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01 | Maio | 2014 - Se Na linha da frente da informação, para que se mantenha sempre informado com rigor e isenção - Nº 0 - Ano 1 |sexta-feira 01 de Maio de 2014 À CONVERSA COM Prof. Doutor Jorge Custódio pág 12-13 Recuperação vai custar 20 milhões de euros Objectivo é resolver problemas ambientais e recuperar património na antiga mina do concelho de Mértola, desactivada há 48 anos. Antiga Mina de São Domingos A Câmara de Mérto- la e a Empresa de De- senvolvimento Mineiro (EDM) chegaram a acordo para resolverem problemas ambientais e recuperarem patrimó- nio da antiga mina de S. Domingos, num inves- timento de 20 milhões de euros. Após vários anos de negociações, a autarquia conseguiu que a EDM, através da nova direcção, "apre- sentasse vontade de finalmente incluir no seu orçamento e no âmbito do novo quadro comunitário de apoio investimentos neces- sários para resolver problemas ambientais do parque da mina de S. Domingos", disse à Lusa o presidente da Câmara de Mértola, Jorge Rosa. (continua pág.5) A classificação define responsabilidades públicas de enorme significado a nível das políticas culturais da administração pública e autárquica, das instituições públicas e associativas e ainda das empresas privadas e dos cidadãos. Dado que foram reconhecidos os valores patrimoniais da Mina de S. Domingos, a classificação passa a ser o motor da salvaguarda, da reabi- litação ambiental, da investigação, da conservação e restauro, da recuperação, da reabilitação urbana e da valorização e da fruição social e turística, de acordo com as leis portuguesas e as cartas e recomendações internacionais, nomeadamente aquelas que foram passadas à legislação portuguesa.

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- SeNa linha da frente da informação, para que se mantenha sempre informado com rigor e isenção - Nº 0 - Ano 1 |sexta-feira 01 de Maio de 2014

À C O N V E R S A C O M P r o f . D o u t o r J o r g e C u s t ó d i o pág 12-13

Recuperação vai custar 20 milhões de eurosObjectivo é resolver problemas ambientais e recuperar património na antiga mina do concelho de Mértola, desactivada há 48 anos.

Antiga Mina de São Domingos

A Câmara de Mérto-la e a Empresa de De-senvolvimento Mineiro (EDM) chegaram a acordo para resolverem

problemas ambientais e recuperarem patrimó-nio da antiga mina de S. Domingos, num inves-timento de 20 milhões

de euros. Após vários anos de negociações, a autarquia conseguiu que a EDM, através da nova direcção, "apre-

sentasse vontade de finalmente incluir no seu orçamento e no âmbito do novo quadro comunitário de apoio

investimentos neces-sários para resolver problemas ambientais do parque da mina de S. Domingos", disse à

Lusa o presidente da Câmara de Mértola, Jorge Rosa.

(continua pág.5)

A classificação define responsabilidades públicas de enorme significado a nível das políticas culturais da administração pública e autárquica, das instituições públicas e associativas e ainda das empresas privadas e dos cidadãos. Dado que foram reconhecidos os valores patrimoniais da Mina de S. Domingos, a classificação passa a ser o motor da salvaguarda, da reabi-litação ambiental, da investigação, da conservação e restauro, da recuperação, da reabilitação urbana e da valorização e da fruição social e turística, de acordo com as leis portuguesas e as cartas e recomendações internacionais, nomeadamente aquelas que foram passadas à legislação portuguesa.

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editorial

A regata que passa junto à Igreja na

Mina de São Domingos, sofreu uma profunda remodelação, a água foi canalizada para uma segunda regata que corre junto à estrada até ao Tea-

Este projecto que vê hoje a luz do dia, precisamen-te no dia 1 de Maio, dia Internacional do Trabalhador, é mais um dos projectos desenvolvidos pelo Grupo de Amigos da Mina de São Domingos (GAMSD).

O GAMSD nasceu da iniciativa do nosso con-terrâneo Zito Barão o qual a distância na forma de saudade o impeliu a criar este grupo na rede social facebook. O que era apenas uma forma de ter contacto com alguns familiares e amigos e o elo de ligação virtual com a Mina de São Domingos, passou em pouco tempo a um grupo que conta neste momento com cinco mil quatrocentos e trinta e três menbros (5.433).

Durante este percurso e a seu pedido vários admi-nistradores se foram juntando no intuito de dinamizar o grupo e não o deixar cair em esquecimento.

Aos poucos o GAMSD passou de um simples sítio de encontro de amigos, de curiosos sobre a Mina, de postagem de fotos, etc... e foi-se tornando num espaço debate, de liberdade, onde se tem um olhar atento sobre a Mina de São Domingos o seu património cultural, arqueológico e as suas gentes.

Vários foram já as acções levadas a cabo a par-tir deste grupo, recordo a petição para o abate dos eucaliptos das Ilhas que se encontravam em estado acelerado de degradação e a sua reflorestação imedia-ta. Petição que foi entregue em mãos ao Presidente da Câmara Municipal de Mértola e mereceu da sua parte atenção procedendo ao pedido apresentado.

Mais recentemente o alerta às autoridades compe-tentes do abate ilegal da própria Câmara Municipal de Mértola aos eucaliptos que se situavam na Praia da Tapada Grande, e que mereceu o reconhecimento da ilegalidade por parte das entidades competentes, fixando assim coimas à Câmara por este acto ini-qualificável.

Para além de todos estes pontos formou-se com a chefia do Luís Baltazar o Centro de Estudos da Mina de São Domingos, [ http://cemsd.minadesdo-mingos.com ] um espaço que reune vários textos e documentos, escritos e gráficos sobre a Mina de São Domingos. Este site permite uma fácil consulta da história e serve de ponto de apoio para trabalhos académicos, sendo inclusivé referenciado no livro editado recentemente “Mina de São Domingos, Ter-ritório, História e Património Mineiro” do Professor Doutor Jorge Custódio.

Ainda no campo do arquivo está também organi-zado um local onde se pode aceder a fotografias de várias épocas da Mina de São Domingos, das suas gentes, usos e costumes, “Memória Digital - Mina de São Domingos” e que podem aceder através do site, [ http://www.memoriadigital.minadesdomingos.com/ ].

Este jornal que hoje é lançado, pretende dentro das suas rúbricas que são variadas dar a conhecer e reavivar memórias, informar e ao mesmo tempo divulgar o nosso património, a sua história, o seu presente, sempre com os olhos lançados no futuro.

Estamos abertos à participação de todos, desde que não fuja à linha editorial traçada. Contamos convosco para levar a bom porto mais esta iniciativa do GAMSD.

Boa leitura espero que gostem, se divirtam, se informem e passem uns bons momentos.

Mina de São DomingosRegata junto à Igreja deixa de ser problema

tro. Nas últimas chuvadas já foi possível constatar que as águas fluiram de forma nor-mal, sem que provocassem inundações e alagamentos no antigo Bairro Marechal Carmona, agora Bairro 1º de Maio.

As obras estão conclu-

ídas e são um benefício enorme para quem todos os anos por altura das chuvas, padecia do tormento das inundações e alagamentos. Além de ser um passo po-sitivo e de ser reconhecido como tal, esperemos que a autarquia não esqueça

entretanto outros problemas que têm ainda a ver com as inundações e alagamentos que continuam a existir em outros pontos da Mina de São Do-mingos, e que muito têm sido contestados, inclusive com cartas enviadas à autarquia, muitas delas sem resposta.

James Francis Mason com os chefes, os encarregados e o padre (1882)

F O T O G R A F I A S C O M H I S T Ó R I A

1º de MAIODia Internacional do Trabalhador

Neste dia Internacional do Trabalhador, dia escolhido pelo mensário, on-line “O Gasómetro” para sair com a sua publicação Nº 0, prestamos sentida homenagem a todos os mineiros e em particular a todos os que morreram no fundo da Mina. Esperamos com este semanário e a exemplo do Grupo de Amigos da Mina de São Domingos (GAMSD), continuar a aproximar todos os mineiros espalhados pelo mundo, que têm como ponto de encontro das suas memórias a Mina de São Domingos.

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CEMSD

Centro de Estudos da Mina de São DomingosRecolhe e disponibiliza informação

O Centro de Estudos da Mina de São Domingos (CEMSD), iniciativa de Luís Baltazar um filho da terra, tem vindo a crescer de há um tempo a esta parte com o apoio do Grupo dos Amigos da Mina de São Domingos e de toda a população residente e não residente desta lo-calidade, situada no concelho de Mértola, na margem esquerda do Guadiana. Pode ser consultado em http://cemsd.minadesdomingos.com

Nesta edição número zero de “O Gasómetro” en-trevistámos Luís Baltazar impolsionador do Centro de Estudos da Mina de São Domingos (CEMSDA)e colocámos-lhe algumas questões em relação ao projecto que voluntariamente dirige.

