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i i i i i i i i No descompasso da Lei: disputa pela hegemonia e difusão da Telesur na Argentina Gláucia da Silva Mendes Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil E-mail: [email protected] Resumo O presente artigo investiga se a Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual, calcada em um paradigma de democra- tização das comunicações, ampliou o acesso à televisão multiestatal Telesur em território argentino, que até então estava restrito a 6% do público da televisão por assinatura. Evidencia que, embora a lei contenha aportes favoráveis a uma maior disseminação do sinal da emissora tanto na radiodifusão aberta quanto no serviço de televisão paga, pouca coisa mudou no cenário apresentado, porque os conglo- merados multimídia constituídos sob o paradigma de comunicação convergente ainda travam uma batalha para manter sua hegemonia, impondo resistências à pluralização e à diversificação do espaço comunicacional argentino. Palavras-chave: políticas de comunicação, democratização da comunicação, lei de meios; telesur In the mismatch of Law: struggle for hegemony and diffusion of Telesur in Argentina Abstract This paper investigates whether the Law of Audiovisual Communication Services, based on a paradigm of democratization of communications, expanded access to multistate Telesur television in Argen- tina, which until then was limited to 6% of pay-TV audience. It shows that, although the law contains contributions in favor of further spread of the signal in both the broadcasting station opened as the pay-TV service, little has changed in the scenario presented, because the mul- timedia conglomerates constituted under the converged communication paradigm still waging a battle to maintain its he- gemony, imposing resistances to plura- lization and diversification of Argentine communicational space. Estudos em Comunicação nº 11, 267-290 Maio de 2012

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No descompasso da Lei: disputa pela hegemonia e difusãoda Telesur na Argentina

Gláucia da Silva MendesUniversidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil

E-mail: [email protected]

Resumo

O presente artigo investiga se a Lei deServiços de Comunicação Audiovisual,calcada em um paradigma de democra-tização das comunicações, ampliou oacesso à televisão multiestatal Telesur emterritório argentino, que até então estavarestrito a 6% do público da televisão porassinatura. Evidencia que, embora a leicontenha aportes favoráveis a uma maiordisseminação do sinal da emissora tanto

na radiodifusão aberta quanto no serviçode televisão paga, pouca coisa mudou nocenário apresentado, porque os conglo-merados multimídia constituídos sob oparadigma de comunicação convergenteainda travam uma batalha para mantersua hegemonia, impondo resistências àpluralização e à diversificação do espaçocomunicacional argentino.

Palavras-chave: políticas de comunicação, democratização da comunicação, lei demeios; telesur

In the mismatch of Law: struggle for hegemony and diffusion of Telesur inArgentina

Abstract

This paper investigates whether the Lawof Audiovisual Communication Services,based on a paradigm of democratizationof communications, expanded access tomultistate Telesur television in Argen-tina, which until then was limited to6% of pay-TV audience. It shows that,although the law contains contributionsin favor of further spread of the signal in

both the broadcasting station opened asthe pay-TV service, little has changed inthe scenario presented, because the mul-timedia conglomerates constituted underthe converged communication paradigmstill waging a battle to maintain its he-gemony, imposing resistances to plura-lization and diversification of Argentinecommunicational space.

Estudos em Comunicação nº 11, 267-290 Maio de 2012

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Keywords: communications policies, democratization of communication, medialaw; telesur

A emergência, na última década, de governos progressistas 1 na AméricaLatina vem conduzindo à elaboração de políticas públicas voltadas para

uma estruturação mais democrática do setor de comunicação na região. Presi-dentes como Hugo Chávez, na Venezuela; Rafael Correa, no Equador; Néstore Cristina Kirchner, na Argentina; Tabaré Vásquez e José Mujica, no Uruguai,vêm promovendo ações como a reformulação de dispositivos legais, o incen-tivo à comunicação comunitária e o investimento na comunicação pública eestatal.

Além dessas medidas, de âmbito nacional, eles estão investindo em inici-ativas que nascem da cooperação internacional. Estas se apresentam como al-ternativas aos conglomerados de comunicação transnacionais, que se espraiampela região fornecendo uma visão unificada dos acontecimentos. Consistem,portanto, em uma estratégia indispensável aos novos tempos.

A junção de forças em escalas nacional, regional e supranacional revela-seindispensável para os entrechoques com os blocos hegemônicos. A defesada prevalência dos interesses públicos sobre as ambições corporativas nãopode limitar-se a contrafortes dentro de cada nação: tem que almejar frentessupranacionais de atuação (MORAES, 2011, p. 171).

O pioneirismo nesse segmento coube à Telesur. No ar desde 24 de julho de2005, aniversário de nascimento do prócer da independência latino-americanaSimón Bolívar, a emissora surgiu como uma iniciativa do governo da Venezu-ela (detém 51% de suas ações), inicialmente apoiada pelos mandatários de Ar-gentina (20%), Cuba (19%) e Uruguai (10%) 2. Com o slogan “Nosso Norte é

1. De acordo com Moraes (2011), tais governos não são homogêneos, podendo ser clas-sificados em dois grupos. O primeiro é constituído por países que fazem parte da AliançaBolivariana das Américas (ALBA) - como Venezuela, Equador e Bolívia -, prioriza agendase parcerias que viabilizem o desenvolvimento sustentável e promove a integração econômicae cultural regional, em detrimento das propostas ditadas pelos Estados Unidos. O segundo,formado por Brasil, Uruguai, Argentina e Chile, oscila entre a defesa da inclusão social dasclasses mais pobres e políticas econômicas afinadas com as razões do mercado.

2. Com o passar dos anos e a eleição de governantes afinados com as políticas chavistas,outros países tornaram-se acionistas do canal: Bolívia (2006), Equador (2006) e Nicarágua(2007).

