledore no momento anterior à cena em questão, e ainda refere-se ao mal

erguendo-se contra o bem.

Há um corte para Dumbledore de perfil, ele está olhando Harry Potter no chão. Há

então um corte rápido que foca Harry Potter em primeiríssimo plano (enquadrado

dos ombros para cima) sofrendo violentamente de dor. Neste momento o espectador

acompanha uma série de flashbacks, que são cenas que o público já assistiu em

filmes anteriores da série ou anteriormente em A Ordem da Fênix. Esses flashbacks

são claramente compreendidos como maus momentos vividos por Harry Potter em

sua vida sendo que, neste primeiro momento, são momentos em que a morte está

presente: o momento em que Voldemort invade a casa de seus pais para matá-los, o

momento da morte de Cedrico Diggory no Torneio Tribruxo e a morte de seu

padrinho Sirius Black, minutos antes. Entre o flashback que mostra sua mãe e o

seguinte, capta em um plano detalhe um dos olhos de Harry Potter, não alterado,

mas normal (ele não está revirado como o menino está no momento). Estes flashes

do olho estão envoltos por uma sombra, que são os óculos que Harry Potter usa.

Esse enfoque nos olhos através dos óculos do menino remetem que ele agora

consegue enxergar a verdade: neste momento, ele está sendo possuído pelo mal e

ele consegue ver a verdade que dói (a morte), porém ele também começa um

momento de reflexão, ele sabe que estas verdades, estes momentos de morte, este

mal fazem parte de si, mas talvez valha a pena lutar para o oposto, para que outras

pessoas inocentes não morram, que o bem persista.

Há um novo corte para o momento real e a câmera foca Harry Potter em

primeiríssimo plano em um plongée, e o espectador tem a impressão de que está o

vendo estirado no chão, de cima, próximo ao olhar de Dumbledore, que está ao seu

lado assistindo. Harry Potter grunhe e sofre com muita violência e vale ressaltar que

no início deste momento os olhos do garoto parecem ter voltado ao normal e, ao

encerrar, antes de cortar para Dumbledore, os olhos voltam a mudar de cor,

revirados, como no início da cena, que remete aos filmes de terror. Ou seja, aqui

notamos uma resistência do bem no corpo de Harry Potter (os olhos voltaram ao

normal), mas o mal ainda está ali, ele não foi totalmente vencido, Voldemort ainda

125

está possuindo, fazendo-o sofrer violentamente, como se estivesse forçando o

garoto a implorar pela própria morte.

Um novo corte ocorre em primeiríssimo plano para o rosto de Harry Potter, o

enquadramento daquele momento leva o espectador a olhar diretamente para os

seus olhos, enfatizando o que está ocorrendo ali: ele ainda está sendo possuído

pelo Lord das Trevas, o mal ainda está ali presente. Um novo flashback ocorre e os

olhos são novamente captados em plano detalhe: Arthur Weasley estirado no chão

do Ministério da Magia. Noites antes, Harry Potter havia sonhado que Arthur

Weasley, pai de seu amigo Ron Weasley, estava sendo atacado por uma cobra no

ministério da magia. Neste sonho Harry Potter não estava assistindo o ataque, mas

ele atacava. Este foi um dos primeiros momentos em que o garoto parou para refletir

se ele estava pendendo para o mal e este momento ser retratado no flashback

remete a esta reflexão, a esta dúvida, porque, naquele momento, o mal existe sim

dentro de dele. O espectador vê Arthur Weasley a partir do plano do olhar da cobra,

no chão, seu rosto está levemente em um plongée que remete à derrota que o bruxo

sofreu pela cobra que o atacou.

O próximo flashback que lhe ocorre é o Lord das Trevas aparecendo no Ministério

da Magia naquela noite: ele chega a partir de uma nuvem negra que enfatiza a sua

maldade. O plano detalhe dos olhos ocorre novamente e então vemos Voldemort

não como uma memória, mas como se ele estivesse ali presente. Vemo-lo em

primeiro plano e não há identificação de um cenário específico, mas ele está

rodeado, numa espécie de fade, por uma nuvem negra que, novamente, enobrece

sua maldade (na série Harry Potter o mal muitas vezes é destacado em cenas com

nuvens negras), e que também se camufla com a sua própria capa, também negra,

dando um ar maior de sua grandiosidade, do seu poder.

Um novo flashback acontece e o momento revivido ocorre no começo de A Ordem

da Fênix, logo quando Harry Potter chega na escola para seu começo de ano letivo

quando tem um reflexo de ira com seus colegas da Grifinória, que o contestam sobre

a morte de Cedrico Diggory, no Torneio Tribruxo, do ano anterior. Harry Potter se

enfureceu e, quando está em seu quarto (flashback) contorce-se como se estivesse

tentando se livrar de algo de seu corpo, aliviar a ira dos questionamentos que teve,

livrar-se do mal que lhe ocorreu no momento.

126

Então há um corte para uma cena que não se trata de um flashback. Harry Potter é

mostrado pela nuca e, a sua frente, um espelho e seu corpo refletido, e o menino

está olhando para o seu próprio reflexo. A sala em que ele se encontra está escura,

mas é visível um feixe de luz entrando pelo lado esquerdo, acima. Por trás também

há luz que ilumina suas costas. Podemos interpretar este momento da cena como a

reflexão pela qual o menino está passando: ele vive o conflito de questionamento

sobre o seu próprio eu, pois, apesar de desejar lutar contra o mal e derrotar seu

inimigo para garantir a paz na nação bruxa, Harry Potter passou por momentos de

raiva, angústia, sofrimento que o fazem se perguntar se está pendendo para o mal.

Neste momento da cena Harry Potter está sendo “possuído” pelo mal, ou seja, ele

carrega o mal dentro de si. Em sua frente há pouca iluminação, podendo simbolizar

o lado do mal que está em seu percurso, em suas costas há a luz, ou seja, a

sabedoria, o bem, as coisas boas que trouxe consigo até o momento. Os feixes de

luz entrando por cima da sala podem simbolizar também os “resquícios” do lado bom

que há em Harry Potter, a esperança que o mundo bruxo deposita na luta contra o

Lorde das Trevas, ou até mesmo a luz dos bruxos que já se foram e que também

enfrentavam esta luta, como seus pais e Sirius Black.

Imagem 36: Momento da cena de Harry Potter e a Ordem da Fênix em que o garoto olha seu reflexo

no espelho em uma sala escura. As formas em vermelho destacam a luz. Disponível em: http://galeria.potterish.com/thumbnails.php?album=4789. Acesso em 23.04.2016.

Este momento de cena continua muito rapidamente e vemos Harry Potter de perfil, e

o lado mostrado pela câmera está escuro, logo, existe o mal ali presente com e nele.