OG - A pergunta que se impõe, como nasceu a ideia da criação do CEMSD?

LB - A ideia da criação do CEMSD nasce a partir de uma necessidade comum a muitos dos interessados nas questões relacionadas com a MSD, ter um acesso facilitado via internet aos muitos documentos produzi-dos por pessoas muito diversas e que se encontravam espalhados (podemos dizê-lo) por todo o mundo. Existia um grupo considerável de pessoas, entre as quais me incluo, que nos últimos anos tinham dedicado algum do seu tempo a procurar esses documentos e guardá-los, tivemos a felicidade de nos encontrar, ou nalguns casos reencontrar no Grupo de Amigos da Mina de S. Domingos no Facebook e começámos a partilhar esses documentos, então pensámos porque não partilhar com todos os outros? E assim nasceu o CEMSD.

OG - Quais são os objectivos do CEMSD? E que mais-valias pensa trazer à Mina de São Domingos?

LB - O objetivo principal continua a ser o mesmo, partilhar de forma livre a informação disponível sobre

a Mina de S. Domingos, mas temos a consciência que existe muito património imaterial (memórias) que se está a perder e estamos a tentar encontrar formas de recolher e preservar essas memórias. Quanto às mais-valias, pensamos que o CEMSD poderá ser uma âncora para todos os que pretendam efetuar estudos, sejam de que disciplina forem, sobre a MSD, contribuindo assim para a sua divulgação, somos ainda um lugar de referência para aqueles que gostando da Mina, e mesmo sem intuitos de realizarem estudos sobre a mesma, pretendem conhecê-la melhor.

OG - O CEMSD tem feito parte de muitas con-sultas a nível académico e muito recentemente foi referenciada no livro do Prof. Jorge Custódio “Mina de S. Domingos. Território, História e Património Mineiro”, sendo um projecto sem apoios, nem a nível autárquico nem a nível governamental, como se torna possível manter o nível de qualidade do site?

LB - O sítio internet do CEMSD é resultado do esforço de um conjunto de pessoas dedicadas que muito têm dado de si, é o reflexo de milhares de horas de trabalho desinteressado, cujo valor pecuniário nunca foi calculado porque a intensão nunca foi procurar mais-valias financeiras. Ultimamente foram efetuadas alterações que lhe conferiram maior atratividade e facilidade de uso por parte dos interessados menos familiarizados com as questões informáticas, demo-cratizando ainda mais o acesso.

OG - Com quantos documentos, entre escritos e fotográficos conta neste momento o CEMSD?

LB - Neste momento estão disponíveis entre estu-dos, artigos científicos e jornalísticos, peças manuscri-tas, mapas e outros, cerca de 170 documentos, alguns com centenas de páginas; 217 fotografias distribuídas por 6 categorias; 59 vídeos; uma cronologia com de-zenas de eventos; e algumas centenas de entradas no Mural relativas a pessoas e lugares da MSD. Todo este espólio abarca as diversas épocas da história da MSD e pretende ser um legado para as gerações vindouras.

OG - Já existiu por parte da autarquia algum re-conhecimento em relação ao CEMSD, dado ser uma ferramenta essencial para a divulgação do complexo mineiro da Mina de São Domingos, da sua história dos seus costumes e das suas gentes?

LB - Sim, a Assembleia Municipal de Mértola, votou em fevereiro de 2013 uma proposta de louvor aos promotores do CEMSD, tendo sido aprovado por unanimidade. Ação que muito nos sensibilizou, porque por vezes e devido a posições criticas tomadas

publicamente por alguns dos colaboradores, o CEMSD é erradamente visto como um “contra-poder”. Mas sempre pretendemos deixar claro que o CEMSD é um projeto apolítico e que a posição individual dos seus colaboradores não pode e não deve ser vista como uma posição de grupo, o CEMSD enquanto grupo nunca tomou nem pretende tomar qualquer posição politica, obviamente que os seus membros são cidadãos de pleno direito e como tal têm total liberdade de se pronunciarem, como entenderem, sobre as questões politicas, sociais ou outras, se o pretenderem fazer.

OG - Para finalizar qual o objectivo que tem em mente a curto/médio prazo para o CEMSD, sendo que tenho conhecimento que há pouco tempo existiu uma remodelação e o arquivo fotográfico sofreu enormes alterações? Como se torna possível com trabalho voluntário manter este site?

LB - Com trabalho voluntário é possível fazer tudo. Os únicos custos que temos é a manutenção da plataforma tecnológica, e esse é muito baixo, temos entre nós especialistas e tecnologias de informação e comunicação, o que nos dá algum “conforto” nas questões de desenvolvimento, mas o essencial é a entrega que todos os colaboradores têm mostrado, esse é o grande segredo do CEMSD: Os projetos para o futuro próximo passam por con-tinuar a alimentar o acervo, existem ainda muitos documentos por catalogar e carregar, pretendemos igualmente carregar muita informação pessoal sobre os trabalhadores da Mason & Barry, Lda. no Mural, para que as respetivas famílias se revejam no pro-jeto e contribuam para o enriquecer, elevando este espaço como o lugar virtual de lembrança e home-nagem a todos esses homens e mulheres que cons-truíram com as suas mãos a Mina de S. Domingos. Para os próximos dias está prometida uma surpresa, mas não pretendo já “levantar o véu” posso apenas dizer que utilizará tecnologia inovadora e que permitirá ligar a história da MSD aos lugares onde ocorreram os eventos. Esperamos ainda este ano efetuar algumas ativi-dades no terreno, como por exemplo passeios pedestres/visitas guiadas, maratonas fotográ-ficas e outros eventos que sejam possíveis de realizar com os recursos que temos disponíveis. A longo prazo, gostaríamos de realizar na Mina de S. Domingos, um colóquio ou umas jornadas dedicadas ao tema do património material e imaterial do lugar. Ambições e projetos não nos faltam, e tenho a certeza que por não dependermos de ninguém a não ser de nós próprios, os iremos realizar à medida que dis-pusermos dos recursos; e que continuaremos a ser uma referência para todos os que gostam da Mina de S. Domingos.

Luís Baltazar é Geógrafo, especialista em Geomática.

Neto de um mineiro, viveu a sua infância na MSD

onde frequentou a escola primária, embora a viver fora da Mina

o seu apego à terra nunca se desvaneceu

e por sua iniciativa reuniu em torno do CEMSD

um conjunto de pessoas com diversas valências,

competências profissionais e histórias de vida,

o que permitiu o desenvolvimento

e o sucesso do projeto.

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A aldeia de Mina de S. Domingos localiza-se numa parcela do território nacional a que normalmente se atribui o nome de “Margem

Esquerda do Guadiana”, no distrito de Beja, concelho de Mértola, freguesia de Corte do Pinto, distando cerca de 270 km de Lisboa, 65 km de Beja e 17 km de Mértola, sendo uma das localidades portuguesas mais distante da respetiva capital de Distrito. Por outro lado, o facto da fronteira espanhola ficar a escassos 2 km, confere-lhe uma localização que lhe dá um pouco a imagem de “fim do mundo”.

A aldeia deve a sua existência aos recursos mine-

rais existentes, integrada na Faixa Piritosa Ibérica a riqueza do seu subsolo tornou-a, durante um século, e a par de outas minas da região (Rio Tinto, Tharsis, Aljustrel, Lousal, etc.) a principal produtora de pirite de cobre do mundo.

Geologicamente, tudo começou com a minerali-zação de sulfetos que ocorreu em ambiente vulcânico e sedimentar submarino, num período entre os 362 e os 346 milhões de anos atrás, para ajudar a entender a antiguidade, podemos referir que os dinossauros viveram na terra entre os 230 e os 65 milhões de anos atrás e que os primeiros hominídeos datam de cerca de 7 milhões de anos atrás.

Os vulcões instalaram-se no fundo de um mar pouco

profundo onde a lava e outros produtos se misturaram com sedimentos (argilas e areias). Com o fim da ativi-

Mina de S. Domingos

Fig 1 – Mina de S. Domingos (Memória Digital - CEMSD)

Fig 2 - Esquema que ilustra a formação de depósitos de pirite na FPI (Friends of Minerals Forum)

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dade vulcânica, o mar devido a movimentos da crosta terrestre tornou-se mais profundo, ocorrendo então a acumulação de mais sedimentos, provenientes da área continental e da erosão dos próprios cones vulcânicos, originando as rochas que após a sua emersão compõem a matriz geológica da região.