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o Sul”, o veículo propõe-se a ser uma alternativa às redes informativas interna-cionais vinculadas a conglomerados multimídia (CNN, NBC, Fox News etc),que promova a integração entre os países latino-americanos, concedendo-lhesespaço para divulgar sua própria imagem e transmitir seus próprios conteúdos.

A orientação da emissora é essencialmente informativa. Aproximada-mente 80% de seu conteúdo é jornalístico. Os 20% restantes são compostospor filmes e documentários independentes produzidos na região, muitos exi-bidos pela primeira vez. Na grade de programação destacam-se os telejornais,transmitidos de hora em hora, e programas como “Reportajes Telesur”, queconsiste em matérias investigativas sobre temas de impacto na região; “Maes-tra vida”, dedicado à biografia de personagens populares e figuras de destaqueda América Latina, e “Vamos a conocernos”, focado na diversidade cultural.

A composição acionária do canal levanta questionamentos sobre até ondevai a participação latino-americana. A posse de mais da metade das açõespelo Estado venezuelano confere-lhe um poder decisório que praticamentenão deixa margens para a interferência nos rumos da emissora. O país designaa diretoria executiva e, para críticos, exerce influência na linha editorial. Navisão de Omar Rincón, embora seja uma ideia necessária ao continente, aTelesur não representa a América Latina, apenas o pensamento chavista (apudMORAES, 2011, p. 78).

Para além da discussão sobre a autonomia ou não do veículo em termospolíticos – que acomete praticamente todos os meios de comunicação estataislatino-americanos, já que a região é uma das únicas do mundo onde a noção deserviço público de comunicação não prosperou (BECERRA, 2010) –, acredi-tamos ser essencial observar se ele de fato vem cumprindo seu objetivo de serum meio de comunicação latino-americano, não só em termos dos conteúdosque exibe, mas também da pretensa difusão de seu sinal pelo subcontinente.

Com o foco no segundo aspecto, analisamos a situação da Telesur na Ar-gentina. Além de ser o segundo maior acionista do canal, o país foi um dosprimeiros a aderir à iniciativa: em 1° de fevereiro de 2005, antes do lança-mento da emissora, Néstor Kirchner e Hugo Chávez subscreveram um convê-nio de fortalecimento da Nova Televisora Del Sur S.A. (Telesur). No docu-mento, comprometeram-se com “[. . . ] el intercambio de recursos técnicos yhumanos, de conformidad con las legislaciones internas y compromisos inter-nacionales de ambos países, a los fines de promover el fortalecimiento de lanueva Televisora del Sur S.A. (TELESUR)” (FLORES, 2005).

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Apesar de assumir importante papel na criação do veículo, a Argentinanão conseguiu universalizar a distribuição do sinal Telesur em seu territórionos primeiros anos. O acesso ficou restrito aos clientes do serviço de TV porsatélite DirecTV, que representavam 6% do mercado do segmento de televi-são por assinatura (BECERRA; MASTRINI, 2009). Isto porque a políticade comunicação do governo Néstor Kirchner (2003-2007) foi marcada porum caráter dúbio: embora tenha incluído medidas de cunho democratizador –dentre as quais a própria adesão à emissora -, esteve fortemente enraizada noparadigma comunicacional convergente, que favoreceu a atuação dos conglo-merados multimídia transnacionais.

Tais rumos da política de comunicação argentina foram alterados com aascensão ao poder de Cristina Kirchner, em 2008, e a subsequente elabora-ção e aprovação, em 2009, da Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual,conhecida como Lei de Meios. O novo marco regulatório representou umamudança do paradigma comunicacional: ele abandonou os valores economi-cistas do modelo convergente e filiou-se a uma concepção da comunicaçãocomo direito humano, que se calca na proposta de democratização do espaçomidiático, a partir da diversificação e da pluralização das vozes que nele cir-culam (BARANCHUK; USÉ, 2011).

A promoção de veículos que representam uma alternativa aos conglome-rados multimídia figura, portanto, como um dos objetivos da lei. Em virtudedisso, o presente artigo propõe-se a investigar o que mudou no cenário de dis-tribuição do sinal da Telesur em território argentino, tanto no que diz respeitoàs disposições do novo marco regulatório quanto das ações empreendidas como intuito de implementá-las. Nesta investigação, voltamos nosso olhar não sópara o setor de radiodifusão aberta, mas também para o serviço de televisãopor assinatura, haja vista sua penetração no país - quase metade dos lares ar-gentinos tem acesso a ele (BECERRA; MASTRINI, 2009).

Partimos da hipótese de que, embora a Lei de Meios contenha aportes fa-voráveis a uma maior difusão do sinal da Telesur e medidas concretas venhamsendo adotadas nesse sentido, pouca coisa mudou no cenário apresentado por-que os conglomerados multimídia constituídos sob o paradigma convergenteainda travam uma batalha para manter sua hegemonia, impondo resistências àpluralização e à diversificação do espaço comunicacional argentino.

Ao referirmo-nos à hegemonia, evocamos o sentido atribuído ao termo porGramsci (apud GRUPPI, 2000): uma liderança ideológica e cultural da socie-

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dade, dotada de um certo grau de instabilidade (em virtude da coexistência deforças contrárias), que resulta muito mais da persuasão, da conquista de con-senso em torno de uma determinada visão de mundo, do que da dominação,do uso da força.

Tendo isto em vista, iniciamos nossa explanação delineando os traçosfundamentais do paradigma convergente e a estruturação do setor de comu-nicação argentino resultante da aplicação de seus princípios. Na sequência,expomos as diretrizes do modelo pró-democratização da comunicação e pro-curamos evidenciar o processo histórico que conduziu ao seu fortalecimento,colocando em crise a hegemonia do paradigma até então vigente.

