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Varnhagen: Analise interpretativa do autor e Sua “História Geral do Brasil”. Uma concepção acerca do Índio e da Identidade Nacional no século XIX. Ailton silva dos Santos 1 Bruna Ribeiro dos Santos 2 Resumo Varnhagen, influente pensador do século XIX, juntamente com sua concepção acerca do índio e do negro, atravessou eras, e é impossível se estudar a historiografia brasileira sem beber desse autor e sem se impressionar com sua visão histórica. Estudando sua obra e autores que trabalharam com essa figura épica, procuramos apresentar seu pensamento e estudar suas causas. Demonstrar sua importância para a historiografia nacional, analisando-o em seu contexto, assim como problematizar sua relação de aversão ao gentio. Tendo em base suas afirmativas em defesa de seu ideal colonizador, tirânico e português. Palavras-Chave: Varnhagen, colonizador, índio. 1 Cursando Licenciatura em História, pela Faculdade Dom Pedro II- FJAV. E-mail: [email protected]. 2 Cursando Licenciatura em História, pela Faculdade Dom Pedro II FJAV. E-mail: [email protected].

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Varnhagen: Analise interpretativa do autor e Sua “História Geral do Brasil”. Uma

concepção acerca do Índio e da Identidade Nacional no século XIX.

Ailton silva dos Santos1

Bruna Ribeiro dos Santos2

Resumo

Varnhagen, influente pensador do século XIX, juntamente com sua concepção acerca do índio

e do negro, atravessou eras, e é impossível se estudar a historiografia brasileira sem beber

desse autor e sem se impressionar com sua visão histórica. Estudando sua obra e autores que

trabalharam com essa figura épica, procuramos apresentar seu pensamento e estudar suas

causas. Demonstrar sua importância para a historiografia nacional, analisando-o em seu

contexto, assim como problematizar sua relação de aversão ao gentio. Tendo em base suas

afirmativas em defesa de seu ideal colonizador, tirânico e português.

Palavras-Chave: Varnhagen, colonizador, índio.

1 Cursando Licenciatura em História, pela Faculdade Dom Pedro II- FJAV. E-mail: [email protected]. 2 Cursando Licenciatura em História, pela Faculdade Dom Pedro II – FJAV. E-mail: [email protected].

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1 – Introdução: Varnhagen no tempo e espaço.

Nascido em São João de Ipanema (atual Sorocaba), São. Paulo, em 17 de fevereiro de

1816. Francisco Adolfo de Varnhagen foi um dos maiores historiadores brasileiros e um

grande intelectual de sua época. Tido como o Heródoto Brasileiro, ele influenciou o meio da

pesquisa histórica com seu método de procedência, em torno do que cabia a investigação de

documentos. Sua forma de estudar os acontecimentos, ao longo do tempo, de forma linear e

cronológica, difundindo a máxima de que “as ações humanas espalham as intenções de quem

as pratica” foi um marco para historiadores brasileiros recém-surgidos.

“-Ele pode ser considerado, de fato, o ‘Heródoto do Brasil’, pois foi o

iniciador da pesquisa metódica nos arquivos estrangeiros, onde encontrou e

elaborou inúmeros documentos relativos ao Brasil. Tendo morado sempre no

exterior, se sentia um exilado, dominado que sempre esteve pela saudade do

Brasil-”. (REIS, José Carlos, 1999, p.24).

Privilegia o estado e o estuda de forma isolada de forças econômicas e sociais. E tem

financiamento para suas pesquisas e publicações provindas do próprio D. Pedro II. Em sua

obra, que mesmo tida por muitos da atualidade e vários de sua época como uma concepção

racista que atesta a dominação portuguesa sobre o indígena e negro, conhecemos bem sua

aversão a essas duas etnias, ele foi o criador da “Grande História Brasileira”. Esse termo nos

causa calafrios após termos feito a leitura, mas o que nos vale aqui é avaliar sua escrita e

tentar nos projetar na época e personificar o homem a fim de compreender suas intenções a

partir da avaliação de trechos de sua obra.

Filho da portuguesa Maria Flávia de Sá Magalhães e de Friedrich Ludwig Wilhelm

Varnhagen, um engenheiro militar, surge na historiografia brasileira como um grande nome.

“-Foi um historiador oficial, um adulador dos poderosos e juiz severo das

revoltas populares. A história, para ele, é feita pelos grandes homens, por

reis, guerreiros e governadores, bispos e não pelos homens incultos. Foi à

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Casa de Bragança que construiu o Brasil íntegro, uno e independente-”.

(REIS, José Carlos, 1999, p.32).

Deixa claro sua preferência portuguesa, lembremos que ele realizou todos os seus

estudos em Lisboa, cursando em um colégio militar e ingressando nas tropas de D. Pedro IV

contra D. Miguel nas guerras liberais, inicia sua grande obra “Historia Geral do Brasil” com

uma narrativa enfadonha e rebuscada da partida das naus portuguesas e citando figuras

ilustres a seu ver termina por narrar essa partida e travessia transatlântica e continua sua obra

mostrando aspectos e apresentando formas geográficas de nosso país, assim como fauna e

flora.

