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Novelas de Faroeste VIII · caminhou até que toda a beleza daquelas encostas se descortinassem diante dele. — Veja, Kiddo! Daqui até onde a vista alcança, e muitos acres além

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Novelas de Faroeste

Volume VIII

L P Baçan

Copyright © 2015 L P Baçan

Todos os direitos reservados. Este livro ou

parte dele não pode ser reproduzido ou

usado de qualquer outra forma nem

divulgado sem a expressa autorização do

autor, exceto o uso de partes para referência

ou comentários.

ISBN 978-1-329-81627-5

Lulu Press, Inc. 3101 Hillsborough St, Raleigh, NC 27607

2015

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O Velho e Selvagem Oeste

No Velho e Selvagem Oeste, o saloon era

o local mais movimentado e frequentado da

cidade. Ali aconteciam shows, dança, jogo e

muitas brigas. Ali se encontravam mocinhos

e bandidos, pistoleiros e desafiantes,

mulheres bonitas e perigosas. A maior parte

das histórias de faroeste passava por ele.

Dos ambientes mais simples e rudes aos

mais sofisticados, todos, indistintamente

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acolhiam moradores e forasteiros, cada um

com sua história, cada um com seu destino.

Famosos pistoleiros criaram fama nesse

local. Outros ali encontraram a morte, na

boca esfumaçada de um Colt. A fumaça da

pólvora negra era o manto lúgubre que

cobria mais um morto. Um punhado de

serragem era jogado sobre a poça de

sangue. Uma rodada gratuita de uísque

barato era servida e minutos depois

ninguém mais se lembrava do ocorrido.

Afinal, o Oeste era mesmo um lugar

selvagem e as Novelas de Faroeste mostram

isso.

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A Vingança do Caçador

Amanhecia nas montanhas ao norte de

Santa Fé. O sol projetava-se generosamente

nas encostas gramadas, onde pastavam

algumas dezenas de cabeças de gado

Longhorn e mustangues selvagens ainda.

A explosão deixou o gado inquieto e

assustou os cavalos, que galoparam para

longe, enquanto o eco ribombava por entre

as elevações rochosas.

Madson Jack acordou sobressaltado com

a explosão. No momento seguinte, o bebê

começou a chorar alto, também acordado

pelo barulho inesperado.

— Maldito seja você, Wink Van Horn!

— gritou ele, irritado, saltando da cama.

Hannah, sua mulher, já acudia o bebê,

tomando-o no colo e tentando acalmá-lo.

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Madson saiu para o quintal de sua

cabana, olhando os cavalos correndo em

debandada, no meio do gado agitado.

— Você precisa ir lá falar com ele,

Madson — falou-lhe Hannah. — Se não

puder parar com as explosões, pelo menos

que as faça mais tarde, quando o bebê já

estiver acordado.

— Esse sujeito é louco, achando que vai

encontrar prata nas terras dele. Devia estar

criando cavalos e gado, ao invés dessa

loucura. Vai acabar fazendo com que os

cavalos se arrebentem de tão loucos que

ficam. Vou lá agora mesmo falar com ele —

decidiu-se Madson, vestindo-se e saindo.

Parou, por instantes, no meio do quintal,

depois retornou e apanhou seu cinturão,

afivelando-o nos quadris.

— Acha que vai precisar disso? —

indagou Hannah, apreensiva.

— Como eu disse, aquele sujeito é louco

— afirmou Madson Jack, indo selar seu

cavalo.

Momentos mais tarde galopava na

direção do rancho de Wink Van Horn, um

holandês meio doido, que comprara aquelas

terras e cismara que encontraria prata nelas.

Vinha explodindo aquelas bombas havia

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alguns dias. As vacas leiteiras de Madson

simplesmente pararam de dar leite, após o

início das explosões.

Não precisou cavalgar muito. Wink vinha

fazendo as pesquisas numa encosta próxima

à divisa dos dois ranchos. Viu o grupo de

homens logo abaixo. Galopou naquela

direção. Eles gritaram e acenaram. Madson

olhou a sua esquerda. Viu, não muito longe

dele, a fumaça do estopim.

— Cobra dos infernos! — praguejou ele,

esporeando seu cavalo na direção oposta.

Mal havia se afastado, a explosão sacudiu

a montanha sob ele e jogou fragmentos de

pedra para o alto. A fumaça e a poeira

demoraram para se assentar, dando-lhe

tempo de chegar até os homens.

— Diabos, vizinho! Quase o mando pelos

ares — falou Wink, com seu sotaque

carregado.

Junto dele estavam um engenheiro de

minas e dois homens que chegaram ali com

o holandês. Um deles tinha todas as

características de um pistoleiro. Vestia

roupas pretas, com um colete de couro,

onde se destacavam botões de prata. Usava

um cinturão com dois coldres. Seus Colts

eram reluzentes, com coronhas de

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madrepérola. Tinha um chapéu de abas

retas, de onde se sobressaía uma pena de

águia. Seu olhar era sinistro.

Madson não gostara dele deste a primeira

vez que o vira. A antipatia parecia ser

recíproca, pois o pistoleiro o encarava com

olhos frios.

— Diabos, homem! Não pode começar

com essas explosões um pouco mais tarde?

Todos os dias você quase mata meu filho de

susto. O bebê não tem três meses ainda.

— Eu sinto muito, Madson, mas preciso

aproveitar todo o tempo de que disponho —

falou o homem alto e forte, com a pele

rosada, indo apanhar um pouco de café no

bule que aquecia junto a uma fogueira.

O engenheiro foi preparar nova explosão,

acompanhado pelo outro homem, que

parecia ser o entendido em dinamite. O

pistoleiro foi se encostar numa árvore e, de

longe, ficou apenas observando as ações do

rancheiro.

Estranhava que Madson usasse o cinturão

com a arma. Jamais o vira armado antes.

— Podíamos fazer um acordo, Wink.

Você começa as explosões após eu ter

tempo de acordar o bebê, amamentá-lo e

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depois levá-lo para longe. E também de

levar meu gado para outro pasto.

— Suas terras são enormes, Madson.

Tenho certeza que há prata nelas também.

Por que não as vende para mim? Ou

façamos uma sociedade para explorá-las.

Nada de gado e cavalos. Você vai ficar

rico...

— Não, Wink. Não comprei estas terras

para ficar rico. Só o fiz para ter um pouco

de sossego e poder criar minha família

tranqüilamente.

— Está jogando dinheiro fora...

O engenheiro fez um sinal de longe.

Novo estopim foi aceso. Os homens

trataram de se proteger atrás das árvores. A

nova explosão foi mais forte que a anterior,

jogando detritos para o alto.

A paisagem, ali, estava totalmente

alterada. Quando a poeira e a fumaça

novamente se assentavam, o engenheiro

apareceu, trazendo alguns fragmentos de

rocha nas mãos.

— Eu disse que estávamos perto — falou

ele, mostrando as rochas.

Engastadas no meio das pedras, viam-se

pequenos filetes de metal brilhante. Era o

minério de prata. Aquela configuração

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indicava que, nas imediações, havia um

veio muito rico. A questão ali era saber em

que direção estava o veio.

— Eu lamento, vizinho, mas vou ter que

incomodá-lo mais um pouco ainda, pelo

menos até sabermos em que direção está o

veio principal. Então abriremos ali um túnel

e as escavações serão menos barulhentas.

— Então, pelo menos, prometa-me que

só vai iniciá-las uma hora após o sol nascer.

É o tempo que preciso — pediu Madson.

— Está bem, acho que posso fazer isso

— afirmou Wink.

Não fora um resultado satisfatório, mas,

para Madson Jack, já era o bastante. Cedo

ou tarde aquele maluco desistiria daquela

bobagem e a paz voltaria às montanhas.

Quando foi apanhar seu cavalo, Concho

Valentine, o pistoleiro, pôs-se entre ele e o

animal.

— Vejo que está usando uma arma —

comentou, apontando o Colt que pendia no

cinturão de Madson.

— Sim, parece que todos usam uma arma

por aqui. Isso o surpreende?

— Sabe usá-la? — indagou o pistoleiro.

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— Não, eu a uso apenas como enfeite —

respondeu Madson Jack, encarando o outro

sem se impressionar.

— Pode se machucar, se não souber usá-

la. Acha que pode fazer isto? — indagou

Concho, sacando, com extrema rapidez,

uma de suas armas e disparando contra um

galho da árvore mais próxima, cortando-o.

Antes que o galho tocasse o solo, o

pistoleiro disparou de novo, cortando-o ao

meio.

Junto à fogueira, Wink olhava com

satisfação o desempenho de seu pistoleiro.

— Estou impressionado, moço. Você

atira muito bem — afirmou Madson,

contornando-o para ir apanhar seu cavalo.

— Não quer nos mostrar como sabe

atirar, vizinho? — provocou-o Wink.

— Ou talvez ele não saiba — zombou

Concho.

— Não carrego uma arma para ficar me

exibindo. Uso-a quando encontro cobras ou

outros bichos peçonhentos. Então eu a tiro

do coldre. Normalmente acerto onde aponto

— falou o rancheiro, com seriedade,

olhando o pistoleiro nos olhos.

Concho riu zombeteiramente, girando o

revólver no dedo indicador, antes de

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encaixá-lo no coldre, num movimento

rápido e hábil.

Madson virou-lhes as costas e esporeou

seu cavalo. Definitivamente não gostava de

Concho. Wink também não se esforçava

para ser simpático. Não via a hora de

terminarem com aquelas explorações.

— E então? — indagou Hannah.

— Essas porcarias de explosões ainda

continuarão por algum tempo. Estive

pensando no caminho para cá. Por que não

vai para a cidade e fica na casa de sua irmã,

até tudo terminar? — sugeriu ele.

— De jeito nenhum, Madson Jack. Esta é

nossa casa e não sairemos daqui assim tão

fácil. Se o gado pode suportar essas

explosões, nós também o faremos.

— Não vou nem discutir com você. É

mais teimosa que uma mula. Vou buscar

aquelas vacas que deixei no vale, junto ao

rio. Acho que já estão dando leite e poderão

substituir as nossas.

— Mas se trazê-las para cá, vai acontecer

o mesmo com elas.

— Não temos escolha, Hannah. O bebê

precisa de leite. Vou deixá-las o mais

distante possível.

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— Vai ter de cavalgar o dia todo para

trazê-las aqui.

— Não importa. Precisamos delas. Pode

preparar alguma coisa para eu comer no

caminho?

— Sim. Fique com o bebê enquanto eu

preparo — disse ela, entregando-lhe a

criança.

Com o bebê no colo, Madson Jack

caminhou até que toda a beleza daquelas

encostas se descortinassem diante dele.

— Veja, Kiddo! Daqui até onde a vista

alcança, e muitos acres além ainda, é tudo

nosso. Vamos enchê-la de gado e de

crianças. Cresça logo, case-se e tenha uma

porção de filhos. Vamos precisar de toda

ajuda possível — comentou ele.

Era muita terra. Os sonhos de Madson

eram grandes também. Tinha a terra que

sempre sonhara, uma mulher que o amava e

seu primeiro filho. Com o tempo viriam

outros. Queria uma família bem numerosa.

Queria vê-los cavalgando por aquelas

encostas, tornando aquele a mais rico e mais

próspero rancho da região de Santa Fé.

Nova explosão fez o bebê saltar em seu

colo.

— Cobra dos infernos! — exclamou ele.

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O bebê encolheu-se todo e começou a

chorar. O rancheiro foi para a cabana.

— Pobrezinho, Hannah! Devia ir para a

cidade com ele, até o maldito Wink

terminar essa droga de pesquisa...

— Madson Jack, já lhe disse uma porção

de vezes para não falar palavrões na frente

do bebê — repreendeu-o ela.

— Diabos, Hannah! Ele nem sabe o que é

isso...

— Mas um dia saberá, se continuar

repetindo-o diante dele.

— Está bem — concordou ele, passando

o filho para ela e apanhando o alforje que

ela havia preparado.

— Se não conseguir chegar antes do

escurecer, pare e acampe. Não tente

cavalgar no escuro, como fez da última vez.

— Certo, patroa! — brincou ele,

beijando-a e depois beijando o bebê.

Momentos mais tarde, descia a encosta a

galope

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No Santa Fé Saloon e Hotel, algumas

horas mais tarde, quatro homens ocupavam

uma das mesas ao fundo, na ala do

restaurante debruçando-se sobre os pratos

de comida como se aquela fosse sua última

refeição.

Tinham as capas de viagem amontoadas

na mesa ao lado. Estavam cobertas de

poeira. Haviam cavalgado muito para

chegar até ali.

Kate, a garota que servia as mesas,

aproximou-se, trazendo mais filés fritos.

Deixou a travessa sobre a mesa e ficou

olhando a maneira desesperada como eles

comiam.

— O que está olhando aí, garota?

— Nada. Nunca vi ninguém com tanta

fome...

— Culpa desse cretino aí que não

calculou a quantidade de comida necessária.

Estamos há dois dias sem comer —

explicou um deles.

— Eu tenho culpa se vocês comem como

cavalos? — defendeu-se aquele que estava

sendo acusado.

— De Tucson até aqui é uma longa

caminhada, seu idiota. Devia ter pensado

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nisso — acrescentou um outro. — Traga-

nos mais feijão, garota.

— Está bem — concordou ela, afastando-

se para retornar em seguida com outra

tigela.

Deixou-a sobre a mesa e foi cuidar dos

outros clientes. Naquele momento, Concho

Valentine entrou no restaurante, com seu ar

sinistro de sempre.

Examinou o ambiente com os olhos. Viu

os homens ao fundo. Esboçou um sorriso de

satisfação, enquanto caminhava na direção

deles.

— E então, seus bastardo! — disse ele,

puxando uma cadeira e sentando-se com

eles.

— Ei, Concho, seu filho da mãe.

Pensamos que tivesse morrido. Mal pude

acreditar, quando recebi sua carta — disse

um deles.

— Fizeram boa viagem?

— Exceto por um ou dois percalços,

graças a essa besta aí do seu lado —

respondeu o outro.

— Eu já disse que trouxe comida

suficiente para todos. Só não esperava que

comessem como lobos — defendeu-se de

novo o pistoleiro.

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— Continuam os mesmos. Não se

entendem, mas continuam juntos. Fico

contente que tenham vindo, rapazes, pois

tenho um serviço rápido para vocês. Rápido

e lucrativo.

— Quão rápido e quão lucrativo? —

indagou o que os liderava, cujo nome era

Dening Stone.

— Trabalho para esta noite mesmo.

Quinhentos dólares para cada. Vocês

partem hoje à noite mesmo.

— Hoje mesmo? Não vemos uma cama

há dias... Não durmo com uma garota há

mais de uma semana... Concho, podemos

partir amanhã cedinho... — falou o rapazola

chamado Joseph Sanders.

— Com quinhentos dólares no bolso

poderá dormir com muitas garotas, quando

estiver de volta a Tucson, Joe.

— Até com duas de cada vez, se agüentar

com elas — zombou o sisudo Lubock

Coolidge.

— Essa foi boa, Lubock! — riu Lou

Newcomb, o caolho.

— Chega de palhaçada, rapazes. Vamos

falar sério com Concho agora —

repreendeu-os Dening Stone. — O que

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vamos ter que fazer para merecer essa

grana, Concho?

— Fácil! Nas montanhas, ao norte daqui,

há um rancho que domina boa parte das

encostas e vales. O dono é um maluco que

veio ninguém sabe de onde. Vocês só tem

que ir até lá e matá-lo, juntamente com a

família dele.

— Só isso? — indagou Joe.

— Sim, só isso. Se quiserem saquear a

casa, tudo bem. Se quiserem se divertir com

a mulher dele, não me importo. Só quero

que partam na mesma noite e tratem de

despistar ao máximo. Da mesma maneira

como chegaram, vocês vão sair. Seria

prudente, inclusive, que não ficassem na

cidade, que seguissem em frente, dando a

entender que apenas estavam de passagem.

Entendido?

— Certo. E quando receberemos o

dinheiro?

— Agora mesmo. Aqui neste envelope

está o dinheiro e o mapa da região. A casa

está assinalada. Não há como errar. Vão lá

após o escurecer. Lembre-se: não deixem

pistas. Entendido?

— Entendido, Concho. Sem testemunhas

e sem pistas, não é?

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— Exatamente. Até a próxima vez,

rapazes. Quando eu ficar rico, mando

buscá-los para trabalharem para mim —

prometeu Concho, retirando-se.

Assim que o pistoleiro saiu do saloon,

Dening abriu o envelope. Havia uma porção

de notas graúdas lá dentro.

— Diabos, Stone! — reclamou Joe. —

São notas graúdas.

— Não importa, seu idiota! Podemos

trocá-las no banco. Aliás, vá fazer isso

agora mesmo, enquanto eu o os outros

estudamos este mapa.

— E não pense em fugir com o dinheiro

— alertou-o Lou.

— Eu jamais faria isso com vocês,

rapazes — sorriu Joe, piscando um olho,

antes de sair rapidamente.

— Acha que é seguro deixá-lo ir

sozinho? — questionou Lubock.

— Não sejam idiotas! Joe é incapaz de

dar um passo sozinho. Não se preocupem. O

dinheiro está seguro com ele. Vamos ver

este mapa agora — determinou o chefe do

grupo.

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Entardecia. Madson tentava apressar as

vacas e bezerros que conduzia, mas não

conseguia. Os pequenos animais paravam a

todo momento, cansados, enquanto as

vacas, com as tetas pesadas de leite, não

conseguiam caminhar mais depressa.

— Cobra dos infernos! — praguejou ele,

olhando o céu.

Não conseguiria chegar antes do

escurecer. Subir aquelas encostas era um

esforço adicional para aqueles animais e ele

se convenceu que forçá-los era inútil.

Teria que acampar e passar a noite em

algum ponto. Na manhã seguinte retomaria

a jornada.

Escolheu um vale estreito, entre duas

encostas, com uma regato que brotava

límpido e fresco das pedras. A pastagem era

boa e a água suficiente.

Acendeu uma fogueira, depois foi

apanhar o alforje onde Hannah havia posto

a comida e os utensílios de cozinha: a

frigideira e a chaleira para o café.

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Trouxe também os cobertor grosso,

suficiente para forrar a relva e cobrí-lo.

Enquanto a fogueira começava a arder, foi

retirar a sela do cavalo e preparar a cama

para aquela noite.

Não gostava de ficar longe do rancho

nem de Hannan e o bebê embora isso, às

vezes, fosse necessário. Tinha um trabalho a

fazer ali. Era muita terra, talvez mais do que

realmente precisasse, mas Madson Jack

empregara nela todo o dinheiro sangrento

que ganhara naqueles dez anos como

caçador de recompensas.

Era algo que nem Hannah sabia. Por

muito tempo, antes de conhecê-la, Madson

havia cavalgado por todo o oeste,

perseguindo rostos que conhecia apenas em

cartazes.

Escolhia sempre os mais perigosos,

porque eram os que rendiam mais. Era um

trabalho nojento, mas era o que sabia fazer.

Aprendera muito cedo a usar uma arma.

Agora, depois que se casara e comprara

aquele rancho, não voltara mais a usar uma

arma. Guardava as suas porque sabia que

cruzaria com serpentes e pumas naquelas

montanhas. Além disso, desde os doze anos

que se habituara ao peso de uma arma em

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seus quadris. Era difícil livrar-se disso

agora.

Levava sempre consigo o Colt de seis

tiros, calibre quarenta e cinco, num cinturão

com trinta balas, uma Winchester do mesmo

calibre e, eventualmente, uma Overland, de

canos duplos e curtos, de grosso calibre,

com pelo menos mais vinte cartuchos.

Eram armas especialmente preparadas

para uso imediato e certeiro. O Colt

deslizava facilmente do coldre. A

Winchester tinha a alavanca de

engatilhamento leve e macia, com um

gatilho sensível, de ação curta. A Overland,

quando aberta, expelia longe os cartuchos

usados, facilitando o remuniciamento.

— Cobra dos infernos! — murmurou ele,

quando tentou se lembrar de quantos

homens matara.

Havia sido um bom número deles, desde

ladr·es de diligências ou trens, até

assassinos comuns. Todos os que perseguiu,

Madson Jack conseguiu entregar à justiça.

Nem sempre vivos.

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Quando percebeu que o sol escondia-se

lentamente no horizonte, Hannah entendeu

que Madson não conseguiria chegar a

tempo. Torceu para que ele não bancasse o

cabeça dura e acampasse, evitando cavalgar

à noite.

Estava concentrada em seus afazeres,

quando ouviu o cachorro latir.

Ao sair à janela para olhar, viu um

cavaleiro que se aproximava, vindo da

cidade. Mesmo naquela distância, podia

deduzir que era Johnny, seu irmão.

Foi buscar o bebê. Johnny adorava o

sobrinho.

— Ei, Kiddo! — gritou de longe o

cavaleiro e o nenê agitou-se nos braços da

mãe.

Os dois sempre faziam muita festa juntos.

Era incrível como o pequeno Kiddo

reconhecia a voz do tio.

Johnny saltou do cavalo agilmente.

Trazia algo nas mãos. Era um brinquedo de

chocalho, que agitou diante dos olhos

brilhantes e vivazes do bebê.

Pegou-o no colo e brincou com ele, sob o

olhar enternecido de Hannah.

— Cadê o Madson?

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— Foi ao vale, buscar umas vacas

leiteiras. Nosso vizinho anda fazendo umas

explorações com dinamite e as vacas

leiteiras pararam de dar leite.

— Dinamite? O que ele anda

procurando?

— Disse que há prata nestas terras...

— E pode estar certo — afirmou o rapaz.

— Acha mesmo?

— Pelo menos é o que comentam na

cidade. Acho que o Madson podia fazer

algumas pesquisas também. Prata é muito

mais lucrativa do que cavalos e gado...

— Tente sugerir isso a ele.

— Ele tem muita terra aqui. Mesmo que

explore uma mina de prata, sobrará espaço

para os cavalos e o gado.

— Madson não comprou isto aqui para

ter lucro ou ficar rico. Quer apenas o

suficiente para nós. De qualquer modo, se

houver prata por aqui, ficará para nossos

filhos ou nossos netos. Eles poderão decidir

o que fazer.

— Muito esquisito esse meu cunhado —

comentou Johnny, brincando sempre com o

bebê.

— Por que diz isso?

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— Foi preciso muito dinheiro para

comprar estas terras. Sabe como ele o

conseguiu?

— Madson sempre me disse que herdou

de um tio, em Nova Iorque. Sempre achei

desagradável comentar o assunto. Mas

deixemos isso para lá. Vai passar a noite

aqui, não?

— Sim, claro. Vim para ficar alguns dias.

Talvez ajude Madson a fazer aquele novo

curral.

— Ótimo! Ele vai apreciar sua ajuda.

Vamos entrando agora. Vou preparar uma

sopa para nós. Acho que Madson não

voltará esta noite.

Entraram. Enquanto conversavam,

Hannah preparava o jantar. Tudo era

tranqüilidade ali.

Então o cachorro começou a latir.

— Deve ser o Madson chegando —

comentou Hannah.

— Vou dar uma olhada — falou Johnny,

saindo à porta da cabana e olhando ao redor.

O cachorro latia, voltado na direção da

trilha que vinha da cidade.

— Acho que meu cavalo o está

incomodando. Vou tirar-lhe o arreio e soltá-

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lo no curral — falou Johnny, entrando e

depositando o bebê no berço.

O cão ganiu e parou de latir. Aquele

silêncio repentino fez com que os dois

irmãos se entreolhassem.

— Johnny! — murmurou ela,

incomodada.

— Fique com o bebê. Vou ver o que está

havendo — disse ele, sacando sua arma.

Havia deixado a porta aberta. Quando

caminhou na direção dela, um homem

surgiu diante dela. Segurava uma

espingarda de cano duplo.

Tomado de surpresa, Johnny nem teve

tempo de reagir. A explosão sobressaltou-o,

ao mesmo tempo em que se via atirado para

trás, para cima da mesa.

Seu peito estava crivado de chumbo.

O bebê gritou, assustado. Hannah correu

até ele, apanhando-o e protegendo-o em

seus braços. Seus olhos estavam fixos na

porta, onde um a um aqueles quatro

homens, vestindo capas empoeiradas, foram

entrando e olhando-a com ar sinistro.

— Vão embora daqui! — gritou ela,

tentando correr para o quarto.

Joe Sanders antecipou-se a ela, barrando-

lhe a passagem.

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— Deixem-nos em paz... Vão embora! —

gritou ela novamente.

— Moça, é melhor deixar o bebê no

berço. Temos coisas a resolver — falou

Dening, apontando-lhe a espingarda que

acabara de recarregar.

— Quem são vocês... O que querem

aqui?

— Apenas conversar...

Lou e Lubock apanharam o cadáver de

Johnny, atirando-o lá fora, ante o olhar

horrorizado de Hannah. Percebeu que o

bebê corria perigo, ficando com ela.

Lentamente foi até o berço e depositou ali

o bebê, que ainda chorava.

— Faça o bebê ficar quieto, Joe. Você

sempre teve muito jeito com crianças —

ordenou Dening.

— Deixe comigo, Dening — falou o

rapaz, indo até lá.

Hannah estava em seu caminho. Ele a

segurou pelo braço e puxou-a, jogando-a

para cima de Lou Newcomb, que a agarrou

pelo pescoço e a obrigou a olhar.

Joe ergueu com uma das mãos o bebê,

que esperneava e chorava. Hannah debateu-

se, tentando ir em auxílio do filho. Sem que

pudesse fazer nada para impedí-lo, Joe

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sacou uma faca e simplesmente cortou a

garganta do bebê, que parou imediatamente

de chorar, debateu-se mais um pouco na

mão dele, depois imobilizou-se, banhado de

sangue.

O assassino depositou-o de volta ao berço

e cobriu seu corpo.

— Pronto, Dening. Problema resolvido

— afirmou ele, com seu ar quase demente e

as mãos sujas de sangue.

— Maldito bastardo! — gemeu Hannah,

com a força de uma fera encurralada,

livrando-se do braço que a prendia e

avançando contra Joe.

De passagem pela mesa, ela apanhou uma

faca de cozinha e cravou-se violentamente

no ombro esquerdo do pistoleiro. A lâmina,

com a violência do golpe, enterrou-se até o

cabo.

Não satisfeita, ela agarrou-o pelo rosto e

suas unhas traçaram sulcos profundos na

pele dele.

Joe urrou de dor, recuando, enquanto

Lubock e Lou agarraram Hannah,

imobilizando-a.

— É uma gata selvagem. Vamos nos

divertir muito com ela — comentou Dening.

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— Prefiro morrer — gritou ela, tentando

atingí-lo com um pontapé.

Dening desviou-se e, no momento

seguinte, esmurrou-a no queixo com força,

atordoando-a.

Sacou a faca, enquanto Joe, apoiado na

parede, olhava o sangue que escorria

lentamente do local onde a faca estava

cravada.

— Dening, ela me acertou... Maldição!

Estou ferido... — gemeu o rapaz, segurando

o cabo da faca e tentando tirá-la.

A dor foi lancinante. Ele tentou mover o

braço esquerdo, mas estava paralisado. O

sangue continuava brotando, lento e

constante. Ele puxou a toalha da mesa e pôs

encima.

— Segurem-na, rapazes! — ordenou

Dening, tirando o cinturão.

Com sua faca ele cortou as roupas de

Hannah, despindo-a. Depois, abaixou suas

calças. Os outros sorriam de satisfação,

esperando a sua vez. Até Joe esqueceu-se

do ferimento para observar o corpo nu e

desejável da mulher.

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Naquele dia, Wink Van Horn acordou

mais tarde do que de costume. Sua esposa,

como sempre, já havia se levantado e a

mesa do desjejum estava pronta quando ele

se sentou.

— Por que se levantou tão tarde hoje?

— Vou ao Rancho Jack, falar com

Madson. Ele esteve ontem lá onde fazemos

as explorações. Acho que não lhe dei toda a

atenção que merecia. As explosões andam

assustando o bebê deles e parece-me que há

um problema com as vacas leiteiras...

— É, acho que devia mesmo fazer isso. É

uma boa gente e Hannah me ajudou muito,

quando nos mudamos para cá. Lembra-se

disso?

— Sim, claro, como poderia me esquecer.

Vou até lá agora cedo.

— Leve-lhe algumas compotas que fiz.

Foi ela quem me ensinou, por isso creio que

gostará do presente.

— Está bem. Deixe tudo preparado. Vou

selar o cavalo.

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Algum tempo depois, quando o sol

firmava-se no céu, anunciando mais um dia

radiante, com o alforje cheio de vidros de

compota, Wink Van Horn preparava-se para

sair.

— Onde vai agora, Sr. Van Horn? —

indagou-lhe Concho, surpreso. — Esperava-

o.

— Vou até o rancho de Madson Jack

levar alguns vidros de compota...

— Quer que eu vá junto?

— Não, eu faço isso sozinho. Fique e

cuide do engenheiro e do técnico em

explosões. Quero mais algumas explorações

hoje, naquela direção que tomamos ontem.

— Pode deixar, patrão. Cuidarei de tudo

— falou o pistoleiro.

Wink esporeou seu cavalo, afastando-se.

O sol forte jogava luz e cores naquelas

encostas verdejantes. Enquanto cavalgava,

ele imaginava a fortuna em minério de prata

que poderia existir sob os cascos do cavalo.

Sabia que estava no caminho certo agora.

Encontrar aquele veio de prata fora um

sonho, desde que havia passado por ali,

certa vez, e analisado a composição do

terreno.

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O que ninguém sabia era que Wink Van

Horn, na Holanda, havia estudado geologia,

antes de aventurar-se no Novo Mundo, em

busca de uma oportunidade.

Havia percorrido alguns locais no Novo

México, onde sabia que o terreno era

propício à existência daquele metal. Quando

estudara, na Holanda, tivera informações de

um professor que viajara pelos Estados

Unidos.

Assim, seu grande sonho sempre fora

reunir algum dinheiro e comprar um pouco

daquelas terras ainda baratas. A prata o

deixaria rico.

Teve sorte, negociando gado no Arizona.

Foi onde conheceu Concho Valentine, que

lhe deu a sustentação em negócios nem

sempre muito honestos, onde fez fortuna.

Agora só precisava de um pouco mais de

tempo para atingir seu objetivo.

Aproximava-se da casa da Família Jack.

Estava tudo quieto. O cachorro não latiu e

logo ele descobriu o motivo. O animal

estava deitada diante da casa, com a

garganta cortada.

Logo à frente, estendido, estava o corpo

de um homem. Wink desceu do cavalo e

correu examiná-lo.

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— O que é isso? — indagou-se,

percebendo que se tratava do irmão de

Hannah.

Entrou na cabana. O fogo estava

apagado. Sobre a mesa, nua e com a

garganta cortada, estava o corpo de Hannah.

Percebia-se que fora barbarizada antes da

morte.

Lembrou-se do bebê. Viu a cabecinha no

berço. Aproximou-se. O bebê estava

imóvel. Levantou o cobertor.

— Oh, Deus! — murmurou ele,

horrorizado com o terrível quadro.

Recuou na direção da porta. Ouviu

barulho ali perto. Virou-se naquela direção.

Madson acabava de chegar. Ao ver o

cachorro morto e o corpo de Johnny, ficou

alucinado. Saltou do cavalo e correu na

direção da casa.

Wink estava pálido, olhando-o

atonitamente. Quando Madson aproximou-

se, segurou-o pelo braço.

— Não entre lá, vizinho! — disse.

— Por quê? — quis saber o rancheiro,

olhando o cachorro e o corpo de Johnny.

— Não é algo agradável de se ver e...

Madson não esperou que ele terminasse.

Livrou-se com um safanão e entrou na casa.

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— Hannah! Kiddo! — chamou ele,

imobilizando-se como se tivesse levado

uma pancada no estômago, ao ver o corpo

de Hannah sobre a mesa.— Oh, não, Deus!

Não! — berrou em seguida, abraçando a

mulher.

Seus olhos, então, dirigiram-se até o

berço. A visão com bebê, com a garganta

cortada, deixou-o enloquecido.

Quando cravou a cruz na sepultura de

Hannah, Madson deixou ali também toda a

sua dor de pai e marido. Estivera à beira da

loucura naqueles momentos dolorosos.

Agora, estava insensível, tão insensível

quanto costumava ficar quando pegava um

novo cartaz com um novo rosto a ser

perseguido. Não importava nada, além da

busca que tinha pela frente.

Wink Van Horn estivera todo o tempo

com ele, lamentando a tragédia, oferecendo

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sua ajuda. Juntos cavaram os túmulos.

Juntos haviam sepultados os três corpos.

— E agora, vizinho, o que pretende

fazer?

— Ainda não sei — respondeu Madson,

mas em sua mente começava a se definir

tudo que teria de fazer.

— Olhe, se decidir ficar, conte com a

minha ajuda. Se preferir vender as terras, eu

as compro. Tenho certeza que há prata

nelas...

— Não as venderei, Wink. Nada mudou

para mim. Minha esposa e meu filho

morreram por causa dessas terras. Hannah

dizia que aqui era seu lugar e que não sairia

daqui... Acho que, no fim, tudo aconteceu

como ela queria.

Wink foi apanhar seu cavalo. Os vidros

de compota ainda estavam no alforje.

— Vim até aqui para lhe trazer isto —

disse ele, pateticamente, mostrando um dos

potes.

— Obrigado, Wink! Mas não vou

precisar... Acho que devo ir à cidade

informar o xerife do que aconteceu aqui...

— Sim... Mas dificilmente ele virá aqui

ou formará uma patrulha para caçar os

assassinos...

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— Sei disso, mas tenho de fazê-lo.

— Está bem. Se precisar de ajuda, sabe

onde me encontrar...

Wink afastou-se a galope, consternado.

Madson ficou algum tempo rezando e

olhando as três cruzes. Fora tudo um

delicioso sonho para ele, um maldito

caçador de recompensas.

Tudo aquilo talvez fosse seu castigo por

tantos homens que matara ou que mandara

para a forca.

Sabia, no entanto, que não havia

encerrado sua carreira de caçador. Mesmo

que o tivesse desejado um dia, alguém

aparecera para mostrar-lhe que, para um

homem como ele, a paz e a tranqüilidade de

uma família era um sonho inatingível.

Caminhou ao redor da casa, observando o

terreno. Não tinha dúvidas quanto ao

número de assassinos. Eram quatro. As

marcas eram bem evidentes no chão.

Vieram da cidade. Deixaram os cavalos um

pouco afastado. Um deles se adiantara e

matara o cachorro, que estava preso a uma

corda.

Depois entraram na casa, matando

Johnny. Mataram depois o bebê. Abusaram

de Hannah, depois cortaram-lhe a garganta.

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A faca de cozinha jogada num canto,

manchada de sangue, dava a entender que

Hannah ferira um deles. Os pedaços de pele

e carne sob suas unhas indicavam que ela

resistira, até ser dominada.

Quatro homens haviam estado ali.

Haviam destruído todos os

25

seus sonhos mais queridos.

Apanhou suas armas e munição.

Reforçou seu alforje com mantimentos,

apanhou sua capa de viagem, depois trancou

a casa. Deu uma última olhada na direção

das sepulturas, depois pôs-se a caminho.

Deixava para trás o rancheiro pacato que

fora. Voltava a ser Madson "Cachorro

Louco" Jack, o pior e mais perverso caçador

de homens a oeste do Rio Mississipi.

O grupo havia cavalgado toda a noite e a

manhã inteira. Evitaram a cidade de Santa

Fé e tomaram a trilha para Albuquerque. Ali

poderiam tomar um barco e descer o Rio

Grande até Las Cruces, antes de El Paso,

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onde tomariam a trilha para Tucson,

finalmente.

Agora tinham dinheiro para isso e a

viagem de volta poderia ser mais

confortável que a de ida. A única coisa que

os incomodava, no entanto, eram os

gemidos e reclamações de Joe Sanders, cuja

ferida no ombro não parava de sangrar.

— Estamos próximos da cidade de

Stanley — comentou Lou. — Poderíamos

levá-lo a um médico e deixá-lo lá. Quando

sarasse, iria embora...

— Joe não conseguiria dar um passo

sozinho, vocês o conhecem. Se o deixarmos

para trás, em pouco tempo teria espalhado

para todo mundo o que fizemos. Se vamos

levá-lo a um médico, teremos de ir junto —

falou Dening.

— Ele vai nos atrasar. Além disso, já

perdeu tanto sangue que nem sei como se

agüenta na sela ainda — observou Lubock.

— Entramos nisso juntos e vamos sair

juntos. Não precisamos ter tanta pressa.

Ninguém nos perseguirá pelo que fizemos.

Talvez ainda leve muito tempo até que

alguém descubra o que aconteceu naquele

rancho.

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— Por que será que Concho queria

aquela família morta? — perguntou Lou.

— Como vou saber? A questão agora é

cuidarmos do Joe, antes que ele morra —

observou Dening.

— Vai ser difícil explicar o que

aconteceu com ele, com a cara marcada

desse jeito pelas unhas da mulher — falou

Lour.

— Diremos que ele brigou com uma

garota num bordel e que ela lhe fez isso.

Não será problema. Poderemos descansar

um pouco também. Estamos cavalgando

direto há muitos dias.

Nesse detalhe, Lou e Lubock

concordaram. Quando a Joe, idéia deles era

deixá-lo para trás, com uma bala na cabeça.

Afinal, ele tinha quinhentos dólares no

bolso que, divididos, engrossariam o prêmio

de cada um pelo trabalho feito.

Chegaram a Stanley no fim da manhã.

Enquanto Dening levava Joe até o médico,

Lou e Lubock foram para o saloon.

— Ele está muito fraco. Precisa de

repouso e uma boa alimentação para

recuperar-se — avisou o médico.

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— Em quanto tempo poderá voltar a

cavalgar? Temos de seguir viagem —

indagou Dening.

— Não antes de três dias, mesmo assim

correrá o risco de abrir novamente o

ferimento.

Dening pagou e ajudou Joe chegar até o

saloon.

— Eu posso cavalgar, Dening. Agüentei

até aqui, não? Fiquei firme na sela, não

fiquei? Não vou cair. Podemos seguir em

frente — afirmava o garoto.

— Não seja tolo, Joe. Você teve sorte de

não ter morrido sem uma gota de sangue no

corpo. Agora terá de repousar. Vai ficar no

hotel e se alimentar bem, até que fique bom

de novo para cavalgar.

— E vocês?

— Eu acho que devíamos seguir em

frente — afirmou Lou.

— Ou vamos juntos ou ninguém vai —

falou Dening, ameaçadoramente.

— Pode deixar, Dening. Eu ficarei bem.

Vocês podem ir na frente. Só me arrume um

quarto, uma garrafa e uma garota para

cuidar de mim. Garanto que não irei embora

enquanto não me sentir muito bem.

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— Vai gastar todo o seu dinheiro com a

garota e com bebida. Não conseguirá ir

embora depois...

— Ora, Dening, não sou criança. Posso

cuidar de mim. Não quero retardá-los ou

prendê-los aqui. Vão em frente. Só faça o

que estou lhe pedindo, nada mais.

— Está bem. Só que vou levar uma parte

do seu dinheiro. Deixarei uma passagem de

barco comprada para você, em

Albuquerque. Assim saberei que chegará

bem.

— Tudo que você quiser, Dening —

concordou o rapaz.

Madson sabia que os homens que haviam

atacado sua família eram de fora, talvez

vagabundos ou viajantes. Estranhou que

tivessem vindo da cidade, feito aquela

barbaridade, depois retornado quase que

pelo mesmo caminho, apenas desviando-se

da cidade e tomando a trilha para Stanley.

Dali para frente, tudo era palpite. Eles

podiam apenas estar despistando, para

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poder retornar a Santa Fé. Ou então,

poderiam estar indo para qualquer direção,

tanto para Albuquerque, quando para

Amarillo, em Oklahoma.

As pistas se confundiam naquela trilha,

em meio a tantas outras que vinham ou

retornavam de Santa Fé.

Parou ali, naquele ponto, pensando. Se a

intenção deles fosse apenas de despistar

para retornar depois, haviam avançado

demais. Poderiam ter feito isso antes, em

terreno rochoso, onde as pegadas haviam

sumido por um bom trecho, antes de serem

novamente encontradas por ele.

— Cobra dos infernos! — murmurou ele.

— Foram mesmo para Stanley — concluiu,

esporeando seu cavalo.

Aqueles homens tinham muitas horas de

dianteira. Estavam rumando para um lugar

definido. Se descobrisse para onde iam,

tudo se tornaria mais fácil, pois poderia

antecipar suas ações.

Daquela forma, tinha de jogar no escuro.

Era como procurar um bandido de quem

nada conhecia. Isso, no entanto, longe de

incomodá-lo, funcionava mais como um

desafio.

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Naquele caso, tinha uma motivação

especial. Apanhar aqueles homens era uma

questão pessoal. Jamais trabalhara com essa

motivação antes, por isso policiava-se,

tentando manter-se mais frio do que

normalmente seria.

Não podia deixar sua emoção prevalecer.

Chegou a Stanley no final da tarde. Se

um daqueles homens estava ferido, com

certeza teria ido procurar médico. Madson

fez o mesmo.

— Sim, atendi um rapaz hoje, no final da

manhã, com um ferimento a faca no

ombro... — lembrou-se o médico.

— Ele disse o que provocou o ferimento?

— Sim, o amigo que o acompanhava

disse que foi numa briga com uma garota de

bordel...

— Ele estava com um amigo? Só um?

Não eram quatro?

— Não — afirmou o médico, com

convicção. — Vieram apenas dois ao meu

consultório. Recomendei, inclusive, que o

rapaz ficasse em repouso e se alimentasse

bem. Não estava em condições de viajar.

— Viu para onde foram?

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— Acho que foram para o saloon. É o

único lugar que aluga quartos aqui em

Stanley.

— Acha que ainda estão lá?

— Pelo menos eu recomendei que não

viajassem...

Madson ia sair, quando o médico

resolveu fazer mais uma pergunta.

— Você conhece a garota que o agrediu?

— Porque que pergunta?

— Deve ser uma gata muito feroz. Além

de esfaqueá-lo, arrancou-lhe o couro do

rosto com as unhas.

Um frêmito de indignação percorreu o

corpo do caçador de recompensas. Devia ser

um dos bastardos que haviam atacado

Hannah

e barbarizado com ela.

Agradeceu. Deixou seu cavalo amarrado

diante do consultório e caminhou

lentamente na direção do saloon.

Havia pouco movimento nas ruas. Diante

do saloon, apenas dois cavalos amarrados.

Lembrou-se do que o médico dissera, a

respeito de serem apenas dois os homens

que estiveram lá. Poderia estar atrás de uma

pista falsa.

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Aproximou-se cuidadosamente da porta.

Antes de entrar, sondou o interior.

Apenas dois homens bebiam, encostados

no balcão. Nenhum deles estava ferido.

Entrou e dirigiu-se calmamente ao

balcão.

— O que vai ser, forasteiro? — indagou-

lhe o bartender.

— Uísque.

O homem serviu-o rapidamente.

— Parece cansado, homem. Cavalgou o

dia todo?

— Sim, o dia todo — respondeu Madson,

os olhos atentos aos dois homens ao seu

lado e à porta.

— Se quiser um banho, uma refeição, um

quarto e uma mulher, temos tudo isso aqui

— continuou o bartender.

— Acho que vou precisar de tudo isso,

nessa ordem, exceto a mulher — respondeu

Madson.

Os dois homens ao lado riram, sem

encará-lo. O homem atrás do balcão

também segurou-se para não rir. Madson

fuzilou-o com seu olhar mais glacial.

— Acho que posso providenciar tudo

isso, senhor — respondeu, tornando-se

sério.

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— Procuro quatro homens. Devem ter

passado por aqui no final da manhã ou no

começo da tarde — disse ele.

— Não me lembro de ter visto quatro

forasteiros... Viram alguma coisa assim,

rapazes? — indagou aos dois homens que

bebiam ao lado.

— Depende de quem quer saber —

respondeu um deles e os dois se viraram

para encarar Madson Jack.

— Eu quero saber — falou o caçador.

— E quem é você?

— Meus amigos me chamam de Madson

Jack... Meus inimigos costumavam me

chamar de "Cachorro Louco" Jack —

afirmou ele, desabotoando a capa e abrindo-

a para revelar o Colt.

— "Cachorro Louco" Jack? — repetiu o

homem, engolindo seco.

— Sim, você ouviu bem, rapaz. Viu

quatro estranhos na cidade hoje?

— Não estava aqui nesse horário... Tinha

ido recolher um gado ao sul da cidade...

Sinto muito, Sr. "Cachorro Louco" Jack.

Uma garota estava tirando garrafas de

uma caixa e arrumando-as na prateleira,

atrás do balcão. Parou e voltou-se para

encarar Madson.

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— Eu vi quatro sujeitos assim, aqui no

saloon, na hora do almoço. Entre eles estava

aquele rapaz ferido, o que alugou o quarto

de Ella. Os dois estão juntos lá encima —

falou ela.

— Quem está com eles?

— Apenas os dois. Os três amigos dele

foram embora.

— Para onde?

— Não sei.

— Em que quarto estão?

— Quarto doze, no fim do corredor, à

direita.

Madson entornou seu uísque, depois

retirou o Colt do coldre, verificando sua

carga. Guardou-o em seguida. Caminhou na

direção da escada.

— Espere um pouco, homem! O que

pretende fazer?

— Uma visita ao meu amigo —

respondeu Madson, sem se deter.

— Buck, vá chamar o xerife! — pediu o

bartender a um dos rapazes ali.

— Vai haver encrenca da grossa — falou

Buck, apressando-se em fazer o que o outro

lhe pedira.

Enquanto ele saía, os outros

acompanhavam os passos firmes e

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decididos de Madson, subindo a escada até

o corredor, no alto. Caminhou, então, até o

fim, parando diante da porta.

Não sabia o que encontraria pela frente,

mas sabia como enfrentar uma situação

como aquelas. Não era diferente de muitas

que enfrentara antes.

Sacou a arma, engatilhando-a. Em

seguida, meteu o pé na porta, bem encima

da fechadura. Com um estrondo, a porta

abriu-se até o fim, indo bater na parede ao

lado.

Na cama, Joe assustou-se ao ver aquele

homem entrar com a arma apontada para

ele. A garota nua que estava ao seu lado

pulou para um canto, enrolando-se num

roupão.

— O que está havendo aqui? — indagou

ela, assustada.

Joe olhava para o coldre de seu cinturão,

que pendia ao lado de sua cabeça, preso na

cabeceira da cama.

— Quem é você? O que pensa que está

fazendo aqui? — indagou o pistoleiro,

assustado também.

Madson aproximou-se, apanhou o

cinturão do outro e jogou-o na direção da

porta. Olhou o ferimento no ombro de Joe.

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— Onde conseguiu esse ferimento? —

indagou.

— Uma mulher, num bordel, fez isso...

— Que mulher? Em que bordel?

— Por que quer saber? — retrucou o

rapaz.

Madson inclinou-se sobre ele como se

fosse dizer-lhe alguma coisa. Ao invés

disso, o cano de sua arma atingiu o ombro

ferido do rapaz, que urrou de dor.

O sangue começou a escorrer para o peito

dele, enquanto encolhia-se contra a

cabeceira.

Madson fizera-o sentar-se com as costas

apoiadas contra a cabeceira da cama. Joe

tentava fazer parar o sangue que escorria da

ferida.

— Não tem o direito de fazer isso com

ele — falou a garota, começando a vestir-se.

— Este bastardo e mais três amigos

atacaram meu rancho ontem à noite.

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Mataram meu cunhado, estupraram e

mataram minha mulher e cortaram a

garganta de um bebê de três meses. Acha

que não tenho o direito de fazer o mesmo

com ele?

— Eu não fiz nada disso — defendeu-se

Joe, mas a garota o olhava agora

aterrorizada, sentindo-se enojada por ter

estado com um assassino frio e impiedoso

como ele.

Ela correu na direção da porta, mas, antes

de chegar lá, vomitou todo o seu asco.

Ficou apoiada ao batente da porta, enquanto

seu corpo abalava-se repetidas vezes.

— Agora só nós dois — falou-lhe

Madson, olhando-o com profundo ódio.

Joe viu a morte estampada nos olhos

daquele homem diante dele. Eram olhos

frios e penetrantes, que pareciam vasculhar

sua alma.

— Você tem que acreditar em mim... Não

fiz nada... Ela me atacou... Eu estava

ferido... Não podia fazer nada com ela...

— E estas marcas em sua cara? Por que

ela as fez?

— Eu só tentei segurá-la...

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Novamente o cano da arma atingiu Joe,

desta vez na testa, com força. Um filete de

sangue desceu pelo rosto dele.

— Vamos por parte, seu covarde. Antes

de mais nada, quero saber os nomes de seus

amigos e para onde eles foram — indagou-

lhe Madson.

— É melhor ficar quieto aí mesmo,

forasteiro. Aqui quem faz as perguntas sou

eu — falou o homem parado na porta,

apontando uma espingarda de cano duplo.

Madson virou-se e encarou o ajudante do

xerife.

— Quem é você? — indagou o homem

com a estrela.

— Sou Madson "Cachorro Louco" Jack

— respondeu.

— E o que faz aqui?

— Este homem esteve em meu rancho

ontem à noite, juntamente com três outros

amigos, e matou minha mulher, meu filho e

meu cunhado...

— É mentira. Nunca estive antes em

Santa Fé... Ele está me acusando

injustamente...

— Como sabe de onde sou? — indagou-

lhe Madson, fuzilando-o com o olhar.

— Você disse — afirmou Joe.

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— Não, ele não disse de onde era,

Ajudante Miller. Acredito que esse sujeito

seja mesmo um assassino... Olhe o rosto

dele... Apenas uma mulher desesperada

faria algo como aquilo — acusou-o a

garota.

— Isso tudo está muito confuso para

mim. Vamos todos para a cadeia. Quando o

xerife retornar, esclarecerá isso — decidiu o

representante da lei.

— Você não entende... Os outros três

estão fugindo. Preciso descobrir para onde

foram e quem são eles — falou Madson.

— Descobriremos isso no devido tempo.

Agora, mister, se soltar sua arma,

poderemos ir todos para a cadeia e resolver

isso com calma.

Madson olhou os canos duplos da

espingarda, apontados para ele. Não tinha a

menor chance.

Sentiu-se agoniado. Afinal, ali, diante

dele, estava um dos assassinos que poderia

dar pistas sobre os outros.

— Está bem — concordou, afinal,

deixando sua arma deslizar de volta para o

coldre.

— Vista-se! — ordenou Miller a Joe.

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— Estou ferido... Muito ferido... Perdi

muito sangue...

— E vai perder mais se não fizer o que

lhe mando — exigiu o ajudante.

Joe não teve alternativa também.

Instantes depois o grupo estava na cadeia.

— Onde está o xerife? — quis saber

Madson.

— Foi pescar, mas sempre volta antes do

escurecer. Agora fique calmo e espere. Ele

não deve demorar.

Madson percebeu que não adiantaria

tentar forçar sua liberação. De qualquer

forma, precisava da informação que Joe

tinha.

Sentou-se numa cadeira e esperou

calmamente, contendo sua impaciência. Joe,

apavorado, sentara-se no outro lado da sala.

O olhar que Madson lhe lançava o

assustava. Não sabia como sair daquela

situação.

O xerife chegou logo em seguida. Assim

que entrou, olhou na direção de Madson.

— "Cachorro Louco" Jack! Pensei que

tivesse se aposentado — disse o homem da

lei, indo até ele e estendendo-lhe a mão. —

O que faz por aqui?

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— Eu estava aposentado mesmo, Pat, só

que ontem, quatro bastardos filhos de uma

cadela foram até meu rancho, mataram

minha mulher, meu filho e meu cunhado.

Saí no encalço deles. Aquele é um dos

assassinos.

O xerife voltou-se na direção de Joe.

— É verdade o que ele está dizendo,

filho? — indagou-lhe o homem da lei.

— É mentira, xerife. Jamais o vi em toda

a minha vida... Nem estive em seu rancho...

Nem sei onde é...

— Pergunte-lhe como conseguiu aquele

ferimento no ombro e aqueles riscos na cara

— falou Madson.

— Foi uma prostituta de um bordel...

— Que bordel?

— Eu não me lembro — confundiu-se o

rapaz.

O xerife foi até ele. O ferimento

continuava sangrando. Joe estava bem

pálido já, tanto pela perda de sangue quanto

pela incômoda situação em que se

encontrava.

— Filho, conheço aquele homem ali há

mais de dez anos. Em toda a sua vida, ele

nunca disse uma mentira. Mas já arrancou a

língua de muitos mentirosos por aí.

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Aconselho você a ser inteligente e contar o

que queremos saber. Caso contrário, vai se

dar mal, muito mal mesmo.

Joe pensou por instantes. Sabia que

comprometeria seus amigos, se contasse.

Dening havia recomendado que, caso

alguma coisa acontecesse, que procurasse

mentir e negar sempre.

Era o que pretendia fazer.

— Estou falando a verdade, xerife —

afirmou, então.

O xerife voltou-se para Madson.

— O que mais posso fazer? Tem alguma

prova, além dessas marcas no corpo dele?

— Não, xerife. Nenhuma.

— Vai fazer alguma acusação? —

insistiu o Xerife Pat e Madson entendeu

onde ele queria chegar.

— Não, xerife. Talvez eu tenha me

enganado...

— Certo, Jack. Não tenho outra escolha,

senão soltar o rapaz.

— É justo, xerife.

— Espere um pouco — falou Joe,

percebendo a armadilha em que estava

sendo metido. — Não pode me deixar ir

assim... Ele vai me pegar.

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— Quer apresentar alguma queixa contra

ele? — indagou o xerife a Joe.

— Não, eu não... Mas ele vai me matar...

— Por que ele o mataria? — insistiu o

homem da lei.

— Por causa da mulher...

— Você fez alguma coisa a ela?

— Não, eu não, mas...

O xerife voltou a inclinar-se sobre Joe.

— Filho, não posso impedir aquele

homem de pegá-lo lá fora, tão logo você

saia daqui. O melhor a fazer ainda é

confessar. Por que não nos conta tudo? Eu

lhe garanto proteção.

Joe estava confuso. Não podia incriminar

seus amigos. Seria morto por eles.

Estava muito fraco. O sangue continuava

minando de seu ferimento. A pressão havia

sido demasiada. Ele sentiu tudo girar a sua

frente e a escuridão o envolveu.

Levaram-no ao médico, que novamente

tratou do ferimento dele e o mandou de

volta ao quarto no saloon, para repousar.

— O que se há de fazer, Jack? —

comentou o xerife, assim que o deixaram na

cama, desacordado.

— Bastardo! Simplesmente destruíram a

minha vida, xerife.

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— E há um detalhe, Jack. Amanhã o juiz

itinerante vai passar por aqui. Teremos que

levar o rapaz até ele. Como não há provas,

nada podemos fazer. Ele será solto e com

garantia de vida, que na certa pedirá ao juiz.

— Diabos, Pat. Ele é a minha única pista.

O xerife andou de um lado para outro,

pensativo. Algo parecia incomodá-lo.

— Jack, talvez possamos fazer um trato

— disse, finalmente o homem com a estrela.

— O que tem em mente?

— Há um vaqueiro num rancho próximo

daqui que espancou uma das garotas do

saloon, quebrando-lhe o queixo e deixando-

a inutilizada. Fizeram um acordo. Ele daria

a ela dez cavalos como pagamento, para que

ela pudesse viajar a San Francisco, onde um

médico resolveria o problema dela. Ocorre

que o filho da mãe do vaqueiro quer que

alguém vá até lá buscar os cavalos. Disse ao

meu assistente que ia pescar hoje, porque

tentei fazer isso. Não consegui. Não tenho

mais os nervos de antigamente...