127

Logo em seguida há um corte que Harry Potter está olhando para o espelho, agora

mais perto, em primeiro plano de costas (vemô-lo de nuca) e seu reflexo está

captado da cintura para cima. Neste reflexo há uma presença significativa de luz

pelo lado esquerdo. Então ele mexe com muita rapidez a cabeça em um movimento

brusco para o lado iluminado, e quando ela está olhando novamente para seu

reflexo não vemos mais o rosto do garoto, mas sim o rosto de Voldemort no corpo

do garoto e que diz “olhe para mim”, (2:01:27) como um modo de forçá-lo a encarar

o Lorde das Trevas, de forçar o garoto a aceitar que existe o mal dentro dele e que

ele o fará sofrer até se render. Aqui conseguimos ver (pelo olhar o espectador) a luz

e a cabeça de Harry Potter no mesmo lado, e a escuridão e o rosto de Voldemort

para o outro, representando justamente esses opostos, o bem e o mal, em uma

mesma sala e na mesma pessoa. Embora o espectador veja Harry Potter pela nuca

e a imagem que se forma esteja completamente escura, isto pode representar que,

naquele momento, ele está sim sendo tomado pelo mal.

Imagem 37: Momento da cena de Harry Potter e a Ordem da Fênix em que o menino olha seu reflexo

no espelho em uma sala escura e Voldemort está em seu corpo. A forma amarela detalha o lado “do bem” e a forma vermelha o lado “mal” recorrente na cena. Disponível em:

http://galeria.potterish.com/thumbnails.php?album=4789. Acesso em 23.04.2016.

A cena retorna para o Ministério da Magia e mostra Harry Potter sofrendo no chão,

novamente com os olhos destacados, indicando estar sendo possuído. Harry Potter

sofre com violência, contorcendo-se e movimentando-se mais uma vez como se

estivesse tentando se livrar da dor.

128

Dumbledore então diz que não são as semelhanças entre os dois (entre Harry Potter

e Voldemort), mas sim as diferenças que dirão o “lado” em que Harry Potter

“pertence” e deverá lutar, ou seja, serão as qualidades de coragem, amor,

solidariedade, compaixão e características “do bem” que relevarão a ira, as

tentações, a inveja, logo, as características “do mal”, muito ressaltadas no Lord das

Trevas no decorrer da saga (2:01:33).

Observamos Harry Potter em uma câmera baixa, o que passa uma ideia de que o

menino está fragilizado, em um momento de fraqueza. A cena então registra Rony

Weasley e Hermione Granger chegando ao mesmo ambiente e seus colegas Gina

Weasley, Neville Longbotton e Luna Lovegood entrando em seguida. A trilha sonora,

nesse momento, fica mais delicada, pois remete, agora, não só aos amigos, mas ao

bem que também está presente. No primeiro momento, os dois primeiros amigos

são vistos em primeiro plano e logo em seguida de nuca: o espectador vê a cena de

Harry Potter no chão e Dumbledore ao seu lado a partir do ponto de vista dos

colegas que estão ali presentes como se o espectador estivesse no ambiente. O

garoto está no chão e em seguida a câmera foca a expressão dos colegas em um

travelling que passa de rosto a rosto e claramente o sentimento de preocupação e

pena do colega.

A cena passa para Harry Potter novamente e com um movimento de fade in da

câmera, ou seja, um movimento que dá a impressão de que o espectador viaja para

“dentro” dele, um novo momento de flashbacks ocorre: vemos Harry Potter e

Hermione Granger em um abraço, ambos sorrindo, momento vivenciado no segundo

ano escolar (cena fragmentada do filme Harry Potter e a Câmara Secreta), em

seguida Harry Potter está em uma mesa de café da manhã na casa da família

Weasley e o momento o traz rindo com Rony Weasley (cena também retirada do

segundo filme da saga). O que segue são flashes rápidos introduzidos por fade in

dos rostos de Lilian Potter, James Potter e Sirius Black, ou seja, entes familiares

queridos de Harry Potter que morreram.

O espectador também vê outros momentos de alegrias que Harry Potter vivenciou

com seus colegas Rony e Hermione Granger dos anos anteriores e também do que

aconteceu ainda naquele ano escolar, mais cedo. Ao contrário dos flashbacks

anteriores do início da cena, que eram de momentos ruins, de perda, sofrimento,

129

tristeza, estas lembranças trazidas são felizes, estimulam a parte “do bem” de Harry

Potter, que estas partes de sua memória e de sua vida o tornam forte. Em seguida

ele diz, dirigido-se a Voldemort que naquele momento está “em sua mente” que ele

é que o fraco, pois ele nunca terá amor ou amizade (o que remete aos flashbacks

mostrados neste seguimento – amor de pai, mãe, padrinho, amigos) e que ele sente

pena do inimigo. Ao dizer isso, o Lord das Trevas novamente é observado fora

daquele ambiente, envolto por nuvens pretas e apontando a varinha para baixo,

como se estivesse de pé apontando-a para Harry Potter estirado no chão. A trilha

sonora chega ao ápice da delicadeza apontando que, apesar de todo o mal que ele

viveu ao início da cena (envolta por uma trilha sonora grave), Harry Potter buscou

dentro dele o bem, que prevalece. Ele parece estar preparando um ataque ao garoto

quando, então, é surpreendido com a frase dita por Harry Potter “Você é o fraco...

você nunca conhecerá o amor ou a amizade. E eu sinto pena de você” e interrompe

o movimento. A música continua delicada, porém agora mais forte, mais intensa,

ressaltando ainda mais a emoção sentida pelo garoto.

Novos flashbacks ocorrem, mas o primeiro momento que o espectador vê é na

mesma sala do espelho em que o menino observa o inimigo em seu reflexo, sorrindo

maliciosamente. Os takes colocados aqui são as mesmas do início da cena (o

dementador, a morte de Cedrico Diggory) e também um ataque realizado por

Voldemort que forma uma grande serpente em chamas e o momento em que

Dumbledore deixa a Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts naquele ano

(Dumbledore, sobre pressão do Ministério da Magia deixa a escola para que não

fosse preso. Ele utilizou a chave de um portal trazido por sua fênix). A fênix brilha,

está em chamas, como se estivesse renascendo. Nessa parte da cena, ela remete a

um momento de angustia que Harry Potter sentiu ao ser “abandonado” pelo seu

mentor, uma vez que “saiu” da escola. Porém, a luz trazida pela fênix remete aqui

também ao momento de ascensão do bem: todas as cenas agora estão invertidas

como se estivessem sendo rebobinadas de trás para frente, simbolizando que todo

esse mal que entrou dentro de Harry Potter agora está saindo e dando espaço para

os sentimentos bons, para o bem.