“-Geognosticamente consta a parte oriental deste território de altas serras,

em geral de formações primitivas, onde predomina o granito e mais rochas

congêneres. A ellas se arrimam pelo dorso Occidental os sandsteins e

itacolumites. Na parte central, sobre as águas do S. Francisco e do Tocantins,

abundam as rochas calcareas, que forne-cerão algum dia á industria humana

mármores de varias cores. Para as bandas do norte, nos extensos paramos re-

talhados pelas águas que vão ao Maranhão e a vários dos afluentes do

Amazonas, quasi tudo são formações cretosas e terrenos de alluvião-”.

(Varnhagen, 1953, p.90; tomo I).

Ainda sobre terras da America Portuguesa, o autor descreve o clima e vegetação típica

do clima tropical:

“-Nos logares mais altos, apenas crescem os sapés e outras gramineas, e

alguns lichens; e nesta vegetação termina a escalla thermometrica dos

differentes climas do nosso território. Apezar de tantas serras, cujos pincaros

parecem desafiar as nuvens, nenhuma ha que se vista de neves perpétuas, e

que se nos figure de longe a estampar sua alvura contra o fundo azul do

firmamento. Se as plantas do Brazil tem paridade com as do continente d'

África fronteiro, não succede assim com os amemaes: todos elles são

especiaes americanos, sem relação, em geral, com os da zona torrida nos

outros continentes, excepto na circunstancia de serem, como ali, mais

perfeitos do que os das zonas temperadas e frias. Os quadrúpedes longe estão

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de poderem ser comparados em tamanho aos elefantes, hypopotamos

rhinocerentes do continente visinho. Em vez destes três pachydermes, a

America possuía, como animal mais corpulento, um pachyderme também,

proboscidio como o elefante, mas apenas do tamanho de uma zebra: era o

tapir, a que vulgarmente em virtude da dureza de seu couro chamam anta;

nome este com que os Europeos denominavam o bufalo, de que obtinham

producto análogo ao que veiu a preslar o animal americano-”. (Varnhagen,

1953, p.95; tomo I).

Em sua narrativa ele deixa transparecer o interesse latente em sua observação de

futuras áreas de exploração, com matérias primas favoráveis ao mercado português. Ferrenho

defensor dos interesses lusitanos, nascido e tendo crescido e estudado em meio às concepções

intelectuais desse contexto, não poderíamos esperar de Varnhagen, mais do que sua realidade

permitia que transparecesse, sendo um adepto da historiografia alemã e devoto da dinastia de

Bragança, o autor intenta construir a memória do país recém-independente, a partir de sua

“História Geral do Brazil”.

2 – Perspectivas acerca dos indígenas

Percebendo o Brasil como uma obra iluminada por Portugal, que só terá seu futuro e

desenvolvimento sob a tutela do branco católico liderada pela casa de Bragança, quando

falamos branco católico nos referimos à elite, ao o portador de títulos e meios comerciais,

para assim se chegar à civilização, a evolução e o progresso. E tendo os olhos posto no

continente a partir da caravela conquistadora logo percebemos o papel do indígena para a

sociedade vivida e vislumbrada pelo autor, desse continente que estava legado as sombras da

involução e da barbárie, que logo começa a estipular a não anterior ocupação indígena no

novo mundo.

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“-Segundo os princípios admitidos pelos publicistas, não é possível

reconhecer que os nossos antigos índios, pouquíssimos proporcionalmente

em numero, eram os legítimos donos das terras, que, em vez de habitar,

percorriam nómandes, disfructando dellas em quanto não espantavam a caça,

ou em quanto com sua primitiva agricultura não haviam, ao cabo de uns

quatro annos em que seus tejupares ou ranchos haviam apodrecido, cançado

a terra, cujas matas primitivas ou virgens haviam derrubado-” (Varnhagen,

Discurso Preliminar, 1953, p.XVI; tomo II).

Tentando provar que a vida nômade dos indígenas atestava a não atribuição de posse

do território ocupado, uma não ocupação efetiva, tornando assim valida a natureza de quem

chegasse e tomasse posse poderia ter o usufruto. Nômades e também estrangeiros, atestam

isso apresentando uma ideia teórica de que o gentio seria provindo de terras além da America,

de algum lugar da Ásia Menor ou Egito.

Chegados aqui graças a sua marinha bem desenvolvida. Sim os índios não brotaram do

chão da nossa terra eles migraram de outro lugar de origem, mas não pequemos como

Varnhagen e nos dirijamos ao índio e sim a raça humana, seres migrantes que segundo teorias

teriam atravessado o Estreito de Bering saindo assim da África e se dirigindo a outras

paragens. Se eram esses humanos, aqui, afeitos índios, exímios construtores navais capazes de

atravessar águas tormentosas e salobras, sob chuva e todas as demais intempéries, com suas

canoas aqui utilizadas para navegarem rios, não sabemos. Apenas podemos concordar que não

é uma teoria de todo descartável, mas irrelevante no contexto estudado devido a sua natureza

improvável e muito legado à fantasia.