— E o que está querendo me propor, Pat?

— Gostaria que fosse lá, em meu lugar,

apanhar aqueles malditos cavalos.

— O que o impede de fazê-lo?

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— Uma dúzia de amigos desse sujeito.

Pelo que espalharam, vão quebrar todos os

ossos de quem se arriscar a aparecer por lá

para apanhar os cavalos...

— E o que eu ganho com isso?

— Se fizer isso, Jack, eu entrego aquele

bastardo ali em suas mãos e você faz dele o

que desejar para conseguir as informações

que precisa.

— Isso vai me atrasar, Pat...

— Eu sei, Jack, mas não tenho escolha.

Além disso, parece que os homens que você

procura têm um endereço fixo. Estão

voltando para casa. Se existe coisa mais

certa do que o fato de Deus estar no céu é o

de que você vai pegá-los no ninho deles.

Madson pensou por instantes. Joe era sua

única chance de descobrir quem eram os

assassinos e para onde foram.

O xerife estava usando-o, mas não tinha

outra alternativa.

— Como vou fazer isso sem correr o

risco de ser perseguido como ladrão de

cavalos? — quis saber o caçador de

homens.

— Eu lhe darei uma estrela e o nomearei

meu ajudante. A estrela será sua garantia.

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— Grande garantia! Tem uma delas a

prova de bala? — ironizou Madson.

Concho Valentine havia percorrido toda a

cidade. Ninguém tivera notícias de Madson

Jack.

Cruzou com o xerife, na rua.

— Ei, xerife! Falou com Madson Jack

hoje?

— Aquele maluco das montanhas?

— Sim, ele mesmo.

— Não, há muito tempo que não o vejo.

— Não esteve de manhã na cidade?

— Como eu disse, não o vejo há muito

tempo, filho — respondeu o xerife,

afastando-se.

Concho foi até o saloon. Aproximou-se

do balcão e pediu um uísque.

— Não viu Madson Jack por aqui hoje?

— indagou ao bartender.

— Não, faz muito tempo que não o vejo

por aqui.

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— Fala daquele sujeito que comprou as

terras nas montanhas? — indagou um

vaqueiro, ao lado, no balcão.

— Sim, aquele maluco mesmo.

— Eu o vi no fim da manhã, na trilha que

leva à cidade de Stanley.

— Tem certeza?

— Sim, mas não conversei com ele.

Parecia muito apressado e tinha uma cara de

poucos amigos.

— Obrigado, amigo. Tome um trago por

minha conta — disse Concho, pensando no

que poderia ter acontecido.

Seus amigos haviam cometido um

maldito engano. Madson dissera a Wink

Van Horn que iria à cidade, avisar o xerife.

Ao invés disso, simplesmente sumira. Se

aquele vaqueiro não se enganara, Madson

estava indo no encalço de Dening e seus

amigos.

Precisava impedí-lo de conseguir isso, só

que não havia como

evitá-lo. Se Madson os alcançasse e os

fizesse falar, saberia que ele, Concho,

estava por trás de tudo aquilo.

Só poderia voltar a ter contato com

Dening após sua volta a Tucson. Até lá,

estava de mãos atadas.

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Antes do amanhecer, Madson já deixara a

cidade. Levava uma estrela de lata espetada

na capa de viagem e todas as suas armas

consigo.

Além do Colt na cintura, levava a

Winchester e a Overland, uma de cada lado

da sela, em seus respectivos coldres.

Galopou na direção do rancho informado

pelo xerife, chegando lá quando os

vaqueiros levantavam-se e dirigiam-se para

o refeitório.

— Onde posso achar Roy Carter? —

indagou a um vaqueiro que passava

apressado, na direção do seu desjejum.

— Se ficar aqui, vai vê-lo passar. É o

único palhaço aqui que usa um chapéu

amarelo.

— Amarelo?

— Eu lhe disse que ele era um palhaço —

confirmou o rapaz, adiantando-se.

O caçador não precisou esperar muito.

Logo um dos vaqueiros, com um chapéu

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amarelo vistoso, tipo "dez galões", de copa

alta e bojuda, saiu pela porta do dormitório.

Era um tipo magro, todo aprumadinho,

com um coldre baixo, onde balançava um

Colt com coronha de madrepérola.

Quando avançou, Madson pôs seu cavalo

no caminho dele.

— Quem é você? O que pensa que está

fazendo? — indagou ele, com arrogância.

Madson havia sacado sua espingarda de

cano curto, ocultando-a sob a capa.

— Você tem uma dívida e estou aqui

para cobrá-la — disse-lhe Madson,

mostrando-lhe a estrela.

O vaqueiro sorriu com cinismo e ia dizer

alguma coisa. O ruído dos gatilhos da

espingarda alertou-o. Os dois canos

surgiram discretamente, apontados para ele.

— Tenho pressa e gostaria de resolver o

assunto o mais depressa possível e com um

mínimo de sangue, se é que você me

entende — falou friamente o caçador.

— Do que está falando? — indagou o

cowboy, num fio de voz.

— Falo de dez cavalos que deve a uma

senhorita lá na cidade. Lembra-se disso?

Roy engoliu seco. A expressão daquele

forasteiro, seu tom de voz e aquela

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espingarda não lhe deixavam muitos

argumentos.

— Estão lá no curral. Terá de pegá-los —

falou o vaqueiro.

— Não, você os pega, amarra todos eles

pelo pescoço numa só corda e eu os levo

para a cidade. Agora vamos cuidar disso

agora mesmo.

— Ei, Roy, algum problema? — indagou

um de seus amigos.

— Não, está tudo tranqüilo por aqui. Só

estamos negociando alguns cavalos —

explicou Madson. — Não é mesmo, Roy.

— Sim, claro — concordou ele,

caminhando na direção do curral.

Enquanto ele reunia os cavalos, Madson

mantinha-o sob a mira da arma. Quando

terminou, pegou a ponta da corta e prendeu

no arção de sua sela.

— Quer assinar este papel agora? Fará a

transação ficar legalizada — ordenou

Madson Jack.

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Madson Jack sabia que aquilo não ficaria

barato, por isso, assim que se afastou do

rancho, escolheu um bom lugar para uma

emboscada.

Desmontou, amarrou bem os cavalos e

apanhou sua Winchester, subindo no alto

das rochas. Esperou pacientemente. Sabia

que em breve uma nuvem de poeira

indicaria que Roy Carter e seus amigos

estavam a caminho.

Não teve tempo nem de enrolar um

cigarro. Um bando de vaqueiros surgiu na

curva do caminho, saindo de trás de uma

colina.

Madson engatilhou sua arma. Roy era um

alvo fácil, na frente dos outros, com aquele

chapéu de copa alta na cabeça. E amarelo.

Mirou cuidadosamente e apertou o

gatilho. Roy julgou que o vento tivesse

arrancado o chapéu de sua cabeça. No

momento seguinte, quando o eco do tiro

soou pela planície, percebeu que fora algo

mais perigoso que isso.

— Protejam-se! — gritou e o bando

espalhou-se.

Madson mirou de novo cuidadosamente,

quando viu Roy desviando-se para a direita.

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Detestava fazer aquilo, mas não tinha

alternativa.

— Cobra dos infernos! — praguejou ele,

quando apertou o gatilho e viu o cavalo

montado por Roy dobrar as patas da frente e

girar sobre si mesmo algumas vezes,

enquanto o vaqueiro era atirado na poeira.

Alguns vaqueiros atiraram a esmo, na

direção nas rochas. Madson visou um deles

e arrancou-lhe o chapéu da cabeça com um

balaço. Fez o mesmo com mais dois ou três,

depois, calmamente, foi apanhar os cavalos

e ir embora.

Sabia que o ânimo dos vaqueiros teria

arrefecido.

— Bastardo, filho da mãe! — berrava

Roy, todo sujo de poeira, olhando seu

cavalo.

O tiro fora certeiro. O animal não sofrera.

Estava morto, quando caiu.

— Seu chapéu, Roy — disse-lhe um dos

amigos, aproximando-se e entregando-o.

O vaqueiro olhou o buraco de bala pouco

acima de onde estava sua cabeça e engoliu

em seco.

— Ficou ventilado agora, Roy, só que

você não poderá mais dar água ao cavalo

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com ele — falou outro e todos começaram a

rir.

— Do que estão rindo, seus bastardos?

Ele está indo embora. Temos que ir no

encalço dele. Está roubando meus cavalos...

— protestou ele.

— Roy, se quiser, eu lhe empresto meu

cavalo para você ir atrás dele, mas eu não

vou. Aquele homem atira demais. Viu o que

fez no seu chapéu. Viu o que fez com o

cavalo... — ponderou um deles.

— Ele não atira bem... Não se deixem

impressionar...

Um dos vaqueiros, com o dedo indicador

enfiado no buraco feito na copa do seu

chapéu, mostrou-o a Roy.

— Não seja estúpido, Roy. Se ele

quisesse, teria acertado minha cabeça —

disse ele.

— Maldição! — praguejou Roy, atirando

seu chapéu no chão e pisando-o, num

acesso de raiva.

Nada havia a ser feito a não ser amargar o

prejuízo. No fundo, reconhecia que seus

amigos tinham razão. Aquele homem que o

fora procurar tinha a morte nos olhos. Seria

loucura enfrentá-lo abertamente.

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O xerife não se surpreendeu, quando

Madson chegou com os cavalos.

— E então, teve algum trabalho? —

indagou.

— Não, nenhum. O rapaz foi muito

atencioso, até apanhou os cavalos e

amarrou-os para mim — disse Madson,

desmontando.

— Desculpe-me ter-lhe pedido isso, Jack,

mas estou ficando velho para certas coisas.

— Esqueça, Pat. Eu lhe fiz um favor,

você me faz um favor e assim todos ficam

felizes. Onde está o passarinho? Preciso

fazê-lo cantar agora.

— Está lá no saloon ainda. Deixei um dos

meus ajudantes vigiando-o. Pode pegá-lo e

levá-lo para fora da cidade. Não quero

tragédias aqui dentro, está bem?

— Certo, Pat. Já vou para lá. Quero

terminar isso o mais depressa possível.

Entregou os cavalos ao xerife, bem como

o recibo passado por Roy e foi

imediatamente para o saloon. O ajudante do

xerife conversava com o bartender.

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— Ele está lá encima, no quarto — falou

o rapaz.

— Sozinho? — indagou Madson,

começando a subir rapidamente a escada.

Correu até a porta, que estava aberta.

Nenhum sinal de Joe lá dentro.

O ajudante do xerife surgiu no fim do

corredor.

— Ele fugiu — gritou-lhe Madson,

olhando a janela no fim do corredor.

Estava aberta. Correu até lá. Um homem

poderia descer até o telhado da varanda e

escorregar para o chão.

Madson fez isso. Quando chegou à rua,

não viu sinal de Joe.

— Maldição! — praguejou ele.

Um garoto brincava ali perto. O caçador

chamou-o.

— Viu um homem descer pelo telhado

aqui para a rua?

— Sim, ele desceu, pegou um cavalo

malhado que estava ali, perto do armazém, e

fugiu a galope.

— Para onde ele foi?

— Para lá — apontou o garoto.

O auxiliar do xerife chegou naquele

momento.

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— Ele fugiu na direção de Albuquerque

— disse-lhe Madson, enquanto assobiava,

chamando seu cavalo.

O animal surgiu em seguida. Madson

montou-o. O animal estava cansado, mas

era resistente.

— Vai precisar de ajuda? — indagou o

ajudante.

— Não, de agora em diante é por minha

conta.

Joe levava uma vantagem, mas Madson

sabia o que aconteceria. Ao tentar escapar,

Joe forçaria seu animal até a exaustão.

Depois teria de parar para descansá-lo ou

correr o risco de ficar a pé.

Bastava seguí-lo numa velocidade

constante, sem cansar seu cavalo. Sabia que

o alcançaria logo. Sempre alcançava os

homens a quem perseguia.

Sem contar que Joe estava ferido e fraco.

Só esperava encontrá-lo com vida ainda.

Após algumas horas de cavalgada,

Madson viu um cavalo sem cavaleiro logo à

frente.

Preocupou-se, porque poderia tratar-se de

uma emboscada. Diminuiu a marcha e

apanhou sua Winchester.

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Viu um corpo caído no meio de uns

arbustos. Era Joe, com o tronco todo

coberto de sangue.

— Água... Água, por favor! — pediu ele.

Madson aproximou-se e desmontou. Joe

estava incrivelmente pálido e fraco pela

perda de sangue.

Pensou em dar-lhe água, mas desistiu.

Aquele animal estava morrendo. O melhor a

fazer era sacrificá-lo, antes que sofresse

mais.

Abaixou-se junto dele.

— Quem eram seus amigos? Para onde

eles foram? — indagou o caçador.

— Água... Água... — repetia Joe.

Madson percebeu que o rapaz estava com

febre e que, possivelmente, logo começaria

a delirar.

— Cobra dos infernos! — praguejou,

percebendo a ironia de tudo aquilo.

Tinha de fazer de tudo para que aquele

bastardo não morresse, antes de lhe contar o

que sabia.

Arrastou-o para a sombra de uma árvore.

Deu-lhe água. Apertou o curativo,

impedindo que sangrasse.

Percebeu que Joe era um homem morte.

Não escaparia daquela. Pelo menos Hannah

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poderia ter o consolo de saber que levara

um deles consigo.

— Muito bem, seu maldito! — falou-lhe

Madson. — Quem eram eles? Para onde

estão indo?

Joe abriu os olhos sem brilho, encarando-

o e reconhecendo-o. Começou a rir.

— Sabe... Eu menti para você... —

murmurou ele.

— Quem eram eles, maldição?

— Eu fui o último com ela... Estava

quente... Nem se debatia mais... Depois...

Depois sabe o que fiz?

— Cale-se! — ordenou Madson,

torturado, sacando a arma e enfiando a

ponta do cano na boca do rapaz.

— Depois eu fiz com ela o mesmo que

fiz com o bebê... Cortei a garganta dele com

esta faca — falou, puxando a faca que trazia

oculta em sua bota.

Só que estava muito fraco para qualquer

ataque. Madson tomou-lhe a arma e

posicionou a lâmina na garganta dele.

— Está bem, bastardo. Talvez goste um

pouco de seu próprio remédio. Vou cortar

sua garganta... Depois puxar a língua por

ela — disse o caçador, começando a cortar.

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Joe continuou rindo, olhando

pateticamente para ele.

— Maldito! — berrou Madson,

empurrando a faca com toda força, depois

fazendo-a correr pela garganta de Joe

Sanders.

O corte nem chegou a sangrar muito. Ele

ficou ali, o corpo estremecendo, os olhos

esbugalhados e um arremedo de riso

borbulhando em sua goela seccionada.

Madson levantou-se e caminhou de um

lado para outro, desesperado.

Joe havia sido sua única esperança, sua

única pista. Precisava saber para onde os

outros haviam se dirigido.

Revistou seus bolsos. Depois seu alforje e

sua sela, tentando achar alguma pista,

alguma indicação que denunciasse o destino

daqueles homens.

Nada escapou de sua busca minuciosa.

Havia um pedaço de jornal, embrulhando

um pedaço de fumo. O jornal era o Star, de

Tucson, no Arizona.

Encontrou perto de quatrocentos dólares

na bolsa da sela, junto com algumas roupas.

Havia uma etiqueta da fábrica nelas.

Também de Tucson. A sela tinha, gravada a

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ferro quente, na parte de baixo, a marca de

um seleiro de Tucson.

— Tucson! — murmurou Madson, sem

entender.

Por que alguém viriam de tão longe

apenas para matar sua família? Seria

alguma vingança? Acaso algum parente dos

homens que havia capturado resolvera

promover aquilo?

Era desumano. Todos os homens que

havia aprisionado eram criminosos e

assassinos. Jamais capturara um inocente.

Todos eles, somados, não valiam a vida do

pequeno Kiddo.

Além disso, aqueles quatrocentos dólares

davam a entender que o preço pago por isso

fora compensador.

Imaginou que caminho poderiam ter

tomado. O mais comum seria ir na direção

de Albuquerque. Chegando ao Rio Grande,

apanhar um dos barcos particulares que

desciam até Las Cruces, numa viagem mais

rápida e menos cansativa para homens e

animais.

De Las Cruces era só seguir a trilha

direto até Tucson, onde chegariam após

alguns dias de viagem.

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Deixou o corpo ali, mas levou consigo o

cavalo e a arma de Joe. Seria a única

maneira de descobrir seu nome e o nome de

seus amigos assassinos.

O melhor a fazer era tentar cavalgar à

noite também. Usando os dois cavalos,

poderia fazer isso e ganhar tempo. Estaria

cansado pela manhã, mas poderia, com um

pouco de sorte, surpreender os criminosos

ainda em Albuquerque.

Dening Stone bebia no saloon do Hotel

Albuquerque, onde Lou e Lubock haviam

insistido que parassem.

Ninguém os perseguia e eles tinham

dinheiro. Isso provocava cócegas. Veio

fácil, tinha de ir fácil também.

Além disso, Albuquerque tinha as mais

lindas mulheres distribuídas em dois ou três

bordéis renomados em todo o oeste.

A famosa Casa de Conchita, no Bairro

San Fidel, era o paraíso para os homens

com dinheiro para gastar. Era isso que Lou

e Lubock pretendiam.

Quando entraram no saloon, Dening mal

pôde reconhecê-los. Haviam feito a barba,

cortado os cabelos e comprado roupas,

chapéus e botas novas.

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— Ei, homem, por que não faz o mesmo?

Hoje à noite vamos nos esbaldar na Casa de

Conchita. São as mulheres mais bonitas do

oeste, Dening. É uma oportunidade única.

Quando acha que voltaremos aqui de novo?

— argumentou Lou.

— Ora, seu caolho, vocês estão gastando

todo o seu dinheiro com bobagens...

— E para o que você vai guardar o seu?

— quis saber Lubock.

— Tenho meus motivos. Se quiserem

gastar o de vocês, façam bom proveito. E

vou partir amanhã cedo, antes do nascer do

sol. Enquanto as belezas aí se enfeitavam,

fui até o rio e acertei o meu transporte. Um

barco descerá para Las Cruces logo pela

manhã e eu irei nele. Deixei acertado

também o transporte para Joe. Se quiserem

ir comigo, acho melhor irem até lá. Não há

muitos lugares, como sabem.

Lubock e Lou entreolharam-se. Não

haviam feito toda aquela maldita viagem

para perderem a melhor parte. Ainda tinham

muito dinheiro para gastar.

— Está bem, Dening. Se está com tanta

pressa de voltar, pode ir na frente. Eu e Lou

vamos gastar uma parte do dinheiro com as

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mulheres de Albuquerque. Acho que

merecemos isso.

— Como quiserem, rapazes. Só não

gastem tudo. Deixem um pouco para as

mulheres de Tucson — recomendou

Dening.

— Como estamos? Acha que vamos

agradar às mulheres da Casa de Conchita?

— Vocês estão mais cheirosos que

cabrito recém-nascido, rapazes. Com

certeza elas vão adorar vocês,

principalmente nessas roupas novas e com

esse dinheiro todo no bolso.

Os dois riram e pediram ao bartender

uma garrafa de uísque.

— Um dólar! — disse o rapaz.

— Tem troco para cinco? — zombou

Lou.

— Bem, acho que não... Preciso ver...

— Então faça o seguinte, rapaz — disse

ele. — Deixe a nosso crédito. Vamos beber

muito por aqui ainda...

Os três riram.

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O sol, ao se pôr, projetava as sombras das

montanhas mais altas, alongando-as pelas

encostas verdejantes. Os homens

encerravam mais um dia de trabalho.

— Não há dúvidas, Sr. Van Horn —

comentou o engenheiro. — O veio principal

fica justamente nas terras de seu vizinho.

— Maldição! Eu não esperava por isso —

resmungou o homem.

— Não conseguirá negociar com ele?

Talvez consiga comprar-lhe as terras,

depois da tragédia.

— Eu lhe fiz uma oferta, mas ele recusou

de imediato. Esse homem, de tão

desesperado que estava, pode ter caído no

mundo sem previsão de retornar.

— Veja bem, Sr. Van Horn, não existem

cercas marcando as divisas. Se deixarmos

um bom pedaço de terra para a exploração

do veio, poderíamos fazer uma cerca,

alterando as divisas dos dois ranchos. Com

um pouco de dinheiro, mais tarde, poderá

legalizar isso junto ao Escritório de Registro

de Terras — sugeriu Concho.

— Talvez até transferir as terras para o

seu nome.

— Está aí uma idéia excelente —

aprovou o engenheiro. — Se amanhã ou

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depois aparecer algum reclamando as terras,

elas estão ali. Se antes disso o seu vizinho

aparecer... Bem... A solução será negociar

com ele ou... — deixou ele no ar, olhando

para Concho.

— Ou Concho resolve tudo da maneira

mais rápida e fácil.

— Vou pensar no assunto, rapazes. De

qualquer forma, podem começar a preparar

o início da escavação do túnel. Vamos

precisar de gente, mas não quero

trabalhadores de Santa Fé. Podem dar com a

língua nos dentes...

— Trarei gente de Los Alamos —

informou Concho, satisfeito.

Madson tentara cavalgar durante toda a

noite, mas acabara cedendo ao cansaço e

parado para dormir um pouco. Acordou

quando o sol nascia, ouvindo as pragas de

uma garota.

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Caminhou um pouco, da margem do rio

onde estava, até a trilha. Uma garota, toda

coberta de poeira, chutava a carcaça

arquejante de um cavalo.

— O que houve aqui? — indagou ele.

— Este animal inútil... Comprei-o em

Albuquerque para ir até Amarillo e veja o

que aconteceu.

Ele se aproximou e examinou o animal.

Era um cavalo velho, muito velho, que

cedera ao peso da garota e da mala que ela

carregava.

Possivelmente enfiara uma das patas num

buraco, quebrando-a. Seus grandes olhos já

embaçados demonstravam todo o seu

sofrimento.

Madson sacou o seu Colt e antes que a

garota entendesse o que estava havendo, ele

disparou contra a cabeça do animal,

matando-o instantaneamente.

A garota olhou-o furiosa, com os olhos

soltando chispas, de tanta fúria.

— Eu não acredito que você fez isso... Eu

simplesmente não acredito — falou ela.

— Seu cavalo era velho e quebrou uma

pata. Está vendo aqui?

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— disse ele, mostrando o local onde o

osso formava um ângulo inesperado na pata

do animal.

— Maldito Ben Sommers! — berrou ela,

sapateando na poeira. — Disse-me que era

um bom animal e que me levaria até

Amarillo.

— Planejava ir até Amarillo sozinha,

nesse cavalo aí?

— Sim, por que não deveria? Os homens

fazem isso, não?

— Mas você estaria correndo um risco

enorme...

— Risco? Por quê? — indagou ela,

tirando um enorme revólver de sua sacola

de tecido. — Acha que não sei me

defender?

— Tudo bem, eu não devia mesmo ter me

metido — comentou ele, voltando para seu

acampamento.

No caminho foi apanhando gravetos e

madeira para reacender a fogueira. A garota

o seguiu.

— Ei, você tem dois cavalos — observou

ela.

— Sim, e daí?

— Poderia me vender um deles...

— Não. Preciso dos dois.

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— Por quê?

— É uma longa história...

— Eu não vou a parte alguma. Por que

não a conta enquanto eu o ajudo com o

café?

Madson olhou-a com atenção. Não era

uma garota normal, para estar ali, no meio

do nada, querendo chegar a Amarillo a

cavalo.

— Vamos, conte-me — insistiu ela,

pegando a chaleira e indo lavá-la no rio.

Encheu-a e retornou.

Se havia algo que Madson detestava, era

uma mulher faladeira e aquela parecia ser

uma. Apesar de jovem e bonita, as suas

maneiras vulgares incomodavam-no. Havia

muito deixara de conviver com aquele tipo

de mulher.

— Vamos, fale! — tornou ela.

— Está bem. Se está disposta... — falou

ele, contando-lhe sobre o que acontecera a

sua família e a pista que seguia.

Quando terminou, a garota o olhava

pensativa.

— Você disse que eram quatro homens.

Um morreu no caminho e os outros três

seguiram em frente, não?

— Sim, isso mesmo. Por quê?

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— Bem, eu trabalhava no Hotel

Albuquerque... Mais precisamente no

saloon...

— E o que fazia lá?

Em resposta, ela enfiou a mão na bolsa e

retirou um baralho.

— Sou jogadora... Jogo pôquer... Tive

um pequeno problema lá, ontem... Alguém

achou que havia um ás a mais no baralho...

Mas eu não tive culpa... Assim, resolveram

me expulsar. O xerife disse que me

prenderia, se eu estivesse na cidade ao

amanhecer. Foi por isso que tive de comprar

aquele cavalo no escuro...

— Certo, certo, certo — cortou-a ele,

com impaciência. — O que tem os três a ver

com o Hotel Albuquerque?

— Bem, acho que eles estão lá agora.

Pelo menos estavam até ontem à noite. Sei

que dois deles foram passar a noite na Casa

de Conchita. O outro ficou no hotel e, pelo

que sei, deve ter partido agora cedo para

Las Cruces, descendo o rio.

— Por que se separaram?

— Não sei, acho que dois deles

resolveram se divertir um pouco...

— Acha que os dois ainda estão lá?

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— Com certeza. Ninguém que eu

conheça consegue sair da Casa de Conchita

enquanto tiver dinheiro. E eles pareciam ter

muito dinheiro para gastar.

Madson nada disse. Apanhou a sela e foi

selar seu cavalo. Derramou a água da

chaleira na fogueira e guardou-a.

— Ei, por que a pressa?

— Preciso encontrar esses dois homens

— falou ele.

— E o cavalo, posso ficar com ele?

— Sim, leve-o. É seu.

Enquanto ela corria buscar sua mala,

Madson montou seu cavalo e afastou-se a

galope. A informação da garota deixara-o

esperançoso de encontrar dois dos

assassinos.

Quando chegou à cidade, não foi difícil

localizar a Casa de Conchita.

Todos dormiam ali ainda. Madson não

bateu na porta da frente. Deu a volta e

entrou pelos fundos, indo direto para o

refeitório da enorme casa.

Ali, diversas garotas, com caras

sonolentas e vestindo apenas suas roupas de

baixo olharam-no com interesse.

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— Ei, forasteiro, precisa de um banho, de

fazer a barba e de roupas novas para entrar

aqui — disse uma delas.

— Onde está Conchita?

— Quem quer saber?

— "Cachorro Louco" Jack — respondeu

ele.

— Será que ouvi bem? — indagou uma

mexicana entrando no aposento.

Beirava os cinqüenta anos, vestia-se com

esmero e seus traços ainda guardavam

muito da beleza de sua juventude.

— Cobra dos infernos! — gritou ela.

— Cobra dos infernos! — respondeu ele

e a mulher, feliz, atravessou o aposento para

abraçá-lo, apesar de toda a poeira que o

cobria.

— Há quanto tempo, Jack! — exclamou

ela. — Garotas, este é o pedaço de homem

mais pão-duro e mais gostoso de todo o

oeste. Em dez anos que o conheço nunca

consegui arrancar-lhe um centavo...

— Mas isso não a impediu de desfrutá-lo,

não? — observou uma delas.

— O que o traz aqui? Quer um banho?

Quer que lhe corte o cabelo? Quer

descansar apenas? Vamos, é só dizer. Estou

aqui para satisfazer seus desejos...

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— Procuro dois homens. Estão aqui

desde ontem. Gastam dinheiro como se ele

tivesse sido ganho muito fácil...

O rosto dela ficou sério.

— Vamos conversar em meu escritório

— disse ela, levando-o para outro aposento.

— Quem são esses homens e o que

fizeram?

— Fazem parte de um grupo de quatro

que matou minha mulher, meu filho de três

meses e meu cunhado...

— Meu Deus! Por quê? — exclamou ela,

horrorizada.

— Sinceramente, não sei. Peguei um

deles, mas não pôde falar. Esses dois, com

certeza, terão muito o que dizer.

— Por favor, Jack. Estou tendo alguns

problemas com a Liga das Senhoras Pela

Moralidade. O xerife me alertou que terá de

me expulsar, se acontecer alguma coisa

aqui...

— Prometo ser silencioso, Conchita.

Talvez faça um pouco de sujeira, mas isso

deverá pagar sua faxineira — falou ele,

pondo nas mãos dela o dinheiro que tinha

tomado do cadáver de Joe.

— Tudo isto? — espantou-se ela.

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— É que talvez eu faça muita sujeira

mesmo — afirmou ele.

— Sem tiros?

— Sem tiros — prometeu ele.

Conchita guiou-o até o quarto onde

estava Lou, o caolho. Abriu a porta e

mandou a garota que estava com ele sair. O

homem estava bêbado ainda, de tão festiva

e agitada que fora a sua noitada.

Quando a garota saiu, Madson entrou,

fechando a porta. Foi abrir as cortinas. Lou

resmungou, virando-se na cama, protegendo

os olhos com o travesseiro.

O caçador foi se sentar na beirada da

cama. Arrancou o travesseiro, jogando-o

para um canto.

— Ei, que diabos... — ia dizendo, mas

calou-se, cuspindo pedaços de dentes,

quando a coronha do Colt golpeou-o na

boca.

Antes que ele pudesse reagir, Madson

enfiou-lhe o cano da arma na boca

ensangüentada.

— Se abrir a boca, é um homem morto

— ameaçou.

Com os olhos refletindo surpresa e terror,

Lou concordou de imediato, balançando a

cabeça.

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Madson retirou-lhe o cano do revólver da

boca.

— Você e mais três outros estiveram em

Santa Fé e agora estão a caminho de

Tucson?

— Sim, sim...

— Como é seu nome?

— Lou Newcomb...

— E do garoto que deixaram para trás?

— Fala de Joe Sanders?

— Sim, Joe Sanders. Quem está aqui com

você?

— Lubock Coolidge. Dening Stone deve

ter partido para Las Cruces em um barco...

Que horas são?

— Hora de morrer.

— Quem é você? — indagou ele,

choramingando.

— Você não me conhece, mas conheceu

minha mulher, meu filho e meu cunhado —

falou Madson, olhando-o nos olhos.

— Não sei do que está falando... Eu

juro... Não fiz nada... Nada mesmo...

— Por quê? Quem lhes pagou para

fazerem aquilo? Responda! — ordenou-lhe

o caçador, pondo sua faca na garganta do

outro. — Se não me responder, farei a você

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o mesmo que fizeram a minha mulher e ao

meu filho...

— Ei, Lou, que tal estou? — indagou

Lubock, entrando naquele momento no

quarto, após chutar a porta.

Usava chapéu, cinturão e botas no corpo

nu. Por instantes ficou surpreso e atônito,

vendo a faca na garganta de seu amigo.

Depois, percebendo a ameaça, tentou sacar

sua arma.

Madson não tinha escolha. Não podia

disparar contra ele e causar problemas para

Conchita.

Assim, com rapidez, arremessou a faca,

que enterrou-se até o cabo no peito de

Lubock, que recuou, batendo as costas da

parede e escorregando para o assoalho.

— Ei, homem... Por que fez isto? —

indagou, pateticamente.

Lou percebeu que estava encarando a

morte. Girou o corpo na cama, tentando

alcançar o cinturão, que deixara numa

cadeira, não muito longe da cama.

Madson saltou no encalço dele,

derrubando-o. Com as forças do desespero,

Lou chutou-o. Com as forças do desejo de

vingança, o caçador arrastou-o, afastando-o

da arma.

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— Socorro! — gritou, mas não chegou a

repetir o apelo.

O punho de Madson enterrou-se em seu

estômago, fazendo-o tossir e dobrar-se em

dois.

No momento seguinte, com violência, a

bota do vingador subiu ao encontro do rosto

do outro.

O assassino tentou desviar-se. A roseta da

espora abriu um talho em seu rosto, por

onde o sangue escorreu generosamente.

— Maldito! — berrou ele, apanhando

uma cadeira e arrebentando-a no corpo de

seu agressor.

Possesso, Madson chutou-lhe um dos

joelhos, fazendo-o estalar. Lou caiu de

joelhos. O salto da bota atingiu-o na testa,

fazendo-o cair para trás.

Madson foi arrancar a faca espetada no

peito de Lubock, que morrera sem mais um

gemido.

Em seguida, aproximou-se de Lou. Este,

com o rosto transformado numa máscara de

sangue, tentou a última reação, urrando e

avançando contra Madson como um touro

bravo.

O caçador não arredou pé. Apenas firmou

o corpo, com o braço ligeiramente à frente.

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O próprio Lou fez a faca enterrar-se

profundamente em seu ventre. Ficou

olhando para os olhos de seu matador, que

não refletiam nenhuma emoção.

— Quem os mandou? — indagou

Madson.

— Jamais... jamais saberá — murmurou

Lou, enquanto o sangue escorria de sua

boca.

Furioso, Madson moveu a faca

lateralmente algumas vezes, depois puxou-

a.

Abobalhado, Lou ficou olhando para o

grande corte em seu ventre, por onde suas

tripas começavam a cair.

Tentou segurá-las, apertando-as com as

mãos. Caiu de joelhos. Levantou os olhos

atônitos para os olhos frios do caçador, que

simplesmente virou-lhe as costas e saiu.

Conchita o esperava do lado de fora, com

uma toalha molhada para ele se limpar.

— Quando você diz que vai fazer uma

sujeita, será mesmo uma grande sujeira...

— É uma sujeira de quatrocentos dólares,

Conchita.

— Tudo bem, pode deixar que eu cuido

de tudo agora. Farei com que eles sumam

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como se jamais tivessem existido. Terminou

seu trabalho?

— Não. Ainda há um deles, que deve ter

descido o rio, rumo a Las Cruces...

— Deve ter ido agora cedo, no barco de

Pepe Legrand. Ele sempre leva mercadorias

para desembarcar em Las Lunas, Bernardo e

Socorro. Se você cavalgar rápido, poderá

encontrá-lo em San Antônio, onde passarão

a noite.

— Obrigado, Conchita! — agradeceu ele.

— Espero que passe aqui, na volta,

quando terminar seu trabalho...

— Farei o possível — afirmou ele.

Deixou a casa e foi apanhar seu cavalo.

Era um bom animal, mas já estava muito

cansado.

Madson, no entanto, não tinha muita

escolha. Precisava ir no encalço do último

homem. Talvez este informasse-lhe porque

tudo aquilo tivera de acontecer.

Ia ser uma longa jornada, sem descanso,

rio abaixo. Estava no limite de suas forças

também, mas o desejo de vingança o

animava ainda.

Esporeou seu animal, seguindo a trilha

que margeava o rio. ã medida que avançava,

ia indagando sobre o barco de Pepe.

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Quando chegou a Las Lunas e perguntou

por ele, calculou que tivesse umas seis

horas de vantagem.

Em Bernardo, essa vantagem reduzira-se

para apenas quatro horas. De qualquer

forma, iria encontrá-lo em Socorro, naquela

mesma noite.

Teve de reduzir a marcha nas últimas

milhas. Anoitecera e seu cavalo estava

muito cansado. Ele também, após todo o

esforço daquele dia, sentia-se no limite.

Viu, ao longe, as luzes da cidade.

Tocheiros ardiam nas ruas, iluminando-as

precariamente. O céu limpo, com estrelas,

facilitou o resto da jornada.

Quando entrava em Socorro, a lua surgia

no céu, enorme, jogando uma claridade

quase irreal na paisagem.

Quando avançou pela rua, as pessoas o

olhavam como a um fantasma. Achou que

devia estar horrível, com o cansaço

estampado em seu rosto.

Desmontou e puxou seu cavalo pelas

rédeas, na direção do saloon. Amarrou-o no

tronco, junto ao bebedouro. Tirou a capa e o

chapéu e mergulhou a cabeça na água dos

animais.

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Ficou ali por algum tempo, tentando

manter-se acordado para poder pôr as idéias

no lugar e decidir o que fazer e por onde

começar.

Enfiou a cabeça mais uma vez no

bebedouro. Quando a levantou, viu uma

estrela reluzindo no peito do homem a sua

frente.

— Cobra dos infernos! — praguejou ele,

reconhecendo o xerife de Socorro.

— "Cachorro Louco" Jack, diabos,

homem, você parece um fantasma? O que

faz por aqui? Achei que tivesse se

aposentado...

— Bem que tentei, Hank, mas não me

deixaram.

— Venha, vamos entrar. Vou lhe pagar

um drinque. De onde está vindo?

— De Albuquerque...

— Caçando alguém?

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— Digamos que sim... — respondeu,

enquanto entravam.

Foram até o balcão. O homem da lei

pediu dois uísques.

— Quem está procurando?

— Procuro um homem, o último de um

bando de quatro, que matou minha família...

— respondeu, lutando para manter os olhos

abertos.

— Demônios, homem! — exclamou. —

Como aconteceu isso?

— Não sei ainda... Tudo foi muito

gratuito. Vieram de desde Tucson, até Santa

Fé, para isso. Acho que algum parente de

alguém que cacei por aí... Não sei... Estou

cansado demais para pensar, Hank.

— Como sabe que seu homem está aqui?

— Ele tomou o barco de Pepe Legrand

hoje cedo, em Albuquerque...

— Então está aqui, com certeza. Como é

ele?

— Não sei... Sei apenas seu nome...

— Qual é?

— Dening... Dening Stone.

— Certo, Jack. Vou lhe dizer o que

faremos. Você vai comigo até a cadeia. Eu

lhe empresto uma das celas. Você vai

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dormir, até descansar. Eu procurarei esse

homem para você.

— Não posso lhe pedir isso, Hank...

— Esqueça. Devo-lhe a vida ainda,

lembra-se? Aquele tiroteio em Cedar City...

— Eu já tinha esquecido aquilo — falou

Madson, incapaz de raciocinar.

Hank Hartley obrigou-o a apoiar-se nele

e levou-o para cadeia, acomodando-o numa

das celas.

— Fique aí e descanse. Seja como for,

seu amigo só partirá amanhã cedo, quando

Pepe resolver partir. Eu vou achá-lo e virei

avisá-lo.

Madson nem ouviu as últimas palavras

do amigo. Estava profundamente

adormecido.

Hank jogou um cobertor sobre ele, depois

deixou-o sozinho. Foi apanhar sua

espingarda.

Socorro era uma cidade muito pequena.

O único movimento era proporcionado

pelos barcos que ancoravam ali com

regularidade. Fora disso, era muito

tranqüila.

Hank não tinha auxiliares. Fixava seu

próprio horário de trabalho. Normalmente

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estava ativo durante as chegadas dos barcos

que desciam ou subiam o rio.

À noite, antes de ir dormir, fazia uma

ronda geral. A cadeia era sua casa. Ali

dormia e ali fazia as refeições, trazidas

diariamente pela filha do prefeito, por quem

ele estava interessado.

Não tinha muito a oferecer a uma mulher,

mas Sissy não exigia muito. Ser prefeito de

Socorro não fazia de seu pai um homem

mais rico.

Hank encarnava o homem valente, o

desbravador, o homem da fronteira, muito

embora, no alto de seus quase quarenta

anos, Hank já não tivesse a mesma fibra de

antes.

A aura, no entanto, o acompanhava. Uma

aura que brilhava mais forte quando alguém

como "Cachorro Louco" Jack aparecia para

lembrá-lo dos velhos tempos.

Fechou a cadeia e saiu para a rua. As

pessoas que viajavam no barco de Pepe

normalmente pernoitavam numa pensão à

beira do rio.

Era um ambiente sem requinte nenhum,

mas até certo ponto confortável, barato e

limpo, embora, no meio da noite, fosse um

lugar um tanto perigoso.

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Hank não se preocupou. Era o xerife de

Socorro e, como xerife, normalmente era

respeitado.

Quando entrou na cantina anexa à

pensão, pouca gente ainda estava acordada.

Havia uma garota mexicana conversando

com um vaqueiro, no fim do balcão. Um

velho tomava tequila e um outro, numa das

mesas ao fundo, bebia uísque sozinho.

— Olá, Pepe! — disse o xerife,

aproximando-se da mesa onde o velho bebia

tequila.

— Que se passa, xerife. Está acordado até

tarde hoje — observou o velho.

— Procuro um amigo... O nome é Dening

Stone...

— Quem quer saber? — indagou o

homem ao fundo, que bebia sozinho.

— Ei, calma. Não se ponha nos cascos,

homem. Sou o xerife daqui e preciso falar

com você — falou Hank, empunhando a

espingarda.

Os gatilhos, no entanto, não estavam

armados.

— O que quer falar comigo, homem da

lei? — perguntou Dening e suas mãos

escorregaram da mesa.

— Só quero saber de onde está vindo...

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— Como sabe meu nome?

— Uns amigos seus...

— Onde estão?

Hank percebeu a tensão no outro.

Percebeu, também, que as mãos dele

haviam sumido de cima da mesa.

Sentiu-se velho e cansado de tudo aquilo,

daquele jogo perigoso que tinha de fazer

como homem da lei.

A espingarda estava em suas mãos. Os

canos estavam ligeiramente voltados para o

homem a sua frente, mas não estavam

engatilhados.

Sabia que o outro já devia ter sacado a

arma e agora a apontava para ele, sob a

mesa.

Tentou apontar a arma na direção da

mesa, enquanto estendia o polegar,

pousando-o num dos gatilhos.

— Acho melhor não fazer isso, xerife —

alertou-o Dening.

— É melhor vir comigo, mister — falou

Hank, sentindo que sua própria voz tremia.

— Cometeu um erro vindo sozinho,

xerife — disse Dening, puxando lentamente

o cão do gatilho para trás.

Sua voz encobriu o barulho. Hank estava

tenso agora, olhando para a superfície da

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mesa. Algo lhe dizia que algo aconteceria

ali.

Num último e desesperado gesto, girou a

arma na direção de seu oponente, tentando

engatilhá-la.

A mesa deu um salto e lascas voaram,

enquanto o projétil passava por ela e ia

bater com força no peito de Hank, fazendo-

o recuar alguns passos.

Sentiu um gosto de sangue na boca e o ar

lhe faltar no pulmão, varado pela bala.

Olhou Dening, que jogara a mesa para o

lado e avançava na sua direção,

engatilhando o Colt.

— Não! — disse fracamente, quando o

pistoleiro encostou a arma em seu rosto e

apertou o gatilho.

Fragmentos de ossos, cérebro e cabelos

de Hank Hartley espirraram nas paredes

sujas da cantina.

O pistoleiro correu para a porta e saiu

rapidamente, sumindo na escuridão.

Não muito longe dali, Madson saltava no

catre, pondo-se em pé instantaneamente. O

eco dos tiros ainda ribombavam pelas

barrancas do Rio Grande.

— Hank! — gritou, ainda aturdido,

correndo para a rua.

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Algumas pessoas surgiram nas portas e

janelas.

— Veio do rio... Acho que foi encrenca

na cantina de novo — disse alguém.

Alguns homens corriam na direção do

rio. Madson acompanhou-os, torcendo para

que não tivesse acontecido o pior.

Lembrava-se de ter ouvido Hank dizer

que iria procurar o quarto homem e trazê-lo

para Madson.

— Oh, não! — exclamou, quando viu o

amigo deitado, com o rosto simplesmente

irreconhecível, após o balaço.

— O homem atirou nele, depois fugiu na

direção do rio... Hank falou o nome dele...

Um tal de Dening Stone... Nunca o tinha

visto antes... — explicava Pepe.

— Para onde ele foi? — indagou o

caçador.

Pepe Legrand apontou.

Madson deixou o local e correu,

acompanhando a margem do rio. A lua

projetava uma claridade generosa sobre a

planície cortada pelo rio.

Ele não teve que correr muito para

perceber o homem que fugia.

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— Cobra dos infernos! — murmurou ele,

recuperando todas as suas forças e suas

energias.

Dening Stone não percebeu que era

perseguido, a não ser quando Madson

estava muito perto.

Sacou sua arma e disparou algumas

vezes, mas Madson foi mais rápido,

escondendo-se e rastejando na direção dele.

Dening voltou a disparar algumas vezes,

mas estava perdido naquele terreno que não

conhecia.

Madson, no entanto, já havia passado

antes por Socorro. Conhecia aquela

planície. Conhecia o rio.

Rastejou até o barranco, descendo por ele

e correndo pela margem do rio, até

ultrapassar Dening.

Feito isso, retornou ao terreno firme e

ficou oculto. O pistoleiros e assassino

disparou mais algumas vezes, depois correu,

justamente na direção dele, enquanto

ejetava as cápsulas vazias de sua arma e

começava a recarregá-la, em desespero,

deixando as balas caírem pelo caminho.

Madson esperou-o como uma fera antes

do bote. Quando ele passou, o caçador

vibrou a coronha de sua arma, batendo-a

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com força na testa de Dening Stone, que

gemeu, surpreso, antes de estatelar-se na

relva.

Mal teve tempo de compreender o que

acontecia e Madson já lhe chutava a mão

que ainda segurava o Colt.

— Meu pulso... Você quebrou meu

pulso.. — gemeu Dening.

— Não será a primeira nem a última

coisa que quebrarei em você, maldito

bastardo — vociferou Madson, chutando-

lhe algumas vezes as costelas, sentindo os

ossos quebrarem-se no bico de sua bota.

O assassino gemia e rolava no chão,

tentando fugir aos golpes. Havia perdido a

arma e estava totalmente indefeso contra

aquele homem que o atacava como o pior

castigo do inferno, sem dar-lhe nenhuma

trégua.

Madson só parou quando percebeu que

seu oponente estava subjugado totalmente.

Então parou para respirar.

Estavam sozinhos ali. A cidade ficara

para trás. Perto dali, o Rio Grande corria

sereno, no trecho largo e profundo.

O caçador sentou-se ao lado da caça,

extenuado. Estava ali o último dos malditos

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e o último a dar-lhe as respostas que

precisava.

Queria entender tanto ódio. Queria saber

por que sua esposa e seu filho tiveram que

morrer de forma tão cruel e desumana.

Dening gemeu e começou a mover-se,

rastejando na relva.

— Você é Dening Stone?

— Sim, e você, quem é?

— Sou Madson "Cachorro Louco" Jack...

— E daí, homem? Eu não fiz nada contra

você...

— Você matou minha mulher, meu filho

e meu cunhado... Filho da mãe... Maldito!

— berrou Madson, chutando a cabeça do

outro.

— Por favor... pela memória de sua

esposa e de seu filho... — suplicou Dening.

Madson se abaixou sobre ele, pôs o

joelho em seu peito e esmurrou-lhe o rosto

até seus punhos sangrarem.

— Não use o nome de minha mulher e de

meu filho depois do que fizeram com eles...

— gritou Madson.

— Por favor... Por favor...

— Você é um homem morte, Dening

Stone. Faça suas orações. Antes do sol

nascer, você estará no inferno.

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— Não, poupe-me... Você precisa

compreender...

— Não há perdão para o seu crime. Se

lhe resta ainda algum resquício de

dignidade, diga-me o nome de quem o

contratou. Eu preciso entender porque

fizeram isso comigo...

— Eu não sei dizer porque mandaram

fazer isso... Mas faço um trato com você —

disse o assassino, sabendo que sua vida

acabaria mesmo antes do sol nascer.

— Não está em condições de fazer tratos,

moço. Seja lá quem foi que mandou, vocês

o fizeram e pagarão por isso. Seus amigos já

foram. Só falta você agora...

— Por favor... Eu conto quem nos

contratou...

Madson ergueu-se, respirando fundo.

Precisava controlar-se. A informação que

precisava estava com aquele homem. Tinha

de saber porque sua mulher e seu filho

morreram estupidamente.

— Está certo, só não peça por sua vida —

disse, afinal.

— Não, não pedirei por minha vida. Em

meus bolsos, vai encontrar perto de

quinhentos dólares. Faça esse dinheiro

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chegar até minha irmã, Lucille Stone

Colver, em Tucson...

— E por que eu faria isso?

— Você teve um filho... Sabe como isso

é importante...

— O que é tão importante que possa

justificar a morte de três inocentes?

— Por favor... Eu não tinha escolha...

Quando me encomendaram o serviço, sabia

que receberia bem... Eu precisava desse

dinheiro...

— Para gastar com mulheres e bebidas,

como seus amigos?

— Não, eu não gastaria meu dinheiro

inutilmente... Mande-o para minha irmã...

Ela levará minha sobrinha para Colorado

Springs... O médico recomendou... Ela tem

tuberculose... Morrerá, se não for fazer o

tratamento lá... Os quinhentos dólares eram

para isso...

— Cobra dos infernos! — praguejou,

Madson, angustiado. — Para salvar sua

sobrinha, você não tinha o direito de matar

os meus entes queridos!

— Eu não sabia... Pensamos que

tivéssemos matado o casal e o filho...

Conforme foi solicitado...

— Quem mandou?

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— Mandará o dinheiro para minha irmã?

Lucille Stone Colver, em Tucson?

O caçador caminhou de um lado para

outro, fora de si, percebendo como tudo

aquilo era nojento e fedia.

Aquele homem também matava por

amor. Só que, naquela tragédia, Madson

fora a vítima. Ele, que tantas vezes fora o

carrasco, experimentara pela primeira vez a

tragédia de ser a vítima.

O que aquele homem que iria morrer lhe

pedia não podia ser recusado. Afinal,

custara a vida de três pessoas.

— Eu prometo. Ela receberá o dinheiro.

Agora conte-me, quem foi o maldito

bastardo que mandou fazer isso?

— Concho Valentine...

— Quem? — surpreendeu-se Madson.

— Concho Valentine... O pistoleiro... O

pistoleiro do holandês...

Por momentos Madson ficou sem

entender. Não tinha sentido nenhum o que

aquele homem estava falando.

— Fala do pistoleiro que trabalha para

Wink Van Horn?

— Sim... Ele mesmo... Aqui... no meu

colete... Há uma carta dele, chamando-nos

para ir a Santa Fé...

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Madson inclinou-se sobre ele e tateou os

bolsos do colete. Sentiu o volume do

envelope.

Dening, no entanto, havia sacado a faca

que trazia na bota. Enquanto Madson

retirava o envelope do bolso do homem

caído, este brandiu a faca, enfiando-a no

lado esquerdo do corpo do caçador, entre as

costelas.

— Cobra dos infernos! — gemeu

Madson, sentindo a dor insuportável nublar-

lhe os olhos.

Viu os olhos brilhantes de Dening,

refletindo o brilho da lua. Viu-os encherem-

se de pavor quando enfiou-lhe na boca

aberta o cano do Colt e apertou o gatilho.

A boca do pistoleiro iluminou-se

estranhamente. Quando o brilho apagou-se,

Madson apagou-se com ele.

Aquela não seria a primeira nem a última

cicatriz no corpo de Madson, só que a

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lâmina penetrara profundamente,

perfurando seu pulmão.

Respirar era um tormento. O sangue fluiu

dias a fio, a cada vez que ele respirava. A

febre foi altíssima. Qualquer outra pessoa

teria desistido. Qualquer pessoa de bom

senso teria chamado um padre e

encomendado a alma torturada de Madson

Jack a Satanás.

Menos Martha Dalhart, conhecida a oeste

do Mississipi como a Dama de Copas, a

jogadora de pôquer mais matreira e

trapaceira que se conheceu.

Sua teimosia era tão grande quanto a de

Madson, que resistia e não queria morrer.

Ela também achava que ele não morreria e

usou todos os seus recursos para que isso

não acontecesse.

Quando, finalmente, encontrou-o em

Socorro, após seguir sua pista desde

Albuquerque, julgou que tinha perdido

aquela parada.

Madson estava atirado num catre da

cadeia, entre a vida e a morte. Não havia um

médico na cidade.

— Dê-me um cartucho de sua espingarda

— pediu ela ao novo xerife, o barbeiro da

cidade, até a morte de Hank.

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Ele não entendeu o que ela pretendia

fazer, mas obedeceu-a. Martha parecia ser a

única disposta a cuidar daquele sério

candidato a cadáver.

Ela mordeu o cartucho que ele lhe deu.

Cuspiu caroços de chumbo, depois arrancou

mais um pedaço, até chegar à pólvora.

Espalhou-a sobre o ferimento, que minava

sangue, empurrando um pouco com o dedo.

Depois encostou ali uma vela. O cheiro

de pólvora misturou-se ao de carne

queimada.

Sobre a ferida ela aplicou um cataplasma

que trazia consigo, presente de um

curandeiro apache. Não cheirava bem, mas

já se mostrara útil em outras vezes.

Amarrou uma atadura bem justa sobre o

ferimento e ficou ali, ao lado dele.

Loveland, o barbeiro que se tornara

xerife, foi levar-lhe uma caneca de café.

— De onde o conhece? — indagou ele.

— Da estrada... Ele me ajudou... Deu-me

um cavalo... Só que deixou cair isso e eu

achei que devia devolver-lhe — falou ela,

mostrando um pingente em forma de

coração.

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Abrindo-o, via-se, de um lado, o rosto

sorridente de uma bela mulher; do outro, o

rosto sério e compenetrado de Madson Jack.

— Você o perseguiu de Albuquerque até

aqui só para devolver-lhe isso?

— Na verdade, xerife, eu não tinha para

onde ir. O xerife de Amarillo já me

conhece. Não me deixaria ficar. Achei que,

com ele, minhas chances seriam maiores...

— É e sempre será uma jogadora, Dama

de Copas.

Ela sorriu e permaneceu ali, ao lado de

Madson, noite e dia, enquanto ele lutava

contra a morte.

Olhando-o, inerte no catre, com o tronco

coberto de cicatrizes, Martha tinha certeza

de que ele sobreviveria.

Por dias a fio tratou dele como se tratasse

de uma criança incapaz para tudo. Limpava-

o e empurrava-lhe goela abaixo um caldo de

galinha reforçado, água, leite e uma mistura

de limão, alho e cebola que lhe ensinara o

curandeiro apache.

Madson não cheirava bem após uma

semana, mas estava livre da morte. Quando

abriu os olhos, viu o rosto aliviado daquela

garota que encontrara na estrada, ao lado de

um cavalo agonizante.

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Naquele breve momento, pareceu-lhe que

o tempo não havia passado e que ele

acabava de acordar naquele dia, algum

tempo atrás.

— Não foi embora ainda? — perguntou

ele.

— Não, eu tinha que cuidar de você —

respondeu ela, debruçando a cabeça no

peito dele e começando a chorar.

A tensão e a expectativa dos últimos dias

chegavam ao fim para ele. Finalmente ele

estava bem.

Demorou alguns dias até que ele

percebesse o que se passara e pudesse

levantar-se e dar seus primeiros passos.

Martha mantinha-se ao lado dele sem

saber exatamente porque fazia aquilo.

Sempre fora independente, mas sentira-se

bem naqueles dias em que vira que ele

dependia dela.

Quando sentiu que poderia cavalgar

novamente, ele conversou com ela. Martha

havia alugado uma casinha perto do rio,

onde ele recuperou-se do ferimento

— Não tenho como agradecer-lhe,

Martha, pelo que me fez...

— Senti-me bem fazendo-o...

— Mas tenho que partir...

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— Nunca pensei em criar raízes...

— Tenho uma missão a concluir...

— Também vou para os lados de Santa

Fé...

— Tenho um rancho e...

— Detesto animais...

— Fica nas encostas das Montanhas

Rochosas, na parte verde.

— Adoro a montanha...

— Vou morar numa cabana... Sozinho...

