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Novelas de Faroeste

Volume II

L P Baçan

Copyright © 2015 L P Baçan

Todos os direitos reservados. Este livro ou

parte dele não pode ser reproduzido ou

usado de qualquer outra forma nem

divulgado sem a expressa autorização do

autor, exceto o uso de partes para referência

ou comentários.

ISBN 978-1-329-76698-3

Lulu Press, Inc. 3101 Hillsborough St, Raleigh, NC 27607

2015

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O Velho e Selvagem Oeste

No Velho e Selvagem Oeste, o saloon era

o local mais movimentado e frequentado da

cidade. Ali aconteciam shows, dança, jogo e

muitas brigas. Ali se encontravam mocinhos

e bandidos, pistoleiros e desafiantes,

mulheres bonitas e perigosas. A maior parte

das histórias de faroeste passava por ele.

Dos ambientes mais simples e rudes aos

mais sofisticados, todos, indistintamente

acolhiam moradores e forasteiros, cada um

com sua história, cada um com seu destino.

Famosos pistoleiros criaram fama nesse

local. Outros ali encontraram a morte, na

boca esfumaçada de um Colt. A fumaça da

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pólvora negra era o manto lúgubre que

cobria mais um morto. Um punhado de

serragem era jogado sobre a poça de

sangue. Uma rodada gratuita de uísque

barato era servida e minutos depois

ninguém mais se lembrava do ocorrido.

Afinal, o Oeste era mesmo um lugar

selvagem e as Novelas de Faroeste mostram

isso.

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Justiça de Pistoleiros

O calor punha as pessoas nervosas no

Saloon Green River, em Cortez, no

Colorado, próximo de Durango. A falta de

uma cerveja gelada podia levar um homem

a cometer uma loucura.

Foi o que aconteceu com Ned Murdock.

Enraivecido, ele sacou sua faca Bowie e a

cravou no balcão com violência, olhando

furiosamente para o barman.

— Não pense que me assusta, garoto

nervosinho — disse o homem, retirando

uma espingarda de sob o balcão.

Engatilhou-a e apontou-a para o rapaz.

Os dois devastadores canos eram uma

ameaça que não devia ser ignorada.

Mas Ned Murdock estava bêbado e com

sede.

— Cerveja! Eu quero uma cerveja! —

insistiu ele, batendo as mãos no balcão.

— Quero ver seu dinheiro primeiro,

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garoto.

— Meu pai tem dinheiro — respondeu

ele, com a voz enrolada, apoiando-se no

balcão para não cair. — Muito dinheiro!

— Se é assim, traga-o aqui.

— Não está acreditando em mim, não é?

— insistiu o jovem, irritado.

— Acredito em você, mas quero ver a cor

de seu dinheiro primeiro.

Ned correu os olhos ao redor, observando

os presentes. Todos acompanhavam a cena

com interesse e isso o fez se sentir

humilhado.

Podia ver o rosto deles como estavam

adorando aquilo. E de fato estavam. Ned era

um garoto vagabundo e arrogante, metido a

pistoleiro.

— Pegue sua faca e saia daqui —

ordenou o barman. — Será bem vindo

quando tiver dinheiro.

Ned o olhou com profundo rancor.

Arrancou a faca da madeira e a guardou na

bainha, presa no cinturão, às costas dele.

Só que não se retirou. Ficou passeando

por entre as mesas, olhando

desafiadoramente para as pessoas, que

evitavam encará-lo.

Sabiam que, bêbado, Ned era sinônimo

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de encrenca.

— Você ainda me pagará por isso. Todos

me pagarão por isso — berrou ele,

repentinamente.

— Cale sua boca ou eu mesmo vou atirá-

lo na rua, rapazola metido e irresponsável!

— gritou de volta o barman, já perdendo a

paciência com ele.

— Ainda serei rico como meu pai...

— Certo, quando for, pode voltar aqui e

tomar a sua cerveja. Até lá, pare de

importunar meus fregueses.

— Pare de provocar o garoto — ordenou

Bluf Blanding, de sua mesa.

O barman olhou na direção dele,

balançou a cabeça de um lado para outro e

sorriu para Bluf, entendendo a situação.

Ned olhou na direção daquela mesa. Bluf

fez-lhe um sinal, pedindo que chegasse até

ele.

— Sente-se e beba conosco — convidou.

— Não quero — respondeu o garoto,

demonstrando todo o seu orgulho e

arrogância.

— Vamos lá, sente-se aqui. Podemos

conversar um pouco, amigo.

— Conversar sobre o quê?

— Negócios, por exemplo.

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— Negócios? Quer falar de negócios

comigo? — retrucou o rapaz, sentindo-se

importante.

— Sim, claro. Afinal, penso que nós dois,

trabalhando juntos, poderemos ganhar um

bom dinheiro.

O garoto hesitou por instantes, depois

afastou uma cadeira e se sentou.

Bluf lhe serviu uma boa dose de uísque,

que ele tomou de uma só vez.

— Eu sempre o achei um sujeito muito

esperto, Ned. Pena que seu pai não pense

assim e o trate como a um cão sarnento, não

é verdade?

O rosto de Ned se alterou, demonstrando

ódio e rancor extremos. Ele tomou nova

dose que Bluf havia posto no copo.

— Meu pai ainda verá do que sou capaz.

— Eu não entendo como ele deixa você

ser humilhado dessa forma, aqui, nesta

cidade. Ele é rico o bastante para lhe

comprar toda a cerveja de Cortez, incluindo

os bordéis, saloons e cantinas da região. E

você fica por aí, mendigando uma simples

cerveja, para amenizar o calor de uma dia

quente. Considero isso desumano —

comentou Bluf, melífluo, envolvendo o

rapaz com sua conversa fácil e insinuante.

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— Ele não me dá nada... Quer que eu

trabalhe como um burro de carga e que

rasteje por alguns níqueis!

— É muita humilhação. ele não tem esse

direito. Concorda comigo?

— Sim, se concordo!

— Pelo que sei, parte daquela fazenda é

sua, com a morte de sua mãe.

— Um quarto dela já é minha, mas só

poderei dispor disso quando tiver vinte e um

anos...

— A menos que algo aconteça com seu

pai... Um acidente... O velho é metido a ser

domador de cavalo bravo, a perseguir rês

em disparada... Essas coisas acontecem —

disse Bluf, sugestivamente, fazendo o rapaz

encará-lo pensativamente.

Serviu outra dose, que o rapaz emborcou

de uma só vez, limpando a boca na manga

da camisa.

— Que tipo de negócio quer fazer

comigo? — indagou a Bluf.

O jogador se debruçou sobre a mesa,

fazendo Ned inclinar-se também.

— Vai precisar de muita coragem para

este negócio.

— Eu tenho — afirmou Ned.

— É um negocio que poderemos

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considerar honesto, dependendo do ponto

de vista — continuou Bluf.

— Como assim?

— Quantas cabeças de gado há na

fazenda?

— Umas dez mil, no mínimo.

— Pois veja: duas mil quinhentas são

suas.

— É, tem lógica. Mas e daí?

— Daí que você pode ir tirando esse gado

aos poucos e vendendo. Pode levá-lo a

Mexican Hat, em Utah, a Red Rock, no

Arizona, ou a Farmington, no Novo

México. Em qualquer uma dessas cidades

conseguirá bons preços e compradores

interessados em bom gado, sem questionar a

procedência.

— Tão fácil assim?

— Mais fácil do que imagina. Posso lhe

conseguir um comprador certo pelas duas

mil e quinhentas cabeças e até por mais.

— Não há como tirar duas mil e

quinhentas cabeças de lá, sem que meu pai

perceba.

— Há um meio de fazer com que ele não

perceba.

— Qual?

— Ao invés de levarmos o seu gado,

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poderemos levar o gado de outros

rancheiros. Basta misturá-los com o seu

rebanho e, na hora certa, separá-los para a

venda.

— Está falando de roubo de gado? —

sussurrou Ned, um tanto intimidado com a

proposta.

— Falei que precisaria de coragem para

isso, não falei?

— Sim, mas não disse que teria de

roubar.

— É relativo, Ned. Há muito gado solto,

que se criou sozinho e ainda não tem marca.

Estou falando desse gado, entende? —

explicou Bluf, servindo outra dose ao rapaz.

— Sim... Boa idéia! Recolher os bandos

antes dos outros rancheiros... Ninguém

desconfiará nem poderá acusar de nada. O

gado estará com a marca do meu rancho.

Muito esperto — comentou, cada vez mais

embriagado.

— Quanto acha que isso poderá nos

render? — indagou.

— Vinte mil, trinta mil, cinqüenta mil...

É difícil dizer, Ned. Só posso garantir que é

muito mais do que jamais sonhou, garoto.

Os olhos do rapaz brilharam de cobiça.

Poderia ter dinheiro e, ainda por cima,

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vingar-se de seu pai.

— Acho que estou gostando da sua idéia,

Bluf.

— Eu sabia que você era um sujeito

esperto. Não lhe disse isso?

— Sim, você também é esperto, Bluf,

pois percebeu que eu sou esperto,

compreendeu?

— Claro — riu Bluf. — Agora pense

bem: já imaginou como esse dinheiro

poderia ser muito maior, se seu pai estivesse

fora do caminho? Pena que seja seu pai...

Pai é pai, não?

Ned debruçou-se sobre a mesa para

segredar algo ao ouvido de Bluf.

— Na verdade, ele não é meu pai

legítimo. Quando minha mãe casou com

ele, eu já era nascido, só que não tinha pai,

compreendeu? Eu era um bastardo... E

assim ele me trata até hoje. Por isso eu o

odeio tanto.

— Bom, isso muda as coisas... Um

homem que faz isso com uma criança...

Tratá-la como um bastardo... Causa-me

repulsa, sabia? — comentou Bluf.

— Eu devia cuidar dele.

— Sim, devia mesmo — insuflou o

jogador.

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— E vai ser esta noite mesmo.

— Se fizer isso, procure-me amanhã,

Ned. Com o controle da fazenda,

poderemos arrebanhar todo o gado solto nas

pastagens, juntando-o ao seu. Ficaremos

ricos.

— Sim, ricos! — exclamou o rapaz,

imaginando-se com todo o dinheiro do

mundo nos bolsos.

Ninguém mais iria humilhá-lo,

principalmente aquele barman. Iria ver só.

Entardecia em Santa Rosa, no norte do

Novo México. O sol já fazia alongar os

picos dos Montes de Cristo, jogando

sombras nos desfiladeiros.

Burt Murdock havia deixado as esporas e

as botas presas na sela de seu cavalo, meia

milha distante, e calçado mocassins para

poder caminhar silenciosamente.

Aproximou-se do platô, à beira do

desfiladeiro, sem um ruído. O guarda

olhava para baixo, fumando tranqüilamente.

Quando percebeu o ruído e se voltou,

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Burt já tapava-lhe a boca com a mão e

enfiava sua Bowie nas costelas dele,

rasgando-lhe o pulmão.

O homem se debatei debilmente. Burt

posicionou a faca na garganta do outro,

junto à orelha esquerda, e fez com que a

lamina deslizasse profundamente até a

orelha direita.

O homem ficou imóvel, enquanto o

sangue jorrava na areia. Burt o escorou com

umas pedras, arrumando o rifle diante dele,

como se dormisse.

Examinou o local lá embaixo, quando o

desfiladeiro terminava, abrindo-se num

esconderijo natural, cercado de pedra.

Aquela era a única entrada e também a

única saída. Ele procurou o curral. Os

cavalos roubados estavam afastados da

casa, num grande curral. Perto de uma

centena de cavalos.

— Peguei-os finalmente, miseráveis! —

exclamou, com um suspiro de alivio.

Após duas semanas de vigília e

perseguição, conseguira, finalmente,

descobrir o esconderijo da quadrilha que

vinha roubando cavalos na região de Santa

Rosa.

Os rancheiros, cansados do prejuízo e da

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ineficiência do xerife, o haviam contratado.

Burt era um pistoleiro a serviço da lei,

um caçador de recompensas, um homem

que fazia o trabalho sujo que ninguém

queria fazer ou tinha medo de fazer.

Ele adorava aquilo.

Retirou do bolso da capa longa que usava

um pacote de dinamite. Cortou um estopim.

Procurou o melhor lugar para a explosão.

Queria provocar um desmoronamento,

barrando a fuga dos bandidos, se fosse

preciso, mas só usaria esse recurso se não

conseguisse impedir uma reação.

Os rancheiros haviam sido bem claros.

Vivos ou mortos, cada bandido valeria um

bônus extra de cem dólares, mais mil

dólares para desbaratar a quadrilha.

Teria ainda mais cinco dólares por cavalo

recuperado. Burt fez as contas mentalmente.

Já contara pelo menos uns oito homens na

cabana.

Havia ali, a sua disposição, algo em torno

de dois mil e quinhentos dólares.

— Aqui serve — comentou consigo

mesmo, enfiando a dinamite entre as raízes

de uma enorme árvore que pendia sobre o

desfiladeiro.

Se a explodisse, seus galhos impediriam a

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fuga dos bandidos, mas poderiam ser

queimados depois, para liberar a saída dos

cavalos.

Procurou um bom local, engatilhou sua

Winchester e esperou que um dos homens

saísse da cabana.

Momentos depois, um deles abriu a porta,

com um balde na mão, caminhando na

direção do poço.

Burt disparou, arrancando o balde da mão

dele. O homem correu se esconder atrás de

um bebedouro.

Portas e janelas da cabana foram

fechadas. Burt olhou o céu. Escurecia

rapidamente. Tinha de resolver aquilo o

mais depressa possível.

Apanhou uma banana de dinamite e

atirou-a próximo da cabana. Apontou seu

rifle e disparou.

A explosão levantou uma nuvem de

fumaça e poeira e ecoou violentamente

pelos muros de pedra do desfiladeiro.

— Vocês aí, quero-os com as mãos para

cima, fora da cabana, em trinta segundos. A

próxima dinamite vai explodir no telhado

— disse, arremessando a banana.

Ela caiu certeiramente no telhado da

cabana, rolou até o beiral e ficou ali,

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tomando um resto de sol da tarde que

morria.

— Ele diz a verdade — gritou o homem

atrás do bebedouro. — A dinamite está no

telhado.

— Maldito seja você! O que quer, afinal?

— Quero-os fora dai em vinte segundos.

— Pode vê-lo, Slim? — indagaram da

cabana.

— Não — respondeu o homem fora dela.

— Demônios, homem. Poderemos

negociar. Quanto está ganhando com isso?

— O suficiente — respondeu Burt. —

Enquanto isso, vocês estão perdendo o resto

do tempo e o resto da vida.

— Faça o que ele diz, Duran! — gritou

Slim.

— Cinco segundos... Quatro... Três... —

começou ele a contar.

As portas e janelas se abriram. Armas

jogadas para fora. Os homens começaram a

sair com as mãos para cima.

— Você aí, atrás do bebedouro. Pegue

cordas e comece a amarrá-los. Bem firme.

Se eu encontrar um mal amarrado, você terá

uma banana de dinamite daquela enfiada

naquele lugar, com um pavio curto acesso.

O homem apressou-se em cumprir a

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ordem. Burt começou a contar. Sete homens

saíram da cabana.

— Eu disse para que todos saíssem! —

gritou. — O tempo está esgotado.

Os homens lá embaixo olharam

desesperadamente para a cabana. Um rifle

foi atirado pela janela. O oitavo homem

saiu.

Todos olharam na direção do platô,

ansiosamente. Burt continuou abaixado.

Havia oito homens lá embaixo, mais um

vigiando. Nove homens. É uma conta difícil

de ser feita. Dividir o roubo em nove partes

era muito complicado para aqueles homens.

Tinha de haver um décimo bandido.

Lá embaixo, alguns deles olharam para a

cabana, quando uma sombra começou a se

erguer no alto do platô.

Um rifle surgiu na janela da cabana e

disparou. O vulto no alto do platô caiu para

frente, despencando no desfiladeiro.

Um homem ficou em pé, atrás do que

caiu, apontando seu rifle para o telhado da

cabana.

Quando apertou o gatilho, um último raio

de sol iluminou a banana de dinamite no

telhado.

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Bluf acertara numa coisa: Ned era mesmo

esperto. Quando saiu do saloon, naquela

tarde, parou no rio Mesa Verde, que contava

as terras do rancho.

Despiu-se e, no comecinho da noite,

mergulhou nas águas frias e nadou durante

algum tempo, até se sentir melhor.

Depois deitou-se na margem e ficou

pensando, vendo as estrelas surgirem no

céu.

Sabia que Bluf Blanding era um

escroque, um jogador ladrão e um

trapaceiro de primeira classe.

Havia dado muitos golpes nos pequenos

rancheiros da região, com a conivência do

xerife, que o protegia.

Só que, agora, Bluf havia mesmo

pensado alto. Naquela região toda deveria

haver, por baixo, mais de cem mil cabeças

de gado.

Roubá-las e vender nos outros Estados

seria uma tarefa muito fácil, considerando

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que Cortez estava a igual distancia de três

Estados diferentes: Utah, Arizona e Novo

México.

Havia comércio suficiente para mais do

que cem mil cabeças. Isso renderia muito

mais dinheiro que Ned jamais sonhara em

ter nas mãos.

Quando se sentiu livre dos efeitos do

álcool, Ned foi para casa.

Todas as noites, quando chegava, Jed

Murdock despejava sobre ele o mesmo

sermão.

Às vezes Jed o esmurrava, Ned nem

sentia, de tão bêbado que estava.

Naquela noite, porém, incentivado pelas

palavras de Bluf e acreditando em si

mesmo, Ned iria agir diferente.

Já era noite quando chegou. Após levar

seu cavalo para o estábulo, dirigiu-se à casa

principal do rancho.

— Parece que você só vem aqui para

dormir. Por que não simplifica as coisas e

dorme no saloon. Ou então na sarjeta, que é

o seu lugar — disse Jed, levantando-se da

sua escrivaninha, num canto da sala.

Caminhou na direção de Ned, que o

encarou ameaçadoramente. Jed não

conhecia aquele olhar do enteado.

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— Quero falar com você — disse Jed.

Jed esperou, mantendo seu olhar fixo no

dele.

— Acho que devemos desistir de tentar

fazer de você um homem. Diga-me o que

quer para sumir de minha vida para sempre

e não me incomodar mais com essa sua cara

de beberrão — indagou Jed, secamente.

Jed destilou ódio no olhar.

— Basta! Basta, entendeu? Não sou um

cachorro, sou um homem!

— Para mim você é um vagabundo...

Puxou bem a sua mãe, aquela mundana que

tirei de um saloon em Santa Fé para fazer

minha mulher...

— Não toque no nome de minha mãe —

falou Ned, enfurecido. — Ela o fez feliz e,

enquanto esteve aqui, nesta casa, jamais fez

nada que pudesse...

— Cale-se, garoto idiota! O que sabe de

sua mãe?

— Sei que ela morreu e que me deixou,

por direito, um quarto deste rancho e de

todo o dinheiro que ele rende.

— Tem razão. Tem toda razão, mas esse

dinheiro jamais será seu, entendeu?

— Não pode me negar isso.

— Posso e vou. Se lhe der a sua parte, em

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dois tempos você a gastará no saloon e logo

estará de novo, rastejando por um níquel.

— Não pode me roubar o que...

— O que disse? Está me chamando de

ladrão, seu bastardo atrevido? — gritou Jed,

ameaçadoramente.

Ned, a principio, se intimidou. Depois, o

ódio maior que qualquer temor. Ele encarou

o padrasto pela primeira vez.

— Sim, é isso mesmo. É um ladrão! Está

roubando o meu dinheiro, o dinheiro que

era de minha mãe e que me pertence por

direito...

A mão de Jed se abateu pesadamente no

rosto do garoto, fazendo-o cambalear.

Ned recuou, a mão indo às costas, no

cinturão, buscar a faca afiada.

Jed avançou, disposto a quebrar-lhe todos

os ossos do corpo, tamanho era seu ódio.

Ned apenas o esperou, erguendo a faca.

Quando Jed percebeu, metade da lamina já

havia penetrado em seu estômago.

— Ned! — exclamou ele, chocado.

— Surpreso, velho sovina? — indagou o

rapaz, girando a lamina no ventre do outro,

depois forçando a ponta para cima, na

direção do coração.

— Ajude-me — suplicou Jed.

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— Sim, vou ajudá-lo a ir encontrar com

minha mãe para lhe pedir desculpas, seu

bastardo dos infernos! — vociferou o

garoto, empurrando a faca para cima,

cortando ao meio o coração do rancheiro.

Ned se afastou. O padrasto caiu de

joelhos, olhando com olhos esbugalhados a

lamina enterrada em seu ventre.

Tentou falar alguma coisa, mas apenas

vomitou sangue e caiu para frente.

— O que fez, seu animal imprestável! —

gritou Jay Fowler, capataz do rancho,

entrando naquele momento.

Surpreso, Ned recuou até suas costas

baterem na escrivaninha.

Jay correu levantar o corpo do patrão. O

sangue jorrou pelo ferimento. Ele puxou a

faca e tentou estancar o sangue com a mão.

— Vá buscar ajuda, seu bastardo! —

gritou Jay, em desespero. Ned olhava a

caixa de dinheiro aberta sobre a

escrivaninha. Normalmente ficava trancada

numa gaveta. Seu pai deveria estar

conferindo. Olhou para Jay. A palavra

indesejável ecoava em sua cabeça. Não

queria mais ser chamado de bastardo. Nem

por Jed, por Jay ou por qualquer filho da

mãe no mundo.

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Além disso, havia aquele dinheiro ali. E

havia Jay, com a faca na mão, todo molhado

de sangue.

— Nunca mais... Mas nunca mais

mesmo, você me chamará de bastardo

novamente — afirmou Ned, sacando sua

arma.

— O que vai fazer? — surpreendeu-se

Jay.

— O que já devia ter feito há muito

tempo, seu trouxa. Melhor uma bala nessa

sua boca grande.

Jay soltou o corpo do patrão e tentou

sacar a arma. Era rápido, mas Ned, quando

não estava bêbado, era mais rápido ainda

que ele.

O Colt trovejou e uma bala certeira

apanhou Jay em pleno peito, jogando-o para

trás, com a arma na mão.

Num esforço supremo, o capataz tentou

erguer o braço para disparar.

Ned apertou de novo o gatilho, mirando a

cabeça do infeliz caído diante dele.

A bala atingiu o rosto de Jay, bem sobre

o nariz, transformando sua cara numa

máscara sangrenta e retorcida.

O rapaz, então, correu apanhar alguns

maços de dinheiro e pô-los no bolso de Jay.

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Depois correu para o pátio, aos gritos:

— Venham depressa! Jay matou meu pai!

Ajudem!

Os empregados do rancho, sonolentos,

começaram a surgir da escuridão, logo

depois.

Burt estava no saloon e já bebera meia

garrafa de uísque, enquanto esperava os

rancheiros retornarem.

Viera para a cidade e indicara onde

estava os cavalos e os membros da

quadrilha, mortos.

A explosão da dinamite, no telhado da

cabana, lançara lascas de madeira para

todos os lados.

A quadrilha teve morte horrível. Para

Burt, isso pouco importava. mereciam

morrer.

— Não quer subir, tomar um banho e

depois relaxar comigo? — perguntou-lhe

Luna, uma lindíssima mexicana, de longos e

negros cabelos, olhos profundos e

misteriosos e um perfume de rosas que

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entontecia e a fazia mais desejável.

Havia muito Burt não via uma mulher tão

limpa e tão cheirosa como aquela.

— Mais tarde, querida! — disse ele. —

Estou esperando o meu pagamento.

— E quando ele chega?

— Em breve.

— Posso beber com você?

— Será um prazer para mim —

respondeu ele, empurrando a garrafa na

direção dela.

Luna foi até o balcão e retornava com um

copo, quando um vaqueiro a segurou pelo

braço.

— Ei, Luna, sente um pouco no meu colo

— pediu ele, bêbado e coberto de poeira.

— Deixe-me em paz, vaqueiro! Vá tomar

um banho primeiro.

— Não quer você me dar um banho?

