13
João Pessoa - PB, 26 a 29 de julho de 2015 SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural NOVAS SOCIABILIDADES NO RURAL CONTEMPORÂNEO: DO ISOLAMENTO DA JUVENTUDE RURAL AO PROTAGONISMO ENQUANTO CATEGORIA SOCIOPOLÍTICA EMERGENTE. SOCIABILITY NEW IN RURAL CONTEMPORARY: ISOLATION OF RURAL YOUTH LEADERSHIP AS THE CATEGORY SOCIOPOLITICAL EMERGING. Gisele Martins Guimarães. Professora na UFSM. Email: [email protected] Ezequiel Redin. Doutorando do Programa de Pós Graduação em Extensão Rural - UFSM. Email: [email protected] Paulo Roberto C. da Silveira. Professor - UFSM. Email: [email protected] Janaína Balk Brandão. Professora na UNIPAMPA em exercício provisório na UFSM. Email: [email protected] Grupo de Pesquisa: GT 7 Agricultura Familiar e Ruralidade Resumo Este texto aborda as formas contemporâneas de sociabilidade possibilitadas pelas Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) como internet e telefonia celular e a interferência destas nas expectativas dos jovens rurais em relação a sua trajetória de vida. Como referência empírica, apresenta-se a experiência de organização dos jovens rurais da Região Centro Serra do Rio Grande do Sul, reunidos e organizados pela Associação Regional da Juventude Rural do Território Centro Serra (AREJUR) a qual envolve cerca de nove mil jovens de doze municípios da Região Centro Serra do Estado. Busca-se identificar a relação entre as novas sociabilidades e o processo organizativo da juventude rural, assinalando possíveis efeitos das TIC nas expectativas e demandas prioritárias dos jovens rurais considerando que essas novas formas de sociabilidade vem permitindo que estes se conectem com a sociedade globalizada, redimensionando suas relações sociais e redefinindo as bases de seu processo identitário, permitindo assim uma maior visibilidade da Juventude Rural e suas demandas específicas, elencando estes à condição de uma categoria sociopolítica emergente. Os resultados aqui apresentados derivam de estudos que vem sendo realizados na Região Centro Serra/RS pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), através do Núcleo Interdisciplinar de Extensão e Pesquisa sobre Alimentação e Sociedade (NEPALS). Palavras-chave: Juventude Rural Agricultura Familiar Desenvolvimento Rural. Abstract This text addresses the contemporary forms of sociability enabled by Information and Communication Technologies (ICT) such as internet and mobile telephony and the effect of these on the expectations of rural youth for his life story. As an empirical reference, shows the rural youth organization experience of the Central Region Serra do Rio Grande do Sul, gathered and organized by Rural Youth Association Regional Spatial Centre Serra (AREJUR) which involves about nine thousand youngsters twelve municipalities of the Central State

NOVAS SOCIABILIDADES NO RURAL CONTEMPORÂNEO: DO …icongresso.itarget.com.br/tra/arquivos/ser.5/1/5312.pdf · de Informação e Comunicação (TIC) como internet e telefonia celular

  • Upload
    others

  • View
    0

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: NOVAS SOCIABILIDADES NO RURAL CONTEMPORÂNEO: DO …icongresso.itarget.com.br/tra/arquivos/ser.5/1/5312.pdf · de Informação e Comunicação (TIC) como internet e telefonia celular

João Pessoa - PB, 26 a 29 de julho de 2015

SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

NOVAS SOCIABILIDADES NO RURAL CONTEMPORÂNEO: DO ISOLAMENTO

DA JUVENTUDE RURAL AO PROTAGONISMO ENQUANTO CATEGORIA

SOCIOPOLÍTICA EMERGENTE.

SOCIABILITY NEW IN RURAL CONTEMPORARY: ISOLATION OF RURAL

YOUTH LEADERSHIP AS THE CATEGORY SOCIOPOLITICAL EMERGING.

Gisele Martins Guimarães. Professora na UFSM. Email: [email protected]

Ezequiel Redin. Doutorando do Programa de Pós Graduação em Extensão Rural - UFSM.

Email: [email protected]

Paulo Roberto C. da Silveira. Professor - UFSM. Email: [email protected]

Janaína Balk Brandão. Professora na UNIPAMPA em exercício provisório na UFSM.

Email: [email protected]

Grupo de Pesquisa: GT 7 – Agricultura Familiar e Ruralidade

Resumo

Este texto aborda as formas contemporâneas de sociabilidade possibilitadas pelas Tecnologias

de Informação e Comunicação (TIC) como internet e telefonia celular e a interferência destas

nas expectativas dos jovens rurais em relação a sua trajetória de vida. Como referência

empírica, apresenta-se a experiência de organização dos jovens rurais da Região Centro Serra

do Rio Grande do Sul, reunidos e organizados pela Associação Regional da Juventude Rural

do Território Centro Serra (AREJUR) a qual envolve cerca de nove mil jovens de doze

municípios da Região Centro Serra do Estado. Busca-se identificar a relação entre as novas

sociabilidades e o processo organizativo da juventude rural, assinalando possíveis efeitos das

TIC nas expectativas e demandas prioritárias dos jovens rurais considerando que essas novas

formas de sociabilidade vem permitindo que estes se conectem com a sociedade globalizada,

redimensionando suas relações sociais e redefinindo as bases de seu processo identitário,

permitindo assim uma maior visibilidade da Juventude Rural e suas demandas específicas,

elencando estes à condição de uma categoria sociopolítica emergente. Os resultados aqui

apresentados derivam de estudos que vem sendo realizados na Região Centro Serra/RS pela

Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), através do Núcleo Interdisciplinar de Extensão

e Pesquisa sobre Alimentação e Sociedade (NEPALS).

Palavras-chave: Juventude Rural – Agricultura Familiar – Desenvolvimento Rural.