— Não tenho sido muito popular

ultimamente...

Ele apoiou-se nela para caminhar até o

lado de fora da cabana, onde podia ver o rio.

— Tenho uma missão, quando voltar,

Martha.

— Também sei atirar, sabia?

— Você me salvou a vida, não posso

pedir-lhe nada... Pelo contrário, acho que

devo algo a você. Apanhe um lápis e papel,

por favor.

— O que vai fazer?

— Faça o que eu disse, por favor.

Martha, a contragosto, atendeu-o,

levando-lhe o que ele pedira. Madson

rabiscou algumas linhas no papel, depois

estendeu-o a ela.

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— Se algo me acontecer, as terras nas

encostas são suas...

— De forma alguma. Ou estamos nisso

juntos, ou nada feito — falou ela, furiosa.

Ele começou a rir. Sabia agora porque

não gostava de mulheres tão faladeiras.

— Diga-me exatamente o que pretende

fazer, quando chegar a Santa Fé — pediu

ela.

— Vou procurar Concho Valentine...

Quero saber por que ele mandou matar

minha família...

— Você não o conhecia? Procure se

lembrar. Deve ter feito alguma coisa para

ele odiá-lo tanto assim...

— Fui um caçador de recompensas,

Martha. Não consigo me lembrar de quantos

homens mandei para a forca ou matei, em

toda a minha vida...

— Entre eles, deve ter alguém que

Concho Valentine prezava muito, para ter-

se vingado dessa forma...

— Não sei, Martha. Acho que só o

saberei quando estiver cara a cara com ele...

Eu sempre notei que ele me olhava de um

modo agressivo... Maldito! Todo o tempo

tramando contra mim, planejando uma

vingança infame.

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— Quando quer partir?

— Amanhã mesmo. Antes de irmos,

porém, preciso fazer algo. Havia um

envelope com o homem que matei...

— Está comigo, o xerife encontrou-o em

sua mão.

— Temos que mandar esse dinheiro para

Tucson. Há um banco em Socorro?

— Não, só vamos encontrar um em

Albuquerque...

— Então vamos levá-lo conosco. Tenho

que mandá-lo para a irmã do homem que

matei — falou ele.

Embora isso não tivesse muito sentido

para ela, Martha não questionou. Na

passagem por Albuquerque fariam aquilo.

Naquele sábado, Concho estava no

saloon, juntamente com os mineiros, que

vinham ajudando a cavar o túnel nas terras

que Wink se apossara de seu vizinho.

Embora o uísque fosse do melhor e as

mulheres as mais bonitas do saloon, tinha

motivos para estar intranqüilo.

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Primeiro foi o corpo de Joe, encontrado

no caminho para por alguém no caminho

entre Stanley e Albuquerque.

Um vaqueiro, vindo daquelas bandas,

havia contado a história. Pela descrição do

morto, só poderia ser o rapaz que

acompanhava Dening.

Depois foi alguém contanto que estivera

na Casa de Conchita, em Albuquerque, e

vira as mulheres levando dois corpos para

serem enterrados nos fundos da casa.

Finalmente, foi aquele comentário do

tiroteio em Socorro, que vitimara o xerife.

Neste último, o assassino fora morte por um

forasteiro, que acabara ferido e à beira da

morte.

Concho juntou um mais um e chegou a

uma conclusão. Madson Jack não era tão

inofensivo quanto parecia. Quando

descobriu o massacre feito em sua cabana,

saíra para caçar os matadores, pegando um

por um.

Só não entendia como um rancheiro

simplório daqueles podia ter matado Dening

e seus amigos.

— Está muito sério hoje, Concho —

comentou uma das garotas, sentando-se no

colo dele.

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— Impressão sua, Ruth. Só estou

preocupado em como vou gastar todo o

dinheiro que devo ganhar...

— Por que não me convida para ajudá-

lo?

— Sim, acho que farei isso — disse ele.

Naquele momento, a porta do saloon

abriu-se para dar passagem a um

desconhecido, sobressaltando-o.

Estava assim nos últimos dias. Cada

cavaleiro que se aproximava dele parecia

ser um inimigo.

— Por que não subimos até o meu

quarto? Hoje é sábado e você deve estar

precisando relaxar... Deixe que eu cuide de

você nesta noite — falou ela, com a voz

convincente, não admitindo uma recusa.

— Está bem... Acho que estou mesmo

precisando disso — afirmou ele, deixando-

se levar por ela.

Ruth o arrastou escada acima, sumindo

com ele pelo corredor. Naquele momento,

na porta do saloon, Madson o apontava para

Martha conhecê-lo.

— Aquele era Concho Valentine.

— Pois eu o conheço, Madson. Ele

trabalhava com um holandês em Tucson,

negociando gado. Só que trapacearam todo

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mundo, enganando-os. Compravam gado

pelo preço de mercado e o revendiam

abaixo do preço. Só que não pagavam os

vendedores.

— Tem certeza disso? Wink Van Horn

sempre me pareceu um sujeito honesto...

— Se for o mesmo sujeito, saiba que ele

tinha uma fascinação estranha por prata.

Dizia que o Novo México estava assentado

no veio de prata mais rico do mundo.

— Cobra dos infernos! — praguejou

Madson. — Você está falando do bastardo

do Wink Van Horn. Não entendo...

Enquanto os dois conversavam, Rocky

Ordway, o especialista em explosivos que

trabalhava para Van Horn reconheceu

Madson. Disfarçadamente subiu a escada e,

avançando pelo corredor, foi bater na porta

do quarto de Ruth.

— Que diabos é isso... — ia dizendo

Concho, quando deu de cara com Rocky. —

O que está havendo, Rocky?

— Aquele rancheiro... Eu o vi lá

embaixo... Junto à porta.

— Não sabe o que está falando?

— Vá ver você mesmo?

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Concho hesitou por instantes, depois

deixou o quarto e foi para a porta dos

fundos do pavimento superior.

Desceu a escada até o beco, depois

avançou por ele cuidadosamente, até poder

ter uma visão da porta de entrada do saloon.

Ali, acompanhado de uma mulher

desconhecido, mais magro e barbado, estava

o rancheiro.

— Maldição! — praguejou ele,

escondendo-se.

Não tinha dúvidas, era o rancheiro. Mas o

que estaria fazendo ali? Por onde andara?

Teria sido ele quem liquidara com Dening e

seus amigos?

Fosse como fosse, não se sentiu seguro.

Os dois Colts que levava nos quadris eram

efetivos contra adversários que ele

conhecia. Aquele rancheiro, no entanto,

surpreendia-o.

Desde quando o desafiara a provar sua

habilidade, Concho se intimidara com

aquele homem. Havia algo nos olhos de

Madson. Seu olhar não eram de um

rancheiro comum ou de um homem pacato.

Seu olhar era o de um matador.

Voltou pelo beco. Pediu a Ruth que

chamasse Rochy e mais alguns dos homens

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da mina, que jogavam cartas no saloon.

Pretendia jogá-los todos contra Madson.

Martha, no entanto, percebeu aquela

estranha movimentação de homens sozinhos

subindo a escada para o andar superior.

— Mad, a menos que esteja acontecendo

uma grande festa lá em cima, não vejo razão

para tantos homens sozinhos subiram lá —

observou ela.

Ele atentou para esse detalhe. Martha

tinha razão.

— Vou descobrir o que está havendo —

disse ela.

Antes que ele pudesse detê-la, Martha

entrou no saloon, caminhando à vontade por

entre as mesas.

Logo alguém reconheceu a Dama de

Copas, saudando-a, cercando-a, girando ao

seu redor.

Madson não quis deixar todo o trabalho

para ela, por isso contornou o saloon,

entrando pelo mesmo beco onde Concho

observara-o minutos antes.

Subiu lentamente a escada, até o

pavimento superior, parando diante da porta

e tentando ouvir alguma movimentação lá

dentro.

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Só então abriu-a, entrando. Viu o grupo

de homens no fim do corredor, prestes a

descer para o salão. Concho estava entre

eles. Foi até lá, observando-os atentamente.

Martha estava lá embaixo, às voltas com

inúmeros conhecidos.

— Cobra dos infernos! — murmurou

Madson, percebendo que os homens,

juntamente com o pistoleiro, saíam para a

rua a sua procura, retornando em seguida.

— Ela estava com ele — apontou

Concho, na direção de Martha. — Agarrem-

na.

Dois homens apressaram-se em segurar a

garota, levando-a para fora, sob os protestos

dos que a conheciam.

— Onde está ele? — indagou Concho,

quando a levaram para o beco.

— De quem está falando? — retrucou

ela, ignorando a pergunta que ele fizera.

O pistoleiro demonstrou logo sua

impaciência, esbofeteando-a com violência,

fazendo-a cuspir sangue.

— Seu bastardo nojento! — vociferou

ela.

— Onde está aquele maldito rancheiro?

— insistiu Concho.

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— Procurando por mim? — indagou

Madson, surgindo no beco, com o Colt

pronto para a ação.

Concho e os outros ficaram imóveis,

olhando aquele homem decidido que os

encarava. Martha livrou-se dos braços que a

prendiam e correu para junto do caçador.

— Olá, rancheiro! — disse Concho,

adiantando-se e medindo seu oponente. —

Pensamos que tivesse morrido...

— Bem que tentaram... Por que está a

minha procura?

— Você? — gaguejou o pistoleiro.

— Não era por mim que procuravam?

— Deve haver algum engano...

Procurávamos um homem que trabalhou lá

na mina e roubou dinheiro dos outros...

Pensamos tê-lo visto na companhia dessa

garota...

— Enganaram-se, no entanto. Ela está

comigo. Quanto a você, alguns amigos seus

mandaram lembranças.

— Amigos? Lembranças? — balbuciou

Concho, intimidado.

Aquele olhar do rancheiro perturbava-o.

Eram olhos de um matador, sentia isso.

— Sim. Joe Sanders, Lou Newcomb,

Lubock Coolidge e Dening Stone...

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— Não conheço nenhum deles —

gaguejou Concho.

— Pois eles o conheciam muito bem...

Pena que estejam mortos, assim como você

estará em breve.

— Do que está falando, afinal? —

vacilou o bandido, sem coragem para

enfrentá-lo.

Naquele momento, o xerife e alguns

ajudantes surgiram, portando rifles e

espingardas, fazendo-os dispersarem-se.

Concho reuniu-se com os homens junto

ao balcão, no saloon, enquanto Martha e

Madson iam registrar-se no hotel.

— Steve, siga os dois. Veja para onde

vão — ordenou o pistoleiro a um dos

homens, que saiu rapidamente.

— Quem é esse sujeito, Concho? — quis

saber outro deles.

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— É um problema que atormenta o nosso

patrão. Estou certo que ele dará uma boa

gratificação a quem o livrá-lo dele.

— E quanto é essa boa gratificação? —

questionou outro.

— Talvez quinhentos dólares... talvez

mil...

— Fala sério? É mais do que ganharemos

em dois anos na mina... Se o problema for

esse, vamos dar um jeito nesse sujeito agora

mesmo — decidiu-se um deles, logo

apoiado pelos outros.

— Somos cinco, Concho. Isso dará

duzentos dólares cada um. É só ordenar e

iremos atrás dele agora mesmo.

— Se é isso o que querem, fiquem à

vontade, rapazes. Tão logo terminem o

serviço, fujam para a mina. Lá estarão

seguros.

O homem que seguira Madson e Martha

retornou naquele momento.

— Eles estão no hotel agora.

Concho olhou para os homens e fez um

sinal de cabeça, dando a entender que era

para irem atrás dos dois.

Animados com a perspectiva do ganho

fácil, os cinco homens deixaram o saloon,

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caminharam pela rua com decisão e foram

até o hotel.

— Em que quarto hospedaram-se o

homem e a mulher que acabaram de chegar?

— indagaram ao garoto da portaria.

— Quarto quinze...

Um dos homens apanhou algumas

moedas e entregou-as ao garoto.

— Saia por alguns instantes, garoto. Vá

comprar uns doces. Você não nos viu por

aqui, entendeu?

Intimidado e ao mesmo tempo

agradecido, o garoto tratou de sair dali o

mais depressa possível.

Os cinco homens sacaram suas armas e

começaram a subir as escadas até onde

ficavam os quartos.

No número quinze, Martha estendera-se

na cama, enquanto que Madson tinha ficado

na janela observando a rua.

Viu quando os homens deixaram o saloon

e caminharam na direção do hotel. Em

seguida, viu o garoto correndo para longe.

— Acho que vamos ter companhia —

disse ele, sacando sua arma e examinando-

a.

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— Quem são? — quis saber Martha,

apanhando o pesado Colt que carregava na

bolsa de mão.

— Não acha essa uma arma muito grande

para uma jogadora? — indagou ele.

— Tenho estas outras duas de reserva —

disse ela, levantando a saia e mostrando

dois Derringer presos na liga de suas meias.

Madson ouviu o ranger da madeira no

corredor. Fez um sinal para Martha sair de

frente da porta.

Por momentos fez-se um silêncio total.

No momento seguinte, a porta explodiu com

um pontapé e os cinco homens entraram

atirando, arrebentando o colchão e os

travesseiros, fazendo penas de ganso

voarem pelo quarto, que se encheu de

fumaça.

— Cadê eles? — berrou um dos homens,

aturdido.

— Aqui — respondeu Madson, que

colara-se à parede, juntamente com Martha.

Quando os homens começaram a virar-se,

Madson começou a disparar, batendo a mão

espalmada no cão da arma e mantendo o

gatilho pressionado.

As balas foram certeiras, varando corpos,

perfurando-os, fazendo o sangue espirrar e

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ossos surgiram, estilhaçados, nos buracos de

saída dos projéteis.

Martha também disparou seu canhão de

mão, com igual pontaria. Os homens foram

jogados contra a parede, amontoando-se

grotescamente.

Quando a fuzilaria terminou, os cinco

estavam caídos. Martha e o caçador haviam

esgotado toda a munição de suas armas. Ele

começou a recarregar seu Colt.

— Concho não está entre eles —

observou Madson.

— Maldito! Se você não estivesse atento,

teríamos virado peneira — observou ela,

levantando a colcha da cama, toda cheia de

buracos.

— Tenho que ir atrás daquele pistoleiro

— falou Madson, tendo terminado de

recarregar sua arma.

— Não vai a lugar algum antes de me

explicar o que houve aqui — falou o xerife,

surgindo com seus auxiliares armados.

— Deixe-me terminar o que comecei,

depois eu lhe darei todas as explicações que

quiser, xerife — pediu o caçador.

— Nada feito. Primeiro você explica. Por

que os matou?

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— Cobra dos infernos! — lastimou

Madson, porque sabia que Concho

descobriria que não conseguira seu intento,

tento tempo de fugir.

Contou ao xerife que os mesmos homens

que havia encarado no beco foram até o

hotel e entraram atirando, não lhes dando

outra alternativa a não ser responder ao

fogo.

Tudo estava muito evidente. Bastava ver

que todos haviam morrido com as armas nas

mãos e a cama estava crivada de balas.

— E por que eles queriam matá-lo? —

questionou o xerife.

— Não faço a menor idéia...

— Andou sumido por uns tempos, Sr.

Jack. Por onde andou?

— Caçando — respondeu Madson,

tomando Martha pela mão e levando-a dali.

Concho preferiu enfrentar a escuridão e

as perigosas encostas para retornar

imediatamente à mina. A volta do rancheiro

confirmava suas suspeitas.

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Além de não terem feito um trabalho

completo, Dening e seus

amigos acabaram mortos.

Descobria, finalmente, que não estava

lidando com um homem comum. Madson

Jack poderia ter uma aparência inofensiva,

mas, no fundo, era um lobo, um abutre, um

lince perigoso e mortal.

Teria de enfrentá-lo, não restava a menor

dúvida. Quando o rancheiro visse as cercas

invadindo sua propriedade e a mina de prata

instalada em suas terras, na certa

protestaria. Wink Van Horn perderia tudo

que investira na extração da prata.

Eram sócios havia muito tempo. Juntos

logo estariam ricos. Não podia permitir que

nada se interpusesse em seu caminho.

Quando chegou, de madrugada, tratou de

acordar seu patrão e contar-lhe o que

acontecera na cidade.

— Diabos, Concho! Pensei que ele

estivesse morto...

— Pensei a mesma coisa, só que ele é

mais perigoso do que nós imaginávamos.

— Com certeza virá para cá amanhã

cedo. Verá a cerca, a mina... Temos de

impedí-lo.

— Pensei em algo no caminho...

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— Então diga logo!

— Podemos esperá-lo amanhã, na

Garganta Glorieta, minando toda ela.

Quando ele passar, nós o explodimos, sem

deixar vestígios.

— Faça um bom trabalho, Concho.

Acabe com ele de uma vez por todas.

O pistoleiro tratou de providenciar tudo

naquele mesmo momento. Em breve o sol

surgiria. Com certeza o rancheiro partiria da

cidade logo ao amanhecer. Em breve

chegaria à garganta.

Apanhou dinamite e estopins no depósito,

enchendo os alforjes de sua sela, partindo

em seguida.

O dia amanhecia, quando chegou à

garganta e começou a instalar a dinamite,

numa seqüência ao longo da passagem.

Quando o rancheiro entrasse ali, acenderia o

estopim principal. Tudo explodiria quando

ele chegasse ao meio das cargas dispostas a

uma distância de alguns metros uma da

outra.

Ao terminar o trabalho, ficou a postos e

oculto. Teria de acender o estopim principal

e tratar de fugir logo dali.

Estava cansado pela noite atribulada.

Sentou-se na sombra de uma pedra e

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esperou. Cochilou algumas vezes, até

acabar adormecendo.

Acordou com o barulho de cascos de

cavalos ecoando pelas paredes da garganta.

Rapidamente riscou um fósforo e acendeu o

estopim, correndo na direção do cavalo, que

deixara oculto.

Montou-o e saiu a galope. Naquele

momento, no meio da garganta, Madson

ouviu o cavalo em disparada.

— Ouviu isso? — indagou.

— Sim, um cavalo... Mad, olhe aquilo!

— falou ela, apontando para a fumaça que

subia rapidamente do meio das pedras.

Os olhos do caçador observaram o

caminho. Pôde ver os buracos recém-

cavados e os estopins que saíam deles.

— Dinamite! — gritou ele, batendo com

força na anca do cavalo montado por

Martha, que saiu em disparada.

Ele esporeou seu animal, forçando-o ao

máximo, tratando de sair dali o mais

depressa possível.

Os explosivos vieram explodindo numa

seqüência aterrorizante, jogando pedras

contra a parede oposta, levantando uma

nuvem de poeira e fumaça.

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— Cobra dos infernos! — berrava

Madson, ferindo os flancos de seu animal

com as esporas, até ver-se fora da garganta,

juntamente com Martha.

— Diabos! Que hospitalidade a desta

terra — reclamou ela. — Atiram na gente,

explodem bombas, o que mais nos falta

agora?

Em resposta a sua pergunta, uma bala

assobiou junto de sua cabeça e foi

ricochetear numa pedra, num zumbindo

macabro.

Madson saltou sobre a garota,

derrubando-a da sela e levando-a para a

proteção de uma rocha.

— Maldição, Mad! Alguém nos quer

morto mesmo.

— Sim, alguém deseja muito isso —

confirmou ele, ouvindo de novo o tropel de

um cavalo ao longe.

Saiu de seu esconderijo e subiu na rocha.

O atirador já ia longe, deixando apenas uma

nuvem de poeira para indicar sua passagem.

— Quem acha que foi? — indagou

Martha, espanando as roupas cheias de

poeira.

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— Com certeza foi Concho. É o único

com acesso a dinamite por estas bandas.

Mas por que esse maldito quer me matar?

— Isso só saberemos quando o

encontrarmos.

— Espero que isso não demore muito. Já

estou começando a ficar impaciente.

Apanharam seus cavalos e seguiram na

direção do rancho, tomando cuidado

redobrado.

Concho foi direto para a mina. Quando

chegou, Wink o aguardava preocupado.

— E então? — indagou, ansioso.

— Nada feito. Escaparam, não sei

como...

— Diabos, Concho! Não temos escolha

mesmo. Ele e a mulher que o acompanha

terão de morrer. Vá até o dormitório e

pegue alguns homens. Pague-lhes o que for

preciso e vá até o rancho e o

mate. Dinamite-o, queime-o, fuzile-o,

faça o que for preciso, mas acabe com ele

ou tudo que fizemos até agora estará

perdido.

— Não se preocupe. De qualquer

maneira, ele está vindo direto para a boca

do lobo. Nós o pegaremos, de um jeito ou

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de outro, eu prometo — afirmou o

pistoleiro.

Pouco mais tarde, deixava o local com

um grupo de meia dúzia de mineiros,

armados até os dentes.

Rumaram para o rancho de Madson Jack.

Lá, ele e Martha haviam acabado de chegar.

Antes de mais nada, ele foi até os

túmulos de seus entes queridos e fez uma

prece silenciosa. Os assassinos estavam

mortos. Não era um consolo, não os traria

de volta, mas dava-lhe a certeza de que

ninguém mais sofreria por causa daqueles

bastardos assassinos.

Martha esperou que ele rendesse suas

homenagens à família. Enquanto isso, foi

examinar a cabana. O lugar estava uma

bagunça. Ainda havia manchas de sangue

espalhadas nos móveis e no assoalho.

— Martha querida, sei que não gosta

disso, mas terá de fazê-lo — comentou ela

consigo mesma, olhando ao redor.

Encontrou uma vassoura e um balde.

Antes de mais nada, apanhou os panos

manchados de sangue e o berço, levando-os

para fora e ateando-lhes fogo.

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Depois foi até o poço, apanhou água e,

quando voltava, percebeu os cavaleiros que

se aproximavam.

— Mad! — gritou ela.

O caçador voltou-se e olhou na direção

apontada por ela.

— Temos visitas! — informou ela.

Madson sabia que tipo de visita seria

aquele. Correu até seu cavalo e apanhou sua

Winchester e a Overland, levando-as para

dentro da casa.

— Sabe usar uma dessas? — indagou,

entregando a Winchester para a garota.

— Posso tentar — disse ela, engatilhando

a arma com familiaridade.

Madson municiou sua espingarda, depois

foi até a janela, espiar os homens que se

aproximavam.

Eles formavam um leque agora,

avançando com a visível intenção de cercar

a casa.

A fumaça do berço que ardia logo à

frente incomodou-o. Aquilo poderia ser

uma péssima sugestão.

— São sete — contou ele. — Vão nos

cercar... E aquele abutre negro está entre

eles.

— Vamos ficar e nos defender?

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— Você fica aqui e atrai a atenção deles.

Vou impedir que eles nos cerquem — falou

ele, indo para o quarto.

Martha foi no seu encalço.

— O que vai fazer?

— Vou sair pela janela. Vá lá na frente e

comece a disparar contra eles.

Martha obedeceu-o. Enquanto ele saltava

pela janela, ela foi para o seu posto. Apoiou

o cano da arma no parapeito da janela e

mirou cuidadosamente.

Quando enquadrou um deles na mira,

apertou o gatilho. A arma saltou, quando

disparou. Através da fumaça ela viu o

cavaleiro ser atirado fora de seu animal,

com um grito de dor.

Imediatamente os atacantes começaram a

disparar seus rifles contra a cabana.

Felizmente os troncos resistiam aos

impactos das balas, mas o mesmo não

acontecia com a porta e as janelas, que se

lascavam todas com a passagem dos

projéteis, que iam estilhaçando louças e

vidros no interior da cabana.

Martha abaixou-se, tapando os ouvidos

com as mãos, enquanto a saraivada de balas

continuava.

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Lá fora, Madson havia se afastado o

suficiente para ter uma boa visão do

tiroteio.

Os homens foram tomando suas posições

e desmontando. Um deles foi na sua

direção, sem vê-lo, disparando contra a

cabana.

Madson esperou até que ele estivesse

perto. Então, surgindo inesperadamente

diante do cavaleiro, bateu com a coronha da

arma na perna do cavalo, fazendo-o cair e

jogar o homem que o montava no chão.

Antes que o atacante tivesse condições de

entender o que estava acontecendo, Madson

caiu sobre ele, golpeando-o no nariz com a

coronha da espingarda.

O homem gemeu, enquanto o sangue

escorria generosamente, transformando sua

cara numa máscara sangrenta.

Ainda assim ele tentou sacar seu

revólver. Madson praticamente encostou o

cano da arma na garganta dele e apertou os

dois gatilhos, degolando-o.

Um cheiro nauseando de carne queimada

misturou-se à fumaça. Rapidamente ele

remuniciou a espingarda.

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Contou o número de armas que disparava

agora contra a cabana. Eram quatro. Martha

deveria ter acertado mais um, concluiu ele.

— Cobra dos infernos! — berrou, quando

o cavaleiro surgiu praticamente sobre ele,

atropelando-o com o animal e pisoteando-o.

Ele rolou na relva. O cavaleiro vira

quando ele atacara seu amigo e viera em seu

socorro.

Madson, ignorando as dores em seu

corpo, só se preocupava com aquele rifle

apontado para ele agora.

O tiroteio continuava cerrado contra a

cabana. Concho viu a fumaça do berço que

queimava e achou que, tendo os dois

encurralados lá dentro, o mais rápido era

queimá-los para obrigá-los a sair de lá.

Além disso, trouxera algumas bananas de

dinamite em seu alforje. A questão, porém,

era aproximar-se para atirá-las na certeza.

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Do outro lado, Madson Jack rolava

desesperadamente, tentando fugir às patas

do cavalo e ao rifle que era apontado contra

ele. Não conseguia mirar o cavaleiro.

Não teve escolha, então. Apontou a

espingarda contra as patas do cavalo e

disparou, estraçalhando-as. O animal foi ao

chão e o homem sobre ele rolou. Seu rifle

voou longe.

Ele ficou gemendo, olhando a perna

quebrada e o osso que furara o tecido da

calça.

— Minha perna... Minha perna... —

repetia, sem entender o que aquele osso

estava fazendo fora de seu lugar normal.

Madson recarregou a arma. Apontou para

o cavalo e sacrificou-o. Depois, mancando,

aproximou-se do homem caído, que

levantou para ele seus olhos suplicantes.

— Ajude-me! — pediu ele,

pateticamente.

— Jamais deixo um animal sofrer —

disse Madson, apontando a arma para a

cabeça do outro e apertando o gatilho.

A cabeça transformou-se numa massa

sanguinolenta e disforme.

Não havia piedade alguma ou remorso

nos olhos do matador.

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Ele correu, então, para um ponto

privilegiado. Viu que Concho disparava seu

rifle contra o berço na frente da casa. A

cada impacto de um projétil, o móvel era

empurrado para mais perto da parede.

— Cobra dos infernos! — praguejou ele,

observando também a posição dos outros

atiradores.

Dos sete que haviam chegado, restavam

quatro. Martha continuava disparando, mas

já não podia mirar com calma.

Ele correu, então, até onde estavam os

homens que ele havia acabado de matar e

apanhou seus rifles. De volta ao seu posto,

apontou com calma para o atacante mais

próximo.

Quando apertou o gatilho, viu o chapéu

voar da cabeça do homem, enquanto ele

caía para o lado com a cabeça partida.

— Três! — murmurou ele.

As balas começaram a assobiar sobre sua

cabeça. Havia revelado sua posição. Ele se

escondeu. Martha aproveitou-se da

distração dos homens lá fora e pôde mirar

atentamente contra um deles, atingindo-o.

— Dois! — comentou Madson,

agradecendo Martha pela pontaria.

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O último dos mineiros que

acompanhavam Concho parou de atirar e

abaixou-se. Percebeu que apenas o

pistoleiro ainda atirava, tendo despedaçado

o berço e jogado a madeira e os tecidos em

chamas contra a parede.

Apavorou-o, no entanto, o fato de que

todos os seus amigos estavam mortos. Se

ficasse ali, teria o mesmo destino. Em

pânico, correu apanhar seu cavalo.

— Volte aqui, seu covarde! — gritou-lhe

Concho.

O mineiro não lhe deu resposta. Esporeou

seu cavalo e tentou afastar-se dali o mais

depressa possível.

— Seu bastardo! — berrou Concho, fora

de si, apontando seu rifle para o homem em

fuga e apertando o gatilho.

Com um grito o homem tombou para

frente, na sela, depois foi pendendo para o

lado, até cair. Seu pé ficou preso ao estribo

e seu corpo foi arrastado pelo animal em

disparada.

— Agora eu o pego — murmurou

Martha, enquadrando Concho em sua mira e

apertando o gatilho.

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O pistoleiro gemeu, erguendo os braços e

deixando cair o rifle. Tombou para trás,

amaldiçoando a pontaria da garota.

Ao vê-lo atingido, Madson precipitou-se

de onde estava, correndo até o pistoleiro,

que tentava rastejar na direção de seu

cavalo.

Quando o alcançou, o rancheiro chutou-

lhe as costelas repetidas vezes, fazendo-o

gemer e rolar na relva.

Martha saiu da cabana e correu afastar o

que restava do berço em chamas. Depois

pegou água para jogar na parede, enquanto

Madson desarmava Concho e o obrigava a

sentar-se.

A bala que Martha disparara contra ele

havia atingido seu ombro direito e aberto

um rombo enorme, por onde o sangue fluía

continuamente.

— Estou morrendo, homem — falou

Concho, olhando os olhos frios de seu

oponente.

— Que se dane você, maldito! Que o

inferno o receba bem e que Satanás tenha

um bom lugar reservado para você...

Concho continuava olhando aqueles

olhos frios e sem emoção.

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— Quem é você, afinal? — indagou o

pistoleiro. — Não é um rancheiro comum...

— Agora sou um rancheiro, mas, antes

disso, eu era conhecido como "Cachorro

Louco" Jack...

— O caçador...

— Sim, e você devia saber disso, não?

Afinal, por que mandou aqueles homens

matarem minha família?

Concho tossiu, sentindo fortes dores nas

costelas, quebradas a pontapés. O sangue

não cessava de escorrer de seu ferimento.

Martha aproximou-se dos dois.

— Não foi nada pessoal...

— Não? — surpreendeu-se Madson Jack.

— Claro que não... Você devia estar lá,

naquela noite, para ser morto junto com

todos... Teve sorte, maldição!

— Por quê?

— Por causa da mina de prata. O veio

conduzia na direção de suas terras.

Sabíamos disso desde o princípio... Você

não queria vender... Criar cavalos! Que

idiota! Há prata em suas terras, sabia?

Muita prata...

— E que interesse tinha você em...

— Será que não percebeu ainda que não

estou sozinho nisso? Foi Wink Van Horn

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quem determinou a morte de vocês todos.

Ele queria ficar com as terras e as teria.

Naquela manhã, quando ele foi até sua

cabana e encontrou você vivo, ele estava

indo apenas para se certificar de que poderia

usar as suas terras para explorar a prata...

Pensamos que tivesse enlouquecido...

— Não acredito nisso... Ajudei Wink a

instalar-se aqui... Minha esposa e a dele

eram amigas...

— Ela nada sabe do plano... Se for até a

divisa das terras, vai descobrir que foi feita

uma certa, avançando sobre o seu lote. Ali

foi aberta a mina. Já está produzindo,

inclusive...Você pode ficar rico... O que vai

ser irônico... — gemeu Concho, começando

a rir.

— O que vai fazer com ele?

— Sangrando assim, não vai durar muito.

— Ei, rancheiro... Se um animal está

sofrendo, você o sacrifica, não? Não me

deixe sangrar até morrer... Mate-me! —

suplicou o pistoleiro.

Madson encarou-o com frieza.

— Nem todo o sofrimento do mundo e o

que certamente encontrará no inferno será

suficiente para fazê-lo pagar pelo que fez,

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bastardo! — falou ele, virando-lhe as

costas.

Concho encolheu uma das pernas,

retirando dali uma faca. Com dificuldade

ergueu-a, prestes a arremessá-la nas costas

do rancheiro. Martha, no entanto, percebera

o movimento.

Com rapidez ela levantou a saia e sacou

um dos Derringer que trazia preso na liga,

disparando os dois canos quase que ao

mesmo tempo.

O tronco de Concho foi jogado para trás,

com dois buracos abertos na cara.

Estrebuchou por instantes, depois ficou

imóvel.

Madson olhou-se sem nenhuma piedade.

— Você é muito boa com seus

brinquedinhos — elogiou ele.

— E agora, Mad? O que vai fazer?

O rancheiro olhava na direção do cavalo

de Concho. Do alforje sobressaía-se os

estopins de algumas bananas de dinamite.

Foi até lá e apanhou-as.

— Tenho que terminar um trabalho,

Martha. Por que não fica e continua

cuidando da casa, como pretendia?

— Mad, não sou mulher de ficar em casa,

enquanto meu homem anda por aí.

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Principalmente nesta terra esquisita, onde

todos são doidos para vê-lo morto. Aonde

você for, eu vou.

— Está bem, já vi que não se pode

discutir com você... — concordou ele.

Apanharam os cavalos e partiram

imediatamente. Madson queria terminar

aquele assunto o mais depressa possível.

Para ele fora um choque saber que Wink

Van Horn havia mandado matar sua família.

Mas, enquanto cavalgava, pensou que

Concho poderia ter inventado aquilo

também, só para incriminar o patrão.

Quando se encontrasse com Wink, no

entanto, saberia. Bastaria olhar nos olhos do

outro e teria a certeza.

Algum tempo depois, avistaram a cerca

de arame farpado, separando as duas

propriedades.

— Aquele bastardo falava a verdade —

comentou ele. — Veja a cerca... Avança

sobre as minhas terras. Maldito Wink!

— O que vai fazer se houver mesmo

prata em suas terras, Mad? — indagou ela.

— Dane-se a prata! Não a quero, já que

foi a causadora da morte de minha família...

Quero criar meu gado e meus cavalos, só

isso e nada mais.

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— Há um espaço nisso para mim?

Ele a olhou com ternura.

— Habituei-me a tê-la ao meu lado,

Martha. Se quiser ficar, só vai me dar

alegrias.

Ela sorriu.

— Não é irônico? A Dama de Copas e

"Cachorro Louco" Jack aposentados e

juntos, criando cavalos, gado e...

— Crianças?

— Diabos, por que não? Ainda sou nova,

posso ter uma porção delas...

Pela primeira vez em muitos dias, então,

Madson Jack sorriu.

Não tinham cavalgado muito, quando

surgiu diante deles a depressão cavada a

dinamite e o buraco de entrada da mina.

Diante dela estava Wink Van Horn, que

estremeceu ao vê-lo chegar.

Madson esporeou seu cavalo, descendo

até lá. Ficou frente a frente com seu

vizinho, olhando-o nos olhos.

Wink abaixou a cabeça, intimidado. Seu

corpo tremia incontrolavelmente.

— Diga que não é verdade, Wink! Diga

que não participou dessa crueldade inútil!

— gritou Madson, alucinado.

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Estava ali, diante dele, trêmulo e

indefeso, o homem que provocara toda a

tragédia que se abatera sobre a vida dele.

Saltou do cavalo e esbofeteou-o, ansioso

para que Wink reagisse e desse-lhe o

motivo que precisava para mata-lo.

Wink nem portava uma arma. Foi

recuando, na direção da entrada da mina, até

virar-se e correr de uma vez para dentro da

boca escura.

Madson começou a correr atrás dele.

Martha viu que Wink, ao entrar, havia

apanhado uma tocha e ateado fogo a uma

porção de estopins.

— Mad! — gritou ela, percebendo a

armadilha.

Ele não a ouviu e ia entrar no túnel. Ela

sacou um Derringer e disparou os dois

canos contra a parede rochosa, à frente dele.

— Está maluca ou o quê? — gritou ele,

virando-se para ela.

— Estopins... dinamite... — gritou ela,

esporeando seu cavalo na direção dele.

— Não, volte! — ordenou ele, mas

Martha não o obedeceu.

Galopou velozmente, passando em frente

à boca da mina. Madson agarrou-se ao

arção da sela e, firmando os pés no chão,

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impulsionou o corpo para cima, caindo na

garupa do cavalo.

A força da explosão jogou-os com o

cavalo para frente, derrubando-os e

fazendo-os rolar na poeira, enquanto

pedaços de pedra choviam sobre eles.

Madson deitou-se sobre ela, protegendo-

a. Quando a fumaça e a poeira começaram a

se assentar, os dois se levantaram,

espanando-se e tossindo.

— Devo-lhe a vida de novo — falou ele.

— E Wink?

— Ficou lá dentro, deve ter morrido com

a explosão.

— O que vai dizer à família dele?

— Que houve um acidente... Aliás, vou

deixar que eles mesmos descubram isso.

Não acho que desejarão reabrir a mina... O

tempo se encarregará de curar as feridas

feitas na terra.

— E nos homens também — murmurou

ela, abraçando-o.

— No fim de tudo, será apenas mais uma

cicatriz — comentou ele, sentindo-se

cansado.

Antes de mais nada, queria dormir por

muito tempo. Depois, pouco a pouco, com a

ajuda de Martha, reconstruir sua vida.

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Abutres Humanos

O fim da Guerra de Secessão

transformara o Sul dos Estados Unidos

numa terra de injustiças, onde vigorava

apenas uma lei, a lei dos vencedores.

Os homens e famílias que haviam

defendido o Exército Confederado, quando

voltaram, encontraram suas terras invadidas

e saqueadas, as colheitas perdidas, as casas

queimadas.

Quando tentaram se reerguer, voltando a

cultivar suas lavouras produtivas, a União

aplicou-lhes o golpe final, que foi a

cobrança de impostos atrasados.

Ninguém tinha dinheiro nem como pagar.

Os compradores de terra, mancomunados

com cobradores de impostos e banqueiros,

começaram a comprar por míseros níqueis

terras que valiam uma fortuna.

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Sem suas terras, os confederados

tornaram-se exilados dentro de seu próprio

país. Muitos foram para o Oeste, tentar

esquecer os horrores da guerra e reiniciar

suas vidas. Outros, porém, preferiram ficar

e tentar, de alguma forma, combater aquela

injustiça, enfrentando os abutres humanos.

Na cidade de Atlanta, apesar da apressada

reconstrução iniciada pelos homens do

Norte, que vinham comprando

sistematicamente as propriedades, notava-se

muito bem essa injustiça.

A linha férrea que cortava a cidade

dividia-a como se fossem dois países

diferentes. De um lado o Norte,

progressista, em pleno desenvolvimento,

onde o dinheiro corria com facilidade. Do

outro lado, a marginalização de famílias

inteiras, morando em casas semi-destruídas,

vivendo dos restos que os vencedores

atiravam aos cães.

Famílias que haviam sido parte da nobre

aristocracia do sul do país eram agora

mendigos e derrotados. A cidade viviam

como uma bomba, prestes a explodir a

qualquer momento. Para manter a ordem e

sob equilíbrio a tênue divisão entre os dois

mundos completamente diferentes, apesar

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de separados apenas pela linha férrea, a

União mandara para lá dois delegados

federais.

Cabia a eles zelar para que aquela revolta

latente que pairava sobre a cidade não

explodisse a qualquer momento.

Tudo parecia tranqüilo naquela noite

calma de verão, mas os dois homens da lei

sabiam que tudo aquilo poderia explodir

como uma panela de pipoca. A ronda

noturna era o momento de maior tensão

para os homens que patrulhavam a rua que

separava os dois territórios. De um lado os

confederados vencidos e, do outro, os

ianques vencedores e arrogantes.

Poucos delegados federais haviam se

sujeitado àquele trabalho. Mesmo os

detetives da Pinkerton evitavam toda e

qualquer ação na derrotada e amargurada

Atlanta.

Poucos, como Oates e Riley se

sujeitariam àquele trabalho. Eles o faziam

por uma curiosa coincidência. Um deles

servira no Exército Confederado; o outro,

no Ianque. Viviam naquela tensão como

haviam vivido a guerra, lutando contra seus

medos interiores, atirando nas chamas dos

rifles escondidos na escuridão, torcendo

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para que a bala desgarrada acertasse o

artilheiro do canhão que poderia mandá-los

para o inferno.

E torciam para que o medo, de repente,

não invadisse suas veias, quando o próprio

demônio dissesse a senha do dia,

convidando-os para a eternidade.

Oates parou o cavalo numa esquina.

Segurou firme a rédea, contendo o ímpeto

do fogoso animal, depois apenas tocou a

espora em seu flanco, fazendo-o retomar o

caminho.

— Já conseguiu domá-lo? — quis saber

Riley.

— Não, e jamais o farei. Um animal

como este tem que ter instinto e reações

próprias. Não pode depender só do meu

comando, ele tem que se antecipar —

respondeu Oates, de olho na carruagem que

passava ao lado deles.

As janelas eram de madeira e estavam

fechadas, apesar do calor. Apenas uma

delas tinha uma pequena abertura, por onde

escapava fumaça de um gostoso charuto do

Alabama.

— Quem acha que está ali? — indagou

Riley, percebendo a preocupação do amigo,

enquanto se detinham e observavam.

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— Acho que temos um coletor de

impostos, voltando para a cidade com a

bolsa cheia — respondeu Oates, retirando o

rifle Winchester que estava ao lado da sela e

pondo-o no seu colo.

Atrás daquela carruagem, havia uma

outra. Uma terceira passou e ficou à direita

da primeira e, por fim, uma quarta passou

pela esquerda. Estavam fechando a primeira

carruagem entre as três outras.

Aquilo chamou a atenção dos homens da

lei. Riley olhou atentamente para o curioso

séquito que seguia pela rua, depois para seu

amigo.

A Overland de dois canos e grosso

calibre estava em seu colo, carregada com

cartuchos municiados com esferas de

chumbo e com os gatilhos mais sensíveis de

todo o Condado.

— É o que estou pensando? — perguntou

Riley.

Oates concordou com um aceno de

cabeça. O cobrador de impostos seria

assaltado, sem perceber o que estava

acontecendo. Tinham de agir logo. Sair em

perseguição às três carruagens depois era o

mesmo que suicidar-se. Com certeza iriam

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para a zona confederada da cidade e, ali,

seria loucura perseguí-los.

— Vamos começar a brincadeira fazendo

tiro ao alvo? — indago, engatilhando o seu

rifle.

— Não vejo outra saída — falou Riley,

fazendo o mesmo com sua espingarda.

— Não sabemos quantos estão dentro

daquelas carroças — respondeu Oates.

— Só há um jeito de descobrir — disse

Riley, esporeando seu cavalo e

emparelhando-se com a carruagem que ia

atrás das outras, no meio da rua.

Uma janela se abriu e ele viu surgir o

cano de um fuzil confederado. Freou seu

cavalo e disparou o rifle contra a porta da

carruagem. O poderoso projétil varou a

porta de madeira e atravessou o homem que

segurava a arma. O cocheiro havia sacado

um Colt e o apontava contra Riley.

Oates disparou sua espingarda de baixo

para cima, pegando o cocheiro mas costas e

jogando-o para o alto. O homem gemeu e

foi cair na poeira da rua, estrebuchando.

Outro pistoleiro surgiu na janela,

apontando uma espingarda. Riley fez um

rombo na porta da carruagem e o pistoleiro

foi jogado para o outro lado.

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A carroça que ia à frente disparou pela

rua, seguida pelas duas outras, uma de cada

lado. Oates esporeou seu cavalo e avançou,

até poder atirar num dos cavalos. O animal

tropeçou, ferido mortalmente, e caiu,

fazendo a carruagem capotar numa nuvem

de poeira. O cocheiro caiu longe, com o

pescoço quebrado.

Imediatamente dois homens com fuzis

saíram da carruagem semi-destruída. Riley

passou por eles, em disparada, atirando com

sua espingarda. Simplesmente fez sumir a

cabeça de um deles com um disparo,

enquanto Riley atingia o outro em pleno

peito, jogando-o alguns metros para trás.

— Malditos! — gritou o cocheiro da

terceira carruagem, com um Colt na mão.

Começou a disparar, arrancando o chapéu

da cabeça de Riley.

— Proteja-se Riley — gritou Oates,

apontando na direção do atirador, enquanto

nas janelas da carruagem surgiam mais duas

armas apontadas para eles.

Riley agiu instintivamente. Após tanto

tempo trabalhando com Oates, sabia como o

parceiro agia. Abaixou-se na sela e, sob o

pescoço do cavalo, disparou um tiro em

cada um dos homens na carruagem. Oates

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tinha seu rifle apontado na direção da

carruagem. No momento em que Riley se

abaixou, apertou o gatilho, com incrível

pontaria.

O cocheiro jamais soube o que o atingiu.

Seu peito tingiu-se na hora de vermelho e

ele voou para o meio da rua. O cavalo

andou um pouco mais, depois, sem

condutor, parou docilmente no meio da rua.

As poucas pessoas que ainda estavam na

rua sumiram. Todos sabiam que ali era a

terra de ninguém, separando a União dos

Confederados, vencedores dos vencidos.

O cheiro de pólvora foi levado

rapidamente pela brisa que soprava. Ainda

em alerta, Oates desceu do cavalo, seguido

pelo parceiro.

Escondidos atrás das janelas dos prédios,

sulistas e nortistas observavam o fim do

tiroteio, uns com alívio, outros com rancor.

A grande mansão abandonada, na

margem leste do Rio Chattahoochee parecia

preparado para uma guerra. Eles haviam

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começado a chegar ao local antes do

anoitecer. Equipes de homens fortemente

armados circulavam pelos aposentos,

enquanto grupos caminhavam ao redor

mantendo severa vigilância.

O telhado havia sido ocupado. Duas

canoas patrulhavam os fundos, ancoradas

no rio. Carroças haviam sido espalhadas ao

longo da estrada, todas com homens

armados com fuzis, espingardas ou Colts.

Robert Woodfarm, o filho do patriarca da

família, o Coronel Swam Woodfarm,

comandava pessoalmente a operação, toda

ela montada pelo seu pai.

Às oito da noite, tudo estava preparado

para o aguardado encontro. De um lado,

representando os fazendeiros sulistas

despojados de suas terras, estava Luther

"The Dog" Masden; do outro, falando pelos

comerciantes de tabaco e ex-proprietários

de barcos principalmente, estava Titus

Warspite.

Luther chegou pontualmente. A carroça

parou no local indicado pelos homens da

segurança.

— Olá, Robert! — cumprimentou, ao ver

o rapaz parado na porta da mansão.

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— Luther, é bom ver você! — disse

Robert, apontando o interior da sala, onde

uma mesa havia sido preparada para a

reunião.

Caminharam até lá. Luther olhava

atentamente ao redor, observado todo o

esquema de segurança montado.

— Quando me disseram que vocês

estavam por trás disso, não hesitei —

comentou Luther. — A nossa situação e a

de nossos compatriotas torna-se mais

desesperadora a cada dia.

— Para nós era uma questão de honra

fazer alguma coisa contra esse estado de

coisas, Luther.

— Agradeço a iniciativa de vocês —

falou Luther, com reconhecimento.

O líder dos fazendeiros tomou seu lugar

na mesa, sobre a qual havia um grande

mapa, representando a região de Atlanta. Os

dois conversaram sobre as injustiças que

vinham se sucedendo, enquanto

aguardavam a chegada do terceiro

participante da reunião, que chegou logo

depois. Ninguém faltaria a um encontro tão

importante, principalmente se convidado

pelo Coronel Woodfarm.

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Angus Warspite desceu do cavalo com

seu sobretudo cinza, usando todas as

insígnias e medalhas que recebera por sua

participação na guerra fratricida. No

pescoço tinha o lenço vermelho, símbolo

dos guerrilheiros de Quantrill. Robert foi

recebê-lo e acompanhá-lo até à mesa, onde

Luther esperava-os.

Quando o outro aproximou-se, Luther

levantou-se. Olharam-se com um ódio que

já durava muito tempo, tempo demais até.

Um ódio que não tinha mais sentido agora.

Brigar e matar-se já não mais fazia parte

das vidas daqueles homens. O Coronel

julgava que isso poderia ser transformado

num acordo entre os dois líderes. Para eles,

a paz entre os confederados representaria

um grande passo para o ousado plano que

vinham acalentando: expulsar do Sul

aqueles abutres que vinham sugando a

vitalidade daquela gente derrotada e

desmoralizada.

A idéia era resgatar o orgulho sulista e

mandar os ianques de volta para o lugar de

onde vieram.

- Bem, cavalheiros, o fato de estarem os

dois aqui significa que entenderam nossos

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argumentos, mostrando-se dispostos a

negociar não? — falou Robert.

— Você nos prometeu grandes

realizações. — disse Luther.

— Estamos esperando, pode falar —

acrescentou Angus.

— A idéia de meu pai é simples. Vamos

parar de brigar entre nós mesmos e começar

a brigar contra os nortistas. Titus tem

experiência e treinará os homens em táticas

de guerrilha. Luther organizará uma rede de

esconderijos e fornecimento de comida,

camas e munição entre os fazendeiros.

Vamos agir principalmente contra os

Bancos sulistas, os cobradores de impostos

e os leiloeiros, que vendem nossas terras em

praça pública. Vamos começar a recolher

nosso tesouro, amigos. Com ele nas mãos,

pagaremos os impostos e compraremos de

volta nossas terras. Veremos se esses

sulistas sanguessugas vão querer continuar

por aqui, quando começarmos a devolver-

lhes o fogo, o ferro e o sangue com que nos

têm tratado até agora. Estão entendendo?

Os dois líderes olharam-se por instantes.

O que Robert dizia tinha alguma lógica,

mas já fora tentado antes. Não havia como

combater aquela horda de invasores

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arrogantes e prepotentes, com suas carteiras

cheias de dinheiro e a conivência dos

cobradores de impostos e juizes.

Angus comentou isso. Luther concordou

com ele. Robert sorriu matreiramente,

lembrando-se que seu pai pensara naquilo

também.

— Podemos maximizar nossas ações e

vitórias, fazendo os ianques brigarem entre

si.

— Como assim? — insistiu Angus.

— Vamos arrumar para eles um motivo

para se matarem. Se começarem a se

preocupar com eles mesmos, vão nos deixar

em paz por algum tempo, o suficiente para

nos organizarmos.

Luther e Angus trocaram um olhar de

visível entendimento. A idéia de Robert

tinha sentido. A questão agora era descobrir

como fazer isso.

Os dois olharam ao mesmo tempo na

direção de Robert.

— Como faríamos isso? — indagou

Titus.

— Nós temos um inimigo comum —

mencionou Luther. — Alguém que nos

incomoda e aborrece tanto quanto aborrece

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e incomoda os sulistas... Os Delegados

Federais...

— Exato! — confirmou Robert.

— Sim, aqueles dois malditos! —

lembrou Luther.

— Principalmente aquele bastardo do

Delegado Oates Fordd.

— Esse é o pior de todos.

— Gostaria de pôr minhas mãos nele.

— E eu de arrancar-lhe o coração com as

próprias mãos...

Diante deles, Robert olhava-os com

satisfação. Havia conseguido uní-los em

torno de um objetivo, conforme seu pai

havia previsto. Os dois importantes

representantes já mostravam que havia

ainda orgulho e vontade de lutar dentro

deles.

— Perceberam, senhores, como isso pode

ser feito? — observou ele.

Os dois se voltaram para ele. Pensaram

por instantes, depois começaram a rir.

— Sim, percebemos — comentou Angus.

— Você e seu pai têm toda razão, Robert

— acrescentou Luther. — Só que Oates e

Riley são dois apenas e logo serão mortos...

— Mas a idéia é não deixar que isso

aconteça. E fazê-los provocar a ira dos

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nortistas contra eles, infernizar-lhes as vidas

ao máximo, mas não matá-los. Eles serão

mais úteis vivos. Perceberam?

Desta vez os dois não demonstraram estar

muito certos do que Robert pretendia.

— Eles serão importantes para

fomentarmos o ódio contra os delegados

federais.

— Acho que estou entendendo — falou

Titus.

— Canalizando a preocupação e o ódio

para os federais, iniciaremos ações que

darão a entender que são eles agindo contra

os nortistas. Eles canalizarão toda a raiva e

a agressividade dos nossos invasores,

perceberam?

— É... Tem lógica — comentou Angus.

— Só que, mesmo assim, cedo ou tarde,

alguém vai pegá-lo — mencionou Angus.

— E então, quantos outros virão para

substituí-los? Dizem que os delegados

federais são como praga daninha. Se você

mata um, meia dúzia aparece ao redor.

Compreenderam?

Os dois olharam-se por instantes, depois

começaram a balançar suas cabeças num

sinal de aprovação.

— Muito esperto — comentou Angus.

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— Pode funcionar — concordou Luther.

— Perfeito, senhores. Acho que pegaram

bem o espírito de nosso plano — elogiou

Robert.

— E quando começaríamos esse plano?

— questionou Luther.

— Antes de mais nada, precisamos

estabelecer toda a nossa estratégia. Estão

conosco nisso?

— Cem por cento — afirmou Luther. —

Garanto como todos nossos irmãos

fazendeiros vão adorar a simples idéia de

poderem resgatar suas terras ou não perder

o pedaço que ainda têm.

— E os comerciantes investirão até suas

últimas obturações de ouro para retomarem

o controle do comércio e da navegação

fluvial na região.

— Temos um acordo então, cavalheiros?

— indagou Robert, pondo sua mão aberta

acima da mesa, com a palma para baixo.

Angus e Luther mediram-se por instantes.

A velha desavença entre eles tinha mais

sentido.

Depois, com decisão, Titus pôs sua mão

sobre a de Robert e Luther, a dele sobre a de

Angus.

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— Bebamos a isso, meus amigos — falou

a voz forte e inconfundível de Swam

Woodfarm, surgindo no algo da escadaria,

com seu uniforme confederado de gala,

coberto de medalhas e insígnias.

Titus Warspite pôs-se em pé e, em sinal e

respeito e honra, prestou continência ao

velho e experiente militar, que começou a

descer os degraus, fazendo um sinal para

um de seus homens.

Uma porta se abriu. Um grupo de homens

apareceu, com copos e garrafas, levando-os

para a mesa. Os homens ao redor sorriam

satisfeitos.

— Hoje é um dia que ficará para sempre

gravado na história deste país, meus irmãos.

Hoje foi o dia que declaramos nossa guerra

contra a União dos Estados Unidos e

decretamos a criação do Estado Livre da

Geórgia.

Os homens aplaudiram

entusiasticamente. Rolhas saltaram. Copos

foram enchidos e erguidos, num brinde

emocionado.

— Ao Estado Livre da Geórgia! — gritou

o coronel e todos responderam com a

mesma saudação.

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Aquela prometia ser mais uma daquelas

longas e malditas noites de ronda naquele

território selvagem, o mais perigoso, o mais

temido e o mais assustador da cidade, uma

terra de ninguém separando perdedores de

vencedores.

Os dois delegados tinham, ainda, uma

razão especial para detestar aquele trabalho,

naquela região. O Xerife Jefferson não via

com bons olhos aquilo que ele julgava como

uma intromissão da União nos negócios da

cidade.

A presente dos dois federais criava um

problema de jurisdição, principalmente

considerando que os dois estavam onde a

encrenca acontecia, enquanto, para sua

felicidade ou infelicidade, o xerife estava

sempre no canto oposto.

Assim, com caras de poucos amigos o

xerife e seus auxiliares tiveram de ouvir o

cobrador de impostos derramar elogios

sobre a atuação dos delegados federais, os

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únicos com competência para tornar as ruas

de Atlanta seguras para um cidadão

honesto.

— Veremos se vai se sentir dessa forma,

quando a situação mudar — murmurou o

xerife, entredentes.

O Delegado Oates Fordd ficou pensativo,

demonstrando a preocupação nas rugas que

vincavam sua testa.