E tendo conquistado a costa brasileira implantaram aqui a indústria da mandioca e a

cultura do milho.

“-Para serem navegadores tiveram em seu favor as mesmas cheias do grande

rio, que lhes trazia boiando desde as cordilheiras do Peru, e lhes depunha nas

praias que lhes serviam de estaleiros grandes cedros; de modo que nem

tinham que cortal-os, nem que transportal-os. Assim são os Tupis os Jazões

de nossa mythologia, são os Fenicios da nossa historia antiga, são os nossos

invasores normandos em tempos bárbaros-“. (Varnhagen, 1953, p.106; tomo

I).

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Continua a dissertar acerca do índio apresentando costumes e maneiras, sempre

enfatizando sua posição por meios de adjetivos como bárbaros e selvagens incapazes de

civilização. Sendo esse um pensamento geral no período em questão.

“-Quasi todos pintavam o corpo em fôrmas a capricho, com tinta negra tirada

da sapucaia, e a logares como na face e nos pés com um fino vermelho que

extra-hiam do urucú. Alguns sarjavam o corpo com riscos abertos com o

dente de cutia, instrumento que lhes servia de lanceta, quando sangravam.

Nessas sarjaduras, em quanto frescas , mettiam alguma côr que as tornasse

duráveis; e com ellas presavam-se de valentões, fazendo geralmente novos

riscos, depois de algum grande feito, que por esse meio perpetuavam no

corpo. Outros bandos furavam os beiços, principalmente o inferior, pondo no

buraco um grande botoque, pelo que foram pelos Europeos chamados

Botocudos-”. (Varnhagen, 1953, p.111; tomo I).

O que faltou ao autor foi uma avaliação de costumes e representações, essas que ele

não enxergava como cultura e como histórica, mas como suscitamos ele foi um claro filho de

seu tempo, e na época em questão o foco era dominar e pilhar riquezas para a metrópole,

ainda mais em tempos tortuosos. Discorrendo sobre os costumes dos gentios, Varnhagen não

deixa de falar da mulher índia e da divisão dos trabalhos e tarefas.

“-A divisão do trabalho, segundo os sexos, reduzia-se á seguinte. Os homens

aprestavam as armas, iam á guerra, assentavam e construíam as tabas ou

povoações e tratavam da caça, e da pesca, e de fazer a roça. As mulheres se

occupavam das sementeiras e plantações, fabricavam a farinha, e

preparavam as bebidas; carregavam nas transmigrações os fardos e as

crianças, faziam os utensílios cazeiros, e cuidavam das aves e animaes

criados em casa para regalo, os quaes nunca matavam para comer-“.

(Varnhagen, 1953, p.114; tomo I).

Na narrativa acerca dos costumes o autor peca em não dar um enfoque a didática, as

formas de ensinamentos e aprendizagem dos gentios. Ao pouco que ele se refere é de forma

sucinta e racista. Mas entendemos que ao molde pedagógico da época, tudo o que se

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construía, no processo de ensino-aprendizagem, na tribo nada mais era que a propagação de

conceitos e características bárbaras e tribais.

As “gentes vagabundas” guerreavam constantemente entre si, caminhando sozinhos

para a própria destruição. E seguindo sua narrativa e interpretação em relação aos conflitos

entre as tribos o autor acaba por reduzir toda a miríade de tribos e etnias indígenas, com

dialetos e costumes diversos e diferentes a uma única raça, o Tupi.

“-Essas gentes vagabundas, que guerreando sempre povoavam o terreno que

hoje é do Brazil, eram segundo parece verdadeiras emanações de uma só

raça ou grande nação; isto é, procediam de uma origem commum, e falavam

todas dialectos ' da mesma lingua, que os primeiros colonos do Brazil

chamaram geral, e era a mais espalhada das principaes da America

Meridional-“. (Varnhagen, 1953, p.99; tomo I).

Comportou-se como nosso grande arqueólogo, nosso antropólogo de gabinete. Ao

buscar fundo uma origem histórica para o Brasil, com suas teorias e hipóteses diversas e

mesmo com lógicas que, para os dias de hoje, chegam a beirar o absurdo. Utilizou a

linguística para investigar e poder melhor compreender os “Tupis”. Classificando todos os

gentios em uma única raça devido a sua língua comum. Percebamos aqui que é muito fácil se

classificar toda uma diversidade cultural em aspectos diversos, com uma única palavra. Sobre

tudo quando você faz seus estudos no conforto de seu escritório sem sentir o solo entre os

dedos e vivenciando o dia a dia, e ouvindo o disse me disse do povo da terra.

“-Para Varnhagen, os tupis eram a grande nação que existia no Brasil antes

da chegada dos portugueses: O interesse demonstrado por Varnhagen em

relação à língua indígena deve ser entendido como um empenho em saber

como era o Brasil antes da chegada da civilização-”. (RODRIGUES, Kléber,

2011, p.6).