Abstract

This text addresses the contemporary forms of sociability enabled by Information and

Communication Technologies (ICT) such as internet and mobile telephony and the effect of

these on the expectations of rural youth for his life story. As an empirical reference, shows the

rural youth organization experience of the Central Region Serra do Rio Grande do Sul,

gathered and organized by Rural Youth Association Regional Spatial Centre Serra (AREJUR)

which involves about nine thousand youngsters twelve municipalities of the Central State

Page 2: NOVAS SOCIABILIDADES NO RURAL CONTEMPORÂNEO: DO …icongresso.itarget.com.br/tra/arquivos/ser.5/1/5312.pdf · de Informação e Comunicação (TIC) como internet e telefonia celular

João Pessoa - PB, 26 a 29 de julho de 2015

SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

Serra. The aim is to identify the relationship between the new social arrangements and the

organizational process of rural youth, indicating possible effects of ICT in priority

expectations and demands of rural youth considering that these new forms of sociability is

allowing them to connect with the globalized society, resizing their social relations and

redefining the foundations of his identity process, thereby allowing greater visibility of rural

youth and their specific demands, listing these to the condition of an emerging socio-political

category. The results presented here are derived from studies being conducted in the Central

Sierra / RS Federal University of Santa Maria (UFSM), through the Interdisciplinary Center

for Extension and Research on Food and Society (Nepals).

Key words: Rural Youth - Family Agriculture - Rural Development

1. Introdução Desde a década de 1990, a literatura vem documentando elementos de mudança no

rural brasileiro, como a redução do número de famílias envolvidas com a agricultura, a

emergência de atividades não agrícolas no espaço rural, a presença da agricultura de tempo

parcial e ainda a pluriatividade como nova característica da organização do trabalho das

famílias rurais. Neste “novo rural”, atividades como turismo, indústria, comércio e serviços

surgem com crescente importância na ocupação da força de trabalho disponível, enquanto

fenômenos de êxodo rural são observados a partir do envelhecimento da população do campo

e a masculinização entre os seus remanescentes (CAMARANO e ABRAMOVAY, 1999).

Estudos recentes sobre o desenvolvimento rural brasileiro enfatizam uma intensa

migração dos jovens rurais para os centros urbanos em busca de opções de estudo, emprego

com salários fixos e direitos de previdência social, respeitados (STROPASOLAS, 2006). Este

êxodo dos jovens vem trazendo consigo ameaças à sucessão familiar implicando no provável

esvaziamento do rural em um futuro próximo. Ao examinar este processo no qual a juventude

rural assume a perspectiva de não permanecer no campo, as pesquisas apontam diversas

motivações para este comportamento, indo da baixa expectativa de renda na agricultura

camponesa, a falta de participação na gestão da economia familiar e ainda a busca por

melhores condições de infraestrutura, serviços públicos e opções de lazer (REDIN e

SILVEIRA, 2012). Neste sentido, adverte-se para a necessidade de estudos, que possam ir

além dos fatores que estimulam a saída do rural apontando e refletindo sobre os aspectos que

estimulam a juventude rural a permanecer nestes espaços.

Neste artigo o conceito de Juventude Rural assume significado de um ator coletivo,

relacionado a um projeto identitário que implica na dimensão da organização e luta política.

Deste modo, ultrapassa-se o enfoque que ressalta apenas fatores de ordem individual, a qual

tem como consequência uma análise que particulariza a situação de cada família e não

enfatiza os elementos relativos às expectativas e perspectivas dos jovens enquanto grupo

social, os quais agem e reagem condicionados, sobretudo, por políticas públicas que

interferem nas condições estruturais e conjunturais presentes em cada território (REDIN e

SILVEIRA, 2012).

Sob este prisma, busca-se abordar as contemporâneas formas de sociabilidade

possibilitadas pelas novas Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), como a internet

Page 3: NOVAS SOCIABILIDADES NO RURAL CONTEMPORÂNEO: DO …icongresso.itarget.com.br/tra/arquivos/ser.5/1/5312.pdf · de Informação e Comunicação (TIC) como internet e telefonia celular

João Pessoa - PB, 26 a 29 de julho de 2015

SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

e os telefones celulares e a possibilidade destas exercerem interferências nas decisões da vida

rural, a partir da possibilidade de interação com a sociedade global, afetando assim a

expectativas dos jovens em relação a sua trajetória de vida e em última instância nas formas

de participação destes, nos movimentos da Juventude Rural. Este processo implica em novas

perspectivas para a população rural, seja nos aspectos de acesso à informação como nas novas

possibilidades de interação social. Abordamos assim a relação entre estas novas

sociabilidades e o processo organizativo da juventude rural, buscando identificar efeitos das

TIC nas expectativas e perspectivas dos jovens rurais.

Como referência empírica, apresenta-se a experiência de organização dos jovens rurais

da Região Centro Serra do Rio Grande do Sul, reunidos e organizados pela Associação

Regional da Juventude Rural do Território Centro Serra (AREJUR) a qual envolve cerca de

nove mil jovens de doze municípios da Região Centro Serra do Estado: Arroio do Tigre,

Cerro Branco, Estrela Velha, Ibarama, Jacuizinho, Lagoão, Lagoa Bonita do Sul, Passa Sete,

Salto do Jacuí, Segredo, Sobradinho e Tunas. As experiências vivenciadas por essa

Organização Social permite-nos compreender como as TIC vêm influindo na ação coletiva

dos atores rurais, considerando que essas novas formas de sociabilidade podem permitir que

os jovens rurais conectem-se com a sociedade globalizada, redimensionando suas relações

sociais e redefinindo as bases de seu processo identitário.

Os dados empíricos aqui analisados derivam de estudos que vem sendo realizados na

Região Centro Serra/RS pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), através do

Núcleo Interdisciplinar de Extensão e Pesquisa sobre Alimentação e Sociedade (NEPALS),

onde se busca refletir sobre o papel exercido pelos jovens no rural contemporâneo,

objetivando conhecer suas demandas enquanto atores coletivos.

O presente texto está dividido em três seções. Na primeira apresenta-se a Juventude

Rural sob a conceituação de atores sociais coletivos com identidade em construção,

responsáveis pela preservação do patrimônio natural e social do rural, agentes políticos e

ainda promotores de transformação nos espaços em que vivem. Neste sentido, acredita-se que

as TIC, por meio da Internet e mais recentemente, os smartphones vem promovendo a criação

de novos espaços de sociabilidade no rural, bem como interatividade entre os atores, o que

pode estar condicionando o surgimento de novas organizações sociais e ainda o

fortalecimento das já existentes em função da aproximação dos jovens pelas redes

sociais.Diante deste cenário pergunta-se: Quais as implicações das TIC sobre as expectativas

e demandas prioritárias da Juventude Rural, bem como a organização destes enquanto

categoria sociopolítica?