— Até daria, se estivesse disponível. Só

que não estou — falou ela, dando um

repelão e livrando-se dele.

Foi até a mesa.

— Vaqueiros! Bah! — disse ela, com

cara de nojo, enquanto Burt lhe enchia o

copo.

Ela bebeu de um só gole, como ele fazia

a cada vez que enchia o copo. Burt ergueu a

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cabeça. O vaqueiro bêbado estava atrás de

Luna e o olhava com rancor.

Luna percebeu e se voltou para olhá-lo.

— Sujo por sujo, pelo menos sou mais

bonito — disse o vaqueiro, com voz

pastosa.

— Caia fora, homem! Estou ocupada! —

falou ela, irritada.

— Eu cheguei aqui antes desse barbado.

Já gastei mais do que ele e você ainda não

me deu atenção. Eu queria que...

— Você ouviu a garota. Caia fora! —

falou-lhe Burt, perdendo a paciência.

O vaqueiro o encarou com despeito.

— Quem você pensa que é? — indagou a

Burt, contornando a mesa.

Parou diante do caçador de recompensas.

Nem viu o que acontecia. Burt levantou o

pé e o atingiu na barriga, jogando-o sobre a

mesa atrás dele.

O vaqueiro levou a mão ao cinturão,

tentando apanhar a arma. Num salto, Burt

caiu sobre ele, levando na mão a garrafa de

uísque, que arrebentou na testa do bêbado.

O vaqueiro desmoronou no assoalho,

com sangue empapando-lhe os cabelos.

— Maldito! Me dez perder meia garrafa

de um bom uísque — falou Burt, revistando

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os bolsos do outro.

Encontrou algumas moedas. Levou-as até

o balcão.

— Outro litro! — pediu.

Apanhou-o e retornou para a mesa, onde

Luna o olhava com admiração.

— É mesmo um caçador de recompensa?

— quis ela saber.

— Faço justiça — corrigiu ele.

— Não é a mesma coisa?

— Não para mim.

— Já matou muitos?

— Sim.

— Quantos?

— Não me lembro, mas a maioria fazia

muitas perguntas — disse ele, em tom

ameaçador, brincando com ela.

— Ai, hombre! — exclamou ela, sorrindo

deliciada.

Um tropel de cavalos lá fora anunciou a

chegada dos rancheiros que haviam

contratado Burt.

Três deles entraram, acompanhados do

xerife.

— E então, cavalheiros? Estava tudo lá,

como eu disse?

— Sim, Murdock. Dez cadáveres,

noventa e cinco cavalos e uma cabana

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destruída — disse o xerife, num tom de

despeito.

— Uma quadrilha a menos para nos

infernizar, xerife — corrigiu o líder dos

rancheiros. — Murdock fez o que você

deveria ter feito.

O xerife teve de engolir seu

ressentimento, mas ficou ainda mais

recalcado quando os rancheiros juntaram

alguns pacotes de dinheiro e os puseram

sobre a mesa, à frente do pistoleiro.

— Dois mil e quinhentos, arredondando a

conta, Murdock. Com os agradecimentos da

Associação dos Rancheiros de Red River —

disse o líder.

— Às ordens, cavalheiros. Se precisarem

de novo, espero que não precisem, sabem

onde me encontrar.

Os homens agradeceram e saíram. Burt

juntou as notas e guardou-as no bolso

interno de sua capa.

O xerife continuou ali, ao lado da mesa,

sem esconder seu despeito.

— Sou obrigado a lhe pedir algo,

Murdock — disse, finalmente, após

pigarrear.

— Diga, xerife.

— Gostaria que saísse de minha cidade

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amanhã mesmo.

— Sua cidade?

— Sim, Murdock, minha cidade. Aqui eu

sou a lei e não quero tipos como você por

aqui. Só atraem encrencas.

Murdock sorriu amargamente, encarando

o xerife com seus olhos frios e cinzentos.

— Vocês xerifes são todos iguais.

Escondem-se atrás de um pedaço de lata e

se tornam arrogantes e mandões. Só que,

quando surge um trabalho sujo, é gente

como eu que vai fazê-lo no seu lugar.

— Ouça bem, Murdock: você mata dez

homens como quem foi pescar. Ganha dois

mil e quinhentos dólares que gastará com

prostitutas, com certeza, e irá atrás de outro

trabalho. Eu tenho que ficar aqui, viver com

cem dólares por mês e casa. Por que devo

arriscar minha vida?

— Acho que tem o emprego que merece,

xerife. Se arriscasse, talvez ganhasse mais.

Só que não tem no meio das pernas o

mesmo que eu — finalizou Burt, apanhando

a garrafa de uísque com uma das mãos e a

cintura de Luna com a outra.

Caminharam na direção da escada que

conduziria ao pavimento superior, onde

estavam os quartos.

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— Gostei de ver — disse Luna. — Esse

sujeitinho metido a besta merecia uma lição.

É um galinha!

— Tem razão. Um galinha! E eu, o que

sou?

— Macho... Mui macho! — disse ela,

enfiando a mão entre as pernas dele e

agarrando algo precioso.

Na manhã seguinte, antes do nascer do

sol, Burt foi até o estábulo selar seu cavalo.

Levava consigo o alforje e o dinheiro que

ganhara.

— Pablo! — chamou, assim que

empurrou o pesado portão.

Como das vezes anteriores, Pablo não

veio correndo ao seu encontro. O garoto que

cuidava do estábulo tinha sono leve, muito

leve.

Burt ficou alerta. Todos na cidade sabiam

que ele estava com dois mil e quinhentos

dólares em dinheiro.

Algum idiota poderia ter uma idéia

estúpida a respeito disso.

— Pablo, seu dorminhoco! — chamou de

novo, entrando.

Sua mão direta já sacara o Colt. Ele ouviu

o barulho da palha sendo amassada e o

vulto que avançou na sua direção.

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Bateu com o alforje, parando o ataque.

Depois, com a coronha do Colt, provocou

um estalo na cabeça do seu agressor, que

gemeu e caiu.

— Maldito! — murmurou alguém,

furioso, avançando rapidamente. Murdock

desviou-se para o lado e o cano de seu

revólver atingiu a nuca do homem, que se

estatelou no chão.

O primeiro tentou se erguer. Burt

marcou-lhe o queixo para sempre com a

roseta de sua espora.

Acendeu um fósforo. O xerife e um

auxiliar gemiam no chão do estábulo,

lambuzados de esterco.

— Afinal encontrou o seu lugar, xerife —

afirmou Burt, pondo-o para fora a pontapés.

Menos de três horas depois da morte de

Jed, o xerife compareceu na sede do rancho,

chamado por Ned.

Examinou os dois cadáveres, que o rapaz

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cobriu com panos, depois foi até a cozinha,

lavar as mãos sujas de sangue.

Ned o seguiu.

— Como aconteceu? — indagou ao

rapaz.

— Acho que Jay tentou roubar meu pai e

foi descoberto. Eles lutaram. Jay o

esfaqueou. Cheguei no momento em que ele

roubava o dinheiro. Tentei convencê-lo a se

entregar, mas ele sacou a arma. Não tive

escolha.

O xerife ouviu tudo atentamente. Era

cúmplice de Bluf, que já lhe contara seus

planos a respeito de Ned.

— Quando você chegou, Jay havia

matado seu pai?

— Sim, e estava pegando o dinheiro.

— E esta faca, a quem pertence? —

indagou, mostrando a arma que retirara do

corpo de Jed.

O garoto empalideceu. Havia se

esquecido daquele detalhe. O xerife lavou a

faca, enxugou-a depois se aproximou do

jovem.

Guardou a faca na bainha, enquanto o

olhava nos olhos.

— Se Jay tivesse pego o dinheiro depois

de ter matado seu pai, então este dinheiro

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estaria manchado de sangue — falou o

homem da lei, retirando do bolso um maço

de dinheiro, que tirara do cadáver de Jay.

Ned se viu num beco sem saída. Estava

nas mãos do xerife, que simplesmente

enfiou no bolso o maço de dinheiro.

— Eu e Bluf somos sócios, Ned. Isto nos

torna sócios também. Eu jamais prejudicaria

um sócio, entendeu? — falou o xerife, com

cumplicidade.

— Entendi — respondeu o garoto,

sorrindo aliviado, pois se vira à beira da

forca.

— Fique tranqüilo. Em meu relatório,

tudo será como você disse: Jay tentou

roubar seu pai. Foi descoberto e o matou.

Você chegou naquele momento. Tentou

prendê-lo, mas Jay reagiu, sacando a arma e

não lhe dando alternativa, a não ser baleá-

lo. Ok?

— Ok, xerife! E a faca?

— Jay tinha uma na bota. Deixe-a no

lugar da sua. Agora é o novo dono do

rancho, e poderá ganhar muito dinheiro,

mas muito dinheiro mesmo — insinuou o

homem da lei.

Ned se sentiu muito importante naquele

momento, mas percebeu, também, que todo

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aquele dinheiro teria ainda mais um sócio: o

xerife de Cortez.

No outro dia, após o sepultamento do pai,

no alto de uma colina, onde estava o

pequeno cemitério do rancho, Ned fez uma

reunião com todos os empregados dali.

Definiu como seriam as coisas dali em

diante. Despediu alguns empregados,

nomeou um novo capataz e mandou

contratar mais homens.

Assim que deixou tudo conforme

desejava, apanhou um maço de dinheiro e

foi para a cidade.

Encontrou Bluf na porta do saloon.

— Fiquei sabendo o que houve com seu

pai — disse o jogador. — Lamento muito

mesmo.

— Obrigado, Bluf! Foi uma tragédia,

realmente, mas o que se há de fazer?

— Soube que você matou o criminoso.

— Sim, no ato.

— E que o xerife esteve lá e confirmou

sua estória.

— Exatamente.

— Perfeito, garoto! Eu sabia que você era

mesmo muito esperto. Agora tudo é seu,

não?

— Sim, tudo é meu. E para festejar,

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gostaria de convidá-lo para um drinque.

— Será um prazer.

Entraram. Ned foi direto ao balcão,

olhando o barman nos olhos.

— Sirva-me um uísque — ordenou.

— Só depois de ver a cor do seu dinheiro,

garoto — respondeu o homem, que não

sabia da morte de Jed Murdock nem que

Ned era, agora, o mais rico herdeiro da

região.

— Terei que ensiná-lo a me respeitar, seu

bastardo — rugiu Ned, inclinando-se sobre

o balcão e esmurrando o barman, que foi

bater contra a prateleira, derrubando

garrafas.

— Vai ter que me pagar cada centavo do

prejuízo — ameaçou o barman, apanhando

uma espingarda sob o balcão.

Ned foi mais rápido. Sua faca se deslocou

no ar e foi se cravar no ombro do outro, que

gritou de dor e soltou a arma.

Ned saltou para o interior do balcão e

agarrou o barman pelo colarinho.

— Você está falando agora com Ned

Murdock, Sr. Murdock para você, de agora

em diante — determinou, esmurrando

selvagemente o rosto do barman, vingando-

se, assim, de toda humilhação que já sofrera

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ali.

Retirou sua faca do ombro dele, após

derrubá-lo e chutá-lo algumas vezes.

Depois apanhou algumas notas e atirou-

as sobre ele.

— Isto paga as garrafas quebradas? —

indagou, aos gritos.

— Sim, paga — respondeu o outro,

debilmente.

— Isto paga meu uísque? — insistiu,

jogando mais uma nota sobre o ferido.

— Sim... Sim, Ned... Paga...

— E isto vai amaciar sua língua de agora

em diante — finalizou, enfiando outra nota

na boca do barman. — Quero que leve seu

melhor uísque para minha mesa.

— Você deu a ele o que ele merecia —

comentou Bluf, assim que se sentaram.

— Sem puxasaquismo, Bluf. Quero que

me trate como um sócio e não coimo um

garoto mimado, compreendeu? — corrigiu-

o Ned, surpreendendo o jogador.

— O que houve? — quis saber Bluf.

— Nada mudou. Temos negócios a tratar,

não?

— Sim, claro. Agora mais do que nunca

— concordou Bluf, enquanto o barman,

respeitosamente, punha sobre a mesa uma

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garrafa e dois copos, antes de sair à procura

do médico e do xerife.

— Pois bem, Bluf. Antes de mais nada, é

preciso que deixemos bem claro quem vai

dirigir toda a operação — ponderou o

garoto, olhando o outro com seriedade.

Outros homens haviam se aproximado da

mesa. Era capangas de Bluf, que se cercara

de precauções, após saber da morte de Jed

Murdock.

Como o garoto passava a ser o dono de

tudo, não havia como não ganhar dinheiro

com ele.

Sua intenção, juntamente com o xerife,

era a de envolver Ned no roubo de gado,

depois dar sumiço nele, ficando com tudo

que lhe pertencia.

Julgando que Ned não passasse de um

bêbado apenas, Bluf havia cometido um

erro.

— Bem pensado, Ned. Acho que, por

tudo que sei e que conheço desse ramo, eu

posso...

— Indicar a mim como o chefe? —

completou o jovem, para surpresa de Bluf,

que desejava chefiar pessoalmente todo o

trabalho.

Os homens atrás de Bluf se mexeram,

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incomodados. Ao serem contratados, Bluf

prometera que eles receberiam ordens dele.

Naquele momento chegou o xerife, que

fora procurado pelo barman.

— Ele vinha provocando Ned há muito

tempo, Hank. Teve o que mereceu. Ned

apenas se defendeu. Todos aqui podem

dizer isso — falou Bluf, apontando para os

homens atrás dele, que concordaram

imediatamente com a estória.

— Está certo, acho que isso encerra a

questão. Vejo que estão comemorando —

observou.

— Pegue um copo e sente-se, xerife. É

meu convidado — disse Ned.

O xerife apanhou o copo e foi se sentar

com eles.

— Estamos tratando de negócios, sócio

— falou Ned, olhando o xerife. — Eu dizia

ao Bluf que tenho todas as condições de

chefiar a sociedade...

— Espere aí, garoto! — cortou-o Hank

chance, o xerife. — Não o ajudei ontem à

noite para receber ordens suas.

— Pois é melhor considerar isso agora,

xerife. Tenho tudo nas mãos. Posso até nem

precisar de sócios para fazer o que é preciso

ser feito.

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— Não conseguirá sem nos — afirmou

Hank.

— Provarei que está errado.

— Precisa dos meus contatos para vender

o gado — ajuntou Bluf.

— Posso ir atrás de contatos, mas vocês

não podem roubar e esconder o gado sem a

minha ajuda.

Bluf percebeu que Ned tinha a faca e o

queijo na mão. A melhor estratégia não era

enfrentá-lo, mas, sim, descobrir até onde ele

poderia ir com aquilo.

— Pensando bem, Hank, acho que Ned

está com a razão. Se analisarmos friamente

a situação, ele tem tudo nas mãos. Assim

sendo, ninguém melhor que ele para ser

nosso líder.

— Não vou receber ordens de um bêbado

— protestou o xerife, aborrecido.

Ned o fulminou com um olhar glacial.

— É pegar ou largar, xerife. Não há outra

escolha. Tornou-se meu cúmplice ontem, ao

trocar as facas e ao ficar com meu dinheiro.

— Pois saiba que eu posso prendê-lo

agora mesmo, jogá-lo numa cela e perder a

chave. Você apodrecerá lá, eu prometo.

Diariamente lhe darei uma surra para

amaciar esse seu couro de animal

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selvagem...

— Pare, xerife, antes que eu me aborreça

— cortou-o Ned, ameaçadoramente. — Se

olhar no balcão, verá cinco homens

bebendo.

O xerife olhou para lá e confirmou.

— Sim, e daí?

— Erga um dedo contra mim e verá o que

acontece. Um sinal meu eles acabarão com

você — disse o rapaz, pondo dois dedos na

boca e soltando um assobio rápido.

Os cinco homens imediatamente se

voltaram, com as mãos nas armas.

— Tudo bem, rapazes! Só queria ver se

vocês estavam alertas — falou-lhes Ned.

— Eu não disse, Hank? O garoto é vivo,

pode cuidar das coisas. Será nosso chefe e

todos nós lucraremos muito com isso.

Acredite — insistiu Bluf.

Hank encheu o copo e bebeu num só

gole, fazendo uma careta. Olhou Bluf e

depois Ned.

— Está certo! Acabou de provar que é

cauteloso e isso me agrada — falou o xerife.

— Será o manda-chuva.

— Sábia decisão, sócio. Vamos brindar a

isso — propôs Ned, erguendo seu copo.

Após beberem por algum tempo, Ned se

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retirou. Bluf e o xerife ficaram a sós para

conversar.

— Não sei o que você pretende fazer,

Bluf, mas não me agrada receber ordens

desse moleque.

— Não se preocupe, Hank. É temporário.

O garoto está pondo em nossas mãos a

chance de ficarmos ricos. Não vamos

desperdiçar isso. Vamos dar-lhe corda. Ele

se enforcará com ela, se está se entendendo.

— Qual é o seu plano?

— Vamos fazer de conta que ele manda

até chegar o momento de mudarmos isso.

Na hora certa, descartamos o idiotazinho e

ficamos com tudo.

O xerife sorriu, compreendendo.

— Agora melhorou.

— Deixe o garoto pensar que manda. Ele

fará exatamente o que nós quisermos.

— Ele já selecionou alguns homens de

confiança. Precisaremos fazer o mesmo.

— Já fiz. Ali, naquela mesa, estão cinco

dos melhores pistoleiros da região.

Trabalham para nós, para mim e para você.

— Acha que é o bastante?

— Para começar, sim. Depois

contratamos mais. Em pouco tempo, meu

amigo, pouco tempo mesmo, estaremos com

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o maior rebanho de gado da região. Com

você nos dando cobertura, ninguém vai

suspeitar. quem pensaria que o maior

rancheiro da região é um reles ladrão de

gado?

— Muito bem pensado, Bluf. Pensado

mesmo! — elogiou Hank, satisfeito com o

andamento do plano.

Uma semana depois, pela manhã, um

rancheiro parou seu cavalo coberto de suor

diante da cadeia.

Entrou furiosamente, sobressaltando o

xerife, que cochilava em sua escrivaninha.

— Hank, assim não dá mais. Roubaram

uma cem cabeças de meu melhor gado.

Estavam separadas para a marcação. Com

essas já perdi um quinhentas, percebeu? —

indagou, exaltado.

O xerife tirou os pés da escrivaninha e foi

pegar uma caneca de café no fogão.

Bocejou.

— Eu sinto muito Steve, mas está

acontecendo com muita freqüência. Penso

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que são ladrões de gado dos Estados

vizinhos que se aproveitam da nossa

proximidade com as fronteiras.

— Certo, mas você tem que fazer alguma

coisa, homem.

— Fazer o quê, Steve? Eu já pedi meia

dúzia de auxiliares, mas o prefeito negou.

— Mas se você não for atrás, Hank, eles

continuarão agindo impunemente.

— Não posso lutar sozinho contra

fantasmas, que atacam à noite e somem sem

deixar vestígios, Steve. Fale com o prefeito.

Se ele autorizar os auxiliares, poderei fazer

alguma coisa. Esta região é muito grande,

um homem sozinho nada pode fazer.

— Se o prefeito é idiota o bastante para

perceber que, sem nosso apoio, não vai se

reeleger, então nós, da Associação dos

Criadores de Gado, vamos tomar nossas

providências.

— O que pensa fazer?

— Vamos nos organizar e contratar

alguns pistoleiros.

— Se fizer isso estarão contra a lei.

— E você virá nos prender?

— Pistoleiros não são a solução, Steve.

Só pioram a situação. Encher a cidade deles

pode ser perigoso. Podem fugir ao controle

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e...

— Então veja Ned Murdock, por

exemplo. Está sempre cercado de pistoleiros

e nunca soube que ele tenha sido roubado.

Nem um mísero bezerro levaram dele. Acha

que estamos errados?

Hank não estava gostando daquilo.

Pistoleiros a serviço dos rancheiros

poderiam complicar tudo, dificultando o

trabalho de Ned e de seus ladrões de gado.

Steve saiu dali furioso e foi para o saloon,

onde encontrou outros rancheiros,

igualmente descontentes.

— E então? — indagaram, esperançosos.

— Nada feito. Hank não pode fazer nada.

Até dou razão a ele. Sozinho não pode

enfrentar a quadrilha de ladrões. Acho que

vamos ter que fazer como Ned Murdock,

pessoal.

— Contratar pistoleiros? — indagou

alguém.

— Sim, gente de nossa confiança.

— E onde encontrá-los?

— Não precisa ir muito longe. Em

Durango há sempre bons pistoleiros.

— Quem irá falar com eles e escolhê-los?

— Eu mesmo vou — afirmou Steve. —

Só quero que vocês, como membros da

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Associação dos criadores, me autorizem.

Tratarei os melhores que encontrar. Vamos

gastar algum dinheiro, mas não tanto quanto

perderemos com esses roubos.

— Steve tem razão, pessoal. De minha

parte eu concordo — afirmou um dos

criadores.

— Eu também — ajuntou outro.

Todos concordaram por unanimidade,

autorizando Steve a ir contratar os

pistoleiros necessários.

— Quando partirá, Steve?

— Hoje mesmo, rapazes.

— Bebamos a isso, então, antes da

partida do Steve, pessoal — propôs alguém.

Numa das mesas ali perto, Bluf ouvia a

conversa com cara de quem não gostava

nada da idéia.

Ned chegou um pouco mais tarde no

saloon. Estava satisfeito com o andamento

dos planos.

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Foi ao encontro de Bluf. Imediatamente o

barman chegou, trazendo-lhe um copo para

uísque e uma cerveja.

Após terem se entendido, bastava Ned

entrar no saloon que o uísque e a cerveja

iam ao seu encontro.

E ele tinha crédito agora.

— Como vão as coisas? — indagou Ned.

— Acho que vamos ter problemas.

— Como o quê?

— Com a Associação dos Criadores.

Acabaram de fazer uma reunião aqui e

decidiram contratar pistoleiros para se

defenderem dos roubos.

— Demônios! De quem foi essa idéia

maluca?

— De Steve Granger, aquele rancheiro

idiota.

— O pai de Dianne Granger, não?

— Sim.

— Tem uma bela filha o maldito.

— Só que nem ela nem ele gostam de

você, Ned. Já reparou nisso?

— Pouco me importar o que eles pensam

de mim — falou o rapaz, bebendo o uísque,

depois tomando uma golada de cerveja.

Limpou a boca com a manga da camisa.

Nesse momento, dois vaqueiros

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empoeirados e cansados entraram no saloon

e foram até o balcão.

Pediram cerveja e beberam,

demonstrando que estavam mesmo

sedentos.

Logo em seguida, Steve Granger entrou

também e foi até os dois.

— E então, rapazes? Seguiram a pista dos

ladrões? — indagou ele aos dois.

— Sim, patrão. Seguimos a pista até a

divisa com as terras de Ned Murdock.

— Ned Murdock? — falou Steve, embora

sem demonstrar surpresa.

— Alguém disse o meu nome? —

indagou o rapaz, erguendo-se e caminhando

na direção do balcão.

— Há qualquer coisa errada com suas

terras, garoto. O gado roubado está sumindo

lá dentro — falou Steve, sem temor.

Ned chutou uma cadeira a sua frente,

provocando barulho e chamando a atenção.

— O que está insinuando? — indagou,

furioso.

— Isso está se tornando freqüente, Ned.

Gado some e todas as pistas levam na

direção de suas terras.

— Minhas terras são muito grandes. Não

posso vigiá-la totalmente. Se os bandidos

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estão passando por elas para levarem o gado

para outros Estados, nada posso fazer.

— O interessante é que eles passam

levando gado roubado e não carregam nem

uma de suas reses.

— Eu me defendo...

— Mas acabou de dizer que não tem

como proteger todas as suas divisas, não

foi? — cortou-o Steve, deixando o garoto

ainda mais irritado. Ele se aproximou de

Steve, ficando frente a frente com o

rancheiro, olhando-o nos olhos.

— Vamos lá, Steve. Desembuche logo.

Sinto que tem algo a dizer. Por que não fala

abertamente, ao invés de ficar girando ao

redor do assunto.