A presença de uma enorme massa de mineral coberta por um “chapéu de ferro”, a Serra de S. Domingos destacava-se numa paisagem caraterizada por um relevo de ondulado suave, entalhado por barrancos pouco profundos em que se destacava o vale dos rios Chança e Guadiana, destacavam-se ainda alguns afloramentos quartzíticos (ex. Guizo Grande e Guizo Pequeno) que devido à sua maior resistência à ero-são são os pontos mais elevados da paisagem. Mas a exploração de minerais a céu aberto que ocorreu no final do séc. XIX / princípio do séc. XX transformou radicalmente e definitivamente a paisagem, agora no lugar da Serra de S. Domingos, abre-se uma imensa cratera (corta) cheia de água-forte.

Esta região caracteriza-se por um clima tipica-

mente Mediterrânico, ou seja, com Verões secos e Invernos pouco chuvosos e frios, onde se registam as mais baixas precipitações do país (entre 606,7 e 480,8 mm) e os mais elevados níveis de insolação e temperatura. O fator climático, aliado à pobreza dos solos, uma vez que a maior parte destes, de acordo com a carta de capacidade de uso, apenas têm aptidão para culturas tradicionais, utilizações florestais de espécies autóctones, matos e pastagens, faz com que a atividade agrícola esteja muito condicionada e que se limite à silvicultura, pecuária e algumas hortícolas e frutos (para abastecimento local) onde a existência de água o permite.

O coberto vegetal é essencialmente constituído por montados de azinho associados a algumas gramíneas e por matos sobretudo de estevas. Em termos faunís-ticos, a região também não apresenta grande riqueza, exceto no Vale do Guadiana onde devido a condições muito particulares existem algumas espécies notáveis, o que levou, já no final do séc. XX à criação de um Parque Natural.

Existem no entanto outras riquezas naturais que levaram à fixação humana, nomeadamente, a navega-bilidade do rio Guadiana (até Mértola), o que permitia um rápido e fácil acesso ao litoral e a existência de minerais nobres na região, como o Ouro, a Prata e o Cobre.

Pensa-se que a região tenha sido ocupada pelo ho-mem desde há muito, provavelmente desde a idade do ferro. Nessa altura, devido à abundância de minério, terão existido na área diversos núcleos humanos que se dedicavam à extração e ao trabalho dos minerais produzindo armas e outros utensílios e usando o Guadiana para o comércio dos mesmos. Desde logo a região se evidenciou como ponto de cruzamento das rotas comerciais do interior.

Existem evidências que os Fenícios, como grande povo mercador do Mediterrâneo, chegaram a esta área por volta do séc. VIII a.C., em busca das suas rique-zas minerais, no entanto, pensa-se que se limitavam a fazer trocas com os autóctones nunca se chegando a estabelecer.

Com a ocupação Romana, as potencialidades da região foram exploradas de forma mais sistemática, levando a que a sua importância fosse realçada. Mér-tola, Myrtilis na época, chegou a ser cidade e ponto de vital importância política e militar, tendo mesmo o direito de cunhar moeda, pois o seu porto fluvial e a via que o ligava a Beja e a Évora, eram vitais para o escoamento de produtos e para a manutenção do império.

Com a queda do Império Romano, a região é ocu-pada pelos Muçulmanos, não perdendo, no entanto, a sua importância estratégica e continuando a explo-

ração de minerais e o desenvolvimento do ponto de vista social e cultural, sendo desta época os vestígios arqueológicos mais importantes.

D. Sancho II conquista a região em 1238 e no ano seguinte estas terras são doadas à Ordem de Santiago, dando-se nessa altura uma viragem, com a exploração mineira a entrar em recessão, quer por falta de inte-resse, quer por dificuldades técnicas para chegar aos filões mais profundos, passando a ser a agricultura de cereais e a sua moagem (aproveitando a força das águas dos Rios Guadiana e Chança), a ocupação principal.

Só em meados do Séc. XIX, com a redescoberta da Mina de S. Domingos e a sua exploração através de técnicas avançadas para a época, é que a região volta a ter a importância do passado, com o rio a voltar a ter um papel fundamental no escoamento do mineral. A mão-de-obra torna-se premente o que leva à migração de muita gente, que chega, não só do Alentejo, mas também do Algarve e das Beiras.

A exploração industrial do minério da Mina de S. Domingos termina em meados do séc. XX, devolvendo a região à pobreza e ao esquecimento anterior, devido, essencialmente, ao seu afastamento dos grandes cen-tros de decisão. Fica igualmente um enorme passível ambiental, que irá perdurar durante séculos, dando por um lado um aspeto único à paisagem, mas que irá continuar inexoravelmente a envenenar águas e solos.

Esta região, que chegou a ser classificada como um ermo, à época da conquista cristã, só se torna verdadeiramente atrativa durante a fase de exploração industrial da Mina de S. Domingos, com o concelho nessa época a ter perto de 30000 habitantes, no entan-to, com o fecho da mina a emigração sobe em flecha, reduzindo-se a população para metade. Desde essa altura o concelho tem vindo a perder população, tendo neste momento, segundo os censos de 2011, pouco mais de 7 000 habitantes. Atualmente, dos lugares do concelho, apenas dois, a sede de concelho e a Mina de S. Domingos têm mais de 500 habitantes.

Nos últimos anos, com o incremento do turismo cultural, do turismo rural e do turismo da natureza, a região recebeu um novo fôlego e os serviços sofreram um crescimento assinalável, sendo já o principal sector empregador. Existe a esperança de que este processo seja de tal forma dinâmico, que para além de fixar a população jovem da região, atraia um razoável número de jovens que abandonem as cidades na procura de uma melhor qualidade de vida, essencialmente mais calma, saudável e segura.

Luís Baltazar

Fig 3 – Tapada Grande (Memória Digital - CEMSD), Autor: José Zarcos Tirado Palma

Fig 2 – Corta da Mina de S. Domingos (Memória Digital - CEMSD)

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1º Parte

As Minas de São Domingos, inscrevem-se no centro da Faixa Piritosa Ibérica da designada Zona Sul Portuguesa, onde se

situam igualmente as minas de Canal-Caveira, Lou-sal, Aljustrel e Neves-Corvo, e que se prolonga em Es-panha para além das minas de Riotinto.

Foi nesta região que há 350 milhões de anos a atividade vulcânica submarina que ocorreram e deram origem a importantes jazigos de sulfuretos maciços po-limetálicos associados aos flancos de cones vulcânicos, na forma de pirites, mas também de calcopirites, blendas, galenas e cassiterites.

Estima-se que a massa explorada em São Domingos rondam os 25 milhões de toneladas de minério que tinha uma disposição subvertical, com uma orientação aproximadamente este-oeste, com a presença predomi-nante de pirite e, em percentagens variáveis. A pirite apresentava teores de enxofre entre 45% e 48%. Os teores médios de cobre e zinco eram de 1,25% e de 2 a 3%, respectivamente.

A exploração mineral no local de São Domingos é anterior à invasão romana da península Ibérica, período em que os trabalhos se intensificaram com a exploração do «chapéu de ferro» que cobria a massa piritosa, para a exploração de cobre, ouro e prata. Foram o primeiro empreendimento mineiro do país.

No período da proto-história Idade, do Cobre (aproximadamente 2500 a 1800 a.C.), foi descoberto junto da Achada do Gamo um artefacto (fragmento de raspadeira sobre lasca retocada) que indicia presença humana neste local durante este período.

Existem também perto da Mina de S. Domingos

vestígios arqueológicos do período da Idade do Bron-ze (sitio dos gaimanitos), por volta do ano 1000 a.C. a região estaria sobre o domínio dos Tartéssios que exploravam minas de cobre e prata com o objetivo de os comercializar com os povos do mediterrânio (Fení-cios), sabendo-se da existência de um porto Fenício em Mértola e outro junto da confluência do Chança com o Guadiana, embora não existam provas arqueológicas conclusivas, supõe-se que o minério de S. Domingos seria explorado por esse antigo povo da península e “vendido” aos Fenícios que o comercializavam na bacia do Mediterrâneo.

GÊNESE DA SERRA DOURADA

os mais de 3 séculos de exploração foram extraídos cobre, prata e provavelmente ouro.