Na segunda seção apresentamos a experiência da Associação Regional da Juventude

Rural da Região Centro Serra-RS, a AREJUR enquanto organização social da categoria. Esta,

formada por associações de jovens rurais dos municípios constituinte da Região Centro Serra,

constitui instância de representação e legitimidade das demandas dos jovens rurais da Região.

Trabalhos realizados pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) permitem-nos refletir

sobre questões referentes às expectativas e demandas prioritárias dos jovens rurais apontando

para o fomento e qualificação no acesso as TIC como fundamental para a permanência destes

no meio rural, juntamente com outro grupo de elementos que incluem questões de melhorias

de infraestrutura (estrada, energia, telefonia, etc.), produção e mercado.

Page 4: NOVAS SOCIABILIDADES NO RURAL CONTEMPORÂNEO: DO …icongresso.itarget.com.br/tra/arquivos/ser.5/1/5312.pdf · de Informação e Comunicação (TIC) como internet e telefonia celular

João Pessoa - PB, 26 a 29 de julho de 2015

SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

Por fim, a última seção apresenta reflexões no âmbito dos desafios da Juventude Rural

enquanto categoria sociopolítica emergente no rural contemporâneo.

2. Juventude Rural e as Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC)

A juventude rural contemporânea está imersa num conjunto de novas relações de

sociabilidade que constituem e se reconstituem diante das Tecnologias de Informação e

Comunicação (TIC) cada vez mais presentes no rural brasileiro. Estas, por sua vez,

correspondem a todas as tecnologias que interferem e mediam os processos informacionais e

comunicativos.

As TIC constituem um conjunto de recursos tecnológicos integrados entre si, que

proporcionam, por meio das funções de hardware, software e telecomunicações, interações

entre processos de negócios, de pesquisa científica, de ensino e aprendizagem. Como exemplo

citamos o rádio, o telefone (fixo e móvel) a televisão (analógica e digital) e a internet,

considerada a responsável pela revolução das redes em função de sua capacidade de promover

interatividade entre os sujeitos, aproximando sentidos através da informação e mecanismos de

sociabilidade, como o fazem as redes sociais.

Neste sentido, considera-se que estas têm papel fundamental no desenvolvimento uma

vez que facilitam o processo de comunicação, compreendido, em sua essência, como capital

social para os atores que necessitam dela para tomar suas decisões de produção e convivência

(BORDENAVE, 1983). Vale lembrar que o processo de comunicação no meio rural sempre

esteve ligado a informação, esta sob uma perspectiva técnica, tecnológica ou ainda de lazer

como faziam (e ainda o fazem) os inúmeros programas de rádio que atingem o meio rural por

meio de músicas e informes técnicos.

No entanto salienta-se que sob esta perspectiva, a informação não é reconhecida como

comunicação pela passividade com que os sujeitos a recebem. Completando essa análise nos

reportamos a Paulo Freire (1977) que assinala a importância da reciprocidade que não pode

ser rompida para que haja o ato comunicativo, o que implica em uma relação dialógica e não

unidirecional.

De outro lado, considerando-se a revolução da comunicação por meio da internet,

percebe-se a possibilidade de interatividade entre os sujeitos, esta dada pela troca em duas ou

mais vias de diálogo. Este fenômeno de reciprocidade seria então capaz de promover

comunicação, ou seja, se daria por meio de relações e significações sociais construídas de

forma coletiva pelas partes envolvidas: emissores e receptores, tendo a máquina como meio

de mediação.

E é deste mecanismo de construção em rede, proporcionado pela internet, que surgem

as possibilidades de sociabilidade, termo este sugerido por Georg Simmel (1983) que implica

em interação entre os sujeitos. Esta, movida na sociedade por objetivos comuns partilhados,

como posição social, cultura e aumento de capacidades por meio da informação e formação.

Todas estas e outras questões favorecidas pelo acesso crescente dos atores às Tecnologias da

Informação e Comunicação, cada vez mais presente entre os jovens, tanto urbanos quanto

rurais, muito embora os últimos ainda estejam em evidente desvantagem quando comparados

aos primeiros, no acesso ao serviço, como demonstram os dados de pesquisa do Comitê

Page 5: NOVAS SOCIABILIDADES NO RURAL CONTEMPORÂNEO: DO …icongresso.itarget.com.br/tra/arquivos/ser.5/1/5312.pdf · de Informação e Comunicação (TIC) como internet e telefonia celular

João Pessoa - PB, 26 a 29 de julho de 2015

SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

Gestor da internet no Brasil, indicando que a presença do computador na área urbana atinge

51% dos estabelecimentos, enquanto na área rural chegam a 16% nos domicílios (CGI, 2012).

No entanto, é fundamental que se reconheça que as TIC no meio rural potencializam a

comunicação e facilitam as trocas de experiências, sobretudo, entre os jovens, que veem nela

a possibilidade de sair para além de seus espaços geográficos e sociais, podendo fazer-se

pertencer a diferentes redes, onde a organização social pode emergir como resultado de um

processo de partilha de interesses e sentimentos de pertencimento.

No recorte empírico deste estudo (Região Centro Serra do RS), encontram-se

disseminados, em ordem cronológica, o rádio, a televisão, telefone fixo, o celular, computador

e internet, por último, mais contemporâneo, os smartphones. Para fins metodológicos, este

trabalho realiza um recorte em relação ao computador e a internet, que cada vez mais fazem

parte do cotidiano dos rurais influenciando, em um primeiro momento nos trabalhos

escolares, estendendo-se aos momentos de lazer. Num segundo momento, significam um

potencial de mudança na sociabilidade, antes dependentes das festas locais e hoje fundadas

também na aproximação com jovens urbanos (fisicamente ou virtualmente) através das redes

sociais.