— Pois bem, Ned, acho que há alguma

coisa errada em seu rancho e com você.

Todos esses roubos começaram depois que

seu pai morreu e você começou a contratar

esses pistoleiros.

Ned ficou lívido, a mão baixando na

direção da arma.

— Se está tão certo disso, por que não

procura o xerife e me denuncia? — desafiou

o rapaz.

— Porque aquele maldito está

mancomunado com você. Jamais tomaria

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qualquer providencia contra você.

— E você, Steve, faria alguma coisa?

— Começaria dando-lhe uma surra de

chicote, pirralho metido a homem —

murmurou Steve, furioso com a arrogância

do rapaz.

— Se você não fosse o pai de Dianne...

— Cale-se, bastardo! Não tem o direito

de pronunciar o nome de minha filha.

— Ela é boa demais para mim?

— Sim, boa demais para você.

— Não me faça perder a cabeça, Steve —

alertou o rapaz, a mão tocando a arma.

Steve não lhe deu chance. Sacou sua

arma, apontando-a para o peito do rapaz.

— Vamos, lá, dê-me a chance de matá-lo,

seu vermezinho ordinário — vociferou

Steve.

— Não vou sacar minha arma — disse o

rapaz, cruzando as mãos nas costas.

— Pior para você, então, pois vou surrá-

lo como seu pai deveria tê-lo surrado —

rugiu Steve, avançando para o garoto.

O movimento foi rápido, muito rápido.

Steve sentiu o impacto no peito e baixou os

olhos para olhar.

A lamina da faca havia penetrado até o

cabo, perfurando seu pulmão.

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Ele tossiu, escarrando sangue. Com as

duas mãos ele segurou o cabo da faca e

puxou-a.

O sangue esguichou da ferida. Steve caiu

de joelhos, os olhos esgazeando-se.

Murmúrios roucos escaparam de sua

garganta. Ned, cruelmente, chutou o rosto

do moribundo, jogando-o para trás.

Apanhou sua faca. Limpou-a na roupa de

Steve, depois guardou-a na bainha presa nas

costas.

— Seu filho da mãe! — rugiu um dos

vaqueiros de Steve, levando a mão ao Colt.

Seu gesto foi imitado pelo seu amigo,

ambos desejosos de vingarem o patrão

morto.

Bluf, no entanto, estava atento. Sacou sua

arma e, certeiramente, meteu um balaço na

cabeça de cada um deles.

O assoalho do saloon ficou lavado de

sangue, com três cadáveres estrebuchando.

Atraído pelos tiros, o xerife chegou em

seguida.

— O que houve por aqui? — quis saber.

— Steve queria me surrar e tive de me

defender —f alou o garoto.

— E seus homens tentaram atirar em

Ned, por isso eu os matei — completou

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Bluf.

— Foi isso mesmo que aconteceu? —

indagou Hank ao barman, que se apressou

em concordar. — E vocês, viram isso

também? — indagou, então, aos outros

presentes, muitos dos quais pistoleiros do

próprio Ned.

Todos concordaram com a versão dada

por Ned e Bluf.

— Se é assim, foi legitima defesa, então.

Nada há que se possa fazer — determinou

ele.

— Sim, xerife. Agora é trabalho para o

papa-defuntos. — comentou Bluf. — É

melhor o Ned ir para o rancho agora. Os

rancheiros ainda estão por aí e a coisa pode

esquentar. Não queremos encrencas com

eles, não mais que já temos — acrescentou,

assim que Hank se aproximou da mesa.

— Bluf tem razão, Ned. Vá para o rancho

e deixe as coisas esfriarem.

— Não tenho medo dos rancheiros nem

de ninguém.

— Sabemos disso, mas será melhor para

todos — insistiu Bluf.

Ned se deu por vencido. Terminou a

cerveja e foi embora, seguido por seus

capangas.

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Hank sentou-se para conversar com Bluf.

— Penso que ele está escapando do nosso

controle, Bluf.

— Posso cuidar dele, não se preocupe.

Ele está embalado, julgando-se o maioral.

Deixe-o seguir em frente. Só temos a lucrar

com isso.

— Não sei, Bluf. Não confio nele. Acho

que pode nos enganar a qualquer momento.

— Que nada, Hank. Ele precisa de nós,

precisa de sua proteção, como xerife. Não

fosse isso, eu até poderia achar que ele

começaria a criar asinhas. Sem sua ajuda,

estaria encrencado no primeiro tiroteio.

— Veremos. Espero que ele perceba isso,

Bluf. Caso contrário, teremos de agir contra

ele.

— Vamos aguardar para ver. Logo

iremos vender a primeira manada de gado

roubado. Ned está terminando de marcá-lo.

Quando os lucros começarem a entrar, as

coisas ficam mais fáceis.

— Espero que sim, sócio — falou Hank,

não muito confiante naquilo.

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Aquele foi um dia de tristeza no Rancho

Granger. Dianne chorava a morte do pai,

confortada por amigos e vizinhos.

Uma cova já havia sido cavada na colina

que dominava toda a extensão do rancho.

Ali já repousava a mãe da garota. Agora

seu pai iria fazer-lhe companhia.

Estavam todo preparados, ao entardecer,

para levarem o caixão para a carroça e, dali,

para a sepultura.

Um bando de cavaleiros se aproximou,

no entanto, interrompendo a cerimonia.

Ned e seus homens chegaram e pararam

diante da casa. Ao vê-lo, Dianne ficou

possessa.

— Seu maldito assassino! Vou acabar

com você se não sair daqui imediatamente.

— Acalme-se, querida. Só vim prestar

minhas homenagens ao seu pai. Era um

grande homem.

— Miserável, cínico e covarde! Primeiro

o mata, depois o elogia...

— Acho melhor ser mais educada

comigo, garota. Não vim aqui em busca de

encrenca, mas você me ofende falando

dessa forma — repreendeu-a ele, com rigor.

— É o fim do mundo mesmo. Você está

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mais do que buscando encrenca. Você está

trazendo a encrenca com você — disse um

dos rancheiros, avançando para o pátio.

O som de armas sendo engatilhadas o

fizeram pensar duas vezes antes de qualquer

outra coisa.

— Fique quietinho aí, moço! A conversa

ainda não chegou aí — ameaçou-o Ned.

— O que desejas aqui, afinal? — quis

saber Dianne, já quase fora de si com tanto

cinismo.

— Só vim avisá-la que estarei a sua

disposição para o que precisar...

— Não preciso de sua ajuda — cortou-a

ela. — Tenho muitos amigos aqui.

— Nenhum deles vale tanto quanto eu e

nem todos eles juntos tem a força de meu

dedo. Uma garota especial como você

precisa da proteção de um homem como eu.

— Não o considero um homem, Ned.

Para mim você não passa de um animal

arrogante! — rugiu ela, cuspindo na direção

dele.

Ned saltou do cavalo para o alpendre da

casa, vibrando uma bofetada no rosto da

garota.

O rancheiro mais próximo avançou

contra Ned, mas uma bala disparada por um

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dos pistoleiros, atingiu-o na perna,

derrubando-o pesadamente.

Ninguém pôde fazer nada, diante das

armas dos pistoleiros, apontadas para eles.

— Espero um pouquinho mais de

respeito de você na próxima — falou Ned,

saltando para seu cavalo.

Olhou Dianne demoradamente,

devorando-a com os olhos, depois esporeou

seu cavalo e se afastou, seguido pelos seus

homens.

— Malditos! Precisamos fazer alguma

coisa. O único capaz de enfrentá-lo era seu

pai. Dianne. Não sei o que faremos agora —

disse o rancheiro que fora ferido.

— Pois eu sei o que fazer. Se meu pai

tinha um plano, nada mudou com a morte

dele. Eu realizarei o que ele pretendia fazer.

Vou a Durango contratar pistoleiros.

— Mas o que você entende disso? —

indagou alguém.

— Nada, mas prometo que vou aprender

depressa, muito depressa mesmo — decidiu

ela, os olhos acompanhando a nuvem de

poeira que se formava à passagem de Ned

de seu cortejo.

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No dia seguinte, em Durango, no saloon

Vallecito, um homem bebia sozinho numa

das mesas ao fundo.

Entardecia. Os primeiros vaqueiros e

jogadores começaram a chegar.

O homem que bebia sozinho tinha um

baralho na mão e brincava com as cartas.

Dois jogadores se entreolharam, após

observarem-no. Aproximaram-se da mesa

dele.

— Que tal uma partida de pôquer,

forasteiro? — indagou um deles.

Burt Murdock levantou os olhos para os

dois, examinando-os.

— Como se chamam?

— Sou Ken Willard e este é meu irmão,

Clayton Willard.

Burt reclinou o corpo na cadeira para

examiná-los melhor. Eram típicos

jogadores, com coletes e casaca, chapéu

coco e aquele olhar matreiro que só os

trapaceiros têm.

— Gosto de jogar, mas gosto de jogo

limpo. Não tolero trapaceiros nem ladrões.

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Para este tenho um tratamento especial —

disse, em voz alta, para que todos presentes

ouvissem.

Conseguiu chamar a atenção de todos.

— Só sabemos jogar assim, estranho —

disse Ken. — E você, como é seu nome?

— Meu nome é Dois Mil e Quinhentos

Dólares — respondeu ele, depositando o

maço de dinheiro na mesa.

Os olhos de Ken e de Clayton brilharam

de cobiça. Ao verem todo aquele dinheiro,

as pessoas rodearam a mesa, dispostas a

acompanhar o jogo.

Todos os que conheciam os irmãos

Willard sabiam que o estranho não teria

chances.

Aqueles dois trapaceavam como ninguém

e jamais haviam sido apanhados.

— Você carteia — disse Clayton a Burt.

— A primeira mão é sua.

Começaram o jogo. A principio, os dois

irmãos deixaram que Burt ganhasse

pequenas quantias.

À medida que o jogo foi aumentando,

porém, resolveram começar a agira.

Clayton daria as cartas. Distribuiu as

cinco de praxe para cada um.

— Você troca, estranho. Quantas?

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— Duas — disse Burt.

— E você, Ken?

— Quero três!

Clayton começou a retirar as três cartas.

Juntou-as na mesa e empurrou-as na direção

do irmão.

Burt agiu rápido como um raio. Sua faca

cravou-se sobre a mão de Clayton,

prendendo-a, juntamente com as três cartas,

no tampo da mesa.

— Seu maldito! O que pensa que está

fazendo? — berrou o outro irmão, pondo-se

de pé.

Burt, porém, já enfiava o cano de seu

revólver na boca do jogador.

— Calado! — ordenou.

— Por que fez isso? — indagou Clayton,

tentando tirar a faca.

— Deixe-a aí — ordenou Burt. — Tenho

um amiguinho, um garoto de seis anos, que

encontrei em Alamosa. Ele me contou como

o pai foi roubado por dois jogadores aqui

em Durango, neste saloon. Prometi a ele

que iria ver isso, pois o pai dele se suicidou,

ao perder todo o dinheiro da família,

deixando-a na miséria.

— Não pode nos acusar de trapacear—

disse Clayton, gemendo de dor.

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— Um baralho só tem quatro ases. Eu

tenho dois deles. O terceiro eu descartei e

deveria estar encima do baralho. Só não

poderia estar é entre as três cartas que você

estava passando para o seu irmão. Que acha

de verificarmos? — perguntou Burt,

segurando o cabo da faca e arrancando-a.

Clayton gemeu de dor.

O xerife estivera no saloon e, diante das

provas e das testemunhas, os dois irmãos

foram levados presos.

— Só o aviso para dar o fora da cidade o

mais depressa possível, forasteiro — dissera

o xerife. — Como das vezes anteriores os

dois irmãos vão pagar a fiança e sair.

Quando isso acontecer, virão atrás de você.

— Não terão que andar muito, xerife.

Vou estar bem aqui — afirmou Burt,

calmamente.

— Compreende que nada posso fazer

para impedi-lo de vir atrás de você?

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— Compreendo, xerife. Da mesma forma

como você terá de compreender quando eu

os matar — devolveu Burt.

— Os dois são tão trapaceiros com as

armas quanto são com as cartas, por isso

não espere que eles o enfrentem cara a cara,

na certa vão atacá-lo quando você menos

esperar.

— Eu sabia que não seria de outra forma,

xerife. Não se preocupe comigo.

— Mais uma vez eu insisto. Posso

conseguir umas duas ou três horas de

vantagem para você — avisou o xerife.

— Xerife, mais uma vez eu agradeço,

mas não sou homem de fugir de uma briga.

— É, não sei se você é muito corajoso ou

se é muito estúpido, estranho, mas tome

cuidado, de qualquer modo.

— Tomarei, xerife! — finalizou Burt,

agradecendo-o mais uma vez pela

preocupação.

Sua mesa ficou vazia, bem como as

mesas próximas. Ele continuou no fundo do

salão, bebendo sozinho.

Todos o olhavam de longe, receosos,

como se esperassem que, a qualquer

momento, aquele local onde ele se

encontrava fosse ser varrido de bala.

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Alguém, então, se aproximou e parou

diante dele. Vestia roupas masculinas,

cobertas de pó. Sob o chapéu, porém, um

rosto feminino.

Os cabelos compridos de Dianne estavam

presos no alto da cabeça e cobertos pelo

chapéu de abas retas.

As roupas masculinas compridas e

folgadas escondiam as formas perfeitas de

seu corpo.

— Posso me sentar com você? —

indagou ela, provocando surpresa nele.

Burt a olhou demoradamente,

demonstrando estar confuso com ela.

Dianne tirou o chapéu e seus cabelos

cascatearam sobre seus ombros.

— Está surpreso? — indagou a garota.

— Não, até que não. Quem é você e o

que quer?

— Posso me sentar?

— Não tem medo?

— De quê?

— Parece que todos no saloon estão

esperando a saída daqueles dois da cadeia.

Com certeza eles virão disparando contra

esta mesa. Portanto este não é um lugar

muito saudável para uma garota, mesmo

que ele porte uma arma. Sabe usá-la?

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— Sei com o sacar e atirar.

— Talvez não seja o bastante.

— E não é. Sou uma rancheira, não uma

pistoleira. Afinal, posso ou não me sentar?

— Por favor — disse ele, finalmente, sem

se levantar.

Seus sentidos estavam atentos às reações

das pessoas no saloon.

Quando os dois jogadores viessem atrás

dele, Burt sabia que haveria reações, mesmo

que imperceptíveis, das pessoas no balcão,

na porta e nas janelas.

Por isso não desviava sua atenção,

mantendo-se alerta ao menor sinal.

— Quer beber? — perguntou ele, fazendo

um gesto para o barman que, de longe,

jogou o pequeno copo na direção dele.

Burt o apanhou no ar e riu do medo

demonstrado pelo outro.

— Afinal, o que deseja de mim?

— Sou de Cortez — começou ela. —

Estamos tendo problemas com ladrões de

gado e precisamos contratar pistoleiros para

nossa proteção. Represento a Associação

dos Criadores...

— E o xerife local? — cortou-a Burt.

— É um imprestável. Se duvidar, está

mancomunado com os ladrões.

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— Péssimo! Quando não são covardes

são corruptos — comentou Burt.

— Eu o vi agindo contra os dois

jogadores. Penso que seja um pistoleiro...

— Sou mais do que isso, senhorita...

— Desculpe-me! Sou Dianne Granger.

— Ok, Dianne. Noto que usa um laço

negro na camisa. Está de luto?

— Sim, por meu pai.

— Eu sinto muito!

— Foi assassinato por um pirralho

arrogante que se julga o maioral, só porque

é o maior criador de gado da região...

— E porque ele matou seu pai?

— É o que eu gostaria de saber. Meu pai

era um homem estourado, mas honesto.

Deve ter descoberto algum podre de Ned

Murdock, o rapazola...

— Murdock? Ned Murdock? É parente

do velho Murdock?

— Conhece Jed Murdock?

— Há muito tempo passei por Cortez...

Lembro-me de tê-lo conhecido um dia —

disse Burt e seu tom de voz era saudoso.

A expressão de seu rosto também mudou.

Ele ficou triste e isso nublou seus olhos

cinzentos.

— Pois é. Depois da morte do pai...

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— Jed Murdock tinha outro filho? —

surpreendeu-se Burt.

— Como outro filho? Desde que o

conheço, sempre soube que Ned era o único

filho dele — estranhou a garota.

— Está bem, acho que estou fazendo

confusão — descartou Burt. — Foi há tanto

tempo...

— Pois bem, como eu ia dizendo, após a

morte do pai, Ned Murdock se tornou

arrogante e cercado de pistoleiros. Matou

meu pai por nada, aparentemente. É o único

que tem ficado livre dos roubos de gado e,

por incrível que pareça, todas as pistas

levam na direção das terras dele, onde

nenhuma cabeça foi roubada até agora.

— Suspeitam que ele esteja por trás dos

roubos?

— De certa forma, sim, mas não se [pode

entender o motivo. Sozinho ele deve ter em

torno de uma cem mil cabeças de gado. Ou

é muito burro para perceber o quanto é isso

ou é ambicioso demais para querer todo o

resto.

— E vocês procuram pistoleiros para

enfrentá-lo ou para protegê-los.

— A idéia é nos proteger, antes de mais

nada. Se continuarem os roubos, muitos

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acabarão quebrados, quando chegar o

momento de pagar os empréstimos no

Banco.

— E você quer me contratar.

— Sim, se estiver disponível.

Ele pensou por instantes, os olhos frios e

cinzentos sempre atentos às reações das

pessoas no saloon.

— Acho que estou disponível — afirmou

ele. — Costumo cobrar mil dólares pelo

trabalho, cem dólares para cada membro da

quadrilha preso ou morto, é indiferente para

mim, mais cinco dólares por cabeça de gado

recuperada.

Dianne não precisou fazer a conta

completa para perceber que aquilo

representava muito dinheiro.

Esboçou um sorriso incrédulo.

— Se formos pagar isso para cada

pistoleiros contratado, melhor será entregar

todo o rebanho para os ladrões — concluiu

ela.

— Você não entende o acordo. Pagará o

que eu disse pelo meu trabalho e nada mais.

— E os outros?

— Que outros?

— Os outros pistoleiros que vão ajudá-

lo?

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— Ninguém vai me ajudar. Eu sempre

trabalho sozinho, Dianne.

Os olhos dela fitaram com incredulidade

aquele homem, que falava com convicção

sobre seu trabalho macabro.

— O que você é, afinal? — indagou ela,

olhando-o sem entender.

— Um caçador de recompensas —

respondeu ele.

Burt havia estendido o pé e, sem que

Dianne percebesse, apoiando a sola da bota

no braço da cadeira dela.

Repentinamente, ele empurrou a cadeira

dela para trás, ao mesmo tempo em que se

jogava para o lado.

Uma descarga de chumbo picotou o

tempo da mesa onde eles estiveram

conversando.

Dianne ficou imóvel, ouvindo as balas

assobiando sobre sua cabeça.

Os dois jogadores entraram no saloon

com as armas fumegantes na mão.

Ken havia atirado da porta. Clayton da

janela, quebrando os vidros.

— Vamos dar o fora agora — gritou

Clayton.

— Quero ver se o maldito está morto

antes de dar o fora da cidade — respondeu

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seu irmão, recarregando o Colt.

Burt se levantou, então, com a arma ainda

no coldre. Fitou os dois irmãos, que haviam

se imobilizado de surpresa.

— Foi um erro terem voltado aqui —

falou e sacou sua arma.

Um tiro atingiu o peito de Clayton,

jogando-o para trás. Seu irmão ergueu o

Colt para responder ao fogo, mas Burt foi

impiedoso.

Disparou duas vezes, atingindo-o na

cabeça e no peito, derrubando-o sobre o

irmão.

Os dois estrebucharam no assoalho,

banhados de sangue. Burt estendeu a mão,

ajudando Dianne a se levantar.

— Como soube? — quis ela saber,

perguntando num fio de voz emocionado.

— As pessoas junto à porta e à janela se

afastaram. Os que estavam no balcão

olharam repetidas vezes para cá e para os

dois irmãos, lá fora.

— Fantástico! Foi muito bom, mas daí a

capturar sozinho toda quadrilha de ladrões

de gado vai uma distancia enorme —

comentou ela.

— Posso lhe dar referencias — falou ele,

com tranqüilidade.

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— Referencias?

— Sim. Basta telegrafar para a

Associação dos Criadores de Red River, No

Novo México, de onde estou vindo e para

uma porção de outros lugares que poderei

discriminar.

A garota não estava ainda de todo

convencida. Burt não se preocupou em

insistir.

Pensava em seu pai, Jed Murdock, da

briga que tivera e que o fizera se afastar de

casa havia mais de vinte anos.

Após a morte da primeira esposa, Jed,

que tinha um gênio difícil, ficou pior ainda.

Burt não o suportou. Aos vinte anos fugiu

de casa. Mesmo agora, sabendo da morte do

pai, não podia deixar de se sentir triste.

Apesar de tudo, gostava daquele velho

brigador.

— Você me disse que, após a morte de

Jed, seu filho ficou com todo o rancho?

— Sim, é o único herdeiro.

— Entendo! — comentou Burt,

pensativo. — Tenho de ir para Cortez, de

qualquer forma — continuou ele. — Se

quiser me contratar, nada terá a perder. Só

recebei depois de terminar o trabalho.

— Nada adiantado?

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— Nada.

— Tem certeza que dará conta do

trabalho?

— Você verá — afirmou ele, vendo o

papa-defuntos tirar as medidas dos irmãos

mortos e o xerife, parado na porta do

saloon, balançar a cabeça num gesto

cansado.

— Está bem. Trato feito — decidiu ela,

finalmente.

— Muito bem. Antes de mais nada,

poderemos voltar juntos para Cortez, mas,

uma vez lá dentro, você não me conhece

nem nunca ouviu falar em mim. Serei um

desconhecido para você. Se eu precisar de

alguma coisa, a procurarei em sua casa,

sempre à noite, após as oito horas, nunca

antes.

— Terei de falar a seu respeito aos outros

rancheiros.

— Tudo bem, mas quanto menos pessoas

souberem de minha presença, melhor.

Normalmente faço muito barulho quando

chego a algum lugar. Se lhe perguntarem se

sou o pistoleiro que você contratou, negue

sempre.

— Certo, mas por que tudo isso?

— Porque, normalmente, uma quadrilha

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como essa sempre conta com a proteção de

alguém. Se souberem que estou lá para

caçá-los, logo eles se voltarão contra mim.

— É, faz sentido. Acho que combinamos

tudo, não? Afinal, qual é o seu nome?

— Burt... Burt Taylor — mentiu ele.

— Ok, Burt! Temos um acordo, então.

Ela estendeu a mão sobre a mesa. Burt a

apertou suavemente, desmentindo toda a

rudeza de seu rosto queimado pelo sol.

No dia seguinte, quando retornou a

Cortez e já estava em sua casa, Dianne foi

procurada por um grupo de rancheiros,

liderados por John Waltman, amigo de seu

falecido pai.

— Contratou os pistoleiros? — indagou

ele.

— Sim, estão contratados.

— E quanto são?

— Meia dúzia, talvez mais. Os melhores

existentes — mentiu ela.

— Quanto custará?

Ela informou o que Burt lhe pedira.

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— Parece-me razoável, mas será que

ainda poderá falar com eles e desistir do

acordo? Nem que tenhamos de indenizá-los

pelo trabalho de se porem a caminho.

— Como? — surpreendeu-se ela.

— Espere, deixe-me explicar-lhe —

pediu John. — Ned me procurou ontem.

Ficou sabendo que iríamos contratar

pistoleiros...

— Como ele ficou sabendo?

— Não sei. Viram você deixando a

cidade. Os boatos correm rapidamente. Ned

me procurou. Fez uma oferta...

— Oferta? De Ned? Que tipo de oferta?

— Nós lhe damos um quarto de nossas

manadas e ele nos dá proteção contra os

ladrões de gado.

— O quê? — surpreendeu-se ela, mal

podendo acreditar no que ouvia. — Vocês

pretendem aceitar?

— Veja bem, ainda será vantajoso para

nós. Teremos proteção e...