O xerife não gostava deles, isso era um

fato incontestável e os dois sabiam disso.

Estava sempre preparando algo para tornar

mais difíceis a vida e o trabalho deles. Algo

lhe dizia que o xerife sabia de algo que eles

ainda não sabiam.

— Ele o deixou preocupado, Oates. O

que foi? — perguntou Riley.

— Esse sacana está sabendo de algo que

não sabemos.

— E você acha que pode ser o quê?

— Não sei ainda, mas vou descobrir.

— Como?

— Pensarei em algo. Vou ao restaurante

tomar um café. Vamos comigo?

— Particularmente eu preferiria um

uísque, depois dessa agitação toda. A cada

dia isto aqui se torna mais perigoso. Essa

gente está desesperada, meu amigo.

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Caminhavam pela rua, puxando seus

cavalos, deixando para trás o xerife e seus

homens para limpar toda a sujeira. Um

negro com os cabelos cortados bem curtos,

roupas sujas e esfarrapadas, apontou a

cabeça num beco, chamando por Oates.

Os dois foram até ele.

— Ei, Oates, está acontecendo alguma

coisa lá para os lados do rio — disse ele.

— E o que é, Pete "Noite Escura"?

— Não sei dizer, mas havia muitos

homens... Gente com armas e uniformes...

— Alguma briga?

— Não, mais parecido com festa...

— Alguém conhecido?

— Pete é muito esperto para ter ido ver

de perto... Bastante gente... Carroças e

cavalos... Grande festa, com certeza.

— Se era uma festa, por que não foi até

lá, Pete?

— Pensa que sou louco? — retrucou o

outro, rindo e estendendo a mão.

— Onde foi isso, Pete?

— Na Mansão O'Brien, sabe onde é?

— Sim, acho que sim, Pete. Obrigado

pela informação — disse, enquanto punha

uma moeda na mão estendida.

Pete sumiu para dentro do beco.

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— O que acha que pode ser? - indagou

Riley.

— Não sei, mas adoraria dar uma olhada.

— Pena que já acabou, não?

— Talvez encontremos alguma coisa

ainda... O que me diz? — indagou, olhando

para o parceiro

Era aquilo que tornava Oates um

delegado eficiente. Nada o intimidava.

Aquela sua maldita curiosidade o levava a

qualquer lugar, não importavam os riscos e

Riley já perdera a conta das encrencas em

que os dois já haviam se metido por causa

disso, desde que estavam ali. .

Oates fizera pergunta apenas por fazer.

Riley já o conhecia bem. Ele fazia pergunta

e já tratava de pô-la em prática, montando

seu cavalo. Riley tratou de fazer o mesmo.

Seu amigo já galopava a sua frente.

Todo o andar de cima da casa estava

destruído. A parte de baixo havia sido

precariamente adaptada para oferecer um

mínimo de conforto.

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Nas paredes, pedaços retalhados de telas

e pinturas indicavam o bom gosto dos

moradores daquela mansão. Os lampiões

acesos não lembravam em nada o brilho

antigo, quando os candelabros de cristal

iluminavam soberbamente as paredes

luxuosamente decoradas, os tapetes e

cortinas vindos direto de Paris, além dos

móveis maciços e finamente entalhados por

mãos hábeis.

A mesa posta com um resto de luxo era

ocupado por apenas um velho, servido por

uma equipe de dois fiéis e antigos criados,

velhos demais para entenderem o

significado da libertação. Swam Woodfarm

chegava aos sessenta anos com grande

vitalidade e uma lucidez impressionante

para sua idade.

Havia lutado várias batalhas e conseguido

muitas vitórias, mas caíra na batalha final

de Kennesaw, quando os confederados

ofereceram a última e decisiva resistência,

antes da queda de Atlanta.

A derrota fora um golpe violento em seu

orgulho. Já não tinha mais a vitalidade de

antes e não conseguia se adaptar àquela vida

de privações. Para um homem como ele,

habituado ao luxo e ao comando, ver-se

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naquela condição quase de um mendigo era

doloroso demais.

Por isso vinha preparando seu filho,

Robert Woodfarm, para levar adiante aquele

plano.

Havia relutado em prepará-lo, mas os

dias de miséria tornavam-se cada vez mais

dolorosos para ele. Aquela poderia ser sua

última chance de sair daquela situação de

penúria e recuperar a honra e a riqueza

perdidas.

— Bom trabalho, filho — disse-lhe o

velho, assim que Robert chegou.

— Pelo menos neste início, tudo

aconteceu conforme havia previsto, meu

pai.

— Eu tinha certeza que seria assim —

afirmou o velho.

— Continuo curioso, no entanto, para

saber o que tem em mente com tudo isso.

— Agora posso lhe contar, meu filho.

Essas ações contra os ianques, bem

planejadas, vão tornar esse tesouro que

pretendo amealhar muito grande, o bastante

para darmos o fora daqui, meu filho. Há

terras boas e baratas na Califórnia e no

Oregom. É para lá que iremos, recuperar a

tradição do nome Woodfarm.

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Os olhos do rapaz brilharam de cobiça.

— Pensou nisso mesmo, pai?

— Sim, vamos tirar dos ianques o que

eles tiraram de nós...

— Mas os outros...

— Os outros são soldados e soldados dão

a vida, sem esperar recompensa, Robert.

Serem roubados pelos ianques ou por nós,

não fará nenhuma diferença para eles.

— Entendo! Parece-me um bom plano,

pai.

— E seu trabalho vai ser importante para

o sucesso de tudo isso, filho.

— Farei minha parte, pai. Pode ter

certeza — garantiu o rapaz, apanhando de

novo seu chapéu.

— Vai sair?

— Sim, vou tomar um trago com os

rapazes.

— Cuide-se, filho. Não aceite

provocações dos ianques, mas não volte

para casa trazendo uma ofensa.

— Entendido, pai — afirmou ele, saindo.

Lá fora o esperavam três de seus

melhores amigos.

— E então, Robert? — indagou um deles.

— Eu estava certo o tempo todo. O velho

e seu grande plano vão nos render um

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verdadeiro tesouro. E o melhor é que não

vamos ter que repartir o tesouro —

comentou ele enquanto montava.

— E nós, onde entramos nisso, Robert?

— quis saber um outro.

— Apenas fiquem do meu lado, rapazes,

e não se arrependerão — prometeu ele.

— Onde vamos? Algum lugar em

especial, Robert? — indagaram.

— Vamos dar uma volta, enquanto

conversamos. Depois vamos ao Saloon da

Rose, ainda é cedo para ir para lá.

Um deles tirou uma garrafa de uísque do

alforje, estendendo-a para Robert, que

tomou um gole, saboreando a bebida,

enquanto pensava. A perspectiva de retornar

àquela vida de luxo e de conforto de

antigamente agradava-o muito.

Principalmente sabendo que iria fazê-lo

às custas dos malditos ianques.

Um grupo de nortistas, acompanhados de

duas garotas, retornava da igreja a pé,

quando foi abordado por um bando de

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sulistas a cavalo. Os confederados, após a

derrota, haviam dolorosamente aprendido a

suportar as zombarias e a humilhação.

Tudo estava sob controle, até que um dos

cavaleiros inclinou-se e enfiou a mão pelo

decote de uma das garotas. Ela reagiu

furiosamente, cuspindo no rosto dele.

Imediatamente os cavaleiros atiraram seus

animais para cima do grupo. Não satisfeitos,

desmontaram e começaram a chutar e

esmurrar os homens caídos na poeira. As

garotas ficaram possessas, começando a

gritar no meio da rua.

Ninguém apareceu em socorro delas,

embora, atrás das portas e janelas, muita

gente assistia à cena.

Os sulistas tentaram correr, apesar de

espancados. Os nortistas apanharam seus

cavalos e foram no encalço deles,

empurrando-os contra um beco sem saída.

Ali desmontaram e recomeçaram a bater

nos seus inimigos.

Todas as armas dos sulistas haviam sido

confiscadas. Se um deles fosse apanhado

usando uma arma, mesmo que fosse um

canivete, era preso e severamente punido.

Por isso um deles havia relutado, mas ser

chutado como um cão e sentir suas costelas

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sendo partidas foi demais para ele. De sob

seu sobretudo ele retirou uma espingarda de

dois canos. Os canos e a coronha haviam

sido cortados, tornando-a fácil de portar e

esconder, mas com um poder de fogo

violento a curta distância.

Ele engatilhou a arma e apontou-a na

direção de seus agressores. Apertou os dois

gatilhos ao mesmo tempo

A poderosa descarga atingiu em cheio o

rosto de um dos atacantes, fazendo sua

cabeça sumir em meio a uma nuvem de

sangue, miolos e cabelos.

Os outros tentaram fugir. Um deles,

porém, sacou seu Colt e começou a

disparar.

O primeiro disparo arrebentou uma

vidraça em algum ponto lá atrás. Outros

dois homens sacaram espingardas

semelhantes, disparando-as na direção do

bando que tentava abrigar-se atrás de uma

carroça.

— Vão me pagar caro por esta surra —

dizia o rapaz, enquanto remuniciava sua

espingarda.

O homem com o Colt na mão disparou o

segundo tiro, atingindo-o no peito e

jogando-o para trás.

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Uma das garotas ergueu sua saia e retirou

dali um pequeno Derringer, de dois tiros.

Disparou contra o ianque, no momento em

que um de seus amigos também disparava

sua espingarda de caso serrado.

O ianque foi jogado para o alto e para

trás, caindo com os braços abertos e um

rombo enorme no peito.

— Malditos! Pegaram meu amigo —

gritou um ianque, saindo detrás da carroça e

correndo para o beco, disparando um rifle.

Um dos sulistas levantou sua Overland de

canos serrados e disparou, atingindo-o em

cheio. Ele jogou os braços e a Winchester

para o alto, enquanto era empurrado para

trás.

As garotas começaram a disparar também

contra os homens atrás da carroça. Elas

usavam Derringers, que seguravam com

ambas as mãos, enquanto disparavam sem

muita pontaria àquela distância, mas

arrancando lascas da carroça ou

arrebentando vidraças atrás deles.

Nas casas ao redor, as pessoas deitavam-

se no chão, buscando proteção contra aquele

inferno de chumbo.

Um dos nortistas havia conseguido

apanhar seu rifle na sela do cavalo e

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começou a responder ao fogo, sem atingir

ninguém.

— Bastardos! — falou uma das garotas,

apanhando uma das tochas que iluminavam

a rua.

Arremessou na direção da carroça. A

garrafa caiu sobre a madeira, jogando

fagulhas para todo lado, mas continuando a

arder e espalhando rapidamente o fogo.

— Malditos rebeldes! — berrou um

deles, tentando apagar as chamas, batendo

com seu colete, mas incendiando-o e

jogando o fogo sobre seus amigos.

Eles trataram de fugir dali, tentando

correr para longe da carroça.

Um dos sulistas cortou-lhes o caminho

com sua espingarda engatilhada e apontou-a

para eles, disparando os dois canos sem

piedade.

A carga especialmente reforçada abriu-se

num leque mortal, atingindo todo eles e

derrubando-os. Alguns ainda ficaram se

contorcendo na poeira, com as roupas em

chamas. As garotas aproximaram-se e

foram imobilizando-os com certeiros

disparos de Derringer na cabeça.

Os corpos ficaram imóveis, ardendo

macabramente no meio da rua. Um dos

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sulistas soltou o grito de guerra rebelde, no

momento em que Oates e Riley, atraídos

pelo tiroteio, dobravam a esquina a galope.

— Que diabos é isso? — indagou Riley,

surpreso, olhando aquelas estranhas

fogueiras ardendo no meio da rua.

A resposta veio em seguida com uma

série de disparos na direção deles.

— Oates, acho que não nos convidaram

para esta festa — gritou Riley, saltando do

cavalo e indo ocultar-se do outro lado da

rua.

— Diabos, esta noite promete —

comentou Oates, erguendo a sua Winchester

e disparando de volta.

Sua pontaria foi certeira. Três tiros

acertaram em seqüência o corpo de um dos

atiradores, jogando-o contra uma parede.

Quando escorregou para o chão, deixou

uma trilha de sangue na madeira.

— Filho de uma cadela!... Maldito! —

gritou uma das garotas, mirando sua

pequena arma na direção de Oates.

— É uma garota, Oates! — alertou Riley.

O delegado hesitou por instantes. Era

mesmo uma garota confederada, com os

cabelos soltos, correndo na direção dele

com uma Derringer em cada mão.

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Riley percebeu a indecisão do amigo e

disparou sua Overland contra a garota,

jogando-a para trás, sobre o corpo em

chamas de um nortista.

A outra garota começou a correr na

direção de Riley, que tratou de remuniciar

sua arma.

— Pegue-a, Oates! Pegue-a ou ela vai me

acertar — pediu Riley, atrapalhando-se para

recarregar a espingarda.

— Diabos! — praguejou Oates,

apontando o rifle na direção da garota que

corria pela rua.

Jamais vira uma imagem tão

impressionante. A garota parecia fora de si,

disparando e remuniciando com rapidez as

armas que tinha mas mãos.

— Atire, demônios! — insistiu Riley, no

momento em que Oates apertava o gatilho.

Riley viu, na sua frente, a garota ser

puxada para trás por uma força invisível.

Seu corpo arrastou-se na poeira, ficando

imóvel, numa posição grotesca e retorcida.

O disparo secionara sua espinha e abrira

um rombo em sua barriga, jogando para

fora tudo que estava lá dentro.

Riley respirou aliviado, enquanto

remuniciava sua espingarda, engatilhando-a

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em seguida. Avançou na direção dos corpos

que se espalhavam pela rua. Oates seguiu-o,

após recarregar sua arma também.

— Pensei que não fosse atirar - comentou

Riley.

— Era uma mulher...

— Pois então não pense nela como uma

mulher. Pense nela como uma assassina,

que é o que ela era, na verdade. Você já

tinha visto coisa assim antes?

O tropel de cavalos aproximando-se

indicava que o xerife e seus auxiliares, com

certeza, se aproximavam.

Como sempre, apareciam só quando o

tiroteio cessava.

— O que temos aqui? — indagou o

homem da lei.

— Uma besta a cavalo! — respondeu

Oates.

— Muito engraçado, delegado! Não acha

que já teve encrenca demais para uma só

noite? — insistiu o policial, desmontando.

Os curiosos chegaram em seguida. Oates

e Riley foram examinar a cena da tragédia e

tentar entender o que havia acontecido,

seguidos pelo xerife.

— Muito bem, pessoal: que diabos

aconteceu aqui? — indagou o xerife às

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pessoas que saíam das casas, ainda com

olhar assustado.

Mais tochas foram acesas, iluminando

macabramente o cenário de morte.

— Os nortistas provocaram os nossos,

xerife. Começaram a surrá-los. Um dos

rapazes sacou uma espingarda e começou

um tiroteio. Estavam se saindo bem, até que

chegaram os dois federais — explicou uma

das pessoas.

Riley, percebendo que Oates afastara-se

para não demonstrar sua irritação para com

o xerife.

— Foi isso mesmo, Oates?

— Sim — antecipou-se Riley. —

Ouvimos o tiroteio e viemos ver o que

estava acontecendo, quando alguém atirou

em nós e revidamos, atirando de volta —

explicou.

Espero que esteja falando a verdade,

Riley. Seria uma pena ter de puní-los por

excesso de força...

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Um grupo de cowboys que acabava de

chegar à cidade entrou no saloon com ar

cansado e poeira cobrindo seus rostos.

Quando chegaram no balcão, O bartender já

servira a bebida preferida de todos eles,

uísque puro.

— Burt, se minha mulher soubesse meus

gostos como você sabe, eu seria um homem

feliz — comentou um deles.

— Como foi o dia, rapazes? — indagou

Burt, que havia sido cowboy antes da guerra

e agora era sócio do Saloon da Rose, o mais

freqüentado da zona sulista da cidade.

— O mesmo trabalho de sempre, Burt —

falou Doyle, tirando o chapéu e esfregando

uma das mãos nos ralos cabelos. — O dia

inteiro olhando traseiros de vacas. Pelo

menos estamos livres do chumbo que anda

correndo solto pelas ruas de Atlanta, não?

Houve briga feia ainda há pouco. Passamos

por lá e vimos os cadáveres espalhados.

— Algum dos nossos?

— Dos dois lados.

— Sem contar que tentaram assaltar um

coletor de impostos nas barbas sabe de

quem?

— Oates Fordd?

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— Ele mesmo. O bastardo é mais esperto

que uma serpente. Ele e Riley despacharam

uma porção deles para o inferno.

— Eram dos nossos?

— Acho que não, só pode ser gente de

fora. Quem seria maluco de tentar isso na

frente daqueles dois?

— É... Não devia mesmo conhecer Oates,

aquele demônio — comentou o bartender,

mas ninguém mais o ouvia, ocupados com

suas bebidas.

O bartender foi até o fim do balcão, onde

um velho grisalho, num surrado uniforme

confederado, bebia sozinho seu uísque.

— Como eu estava lhe dizendo, Burt,

parece que alguma coisa grande vai

começar a acontecer por aqui, depois

daquela reunião hoje na Mansão O'Brien.

Os rapazes todos estavam lá — comentou

ele.

— Tem alguma idéia do que seja?

— Nenhuma, mas o Coronel está no

meio.

— E o resto dos rapazes?

— Não falei com nenhum deles. Esperei

encontrá-los aqui.

— Ficarei atento. Alguém deverá saber o

que está acontecendo.

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O bartender retornou ao balcão, onde os

cowboys terminavam suas bebidas. Repetiu-

lhes a dose.

Chamou-os para mais junto de si. Os

homens debruçaram-se sobre o balcão.

— Sabem alguma sobre o que houve lá

para os lados do rio esta noite, pessoal? —

indagou ele.

— Nada que saibamos com detalhes,

Burt. Parece que houve uma reunião do

nosso pessoal. Um amigo passou por lá,

mas muito depois e já não havia mais

ninguém para informar o que havia sido

resolvido. Sei apenas que há uma notícia

correndo por aí...

— Que notícia?

— Manda limparmos e remendarmos

nossos uniformes e dobrarmos o lenço

vermelho — informou o cowboy.

— Ninguém tem ao menos uma idéia do

que esteja acontecendo?

— Não sabemos ao certo, Burt, mas

estávamos justamente comentando isso.

Exceto por esses dois tiroteios, percebeu

como a noite está calma?

O bartender olhou ao seu redor. Percebeu

que a maioria de seus habituais fregueses

ainda não havia chegado. Sempre apareciam

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com uma história a mais de humilhação e

sofrimento para contar. Naquela noite,

porém, pareciam não ter motivos para beber

e chorar as mágoas.

ã medida que a noite avançava, ao invés

de aumentarem as confusões, como sempre

acontecia, elas foram diminuindo. Dava

para sentir nos ossos que alguma coisa

estava acontecendo.

— Estranho? — comentava o bartender, a

todo momento, com ar pensativo.

Todos os fregueses que entravam tinham

a mesma sensação. Alguma coisa estava

acontecendo e eles desconheciam.

Era como se as pessoas tivessem alguma

coisa muito importante para fazer naquela

noite. Essa idéia não lhe saía da cabeça.

Passava um pouco das onze da noite,

quando o xerife e seus assistentes passaram

por ali para beber um trago.

— Que diabos estão fazendo aqui tão

cedo? — indagou ele.— Estão desertando

do serviço?

— Burt, tudo está em paz lá fora —

afirmou o xerife, num tom misterioso.

— Isso tem alguma coisa a ver com a

reunião na Mansão O'Brien?

— É possível...

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A maneira como o xerife falava e sorria

misteriosamente dava a entender que sabia

o que estava acontecendo. E não podia ser

de outra maneira.

O Xerife Jefferson era um sulista que,

graças a sua tremenda habilidade e o apoio

do Coronel Woodfarm, conseguira ser

nomeado xerife da cidade dividida, tendo

livre trânsito nos dois territórios.

— O que está acontecendo? — insistiu o

bartender.— Os rapazes todos estão

curiosos, Rose está curiosa. Se é algo contra

os ianques, queremos todos saber e

participar.

— Vocês terão sua chance, só posso lhe

dizer isso por enquanto — assegurou o

homem da lei.

— Espero que seja para breve, xerife.

Estamos todos com esses ianques

atravessados na garganta — comentou o

bartender, mas interrompeu quando viu um

velho soldado, apoiado numa muleta, entrar

no bar e ir até uma parede, onde havia uma

bandeira confederada pregada.

Espetou um pedaço de pano vermelho

com um alfinete nela, deu o grito de guerra

rebelde, depois retirou-se diante de todos os

outros, que haviam feito silêncio.

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O bartender deixou seu posto e foi até lá,

olhar o pano que ele deixara. Era um pedaço

de uma antiga bandeira confederada, com

um nome escrito nela: Quantrill, o

guerrilheiro que por muito tempo

infernizara os ianques com seus ataques às

cidades nortistas.

Seu bando havia sido, finalmente,

destruído, sobrando apenas alguns nomes

que agora enfeitavam cartazes de procura-

se, espalhados nas árvores de todo o país.

O pano vermelho significava que

Quantrill ou sua idéia estava de volta.

Quando retornou ao balcão, o xerife o

olhava com interesse. Burt podia sentir em

seus ossos que ele sabia algo sobre aquela

historia toda, mas não a contaria.

— É um recado para limparmos as armas

e os uniformes, xerife. Vamos voltar a agir

contra os ianques?

— Vamos deixar esse assunto de lado,

Burt. Apenas espere e vá limpando as

armas... — recomendou o xerife. — Onde

está Rose?

— Lá encima.

— Vou falar com ela.

— Vai contar o que está havendo?

— Talvez.

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— E ela dirá a nós?

— Pergunte a ela — finalizou o xerife,

deixando-o sem resposta.

Os dois delegados haviam voltado para o

escritório, onde ficava a Delegacia Federal.

Após aqueles tiroteios, uma incrível calma

havia se abatido no lado sulista da cidade.

— O que acha que pode estar havendo?

— questionou Oates.

— Diabos como há muito tempo não vejo

esta cidade tão parada. Alguma coisa está

acontecendo?

— Será que tem alguma coisa a ver com

o que houve lá na beira do rio?

— Refere-se à movimentação na velha

Mansão O'Brien?

— Sim... Mas nada havia quando fomos

lá. Será que o negro não se enganou?

— Quem pode saber. O pobre Pete

"Noite Escura" não fica sóbrio desde que

começou a guerra, pelo que sei.

— Talvez possamos obter algumas

respostas — comentou Oates.

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— Como?

— Indo ao Saloon da Rose.

— Onde?

— No Saloon da Rose — repetiu Oates.

Riley olhou-o com atenção, tentando

descobrir se realmente o amigo falava sério.

— Não, Oates, de jeito nenhum —

comentou, quando percebeu que sim.

— E por que não? Já estivemos lá antes...

— Ainda tenho a cicatriz nas costas da

garrafada que levei, quando você cismou de

não prestar continência àquela bandeira

esfarrapada na parede.

— Ora, Riley, eu não podia. Jurei minha

lealdade à União.

De repente, na janela que dava para um

beco ao lado da delegacia, alguém bateu

levemente.

Os dois delegados se olharam e sacaram

seus Colts ao mesmo tempo.

— Oates! — chamou alguém lá fora.

O delegado se aproximou da janela e,

quando ia abrí-la, uma voz feminina

sussurrou lá de fora.

— Não, não abra, delegado!

Oates sentiu suas velhas cicatrizes

doerem, alertando-o para um perigo muito

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próximo e muito mais perigoso que um tiro

de Winchester.

Conhecia aquela voz, por mais que ela

tentasse disfarçá-la.

— O que deseja? — indagou ele.

— Oates — disse a voz feminina. — Se

for passar pela via férrea esta noite, olhe no

telhado da loja de ferragens.

— É você?

Um riso surpreso e ao mesmo tempo

envaidecido se ouviu do outro lado.

— Por favor, não abra a janela nem me

siga, delegado. Pode pôr a minha vida em

perigo — murmurou ela.

Oates ficou ali, colado à janela, tendo a

certeza de que aspirava o perfume dela, mas

nada podia fazer. A mulher tinha razão.

Toda e qualquer ação da parte dele poria a

vida dela em perigo.

— O que houve, Oates? — indagou

Riley.

— Acho que já demoramos demais para

fazermos nossa última ronda, Riley.

— Era ela?

— Com certeza.

— Quem pode querer sua cabeça tanto

assim, a ponto de querer matar um delegado

federal?

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— Tem que ser mais do que pessoal,

Riley. Vamos ver se descobrimos o que é...

Riley apanhou sua espingarda, uma

bandoleira cheia de cartuchos, e seguiu-o.

— Desconfio, Riley, que há muita gente

que não gosta de nós nesta cidade, não

acha?

— É... Acho que você tem razão —

concordou Riley, seguindo-o. — Esta noite

estava calma demais para o meu gosto

mesmo. Detesto o sossego, a paz, a

tranqüilidade e a felicidade...

Uma tensão já conhecida instalou-se nos

dois delegados federais.

Alguma coisa estava acontecendo na

cidade. Uma coisa estranha que estava

tirando das ruas os rebeldes brigões e

deixando apenas os ianques provocadores à

procura de encrenca, sem encontrar. Teria

sido isso que os levara a armar aquela

emboscada?

Seria uma forma daqueles malditos se

divertirem?

Oates sabia muito bem que havia muitos

ianques veteranos de guerra que não

conseguia ir para a cama sem quebrar

algumas cabeças confederadas.

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Desde o término da guerra e com a

chegada dos vencedores, Atlanta jamais

fora daquele jeito. Podia-se sentir no ar que

alguma coisa estava para acontecer. Era a

mesma sensação que precedia as batalhas,

na guerra de que haviam participado.

— Já percebeu, Riley? Já fizemos esta

ronda dezenas de vezes, mas nunca é a

mesma coisa. Nunca sabemos o que vamos

encontrar pela frente, não?

— Se não fosse pelos avisos que ela nos

manda, já teríamos morrido há muito

tempo, não?

— Com certeza!—

— E o que acha que está havendo na

cidade? O que significa essa trégua?

— Significa muita encrenca a caminho,

pode ter certeza — falou Oates, verificando

a barrigueira de seu cavalo, apertando-a

bem firme, depois montando.

Riley fez o mesmo.

— Como vamos enfrentar essa? —

indagou Riley, acomodando a espingarda no

coldre da sela.

— Vamos ver o cenário da batalha

primeiro — falou Oates, pondo seu cavalo

para andar.

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Não rumaram direto para a rua paralela à

via férrea, onde era a divisa entre os dois

territórios da cidade.

Foram para a rua que ficava atrás da loja

de ferragens. Oates parou seu cavalo e

desceu, levando sua Winchester.

— O que vai fazer? — indagou Riley.

— Vamos ver como estão as coisas.

Riley desceu e seguiu-o. Aproximaram-se

e entraram num beco de onde podiam

observar o telhado da loja de ferragens.

— Vê alguma coisa? — indagou Riley.

— Se está lá, está imóvel e muito bem

escondido. Vamos ter de fazê-lo sair de lá,

Riley.

— Como quer fazer?

— Vou ficar aqui e você retorna até o

começo da rua. Avança devagar. Quando o

bastardo lá encima pôr o nariz para fora, eu

o acerto...

— E se houver mais de um lá?

— Eu tenho uma Winchester, acerto os

dois, não se preocupe.

— Ok, Oates! Vou voltar a fazer o que

me pede.

Enquanto Riley retornava até os cavalos,

Oates procurou a melhor posição para

apoiar sua Winchester, no beco. Dali, no

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escuro, podia observar todo o telhado da

loja sem ser visto.

Não via sinal de ninguém lá.

Subitamente, porém, viu a chama de um

cigarro ardendo no alto do telhado.

Aquela brasa indicava a presença de

alguém lá. Engatilhou a Winchester e

esperou, atento a qualquer movimento.

Riley já devia estar no começo da rua. A

qualquer momento alguém teria de surgir lá

em cima.

— Bastardo filho da mãe! — murmurou

ele, quando uma cabeça surgiu lá encima,

com um fuzil na mão.

Um homem alto, usando chapéu, apontou

no alto do prédio, olhando a rua. Depois

abaixou-se para, em seguida, tomar posição

de tiro com seu fuzil.

Pelos movimentos de mão que fez, Oates

percebeu logo que se tratava de uma arma

especial. Sabia de que tipo era. Os soldados

sulistas haviam usado muito aquelas armas

no fim da guerra. Eram armas de longo

alcance, com luneta rudimentar e projéteis

especiais.

Riley estava em perigo, porque poderia

ser atingido de longe. Tratou de agir rápido.

Mirou cuidadosamente e disparou. Viu o

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chapéu voar para cima, levando junto parte

da cabeça do atirador.

Riley esporeou seu cavalo e avançou em

disparada, ao ouvir o tiro.

— Você o pegou? — indagou, saltado do

cavalo com sua espingarda engatilhada e

pronta para disparar.

Oates havia corrido esconder-se atrás de

um bebedouro, olhando o telhado

atentamente.

— Sim, arranquei a cabeça do bastardo.

— Algum sinal de mais alguém?

— Não, havia apenas um. Vou subir lá

para verificar. Fique aqui e me dê cobertura.

Oates atravessou a rua e entrou no beco

atrás do prédio. Havia uma escada ali.

Enroscou a correia da Winchester no ombro

e começou a subir.

Tudo estava em silêncio ao redor. Oates

estava achando tudo aquilo muito estranho.

Viu o corpo caído no telhado. Não

precisaria chegar perto para ver que faltava-

lhe parte da cabeça. Mesmo assim foi até lá.

Estava interessado em algo. Junto ao corpo

havia um fuzil especial para atiradores de

emboscada, com mira telescópica,

semelhantes aos usados pelos nortistas,

como ele deduzira.

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Conhecia aquela arma muito bem.

Apenas se ouvia seu som ao longe e um

corpo caía em algum lugar ao redor deles.

Quem estivesse na mira dele no momento

do disparo dificilmente escaparia.

A caixa de projéteis junto ao rifle

mostrava o tipo de bala empregada e sua

procedência: Exército dos Estados Unidos.

— Bastardos! — murmurou ele, sem

entender, inclinando-se para examinar o

rifle.

— Tudo bem, Oates? — indagou Riley,

surgindo no telhado.

— Sim, só havia um. Conhece este tipo

de arma? — indagou Oates.

— Sim, usei uma na guerra. É infalível.

De lá de cima Oates ficou olhando as

pessoas que saíam à rua, nos dois lados da

cidade, observando e tentando adivinhar o

que havia acontecido.

Oates ficou pensando como alguém

conseguiria aquela arma e a munição,

exclusivas do Exército da União. E por que

se daria ao trabalho de preparar uma

emboscada como aquelas.

Quem estava por trás de tudo aquilo?

Quem o desejava morto?

E por quê?

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Tudo isso apenas confirmava para ele que

alguma coisa estranha, muito estranha,

acontecia em Atlanta.

E só havia uma forma de começar a

encontrar as respostas.

Era quase meia-noite quando Robert

Woodfarm chegou ao Saloon da Rose,

sendo saudado em pé, com palmas, pelos

presentes. O filho do Coronel Swam

Woodfarm era olhado com respeito. Mãos

se estenderam em sua direção e ele as foi

apertando, à medida que caminhava até o

balcão.

Burt já o esperava com uma garrafa de

brandy envelhecido, a bebida exclusiva do

coronel e, agora, de seu filho. Era a mais

cara do estabelecimento, mas nem o coronel

nem seu filho pagavam alguma coisa ali.

— Veja lá na parede - apontou Burt, na

direção da bandeira confederada, onde o

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velho havia pregado o pedaço de pano

vermelho.

Robert e seus amigos sorriram. A notícia

corria rapidamente. Seria fácil mobilizar um

exército contra os ianques, mas os planos

deles não previam nenhum ato meritório ou

ação heróica.

— ã Confederação! — brindou ele e

todos se puseram em pé para brindar

também.

Um semicírculo se formou, deixando-o

no centro, apoiado ao balcão e olhando

aqueles rostos cheios de expectativa.

— Robert, é verdade o que andam

dizendo por aí? - indagaram.

— E o que andam dizendo por aí? —

devolveu ele.

— Aquilo! — insistiu o homem,

apontando na direção da bandeira na parede.

— Nada posso dizer, rapazes. Eu estaria

cometendo um crime de alta traição contra a

União. Nada sei de heróis que pretendem

resgatar a honra e o orgulho do povo sulista

— afirmou ele e, nas entrelinhas, todos

entenderam o que ele queria dizer.

— E poderíamos ajudar esses heróis, se

eles por acaso aparecessem? - quis saber

outro.

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— Acredito que eles aceitariam toda a

ajuda possível, amigos. Esperem. Quando

for o momento, eles pedirão ajuda, se acaso

existirem mesmo.

— E seu pai, como está?

— Meu pai só fia satisfeito no lombo de

um cavalo e na expectativa de uma batalha.

Posso lhes afirmar que ele nunca esteve

melhor, rapazes.

— Um hurra para o coronel e seu filho!

— propôs alguém e o saloon estremeceu

com a saudação.

No momento seguinte ele se calou. No

alto da escada surgia Rose, com seu vestido

vermelho lembrando a bandeira

confederada. Todos os olhos se voltaram

para ela. A admiração e o desejo

estampava-se em todos os rostos.

Era a mulher mais desejadas de Atlanta,

mas ninguém podia afirmar que tinha

dormido com ela, nem o próprio coronel

nem seu filho. Rose era bela e inatingível.

O pianista tocou os primeiros acordes de

Dixieland. Rose começou a cantar com sua

voz levemente rouca, mas cheia de emoção

e vibração. Os homens contaram com ela.

Quando terminou, os aplausos

explodiram no saloon.

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— Uma rodada por conta da casa, Burt

— declarou ela.

Os aplausos foram mais entusiasmados

ainda. Todos correram para o balcão. Burt

foi servindo os copos um a um. Rose foi até

a bandeira confederada na parede. Robert

foi ter com ela.

— Está sabendo das novidades? —

indagou ele.

— Sim, o xerife esteve aqui e me contou.

— Ótimo! Já começamos nosso trabalho.

Estamos nos organizando para entrar em

ação. Soube dos delegados federais?

— Sim, o xerife disse que eles estão

sendo ameaçados. Quem está por trás disso,

afinal?

— Ainda não sabemos, mas a morte deles

pode ser interessante para nós.

— Como assim?

— Seria ótimo para nós que apenas o

xerife ficasse no controle da lei em Atlanta.

Poderemos agir livremente, assaltando o

banco, os coletores de impostos e os

leiloeiros e compradores de terra.

— Se eles forem mortos, outros virão no

lugar deles...

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— O xerife pode insistir junto aos seus

amigos ianques para que não façam isso.

Não sei como ficaria.

— A vida daqueles dois não será nada

fácil daqui para frente — comentou Rose.

— Hoje à noite escaparam de uma

emboscada, mas sabemos que puseram

quatro pistoleiros atrás deles. Cedo ou tarde

eles serão apanhados. É só uma questão de

tempo.

Rose ficou pensativa, traindo sua

preocupação. Robert sorriu

misteriosamente. Ele e alguns outros sabiam

do caso entre ela e Oates, desde quando ele

era major no Exército Confederado.

Naquela noite, quando o xerife a

procurara, foi para que ela avisasse Oates da

emboscada e ele pudesse se antecipar,

apanhando o atirador com a arma e a

munição nortista.

Aquilo daria o que pensar para o

delegado e fazia parte do plano de jogá-los

contra os ianques e vice-versa. Enquanto

eles se digladiavam, os sulistas agiriam,

roubando e saqueando.

Sem saber, Rose estava sendo usada

pelos líderes daquele plano, assim como

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todo o resto dos inocentes colaboradores e

soldados que os ajudariam a enriquecer.

Apenas o Coronel, Robert, seus amigos e

o xerife sabiam do plano real: roubar em

proveito próprio.

— Vamos ter de contar com a sua ajuda,

Rose, para esconder eventualmente algum

dos nossos, tratar de feridos e até esconder o

produto dos roubos.

— Claro que sim, Robert. Ainda temos

toda a adega preparada para esse tipo de

coisa.

— Ótimo. É possível que tenhamos que

usá-la logo para esconder o produto do

nosso primeiro roubo... Aqui estará a salvo

e livre de encrencas. E falando nisso, olhe

só quem está chegando — disse ele, com

surpresa.

Oates estava entrando, acompanhado de

Riley. Enquanto os dois entravam, um

silêncio mortal pairou no saloon. Oates

parou, olhando para a parede onde estavam

Rose e Robert, junto à bandeira. Caminhou

até lá.

— Não, de novo não, Oates — falou ele,

seguindo-o, com a espingarda na mão,

pronta para fazer fogo.

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— Por que isto? — indagou ele, retirando

o pano vermelho.

Alguns homens fizeram menção de

reagir, mas calaram-se quando Robert fez

um gesto pedindo calma.

— Pensei que ainda se lembrasse —

ironizou Robert. — Seu juramento à União

afetou sua memória?

— Lembro que este era o símbolo de um

cachorro louco chamado Quantrill, um

maldito bandido que matava mulheres e

crianças.

— Ele matava nortistas! — gritou

alguém.

— Americanos! — corrigiu Oates,

rasgando o pano e jogando-o no chão.

Um velho, sem o braço direito levantou-

se, aproximou-se, apanhou o pano e o

guardou com respeito.

— Maldição, Oates! Não precisava se

indispor com esses veteranos.

O delegado não o ouvia. Olhava para

Robert e para Rose alternadamente.

— O ar está ficando irrespirável — disse

a garota, deixando-os.

Oates acompanhou-a com os olhos,

enquanto ela ia para trás do balcão, ajudar a

servir os homens que, furiosos, bebiam

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procurando ignorar a presença ofensiva dos

dois homens da lei, principalmente Oates, a

quem consideravam um traidor.

— Você pode ter seus defeitos, Oates,

mas devo reconhecer que é um sujeito

valente. Ou valente ou louco. Difícil

descobrir o que você é exatamente.

Oates ficou olhando para ele. Conhecia

Robert havia muito tempo. Era um covarde,

que passara a guerra toda num campo de

prisioneiros, após ter sido apanhado em sua

primeira batalha. Voltara para casa sem um

arranhão.

— Pensei que estivesse na festa — disse-

lhe Oates.

— Que festa?

— A festa que houve lá na Mansão

O'Brien.

O rosto de Robert não se alterou.

— Não pude ir — respondeu,

simplesmente, esboçando um sorriso irônico

e misterioso.

Oates não teve dúvida. Ele, assim como o

xerife, sabiam de alguma coisa.

Alguma coisa que tinha a ver com aquele

fuzil nortista encontrado com o

emboscador, naquela noite. Oates e Riley

haviam procurado em seus arquivos alguma

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informação sobre o roubo de armas daquele

tipo, mas nada haviam encontrado. Teriam

de escrever uma carta e mandar para o

Exército para descobrir isso.

— Ficou preso a algum compromisso —

devolveu Oates, num tom de zombaria que

Robert entendeu imediatamente, pois o

delegado federal não perdia uma

oportunidade para alfinetá-lo por sua

medíocre participação na guerra.

Robert empalideceu e todo o seu corpo

enrijeceu. Mesmo assim, ele não perdeu o

controle. Num momento como aqueles valia

a pena manter a calma. Começar uma briga

com o delegado ali dentro poderia pôr a

perder todo o plano.

Oates deu-lhe lentamente as costas e

rumou para o balcão. Ele e Riley foram

ocupar uma das pontas, de onde podiam

observar todo o saloon, sem ninguém atrás

deles.

Os homens que bebiam por perto se

afastaram. Ele fez um sinal, pedindo que

Burt o atendesse. O bartender hesitou,

demonstrando sua aversão pelo delegado.

— Eu cuido disso — antecipou-se Rose,

apanhando uma garrafa de seu pior uísque.

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— Quero do outro — exigiu Oates,

quando ela se aproximou.

Ela demonstrou sua contrariedade pela

careta em seu rosto e recuou, apanhando

outra garrafa.

Serviu os dois.

— Fico contente em ver que está bem...

— disse ela com sua voz de mulher

apaixonada, fazendo-o arrepiar-se dos pés à

cabeça.

— Você se arriscou muito... Como soube

da emboscada?

— O xerife me contou. Alguma coisa vai

começar a acontecer.

— Precisamos conversar a sós, de alguma

forma... — pediu ele.

— Não posso... Pode ser muito

perigoso... Você deve tomar muito cuidado

de agora em diante. Eles vão tentar matá-

los.

— Quem?

— Ninguém sabe... Quando você sair,

fique atento a quatro cavaleiros. Estão no

seu encalço...

Os dois conversavam como se Oates

estivesse dizendo gracejos a ela, que

demonstrava contrariedade no rosto. Só

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Riley, ao lado, podia perceber o verdadeiro

conteúdo da conversa.

Seu olhar estava vigiando o saloon. Via

todos aqueles homens ansiosos para ter um

pretexto e partir para cima deles. A única

coisa que parecia mantê-los em calma era

Robert, ainda em pé junto à bandeira,

conversando com seus amigos e a

espingarda que ele, Riley, segurava

ostensivamente.

— É melhor eu me afastar ou você

começará a ter problemas com meus fãs.

— Preciso saber mais sobre o que está

acontecendo.

— Eu o aviso quando tiver mais

informações — arrematou ela, saindo de

perto deles.

— O que acha, Oates?

— Ainda não sei. Vamos investigar isso

mais a fundo. O problema agora é que há

alguém lá fora a nossa espera — disse. — E

o diabo é que estou apenas com o meu

Colt...

— Estou com minha espingarda aqui, não

se preocupe. Quando sairmos eu lhe dou

cobertura, até que pegue a Winchester.

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— Vamos terminar nossa bebida e sair

logo daqui. O clima está ficando cada vez

mais pesado — observou Oates.

— Fiquei curioso com uma coisa, Oates

— disse Riley. — Se não são os rebeldes

que nos caçam, quem poderá ser?

— Se descobrirmos de onde veio aquele

fuzil ianque teríamos uma resposta.

— Pensei nisso também. Se os rebeldes

não são os responsáveis, acho bom

começarmos a considerar que nossos

inimigos estão no meio dos ianques.

— É isso que me preocupa. Se somos

hostilizados pelos sulistas e caçados pelos

nortistas, estamos no inferno, meu amigo.

No inferno e não sabemos o momento em

que seremos apresentados ao demônio em

pessoa — comentou Oates, examinando

disfarçadamente a carga de seu Colt.

— Vamos sair?

— Sim. Eu saio na frente. Você fica na

porta, de olho. Quando eu chegar ao meu

cavalo e empunhar a Winchester, você sai e

vai ao meu encontro. Ok?

— Ok! — confirmou Riley, verificando a

carga da espingarda e retirando dois

cartuchos da bandoleira e deixando-os de

reserva na mão.

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Oates deixou uma moeda sobre a mesa.

Caminharam na direção da porta. Robert

olhou o rosto de Rose, que demonstrava

toda a sua expectativa, confirmando que

havia contado a Oates sobre a emboscada.

Pela maneira como os dois federais

rumavam para a porta, percebia-se a cautela

e a tensão em seus rostos.

Oates adiantou-se, saindo rapidamente e

caminhando na direção onde estava seu

cavalo. Riley parou na porta, com a

espingarda pronta para atirar.

Olhou para os lados. Diante do saloon

havia um beco. Riley teve certeza que viu

algo brilhar ali, mas hesitou. Não podia

disparar sem um motivo justo. Poderia

matar um inocente.

Seu amigo chegou no cavalo e começou a

sacar a Winchester.

Riley adiantou-se, olhando nas duas

direções, enquanto caminhava ao encontro

de Oates. Naquele momento, línguas de

fogo brotaram do beco e os projéteis

passaram assobiando ao redor dele, indo

encravar-se na parede do saloon.

— No beco! — gritou Riley, atirando-se

ao chão, protegendo-se atrás dos cavalos

amarrados no travessão.

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Oates fez o mesmo. Uma dezena de

disparos foram feitos numa seqüência

atordoante, depois o silêncio dominou a rua.

Momentos depois, o tropel de cavalos

indicava que os atacantes haviam se

afastado.

Os dois se levantaram, espanando a

poeira das roupas. Rose foi a primeira a

deixar o saloon. Ao vê-los com vida,

respirou aliviado, levando as mãos ao peito.

— Está tudo bem, pessoal! Eles não

tinham muita pontaria — comentou Oates,

guardando a Winchester na sela.

Montou seu cavalo, imitado por Riley.

Robert Woodfarm estava parado na porta,

olhando-os e sua expressão não era de

desapontamento. Parecia satisfeito e isso

Oates não entendeu.

— Vamos tentar seguí-los? — indagou

Riley.

— Aqui, no setor sulista da cidade?

Jamais os encontraríamos e eles teriam

facilidade para nos preparar nova

emboscada.

— Não estou gostando nada disso, Oates.

Esse negócio de servir de alvo não me

agrada nem um pouco.

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— Paciência, meu amigo! Vamos

descobrir quem está por trás disso tudo —

afirmou Oates, esporeando seu cavalo.

Os dois delegados já haviam se afastado,

quando chegou o xerife. Ao ver Robert, foi

ter com ele na mesa onde bebia com seus

amigos.

— Puxe uma cadeira, xerife! —

convidou-o.

O xerife se sentou, cheio de curiosidade.

— E então? — indagou.

— Tudo perfeito, xerife.

— Eles não desconfiaram?

— Nem um pouco.

— E Rose?

— Perfeita em seu papel.

— Ela vai ser muito útil para nós,

despistando os federais, enquanto agimos.

Estive com alguns compradores de terras no

hotel hoje à noite. Amanhã vai haver o

leilão da Fazenda Graceland. Algumas das

carteiras mais abarrotadas do Estado estarão

lá.

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— Excelente, xerife! Poderemos dar

nosso primeiro golpe amanhã, então.

— Sim, a operação já está toda montada.

Eu e meus rapazes estaremos montando

guarda, mas não haverá reação. Os homens

chegarão no início do leilão, roubarão todos

que estiverem lá, depois fugirão para o

outro lado do rio. Um emissário será

mandado para cá, para trazer o produto do

roubo.

— Ótimo! Vamos escondê-lo na adega

do saloon. Rose já concordou.

— Acha que poderemos confiar nela

quanto a isso? Se ela contar ao delegado

federal, perderemos todo o nosso tesouro.

— Não se preocupe quanto a isso. Rose é

fiel à Confederação. Seu único mal foi

apaixonar-se por Oates. Enquanto não

fizermos mal a ele, ela se manterá do nosso

lado, ajudando-nos como fez durante toda a

guerra.

— Espero que tenha razão quanto a isso.

— Tenho, não se preocupe. É uma pena

que meu pai não possa estar presente. Ele

iria adorar ver a cara desses ianques,

enquanto entregam suas carteiras.

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— Pois eu vou ter essa felicidade. Depois

eu conto a ele — falou o xerife e todos

riram.

No outro lado do salão, Rose servia

alguns cowboys que acabavam de chegar,

mas mantinha-se atenta ao que se passava lá

na mesa, agora que o xerife chegara.

Não estava se sentindo muito segura a

respeito deles. Pareciam não estar lhe

contando toda a verdade. Havia alguma

coisa no ar que ela não conseguia entender.

A começar por aqueles atentados contra

os dois delegados federais. Como o xerife e

Robert haviam tomado conhecimento disso?

Sua intuição feminina lhe dizia que não

estavam lhe contando toda a verdade a

respeito daquele plano de resistência contra

a dominação dos ianques.

Roubar dos malditos ianques para ajudar

os compatriotas rebeldes era uma ação

meritória, segundo ela. Só que, agora, não

se sentia tão segura a respeito disso.

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Oates e Riley voltaram para o escritório.

Oates estava intrigado com tudo aquilo que

estava acontecendo. Duas emboscadas

numa noite davam o que pensar. Foi

apanhar o fuzil militar que haviam tentado

usar contra eles algumas horas antes.

— O que o preocupa, Oates? — indagou

Riley.

— Não sei, companheiro, mas há alguma

coisa errada nisso tudo.

— Sim, muito errada. Estão nos usando

como alvo.

— Não é isso. Na primeira emboscada,

alguém deixou escapar o plano para Rose.

Na segunda, também, só que eles tiveram

chance de atirar. Você erraria daquela

distância?

— Mesmo considerando a escuridão, eu

acho que não. Atirando no escuro eu acho

que acertei um deles...

— Também tive essa impressão. Mas por

que homens treinados ou hábeis para atirar

teriam errado o alvo tão vergonhosamente?

— Acha que erraram deliberadamente?

— É uma hipótese.

— Por quê?

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— Por que talvez querem que pensemos

que alguém quer nos matar.

— Não vejo lógica nisso.

— Nem eu, mas é o que me vem à

cabeça.

Enquanto os dois pensavam, lá fora, num

beco, os quatro homens que haviam

participado da emboscada diante do saloon

conversavam.

Um deles havia sido atingido e estava

inconformado.

— As ordens foram claras, Pete. Só

tínhamos que assustá-los.

— E isto é susto? — retrucou o rapaz,

mostrando a mão suja de sangue.

Um dos tiros de Riley havia acertado seu

braço esquerdo, deixando ali alguns caroços

de chumbo grosso.

— Foi aquele maldito com a espingarda e

eu vou acertar contas com ele — disse o

rapaz, sacando seu Colt.

— Vai ter que explicar isso ao Coronel

depois.

— Dane-se o Coronel — respondeu ele,

atravessando a rua com a arma engatilhada.

— Então vai fazer isso sozinho —

disseram os outros, indo apanhar seus

cavalos.

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Aproximou-se de uma janela aberta,

espreitando sorrateiramente. Viu Riley em

pé, de costas e não hesitou. Levantou a

arma e atirou.

Riley foi jogado para cima da mesa de

Oates, que sacou rapidamente a arma,

enquanto amparava o amigo.

— Riley! — gritou, ao sentir sangue em

sua mão.

Acomodou-o no assoalho e correu para a

porta. Viu o homem que corria na direção

de um beco e fez fogo. O matador rodopiou

e caiu na poeira.

— Oates! — chamou-o Riley.

Ele retornou para junto do amigo.

— Estou mal... Estou mal, Oates! —

murmurou Riley.

— Vou chamar o médico, Riley. Agüente

firme! — disse o delegado, levantando-se e

indo até a porta.

Não viu o homem em quem atirava.

Havia um médico logo ali perto e, com

alívio, Oates viu que já havia luz naquela

casa. Quando abriu a porta para ir até lá, o

médico já vinha saindo com sua maleta. Foi

ao encontro dele.

— Lá dentro, foi meu amigo, acertaram-

no nas costas — avisou, retornando.

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O médico fez um rápido exame.

— Teve sorte, a bala não atingiu nenhum

órgão vital. Vou tentar tirá-la a parar a

hemorragia.

— Precisa de ajuda?

— Não, só traga aquela luz para mais

perto.

Oates fez o que ele pedira, depois

apanhou seu rifle e foi no encalço do

homem que havia disparado contra Riley.

Aquilo mudava todas as suas conclusões.

Estavam querendo matá-los de verdade.

— Demônios! — murmurou ele. — Foi

para o lado rebelde da cidade — concluiu,

seguindo a trilha de sangue que havia

entrado pelo beco e saído na outra rua.

Dali rumava na direção da linha férrea.

Aquele homem tinha poucos minutos de

dianteira. Estava rumando para um lugar

definido. Se descobrisse para onde iam,

tudo se tornaria mais fácil, pois poderia

antecipar suas ações.

Naquele caso, tinha uma motivação

especial. Apanhar aquele homem vivo era

uma questão de honra. Poderia fazê-lo falar

e descobrir o que estava acontecendo na

cidade realmente.

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Atravessou a linha férrea. A trilha de

sangue continuava na poeira na direção de

um saloon que havia ali perto. Era para lá

que o ferido se dirigia.

Deixou seu rifle engatilhado e caminhou

lentamente na direção do saloon.

Não havia movimento nas ruas. Diante

daquele saloon, havia apenas dois cavalos

amarrados.

Aproximou-se cuidadosamente da porta.

Antes de entrar, sondou o interior.

Apenas dois homens bebiam,

conversando com o bartender. Nenhum

deles estava ferido. A trilha de sangue era

nítida, no entanto, entrando, passando pelo

salão e subindo as escadas na direção do

pavimento superior.

Entrou e dirigiu-se calmamente ao

balcão.

— O que vai ser, delegado? — indagou-

lhe o bartender.

— Uísque.

O homem serviu-o rapidamente.

— Parece assustado, delegado. O que

houve?

— Procuro um homem — respondeu

Oates, os olhos atentos aos dois homens ao

seu lado e ao alto da escada.

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— Acho que veio ao lugar errado,

delegado. Se quiser uma garota... —

ironizou o bartender.

Os dois homens ao lado riram. O homem

atrás do balcão também segurou-se para não

rir. Oates fuzilou-o com seu olhar mais

glacial.

— Procuro um homem ferido. Deve ter

entrado aqui há poucos minutos — disse

ele.

— Não me lembro de ter visto ninguém

entrar... Viram alguma coisa assim,

rapazes? — indagou aos dois homens que

bebiam ao lado.

— Depende de quem quer saber —

respondeu um deles e os dois se viraram

para encarar Oates .

— Eu quero saber — falou o delegado

federal.— E quem é você?

— Meus amigos me chamam de Oates ...

Meus inimigos costumavam me chamar de

Fordd — afirmou ele, desabotoando a capa

e abrindo-a para revelar o Colt.

— Fordd? Oates Fordd? — repetiu o

homem, engolindo seco.

— Sim, você ouviu bem, rapaz. Viu um

homem ferido entrar ainda há pouco?

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— Não estava de costas... Sinto muito,

Sr. Fordd .

Uma garota estava tirando garrafas de

uma caixa e arrumando-as na prateleira,

atrás do balcão. Parou e voltou-se para

encarar Oates.

— Eu vi aquele rapaz ferido, o

amiguinho de Norma. Os dois estão juntos

lá encima — falou ela.

— Há mais alguém com eles?

— Apenas os dois.

— Não sei.

— Em que quarto estão?

— Quarto cinco, no meio do corredor, à

direita.

Oates entornou o uísque, depois retirou o

Colt do coldre, verificando sua carga.

Guardou-o em seguida. Apanhou o rifle que

deixara sobre o balcão, já engatilhado.

Caminhou na direção da escada.

— Espere um pouco, homem! O que

pretende fazer?

— Vou pegar aquele filho da mãe! —

respondeu Oates, sem se deter.

— Bob, vá chamar o xerife ou um de

seus auxiliares. Deve encontrar alguém no

Saloon da Rose! — pediu o bartender a um

dos homens que bebiam ali.

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— Vai haver encrenca da grossa — falou

Bob, apressando-se em fazer o que o outro

lhe pedira.

Enquanto ele saía, Oates subia a escada.

Avançou lentamente pelo corredor, até

parar diante da porta. A trilha de sangue era

bem nítida. Respirou fundo. Não sabia o

que encontraria pela frente, mas sabia como

enfrentar uma situação como aquelas. Não

era diferente de muitas que enfrentara antes.

Segurou firme o rifle. Em seguida, meteu

o pé na porta. Com um barulho de madeira

sendo lascada lascando, a porta se abriu até

o fim.

Na cama, Pete assustou-se ao ver aquele

homem entrar com a arma apontada para

ele. A garota que lhe fazia um curativo

pulou para um canto.,

— O que está havendo aqui? — indagou

ela, assustada.

Pete olhava para o coldre de seu cinturão,

que pendia ao lado de sua cabeça, preso na

cabeceira da cama.