A providência divina chegou por meio dos jesuítas, para salvar a novo continente de

falsos deuses e dos costumes bárbaros, tornando possível a civilização. Mas o autor encara a

catequese ministrada pelos jesuítas, mesmo que necessária, uma pseudofilantropia, pois os

mesmos eram contra a escravidão dos gentios, o que era uma necessidade para o colonizador,

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mas utilizavam de seu trabalho, escravo, para construção de templos e localidades que

desejassem, assim como cultivo de terras. “Assim taes rixas perpetuariam neste abençoado

solo a anarchia selvagem, ou viriam a deixal-o sem população, se a Providencia Divina não

tivesse accudido a dispor que o christianismo viesse ter mão a tão triste e degradante estado!”

(Varnhagen, 1953, p.107; tomo I)

Mesmo defendendo o discurso da não escravidão indígena se beneficiavam de seu

trabalho, e se constituíam assim como rivais do mercado colonial. Pois com a não utilização

da mão de obra indígena foi-se necessário à importação de escravos africanos. que acabaram

por se mostrar mais fortes, resistentes e trabalhadores que os indígenas, que segundo

Varnhagen eram vagabundos e preguiçosos, só que também mais caros, o que provocava o

aumento dos preços dos produtos, o que impossibilitava a competição comercial com os

jesuítas e seus preços.

“-Na conversão dos índios prestaram um grande serviço, na infância da

colonização, -animando os governadores a prosseguir sem escrúpulos o

sistema de os obrigar à força, em toda parte reconhecido como mais profícuo

para sujeitar o homem que desconhece o temor de Deus e a sujeição

de si mesmo pela Lei. – Entretanto, é lamentável que justamente se

apresentassem a sustentar o sistema contrário, quando tiveram fazendas que

granjear com o suor dos índios, ao passo que os moradores da terra,

comprando os escravos de África e arruinando-se com isso, não

poderiam competir com eles na cultura do açúcar, etc-“. (VARNHAGEN,

1953, p.141, tomo 4).

É clara a percepção, ao longo da leitura de sua obra, sua aversão a esse povo que

“Nem sequer mereciam o nome de bárbaros: eram selvagens, com o que explicamos a

condição social a que os philologos, independentemente da significação etymologica,

applicam essa palavra” (p.XVII), ele reduz assim o indígena a um estado inferior a barbárie,

ele é sim, um puro selvagem. Mandados e desmandados por déspotas tiranos que incitavam a

guerra por vingança, teria então o português sido um benfeitor benevolente que trouxe a

civilização a esse povo selvagem. Aculturação se torna misericórdia sobre o prisma de

Varnhagen. “Se percorrermos o sagrado texto, foi n’esse regimen de tribu que o innocente

Abel pereceu victima da inveja do irmão, que o velho Noé se viu escarnecido pela família, e

que as filhas de Loth pecaram incestuosamente” (p.XVII)

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Valendo-se do apelo a religião, o autor demonstra a vida do selvagem envolta em

“pecado”, e que sua organização social em si representa o pecado, da sodomia por exemplo, e

sem nenhum valor cristão, relega ao lixo toda a crença dos gentios, descrendo e desprezando

o que eles acreditavam e usa de analogias pagãs para apresentar sua ideologia a seus pares,

demonstrando que “Talvez houvesse admitido que a raça humana abandonada a certo gráu de

barbárie e degradação, n’um ou n’outro districto, pode chegar a exterminar-se e a tragar-se a

si própria como os filhos de Saturno” (p.XVIII), como que apresentando que sem a mão

amiga do branco déspota a auto aniquilação era tudo o que os gentios teriam por fim.

“-Se eram porêm tam favorecidos nos dotes do corpo e nos sentidos, outro

tanto não succedia com os do espirito. Eram falsos e infiéis; inconstantes e

ingratos, e bastante desconfiados. Além de que desconheciam a virtude da

compaixão. Não tinham ideas algumas de sã moral; isto é, da que nasce dos

sentimentos do pudor e da sensibilidade, da moral que respeita o decoro e a

boa fé; e eram dotados de uma quasi estúpida brutalidade, e difíceis de

abalar-se de seu gênio fleugmatico-”. (Varnhagen, 1953, p.130-131; tomo I).

“E sem moral, sem admissão das virtudes, com a certeza do castigo dos vícios

oppostos a ellas, sem a sujeição das paixões do homem solitário em favor do gênero humano,

não há civilisação possível” (p.XIX). Para Varnhagen o que os indígenas viviam não era nem

a sombra de uma sociedade organizada, ele não via formas sociais, representações sociais ou

culturais naquele amontoado de gente nua e sem Deus.

“-Nos selvagens não existe o sublime desvelo, que chamamos patriotismo,

que não é lanlo o apego a um pedaço de terra, ou bairrismo (que nem sequer

elles como nômades tinham bairro seu), como um sentimento elevado que

nos impelle a sacrificar o bem estar e até a existência pelos compatriotas, ou

pela glória da pátria , com a só idéa de que a posteridade será grata á nossa

memória , e a ella adjudicará neste mundo a immortalidade,—que a fé

promette para nossas almas no outro-”. (Varnhagen, 1953, p.98-99; tomo I).