— E quem garante que os roubos não

continuarão? Quem garante que, após um

quarto de todo o gado, ele não peça mais?

Quem garante que não seja ele mesmo

quem esteja mandando nos roubar? Gente,

temos de pensar friamente. Aquele moleque

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é capaz de tudo. Isto é extorsão.

— Pode ser, mas será a solução para os

nossos problemas.

— Eu não aceitarei isso. Lutarei até o

fim. Vocês me deram procuração para

contratar os pistoleiros. Eles estão a

caminho e não há como impedir isso.

Aceitar a proposta de Ned é submeter-se a

chantagem. Não permitirei isso. Meu pai

jamais aceitarei isso também.

— Você tem que ser razoável, Dianne —

insistiu John.

— Não, jamais.

— O gordo nos livrará de problemas.

— Já estamos com problemas. E o gado

que já foi roubado? Será descontado? Será

recuperado? O que Ned fará a respeito?

— Não conversamos sobre isso, querida

— respondeu John.

Dianne notou que os demais rancheiros

permaneciam em silencio e que pareciam

até não concordar com John.

Este, sim, estava muito empenhado em

vender aquela proposta indecente de Ned

Murdock.

— Só há uma forma de resolver isto —

disse ela. — Vamos votar. quem está favor

de minha idéia, levante a mão — disse ela,

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decididamente, erguendo a mão direita.

Os outros rancheiros, exceto John

Waltman, a seguiram.

Naquela tarde, Bluf e Ned bebiam e

conversavam no saloon sobre a nova

estratégia desenvolvida pelo garoto.

— E então, o que achou? Com isso,

teremos um quarto de todo o rebanho dos

rancheiros — explicou Ned.

— Fantástico, garoto! Você me

surpreende cada vez mais.

— Dessa forma, eles vão me entregar

reses marcadas. Compreende o que isso

significa, não?

— Que poderemos roubar reses marcadas

também.

— Sim, isso mesmo.

— Mas aí os rancheiros vão protestar.

— Quem protestar, eu me oferecerei para

comprar as terras dele.

— O que pretende com isso? Ser o dono

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de toda a região?

— E por que não?

Bluf olhou-o. O garoto era inteligente,

mas era louco, completamente louco.

Só que isso, longe de incomodar o

jogador, mais o animava. Afinal, quanto

mais Ned tivesse, mais ele e Hank

lucrariam.

Quando se cansassem de servi-lo e já

estivessem com tudo nas mãos, poderiam

descartá-lo.

Sairiam daquilo ricos e, sendo Hank o

xerife, poderiam jogar toda a culpa dos

roubos em Ned que, morto, não poderia se

defender.

Bluf adorava aquele plano.

— Que tipo! — comentou Ned,

observando o homem que entrava no

saloon.

Era alto e usava esporas mexicanas, que

tiniam ao bater no assoalho.

Vestia uma longa capa de viagem,

coberta de poeira. Tinha o rosto curtido pelo

sol e um olhar frio e desconfiado nos olhos

de um azul quase cinzento.

Encostou-se no balcão.

— Uma tequila e uma cerveja — pediu

ele.

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O barman o serviu. O homem bebeu a

tequila, depois tomou alguns goles de

cerveja.

Estalou a língua, deliciado. Terminou a

cerveja e pediu outra dose.

Sobre o balcão deixara uma moeda de um

dólar.

— Vai beber tudo isso? — apontou o

barman.

— Sim. Vá repetindo até esgotar o

dinheiro.

— Tudo bem, estranho — concordou o

atendente, repetindo a dose.

O xerife entrou logo em seguida. Bluf

fez-lhe um sinal, mostrando o homem junto

ao balcão.

Hank foi até lá. O forasteiro, ao ver a

estrela, não se intimidou.

— Bebe comigo, xerife?

— E por que não? — retrucou Hank,

pedindo um uísque.

— A nossa — disse o forasteiro,

levantando o copo.

— A nossa — aceitou Hank, tocando seu

copo no dele.

— Como é seu nome, estranho?

— Burt Taylor.

— Procura trabalho.

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— Não, estou de passagem. Quero

descansar por um dia ou dois, depois seguir

viagem.

— De onde vem?

— Do sul.

— Para onde vai?

— Norte — respondeu Burt, repetindo a

dose de sua bebida.

— Vejo que usa um cinturão todo

especial — observou Hank.

— Gosto do coldre baixo assim. Fica

mais fácil sacar. Há muitas cascavéis na

estrada e é preciso estar atento, se é que me

entende.

— Sim, eu entendo, Burt Taylor. Se

mudar de idéia, desejando ficar e trabalhar,

fale comigo. Acho que tenho um bom lugar

para um homem como você.

— Como eu?

— Sim... Que usa coldres baixos e sabe

atirar em cascavéis, se é que me entende —

brincou Hank, agradecendo pelo uísque e

indo para a mesa de Bluf e Ned.

— Quem é? — quis saber Ned.

— Um viajante.

— Há muito não vejo um homem com

esse tipo de capa — comentou.

— São viajantes...

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— Ou caçadores de recompensa —

completou Bluf.

— Sim, era isso que ia dizer — ajuntou

Ned. — Soube que a garota Granger foi até

Durango atrás de pistoleiros.

— Pistoleiros, não caçadores de

recompensa — corrigiu Hank.

— De qualquer forma, fique de olho nele,

Hank. Nunca se sabe — alertou Bluf.

Naquele momento, Arthur Brandon, um

pequeno rancheiro, entrou no saloon.

Trazia uma espingarda engatilhada e o

rosto ensangüentado. Olhou na direção da

mesa de Ned e ergueu a arma.

— Fique aí mesmo, maldito! — gritou.

— Seus pistoleiros acabam de roubar meu

gado, mas eu os segui até seu rancho. Eles

me pegaram, quase me mataram. Deixaram-

me para os abutres, mas tenho o couro duro

— disse o homem, aproximando-se.

— Arthur, fique calmo — pediu o xerife.

— Cale a boca você, seu incompetente

corrupto. Pensa que eu não sei? Você e eles

estão juntos nesse negocio sujo.

— Espere aí. Assim você está me

ofendendo e não posso permitir que... — ia

dizendo Hank, mas calou-se quando os dois

canos da espingarda se voltaram para ele.

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— Fique aí mesmo. Eu quero é esse

pirralho bastardo, esse filho de uma

dançarina de cabaré que nem sabe ao certo

quem é o pai dele. Pode ter sido qualquer

um de nós, rapazes — falou o rancheiro,

com ódio, completamente fora de si.

— Maldito boca grande! — falou Ned e

sua mão se moveu com incrível rapidez.

A faca atravessou o saloon e atingiu a

garganta do rancheiro, atravessando-a.

O homem caiu para trás, apertando os

dois gatilhos da espingarda, abrindo um

rombo no forro.

Ned sacou a arma e foi até ele. O velho

estrebuchava, os olhos revirados, a boca

vomitando sangue.

— Chega, Ned! Ele já está morto — disse

Hank, detendo-o, impedindo-o de disparar

contra um cadáver.

— Miserável! Maldito mentiroso! —

repetia Ned, retornando à mesa.

Sem que percebesse, Burt havia

apanhado mais uma tequila e uma cerveja e

ido sentar-se numa das mesas próximas

deles.

Fingiu-se de bêbado e cansado,

debruçando-se sobre a mesa, como se

estivesse dormindo.

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— Sente-se, John. O que tem a me dizer

da proposta que fiz aos rancheiros? —

indagou Ned.

O rancheiro olhou para os lados primeiro,

antes de começar a falar.

— Levei sua proposta a eles. Estavam tão

assustados que acabariam concordando.

Quiseram falar com Dianne Granger e ela

os convenceu do contrário.

— Maldita garota! É teimosa como uma

mula. Soube que ela foi contratar

pistoleiros, é verdade?

— Sim, estava em Durango e contratou

seis deles. Estão vindo para cá.

— Ótimo, cuidarei disso. Quer dizer que

nada feito, então?

— Infelizmente, não.

— É uma pena, John. Você perdeu uma

gorda comissão. Devia ter se esforçado

mais.

— Foi aquela garota. Sem ela, eles teriam

concordado.

Ned pensou por instantes, olhando para

seus sócios.

— E se eu cuidar da garota, você

conseguirá convencer os outros rancheiros?

— Com toda certeza.

— Está bem. Espere, então, eu cuidar

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dela, depois volte a falar com eles.

— Certo, Ned — despediu-se John,

saindo.

— O que vai fazer, Ned? — indagou

Bluf.

— Deixem comigo — falou o garoto,

fazendo um sinal para um homem no

balcão.

Era Melrose Summer, um de seus

homens de confiança e pistoleiro da pior

espécie.

— Pois não, patrão — apresentou-se ele

rapidamente.

— Mel, quero que vá até o rancho da

garota Granger e diga a ela que desejo

conversar com ela.

— Acho que não será preciso, patrão. Eu

a vi entrar no armazém há uns dez minutos.

— Verdade? Pois vá lá e traga-a até aqui.

Preciso acertar umas coisinhas com aquela

gata selvagem.

— Deixe comigo. Levarei Bob e Will —

falou o pistoleiro, indo até o balcão

conversar com seus parceiros.

Burt se levantou preguiçosamente, bebeu

o resto de tequila e cerveja, depois foi até o

balcão.

— Onde arrumo um quarto e uma boa

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janta?

— Na pensão da viuva Moriarty. É só

descer a rua. Verá a placa na frente da casa.

Burt agradeceu e saiu, ainda na frente dos

pistoleiros de Ned.

Olhou a rua, examinando os prédios. O

armazém ficava rua abaixo, na direção da

pensão.

Montou seu cavalo e, sem pressa,

começou a descer a rua. Os homens de Ned

deixaram o saloon.

Burt viu Dianne saindo do armazém. Ao

vê-lo, a garota ficou parada, apenas

olhando-o.

Ele segurou o cavalo.

— Por favor, senhorita! — disse ele. —

Onde fica a pensão da viuva Moriarty?

— Descendo a rua, na próxima esquina.

É aquela casa com a cerca branca —

apontou ela.

Nesse momento, os três homens de Ned

chegaram.

— Temos um recado para você, dona.

Ned quer vê-la agora mesmo — falou

Melrose.

— Digam a ele que vá para o inferno!

Não tenho nada a tratar com ele — falou

ela, virando as costas para se afastar.

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Mel a segurou pelo braço, obrigando-a se

voltar.

— Não me faça obrigá-la a ir, dona. Eu

gostaria muito de levá-la sem problemas.

— Largue-me, seu animal — exigiu ela,

tentando se libertar da mão que a segurava.

— Vou levá-la por bem ou por mal —

falou o pistoleiro, irritando-se.

— Já disse que não vou — decidiu ela,

livrando-se dele com um empurrão.

Os outros dois correram e barram-lhe o

caminho. Burt, em seu cavalo ainda,

indagou:

— Precisa de ajuda, dona?

— Meta-se com sua vida, estranho, ou

vai se arrepender! — rosnou-lhe Mel.

— Eu falei com a moça aí — ignorou-o

Burt.

— Sim, preciso de ajuda.

Burt desmontou lentamente, sem pressa

alguma. As pessoas observaram a cena com

interesse.

Antecipadamente já lamentavam a sorte

daquele forasteiro que ousava enfrentar os

homens de Ned Murdock.

Sabiam que ela não teria chance. Aqueles

homens eram cruéis e implacáveis.

Os homens desviaram a atenção de

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Dianne para o intrometido que ousava

desafiá-los.

— Qual é seu nome, estranho? —

indagou Mel.

— Burt Taylor, por quê?

— Para mandar escrever em sua lápide,

lá na Colina dos Pés Juntos.

Os outros pistoleiros riram. Burt não se

intimidou, encarando-os com seus olhos

cinzentos.

Dianne se afastou, mas ficou observando

a cena à distancia.

— Você fala demais — disse Burt.

— Acho que não sabe com quem está

lidando — comentou Mel, arrogante.

— Reconheço um coiote pelo cheiro —

zombou Burt.

— É um piadista... Que bom, rapazes!

Temos alguém para pôr no palco do saloon

e nos contar algumas piadas — falou Mel.

— Que acha desta aqui? — acrescentou,

lançando o punho contra o rosto do

forasteiro.

Burt apenas desviou o corpo e o punho

do pistoleiro passou ao lado de seu rosto.

Em resposta, ele socou-o na orelha,

fazendo-o ir se estatelar na poeira da rua.

— Maldito intrometido! — rugiu o

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segundo, dando um pontapé em Burt.

O caçador de recompensa segurou-o pela

bota e chutou-lhe os testículos, fazendo-o

urrar de dor e se dobrar para frente.

Burt não teve piedade. Acertou-lhe um

chute no rosto, jogando-o sobre Mel, na

poeira da rua.

O outro pistoleiro sacou de uma faca.

— Arrancar-lhe o couro bem devagarinho

— disse, avançando para o justiceiro.

A faca rebrilhou ao sol por instantes,

depois voou alto e foi cair no meio da rua.

Burt a havia tirado da mão do pistoleiro

com um chute. Antes que seu oponente se

recuperasse da surpresa, ele o golpeou no

queixo, derrubando-o desacordado.

As pessoas aplaudiram, surpresas com a

surra aplicada nos homens de Ned.

Burt saltou para o seu cavalo. Ao passar

por Dianne, disse-lhe em voz alta.

— Está tudo bem agora, senhorita.

Garanto que eles não mais a incomodarão.

— Eu fico muito grata por isso,

forasteiro, mas acho que se meteu numa

encrenca por isso.

— Não me importo. Encrenca tem sido

meu meio de vida, moça.

Ele a saudou tocando a aba do chapéu e

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desceu a rua, na direção da pensão da viuva

Moriarty.

Atrás dele, na porta do saloon, Ned não

se conformava com a surra levada por seus

homens.

— Quero que o investigue, Hank. Esse

sujeito me parece perigoso. Num momento

está atrás de nós, dormindo. No outro, está

na rua, brigando com três dos meus

melhores homens e dando-lhes uma lição.

— Já falei com ele, Ned. É um sujeito

perigoso mesmo, deu para perceber. Seus

capangas tiveram sorte dele não ter sacado a

arma. Estariam mortos, tenho certeza.

— Faça-lhe uma oferta, Hank.

— Ora, Ned! Sou o xerife, isso não fica

bem.

— Certo, então, mandarei alguém

convidá-lo para tomar um drinque comigo e

conversar.

— É boa a sua idéia, mas seja lá quem

for, mande-o ir com calma com esse

forasteiro. Não é flor que se cheire. É um

homem acostumado a fazer as suas próprias

regras e jamais obedecer ordens, seja lá de

quem for.

— Isso nós veremos!

— E quanto à garota? — quis saber Bluf.

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— Vou mandar os rapazes buscarem um

pouco do gado dela.

— Só isso?

— Não, irei junto e farei uma visita a ela.

Hoje é lua cheia, noite romântica, própria

para um encontro amoroso.

— Vai se dar mal com ela — alertou

Hank.

— É uma gata selvagem, só precisa de

quem a dome — falou ele, com

fanfarronice.

— Espero que tenha razão e não saia de

lá arranhado pela gata que pretende

conquistar.

— Eu sei o que estou fazendo — afirmou

ele, indo selecionar um capanga para

mandar convidar Burt para um drinque.

Burt havia chegado há pouco tempo na

cidade, mas já fora o suficiente para

perceber como as coisas funcionavam.

Ned Murdock, seu meio-irmão, era um

ambicioso tirano, disposto a tomar tudo pela

força pelo terror.

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Estava roubando o gado dos rancheiros e

ainda forçando-os a pagarem por proteção.

Era sempre o mesmo em toda parte. Só

que, desta vez, a família dele estava

envolvida.

Não nutria nenhum sentimento por Ned.

Simplesmente não o conhecia e, para agir

daquela forma, Ned não sabia da existência

de um filho de Jed Murdock.

Assim sendo, estavam ambos na mesma

posição, só que Ned se apossara da fortuna

que, por direito, seria toda de Burt.

O caçador ainda não sabia o que faria a

respeito. Seu senso de dever o levava a se

preocupar inicialmente com seu trabalho.

Estava ali para desbaratar uma quadrilha

de ladrões de gado e o faria. tinha

conseguido algumas boas pistas, como a

intenção Ned de mandar roubar gado de

Dianne.

Seria um bom começo para sua

investigação.

— Vi o que fez e adorei — comentou a

viuva Moriarty, quando Burt desceu do

cavalo, diante da cerca nova.

— Parece que aqui ninguém gosta dos

pistoleiros de Ned Murdock — observou

ele.

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— Realmente. Aquele garoto arrogante

ainda vai se dar mal, ouça o que lhe digo.

— Imagino mesmo. Soube que tem

quartos para alugar?

— Para você? Oh sim, claro! Entre.

Tenho um ótimo quarto, de frente para a

rua, com banheira e tudo. Você vai adorar

— disse a velhinha, levando-o para o

interior da casa. — Se quiser tomar um

banho, mando esquentar a água para você.

Tenho água fria encanada. É bom no calor,

mas péssimo no inverno.

— Eu adoraria um bom banho. Tenho

algumas roupas que precisam ser lavadas...

— Eu cobro à parte, mas posso fazer isso

por você. Estão no alforje da sela?

— Sim...

— Eu pego, pode deixar.

Burt foi levado a um pequeno e

confortável quarto, no pavimento superior

da casa. Havia uma cama, banheiro no fim

do corredor e um cheiro de limpeza

encantador.

— É o melhor que já tive em toda a

minha vida, Sra. Moriarty —declarou ele.

— Fico feliz que gosta. Vou cuidar do

seu banho.

— Há uma muda de roupa limpa no

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alforje. Agradeceria se a passasse para mim.

— Pode deixar que eu cuido de tudo —

afirmou ela, retirando-se.

Burt foi até a janela. Viu um dos homens

que estava no saloon descendo a rua. Ficou

de sobreaviso.

O pistoleiro falou com a viuva, que

retirava o alforje da sela, depois entrou na

casa.

Burt foi esperá-lo no alto da escada, com

o Colt preparado no coldre.

Ao vê-lo, o pistoleiro parou,

impressionado.

— O que deseja? — indagou o caçador

de recompensa.

— Meu patrão o convida para um

drinque.

— Muito gentil, mas quem é seu patrão?

— Ned Murdock.

— Lá no saloon?

— Sim. Ele o espera agora.

— Vou tirar a poeira do couro e vestir

uma roupa limpa. Assim que terminar, irei

até lá — finalizou ele.

O pistoleiro ainda o mediu dos pés à

cabeça, como que avaliando-o. Burt já vira

aquele olhar antes. Normalmente vinha de

um sério candidato a defunto.

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Tomou um banho quente, fez a barba,

mudou de roupas, vestiu o cinturão e foi

para o saloon.

Quando passava pela rua, as pessoas

comuns o olhavam com respeito, naquele

comecinho de noite.

Os lampiões da rua começavam a ser

acesos. As pessoas que trabalhavam no

comércio fechavam suas lojas e iam para

casa.

Burt imaginou como seria viver uma vida

monótona e tranqüila como aquela, sem

sobressaltos, tendo sempre um lugar para

onde voltar, com alguém o esperando.

Desconhecia esse ritmo de vida. Tornara-

se um caçador havia mais de quinze anos.

Já nem se lembrava mais dos homens que

matara. Ganhara muito dinheiro, mas tão

fácil como vinha também ia.

Jogo, mulheres e bebida levavam tudo o

que ganhava. Ultimamente, porém, havia

percebido que precisava começar a pensar

na velhice.

Beirava os quarenta anos. Não poderia

ser um caçador o resto de sua vida.

Quando entrou no saloon, um silencio

pairou no ar. Todos ficaram de olho nele e

em Ned Murdock, que bebia juntamente

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com Bluf.

Burt foi até a mesa deles.

— Queria me ver? — indagou.

— Sente-se, estranho — convidou Ned.

Burt o atendeu, sempre com cautela,

mantendo seus olhos nos dois homens

diante dele e nos outros, espalhados pelo

salão.

O barman trouxe um copo de tequila e

outro de cerveja.

— Vejo que tem boa memória —

observou Burt.

O homem sorriu e se afastou

rapidamente. Burt bebeu o copo de tequila,

depois tomou alguns goles de cerveja.

Encarou Ned Murdock buscando nele

alguma semelhança com o seu pai, sem

conseguí-lo.

— Soube que é filho de Jed Murdock, é

verdade? — indagou.

— Por quê? Conhecia o velho? —

retrucou Ned.

— Passei por aqui há muito tempo atrás.

Na época ele era viuvo e tinha um filho...

— Filho? Nunca soube de filho nenhum.

Você sabia disso, Bluf? — indagou ao

sócio.

— Nunca ouvi falar.

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— Pois nem eu — afirmou o rapaz, já

bastante alto. — Mas não o convidei aqui

para falar de amenidades. Soube que está de

passagem, é verdade?

— Sim.

— Não procura trabalho? Vi o que fez

com três dos meus melhores homens...

— Se aqueles eram os melhores, fico

imaginando que porcaria devem ser os

outros — zombou Burt.

O rosto do rapaz ficou sério, olhando-o

com rancor.

— Não zombe de meus homens,

forasteiro. Está em minha cidade e aqui,

quando eu toco, todos têm que dançar.

— Inclusive eu?

— Eu disse que todos têm que dançar.

Todos, entendeu?

— Perfeitamente — respondeu Burt,

reclinando-se em sua cadeira e olhando o

garoto.

Era um pirralho, realmente, mas

arrogante e senhor de si. Adoraria dar-lhe

uma lição.

— Vou lhe fazer uma proposta...

— Que proposta?

— Uma proposta de trabalho...

— Já disse que não estou à procura de

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trabalho.

Ned inclinou-se sobre a mesa para falar

mais de perto.

— Um tipo como você, que surra três dos

meus homens com tamanha facilidade, não

pode ficar nesta cidade sem trabalhar para

mim. Isso me deixa nervoso, sabia? E

quando fico nervoso, eu faço besteiras.

— Assim, não me deixa escolha, não? Ou

trabalho para você ou dou o fora da cidade...

— Acertou — disse Ned, apontando o

dedo direto para a cara do caçador de

recompensa.

Burt inclinou-se. segurou o dedo dele e o

abaixou até a mesa.

— Não gosto que apontem para mim,

seja um dedo ou uma arma. Além disso, não

gosto também de receber ordens. Sou meu

próprio patrão e pretendo continuar assim.

Agradeço pelo drinque — disse,

levantando-se.

— Ainda não terminei — berrou Ned,

possesso com a atitude do outro.

— Você não entendeu, garoto. Eu já

terminei — falou Burt, acabando de beber a

cerveja e depositando o copo com força

sobre a mesa.

Ned ficou olhando para ele como louco.

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Sua mão procurou a faca que trazia às

costas.

— Não! — murmurou Bluf, detendo-o.

Melrose e seus dois amigos estavam no

balcão. Foram, se postar diante de Burt,

impedindo-o de sair.

— Não ficaram satisfeitos ainda? —

indagou Burt.

— Você teve sorte, apenas isso — falou

mel.

— Vão tentar a sorte de novo?

— Não vai se sair bem desta vez.

— Vocês me dão pena — disse Burt,

empurrando Mel para passar entre os três.

A reação foi rápida. Um dos homens o

agarrou por trás, imobilizando seus braços.

Mel, diante dele, preparou-se para socá-lo

no estômago.

Burt jogou a cabeça para trás e o som do

nariz se partindo foi seguido por um grito

de dor.

O sangue lavou a cara do pistoleiro que

segurava o caçador. Por uma fração de

segundos, mel deteve seu golpe, tempo

suficiente para Burt atingi-lo no estômago

com um pontapé.

O terceiro homem não quis brincadeira.

Foi logo sacando a arma. Burt segurou-lhe o

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pulso e girou o corpo, pondo o braço do

homem sobre seu ombro.

Puxou com força para baixo e o osso

estalou, quebrando-se, rasgando a pele e a

camisa.

Um urro de dor se seguiu ao estalo. Mel

tentou se erguer, ainda sem fôlego. Burt

meteu-lhe o pé na cara, desta vez, jogando-o

de costas no assoalho, com a cara cheia de

sangue.

