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46 www.backstage.com.br INSTRUMENTOS Luciano Freitas é profissional de áudio, fez curso de piano erudito, Full Mastering no Füller Studios (Miami). É técnico em áudio na Pro Studio Americana e foi professor de teclado no Conservatório Musical Joelson Vieira. “Nóis agnetophon era a marca do gra- vador de fitas desenvolvido pelos alemães da AEG em 1930, ba- seado na invenção da fita magnética de Fritz Pfleumer. Seu primeiro mo- delo (K1) foi utilizado em 1936 na gravação de uma apresentação da London Philharmonic Orchestra com Thomas Beecham, porém deixou todos desiludidos com o resultado distorcido e ruidoso obtido. Durante a segunda guerra mundial, a Ampex Electric and Manufacturing Company (empresa criada em 1944 M Amor ou ódio, dois substantivos que certamente acompanharão quem já freqüentou a comunidade do “Santo Óxido”. Provavelmente as futuras gerações dos profissionais do áudio talvez nem venham a conhecê-la pessoalmente, mas seu valor histórico sempre será lembrado por Alexander M. Poniatoff) era uma pequena empresa produtora de gera- dores e motores elétricos. Próximo ao fim da guerra, enquanto servia ao exército americano, o engenheiro Jack T. Mullin foi designado a investi- gar os experimentos eletrônicos ale- mães, principalmente os utilizados no campo das telecomunicações. Mullin adquiriu e trouxe para Améri- ca dois gravadores Magnetophon e um conjunto de cinqüenta fitas mag- néticas com a intenção de criar ver- sões aprimoradas do equipamento na fita...” na fita...”

“Nóis na fita” - backstage.com.br · Paul (tido por alguns como o inven-tor da guitarra elétrica com corpo só- ... mite ao usuário calibrar o sinal antes de seu processamento,

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INSTRUMENTOS

Luciano Freitas é profissional de áudio, fez

curso de piano erudito, Full Mastering no Füller

Studios (Miami). É técnico em áudio na Pro

Studio Americana e foi professor de teclado no

Conservatório Musical Joelson Vieira.

“Nóisagnetophon era a marca do gra-vador de fitas desenvolvido

pelos alemães da AEG em 1930, ba-seado na invenção da fita magnéticade Fritz Pfleumer. Seu primeiro mo-delo (K1) foi utilizado em 1936 nagravação de uma apresentação daLondon Philharmonic Orchestracom Thomas Beecham, porém deixoutodos desiludidos com o resultadodistorcido e ruidoso obtido.Durante a segunda guerra mundial, aAmpex Electric and ManufacturingCompany (empresa criada em 1944

MAmor ou ódio, doissubstantivos quecertamenteacompanharão quemjá freqüentou acomunidade do“Santo Óxido”.Provavelmente asfuturas gerações dosprofissionais do áudiotalvez nem venham aconhecê-lapessoalmente, masseu valor históricosempre será lembrado

por Alexander M. Poniatoff) era umapequena empresa produtora de gera-dores e motores elétricos. Próximo aofim da guerra, enquanto servia aoexército americano, o engenheiroJack T. Mullin foi designado a investi-gar os experimentos eletrônicos ale-mães, principalmente os utilizadosno campo das telecomunicações.Mullin adquiriu e trouxe para Améri-ca dois gravadores Magnetophon eum conjunto de cinqüenta fitas mag-néticas com a intenção de criar ver-sões aprimoradas do equipamento

na fita...”na fita...”

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(graças à guerra, muitas patentes deequipamentos estavam sendo ignora-das). Bing Crosby, cantor e apresen-tador da NBC, descontente com astransmissões de seus programas reali-zados ao vivo, insistia na idéia de gra-var sua programação em discos deacetato, mesmo com péssima quali-dade sonora e incapacidade de edição(tal idéia nunca foi aceita pela NBC,levando Crosby a se afastar por maisde um ano da emissora). Em 1947,Mullin demonstrou uma de suas pri-meiras modificações a Crosby queimediatamente previu o grande po-tencial da nova tecnologia, tornan-do-se um dos grandes investidores daAmpex na intenção de comercializaresses equipamentos. Em 1948, a em-presa lançou seu primeiro gravador, o