— Quem é você? O que pensa que está

fazendo aqui? — indagou o pistoleiro,

assustado.

Oates aproximou-se, apanhou o cinturão

dele e jogou-o para longe. Olhou o

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ferimento no braço, feito por uma

espingarda, e o outro na coxa, feito por um

Colt.

— Onde conseguiu esses ferimentos? —

indagou.

— Numa briga...

— Onde?

— Por que quer saber? — retrucou o

rapaz.

Oates inclinou-se sobre ele como se fosse

dizer-lhe alguma coisa. Ao invés disso, o

cano de sua arma atingiu a coxa ferida, que

urrou de dor.

O sangue começou a escorrer novamente,

enquanto o rapaz encolhia-se todo na cama.

Oates o fez sentar-se com as costas

apoiadas contra a cabeceira da cama. Pete

tentava fazer parar o sangue que escorria.

— Não pode fazer isso — falou a garota.

— Este bastardo e mais alguns amigos

atacaram-me ainda há pouco. Balearam meu

parceiro. Acha que não tenho o direito de

fazer o mesmo com ele?

— Eu não fiz nada disso — defendeu-se

Pete.

— Dê o fora! — disse o delegado a ela.

A garota sumiu rapidamente pela porta.

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— Agora só nós — falou-lhe Oates,

olhando-o com profundo ódio.

Pete viu a frieza estampada nos olhos

daquele homem diante dele. Eram olhos

assustadores, que pareciam vasculhar sua

alma.

— Você tem que acreditar em mim... Não

fiz nada...

Novamente o cano da arma atingiu Pete,

desta vez no braço ferido. Um filete de

sangue começou escorrer por debaixo da

bandagem aplicada às pressas.

— Vamos por parte, seu covarde. Antes

de mais nada, quero saber os nomes de seus

amigos e para onde eles foram — indagou-

lhe Oates.

— Não sei de nada... Não posso lhe dizer

nada...

— Não sabe ou não pode? — insistiu

Oates.

O rapaz ficou indeciso, sem saber o que

fazer.

— Vista-se! — ordenou-lhe Oates.

— Não pode fazer isso comigo... Eles

vão me matar... — choromingou ele.

— Quem vai matá-lo?

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— Não posso dizer — insistiu Pete,

sentando-se com dificuldade e apanhando

suas botas.

Calçou com dificuldade a primeira.

Quando apanhou a segunda, sua mão

firmou-se no cabo de uma faca.

— Preciso de uma camisa limpa. Tem

naquele guarda-roupa — falou o rapaz.

Oates olhou na direção. Pete sacou a faca

e ergueu o braço para arremessá-la nas

costas de Oates. O delegado federal, no

entanto, estava alerta.

Girou o corpo rapidamente e bateu com a

coronha do rifle encima do nariz do

pistoleiro, que soltou a faca, gemendo e

tentando estancar o sangue que brotava de

seu nariz quebrado.

— Se tentar mais uma dessas gracinhas,

acabo com sua raça, seu bastardo! — rugiu

Oates. — Vista essa bota.

Foi até o armário, apanhou uma camisa e

jogou-a encima de Pete. O rapaz terminou

de se vestir com dificuldade.

— Vamos dar um passeio agora —

ordenou Oates, segurando-o pelo pescoço e

jogando-o na direção da porta.

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Ele caiu exatamente nos pés do xerife e

de Robert Woodfarm, que acabavam de

chegar.

— O que está havendo aqui, delegado?

— indagou o xerife, trêmulo de raiva.

Robert reconheceu logo Pete, um dos

homens que haviam sido mandados para

emboscar os delegados.

— Estou efetuando uma prisão, xerife.

Vou levar este homem para interrogatório.

— Ele está ferido... Precisa ser medicado

primeiro — argumentou o xerife.

— O médico está ocupado agora, xerife.

Está tratando Riley, que foi baleado por este

bastardo — informou Oates, chutando as

costelas de Pete, que tentava se levantar. —

E é melhor que saiam todos de minha

frente. Não estou com muita paciência esta

noite.

O xerife olhou na direção de Robert, que

fez um sinal.

— Precisa de ajuda com o prisioneiro,

delegado? — indagou o homem da lei.

— Não, eu dou conta disto sozinho —

afirmou Oates, segurando Pete pelos

colarinhos e chutando-o para o corredor.

Os homens se afastaram para dar

passagem aos dois. Entre eles estavam os

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três amigos de Pete, que olharam temerosos

para o prisioneiro, temendo que ele viesse a

falar.

Assim que Oates desceu as escadas,

Robert chamou os três pistoleiros.

— Que diabos aconteceu? — indagou,

furioso.

— Estávamos a sua procura para lhe

contar. Pete foi ferido lá no saloon e ficou

furioso, querendo ir à forra. Tentamos detê-

lo, mas não houve como segurá-lo...

— Saem o que vai acontecer se ele falar?

— indagou Robert, olhando-os

significativamente.

— Ele não vai falar, Robert. Prometemos

— disse um dele, fazendo um sinal para que

seus amigos o seguissem.

— Acha que eles dão conta do recado?

— perguntou o xerife a Robert.

— Pode ficar sossegado. Pete não abrirá

a boca. Nem que queira...

Lá embaixo, Oates sentia o clima hostil

que pairava no saloon, enquanto empurrava

Pete, seguro pelo colarinho da camisa. O

ferido deixava uma trilha de sangue para

trás.

Saíram do saloon e foram para o meio da

rua. Ao longo da rua, tocheiros acesos

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iluminavam-na. Lá na frente, porém, Oates

viu alguns deles sendo derrubados,

deixando o trecho na escuridão.

Não tinha outra alternativa. Sabia que não

seria fácil sair dali. A questão toda era

garantir a vida de Pete para tirar dele a

verdade sobre o que estava acontecendo.

Fazê-lo falar era necessário. De qualquer

maneira.

— Viu aquilo lá na frente, Pete?

— Não vai conseguir me levar,

delegado...

— Não é isso o que me preocupa, Pete.

Minha preocupação é levá-lo vivo até o

escritório. Lá pode ficar certo que saberei

fazê-lo falar. Só que acho que não vou

conseguir...

— O que quer dizer com isso?

— Neste momento, Pete, quem seus

amigos desejariam matar? A mim ou a

você!

Pete estacou, após pensar no assunto por

instantes. As ordens que haviam recebido

era apenas para disparar contra os

delegados, não matá-los.

Deveria haver um motivo para não querer

que eles morressem. Quanto a ele,

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reconhecia que cometera um erro e que

poderia ser morto por isso.

Seus amigos não iriam deixar que ele

falasse. Essa situação assustou-o. Oates

percebeu isso.

— E então, Pete? Quem acha que eles

estão esperando para matar lá na frente.

— Eles não fariam isso... Não atirariam

em mim...

— Você pode levar todos eles para a

forca, Pete. Acha que eles não estão com

medo? — continuou Oates, assustando-o.

— Tem que me tirar dessa, delegado...

— Só se me contar o que sabe...

O pistoleiro hesitou, mas percebeu logo

de estava condenado à morte de qualquer

maneira. Saber que seus amigos poderiam

matá-lo enfureceu-o, tornando-se maior que

seu ódio pelos ianques.

— Está bem... Eu falo.

— Diga-me alguma coisa importante para

que eu me convença de que ala a verdade —

pediu o delegado.

— Certo, certo. Vou lhe dar algo

realmente grande, delegado... — ia dizendo

Pete.

Não continuou. De um ponto no escuro

adiante deles surgiu uma língua de fogo. O

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pistoleiro foi jogado para trás, no exato

instante que o som do tiro chegava até eles.

Oates não precisou examinar atentamente

para ver que Pete estava nas últimas, com

um rombo no peito.

Arrastou-o para a beirada da rua. Pete

tentava respirar, com o peito aberto. Seus

olhos arregalados refletiam seu pavor. Ele

ficou olhando pateticamente para o

delegado.

— Vamos, fale, Pete! O que tinha para

me dizer? — insistiu Oates, furioso por

perder aquela chance de descobrir alguma

coisa.

— Graceland... Fazenda Graceland... —

conseguiu dizer Pete, estrebuchando em

seguida.

O xerife e seus homens avançaram pela

rua logo em seguida. Ao perceberem que

Pete estava morto, demonstraram alívio.

— Diabos! Eu poderia ter arrancado

alguma coisa dele — falou Oates.

— Ele não disse nada? — indagou o

xerife.

— Nada! — assegurou Oates, afastando-

se.

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Estava intrigado com aquela informação.

O que Pete quisera dizer ao se referir à

Fazenda Graceland?

Deixou o setor rebelde da cidade, ao

passar pela linha férrea. Rumava com pressa

agora para o escritório, ansioso para ter

notícias de Riley.

Ao passar diante do prédio do Banco, no

entanto, parou, olhando o cartaz que

anunciava o leilão da Fazenda Graceland,

no dia seguinte, ao meio-dia.

— Diabos! O que vai acontecer lá

amanhã? — indagou-se.

Quando chegou ao escritório, o médico já

havia atendido Riley e o ajudara a se

levantar para ir até a cama, num dos quartos

nos fundos do escritório.

— Pode ficar tranqüilo, delegado! A bala

apenas passou pelos músculos. Consegui

retirá-la sem maiores danos. Em alguns dias

ele estará em pé novamente. Virei vê-lo

amanhã — informou o médico.

Oates pagou-o e agradeceu-o, depois foi

até o quarto ver o amigo.

— E então? Tem o couro mais duro do

que eu imaginava — falou Oates.

— Pura sorte! Você pegou o bastardo?

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— Sim, eu o trazia vivo para cá, mas seus

próprios amigos o mataram.

— Demônios! Conseguiu arrancar

alguma coisa dele?

Oates pensou por instantes. O melhor era

não preocupar Riley, por isso resolveu

esconder o que sabia.

— Não, nada! — afirmou. — De

qualquer forma, o importante agora é que

você fique bem.

Eu estou bem, pode ficar sossegado —

garantiu Riley.

Era madrugada. Riley gemia de dor. O

médico havia deixado algumas pílulas para

isso. Oates se levantou para ir atender o

amigo. Foi quando ouviu ruídos no

escritório.

Armou-se rapidamente e ficou à espreita.

Viu a porta aberta. Vultos se moviam lá

dentro. Contra a claridade opaca que vinha

da rua, divisou um homem.

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Parecia um militar, pelo tipo de chapéu

que utilizava.

— Não se movam! — ordenou Oates,

embora não soubesse exatamente quantos

homens haviam entrado ali.

A resposta foi fulminante. Um fuzil

disparou na sua direção, mas o tiro foi alto

demais. Ele respondeu ao fogo. Viu os

homens saindo pela porta. Eram três.

Disparou, mas não acertou nenhum.

Correu para a porta. Viu os três homens

atravessando a rua, na direção do beco. Ia

sair e atirar, mas do beco alguém disparou

contra ele, abrindo um rombo na porta.

Estavam usando uma arma muito potente,

um rifle militar, com certeza. Recuou.

Pouco depois ouviu o tropel de cavalos

saindo pelos fundos do beco e se afastando

rapidamente.

— Oates! Você está bem? — indagou

Riley, em algum ponto atrás dele.

— Riley! Demônios! Você não devia

fazer isso — comentou Oates, riscando um

fósforo e indo acender um lampião.

Riley estava apoiado ao batente da porta,

pálido e com dores, segurando sua

espingarda engatilhada.

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— Venha, vamos voltar para a cama —

disse Oates, ajudando-o a caminhar.

Enquanto o acomodava ali, chegou o

médico novamente, com sua maleta.

— Tudo bem por aqui? — indagou.

— Sim, doutor. Entraram aqui...

— Quem, homem?

— Não se, não vi. Estava escuro...

— Como está o Riley?

— Acordei com ele gemendo.

— Está doendo o ferimento? —

perguntou-lhe o médico.

— Sim, um pouco.

— Pegue água, Oates. Vamos lhe dar

duas destas pílulas e ele dormirá como se

tivesse levado uma pancada na cabeça —

falou o doutor.

Oates acendeu um outro lampião para ir

até a cozinha, anexa ao escritório buscar

água.

Foi até lá, apanhou uma moringa com

água e, quando retornava, observou algo no

chão do escritório. Foi ver. Era um chapéu

militar, da Cavalaria da União.

— Diabos! — murmurou ele, sem

entender. — Por que homens das União

teriam entrado aqui? — indagou-se.

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Foi levar a água, mas escondeu o chapéu

para que Riley não o visse.

O médico o fez tomar duas daquelas

pílulas e em pouco tempo ele estava

adormecido.

O barulho de cavalos lá fora chamou a

atenção de Oates, que armou-se e foi até a

porta. O xerife e seus ajudantes

desmontavam naquele momento.

— Não dorme mais, xerife? — ironizou

Oates.

— Tem gente nesta cidade que parece

atrair encrenca e isso não me deixa dormir.

O que houve por aqui?

— Alguém entrou aqui, xerife.

— Viu quem era?

— Não, mas eles deixaram cair algo

muito interessante.

— E o que foi?

Oates fez um sinal para que o homem da

lei o seguisse. No escritório, mostrou-lhe o

chapéu que um dos atacantes havia deixado

cair. O xerife demonstrou certa surpresa.

— Demônios, Oates! Você parece que

conseguiu fazer inimigos dos dois lados.

Primeiro aquele rifle militar, agora este

chapéu... Por que os soldados da União

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querem matá-lo? Será porque na guerra

você matou muitos deles?

— Pode até ser, xerife. Não duvido que

haja pessoas para as quais a guerra ainda

não terminou e para quem o meu juramento

de servir à União agora não tenha nenhum

valor. A questão é que estamos milhas e

milhas distantes de qualquer destacamento

militar...

— Engano seu, delegado — cortou-o

xerife.

— Como assim?

— Temos um pequeno destacamento

próximo daqui.

Oates ficou surpreso ao ouvir aquilo.

— Onde?

— Na Fazenda Graceland. Amanhã ela

será leiloada. Um tenente e meia dúzia de

soldados estão lá cuidando da ordem e

fiscalizando o leilão.

Oates lembrou-se imediatamente do que

Pete dissera, antes de morrer. Mencionara a

Fazenda Graceland. Estaria querendo dizer,

com isso, que o perigo vinha de lá?

Tinha algum sentido. Aqueles soldados

vinham de alguma parte, sabiam dele e

tentavam matá-lo. Fatos como aquele eram

muito comuns no pós-guerra. A rendição do

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Sul e o juramento de lealdade imposto aos

rebeldes que queriam o perdão não haviam

sido assimilados muito bem por gente de

ambas as partes.

— Quer que eu investigue os soldados,

delegado? — indagou o xerife.

— Não, eu mesmo farei isso.

— Sugiro que espere até o final do leilão.

Os soldados passarão por aqui. Não quero

nenhum tumulto durante o leilão. Como vou

estar lá amanhã, posso pedir ao tenente que,

antes de ir embora, passe por aqui para falar

com você.

O xerife estava sendo camarada.

Camarada como nunca fora antes, o que

despertava alguma suspeita.

— Vou agradecer isso, xerife.

— Ótimo! Assim você poderá estar aqui,

cuidando de seu amigo — lembrou o

homem da lei, com um tom solidário na

voz, deixando o delegado federal em

dúvida.

O médico aproximou-se.

— Ele dorme, Oates. O ferimento não

sangrou quando ele se levantou, o que é um

bom sinal. Vai dormir muito bem e estará

melhor amanhã. Faça-o comer alimentos

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leves e nutritivos. Ele é forte como um

touro e estará de pé em um ou dois dias.

— Obrigado, doutor! Jamais esquecerei

sua atenção — agradeceu Oates,

acompanhando-o até a porta.

Quando voltou, o xerife e seus homens

preparavam-se para ir embora também.

— Se tiver qualquer problema, não hesite

em me chamar — falou o homem da lei,

saindo com seus ajudantes.

Oates ficou pensativo. Parecia haver uma

lógica naquilo tudo. Estavam querendo a

sua cabeça e poderia ser por pura vingança.

Até aí, tudo bem, podia compreender.

Quando essa vingança pessoal começava

a atingir pessoas inocentes como Riley, que

lutara lealmente no Exército da União,

aquela situação começava a aborrecer.

Talvez tivesse ainda que quebrar algumas

cabeças e chutar alguns traseiros para que as

pessoas compreendessem isso.

Enquanto isso, não longe dali, o xerife

parava diante do Saloon da Rose. Havia

poucos freqüentadores. Robert esperava-o,

numa das mesas ao fundo. Atrás do balcão,

Rose observava tudo com muita atenção.

Robert e o xerife haviam confabulado

muito, naquela noite. Apesar do avançado

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da hora, Robert ainda estava ali, esperando

o xerife.

Demonstrou alívio e satisfação, quando o

homem da lei chegou. Rose desejou poder

entender o que estava realmente

acontecendo naquela noite.

— E então? — indagou Robert, assim

que o xerife se sentou diante dele.

— Perfeito, Robert. Os homens agiram

como você ordenou. O chapéu ficou lá.

Com ele e com o fuzil militar, Oates ficou

realmente confuso.

— Alguém se feriu?

— Não, tudo esteve como o planejado.

— Contou ao Oates sobre o

destacamento?

— Sim, prontifiquei-me, inclusive, a

pedir ao Tenente que o procure na cidade,

antes de ir embora.

— Vai ser divertido isso — comentou

Robert. — Esse golpe de sorte vai nos

ajudar muito.

— Sim, quem diria que os dois heróis da

Batalha de Stonewall estariam frente a

frente de novo?

— Isso vai dar a Oates o que pensar.

Quando ele souber que é o Tenente Johnson

quem comanda o destacamento, o mesmo

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tenente que o enfrentou em Stonewall.

Apesar do heroísmo de Johnson, ele foi

humilhado com a derrota. Todos sabem que

ele jurou solenemente vingar-se, quando

depôs sua espada.

— Está tudo perfeito, Robert. Com

certeza eles vão se desentender. Oates é

esquentado, vai acabar arrumando confusão

com o tenente, que é um herói idolatrado

pelos ianques. Seguramente todos irão

contra Oates e isso só beneficiará nosso

plano.

— Ótimo! Agora precisamos fazer

alguma coisa em relação a Rose. Ela me

parece muito desconfiada. A todo momento

ela está olhando para cá. Vigiou-nos toda a

noite.

— Deixe-a comigo! Vou plantar mais um

pouco de confusão na cabeça dela. Como

mulher apaixonada ela tem sido muito útil

para nós. Temos que conservá-la assim.

— Certo, xerife! Eu vou para casa dormir

um pouco. Amanhã quero estar no leilão da

Fazenda Graceland. Quero ver as caras dos

homens com as malas de tecido cheias de

dinheiro, quando nossos rapazes entrarem

em ação.

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— Sim, vai ser divertido. Os homens vão

recolher todo o dinheiro. Um deles trará

uma valise cheia de papéis para Rose

guardar. O dinheiro de verdade irá para as

mãos do Coronel, que será o nosso guardião

do tesouro — comentou o xerife, com um

sorriso significativo.

— Sim, o nosso nobre e querido guardião

— confirmou Robert, com um sorriso de

cumplicidade.

Levantou-se e apanhou seu chapéu.

Acordou seus amigos, que dormia nas

mesas próximas. Eram todos filhos da

aristocracia destronada do Sul. Todos com

uma educação refinadas, amantes do que

havia de bom na vida, mas agora mendigos

das migalhas que os homens do Norte

atiravam.

Era difícil para o orgulho deles conviver

com isso indefinidamente. Sabiam agora,

porém, que era por pouco tempo. Robert era

a chance de mudar isso, por isso o

apoiariam até a morte.

Assim que Robert saiu, o xerife foi até o

balcão. Rose continuava intrigada com tudo

aquilo.

— Noite movimentada, não, xerife? —

observou ela.

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— Tem razão, Rose. Já aconteceu de tudo

nesta cidade. É demais para uma só noite

realmente.

— O que houve anda há pouco?

— Tentaram matar de novo o delegado

federal.

Rose estremeceu e suas mãos tremeram.

— Ele está ferido? — indagou ela, aflita.

— Não, ele está bem.

Ela respirou aliviada.

— Quem está por trás disso tudo, xerife?

— quis ela saber.

— Difícil dizer, Rose, mas tudo indica

que é gente do outro lado.

— Do outro lado? Gente da União?

— Sim, isso mesmo.

— Por quê?

— Oates foi um herói rebelde. Um herói

oportunista, que jurou lealdade à União,

quando a guerra acabou. Dos dois lados ele

tem inimigos... — disse o xerife, embora

sua expressão demonstrasse que ele sabia de

mais alguma coisa ainda.

Rose apanhou uma garrafa do melhor

uísque e serviu a ele.

— Esta é por conta da casa — disse ela.

O xerife agradeceu, depois tomou o

uísque num só gole.

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— Sabe, Rose, na emboscada hoje, Oates

encontrou um rifle militar, com mira

telescópica, daqueles usados pelos ianques

no final da guerra. Ainda há pouco, no novo

atentado, um dos homens que invadiu o

escritório deles deixou para trás um

chapéu... Um chapéu da Cavalaria da

União. Somando-se um mais um, temos a

conclusão. O rifle e o chapéu ianques

demonstram que há gente do outro lado

querendo pegá-lo. E se continuarem

insistindo, vão acabar conseguindo.

Obrigado pelo uísque, Rose. Preciso dormir

um pouco. Amanhã tenho de estar presente

no leilão da Fazenda Graceland.

— Espera encrencas?

— Talvez nossos rapazes comecem a

agir.

— Vai haver muito dinheiro vivo

circulando em Graceland.

— Sim. Se nossos rapazes conseguirem

pegá-lo, ele será mandado todo para cá.

Você o esconderá para nós na adega?

— Pode contar com isso, xerife.

— Ótimo, Rose! Sei que sempre

poderemos contar com você — afirmou o

xerife, despedindo-se com um aceno.

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Enquanto ele deixava o saloon, agora

vazio, e o bartender começava a fechar as

janelas e a porta, Rose serviu um uísque

para si mesma.

Tomou-o em pequenos goles, enquanto

pensava.

— Não vai dormir, Rose? — indagou

Burt, quando terminou de fechar e apagar os

lampiões principais.

— Estou sem sono, Burt. Acho que vou

tomar alguns drinques, antes de ir para a

cama.

— Faça bom proveito. Eu estou morto de

sono e de cansaço — falou Burt, retirando-

se.

Rose apanhou uma garrafa e foi se sentar

numa das mesas. Apenas os lampiões

acesos nas laterais do balcão iluminava o

amplo salão vazio.

Lá encima, as garotas dormiam com os

últimos fregueses da noite, normalmente

seus namorados.

Alheia a isso, ela pensava e não

conseguia esconder a aflição e a

preocupação que a tomavam de assalto.

Amava Oates e não conseguia mais

esconder isso. Tinha certeza que todos

sabiam disso, inclusive o xerife e Robert.

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Era justamente por isso que ela pressentia

alguma coisa de errado naquelas

informações que eles lhe passavam. Era

como se soubessem que ela contaria ao

delegado federal, no que estavam certos.

Rose continuava leal ao Sul. Esconderia o

dinheiro roubado, juntamente com os

soldados que fizessem algum ataque e

precisassem de proteção. Fizera isso durante

a guerra, quando Atlanta caiu sob o domínio

do Exército da União.

Fizera parte da resistência inútil que

tentara manter os ianques longe da cidade.

Tudo fora inútil mesmo. O sonho rebelde

havia sido um pesadelo e todos tinham de

acordar um dia e enfrentar a realidade.

Os planos do Coronel tinham algum

sentido. Rose os apoiava. Alguma coisa

precisava mesmo ser feita, mas com

inteligência, ou todo o Sul seria sufocado

pela invasão ianque.

Nada demais para quem perdeu a guerra,

se isso não implicasse em jogar na rua

fazendeiros, comerciantes e pessoas que

queriam apenas trabalhar em paz.

Isso era preocupante para ela, mas nem

tanto quanto a preocupação pela vida de

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Oates. Se algo acontecesse a ele, Rose não

sabia o que faria.

Desejou poder sair dali e ir ao encontro

dele. Sabia que isso era arriscado, no

entanto. Muito arriscado.

Tomou mais um uísque e pensou naquele

risco. Vivera toda a sua vida correndo

riscos. Esse poderia ser um que valeria a

pena. Só que era um risco que dependeria

da aceitação de Oates e ela não sabia como

ele pensava a respeito.

Talvez fosse hora de aceitar aquele

convite dele para conversarem. Tinham

muita coisa pendente para resolver.

Mal o dia amanhecera e Oates estava fora

da cidade, com o rifle militar ianque e a

caixa de munição. Havia levado algumas

garrafas consigo, alinhando-as sobre uma

pedra.

Montou seu cavalo e afastou uns

duzentos metros. Desmontou. Amarrou o

animal numa arbusto, depois procurou um

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lugar onde pudesse apoiar a arma para ter

firmeza na hora do disparo.

Encontrou um local adequado. Carregou

a arma e apoiou-a contra um galho caído.

Uma das garrafas surgiu nítida na luneta da

arma.

Apertou o gatilho com suavidade. Apesar

da potência do fuzil, o recuo foi mínimo,

demonstrando que a arma era realmente

apropriada para a finalidade a que se

propunha.

Quando a fumaça se dissipou, Oates

percebeu que a garrafa tinha sumido da

mira.

— Demônios! — praguejou ele, olhando

a arma com admiração e respeito.

Parecia ser infalível naquela distância.

— Vejamos o que você pode fazer —

murmurou ele, caminhando para mais longe

ainda.

Andou mais uns cem metros, até uma

árvore, com um tronco em forquilha, onde

pôde apoiar a arma e mirar de novo contra

uma das garrafas.

Atirou. Novamente atingiu o alvo,

demonstrando a grande precisão daquela

arma.

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Ficou satisfeito com os resultados.

Voltou ao seu cavalo, montou-o e cavalgou

na direção da sede da Fazenda Graceland,

que ficava a umas duas horas a cavalo.

Conhecia um pouco aquela região. A

sede da fazenda ficava num vale, próxima

do rio. Do alto de uma das colinas ele

poderia observar o que se passava lá

embaixo.

Para chegar lá, evitou a trilha normal para

não ser visto. Uma vez no alto da colina

escolhida, viu como os interessados

chegavam aos montes.

A Fazenda Graceland era uma das

maiores e mais cobiçadas da região. Acres e

mais acres de boa terra para o plantio do

amendoim, alfafa e pastagens.

— Lá estão eles! — murmurou o

delegado, ao perceber quatro barracas

armadas nas proximidades da casa principal

da fazenda.

Eram barracas da Cavalaria, sem dúvida.

Ele usou a luneta do fuzil para observar

melhor.

Os homens chegavam em carroças ou a

cavalo. Eram os famosos compradores, que

carregavam o dinheiro em maletas de pano.

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Muita gente foi se concentrando no local.

Oates nada via de anormal em tudo aquilo.

Parecia com outros leilões, dos quais havia

participado.

Muita gente interessada, lances baixos,

acordos e conchavos entre eles e uma

fortuna mudava de mãos por uma bagatela.

Era assim que o Sul estava sendo

espoliado pelos vencedores e seus

compradores de terras.

Algo, no entanto, chamou a atenção do

delegado. Não muito distante da fazenda, no

sentido oposto à cidade e antes do rio, havia

um grupo de cavaleiros, no mínimo de uns

cinqüenta homens.

Olhou-os melhor com a luneta do fuzil.

Eles saíam de dois ou três de cada vez,

voltando até cruzar com a trilha, depois

misturavam-se às carroças e cavaleiros que

rumavam para Graceland.

Intrigou-se, pois alguns dos homens que

ficavam pareciam usar uniformes cinzas. Os

mesmos uniformes usados pelos rebeldes

durante a guerra.

— Que diabos temos aqui? — indagou-se

ele.

Já era quase meio-dia. Em breve o leilão

começaria. Pouca gente ainda se apressava,

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de carroça ou a cavalo, pela trilha. Os

homens de uniformes cinzas, então, num

grupo de uns trinta cavaleiros, começaram a

se movimentar, cavalgando na direção da

fazenda.

O delegado percebeu que alguma coisa

aconteceria. Fosse o que fosse, iria

acontecer em breve. Nada havia que ele

pudesse fazer, a não ser observar.

Depois de tudo que havia acontecido nas

últimas horas, o delegado federal tinha

razões para acreditar que toda aquela

movimentação tinha algum sentido, embora

ele não conseguisse percebê-lo.

Aquelas emboscadas haviam sido

preparadas para afastá-los do caminho. O

que gerava confusão era saber quem estava

por trás delas.

Reconhecia que Riley e ele tinham

inimigos dos dois lados, pois aplicavam a

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lei sem preferências pessoais por este ou

aquele lado.

Oates afirmava a todo momento,

inclusive, que, para ele, não havia um lado

vencedor e um perdedor naquela cidade,

agora que a guerra tinha terminado.

Muita gente, no entanto, não se

convencia disso. Essa intolerância era o

motivo de muitas desavenças e das brigas

quase que diárias ainda.

Para melhor observar o que acontecia na

Fazenda Graceland, foi apanhar seu potente

binóculo de campanha na sela do cavalo.

Escolheu uma posição à sombra onde

poderia observar e ficou atento.

Observou melhor os homens de cinza que

haviam se aproximado e estavam a uma

distância prudente da fazenda. Conhecia

muito bem aqueles uniformes: eram do

Exército Confederado.

Na fazenda, sobre uma carroça, o

leiloeiro, vestido de preto, se preparava para

iniciar o leilão. Próximo dali havia um boi

inteiro sendo assado. Os leilões em Atlanta

e em todo o Sul haviam se transformado

numa grande fresta para a gente do Norte,

que vinham, cada vez em maior número,

com suas malas recheadas de dinheiro,

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comprando terras e mais terras a um preço

aviltante.

De repente, uma confusão ao redor do

leiloeiro. Os cavaleiros de cinza avançaram,

então, dominando a situação e cercando

todo os presentes.

— Demônios! — praguejou o delegado,

quando viu os soldados rebeldes

desarmando os poucos soldados da União.

Depois, com uma frieza inesperada,

enfileiraram todos eles contra a parede de

um celeiro e fuzilaram-nos sumariamente.

Aquele era o tipo de intolerância que o

deixava aborrecido, só que nada havia que

pudesse fazer. Se estivesse lá, com certeza

também seria morto, pois os do Sul não

aceitavam o fato dele ter prestado juramento

à bandeira americana, após o término da

guerra.

Estava acontecendo um grande roubo na

Fazenda Graceland. Todos estavam sendo

despojados de suas carteiras, de seu

dinheiro e de suas jóias.

Algumas mulheres foram levadas para o

celeiro, sob protestos dos homens, que

foram derrubados a coronhadas. Com

certeza seriam violentadas.

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Os homens foram empurrados para um

depósito e trancados. O boi que assava ao

fogo foi o alvo seguinte dos soldados

confederados, que resolveram transformar

aquilo numa festa particular.

Oates viu algo, então, que lhe chamou a

atenção. Podia jurar que era o xerife o

homem que confabulava com um grupo de

oficiais rebeldes, bem destacados pelo tipo

de chapéu que usavam, ao invés do quepe

dos demais.

Dois deles montaram seus cavalos. Um

recebeu uma grande sacola. Ambos

deixaram a fazenda rapidamente, rumando

na direção de Oates.

— O que há para este lado? — indagou-

se ele, olhando ao redor.

A única coisa que lhe passou pela cabeça

foi que naquela direção ficava a fazenda

decadente do Coronel Woodfarm, o herói

confederado de Atlanta, que em breve

acabaria sendo leiloada, como todas as

outras da região.

De qualquer forma, ficou curioso para

saber o que aqueles homens levavam.

O ataque transformara-se numa festa. As

mulheres divertiam forçadamente os

homens. A comida e a bebida que fora

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preparada para os nortistas estava sendo

consumida pelos sulistas. Os dois cavaleiros

avançavam agora pela trilha, na direção

mesmo da Fazenda Woodfarm.

Oates apanhou seu cavalo e adiantou-se a

eles, até uma curva. Pegou seu laço,

amarrou-o numa árvore e esticou-o,

passando a outra ponta por uma pedra.

O laço ficou esticado, a meia altura, logo

após a curva. Vindo em velocidade, os

cavaleiros não teriam tempo de qualquer ato

de defesa, pois quando percebessem

estariam sobre ele.

Armou-se de sua Winchester e esperou.

Ouviu o galope se aproximando. Os

cavaleiros vinham à toda pela trilha.

Quando fizeram a curva, os cavalos bateram

as pernas contra o laço, desabando numa

nuvem de poeira.

O delegado viu a bolsa voar no ar e cair

pesadamente, abrindo-se e revelando seu

interior. Havia ali carteiras, relógios, jóias e

muito dinheiro nortista, em maços de toda

espessura.

O produto do saque era uma pequena

fortuna, talvez mais dinheiro do que ele vira

em toda a sua vida.

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Um dos homens, ainda aturdido,

levantou-se e, cambaleando, tentou entender

o que estava acontecendo. Ao ver o

delegado federal próximo dele, tentou

reagir.

— Oates, seu maldito traidor bastardo! —

vociferou, tentando sacar sua arma.

O delegado não lhe deu chance de sacá-

la. A coronha da Winchester atingiu a testa

do soldado sulista, jogando-o de costas na

poeira.

Oates viu uma sombra se mover atrás

dele e se voltou a tempo de ver o segundo

soldado, tentando sacar sua arma.

Não podia deixar que ele atirasse, pois

poderia atrair a atenção dos homens na

fazenda. Por isso, lançou-se sobre ele,

caindo os dois na poeira.

Oates socou-o no queixo repetidas vezes,

até que ele se imobilizasse. Amarrou-os,

então. Depois foi examinar a mala feita de

tecida, uma "carpetbag", ou bolsa feita de

carpete, usada pelos homens do Norte.

Havia mesmo uma pequena fortuna ali e

o interesse do delegado era saber por que

eles a levavam naquela direção.

Foi examinar os cavalos. Nenhum deles

se machucara na queda. Apanhou os cantis

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de água e foi acordar os dois soldados,

jogando-lhes água na cara.

— Oates, seu maldito! Você deveria estar

morto, seu renegado — disse um deles,

olhando o delegado com ódio e se

debatendo, tentando se livrar da corda que o

prendia.

— Se falar desse jeito de novo, eu lhe

quebro todos os dentes da boca — rugiu

Oates. — Para onde iam com aquela sacola?

— Jamais saberá.

— Iam levá-la ao Coronel, não?

— Vai pagar por isso, Oates...

— Está falando demais para o meu gosto

— ameaçou Oates. — Será que ainda não

percebeu sua situação? Aliás, será que ainda

não percebeu a minha situação? —

emendou.

Os dois sulistas se olharam, sem

entender.

— Estou com uma pequena fortuna

naquela mala e os únicos que sabem que ela

está comigo são vocês... Se eu ficar com

ela, não vou querer que ninguém saia por aí

abrindo o bico e dizendo o que eu fiz...

Assim, algum de vocês tem uma pá no

cavalo? Senão, vão ter de cavar com as

próprias mãos...

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— O que quer dizer com isso? —

indagou um deles.

— Que terei de matá-los, rapazes. É

simples, não? Ali tem mais dinheiro do que

ganharei em toda a minha vida — continuou

Oates. — Não posso perder essa chance.

Não pretendo passar o resto de minha vida

servindo de alvo para gente do Norte e do

Sul.

— É um miserável renegado, Oates! Um

ladrão!

— Não serei melhor do que vocês...

— Roubamos por uma causa?

— Que causa?

— A gloriosa causa do Sul...

— Ao diabo com o Sul! Não percebem

que o Sul está morto? Que seus despojos

estão sendo disputados por vermes vindos

de todo o país? Que não será possível lutar

contra isso? — indignou-se o delegado.

— Fala isso porque é um covarde, que se

vendeu...

Não chegou a terminar. Oates acertou-o

na boca, jogando-o para trás. O soldado

caiu, cuspindo pedaços de dentes e sangue.

— Não estou com muita paciência para

lidar com vermes agora — falou Oates. —

Principalmente depois do que vi lá embaixo.

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Gloriosos soldados matando gente a sangue-

frio e atacando mulheres. Isto é o que

sobrou da glória do Sul?

Sem dizer mais nada, Oates apanhou sua

faca e cortou o laço em duas partes.

Começou a trançar um macabro nó de forca

no primeiro pedaço, depois fez o mesmo no

outro.

Os dois soldados olhavam-no

apavorados. Ele passou as cordas pelo galho

de uma árvore, depois trouxe os cavalos dos

soldados para perto.

— O que vai fazer? — indagou um deles,

apavorado.

— Vou mostrar como devem ser tratados

os covardes e assassinos...

— Não pode fazer isso conosco... —

berrou um deles, quando Oates o agarrou

pelos colarinhos, fazendo-o se levantar.

— Eu lhe digo o que pode ou não ser

feito...

— Temos direito a um julgamento justo...

— Tiveram, quando fuzilaram aqueles

homens lá embaixo e atacaram aquelas

mulheres.

O soldado tentou protestar. Oates

acertou-o no estômago, depois o carregou,

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jogando-o sobre a sela do cavalo. Passou o

laço em seu pescoço, depois esticou a corda.

— Espera, Oates, vamos conversar —

disse o outro, de quem o delegado tinha

quebrado alguns dentes.

— O que tem para me dizer? —

perguntou, erguendo-o e levando-o para a

sela do outro cavalo.

— Espere, Oates... Não pode fazer isso...

Eu falo... Eu digo tudo que quiser saber...

Oates já havia passado o laço pelo

pescoço dele. Esticou a corda. Escolheu um

galho caído no chão, limpou-o das folhas

secas, improvisando um chicote.

— Oates, pelo amor de Deus! Não pode

nos matar assim! Você foi um dos nossos...

Pelos velhos tempos...

O delegado parou, como se pensasse.

Ficou agitando a vara em sua mão, fazendo-

a assobiar. Os cavalos se moveram

inquietamente diante daquele barulho.

Ele olhou para os dois.

— O que acham que podem me contar

que lhes salvará a vida? — perguntou.

— O que você quiser saber.

— Para começar, para onde iam com a

mala de dinheiro?

— Levar para o Coronel...

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— Muito bem! Nosso herói se

transformou num ladrão — comentou ele.

— Sabem alguma coisa das emboscadas

contra mim e Riley.

— Não, disso não sabemos de nada.

Examinou-os. Pareciam sinceros.

Conhecia aqueles dois. Haviam servido

juntos sob o comando do Coronel. Eram

homens de confiança e leais não à causa

rebelde, mas fiéis ao comando do Coronel,

que sempre fora, naquela região, uma figura

de peso, uma lenda viva realmente.

Se estavam de novo metidos em

escaramuças, não o faziam por vontade

própria, mas por lealdade ao velho militar.

— O que mais estão preparando? —

indagou.

— Não sei... Recebemos ordens de atacar

Graceland... Só isso... Talvez haja mais

coisas... Não sei... — respondeu o homem

com os dentes quebrados, ainda cuspindo

sangue.

— Vou levá-los presos, rapazes — falou.

— Será o mesmo que nos matar aqui —

informou um deles.

— Não se preocupe! O xerife e seus

ajudantes tomarão conta de vocês...

Os dois homens se olharam apavorados.

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— Quando ele souber que falamos,

estaremos mortos — disse um deles, num

fio de voz, confirmando as suspeitas do

delegado.

— Por quê? — insistiu. — Porque o

xerife estava mancomunado com vocês

durante o ataque? Porque eu o vi junto com

os oficiais, antes de vocês montarem para

vir para cá?

Os dois abaixaram a cabeça e não

precisaram dizer nada. Apesar de tudo,

Oates não conseguia culpá-los. Eram

homens de quem tudo fora tirado: a família,

as colheitas, a terra, a sobrevivência.

Viviam de esperanças, por mais

desesperadas que fossem. Eram vítimas dos

espertalhões ou de fanáticos como o

Coronel.

Só que, por trás daquilo tudo, Oates via

um grande golpe. Um golpe para tornar

alguns poucos ricos à custa da miséria dos

desesperados.

Olhou-os com pena. A questão agora era

saber o que fazer com eles. Se os levasse

para o xerifado, com certeza seriam mortos

para não falar, como acontecera com Pete,

na noite anterior.

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Havia uma pequena cela no escritório

ocupado pelos delegados federais, mas, com

Riley ferido, não haveria como montar

guarda todo o tempo. Soltá-los seria outra

estupidez. O elemento surpresa e o suspense

a respeito do paradeiro do dinheiro roubado

poderiam ser mais úteis naquele momento

para ele, enquanto continuava suas

investigações.

— Está bem, rapazes, não morrerão agora

— disse o delegado, cortando com sua faca

o laço do pescoço de um deles.

Quando se preparava para fazer o mesmo

com o segundo, o primeiro esporeou seu

cavalo, tentando escapar.

— Maldição! — exclamou o delegado.

Sem pestanejar ele arremessou sua faca,

cravando-a pouco abaixo da nuca do

soldado, que pendeu para o lado e caiu

pesadamente na poeira.

— Seu bastardo nojento! — berrou o

outro, tocando o cavalo para cima de Oates.

O delegado saltou para o lado. O cavalo

avançou e passou rente a ele. O soldado

ficou dependurado na ponta da corta, com

os olhos esbugalhados e o pescoço

grotescamente retorcido.

— Maldição! — praguejou.

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Acabava de perder duas importantes

testemunhas. Com eles em suas mãos

poderia intimidar os conspiradores. Agora

nada havia que pudesse fazer.

Pensou em enterrá-los, mas achou melhor

não fazer isso. Iria dar o que pensar quando

fossem encontrados, quando não

aparecessem com o dinheiro.

Voltou ao seu posto de observação. Os

soldados de cinza já haviam saído e uma

grande confusão reinava no local. Pensou

em ir até lá, mas já sabia o que havia

acontecido e nada poderia mais ser feito

para salvar aqueles homens nem evitar o

sofrimento e a humilhação daquelas

mulheres.

Em parte não deixava de ser um castigo

para todos eles, sedentos de diversão,

tripudiando sobre aquela terra castigada e

sofrida.

Cavalgou de volta para a cidade, mas,

antes de chegar lá, arrumou um esconderijo

para a mala numa velha mina abandonada.

O local era seguro. Oates o conhecia desde

garoto, quando brincava por ali.

As notícias do ataque já circulavam.

Assim que desmontou diante do escritório,

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já surgiram pessoas perguntando se ele

sabia alguma coisa a respeito.

— Não sei o que houve — disse ele. —

Onde está o xerife?

— Deve estar lá...

— O que houve, realmente?

— Estão dizendo que um exército

confederado atacou a Fazenda Graceland...

— Um exército! — surpreendeu-se

Oates, notando nos olhos das pessoas um

brilho de esperança.

Era isso apenas o que as mantinha vivas

naqueles tempos de humilhação.

— Vou ver isso em seguida. Antes quero

ver como está meu amigo — disse,

entrando.

O médico vinha saindo. Havia acabado

de examinar Riley.

— Eu disse que ele era forte como um

touro. Se não o amarrar na cama, ele vai

acabar se levantando antes do tempo. Mas,

pelo menos, ele está em boas mãos. Tenho

certeza que vai se recuperar logo — disse o

médico, com um sorriso divertido nos

lábios.

— Em boas mãos? Como assim? —

estranhou Oates.

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— Uma boa enfermeira, boa comida...

Vai se levantar logo — confirmou o

médico, rindo e saindo.

Oates foi até o quarto de Riley conferir o

que estava acontecendo.

Parou na porta, surpreso, quando viu

quem estava com o ferido, dando-lhe sopa

na boca.

— Rose! — exclamou.

Apertando-a em seus braços e beijando-a,

Oates nem tentava se lembrar mais de

quantas e quantas vezes sonhara com aquela

cena. A mesma coisa acontecia com Rose.

Desde que a guerra terminara e que fora

dada oportunidade aos soldados e oficiais

rebeldes de jurarem fidelidade à bandeira da

União, Oates passara a ser hostilizado pelos

seus ex-companheiros de batalhas.

Para Rose aquilo fora terrível, porque a

afastara dele por algum tempo. Oates fora

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para Washington, onde acabara sendo

nomeado Delegado Federal.

Ele mesmo insistiu para ser mandado

para Atlanta, uma cidade que a maioria dos

outros delegados evitava.

— Oh, Deus! Como eu sonhei com isso!

— murmurou ela, com os olhos brilhantes e

o corpo trêmulo de emoção.

— Oh, Rose! Fique comigo!

— Não posso...

— E por que não?

— Meus amigos...

— Nossos amigos, não se esqueça. Quero

o bem deles, mas não da forma como eles

querem obter isso. Atacaram a Fazenda...

— O que soube sobre o ataque?

— Eu não soube, Rose. Eu estava lá.

Ela demonstrou surpresa, olhando-o com

atenção, apalpando-o para se certificar de

que ele não estava ferido.

— Como conseguiu sair com vida?

— Não participei do ataque. Estava numa

colina, observando tudo. Nada pude fazer.

Eles simplesmente fuzilaram os soldados,

sem lhes dar chances de defesa...

— Meu Deus! Perderam a razão!

— E atacaram as mulheres. Estão agindo

como os loucos de Quantrill. Não são

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soldados, são animais recalcados,

assassinando e violentando, Rose. Temos

que detê-los.

— Estão fazendo isso por dinheiro,

Oates. Vão arrecadar fundos para pagar as

dívidas dos fazendeiros e evitar que suas

terras vão a leilão... Um emissário chegou

há pouco, trazendo o produto do ataque à

Fazenda Graceland...

— Como? — surpreendeu-se ele.

— A adega do saloon vai ser usada

novamente como esconderijo. Está lá a mala

com o dinheiro roubado...

— Você a examinou?

— Não, e deveria?

Oates ficou intrigado com o que estava

acontecendo. Pelo visto, Rose estava sendo

enganada. E não apenas ela. Todos os que

confiavam nos planos loucos de

ressurgimento do Sul.

A guerra estava irremediavelmente

perdida e aquelas terras eram agora

devastadas por abutres de todos os tipos.

— Rose, preciso examinar essa mala.

— Por quê? Sabe que não posso. Seria

loucura! Traição! Eu seria morta por isso...

— surpreendeu-se ela.

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— E se eu lhe garantir que não há

dinheiro nela?

A garota olhou-o desconfiada, mas sem

entender o que poderia estar se passando.

— Como pode afirmar isso?

— A mala com o produto do roubo está

bem escondida agora. Eu a tirei dos

emissários que a levavam para o Coronel.

Ela recuou, olhando-o atônita.

— Fala sério?

— Sim, eu a escondi.

— Nesse caso, o que há naquela mala que

escondi na adega?

— Acredito que não encontrará nada de

valor lá.

— Neste caso...

— Acho que está sendo enganada,

querida. Você e todos os outros. Desconfio

que o produto do roubo, não apenas desse,

mas de todos os outros que seguramente

serão cometidos, não irá ajudar fazendeiros

ou qualquer outro necessitado...

— Meu Deus! Como puderam pensar em

semelhante traição?

— São os tempos, querida. Poderia me

deixar ver essa mala?

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Ela hesitou por instantes. Se fossem

apanhados juntos, examinando aquela mala,

seria o fim para os dois.

Por outro lado, a suspeita que Oates

lançar sobre a sinceridade dos planos do

Coronel e de seus comandados era terrível

demais para não ser apurada.

— E tem mais, Rose. O xerife participou

pessoalmente do ataque. Estava lá todo o

tempo, enquanto os soldados ianques eram

fuzilados e as mulheres eram violentadas.

Deve chegar daqui a pouco à cidade com

uma história bem fantástica.

— Está bem — concordou ela. — Vamos

até o saloon, disse ela, decididamente.

Os dois saíram juntos. Algumas pessoas

os viram e se surpreenderam. Eles pegaram

seus cavalos e cavalgaram para o saloon.

Quando haviam atravessado a divisa

entre as duas partes da cidade, foram

barrados pela aproximação do xerife com

seus ajudantes. O homem da lei ficou

surpreso ao ver Rose na companhia do

delegado federal, mas não se manifestou a

respeito.

— Atacaram a Fazenda Graceland,

mataram os soldados, violentaram algumas

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mulheres... — informou o homem da lei,

fazendo um ar solene e grave.

— Quem atacou, xerife? — indagou o

delegado.

— Guerrilheiros...

— Rebeldes?

— Sim... Roubaram uma fortuna —

afirmou, olhando na direção de Rose.

Percebia alguma coisa estranha nela. Não

via ali aquele olhar de cumplicidade que

conhecia, mas uma inesperada acusação,

como se Rose o olhasse com asco.

— Se eram guerrilheiros e mataram

soldados da União, só há uma coisa a fazer

neste caso — falou Oates.

— E o que é? — indagou o xerife, sem

tirar os olhos de Rose.

O que via no olhar dela deixava-o muito

preocupado.

— Pedir a implantação da Lei Marcial

novamente na cidade e solicitar a vinda de

um destacamento da Cavalaria.

— O quê? — surpreendeu-se o xerife,

percebendo que aquela medida jogaria por

terra todos os planos feitos pelo Coronel.

A presença dos soldados ianques

representava um perigo inesperado para

qualquer ação mais ousada. Os soldados

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rebeldes seriam caçados com a mesma

animosidade que motivara aquela guerra.

— Deveria pensar melhor nisso,

delegado. A presença de soldados ianques

na cidade pode ser uma ameaça à ordem e

encarada como uma provocação...

— E a cada vez que um deles circulasse

pelas ruas com seu uniforme azul, seria

considerado um alvo por algum rebelde

encima de um telhado, não?

— Já passamos por isso antes, delegado.

Pense bem, por favor — insistiu o xerife. —

Agora temos que ir. Se quiser discutir

melhor o fato, estarei em meu gabinete.

O homem da lei e seus ajudantes se

afastaram, dobrando uma esquina. Rose e

Oates continuaram seu caminho.

O xerife, porém, preocupava-se com o

que vira na expressão de Rose. Assim que

saíram das vistas dos dois, ele se deteve.

— Don e Billy, quero que vocês sigam

aqueles dois e vejam o que vão fazer —

ordenou.

— Quer que tome alguma providência

em relação ao delegado?

— Não, ele não me preocupa no

momento. Vai pensar duas vezes, antes de

chamar os soldados. Também não quer a

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cidade em pé de guerra. O que me preocupa

é Rose. O que ela fazia com ele, assim

abertamente?

— Está bem, xerife. Vamos seguí-los —

afirmou Don, fazendo um sinal para Billy.

Os dois se afastaram e o xerife esporeou

seu cavalo. Esperava encontrar Robert

Woodfarm a sua espera no gabinete para

discutirem os últimos acontecimentos e o

sucesso do primeiro ataque.

Enquanto isso, Rose e Oates chegavam

ao saloon. Assim que desmontaram, alguns

homens diante do prédio já se puseram em

guarda.

O delegado demonstrou que estava ali em

paz, mantendo suas mãos próximas das

armas, no entanto. Rose arrastou-o para

dentro do saloon.

Assim que entraram, os homens se

levantaram e ficaram na porta, olhando com

curiosidade o que se passava lá dentro.

Burt, o sócio de Rose, surpreendeu-se ao

vê-la com o delegado.

— O que está havendo, Rose? —

indagou.

— Venha comigo, Burt. Você poderá

testemunhar algo abominável — disse ela,

apanhando um lampião e acendendo-o.

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— Aonde vai? — quis ele saber.

— À adega!

— Espere! - pediu ele, olhando-a

assustado.

Sabia que a mala contendo o produto do

ataque estava escondida lá dentro. Seria um

risco para Rose levar o delegado federal lá

dentro.

— Não se preocupe, Burt. Se estamos

certos, não há dinheiro naquela mala —

falou ela, entendendo a preocupação dele.

— Como?

— É isso mesmo o que você ouviu —

falou ela, caminhando na frente dos dois.

Os homens na porta do saloon haviam

ouvido aquilo, inclusive Don e Billy, que se

olharam surpresos.

— O que faremos? — indagou Billy.

— Vá avisar o xerife do que está

acontecendo aqui — ordenou Don.

— E você?

— Eu vou ficar e observar. Não estou

gostando do que está acontecendo. Segundo

o xerife, o dinheiro estaria em segurança

aqui, no saloon, com Rose. Se estamos

sendo enganados, quero saber quem está por

trás disso, Billy.

— Está bem, vou avisar o xerife, então.

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Rose e os dois homens desceram por uma

escada, até uma grande porta feita com

pranchas de madeira maciça. Burt se

adiantou, abrindo-a. Entraram na escuridão

fria da adega.

O lampião iluminou garrafas dispostas

em estruturas de madeira, caixas e teias de

aranhas. A garota foi até uma dessas

estruturas de madeira e puxou-a.

Oates se apressou em ajudar. Atrás

daquela espécie de estante havia uma

caverna, que se estendia sob o saloon.

Caminharam alguns passos, até uma mesa.

Sobre ela estava a mala.

Com gestos nervosos, Rose desamarrou

os laços que a fechavam, depois abriu-a.

— Eu sabia! — afirmou Oates.

Burt estava perplexo, sem entender. Vira

quando os emissários haviam trazido aquela

mala, informando que era o produto do

roubo na fazenda. Só via ali, agora, papeis

velhos, gravetos e folhas secas.

— E o dinheiro? — indagou ele, atônito.

— Acho que todos vocês estão sendo

enganados — falou Oates.

— Maldição! O que significa isto, afinal?

— perguntou Rose, indignada com aquilo.

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— Temos abutres dos dois lados, querida.

Ambos estão rapinando esta terra e sua

gente — informou Oates.

— Os outros precisam saber disso —

disse Burt.

— Mas temos que fazer isso de forma a

não provocar uma revolta. Já basta o que

fizeram na fazenda, matando soldados e

violentando mulheres. Isso já é suficiente

para que a Cavalaria seja mandada para cá,

com funestas conseqüências. É hora de

apaziguar, não de fomentar o ódio. Todos

terão muito a perder com um

recrudescimento nas hostilidades.

— Oates tem razão, Burt. O povo tem

direito de saber o que está se passando, mas

deve deixar para a lei as providências. Não

temos mais aqui um caso de revolta

popular, mas de uso das esperanças do povo

em proveito próprio.

— Não será uma tarefa fácil —

reconheceu Burt.

— Eu farei isso. Todos me ouvirão, tenho

certeza — afirmou a garota.

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O xerife entrou sorridente em seu

gabinete, ao perceber que Robert estava ali

a sua espera. Foi direto a um armário para

apanhar uma garrafa de uísque e

comemorarem.

— Seu estúpido! Onde está o dinheiro?

— indagou Robert, furioso.

— Como? — retrucou o homem da lei,

olhando-o surpreso, sem entender aquela

fúria inesperada.

Robert já estava junto dele, olhando-o

nos olhos, com o dedo em riste quase

enfiado em seu nariz.

— Tínhamos combinados que o dinheiro

seria mandado para a nossa fazenda... — ia

dizendo Robert.

— Mas foi o que fizemos...

— Mentira! Ele não chegou lá.

— Mandamos dois homens... Mas... O

que está havendo afinal? Onde foi parar

todo aquele dinheiro? Se aqueles malditos...

— Encontramos dois homens mortos no

caminho. Um estava com uma faca em suas

costas. O outro foi enforcado. Eram Ted e

Simon. Seriam esses os emissários?

Os olhos do xerife estavam arregalados.

Ele se lembrou do olhar de Rose e da

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determinação do delegado federal, quando

cruzara com eles na rua.

— Espere um pouco, Robert — disse o

xerife, pensativo.