A hegemonia do paradigma de comunicação conver-gente na Argentina

Ao elencar os paradigmas que nortearam as políticas de comunicaçãodesde o surgimento destas em meados do século XIX, Van Cuilenburg e Mc-Quail (1988) identificam a década de 1980 como um momento de mudança.Embora não cheguem a denominar o paradigma então nascente, delineiam ostraços fundamentais do que viria a se constituir como o modelo convergentede comunicação.

Nele, o interesse público é redefinido com base em valores econômicos econsumistas. Se antes as políticas comunicacionais visavam a objetivos cultu-rais e políticos, a partir desse momento passa a imperar a lógica do mercado,da tecnologia e dos consumidores. Por conseguinte, também a normativi-dade precedente é desmontada. O paradigma convergente modifica os marcosregulatórios, mantendo apenas o que concerne a aspectos técnicos e “comuni-cacionais”.

Apesar disso, as políticas nacionais de comunicação não tem seu papelminimizado. Os governos ainda são proativos na definição das regras do jogo.Os recuos regulatórios em prol do mercado só ocorrem na medida em queeles o permitam. Mais do que uma desregulação do setor, o que se presencia,portanto, é um processo de re-regulação.

Mientras se declama una supuesta apertura hacia un hipotético libre mer-cado, en realidad se están sentando las bases para regular en pos de una

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nueva estructura de propiedad cada vez más dominada por el capital con-centrado. En este sentido, tal como ha sido sostenido por el EuromediaResearch Group, el término desregulación debe ser reemplazado por el dererregulación, una nueva lógica en política de medios (MASTRINI; MAST-MAN, 1995, p.2-3).

A re-regulação cria dispositivos legais compatíveis com os novos inte-resses econômicos, dentre os quais se destaca a concentração. Medida emtermos da incidência das maiores empresas de uma atividade econômica novalor total de produção desta, a concentração pode resultar da expansão emum mesmo ramo de atividade (concentração horizontal), em diferentes etapasde uma mesma cadeia de valor (concentração vertical) ou em ramos diversos(concentração cruzada) (BECERRA; MASTRINI, 2009).

A concentração midiática adquire nova dimensão em tempos de vigênciado paradigma convergente, quando outro interesse econômico se vê benefi-ciado pelas medidas re-regulatórias: a internacionalização. Marino (2007)afirma que a supressão das barreiras aos investimentos internacionais faz comque os capitais dos países centrais rumem especialmente em direção aos paísesemergentes, com o propósito de estender sua presença a distintos mercados,gerar economias de escala e ampliar suas margens de lucro.

Apesar de considerar que o aporte de Van Cuilenburg y McQuail (1988)sobre os paradigmas de políticas de comunicação precisa ser adequado paradar conta de especificidades latino-americanas, Becerra (2010) traça uma pe-riodização dos processos históricos dos meios de comunicação na Argentinaem que a última etapa praticamente coincide com o paradigma convergente.

A fase, que teve início com o golpe militar de 1976, conduziu à reformu-lação das regras do sistema de meios e indústrias culturais argentinos. Umade suas marcas foi a edição, em plena ditadura, do Decreto-Lei N° 22.285,de 1980. Marino e Postolski (2009) avaliam que a norma assumiu um caráterautoritário e privatista, negando a todos os atores sem fins de lucro a possibi-lidade de gerir meios de comunicação.

El régimen de licencias estableció que podían ser licenciatarios de radi-odifusión las personas físicas o jurídicas con fines de lucro, argentinas onaturalizadas con más de diez años de residencia en el país. Esta con-dición discrimina a todo tipo de sociedad no comercial (sociedades de fo-mento, partidos políticos, sindicatos etc.)” (MARINO, POSTOLSKI, 2009,p. 180).

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Embora o marco regulatório fornecido pela ditadura constitua a base sobrea qual se assentou o processo de privatização e concentração multimídia naArgentina, Becerra et al. (2011) afirma que este só ganhou verdadeiro impulsonos governos democráticos, especialmente na gestão de Carlos Menem (1989-1999). Neste período, foram realizadas re-regulações que abriram caminho aoprocesso de concentração.

A Lei de Reforma do Estado N° 23.696, de 1989, flexibilizou pontos dodecreto-lei, possibilitando a constituição de conglomerados multimídia. Aassinatura do Tratado de Promoção e Proteção Recíproca de Investimentosentre Argentina e Estados Unidos, em 1991, e sua validação com a ReformaConstitucional de 1994, permitiram a entrada de capital estrangeiro no setor,até então proibida.

As re-regulações abriram caminho a um intenso processo de concentra-ção. Albornoz e Hernández (2009) argumentam que na primeira metade dadécada de 1990 formou-se na argentina um mercado de comunicações oli-gopólico, caracterizado pelo surgimento de conglomerados multimídia naci-onais. Durante o biênio 1996-1997 o setor de comunicações recebeu amplosinvestimentos estrangeiros, mobilizando quase U$ 3.000 milhões. Este foi omomento em que começou a se formar o conglomerado que, com os anos,passaria a dominar a atividade: o Grupo Clarín.

Pouco antes de deixar a presidência, Menem promulgou ainda o DecretoN° 1.005/1999, legalizando vários aspectos assumidos pelos oligopólios trans-nacionais à margem da legislação vigente. Dentre as formalizações realizadas,Albornoz e Hernández (2009) destacam: a autorização de ingresso de capitalestrangeiro de outros países que firmaram Tratados de Reciprocidade com aArgentina além dos EUA; a ampliação do número de licenças por operador de4 para 24; a autorização de cadeias permanentes de transmissão e a autoriza-ção para a transferência de licenças, facilitando a compra e venda de meios.

Os governos de Fernando de La Rúa e Eduardo Duhalde, sucessores di-retos de Menem, não realizaram mudanças nesse quadro. Mesmo NéstorKirchner, que assumiu a presidência em 2003 com um discurso de enfren-tamento aos conglomerados multimídia, encaminhou sua política de comu-nicação nessa direção. Ainda que tenha adotado medidas de cunho demo-cratizador, estas não adquiriram proeminência e tiveram seus efeitos práticosanulados por decisões benéficas aos conglomerados multimídia.