Deixou o saloon, em seguida, sem olhar

para trás.

— Ele é um homem morto — declarou

Ned. — Quando eu terminar com aquela

garota, hoje à noite, cuidarei dele a meu

modo.

Naquele noite, após o excelente jantar

servido pela viuva, Burt foi se sentar na

varanda da casa para fumar.

Pouca gente passava na rua, apenas um

ou outro cavaleiro. Ele esperava. Precisava

falar com Dianne naquela mesma noite e,

além disso, evitar o roubo do gado dela,

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bem como o ataque de Ned.

O garoto era perigoso, não restava a

menor dúvida, mas Burt já havia enfrentado

gente mais perigosa e mais experiente.

O garoto tinha poder, tinha capangas,

mas capangas não eram pessoas de

confiança.

Ao primeiro sinal de perigo trocavam o

pagamento pela vida. O que ganhavam não

justificava morrer pelo patrão.

— Vai sair? — indagou a viuva, quando

ele subiu, para retornar, pouco depois, com

o cinturão e o Colt.

— Vou dar uma volta, arejar as idéias —

disse ele, com tranqüilidade.

— Tome cuidado. Tem gente que não

gosta de você nesta cidade. Não vá pegar

uma indigestão andando por aí.

— Não se preocupe, Sra. Moriarty. Eu

tenho o remédio para isso — afirmou ele,

batendo na coronha do Colt.

Ela riu e ele foi selar o cavalo. Pouco

depois ele sumia no fim da rua.

Sabia onde era o rancho de Dianne.

Naquele dia, quando chegaram juntos de

Durango, ele a deixara na porteira do

rancho.

A noite estava clara. A lua cheia vinha

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surgindo, clareando os campos e os pastos,

mostrando a pujança daquela região.

Havia algumas coisas que ele reconhecia

naquela paisagem. O contorno das

montanhas ao longe, a trilha que levava até

a cidade, a localização do rio e de um lago

que havia por ali.

Era imagem familiares, do tempo de sua

juventude, antes de deixar o rancho.

Ao se aproximar do Rancho Granger,

ouviu um tropel de cavalos vindo da cidade.

A nuvem de poeira indicava um grupo de

cavaleiros vindo na sua direção.

Deduziu que era Ned e seus capangas,

por isso esporeou o cavalo, chegando ao

rancho antes deles.

Havia luz na sala de jantar. Burt entrou

rapidamente, surpreendendo Dianne, que

jantava sozinha.

— Pegue uma arma — ordenou ele,

apagando os lampiões que iluminavam a

sala.

Com seu rifle na mão, ele ficou à espera.

Dianne foi se encostar nele, junto à janela.

Ele sentia o corpo dela tremer.

— O que foi? — quis saber a garota.

— Onde estão seus vaqueiros?

— Estão fora, nos pastos caçando as

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desgarradas, por quê?

— Há mais alguém na casa?

— Não, faço tudo sozinha. Há dois

homens no alojamento, mas estão feridos.

Caíram do cavalo, quando cavalgavam.

— Ned Murdock está vindo aí com seus

homens. Pretendem roubar seu gado e ele,

pessoalmente, deseja cumprimentá-la —

ironizou ele.

— Imagino o tipo de cumprimento que

ele tem para mim.

— Quanto gado tem no pasto?

— No cercado, umas duas mil cabeças,

mas há muito mais nos pastos.

— Para Ned isso nada significa, mas para

você é bastante, não?

— Se é! — concordou ela, encostando-se

mais nele, quando o tropel de cavalos

invadiu a sede da fazenda.

— Malditos! — murmurou Burt, vendo

que os homens traziam tochas. — Vão

incendiar tudo.

— Ah, isso não — respondeu Dianne,

fazendo pontaria.

Ao seu disparo, um dos homens caiu

sobre a própria tocha, apagando-a. Os

outros abriram fogo contra a casa.

Burt a forçou abaixar a cabeça, enquanto

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as balas assobiavam sobre eles.

— Gata selvagem! — berrou Ned,

chutando a porta e entrando como um

furacão.

Os homens pararam de atirar lá fora. Burt

se levantou como um felino e seu punho

atingiu em cheio o rosto do garoto, jogando-

o contra a parede.

Ao cair, ele derrubou uma moldura com

fotografia. O barulho de vidros se

quebrando fez seus homens rirem lá fora.

— Aí, Ned! Cuidado ou ela vai arrancar

seu couro!

Ned se ergueu aturdido, na escuridão. O

punho de Burt afundou-se no estômago dele

repetidas vezes, esgotando todo o ar que o

jovem tinha em seus pulmões.

Finalmente, um soco em seu maxilar o

derrubou sobre a mesa, quebrando pratos e

copos.

Os homens riram mais alto lá fora. Burt

segurou o jovem pelos colarinhos e o levou

para fora.

Quando surgiu na varanda da casa, os

homens silenciaram-se.

— Quem é você? — indagaram eles,

incapazes de definirem, na escuridão, de

quem se tratava.

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Burt fez questão de ficar fora da claridade

da lua.

— Vai se arrepender disso, homem —

falou outro pistoleiro.

Em resposta, Burt sacou sua arma. Soltou

Ned, depois chutou-lhe o traseiro, jogando-

o na poeira.

Um dos pistoleiros apontou a arma na

direção de Burt. Seu movimento foi em vão.

Um disparo fez seu chapéu voar longe,

recheado com pedaços de ossos e de crânio.

Ele tombou sobre o cavalo, fulminado.

— Caiam fora daqui agora mesmo —

ordenou ele, disparando para o ar.

Dois homens desceram de seus cavalos

para ajudarem Ned a montar. O bando

partiu a galope.

— Obrigada! Fez um ótimo trabalho —

disse Dianne, agradecida.

— Tudo bem! Foi só o começo. Tenho de

voltar à cidade. Não quero que saibam que

estive aqui.

— Por quê?

— Será melhor para mim e dará a eles o

que pensar — explicou ele, indo apanhar

seu cavalo.

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Antes de partir, Burt alertou Dianne:

— Acho que eles não voltarão, mas

aconselho-a a ficar alerta. Se possível,

mande buscar alguns vaqueiros para

protegê-la.

— Farei isso pessoalmente.

— E tome cuidado também com um tal

de John Waltman. Ele não é tão amigo

quanto parece.

— Eu já havia percebido isso. Insistiu

muito para que fizéssemos um acordo com

Ned Murdock. Fiquei desconfiada.

— Ótimo, então! Se precisar de mim,

estarei na pensão da viuva Moriarty.

— E quanto ao gado roubado, alguma

pista?

— Não tenho a menor dúvida de que se

encontra no rancho de Ned. Só preciso

provar, mas essa é uma outra história.

Adeus! — disse ele, esporeando seu cavalo.

Chegou à cidade despistadamente. Viu o

ajuntamento dos homens no saloon e passou

direto, indo para a pensão.

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A viuva ainda estava acordada e, assim

que ele entrou, foi lhe servir café.

— Não precisava ficar acordada por

minha causa — disse ele.

— Não seja presunçoso, rapaz. Velhos,

como eu, dormem pouco e se alimentam de

conversa, sabia?

Ele riu, tomando um gole de café. A

mulher o olhava com insistência,

perturbando-o.

— O que houve, Sra. Moriarty?

— Você... Você se parece muito com o

velho Murdock, sabia?

— Fala de Jed Murdock?

— Sim, o pai daquele desmiolado.

— O que sabe sobre o velho Murdock?

— Era um homem, mas muito rigoroso

com o filho e com a esposa, não a segunda,

mas a primeira, que eu conheci muito bem.

Ele teve um filho com ela. Um ótimo

garoto, mas, após morrer a esposa, Murdock

ficou intratável. Acabou expulsando o filho

de casa.

— E o que houve com esse filho? —

indagou Burt.

— Jed dizia que o filho tinha morrido,

mas nunca soube ao certo. Depois de muito

tempo, ele se casou com uma corista de

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Santa Fé. A mulher já tinha um filho, esse

que aí está e que ficou com tudo que era do

velho.

— Pelo que vi, ninguém gosta desse

rapaz.

— Era um vagabundo. Não trabalhava.

Vivia bebendo no saloon, arrumando

confusão, até a morte do pai.

— E Jed, como morreu?

— Dizem que foi morto capataz e este foi

morto por Ned. Eu cá tenho minhas

dúvidas. Conheci Jed e seu capataz. Eram

muito amigos. Duvido que tenha sido

conforme dizem.

— O que acha que aconteceu, na

verdade?

— Acho que Ned matou o padrasto e

jogou a culpa no capataz. Para ele foi a

melhor coisa que aconteceu. Tomou conta

de tudo, juntou-se com Bluf, aquele

jogador, e com o xerife. Ao que parece

pretendem se apossar de tudo por aqui.

— É, a ambição acaba cegando as

pessoas, só que, cedo ou tarde, elas acabam

enfrentando a justiça.

— Deus o ouça, meu filho! — disse a

velha senhora, benzendo-se.

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Ned não se conformava com o que havia

acontecido. Fora humilhado e surrado

diante de seus homens.

— Ela vai me pagar. Eu juro como vai —

dizia ele, enquanto uma das garotas lhe

fazia um curativo no rosto.

— Os pistoleiros que ela encomendou em

Durango devem ter chegado — opinou o

xerife.

— Se foi isso, você devia fazer alguma

coisa — berrou Ned, empurrando a garota

para trás e derrubando-a.

Chutou-a e foi até o balcão apanhar outra

garrafa de uísque. Cuspiu a rolha no

assoalho e bebeu no gargalo mesmo.

A bebida fez arder ainda mais o

ferimento em sua boca. Ele gargarejou com

a bebida, depois cuspiu-a para o lado.

— Um de meus homens foi

covardemente morto, Hank. Acho que você

devia agir neste caso — sugeriu o rapaz.

Hank olhou na direção de Bluf, que fez

um gesto negativo com a cabeça.

— Não dará certo, Ned. Se ela for levada

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a julgamento, os cidadãos de Cortez jamais

a condenarão. Ela sairá livre e Hank será

ridicularizado.

— Maldição! — berrou novamente o

rapaz, chutando algumas cadeiras. —

Aquele forasteiro... Burt Taylor... Alguém

vá até a casa da viúva Moriarty e veja se ele

está lá! — ordenou.

—Vai conversar com ele de novo? —

indagou Bluf.

— Não, seu idiota! Quero só confirmar se

não foi ele quem me atacou lá no rancho.

Dois pistoleiros saíram imediatamente.

Ned continuou andando de um lado para

outro, chutando cadeiras, bebendo e

cuspindo uísque com sangue.

Parou, de repente, pensativo.

— Bluf, o que foi que o forasteiro disse

sobre um filho que o velho Jed tinha?

— Acho que se referia a você quando era

pequeno, não?

— Será?

— Ei, Concho! — gritou Ned para o

Barman. — Quantos anos você tem?

— Sessenta.

— Conheceu o velho Murdock?

— Cansei de levá-lo bêbado, para o

rancho, depois de fechar o saloon.

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— Ele teve outro filho?

— Acho que sim... Sim, do primeiro

casamento, mas, pelo que sei, ele morreu.

— Tem certeza?

— O velho Jed não cansava de repetir

isso.

Ned se sentou, finalmente, já mais calmo.

Continuou tomando uísque. Os dois

pistoleiros retornaram.

— E então? — indagou aos dois.

— Vimos o tal sujeito tomando café e

conversando com a velha, na cozinha da

pensão. Acho que ele não saiu de lá.

— Então foram os pistoleiros que Dianne

contratou. Maldição! Temos que fazer

alguma coisa a respeito. O que me diz,

Bluf?

— Acho que devemos sossegar, só isso.

Amanhã chegará um emissário dos

compradores de gado. Devíamos começar a

vender e a entregar o gado, fazendo

dinheiro vivo.

— Certo. Veremos isso amanhã. Eu vou

dormir, mas adoraria quebrar algumas

cabeças antes disso.

— Fique calmo, homem. Faça o que Bluf

lhe sugeriu. Fique calmo. Pegue uma das

garotas e vá para casa se divertir e

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descansar.

— Ótimo idéia! — exclamou ele,

escolhendo duas garotas e saindo com elas,

seguido pelos capangas.

Bluf e Hank ficaram praticamente

sozinhos no saloon. O barman começou a

recolher copos e garrafas e a espantar os

bêbados.

— E agora, o que vamos fazer? Pelo que

sei, esse emissário poderá comprar todo o

gado que temos, se o preço for razoável.

Todo o gado, inclusive o gado do rancho. Já

imaginou o quanto isto renderá? — indagou

o xerife.

— Mais dinheiro do que já vimos em

toda a nossa vida. Mais dinheiro que jamais

teremos. Se fizéssemos esse negocio,

vendendo todo o gado, Ned ficaria sem

dinheiro para pagar o Banco. Perderia as

terras, mas o que isso nos importa?

Estaremos longe e ricos.

— Jamais teremos tranqüilidade com Ned

vivo. Para podermos gozar nosso dinheiro,

ele precisa morrer.

— Como fazer isso se ele viver cercado

daqueles capangas?

Os dois se olharam pensativamente. O

xerife parecia ter a solução para o caso.

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— Concho, você se lembra do nome do

filho de Jed Murdock? — indagou-lhe

Hank.

O velho barman pensou por instantes.

— Matt... Não, não era esse. Burt... Burt

Murdock, como o avô, pai de Jed.

— Espere um pouco! — disse Bluf. —

Aquele forasteiro disse que se chamava

Burt.

— Burt Taylor, não?

— Sim.

— E se fosse Burt Murdock?

— Seria muita coincidência.

— Ele é rápido e desafiou Ned, que o tem

atravessado na garganta. Pode muito bem

ser um dos pistoleiros contratados por

Dianne.

— Está pensando o mesmo que eu?

— Acho que sim.

— Jogar um contra o outro?

— Você viu aquele sujeito. É um caçador

de recompensas. Não se intimida fácil.

Surrou três homens de Ned com a maior

facilidade.

— Um confronto entre os dois seria a

nossa solução. Se o pistoleiro matasse Ned,

nós teríamos tudo em nossa mãos.

Principalmente depois daqueles papéis em

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branco que Ned assinou para mim.

Ambos riram, entusiasmados com o

plano.

— Como vamos fazê-lo se enfrentarem?

— indagou Bluf.

— Sei onde o gado roubado está

escondido. Mandarei um bilhete para o

caçador, indicando a localização. Ele

recupera o gado e incrimina Ned. Nós

tratamos de fazer a cabeça do garoto,

dizendo que a única saída será matar o

forasteiro.

— Certo! Vai ser assim mesmo. Vamos

rabiscar esse bilhete.

Apanharam papel e lápis. Hank indicou a

localização do gado roubado.

— Como fará para que ele receba o

bilhete? — quis saber Bluf. — Se ele ainda

estiver tomando café com a viuva, vou jogá-

lo embrulhado numa pedra.

— Excelente idéia!

Apesar do cansaço de todo aquele dia,

Burt havia se divertido muito com a estória

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da viuva.

Algo, porém, não saía da cabeça da

velhinha.

— Agora, cá entre nós, Burt: você é o

filho desaparecido de Jed Murdock, não é?

Ele ficou sério, olhando-a nos olhos.

— Só cá entre nós: sou.

— Eu sabia! Não podia estar enganada.

Que bom que esteja vivo, filho! Fico

contente! Eu o conheci garotinho, senti uma

pena enorme quando seu pai o expulsou.

— Só que isso não pode ser divulgado,

Sra. Moriarty. É muito importante e pode

me custar a vida.

— Não se preocupe. Não direi a

ninguém. E você, o que pretende fazer?

Acho que o legítimo dono do rancho é você.

— Na hora certa verei o que posso fazer

— disse ele.

Naquele momento, uma pedra quebrou a

vidraça, jogando estilhaço de vidro pela

cozinha toda.

Burt apagou o lampião e, num salto,

estava na porta. Abriu-a e saiu. a lua cheia

iluminava generosamente os arredores, mas

ele não viu nenhum movimento.

— Está bem, Sra. Moriarty? — indagou

ele, retornando para dentro da casa.

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— Sim, o que houve?

— Não sei. Pensei que fosse um tiro, mas

não houve estampido. Acho que jogaram

uma pedra na vidraça.

— Por que, diabos, fariam isso? —

indagou ela, acendendo o lampião.

— Cuidado! — alertou ele, levando-a

para um canto protegido, longe da janela.

Só então ele viu a pedra e o bilhete que

acompanhava. Apanhou-o.

— Se quer achar o gado roubado, vá ao

Desfiladeiro Mesa Verde — leu ele.

— Mesa Verde! Fica nas terras de

Murdock — falou a Sra. Moriarty.

— Sim, sei onde é. Um ótimo esconderijo

— comentou ele, lembrando-se do local.

— Quem teria mandado isso?

— Alguém que quer que eu vá até lá.

Pode ser uma armadilha, mas pode ser uma

pista também — opinou ele.

— E você?

— Irei lá ao amanhecer. Pode me acordar

bem cedo amanhã?

— Claro. Nós velhos acordamos com as

galinhas. Pode deixar que eu o acordarei

com o melhor café da manhã que já provou

nesta parte do Oeste, filho — garantiu ela.

No dia seguinte, antes do nascer do sol,

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Burt se pôs a caminho.

Só que, ao invés de ir direto para o

Desfiladeiro Mesa Verde, preferiu seguir

um caminho que ele conhecia, de sua

infância ainda.

Se tudo estivesse no lugar, poderia se

aproximar de lá sem correr risco.

Quem quer que tivesse mandado aquele

bilhete não falava de vigias protegendo o

gado.

Isso não garantia que eles não estariam

lá, esperando por algum incauto.

Suas previsões se confirmaram. Chegou

ao Desfiladeiro por um caminho pouco

usado.

Pôde observar bem o local. Havia uma

quantidade muito grande de cabeças de

gado ali, algumas com marcas, mas a

maioria sem marcas.

Um vigia, no ponto mais alto, controlava

os movimentos lá embaixo.

Um grupo de vaqueiros se levantava e se

preparava para continuar marcando o gado.

Nada havia ali a ser feito. O Desfiladeiro

tinha algumas passagens que seriam difíceis

de serem bloqueadas.

De qualquer forma, o gado não seria

tirado dali. Pela movimentação lá embaixo,

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todos estavam mais preocupados em

terminar o trabalho começado.

Retornou à cidade, pensando no que

poderia ser feito. Comunicar o xerife seria

perda de tempo.

A melhor coisa, e talvez a única, fosse

informar a Associação dos Criadores,

através de Dianne.

Já teria, com isso, realizado metade de

sua missão. Faltaria apenas apanhar os

membros da quadrilha.

— E então? — indagou a viuva, quando

ele retornou.

A velhinha estava ansiosa por noticias.

— O gado estava lá, conforme dizia o

bilhete.

— E o que você fez?

— Nada. Eles estavam marcando o gado

e não havia com o que se preocupar. Não

vão a parte alguma.

— Só que, enquanto você estava fora,

ouvi alguns comentários.

— O que ouviu.

— Como lhe disse, velhos se alimentam

de conversa. Anabel, a esposa de Concho, o

barman, disse que o marido ouviu umas

conversas ontem à noite. Segundo ela, um

homem está vindo para cá para comprar

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gado, o gado de Ned Murdock.

— Interessante! Por isso se apressavam

em marcar o gado e em trocar as marcas

originais.

— Ao que parece, vai ser um negócio e

tanto.

— Só que um emissário não viria apenas

para comprar aquele gado roubado. Há

bastante, mas nada que justifique um

negócio assim — estranhou Burt.

— Você não entendeu — disse ela. —

Ele vem comprar todo o gado de Ned

Murdock: o legal e o roubado.

— Todo? Por quê?

— Acho que aí tem coisa dos sócios do

Ned: Bluf e o xerife. Se meus ossos não me

falham, eles pretendem passar o pirralho

arrogante para trás.

Burt sorriu, admirando aquela mulher. Os

sócios de Ned poderiam mesmo estar

preparando alguma para ele.

— Mas... E o bilhete? Quem o teria

mandado? — indagou-se ele, sem imaginar

a resposta.

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Uma coisa Bluf acertara a respeito de

Ned: o rapaz era mesmo esperto.

Desde o principio, ele se mantivera com

um pé atrás em relação aos seus sócios.

A matemática era simples: Ned entrava

com o gado, com os pistoleiros, com o

roubo, com as terras e Bluf com nada.

Hank ainda dava uma pequena

contribuição, fornecendo a proteção

necessária da lei. mas era só.

Nenhum de seus dois sócios contribuía

com uma cota que lhes permitisse morder

um terço de todo o lucro.

Bluf nunca fora de confiança. Em

diversos oportunidades havia recusado um

mísero gole a Ned e isso o rapaz não

esquecia.

Somente quando viu o potencial que ele

representava, foi que Bluf se tornou seu

amigo.

Ned pensara em tudo isso e resolvera não

facilitar. Mantinha seus sócios sob

vigilância discreta, sem que eles soubessem

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disso.

Por isso, naquela manhã, quando se

levantou e foi procurar uma xícara de café

para tirar o gosto de ressaca da boca, viu

Archie, o homem que fora destacado, na

noite anterior, para vigiar Bluf e Hank.

A simples presença dele no rancho há

indicava que o capanga tinha noticias

importantes.

— O que houve, Archie? — indagou,

após se servir.

— Aconteceu algo estranho ontem,

patrão — começou o capanga. — Fiquei em

frente do saloon, observando os dois. Hank

escreveu algo num papel, depois saiu.

— Papel? Como assim?

— Era um bilhete, com toda certeza.

— Hank escreveu um bilhete? E para

quem?

— Para aquele forasteiro. Ele e Bluf

estavam no saloon. Hank escreveu, depois

saiu. Embrulhou uma pedra com o bilhete e

foi até a casa da viuva Moriarty. Ela e o

forasteiro conversavam na cozinha. Hank

jogou a pedra com o bilhete na vidraça,

depois se afastou.

— E o que aconteceu em seguida?

— Hank retornou ao saloon. Bebeu mais

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alguns goles com Bluf e foram ambos

dormir.

— Só isso? E esse bilhete? — indagou

Ned, confuso.

— Bom, patrão! Eu devia vigiar Bluf e

Hank, mas aquela história do bilhete me

deixou intrigado. Resolvi vigiar a casa da

viuva. De manhãzinha, o forasteiro saiu a

cavalo. Foi direto para o Desfiladeiro Mesa

Verde...

— Mesa Verde? Maldição! Então ele viu

o gado.

— Sim, e os rapazes marcado.

— E como o vigia não o percebeu?

— Ele usou um outro caminho, que nem

eu conhecia. Saiu por trás da entrada que

usamos. É uma trilha antiga...

— Que trilha? Nunca soube de outra

trilha para o Desfiladeiro Mesa Verde...

— Pois ele parecia conhecer muito bem o

caminho, patrão.

Ned ficou pensativo, ligando as coisas e

não ficando nada satisfeito com as

conclusões.

— E o que ele fez em seguida?

— Retornou à cidade, direto para a

pensão.

— Diabos! O que temos aqui, afinal? —

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indagou Ned, tomando todo o café,

procurando clarear os pensamentos. —

Archie, volte à cidade e vigie o forasteiro.

Mande outro cuidar de Bluf e de Hank.

O capanga se apressou em cumprir a

ordem. Ned ficou pensando, enquanto

tomava mais café.

Não conseguia entender aquilo. Se Hank

havia mandado o bilhete, informando a

localização do rebanho roubado, por que o

fizera? Tinha tanto a perder quanto Ned.

Ou não? Se Ned fosse preso, quem

cuidaria de todo o plano? começou a

perceber que seus sócios preparavam uma

armadilha. A intenção era ficar com tudo

para eles. Não havia outra explicação.

E o forasteiro? Quem seria ele na

verdade? Como conhecia uma trilha que

nem ele, Ned, sabia que existia?

Lembrou-se da conversa da noite anterior

com o barman. Jed tivera um filho. Um

filho que estaria morto. Mas seria isso

verdade?