Ampex 200, o qual logo se tornaria ummarco na revolução do rádio (sendoempregado na gravação do programade Bing Crosby). Um dos grandesmúsicos da época, o guitarrista LesPaul (tido por alguns como o inven-tor da guitarra elétrica com corpo só-lido, em contrapartida às teorias deLeo Fender e Adolph Rickenbaker),foi um dos primeiros a adquirir e mo-dificar seu Ampex 200 adicionandooutros cabeçotes reprodutores, con-cebendo a idéia do primeiro sistemade gravação multipistas da história.No início dos anos 50, a Ampex ini-cia a comercialização de máquinascom dois canais simultâneos em fitasde ¼”, logo expandindo para modeloscom três e quatro canais com fitas de½”, e chegando no final dessa década

a modelos com oito canais e a criaçãode uma subdivisão na empresa que tra-balhasse na produção de fitas magnéti-cas (Ampex Magnetic Tape Division,futura Quantegy). A demanda pormais canais explodia entre os músi-cos, buscando a capacidade de realizaroverdubbings cada vez mais intensos.Isso criou um campo totalmente favo-rável para outras empresas tambémdespontarem nesse mercado. Em 1967,os engenheiros de áudio Geoff Emericke Ken Townshend trabalhando no dis-co “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts ClubBand” dos Beatles desenvolveramuma forma rudimentar de sincronizarduas máquinas Studer J37 (de quatrocanais), colocando esse fabricanteentre os principais construtores des-ses equipamentos (até 2004 essa era

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uma das poucas empresas que aindacomercializava esses equipamentos).No final da década de 60 já havia vári-os grandes fabricantes trabalhandocom esse produto como a 3M Corpo-ration (com o modelo M56) e a ScullyRecording Instruments (construindoo único gravador de 12 canais em fitade 1”), levando em 1968 a Ampex acriar uma versão de 16 canais de suafamosa MM 1000 (primeiro equipa-mento com essa capacidade de canaisem fita de 2” e controles herdados deum gravador de vídeo). As últimasmáquinas construídas pela Ampexeram de 24 canais, as quais debutarampela época de ouro da gravação ana-lógica e tiveram seu declínio anuncia-do com o início da década de 90 e apopularização e viabilidade da grava-ção digital.A tecnologia digital chegava com aintenção de resolver as principais li-mitações do armazenamento de da-dos analógicos nas fitas que, emborafosse satisfatório para a época, apre-sentava muitas imperfeições. Parti-cularmente, a natureza granular domaterial magnético adicionava ruídoao sinal, o qual podia ser representa-do pelo típico chiado de uma fita(tecnologias como a Dolby B, C e HX-Pro apareceram para tentar mascararessa deficiência). Outro problema vi-nha da falta de precisão na velocidadedos motores de corrente direta queconduzia as fitas produzindo muitasvezes solavancos nos cabeçotes dasmáquinas profissionais que trabalha-vam em alta velocidades (15” e 30”por segundo, as quais proporciona-vam menor distorção harmônica emelhor resposta de freqüências), o queresultava em flutuações nas baixas fre-qüências do material armazenado.

Como vivemos em um mundo ondeacredito que um fator imprescindívelseja a relação custo-benefício de umproduto, podemos afirmar que as má-

quinas de fita analógica multicanais setornaram equipamentos em extinção.Sem começar a citar todas as virtudesde um sistema de armazenamento digi-tal, alguns fatores como custo das fitas(isso quando são encontradas), aliadoao custo de manutenção das máquinas(alinhamento e polarização dos cabe-çotes), falta de praticidade na edição emanipulação do material gravado, difi-culdade em produzir cópias de seguran-ça, entre vários outros itens secundári-os como redução de custos em que omercado musical nos impõe dia-a-diaem conseqüência da pirataria, nos fa-zem ter a certeza de que não se atualizaré cavar nossa própria sepultura.Mas, e o fator que mais nos importaque é a qualidade sonora? Com os óti-mos conversores que temos hoje (al-guns gravando em 192 Khz) é impos-sível afirmar que não temos motivospara migrar para o digital levando emconta esse quesito. Talvez a única ca-

racterística da fita que o mundo digi-tal não conseguiu copiar perfeita-mente seja sua saturação. Na guerrados volumes em que vivemos hoje(em que o que toca mais alto é erro-neamente classificado como melhor)essa característica pode ser uma alia-da. Em um sistema digital, o limitepara armazenamento de informaçõesé 0 Dbfs (full scale ou escala digital),em que tudo que supera esse limiarserá bruscamente ceifado e reconhe-cido como distorção. Já em um grava-dor analógico, quando o sinal superao limite de 0 Db a margem dinâmicafica comprometida, porém a sonori-dade ganha uma textura única quemuitas vezes é utilizada artisticamen-te por alguns engenheiros de áudio(existem ainda aqueles que captamna fita e imediatamente transferem omaterial para um sistema digital).Então, mesmo tendo conhecimentodas inúmeras deficiências desses equi-pamentos, somos obrigados a nos ren-der a esse sistema se quisermos essacaracterística? Acredito que não.Existem equipamentos, alguns delesanalógicos, outros em formato deplug-ins, que resgatam ao seu modoessa robustez sonora, em que mesmoo resultado não sendo idêntico, acabasendo um material com característi-cas muito interessantes por uma fra-ção do preço de um sistema de fita.