— Meu pai está possesso com o que

aconteceu. Esperava sentir esse dinheiro em

suas mãos...

— Se Ted e Simon foram mortos, alguém

roubou esse dinheiro deles...

— E quem sabia que esse dinheiro estava

sendo mandado para a fazenda, além de

você e alguns oficiais? Para todos os outros,

o dinheiro estava sendo mandado para ser

oculto por Rose, no saloon, não?

— Está insinuando que algum de nós...

— Não se trata de insinuação, xerife.

Algum de nós nos traiu e roubou todo

aquele dinheiro...

Naquele momento, Billy entrou no

gabinete esbaforido.

— Que diabos está havendo, Billy? —

indagou o xerife, exasperado.

— Alguma coisa está acontecendo lá no

saloon, xerife. Rose levou o delegado

federal para lá. Estão dizendo que não há

dinheiro na mala que foi escondida por ela...

O xerife e Robert empalideceram,

trocando olhares atônitos e raivosos.

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— Reuna o pessoal, Billy — ordenou o

xerife.

— Demônios! Como ele descobriu isso?

— Não tenho a menor idéia. Só sei que

teremos muito trabalho para explicar ao

povo o que está acontecendo. O ataque e

sua finalidade já devem ser do

conhecimento de todos eles. Não teremos

como evitar uma revolta contra nós...

— Espere, xerife... Vamos manter a

calma... Tem certeza que não se enganou

com as malas, mandando a que tinha o

dinheiro para Rose?

— Absoluta!

— Neste caso, temos de ser espertos...

— Não haverá esperteza que nos livre da

fúria de nossa gente, quando descobrirem o

que estávamos tentando fazer...

— Não se preocupe. O ódio aos ianques

sempre será maior do que qualquer coisa.

Podemos fazer o feitiço se voltar contra o

feiticeiro — falou Robert, tentando pensar

como seu pai naquele momento.

— O que tem em mente?

— Se o dinheiro foi mandado para Rose e

sumiu, ela tem que dar conta dele.

Principalmente se ela nos traiu, aliando-se

ao renegado Oates Fordd, um bastardo que

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renegou nossa bandeira para servir à da

União.

— Acha que pode dar certo?

— Se você instruir corretamente seus

ajudantes, eles poderão dar a partida numa

manifestação de ódio contra Rose. Vai ser

difícil impedir que o povo linche aqueles

dois, o que será conveniente para nós todos.

— Pode dar certo... Vou falar com meus

rapazes. Eles serão o instrumento que

desencadeará o inferno sobre Rose e Oates,

livrando, assim, nossa cara.

Quando os três retornaram da adega,

trazendo a mala, uma pequena multidão já

havia se juntado no saloon.

— Rose, quer nos dizer o que está

havendo? —indagou alguém. — O que esse

renegado está fazendo aqui?

— Eu lhes digo o que está havendo —

falou Oates, apanhando a mala e jogando-a

no meio do salão.

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Seu conteúdo espalhou-se, diante dos

olhares surpresos de todos.

— É isso o que está havendo. Vocês

estão sendo usados com falsas esperanças.

Têm que entender que o Sul acabou. Agora

somos parte da União e é assim que será de

agora em diante...

— Cale a boca, renegado! — gritou um

dos presentes.

— Eu lhe mostro quem é renegado —

disse Oates, saltando sobre ele.

Agarrou o homem pelo pescoço e socou-

o no nariz, fazendo o sangue espirrar.

Os outros foram em auxílio do amigo,

caindo sobre Oates e derrubando-o com

socos e pontapés.

Rose apanhou a cartucheira que ficava

atrás do balcão e disparou um tiro para o

alto, abrindo um rombo no forro.

— O próximo que se mexer ou tocar num

fio de cabelo de Oates, vai se haver comigo

— ameaçou ela e todos tinham certeza que

ela cumpriria a promessa. — Oates não é

um renegado. Pelo contrário, está fazendo

por nossa cidade muito mais do que vocês

querem admitir. Ao jurar lealdade à

bandeira da União ele apenas foi inteligente

diante de uma situação que não poderemos

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mais mudar... Temos de admitir: a guerra

acabou e fomos derrotados. A Confederação

do Sul não existe mais. E Oates poderia ter

ido para qualquer parte do país, mas

preferiu voltar para cá e nos ajudar a

entendermos o que havia acontecido.

Um silêncio doloroso pairou no saloon,

enquanto os homens, cabisbaixos, ouviam o

que Rose dizia.

Oates se levantou e caminhou até onde

estava a mala com papeis, gravetos e folhas.

— Eis o sonho que restou, pessoal...

Estão sendo usados... Estão tripudiando em

suas esperanças de voltar no passado... É

impossível... Perdemos a guerra...

— Oates está certo, pessoa. — confirmou

Burt. — Temos de arregaçar as mangas

agora e tentar reconstruir nossas vidas. Ficar

se lamentando agora não vai adiantar nada...

O xerife, seus ajudantes e Robert

chegaram naquele momento. Todos os

olhares se voltaram para os dois.

— O que está havendo aqui? — indagou

o homem da lei.

— Nós é que lhe perguntamos isso, xerife

— falou Oates, chutando a mala que

escorregou pelo assoalho e foi parar aos pés

do homem da lei.

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— E isto, o que significa? — continuou.

— Como se não soubesse, não é, xerife?

— ironizou Rose. — Esta é a mala que os

emissários trouxeram para ser escondida. A

mala com o produto do roubo na Fazenda

Graceland.

Oates percebeu que os ajudantes do

xerife se distribuíam pelo saloon. Eram

todos ex-combatentes, homens acostumados

ao rigor das batalhas e bons no gatilho.

A maneira como se comportavam

indicava que estavam seguindo ordens,

preparando-se para a ação.

Eram cinco ao todo e pela maneira como

se distribuíram, seria impossível para Oates

acertá-los com rapidez.

Teria de atingir uns dois ou três, depois

procurar um esconderijo. O problema era

afastar Rose do caminho.

— Não sei do que está falando — falou o

homem da lei, abaixando-se para examinar

o conteúdo da mala.

Oates se aproximou de Burt.

— Tente tirar Rose da linha de tiro. Acho

que isto aqui vai pegar fogo — falou-lhe o

delegado.

— Certo, tentarei. Tenho uma arma

comigo. Se precisar de ajuda...

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— Terá que atirar contra seus amigos,

como Billy ali na frente, Don à direita,

Thomas, ao fundo...

— Diabos!

— Apenas tire Rose do caminho e deixe

o resto comigo, está bem?

— Não sei do que está falando, Rose —

afirmou o xerife, levantando-se e encarando

a garota.

Robert, ao seu lado, estava lívido e tremia

de indignação. Todo o plano poderia ir por

água abaixo, por causa daqueles dois

malditos.

— Mas eu sei, xerife. Eu estava numa

colina próxima da fazenda. Eu vi o ataque.

Eu vi os soldados sendo fuzilados e as

mulheres sendo violentadas. Eu os vi

mandando o dinheiro para a fazenda do

Coronel... Robert deve saber onde está o

dinheiro...

Todos os olhares se concentraram no

filho do coronel, o herói que passara toda a

guerra num campo de prisioneiros.

— Não sei do que está falando —

gaguejou Robert, recuando alguns passos.

A multidão já era compacta atrás deles.

— Acho que podem abrir o jogo, pessoal

— falou Oates. — Como sei do que o xerife

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fez, dos crimes que foram cometidos hoje

em Graceland e do dinheiro que foi

roubado, acho que não sairei vivo daqui.

Assim, Por que não contam a eles o que

aconteceu com o dinheiro? — propôs Oates.

A multidão silenciosa concordou com

movimentos de cabeça e olhares

interrogativos.

Burt conseguira levar Rose para o outro

extremo do balcão, deixando a linha de tiro

livro. Oates já analisara suas ações. Balearia

dois dos ajudantes, os mais próximos e mais

perigosos, depois se esconderia atrás do

balcão.

Billy, um dos ajudantes, estava inquieto.

Seu pai e seus irmãos haviam morrido na

guerra. Ele, mais do que todos, tinha

motivos para odiar os ianques e todos os

que se ligavam a eles, como o delegado

federal.

Não podia admitir, porém, que a memória

de seus mortos em batalha fosse usada para

fins tão mesquinhos.

— Ele tem razão, Robert. Se o que ele

afirma é verdade, temos de reconhecer que

é um homem morto mesmo. Assim, onde

está o dinheiro? — quis ele saber.

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O rapaz encolheu-se, olhando o xerife

com apreensão. O homem da lei percebeu

que a situação começava a se inverter.

— Acho que temos de perguntar isso a

Rose — devolveu o xerife. — O dinheiro

foi entregue a ela, ela tem que dar conta.

— Pois aí está ele, a seus pés, xerife —

disse ela.

— Estão sendo enganados, rapazes. Rose

e esse renegado estão nos enganando.

Pegaram o dinheiro e...

— O dinheiro foi mandado para a casa do

Coronel e não chegou lá. O que houve com

Simon e Ted? — indagou Oates.

O xerife olhou-o nos olhos,

compreendendo tudo. Oates tinha observado

todos os acontecimentos e seguido os

emissários, roubando-lhes o dinheiro.

— Bastardo! — rugiu ele. — Foi você,

não?

— E quem mais poderia ter sido? —

retrucou o delegado.

— Fogo nele, rapazes! — ordenou o

xerife, levando sua mão à arma.

Oates percebeu a indecisão dos ajudantes,

chocados com aquela dúvida que pairava no

ar.

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Concentrou sua atenção no xerife e em

Robert. Este, ao ver o xerife sacando,

imitou-o.

O delegado federal teria que tentar não

podia matar aqueles homens porque não

sabia qual seria a reação daquela multidão

diante dele.

Assim, sacou velozmente sua arma e

atirou no ombro direito do xerife e no

quadril de Robert, antes que os dois

conseguissem sacar suas armas.

— Maldição, rapazes! Atirem nele! —

ordenou a seus ajudantes, mas Oates já os

tinha sob sua mira.

Todos o haviam visto sacar. Sabiam que

ele era rápido e tiveram uma demonstração

ali, diante dos olhos. Ninguém iria se

arriscar a enfrentá-los, principalmente após

o que haviam tomado conhecimento.

— Muito bem, rapazes, vejo que

perceberam a voz da razão — comentou

Oates, indo até os dois feridos e

desarmando-os. — Vou nomeá-los

ajudantes federais agora. Temos de levar

estes dois...

— Deixe-os aqui, Oates! Sabemos o que

fazer com eles. Vão dançar na ponta de uma

corda — gritou alguém.

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— Não, pelo contrário. Acho que a lei

deve prevalecer agora. Estes homens têm de

ser julgados para servir de exemplo a todos

os aproveitadores — sentenciou o delegado.

A multidão concordou, muito embora

alguns estivessem anda indignados com a

ação de Robert e do xerife.

Riley já estava bem melhor e fora para a

cadeia, fazer companhia ao seu amigo e aos

ajudantes. O clima na cidade estava tenso.

Oates telegrafara pedindo um destacamento

da Cavalaria, que ainda não chegara.

— Deveria ter deixado que a multidão os

linchasse lá no saloon — comentou Rose.

— Teria nos poupado aborrecimentos,

tenho certeza, mas estaríamos atrasando a

chegada da lei e da ordem à cidade.

— Só que agora estamos pior do que

antes — comentou Riley. — Agora todo

mundo quer nos matar. Os rebeldes, para

tirarem o xerife e Robert daqui e lincharem-

nos. Os ianques, porque estamos protegendo

os homens que participaram do ataque a

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Graceland. E como se não bastasse tudo

isso, temos o Coronel e seus homens fiéis a

ele ainda, ameaçando atacar a cidade para

resgatar o filho e nos matar. O que mais nos

falta agora?

— Fique calmo, Riley. A situação não é

desesperadora ainda. A Cavalaria vai chegar

logo...

— Tomara!

Naquele momento, gritos lá fora

indicaram a chegada de encrenca.

— Rose, é melhor sair pelos fundos e

ficar longe — recomendou Oates.

— Nem pensar — afirmou ela,

apanhando uma Winchester e engatilhando-

a.

Um grupo de homens, em esfarrapados

uniformes do Exército Confederado, faziam

um protesto.

— Queremos os traidores! — gritavam

eles.

Oates ia sair para tentar apaziguá-los,

quando um bando de cavaleiros surgiu.

Eram ianques, revoltados com o ataque a

Graceland.

Uma briga se iniciou no meio da rua,

diante da cadeia.

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— Demônios! — praguejou Oates,

apanhando uma Overland de dois canos e

saindo.

Disparou uma vez para o ar.

— Se não pararem com isso agora

mesmo, vou ser forçado a usar isto contra

vocês — disse ele, recarregando.

Os homens na rua pararam. De repente,

toda a cidade ficou em silêncio. As cabeças

se voltaram na direção do fim da rua. Ali,

um pequeno exército a cavalo se

organizava.

ã frente deles, num cavalo branco

imponente, no seu uniforme de batalha

completo, o Coronel Woodfarm em pessoa

liderava um grupo de fanáticos.

— Oh, droga! — murmurou Oates,

retornando para o interior da cadeia. —

Vamos fazer uma barricada nas portas e

janelas. O Coronel está chegando com seus

homens. Se vocês quiserem sair, rapazes,

não os impedirei — disse aos ajudantes.

Os homens se olharam.

— Achamos que estamos do lado certo

agora, Oates.

— Certo, rapazes! Vamos nos preparar.

Eles devem ser uns trinta homens mais ou

menos, contra nós sete...

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— Oito! — corrigiu Rose, manobrando a

Winchester com familiaridade.

Barricadas foram postas nas portas e

janelas. A rua diante da cadeia ficou vazia.

O grupo de soldados confederados avançou

sem oposição.

Pararam e desmontaram, sob as ordens do

Coronel. Um homem, após receber

instruções, avançou rapidamente pela rua,

até diante da prisão.

— Oates, o Coronel manda que você

solte Robert e o xerife. Caso contrário, será

obrigado a ordenar o ataque.

— Pois volte e dia a ele que eu mandei

que ele se entregasse. Caso contrário, terei

que ir prendê-lo.

O soldado olhou-o intrigado, como se

julgasse Oates um louco.

— Vá lá e diga a ele — insistiu Oates.

— É loucura! — falou o soldado.

— É loucura o que vocês estão fazendo.

Não há chances. Neste momento, um

destacamento da Cavalaria está chegando à

cidade. Vocês não terão chance. Serão

caçados e exterminados como animais

perigosos. Tenho certeza absoluta que eles

não farão prisioneiros.

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O soldado hesitou. Havia dúvida em seu

rosto. Ele puxou as rédeas do cavalo e

cravou-lhe as esporas, retornando para junto

do Coronel.

— E então? — indagou o militar.

— Ele não vai se render, senhor...

— E o que mais? — insistiu o Coronel,

percebendo que o soldado tinha mais

alguma coisa a dizer.

— Ele mandou que o senhor se

entregasse...

O coronel riu e fez um sinal para seus

homens. Parte deles começou a avançar pela

rua, ocupando janelas e portas, entrando

pelos becos, subindo nos telhados.

O restante ficou ao lado dos cavalos,

esperando as ordens. O Coronel esperou até

que os homens se posicionassem, depois

levantou seu sabre e deu sinal.

Um cerrado tiroteio se abateu contra a

cadeia. As balas arrebentavam os vidros das

janelas e tiravam lascas da porta, que foi

sendo cravejada de projéteis.

Nas grossas paredes de tijolos, as balas

batia com violência e encravavam-se,

abalando os alicerces, fazendo toda a

construção tremer.

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— Mantenham-se abaixados! — gritou

Oates, enquanto as balas entravam pelas

janelas e iam arrebentar tudo que

encontravam pelo caminho.

Os prisioneiros estavam protegidos no

corredor das cela e não seriam atingidos.

Oates pensou que um bom lugar para eles

seria ali, na frente, servindo de alvo para as

balas que choviam, vindo de toda parte.

De repente, o tiroteio cessou e um

silêncio mortal pairou sobre a cidade.

Olhando rapidamente pela janela, Oates

viu os homens deixando suas posições e

correndo na direção dos outros.

— O que está havendo? — quis saber

Rose.

Oates desobstruiu a porta e saiu para

olhar. Os homens do Coronel haviam

acabado de montar seus cavalos. De um

lado e do outro da rua, fechando a passagem

deles, haviam soldados da União,

desmontados e postados em posição de tiro,

com suas armas apontadas.

O Coronel, em seu cavalo, analisava a

situação.

— Renda-se, Coronel! — gritou-lhe

Oates, percebendo que não havia saída para

o velho militar.

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— Nunca! — respondeu ele.

— Não vai conseguir passar — afirmou,

entendendo o que ele queria fazer.

Seria uma manobra de fuga desesperada,

indo direto para os atiradores e tentando

passar a todo custo.

Poderia dar algum resultado em campo

aberto, mas ali estava encurralados.

— Não, Coronel, não faça isso! —

insistiu Oates.

O militar olhou-o de longe, prestou-lhe

continência, depois sacou o sabre e

posicionou-o no ombro.

— Carga! — gritou ele, esporeando seu

cavalo, seguido por seus homens.

O grupo foi se desfazendo pela rua, na

medida que avançava e era recebido por

tiros, ao mesmo tempo em que tinha sua

retaguarda sob ataque.

— Oh, Deus! — murmurou Rose,

abraçando-se a Oates.

O último dos confederados a cair foi

justamente o Coronel. Seu cavalo avançou

por alguns metros ainda, depois fez a volta e

retornou, parando ao lado do corpo crivado

de balas.

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Uma Arma para uma

Mulher

Para um homem acostumado a ser livre, a

percorrer os territórios no lombo de seu

cavalo, sem se fixar em parte alguma,

quinze anos numa prisão fora um castigo

cruel.

Frank Sommer havia passado por essa

terrível experiência e, agora, desejava

apenas retornar para junto de sua filha e

passar seus últimos dias num rancho junto

ao Rio Colorado.

Birddie Nolan, um velho parceiro que,

como ele, também cumprira pena,

aguardava-o também. Havia sido o velho

bandido que, nos últimos cinco anos, havia

tomado conta de Moly Sommer, a filha do

pistoleiro.

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Frank Sommer nem sabia como era o

rosto da filha nem podia imaginar que tipo

de garota encontraria a sua espera. Nolan,

em uma de suas cartas, dissera que a jovem

era um retrato vivo da mão, além de ser

corajosa e muito decidida.

Quando fora preso, após uma carreira de

crimes que ao tornara procurado em todo o

Oeste, Frank só vira sua filha uma única

vez. Guardava dela a recordação de uma

garotinha de cabelos claros, como cabelo de

milho e olhos muito azuis.

Ele pensava em tudo isso, enquanto

cavalgava no entardecer. Logo teria de

acampar, por isso procurou um lugar

adequado.

Faltavam ainda umas cinqüenta milhas

para chegar ao seu destino. Os anos todos

na prisão o haviam arruinado fisicamente.

Era agora um velho de quase sessenta anos,

com cabelos brancos e a vontade de viver

seus últimos dias em paz.

Parou junto a um riacho. Soltou o cavalo

para pastar, acendeu a fogueira e preparou

alguma coisa para comer. Havia cavalgado

muito naquele dia e o corpo doía

terrivelmente. Queria comer alguma coisa

logo e descansar.

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Tinha terminado de jantar e preparava um

pouco de café, quando os dois estranhos

chegaram. Um deles era alto e magro. O

outro era um pouco mais baixo. Ambos

portavam armas em coldres muito baixos,

próprios de pistoleiros.

— Noite! — disse o mais alto, sem

desmontar, sondando o terreno. —

Estivemos cavalgando todo o dia. Podemos

aproveitar a sua fogueira?

— Sim, como não — respondeu ele. —

Estava mesmo me sentindo muito só por

aqui. Desmontem, estou fazendo um pouco

de café. Se quiserem comer, tenho comida,

mas terão que preparar...

— Não se incomode, bom homem.

Aceitaremos seu café, com prazer. Só

vamos descansar um pouco e depois seguir

viagem. Meu nome é Samuel Corey e meu

parceiro se chama Slim Patterson.

— Sou Frank Sommer — apresentou-se o

velho pistoleiro, sondando-os.

Os dois recém-chegados olharam-se por

instantes. Desmontaram, retirando de seus

alforjes canecas de alumínio. Sommer

terminou o café e serviu-os. Depois

apanhou uma caneca para ele e foi se

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encostar no arreio, onde estendera o

cobertor de lã de carneiro.

Seu cinturão estava junto à sela. Era o

mesmo que usava, quando fora preso. A

arma era um velho Colt, um dos primeiros

modelos com cartuchos que foram

produzidos.

— É uma arma muito velha essa que tem

aí — observou Samuel, olhando para o

pistoleiro.

— Sim, é bem velha mesmo, moço. Deve

ter uns trinta anos comigo. Hoje não são

mais usados, mas o cano longo garante uma

precisão superior aos Colts de cano curto

que se fazem hoje. Vi um catálogo num

jornal, esses dias. Com um cano daqueles

um homem precisaria de sorte paras acertar

um celeiro a dez passos...

— Sim, mas há de convir que não é uma

arma própria de um pistoleiro. É mais difícil

e demorada para sacar, não — observou

Slim.

— De que lhe adianta sacar rápido se não

tem precisão? Eu sempre usei esta daqui e

não tenho motivos para reclamar dela.

Garantiu-me a vida muitas vezes.

— É, não duvido, moço — disse Samuel.

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— Para onde estão indo? — indagou o

velho pistoleiro, terminando o café e

começando a enrolar um cigarro.

— Para longe... Vamos voltar para

Tucson — respondeu Samuel.

— Voltar? Vieram a negócios, então...

— Sim. Pretendemos concluí-lo hoje à

noite e voltar o mais depressa possível...

Enquanto Samuel falava, Slim rodeava o

pistoleiro, postando-se de modo a deixá-lo

entre dois fogos. Os anos na prisão não

haviam tirado de Sommer os instintos.

Sua experiência alertou-o e ele ficou de

olho nos dois, pronto para agir, se fosse

necessário. A arma estava livre no coldre.

Bastaria puxá-la e a teria na mão.

— Como podem sair nessa escuridão

para tratar de algum negócio? — indagou

ele.

— Não vamos longe e a lua cheia deve

sair logo...

— Não há nada por perto daqui, moço.

Além disso, estamos na lua minguante.

Samuel jogou para trás a aba de seu

paletó, descobrindo o Colt. Slim fez o

mesmo. Sommer continuou como estava,

memorizando a posição dos dois. Slim

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continuou se movendo. Sommer começou a

se levantar lentamente.

Sua arma estava ao lado, mas encostada à

sela.

— Estavam à minha procura?

— Na verdade, nós o seguimos desde que

deixou a prisão territorial...

— E por quê?

— Alguém o quer morto.

— Quem os mandou?

— Bem, nós nunca perguntamos nomes,

quando aceitamos um serviço bem pago.

— Quanto valeu para vocês a minha

vida?

— Um bom preço: dois mil dólares.

— Puxa, que decadência a minha!

Sabiam que um dia já vali vinte e cinco mil,

vivo ou morto?

— Está velho e acabado agora — disse

Slim.

— Acha mesmo isso, filho? Durante os

últimos quinze aos não peguei numa arma,

mas dizem que certas coisas a gente nunca

esquece. Matar é uma delas. Quando você

começa, não pode parar e isso é cada vez

mais fácil. Fiquei sem matar quinze anos...

Posso estar com uma vontade louca e fazê-

lo agora...

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Os dois pistoleiros se olharam.

— É só um velho, agora. Além disso, sua

arma esta aí, ao lado da sela. Terá de se

abaixar para apanhá-la. Acho que vou lhe

dar esta chance, velho.

— São dois contra um... Acho que é uma

boa chance...

— Lamento, velho, não é nada pessoal.

Para nós é apenas trabalho — disse Samuel.

Sommer olhou-os mais uma vez, depois

abaixou-se para apanhar sua arma. Quando

fez isso, Samuel sacou sua arma com

incrível rapidez, disparando. Sommer já

havia se abaixado e a bala a ele endereçada

foi atravessar o peito de Slim, atirando-o

contra umas pedras.

— Maldito filho da mãe! — berrou

Samuel, mas seus olhos se esbugalharam e

sua voz lhe morreu na garganta, quando a

bala disparada por Sommer atingiu-lhe a

cara, deformando-a.

Ele rodopiou e caiu quase sobre a

fogueira. Slim, ferido no peito, pôs-se de

joelhos, segurando sua arma com as duas

mãos e tentando levantá-la para disparar

contra Sommer.

O velho ouviu o estalido do gatilho e

jogou-se para o lado, disparando contra a

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testa de Slim, jogando sua cabeça

violentamente para trás.

Um silêncio mortal pairou no

acampamento. Sommer começou a trocar os

cartuchos usados de sua arma, olhando os

dois homens imóveis, iluminados pelas

chamas.

Havia ficado quinze anos na prisão, mas

havia gente do lado de fora que não pudera

esquecê-lo.

De repente, um tiro de rifle ecoou na

noite que chegava. A bala assobiou a

polegadas da cabeça dele.

Percebeu que havia um terceiro homem

ou, talvez, até mais. Estava ou estavam

ocultos em algum ponto próximo dali.

Uma bala assobiou a sua frente, bateu

numa pedra e ricocheteou tetricamente,

como um grito de agonia perdendo-se na

escuridão. Arizona atirou-se para trás de

uma rocha, tentando localizar seu agressor.

Novas balas arrancavam lascas de pedra,

sem que ele pudesse revidar.

Localizou de onde vinham os tiros pelos

clarões dos disparos. Mirou naquele ponto e

fez fogo algumas vezes, até que ouviu um

grito.

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— Peguei-o maldito! — exclamou ele,

com satisfação, respirando aliviado.

Percebeu que poderia correr e ir abrigar-

se atrás de um tronco e, dali, aproximar-se

mais do atirador. Quando se levantou para

correr, ouviu nitidamente o galope de um

cavalo afastando-se rapidamente.

— Como acha que ele pode estar agora,

Nolan? — indagou Moly, sentada à mesa.

O velho bandido apanhou um graveto no

fogão e acendeu o cigarro com ele. Deu

algumas baforadas, depois cuspiu nas

chamas que crepitavam.

— Envelhecido, com certeza —

ponderou.

— Eu não queria saber isso, Nolan.

Quero saber quanto às idéias dele agora...

— A prisão muda muito um homem,

Moly. Tanto pode tirar-lhe toda a vontade

de continuar lutando como pode transformá-

lo num inconformado.

— Você que o conheceu bem, o que

acha?

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— Acho que Frank cansou de lutar. Não

lhe tiraram a vontade, que fique bem claro.

Ele apenas se cansou de lutar.

— Eu não consigo entender como um

homem como ele pôde dedicar toda a sua

vida ao crime, cometendo roubos e

assassinatos — disse ela e havia um tom de

revolta em sua voz.

— A vida há quarenta anos atrás era dura,

querida.

— Outros passaram por isso, mas não se

dedicaram ao crime, Nolan.

— Esses tiveram a sorte de não participar

daquela maldita guerra civil. Foi uma praga

para nós do Sul. Perdemos nossos lares,

nossas terras e ficamos sem nada. Nem o

nosso orgulho os ianques deixaram. Sem

nada disso, sem trabalho e sem dinheiro, ou

morríamos de fome ou roubávamos deles —

disse o velho, com um tom amargo.

Moly percebeu que sua pergunta

sensibilizara-o.

— Desculpe-me, Nolan! Não quis

magoá-lo — disse ela, indo abraçá-lo.

— Está tudo bem, querida. Tudo passou

agora. Agora temos este rancho e

poderemos viver nele o resto de nossos dias,

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sem nos preocuparmos com aqueles tempos

violentos que passaram.

— Espero sinceramente que meu pai

pense da mesma forma, Nolan.

— Pode ter certeza que sim. O que ele

desejará de agora para frente é um lar para

onde voltar no fim do dia, comida quente,

roupa limpa e uma cama macia.

— Vamos esperá-lo do outro lado do rio?

— propôs ela.

— Sim, eu não perderia isso por nada.

Deverá estar chegando aqui por volta do

meio-dia.

— Como sabe?

— Também fiz esse caminho, Moly.

Lembra-se?

Ela foi apanhar o bule de café e derramar

mais um pouco na caneca que ele tomava.

Nolan enrolava pacientemente um cigarro.

Moly se sentou diante dele.

— Você e meu pai sempre foram bons

amigos, não?

— Como unha e carne. Quando ele foi

preso, não vi motivos para continuar sem

ele, por isso me entreguei. Isso me garantiu

cinco anos a menos na pena.

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— O que foi ótimo para mim. Eu não

conseguiria tocar sozinha este rancho,

Nolan.

— Bobagem! Vá dormir agora. Vou

fumar um cigarro e depois farei o mesmo.

Amanhã será um dia importante para nós.

Moly sorriu, concordando. A volta do pai

a deixava impaciente e inquieta. Não sabia

como era ele. Não sabia como tratá-lo. Nem

se lembrava da última vez que o vira. Aos

dezoito anos, Moly tinha a sensação de que

nunca tivera um pai, já que ele sempre

esteve ausente, fugindo como um animal

selvagem.

No dia seguinte, a garota estava mais

excitada que na noite anterior. Logo pela

manhã, após fazer todas as suas obrigações

de casa, foi preparar o quarto dele.

Sobre um móvel ela deixou uma foto de

sua mãe. Ambas eram realmente muito

parecidas. Ficou pensativa, tentando se

acalmar e imaginar o homem que estava a

caminho, mas não conseguia.

Só queria que ele fosse como Nolan o

havia descrito centenas de vezes, ao longo

daqueles cinco últimos anos.

Mais tarde, ela e Nolan cavalgaram até o

outro lado do rio para esperá-lo. Como o

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velho havia previsto, pouco depois do meio-

dia avistaram uma figura solitária que

cavalgava na direção deles.

— É ele — afirmou Nolan.

— Como sabe?

— Só ele cavalgava daquela foram, com

o corpo ligeiramente pendido para o lado

esquerdo da sela.

— Verdade? E por que isso?

— Um velho hábito dele. Dizia que assim

a arma estava sempre pronta para ser

sacada.

— E era verdade?

— Sim, funcionava...

— Por que nunca me ensinou isso?

— Esses truque de pistoleiros, pequenos

detalhes que se tornam significativos nos

momentos certos, é coisa de gente que mata

gente, Moly. Eu jamais desejaria que você

aprendesse isso, entendeu? Isso fez parte da

minha vida, mas eu gostaria de esquecer

tudo agora.

Sommer os vira de longe e esporeara seu

cavalo. Quando se aproximou, ficou

olhando maravilhado para o rosto da filha,

parecidíssima com sua finada esposa.

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— Frank, seu coiote velho! — disse

Nolan, estendendo-lhe a mão, que o

pistoleiro apertou com força.

— Nolan, seu bode velho! — respondeu

ele, sem desviar os olhos da filha.

Seus olhos que em outros tempos foram

frios e cruéis encheram-se de lágrimas. Ele

desmontou e se aproximou dela.

— Meu Deus! Você é mesmo o retrato

vivo de sua mãe...

— Mas tem os seus olhos, Sommer —

observou Nolan.

— Seja benvindo, papai — falou ela,

abrindo os braços e vencendo a distância

que os separava.

O abraço entre pai e filha foi longo e

afetuoso. Sommer não pôde conter as

lágrimas nem a jovem. Ficaram ali por

algum tempo, sob o olhar emocionado do

velho bandido.

— Você é linda, filha... Linda mesmo —

murmurou ele, afastando-se um passo para

olhá-la com adoração.

— Ei, não vamos ficar nos torrando aqui

no sol. Vamos para o rancho, Nolan. Tenho

uma garrafa de uísque que comprei no

caminho há cinco anos. Guardei-a para

tomá-la junto com você.

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— Pois eu também pensei o mesmo —

afirmou Sommer, retirando de seu alforje

uma garrafa de uísque e atirando-a para o

velho amigo.

— Eu não sabia que você bebia uísque,

Nolan — observou Moly.

— Há quinze anos não bebo uma gota,

deixando a minha sede aumentar. Se meu

velho parceiro, lá na prisão, não podia

beber, eu, aqui fora, também não beberia.

— Continua sendo o mesmo velho

sentimental, Nolan — disse Sommer,

voltando a abraçar o amigo.

Cavalgaram de volta para o rancho.

— Como eu valorizo hoje a liberdade,

Nolan — comentou Sommer, quando

atravessavam o rio.

— Há muitas outras coisas que também

vai aprender a valorizar, meu amigo. Temos

o nosso pequeno rancho. Não vamos ficar

ricos com ele, mas tiraremos dele todo o

necessário para vivermos decentemente.

— Sim, vamos ver se conseguimos deixar

o passado para trás — disse o velho

pistoleiro e, num gesto mecânico, virou-se

na sela para olhar para trás.

— Tomara que o passado nos deixe em

paz, Sommer — ajuntou ele.

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— Só teremos que nos preocupar agora

com o futuro — afirmou Moly, sorrindo

feliz.

Bill Harding examinou suas cartas. Era

sua vez de trocar. Pensou um pouco nas

suas chances e pediu mais duas. Juntou suas

cartas sobre a mesa, depois abriu-as

lentamente. Tinha dois pares, o bastante

para jogar alto.

— Aposto vinte — disse ele, empurrando

as fichas para o centro da mesa.

— Eu passo — desistiu o jogador

seguinte.

— Seus vinte e mais vinte — falou, no

entanto, o terceiro jogador.

Bill sorriu, enquanto olhava o outro nos

olhos, tentando captar algum sinal de blefe.

Voltou a examinar suas cartas. Tinha dois

pares e isso, naquele tipo de jogo, era uma

boa mão. Poderia perder para uma trinca,

mas era muito improvável que saísse uma.

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— Seus vinte e mais cinqüenta — falou,

empurrando as fichas para junto das outras.

O outro jogador pensou, olhando para

Bill.

— Seus cinqüenta e mais duzentos para

ver — falou ele, inesperadamente.

Bill sentiu amargo o uísque que bebia.

As pessoas ao redor da mesa

surpreenderam-se com a coragem daquele

jogador. Bill sentiu toda a sua calma esvair-

se e seus nervos ficaram tensos.

Já fora longe demais e não podia recuar.

Separou os duzentos dólares, pondo-os

junto com o resto da aposta.

— Pago para ver — falou ele. O que tem

aí?

— Trinca de nove.

— Tenho dois pares — disse Bill,

jogando as cartas sobre a mesa e estendendo

as mãos para recolher o dinheiro.

— Um instante, moço — disse o outro

jogador, cravando uma faca entre os dedos

de Bill, assustando-o.

— O que há? É daqueles que não sabem

perder? — indagou o pistoleiro, com os

olhos destilando cólera.

— Uma trinca sempre ganhou de dois

pares — afirmou o jogador.

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— Não aqui em Tucson — respondeu

Bill, sacando a arma sob a mesa e

disparando-a.

A bala arrancou uma lasca da mesa e foi

atingir a testa do outro jogador, que foi

jogado para trás, enquanto seus miolos

espalhavam-se pelo assoalho.

Bill Harding sorriu com frieza, enquanto

se levantava.

— Todos vocês viram. Ele sacou

primeiro — disse em voz alta, indo até o

morto, retirando sua arma do coldre e

deixando-a ao lado do corpo.

Os homens que assistiam ao jogo

dispersaram-se rapidamente. Bill foi até o

balcão e deu uma moeda ao barman para

que limpasse a sujeira.

Os outros afastaram-se dele. Bill ficou

sozinho no balcão, mas não se incomodou

com isso. Estava acostumado.

Um homem entrou no saloon, indo até

ele.

Ao vê-lo, Bill surpreendeu-se.

— Que diabos, homem! Parece que viu o

demônio! — comentou.

— Pois eu acho que foi mais ou menos

isso, Bill — afirmou, apanhando um copo e

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enchendo-o com uísque da garrafa que Bill

tinha diante de si.

— O que quer dizer com isso? Você não

estava com John, Butcher e Dick?

— Sim, e eles estão mortos agora.

— Como? Mortos? — indagou Bill,

agarrando furiosamente o outro pelo

colarinho da camisa.

— Enganaram-nos, Bill. Disseram que

era apenas um velho, mas ele é um

demônio...

— Ele é mesmo um velho... Vocês é que

são uns palermas. Vamos conversar lá fora

— disse Bill, demonstrando contrariedade.

Foram para junto dos cavalos, amarrados

diante do saloon.

— Conte-me o que aconteceu?

— Nós o emboscamos. Eu e Dick

ficamos sobre algumas pedras. John e

Butcher foram até ele, conversaram, deram

nomes falsos e tentaram pegá-lo de

surpresa. O velho, no entanto, matou os

dois, Bill. Eu e Dick tentamos atingí-lo

atirando de longe, mas o velho pegou Dick.

Eu tive de fugir ou ele me mataria

também...

— Idiota! São uns idiotas mesmo! —

exclamou Bill, esmurrando o outro.

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— Não tive culpa, Bill... O velho é um

demônio... — ainda tentou se desculpar,

mas Bill não lhe deu tempo, voltando a

socá-lo com violência.

— Cale a boca! Estamos numa

embrulhada agora. Recebemos para fazer

um serviço e temos de fazê-lo.

— Bem que nós tentamos, Bill, mas foi

como eu disse — choromingou o outro. —

Ele ainda é um matador.

— Que idiotas! Por que não chegaram

atirando? Parar para conversar com um

homem como aquele... Tiveram o que

mereciam, aqueles idiotas!

— O que fazemos agora?

— Temos que terminar o que

começamos. Só que vamos ter que cobrar

um pouco mais.

— Acha que ele pagará?

— Terá de pagar. Perdi três de meus

melhores pistoleiros. Ele devia ter nos

prevenido.

— Chamo os outros?

— Sim, diga-lhes que me esperem no

saloon. Enquanto isso, vou negociar. Vou

arrancar mais cinco mil dólares.

— Vou precisar comprar mantimentos e

munição... — disse Bob Lane.

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Bill separou algumas moedas e entregou-

as ao seu pistoleiro. Enquanto ele ia

negociar, Bob foi até o armazém, onde

comprou o que precisava.

Foi depois para o bordel mexicano, no

outro lado da cidade, onde sabia que

encontraria seus amigos.

O primeiro que encontrou foi Ted

Canton, numa roda com diversos

mexicanos. Ao centro, dois galos

empenhavam-se numa luta de vida ou

morte.

— Bill quer vê-lo lá no saloon — disse.

— Já?

— Sim...

— Não posso ir agora... Meu galo pode

perder a luta...

— Não perderá — disse Bob, sacando

calmamente sua arma e estourando a cabeça

do outro galo. — Pronto, você ganhou.

Ninguém protestou. A fama daqueles

homens dizia que aquilo não era algo

saudável.

Bob foi para a cantina, onde funcionava o

bordel. Quando entrou, uma faca passou

diante de seu nariz e foi se cravar na porta.

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— Diabos, Villas! — gritou ele, já de

arma na mão. — Um dia você ainda perderá

a vida por causa dessa brincadeira.

O mexicano alto e corpulento se

aproximou e abraçou-o, levantando-o no ar

e pondo-o sobre o balcão.

— O que faz aqui, meu pequeno amigo?

— Bill quer ver todos vocês lá no saloon,

agora.

— Agora mesmo?

— Sim. Onde está Uncle Chad?

— Lá dentro — apontou Villas.

Bob saltou do balcão e entrou por um

corredor. Bateu numa porta.

— Bill quer você lá no saloon agora

mesmo.

— Já estou indo — respondeu uma voz lá

dentro.

Pouco depois a porta se abria e surgia um

homem magro, exageradamente alto,

vestindo roupas negras.

— Ei, Chad, esqueceu meu dinheiro —

falou a jovem mexicana seminua,

agarrando-o pelo braço.

Ele sorriu, retirou uma moeda e estendeu

para ela. Quando a garota ia apanhá-la, ele

socou o rosto dela, fazendo-a recuar até a

cama.

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— Jamais... Jamais toque meu braço

assim de novo — disse ele, com raiva,

jogando a moeda sobre ela.

Parece preocupado, parceiro — observou

Nolan, passando a bolsa de fumo para o

amigo.

Frank Sommer não respondeu. Primeiro

enrolou um cigarro, depois acendeu-o.

Estavam sentados no alpendre da casa,

fumando e tomando uísque.

— Fui atacado na estrada, quando vinha

para cá. Eram quatro homens. Matei três. O

quarto escapou.

— Porque não me disse isso antes?

— Não quis preocupá-lo.

— Que tolice, parceiro!

— Depois de todo esse tempo, alguém

ainda me quer morto, Nolan. Não sei quem

nem por quê. Sei apenas que está pagando

pistoleiros para virem a minha procura.

— Então precisamos nos preparar. Logo

teremos encrenca por aqui.

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— Preocupo-me por Moly... Acho que

terei de ir para Tucson resolver isso.

— Está maluco! Vai se atirar no covil dos

lobos? Tucson nunca foi uma cidade muito

receptiva para nós. O melhor a fazer é

manter distância dela.

Moly saiu naquele instante para alpendre

e foi se sentar nos degraus da escada.

Respirou fundo. Estava feliz. Ficou olhando

para o pai. O velho Colt ainda pendia em

sua cintura.

— Pai, por que não guarda esse revólver?

Agora é um rancheiro, não tem com o que

se preocupar. Os tempos são outros.

Frank olhou para a filha e sorriu.

— Meu Colt é como se fosse uma parte

do meu corpo, filha...

— Mas ele não terá utilidade alguma

agora. Por favor, deixe-me guardá-lo?

— Isso a fará feliz?

— Sim, muito.

— Está bem — concordou ele,

desafivelando o cinturão.

Entregou-o à filha.

— Logo vai se acostumar, como Nolan se

acostumou — afirmou ela.

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— Assim espero — afirmou Sommer e

seu olhar alongou-se na direção da trilha,

banhada pelo luar.

Conversaram mais algum tempo e

terminaram de beber a garrafa de uísque.

Foram dormir em seguida.

Frank Sommer sempre tivera o sono leve,

mas a prisão, o silêncio dos corredores,

onde ninguém andava e nada acontecia,

haviam lhe tirado esse hábito. Além disso,

ele e Nolan estavam altos com todo aquele

uísque.

Nenhum deles ouviu os cavalos fazendo

barulho ao atravessar o rio. Nem depois,

quando os homens deixaram os cavalos e

avançaram, com as esporas tinindo abafadas

pela poeira.

Frank apenas acordou quando ouviu o

gatilho estalando e o cano frio da arma

tocando seu ouvido. Alguém acendeu um

lampião.

— Não faça um gesto, velho, ou morre

aqui mesmo — disse Bill Harding. —

Levante-se bem devagar.

Frank foi levado para a sala, onde Moly e

Nolan também se encontravam sob a mira

das armas.

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— Pensei que fosse mais difícil —

comentou Chad, olhando para Moly com

apetite.

— Quem são vocês? O que querem aqui?

— indagou ela.

— Estamos aqui a serviço, moça —

respondeu Bill. — Somos pistoleiros e

fomos pagos para matá-los.

— Por quê? — surpreendeu-se ela.

— Você pergunta demais. Mulheres não

foram feitas para isso — disse Chad,

estendendo a mão e, com um gesto rápido e

inesperado, rasgou a camisola que ela

vestia, desnudando seus seios.

— Bastardo! — rugiu Nolan, socando

Chad no estômago.

A resposta foi rápida. Chad sacou sua

arma e, a queima-roupa, disparou contra

Nolan.

— Maldito! — urrou Frank, tentando

partir para cima do pistoleiro, mas foi

contido por dois outros.

Alguém golpeou sua nuca e ele caiu de

joelhos.

— Malditos sejam vocês e toda a sua

escória — gemeu Frank, caído de joelhos.

— Por que não cala a boca, velho? —

falou Bill, atingindo-o com um pontapé na

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cabeça e jogando-o para trás. — Ergam-no.

Quero que ele veja isso antes de morrer.

Frank foi posto em pé e mantido imóvel,

enquanto Chad continuava rasgando as

roupas de Moly. Quando a garota arranhou-

o no rosto, ele a socou com força,

desmaiando-a.

Ela foi posta sobre a mesa, então, já nua.

— Eu serei o primeiro, rapazes — disse

Chad. — Vocês disputam na moeda quem

serão os próximos.

Frank foi amarrado numa cadeira,

enquanto os homens disputavam o corpo de

sua filha. Moly acordou. Caiu da mesa. Viu

o pai. Correu abraçá-lo, pedindo sua ajuda.

Chad socou-a de novo, jogando-a no

assoalho. Ali, sob as vistas do velho

pistoleiro, que se debatia como um animal

enjaulado, Moly foi brutalizada por eles.

Frank se sentiu à beira da loucura, incapaz

de fazer alguma coisa para ajudar a garota.

Estava arrasado, quando os pistoleiros

terminaram seu cruel trabalho.

— Agora vamos terminar o serviço —

falou Bill.

Moly jazia no assoalho, imóvel, como se

estivesse morta.

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— Deixe-me acabar com ele — pediu

Villas, sacando sua faca.

— Não, não quero que ele morra

depressa. Não se esqueçam que ele matou

três dos nossos melhores amigos. Quero que

ele pague.

— Como quiser, Bill — disse Villas,

cravando sua faca na coxa direita de Frank,

que gemeu e ficou vendo o sangue brotar e

ensopar sua calça.

— É isso mesmo, Villas. Mate-o bem

devagar — afirmou Bill.

O mexicano retirou a faca da coxa do

velho pistoleiro e, com um sorriso sádico no

rosto, espetou-a na outra coxa, depois

apoiou as duas mãos no cabo para fazê-la

entrar lentamente nas carnes de Frank.

— Agora solte-o — ordenou Bill. —

Quero que ele rasteje.

Os pistoleiros fizeram o que ele mandava.

Frank tentou caminhar na direção do corpo

da filha, mas acabou caindo de joelhos. O

sangue continuava jorrando de suas coxas

feridas.

— Rasteje, velho maldito! Rasteje! —

disse Bill, chutando-o na barriga.

Frank olhou-o com ódio, mas estava

desarmado e impotente diante da violência e

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da crueldade daqueles homens. Tentou

rastejar até a filha, mas um pontapé atingiu

sua cabeça, atordoando-o.

Os homens, então, se revezaram

chutando-o por todo o corpo, até deixarem-

no prostrado.

— Esperem, não o matem ainda — disse

Bill, olhando com satisfação para o homem

banhado de sangue, caído a seus pés. —

Apanhe aquela corda, Bob — ordenou.

A ordem foi cumprida. Frank foi posto

sobre uma cadeira. A corda foi amarrada em

seu pescoço e presa a uma viga no centro da

sala.

— Tente equilibrar-se aí, velho — disse

Bill.

— Mas assim ele não vai morrer —

observou Chad.

— É o que pensa — sorriu cinicamente

Bill, sacando sua arma e disparando contra

uma das pernas da cadeira.

Os outros entenderam a brincadeira.

Novos disparos e a cadeira ficou equilibrada

em apenas uma das pernas. Frank agarrou-

se ao laço que prendia seu pescoço,

tentando manter-se equilibrado.

Seus olhos revelavam a dor e a

impotência diante da vingança daqueles

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homens. Ele via a filha e lamentava nada ter

podido fazer por ela.

Além disso, os ferimentos e a surra

haviam enfraquecido seu corpo. O sangue

continuava escorrendo por suas pernas. Ele

se sentia cada vez mais fraco. Seu corpo ia

pesando. A corda mais e mais apertava sua

garganta.

Percebendo que aquela seria a mais cruel

das mortes, o velho pistoleiro deu um saldo,

reunindo suas últimas forças. A cadeira

tombou e ele teve todo o peso do corpo

seguro pelo laço.

Um estalo seco e macabro se seguiu,

quando seu pescoço partiu-se. Ele pendeu

imóvel na ponta da corda, decepcionando

seus inimigos.

— Está bem, rapazes. Terminamos o que

viemos fazer. Vamos embora. Temos muito

o que comemorar em Tucson agora —

ordenou Bill.

Com alarido, os homens partiram,

deixando atrás deles a morte e a desonra.

Quando Cora acordou, no começo da

manhã, estava em sua cama. Tudo parecia

ter sido um pesadelo, se não fosse a dor dos

ferimentos e a vergonha que a dominava.

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Estava arrasada, mas seu primeiro

pensamento foi para seu pai. A porta se

abriu. Nolan surgiu, apoiando-se no batente,

depois caiu com um baque surdo no

assoalho.

Ela se levantou com dificuldade e foi até

ele. Estava ferido no ombro e havia perdido

muito sangue. Ela se lembrou do pai e saiu

para a sala.

Viu muito sangue no assoalho. A porta

estava aberta. Saiu.

— Oh, não, Deus! — exclamou ela,

vendo a sepultura recém-cavada perto de

uma árvore.

Caminhou até lá. Espetado numa cruz

tosca estava o chapéu do velho pistoleiro.

— Pobre papai! — murmurou ela, com

lágrimas nos olhos.

Lembrou-se do velho Nolan. Ele a havia

levado para a cama, vestido, depois

enterrara Frank.

Ela retornou para a casa e foi cuidar dele.

Estava fraco. Ela o arrastou até a cama.

Tirou-lhe a camisa. Não havia muita coisa

que pudesse fazer. Felizmente a bala

atravessara o ombro, sem ter atingido

nenhum osso.

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Ela foi avivar o fogo e deixar a lâmina de

uma faca aquecer-se ali. Depois, com ela,

cauterizou os dois lados da ferida. O velho

apenas gemeu.

A garota saiu e foi se sentar lá fora, no

alpendre. Ficou vendo a manhã firmar-se no

céu, pensando no que fazer. Descobriu que

não havia muito o que fazer. Não sabia

quem eram aqueles homens nem porque

vieram ali.

Preocupou-se, então, em lavar o assoalho.

Aquele sangue ali era uma trágica

lembrança da tragédia que ela queria

esquecer agora.

Birddie Nolan já fora ferido muitas vezes

em sua vida e não seria aquele buraco que

iria matá-lo. Durante uma semana ele lutou

contra a febre, assistido por Moly.

Um dia, ela estava sentada no alpendre,

no final de uma tarde, quando ela o ouviu:

— Moly! Onde está você, Moly!

Ela correu para o interior da casa.

— Estou aqui, Nolan.

— Graças a Deus! Temi que tivesse feito

alguma bobagem...

— Jamais isso me passou pela cabeça,

velho bobo. Como se sente?

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— Parece que uma manada me

atropelou... Você cuidou de mim todo esse

tempo?

— Sim... O que mais eu podia fazer?

Precisava de você... Só você vai poder me

ajudar agora — disse ela e sua voz tinha um

acento sinistro.

Ele a olhou sem entender.

— Quero que me ajude a vingar a morte

de meu pai, Nolan. Quero vingar sua morte

e o que fizeram a nós dois também...

— Não sei se sou a pessoa indicada para

ajudá-la, Moly. Estou velho... Não consigo

sacar nem atirar como antes... Aposentei

minhas armas há muito tempo, lembra-se?

— Você tem a experiência, Nolan...

Quero que me ensine... Você sabe tudo

sobre armas e pistoleiros... Eu tenho o velho

Colt de papai...

— Não sabe o que está me pedindo,

Moly... Poder levar tempo...

— Tenho a vida inteira para isso.

— Seu pai não me perdoaria...

— Eu não o perdoarei se não me ajudar.

Mesmo que não me ensine, Nolan, de uma

forma ou de outra, eu farei o que tenho de

fazer — disse ela, com decisão.

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Nolan olhou-a demoradamente. Podia se

parecer muito com a mãe, mas tinha o

mesmo gênio do pai.

Para quem tem sede de vingança, um ano

demora muito a passar. São noites e dias de

espera, contando os minutos e esperando

algo que parece inatingível.

Enquanto isso, a sede de vingança, como

uma febre maligna, corroendo o coração,

tirando a vontade de ver e enfrentar a vida

com outros olhos, esquecendo um passado

dolorido.

Um ano se passou desde aquela

madrugada fatídica.

A cidade de Tucson prosperara ainda

mais. A proximidade com a fronteira

transformara o negócio de gado em algo

altamente rentável.

O México enfrentava mais uma de suas

revoluções. Não havia gente para cuidar do

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gado, que vivia solto nos pastos. Todos

estavam pegando em armas.

A solução era vender barato aos

americanos, que mandavam seus cowboys

até lá para arrebanhar o gado e trazê-lo para

vender a um preço compensador no

mercado de Abilene, para onde eram

mandados vagões e mais vagões

diariamente.

Os saloons multiplicaram-se, com mesas

de jogo onde o dinheiro corria solto. A fama

do dinheiro fácil vinha atraindo para lá

gente de todo o Oeste, tornando aquela uma

cidade perigosa.

Birddie Nolan entrou no Mining Saloon

and Hotel, carregando um alforje e um

pesado rifle Sharp, calibre cinqüenta.

Depositou-o sobre o balcão e esperou o

"bartender" vir atendê-lo.

— Uísque — pediu ele.

Após tomar o copo num gole só, pediu

outro. A viagem havia sido muito cansativa

e a poeira na estrada de Tucson havia

ressecado sua garganta.

— E uma arma pouco usada hoje essa sua

— comentou um homem ao seu lado no

balcão.

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O homem que examinava sua arma não

era um vaqueiro. Pelas suas roupas e a bota

sem esporas só podia ser um pistoleiro ou

um jogador. A cidade estava cheia deles.

— É uma arma boa para caçar — disse

Nolan.

— Não temos búfalos por aqui.

— Há outros tipos de animais em que

atirar, além de búfalos — respondeu Nolan.

— Se você o diz, deve haver mesmo,

velho. Procura trabalho ou encrenca?

— Nenhum dos dois. Vim resolver um

assunto, apenas isso.

— Precisa de ajuda?

— Procuro uns homens.

— Há muitos homens em Tucson. Precisa

ser mais específico.

— Há um ano atrás eles formavam um

bando. Havia um magro como um palito,

um mexicano que usava facas, um outro

com cara de jogador, chefiados por um

assassino.

— E o que quer com eles?

— Você os conhece?

— Digamos que eu saiba de quem você

está falando.

— Sabe onde encontrá-los? — indagou

Nolan, com ansiedade.

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— E por que eu diria?

— Estaria prestando um favor a um

velho...

— Velho, você tem um Sharp calibre

cinqüenta e parece disposto a caçar. Isso

está me cheirando a encrenca e detesto

encrencas.

— É só me dizer os nomes e ficar fora do

caminho.

— Não, não vou dizer. Principalmente

porque os eles são meus amigos — disse o

estranho, olhando Nolan com cuidado.

— Seus amigos devem ser muito fracos.

O que um velho como eu poderia fazer com

gente tão poderosa a não ser negociar?

O outro riu, mais à vontade. Nolan não

era o tipo capaz de meter medo num

pistoleiro experiente, mesmo porque aquele

rifle Sharp que ele usava tinha de ser

municiado cartucho a cartucho.

Não era uma arma apropriada para um

duelo ou para um tiroteio. Comecei até a

duvidar se aquela arma era capaz de atirar.

— Não vai me dizer onde eles estão?

— De qualquer modo, não — respondeu

o outro.

— Como é seu nome, filho? — indagou

Nolan e seu rosto alterou-se.

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Já não era mais um velho tão indefeso. O

velho bandido ainda não conseguia levar

insulto para casa, apesar de, na sua idade,

isso ser aconselhável.

— Francis Beater e não gosto de

intrometidos nem sou seu filho —

respondeu o pistoleiro, secamente,

estendendo a mão para apanhar a

espingarda de Nolan.