— Adelita, quem é a pessoa mais velha

aqui do rancho? — indagou ele à cozinha,

que servia a mesa para o café da manhã.

— Minha avó, patron!

— Como ela está?

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— Muy bien, señor.

— Tem boa memória?

— Oh, sim, muito boa. Lembra-se de

tudo que já passou na vida.

— Onde ela está?

— Na cabana onde moramos, atrás do

alojamento dos vaqueiros. Por quê, señor?

— Acho que vou lhe fazer uma visitinha

— decidiu ele. — Só que antes tenho umas

providências a tomar — acrescentou ele,

pensando exatamente no que tinha a fazer.

Bluf e Hank se reuniram com o emissário

dos compradores de gado, nos fundos do

saloon.

Não queriam que Ned participasse da

reunião, até que tivessem acertado tudo com

o comprador.

— Estamos falando de um negócio de

mais de cem mil cabeças de gado,

cavalheiros. Hão de convir que é muito

dinheiro — disse o comprador.

— Exatamente, por isso nós o

procuramos. Sabemos que conseguirá fazer

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essa venda, distribuindo-a aos compradores

e donos de ranchos de quatro Estados.

— Além disso, lucrará muito mais do que

todos os seus negócios em um ano —

acrescentou Hank, com razão.

O homem pensou a respeito. Era,

realmente, um excelente negocio. Só que

havia alguns riscos. Isto, ao invés de ser um

entrave, poderia lhe ser favorável. Bastava

saber negociar. Principalmente

considerando que aqueles dois estavam

tentando trapacear o sócio principal e dono

do gado.

— Bom, em um negócio desse tamanho,

vai ser difícil examinar todo o gado e contá-

lo. Terei de aceitar a palavra de vocês,

principalmente porque ele será retirado em

pequenas boiadas pelos compradores finais.

Só que isso é algo a ser considerado no

preço da manada.

— Oh, é claro. Nós entendemos — falou

Bluf. E quanto poderá nos pagar por cabeça.

O comprador havia feito as contas.

Poderia vender facilmente cada cabeça de

gado a cinco dólares.

— Vejam bem, há bezerros, bois, touros,

vacas, aleijados, doentes, tudo junto... —

argumentou.

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— Quanto? — insistiu Bluf.

— Um dólar e meio por cabeça.

Bluf e Hank se olharam, fazendo as

contas. Isso seria perto de cento e cinqüenta

mil dólares.

Era mais dinheiro que todo o dinheiro

existente em Cortez. Dividido meio a meio,

seriam setenta e cinco mil para um. O

suficiente para irem morar na Europa, se

fosse o caso.

— E como será o pagamento?

— Depois que assinarmos o contrato, eu

irei pagando à medida que o gado for sendo

retirado.

— Não pode pagar tudo à vista?

— Cento e cinqüenta mil? Nem existe

tanto dinheiro assim em todo o Território —

disse o comprador.

— Ordem bancária... Aceitamos ordem

bancária — falou Bluf, ansioso.

Queriam pôr a mão no dinheiro e dar o

fora dali o mais depressa possível, deixando

para o Banco o trabalho de acertar o

prejuízo.

— Posso tentar, mas nesse caso teria de

reduzir um pouco o preço... Um dólar e

vinte por cabeça!

— Fechado! — falou Bluf.

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— Sim, fechado! — concordou Hank.

— Quando vamos pôr a mão no dinheiro?

— insistiu Bluf.

— Assim que o Sr. Murdock assinar o

contrato de compra.

— Acha que pode resolver tudo com

isto? — indagou Bluf entregando um papel

assinado em branco por Ned Murdock.

— Para mim é satisfatório, senhores. Em

três dias terão o dinheiro em seus nomes no

banco.

— Três dias? É muito tempo! —

reclamou Bluf.

— Sim, tempo demais — concordou

Hank.

Os três homens saltaram de suas cadeiras,

quando a porta foi arrebentada e a sala

invadida.

Ned Murdock entrou, encarando seus

sócios.

— Não quiseram me esperar para

negociar? — indagou.

— Você não está entendo, Ned.

Acabamos de chegar e só estávamos... — ia

dizendo Bluf.

— E isto? O que é? — quis ele saber,

apanhando o papel assinado em branco

sobre a mesa.

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Continha a custo sua ira. Pusera homens

vigiando a estrada. Eles o avisaram da

chegada do emissário e da reunião com os

dois sócios.

Sabia que os dois tentariam enganá-los.

Não restava a menor dúvida. Resolveu

acertar tudo de uma vez por todas.

— É um papel... Você assinou, lembra-

se? Eu lhe pedi... Para os negócios... —

gaguejou Bluf.

— Devo concluir que você é o

intermediário na compra do gado, não? —

indagou ao viajante.

— Sim, vim atender o chamado de

vocês...

— E quanto está pagando por cabeça?

— Bem.. Ainda não fechamos negócios

e...

— Então por que um papel em branco?

Quanto? — exigiu Ned, segurando o outro

pelos colarinhos.

— Um dólar e vinte — disse o

comprador, num fio de voz.

— Um dólar e vinte? Por cabeça que vale

no mínimo cinco dólares? Vocês estão

loucos! — afirmou, rasgando o papel, mas

segurando os pedaços em sua mão.

Bluf e Hank estavam lívidos,

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principalmente porque os capangas de Ned

os havia cercado.

— Se quer fazer negócio, senhor, espere-

me lá na frente. Mas aviso que não acertarei

oferta menor que quatro e oitenta por

cabeça, o que lhe dará um bom lucro, se for

esperto. Vá — ordenou ele.

O homem apressou-se em deixar a sala.

Ned sentou-se diante dos seus sócios. Pôs

os pedaços de papel rasgado sobre a mesa.

— O que dizia o bilhete, Hank? —

perguntou, de chofre.

— Bilhete? Que bilhete? — estremeceu

Hank.

— O que mandou para aquele forasteiro.

— Ned! Eu não fiz nada disso... — ia

dizendo o xerife, mas calou-se quando o

rapaz sacou sua faca e encostou a ponta

afiada na garganta dele.

— Não minta para mim. Sinceramente,

não entendi sua jogada. Se o forasteiro

achasse o gado, nós perderíamos a manada

roubada. Não entendo...

— Foi idéia dele, Ned — entregou Bluf,

percebendo que a situação dos dois

começava a ficar preocupante.

Tratou de salvar o próprio pêlo.

— Bluf, seu traidor miserável!

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— Foi sua idéia, não negue — falou Bluf.

— Ele queria que você ficasse zangado com

o forasteiro e o fosse procurar. Acreditava

que, numa luta, você seria morto...

— E vocês ficariam com tudo... Sim...

Muito bom! Nem eu mesmo teria pensado

nisso. Por isso vieram fazer negócio direto

com o emissário dos compradores,

entregando o gado por ninharia. Miseráveis!

Eu sabia que vocês me trairiam — afirmou

ele.

— Não, Ned, você está enganado. Eu

jamais... — ia dizendo Hank, mas calou-se

quando a faca se moveu rapidamente junto a

sua garganta.

Ele nada sentiu. Apenas uma onda de

calor em sua pele, como se um palito de

fósforo fosse riscado nela.

Depois, algo quente desceu-lhe pelo

peito. Ned o olhava nos olhos, com a faca

na mão.

— O que fez? — indagou Hank,

perplexo.

— O que deveria ter feito há muito

tempo.

— Mas... O quê? — insistiu o xerife,

abobalhado, olhando o sangue que escorria

de seu pescoço e empapava sua camisa.

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Levou a mão à garganta. O movimento

da faca do garoto havia cortado

superficialmente a pele e as veias também,

provocando uma hemorragia.

Bluf estava branco, imóvel, chocado,

olhando Hank tentar deter o sangue,

apertando os dentes sobre as veias que

esguichavam o liquido vital.

O homem da lei tossiu e cuspiu sangue

sobre a toalha da mesa.

— Até para morrer você é ruim, Hank —

falou Ned, enfiando a faca no peito dele, até

o cabo.

Torceu-a de um lado para outro, depois

ergueu o xerife, segurando a faca com as

duas mão.

Jogou-o para trás. Hank caiu, banhado de

sangue. Bluf olhou para o meio de suas

pernas. Havia urinado nas calças.

Ned começou a rir. Bluf, a principio,

ficou olhando para ele como um idiota.

Depois começou a rir também.

— Bluf! Amigão! — falou Ned,

abraçando-o e fazendo-o se levantar.

— Ned... Eu juro... Foi tudo idéia dele...

— Claro, Bluf. Você é burro demais para

pensar num plano desses... Não o culpo.

— Vai me perdoar?

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— E por que não?

— Sério?

— Sim, estou falando a verdade. Eu o

perdôo, meu amigo — afirmou Ned,

enfiando a faca no estômago do jogador e

rasgando-lhe as tripas.

— Ned! — gemeu ele, caindo de joelhos.

O rapaz o olhou sem piedade.

— Você disse que...

— Que o perdoaria?

— Sim...

— E o perdôo, seu idiota. Só não lhe

disse que não o mataria, não foi? —

finalizou ele, pondo o pé no peito dele e

empurrando-o para trás.

Bluf estrebuchou no assoalho banhado de

sangue.

Burt havia decidido informar Dianne e a

Associação dos criadores a respeito da

localização do gado roubado.

Além disso, tentaria obstruir o negócio

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entre Ned e o emissário dos compradores de

gado.

— Burt, tem um homem aí fora querendo

falar com você — veio avisar a senhora

Moriarty.

— Quem é?

— Pela aparência, deve ser um dos

pistoleiros de Ned Murdock.

— Está bem, Sra. Moriarty — agradeceu

ele, indo até a varanda da casa.

O pistoleiro no cavalo o olhou, medindo-

o dos pés à cabeça.

— Meu patrão quer falar com você.

— Onde ele está?

— No saloon.

— Sabe o assunto?

— Ele mandou dizer que quer falar sobre

Jed Murdock e o Desfiladeiro Mesa Verde.

— Certo! Estarei lá em quinze minutos

— disse Burt, pensativo.

Ao mencionar aqueles assuntos, Ned

dava a entender que havia descoberto a

verdadeira identidade de Burt.

Isso não o preocupava, no entanto. Ir ao

saloon, após saber que Ned o descobrira, era

cometer suicídio.

Na certa Ned o esperaria com todos os

seus capangas. Burt, pelo contrário, não

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teria em quem confiar.

— Você vai, Burt? — indagou a Sra.

Moriarty, que havia ouvido a conversa da

janela.

— Sim, tenho que ir.

— Ele vai matá-lo, sabia?

Burt continuava pensando.

— Lavou aquela minha capa, Sra.

Moriarty?

— A de viagem?

— Sim.

— Está limpa e passada. Não me diga

que pretende fugir?

— Não, pretendo brincar um pouco —

respondeu ele, entrando. Dez minutos mais

tarde ele saía, com um rifle na mão, o

cinturão com dois coldres e a capa cobrindo

o corpo.

A brisa quente agitava as abas da roupa,

fazendo-a dançar, projetando uma sombra

grotesca na poeira da rua.

A cidade parecia já saber do confronto.

Todos acompanhavam Burt com o olhar.

Ele subiu a rua, até o saloon. Entrou,

fazendo tinir suas esporas mexicanas no

assoalho.

Ned sorriu ironicamente ao vê-lo. Burt

foi até o balcão.

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— Tequila e cerveja! — pediu ele,

jogando uma moeda sobre o balcão.

Quando o barman o serviu, ele bebeu a

tequila e uma gole de cerveja, depois se

voltou para Ned, que ocupava uma mesa ao

fundo do salão.

— Queria me ver?

— Sim, acho que precisamos acertar

alguns detalhes.

— Como o quê, por exemplo?

— Aquele homem é emissário de

compradores de gado. Quer fazer negócio

com o Rancho Murdock. Com quem ele

deve falar?

— Com o proprietário! — respondeu

Burt, os olhos cinzentos percorrendo o

saloon.

Havia pelo menos uma dúzia de

pistoleiros espalhados por ali.

— O verdadeiro proprietário está morto

— disse Ned, que exibia, no peito, a estrela

de xerife lambuzada de sangue. — Morreu

com uma facada — continuou, sacando sua

Bowie e espetando-a na mesa. — Com uma

faca igual a esta.

— Igual a essa ou com essa? — corrigiu

Burt.

— Você é esperto — riu Ned, reclinando-

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se em sua cadeira. — E tem um punho

pesado — completou, acariciando o queixo

ainda marcado pelo golpe que recebera de

Burt, na visita ao Rancho Granger.

— Você quem o diz.

— Estive no Escritório de Registros...

Sabia que Jed tinha um filho? Acho que o

conheceu quando passou por aqui, não

conheceu?

— Por que não poupa meu tempo e me

diz logo o que quer de mim? — pediu Burt,

percebendo que o barman sumira e que as

pessoas que não eram capangas de Ned

haviam se retirado.

— É simples! Quero matá-lo. Mas antes

quero saber o que meu irmão veio fazer

aqui, sem se revelar, sem se apresentar,

tratando-me como se eu fosse um bastardo...

— E você é. Não o considero meu irmão.

Ned ficou lívido e estremeceu de ódio.

Não tolerava ser chamado de bastardo.

Avançou na direção de Burt, brandindo

sua faca. Burt ficou na defensiva.

— Maldito filho de Jed Murdock! —

berrou Ned, jogando o braço para frente, a

faca rebrilhando.

Burt foi ágil e antecipou a manobra,

desviando o corpo para o lado, golpeando o

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rosto de seu agressor.

Ned gemeu e rolou no assoalho, sem

soltar a faca. Girou o corpo como um gato,

levantando-se.

Um de seus pistoleiros sacou a arma.

Burt o abateu, metendo-lhe um balaço no

meio dos olhos.

— Parem... Ninguém se meta! Ele é meu!

Quem tentar acertá-lo vai se haver comigo

— ordenou Ned, sentindo o rosto em fogo

após o golpe recebido.

Ele girou ao redor de Burt, passando a

faca de uma para a outra mão, tentando

confundir o caçador de recompensa.

— Esse brinquedo machuca a mão de

criança — zombou Burt, irritando-o ainda

mais.

Ned ameaçou com a esquerda, mas

passou a faca para a mão direita e

empurrou-a na direção do estômago de

Burt.

— Morra, maldito! — gritou.

— Você fala demais — respondeu o

outro, segurando o pulso do rapaz e

torcendo-o.

Ned esperneou, mas a faca foi apontada

para sua garganta, aproximando-se até tocar

a pele.

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Burt o enlaçou com o outro braço,

imobilizando-o.

— Quem é você, afinal? — indagou o

garoto, sem fôlego, com a faca espetando

sua goela.

— Sou quem você disse que sou.

— Não vai sair vivo daqui.

— Você não está em posição de decidir

isso — afirmou Burt, forçando a ponta da

faca contra a pele dele.

Um filete de sangue escorreu pelo

pescoço do rapaz, que se debateu.

— Vamos começar a acertar as coisas —

falou o caçador. — Mande seus homens

soltarem os cinturões.

— Jamais. Você está morto, não importa

o que faça comigo.

— O que vou fazer com você é simples

— afirmou Burt, empurrando a faca,

abrindo um pequeno corte na garganta dele.

O sangue deslizou mais forte, manchando

a camisa do rapaz.

— Soltem as armas, rapazes — ordenou

ele.

Os pistoleiros hesitaram. Burt aprofundou

a faca na pele de seu prisioneiro, que gemeu

e amaldiçoou cada um de seus pistoleiros.

— Mato quem não me obedecer —

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berrou ele.

Os cinturões caíram no assoalho. Burt

empurrou Ned, tomando-lhe a faca e

golpeando-o nos rins.

Ned cambaleou e caiu de joelhos. Burt

apanhou seu rifle e o engatilhou.

— Caíam fora agora! — ordenou aos

pistoleiros.

— Olhe... Olhe na escada... — falou Ned,

gemendo de dor, levantando-se com

dificuldade.

Burt desviou os olhos para ver. Dianne

estava com as mãos amarradas diante do

corpo e uma tira de pano na boca.

Seu olhar refletia terror. Um pistoleiro

apontava uma arma para a cabeça dela.

— Devolva a minha faca — ordenou

Ned, possesso, mas de olho no rifle

engatilhado nas mãos de Burt.

— Pegue sua faca — respondeu o

caçador, atirando-a para o alto, cravando-a

no forro do saloon.

— Filho da mãe! Era uma boa faca! —

disse Ned, indo até a escada. — Venha,

minha querida! — acrescentou, fazendo um

gesto obsceno para Dianne.

Burt ficou imóvel, de olho no pistoleiro

que apontava a arma para Dianne.

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Só precisava de um vacilo, de um

momento de distração para agir, mas a cada

segundo as coisas se complicavam.

Dianne chegou até Ned, que arrancou sua

mordaça e a beijou na boca.

A garota se debateu e cuspiu, enojada,

depois que ele a soltou.

— Esta é uma pequena amostra do que

reservo para ela, quando terminar com você

— sentenciou Ned. — Agora solte suas

armas para eu poder acertar minhas contas.

Ao invés de atendê-lo, Burt desabotoou

sua capa longa de viagem.

Ao redor do peito, presas com o fio de

crochê da Senhora Moriarty, havia dezenas

de bananas de dinamite.

Um silencio mortal pairou no saloon.

— Quem vai se arriscar? — indagou

Burt.

Os pistoleiros se entreolhara,.

— Ele é louco! — disse um.

O homem que apontava a arma para a

cabeça de Dianne desviou o cano para o

lado, ao olhar para seus amigos.

Era o que Burt esperava. ele ergueu o

rifle com a rapidez do raio e apertou o

gatilho.

O pistoleiro foi jogado para trás. Dianne,

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livre da ameaça correu se esconder atrás de

uma das mesas.

Os outros homens ergueram as armas,

mas pensaram duas vezes antes de disparar.

Se uma bala atingisse a dinamite, todos

morreriam. Até o próprio Ned, que tinha

tudo a perder com aquilo, hesitou.

— Sou Burt Murdock, o verdadeiro dono

do Rancho Murdock. quem quiser trabalhar

para mim vá me esperar lá fora. Quem

quiser morrer comigo, fique aqui dentro —

disse ele.

Os pistoleiros não precisaram pensar

muito. A decisão era óbvia. Todos correram

para fora. Ned ficou sozinho diante de seu

meio-irmão.

Tudo parecia mesmo perdido. Só que não

daria a Burt a chance de levar tudo sem

resistência.

— Muito bem, acho que você venceu —

falou Ned, indo até o balcão.

Apanhou uma garrafa de uísque, como se

fosse servir uma dose. Burt abaixou o rifle.

O erro lhe custou uma pancada violenta

na cabeça. O vidro quebrado cortou-lhe o

couro cabeludo, fazendo o sangue descer

pelo seu rosto.

Ned alcançou a dinamite presa no corpo

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de Burt, puxando-a com força, arrebentando

os fios.

Jogou longe o macabro colar, rindo

sadicamente ao ver o sangue que cobria o

rosto de seu oponente.

Atacou-o, atingindo-o o estômago

repetidas vezes, fazendo-o recuar.

Endereçou um direito no queixo dele, para

finalizar a seqüência de golpes, mas Burt o

aparou e enfiou o joelho no estômago dele.

Ned gemeu, sentindo todo o ar ser

expelido de seu pulmão. O punho de Burt se

abateu sobre a nuca dele, fazendo-o desabar

de cara no assoalho.

Burt respirou fundo, recuperando o

fôlego. Ned ficou de quatro, tentando se

erguer.

Burt chutou-lhe o estômago, o baço e

depois os rins, fazendo-o urrar de dor.

— Não se levante ou eu o mato de tanta

pancada — ordenou Burt.

Nesse momento, a janela do saloon foi

quebrada e uma espingarda surgiu,

apontando na sua direção.

Numa fração de segundos ele reconheceu

John Waltman, o homem que tinha muito a

perder se Ned fosse neutralizado.

O caçador de recompensa deitou-se

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rapidamente e a carga dupla passou sobre

seu corpo, arrebentando garrafas nas

prateleiras do bar.

Ao se deitar Burt já tinha na mão seu

Colt. Disparou duas vezes, jogando vidro e

morte na cara de Waltman, que foi

estrebuchar na rua.

Ned, quase sem forças, aproveitando-se

da distração de Burt para tentar fugir.

A caçador foi no seu encalço, saltando

sobre ele na porta do saloon. Os dois

rolaram pela calçada e foram cair na poeira

da rua. Ned tentou se erguer. Burt o acertou

com um pontapé, quebrando-lhe o nariz.

Ofegante, Ned ficou de joelhos na poeira,

vendo o sangue gotejar de seu nariz e de seu

rosto.

— Prazer em conhecê-lo, irmão — disse

e tentou sacar a sua arma.

Burt foi mais rápido, disparando

certeiramente apenas uma vez e acertando o

peito de Ned, que caiu para trás.

Seu corpo se contorceu, agonizando. Burt

se aproximou, olhando os olhos esgazeados

do pequeno assassino.

— O prazer foi todo meu, irmão — disse,

enquanto Ned vomitava sangue e exalava

seu último suspiro.

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— Já é tarde — murmurou Dianne,

terminando de soltar o nó que prendia sua

mão.

— Era um louco — comentou Burt.

— E você me enganou direitinho. Todo o

tempo era o filho de Jed Murdock.

— Sim, sou Burt Murdock, filho de Jed

Murdock, um velho cabeça-dura intragável,

mas trabalhador.

— O que vaio fazer agora?

— Sei onde está o gado roubado e

capturei os chefes da quadrilha. vocês não

terão mais problemas com eles. Só me resta

fazermos a conta, agora, para vocês me

pagarem.

— Isto será um prazer. E quanto ao

Rancho Murdock? Ele é seu.

Burt olhou nos olhos dela, tentando

encontrar neles a solução.

— Não conseguirei fazer isso sozinho —

disse ele.

— Por que não pede a minha ajuda?

Ele sorriu. Seus dias de caçador de

recompensa haviam terminado.

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Justiça pelas Armas

O Oeste tinha um juiz onipresente e

sempre eficiente, apesar de muitas vezes ser

muito parcial. Esse juiz era o Colt e sua

mais preciosa ajudante foi a Winchester.

Muitas questões aparentemente

insolúveis foram facilmente resolvidas por

eles, que espalharam, durante aqueles

tempos turbulentos, cruzes por toda a

fronteira.

Onde a justiça dos homens falhava, a

justiça das armas prevalecia.

Em uma cidadezinha, em algum ponto do

Arizona, os homens começavam a se reunir

no saloon de Helen Fulton, no comecinho

da tarde. Naquele dia, em especial, falava-se

muito na morte de Gregory Merryl, mas

nunca abertamente.

Quem fosse esperto, fazia seus

comentários em voz baixa e apenas no

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ouvido dos amigos.

— Já não foi tarde — falou um vaqueiro,

com mais uísque que juízo na cabeça.

— Cuidado com o que diz, meu velho —

advertiu-o um de seus amigos. — Se os

filhos dele souberem que disse isso, você

terá uma estadia garantida na Colina dos

Pés Juntos.

— Ele tem razão — ajuntou outro.

— Eles falam a verdade — falou um

outro ainda. — Numa situação dessas, eu

detestaria estar em sua pele.

O vaqueiro pareceu não se importar

muito com os conselhos recebidos.

— Mas cá para nós, se alguém está

preocupado com a morte daquele velho

safado, esse alguém é Scott Nelson. Oscar e

Bob Merryl vão cair sobre ele como abutres

famintos.

— Quem o mandou se meter com o

velho? Podia ter feito como todos os outros,

mais ajuizados, vendido seu rancho e dando

o fora. Poderia comprar novas terras na

Califórnia e ficar rico e sossegado. Ao invés

disso, preferiu ficar e arranjar encrenca. E

logo com quem!

— Pensando bem, eu acho que dou razão

ao Scott. Quem tornou os Merryl tão

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poderosos assim? Quem lhes deu o direito

de se acharam donos de tudo? Eles não têm

o direito de querer todas as terras só para

eles. Além disso, os preços que pagam são

uma infâmia.