Vejamos agora três hardwares e três plug-

ins que se destacam nessa categoria:

HARDWARES

Empirical Labs FATSO – Equipa-mento analógico com controles digi-

Como vivemos em ummundo onde acredito queum fator imprescindível

seja a relação custo-benefício de um produto,podemos afirmar que as

máquinas de fita analógicamulticanais se tornaram

equipamentos em extinção

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tais que por meio da não linearidade(comum em equipamentos valvula-dos e máquinas de fita analógicas)adiciona aparente volume sem adicio-nar sinais de pico ao sinal processado.Possui simulação de fita, saturação dealtas freqüências, gerador de harmôni-cos e um compressor com as caracte-rísticas do popular “Distressor” (po-rém com controles minimizados).

Rupert Neve Portico 5042 – Con-cebido pela maior lenda viva do mer-

cado de áudio, esse equipamento in-corpora um circuito real de um grava-dor de fitas com um minúsculo cabe-çote magnético que, por sua vez, éacoplado a um amplificador correta-mente equalizado (a única coisa querealmente falta é a fita). Possui entra-das e saídas com transformadores ba-lanceados, permitindo seu uso comoum amplificador de sinal de linha ex-tremamente puro com 12 Dbs, quan-do a simulação de fita não for requisi-tada. Possui controle de simulação deduas velocidades (7.5” e 15” por se-gundo) e nível de saturação que con-trola a quantidade de magnetizaçãoque será enviada ao cabeçote.

AnaMode ATS 1 – Hardware analógi-co que atualmente possui a maiorquantidade de controles dos produtosdessa categoria. Permite a simulação de3 velocidades de tração (7.5”, 15” e 30”por segundo), da equalização de bai-xas e altas freqüências no circuito de

gravação e reprodução do gravador defita (permitindo a simulação do chia-do característico), ajuste efetivo dapolarização no circuito de gravação, ea adição de placas opcionais que re-produzem as características específi-cas de 4 máquinas lendárias.

PLUG-INS

Digidesign Reel Tape Saturation –Plug-in exclusivo para Pro Tools que si-mula famosos gravadores de fita comoos modelos 456 (da Ampex, com fita

Quantegy GP9), M79 (3M) e A800(Studer). Resgata a coloração das má-quinas de fita magnética permitindo ocontrole de diversos parâmetros como

velocidade (de 7.5” a 30” por segundo),saturação, quantidade de chiado, pola-rização dos cabeçotes e característicasde resposta de freqüências específicasde cada modelo. Pode ser alugado dire-tamente no site do fabricante confor-me a necessidade de cada usuário.

Crane Song Phoenix – Pacote for-mado por cinco plug-ins, cada umcom as caraterísticas de um determi-nado fabricante e três curvas de equa-lização. Seu controle de nível de sinal

modifica a interação do processadorcom relação ao sinal original, en-quanto seu controle de entrada per-mite ao usuário calibrar o sinal antesde seu processamento, evitando que omesmo chegue distorcido ao proces-sador. Possui boa relação de consumode DSP em sistema TDM da Digi-design (habilitando 20 instâncias em44.1Khz por chip de um sistema HD).

McDSP Analog Channel – Pacote for-mado por dois plug-ins: AC1 que simula ascaracterísticas de pré-amplificadoresanalógicos e AC2 que simula máquinas defita (o qual está em questão). É atualmenteo plug-in dessa categoria que mais oferecediferentes modelos de simulações (máqui-nas). Possui praticamente todos os contro-les possíveis em um equipamento real ecoleciona como usuários os produtores dascantoras Faith Hill e Shania Twain.Muitos fabricantes já oferecem ver-sões demonstrativas de seus plug-ins(com limite de uso), e alguns até mes-mo versões gratuitas como é o caso doFerox (www.jeroenbreebaart.com). Oimportante é comparar e decidir qualequipamento ou plug-in mais se en-quadra na sonoridade e investimentoque você busca.