E ainda sobre os nossos nativos Varnhagen escrevia:

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“-Não conheciam as delicias do amor da pátria, porque, nômades, pátria não

tinham; e a tão curtos horisontes limitavam suas idéas de nacionalidade que

pouco além passavam ellas do alcance do tiro de seus arcos. A satisfação de

contarmos maior número de indivíduos por compatriotas, de pertencermos a

uma família mais crescida, e de gloriarmo-nos com as acções illustres de

maior número de indivíduos por quem nos imaginamos representados, não

pode ser apreciada senão pelos povos que ja chegaram a certo gráu de

civilisação-”. (Varnhagen, 1953, p.103; tomo I).

Então era preciso opor a eles a civilização e Deus, “Não hesitamos em asseverar que

sem o emprego da força não era, nem é possível reduzir os selvagens; assim como não poderia

haver sociedade sem castigos para os delinquentes” (p.XIX), mesmo que pela força bruta,

imposta de forma déspota e cruel, naturalmente justificada pelo ‘bem maior’ dado a eles. “A

escravidão e a subordinação são o primeiro passo para a civilisação das nações: Disse, com

admirável philosofia e coragem, o virtuoso e sábio bispo brazileiro Azevedo Coutinho”

(p.XXI), era preciso escravizar, não só pela necessidade de mão de obra para a construção da

colônia, que virou império, mas para a absolvição, por partes dos gentios, de valores

sociáveis.

“-Assim longe de condemnarmos que se fizesse uso da coacção pela força

para civilisar os nossos Indios, estamos persuadidos que não era possível

haver empregado outro meio; e que delle havemos ter que lançar mão nós

mesmos, em proveito do paiz, que augmentará seus braços uteis, em favor da

dignidade humana, que se vexa em presença de tanta degradação, e até em

beneficio desses mesmos infelizes, que ainda quando nas nossas cidades

passassem à condição em que se acham os nossos Africanos, viviriam nellas

mais tranquillos e mais livres do que vivem, sempre horrorisados na sua

medonha liberdade dos bosques, temendo a cada momento ser apanhados e

trucidados por seus visinhos-” (Varnhagen, Discurso Preliminar, 1953,

p.XXI; tomo II).

Em seu texto fica claro o quanto o autor quer demonstrar a benéfica intervenção

portuguesa no mundo indígena, até no que se refere à escravidão, pois todos os meios

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empregados pelo colonizador foram formas de tirar o indígena de seu estado inferior, a

barbárie, de destruição mútua e vida de pecados. “Sim: Acudamos, em quanto é tempo, a

esses infelizes, que se estão exterminando e devorando mutuamente, e que todos são nossos

parentes por Adão: procuremos-lhes o bem, apezar delles, que não sabem o que fazem”

(p.XXI), o índio é apresentado como uma criança ingênua e indefesa que precisa ser tutelada,

guiada pelo caminho dos valores e virtudes, e sua vida sem regras, desvirtuada e sem cristo

representa a perda de valores e uma nodoa que deve ser domesticada.

“-Como as substancias mais adjectas e mais revoltantes, são ainda

susceptíveis de certa degeneração, assim os vícios naturaes da humanidade

são ainda viciados no selvagem, que é ladrão, cruel, dissoluto; Para ser

criminossos, nós vencemos a nosso natural; o selvagem segue-o; tem do

crime o apetite, não os remorsos. E em quanto o filho mata o pai para

arrancal-o aos dissabores da velhice, a mulher destroe o fruto de seus brutos

amores para se poupar à fadiga de amamental-o. Arranca os cabellos

ensopados do sangue do inimigo vivo; atassalha-o, assa-o, e o devora,

cantando; e, se topa licores fortes, bebe até à embriaguez; até à febre, até à

morte, sem os temores que dá a razão, nem o asco que aparta os animaes

pelo próprio instinto-” (Varnhagen, Discurso Preliminar, 1953, p.XXIII;

tomo II).

Reduzindo os gentios a vãos vícios sórdidos e condutas deploráveis, Varnhagen os

coloca em um patamar ainda menos que a barbárie de antes, agora eles encontram-se em igual

status que os animais, um estado de irracionalidade, ou até de falta de sentimentos. Falta-lhes

humanidade, essas lhe depositadas pelo colonizador, que no ato de matar, exterminar,

escravizar, sem contar diversos outras condutas como exploração sexual, está sendo humano e

benevolente.

3 – Varnhagen e a Identidade Nacional

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“Quereis saber o que é a nação brazileira? Olhae para o próprio brazão d’armas que a

symbolisa. Nelle vereis a esfera armillar, significando a origem da dynastia de Christo, que

representa por si só a historia da civilização do paiz” (p.XXV), para Varnhagen o Brasil era

português e o indígena não contribuía para a identidade nacional, não antes da guerra contra a

Holanda que foi o marco da identidade nacional, e mesmo assim para o autor ela serviu para

comprovar a superioridade dos portugueses não só contra os holandeses, mas sobre todas as

raças que habitavam esse lado do atlântico. A identidade brasileira estava nos brasões, em

cristo, mas e a selva, Tupã e a cultura e todas as suas manifestações existentes em

Pindorama? Eram conceitos a serem descartados quando da chegada da civilização.