Com Fim do Império Romano do Ocidente, acaba a exploração deste povo no ano de 476, é destituído o último imperador, Rómulo Augusto e é proclamado Rei da Itália Odoacro, Rei dos Hérulos.

A região passa a ser dominada pelos povos Ger-mânicos, principalmente Visigodos, não existem

2ª Parte

A Exploração do filão existente na Serra de S. Domingos pelos Romanos, datam aproximadamente Sec. I a Sec. IV, dessa época os vestígios arqueológi-cos encontrados foram (moedas e artefactos), durante

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indícios de exploração mineira neste período entre os Séculos V a VII.

A partir do ano 711 a região é invadida pelos povos do Norte de África, liderados por Tarik, que exploram igualmente as riquezas minerais de S. Domingos, pois existem alguns vestígios arqueológicos (moedas) que

o comprovam, essa exploração no entanto deverá ter sido muito inferior à efetuada pelos Romanos.

3ª parte

«Nada fazia prever que, a 16 de Junho de 1854, Nicolau Biava, mineiro a soldo dos proprietários da mina de Tharsis (Espanha) encontra uma antiga mina romana na serra de S. Domingos no concelho de Mértola e regista-a em seu nome, viria a ser co-locada no mapa histórico do património mineiro. Os seus descobridores eram estrangeiros e andavam pelo território alentejano na pesquisa de manifestações ge-ológicas visíveis da pirite, tendo como raiz o interesse internacional da exploração de um jazigo que pudesse ser rentável, no sector português da Faixa Piritosa Ibérica, tal como já acontecera no sector espanhol da mesma Faixa. O achado mineiro foi intencional, associado ao movimento de exploração das minas de Huelva e de Sevilha, em curso entre 1830 e 1850. A pirite valorizara-se a nível internacional, em função do interesse industrial da extração do enxofre e ao aproveitamento da percentagem do cobre contido naquele minério complexo, atendendo às inovações tecnológicas no sector metalúrgico.

Tudo isso explica a corrida britânica às fontes de matérias-primas, revelando um conhecimento especí-fico da pirite portuguesa, muito mais profundo do que aquele que as elites e as autoridades administrativas portuguesas dispunham nessa altura. Explica ainda, o surto de capital inglês em Portugal, a instalação de

novos interesses mineiros, industriais e comerciais no território aliado e a frágil defesa das vantagens que Portugal poderia retirar da autorização da sua lavra, em contexto de exploração intensiva de um produto mineiro. De certo modo, a Mina de S. Domingos é o espelho da própria conjuntura história do período de 1848 a 1875, um dos muitos exemplos da expansão da economia capitalista por todo o mundo, vertida numa versão local, perfeitamente definida e delimitada, quanto ao território de incidência.

O aspecto da “criação” da Mina de S. Domingos, na-quilo que tem de positivo e negativo e no significado que representa referente ao legado e à herança do sítio mineiro e industrial, traduz-se, hoje, acabado o ciclo paleotécnico e a exploração industrial, na busca de resoluções para os problemas ambientais emergentes do fim abrupto da mineração e impondo a recuperação ambiental mitigada e associada à valorização/valo-ração do património mineiro, que os nossos tempo configuraram na estrutura dos bens a salvaguardar, a conservar e a transmitir às novas gerações. Por este lado, o processo ambiental da Mina - a partir da classi-ficação do Conjunto mineiro, materializada em Junho de 2013 - terá de ocorrer em paralelo com valorização cultural, integrando-se uma na outra como peças do mesmo puzzle”.

Edição de: António Pacheco com excertos de Isabel Men-donça, Jorge Custódio e elementos base do CEMSD – Centro de Estudos da Mina de São Domingos.

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Meus Amigos e Conterrâneos, como tenho dito sou mineiro de gema, genuíno, e do coração e vivo nesta zona na Rua do Sul,

embora tenha nascido em casa, e não no Hospital, na Rua de Aldeia Nova, nº 38, na Mina de S. Domingos, há 60 anos, e de onde parti aos 13 anos de idade para a selva nos arrabaldes de Lisboa.

Fiz a minha escola primária na Mina de S. Do-mingos, em frente ao quartel da Guarda Nacional Republicana, com quatro salas, distribuídas em dois pisos, - mais tarde viria a ser construída outra tirando--lhe a vista mas por pouco tempo, - e que tinha como Directora a Professora Maria Teresa Paleta, e há muito deixou de ser escola, ou melhor passou a ser um local onde hoje se bebe uns copos e que me deixa um bo-cadinho triste, não pelos copitos, mas pelas memórias que estão escritas nas suas paredes, e que só os que a frequentaram conseguem decifrar.

Os combates fora da Mina de S. Domingos foram muito duros mas tive sempre no coração a minha terra natal, as suas gentes, as suas coisas boas e más e é com sentido orgulho que as conto ao meu filho e netos para que estes conheçam e transmitam a história dos seus avoengos.

Narro-lhes, por exemplo, os episódios de quando o cabo de aço que puxava os vagões se partia e os ope-rários entre os quais o meu avô Francisco Teixeira, e o meu pai, e muitos outros, trabalhavam dias, e noites, seguidos para procederem à sua reparação, sem a qual a mina estava parada.

Também lhes falo quando com o meu irmão Zé levava o almoço ao meu pai junto à boca da mina próximo das oficinas, onde este trabalhava, e mais tarde na fábrica de serração de mármore junto aos “tipes” no lado norte da aldeia/vila.

Relato-lhes os trabalhos de sondagens que o meu pai e outros camaradas de trabalho fizeram em Loulé, - onde vivemos cerca de um ano, - e ainda os acidentes na mina, e a importância chave do hospital. Conto-lhes um infeliz e gravíssimo acidente de tra-balho dum camarada do meu pai que estava a operar a sonda ao seu lado quando foi atingido na cabeça por um tubo e teve morte imediata, - o meu pai não foi alcançado porque estava agachado, - e o choque e choro copioso que isso lhe causou, teria eu cerca de oito anos, ou menos.

Exulto os concertos da banda de música no lindo

jardim local, e o trajecto que fazia pela estrada prin-cipal, onde o meu tio José Sequeira Costa foi músico, enquanto não partiu para a selva, e que hoje também vive na Mina.

Realço a importância dos 4 clubes recreativos locais, cada um com as suas particularidades, - o Cento Republicano onde ia com o meu irmão Zé e o meu avô Francisco Teixeira esfolhear o “O Século”, e o “Musical” pela mão do meu pai apanhar as letras do “Diário de Notícias”, e ver as sessões de televisão das tardes e os vibrantes episódios do “Mascarilha” com o seu cavalo branco de mãos dianteiras levantas gritando “Helo, Silver”, e o índio “Tonto” com a sua trança comprida, nas noites de Domingo.

Elogio a grandiosidade das sessões de cinema, no Cine-Teatro, hoje museu, às quartas e aos fins de semana.

Comento uma parada militar a que assisti, menino, pela morte de soldados mortos no Ultramar, a qualidade e as exigências do ensino primário, a cooperativa, a vigilância policial a que o povo estava sujeito, a bi-blioteca ambulante da Fundação Gulbenkian, a quem muito devo, os festejos da terra, em especial o dia de S. João, a oficina do ferrador Antoninho, próximo do mercado novo.

A oficina do Tio Antoninho é mais uma saga das gentes da Mina S. Domingos.

O tio Antoninho era uma excelente pessoa e amigo e grande professor que transmitia os ensinamentos da vida aos seus alunos. Todos adorávamos ouvir as suas histórias. Promovia o respeito dos mais velhos pelos mais novos e o contrário.

Nas manhãs invernosas o calor da forja do tio Antoninho era um sítio muito procurado.

O fogo aceso com carvão transformava o ferro em mel e aquecia as mãos dos frequentadores daquele "clube". A forja tinha um fole que estava colocado do lado esquerdo da entrada da oficina. A bigorna era o arranjo do centro. Havia dois malhos, um pequeno para os aprendizes e outro grande para os “especialistas” . No primeiro teste tinha-se de "bater" 25 ferraduras, e começava-se com o malho pequeno.

O risco que o mestre ferreiro Antoninho corria era enorme. Podia ser atingido no braço ou na cabeça. As ferraduras eram batidas pelo ajudante e pelo mestre alternadamente a um ritmo elevado. O ajudante batia apenas dum lado do varão ou da barra de ferro em brasa, e era aparelhado pelo mestre.

Também era interessante ver o tio Antoninho calçar os equídeos.