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Os limites impostos à disseminação da Telesur pelo território argentinorefletem tal cenário. Embora tenha aderido à emissora em fevereiro de 2005 -antes, portanto, do lançamento desta em julho do mesmo ano -, o governo nãoadotou medidas capazes de garantir acesso generalizado à multiestatal. Aocontrário, suas políticas fortaleceram os conglomerados multimídia, atorescontra os quais a emissora trava sua disputa simbólica.

Néstor Kirchner manteve em vigência o Decreto-Lei N° 22.285, de ca-ráter privatista, no qual os meios de comunicação estatais eram relegados auma função subsidiária. Ademais, assinou o Decreto N° 527, que garantiu aperpetuação, por mais dez anos, dos agentes – privados - que já exploravamo serviço de radiodifusão (CALIFANO, 2007); isto em um quadro de esgota-mento do espectro radioelétrico, que fechava as possibilidades de difusão deemissoras alternativas - como a Telesur – em sinal aberto (ROSSI, 2009).

No que tange à televisão a cabo, Kirchner intensificou o quadro conglo-meral existente, mantendo a suspensão da chamada a licitações - que poderialevar à entrada de outros operadores no sistema - e aprovando, em 2007, a fu-são dos dois maiores operadores do sistema - Multicanal e Cablevisión -, sobo controle do Grupo Clarín (CALIFANO, 2007). Tais decisões acabaram porrepercutir na distribuição do sinal da Telesur, ao ampliar o poder de decisãodos grandes operadores sobre os sinais a incluir ou não em sua programação.

Isto porque, como explica Marino (2007), os principais operadores do ser-viço de televisão a cabo na Argentina encontram-se associados aos principaisprovedores de sinais, por intermédio de relações de concentração vertical. Ocontrole sobre diferentes fases do sistema leva-os a utilizar sua posição domi-nante no mercado para excluir sinais competidores. Este é o caso da Telesur,emissora que se propõe a ser uma alternativa às cadeias informativas inter-nacionais, especialmente CNN em espanhol, controlada por Time Warner -empresa que figura como acionista dos principais operadores do sistema deTV a cabo argentino.

Esta estratégia afeta o sistema como um todo e não apenas os grupos con-centrados. Como recorda Marino (2007), o controle sobre um insumo básico(os principais sinais televisivos) confere aos conglomerados poder de pressãotambém sobre os demais operadores. Por esta razão, a ausência da Telesurnão só da grade de programação de Cablevisión, mas também dos pequenosoperadores pode estar relacionada à concentração vertical da TV a cabo ar-gentina.

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Segundo Becerra et al. (2011), medidas como essas resultaram na con-formação de uma estrutura marcada por um alto índice de concentração dosprincipais meios nos mercados mais massivos (televisão aberta e a cabo; im-prensa escrita e rádio); pela formação de conglomerados multimídia, presen-tes em praticamente todos os setores comunicacionais, e pela centralização daprodução de conteúdos na região metropolitana de Buenos Aires.

A combinação entre a concentração conglomeral e o controle de cada umdos mercados por seus principais operadores (as quatro maiores empresas decada mercado dominam juntas mais de 78% de seu público) potencializou opoder exercido por poucos grupos, que passaram a atuar em todo o sistema.Destaca-se neste cenário o Grupo Clarín, maior conglomerado multimídia ar-gentino.

A empresa abarca, dentre outros meios, o principal jornal impresso dopaís (Clarín); um dos quatro canais de televisão aberta da região metropoli-tana (Canal 13); o maior operador de televisão a cabo (Cablevisión) e sinaistelevisivos que compõem não só sua grade de programação, mas também ade outros operadores; participação acionária na única empresa de papel paradiários argentina (Papel Prensa), além de várias estações de rádio e portaisnoticiosos.

Enquanto o paradigma convergente consolidava-se e conduzia a essa es-truturação do setor, outro modelo comunicacional ganhava adeptos na Argen-tina. A seguir, apresentamos os princípios que o respaldam e procuramosevidenciar como ele adquiriu força, colocando em crise a hegemonia da con-cepção então vigente.

O paradigma de democratização da comunicação naArgentina

Após o retorno da democracia na Argentina, em 1983, determinados ato-res sociais passaram a reivindicar outro modelo comunicacional. O paradigmaentão defendido calcava-se nas ideias surgidas do debate contra o imperia-lismo cultural, iniciado na Unesco nas décadas de 1970/1980 pelo países quecompunham o denominado Terceiro Mundo. De acordo com Ramos (2010),as contribuições em torno do tema resultaram em um inventário de diretrizes

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de ação, reunidas no documento intitulado “Um mundo, muitas vozes”, maisconhecido como Informe MacBride.

Embora avalie que o documento é passível de críticas e por vezes apre-senta até contradições, o autor afirma que ele contém em seu bojo importan-tes diretrizes pró-democratização da comunicação, dentre as quais se podedestacar a proposição do direito à comunicação e da elaboração de políticaspúblicas de comunicação. O direito à comunicação vai além do direito à in-formação, da garantia de receber informação de qualidade e veraz. Assumeum aspecto dialógico e muito mais inclusivo:

Hoje em dia se considera que a comunicação é um aspecto dos direitoshumanos. Mas esse direito é cada vez mais concebido como o direito decomunicar, passando-se por cima do direito de receber comunicação ou serinformado. Acredita-se que a comunicação seja um processo bidirecional,cujos participantes – individuais ou coletivos – mantém um diálogo demo-crático e equilibrado. (UNESCO, 1983 apud RAMOS, 2005, p. 247)

Inerente ao direito à comunicação encontram-se as concepções de diver-sidade e pluralismo cultural. De acordo com Charras (2011), a diversidadecultural está associada à ideia de proteção da variedade de bens e mensagensculturais e informativas. O pluralismo, por sua vez, consiste na resposta polí-tica à diversidade cultural e se plasma na adoção de medidas que favoreçam ainclusão e a participação de todos os cidadãos, garantindo a interação harmo-niosa entre grupos com identidades culturais plurais.