Nesse interim, reconhece-se que o avanço das TIC no meio rural vem fornecendo

novas dinâmicas em relação à comunicação e a sociabilidade, promovendo simbioses na

juventude rural, aqui compreendida como uma construção social, como sugere Bourdieu

(1984, p. 152), quando diz que “(...) a juventude e a velhice não são dadas, mas construídas

socialmente, na luta entre jovens e velhos”. A relação entre idade social e idade biológica é

muito complexa, cujas ações estão ancoradas no sujeito coletivo, diante das esferas do circuito

social em que se estabelecem e legitimam enquanto gerações juvenis.

Ainda enfatizando a abordagem metodológica e conceitual do presente trabalho,

salienta-se que a juventude rural é aqui analisada no campo teórico como: sujeito de

transformação do campo (CASTRO, 2005); grupo responsável pela sucessão ou êxodo rural

(DIRVEN, 2001); agentes da manutenção e preservação do patrimônio da família rural

através das estratégias matrimoniais e reprodução biológica (BOURDIEU, 2009); ator político

(STROPASOLAS, 2006, CASTRO, 2009); agentes promotores de espaços sociais ligados ao

lazer, convívio, entretenimento e troca de experiências (REDIN e SILVEIRA, 2012).

A juventude nas sociedades camponesas, geralmente, coincide com uma etapa de

semidependência social, assinalada por uma precoce inserção produtiva e por um status

subordinado dos jovens no seio da família. Apesar da subordinação doméstica, em que não

possuem prestígio e poder, ocupam lugar central no espaço lúdico no âmbito da comunidade

e, frequentemente, participam em muitos aspectos da vida festiva, institucionalizada,

mediante agrupamentos coletivos (FEIXA PÀMPOIS, 2004), como os grupos de jovens rurais

unificados na Associação Regional da Juventude Rural no Território Centro Serra, RS, objeto

deste estudo.

Estudos como de Champagne (1986) alertam para a ampliação do espaço social dos

jovens rurais e a redução de controle da família camponesa. O isolamento geográfico e social

do meio rural tradicional tem efeitos sobre a sociabilização dos jovens. A partir do caso da

zonas de bosques, o autor mostra que a dispersão do habitat e a relativa autonomia econômica

reforçavam o isolamento das famílias rurais e lhes davam um monopólio de fato na

socialização de seus filhos, favorecendo assim uma reprodução social estritamente ligada a

Page 6: NOVAS SOCIABILIDADES NO RURAL CONTEMPORÂNEO: DO …icongresso.itarget.com.br/tra/arquivos/ser.5/1/5312.pdf · de Informação e Comunicação (TIC) como internet e telefonia celular

João Pessoa - PB, 26 a 29 de julho de 2015

SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

sua concepção de mundo, uma transcrição análoga. Tal fato proporcionava as famílias rurais

controle de todos os seus membros ao longo do tempo, sem concorrência.

Em contexto contemporâneo, especificamente na realidade sul-brasileira, acredita-se

que o avanço das TIC para o meio rural e a expansão e interiorização das universidades e

institutos federais de educação técnica e superior, têm colocado em xeque o saber da família e

o controle mais rígido do jovem no meio rural. Esse fenômeno provoca um empoderamento

deste perante a família e, em certa medida, uma ampliação das opções em relação ao seu

futuro profissional, o que certamente pode favorecer os processos migratórios.

Conforme Champagne (1986), em um espaço de interconhecimento onde tudo se

sabia, as famílias podiam envolver total e continuamente a vida de seus filhos, vigiando suas

atividades e suas amizades e até mesmo induzindo seus casamentos. Desse modo, impunham

seus valores, seu estilo de vida e sua acepção de excelência profissional. Nesse contexto de

microssociedade, acontecia a sucessão porque isso era evidente, seja por dever ou por

obrigação familiar e também pelas reduzidas opções que se colocavam como viáveis diante da

incerteza do abandono da vida na aldeia. A sociedade global se mostrava hostil e o

estranhamento dos jovens, diante das vivências possíveis fora da aldeia, os atemorizava e

acuava (CHAMPAGNE, 1986).

Assim, no contexto do sul do Brasil, a partir da década de 1940-1950, as famílias de

agricultores passam a ver no estudo, uma possibilidade para os filhos conseguirem trabalho no

meio urbano, considerando a saída do rural como sinônimo de acesso a melhores condições de

vida (SILVEIRA, 1994). Segundo investigação conduzida pelo grupo de pesquisa “Sociedade,

Ambiente e Desenvolvimento Rural” da Universidade Federal de Santa Maria, entre os anos

1990 a 1994 o trabalho era visto como sacrifício e, principalmente as mulheres eram

estimuladas a migrarem, já que os filhos homens representavam potencial de mão-de-obra

capaz de definir a capacidade de reprodução social da família. Alia-se a esta questão a prática

ainda comum no Sul do Brasil, das famílias adquirirem área em regiões de novas fronteiras

agrícolas em estabelecimento e com isto viabilizar a migração de parte da família (ou até de

famílias inteiras), buscando manter-se na agricultura.

Neste sentido salienta-se o papel que a educação tem cumprido no processo de

desvalorização da vida rural, enquanto reforça a ideia de que o espaço urbano oferece mais

atrativos, tanto em trabalho, quanto em qualidade dos serviços públicos disponíveis. De outro

lado verifica-se na atualidade um movimento em defesa de uma educação voltada à realidade

rural, buscando despertar nos jovens novas expectativas a partir de fontes de geração de

trabalho e renda pautados pela multifuncionalidade e mesmo a agricultura em tempo parcial,

re-significando os sentidos “da vida no campo”.

Este contexto muda radicalmente quando a crise econômica que se instala no Brasil,

na década de 1980, provoca diminuição da oferta de empregos urbanos de maior

remuneração, enquanto os problemas da hipertrofia urbana passam a serem sentidos de forma

mais precisa. Assim, a atração pelo meio urbano se arrefece e, em algumas regiões, é o

trabalho em tempo parcial que guia as estratégias de reprodução social (mantendo a família

toda no campo, mas com alguns membros se assalariando em parte ou na integralidade no

meio urbano).