Merece ainda destaque o barbeiro Chico Pires, as bicicletas, muitas vezes sem travões, alugadas pelo Sr. Guerreiro, as feiras francas, o “Pago”, no dia 4 de cada mês, o mistério(?) do cemitério inglês, a cerimónia e o ritual dos funerais, onde perdi o meu querido Amigo Jacinto com seis anos, e que tive muita dificuldade em perceber a sua partida, e cuja campa visitei anos a fio, e naturalmente a beleza natural da Mina que eles já conhecem e adoram.

Também lhes conto o grande pesadelo dos anos sessenta na Mina, o desemprego e a emigração.

Descrevo-lhes que o desemprego nesses fatídicos anos, como agora, colocou mais de um milhar de pessoas fora da Mina mas sem um tusto, sem qual-quer indemnização pela perda do posto de trabalho depois de terem trabalhado uma vida em condições miseráveis, sem subsídio de desemprego, ou outro, e com poucas possibilidades de encontrarem outro emprego, e sem um tecto amigo que os abrigasse nas terras que os acolhessem.

Faço-lhes saber nessa altura que todos os dias de manhãzinha, antes de ir para a escola primária, na paragem da camioneta da Rodoviária que partia às 9 horas, para Lisboa, no sentido de Serpa, em frente à mercearia do Chico Paulino, levava nos ouvidos os prantos dos mineiros e dos seus familiares que deles se iam despedir, como se fosse a última vez, e que iam “embarcar” para as terras longínquas dos arrabaldes de Lisboa, aquém e além Tejo, e das Franças, Holandas e Bélgicas.

Conto-lhe ainda que os jovens desse tempo “sal-tavam” da Mina à procura de emprego na grande Capital, e fora dela, trabalhando horas a fio, sem caixa de previdência, sem férias, sem nenhuns direitos, sem salário mínimo, sujeitos a todo o tipo de abusos por parte de patrões sem escrúpulos e ganhando pouco mais do que uns trocos que mal dava para a sua dormida e uma gamela de sopa.

Traço-lhes o cenário dos operários quando eram expelidos pela boca traiçoeira da mina, à hora do al-moço ou no fim da jorna, fumegantes, esfarrapados, cobertos de lama acinzentada, como se fossem zombies dum filme de terror amparados por um naco de pão e umas azeitonas e uma rodelinha de linguiça, se a riqueza fosse tanta.

A escola primária da Mina de S. Domingos vive comigo todas os dias.

Enfim, memórias dum alentejano nado na Mina, onde, com espírito, aprendi a nadar nas suas maravi-lhosas lagoas baptizadas de tapadas.

estórias com história

Gil Teixeira

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Além da recu-peração am-biental , os

investimentos da EDM na área abrangida pela exploração da antiga mina de S. Domingos, desacti-vada há 48 anos, prevêem

Recuperação vai custar 20 milhões de euros

Antiga Mina de São Domingos

LUSA 17/03/2014

também a "recuperação de algum património e manutenção de outro para que não se deteriore mais", explicou.

Por outro lado, indicou o autarca, os investimen-tos "vão tornar possível a estratégia de aprovei-tamento turístico" que a Câmara de Mértola, a Merturis - Empresa Municipal de Turismo e

a Fundação Serrão Mar-tins têm para a área de exploração mineira e para a localidade de Mina de S. Domingos.

Neste sentido, técni-cos da EDM, da autarquia, da Merturis e da fundação vão criar "um projecto que possa englobar, de forma integrada, as três verten-tes", ou seja, resolução de problemas ambientais, re-cuperação e manutenção de património e aproveita-mento turístico do parque da mina de S. Domingos.

O projecto, que "pode-rá rondar 20 milhões de euros", irá ser executado de forma faseada durante o período de vigência do Quadro Comunitário de

Apoio 2014-2020, disse Jorge Rosa. O objectivo é "aproveitar melhor a grande mais-valia" da localidade de Mina de S. Domingos, no concelho alentejano de Mértola, distrito de Beja, "não só pelo seu passado histórico de exploração mineira, mas também por tudo o que se conseguiu criar na zona nos últimos dez anos e que tem vindo a contribuir para que muita gente a visite e frequente", frisou.

Segundo o autarca, os investimentos "vão fazer com que a estratégia de aproveitamento turístico da zona se torne mais eficaz e possa multiplicar

o número de visitantes e simpatizantes que a loca-lidade de Mina de S. Do-mingos tem actualmente".

O projecto será fi-nanciado na sua maioria por fundos comunitários, sendo a comparticipação nacional assegurada pela EDM, empresa pública responsável por elaborar e conduzir projectos de recuperação ambiental de zonas degradadas por antigas explorações mi-neiras abandonadas, disse o autarca. A Câmara de Mértola irá participar no financiamento de inter-venções de recuperação de património e de apro-veitamento turístico da área.

A mina de S. Domin-gos, outrora a maior da Europa, era conhecida desde o período roma-no, mas só começou a ser explorada em termos industriais, pela empresa Mason & Barry, em 1854, quando foi redescoberta por Nicolau Biava, a soldo da La Sabina.

Segundo documentos históricos, foram retiradas 20 milhões de toneladas de cobre durante o perí-odo de apogeu da mina, que chegou a ser o maior empreendimento do sec-tor mineiro em Portugal e na Europa até que foi desactivada em 1966, por alegada falta de viabilida-de económica.

Segundo documentos históri-cos, foram retiradas 20 milhões de toneladas de cobre durante o período de apogeu da mina,...

“ “

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Esteve patente no passado dia 29 de Março do corrente ano, no Museu de Cerâmica de Sacavém, a apresentação do livro “Mina

de S. Domingos. Território, História e Património Mineiro”, um trabalho inédito da autoria do inves-tigador Jorge Custódio, investigador do Instituto de História Contemporânea.

Esta foi uma obra editada e lançada o ano passado 2013, na Biblioteca Nacional, pelo Centro de Investi-gação em Sociologia Económica e das Organizações e pelo Instituto Superior de Economia e Gestão.

O livro “Mina de S. Domingos. Território, História e Património Mineiro” é uma reflexão do território, da história e do património deste complexo mineiro, localizado na margem esquerda do Guadiana, no concelho de Mértola freguesia de Corte do Pinto, recentemente classificado como conjunto de inte-resse público.

A apresentação deste livro esteve a cargo do Autor Jorge Custódio e do Arqueólogo Cláudio Torres, fundador e diretor do Campo Arqueológico de Mértola, numa sessão aberta ao público onde a sala ficou repleta na sua lotação pelo interesse do curiosos, estudiosos, nativos e amantes desta terra.

As intervenções de abertura, contaram também com os testemunhos dos oradores: Conceição Serô-dio ( Museu de Cerâmica de Sacavém), Drª Idalina Sardinha (Investigadora no Centro de Investigação

em Sociologia Económica e das Organizações (SO-CIUS) e Professora do IDEFE) e Paulo Piteira ( Vice-presidente da C.M. Loures).

Entre as várias introduções foram referidos o Pro-toloco de Geminação entre a Autarquia de Sacavém e Corte do Pinto de como foram criadas as condições institucionais para a continuidade do intercâmbio

existente entre Sacavém e as Autarquias do Couto Mineiro de Corte do Pinto e Santana de Cambas.

No decorrer do encerramento da Mina no final da década de 60, e após 110 anos de funcionamento, a Mina de São Domingos e o concelho de Mértola ficaram indissociavelmente ligados à cidade de Sacavém. Pouco tempo depois deste acontecimento

“Mina de S. Domingos. Território, História e Património Mineiro”

Cláudio Torres, Arqueólogo, fundador e director do Campo Arqueológico de Mértola e Jorge Custódio Professor Doutor, Investigador do Instituto de História Contemporânea

Uma das Minas mais

importantes do Mundo e se não

da Europa, onde foram aplicadas

tecnologias de ponta no seculo

XIX, um dos polos de

desenvolvido do arranque

da Revolução Industrial.

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dramático para milhares de pessoas, começaram a chegar à zona da grande Lisboa e em particular de Sacavém muitas famílias dos desenraizados de São Domingos, atraídos pelo facto de também aqui existir uma empresa – a Fábrica de Loiça de Sacavém – de características semelhantes à Manson and Barry”, gerida por uma familia inglesa. Vindos de uma terra onde o associativismo estava fortemente implantado com hábitos e tradições muito próprios, um local e encontro para dar continuidade a essas necessidades e tradições. Depois de em setembro de 1973, um grupo de conterrâneos, vencendo algumas dificuldades criadas pela PIDE, regime salazarista, fundarem a Liga de Amigos da Mina de São Domingos.