O exercício do direito à comunicação associa-se a dois indicadores dedemocratização da comunicação: o acesso e a participação. De acordo comRossi (2006), o acesso é definido primeiramente como eleição material, istoé, como a possibilidade de escolher entre diversas formas de comunicação.Em outro plano, é qualificado como retroação ou a possibilidade de interaçãoentre produtores e receptores dos programas, a intervenção direta do públicona transmissão dos programas e o seu direito a formular comentários e críticas.

Este nível de acesso não deve ser confundido com a primeira instância departicipação: o envolvimento dos cidadãos na produção de mensagens, queestá muito mais relacionado à adoção de um papel protagônico na emissãode conteúdos. Outras formas de participação são a intervenção na tomada dedecisões e, em um patamar mais elevado, a contribuição na formulação deplanos e políticas de comunicação massiva.

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A consecução desses propósitos está relacionada à elaboração de políticaspúblicas de comunicação. De acordo com Ramos (2010), por meio delas oEstado deve incidir sobre a mídia do mesmo modo como o faz em relação aoutras áreas (educação, saúde etc). Dentre suas principais atribuições figuraa formulação de marcos legais para regular os diversos setores comunicacio-nais. Charras (2011) afirma que a Unesco considera fundamental a atuaçãodo Estado nesse sentido, em associação com o setor privado e a sociedade ci-vil, dada a insuficiência do mercado para garantir por si só a diversidade e opluralismo cultural.

A formulação de políticas públicas de comunicação com esse viés foi umareivindicação constante do período pós-ditatorial argentino. No entanto, nosprimeiros momentos dessa batalha faltaram as condições necessárias para reu-nir distintas forças sociais e políticas em torno da concepção que se pretendiahegemônica. Busso e Jaimes (2011) afirmam que de 1983 a 2005 foram apre-sentados no Congresso mais de 73 projetos de lei para a democratização dascomunicações, mas nenhum avançou. Baranchuk (2011) avalia que isto ocor-reu porque eles emergiram de iniciativas pessoais ou de grupos, e não de umapolítica de comunicação centralizada.

Como permitem observar Busso e Jaimes (2011), essa correlação de forçassó começou a mudar em 2004, quando os atores sociais que lutavam isolada-mente se uniram na Coalizão por uma Radiodifusão Democrática. Uma dasprimeiras iniciativas do grupo foi elaborar um documento que ficou conhecidocomo “21 Pontos Básicos pelo Direito à Comunicação”, no qual reuniram osprincípios que deveriam nortear a redação de uma nova lei de comunicação.

Com os “21 Pontos” em mãos, ainda em 2004 o grupo se reuniu comrepresentantes do governo. No encontro houve o reconhecimento de que umanova lei era uma dívida pendente da democracia, mas argumentou-se que arelação de forças impedia incluir o tema na agenda oficial (eleito com apenas22% dos votos válidos, Néstor Kirchner teve que se aliar aos antigos setoreshegemônicos para garantir governabilidade).

Somente quatro anos mais tarde, em 2008, surgiram as condições quepermitiram dar impulso ao projeto. Em meio a um conflito entre o recém-empossado governo de Cristina Kirchner e os representantes do setor rural, aatuação dos conglomerados multimídia tornou-se alvo de um debate no Exe-cutivo que encontrou eco nas manifestações sociais. A cobertura do conflitoempreendida pela grande mídia, nitidamente desfavorável ao governo, cha-

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mou a atenção para o desequilíbrio informativo advindo da concentração dopoder discursivo em poucas mãos, colocando em evidência a necessidade devozes plurais no espaço midiático.

Neste contexto, como relatam Busso e Jaimes (2011), a coalização foiconvocada para um encontro com a presidente, no qual pôde apresentar seus“21 Pontos”. Realizada no dia 16 de abril de 2008, a reunião marcou a adesãodo governo à elaboração de um novo marco regulatório para a comunicação,sob os princípios democráticos. A presidente se comprometeu a enviar umprojeto de lei ao Congresso, após realizar novos fóruns de debate entre dife-rentes setores relacionados com a comunicação audiovisual.

Relegada pelo governo a segundo plano durante o resto do ano de 2008– que foi consumido pelo conflito com o campo -, a batalha pela nova Leide Meios nesse momento teve a coalizão como sua principal liderança. Osmovimentos sociais que a compunham percorreram praticamente todo o país,com vistas a construir o consenso necessário para garantir a hegemonia de umprojeto de lei de comunicação democrático.

Em 18 de março de 2009, o anteprojeto de lei do Executivo enfim foiapresentado à sociedade e submetido a escrutínios públicos. Segundo Usé(2011), foram realizados 24 Fóruns Participativos de Consulta Pública emtoda extensão territorial argentina. Deles resultaram mais de cem propostasde modificação do projeto original realizadas por atores sociais diversos, todaselas devidamente incorporadas ao texto encaminhado ao Congresso.

Vendo sua hegemonia ameaçada, os conglomerados midiáticos impuse-ram resistências ao processo de elaboração da lei. De acordo com Bussoe Jaimes (2011), em um primeiro momento eles tentaram invisibilizá-lo,mantendo-o fora de sua cobertura jornalística. Quando isso não foi mais pos-sível, em virtude da dimensão que o debate adquiriu na sociedade, passarama estigmatizar os atores nele envolvidos. Ademais, tentaram barrar o projetonas casas legislativas, por intermédio de seus representantes parlamentares.