Em seguida, Harry Potter bate com força e violência no espelho em que estava se

observando: seu rosto já está iluminado novamente, o que remete ao bem que está

130

sendo despertado em si. Há poucas partes em que há sombras (o mal está saindo

dele).

Imagem 38: Momento da cena de Harry Potter e a Ordem da Fênix em que o garoto denta destruir o

seu reflexo no espelho que anteriormente mostrava o seu inimigo. A forma amarela detalha o lado iluminado, “do bem”. Disponível em: http://galeria.potterish.com/thumbnails.php?album=4789. Acesso

em 23.04.2016.

Voldemort então é captado em plongée. Não apenas por estar gritando para o alto,

mas também pela posição da câmera, aqui o espectador entende que o inimigo está

sendo derrotado nesta batalha.

Um último flashback é mostrado: Harry Potter abraçando seu padrinho, ambos muito

sorridentes. Sirius Black era seu último parente vivo até sua morte momentos antes.

Era a esperança de alegrias, de um lar, de família para ele. Essa última memória é,

talvez, a sua última lembrança feliz que teve, seu último resquício de felicidade,

esperanças.

Em seguida, Harry Potter está no chão novamente e desta vez algo está saindo de

seu corpo: uma nuvem sai “de dentro” como muita violência. O espectador

compreende que é Voldemort saindo de Harry Potter. A nuvem turva que o puxa

permite compreender que o mal está saindo de dentro dele, deixando apenas o

corpo e o “bem” ali estirado do chão.

Em um plano americano num contra-plongée, Harry Potter está deitado no chão no

lado direito da imagem e uma capa preta aproximando-se aos poucos pelo lado

131

esquerdo: ela começa aparecendo e quando a cena corta para Voldemort, a capa já

ocupa metade da imagem, ou seja, o mal aproxima-se e chega completamente no

ambiente. Então, em um leve plongée, Voldemort olha para os olhos de Harry Potter

e dizendo a ele que ele é tolo e perderá tudo, como uma resposta à fala dirigida a

ele anteriormente. Voldemort quer dizer que o garoto é fraco por valorizar o amor e a

amizade e que, se ele apenas levar este lado “do bem” em consideração, não

sobrará nada em sua vida (se levarmos em consideração a luta do bem contra o

mal, devemos lembrar que Voldemort pretende instaurar o “mal” no mundo bruxo, ou

seja, ao derrotar “o bem”, a parte pela qual Harry Potter luta, não sobrará nada a ele

e que, portanto, ele será infeliz).

O menino está no chão em um contra-plongée e Voldemort é mostrado em um leve

plongée, dando a entender que Harry Potter pode ter passado por um momento de

fraqueza: ele passou pelo seu questionamento interno de que talvez estivesse

tendencioso para o mal, que talvez uma parte dele fosse totalmente semelhante ao

seu inimigo e que por isso haveria uma possibilidade de os dois serem iguais no que

diz respeito à luta pelo mundo bruxo. Esse momento de fraqueza apontou um

momento de superioridade do Lord das Trevas, que “possuiu” o seu inimigo, ou seja,

ele o teve sob controle. Devemos ressaltar aqui que Harry Potter revidou: ele

conseguiu contornar a sua “possessão” e livrar os sentimentos ruins e angústias de

si mesmo naquele momento ao lembrar de coisas pelas quais valem a pena lutar,

ele conseguiu esquivar do controle que o mal tem sobre ele. Este último take em que

Voldemort aparece quase que no plano do olhar do espectador pode representar

que a luta entre o bem e o mal não está encerrada: ambos os lados não venceram e

nem foram derrotados, o que dará a possibilidade de uma nova batalha: o mal

retornará em algum outro momento enquanto o bem reunirá forças para fortalecer a

luta.

132

LUMUS - Conclusão

Os três se viraram para encarar a escuridão à frente.

– Lumus! – murmurou Harry para sua varinha que acendeu.

– Vamos – chamou Rony e Lockhart, e lá se foram os três, seus passos chapinhando ruidosamente no chão molhado.

O túnel era tão escuro que eles só conseguiam ver uma pequena distância à frente. Suas sombras nas paredes molhadas pareciam monstruosas à luz da varinha. (ROWLING, 2000, p. 255)

133

Lumus (Considerações Finais)

Ao longo da série Harry Potter, várias questões são estabelecidas acerca do

crescimento, da passagem da infância para adolescência e da adolescência para a

vida adulta. Tanto o protagonista quanto seus colegas passam a vivenciar e

enfrentar medos, dúvidas, incertezas.

A passagem da narrativa escolhida para este trabalho, tanto do ponto de vista

literário quanto do ponto de vista cinematográfico, traz à tona, principalmente, o

embate do bem contra o mal, inclusive, dentro do próprio protagonista que se

questiona de que lado seguir, pois carrega dúvidas sobre sua própria conduta e de

seus ideais perante a causa: deseja arduamente lutar pelo bem da nação bruxa,

porém ele dá-se conta que pode existir “o mal” dentro de si, ou seja, pode existir

uma parte dentro dele que seja semelhante ao inimigo que deseja derrotar.

Essa luta do bem contra o mal vivida internamente por Harry Potter pode ser

aproximada aos enfrentamentos que os jovens têm ao longo do crescimento:

passam a ser apresentados a novas pessoas, a novas situações que geram o

questionamento de “certo” ou “errado”.

A questão de bem e mal vivenciada por Harry Potter (e certo e errado para os

jovens) também leva ao ponto da questão da identidade. Assim como o protagonista

que está enfrentando uma dúvida interna sobre sua conduta, o jovem também passa

por crises de identidade. Sobre o assunto, levaremos em consideração a

contribuição de Hall:

O sujeito, previamente vivido como tendo uma identidade unificada e

estável, está se tornando fragmentado; composto não de uma única,

mas de várias identidades, algumas vezes contraditórias ou não

resolvidas. (2004 p. 12)

Observamos essas características com o protagonista até o quinto volume da saga,

conhecemos um Harry Potter seguro de si, determinado em alcançar seus objetivos

e que parece “se conhecer” bem. A partir de então, o menino passa a se questionar

134

a que lado, de fato, ele “pertence”. No fragmento literário escolhido, sua voz acaba

“se misturando” com a voz de seu inimigo (2003, p. 660): “Me mate agora,

Dumbledore...”.

Na cena que adapta o fragmento, Harry Potter também emite fala que causa

estranhamento no espectador, pois há dúvidas de quem está falando, se é o menino

ou se é seu inimigo “possuindo” seu corpo: “Você perdeu, velhote.” (2:00:51). Na

cena cinematográfica também vemos Harry Potter se olhando no espelho e tendo

como seu reflexo seu inimigo: Voldemort. Tais momentos observados na cena

escolhida e também em outros ao longo da narrativa da saga Harry Potter ressaltam

identidades fragmentadas, contraditórias e não resolvidas, como mencionou Hall.