No decorrer da apresentação, foram salientes as palavras pelo Arqueólogo Cláudio Torres, esclarecimentos da importância desta Mina que remontam ás suas origens e subsequente criação da região de Mértola, palavras que antecederam no tempo por séculos, antes de Cristo, e que percorreram no decorrer desse tempo até à redescoberta em 1854 por Nicolau Biava. Dos povos que aqui vieram Garimpar as Pepitas Douradas, colonizar esta região por séculos, navegando o Mediterrâneo e o Guadiana até ao local onde lhe chamaram de Myrtilis, em busca da riqueza para glorificar e alimentar os feitos dos seus Impérios e povos de outros tempos.

Não menos esteve o discurso do Prof. Jorge Custódio, real-çado com enfâse abrilhantado pelas suas empolgantes palavras, sobre o seu belíssimo trabalho, a importância da Mina e São Domingos desde a exploração do tempo Romano, uma das Minas mais importantes do Mundo e se não da Europa, onde foram aplicadas tecnologias de ponta no seculo XIX, um dos polos de desenvolvido do arranque da Revolução Industrial. Ficaram mensagens de esperança pelo que já foi feito até aqui, a recen-temente classificado como conjunto de interesse público, e o que se avista e prespectiva para o futuro, a grande importância do património de Mina, se bem que em ruinas, que poderão ser recuperadas e ou mantidas, entre outras.

Grupo Coral da Liga dos Amigos da Mina de São Domingos

No intercalar de alguns intervenientes, o evento contou com a atuação do Grupo Coral da Liga de Amigos da Mina de São Domingos, sediado na cidade de Sacavém que acabou por realizar o desfecho do mesmo.

Edição de: António Pacheco e excertos da Liga de Amigos da Mina de São Domingos.

Assistência atenta encheu o espaço da apresentação

O mistério da Pintura da igreja da nossa terra mais parece o caso do misterioso Voo MH370.

Mas segundo a agência noticiosa de Paymogo, um conjunto de satélites chineses, encontraram os destroços das latas de tinta e andaimes numa zona remota da Ribeira do Chança, tendo a autarquia de Mértola deslocado para o local uma festa e petiscada, para toda a malta se esquecer do assunto….

Not c as

i iFez anos no principio de Março que foi inventado

o telefone.Foi agora tornado publico que quando Alexander

Graham Bell inventou o telefone já tinha 3 chamadas não atendidas do "amigo-da-MSD-mais-amigo não há" a dar-lhe conta das estradas que iam alcatroar e do poeiredo que iamos deixar de ter no Verão..... enfim ..as habituais promessas não cumpridas.. tal como a pintura da igreja.

Alexander Graham Bell

A invenção do telefone e a secreta ligação á CMM

Igreja

Obras de remodelaçãodesaparecem dos radares

Migas de Porco à Alentejana

Nota: As quantidades da receita depende para o numero de pessoas que quizer servir.

Ingredientes:

Entremeada ou entrecosto magrosAzeiteMassa de pimentãoColorauAlhosPimentaLouroVinho brancoVinagre de vinhoPão alentejano duroCoentros

Preparação:

1. Parta a carne em pedaços, e tempere-a com todos os temperos, e um pouco de vinagre.

Não ponha sal porque a massa de pimentão é muito salgada.

2. Deixe ficar a marinar de um dia para o outro, no frio.

3. Frite a carne temperada, em azeite, regando de vez em quanto com vinho branco, para que não queime. Reserve.

4. Quando a carne estiver bem frita, escorra o molho e utilize-o para fazer uma açorda (migas), firme com o pão alentejano demolhado.

5. Unte uma pedra com azeite, vaze a açorda (migas) e dê-lhe a forma de um chouriço grosso, rodando-o sobre a pedra untada para ficar bem liso.

6. Disponha na travessa de servir, com os pedaços de carne em volta e salpique com coentros grosseira-mente picados.

Nota: O prato tradicional é, feito com banha em vez de azeite e a carne é propositadamente muito gorda, in-cluindo mesmo os apreciados nacos de toucinho frito.

Bom Apetite.

Quem quiser pode participar envian-do as suas receitas para [email protected]

Agradecemos a colaboração de to-dos, pois só assim será possível enrique-cer os nossos conhecimentos culinários em relação a esta região.

bom garfo

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Qual a primeira imagem que tem, quando houve o nome Mina de São Domingos?

A Mina de S. Domingos antes da sua identificação como mina de pirite em 1854, existia na memória colectiva das comunidades locais, como um lugar de mineração antiga, pela presença dos seus extensos escoriais, onde a vegetação não crescia. O lugar estava identificado pela Ermida de S. Domingos, cujas pare-des ainda hoje existem, no espaço da 1.ª urbanização, próximo dos antigos Hospital e da Farmácia da Mina, do tempo dos ingleses. Como se sabe, o jazigo de pirite (conhecido e descrito em Portugal e em Espanha no início da 2.ª metade do século XIX) foi registado na Câmara Municipal de Mértola pelo piemontês Nicolau Biava, que fizera a sua identificação. Foi de imediato estudado a nível oficial e demarcado (1857). O Estado português autorizou a concessão provisória a Nicolau Biava, mineiro de Ernesto Deligny, o qual transferiu a concessão para o director da Mina de Tharsis e este para a sociedade de capitalistas, La Sabina.

O registo cartográfico mais antigo que se conhece - da fase contemporânea - deve-se ao geólogo Carlos Ribeiro, que foi o engenheiro encarregado pelo Estado português para proceder à sua demarcação. Um ano depois, James Mason - já ao serviço de La Sabina - fez ou mandou bater uma chapa fotográfica, cujo paradeiro se desconhece. Esta imagem seria realmente muito interessante pois mostraria a mina antes do início da exploração e extracção do minério, com aquela Ermida e os terrenos ermos e agricultados em redor. Os resultados da mineração de La Sabina e depois, a partir de Janeiro de 1859, da Mason & Barry, a empresa arrendatária da concessão, justificam a necessidade e se proceder ao registo fotográfico desse momento antes da construção infra-estruturas e do aglomerado urbano dos mineiros (obras exteriores), para fazer notar os progressos posteriormente alcançados e indexados aos respectivos anos das chapas fotográficas. Dispomos de imagens da mina com regularidade desde a edição do primitivo Álbum de 1863, totalmente publicado no meu livro. Infelizmente não dispomos tantas fotogra-fias da exploração do subsolo, por razões técnicas na primeira fase (ausência de luz no interior das galerias que permitisse imagem na câmara escura). Também não se conhecem ainda imagens que tivessem descido ao subsolo, na segunda fase - entre o piso -190 e -420, não sei bem porquê, pois a partir dos meados do século XX, com a introdução do flash, tal já seria possível.

Do meu ponto de vista, a Mina não pode ser ob-servada apenas do exterior. O interior tem muito a contar. Existem para o interior apenas os desenhos técnicos, poucos, mas existem. Seria interessante proceder-se à pesquisa de imagens do interior da mina, para saber mais qualquer coisa das técnicas de mineração, dado que o subsolo - em virtude das tecnologias de mineração - revela aspectos singulares que a documentação estudada já indicia. Seriam, pois,

importantes documentos para a história da mineração. Da minha parte, solicitei em 1983-1984, que fossem feitas imagens interiores das galerias de acesso e do poço n.º 7, de ventilação (de cima para baixo), trabalho que foi executado pelo fotógrafo do Instituto José de Figueiredo, José Palma, ao serviço da Exposição da Central Tejo, da qual eu era comissário.

Quanto ao exterior, a reunião e selecção de imagens que foram feitas desde os 150 anos mostra muitos as-pectos e rostos da população, suas famílias e amigos. Mas há ainda que fazer mais trabalho para contribuir para uma arqueologia social da Mina.

A Mina dentro da Arqueologia Industrial ainda tem muito para nos dar?

Da minha parte, a Mina de S. Domingos foi inte-grada no Projecto de Investigação da Era da Energia a Vapor em Portugal (1820-1974), um trabalho que estou a desenvolver enquanto investigador integrado do IHC, tendo como objecto de estudo a Casa das Máquinas da Mina (bombagem e extracção de miné-rio), projecto em curso, estando a preparar-se a parte científica e os elementos destinados à intervenção de arqueologia industrial. Este projecto pode ser essen-cial para a definição de metodologias de trabalho que deverão ser aplicadas em casos semelhantes, pois não há intervenções deste tipo em Portugal, com um ou outra excepção mais particular.