Apesar dos obstáculos interpostos, a Lei de Meios foi aprovada na Câmarados Deputados por maioria absoluta – 174 votos a favor, quatro contra e umaabstenção -, e confirmada pelo Senado – 44 votos favoráveis e 24 contrários-, recebendo sua sanção em 10 de outubro de 2009. Mesmo tendo sofridomodificações no parlamento, o texto final refletiu os princípios do paradigmade democratização da comunicação. A seguir, evidenciamos como os concei-

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tos que embasam tal modelo perpassam a lei, focando-nos especialmente nosartigos que possam repercutir na difusão do sinal da Telesur.

Lei de Meios: aportes para a democratização do acessoà Telesur

O relato precedente sobre o processo de elaboração da Lei de Meios re-vela que ela resultou do mais elevado nível de participação elencado por Rossi(2006): o envolvimento da sociedade na formulação de políticas de comuni-cação. Desse debate aberto, emergiram dispositivos que definem outras for-mas de intervenção social no setor. Como expõe Bulla (2011), a participaçãotambém é assegurada em artigos que garantem a atores sociais diversos a titu-laridade de licenças de rádio e televisão e atribui-lhes papel ativo em órgãosconsultivos e em processos decisórios, como a renovação ou não de licenças.

De acordo com Charras (2011), a diversidade e o pluralismo cultural sãogarantidos na lei a partir de três eixos: a imposição de limites à concentraçãomidiática e a obrigação de desinvestimento por parte dos atores que superamtais restrições; a definição de cotas de tela para valorizar os produtos culturaislocais, regionais e nacionais, bem como a atuação de produtores independen-tes; e a definição de três tipos de prestadores de serviços de comunicação –estatal, privado com fim de lucro e privado sem fim de lucro -, dotados deiguais condições de operação e acesso às plataformas de transmissão.

Também o acesso figura como um de seus princípios norteadores. A leiprevê universalidade e diversidade no acesso aos serviços de comunicação,garantindo igualdade de oportunidades a todos os habitantes da Nação (AR-GENTINA, 2009). Propõe-se, portanto, a alterar o cenário descrito por Mas-trini e Marino (2008) em relação ao audiovisual, segundo o qual somente setecidades do interior contam com mais de um sinal de televisão aberta, ficandoo pluralismo neste caso submetido a condições desiguais de acesso: a contra-tação de um serviço de televisão a cabo.

Ao ser perpassada por esses princípios considerados chave em qualquerprocesso de democratização da comunicação, o que a Lei de Meios permitemudar na realidade dos veículos estatais argentinos? E como isso pode reper-cutir na difusão do sinal da emissora multiestatal Telesur, que até a promul-gação da lei registrava baixos índices de penetração no país? Para fazer essa

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avaliação, discorremos a seguir sobre as disposições da lei que podem reverteresse quadro, avaliando seus possíveis reflexos na transmissão da Telesur.

Em primeiro lugar, deve-se destacar que, ao dotar todos os prestadores deserviços de comunicação de iguais condições de operação e acesso às plata-formas de transmissão, o art. 2 da nova lei (ARGENTINA, 2009) põe fim aoprincípio de subsidiariedade do Estado que vigorara até então, restringindoa atuação deste às áreas onde a iniciativa privada não se fizesse presente porfalta de interesse comercial (artigos 10 e 33 do Decreto-Lei) (ARGENTINA,1980).

Ademais, a lei define um regime de outorgas diferenciado para os meiosestatais que não tenham reservas asseguradas no espectro 3. A partir de então,estes não precisam se submeter a concursos, medida prevista no art. 33 doDecreto-Lei (ARGENTINA, 1980). Eles passam a depender de uma autoriza-ção, concedida pelo órgão regulador do setor (art. 22) - a Autoridade Federalde Serviços de Comunicação Audiovisual - de acordo com a demanda e deforma direta, desde que haja disponibilidade do espectro (art. 37) (ARGEN-TINA, 2009).

Ao garantir a todos os tipos de operadores iguais condições de acesso àsplataformas de transmissão, a lei promove uma pluralização do espaço comu-nicacional até então inexistente no país, que é condição básica para a operaçãoda Telesur. A abertura do caminho à transmissão do sinal da multiestatal, viaradiodifusão aberta, nas áreas cobertas pela mídia comercial, instaura umainédita concorrência com esses meios na Argentina, fundamental para o pro-pósito da emissora de ser uma alternativa aos conglomerados multimídia.

Associada às garantias de universalização e diversificação do acesso aosserviços de comunicação, também previstas no art. 2 da nova lei, a definiçãode iguais condições para os diferentes operadores também pode viabilizar atransmissão da multiestatal em sinal aberto para todo território nacional, pros-sibilitando aos cidadãos argentinos acesso gratuito e equitativo a um meio depropriedade do Estado, até então disponível apenas mediante serviço pago.

Por fim, a desburocratização do processo de outorga de licenças parameios estatais, que passam a receber tratamento diferenciado dos meios co-merciais, obtendo autorizações para o funcionamento de acordo com a de-

3. Ambas as leis reservam espaço no espectro para determinados tipos de veículos público-estatais, como os de âmbitos provincial e municipal.

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manda, torna a transmissão da Telesur em sinal aberto dependente apenas deuma limitação de ordem técnica: a disponibilidade de frequência no espectro.

A Lei de Meios também versa sobre a regulação do conteúdo dos pres-tadores de serviços audiovisuais, tornando possível a presença da Telesur emum segmento que a excluía: a televisão a cabo. O art. 65, em seu inc. a, esta-belece que os serviços por subscrição de recepção fixa devem incluir em suagrade, sem codificar, todas as emissoras e sinais públicos do Estado nacionale todas aquelas em que o Estado tenha participação. O inc. b, por sua vez, de-fine que os sinais devem ser ordenados por gêneros, conforme regulamentaçãoque seria ditada com esse propósito (ARGENTINA, 2009).