Essa ideia de vivenciar novas experiências que os jovens enfrentam também

remetem à ideia de busca constante pelo novo. Tanto isso quanto a crise de

identidade são traços que caracterizam um indivíduo moderno e pós-moderno,

conforme cita Bridi:

[...] os dois principais elementos unanimemente indicados como características da modernidade - a constante busca pelo novo e, sua dialética consequência, a crise de identidade - são também evidentes na pós-modernidade, sem que, no entanto, se configurem como opostos excludentes: em vez de dialeticamente dispostas, a busca do novo e a crise de identidade se somam dialogicamente, ampliando combinações e os desdobramentos que tais termos comportam. (2005, p. 77)

Sobre o conteúdo narrativo da saga Harry Potter, podemos afirmar que ele se

aproxima ou dialoga com o conteúdo do gênero épico. Sobre o mesmo, Moisés nos

traz uma definição que contribui para o entendimento da construção narrativa:

A palavra épica liga-se a epos, que significa 'recitação' em Grego. Seu conteúdo revela ação, luta, e, por isso, baseia-se num fato histórico de grande importância, transformado, na psicologia do povo, em verdadeiro mito ou lenda. [...] O épico faz-se representante de Nós, quer dizer, procura fixar o grande feito de transcendência pátria, que reflete o apogeu histórico de uma nação. (1989, p. 26)

135

As principais características do gênero épico em Harry Potter são o caráter da luta

por uma nação que em Harry Potter vemos pelo protagonista que luta por aqueles

que ama e chega a sacrificar sua própria vida em nome da nação bruxa que busca

combater o que é defendido pelo Lord Voldemort.

Temos também a presença da ação, da batalha, feita não apenas pelo protagonista

em prol ao mundo bruxo, como mencionado anteriormente, mas por todos aqueles

que se rendem à luta.

Um elemento muito presente no conteúdo do gênero épico e claramente observada

em Harry Potter é a figura do herói que pode ser compreendida, dentre várias

definições por:

Um herói vindo do mundo cotidiano se aventura numa região de prodígios sobrenaturais; ali encontra fabulosas forças e obtém uma vitória decisiva; o herói retorna de sua misteriosa aventura com o poder de trazer benefícios aos seus semelhantes. [...]

O herói [...] é uma personagem dotada de dons excepcionais. Frequentemente honrado pela sociedade de que faz parte [...]. Ele e/ou o mundo em que se encontra sofrem de uma deficiência simbólica. (CAMPBELL, 1995, p. 18-21)

Na saga Harry Potter identificamos várias figuras que podemos dizer como heróis

que vão desde os estudantes de Hogwarts, membros da Ordem da Fênix, até a

próxima nação bruxa que luta pelo bem e, inclusive, o próprio protagonista,

personagem que traça essas características marcantes como a coragem,

abnegação, teve muitas perdas em seu caminho (seus pais, padrinho, amigos) e que

se arrisca por todos.

Harry Potter, podendo ser classificado como herói da saga (um dos) passa por

várias viagens ao longo da narrativa. Estas viagens podem ser físicas (o

deslocamento de um lugar para o outro), mas também podem ser viagens em busca

de um objetivo. Nestas viagens o garoto enfrenta uma série de obstáculos, inimigos

e tudo que deseja causar uma interferência na conquista do objetivo do herói. Um

obstáculo que Harry Potter tem pela frente é o enfrentamento do seu próprio destino

136

(outra característica de um herói): ele sabe o que deverá vir pela frente, mas

questiona se de fato é o melhor caminho a ser seguido. Em sua viagem, Harry Potter

também partilha da presença de mentores, amigos e criaturas míticas que desejam

contribuir para a conquista de seus objetivos.

Ainda sobre esta jornada do herói, podemos fazer uma associação do percurso de

Harry Potter com o caminho traçado pro Campbell (1995) em três atos: o garoto sai

de um mundo comum, o mundo “sem magia”, passa por um chamado à aventura

quando recebe sua carta de Hogwarts e também quando Hagrid o busca na casa de

seus tios, em seguida faz a recusa do chamado, ele reluta brevemente em atender

este chamado. Quando passa pela plataforma 9¾ e embarca no Expresso de

Hogwarts podemos dizer que Harry Potter faz a travessia do primeiro limiar e já na

escola tem o encontro com o mentor, ou seja, com os professores e amigos que o

acompanharão na jornada e que procuram aconselhar-se e favorecê-lo.

Durante todos os anos em Hogwarts, ou seja, durante toda a narrativa da saga Harry

Potter, o garoto passa por testes, ou seja, passa por desafios que vão “qualificá-lo”,

são uma provação. Além disso, durante toda a narrativa Harry Potter faz aliados e

inimigos, os quais os ajudarão a percorrer e os que tentarão prejudicá-lo em sua

jornada, respectivamente. Podemos afirmar que o garoto tem sua aproximação da

caverna oculta quando tem posse de sua profecia, que lhe dirá um caminho possível

para vencer o Lord das Trevas, ou seja, será uma espécie de arma. Ainda durante

toda a série Harry Potter e principalmente no final, o garoto passa por provação

suprema, ou seja, ele tem embates com o seu inimigo gerando, ao final, alguma

recompensa.

Se pensarmos no final da saga Harry Potter ainda compreendemos que, ao

enfrentar o seu inimigo, disposto a sacrificar-se para estabelecer a paz na nação

bruxa e derrotá-lo, o garoto encontra seu caminho de volta, ou seja, uma solução. O

garoto enfrenta essa condição, morre e passa pela ressurreição, e volta com o

objetivo de derrotar seu inimigo. Após a resolução de todos os desafios, a derrota de

Voldemort e do estabelecimento da paz, Harry Potter poderá retornar ao seu “mundo

comum” agora com todos os conhecimentos, com todas as armas que adquiriu ao

longo de sua jornada para levar para sua vida.

137

Estas características de um conteúdo épico (a presença de herói, viagem, luta por

uma nação, enfrentamento do destino, batalhas) junto às características

modernas/pós-modernas (busca constante pelo novo e crise de identidade)

constroem a narrativa da saga Harry Potter. Podemos afirmar, assim, que o

protagonista realiza e passa por feitos heroicos em confluência com assuntos

presentes na modernidade. Tais assuntos e tais vivências também podem ser

aproximadas, como explicado no início desta conclusão, às vivências dos jovens em

idade de formação.

Assim como o jovem enfrenta dúvidas amorosas, dúvidas sobre sua carreira,

dúvidas sobre sua conduta perante a sociedade, dúvidas sobre o que é “certo ou

errado” etc., o herói da saga Harry Potter (os heróis) passa(m) pelo mesmo. Essa

“mescla” torna Harry Potter um herói da modernidade, gerando uma maior

proximidade com o seu leitor.