Já no início dos anos 2000, as condições de infraestrutura rural tem uma pequena, mas

significativa melhora com relação ao acesso à informação e sociabilidade, iniciando-se assim

Page 7: NOVAS SOCIABILIDADES NO RURAL CONTEMPORÂNEO: DO …icongresso.itarget.com.br/tra/arquivos/ser.5/1/5312.pdf · de Informação e Comunicação (TIC) como internet e telefonia celular

João Pessoa - PB, 26 a 29 de julho de 2015

SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

um processo lento, mas contínuo de mudanças a partir da expansão das TIC trazendo novas e

mais diversas possibilidades de interação social. Pergunta-se: Que implicações estas novas

sociabilidades têm sobre os atores do rural contemporâneo, mais especificamente sobre a

Juventude Rural?

A principal justificativa deste estudo está relacionada à hipótese que essas

transformações que podem estar ocorrendo no espaço rural terão reflexo em relação à

sucessão rural e, se compreendidas e atendidas às demandas desses atores, poder-se-á

estruturar um novo cenário de possibilidades e motivações.

Para tanto a investigação realizada pelos atores do presente trabalho realiza dois

movimentos: o primeiro apresenta o processo organizativo da AREJUR, conhecendo seus

códigos em relação às perspectivas político-culturais enquanto jovens rurais, avançando-se

desta forma para o conhecimento do processo de constituição de um campo em torno da

juventude rural como ator social coletivo, o qual se articula em torno de suas

demandas/expectativas e de um conjunto de relações institucionais. O segundo movimento

dirige o olhar para as transformações que perpassam o rural com a vivência e uso das TIC.

3. Expectativas e demandas prioritárias dos jovens rurais a partir das novas formas de

sociabilidade: experiências da Associação Regional da Juventude Rural da Região

Centro Serra- RS (AREJUR)

A AREJUR foi fundada no ano de 2005, constituindo uma entidade educacional,

social, cultural e esportiva com tempo indeterminado de duração, de fins não econômicos.

Permanentemente, tem como sede o município de Candelária, Rio Grande do Sul, podendo

atuar em todos os municípios em que exista organização de Conselho ou Associação

Municipal de jovens rurais filiados à entidade.

Segundo seu estatuto, a AREJUR tem como principais objetivos: a) ser um órgão

representativo dos conselhos e associações filiadas; b) assessorar os conselhos e associações

municipais filiadas; c) participar e apoiar os eventos dos conselhos e associações municipais

filiadas; d) divulgar os trabalhos realizados em prol da juventude rural em âmbito municipal,

regional e estadual nos meios de comunicação; e) buscar o patrocínio para a realização de

atividades sócio-educativas, tais como: excursões, encontros, convenções, exposições,

intercâmbios, seminários, desfiles, treinamentos de lideranças, atividades esportivas, culturais,

etc.

A formação da associação regional se insere no processo de organização social dos

jovens rurais, além da realização de eventos, aspectos legais e de legitimidade social,

constituindo um campo simbólico que valoriza as origens, os valores e a força do segmento

rural na região que tem a economia primária como motriz. Além disso, a mobilização dos

jovens por meio de conselhos e associações municipais possibilita a exaltação de sua

identidade enquanto categoria sociopolítica, com demandas, direitos e deveres específicos.

E é sob esta condição que as entidades sociais de jovens rurais têm conseguido

concretizar reconhecimento, laços de confiança e respeito nas comunidades ao longo do

tempo, legitimando-se cada vez mais a partir do avanço das tecnologias de informação e

comunicação e instrumentos digitais como as redes sociais.

Page 8: NOVAS SOCIABILIDADES NO RURAL CONTEMPORÂNEO: DO …icongresso.itarget.com.br/tra/arquivos/ser.5/1/5312.pdf · de Informação e Comunicação (TIC) como internet e telefonia celular

João Pessoa - PB, 26 a 29 de julho de 2015

SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

Trabalho realizado por Redin (2012) na Região Centro Serra/RS, identificou que a

expansão da internet tem sido estimulada nas famílias, por demanda dos jovens. Em Arroio do

Tigre, por exemplo, (um dos municípios constituintes da Região) 45% dos usuários são

famílias agricultoras (internet via rádio) que estão aos poucos, aumentando suas interações

com o mundo virtual, sendo um dos motivos citados o estímulo aos filhos. Esta informação

foi disponibilizada em 2012, pela empresa “Interativa Informática”, que atualmente detém

aproximadamente 95% dos usuários de internet no rural do município e boa parte do rural de

outros municípios da Região Centro Serra.

O acesso à internet via rádio vem facilitando a vida dos moradores rurais, em especial

a dos jovens, aproximando-os dos espaços sociais. No entanto, em certa medida, esse

processo pode provocar uma vontade intrínseca de sair do rural pela percepção fascinante e

idealizada do urbano por meio da exaltação a estilos de vida ancorados no consumo

exacerbado e facilitações de serviços, ampliando ainda mais as desigualdades entre o rural e

urbano no que se refere às condições de infraestrutura e lazer, provocando insatisfação dos

jovens rurais com as pertinentes desigualdades visualizadas (REDIN, 2012).

Ainda sobre o município de Arroio do Tigre, Redin (2011) observou várias famílias

com um, dois ou mais celulares, bem como, em menor expressão (mas já bastante visível),

computadores, internet via rádio e televisões a cabo. Também foram visualizadas famílias de

agricultores com acesso a informações em tempo real sobre o comportamento do clima

durante a semana, sobre as projeções para a safra, sobre o comportamento do mercado

agropecuário, do dólar, ou informações ligadas ao lazer e ao entretenimento.

Segundo o pesquisador, dentre as motivações citadas pelos agricultores para

adquirirem computadores ligados à internet, destacam-se os seguintes elementos: a) existência

de jovens na propriedade, que necessitam elaborar trabalhos pelo computador, para fins de

estudos no ensino médio, sendo muito custoso o deslocamento destes à cidade; b) o agricultor

adquire a tecnologia e os serviços de internet com o objetivo de motivar a permanência do

jovem rural na propriedade (REDIN, 2011). Esse último elemento é bastante relevante para a

compreensão da expansão do uso das TIC no meio rural, uma vez que, normalmente, são os

jovens são quem dominam o manuseio dos equipamentos. Em um processo de transferência

de conhecimentos os pais aprendem com os filhos estabelecendo a aceleração dos processos

de inclusão digital entre os agricultores.