A norma, até então inexistente, pode alterar o cenário que vigorara atéentão. Conforme mencionado anteriormente, a concentração do setor não sóem termos horizontais (domínio de uma ou mais empresas no fornecimento doserviço de TV a cabo), mas também verticais (controle sobre diferentes etapasda cadeia de valor, como o fornecimento do serviço e a oferta de sinais), levaas empresas dominantes a usar sua posição para excluir sinais competidores –como a Telesur -, não só de seus próprios serviços, mas do sistema como umtodo, dado o poder de pressão sobre os pequenos operadores proporcionadopela posse dos principais sinais de TV.

Mas será que essas possibilidades abertas pela nova lei foram colocadasem prática nos dois anos transcorridos após sua promulgação? Em caso ne-gativo, o que vem dificultando sua concretização? É o que procuramos evi-denciar a seguir, ao tratar do processo de implementação da Lei de Meios,em especial dos dispositivos que podem contribuir para a difusão do sinal daTelesur na Argentina.

Disputando a hegemonia: avanços e obstáculos à difu-são da Telesur

Como evidenciamos anteriormente, o processo de elaboração da Lei deMeios põe em xeque o paradigma de comunicação convergente, calcado emvalores econômicos e tecnológicos, promovendo um modelo de viés demo-cratizador, em que a comunicação é concebida como um direito. Por conse-guinte, instaura uma luta pela hegemonia, em que os grupos reunidos em torno

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da nova concepção disputam a liderança ideológica e cultural da sociedade e,para isso, têm que enfrentar a resistência das antigas forças hegemônicas.

Neste contexto, também a implementação da lei – e, por extensão, dosartigos que podem alterar as condições de acesso à Telesur - é marcada porresistências. O bloco histórico amalgamado em torno da concepção até en-tão hegemônica age com vistas a conservar sua liderança. Tal resistência seexpressa primeiramente na tentativa de impedir na justiça a vigência da lei.Como expõe Becerra et al. (2011), os conglomerados multimídia e seus re-presentantes parlamentares iniciaram uma série de ações contra a nova regu-lamentação.

A principal delas teve início em janeiro de 2010. O deputado oposici-onista Enrique Thomas interpôs uma ação na Justiça Federal de Mendoza,alegando irregularidades na tramitação do projeto no Congresso. A sentençafoi favorável à causa e levou à suspensão da lei em todo o país, por medidacautelar. Becerra et al. (2011) chama atenção para o fato de que a decisãopartiu da juíza Olga Pura de Arrabal, a mesma que em outras disputas entreo Estado e os conglomerados multimídia, havia emitido sentenças favoráveisaos segundos.

O governo federal recorreu contra a medida cautelar. No entanto, a Câ-mara Federal de Apelações de Mendoza confirmou a sentença. Baranchuk(2011) afirma que pesam sobre os juízes responsáveis pela decisão – OtilioRoque Romano, Alfredo Lopez Cutiño e Julio Demetrio Petra Fernández –condenações ou juízos públicos por ligações com o regime militar, que ini-ciou a implantação do paradigma de comunicação convergente, com a ediçãodo Decreto-Lei N° 22.285.

O caso foi parar então na Corte Suprema de Justiça. Os ministros da cortederam curso favorável à interpelação e remeteram-na ao Procurador Geral daNação, Esteban Righi, para que emitisse parecer. Em consonância com avisão deste, no dia 15 de junho de 2010, foi declarado procedente o recurso doExecutivo e revogada a sentença (REPORTERES SIN FRONTERAS, 2010).

Retiradas as travas legais que impediam a vigência da lei, em oito desetembro a Autoridade Federal de Serviços de Comunicação Audiovisual(Afsca) ditou a Resolução N° 296/2010, estabelecendo as pautas para o or-denamento da grade de programação dos serviços de TV a cabo. O artigo1° define que a grade deve ser ordenada por gêneros, fixando algumas loca-lizações. No que diz respeito aos sinais de notícias internacionais, obriga a

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inclusão da Telesur sua localização no início do espaço reservado ao gênero.O art. 5° define a data de 1° de outubro de 2010 como prazo para a adequaçãoe o art. 6°, afirma que o descumprimento das disposições será consideradofalta grave e estará sujeito a multas (ARGENTINA, 2010).

A Associação Argentina de Televisão a Cabo (ATVC), que nesses diasrealizava sua XX Jornada Internacional, reagiu prontamente. Em um comuni-cado publicado na mesma data da resolução, avaliou que “la norma persigueel objetivo político de controlar los contenidos de los medios de comunica-ción, como vehículo para incidir sobre la capacidad de discernimiento de lasociedad" (ATVC, 2010). Por sua vez, os operadores independentes avalia-ram que as maiores empresas do segmento provavelmente obteriam medidascautelares contra a aplicação das normas, ficando à margem de sua obrigatori-edade, enquanto os menores, carentes de recursos econômicos para tal, seriamcompelidos a cumpri-la (PRENSA RIO, 2010).

E foi o que de fato aconteceu. Em 23 de setembro, uma série de operadorasde TV paga subscreveu a ata da Afsca se comprometendo a realizar as mudan-ças prescritas pelo órgão (AFSCA, 2010b). No mesmo dia, a Justiça Federalda província de Dolores emitiu uma sentença ordenando o congelamento damedida, com base em um amparo interposto pela produtora El Haieck, querecebera de Cablevisión o comunicado de que seu sinal seria eliminado dagrade em função dos reordenamentos ditados pela normativa (CENTRO DEINFORMACIÓN JUDICIAL, 2010). Desta forma, enquanto quase todos ospequenos operadores se comprometeram a cumprir a norma, o principal delesnegou-se a fazê-lo amparado pela decisão judicial.