“-Claro está que, se o elemento europeu é o que essencialmente constitue a

nacionalidade actual, e com mais razão (pela vinda de novos colonos da

Europa) constituirá a futura, é com esse elemento christão e civilizador que

principalmente devem andar abraçadas as antigas glorias da pátria, e, por

conseguinte a historia nacional-” (Varnhagen, Discurso Preliminar, 1953,

p.XXV; tomo II).

Vemos novamente que para o autor, o indígena não tem espaço na constituição de uma

história nacional, nem na vigente nem na futura. “Convem que todos estejamos persuadidos

que o nosso passado, o actual império mesmo interessará tanto mais ás outras nações

civilizadas e instruídas quanto mais longe podermos fazer remontar, não as fontes da nossa

história, mas os mythos de seus tempos heroicos, - mas as inspirações de sua poesia”

(p.XXVI), remontando esse passado heroico, cortam-se todo e qualquer vinculo com uma

possível história que esteja ligada ao ‘descobrimento’ da colônia. Mitos heroicos iria

fortalecer a nacionalidade, que, diga-se de passagem, não teria nada de nacional.

“-Os índios não eram donos do Brazil, nem lhes é applicavel como

selvagens o nome de Brasileiros; não podiam civilizar-se sem a presença da

força, da qual não se abusou tanto como se assoalha; e finalmente de modo

algum podem elles ser tomados para nossos guias no presente e no passado

em sentimentos de patriotismo ou em representação da nacionalidade-”

(Varnhagen, Discurso Preliminar, 1953, p.XXVIII; tomo II).

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Bárbaros, sem pátria e sem uma cultura a ser valorizada. ‘Os índios não eram donos do

Brazil’ e nem lhes cabia o reconhecimento de habitantes transformadores do ambiente. Eram

peças, esperadas para serem usadas no xadrez do imperialismo despótico do colonizador.

Meros animais sem racionalidade, sentimentos ou pensamento relevante, pois lhe era

impossível à construção de uma identidade nacional a seus moldes. Varnhagen lhes tira a

terra, os modos, a cultura, a liberdade e ate os sentimentos. Tudo em nome de uma forma

bruta de dominação e usurpação em prol do poder, visão geral da época, difundida com

maestria por um de nossos maiores historiadores, o Heródoto brasileiro.

“-No essencial, a história do Brasil será a história de um ramo dos

portugueses, pois o português foi o conquistador e senhor, ele deu as

garantias morais e físicas ao Brasil. O português foi o inventor e moto

essencial do Brasil. Aventureiro, no Brasil, se sentiu livre da obediência ao

rei, sentiu que nada tinha acima de si, e avançou conquista do interior-”.

(REIS, José Carlos, 1999, p.26-27).

Sendo o colonizador o primeiro elemento brasileiro, o índio dono por direito de uso

fruto da localidade lhe cabe um status secundário e o negro, tirado a força de sua terra,

forçado a atravessar mares tormentosos sob péssimas condições de vida, cabia o status

terciário. O Negro, esse, pouco estudado por varnhagen, por se tratar de um elemento inútil

que em nada contribuiu para o país, ao contrario só subtraiu. O índio encarava o africano,

assim como ao português, como alienígenas, seres estranhos, assim como era essa a visão do

português acerca dos demais. O autor encara esses dois outros elementos como descartáveis

em todo o contexto em relação à identidade nacional. E mesmo se falando da guerra contra a

Holanda, que muitos autores, sobre tudo, Capistrano de Abreu, contrário as ideias de

Varnhagen, enxergam nesse acontecimento a marca da criação e do surgimento da identidade

nacional, Varnhagen encarou o fato como fortalecedor do status superior português, o Brasil

querendo ser pseudo puritano.

A colônia recém-independente ansiava por uma história dita como sua, e deseja se

impor e se mostrar como nação. Buscava uma cara brasileira e uma definição do que seria o

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povo brasileiro. Que segundo o autor esse desejo estava claro, só se bastava olhar os brasões,

mas:

“-Essa transformação da sociedade colonial pode ser demonstrada com a

modificação ocorrida no significado da palavra brasileiro. Até o século

XVII, essa expressão designava o traficante de pau-brasil, o homem que sai

do reino para recolher e transportar aquela madeira para Lisboa. Como

frequentemente esse comércio era feito por pessoa desqualificadas, a palavra

brasileiro, originalmente, não era das mais elogiosas; mas, a partir do século

XVII, passou ela a ter o significado atual, de pessoa nascida no Brasil-“.

(MICHALANU, 1980, p.95).

Não era essa, a definição ansiada por Varnhagen para seu povo luso-brasileiro. Tendo

nascido no Brasil, mas ido morar e estudar em Portugal aos seis anos de idade retorna ao seu

amado país em 1940 e em 1941 entra para o IHGB (Instituto Histórico e Geográfico

Brasileiro), órgão criado pelo imperador e intelectuais da época com a missão de definir o

território, classificando cidades, rios e etc. E salvaguardar a memória nacional, difundindo os

mitos criadores e enaltecendo heróis da pátria.