— É, mas não é isso que me preocupe —

comentou um, que estivera calado até então.

— O quê? — perguntaram-lhe.

— Enquanto o velho era vivo, ainda

havia algum freio nas coisas. Com a sua

morte, os filhos vão agir livremente e nós

conhecemos aqueles dois, sabemos como

agem.

— Sem contar com aquele bando de

pistoleiros que os cercam. Se quiserem,

podem dominar esta cidade. Não há mesmo

lei por aqui. Nem juiz nós temos.

— Mas temos um xerife...

— Que segundo consta, já fez seus

acertos com os dois filhos do velho.

— Eu não duvido disso. Esse xerife não é

de confiança.

— Ouvi dizer que roubou gado, quando

foi xerife em Abilene...

— No fundo é um rato covarde, assim

como os dois irmãos — falou Helen, que

ouvia a conversa do outro lado do balcão.

Seu tom de voz foi alto o bastante para

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que as pessoas por perto ouvissem. Um dos

vaqueiros do Rancho Merryl estava por ali,

apenas ouvindo. Não reagiu, porque estava

sozinho. Ficou apenas disfarçando e

ouvindo as conversas.

— Você é louca de falar assim

abertamente, Helen — disse o barman.

— Ele tem razão, Helen — ajudou um

vaqueiro.

— Pois eu digo e repito, rapazes. E tudo

como eu disse — continuou ela,

demonstrando coragem. — As coisas vão

ficar piores agora. Ninguém vai deter

aqueles bastardos. Eles e seus pistoleiros

sempre entraram aqui, beberam e farrearam

à vontade, sem pagar a conta. Quando eu os

cobrava, ameaçavam quebrar todo o meu

saloon. Se não fizeram isso por respeito ao

velho, nada vai detê-los agora, a não ser

meu amigo juiz...

— Que juiz, Helen? — indagou o

barman.

— Este — falou ela, mostrando o Colt

que trazia no bolso do vestido.

— Modere a língua, Helen — aconselhou

um dos vaqueiros. — Os Merryl têm olhos e

ouvidos por toda parte e não vão gostar

disso.

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— Eles que se danem. É a verdade. Falo

o que penso e o farei enquanto viver. Não

tenho medo deles e nem dos covardes que

trabalham para eles — continuou ela,

olhando provocadoramente para os homens

no saloon. — Inclusive para você, seu rato

— acrescentou ela, ao reconhecer o

vaqueiro do Rancho Merryl.

— Dobre a língua, moça! Não sou

covarde nem rato.

— Olhe só quem está falando! —

zombou ela, rindo.

— Ouça meu aviso, moça. Em boca

aberta não entra só mosquito... Entra

chumbo também.

— Muito valente, ameaçando mulheres,

seu covarde! Não passa de um safado,

acostumado a beber sem pagar. Pois fique

sabendo que, de agora em diante, ou eu vejo

a cor do seu dinheiro ou você fica de boca

seca. E esta lei vai servir para todos os seus

amigos e patrões.

— Pois eu quero vê-la dizer isso na

presença deles — falou o vaqueiro. —

Aposto que de leoa que aparenta ser vai se

transformar numa franguinha assustada,

com medo de ser depenada.

— Falo na presença deles ou de qualquer

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outro que queira ouvir minhas opiniões.

O rapaz aproximou-se ameaçadoramente

do balcão, encarando-a.

— Eu, particularmente, adoraria arrancar

suas penas e ver que espécie de galinha há

por baixo delas — disse ele, olhando-a

zombeteiramente.

Helen não era mulher de guardar

desaforos. Nunca fora. O vaqueiro não a

conhecia o suficiente para estar preparado

para sua inesperada reação.

— Tente! — disse ela, enquanto

apanhava um litro cheio de uísque e

vibrava-o certeiramente, com todas as suas

forças, na testa do vaqueiro.

O sangue banhou o rosto dele, misturado

ao uísque e aos cacos de vidro. Ele recuou,

chocado e aturdido. Helen saltou agilmente

sobre o balcão, apanhou o chicote de um

condutor que estava ali e, quando o

vaqueiro tentou sacar a arma, ela o

chicoteou no braço, cortando sua camisa e a

pele também.

— Sua maldita! — rugiu ele, avançando

contra ela, mas Helen reagiu furiosamente.

Chicotadas certeiras fizeram o vaqueiro

dançar no assoalho, tentando proteger o

rosto com os braços, enquanto as chicotadas

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iam se repetindo sobre seu corpo.

— Pare... Pare... Pare, pelo amor de

Deus! — gritou ele, caindo de bruços, com

as mãos sobre a cabeça.

— Pare, Helen! É o suficiente — alertou

o barman, deixando seu posto para ir

acalmá-la.

Ela respirou fundo e atirou o chicote para

o lado.

— Agora dê o fora daqui — ordenou ela,

após ter tomado a arma do homem. — E dê

graças a Deus por eu não mandar pendurá-

lo de pernas para o ar diante do saloon para

todos verem o covarde que é.

— Pagará por isso... Juro como pagará —

ameaçou ele, saindo cambaleando.

— Fez mal, Helen, muito mal. Sabe que

isso só lhe trará encrencas — alertou um

dos vaqueiros.

— Mal fazem vocês, deixando-se

intimidar dessa forma. Morrem de medo dos

Merryl. Eu nunca tive medo do velho e

muito menos dos seus filhos bastardos.

— Estou apenas lhe dando um conselho,

Helen. Detestaria ver algo acontecendo a

você. Vai ter trabalho com aqueles dois.

— Pois deixe que venham. Eu estarei

preparada para eles — garantiu ela.

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O vaqueiro que Helen havia surrado foi

até o xerifado e apresentou uma queixa por

agressão contra ela. O Xerife Ted Quincy

estava muito apressado no momento,

porém.

— Cuidarei disso assim que voltar do

rancho. Vou ao enterro de seu patrão. Vá ao

barbeiro e peça para ele limpar esses

ferimentos para você. Depois

conversaremos — decidiu ele, saindo e indo

apanhar seu cavalo.

Não poderia faltar ao enterro do velho.

Tinha coisas a discutir e acertar com os

filhos.

Enquanto isso, no Rancho Merryl reinava

grande consternação com a morte do

patriarca da família, pioneiro que ajudara a

expulsar os índios daquelas terras e que,

pouco a pouco, fora se tornando um dos

maiores proprietários de terras.

Quando a seca de 1868 arrasou as

pastagens e acabou com o gado, o velho

beneficiou-se de sua esperteza, quando da

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escolha das terras onde construir seu

império. Nada menos que três rios

cortavam-na.

Num trabalho arrojado e original para a

época, ele fez seus empregados e mexicanos

trazidos da fronteira cavarem canais de

irrigação e foi o único, naquele ano, a ter

pasto e, mais tarde, gado bom para vender.

Tudo que tinha fora vendido ao Exército.

E o gado dos anos seguintes também. O

velho descobriu o filão, comprando gado

magro e quase morto de fome de seus

vizinhos, soltando-os em seus pastos

sempre verdes.

Enquanto enriquecia, seus vizinhos

empobreciam. Muitos começaram a vender

suas terras e a procurar melhor

oportunidade em outros Estados mais

favoráveis.

O Rancho Merryl transformou-se num

dos maiores do Estado. Era o orgulho do

velho Gregory, agora morto. Seus dois

filhos, junto ao caixão do pai, na sala

principal da casa do rancho, traçavam

planos.

— A época do velho já passou. Ele não

estará aqui para nos limitar mais. Agiremos

a nossa maneira agora, Bob — falou Oscar.

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— Sim, e a primeira coisa a fazer é

demonstrar nossa força. O primeiro a sentí-

lo deverá ser Scott Nelson. Já estou farto da

ousadia dele.

— Não se preocupe, ele não é páreo para

nós. Com o xerife do nosso lado, vamos

transformar a vida de Scott num inferno.

Vamos nos vingar dele na hora certa, não se

preocupe, irmão.

— Quando penso no quanto papai

desejava aquelas terras, sinto ganas de ir lá,

matá-lo com minhas próprias mãos e

arrancar-lhe o coração.

— Faremos isso, não se preocupe.

Aquelas terras são muito boas, iguais às

nossas e uma das melhores do vale para a

criação de cavalos. O Exército tem uma

grande encomenda deles para o ano que

vem. Precisamos criá-los. Por isso aquela

terra tem de ser nossa.

— E quanto aos outros rancheiros que

ainda restam?

— Estão resistindo por causa do Scott.

Quando virem o que acontecerá com ele,

virão correndo entregar-nos suas

propriedades numa bandeja. Vamos abaixar

ainda mais o preço, quando chegar a hora.

— Pena que o velho não possa ver o

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resultado do nosso trabalho, não?

— Sim, em breve realizaremos o sonho

de sermos os únicos proprietários de todas

essas terras. O Rancho Merryl será o maior

do país, pode estar certo.

— Pena que papai tenha sido sempre tão

correto em seus negócios. Se usasse nossos

métodos, isso já teria acontecido antes, com

certeza.

— Sim, vamos jogar pesado agora.

Seremos mais persuasivos que papai. A

nova equipe de pistoleiros deve chegar hoje.

Mandei Glenn buscá-los em El Paso.

— Espero que sejam bons e de confiança,

como os últimos que ele trouxe.

— Não se preocupe quanto a isso. Glenn

sabe o que faz e só nós trará o melhor.

— Se não fosse pela morte de papai, eu

poderia jurar que estou me sentindo muito

feliz.

— Pois eu também — disse o outro e os

dois sorriram com ironia.

Instantes depois chegava Ted Quincy, o

xerife, para prestar suas homenagens ao

velho e conversar com os dois.

— Foi bom que tenha chegado agora,

xerife — falou Oscar. — Precisamos

conversar.

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— Sim, claro, rapazes. Antes deixem-me

prestar minhas homenagens ao velho

Merryl.

— Sim, mas seja muito breve. Os vivos

podem ser mais lucrativos para você agora,

xerife — acrescentou Bob e o xerife sorriu,

entendendo a mensagem.

Apenas tirou o chapéu e olhou o rosto do

velho, desejando poder chamá-lo de todos

os nomes que tinha reservado para ele, mas

adotou uma expressão compungida,

conforme a situação exigia-lhe.

— Pronto, rapazes! Já terminei o que

tinha de fazer. Podemos conversar agora —

disse, então, aos dois.

— Siga-nos, xerife — convidaram-no.

Deixaram a sala onde estava sendo

realizado o velório e foram para um outro

aposento, onde era o escritório do velho, até

sua morte.

Oscar serviu uísque e ofereceu um

charuto ao homem da lei, que apreciou

todas aquelas gentilezas. Os dois rapazes

prometiam ser generosos para com ele e

isso o agradava.

— Muito bem, xerife, já conversamos

sobre o assunto e deve saber como

pretendemos agir de agora em diante, sem a

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presença de nosso pai, não? — indagou-lhe

Oscar.

— Sim, estou a par de seus planos. Onde

eu entro nisso tudo? — quis ele saber.

— Os que ficarem do nosso lado, só terão

a ganhar. Confirma sua posição quanto a

isso?

— Claro que sim, rapazes. Sempre

admirei o trabalho de vocês e estou feliz em

poder participar de seus planos. Ser xerife

não é uma boa profissão nem deixa

ninguém rico — respondeu o homem da lei,

mordendo a ponta do charuto, depois

cuspindo-a.

Bob apressou-se em riscar um fósforo e

acendê-lo para o xerife.

— Ótimo! — afirmou Oscar e os dois

irmãos riram com satisfação.

— Assim que se fala, Ted. De nossa

parte, você só terá a lucrar. Verá que será

muito compensador ser nosso amigo.

— Pois estou ansioso para conhecer tudo

isso. Quais são suas primeiras ações? Já

resolveram o que fazer em seguida?

— Antes de mais nada, vamos tomar o

rancho e Scott Nelson. É o que papai mais

queria em sua vida e nós vamos fazer isso

em homenagem a ele. Seu trabalho será

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fechar os olhos a isso e, se precisarmos, dar-

nos suporte.

— Não vai ser uma tarefa fácil, Oscar.

Scott vai oferecer dificuldades.

— Não é de hoje que ele nos causa

aborrecimentos, Ted. Só que agora papai

não está aqui para nos deter. Ele sempre

quis aquelas terras e vai tê-las,

principalmente porque pretendemos criar lá

os cavalos que vamos vender ao Exército no

ano que vem.

— Precisam fazer isso com muito

cuidado — aconselhou Ted.

— Sim, sabemos que Scott é muito

respeitado na cidade e que isso poderá

repercutir contra nós — ponderou Bob.

— Aí entra sua parte, Ted — falou Oscar.

— Você irá se encarregar de fazer as coisas

parecerem legais.

— Como? — indagou o homem com a

estrela.

— Não sabemos ainda, mas você penará

em algo, quando tudo acontecer. Scott

Nelson não deverá sair apenas do vale e de

nossas vidas. Ele terá de sair deste mundo,

para que possamos ficar tranqüilos.

— Quando querem fazer isso?

— O mais depressa possível... Se

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possível, ainda hoje, após o sepultamento de

papai — falou Bob.

— Deixem-me pensar — disse o xerife,

indo até onde estava o uísque e despejando

familiarmente uma generosa dose em seu

copo.

Baforou seu charuto por algumas vezes,

depois voltou para junto dos dois.

— Acho que podemos fazer isso de um

modo bem simples, sem necessidade de

complicar as coisas. Mandem alguns de

seus homens soltarem cavalos com a marca

do Rancho Merryl nas terras de Scott.

Depois façam uma queixa. Nós iremos ao

rancho dele, descobriremos os cavalos e

providenciaremos seu linchamento, que é o

que se faz nesta terra com malditos ladr·es e

cavalo. O que me dizem?

Os dois irmãos entreolharam-se.

— Acho que pode funcionar. Destruímos

a reputação de Scott e nos livramos dele —

falou Bob.

— É, é simples e eficiente. É uma boa

idéia, Ted. Já começou a pensar da forma

como nós queremos. Agindo assim,

ninguém poderá dizer que não fizemos a

coisa legalmente, já que linchar ladr·es de

cavalo é prática usual. Nem precisaremos

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estar presentes.

— Sim, isso mesmo, Oscar. Basta

mandarem alguns de seus homens para nos

ajudar a reconhecer os cavalos.

Providenciarei para que tudo fique legal

depois de acontecido — afirmou o xerife.

— E o que isso vai representar em termos

de... sua gratidão, rapazes?

Os dois irmãos riram. Oscar foi até a

escrivaninha, abriu uma gaveta e retirou

uma caixa de metal. Dentro dela ele

apanhou um maço de notas. Voltou e

entregou-o ao homem da lei.

O charuto quase caiu da boca de Ted

Quincy, quando calculou a quantia que

havia ali.

— Isto é apenas o começo — falou

Oscar.

— Rapazes, vou adorar trabalhar para

vocês — riu o xerife, tomando mais um

gole de seu uísque.

Lembrou-se, então, do vaqueiro que

havia sido surrado na cidade.

— Há mais alguém que pode servir de

obstáculo a seus planos, rapazes — contou

ele.

— Quem? — surpreendeu-se Bob.

— Sim, quem? — emendou Oscar.

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— Helen Fulton, do saloon.

— Helen? Por quê?

— Andou insultando vocês dois lá no

saloon. Um vaqueiro aqui do rancho

resolveu tirar satisfações e Helen o agrediu

e o chicoteou.

— Helen fez isso? Aquela maldita gata

selvagem! — falou Oscar, entre admirado e

ofendido.

— E diante de várias testemunhas.

— E o que fez a respeito, Ted? — quis

saber Bob.

— Nada, estava de saída para cá. Não

queria me atrasar para o sepultamento.

Deixei para resolver o assunto quando

retornasse.

— É melhor não fazer nada, Ted. Nada

conseguirá contra Helen. Ela é muito

estimada e respeitada pelos que freqüentam

seu saloon. Na certa vai aparecer uma

porção de testemunhas para dar razão a ela

— ponderou Oscar.

— Podemos fazer de outro modo — disse

Bob.

— Como?

— Poderemos usar o assunto para testar a

nova equipe que está vindo de El Paso.

Vamos ver se eles são mesmo bons —

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propôs Bob.

— Pode ser uma boa idéia. Vamos

resolver dois problemas ao mesmo tempo.

Daremos uma lição em Helen, ensinando-a

a nos respeitar, depois cuidaremos de Scott

Nelson. Com isso a cidade verá que não

estamos para brincadeiras. Todos passarão a

nos respeitar ainda mais.

— É um bom plano, rapazes, mas precisa

ser bem feito. Temos de manter as

aparências. Se seus rapazes fizerem alguma

bobagem, terei de intervir.

— Tudo bem, xerife. Quanto a isso, faça

a sua parte. Encontraremos sempre uma

forma de acertarmos tudo — afirmou Bob.

O velho Gregory Merryl foi enterrado na

mais verdejante colina do rancho, num

ponto de onde tinha-se uma vista completa

de todo o vale.

Ali, ao lado da esposa, ele descansaria

para sempre. Apenas os membros da família

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e os empregados estavam presentes. O

único da cidade a participar era o xerife.

Nenhum vizinho viera. Gregory Merryl

nunca se preocupara muito em fazer

amigos. Sempre quis fazer fortuna.

Após o sepultamento, os irmãos estavam

conversando na varanda da casa, quando um

tropel de cavalos se fez ouvir no rancho,

seguido de gritos de saudação.

— São eles — disse Bob, levantando-se.

Oscar seguiu-o. Vinte pistoleiros da pior

espécie acabavam de chegar.

— São os irmãos Merryl? — indagou

aquele que parecia ser o chefe do bando.

— Sim, quem é você?

— Um homem chamado Glenn nos

mandou vir para cá, onde encontraríamos

trabalho. Meu nome é Scar e todos estes

comigo são leais a mim.

— E você é leal a quem? — indagou-lhe

Oscar.

— A quem me pagar mais — respondeu

o pistoleiro.

— Então veio ao lugar certo, Scar. Estão

contratados. Espero que não estejam muito

cansados.

— Foi uma longa viagem, patrão — disse

o cavaleiro. — Estamos com fome e

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sedentos.

— Acho que podemos dar um jeito nisso

agora mesmo. Quero que vão até a cidade

fazer um trabalho rápido. Poderão

aproveitar para comer e beber lá.

— Espero que não seja longe...

— Mais perto do que você imagina, Scar.

Ouçam o que vocês devem fazer lá — disse

Bob, passando-lhe algumas instruções e

dinheiro.

O grupo partiu logo em seguida para o

povoado. Enquanto isso, os irmãos

chamavam alguns homens e ordenavam que

fossem soltar cinqüenta cavalos nos pastos

de Scott Nelson.

— Está tudo preparado agora, Bob —

falou Oscar, quando terminaram as

providências.

— Sim, a partir de hoje, apenas um nome

mandará neste vale: Merryl!

— E em pouco tempo teremos mais

dinheiro do que conseguiremos gastar em

toda a nossa vida — afirmou Oscar, com

satisfação. — Viajarei pela Europa, pela

América do Sul, por toda parte.

Enquanto os dois irmãos sonhavam com

um futuro de riqueza e fartura, na cidade,

Helen havia terminado de cantar a primeira

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música daquele começo de noite.

Sua voz encantava os homens e ela foi

muito aplaudida, quando silenciou.

Nesse momento, a equipe liderada por

Scar entrou no saloon, de maneira ostensiva

e provocadora.

Encostaram-se no balcão e pediram o

melhor uísque que havia na prateleira.

O barman apressou-se em pôr uma

garrafa sobre o balcão. Scar arrancou a

rolha com o dente, cuspindo-a para o lado.

Bebeu no gargalo da garrafa mesmo.

— Que droga! — falou ele, irritado,

cuspindo toda a bebida sobre o barman. —

Eu pensei ter pedido seu melhor uísque,

idiota! — acrescentou ele.

— É o melhor que temos e até agora

ninguém reclamou — falou Helen, exaltada,

indo ocupar um lugar atrás do balcão para

encarar os homens encostados nele.

— Talvez porque tenham morrido ao

beber esta porcaria — gracejou Scar,

arrancando gargalhadas de seus parceiros.

— Se não lhe agrada meu uísque, moço,

pode ir beber em outro lugar — disse ela.

— O uísque vendido aqui sempre foi

honesto, forasteiro — falou um dos

vaqueiros amigos de Helen.

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Sem saber, estava ingenuamente dando a

Scar a oportunidade que ele precisava para

dar início à confusão ordenada pelos irmãos

Merryl.

Scar virou-se no balcão, olhando para os

presentes.

— Quem disse isso? — indagou.

— Eu disse — falou o vaqueiro,

levantando-se e encarando o pistoleiro.

Scar aproximou-se dele lentamente,

sempre olhando-o no fundo dos olhos.

— Eu digo que esse uísque é uma droga,

moço — afirmou Scar, cuspindo saliva

enquanto falava.

— E eu digo que ele é honesto, forasteiro

— respondeu corajosamente o vaqueiro.

— Está me chamando de mentiroso?

— Pois é o que eu acho que é, forasteiro.

Ou então, de onde vem, os homens não são

desmamados a uísque. Deve ter o paladar

muito suave. Por que não pede um copo de

leite? — falou o vaqueiro, sem saber com

quem estava lidando.

— Olhe nos meus olhos — ordenou Scar.

— Sim, por quê?

— O que você vê?

— Vejo um bastardo mentiroso!

— E eu vejo um homem morto — falou o

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pistoleiro, sem emoção alguma, levando a

mão ao Colt.

O vaqueiro percebeu o perigo e tentou

sacar. A arma de Scar saltou para fora do

coldre como num passe de mágica. O

vaqueiro caiu morto sobre a mesa, varado

por duas balas certeiras.

— Não devia ter feito isso, moço — falou

um amigo do vaqueiro, jogando a cadeira

para trás, enquanto levantava-se e tentava

sacar sua arma.

Scar não lhe deu chance alguma.

Estendeu o braço, mirando a cabeça do

outro. Quando disparou, sangue e miolos

foram espirrar nas pessoas sentadas nas

mesas atrás do vaqueiro, que tombou

fulminado, coma cabeça aberta como um

melão podre.

Helen saltou para fora do balcão, chocada

com aquele sangue frio. Scar voltou-se e

encarou-a.

— E agora, moça? Onde está aquele bom

uísque desta espelunca? — indagou, com

desprezo.

— Modere a língua, pistoleiro —

ordenou ela, avançando na direção dele.

Havia um revólver na mão dela, mas

quando avançou por entre os pistoleiros, um

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deles tomou-o dela. Quando ela quis

protestar, Scar já estava junto dela,

esbofeteando-a com violência.

— Não vamos deixá-lo fazer isso com

Helen, pessoal — gritou um dos vaqueiros.

Minutos depois, uma briga generalizada

tomava conta do saloon. Os homens que

defendiam Helen não sabiam que lutavam

contra bandidos da pior espécie, sem

piedade alguma.

Não foi uma luta limpa nem justa. Os

defensores de Helen foram selvagem e

barbaramente espancados, alguns com

requintes de crueldade mesmo.

Quando a briga terminou, o saloon estava

semi-destruído e muitos homens estavam

caídos, sangrando, com braços, pernas ou

costelas quebradas.

— Que isto sirva de lição para vocês.

Quando pedimos um bom uísque, queremos

o melhor de todos — falou Scar. —

Detestamos ser enganados com venenos

como o que servem aqui.

Helen, que havia sido imobilizada por um

dos pistoleiros, conseguiu se livrar e

apanhar um chicote. Avançou como uma

fera contra Scar, atingindo-o no braço.

Uma mancha vermelha desenhou-se na

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camisa do pistoleiro, que se voltou, furioso.

— Vai me pagar, sua gata selvagem, filha

de uma cadela — rugiu ele, tomando-lhe o

chicote.

Helen tentou se defender, mas ele

aplicou-lhe algumas chicotadas violentas

nas costas.

Possivelmente teria sido morta

cruelmente daquela forma, se Ted Quincy

não aparecesse naquele momento, após ter

sido chamado por alguns cidadãos.