A negativa foi acompanhada por uma estratégia para protelar ainda maiso acatamento da norma, que consistiu na apresentação de ações judiciais emdistintas localidades. A batalha judicial se arrastou até 13 de dezembro de2010, quando foram pronunciadas as duas últimas sentenças, favoráveis aogoverno. Na data, a Câmara Federal de Bahia Branca anulou as decisões deprimeira instância das justiças de Coronel Dorrego e Coronel Pringles. Aprimeira respondia a uma ação movida por Dorrego Televisión, vinculada aCablevisión, e a segunda, a Canal 2 TV (TIEMPO ARGENTINO, 2011).

Esgotadas as possibilidades de disputa no âmbito judicial, Cablevisiónpassou a valer-se de seu domínio no setor para impedir a vigência da norma-tiva. Apesar das sentenças, manteve a posição de não acatar as disposiçõesgovernamentais. Embora tenha reordenado a grade em 15 de março de 2011,

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tais alterações não seguiram o ditado pelo órgão; tampouco a inclusão dossinais foi realizada (CANAL AR, 2011).

A intransigência valeu-lhe 86 faltas em fevereiro, que se converteram emuma falta grave, e mais 66 em abril, conduzindo à segunda falta grave. Opresidente da Afsca, Gabriel Mariotto, advertiu que a persistência da negativapoderia levar a novas sanções e à perda da licença, prevista na nova lei quandoacumuladas quatro faltas graves (TIEMPO ARGENTINO, 2011).

Somente um ano após a publicação da Resolução N° 296/10, Cablevisiónresolveu cumprir a normativa, e de forma muito limitada. Em 15 de setem-bro de 2011, realizou o reordenamento e a inserção dos sinais – inclusive oda Telesur -, mas somente em seu sistema de transmissão digital (RAPIDTV-NEWS, 2011). A medida afetou menos de 150.000 telespectadores (NEXTTVLATAM, 2011), uma parcela ínfima do mercado controlado pelo operador, emtorno de 2,75 milhões de assinantes (CHARRAS, 2011). Considerando que aempresa abrange aproximadamente 55% do mercado de televisão a cabo dopaís, pode-se afirmar que a distribuição do sinal da Telesur neste segmentotelevisivo ainda não atingiu taxas consideráveis.

Se os avanços na distribuição do sinal da multiestatal impulsionados pelaLei de Meios ainda foram pouco satisfatórios em relação à televisão a cabo,o que dizer da radiodifusão aberta? O que tem sido feito para garantir quea universalidade e a pluralidade no acesso aos serviços audiovisuais, previs-tas no texto legal, sejam válidas também para esse veículo, que conta com aparticipação acionária do governo argentino?

Neste segmento, nada mudou. Mas por quê? Uma explicação é a vigên-cia do Decreto N° 527/05, elaborado ainda sob a hegemonia do paradigmaconvergente. Como explica Califano (2007), o dispositivo ditado por NéstorKirchner em 2005 suspendeu por dez anos a contagem da validade das ou-torgas de todas as frequências de radiodifusão do país. Na prática, portanto,ampliou em dez anos o tempo das concessões, somando-os aos prazos rema-nescentes.

Para compreender o alcance da medida deve-se considerar que as frequên-cias UHF do país encontram-se indisponíveis. Como afirma Rossi (2009),na década de 1990 o ex-presidente Carlos Menem promoveu a privatizaçãodessa banda do espectro, conduzindo-a a um estado de saturação. Portanto,as frequências passíveis de serem usadas para transmissão em radiodifusão

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aberta de sinais como o da Telesur tiveram uma sobrevida garantida com odecreto kirchnerista.

Em contradição com todo o processo descrito anteriormente, o Congressoratificou o Decreto N° 527 pouco depois de sancionada a Lei de Meios, em20 de outubro de 2009. Becerra (EL CRONISTA, 2011) avalia que a decisãocriou uma situação paradoxal, ao reiterar uma medida que consagra a altaconcentração midiática, em um contexto que aponta para a democratização dacomunicação.

A validação da medida pode ser considerada mais uma investida das anti-gas forças hegemônicas na tentativa de manter sua liderança. Portanto, tam-bém no setor de radiodifusão aberta, os dispositivos da Lei de Meios quepermitiriam ampliar o alcance do sinal da Telesur em território argentino têmsua implementação barrada por uma batalha pela hegemonia.

Considerações finais

Ao investigarmos o que mudou na distribuição da Telesur com a promul-gação da Lei de Meios, observamos que o cenário inicial de baixa difusãoda emissora na Argentina pouco foi alterado. Embora o novo marco regu-latório contenha dispositivos capazes de ampliar o acesso à multiestatal, eleenfrenta resistências à sua concretização. O bloco histórico reunido em tornodo paradigma convergente vem travando uma disputa para manter sua posiçãohegemônica, ameaçada pelos preceitos da nova lei.

A resistência imposta até o momento conseguiu barrar a expansão da Te-lesur no sistema de TV a cabo. Somente os menores operadores seguiram asnormas ditadas pelo governo, incluindo o sinal da multiestatal em sua gradede programação. A Cablevisión, pertencente ao maior conglomerado de co-municação do país e responsável por mais de 50% do mercado potencial dosegmento, vem se negando sistematicamente a fazê-lo.

O acesso à Telesur via radiodifusão aberta, em condições igualitárias paratodos os cidadãos, também não se concretizou em função de disputas pelahegemonia. A vigência do Decreto N° 527, que prorrogou o prazo de todas aslicenças do país em um contexto de saturação do espectro, impede a liberaçãode frequências que poderiam ser usadas para esse propósito.

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Apesar de terem sido poucos até o momento, os avanços na difusão daTelesur na Argentina não devem ser menosprezados. Como afirma Gramsci(apud GRUPPI, 2000), a hegemonia se constrói a partir de uma guerra de po-sições: é pela ocupação tática de espaços limitados da sociedade civil que umaconcepção vai construindo sua liderança. Portanto, cada território conquistadodeve ter seu valor reconhecido.

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