— Não a toque! — ordenou o velho,

batendo com o punho na coronha da

espingarda, impedindo o outro de pegá-la.

A resposta do pistoleiro foi imediata. O

punho dele se estendeu, atingindo o olho

direito de Nolan, jogando-o de costas no

assoalho.

Quando tentou se levantar, Francis

apanhou a espingarda.

Quando parecia que ia apenas examiná-

la, ele a vibrou no ar, atingindo a testa do

velho, fazendo-o rolar de dor no assoalho,

com o sangue escorrendo do ferimento.

— Acho que isso encerra nossa breve

conversa, velho — falou o pistoleiro,

apossando-se da arma.

— Deixe a arma, ela não lhe pertence —

conseguiu dizer Nolan.

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— Acabo de adquirí-la. Algum

problema? — indagou o pistoleiro,

aproximando-se do velho.

— A arma é minha. Não pode ficar com

ela.

— E digo que posso. Você vai me

chamar de mentiroso?

— Por que está fazendo isso? Sou um

velho, não sacaria contra você nunca...

Preciso da arma para caçar...

— Acho que não tem mais dentes para

comer caça, vovô. Ouça bem o negócio que

vou lhe propor. Eu lhe dou a vida e em troca

você me dá sua arma. Feito?

— Maldito! Eu a terei de volta, juro!

Francis riu, alisando a arma e afastando-

se para ir olhar as mesas de pôquer.

Havia uma vaga numa delas. Ele se

sentou para jogar.

Toda a cena fora presenciada por Moly,

imóvel à porta do saloon. Vestia roupas de

homem e apenas olhando com cuidado

alguém veria ali uma mulher.

Ninguém notou isso, quando ela entrou

decididamente e foi até Nolan. Alguns

apenas repararam que ela usava um cinturão

com dois coldres, onde pendiam dois Colts

reluzentes.

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— Tudo bem, Nolan? — indagou ela,

ajudando-o a levantar-se.

— Eu me descuidei... Estou velho,

querida. Já não consigo fazer mais o que

fazia antes.

— Não se preocupe, meu amigo. Eu serei

o seu braço.

— Esqueça-o, Moly.

— Ninguém vai humilhá-lo na minha

presença, se eu puder impedir — disse ela,

com decisão. — Vou buscar sua arma.

— Não, deixe-a. É uma arma velha.

— Eu sei porque você a carrega, Nolan.

Foi um presente de meu pai, não?

— Se vamos querer vingá-lo, querida,

não devemos nos meter em briguinhas de

saloon...

— Estou decidida. Vou buscá-la.

— Aquele homem é um pistoleiro.

Talvez tenha que matá-lo...

— Eu o farei se for preciso.

— Não será como atirar em tábuas ou

sacos de milho...

— Não importa!

— Será a primeira vez, Moly. Isso é

terrível, pois pode se tornar um vício... É

sua última chance de esquecer tudo e

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recuar. Quando começar, não haverá mais

volta...

— Um dia teria que haver uma primeira

vez, Nolan...

— Acha que está preparada?

— Você o diz. Foi meu professor, não?

— Está bem. Tente fazer de tudo para

não matá-lo. Disse que conhecia os homens

que estiveram no rancho há um ano. Pode

estar mentindo, mas gostaria de confirmar.

Os olhos de Moly brilhavam, como

brilhavam os de seu pai: frios e sinistros.

Nolan já os conhecia. Sabia que ela tinha a

mesma natureza do pai. Sacava como ele,

montava como ele e podia matar como ele.

A humilhação sofrida por Nolan ali, no

saloon, fizera Moly lembrar-se de uma

humilhação maior que ambos haviam

enfrentado.

Foi até o balcão. O "bartender" olhou-a

surpreso.

— Mas é uma mulher — murmurou ele.

— Há alguma lei contra vender bebidas

para mulheres aqui?

— Não, madame — respondeu ele,

olhando os dois revólveres que ela

carregava.

Pelo jeito ela sabia usá-los.

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— O que vai ser, madame? — indagou,

educadamente.

— Quero um uísque.

— Do bom ou do ruim?

— Do pior.

— Vai acender uma fogueira ou curar a

pata de seu cavalo?

— Vou afogar um rato — respondeu ela,

entredentes.

— Não vai ser uma coisa bonita de se

ver, aposto — disse o homem, servindo-a.

Moly apanhou o copo e aproximou-se da

mesa onde Francis jogava cartas. Tocou-lhe

o ombro e, quando este voltou-se sorridente,

ela lhe atirou o uísque na cara.

— Sua ordinária! — vociferou ele,

pondo-se em pé, pronto para esbofeteá-la.

Inesperadamente ela sacou uma arma e

encostou o cano no nariz dele,

surpreendendo-o.

Ele empalideceu e estremeceu de raiva.

— O que quer de mim, moça?

— Quero que apanhe essa espingarda aí e

a devolva ao velho, que é o dono dela.

— Está maluca! Esta arma é minha....

Em resposta ela engatilhou a arma. Os

olhos do pistoleiro chispavam, mas o suor

começou a escorrer em sua testa.

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— Vai devolver a arma a ele e pedir

desculpas... — ordenou ela.

— Você deve ser louca, mulher.

— Não me aborreça, nojento.

— Sua vida não vai valer um níquel

quando virar as costas.

Ela riu.

— Você está me aborrecendo. Vai

devolver a arma para ele, pedir desculpas,

tudo isso de joelhos, seu bastardo.

— É doida! Quem pensa que é?

— Vou contar até três — disse ela.

Seu tom de voz era incisivo. Francis

ainda hesitou, mas acabou despencando

numa sonora gargalhada que contagiou todo

o saloon, que acompanhava a cena.

— A dona aqui pensa que é a rainha do

Oeste, pessoal! É algum número novo,

Charlie? — gritou Francis para o

"bartender".

— Um... — disse Moly.

— Está com uma arma na mão, isso não é

uma luta justa — disse Francis, ainda rindo.

— Dois... — falou Moly, guardando a

arma no coldre, surpreendendo a todos.

— Está brincando comigo, garota. Não

sabe quem sou eu.

— Para mim é um rato.

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— Sou Francis Beater, o homem mais

rápido de Tucson.

— Até agora só o vi bater num velho. É

nisso que é rápido? — ironizou ela e o

saloon riu de Francis desta vez.

Os olhos do pistoleiros injetaram-se e ele

estremeceu ligeiramente. Sua expressão

endureceu-se. Sua mão baixou à altura do

coldre.

— Vou lhe dizer o que vou fazer com

você, garota — disse ele, entredentes. —

Vou arrancar essa arma de sua mão, antes

que possa usá-la. Depois vou levá-la para

cima e lhe mostrar a única coisa que uma

mulher deve fazer, além de cozinhar e lavar

ceroulas.

— Você fala demais — disse ela,

friamente.

Francis hesitou. Aquela mulher falava

com muita segurança e tinha um modo frio

de olhar. Um olhar que enregelava. O olhar

da própria morte.

Ele fez um movimento, mas não foi

rápido o bastante. Todos viram e não

acreditaram.

Num passe de mágica, a arma surgiu na

mão da garota, engatilhada e pronta para

disparar.

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— Não pode atirar contra mim — berrou

Francis, levantando os baços. — Não saquei

a minha arma... Todos estão vendo que não

saquei a minha arma.

— Então por que não saca? Não é o

pistoleiro mais rápido de Tucson?

— Não... Foi só uma brincadeira, dona.

— Que pode lhe custar a vida, a menos

que faça o que lhe ordeno.

— Sim... Sim... Tudo que quiser....

— Apanhe a espingarda e leve-a ao

velho...

— Sim, está bem — concordou o

pistoleiro, apanhando a arma e caminhando

na direção de Nolan.

Moly disparou contra a ponta da bota

dele, deixando uma marca no couro.

— Você não entendeu o que eu disse? De

joelhos! — ordenou ela. — E não se

esqueça de pedir desculpas!

Francis não teve outra alternativa, senão

obedecer. Após entregar a arma para Nolan

e pedir-lhe desculpas, levantou-se,

envergonhado.

— Tem mais uma coisa — acrescentou

ela. — O que sabe sobre os homens que o

velho lhe perguntou?

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— Foi mentira minha... Não os conheço...

Juro!

Moly olhou para Nolan, que balançou a

cabeça negativamente.

Aquele homem não diriam o que eles

queriam saber.

— Está bem, seu bastardo! Dê o fora e

não atravesse o meu caminho. Da próxima

vez, não vou conversar tanto. Meto-lhe uma

bala nu bucho — disse ela,

ameaçadoramente.

Todos que estavam ali tiveram certeza de

que ela falava sério. Francis deixou o saloon

sob as gargalhadas de todos os presentes.

— Você é demais, garota! — disse o

"bartender". — Acho que agora posso lhe

oferecer um uísque do bom.

— Pois eu aceito. É muita gentileza de

sua parte — disse ela, indo até lá e

entornando o uísque num só gole.

— E para mim? — indagou Nolan.

— Se é amigo dela, acho que também

merece um — falou o homem, servindo-o.

— Reservei dois quartos no hotel aí da

frente — disse ela.

— Saiu-se bem, Moly.

— E poderia tê-lo matado.

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— Teria sido assassinato. Aquele

bastardo nem sacou sua arma.

— Não o matei porque senti que ele sabia

de alguma coisa, Nolan. Só que teve medo

de contar, você viu?

— Sim, teve muito medo, mais medo do

que ser baleado por você.

— De qualquer forma, estamos aqui e

vamos pegar aqueles bastardos.

* * *

— Você está me dizendo que Francis

Beater foi batido por uma mulher? É

gozação isso?

— Falo sério! Nunca vi nada igual. Já vi

duelos antes, com os melhores gatilhos de

todo o Oeste, mas a maneira como aquela

garota sacou, como se penteasse os cabelos,

foi impressionante. Há algo e diabólico no

olhar dela. É de uma frieza capaz de

arrepiar a espinha de um homem. Ela parece

possuída pelo demônio.

— Deixe de ser imbecil...

— Só estou lhe dizendo o que vi.

O homem levantou-se da cama e

caminhou até a janela. Olhou a rua por

alguns instantes, depois apanhou uma

garrafa de uísque sobre a cômoda e voltou

para a cama.

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— Como é ela? — indagou, sem se

impressionar com a conversa do outro.

— A garota?

— Sim — disse o homem deitado na

cama, retirando a rolha da garrafa com os

dentes e cuspindo-a para longe, antes de

tomar um trago generoso.

— Uma beleza, se não fossem os dois

canhões que ela carrega.

— É bonita, então?

— Sim, muito bonita.

— Pode ser a solução para os nossos

problemas...

— Está maluco, Queeler! Aquela garota é

pura dinamite.

— Talvez possamos manobrá-la —

sugeriu James Queeler, tomando mais um

trago.

Era um homem velho, magro, mas bem

vestido. Seu rosto vincava-se, indicando

preocupação.

— Quer tentar falar com ela? Está

hospedada neste hotel.

— Sim, descubra o número do quarto.

Soube alguma coisa de Bill e de seus

homens?

— Devem estar no México, gastando o

dinheiro que receberam.

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— Então logo voltarão para pedir mais.

— Não deveria pagá-los...

— Não sei como evitar isso... Meu

rancho está à beira da falência. Bill tem me

tomado todo o dinheiro...

— Matá-lo é a única solução...

— Mas para isso precisamos achar

alguém com coragem e habilidade capazes

de vencê-lo, juntamente com seu bando.

— Eu lhe afirmo que aquela garota pode

fazer isso.

— Mas ela não atirou em Francis Beater.

Por quê?

— Teria atirado se ele sacasse. Eu vi os

olhos dela. Deus me livre dizê-lo, Queeler,

mas os olhos dela lembravam os olhos de

Frank Sommer.

— Deixe de ser idiota! Preciso saber se a

garota é boa mesmo. Não basta ter uma

arma e sacar rápido. Tem que saber matar.

— Se quiser, vou encher a cabeça de

Francis e fazê-lo ir tirar satisfações com ela.

Então veremos em que têmpera ela foi

forjada.

— Pode ser uma boa idéia. Acha que

pode convencer aquela idiota a ser homem

uma vez na vida?

— Vou tentar.

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— Então faça-o — ordenou Queeler,

tomando mais um gole.

Curtis Lampblack deixou o hotel e

dirigiu-se até uma das cantinas mexicanas

da cidade. Conhecia Francis. Achava que

poderia tocar seus brios e fazê-lo ir

enfrentar a garota, num confronto para valer

agora.

Era mais um dos serviços sujos que fazia

para James Queeler, de quem fingia ser

amigo. Curtis tinha seus próprios planos.

Localizou o pistoleiro, bebendo

desesperadamente.

— Francis, amigo velho, que baile, não?

— comentou, zombando do outro.

— Deixe-me em paz, Curtis, ou estouro

seus miolos.— Acalme-se Francis. Sou eu,

seu amigo. Não me reconhece?

— Aquela mundana acabou comigo,

Francis. Você viu aquilo?

— Foi terrível. Eu estava lá. Eu vi como

aconteceu. Quando você se descuidou por

que ela era uma garota, ela se aproveitou

disso. Seu erro foi esse, amigo. Não podia

ter dado uma chance a ela.

O pistoleiro pensou, como se aquilo

tivesse sentido.

— Acha mesmo?

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— Claro! Quem imaginar que ela pode

vencê-lo numa luta para valer é um idiota!

Você pode vencê-la de olhos fechados,

desde que não se descuide nem dê chances

para ela. Temos que reconhecer que a

garota saca rápido. Mas eu não a vi atirar

rápido.

Francis bebeu mais um gole de tequila,

encarando o amigo.

— Eu acho que você devia dar uma lição

a ela. Sem chance, sem piedade. Deve fazê-

la rastejar, humilhar-se, como ela o

humilhou. Tem que fazê-la implorar pela

vida!

Francis encheu novamente o copo e

bebeu-o de uma só vez.

— Ela está no hotel em frente do saloon

— disse-lhe Curtis. — Vá lá e acabe com

ela.

— Sim... Acabar com ela... — falou

Francis, levantando-se, examinando a arma

e saindo com passos pesados.

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O calor era intenso e os dois homens

tomavam tequila numa cantina, em

território mexicano. A expressão no rosto de

Chad revelava seu aborrecimento.

— Acho que já chegou a hora de

voltarmos — disse ele a Bill Harding.

— O que houve, Chad? Já se cansou das

mexicanas?

— Jamais me cansarei delas, Bill, você

sabe disso. É este maldito calor... Acho que

devemos mudar de ares novamente. O

México anda meio sem-graça ultimamente.

— Sou obrigado a concordar com você.

Avise os outros. Vamos partir amanhã. Já

estou ficando sem dinheiro mesmo. Por

falar nisso, você deu uma olhada no banco

daqui?

— Sim, passei por lá. Há guardas, mas

não serão empecilho. Suspeito que estou

cheios de ouro lá.

— Que acha de lhes fazermos uma visita,

antes de irmos embora?

— Acho ótimo! Vou reunir o pessoal

para combinarmos isso — disse ele.

Uncle Chad saiu, retornando pouco mais

tarde, com Bob Lane, Ted e Villas.

Bill contou-lhes sobre o banco.

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— O que acham, rapazes? — indagou,

quando terminou.

— Se vamos assaltá-lo, temos de fazê-lo

hoje — disse Villas.

— Por quê? — quis saber Bill.

— Amanhã eles embarcam o

carregamento que estão guardando, direto

para o interior do país. São pesos mexicanos

em ouro para pagamento dos soltados que

estão enfrentando a revolução

— E como eles vão levar isso, por trem?

— Sim, mas haverá mais guardas. Acha

mais fácil roubar o trem?

— E por que não? Ele passa muito

próximo da fronteira, ficará tudo mais fácil,

não?

— Bill tem razão — falou Ted. — O

trem para a umas três milhas da fronteira,

em Paso San Juan, para abastecer-se de

água. Seria interessante ir lá e conhecer o

terreno.

— Grande idéia, Ted. Faça isso. Leve

Bob com você. Quanto isso, Villas tentará

descobrir alguma coisa sobre os guardas

que acompanharão o carregamento.

— Certo — concordou Ted, fazendo um

sinal para Bob.

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Os dois saíram rapidamente. Villas foi

tentar descobrir sobre os guardas.

— Vai ser um grande golpe — disse

Chad.

— Se tivermos sorte, não precisaremos

mais trabalhar por um bom tempo.

Poderemos até entrar no negócio de gado

também.

— Pode ser a chance de nossas vidas.

Estou gostando disso — afirmou Chad,

satisfeito com a idéia.

Moly estava sozinha em seu quarto,

quando ouviu os gritos de Francis Beater lá

fora. Estava se preparando para sair, quando

Nolan bateu na porta.

— Aquele pistoleiro está chamando por

você, Moly.

— Sim, já ouvi. Pensei que fosse sumir,

depois daquela lição. Não sabia que um

homem podia ser tão burro assim, Nolan.

Vou ter que ir lá e matá-lo?

— Agora é para valer, Moly. Terá toda a

cidade observando-a. E se alguém

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reconhecê-la? E se os assassinos estiverem

por perto?

— Depois do que fiz lá no saloon, já não

posso mais ter essa preocupação, Nolan. Se

estiverem por aqui, que apareçam. Vão nos

poupar tempo — disse ela, com decisão.

— Mesmo assim, tenho meus receios.

Pode ser uma armadilha. Dê-me algum

tempo para observar o que está havendo...

— Fique tranqüilo, Nolan. Você me

treinou direitinho — afirmou ela,

apanhando seu cinturão e afivelando-o nos

quadris.

— É melhor usar o Colt de cano curto na

direita, Moly. Será um duelo a curta

distância. Lembra-se de tudo que lhe

ensinei, não?

— Não se preocupe, Nolan. Eu farei o

que tem que ser feito...

— Quando sair à rua, vá para a esquerda.

Terá o sol a suas costas.

— Entendido, Nolan. Se aquele idiota

quer morrer, vou lá fazer a vontade dele —

prometeu ela, com uma expressão de

paciência.

Nolan via nela seu antigo parceiro,

sempre inquieto e pronto para usar uma

arma. A filha fazia justiça ao pai.

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Moly saiu do hotel, fazendo exatamente o

que Nolan recomendara, ficando no centro

da rua, com o sol a suas costas.

Ficou olhando fixamente para os olhos de

Francis, enquanto em cada porta e janela as

pessoas se amontoavam para ver o insólito

duelo entre um pistoleiro conhecido e uma

mulher. Tucson jamais vira algo assim

antes.

— Você é um idiota vindo me provocar,

pistoleiro — disse Moly, com desprezo,

vendo que o sol atrapalhava a visão do

outro.

— Cale-se e saque sua arma. Vou lhe

mostrar o verdadeiro lugar de uma mulher:

na horizontal — respondeu ele, pensando no

que Curtis lhe dissera.

Não facilitaria com aquela mulher. Sem

mais uma palavra, ele levou a mão à arma,

sacando-a.

Um tiro ecoou solitário pela rua. Francis

cambaleou de um lado para outro, antes de

cair de joelhos.

Olhou aterrorizado para o Colt fumegante

na mão de Moly, depois para seu peito,

onde o sangue escorria, traçando um

desenho macabro em sua camisa.

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Seus olhos se reviraram e ele caiu para

frente, morto. Moly aproximou-se

cuidadosamente. Chutou-o com a ponta da

bota, convencendo-se de que ele estava

morto.

— Como se sente? — indagou Nolan,

aproximando-se.

Ainda estava impressionado com a

rapidez e o sangue-frio daquela garota.

— É estranho, Nolan, mas eu me sinto

aliviada. Pode entender isso?

— Sim, é como se estivesse em seu

sangue a habilidade de matar pessoas, não?

Ela levantou os olhos para ele, pensativa.

— Talvez, Nolan.

Um homem destacou-se da multidão que

se acotovelava para olhar o cadáver do

pistoleiro morto. Era o Xerife Red Burton.

— Quem matou este homem? —

indagou, depois de verificar o cadáver.

— Fui eu, xerife — respondeu Moly, sem

hesitação.

O xerife olhou-a espantado. Não havia

presenciado o duelo e custava-lhe acreditar

que Francis Beater fora vencido por uma

mulher.

— Foi uma luta limpa, xerife — afirmou

Nolan.

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— Mas... Francis nem chegou a sacar sua

arma...

— Azar dele, xerife. Bem que ele tentou

— respondeu a garota, afastando-se e

retornando ao hotel, seguida por Nolan.

Um homem, parado à porta do hotel,

dirigiu-lhe a palavra.

— Senhorita, não leve a mal. Meu nome

é Curtis e vi o que acabou de fazer. Foi

impressionante. Há uma pessoa aqui no

hotel que gostaria de conhecê-la.

— E por que eu deveria conhecê-lo?

— Ele tem um negócio a lhe propor.

Pode ser interessante.

— Ela não está interessada — afirmou

Nolan, intrometendo-se.

— Estou falando com ela, vovô...

— Já lhe mostro quem é seu avô — falou

Nolan, de mal humor, erguendo seu rifle

para dar uma pancada em Curtis.

— Fique calmo, Nolan! — interrompeu-o

Moly, pensando por instantes. — Por que

não vamos ouvir o que ele tem a dizer?

Podemos precisar de dinheiro para terminar

o negócio que iniciamos...

— Ele está no quarto trinta e dois.

Esperaremos por você.

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— Certo, vou pensar no assunto —

afirmou a garota.

Curtis afastou-se para que eles entrassem.

Enquanto subiam as escadas, Nolan

comentava:

— Eu sei o que ele quer de você, Moly.

Não deveria ir lá.

— E por que não, Nolan? Se houver uma

chance de ganhar dinheiro, temos de

aproveitá-la.

— Não dessa forma. Será muito perigoso.

A cidade toda a viu matando aquele

pistoleiro. Você é uma atiradora imbatível.

Vai começar a receber propostas para matar

gente...

— Não deixa de ser uma boa idéia,

Nolan, se for para matar gente como a que

invadiu nosso rancho, há um ano atrás —

falou ela, com amargura.

— Não pode generalizar...

— Não terei escrúpulos, Nolan. Essa raça

tem de sumir da face da terra. Enquanto eu

puder, vou contribuir para que isto

aconteça...

Chegaram à porta do quarto. Antes que

ela entrasse, Nolan segurou-a pelos ombros,

obrigando-a a olhá-lo.

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— Está sendo muito amarga, Moly. Isso

não é bom... Matar pode se tornar um

vício...

— Ouça-me bem, Nolan. Meu pai foi

morto e eu fui desonrada por um bando de

ratos como este que acabei de matar. Nada

no mundo me dará mais prazer que repetir

isso, até que todos eles sejam mortos.

— Não sei se quero ajudá-la a fazer isso,

Moly — disse o velho, com sinceridade.

— Vai trair seu juramento, Nolan?

Lembra-se de que jurou comigo, na

sepultura de meu pai, que juntos iríamos

vingá-lo? É isso que estamos fazendo,

Nolan. Vingando-o.

Nolan ficou pensativo, enquanto Moly

entrava em seu quarto.

— Vai vê-lo?

— Sim, vou — disse ela.

Momentos depois ela subia outro lance

de escada para chegar ao terceiro pavimento

do hotel.

Bateu na porta do quarto trinta e dois e

esperou. Curtis abriu-lhe a porta.

— Entre, por favor! — disse ele. —

Quero apresentar-lhe James Queeler, meu

amigo pessoal.

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— Muito prazer, senhorita — disse

Queeler. — Não quer se sentar? —

convidou ele, cheio de gentilezas.

Moly aceitou a oferta, examinando os

dois homens.

— Curtis me disse que tinha um negócio

rendoso para me propor.

— Sim. Vi o modo como liquidou aquele

pistoleiro. Acha que poderia repetir a dose

para mim?

— Matar um homem?

— Não, matar cinco homens — disse

Queeler, olhando-a nos olhos.

Eles lembravam alguém, pela sua frieza.

— Não acha que isso é pedir demais?

— Pago um bom preço.

— E quanto é isso?

— Mil dólares por cabeça. Metade

adiantada.

— E o que são esses homens?

— Pistoleiros, como o que você matou.

— Quero dez mil — propôs Moly.

— Dez mil? É muito dinheiro por aqueles

vagabundos.

— Neste caso, não precisa de mim —

falou Moly. — Meu preço é este. Sabe onde

me encontrar, se precisar de mim.

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A garota levantou-se e fez menção de

sair.

— Espere um pouco, vamos negociar isso

— pediu Curtis, segurando-a pelo braço.

Moly dirigiu-lhe um olhar gélido,

fazendo com que ele a soltasse

imediatamente.

— Está bem, não tenho o que você me

pede... Que tal sete mil? — argumentou

Queeler.

— Já lhe dei meu preço, Queeler. Não

aceito pechinchas. Posso saber quem são

esses homens?

— Bill Harding e seus amigos...

— Onde estão agora?

— Em algum lugar do México, mas em

breve retornarão a Tucson. É um bando de

ladrões e estupradores...

O corpo da garota enrijeceu-se. Ela se

aproximou de Queeler, olhando-o nos olhos.

— Um dos homens é um mexicano que

usa facas?

— Sim, esse é Villas...Por quê?

— Um é magro e se veste de negro, como

um coveiro?

— Está falando de Uncle Chad...

— Sempre andaram juntos os cinco?

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— Há muito tempo que cavalgam juntos.

Por quê? Você os conhece?

Os olhos dela brilhavam sinistramente.

— Sim, eu os conheço, Queeler. E lhe

digo mais. Vou matá-los e não vou lhe

cobrar nada por isso — afirmou ela.

— Como? Não estou entendendo? —

atrapalhou-se James Queeler.

— É isso mesmo que ouviu, moço. Eles

vão morrer e isso não lhe custará nada —

finalizou ela, saindo e fechando a porta.

Nolan estava no corredor a sua espera.

— Fazer-me um favor. Os homens que

procuramos em breve estarão aqui, em

Tucson.

— Como sabe disso?

— Eles disseram. Queriam pagar-me para

matá-los.

— E você aceitou?

— Não. Serão mortos por minha vontade

e vingança.

— Sabe quem são eles?

— Bill Harding e seus capangas

pistoleiros — contou ela, com desprezo

pelos nomes e pelos homens.

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Villas esperou, escondido atrás da caixa

d'água, até que o trem parasse para

reabastecer. Alguns soldados desceram para

fumar e esticar as pernas.

Quando o abastecimento terminou, o

maquinista deu sinal de partida. Os homens

retornaram para o trem. Então ele correu,

subindo no vagão do correio e desengatando

a composição dali para trás.

Boa parte dos soldados ficou na parte que

se soltou. Enquanto isso, Uncle Chad já

subira na locomotiva e dominado o

maquinista e o foguista, exigindo que eles

dessem toda velocidade.

O trem ganhou velocidade rapidamente.

Algumas milhas depois, Chad ordenou que

parece o trem.

— O que pretende afinal, gringo? —

indagou o maquinista.

— Só queremos assaltar seu trem, idiota

— respondeu o pistoleiro, apertando o

gatilho friamente e fulminando os dois a

queima-roupa.

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Bill e os outros já estavam posicionados

do lado de fora, observando o vagão-

correio, ocultos atrás de umas pedras.

— Bom trabalho, Chad — elogiou Bill.

— Como abrimos isso agora?

— Vou tentar argumentar com os guardas

— disse Villas, aproximando-se do vagão.

— Ei, vocês aí dentro! Estão me ouvindo?

A resposta foi um tiro.

— Não sejam idiotas. Não precisam

morrer por causa do ouro.

— Você é que é idiota! Este é um vagão

a prova de balas. Não podem nos atingir

aqui.

— Pode ser a prova de balas, mas não é

de dinamite.

— Terá de chegar perto para fazer isso.

Estará em nossa mira.

— Demônios! Eles têm razão —

observou Villas.

— Tem uma ova — disse Uncle Chad,

apanhando um pacote de dinamite. — Vou

lhe mostrar como se faz isso — disse ele,

esgueirando-se pelas rochas até próximo da

locomotiva.

Correu para ela. Quando um dos guardas

disparou, ele já estava seguro. Subiu na

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máquina, passou pelo vagão de carvão e

saltou para cima do vagão-correio.

Depositou ali o pacote de dinamite,

encaixou um estopim, depois acendeu-o,

correndo de volta para a cabina da

locomotiva.

Um clarão enorme se elevou e o vagão,

explodido de cima para baixo, abriu-se

como uma lata de feijão atropelada por uma

carroça, ficando toda retorcida.

— Belo trabalho, Chad — gritou Bill,

assim que a fumaça se dissipou.

— Lá está o cofre — gritou Villas.

— Peguem mais dinamite. Vamos

terminar de abrí-lo.

O cofre estava danificado, mas a porta

não estava totalmente aberta.

Bill apanhou a dinamite e colocou-a com

cuidado na porta. Era só uma questão de

tempo até porem as mãos naqueles pesos

mexicanos de ouro.

— Cuidado com essa dinamite ou vai

espalhar essas moedas por toda a região —

alertou Bob.

— Cale-se ou espalho seus dentes pela

região toda.

Bill sabia exatamente o que fazia. Assim

que aplicou a dinamite, na quantidade e no

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local certos, acendeu o estopim e todos

correram se esconder.

Momentos depois, a explosão fazia a

porta do cofre voar para longe. Bill foi o

primeiro a chegar e olhar a grande caixa de

ferro no interior do cofre.

— Ajudem-me aqui — pediu.

Os homens puxaram-na para fora. Um

cadeado prendia a lingüeta que travava a

tampa.

Bill atirou contra ele, estourando-o.

Depois abaixou-se e abriu-a.

As moedas de ouro estavam

acondicionadas em cartuchos de papel

grosso. Ele partiu um dos cartuchos ao meio

e as moedas de ouro saltaram, rebrilhando

ao sol.

— Vejam, rapazes! É tudo nosso — disse

ele, com satisfação. — Vamos recolher tudo

isso e dar o fora o mais depressa possível.

Tucson nos espera!

Gritando de satisfação, os homens

apressaram-se em apanhar seus alforjes e

enchê-los com os cartuchos de moedas.

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Os dois vingadores tiveram de conter sua

impaciência e aguardar. Segundo Queeler,

Bill e seus pistoleiros em breve retornaria a

Tucson. Todos os dias, Nolan fazia uma

ronda pelos saloons e cantinas da cidade.

Repetia aquilo na esperança de encontrar

logo os homens que buscavam.

Levava sempre consigo seu velho rifle

Sharp, de grosso calibre e longo alcance.

Era sua maneira de sentir-se protegido.

— Olá, Nolan! — cumprimentou-o o

"bartender" do Crow Saloon.

— Olá, Dan! Dê-me uma cerveja.

O homem atendeu-se, depois ficou a sua

frente, disposto a conversar. A tarde mal

começava e havia poucos freqüentadores no

saloon.

Nolan percebeu que o outro tinha alguma

coisa para contar.

— Alguma novidade, Dan? — indagou,

curioso, após um bom gole de cerveja.

— Cinco homens chegaram esta

madrugada...

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— São os homens que procuramos?

— Bill Harding e seus pistoleiros.

Chegaram do México.

— Tem certeza que são eles?

— Claro que sim, Nolan. Eu os conheço.

Veja, ali vem um deles — apontou,

discretamente.

Uncle Chad desceu a escada e

aproximou-se do balcão.

— Um litro de seu melhor uísque, Dan —

pediu ele, jogando uma moeda sobre o

balcão.

Dan atendeu-o prontamente e ficou

observando Nolan, a quem Chad encarava

agora.

— Não o conheço de algum lugar, vovô?

— indagou o pistoleiro.

As mãos de Nolan crisparam-se sobre a

espingarda. Seu dedo estava próximo do

gatilho. Seu desejo era matar imediatamente

aquele canalha, que ele acabara de

reconhecer.

Sentiu o sangue borbulhar em suas veias.

— Já esteve no inferno? — indagou

Nolan.

— O que há, vovô, não gostou da

pergunta?

— E nem de quem a fez.

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— É muito atrevido para um velho —

disse Chad, furioso, agarrando Nolan pelo

colarinho da camisa.

Com um movimento rápido de corpo,

Nolan atirou-o no assoalho, apontando-lhe o

rifle. Não conseguia conter sua repulsa por

aquele homem. Desejou matá-lo ali mesmo,

mas conteve-se. Moly tinha planos de

vingança bem definidos. Não queria

antecipar-se.

— Sabe que isso poderia ter-lhe custado a

vida? — indagou Chad, levantando-se.

— Eu... Eu perdi a cabeça... — falou

Nolan, tentando se desculpar.

Chad, no entanto, não era homem de ser

ofendido e deixar por isso mesmo. Na

distração de Nolan, ele apanhou o litro de

uísque sobre o balcão.

Seus olhos cintilaram de fúria e ele

resolveu extravasar sua raiva. Num gesto

violento, atingiu a cabeça de Nolan com o

litro de uísque, derrubando-o no meio de

uma chuva de cacos de vidro e bebida.

O sangue brotou do alto da cabeça do

velho bandido, atordoado pela pancada

inesperada.

Aquilo, porém, ainda era pouco para

satisfazer a fúria assassina de Chad.

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Sem piedade, passou a agredir o velho

com pontapés violentos. Nolan tentou

defender-se, mas era impossível, diante da

saraivada de golpes aplicados por Chad.

— Que isto lhe sirva de lição — rugiu

Chad, quando terminou a agressão.

Nolan estava caído, imóvel no assoalho.

Chad riu sadicamente. Dan pusera outro

litro de bebida sobre o balcão. O pistoleiro

apanhou-o e subiu as escadas, rumo aos

quartos lá encima.

Naquele momento, Moly encontrava-se

na cadeia, conversando com o xerife, que

desejava maiores informações sobre a morte

de Francis Beater.

— Sou xerife de Tucson há dez anos e há

vinte conheço todo o Oeste. Já ouvi

contarem muitas histórias e já vi homens

morrerem de muitas maneiras. Francis foi o

primeiro, que conheci, que morreu num

duelo com uma mulher.

— Sempre há uma primeira vez para

tudo, xerife.

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— Mas nada me tira da cabeça que aquilo

foi uma encenação. Você tinha algum

escondido para atirar em Francis...

— Está duvidando de minha honestidade,

xerife?

— Tenho que suspeitar de tudo. Ao invés

de um duelo, penso que tivemos um

assassinato ali.

— Vai ser algo difícil de provar, xerife.

— E aquele velho que a acompanha

sempre. Onde estava ele no momento do

duelo?

— Nolan? No hotel, talvez, olhando

como todos.

— Vou ter que investigar isso.

— ã vontade, xerife. Só acho que está

sendo zeloso demais. Francis Beater era um

rato e não merecia nenhuma consideração.

Quanto ao Nolan, se olhar com atenção,

verá que ele não usa um revólver. Só

carrega aquele velho rifle Sharp e não foi

uma bala dele que atingiu o peito de

Francis.

Nesse momento, a porta abriu-se, dando

passagem a um homem alto e barbado, rosto

moreno e olhos azuis. Estava coberto de

poeira e parecia ter cavalgado muito, até

chegar ali.

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— Você é o xerife?

— Sim, em que posso ajudá-lo.

— Venho do México. Meu nome é

Concho Stevens. Sou um agente pago pelo

governo mexicano para recuperar o produto

de um assalto.

— E o que deseja de mim?

— Ajuda!

— E por que eu ajudaria um agente

mexicano?

— Os homens que procuro não são

apenas ladr·es. São assassinos frios e

perigosos. Tenho certeza que eles estão

aqui, em Tucson agora.

— Você os conhece?

— Não, não os conheço pessoalmente,

mas segui a pista deles até aqui.

— Não sei...É uma situação complicada

— negaceou o xerife.

— Tenho de pegá-los, xerife...

— Não é tão fácil assim. Esses homens

estão sob a proteção da lei americana. Não

cometeram nenhum crime aqui. Enquanto

se mantiverem assim, nada poderei fazer.

— Posso agir a minha maneira, então?

— Desde que não fira as nossas leis...

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— Esses homens não merecem a

consideração nem a proteção de sua lei,

xerife. Mataram seis homens no assalto.

— Nada posso fazer, moço. Eu não faço

as leis, eu só as faço cumprir.

— E de um modo muito seletivo —

observou Moly. — Se fosse um pouco mais

rigoroso, Tucson não seria o paraíso dos

pistoleiros.

— Está se metendo onde não deve, moça

— disse-lhe o xerife. — Como expliquei,

enquanto eles nada fizerem por aqui,

minhas mãos estão atadas.

— Se precisar de alguma ajuda, Concho,

conte comigo — disse Moly ao mestiço a

sua frente.

Concho olhou-a com surpresa,

principalmente quando reparou que ela

usava duas armas na cintura.

Ficou curioso com isso.

— E que tipo de ajuda poderá me dar,

senhorita?

— A que precisa — respondeu ela,

apontando para as coronhas de seus Colts.

— Sabe usá-las? — indagou ele,

desconfiado.

— Pode apostar que sim, moço. Ela

matou um pistoleiro num duelo, bem aqui,

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na rua principal de Tucson. O pobre homem

nem chegou a tirar a arma do coldre.

— Você é tão boa assim? — indagou-lhe

Concho.

— Aquele pistoleiro duvidou e acabou

morto.

A porta da cadeia abriu-se e o garoto que

fazia a limpeza do saloon entrou correndo.

— Ei, moça! Aquele velho, seu amigo,

está muito ferido...

— Nolan? Onde está ele?

— Foi levado para o hotel agora...

— O que houve com ele?

— Parece que se meteu numa briga...

— Nolan metido numa briga? Não é

possível. Chame o doutor para mim, garoto

— pediu ela, atirando uma moeda para o

menino.

— Vai precisar de alguma ajuda, moça?

— indagou Concho.

— Não, obrigada assim mesmo! Posso

tomar conta de tudo — agradeceu ela,

saindo rapidamente.

Nolan estava em péssimo. Havia sofrido

muito com a surra que levara de Chad.

— Oh, Deus, Nolan! O que houve?

— Moly... Eles chegaram... — disse ele,

num fio de voz/

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— Tem certeza?

— Sim... Foi um deles que me bateu...

— Qual?

— O magricela vestido de negro...

Os olhos da garota cintilaram de cólera e

seu corpo tudo estremeceu de fúria contida.

— E os outros?

— Não os vi, mas o "bartender" disse que

estavam lá...

— Onde?

— No Crow.

Ela examinou suas armas para ver se

estavam todas carregadas.

— O que está pensando em fazer? —

indagou ele.

— Vou até lá...

— Não assim... Não pode ir lá sozinha.

— Tenho que ir, Nolan.

— Não seja tola, Moly. Eles são cinco.

Não pode enfrentá-los assim.

— Não temo a morte...

— Morta não poderá se vingar... Vamos

com calma, como planejamos antes...

Para ela, após todo aquele tempo

esperando para matar aqueles homens, estar

tão próxima deles punha nela uma

impaciência difícil de conter.

— Sente-se. Vamos discutir nosso plano.

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Moly sentou-se na beirada da cama.

— Vamos fazer como imaginamos. É

preciso separá-los e matá-los um a um para

que os outros fiquem aterrorizados, lembra-

se? Eles precisam sofrer. Terão que se

desesperar. Cada um deles terá um tipo de

morte muito especial...

Ela respirou fundo, olhando o rosto

ensangüentado do velho.

— Está certo, Nolan. Vamos fazer como

tínhamos imaginado.

— Não precisamos precipitar as coisas.

Parece que ficarão um bom tempo aqui.

Trouxeram muito dinheiro do México.

— Como assim?

— Foi o que disse o "bartender".

— Ainda há pouco eu estava lá no

xerifado e chegou um agente mexicano, à

procura de alguns homens que fizeram um

assalto por lá.

— Podem ser eles.

— O que faço agora, Nolan?

— Fique de olho apenas, nada mais, até

que eu possa me levantar e possamos

retomar nosso plano.

— Está bem... Agora procura descansar.

O médico está vindo.

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Ela aguardou até que o doutor chegasse e

atendesse o velho, que foi medicado e

adormeceu depois de umas pílulas que o

médico lhe deu.

— É melhor assim. Dormindo ele se

recupera mais depressa. Felizmente não

houve nenhum osso quebrado, nem órgãos

internos lesados. Mesmo assim, foi uma

surra violenta — informou o médico, para

indignação da garota.

Ela deixou o amigo adormecido e foi para

o seu quarto. Precisava encontrar uma

forma de domar aquela impaciência dentro

dela, principalmente considerando que

Concho poderia estar atrás dos mesmos

homens que ela.

Se assim fosse, sua vingança poderia não

se concretizar. Resolveu procurá-lo e

encontrou-o na rua, à procura de um hotel.

— Por que não fica no mesmo em que

estou? — sugeriu ela.

— Você o recomenda?

— Não é dos piores. Se ficar nele,

poderemos conversar mais sobre os

assaltantes que procura.

— Sabe alguma coisa deles?

— Há um ano, cinco assassinos pagos

mataram meu pai e me violentaram. Desde

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então, tenho vivido apenas para a vingança.

Acontece que suspeito que os homens que

procuro sejam os mesmos que assaltaram lá

no México.

— Está me propondo uma sociedade

nesse negócio?

— Qual é, especificamente, a natureza de

sua missão.

— O Governo do México quer apenas

recuperar o que puder do dinheiro roubado.

São pesos mexicanos em ouro.

— Precisará levar os homens presos ou

mortos com você?

— Não necessariamente.

— Deixará para mim o prazer de matar

um por um?

— Se isso a satisfaz... Desde que eu

recupere o dinheiro...

— Está bem. Acho que podemos agir

juntos, então.

— Você sabe onde esses homens estão?

— Sim. Estão aqui em Tucson. Foram

vistos no Crow, um dos saloons no fim da

rua.

— Vamos montar nossa estratégia, moça.

Agiremos logo mais, à noite. O que me diz?

— Sim, podemos discutir isso —

concordou ela.

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— Vamos para o seu hotel. Vou tomar

um bom banho e fazer a barba. Depois

conversaremos.

Os dois voltaram juntos para o hotel.

Bill Harding sentia-se como um rei. Duas

das garotas do saloon massageavam-no,

enquanto uma terceira servia-lhe uísque

com os próprios lábios.

— Não se arrependerão por tratar bem

assim o velho Bill — dizia ele, antes que

batessem na porta.

Uma das garotas foi abrir. Era Curtis

Lampblack.

— O que deseja aqui? — indagou Bill,

com rispidez.

— Quero falar-lhe...

— Agora estou ocupado.

— Pode ser do seu interesse - frisou

Curtis, deixando Bill em dúvida.

— Está bem, desembuche!

— Prefiro falar sem a presença das

garotas — pediu Curtis.

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— Ok, garotas. Basta por agora. Eu

mandarei chamá-las, quanto terminar aqui

— ordenou ele.

Curtis esperou até que elas saíssem, antes

de falar.

— O que deseja aqui, afinal? — indagou

Bill.

— Venho da parte do Queeler...

— Isso eu sei. Você sempre foi o garoto

de recados dele.

Curtis engoliu seco e continuou:

— Ele soube de sua volta e está

desesperado porque não poderá pagá-lo

mais. Está quebrado.

— Bem, considerando que no momento

não preciso de dinheiro, vou deixar assim

por enquanto.

— Vai desistir da chantagem?

— E quem é idiota de desistir de uma

mina de ouro? Só vou dar um fôlego para

ele. Quando o meu dinheiro acabar, eu vou

procurá-lo, como sempre.

— E quando será isso?

— Eu não sei... Posso perder todo o meu

dinheiro jogando pôquer logo mais...

— Ele está arruinado, Bill. Seu rancho

está abandonado. Ele não consegue pagar os

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empregados. Não vejo como ele possa

conseguir mais dinheiro.

— Ainda tem as terras, não?

— Sim, mas...

— Quando valem aquelas terras? Vinte

mil? Vinte e cinco?

— Não pode obrigá-lo a isso...

— E por que não? — indagou Bill,

aproximando-se de Curtis e segurando-o

pelo pescoço.

— Ele estará morto sem o rancho...

— E o que me importa isso? Você

também poderá morrer se não levar a ele

meu recado. Diga-lhe que vá se preparando.

A qualquer momento eu lhe farei uma visita

de cobrança. E é bom que ele tenha o que

preciso, quando eu for lá — ameaçou,

soltando-o.

— Não continuar nisso por muito tempo,

Bill... — falou Curtis, num tom intimidador

e despeitado.

— E por que não? — indagou Bill,

desconfiado.

— Em breve saberá — afirmou Curtis,

recuando na direção da porta.

Bill estava certo de estar sentindo ali uma

ameaça. Agarrou Curtis pelo pescoço

novamente, apertando-o com força.

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— Vamos, diga-me o que está havendo

ou morrerá aqui mesmo — ameaçou.

— Há alguém atrás de você... Um

pistoleiro... Dos bons... Cedo ou tarde ele

vai pegá-lo...

— Queeler o contratou?

— Não... O pistoleiro o procura por

motivos particulares, Harding.

— Quem é ele?

— Eu não sei, mas você descobrirá isso

logo...

Bill empurrou-o com força contra a

parede, olhou-o com ódio, depois soltou-o.

Parecia assustado.

— O que houve, Bill? Assustou-se?

Tome cuidado... Se tremer, sua pontaria

será pior...

— Saia daqui! — ordenou Bill, agarrando

Curtis pelo colarinho e jogando-o no

corredor.

— Olhe sempre para trás, Bill. O

próximo estalido de madeira ou uma

sombra no beco pode ser a morte chegando

— falou Curtis, começando a rir

histericamente, enquanto Bill batia a porta.

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Quando anoiteceu, Moly e Concho

encontraram-se no saguão do hotel e foram

juntos para o saloon, para um

reconhecimento dos homens que os dois

caçavam.

Assim que chegaram, ficaram junto à

porta, observando o local. Havia bastante

gente lá dentro. Com um estremecimento,

Moly viu os cinco homens jogando numa

mesa.

Chad destacava-se por sua roupa

sinistramente preta.

— Lá estão — apontou ela, contendo seu

desejo de sacar a arma e ir até lá matá-los.

— Tem certeza?

— Sim, são eles. Eu jamais poderia

esquecer aquelas caras.

— Quem é o chefe?

— Bill Harding, o metido a granfino à

direita.

— Eu poderia entrar lá agora e matá-los

— disse ela.

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— Calma... A vingança é um prato que

deve ser saboreado frio. Se esperou um ano,

pode esperar uma noite agora. Além disso,

preciso descobrir onde esconderam o

dinheiro.

— Deve estar com o chefe deles, com

certeza.

— Certo. Vamos sair daqui. Vamos

acertar como faremos isso, Moly.

Concho segurou-a gentilmente pelo

braço, levando-a para fora dali. Podia sentir

que a garota tremia de ódio contido.

— Como quer fazer? — indagou Concho.

— Você quer o dinheiro de volta e eu

quero as vidas deles. Deixe-me, então,

cuidar de todos eles. Deixarei o chefe por

último. Ele lhe dirá onde está o dinheiro. De

acordo?

— Parece-me bom. Quer alguma ajuda

para o que tem que fazer agora?

— Não, isto é algo que terei de fazer

sozinha, Concho.

— Tem certeza?

— Sim, tenho. Eu o avisarei quando

chegar a hora.

Moly despediu-se dele e desceu a rua,

indo até um bordel de mexicanas numa das

ruas laterais.

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Entrou resolutamente e procurou por uma

das mulheres. Os homens ali presentes

olharam-na com respeito. Conheciam

aquela gringa que levava duas armas.

— O que quer de mim? — indagou a

mexicana.

— Só quero que me diga uma coisa. O

que vocês fazem com os homens que as

maltratam? Ouvi alguém comentar, mas não

me recordo bem...

— Pretende fazer isso?

— Sim, há alguém que merece o castigo.

— Pois então não apenas vou ensiná-la

como vou lhe dar o que precisa — disse a

morena mexicana.

Moly ficou ali mais algum tempo.

Depois, quando saiu, levou um pequeno

saco de couro até seu cavalo, amarrado

diante do hotel, guardando aquilo no alforje

da sela.

Entrou no hotel, pediu um lápis e papel

ao rapaz da portaria e escreveu algo. Em

seguida foi até o Crow novamente.

Entrou e foi direto para o balcão.

— Dan, preciso que me faça um favor —

pediu ela.

— Diga, Moly.

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— Quero que entregue este bilhete àquele

magricela vestido como um coveiro lá na

mesa de pôquer.

— Aquele é Chad, o homem que surrou

Nolan. Não está se metendo em encrencas,

Moly?

— Eles se meteram em encrencas, Dan.

— Está bem, eu faço isso, mas não estou

gostando nada disso, se é que lhe interessa

saber.

— Ok, Dan — agradeceu ela, saindo.

Enquanto Dan levava o bilhete até Chad,

Moly foi apanhar seu cavalo, afastando-se

da cidade.

Foi até um bosque, não muito distante.

Assim que desmontou, tratou de acender

uma pequena fogueira.

Enquanto isso, no saloon, Chad recebia o

bilhete, entregue por Dan. Uma garota

queria se encontrar com o pistoleiro

próximo da cidade.

Ele aproveitou que faziam uma pausa no

jogo para ouvir uma garota cantar, deixou a

mesa e foi ao encontro da misteriosa

mulher.

Encontrou facilmente o local pela

fogueira acesa. Desmontou, olhando com

curiosidade aquela bela mulher, cujo rosto

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não conseguia definir muito bem, pois ela

estava afastada da fogueira.

Ele se aproximou dela.

— Sou Chad — disse ele, com pinta de

bonitão.

— Sou Moly e esperava por você

ansiosamente afirmou ela.

Ele se aproximou um pouco mais,

olhando atentamente para o rosto dela.

— Eu a conheço?

— Sim, você me conhece. Não me diga

que me esqueceu...

Ele demonstrava não se lembrar do rosto

dela. Mesmo assim, avançou, com a

intenção de abraçá-la. Inesperadamente,

Moly vibrou uma tremenda pancada na testa

dele, nocauteando-o.

Moly tratou de fazer o que tinha que

fazer. Apanhou uma faca e preparou quatro

estacas. Pegou corda e o saco de couro que

a prostituta mexicana lhe dera.

Quando Uncle Chad acordou, estava nu,

com braços e pernas presos às estacas.

— Maldita! — rugiu ele, debatendo-se,

mas estava firmemente preso.

Moly estava parada ao lado dele,

olhando-o.

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— Quem é você, maldita? — indagou

ele.

— Vou lhe refrescar a memória,

bastardo! Há um ano atrás, num rancho às

margens do Rio Colorado, um homem foi

morto e uma garota foi violentada por um

bando de animais...

— Você!

— Sim, eu mesma. Estou aqui para fazê-

lo pagar pelo crime que cometeu.

— Maldita vagabunda! Eu deveria tê-la

matado naquela noite...

— Cale-se ou arranco-lhe os dentes a

bala.

— O que vai fazer comigo?

— Um tratamento que as prostitutas

mexicanas dão aos homens que as

maltratam — disse ela, apanhando o saco de

couro. — Já ouviu falar no Saco de

Escorpiões?

— Espere um pouco... Está maluca! Não

pode fazer isso... Nós apenas...

— Apenas o que, bastardo? — rugiu ela,

furiosa, chutando-lhe as costelas.

Ele gemeu, começando a choromingar.

— Felizmente para você eu vou lhe dar

uma morte rápida, miserável. Meu prazer

seria assá-lo em fogo lento e vê-lo morrer

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aos poucos. Mas tenho que cuidar de seus

amigos também...

— Não, por favor! Não faça isso! Eu

tenho dinheiro... Muito dinheiro... Eu lhe

dou tudo que quiser...

— O que eu quero vocês me tiraram e

agora já não podem me devolver — disse

ela, abrindo cuidadosamente o saco de

couro.

Depois, com um movimento rápido, fez

com que o pênis e os testículos do pistoleiro

entrassem pela boca do saco, fechando-o

firmemente com uma correia.

— Não... Não... Não faça isso... Eles

estão me picando... — começou ele a gritar.

Havia sete escorpiões pequenos ali

dentro, o suficiente para matar um homem,

mas não tão rapidamente assim.

Os gritos dele transformaram-se em uivos

de pavor. Ele se contorcia todo, mas isso

apenas enfurecia os animais, que picavam-

no repetidas vezes.

O pavor estampou-se em seu rosto.

Quando o começou a fazer efeito de

verdade, seu corpo começou a ter

convulsões, retorcendo-se horrivelmente.

Moly cuspiu nele, depois foi apanhar seu

cavalo. Quando ele parou de gritar, ela o

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esporeou, galopando na direção de Tucson,

onde continuaria sua vingança.

No saloon, a música terminara e os

homens aplaudiam e jogavam seus chapéus

para o alto.

Nas mesas onde o jogo fora interrompido,

os homens prepararam-se para retomá-lo.

— Onde está Chad? — indagou Bill.

— Ainda não voltou. Recebeu um bilhete

aqui e saiu sem dizer nada.

— Ninguém sabe o que havia nesse

maldito bilhete? Ele saiu justo quando

estava ganhando, aquele bastardo.

— Eu não sei, Bill — falou Bob. — O

"bartender" que o trouxe para ele.

— Pois então vá perguntar a ele o que era

esse maldito bilhete!

Bob levantou-se contrariado e foi até o

balcão, falar com Dan a respeito do assunto.

— Dan, que bilhete era aquele que você

levou para o Chad, ainda há pouco?

— Foi uma garota que me deu para

entregar para ele, Bob. Algum problema?

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— Não, tudo bem — disse Bob,

retornando para a mesa.

— E então, o que era? — indagou Bill,

com impaciência.

— Fique tranqüilo, Bill. Chad está atrás

de um rabo de saia, para variar. Não acho

que ele volte para continuar jogando, se nós

o conhecemos bem.

— Aquele bastardo! Vai me pagar por

isso. Vamos continuar o jogo só nós, então.

Enquanto jogavam, Bill observava

Concho Stevens que, com uma cerveja na

mão, parecia observá-los de longe.

Lembrou-se do que Curtis lhe dissera

sobre um pistoleiro que estaria à procura

dele. Isso estava enervando Bill e a

aparência de Concho, bem como a maneira

dele portar a arma, sinalizavam perigo.

— Villas, está vendo aquele homem perto

da janela, com a caneca de cerveja na mão?

— Sim, o que tem ele?

— Conhece-o?

Villas olhou despistadamente para

Concho, medindo-o dos pés à cabeça.

— Não, nunca o vi antes por aqui. Deve

ser algum dos novos pistoleiros. Todo dia

chega mais nesta cidade...

— Acha que ele é um pistoleiro?

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— Tem todo o jeito.

— Vá lá e traga-o aqui.

O mexicano olhou seu chefe sem

entender.

— Por quê?

— Não discuta, Villas. Apenas faça o que

eu estou lhe pedindo, está bem?

Bill não conseguia esconder seu

nervosismo. Não estava sendo uma

experiência agradável ter um pistoleiro em

seu encalço.

— Está certo — concordou Villas,

atirando suas cartas sobre a mesa.

Levantou-se e foi até onde Concho

tomava a sua cerveja e observava-os.

Ele viu o mexicano aproximando-se dele,

mas não se abalou. Era um homem

acostumado a lidar com o perigo.

Concho parou diante dele, olhando-o com

desprezo.

— É um mestiço?

— Sim, e daí?

— Qual é o se nome?

— Concho Stevens.

— Pois bem, Concho Stevens. Acho que

você fez alguma coisa que não agradou meu

amigo lá na mesa. Ele quer vê-lo.