Essa proximidade abre diversas possibilidades para utilização de Harry Potter (a

saga de modo geral) e literaturas semelhantes na educação básica brasileira para a

contribuição de compreensão de conteúdos. Ao ensinar (em Apêndice), por

exemplo, a literatura do classicismo de Camões, o professor do Ensino Médio pode

utilizar os temas tratados no texto épico de Harry Potter como um modo de despertar

o interesse dos alunos para então fazer a ponte que leve a literatura “obrigatória” do

currículo dos estudantes, esta, muitas vezes encarada como “chata” por abordar

temas distantes da realidade do aluno e por possuir uma linguagem “ultrapassada”

(a língua portuguesa em Os Lusíadas é “arcaica” se compararmos com a atual).

Outro exemplo (em Apêndice) de aplicação de Harry Potter em sala de aula na

educação básica brasileira pode ser feita com a cena escolhida para esta

dissertação no trabalho de literatura moderna, no que se diz respeito ao homem

moderno e sua complexidade. Com a cena escolhida o professor pode trabalhar,

para introdução de obras “obrigatórias” a questão da crise de identidade.

Em ambos os exemplos de atividades citados acima que aplicam Harry Potter em

sala de aula, além do objetivo de fazer com que o aluno compreenda de modo mais

prazeroso por meio de um conteúdo mais “atual” e próximo da realidade dos

mesmos temas tratados em obras renomadas, poderá ainda despertar o interesse

138

dos jovens estudantes do cinema e da literatura, o que pode contribuir para que eles

desenvolvam e aprofundem o hábito da leitura. A utilização de Harry Potter ainda

pode levantar temas transversais na escola como a violência, discussões sobre

cinema e até mesmo o debate de se Harry Potter (ou qualquer outra obra utilizada

pelo professor para fazer a ponte dos conteúdos) é ou não literatura.

Quando o professor utiliza conteúdos mais próximos da realidade dos alunos para

exemplificar matérias escolares e itens obrigatórios do currículo escolar poderá

despertar o interesse em adquirir aquele conhecimento, mas também outros que ele

mesmo poderá descobrir. Os alunos não sentem que aquilo que eles conhecem é

“desprezível” perante o que é dito como renomado (o que é abordado na escola),

mas sim uma fonte de conhecimento.

Em relação à cena escolhida para o desenvolvimento deste trabalho, sua

transposição da literatura para o cinema não foi totalmente literal. Devemos ressaltar

que não houve a intenção de realizar uma comparação para apontar a fidelidade,

mas, sim, a intenção da transposição das temáticas abordadas.

O importante para se inteligir as operações de trânsito semiótico é se tornar capaz de ler, na raiz da aparente diversidade das linguagens e suportes, os movimentos de passagem dos caracteres icônicos, indiciais e simbólicos não apenas nos intercódigos, mas também no intracódigo. Ou seja, não é o código [...] que define a priori se aquela linguagem é [...] icônica, indicial ou simbólica, mas os processos e leis de articulação de linguagem que se efetuam no interior no suporte ou mensagem. (PLAZA, 2010, p. 67)

A cena traduz metaforicamente a serpente de olhos vermelhos como as

inseguranças vividas pelo protagonista, seus medos, suas dúvidas, ou seja, a tensão

e a pressão de um jovem ao encarar novas experiências de vida, ao ter que decidir

seus rumos. A emoção é traduzida da literatura para o filme como elementos que

despertam o sentimento de felicidade, de alegria, aconchego e segurança. No trecho

literário, apenas Sirius Black, parte da família, é citado, mas o filme amplia para o

resto da família e para os amigos. Além de Sirius Black, outras perdas também

139

aprecem na tradução entre o livro e o filme, como o pai e a mãe de Harry Potter,

além de Cedrico Diggory.

Em todas as partes envolvidas, principalmente na adaptação cinematográfica (por

esta ter ampliado o conteúdo do trecho literário) que se passam com o protagonista,

as inseguranças, as seguranças e as perdas, são também passagens integrantes da

vida dos jovens. Os mesmos poderão identificar-se, ou seja, notar as semelhanças

vividas pelo protagonista e interessar-se em realizar uma leitura mais aprofundada

da narrativa não apenas da saga Harry Potter, mas de várias outras obras literárias

e cinematográficas que abordam temáticas que cercam o mundo juvenil e que são

apresentadas em mundos e universos diferentes, mágicos e extraordinários. Esta

identificação possibilitará que o interesse e hábito da leitura e do cinema sejam

ampliados pelos mesmos jovens, ainda mais com a contribuição da escola,

promovendo a formação de cidadãos críticos, conforme ressalta Napolitano:

A diferença é que a escola, tendo o professor como mediador, deve propor leituras mais ambiciosas além do puro lazer, fazendo a ponte entre emoção e razão de forma mais direcionada, incentivando o aluno a se tornar um espectador mais exigente e crítico. (2006, p. 15)

A importância de Harry Potter ter sido adaptado para o cinema (ou seja, através de

um processo de tradução intersemiótica) está no fato de que esta manifestação

pôde ser ampliada para mais pessoas (que não possuem o hábito de leitura e

assistem apenas aos filmes) mantendo e renovando essa parte da cultura e que

também pode ser um artifício significativo para o interesse em leitura da saga

(pessoas que assistiram aos filmes e tiveram interesse em ler a saga literária) e de

outras literaturas.

Assim, concluímos este trabalho que abrangeu, por meio de um estudo de tradução

intersemiótica entre literatura e cinema, a importância dessas duas vertentes no

meio cultural e no meio educacional. Podemos olhar a tradução intersemiótica como

o modo de resgatar, renovar e manter culturas e manifestações. Através dos

produtos realizados pela tradução intersemiótica mais pessoas podem ter acesso a

estas culturas e manifestações permitindo que elas ampliem seus conhecimentos e

140

possam incluir em seu dia-dia. Vemos aqui também a tradução intersemiótica como

uma possibilidade na área de educação, podendo ser uma ferramenta em diversas

áreas para que o processo de ensino-aprendizagem possa se tornar mais prazeroso

para os alunos e contribuir, inclusive, para o hábito de leitura.

141

CHAPÉU SELETOR -Referências

— Então só precisamos experimentar o chapéu! — cochichou Rony a Harry.— Vou matar o Fred, ele não parou de falar numa luta contra um trasgo.

Harry deu um sorriso sem graça. É, experimentar um chapéu era bem melhor do que precisar fazer um feitiço, mas desejou que pudessem ter experimentado o chapéu sem toda aquela gente olhando. O chapéu parecia estar pedindo muito, Harry não se sentia corajoso nem inteligente nem qualquer outra coisa naquele momento. Se ao menos o chapéu tivesse mencionado uma casa para gente que se sentia meio nervosa, quem sabe teria sido a sua casa. A Professora Minerva então se adiantou segurando um longo rolo de pergaminho.