“-O novo país precisava reconhecer-se geográfica e historicamente. O

projeto do IHGB era geográfico, teria a tarefa de situar as cidades, vilas, rios,

serras, portos, planícies; de conhecer e engrandecer a natureza brasileira, seu

céu, clima, matas riquezas minerais flora e fauna; de definir limites do

território. Histórico, deveria eternizar os fatos memoráveis da pátria e salvar

do esquecimento os nomes dos seus melhores filhos-”. (REIS, José Carlos,

1999, p.26).

Tendo logo seu nome repercutido entre as paredes dessa fundação do saber,

Varnhagen propagou seu ideal de Brasil, de nacionalidade e escreveu a “grande história”, sua

obra máxima ‘História Geral do Brasil’, em dois volumes respectivamente 1954-1957.

4 – Varnhagen x Capistrano de Abreu

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Em meio às turbulentas transformações do sec. XIX variações e construções de

pensamentos diversos e a criação da concepção de uma identidade nacional, com o advento do

IHGB. João Capistrano Honório de Abreu surge na cena da historiografia nacional com uma

concepção do índio diferente da dominante na época. Nordestino natural de Maranguape

nasceu em 23 de outubro de 1853, fez rápida e varias passagens por escolas e teve toda a sua

formação feita no Brasil, 1889 vai para Recife onde se formar em humanidade e dois anos

depois regressa ao Ceará.

Dois grandes nomes da historiografia nacional, inseridos em contextos completamente

diferentes e com visões diferentes da realidade e da nossa tão buscada e aclamada identidade

nacional. Tendo em Capistrano a visão além da selvageria, e da barbárie atribuída aos povos

indígenas, ideia esta, atribuída por Varnhagen, Capistrano enxerga a cultura, e demonstra o

índio como agente transformador do ambiente, e salienta suas ações e invenções, e sua

capacidade criadora.

“-Tinham os sentidos mais apurados, e intensidade de observação da

natureza inconcebível para o homem civilizado. Não lhes faltava talento

artístico, revelado em produtos cerâmicos, traçados, pinturas de cuia,

máscaras, adornos, danças e musicas. Das suas lendas, que às vezes os

conservavam noites inteiras acordados e atentos, muito pouco sabemos: um

dos primeiros cuidados dos missionários consistia e consiste ainda em

apagá-las e substituí-las-”. (ABREU, 1907, p.52-53).

Admite sua característica cultural, assim como artística e vê em suas lendas e

conversas míticas perdidas a manifestação de um consciente, não histórico, mas legado a

fantasia da memória. Esse é um ponto em muito distante do pensamento de Varnhagen que

reduz o índio a um estado de selvageria inferior a dos animais, apresentando caráter

sodomicos e pecados nefastos que nem os animais viriam a cometer. Capistrano apresenta

outros caracteres da vida dos gentios que não eram de importância a estudos da época:

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“-De caça e principalmente de pesca era composta sua alimentação animal.

Possuía agricultura incipiente, de mandioca, de milho, de várias frutas.

Como eram-lhes desconhecidos os metais , o fogo, produzido pelo atrito,

fazia quase todos os ofícios do ferro-”. (ABREU, Capistrano, 1907, p.52).

Em Capistrano vemos o gentio como agente ativo e não puramente passivo que precisa

ser tutelado. De inicio Capistrano bebe das considerações de Varnhagen, não atribuindo ao

índio a característica de ‘povo brasileiro’: “O povo brasileiro, começando pelo Oriente a

ocupação do território, concentrou-se principalmente na zona da mata, que lhe fornecia pau-

brasil, madeira de construção, terrenos próprios para cana, para fumo e, afinal, para café”.

(ABREU, Capistrano, 1907, p.50-51).

Mas ao decorrer de sua obra, e de sua investigação, sua concepção é alterada e ele

passa a valorizar os povos indígenas como agentes do meio e transformador. Capistrano viveu

em uma época de grandes transformações e turbulentos conflitos no meio intelectual, que

tinham como fim a concepção da criação de uma identidade nacional. Filho do ceará,

estudante puramente brasileiro, ele reconhece o indígena e o negro como agentes integrantes

do ‘povo brasileiro’, sua obra é impar e temos em sua critica e sarcasmo um melhor vislumbre

do oficio do historiador. E em seu texto, Capítulos da Historia colonial, temos uma melhor

visão dos elementos marginalizados por estudiosos da época, e o indígena é apresentado em

sua forma ativa e transformadora.

Ao confrontar o pensamento desses dois historiadores logo notamos diversas

dicotomias. Capistrano embriagou-se de Varnhagen em seus estudos, não tendo esse

pensamento libertário e igualitário, na sua concepção de povo do Brasil, em inicio. Seu marco

característico como pesquisador. Mas a observação do contexto de vida dessas duas figuras

históricas, seus momentos, meios de influência e por ultimo suas concepções, podemos

compreender o porquê de tão larga dicotomia de pensamento. Capistrano se constituiu a

antítese de seu igual.