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— Está me vendo de lá... Além disso, a

distância é a mesma para nós dois.

— Parece que não me entendeu,

engraçadinho. Eu não lhe dei chance de

escolha nem de retrucar. Ele quer que você

vá até lá e pronto. Comece a andar! —

ameaçou Villas, com a mão na coronha de

sua arma.

— Não aceito esse tipo de convite. Estou

tomando minha cerveja aqui,

tranqüilamente, sem incomodar ninguém. O

que dá a ele o direito de vir me incomodar?

— Não está sendo sensato, mestiço.

— E você está me aborrecendo —

respondeu Concho, no mesmo tom,

encarando-o.

— Ninguém fala assim com Orlando

Villas — gritou o mexicano, tentando sacar

a arma.

Ficou apenas na tentativa. O copo de

cerveja na mão de Concho espatifou-se na

cara do outro, jogando-o no assoalho.

Quando tentou alcançar a arma que caíra,

levou um chute no estômago que tirou-lhe o

fôlego.

Antes que fizesse qualquer outro

movimento, ma arma engatilhada era

encostada em sua boca.

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— Está bem... Acalme-se — murmurou

Villas, levantando-se vagarosamente.

— Agora, se você me repetir o convite

com gentileza, talvez eu o acompanhe até a

mesa onde seu amigo está — falou Concho,

guardando a arma, mas ficando na

defensiva.

Villas olhou na direção da mesa. Bill

estava em pé, olhando fixamente na direção

deles. Pela sua expressão parecia não ter

apreciado muito aquela falha de seu

capanga.

— Está bem, senhor. Por favor, poderia

me acompanhar até aquela mesa? Meu

amigo Bill gostaria de trocar algumas

palavrinhas com você...

— Claro que sim... Como não atender tão

gentil convite.

Villas avançou, sentindo-se terrivelmente

humilhado e jurando a si mesmo que daria o

troco na primeira oportunidade.

Ambos aproximaram-se da mesa ocupada

por Bill e pelos outros. O líder do bando

olhava com preocupação para aquele

homem que vencera facilmente um

pistoleiro experiente como Villas.

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Se alguém ali no saloon reunia habilidade

e coragem para matá-lo, esse alguém só

poderia ser aquele estranho.

Mas por que queria matá-lo?

— Sente-se, amigo — falou ele, olhando

o outro nos olhos. — E desculpe o jeito de

meu amigo aí. Delicadeza nunca foi o forte

dele.

— Queria me falar? — indagou Concho,

sentando-se cautelosamente.

Sentia-se como se estivesse se sentando

num ninho de cascavéis.

— Aceite uma bebida, antes de mais nada

— ofereceu Bill. — Estes são meus amigos

Bob, Ted e Villas. Sou Bill Harding.

— E o que deseja de mim?

— Vi a maneira como usou a arma... Está

procurando trabalho, por acaso?

— Não, já tenho um trabalho.

Bill Harding engoliu seco. As palavras de

Curtis continuavam martelando sua cabeça,

perturbando-o.

— Que tipo de trabalho?

Concho olhou-o no fundo dos olhos,

antes de responder. Bill leu a determinação

naquele olhar. Percebeu que aquele poderia

ser um adversário perigoso.

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— Não acho que vá interessá-lo —

descartou o agente mexicano.

— Isso depende. De repente seu trabalho

pode atrapalhar-me.

— Não creio. Acho que estamos em

ramos diferentes — afirmou Concho,

aceitando o uísque que lhe serviam.

— Vai ficar muito tempo na cidade? —

quis saber Bill, convencendo-se de que o

pistoleiro a sua frente estava atrás dele.

— Só até terminar o que vim fazer aqui

— respondeu Concho, confirmando as

suspeitas do pistoleiro.

— E quando isso vai acontecer?

— Quem pode saber? Hoje, amanhã,

daqui a uma semana. Tudo depende...

— De quê?

— De surgirem as oportunidades certas

— falou Concho, que todo o tempo

mantinha seu olhar fixo no de Bill.

Os dois homens pareciam medir forças, o

que não era percebido pelos outros.

— Não as está deixando passar, bebendo

cerveja aqui no saloon?

— Pode ser, mas não tenho pressa —

disse Concho, com um sorriso misterioso

nos lábios.

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Aquele sorriso incomodou Bill. Ele sentia

seus nervos abalados diante da segurança e

das afirmações daquele homem. Ninguém

podia ser tão frio assim.

Definitivamente, para ele, aquele era o

pistoleiro mencionado por Curtis.

Reunindo tudo que tinha de coragem, Bill

inclinou-se na direção de Concho.

— Deixe-me dizer-lhe uma coisa, amigo.

Não gostei e você. Esta cidade é pequena

demais para nós dois. Quero que vá embora

daqui hoje à noite mesmo.

— E por que eu deveria?

— Porque seus negócios aqui estão

encerrados.

— Veremos! — disse Concho,

entornando o uísque do copo.

— Se eu o encontrar na cidade ao

amanhecer, eu o matarei como a um cão.

— Terminou?

— Sim, dê o fora daqui, se tem amor à

pele — rugiu Bill.

Antes de se levantar, Concho sorriu com

deboche para Bill e seus amigos. Não sabia

de onde vinha aquela sensação, mas

parecia-lhe que olhava cadáveres, ao olhar

para aqueles homens.

— O que foi, Bill? — quis saber Bob.

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— Esse maldito pistoleiro pensa que me

engana. Espero que fique na cidade e me dê

o prazer de matá-lo.

— O que vocês conversavam?

— James Queeler contratou-o para me

matar.

— Então por que não o liquidamos aqui

mesmo e agora?

— Fique calmo! O xerife e seus ajudantes

acabaram de entrar. Não vamos arrumar

confusão com eles. Venha comigo, Bob. Os

outros continuem o jogo e nos esperem.

— Aonde vamos? — quis saber Bob.

— No caminho eu lhe digo — respondeu

Bill.

Os dois rumaram para o hotel. No

caminho Bill contou a Bob o que Curtis

insinuara. Chegando lá, foram direto para o

quarto de James Queeler.

Bill não estava para delicadezas naquela

noite. Assim que chegou, arrebentou a

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fechadura com um pontapé, entrando de

arma em punho.

Queeler estava deitado, com uma garrafa

de uísque pela metade em suas mãos.

Bill olhou-o com profundo desprezo. O

homem na cama talvez até tivesse medo de

Bill, mas naquele momento, não.

— Maldito bastardo! — vociferou Bill,

agarrando-o pela gola da camisa e

levantando-o da cama.

James estava bêbado demais para parar

em pé.

— Olá, amigo Bill! Há quanto tempo não

vejo esse seu focinho nojento! — falou ele,

com a voz pastosa, visivelmente

embriagado.

— Seu maldito miserável traidor! Cale

essa maldita boca! — ordenou Bill,

esmurrando-o e jogando-o de novo sobre a

cama.

Um filete de sangue escorreu do canto da

boca do bêbado, que olhou Bill com olhos

aturdidos e confusos.

— Que diabos está havendo, homem? —

resmungou Queeler, limpando a boca com

as costas da mão.

— Seu bastardo nojento! Soube que você

contratou um pistoleiro para me matar...

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— Eu não fiz isso... — negou Queeler.

— Você não me engana, James. Vai se

arrepender por isso. Se aquede seu

pistoleiro estiver na cidade ao amanhecer,

eu vou matá-lo. Depois vou contar a toda

cidade quem é você, James Queeler, o

cidadão honesto, o rancheiro honrado, que

vem enganando a todos todo esse tempo —

ameaçou Bill.

Queeler começou a gargalhar

histericamente, aumentando a fúria de Bill,

que levantou-o de novo pelo colarinho da

camisa, esbofeteando-o violentamente.

— Ele nem sabe o que está acontecendo,

Bill. Está bêbado como um gambá...

— Miserável! Pode não saber o que está

acontecendo, mas vai se lembrar disso

amanhã — falou Bill, esmurrando

novamente o rancheiro, derrubando-o no

assoalho.

Não contente ainda, aplicou-lhe mais

alguns pontapés no corpo imóvel e

ensangüentado.

— Eu devia matar esse inútil — disse

Bill, quando chegaram lá fora, na rua.

O pistoleiro estava furioso e ofegante.

Moly estava acabando de chegar. Quando

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viu os dois juntos, seu corpo estremeceu e

seus olhos cintilaram, cheios de ódio.

Achou que poderia aproveitar a chance.

Bob e Bill iam atravessando a rua. Ela fez

seu cavalo empinar, quase derrubando-a.

— Ei, cuidado, moça! — disse-lhe Bob.

Ela saltou do cavalo, como se estivesse

assustada. Os dois terminavam de atravessar

a rua, na direção do saloon.

— Ei, rapaz! — chamou ela, com voz

açucarada. — Poderia me ajudar?

Bob e Bill pararam e se olharam.

— Pois não, moça!

Bob olhou para Bill e piscou um olho

significativamente, enquanto sorria.

— Vê se não demora — disse Bill. —

Temos que terminar aquele jogo e cuidar

daquele pistoleiro.

— Tentarei não me demorar —

respondeu Bob, num tom de voz maroto,

caminhando na direção de Moly, medindo-a

com satisfação e desejo.

Era uma bela mulher a que o chamara,

sem sombra de dúvidas.

— Em que posso ajudá-la, dona?

— Poderia me ajudar a levar este cavalo

até o estábulo? Ele está um tanto indócil

esta noite, não sei que bicho o mordeu. Não

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consigo dominá-lo. Viu como ele quase me

derrubou?

— Sim, parece um animal não muito bem

domado, moça. Devia tomar cuidado com

cavalos assim. Poderá se machucar, o que

seria uma pena — falou ele, pegando as

rédeas das mãos dela.

Olhou-a acintosamente.

— É nova aqui? Acho que não a conheço.

— Mentiroso! Quer dizer que já se

esqueceu de mim? — representou ela,

fazendo charminho.

— Por que diz isso? Tem certeza que já

nos conhecemos?

— Claro que sim. Por que acha que pedi

para você me ajudar, quando o vi

atravessando a rua?

— Sinceramente, não consigo me

lembrar...

— Ora, faça um esforço — insistiu ela,

mas, por mais que ele tentasse ver o rosto

dela em todos os detalhes, era impossível.

As tochas acesas pela rua não eram

suficiente para revelar detalhes. De

qualquer forma, ele estava satisfeito, porque

ela era uma bela moça, sem dúvida.

— Estou falando sério com você.

Confesso que você não é o tipo de mulher

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que se esquece com facilidade — disse ele,

passeando os olhos gulosos pelo corpo dela.

Chegaram ao estábulo. Àquela hora não

havia ninguém lá. Bob sabia disso e Moly

também.

O rapaz ia cheio de alegria com a

promessa de momentos de aventura e

delícias.

Quando entraram, porém, ele se virou e

encarou o cano de uma das armas de Moly.

Seu rosto mudou de expressão.

Um lampião iluminava palidamente o

local. Bob estremeceu, olhando o brilho dos

olhos daquela mulher a sua frente.

— O que significa isso? — indagou ele,

assustado.

— Vocês, bastardos nojentos, têm a

memória muito curta — disse ela. — Não se

lembra mesmo de mim? Ou foram tantas,

que não consegue se lembrar de uma em

particular? — indagou ela, com amargura e

raiva.

— Não sei do que está falando — disse

ele, tentando ganhar tempo.

O tom de voz dela mostrava que ela não

estava para brincadeiras e que parecia odiá-

lo muito.

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— Tente se lembrar, seu animal, de uma

certa noite, em um rancho junto ao Rio

Colorado, há um ano atrás. Você e seus

amigos me conheceram muito bem, de uma

forma que eu não gostei nenhum pouco.

Os olhos dele se arregalaram.

— A filha de Frank Sommer...

— Sim — confirmou ela, destilando ódio

pelo olhar.

— O que quer de mim?

— Matá-lo, seu bastardo.

— Mas eu não tive culpa... Eles me

forçaram...

— Poupe-me de suas mentiras, nojento!

— ordenou ela, desferindo-lhe uma

coronhada no rosto, derrubando-o para trás.

Bob tentou pegar sua arma, mas a ponta

na bota de Moly enterrou-se em suas

costelas, fazendo-o gemer e perder o fôlego

por instantes.

— Não pode fazer isso comigo, moça...

Tem que me dar uma chance... — soluçou

ele, aterrorizado.

O desejo de Moly era enfiar uma bala na

boca do pistoleiro e terminar logo com

aquilo.

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— Você quer uma chance? — indagou

ela, agarrando-o pelo colarinho da caminha

e fazendo-o levantar-se.

Bob cambaleou, atordoado com as

pancadas que recebera. O terror estampava-

se em seus olhos.

— Vire-se — ordenou ela.

— O que vai fazer comigo —

choromingou ele.

— Só vou amarrá-lo e amordaçá-lo para

que não grite.

— Por favor! Por favor! — murmurava

ele, bem baixinho, enquanto se virava.

Moly amarrou-lhe as mãos para trás,

depois amordaçou-o com o próprio lenço

dele.

Ele tremia e soluçava, os olhos

espelhando toda a sua covardia diante da

fúria daquela mulher.

Moly apanhou um laço, pondo-o no

pescoço do pistoleiro. Os olhos dele se

arregalaram ainda mais. Ele se debateu. Ela

engatilhou a arma, pondo o cano entre os

olhos dele.

Ela jogou, então, a ponta da corda sobre

uma vida. Havia uma cadeira ali perto. Ela

puxou-a e fez Bob subir nessa cadeira.

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Ele olhava fixamente para ela,

imaginando o que ela pretendia fazer,

mantendo-se imóvel, com medo de cair ou

de tombar a cadeira.

— Eu poderia fazer como fizeram com

meu pai, brincando com sua morte, mas

minha intenção sempre foi lhes dar uma

morte rápida. De qualquer forma, você é um

homem morto, maldito.

Ela o olhou com profundo desprezo.

Depois apoiou seu pé na cadeira. Os olhos

de Bob quase saltavam das órbitas. Ela

balançava a cabeça de um lado para outro e

gemia.

— Lembranças a satanás — disse ela,

empurrando a cadeira.

Bob ficou dependurado pelo pescoço. O

laço se apertava mais e mais, à medida em

que ele se debatia. Sua língua foi se

estendendo para fora da boca aberta. Seus

lábios foram se arroxeando.

Moly só saiu dali depois que o viu

imóvel. Levou seu cavalo para frente do

hotel. Quando ia entrar, viu Concho saindo

do saloon. Esperou por ele.

— Ainda acordada? — observou ele. —

O que tem feito? — perguntou ele.

— Minha vingança — respondeu ela.

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— Já matou algum deles?

— Dois.

A surpresa estampou-se no rosto dele.

— É uma mulher perigosa, Moly. Quais

deles você já pegou?

— O magricela e o rapaz.

— Onde?

— Um está aqui perto, servindo de

comida para escorpiões. O outro está ali, no

estábulo.

— Perguntou alguma coisa a eles a

respeito do assalto lá no México?

— Não, essa pergunta o último deles vai

responder para você.

— O que vai fazer agora?

— Continuar. Ainda faltam três.

— Deixe-me ajudá-la...

— Não, preciso fazer isso sozinha.

— Vai pegá-los todos esta noite ainda?

— Sim, não passarão de hoje.

— Então isto resolve o meu problema.

Bill Harding me mandou sair da cidade até

o amanhecer...

— Ele estará morto, quando chegar um

novo dia. Eu lhe prometo.

— Quem você vai pegar agora?

— O primeiro que me aparecer pela

frente.

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Antes de continuar, ela foi até o quarto de

Nolan. Gostaria que ele estivesse

participando a vingança, mas isso não seria

possível.

Era melhor que ele ficasse e dormisse.

Ela faria tudo sozinha.

Moly deixou-o e voltou ao saloon. Ficou

num canto discreto do balcão, bebendo

cerveja, enquanto observava as ações de

Bill e seus capangas.

Um pouco mais tarde, os três subiram

para o andar superior, cada um deles

acompanhado de uma mulher.

Ela esperou um pouco, depois seguiu-os.

Estava no corredor, quando a mulher que

estava com o mexicano saiu e desceu para

comprar uísque.

Assim que ela retornou, Moly entrou

junto, segurando-a pelo braço.

— Dê o fora agora, belezoca — ordenou

ela à garota. — Eu fico com ele agora.

A outra olhou-a surpresa.

— Calma, meninas, não briguem por

causa do velho Villas... Ele chega para as

duas. Por que não vêm as duas para cá e

conversamos a respeito disso? — convidou

ele, examinando aquela bela mulher, com

um par de Colts na cintura.

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— Vai me perdoar, querido, mas prefiro

todo para mim — disse Moly, pondo uma

moeda na mão da outra garota.

Esta examinou o valor e, ao ver que era

de ouro, tratou de deixar o quarto

rapidamente.

— Ei, muchacha, você sabe mesmo

convencer as pessoas — disse ele. — Venha

aqui dar uns beijinhos em mim — pediu ele,

olhando-a e dando a entender que estava

bêbado.

— Fique calmo, por enquanto. Antes

preciso que você me olhe bem e me diga se

me conhece — pediu ela.

— Claro que não! Eu jamais esqueceria

uma mulher tão bonita — afirmou ele,

sentando-se na cama.

Seu cinturão estava sobre uma mesa,

atrás de Moly. O mexicano ficou olhando

para ela com um sorriso estúpido nos lábios.

— Tem que me reconhecer, Villas —

disse ela, olhando-o nos olhos.

— Por que não vem mais perto? Estou

bêbado, não consigo vê-la direito.

Ela se aproximou um pouco mais. O

mexicano não tirava os olhos dela.

— E então? — insistiu ela.

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Ela balançou a cabeça de um lado para

outro, como se desistisse de tentar

adivinhar.

— Não, eu não me lembro... Jamais

esqueceria uma mulher que carrega duas

armas...

— Tente! Naquele tempo eu não usava

estas armas — falou ela, aproximando-se

um pouco mais.

Inesperadamente ele estendeu a mão,

segurando-a pelos pulsos, girando-a e

fazendo-a cair sobre a cama.

O peso de seu corpo e suas mãos nos

pulsos dela mantiveram-se imóvel. Ele a

encarava bem de perto.

— Como eu poderia esquecer você,

beleza? Por que todo esse mistério? Quem é

você, afinal? O pistoleiro de James Queeler

contratou para nos matar? Ouvi falar sobre

você lá no saloon. Uma mulher que usa

duas armas e que matou Francis Beater cara

a cara... É difícil de acreditar...

— Devia me reconhecer, seu bastardo!

Há um ano atrás... — disse ela, ofegante.

— Não sei quem é, moça, mas não estou

gostando do seu jeito — disse ele, socando-

a no queixo com força.

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Os olhos de Moly reviraram e ela lutou

para não desmaiar. Villas soltou-a para

tirar-lhe as armas e jogá-las para o lado.

Ela aproveitou para retirar uma faca de

sua bota. Ele se deitou de novo sobre ela.

— Agora vai me dizer quem é ou vai se

arrepender, garota — disse ele,

raivosamente.

Em resposta ela o agarrou pelo pescoço,

puxando a cabeça dele para junto dela.

Colou sua boca ao ouvido dele.

A faca pressionou a garganta do

mexicano, que estremeceu.

— Sou a filha de Frank Sommer — disse

ela, girando o corpo e fazendo a lâmina

deslizar pela garganta dele.

Os olhos de Villas se arregalaram,

enquanto ele tentava estancar o sangue que

jorrava de suas veias cortadas. Tentou dizer

alguma coisa, mas apenas sons roucos

saíam e sua garganta.

Ele caiu de joelhos diante dela, já sem

força. Ela chutou a cabeça dele, jogando-o

para trás.

O corpo dele estremeceu, depois ficou

imóvel.

Ela cambaleou, apoiando-se na parede.

Ficou ali, recuperando-se. Aquele soco que

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levara deixara-a mesmo atordoada. Ficou

olhando aquele corpo imóvel, banhado de

sangue.

Já liquidara três deles. Ainda faltavam

dois e ela precisava agir rapidamente, mas

se sentia muito cansada. Trancou a porta e

achou que poderia descansar um pouco.

Os dois que sobravam estavam nos outros

quartos, divertindo-se com as mulheres.

Seria bom esperar que eles bebessem mais e

se cansassem.

Assim não teria problemas para enfrentá-

los. Lentamente seu corpo foi escorregando

pela parede e ela se sentou. Cobriu o rosto

com as mãos para não ver a máscara de dor

e pavor no rosto do cadáver a sua frente.

A vingança era algo terrível. Odiava

aqueles homens pelo que haviam feito.

Olhando-os depois de mortos, parecia que

eles haviam perdido muito mais do que ela.

Bateram discretamente na porta,

sobressaltando-a.

— Quem é? — indagou, após apanhar

seus revólveres.

— Sou eu, Dan. O que está fazendo aí?

Abra esta porta, Moly! — intimou ele.

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Ela não sabia até que ponto podia confiar

nele, mas não tinha escolha. Pelo menos ele

não estava fazendo barulho.

Com as armas nas mãos ela destrancou a

porta. Saiu, antes que Dan visse o que havia

lá dentro.

— Deus do céu, Moly! Vai nos complicar

a todos. O que está fazendo, mulher?

— Estou pegando-os um por um, Dan.

Aqui dentro está o mexicano. Faltam dois.

— Diabos! Você é mesmo um demônio.

Olhe como está? O que foi isso em seu

queixo?

— Uma carícia de nosso amigo

mexicano...

— Venha para baixo. Precisa de um

drinque. Vou fechar este quarto para que

ninguém entre, até que tenha feito o que

veio fazer aqui — disse ele.

— Como me descobriu?

— A garota que ocupa o quarto foi me

procurar para dizer que algo estranho estava

acontecendo. Quando me disse o que era,

imaginei que fosse você.

Levou-a para baixo e deu-lhe um uísque.

O movimento do saloon havia diminuído

muito. Apenas os bêbados ou os vaqueiros

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que esperavam um amigo que festejava com

uma garota.

— Obrigado por sua gentileza, Dan...

Pode me fazer mais um favor?

— Se estiver ao meu alcance...

— Deixe-me dormir um pouco, depois

me acorde, quanto todos forem embora e

você for fechar o saloon...

Ele pensou por instantes. Sabia o que ela

fazia. Nolan havia lhe contado.

— Por favor! — suplicou ela.

— Está bem, mas se alguém disser que eu

a ajudei, eu nego, está certo? Poderá ser

enforcada por isso... — decidiu-se ele,

afinal.

Moly julgou que tivesse dormido horas.

Acordou assustada, quando Dan tocou-lhe o

ombro.

— Todos já foram? — indagou ela.

— Sim, o saloon já está fechado. O que

quer fazer?

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— Como é o nome do homem que está lá

encima, além de Bill?

— Ted Canton.

— Quem é ele? O que gosta de fazer?

— Se há algo que ele gosta mais de fazer

é jogar. É um verdadeiro fanático por isso.

— Preciso tirá-lo lá de cima, sem alertar

Bill. Acha que pode levar um recado para

esse Ted?

— Bom, não vejo nenhum problema

agora.

— Vá lá e diga que vai haver um jogo

realmente pesado aqui embaixo e que estão

a espera dele. Faça isso com cuidado, para

não alertar Bill.

— Deixe comigo. Pretende matá-lo aqui?

— Não, tenho uma idéia melhor — disse

ela, olhando os baralhos encima das mesas.

Foi até lá e apanhou-os, separando as

cartas, até ter um maço.

— Para que isso? — estranhou Dan.

— Eu vou jogar contra ele e pretendo

ganhar — afirmou ela. — Pode ir até lá

avisá-lo?

Dan subiu imediatamente, indo até o

quarto ocupado por Ted. Deu-lhe o recado

sem maiores problemas, descendo em

seguida.

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— Já vai descer — avisou a Moly.

Momentos depois, Ted descia a escada,

ainda vestindo sua camisa, olhando

ansiosamente para os lados.

— Onde é o jogo, Dan? — indagou ele,

estranhando que o local estivesse vazio.

— Aqui — disse Moly, apontando-lhe

uma arma e pegando-o de surpresa.

— Que diabos é isso? — indagou ele. —

Dan, você quer me explicar o que está

havendo?

— Ela quer jogar com você, Ted.

Ted virou-se para olhar a mulher que o

desafiava.

— E então, moço, concorda em jogar

comigo?

— Sim, mas...

— Só que em um outro lugar.

— Por quê?

— Para que possamos jogar

tranqüilamente, sem que ninguém nos

importune. Deixe cair seu cinturão, Ted —

ordenou ela.

Ted não entendeu aquilo, mas obedeceu.

Moly empurrou-o na direção da porta.

Saíram para a rua deserta, àquela hora da

madrugada. Moly apanhou seu cavalo. O de

Ted estava diante do saloon.

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— Onde será esse jogo? — indagou Ted,

ainda sem entender, montando seu cavalo.

— Não muito longe daqui — disse ela.

— A caminho. Pode tomar a estrada que

deixa a cidade. Há um bosque, há duas

milhas.

— Sei onde é... É lá que vamos jogar? O

que há lá?

— Fique calmo, lá você saberá tudo —

disse ela.

— Você é maluca mesmo, sabia? Eu não

sei o que eu estou fazendo aqui, deixando

que você me leve assim.

— Cale-se e cavalgue — ordenou ela.

Moly levou-o para o mesmo lugar onde

executara Chad. Quando lá chegaram, ela

ordenou que ele reunisse lenha para acender

uma fogueira.

— Vamos jogar aqui? Está frio...

— Por isso a fogueira, idiota.

— Podíamos ter jogado lá na cidade

mesmo...

— Não discuta e faça o que estou

mandando — insistiu ela.

A fogueira foi acesa. Momentos mais

tarde, ela iluminava o local. Ted virou-se e

olhou ao redor, então. Soltou um grito de

terror, quando viu o corpo de Chad todo

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retorcido, agora também coberto de

formigas.

— O que está havendo aqui? — indagou

ele, com terror nos olhos, encarando-a.

— Sente-se aí — ordenou ela, friamente.

Ted tremia, olhando a todo momento para

trás, para o cadáver de seu amigo.

Moly retirou um baralho do bolso e

começou a embaralhá-lo lentamente,

olhando o pistoleiro nos olhos.

— Você me conhece? — indagou ela.

— Não... Nunca a vi antes...

— Mentira! Você não só já me viu antes,

como também já me tocou, seu miserável

— disse ela, entredentes.

— Você? Não, deve estar enganada... Foi

outro... Tenho certeza que não a conheço

e...

— Sou Moly Sommer — falou ela.

Ele interrompeu-se para olhá-la

detidamente.

— Moly Sommer? A filha de Frank

Sommer?

— Sim, eu mesma.

Uma expressão de medo e terror

estampou-se no rosto dele. Ted tentou dizer

alguma coisa, mas só soube começar a

chorar.

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— Não, por favor! Não pode me matar a

sangue-frio... Tem que entender...

— Não vou matá-lo sem lhe dar uma

chance, Ted. Sei que é um jogador. Aqui

está o baralho. Retire uma carta. Se for

naipe vermelho, você morre. Se for preto,

você está livre.

Ele parou se soluçar, olhou para ela e

depois para o baralho na mão dela.

— Quem me garante que...

— Quais são as suas chances sem isso,

Ted?

Ele pensou por instantes, sem conseguir

agora desviar os olhos do baralho.

— Se eu tirar uma carta preta, você me

deixará ir embora?

— Sim, foi o que eu disse. Tire uma

carta, Ted. Vermelho e você morre. Preto e

você vive.

— Se eu sair dessa com vida, você vai

me pagar por isso, entendeu?

— Arrisque sua sorte, Ted — insistiu ela.

Ted apanhou uma das cartas, virando-a

de uma vez na relva. O horror estampou-se

em seu rosto, ao ver que era uma carta

vermelha.

— Não, não me mate! Tem que me dar

uma segunda chance. Veja, vou tirar uma

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carta preta agora — suplicou ele, pegando o

baralho da mão dela.

Estava trêmulo e apavorado. O baralho

caiu, espalhando as cartas. A incredulidade

tomou conta de seu rosto.

— Maldita trapaceira! — murmurou ele,

olhando-a. — Você me enganou. Todas as

cartas são vermelhas.

— Nem o demônio poderia salvá-lo

agora de minha vingança — falou ela.

Ted tentou se levantar e correr. Moly

disparou certeiramente, pegando-o na

espinha e jogando-o sobre o cadáver de

Chad.

— Não! — gritou ele, tentando se

arrastar, mas sentindo seu corpo imobilizar-

se.

As formigas subiram em seu corpo,

atraídas pelo cheiro de sangue fresco. Ele

começou a gritar, quando as primeiras

picadas começaram a lanhar sua pele.

Moly aproximou-se. O olhar dele era o de

um animal ferido e sofrendo. Ela engatilhou

a arma e apontou para a testa dela. De

qualquer forma, as formigas não iriam

perder o banquete daquela noite.

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Moly amarrou seu cavalo diante do hotel

e entrou. O rapaz da portaria dormia

pesadamente. Ela subiu as escadas e foi até

o quarto onde Concho dormia.

A porta não estava trancada. Ela entrou e

acendeu o lampião, acordando-o.

— É você, Moly? — indagou ele,

esfregando os olhos.

— Sim, Concho. Acho que chegou a

hora.

— Terminou seu trabalho?

— Só falta o chefe deles.

— Você é um demônio em forma de

mulher, Moly — afirmou ele, sentando-se

na cama.

— Puseram um demônio em mim,

quando invadiram nosso rancho.

— Há uísque sobre aquele móvel. Tome

um gole. Você está horrível.

Ela não discutiu. Foi até lá e apanhou um

copo, servindo uma dose generosa. Tomou-

o de um só gole, depois foi se sentar na

cama, ao lado de Concho.

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— Não vejo a hora disso tudo terminar.

Acho que preciso dormir uma semana —

falou ela, visivelmente cansada com toda

aquela tensão e movimentação.

— Matou quatro homens — comentou

ele, com admiração.

— Sim, e confesso que não tive pena de

nenhum deles, Concho. Sinceramente.

— Fizeram por merecer.

— Nisso você pode apostar.

— Vamos pegar Bill Harding agora?

— Sim...

— Vou me trocar.

Enquanto ele se vestia, ela caiu para trás,

na cama, desejando poder fechar os olhos e

esquecer todo aquele pesadelo.

Pouco depois atravessavam a rua para

entrar pelos fundos do saloon. Uma escada

levava ao andar superior, onde estavam os

quartos das garotas.

Em breve o dia amanheceria. Para os

lados do nascente o céu já começava a

clarear ligeiramente.

— Silêncio, não quero alertar ninguém —

disse Moly, enquanto os dois subiam

cuidadosamente a escada.

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Entraram pelo corredor. Foram

examinando com cautela os aposentos,

abrindo portas com extremo cuidado.

— É ele! — cochichou ela.

Os dois entraram. Bill dormia

placidamente com uma das garotas do

saloon.

— Acorde, escória! — ordenou Moly,

batendo com o cano do revólver no nariz do

pistoleiro.

Bill saltou da cama agilmente, entre

acordado e dormindo, levando a mão ao

cinturão que deixava dependurado na

cabeceira da cama e que Concho

precavidamente havia retirado.

— Que diabos... — ia reclamar ele, mas

Concho prostrou-o de joelhos ao atingí-lo

no estômago com uma coronhada de sua

arma.

A garota junto com ele gritou assustada,

enrolou-se num lençol e ficou olhando

aterrorizada para Moly.

— Está tudo bem, garota! — disse ela. —

Saia daqui e esqueça o que viu — ordenou.

— Sim, já esqueci... já esqueci... — foi

repetindo ela, enquanto saía porta a fora.

Concho jogara as roupas de Bill para o

pistoleiro vestir-se.

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— O que querem comigo? — indagou o

pistoleiro, intimidado.

Moly olhava-o com profundo rancor. Era

o último a morrer e sua vingança estaria

completa.

— Eu só quero conversar com você —

respondeu Concho, fazendo um gesto para

que Moly trancasse a porta do quarto.

Quando ela fez isso, o agente mexicano

guardou sua arma e se aproximou de Bill,

que terminava de abotoar a camisa.

— Vou lhe fazer algumas perguntas e

confesso que não estou com muita

paciência.

— O que quer?

— Onde está o dinheiro?

— Que dinheiro? — respondeu Bill.

— O dinheiro do assalto — explicou

Concho, aplicando um murro no rosto de

Bill e jogando-o contra a parede.

— Espere, homem... Não sei do que está

falando...

Não terminou de dizer o que pretendia.

— Bastardo! Assassino! — rugiu

Concho, desferindo um certeiro pontapé que

quebrou o nariz do pistoleiro e o fez engolir

alguns dentes.

Seu rosto ficou lambuzado de sangue.

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— Eu não sei nada sobre assalto —

choromingou ele e novo pontapé atingiu-o

no estômago, fazendo-o contorcer-se no

assoalho como um verme.

— Falo do assalto ao trem, lá no México.

— Quem é você?

— Agente do Governo do México.

— Não me fará falar — falou Bill,

cuspindo sangue.

— Talvez nem precise — disse Concho,

começando a examinar as coisas de Bill,

espalhadas pelo quarto.

Encontrou um alforje sob a cama.

Despejou o conteúdo sobre a cama,

conferindo-o.

— Acho que a maior parte do roubo está

aqui — afirmou, voltando a guardá-lo. — O

restante eles devem ter gastado. Agora é

com você, Moly.

— Quem diabos é você agora? —

indagou ele a Moly.

A garota aproximou-se, sentindo o

sangue ferver em suas veias.

— Olhe para mim, bastardo! Não se

lembra de mim?

— Deveria? — retrucou ele, limpando o

sangue que escorria de seu rosto.

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Havia ódio e desprezo em seu tom de

voz.

— Olhe bem! — intimou ela.

— Você me parece com qualquer uma

das vagabundas com quem já dormi —

falou ele, com profundo rancor.

Moly lutou para manter-se calma. Sacou

sua arma, engatilhou-a e apontou-a para a

cara de Bill.

— Espere, Moly. Não pode matá-lo a

sangue-frio assim...

— Posso, Concho. E como posso...

— Alguém pode me explicar o que está

acontecendo aqui? Quem é essa mulher? —

indagou Bill, confuso e amedrontado.

— Cale-se, rato imundo! — ordenou a

garota, derrubando-o com uma coronhada.

— Não me maltrate — pediu Bill,

acovardado. — Por que você quer me

matar? Eu nada fiz para você... Alguém

pode me dar uma resposta? — indagou,

olhando para o agente mexicano.

— Pergunte a ela — disse Concho.

— Que espécie de maluca é você, afinal?

— suplicou o pistoleiro.

— Se tivesse alguma coisa de humano e

inteligente em sua carcaça já teria

descoberto. Mas não passa mesmo de um

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imundo rato de esgoto — afirmou ela, com

desprezo.

— Se vou morrer, exijo uma explicação...

Quero saber pelo menos por que morro...

— Olhe bem para mim... A sua resposta

está aqui, em meu rosto. Não se lembra?

— Diabos, mulher! O que a faz tão

especial assim?

— Há um ano atrás — disse ela,

sinistramente.

O pistoleiro reagiu como se tivesse

levado um choque. Recuou, olhando melhor

o rosto da garota.

— A filha de Frank Sommer — falou,

num fio de voz.

— Sim, e estou aqui para me vingar...

— Será assassinato. Você será enforcada

por isso. Temos leis... Meus homens me

vingarão... Você pagará por isso...

— Estou pouco me lixando para as leis.

Elas não protegeram nem a mim nem a meu

pai. Quanto a seus amigos, estão todos

mortos...

— Como? — indagou ele, pateticamente.

— Eu os matei.

Bill ficou olhando para ela, depois caiu

de joelhos e começou a soluçar. Pressentia

que sua vida estava chegando ao fim.

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— Espere... Espere... — disse,

sofregamente, arrastando-se até os pés de

Moly, que ergueu a armar para dar-lhe outra

coronhada.

— Não, espere — pediu Concho,

detendo-a. — O que quer? — indagou a

Bill.

— Faço um trato com vocês...

— Um trato? Que tipo de trato? —

indagou Moly, com repulsa por aquele

homem caído a seus pés.

— Eu digo o nome dele...

Moly olhou para Concho, sem entender.

— Nome de quem? — quis saber ela.

— Do homem que nos pagou para matar

seu pai.

Moly hesitou, aturdida. Jamais, em todo

aquele tempo em que ela e Nolan

prepararam a vingança eles haviam pensado

naquilo. Só que havia lógica. Por que

homens como Bill e seus capangas teriam

matado seu pai, senão por dinheiro?

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Moly estava atônita, sem saber como

reagir diante daquela revelação inesperada.

Durante todo aquele tempo, preparara-se

para aquela vingança e, agora, descobria

que não estava punindo os verdadeiros

culpados.

Bill pressentiu que aquela poderia ser a

sua única chance de sair com vida dali.

— Você tem que acreditar em mim... Nós

fomos apenas o instrumento... O verdadeiro

culpado é o homem que nos pagou para

matar seu pai... Ele, sim, odiava seu velho...

Para nós foi negócio, nada pessoal... Eu

lamento o que houve com você...

Sinceramente... — foi dizendo ele,

confundindo a garota, que olhou para

Concho, buscando apoio.

O agente mexicano não sabia como

ajudá-la naquele momento tão difícil para

ela.

— O nome dele... Dê-me o nome dele —

exigiu ela, voltando a apontar a arma para a

cabeça de Bill.

— Só se prometer não me matar — disse

ele, trêmulo de medo ainda, olhando nos

olhos dela e buscando neles uma esperança

de vida, por menor que fosse.

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Moly voltou a olhar para Concho.

— Acho que é um trato justo, Moly —

ponderou ele. — Mas a decisão é sua... No

fundo, acho que Bill tem razão, apesar de

considerá-lo um crápula e um assassino. Ele

apenas puxou o gatilho. Quem pôs a arma

na mão dele é mais culpado do que ele.

— Está bem — concordou ela, num fio

de voz.

— E quem vai me garantir que você não

me matará depois que eu disser o nome

dele?

— Eu garanto a palavra dela — afirmou

Concho.

O pistoleiro refletiu por instantes. Aquela

era sua única chance e ele tinha que arriscá-

la.

— De acordo... Eu aceito a oferta. O

nome dele é Queeler, James Queeler, um

rancheiro...

— Eu o conheço... sim, eu o conheço —

afirmou a garota, depois começou a rir.

— E agora? O que foi? — indagou Bill,

confuso.

— É irônico, muito irônico — disse ela.

— Do que está falando?

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— James Queeler me pagaria cinco mil

dólares para matar você e seus capangas,

Bill...

— Então... Então era você, o pistoleiro

que Curtis mencionou. Uma mulher... Eu

julguei que fosse você — falou ele, olhando

para Concho. Vão cumprir a promessa? Vão

me deixar ir embora livre, não vão?

— Sim, claro que sim — afirmou

Concho.

Bill não esperou a confirmação da parte

de Moly. Terminou de se vestir

rapidamente.

— Posso levar a minha arma? — indagou

ele.

— Sim, tome — respondeu o agente

mexicano, retirando as balas do Colt e

devolvendo-o com o cinturão para o

pistoleiro. — Só não o carregue aqui dentro

— ordenou.

Bill saiu rapidamente e, enquanto descia

a escada, foi recarregando sua arma. Queria

apanhar seu cavalo e dar o fora dali o mais

depressa possível.

No interior do quarto, Moly ainda estava

surpresa com aquela reviravolta em seus

planos.

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De repente, rompendo o silêncio da

madrugada que chegava ao fim, ouviu-se o

estampido de um revólver, seguido do

estouro de um rifle de grosso calibre.

Moly estremeceu.

— Nolan! Meu Deus, é Nolan! — gritou

ela, deixando o quarto e rumando para a

escada.

Quando chegou à rua, a tragédia estava

consumada. Bill Harding jazia quase partido

ao meio pelo projétil violento do rifle.

Nolan estava caído de joelhos, junto ao

corpo do bandido.

Uma de suas mãos tentava estancar o

sangue que escorria de seu peito.

— Eu peguei o maldito, Moly... Eu o

peguei... — murmurou, antes de tombar nos

braços dela.

Moly sentou-se na poeira, pondo a cabeça

do velho em seu colo.

— Oh, não, Nolan! Por favor, não me

deixe sozinha! — pediu ela.

Concho surgiu, vindo do saloon. Ao ver a

cena, lamentou a morte do velho.

O xerife surgiu logo depois, com o sono

ainda estampado no rosto.

— Que diabos houve aqui? — indagou.

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— Bill atirou nele. Ele respondeu,

disparando o rifle. Eu não queria que isso

tivesse acontecido... Pobre Nolan! Merecia

uma morte mais digna.

— Pelo menos ele morreu lutando, como

sempre viveu — afirmou o xerife.

Moly deixou o corpo do velho escorregar

para a rua. Levantou-se e enxugou os olhos

cheios de lágrimas. Examinou suas armas,

depois começou a caminhar na direção do

hotel.

— Aonde vai? — indagou Concho.

— Ao hotel — disse ela.

— Depois eu preciso falar com você —

alertou-a o xerife.

Concho sabia qual era o destino dela.

— O que vai fazer? — indagou ele,

detendo-a na entrada do hotel.

— Vou matar o homem que foi o

responsável por tudo isso — disse ela, com

decisão.

— Vou com você — decidiu ele.

Foram até o quarto de James Queeler. A

porta estava apenas encostada, já que a

fechadura havia sido estourada naquela

noite.

Moly entrou, examinando o homem que

dormia, curtindo sua bebedeira.

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A luz do dia começava a entrar

lentamente pela janela. Ela inclinou-se

sobre James e esbofeteou-o.

— Acorde, maldito! Acorde para morrer!

— disse ela, furiosa.

Queeler acordou espantado, ainda

atordoado pela bebida, olhando ao seu

redor, tentando se situar.

— Oh, é você... O que faz aqui?

— Vim lhe dizer que os homens que você

queria mortos já eram. Não sobrou

nenhum...

— Oh, graças a Deus! — afirmou James,

procurando pela sua garrafa de uísque.

Quando a encontrou e ia levá-la aos

lábios, Moly tomou-a.

— Por que diabos fez isso? — assustou-

se ele.

— Maldito! — rugiu ela, atirando a

garrafa contra a parede e quebrando-a.

James encolheu-se todo, intimidado com

aquele olhar cheio de ódio.

— Olhe para mim! — ordenou ela.

James cobrira o rosto com as mãos.

— Olhe para mim, seu rato imundo —

gritou ela, tirando as mãos dele da cara.

Ele a olhou intimidado.

— Sabem que eu sou?

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— Uma mulher que usa armas...

— Sabe meu nome?

— Não, ainda não...

— Meu nome é Moly Sommer...

A primeira expressão que passou pelo

rosto dele foi de surpresa. Depois de

espanto. Finalmente, de horror. Ele foi

recuando, até cair sentado na cama.

Arrastou-se, indo encolher-se junto à

parede.

— Você... Você é a filha de Frank

Sommer...

— Sim, a filha de Frank Sommer, o

homem que você mandou matar, seu

canalha.

— Eu não sabia — murmurou ele, num

fio de voz quase demente.

— Eu só queria entender o motivo... Por

quê? Por quê? — gritou ela, fora de si.

Por momentos ele ficou encolhido.

Depois, como se compreendesse que nada

daquilo o livraria do castigo que se

apresentava a ele naquele momento,

encarou a garota com coragem.

— Seu pai era um assassino — declarou

ele.

— Mentiroso!

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— Sim, seu pai era um assassino barato

como Bill Harding e seus capangas.

— Não acredito em você... — disse ela,

desesperada, com a arma na mão, não

sabendo se atirava ou não nele.

Não estava preparada para odiar aquele

homem, assim como não estava preparada

para a terrível verdade.

— Vamos, pergunte alguém que o

conheceu...

— Que mal meu pai lhe fez? — soluçou a

garota, sentindo que as lágrimas brotavam

de seus olhos, nublando-lhe a visão,

tirando-lhe o raciocínio.

— Seu pai matou meu filho... Meu único

filho...

— Oh, não — soluçou ela, sentindo-se

abalar.

— Sim, é verdade... Não tenho motivos

nenhum para mentir... Seu pai o matou na

minha frente, sem que eu pudesse evitá-lo...

— Mentira... Ele está mentindo,

Concho... Faça-o parar, por favor — pediu

ela, engatilhando a arma e apontando-a para

Queeler.

— Mão faça isso, Moly... Acho que já

houve muita incompreensão e violência na

vida de vocês dois... O melhor agora é

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esquecer tudo que aconteceu... — disse

Concho, tomando gentilmente a arma da

mão dela.

— É um bom conselho o dele — disse

Curtis, entrando no quarto naquele

momento, com uma arma na mão.

— Fale com ela, Curtis. Conte-lhe como

o pai dela matou meu único filho... —

soluçou James.

— Sim, James tem razão, garota. É tudo

verdade. Sabe como sei tudo isso? —

indagou ele, mantendo a arma engatilhada,

para surpresa de Concho e Moly.

— Porque você sempre foi o meu melhor

amigo, Curtis...

— Você sempre foi mesmo um idiota,

James. Eu nunca fui seu amigo. Sempre

desejei seu rancho, desde que cheguei aqui.

Eu paguei Frank Sommer para matar seu

filho e deixá-lo sem herdeiro.

O rosto de James indicou surpresa, a mais

terrível e trágica das surpresas.

— Você fez isso, Curtis?

— Sim, eu fiz isso. Depois o convenci a

mandar Bill liquidar Frank. Por quinze aos

eu tentei comprar aquele maldito rancho e

você não quis vendê-lo. Convenci Bill a

extorquí-lo e deixá-lo arruinado como

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último recurso para comprar aquele maldito

rancho. Você transformou isso numa

obsessão para mim, James. Uma maldita

obsessão.

— Seu maldito! — disse Concho,

fazendo um movimento.

— Não tente nada, rapaz. Vai ser uma

bela farsa, quando o xerife chegar aqui.

Direi que vocês mataram Queeler e que eu

os surpreendi, matando-os também.

— Não deixarei que faça isso — gritou

Queeler, avançando contra ele.

Curtis desviou-se e golpeou a cabeça do

outro, derrubando-o.

— Não resistam. Só vão retardar as

coisas e tornar tudo mais dolorido — disse

Curtis. — Ponham-no na cama.

Concho e Moly atenderam. Concho ficou

esperando uma pequena distração de Curtis

para reagir. Moly estava por demais abalada

para qualquer reação.

— Agora obedeçam minhas ordens. Sem

nenhum movimento em falso, tirem suas

armas e joguem-nas para mim... Sem

besteiras. Primeiro a garota, depois você —

ordenou.

Os dois não tiveram outra alternativa,

senão concordar.

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— Agora quero-os de costas para mim.

Os dois obedeceram.

— Desculpe-me tê-lo metido nisso —

disse a garota ao agente mexicano.

— Esqueça! São azares do ofício — falou

ele e Moly viu, surgindo pela manga da

camisa dele, no punho direito, a ponta de

uma lâmina.

Ele piscou um olho para ela,

tranqüilizando-a.

— Calem a bocas. Podem encomendar

suas armas ao diabo — disse Curtis,

apontando a arma para Queeler, atordoado

sobre a cama.

— Primeiro ele, depois vocês dois —

disse, apertando o gatilho e fulminando

Queeler.

Concho agiu rapidamente. Aproveitou-se

da fumaça para empurrar Moly para o lado,

mas Curtis reagiu, disparando contra ele. O

policial gemeu e caiu sobre a cama.

— Agora é sua vez, sua cadela — disse

Curtis, apontando a arma para Moly.

A garota, após ser empurrada por

Concho, teve tempo de sacar a sua faca, que

trazia oculta na bota.

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— Sua hora chegou — falou ela,

arremessando a faca, da forma como Nolan

havia ensinado.

A lâmina afiada entrou pela garganta de

Curtis, bloqueando sua respiração.

Surpreso, ele recuou alguns passos,

deixando cair sua arma para segurar o cabo

da faca e tentar tirá-la.

No momento seguinte, a faca atirada por

Concho, mesmo ferido, atravessou o quarto

e foi cravar-se no peito do traidor.

Seus olhos esgazearam-se e ele tombou

para trás, caindo pesadamente no assoalho.

Moly ergueu-se para ver o que havia

acontecido com Concho, que sangrava à

altura do ombro.

— Não se preocupe, não foi mortal —

assegurou ele.

A figura do Xerife Burton recortou-se na

moldura da porta, com uma arma

engatilhada na mão.

— Eu não acredito... Vocês dois de

novo? Que diabos está acontecendo aqui?

— Acho que foi um ajuste de contas,

xerife — murmurou Concho.

— Parece que vocês dois se meteram em

confusões demais para uma só noite. Ou

têm uma boa explicação para isso, ou eu

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juro como vão dançar juntos na ponta de

uma corda.

— É uma longa história, xerife.

— Eu não vou a lugar nenhum e o dia

está apenas nascendo. Acho que teremos

todo o tempo do mundo — disse ele, após

verificar que James Queeler estava morto,

assim como Curtis Lampblack.

— Primeiro vamos cuidar de Concho.

Tem um belo buraco no ombro.

— Certo, depois vocês me contam tudo

sem perder um detalhe. A vida de vocês

dependerá disso.

Durante quinze dias, Concho havia ficado

sob os cuidados de Moly, no rancho dela, à

margem do Rio Colorado. A garota

pendurara suas armas e percebera que a

vingança era um erro, porque cegava as

pessoas.

Perdera seu pai por causa dela, além do

bom amigo Nolan, que lhe fazia muita falta

agora.

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Apesar de pequeno, havia muita coisa a

ser feita no rancho. Logo que chegara lá,

Concho havia escrito uma carta para o

governo mexicano, relatando o que

acontecera e a colaboração inestimável do

xerife de Tucson para uma solução

favorável.

Assim, foi com surpresa que, numa certa

manhã, Moly viu um grupo de cavaleiros se

aproximando.

— É o Xerife Burton, não?

— Sim, com uma companhia de "rurales"

mexicanos.

— Vieram buscar o ouro?

— Sim e a mim também, com certeza.

A garota olhou-o chocada. Percebeu,

então, que aqueles dias agradáveis que

haviam passado juntos podiam estar

terminando.

— Você... Você vai embora? — indagou

ela, num fio de voz.

— Sim, tenho o meu trabalho e...

Ela não sabia o que dizer. Apenas olhava

para ele, com olhos tristes, que começaram

a se encher de lágrimas.

— Só que estou cansado de tanto servir

de alvo... Tenho economizado um

pouquinho... Receberei uma pequena

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recompensa por recuperar o ouro para o

governo... Pensei em me estabelecer... Não

está precisando de um sócio? — indagou

ele.

— Fala sério?

— Nunca falei tão sério em minha vida

— disse ele, arrancando a tipóia do braço e

abraçando a garota.

Os cavaleiros que chegavam não entendia

o que faziam aqueles dois, beijando-se

como dois idiotas, enquanto um grupo de

visitantes se aproximava.

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L P Baçan O Mago das Letras

1975: escreveu e publicou seu primeiro

livro de bolso, a novela Uma Tese

para o Amor, pela Editora Cedibra,

Rio de Janeiro, passando, daí, a

escrever mensalmente novelas por

encomenda para essa e outras

editoras.

1985: teve 11 letras incluídas no LP

Saudação ao Mato Grosso, da dupla

Estudante & Caminhoneiro.

1986: teve 6 letras incluídas no LP

Oração de Um Caminhoneiro, da

mesma dupla.

1991: participou da Coletânea do I

Concurso Nacional de Literatura da

FENAE, com um conto premiado

em 1º. lugar.

1994: participou da Antologia Os Poetas,

do V Concurso Helena Kolody de

Poesia, Governo do Paraná, Curitiba

– PR.

1995: traduziu a obra El Contuberneo

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Judeo-Maçónico-Comunista, de José

Antonio Ferrer Benimelli, em 2

volumes intitulados Maçonaria &

Satanismo, para a Editora "A

Trolha".

1996: publicou a novela rural Sassarico,

sobre o fim do ciclo do café, início

da rotação de culturas (soja e trigo)

e surgimento dos bóias-frias e editou

os livros Vida Minha, de Emília

Ramos de Oliveira (biografia) e

Círculo Vicioso, de Arlene Cirino de

Oliveira.

1997: participou da coletânea Poema,

Poesia... Maçom, Maçonaria,

organizada por Mário Cardoso para

a Editora Arte Real.

1998: publicou o livro de poemas

Alchimia.

1999: publicou o livro Redação Passo a

Passo e editou o livro URAÍ - Nossa

Terra, Nossa Gente, 2 volumes, de

Emília Ramos de Oliveira.

2000: teve 2 letras incluídas no CD

Nosso Negócio É Cantar, da dupla

Márcio Rogério & Luciano e 3 letras

no CD Mais, do cantor Cícero de

Souza. Publicou, neste ano de 2000,

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Brincando nos Caminhos do Senhor,

revista infantil cristã, Editora e

Gráfica Cotação da Construção,

Londrina – PR.

2001: editou e prefaciou o livro

Templários, de Lori Andrei Perez

Baçan.

2002: foi o autor da letra do hino da Loja

Maçônica Londrina, em parceria

com o músico Wilmar Cirino.

2004: organizou, editou e participou do

livro I Antologia do Portal "Cá

Estamos Nós".

2006: organizou, editou e participou do

livro II Antologia do Portal "Cá

Estamos Nós".

2007: publicou os livros A Sabedoria dos

Salmos, A Sociedade Secreta dos

Templários e O Livro Secreto da

Maçonaria, pela Universo dos

Livros Editora Ltda.

2010: publicou os livros Manual da

Futura Mamãe, Quem Disse Que

Cozinha Não è Lugar de Homem e

Receitas Naturais pela editora

Universo dos Livros. Editou o livro

de contos Solidariedade, do autor

baiano João Justiniano da Fonseca.

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Produziu, dirigiu e apresentou uma

série de 7 (sete) programas

radiofônicos Vila das Artes, na

Rádio Boa Nova FM, de Pérola, PR,

sobre literatura atual.

2012: traduziu, editou e publicou o livro

A Origem do Satanismo na

Maçonaria, de Arthur Edward

Waite.

2013: traduziu, editou e publicou em

formato eletrônico os livros Carmila,

de J Sheridan LeFanu, e Teoria da

Esgrima a Cavalo, de Alex Muller,

Anjos, o Caminho de Volta, Os Olhos

do Carrasco, Novelas de Terror

(Volumes I e II) Novelas Policiais

(Volumes I a 7) e Novelas de Faroeste

(Volumes I a IX) pela Lulu Press, Inc.

e Editora Saraiva.

1975 até 2015: hoje escreveu mais de 700

livros, publicados em sua maioria

em formato de bolso, sobre os mais

diferentes assuntos, como:

romances, erotismo, palavras

cruzadas, charadas, passatempos,

literatura infantil, passatempos

infantis, horóscopos, esoterismo,

simpatias populares, rezas, orações,

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intenções, anjos, fadas, gnomos,

elementais, amuletos, talismãs,

estresse, manuais práticos, religião e

outros livros de bolso com os mais

diversos temas e letras para músicas.

Já editou em formato eletrônico

mais de 1000 títulos, entre

publicações individuais e antologias,

de autores de Língua Portuguesa e

Espanhola.

Publicou ao longo dos últimos 40 anos

poemas e contos em jornais de

circulação regional. Ultimamente,

Tem traduzido e editado livros

eletrônicos e empenhado em editar

todos seus títulos em formato

eletrônico para serem

disponibilizados a seus leitores.

www.acasadomagodasletras.net