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Notas políticas

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Este é um livro de textos políticos não teóricos, quase crônicas, conversas com amigos distantes, e tem como objetivo tentar recuperar um pouco da humanidade, tão desprestigiada por um modo de produção em desacordo à nossa maneira de ser, cordial e amorosa. Capitalismo, socialismo, samba, bossa-nova, chico buarque, mangueira, portela, beth carvalho, mercedes sosa, lula, resistência, esperança, tudo misturado faz a seiva destas crônicas, escritas no calor da luta, e que agora são oferecidas aos leitores e leitoras, companheiros e companheiras de luta por um mundo mais justo e mais humano.

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ROBERTO PONCIANO

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Copyright © 2011 Roberto Ponciano

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seja digital, fotocópia, gravação etc., nem apropriada ou estocada em banco de dados,

sem a autorização do autor.

CapaMaria Eugênia Sá/Mídia4 (foto)

Cris Lima / Demanda Editorial (arte-final)

RevisãoJoão Mcormick

Editor Glauco de Oliveira

Direitos exclusivos desta edição:Booklink Publicações Ltda.

Caixa Postal 3301422440 970 Rio RJ

Fone 21 2265 0748www.booklink.com.br

[email protected]

Notas políticas / Roberto Ponciano . – Rio de Janeiro : Booklink, 2011.

160p. ; 20,5 cm.

ISBN: 978-85-7729-122-9

1. Literatura brasileira. 2. Crônicas. 3. Política I. Ponciano, Roberto. I. Título.

CDD 801.95

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Agradeço a colaboração de:

Rudi Cassel e Jean Ruzarin;João Mcormick (edição dos textos);

O casal Vinícius e Eugênia do Mídia 4;Glauco de Oliveira, meu incansável editor.

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Dedico este livro:

Ao Partido Comunista Brasileiro, me deste a retidão que a ár-vore necessita para crescer (P. Neruda);

A Fernando Ladera Cubero, me fizeste adversário do cruel e inimigo do fanático (P. Neruda);

Ao Partidos dos Trabalhadores e a Democracia Socialista (meu atual partido);

A meu pai, Roberto Ponciano, me ensinaste como a dor de um morreu na vitória de todos (P. Neruda);

A minhas filhas Ana Carolina, Bruna e a toda minha família, porque não termino em ti (P. Neruda);

A Carlos Telles, me ensinasta e dormir na cama dura de meus companheiros (P. Neruda).

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Sumário

A caverna........................................................................................... 11Menino de rua................................................................................... 17Samba, música de negros............................................................... 20Rio carnaval 2030............................................................................. 25Pinte tua aldeia e serás universal................................................... 27O velho e o novo.............................................................................. 30A memória......................................................................................... 35Ainda a memória.............................................................................. 41Chico Buarque, cheiro da terra Brasil............................................ 47Saudades de Sérgio Porto............................................................... 50Bem-vindo, Fausto Wolff................................................................. 53A esquerda raivosa........................................................................... 5560 anos da vitória sobre o eixo nazifascista – Stalingrado,

o verdadeiro dia D...................................................................... 62Natal, a festa da mercadoria........................................................... 68Ano novo?......................................................................................... 71A sociedade do fruir e a sociedade

do trabalho compulsivo............................................................. 74A diminuição da jornada e a recuperação do tempo livre

– liberdade e luta contra a alienação....................................... 83A dessexualização do homem na sociedade do valor................. 86A barbárie capitalista e a histeria da classe média

pela diminuição da menoridade penal.................................... 91A televisão pede “paz”..................................................................... 97França: guerra de quadrilhas ou luta de classes?........................ 99

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Marx, este desconhecido............................................................... 101FSM – A alternativa é o socialismo.............................................. 106Os limites da tolerância................................................................. 110O mico.............................................................................................. 114O monopólio do terror (terrorismo de Estado).......................... 119O preconceito contra a cultura negra no Brasil.......................... 128O que significa ser de esquerda................................................... 130Reduzir a jornada para prolongar a vida..................................... 133Socialismo ou baratas.................................................................... 136Venezuela, um amor...................................................................... 140Marcos Bagno e a cultura do Mister Créu.................................... 143Os que fazem a greve.................................................................... 149Murió la Negra................................................................................ 151A inquisição vermelha.................................................................... 153

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A caverna

Desde que foi decretado pelo Estado oficial que a natureza era uma inimiga a ser desbravada, conquistada e ferida, os ho-mens se recolheram a uma imensa caverna. Todos tinham, em seus lares, uma grande tela chamada de teleinversão, onde po-diam ver o mundo. Tudo era fabricado, os cheiros, os sons, os gostos, os ídolos, as práticas, os carros, muitos carros, barulhen-tos, fumegantes, algumas pessoas tinham vários, era o símbolo do sexo e do poder. E celulares, gritantes, estridentes, desneces-sários, as pessoas andavam com os celulares todo o dia, e fala-vam neles, falavam muito, mas muito mais do que falavam ao vivo, olhando nos olhos, que agora eram todos azuis, graças às diversas lentes que escondiam as descendências sempre mestiças renegadas, desapareciam nos olhos.