5 - considerações finais

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A forma rebuscada da escrita de Varnhagen pode vir a inibir o pesquisador que vá

realizar algum trabalho com ou sobre esse personagem. Pois ao longo das páginas de seu livro

vai se iluminando ainda mais a ideia de escultor das letras. Sua forma um tanto cruel e

despótica no trato aos que ele designa como “inferiores” sendo estes os índios e os negros

pode causar repulsa por muitos. Varnhagen molda assim suas fontes e fatos construindo o

mosaico histórico a sua maneira, da forma que satisfaça a ele e aos seus pares, ou seja, os que

comungam das mesmas ideias como a proposito do imperador é claro, sim, o imperador, pois

não há como compreendê-lo ou trabalhar com ele, sem ter em mente seu trato em relação ao

imperador.

Observemos em sua obra, sua escrita linear e puramente cronológica, descritivamente

enfadonha ao decorrer das linhas, acaba por pôr sombras no entendimento da leitura, por

anuviar as ideias e não me refiro aqui aos anos do livro ou a escrita da época, digo sim, que

ele não se fez um homem das letras que cria a vontade de ler no leitor. Sua escrita é fraca e

deixa muito a desejar.

Sua critica era dura e seus pensamentos negros e em certas passagens desprovidos de

humanidade. Foi grande sua pretensão em querer escrever a História Geral do Brasil, intento

esse, que deixa mais a desejar que sua escrita fraca.

Homem de poder e influente, nada lhe tirará o posto e a alcunha de Heródoto

brasileiro, pois apesar dos pesares sua contribuição para nossa concepção histórica e criação

histórica foram muitas.

Sua única linha de pensamento, sua forma cega de escrita nunca olhando de melhores

formas o seu objeto de estudo, mesmo que do seu escritório ou diversos arquivos e bibliotecas

que frequentou foi seu maior pecado.

Seu prisma de conquistador fez-se propagar uma densa nuvem de pensamentos turvos

da concepção intelectual. Que sua obra foi, e ainda é muito influente, isso é claro. Basta-nos

sempre termos em mente que ela também foi o reflexo de uma época. Foi um homem do seu

tempo histórico.

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Devemos ter em mente ao ler e estudar Varnhagen que assim como todo historiador e

pessoa, ele era filho de seu tempo, e partilhava do pensamento generalizado em sua época, e

sua origem europeia cristaliza ainda mais sua forma de pensar e agir. Independente de seus

pensamentos hoje tidos como racistas e despóticos, ele foi um filho do seu tempo e um grande

nome da historiografia brasileira, desenvolvendo métodos e formas de proceder na pesquisa

histórica, no que diz respeito à pesquisa documental, que foram de muita importância para

esse ramo do conhecimento. Infelizmente o pensamento desse autor era fortemente difundido

na época. Duras eram suas criticas aos indígenas e aos negros, muito lhe doía atribuir uma

simples nota de rodapé em memória, mesmo que tirana, dessa turba miserável. E Varnhagen

existiu, viveu e morreu, como grande homem nobre, visconde, e aos indígenas uma ínfima

parte de seu território original é o que lhes resta. Se nem lhes atribuir como constituintes da

identidade nacional o autor atribuiu, de nada nos espantas eles, na época, não serem

considerados brasileiros.

Referencias:

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ABREU, J. Capistrano de. Capítulos de história colonial (1500 – 1800) [primeira edição:

1907], Brasília: Conselho Editorial do Senado Federal, 1998.

BLOCH, March. Apologia da história, ou, O ofício de historiador; prefácio, tradução,

André Telles. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001.

MICHALANU, Douglas; RAMOS, Ciro de Moura; NETO, José de Nicola. História e

Geografia do Brasil. São Paulo, Ed. GEMSA, 1980.

RODRIGUES, Kleber. (2011), AS REPRESENTAÇÕES SOBRE OS INDÍGENAS

COLONIAIS EM VARNHAGEN, CAPISTRANO E NAS NOVAS PRODUÇÕES

HISTORIOGRÁFICAS DO BRASIL. In conferência: UFS, 18, 19 e 20 de abril de 2011–

Florianópolis/SC.

REIS, José Carlos, As Identidades do Brasil: de Varnhagen a FHC, Rio de

Janeiro, ed. FGV, 1999.

VARNHAGEN, Francisco Adolfo de. História Geral do Brasil. Tomo 1. 5ª ed. São Paulo:

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____________________________. História Geral do Brasil. Tomo 2. 5ª ed. São Paulo:

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____________________________. História Geral do Brasil. Tomo 3. 5ª ed. São Paulo:

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____________________________. História Geral do Brasil. Tomo 4. 5ª ed. São Paulo:

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WEB

Analise do Discurso Fundante de Varhagem. Disponível em:

<http://www.webartigos.com/artigos/analise-do-discurso-fundante-de-varnhagen-no-brasil-

imperio/10718/> Acessado em: 29 agosto. 2012.