Sob este aspecto, atenta-se para internet no espaço rural como uma possibilidade de

ampliação ou criação de novos espaços sociais e, em segundo plano, como auxílio no

processo de qualificação dos aspectos produtivos, possibilitando informação, conhecimento

de tecnologias e ainda qualificação profissional por meio e cursos à distância. Neste sentido,

Sorj (2003) esclarece que a internet pode tornar-se um investimento necessário para

potencializar o capital humano e social dos jovens e de agricultores familiares, mas para tanto,

é imprescindível mobilizar recursos e serviços relativos ao seu aperfeiçoamento, ligados

diretamente aos anseios dos jovens, como a possibilidade de acesso ao ensino agrotécnico e

cursos superiores voltados à vida rural. Nessa alusão, as TIC podem cumprir papel

fundamental na melhoria do conhecimento técnico e produtivo, na gestão da propriedade e

dos recursos naturais.

Outro trabalho significativo para as análises deste artigo foi realizado por

pesquisadores do NEPALS/UFSM no ano de 2013, onde em parceria com a Emater Regional

Page 9: NOVAS SOCIABILIDADES NO RURAL CONTEMPORÂNEO: DO …icongresso.itarget.com.br/tra/arquivos/ser.5/1/5312.pdf · de Informação e Comunicação (TIC) como internet e telefonia celular

João Pessoa - PB, 26 a 29 de julho de 2015

SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

de Santa Maria-RS foram realizados cursos de formação de lideranças jovens para as

associações de Juventude Rural da Região Centro Serra. Por ocasião de um dos encontros

realizou-se uma pesquisa investigativa a cerca das expectativas e demandas prioritárias dos

jovens rurais com a entrada das TIC no meio rural e em particular na casa das famílias.

As perguntas foram direcionadas aos jovens por meio da utilização da técnica de

Grupo Focal. A utilização desta metodologia, de abordagem eminentemente qualitativa, tem

como objetivo revelar as percepções dos participantes sobre os tópicos em discussão. Por

meio de um agrupamento de pessoas com objetivos e elementos em comum, discute-se

percepções e conceitos, promovendo no coletivo a formação de ideias específicas de um

grupo. A técnica gera possibilidades contextualizadas pelo próprio grupo, oportunizando a

interpretação de crenças, valores, conceitos, conflitos, confrontos e pontos de vista (DEBUS,

1997).

No campo das expectativas dos jovens da AREJUR foram citadas várias questões,

indo desde elementos produtivos, de planejamento, crédito entre outros, todos atrelados ao

“sucesso” dos jovens como empreendedores rurais. Dentre as respostas sugeridas pelos jovens

de cada associação constituinte da AREJUR, destaque para: 1) Criação de uma escola técnica

na região Centro Serra/RS para qualificação dos jovens rurais; 2) construção de políticas e

projetos específicos voltados aos grupos de jovens; c) melhorias nas condições de

comunicação, envolvendo demandas por acesso a internet e telefonia rural. Diante da voz dos

jovens, foram reivindicados ainda maiores investimentos destinados a empreendimentos

gestados por jovens rurais.

Estas expectativas dão visibilidade à necessidade de políticas de inclusão digital no

meio rural, buscando facilitar o acesso aos serviços de internet e, ainda, a qualificação dos

atores para o uso das informações, o que se daria por meio de escolas técnicas, universidades

ou institutos federais com oferta de cursos voltados para o meio rural, incluindo a modalidade

“à distância”, cada vez mais presente na formação dos jovens. Nota-se que a formação

aparece como elemento central nas demandas, sendo a oferta de cursos profissionalizantes

uma condição para a permanência do jovem no rural.

A percepção conjunta dos atores também aponta para expectativas de caráter regional

(e não apenas municipal) como a instalação de agroindústrias de beneficiamento dos produtos

produzidos pelos jovens da AREJUR, entendendo esta como condição de fortalecimento dos

produtores da Região Centro Serra, frente ao mercado consumidor. Também aparecem de

forma expressiva, expectativas por melhores condições das estradas, transporte e crédito.

Dentre as expectativas citadas, são colocadas como demandas prioritárias dos jovens da

AREJUR: 1) Incentivos socioeconômicos ligados às atividades de produção e

comercialização dos produtos produzidos e processados (caso das Agroindústrias Familiares);

2) Políticas que garantam a expansão e qualificação dos serviços de internet e telefonia

celular, possibilitando aos atores acesso e ampliação do uso das TIC; 3) Oferta de cursos

profissionalizantes voltados para o meio rural; 4) Melhorias nas condições de Infraestrutura e

transporte público (estradas e serviços de ônibus).

As narrativas obtidas pela pesquisa a partir da técnica de grupos focais mostram que a

Juventude Rural tem consciência de suas potencialidades, bem como as do espaço rural,

redefinindo seu sentido como espaço de vida. Para tanto, reivindica mecanismos de formação

profissional (Escolas Técnicas e Universidades), como forma de permanência e atuação

Page 10: NOVAS SOCIABILIDADES NO RURAL CONTEMPORÂNEO: DO …icongresso.itarget.com.br/tra/arquivos/ser.5/1/5312.pdf · de Informação e Comunicação (TIC) como internet e telefonia celular

João Pessoa - PB, 26 a 29 de julho de 2015

SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

socioeconômica e ainda, ampliação na oferta de serviços de infraestrutura básica, o que inclui

melhorias de deslocamento rural-urbano e ainda, avanços em termos de qualidade e acesso as

tecnologias da informação e comunicação, principalmente internet, como forma de adquirir

conhecimento e garantir interatividade, saindo do isolamento para o centro das sociabilidades.

Neste sentido, o conjunto de dados citados neste artigo, revela que as TIC mantem

relação direta com as expectativas e as prioridades estabelecidas pela juventude rural

entrevistada. Os jovens rurais conectam-se a outros jovens, trocam contatos, combinam dias

de lazer, encontros e jogos esportivos fortalecendo o sentido do “ser jovem rural”. Os

entrevistados relatam que através das redes sociais, informam-se do cotidiano, recebem

informações da comunidade local e até de noticiários nacionais e internacionais.