Há que considerar não apenas os trabalhos arqueo-lógico (mineiros e do foro da arqueologia industrial), mas ainda a identificação do património industrial, paisagístico, arquivístico e museológico, para além do

intangível ou imaterial. O desenvolvimento dos estudos garantirá mais-valias patrimoniais no futuro. Temos de receber esta herança cultural que é a Mina de S. Domingos representa, para sabermos a melhor forma de gestão do legado e procurarmos como comunidade (não apenas Estado) saber transmitir esse legado ao futuro, travando o vandalismo e o abandono de várias décadas e procurando desenvolver projectos âncora. Penso que um dos mais fáceis e baratos projectos ân-cora da Mina, simultaneamente o mais emblemático, deveria ser a valorização e conservação do Cemitério dos Ingleses, por aquilo que ele é na memória da mina, como também como espaço que protegido do sítio dos Lavajos, onde ainda existem vestígios da mina antiga, pré-romana e romana (documentos arqueológicos da sua antiguidade).

Mina de São Domingos Conjunto de Interesse Público, que benefícios podem daí advir?

A classificação da Mina de S. Domingos como Conjunto de Interesse Público constitui um impor-tante acontecimento na história recente da Mina e da população do Concelho de Mértola. A classificação foi publicada no Diário da República, Portaria n.º 414/2013, de 25 de Junho. A classificação define responsabilidades públicas de enorme significado a nível das políticas culturais da administração pública e autárquica, das instituições públicas e associativas e ainda das empresas privadas e dos cidadãos. Dado que foram reconhecidos os valores patrimoniais da Mina de S. Domingos, a classificação passa a ser o motor da salvaguarda, da reabilitação ambiental, da inves-

à conversa com...

Professor Doutor, Jorge Custódio

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tigação, da conservação e restauro, da recuperação, da reabilitação urbana e da valorização e da fruição social e turística, de acordo com as leis portuguesas e as cartas e recomendações internacionais, nomeadamente aquelas que foram passadas à legislação portuguesa, como são hoje a Convenção do Património Mundial (1972), a Convenção para o Património Arquitectónico da Europa (1985), a Convenção para a protecção do Património Arqueológico (1992), Convenção Euro-peia da Paisagem (2000) e outras ainda ratificadas pelo Estado português. Importa considerar ainda por razão de se tratar numa percentagem muito elevado de património industrial, que se impõem ainda como do-cumentos orientadores do trabalho a desenvolver, pela sua própria natureza, a Carta do Património Industrial (TICCIH, 2003) e os Princípios de Dublin (ICOMOS, 2011), sem esquecer a Carta de Veneza (1964).

No meu entendimento a melhor solução seria a criação de um parque arqueológico industrial, que deveria organizar-se com as principais entidades detentoras de propriedade da Mina, a quem se encar-regariam a administração e gestão, a saber: La Sabina, a Fundação Serrão Martins, a Câmara Municipal de Mértola, envolvendo também entidades públicas como a DRC do Alentejo e a EDM. Esta entidade gestora deveria, depois fazer protocolos de colaboração cien-tífica e técnica com várias Universidades (em função das suas especialidades científicas e técnicas) e com o Campo Arqueológico de Mértola. A criação deste Parque, decorreria da legislação em vigor, Decreto-lei n.º 131/2002, de 11 de Maio.

Está ao corrente de qual a aplicação dos 20 milhões de euros que foram destinados para a recuperação do complexo mineiro da Mina de São Domingos? Que pensa desta recuperação?

Só soube deste acordo entre a Câmara de Mértola e a Empresa de Desenvolvimento Mineiro pela comu-

nicação social. Não sei quaisquer pormenores. Espero que ambas as instituições saibam honrar os compro-missos que assinaram, que envolvem a resolução dos problemas ambientais e a recuperação do património mineiro. Neste último conceito não sei o que ambas as instituições entendem por património mineiro, mas isso devia se objecto de uma ampla discussão pública, ao pormenor. Julgo que há um aspecto fulcral que tem de se assumir, de acordo com a portaria de classifica-ção. A dominante arqueológica, são as ruínas e estas requerem estudos prévios e um perfeito entendimento quanto a natureza dos trabalhos a desenvolver. Neste aspecto a portaria é clara. Cabe à Sociedade Civil fiscalizar a acção das entidades.

Na notícia era referido o envolvimento da Empresa Municipal de Turismo, aspecto que é natural. Durante os últimos anos a Mina passou a ter outros horizontes culturais e turísticos, que se expressaram na criação da Praia Fluvial e no Hotel. A REHMINE apostou muito na demonstração o significado do turismo para a região, mas não equacionou a Mina de S. Domingos à luz da classificação como conjunto de interesse público. Im-porta considerar que, o valor económico da mina não pode confundir-se com a indústria turística. O valor económico está no próprio objecto patrimonial e não no turismo. Este pode explorar o objecto patrimonial para criar riqueza para os agentes sociais que vivem do turismo e são socialmente beneficiados pelo turismo em actividade. No entanto, primeiro há que fazer do objecto patrimonial o motor da mudança. Este precisa primeiro de ser tratado e depois sim, a sua gestão - ou melhor a gestão dos seus valores intrínsecos - cria mais riqueza para a região. A atracção turística fazer-se-á se as entidades protegerem o urbanismo mineiro (no qual há que ter força política para não deformar os bairros mineiros, como aconteceu até agora), fizerem a salvaguarda efectiva das ruínas e da paisagem mi-neira, conservarem os vestígios mais significativos do património industrial e da actividade mineira (corta,

núcleos da Moitinha e da Achada do Gamo, Pomarão, obras de arte dos caminhos de ferro e escoriais), para além daquilo que são os dados recentes da Mina. A estratégia turística a desenvolver não deve pôr em causa aquilo a que me referi, com o perigo de depois a memória se esvair.

Neste ponto, volto a referir o modelo de gestão que julgo mais adequado para a Mina de S. Domingos, a criação de um Parque Arqueológico Industrial. Nele tudo o que foi e é a Mina, pode lá estar.

Que futuro prevê para este complexo mineiro?

Imagine a situação em 1842 do Convento de Cristo. Tinha sido abandonado pelo Estado português depois da extinção das ordens religioso-militares (1834). Foi exposto ao saque e ao vandalismo e foi parcialmente vendido em hasta pública a um particular, neste caso a um Ministro de Estado, António Bernardo da Costa Cabral. Hoje é um dos mais importantes conjuntos monumentais portugueses, património mundial, apesar de ainda não ter sido preservado o aqueduto do referido Convento de Cristo, numa extensão aproximada de 18 km. Não esquecer que a área do Convento de Cristo é de 42 hectares.

A área classificada da Mina é maior e envolve também o Pomarão e o corredor ocupado pela linha ferroviária mineira entre S. Domingos e o Pomarão, numa extensão de 18 km. O futuro do conjunto e com-plexo mineiro, nas suas diferentes vertentes (ambiental, ecológica, urbanística, paisagística, arquitectónica, arqueológica e industrial) será sempre aquilo que a sociedade desejar que a Mina de S. Domingos possa significar no futuro. Recebemos esse legado. Foi di-fícil chegar até ao seu reconhecimento oficial, como um dos exemplos mais importantes da mineração capitalista da Europa industrializada, quiçá como um caso do modelo inglês de colonização mineira ao

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Mina de São Domingos: Tanques (Fot. Reinaldo Seno - 2014)

A história de um povo acenta nos ali-cerces do seu passado, e quanto mais assim for mais forte será a sua es-trutura cultural e social.

O tempo faz a história e nós temos a obrigação de manter esses marcos da história preservados para lembrança futura.

Muitas das vezes não

são necessários gastos avultados para tal se conseguir, basta a boa vontade de quem gere os dinheiros públicos. Quantas vezes estes pe-

quenos lugares podem ser exponenciadores de riqueza, atracção de tu-ristas, historiadores, fo-tógrafos, gente comum. É evidente que só por si,

não funcionam, preci-sam de uma máquina de divulgação que os traga à luz que exista uma emergência da sua áurea.

Pequenos pontos uni-

dos tornar-se-ão um pilar forte de uma es-trutura articulada e sustentável, capaz de projectar um lugar para além do seu tempo.

tempo áureo do império britânico. Há que arregaçar as mangas para levar a efeito o trabalho de salvaguarda que ainda há a fazer, de recuperação, de reabilitação e valorização da urbe mineira de acordo com um plano de pormenor de salvaguarda, como exige o decreto-lei n.º 309/2009, de 23 de Outubo; há ainda que proceder à conservação de importantes trechos das suas ruínas (casa das máquinas, o espaço de tratamento do minério da Moitinha, estação, oficinas e porto do Pomarão), que poderão futuramente ser visitadas. Há que olhar para os seus valores paisagísticos, quer ambientais, quer resultantes da extracção e da metalurgia mineira.