— Quando eu chamar seus nomes, vocês porão o chapéu e se sentarão no banquinho para a seleção. (ROWLING, 2000, p. 105)

142

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ROWLING, J. K. Harry Potter e as Relíquias da Morte. Rio de Janeiro: Rocco.

2007.

ROWLING, J. K. Harry Potter and the Order of the Phoenix. Scholastic. 2003.

ROWLING, J. K. Harry Potter and the Order of the Phoenix. Bloomsbury. 2003.

145

ROWLING, J. K. Harry Potter e o Cálice de Fogo. Rio de Janeiro: Rocco, 2001.

ROWLING, J. K. Harry Potter e o Enigma do Príncipe. Rio de Janeiro: Rocco,

2005.

ROWLING, J. K. Harry Potter e Prisioneiro de Azkaban. Rio de Janeiro: Rocco,

2000.

TOUTAIN, L. M. Para entender a Ciência da Informação. Salvador: UFBA, 2007.

WACHTEL, Paul L. Therapeutic communication: Principles and effective

practice. New York, NY, US: Guilford Press. (1993)

Harry Potter e a Ordem da Fênix. Direção de David Yates. Produção de David

Heyman. Reino Unido: Warner Bros., 2007. (138 min.), son. color.

Lista de sites consultados

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< http://www.amazon.com/gp/bestsellers/books/. > Acesso em 15.03.2015.

< http://arte.folha.uol.com.br/graficos/3Ux6L/?w=620&h=455 > Acesso em

02.12.2016.

< http://bordadologia.files.wordpress.com/2014/10/bayeux-tapestry-museum-

bordadologia-002.jpg. > Acesso em 11.05.2016.

< http://bordadologia.files.wordpress.com/2014/10/tapec3a7aria-bayeux-histc3b3ria-

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< http://www.boxofficemojo.com/alltime/world. > Acesso em 25.04.2016.

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43735.jpg.> Acesso em 12.01.2016.

< httP://www.universalorlando.com/Theme-Parks/Universal-Studios-

Florida/Wizarding-World-Of-Harry-Potter-Diagon-Alley.aspx. > Acesso em

12.01.2016.

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Acesso em 06.04.2016.

< http://viajandonovermelho.com. > Acesso em 20.08.2016.

148

MAPA DO MAROTO (Glossário)

Ele apanhou a varinha, tocou o pergaminho de leve e disse: Juro solenemente que não pretendo fazer nada de bom.

Na mesma hora, linhas de tinta muito finas começaram a se espalhar como uma teia de aranha a partir do ponto em que a varinha de Jorge tocara. Elas convergiram, se cruzaram, se abriram como um leque para os quatro cantos do pergaminho; em seguida, no alto, começaram a aflorar palavras, palavras grandes, floreadas, verdes, que diziam:

Os Srs. Aluado, Rabicho, Almofadinha e Pontas, fornecedores de recursos para bruxos malfeitores, têm a honra de apresentar O MAPA DO MAROTO.

Era um mapa que mostrava cada detalhe dos terrenos do castelo de Hogwarts. (ROWLING, 2000, p. 159)

149

Mapa do Maroto (Glossário)

Educação

Torneio Tribruxo: competição entre estudantes de três escolas diferentes que visa

testar os recursos e poderes de cada um. Os representantes da edição do Torneio

Tribuxo que ocorre em Hogwarts são Cedrico Diggory, Harry Potter, Fleur Delacour

(da escola Beauxbottons) e Vitor Krum (da escola Durmstrang).

Transfiguração: disciplina escolar estudada em Hogwarts ministrada pela professora

Minerva. Trata-se do estudo da transformação de objetos em outros.

Feitiços

Lumus: feitiço que ascende uma luz na ponta da varinha.

Grupos

Armada de Dumbledore: organização de alunos de Hogwarts para estudar,

secretamente, a matéria Defesa Contra as Artes das Trevas. A Armanda de

Dumbledore foi criada porque Dolores Umbridge restringiu os estudos em Hogwarts

e os alunos julgaram a educação que estavam recebendo insuficiente. Harry Potter

treina seus colegas em reuniões semanais na Sala Precisa, uma sala secreta da

escola.

Ordem da Fênix: sociedade secreta que tem por objetivo reunir forças para derrotar

Lord Voldemort e os bruxos das trevas.

Lugares

Expresso de Hogwarts: trem que leva dos bruxos estudantes à Hogwarts. O

embarque é feito sempre em 1º de setembro às onze horas da manhã pela

plataforma 9¾ .

150

Hogwarts: escola de magia e bruxaria localizada na Escócia para jovens a partir dos

onze anos de idade em que os alunos são selecionados para uma das quatro casas

em vista das características predominantes de cada um: Grifinória, Lufa-Lufa,

Corvinal e Sonserina. Do primeiro ao sexto ano de Harry Potter em Hogwarts, o

diretor é Alvo Dumbledore e no sétimo ano quem assume é Severo Snape.

Largo Grimmoud, 12: endereço da sede da Ordem da Fênix onde são realizados os

encontros e reuniões secretas dos membros. É a antiga residência da família Black.

Ministério da Magia: administração e centro político dos bruxos, localizado em

Londres.

Plataforma 9¾ : plataforma de embarque para os bruxos estudantes de Hogwarts

para a escola, localizada em Kings Cross em Londres.

Objetos

Chapéu Seletor: objeto que seleciona os novos jovens estudantes de Hogwarts para

uma das quatro casas da escola. O Chapéu Seletor é colocado nas cabeças dos

alunos e ele indica, de acordo com as características e peculiaridades de cada caso,

para uma das opções.

Horcruxes: recurso mágico que prende partes da alma de Voldemort em objetos (o

mesmo criou sete para tornar mais difícil a destruição e, portanto, mais difícil a sua

derrota).

Mapa do Maroto: objeto mágico desenvolvido pelos Marotos (Aluado – Remo Lupin,

Rabicho – Pedro Pettigrew –, Almofadinha – Sirius Black - e Pontas – James Potter)

que fora encontrado pelos gêmeos Weasley. O Mapa do Maroto é um mapa de

Hogwarts que mostra todos os movimentos dos bruxos ali presentes em tempo real

e que também indica todas as passagens secretas.

Penseira: objeto mágico pertencente à Dumbledore o qual permite que o bruxo que

a utiliza possa reviver uma memória de algum momento vivido.

Varinha: instrumento e arma mágica essencial dos bruxos.

151

Personagens

Cedrico Diggory: aluno da casa Lufa-Lufa foi representante, junto com Harry Potter,

de Hogwarts no Torneio Tribruxo. Foi morto por ordem de Voldemort.