Compartilham e recebem informações, inserem sua visão de mundo e estão expostos a

contrapontos, o que permite-nos (os autores), identificar sua passagem de sujeitos ocultos

(off-line) a sujeitos visíveis (online) na sociedade contemporânea.

Quanto às redes sociais, percebe-se que estas convocam os jovens a organizarem-se

em forma de grupos para compartilharem informações, além disso, a rede social serve como

forma de convocação para participação de espaços deliberativos entre os grupos de jovens,

tanto em nível local, municipal ou regional, fortalecendo as organizações sociais.

A criação de perfis (Facebook) das entidades representativas, nas redes sociais (como

exemplo, a AJURATI) tratam de legitimar socialmente a ação dos jovens rurais, que

acontecem no espaço público e transcendem para a rede virtual. As participações da juventude

rural em festivais artísticos e culturais, eventos esportivos, espaços deliberativos sobre ações

de intervenção local/regional, organização de eventos sociais, participação em ações alusivas

à cultura e as convenções sociais do território podem ser encontradas nos sites e nas páginas

de relacionamento virtual.

A sociabilidade do jovem rural, em interação com diferentes usuários mediados pela

conexão digital promove entre os atores uma posição de autonomia em relação a suas

decisões, legitimada pela organização destes enquanto categoria social. No caso em estudo

(AREJUR) a representação organizativa cria uma rede social que congrega determinados

capitais sociais, culturais e simbólicos angariando um importante espaço na sociedade

regional, interagindo com as disputas e se relacionando enquanto categoria sociopolítica,

dotada de anseios e particularidades.

4. Considerações finais: os desafios da Juventude Rural enquanto categoria sociopolítica

emergente.

Os dados das pesquisas apresentadas demonstram a importância das Tecnologias de

Informação e Comunicação na construção da identidade da Juventude Rural e o consequente

fortalecimento desta enquanto categoria sociopolítica emergente. A possibilidade de

interação e interatividade entre os jovens, através da internet, permite a aproximação (mesmo

que virtual) dos atores, conectando-os por meio de uma rede de expectativas, demandas e

valores reforçando o sentido de “ser jovem rural” derivando daí, a organização social destes

enquanto atores sociais coletivos.

Por isso, acredita-se que o avanço das TIC no meio rural pode potencializar a ativação

de recursos humanos, como, por exemplo, o fortalecimento das organizações de jovens,

Page 11: NOVAS SOCIABILIDADES NO RURAL CONTEMPORÂNEO: DO …icongresso.itarget.com.br/tra/arquivos/ser.5/1/5312.pdf · de Informação e Comunicação (TIC) como internet e telefonia celular

João Pessoa - PB, 26 a 29 de julho de 2015

SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

gerando inclusive uma transmissão de valores e significados ligados ao ethos camponês

(Jovem Rural). Neste sentido, o processo de organização da Juventude Rural permite aos

jovens uma maior visibilidade enquanto categoria social, com expectativas e demandas

específicas, o que faz destes, “novos” atores no cenário político. A partir disto, são muitos os

que passam a ocupar funções públicas (vereadores, secretários, membros de consórcios

intermunicipais) e de liderança, como presidência de sindicatos, associações e cooperativas.

Diante deste processo de organização, constroem possibilidades de poder intervir nas políticas

públicas e nas decisões sobre o desenvolvimento de suas comunidades.

No entanto, as TIC ainda não atingiram uma escala totalizante no meio rural, mesmo

que se verifique um acentuado avanço no que diz respeito à popularização da tecnologia.

Deve-se ainda considerar que as TIC no rural brasileiro, apesar dos efeitos globalizantes, são

incipientes para munir a Juventude Rural de informações capazes de torná-los agentes

verdadeiramente ativos do desenvolvimento rural. Para tanto, se faz necessário um processo

de animação social que os conduza e mobilize, no sentido de torná-los sujeitos mediadores

das demandas locais com as expectativas e desafios do rural contemporâneo. Acredita-se que

os agentes de extensão e desenvolvimento rural devam exercer este papel, colocando-se na

condição de “impulso externo” às organizações da Juventude Rural.

No caso da AREJUR, partindo-se das TIC como fundamentais no processo de

fortalecimento dos jovens rurais enquanto organização social percebe-se que é na busca por

formação profissional, que a Juventude Rural pode encontrar nas TIC um grande potencial.

Esta pode viabilizar novas formas de construção de conhecimento e de aproximação com

instituições de conhecimento, como Escolas Técnicas e Universidades (inclusive por meio da

modalidade de “Ensino a Distância”) que passam a ser demandadas em caráter prioritário

pelos jovens rurais como condição para sua permanência no rural, como demonstram os dados

das pesquisas aqui citadas.

As TIC, ainda no sentido da qualificação profissional, podem garantir suporte

informativo nos aspectos produtivos, oferecendo dados de clima, mercado e suporte ao uso

das tecnologias agrícolas, oportunizando assim, a possibilidade de melhorias produtivas e

sociabilidade, transpondo a questão do isolamento e da falta de informação como

características do rural.

As experiências vivenciadas pela AREJUR demonstram o potencial da Juventude

Rural enquanto categoria sociopolítica emergente, colocando a organização da Região Centro

Serra-RS como destaque no Estado no que se refere à mobilização e visibilidade de Jovens

Rurais. No entanto, os desafios no sentido de efetivação destes enquanto protagonistas do

rural contemporâneo ainda são muitos, com destaque para a ausência de políticas públicas que

garantam sua legitimação enquanto atores do processo de desenvolvimento rural.

Quando referimo-nos às políticas públicas, entendemos que estas não podem limitar-se

à agricultura enquanto atividade produtiva, tendo em vista que o rural contemporâneo é cada

vez mais multifuncional e pluriativo. Assim, apenas políticas de crédito ou mesmo de acesso a

compra de terras não são suficientes para garantir a permanência destes no rural, fazendo-se

urgente, políticas voltadas a educação rural, lazer, saúde e acesso a cultura, na agendas das

políticas públicas brasileiras.