Soube que se iniciaram os trabalhos de inventário e conservação do espólio arquivístico, uma iniciativa que envolve a Fundação Serrão Martins. Isto significa uma atenção aos valores da documentação, essenciais para o melhor conhecimento da realidade mineira numa perspectiva local e académica, porventura para a fundamentação do saber e da maior valorização fu-tura. Mas não chega esta acção. Trata-se de um obra gigantesca, que impõe vários saberes e várias entidades e pessoas. Ainda não vi, por parte das entidades mais directamente interessadas no processo de valorização da Mina de S. Domingos, uma mudança de rumo, que possa materializar-se num processo sustentado, a curto, médio e longo prazo. Pode ser que agora tudo se torne possível, porque há perspectivas de financeiro. Mas o trabalho é ciclópico.

Chamo a atenção, no entanto, que o processo da conservação, recuperação e valorização deve ter uma direcção forte, criadora e fiscalizadora, mas simultaneamente ser socialmente participado, para que o financiamento não se esboroe pelos dedos e passos mal dados.

Deverá dirigir-se em primeiro lugar para aqueles que são a memória da mina, os seus actores e ps seus descendentes. Neste ponto, todos os que ainda se encontram vivos e estão com as suas capacidades activas, devem ser chamados - como defendeu Rui Guita - a entregarem o seu testemunho oral, um registo essencial na perspectiva dos Princípios de Dublin para o património industrial imaterial.

Que mensagem deixaria aos autarcas do país, em relação à Arqueologia Industrial, e em parti-cular, neste caso à Câmara Municipal de Mértola?

Temos consciência que, em Portugal, as autarquias localizadas em conselhos e sítios industriais tem feito

algum trabalho na salvaguarda, conservação e valo-rização do património industrial e algumas mesmo tem apoiado intervenções de arqueologia industrial. Isto num contexto institucional e político em que a administração central não tem olhado como deveria ser para os valores do património industrial e mineiro do nosso país.

A Câmara de Mértola manifestou vontade de também colaborar no projecto de intervenção arque-ológica da Casa das Máquinas da Mina, assim como o administrador de La Sabina, que detém a propriedade do lugar onde se encontram as ruínas. Se tal acontecer estamos certos que estão a fazer já muito pela Mina.

A partir de 2013, a Câmara Municipal passou a deter no seu território concelhio não apenas Mértola como Vila Museu, devido ao trabalho de excelência do Campo Arqueológico de Mértola, mas também a

Mina de S. Domingos, um caso de mineração histórico--arqueológica de largo espectro de antiguidade e, si-multaneamente, um caso de mineração contemporânea, de tipologia industrial, integrada nos horizontes do património mineiro da Faixa Piritosa Ibérica.

Isto não significa que possa fazer de S. Domingos um caso semelhante às Minas de Rio Tinto, mas pode muito bem valorizar-se de acordo com a sua escala e até olhar o modelo de forma diferente. Todavia, em qualquer dos casos, há que criar a médio prazo um importante museu mineiro em S. Domingos, que posso ser um dos grandes ícones da salvaguarda e conser-vação da história da mineração da pirite alentejana.

Jorge Custódio

Lisboa, 25 de Abril de 2014

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Valentim Adol-fo João (30 de Março de 1902-

29 de Janeiro de 1970) foi um destacado dirigente do Sindicato dos Minei-ros (primeiro da Mina de São Domingos, depois de Aljustrel). Anarcosindica-lista, participou em 1932 na última grande greve dos mineiros da Mina de São Domingos, , tendo sido o último destes a ser liberta-do das prisões políticas da ditadura, nos anos 60, neste caso, do forte de Peniche. Preso em 1924 por lançamento de bomba. Delegado ao Congresso Operário de 1925. Membro do Grupo de Propaganda e Estudos Sociais da Mina de S. Domingos (1923/33). Participa na Conferência Anarquista do Sul de 1925.

Relativamente a Valentim Adolfo João há uma refe-rência em José Correia Pires, no livro ““Memórias de um prisioneiro do Tarrafal” (1975), em que este anarquista conta a sua fuga do Algarve, nas vésperas do 18 de Janeiro de 1934, a caminho de Espanha. De Beja passa à Mina de São Domingos e à fronteira. “Na fronteira descalcei-me, arregacei as calças e com a companhia de um camarada de nome António Patrício, irmão do velho militante anarquista Valentino Adolfo João, excelente camarada e envolvido mais tarde no atentado a Salazar, esteve preso mais de uma dezena de anos e faleceu há cerca de três. Valentim Adolfo João estava fixado a umas dezenas de quilómetros da fronteira e fui dirigido a ele.

Namorava uma moça com a sua idade, de-zanove anos, e um dia ela queixou-se da pouca atenção que lhe dedicava: – «Passa-se uma noite, passa-se outra, e tu sem apareceres…» Ao que Valentim Adolfo João respondeu:

Não tenho vagar amorpara te dar atençãotenho muito que fazerna minha Associação

É meu desejo transformaresta pobre sociedadeque semeia a iniquidadepara nos escravizartemos muito que lutarcom força audácia e valorpara extinguirmos a dora miséria e o sofrimentoe por isso neste momentonão tenho vagar amor

Se a vida fosse a sorrirse de encantos fosse o vivere se num breve alvorecera luta nos redimirentão poder-te-ei garantirimorredoira afeiçãomas enquanto a escravidãoproduzir mal e desgostonão posso fugir do postopara te dar atenção

Olha para todo o mundoverás tanta dor tanta desgraçaeu amo a beleza, amo a graçaamo o bem-estar profundoo capital iracundoprocura nos pervertermas nós havemos de vencerapeando os comodistase amando os idealistastenho muito que fazer

Sociedade corrompidateus erros são vis e sicáriosaleivosos, argentáriosque nos negam o direito à vidae eis porque minha queridadistraio a atençãoe para acabar a escravidãoeu prego por toda a parteconstruindo um baluartea minha associação”

(Texto retirado da obra “Fado Operário no Alentejo, séculos XIX – XX” de Paulo Lima, 2004, ed. Tradisom, Vila Verde, pp. 90 e 91. 2)

VALENTIM ADOLFO JOÃO“NÃO TENHO VAGAR AMOR”

Ali o encontrei feito agricultor, vivia com a mulher e filhos numa barraca de vime. Já nos conhecíamos por correspondência, mas quando o vi, cabeleira ao alto e desenvolta, lembrei-me da «Cabana do Pai Tomás», e Valentim dava na verdade uma excelente figura de romance. Fazia a sua sementeira e era um autêntico camponês. Fiquei ali um dia e uma noite e recordo-me que ele gozava ali de bom ambiente, nessa noite fomos visitados por uma patrulha da guarda fiscal ou os cha-mados «carabineiros», que decerto modo me vieram a ser úteis para a minha introdução em Espanha.

Também o escritor Modesto Navarro que encontrou o irmão, Patrício, em Aljustrel, já na década de 70, es-creve sobre Valentim Adolfo João no seu livro “Poetas Populares Alentejanos”. Apesar de várias inexactidões (o atentado a Salazar foi em 1937 e não em 1933 como refere Modesto Navarro. Valentim Adolfo João morreu em Janeiro de 1970 e não em 1971), eis o texto de Mo-desto Navarro com umas “quadras” atribuidas a Valentim Adolfo João.

“Quando do atentado contra Salazar, em 1933, Valen-tim Adolfo João, na altura presidente do Sindicato dos Mineiros de Aljustrel, foi acusado pela PVDE (aquela que viria a ser a PIDE) de ter fornecido o dinamite. Sabe-se hoje que os fascistas aproveitaram esse acontecimento para perseguirem e prenderem muitos democratas. A partir daí, Valentim Adolfo João andou com um nome suposto (José Dias) até 1946, data em que foi reconhecido em Setúbal. Condenado a 28 anos de prisão, foi libertado quase no fim da década de 1960/1970, já completamente destruído. Veio a morrer por volta de 1971. É seu irmão, o sr. Patrício, que nos diz estas décimas em Aljustrel, explicando que, na altura em que Valentim Adolfo João as fez, organizava o sindicato com outros mineiros.

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