Comensais da Morte: seguidores de Lord Voldemort.

Dolores Umbridge: secretária do Ministro da Magia, ela assume, no quinto ano letivo

de Harry Potter, o cargo de professora de Defesa Contra as Artes das Trevas. Ela,

junto ao Ministério da Magia, restringe a educação em Hogwarts porque acredita que

não há motivo para o estudo prático de magia – pois o Ministério da Magia não

acredita que Voldemort, de fato, voltou durante o Torneio Tribruxo.

Dumbledore: diretor de Hogwarts até o sexto ano letivo de Harry Potter, é dito por

muitos como o maior bruxo de todos os tempos. Famoso por ter derrotado bruxos

das trevas e por seus estudos mágicos. Foi morto por Severo Snape, era o bruxo

mais temido por Lord Voldemort.

Dursleys: Tios trouxas de Harry Potter, abrigam o garoto até seus onze anos de

idade sem contar que ele é um bruxo.

Gina Weasley: irmã mais nova Dos sete irmãos Weasleys. Aluna da Grifinória, é

apaixonada por Harry Potter.

Harry Potter: nascido ao final do mês de julho, filho de Lilian e James Potter. Lord

Voldemort tentou matá-lo por acreditar que era ele quem o derrotaria. Foi escolhido

para a casa Grifinória.

Hermione Granger: melhor amiga de Harry Potter, filha de pais trouxas. Foi

selecionada pra a Grifinória. É considerada por seus amigos e professores como a

bruxa mais brilhante da sua idade.

Lord Voldemort: também chamado de Lord das Trevas, Aquele-que-não-deve-ser-

nomeado e Você-sabe-bem. Adotou o termo por vergonha de ter herdado o nome de

seu pai trouxa. Tinha sede de poder, de ser o bruxo mais poderoso e por isso

buscou um modo de tornar-se imortal por meio de sete Horcruxes. Buscou, também,

a Varinha das Varinhas, a mais poderosa capaz de derrotar qualquer um. Quando

descobriu, por meio de uma profecia, que uma criança nascida ao final do mês de

152

julho seria capaz de derrotá-lo, tratou de descobrir onde esta criança estaria para

matá-la. Para chegar a Harry Potter (nascido na data estimada pela profecia) matou

Lilian e James Potter (pais do menino) e tentou matá-lo, sem êxito.

Luna Lovegood: aluna da casa Corvinal, torna-se amiga de Harry Potter em seu

quinto ano letivo ao ajudá-lo no Ministério da Magia para buscar a profecia.

Neville Logbotton: amigo de Harry Potter da casa Grifinória, também nascido no

último dia do mês de julho, logo, também poderia ser o destinado a derrotar o Lord

das Trevas.

Ron Weasley: melhor amigo de Harry Potter da casa Grifinória.

Sirius Black: esteve preso por treze anos na prisão de Azkaban por ter sido julgado o

culpado por dizer o esconderijo de Lilian e James Potter ao Lord Voldemort. Black,

na verdade, não contou tal fato ao Lord das Trevas, e sim Pedro Pettigrew. Também

é o padrinho de Harry Potter. Foi morto por Bellatrix Lestrange pouco depois de

Harry Potter resgatar sua profecia no Ministério da Magia.

Termos

Trouxa: termo utilizado para definir quem não é bruxo (termo utilizado pelos bruxos).

153

APÊNDICE

Linha do tempo

154

Exemplos de Planos de Aulas

Exemplo 1: O Ensino de características do homem moderno e pós-moderno na

literatura através de Harry Potter

Disciplina: Língua e literatura portuguesa.

Série/Ano: 2ª série do Ensino Médio.

AULA 1

Conteúdo a ser trabalhado: introdução de características do homem moderno/pós-

moderno na literatura focando na crise de identidade.

Objetivos da aula: introduzir alguns conceitos e características do homem

moderno/pós-moderno na literatura através de textos teóricos de forma que estes

(conceitos) tornem-se claros para serem aprofundados nas aulas seguintes.

Resumo do conteúdo a ser trabalhado: o professor, junto aos alunos, fará a leitura

das características do homem moderno/pós-moderno na literatura e abrirá espaço

para uma discussão procurando compreender o que os alunos entendem por crise

de identidade. O professor abrirá também o questionamento dos motivos, segundo

os alunos, de o homem moderno e pós-moderno passar por esse transtorno.

Metodologia: reflexão a partir de uma aula dialogada podendo ser feita, inclusive, em

mesa redonda entre professor e alunos.

Recursos necessários: utilização do material didático adotado pela escola como

base e, se necessário, a utilização de textos externos que tratem do assunto que

poderão ser fornecidos pelo professor ou projetados em projetor multimídia.

Avaliação: a participação dos alunos durante a leitura e discussão.

AULA 2

Conteúdo a ser trabalhado: retomada dos conceitos levantados na aula anterior,

especialmente a crise de identidade e reflexão do assunto através de Harry Potter.

155

Objetivos da aula: fazer com que os alunos consigam identificar características do

homem moderno/pós-moderno em uma cena do filme Harry Potter e a Ordem da

Fênix, pretendendo, dessa forma, fazer com que consigam identificar a crise de

identidade em um conteúdo mais próximo da realidade dos mesmos para que, na

aula seguinte, possam fazer a mesma reflexão em um texto de José Saramago.

Resumo do conteúdo a ser trabalhado: o professor começará a aula retomando os

conceitos vistos na discussão da aula anterior, enfatizando, principalmente, a crise

de identidade como característica do homem moderno/pós-moderno na literatura.

Em seguida, o professor perguntará aos alunos se os alunos conhecem a saga

Harry Potter para que, caso não conhecem, possa dar uma explicação breve sobre o

assunto. Então, o professor exibirá a cena de minutagem 2:00:34 aos 2:03:26 de

Harry Potter e a Ordem da Fênix e pedirá para que os alunos identifiquem a crise de

identidade que ocorre com o protagonista e reflitam sobre.

Metodologia: aula expositiva e dialogada.

Recursos necessários: computador e de projetor multimídia para exposição de DVD.

Além do material multimídia, material didático adotado pela escola como base.

Avaliação: a participação dos alunos durante a reflexão.

AULA 3

Conteúdo a ser trabalhado: retomada dos conceitos levantados nas aulas anteriores,

especialmente a crise de identidade e reflexão do assunto em textos de José

Saramago.

Objetivos da aula: fazer com que os alunos consigam identificar características do

homem moderno/pós-moderno em textos da literatura de José Saramago (como em

O Homem Duplicado), pretendendo, dessa forma, fazer uma ponte com o exercício

realizado na aula anterior com Harry Potter e identifiquem a crise de identidade

agora em um texto literário.