Era um mundo novo, da imensa democracia “universal”. Uma democracia onde o grande poder era o de consumir, ha-via eleições periódicas, onde, com muito dinheiro o povo miú-do e pobre escolhia o ricaço que lhe daria a corda com que se enforcar.

Nesta sociedade nascera um menino, de nome Demócrito. Ele recebera seu nome do filósofo grego. Seu pai fora expulso da caverna há dezenas de anos atrás e acabou por morrer, feliz, ape-sar de estar longe da família, no exílio, pois fora da caverna era a liberdade. Isto ele escrevera sempre ao filho, embora pouquíssi-mas cartas houvessem podido chegar.

Os amigos de Demócrito ridicularizavam-no. Não havia rea-lidade fora da caverna, o mundo era plano e fora dele era só abis-mo, tristeza, pobreza. Não havia supermercados, nem shopping centers, nem celulares, nem computadores, era o abismo, o in-findável vazio. Demócrito não acreditava. Ele cria que fora da-

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quela caverna insuportável, onde os homens eram classificados de acordo com o valor depositado na conta corrente, havia um mundo. Redondo, com cheiro de plantas e frutas. Com selvas e rios, com outras cores, que não fossem estas da teleinversão.

Estas eram ideias perigosas, só os selvagens, chamados de ín-dios e os comuneros criam nisto, mais ninguém. Os selvagens vi-viam à margem da caverna, comendo com as mãos, num estágio primitivo e aterrador, era impossível viver com eles. Os comu-neros eram uns sanguinários, desacreditavam em tudo que era compulsivo, no casamento compulsivo, no trabalho compulsivo. Ousavam discordar da teleinversão e propunham outra realidade, onde as pessoas valeriam pelo que eram. Mas, o que é uma pes-soa, senão seus carros, seu cartão de crédito, sua teleinversão da realidade, senão seus celulares, senão sua conta bancária? O que? Estas ideias perigosas acabariam com a tranquilidade e a beleza da sociedade da caverna. Sentir o vento? O vento tinha bactérias e micróbios, havia um super ar-condicionado gigante garantindo o sustento de toda a caverna, ar esterilizado, puro. Para que sen-tir brisas, ventos e outros inconvenientes da natureza se este gi-gante do mundo moderno podia nos tirar do estágio de selvage-ria e barbárie?

A música era tecno, melhor, tecno-brega. Roupas grudadas de plástico, de couro, de outros tipos. Era industrial como esta sociedade, aliás, até o amor era industrial, esterilizado, pasteuri-zado, enlatado, louro e artificial como tudo. Louras rebolativas cantavam as partes do corpo feminino como postas de carne expostas em açougues. Aliás, depois de celulares e carros, nada como possuir uma loura. Era uma demonstração de status na ca-verna, ainda que a loura fosse falsificada (90% dos casos). Des-cendentes de índios, negros entre outros, não eram muito bem-vistos nesta sociedade tecno-brega. Aí era um festival de índias louras, de negras louras, de morenas louras, de preconceitos po-liticamente corretos, mudos e eternizados. Também havia os ga-rotinhos de roupas grudadas e partes pudicas dependuradas nas novas revistas de venda de sexo, agora rebatizadas de “magazi-nes de nu artístico”.

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As crianças eram supergordas (as que não eram pobres e fa-mintas) e comiam seus venenos no mac-caverna do momento, o big-caverna, o big-bobagem, o big, pig, chicken ou qualquer coi-sa em inglês, que era uma mostra de cultura. Afinal, na caverna, quem entendesse pouco ou nada de inglês era considerado pou-co ou mais do que um selvagem, embora pouquíssimos fossem descendentes de anglo-saxões.

As pessoas não sofriam mais, porque o sofrimento era algo “out” não “cult”. A teleinversão pensava por todos. Não haviam excluídos, apenas os “colaterais”. Uma criança comendo lixo, era um colateral, uma necessidade da opulência, no máximo um aza-rado, algo extremamente suportável, na verdade, com o tempo, ninguém mais via as crianças comendo lixos. Todas as crianças, dizia a teleinversão, já tinham ido à nova Disney-caverna, que era a maior demonstração de carinho e felicidade que os pais po-diam dar a seus filhos.

Não havia guerras, apenas patrulhamentos da nova polícia internacional da Grande Águia, que dominava tudo e era dona da verdade, afinal dominava todas as mais importantes telein-versões do mundo. Era a democracia da verdade única. Rapazes e moças bem bonitos e arrumados, no jornal da noite, davam a verdade do dia a dia. Bombas caindo em algum lugar da caverna eram danos colaterais, protótipos inteligentes de alguma guerra clínica, para o que a teleinversão fazia a lobotomia da sensibili-dade de todos, aliás, sensibilidade era algo profundamente “out”, fora de moda, assim como a solidariedade. O lema era cada um por si, e Deus contra todos.

Demócrito não acreditava nisto. Era sensível, era solidário. Não tolerava sequer mais a Ditadura da Imagem Única da telein-versão, e queria sair portão afora, para ver o mundo, coisa que não era permitida.