Neste sentido, quanto mais os jovens estiverem preparados para as “novas atividades”

que hoje perpassam o rural contemporâneo, maiores serão suas possibilidade de realização

Page 12: NOVAS SOCIABILIDADES NO RURAL CONTEMPORÂNEO: DO …icongresso.itarget.com.br/tra/arquivos/ser.5/1/5312.pdf · de Informação e Comunicação (TIC) como internet e telefonia celular

João Pessoa - PB, 26 a 29 de julho de 2015

SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

pessoal e profissional. Considerando que os jovens procuram afirmações para o seu futuro e

aspiram a construção de seus projetos, sendo estes geralmente vinculados ao desejo de

inserção no mundo moderno, o que é facilitado pelo uso das TIC.

Outro desafio atribuído à Juventude Rural enquanto categoria sociopolítica refere-se à

representatividade destes nas instâncias de decisão participativa das gestões públicas, como

vagas em fóruns colegiados, Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural, Cultura,

COREDES (Conselho Regional de Desenvolvimento) ou ainda fóruns deliberativos dos

Territórios da Cidadania. A inserção nos espaços de discussão e deliberação para o

desenvolvimento permite o exercício de seu protagonismo servindo como impulso ao

fortalecimento de suas organizações representativas, bem como, a afirmação da Juventude

Rural como categoria política.

5. Bibliografia utilizada

BORDENAVE, J. E. D. O que é comunicação rural. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1983.

BOURDIEU, P. O Poder Simbólico. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil, 1989.

BOURDIEU, P. O senso prático. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.

BOURDIEU, P. Questions de sociologie. Paris. Éditions de Minuit, 1984.

BOURDIEU, P. Questões de sociologia. 1984. Tradução de Miguel Serras Pereira. Paris: Les

Éditions de Minuit, 2003.

CAMARANO, A. A.; ABRAMOVAY, R. Êxodo rural, envelhecimento e masculinização no

Brasil: Panorama nos últimos 50 anos. 1997.

CAMARANO, A. A.; ABRAMOVAY, R. Êxodo rural, envelhecimento e masculinização no

Brasil: panorama dos últimos 50 anos. Rio de Janeiro: IPEA, 1999. 28p. Disponível em:

<http://www.dominiopublico.gov.br/download/ texto/td_0621.pdf>. Acesso em: 01 ago.

2012.

CASTRO, E. G. Juventude rural no Brasil: processos de exclusão e a construção de um ator

político. Revista Latinoamericana de Ciencias Sociales, Niñez y Juventud. Manizales, v. 7,

n. 1, jan. 2009.

CASTRO, E. G. Juventude rural: “apenas uma palavra” ou “mais do que uma palavra”. In:

XXIX ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS. 2005, Caxambu/MG. Anais... Caxambu/MG,

2005. p.1-38.

CGI.BR - Comitê Gestor da internet no Brasil – Pesquisa sobre o uso das tecnologias da

informação e da comunicação no Brasil: TIC Domicílios e TIC Empresas 2011. São Paulo:

CGI.BR, 2012. Disponível em: <http://op.ceptro.br/cgi-bin/cetic/tic-domicilios-e-empresas-

2011.pdf>. Acesso em 01 de Ago. 2013.

CHAMPAGNE, P. Elargissement de l’espace social et crise de l’identité paysanne. Cahiers

d’économie et sociologie rurales, nº 3, décembre 1986, p. 73-89.

Page 13: NOVAS SOCIABILIDADES NO RURAL CONTEMPORÂNEO: DO …icongresso.itarget.com.br/tra/arquivos/ser.5/1/5312.pdf · de Informação e Comunicação (TIC) como internet e telefonia celular

João Pessoa - PB, 26 a 29 de julho de 2015

SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

DEBUS M. Manual para excelencia en la investigación mediante grupos focales.

Washington(USA): Academy for Educational Development; 1997

DIRVEN, M. La herencia de tierras y la necesidad de rejuvenecimiento del campo

latinoamericano: propuestas preliminares. In: el VI Congreso de Economistas Agrarios de

Chile “Gestión de Transferencia Tecnológica en la Agricultura” 29-30 de Novembro de 2001.

Anais… Santiago do Chile, 2001.

FEIXA PÀMPOIS, C. A construção histórica da juventude. In: CACCIA-BAVA, A.; FEIXA

PÀMPOIS, C.; CANGAS, Y.G. Jovens na América Latina. São Paulo: Escrituras Editora,

2004.

FREIRE, Paulo. Extensão ou Comunicação? Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra, 1977.

GRAZIANO DA SILVA, J. O Novo rural brasileiro. Campinas, IE/UNICAMP, 1999.

REDIN, E. Entre o produzir e o reproduzir na agricultura familiar fumageira de Arroio do

Tigre/RS. 262p. Dissertação (Mestrado em Extensão Rural) PPGExR/UFSM, Santa Maria,

2011.

REDIN, E. Jovem rural em questão. Sociais e Humanas. Santa Maria, v. 25, 2012. p. 123-139

REDIN, E.; SILVEIRA, P. R.C. Juventude rural: experiências e perspectivas. In: SANTOS,

V. F.; VELA, H. A. G.; SILVEIRA, P. R. C. Educação rural no mundo contemporâneo. Santa

Maria: UFSM, 2012. p. 175-208

REDIN, E.; SILVEIRA, P. R.C.;GUIMARÃES, G.M.; DOS SANTOS, V.F. Juventude Rural

e novas formas de sociabilidade mediadas pelas TIC. Signos do consumo, São Paulo- SP –

v.5, n.2, 2013. p 225-244, dez. 2013

SIMMEL, G. Sociologia. Organizador [da coletânea] Evaristo de Moraes Filho; São Paulo:

Ática, 1983.

SILVEIRA, P.R.C. Reflexões sobre o modo de gestão em unidades de produção familiares –

um estudo exploratório. 209 p. Dissertação (Mestrado em Extensão Rural) PPGExR/UFSM,

Santa Maria, 1994.

SORJ, B. [email protected] - A Luta contra a desigualdade na sociedade da informação. Rio

de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.

STROPASOLAS, V. L. O mundo rural no horizonte dos jovens. Florianópolis: Editora da

UFSC, 2006.