Resumo do conteúdo a ser trabalhado: o professor iniciará a aula retomando

rapidamente as características do homem moderno/pós-moderno vistas nas duas

aulas anteriores e pedirá para os alunos realizarem o mesmo exercício de reflexão

desta vez com um texto da literatura de José Saramago. O professor poderá realizar

156

esta atividade em conjunto aos alunos ou poderá pedir que a atividade seja feita em

grupos exigindo justificativas quanto a identificação das características.

Metodologia: aula destinada à reflexão própria dos alunos/aula expositiva e

dialogada.

Recursos necessários: computador e de projetor multimídia para exposição de

vídeos e de PowerPoint. Além do material multimídia, material didático adotado pela

escola como base.

Avaliação: o professor avaliará as atividades reflexivas feitas com fim de apontar se

os alunos compreenderam os conceitos e questões abordadas nas aulas.

Bibliografia de apoio para este plano de aula

BRIDI, M. V. Modernity and post-modernity in contemporary Portuguese fiction.

Todas as Letras G (São Paulo), ano 7, n.7, p. 75-81, edição especial, 2005.

FREIRE, Paulo; GUIMARÃES, Sérgio. Educar com a mídia: novos diálogos sobre

a educação. São Paulo: Paz e Terra, 2011.

HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da Língua

Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.

SARAMAGO, José. O homem duplicado. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.

Exemplo 2: Projeto: O ensino de Os Lusíadas através da saga Harry Potter

Disciplina: Língua e literatura portuguesa.

Série/Ano: 1ª série do Ensino Médio.

AULA 1

Conteúdo a ser trabalhado: Introdução de características épicas e clássicas como: o

conceito de herói, de destino, a presença de uma trajetória (a viagem), do

sentimento de nacionalidade e do amor.

157

Objetivos da aula: introduzir o Classicismo de leve, estabelecendo relações de

semelhança e diferença entre Harry Potter e Os Lusíadas, mostrando o conteúdo

para os alunos de modo mais interativo.

Resumo do conteúdo a ser trabalhado: estudo do Classicismo a partir de uma

comparação intertextual entre Os Lusíadas e a saga Harry Potter.

Metodologia: aula expositiva e dialogada pautada

Recursos necessários: computador e de projetor multimídia para exposição de

vídeos e de PowerPoint. Além do material multimídia, material didático adotado pela

escola como base.

Avaliação: Após a exposição dos vídeos será feita uma breve discussão com os

alunos no tempo restante da aula sobre o que foi observado pelos mesmos nos

vídeos e a partir dessa conversa haverá a continuidade do tema nas aulas

seguintes.

AULA 2

Conteúdo a ser trabalhado: Desenvolvimento e estudo dos conceitos de herói, de

destino, da trajetória (viagem), do sentimento de nacionalidade e do amor presentes

na série bruxa para que, mais adiante, possa ser feita comparação com a obra de

Camões.

Objetivos da aula: Mostrar para os alunos que as características de Os Lusíadas que

serão estudadas não são exclusivas do período clássico e que ainda se apresentam

em diversas obras contemporâneas.

Resumo do conteúdo a ser trabalhado: os conceitos de herói, de destino, de viagem,

de nacionalidade e de amor presentes em obras épicas clássicas como Os

Lusíadas.

Metodologia: aula expositiva e dialogada.

Recursos necessários: computador e de projetor multimídia para exposição de

vídeos e de PowerPoint. Além do material multimídia, material didático adotado pela

escola como base.

158

Avaliação: a participação dos alunos durante a discussão.

AULA 3

Conteúdo a ser trabalhado: Continuidade e aprofundamento do estudo dos conceitos

de herói, de destino, da trajetória (viagem), do sentimento de nacionalidade e do

amor presentes na "série bruxa" - relacionando-os agora mais diretamente a Os

Lusíadas.

Objetivos da aula: Mostrar para os alunos trechos de Os Lusíadas, primeiramente da

adaptação do Rubem Braga, na qual espera-se que os alunos consigam reconhecer

as características até então vistas e, depois, do original, para que se familiarizem

com uma obra clássica original.

Resumo do conteúdo a ser trabalhado: os conceitos de herói, de destino, de viagem,

de nacionalidade e de amor, relacionando-os agora de forma mais direta à obra de

Camões.

Metodologia: aula expositiva e dialogada.

Recursos necessários: computador e de projetor multimídia para exposição de

vídeos e de PowerPoint. Além do material multimídia, material didático adotado pela

escola como base.

Avaliação: a participação dos alunos durante a discussão.

AULA 4

Conteúdo a ser trabalhado: Serão finalizados eventuais conteúdos que ainda não

tenham sido terminados, assim como deverão ser sanadas possíveis dúvidas dos

alunos referentes ao tema.

Objetivos da aula: Finalizar o conteúdo referente ao Classicismo, tirar dúvidas e

disponibilizar o restante da aula para que o professor explique o trabalho avaliativo

de aquisição do conteúdoaos alunos e para que os mesmos possam começar sua

organização do trabalho, já que este deverá ser realizado em grupos.

Resumo do conteúdo a ser trabalhado: Serão finalizados conteúdos até então

estudados, assim como serão sanadas possíveis dúvidas dos alunos.

159

Metodologia: aula expositiva e dialogada.

Recursos necessários: computador e de projetor multimídia para exposição de

vídeos e de PowerPoint. Além do material multimídia, material didático adotado pela

escola como base.

Avaliação: Os mesmos deverão formar trios e decidir, ainda na própria aula, algo

que possam comparar com o período clássico (a escolha será de cada grupo). Após

decidirem, o professor conversará com os grupos brevemente para avaliar se as

comparações são de fato coerentes e/ou auxiliar alunos com outras dificuldades. Os

grupos terão duas semanas para se manifestarem artisticamente mostrando as

comparações por eles estabelecidas: poderão ser utilizados cartazes, vídeos,

esquemas etc. que poderão ser feitos da forma como desejarem, desde que

consigam entregar o trabalho pronto ao professor (em papel ou gravado em CD, por

exemplo). Os trabalhos deverão ser realizados em casa, pois dificilmente haverá

tempo hábil em uma escola regular para que o professor utilize mais do que quatro

aulas para tratar de Camões e do período Clássico.

Bibliografia de apoio para este plano de aula

CAMÕES, Luís Vaz de; BRAGA, Edson Rocha (adap.); BRAGA, Rubem (adap.). Os

Lusíadas. São Paulo: Scipione, 2007. – (Série Reencontro Literatura)

FREIRE, Paulo; GUIMARÃES, Sérgio. Educar com a mídia: novos diálogos sobre

a educação. São Paulo: Paz e Terra, 2011.

HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da Língua

Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.

IRWIN, William (coord.); BASSHAM, Gregory (org.). A versão definitiva de Harry

Potter e a filosofia: Hogwarts para os Trouxas. São Paulo: Madras, 2011.