Um dia conseguiu fugir. Seus olhos, acostumados à ilumi-nação artificial, ardiam, seus pulmões se encheram de ar puro, cheios de odores de flores, nos ouvidos, zumbidos de abelhas, pios de passarinhos, sons de um rio próximo. Ele não acredita-va, era impossível. Um rio!!!! Na caverna só havia valões, que fo-

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ram cobertos por serem sujos, mal-fedidos e cheios de sujeira e esgotos. Era uma outra vida.

Tinha medo também, era jovem e ouvira falar que os co-muneros matavam por puro prazer e obrigavam as pessoas que saiam da caverna, que saiam do sistema a orgias. O medo de en-contrá-los era grande, pois eles dominavam algumas áreas do mundo fora da caverna, as que não eram superpatrulhadas pe-los mariners da Superáguia. Ele não cria nos seus próprios olhos. Era isto que a ditadura da imagem única queria negar? Frescor, luz, sol, natureza, a própria essência da humanidade.

Andou e sentiu fome. Pegou mangas, era a primeira vez que as comia assim, direto da árvore. Acabou por encontrar uma pe-quena tribo de índios. Tremeu, a primeira coisa que lhe veio à ca-beça foi: selvagens, antropófagos. Mas a curiosidade foi maior. Acabou por se chegar, e foi bem-recebido. Eles falavam outro idioma, mas, havia alguns na comunidade capazes de falar com ele, pois tinham tido contato com o mundo da caverna.

Demócrito viveu meses ali. Descobriu um novo sentido. Uma solidariedade diferente. Eram estes os selvagens? Não havia ri-cos, e nem pobres, nem hipocondríacos, nem alcoólatras, nem deprimidos, nem órfãos ou viúvas desamparadas, nem existiam os “não incluídos”. Havia um sentido coletivo novo, e pela pri-meira vez na vida, ele sentiu na prática que a felicidade é um bem comum, que o ser humano é parte de uma mesma essência. Per-deu o tênis da moda, e nem se importou. Seus pés se afundaram no lodo dos rios e redescobriu nadar, pescar, dançar e até amar. Não que ele fosse virgem antes de chegar ali, mas descobriu um sexo sem culpas e sem medo, de entrega e sem submissão, uma visão natural e diferente da sexualidade, onde não havia compul-são e nem se usava a relação como um jogo de poder. Estava en-cantado e tinha vontade de viver ali para sempre.

Aprendeu deuses outros, que eram pássaros, que eram árvo-res, que eram cantores, sol e lua, mata e rio. E descobriu que a ca-pivara era sua irmã, que a ema era sua irmã, que o veado era seu irmão. E não achou que estes deuses da mata fossem demônios, ao contrário, viu nestes deuses tanta verdade quanto em Cristo e sua pregação de amor pelo próximo.

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Com o tempo sentiu a necessidade de sair dali e retornar à ca-verna. Quando pensava nisto chegou um comunero para se es-conder na aldeia. Foi bem aceito, já estivera ali antes, e havia aju-dado os índios a organizar sua resistência, pois não apenas uma vez havia sido arrasada a aldeia, com dezenas de mortos a sujar a história da moderna civilização da supercaverna-globalizada-da-imagem-única.

Teve medo, a ideia que tinha do comunero era péssima. Um dia foi suficiente para aproximá-lo daquele militante comunero. Soube de verdades então que jamais pensara antes. De como a sociedade da caverna poderia ser outra, livre, amante da nature-za, sem o trabalho compulsivo, com tempo de sobrar para viver, curtir a natureza, dançar, cantar, sentir o prazer de viver e estar aqui, e a necessidade dos que sabiam desta possibilidade era a de espalhar isto como um evangelho.

Demócrito ficou mais um mês na tribo, aprendeu muitas coisas, recebeu uns livros do velho militante e os devorou, acre-ditava estar pronto para retornar à caverna e cumprir sua pro-messa de abrir os olhos de quem pudesse.

Para voltar à caverna contou uma história que se perdera. Foi recebido como um herói que sobrevivera à sanha de ficar seis meses em poder de selvagens. Na primeira entrevista dada em rede internacional à teleinversão, ele começou a falar a verdade. Da necessidade da natureza, do homem se reencontrar com sua essência, de descobrir sua alienação em relação a si mesmo, aos outros semelhantes, de se libertar, não como um processo de uma pretensa liberdade de se fazer coisas inúteis, mas como uma descoberta das amarras que nos prendem em nosso caminho rumo a uma realidade diferente e digna, e da superação destas cadeias. Nunca mais foi chamado à teleinversão. No dia seguinte todos os principais jornais do grande mundo da supercaverna ti-nham editoriais feitos pelo Partido da Imagem Única que ridicu-larizava e depreciava a fala deste dinossauro, que pretendia que a caverna regredisse e voltasse a ser uma sociedade pouco me-lhor que de índios pré-civilizados. Como abrir mão da miséria na abundância, do homem ser lobo do próprio homem, da compe-