— Que diabos aconteceu por aqui? Um

furacão varreu seu saloon, Helen? —

indagou ele.

A garota chorava, com as costas

sangrando, incapaz até de falar.

— E vocês, o que me dizem? — indagou

o homem da lei a Scar e os outros.

— Não foi culpa nossa, xerife. Paramos

aqui para tomar um uísque de verdade e

fomos destratados por essa dona e seus

amigos, além de terem tentado nos vender

uísque da pior categoria que existe.

Examinando-os, Ted logo concluiu que

eram homens do Rancho Merryl,

possivelmente os que Glenn havia escolhido

para aquele novo trabalho.

— E esses dois mortos?

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— Eu atirei neles, xerife. Aquele ali

tentou me acertar pelas costas. O outro veio

em defesa do amigo. Quanto à briga, e

garota ali tentou atirar em mim com aquela

arma que meu amigo tomou dela —

apontou ele. — Estava fora de s, dei-lhe

uma bofetada para acalmá-la. Então esse

bando todo aí veio para cima de mim e de

meus amigos.

— É verdade isso? — indagou o xerife,

virando-se para um dos vaqueiros.

Atrás dele, um dos homens de Scar sacou

a arma, apontando-a para o vaqueiro, que

engoliu seco.

— Sim, xerife. Ele fala a verdade —

disse, sem outra alternativa.

— Está feito, então. Vou levar todos os

vaqueiros para a cadeia por perturbarem a

ordem. Uma semana de jaula ou multa de

vinte dólares cada um.

Um murmúrio geral de revolta percorreu

o saloon, enquanto Helen, indignada,

conseguia, finalmente recuperar o controle

de si mesma.

— Ele é um covarde maldito, xerife. Não

deve acreditar nas palavras dele — falou a

garota, caminhando com dificuldade.

— O que houve em suas costas?

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— Ela me chicoteou primeiro, xerife. Dei

a ela uma amostra de seu próprio remédio

— informou Scar.

— É, acho que isso equilibra as coisas,

Helen. Parece que não gostou do remédio

que aplica nos outros. Que isso lhe sirva de

lição. Eu mesmo já andava cansado de sua

valentia.

A garota mal podia acreditar no que

estava ouvindo da bocas do homem

responsável pela lei na cidade.

— Quer dizer que não vai fazer nada

contra esse bando de pistoleiros? —

questionou ela.

— Pelo que me disse este cavalheiro,

confirmado por aquele vaqueiro, seus

amigos provocaram toda a confusão, Helen.

— Cavalheiro? Você está chamando de

cavalheiro esse pistoleiro fedorento aí?

— Modere a língua, moça, ou serei

obrigado e lhe dar mais um pouco de

remédio para acalmar sua raiva — ameaçou

Scar, ainda brandindo o chicote.

— É um covarde e canalha, pistoleiro. Eu

me vingarei de você, juro como me

vingarei. Você não perde por esperar.

Mexeu com a mulher errada, moço —

prometeu ela, entredentes.

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— Fique quieta, Helen, ou acabo

prendendo-a também por desacato. Está

tudo resolvido agora. Dê graças a Deus por

eu ter chegado a tempo ou você seria morta

a chicotadas.

— Está me dizendo que surrar mulheres

agora é permitido e amparado pela lei,

xerife?

— Você começou tudo com sua pose de

galinha choca enraivecida, dona. É melhor

ficar quieta agora. Só tem a ganhar com isso

— advertiu Scar.

— Se eu tivesse uma arma, eu o mataria

agora mesmo, seu covarde!

— Estou morrendo de medo — disse

Scar.

Os pistoleiros riram, divertidos.

— Muito bem, pessoal, estão todos

presos agora. Vamos indo para a cadeia —

ordenou Ted Quincy aos amigos de Helen,

sob reclamação geral.

— Espere um pouco, xerife — protestou

Helen, indignada com tudo aquilo que

acontecia.

— O que foi agora? — indagou o homem

da lei, impaciente.

— Quem vai pagar o meu prejuízo?

— De que prejuízo está falando?

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— Olhe a baderna que fizeram em meu

saloon... Mesas, cadeiras, candelabros... Só

aquele espelho na prateleira de bebidas

custou-me duzentos dólares...

— Isto aqui está parecendo o que sempre

foi, Helen Fulton. Uma baderna. Se quer

receber alguma coisa, cobre o prejuízo dos

vaqueiros, que começaram toda a bagunça.

— Você conhece esses homens que está

prendendo, xerife. Sabe que não foi assim.

Por que está defendendo esses pistoleiros?

Está com medo deles?

— Se eu fosse você, não a deixaria falar

assim comigo, xerife — falou Scar.

— Não se intrometa, eu sei cuidar dela.

— E os dois vaqueiros mortos, vai deixar

por isso mesmo, xerife? — ainda insistiu a

jovem.

— Pelo que vejo, foi uma luta leal e eles

tiveram todas as chances. Percebo que

chegaram a sacar suas armas — apontou o

xerife.

Helen olhou e teve uma surpresa

inesperada. Na verdade, os dois vaqueiros

nem haviam tido tempo de sacar suas

armas, antes de serem mortos por Scar.

Durante a briga, alguém havia tirado seus

Colts dos coldres, dando a entender que

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haviam sacado também.

— Está acontecendo alguma coisa por

aqui, xerife — comentou ela, sem entender

tudo aquilo. Mas eu acho que já estou

entendendo tudo. Para quem vocês

trabalham? — indagou ela a Scar.

O pistoleiro não respondeu, olhando-a

com desprezo.

— Percebeu agora, xerife? Esses

pistoleiros devem ser os novos contratados

do Rancho Merryl. Aqueles dois nem

esperaram o cadáver do pai esfriar e já estão

preparando das suas. Com a morte do velho,

com certeza eles vão implantar sua vontade

sobre a região. Mas cedo ou tarde serão

punidos. Tenho certeza disso — afirmou

ela.

Os pistoleiros riram zombeteiramente,

depois ajudaram o xerife a levar os

vaqueiros para a cadeia.

Quando os pistoleiros voltaram ao rancho

e contaram o ocorrido aos dois irmãos,

Oscar riu muito de toda a história,

divertindo-se com o acontecido. Bob ficou

igualmente muito satisfeito com a lição

dada a Helen.

— Fez um bom trabalho, Scar. Quero que

conheça depois toda a equipe. Talvez você

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seja o novo líder deles — disse Bob.

— Sim, uma boa idéia. Vamos nos dar

bem — afirmou Oscar.

— Gosto de trabalhar assim. Vocês

mandam e pagam, eu os faço felizes — riu

Scar.

— Ótimo! Agora pode ir descansar com

seus homens. Há lugares preparados no

alojamento número cinco. Depois

conversaremos mais — despediu-o Bob.

O pistoleiro retirou-se, juntamente com

seus homens. A noite havia caído sobre o

vale e tudo parecia muito tranqüilo agora. O

capataz do rancho e mais alguns vaqueiros

retornaram pouco depois.

Assim que desmontou, foi até a casa

conversar com seus patrões, que bebiam e

conversavam, animados com os últimos

acontecimentos.

— E então, Mark? Fez tudo conforme lhe

ordenamos? — perguntou Bob.

— Sim, patrão! Fizemos tudo conforme

ordenado. Pusemos cinqüenta cabeças de

cavalo no pasto de Scott Nelson, deixando

uma pista como se eles tivessem sido

levados do pasto norte.

— Ótimo! Amanhã pela manhã, vá à

cidade e chame o xerife. Informe que

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tivemos um roubo de cavalos aqui.

— Entendido, patrão.

— E deixe uma equipe pronta e armada

para ajudar o xerife a capturar o ladrão de

nossos cavalos.

— Certo, patrão! Tudo vai ser perfeito.

Scott não terá como negar o roubo.

— Bom trabalho, Mark. Não me deixe

esquecer de lhe acrescentar algo mais no

pagamento desta semana — avisou Bob.

— É muita gentileza sua, patrão —

agradeceu o homem, saindo.

Bob foi apanhar a garrafa de uísque e

completar seu corpo e o do irmão.

Brindaram com satisfação.

No dia seguinte, pela manhã, o xerife e

alguns ajudantes, que serviriam de

inocentes úteis, testemunhando a culpa de

Scott Nelson, apareceram no rancho logo

pela manhã.

Ted, para impressionar os ajudantes,

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representou muito bem seu papel, dando a

entender que nada sabia sobre o plano

engendrado por ele mesmo para acusar

Scott.

— Mandaram me chamar? — indagou

ele, assim que chegaram lá.

Bob e Oscar já o esperavam na varanda

da casa.

— Sim, xerife — respondeu Oscar. —

Estamos com um problema aqui.

— Que tipo de problema?

— Problema com nossa criação de

cavalos, xerife. Ultimamente têm

desaparecido cavalos de nosso rancho.

Achei que poderia nos ajudar. Hoje cedo os

rapazes deram pela falta de cinqüenta

cavalos em nosso pasto norte.

— Alguma pista?

-Longe de nós qualquer acusação sem

provas, xerife, mas o pasto norte faz divisa

com o rancho de Scott Nelson e, como sabe,

estamos tendo alguns problemas com ele.

— Certo. É melhor darmos uma olhada.

Querem vir conosco?

— Eu gostaria de ver isso de perto —

disse Bob ao irmão, em voz baixa.

— Então vamos junto.

— Podemos levar alguns de nossos

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rapazes, xerife? Não queremos encrencas

com Scott Nelson — pediu Bob.

— Tudo bem, Bob. Acho que será útil —

decidiu o xerife.

Momentos depois, os Merryl e meia

dúzia de homens acompanhavam o xerife,

na direção do pasto norte.

Seguiram a divisa com o rancho de Scott,

sempre de olho na cerca que separava as

duas propriedades.

— Como vê, xerife, não há buracos na

cerca, que justificassem a fuga dos cavalos.

Se saíram daqui, devem ter sido levados.

— Preciso apurar isso com cuidado. Não

quero cometer nenhum engano — falou o

xerife, piscando um olho para os dois

irmãos.

Um dos homens do Rancho Merryl

seguia na frente. Fizera parte do grupo que

passara os cavalos para o pasto do outro

rancho.

— Veja aqui, patrão! — disse ele,

mostrando o ponto onde a relva amassada

mostrava que muitos cavalos haviam

passado de um para outro lado da cerca.

O xerife foi até lá. O arame farpado

estava precariamente preso aos palanques,

mostrando um conserto improvisado.

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Bastou puxá-los para que se soltassem.

— Parece que os cavalos passaram por

aqui — disse o xerife. — E não fizeram esta

abertura na cerca sozinhos.

— Vejam, ali na frente, há uma manada.

Vamos dar uma olhada — falou Oscar.

O grupo cavalgou até os cavalos que

pastavam sossegadamente. Como era de se

esperar, muitos cavalos com a marca do

Rancho Merryl foram encontrados entre

eles.

— Aí está a prova, xerife — acusou Bob.

— Não há dúvida.

— Sim, ele anda roubando nossos

animais, xerife — completou Oscar.

— Vejo que é uma prova contundente,

rapazes. Vamos à procura dele — disse o

homem da lei.

Cavalgaram para a sede do rancho, onde

procuraram pelo proprietário. Scott Nelson,

no entanto, não se encontrava lá.

— Algum problema, xerife? — indagou

um dos homens que trabalhavam naquele

rancho.

— Sim, há um problema muito sério por

aqui — afirmou Ted. — Onde está seu

patrão?

— Foi à cidade comprar mantimentos,

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por quê?

— Encontramos cinqüenta cavalos do

Rancho Merryl entre a manada que pasta no

pasto sul deste rancho. E um conserto muito

malfeito na cerca que separa os dois

ranchos.

— O que está querendo insinuar, xerife?

— Não estou insinuando nada, rapaz.

Recebi uma queixa dos Merryl, alegando

que seus cavalos estavam desaparecendo.

Investigando agora, encontramos os cavalos

do lado de cá e a cerca violada. Não preciso

insinuar nada. A verdade está na cara: seu

patrão anda roubando gado do Rancho

Merryl.

— Não pode acreditar nisso, xerife! É

mentira! Por que Scott faria isso? Ele tem

os melhores cavalos do vale.

— Não queira discutir comigo o que eu

vi pessoalmente, rapaz. O que digo é que

seu patrão está em apuros. As provas são

todas contra ele. Roubar cavalos é punido

com linchamento neste território e você

sabe disso.

— Meu patrão é inocente e muito me

admira você, xerife, acreditando numa

bobagem dessas — falou o vaqueiro,

encarando o homem da lei.

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— Não discuto isso com você, rapaz.

Cadê seu patrão?

— Assim que se faz, xerife. Por que ficar

discutindo com um idiota de um vaqueiro?

— ironizou Oscar. — Talvez Scott esteja

escondido em algum ponto por aí, como

uma galinha assustada.

— É uma hipótese a ser considerada —

afirmou o xerife.

— Já lhe disse, xerife. Meu patrão não

está em casa e eu posso garantir-lhe isso.

— Cale-se, vaqueiro! Já lhe dei

importância demais. Vou verificar isso com

meus próprios olhos — decidiu o xerife,

desmontando e fazendo um sinal para seus

auxiliares. — Vamos revistar a casa,

rapazes.

— Espere um pouco, Quincy — disse o

rapaz e seu tom de voz já não era mais

amistoso. — Sou responsável pelo rancho

na ausência do meu patrão. Ninguém aqui

vai revistar nada sem autorização dele —

decidiu o vaqueiro, fazendo um sinal com

seu chapéu.

Vaqueiros armados começaram a surgir

de todos os pontos ao redor dos cavaleiros.

Traziam suas Winchesters engatilhadas e

prontas para disparar.

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Todos pareciam muito decididos. O que

parecia uma ação fácil começava a tornar-se

complicada e perigosa. O xerife percebeu

que estavam em menor número diante da

equipe do rancho.

Olhou para Bob e Oscar, que

compreenderam que o plano fora por água

abaixo.

— É melhor darmos o fora, xerife —

sugeriu Bob.

— Vamos fazer isso, mas vão se

arrepender de terem atrapalhado o trabalho

da lei — ameaçou o xerife.

Os cavaleiros deram meia-volta e

trataram de sair dali o mais depressa

possível.

— O que acham que devo fazer agora?

— indagou o xerife, quando já se afastavam

do rancho.

Cavalgava entre os dois poderosos

rancheiros, todos contrariados com a

resistência encontrada.

— Acho que Scott está oculto no rancho

dele — afirmou Oscar. — Devíamos

reforçar este grupo com nossos homens e

voltarmos lá. Vamos tirar isso a limpo e dar

uma lição naqueles abusados.

— Acho que é o melhor mesmo a ser

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feito. Posso nomear todos os membros do

grupo como meus assistentes temporários.

Isso vai tornar o que acontecer lá legal.

— De acordo. Vamos parar aqui e

esperar. Mandarei um dos homens buscar

Scar e seu bando — falou Bob.

As ordens foram dadas. Um dos

vaqueiros do rancho foi até a sede, de onde

retornou, pouco tempo depois, com Scar e

seus facínoras de El Paso.

— Está com algum problema, patrão? —

indagou Scar a Bob, assim que chegaram.

O pistoleiro parecia impaciente para

entrar em ação e mostrar serviço. No dia

anterior, os dois irmãos já haviam

demonstrado a generosidade deles.

— Sim, temos um problema para

resolver. Sigam-nos. Eu lhe conto no

caminho.

O agora numeroso grupo retornou ao

rancho de Scott Nelson. Ao vê-los

aproximando-se, os vaqueiros armaram-se

de novo e ficaram à espera.

Um grupo deles foi se postar diante da

casa, resolvidos a defendê-la. O xerife freou

seu cavalo diante deles, olhando-os

ameaçadoramente. Tinha respaldo agora. Os

pistoleiros de El Paso já haviam provado

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que sabiam ser eficientes.

— Muito bem, rapazes, não vou repetir

minhas ordens. Saiam da frente agora

mesmo ou vão se arrepender — disse ele.

— Só por cima de nossos cadáveres,

xerife, o que seria difícil de explicar depois,

não? — respondeu o vaqueiro que os

liderava.

— Aviso-os que farei isso, se for preciso.

Posso prendê-los por obstruírem o trabalho

da lei.

— Lei? De que lei está falando? —

ironizou o vaqueiro.

— Você é mesmo muito abusado — disse

Scar, aproximando seu cavalo o máximo

possível do vaqueiro. — Saia da frente ou

faremos o que tem que ser feito —

ameaçou.

— Então o que está esperando? — foi a

resposta do rapaz.

Os homens de Scar baixaram suas mãos

na direção dos coldres, soltando as presilhas

de couro que prendiam os revólveres no

lugar, impedindo-os de cair enquanto

cavalgavam.

Todos ficaram atentos a Scar, esperando

um sinal dele para começar a ação.

— Pela última vez, rapazes. Saiam da

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frente! Só quero revistar a casa e comprovar

que Scott não está aí.

— Terá que acreditar na honestidade de

minha afirmação, xerife. Eu digo que ele

não está.

— Você mentiria para proteger seu

patrão. Ele é um ladrão e merece ser

justiçado, assim como todos que estão com

ele. São cúmplices de roubo também —

alertou o xerife.

O clima tornava-se cada vez mais tenso.

Um sinal, um gesto, um movimento em

falso e a carnificina se instalaria naquele

local.

— Gostaria de vê-lo repetir isso diante de

meu patrão, xerife. Queria ver sua coragem,

então.

— Para mim chega de conversa, rapaz.

Você é muito abusado mesmo. Vamos

passar e quem se opor será morto como um

cachorro raivoso.

— É o que veremos, xerife — disse o

vaqueiro, engatilhando seu rifle.

Seu movimento foi lento demais e muito

previsível para um pistoleiro com a

experiência de Scar, que já estava preparado

para isso.

Sacou sua arma com extrema rapidez e,

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com um tiro certeiro, atravessou a garganta

do vaqueiro, que expeliu uma golfada de

sangue pela boca, antes de cair de joelhos.

Ficou estremecendo, enquanto tentava

dizer alguma coisa, mas apenas sons roucos

e ininteligíveis saíram de sua garganta. Ele

apertava o próprio pescoço, tentando

estancar o sangue, que esguichava por entre

seus dedos.

— Ele esta morrendo... — gritou um de

seus amigos. — Alguém faça alguma coisa.

Em resposta a seu apelo, Scar engatilhou

de novo seu Colt e a bala explodiu a cabeça

do vaqueiro, espalhando seus miolos na

poeira.

Os cachorros, atraídos pelo cheiro de

sangue, aproximaram-se. Um deles

abocanhou um pedaço dos miolos do

vaqueiro e tratou de correr. Os pistoleiros

divertiram-se muito com isso, enquanto os

vaqueiros do rancho ficavam chocados e

enojados.

— Mais alguém quer bancar o valente?

— indagou Scar, encarando-os.

Sob a mira das armas de Scar e de seus

homens, os vaqueiros não tiveram

alternativa, senão submeter-se.

O xerife e seus ajudantes revistaram a

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casa, sem encontrar o proprietário do

rancho.

— Muito bem, homens, ouçam o que vou

dizer! — falou Oscar. — O patrão de vocês

é um maldito ladrão de cavalos e deverá

receber a punição que merece.

— Ele nos roubou — acrescentou Bob, e

como compensação pelo crime eu invoco a

pena de indenização. Este rancho será

nosso, como pagamento dos prejuízos que

ele nos causou. É difícil dizer desde quando

ele vem roubando nossos cavalos. Aqueles

de vocês que quiserem trabalhar conosco e

receberem um bom pagamento, maior do

que o que recebem agora, podem ficar.

Quem não quiser, pode apanhar suas coisas

e dar o fora.

Os vaqueiros entreolharam-se, indecisos.

Trabalhar para os Merryl, naquela altura,

tinha dupla vantagem: mantinha a vida e

merecia um aumento.

Três vaqueiros, no entanto, decididos e

leais, separaram-se dos outros e foram

apanhar seus cavalos.

— Não trabalharei para canalhas e

covardes — comentou um deles.

— Sim, eu prefiro morrer de fome a trair

a confiança do Scott, que sempre foi um

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bom patrão — acrescentou outro.

Os três montaram seus cavalos e trataram

de afastar-se. Oscar, porém, fez um sinal

para Scar. O pistoleiro apanhou sua

Winchester e mirou cuidadosamente. O

primeiro tiro derrubou um dos vaqueiros.

Os outros dois, assustados, trataram de

esporear seus cavalos. Scar engatilhou de

novo a arma e mirou, sem precisar fazer

mira demorada.

O vaqueiro restante, em desespero, cortou

os flancos de seu cavalo com as esporas.

rezando para sair logo do alcance das balas.

Scar disparou pela terceira vez e o

vaqueiro tombou para frente da sela,

enquanto seu cavalo continuava sua corrida

desenfreada.

— Isso liquida a questão — falou Scar.

— Sim. Mais alguém deseja dar o fora do

rancho? — acrescentou Bob.

Nenhum dos vaqueiros do rancho

demonstrou ânimo para enfrentar gente tão

impiedosa e traiçoeira.

— Muito bem, xerife, acho que está tudo

resolvido por aqui, mas não terminamos o

que começamos fazer. Se Scott está na

cidade, vamos para lá atrás dele. Será

excelente pegá-lo lá e linchá-lo diante de

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toda a população. Vão nos respeitar mais

depois disso — propôs Oscar.

— Certo. Já que começamos, vamos

terminar isso — determinou o xerife.

Bob separou meia dúzia de pistoleiros

para ficarem no rancho e coordenarem os

trabalho. O restante do bando partiu a

galope na direção do povoado.

Alheio a todo o drama e à sórdida trama

tecida contra ele, Scott Nelson, na cidade,

terminava de carregar a carroça com os

mantimentos necessários.

Helen Fulton e Judy, uma garota que

trabalhava com ela no saloon viram-no e

foram ao seu encontro.

— O que houve com você, Helen. Parece

que levou uma surra? — brincou ele.

— Sim, e levei mesmo — afirmou ela.

Scott olhou-a sem entender

— Está falando sério?

— Sim, eu fui chicoteada, se é que se

pode acreditar nisso..

— Quem? Como? Por quê? —

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horrorizou-se ele.

— Foi tudo graças à conivência do xerife

e aos pistoleiros que os Merryl mandaram

vir de El Paso.

— Que pistoleiros? — surpreendeu-se

ele.

— Acho que agora os dois farão o que

sempre desejaram fazer e o velho não

permitia. E você, mais do que ninguém,

sabe o que isso significa, não?

— Eu não tenho medo deles — afirmou

Scott.

— Helen também não tinha e olhe em

que estado eles a deixaram — falou Judy.

— Não me acovardarei diante deles,

Judy.. Sei que eles querem meu rancho e

farão todo o possível e o impossível para tê-

lo. Meu rancho é minha vida. Nada me

separará dele. Lutarei como for preciso para

mantê-lo. Fugirei como um covarde se for

preciso, para retornar no momento certo,

com a ajuda certa, para fazer prevalecer a

justiça. Só que o que é meu, é meu. Disso

não abro mão. Podem tomar-me o que

puderem, mas no momento devido, eu volto

para resgatar o que me pertence.

— E faz muito bem, Scott. Eles têm

muitos homens agora. Enfrentá-los é

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loucura — aconselhou Helen.

— Lutei muito para transformar meu

rancho no melhor do vale. Não é o maior,

mas não preciso mais do que já tenho.

Podem tentar, mas o que é justo é justo.

— Aqueles covardes não conhecem

justiça, Scott. Se eu fosse você, iria para

Phoenix, procurar um delegado federal. É a

única maneira de trazer justiça para esta

maldita terra...

Naquele momento, um cavalo entrou em

disparada pela rua principal do povoado.

Sobre ele, um cavaleiro com o peito e as

costas manchadas de sangue lutava

bravamente para manter a lucidez, que se

esvaía no sangue que lambuzava seu corpo

e a sela de seu cavalo.

Ao reconhecer o animal e o seu cavaleiro,

Scott atirou-se corajosamente no meio da

rua e deteve o animal extenuado.

O cavaleiro caiu pesadamente na poeira.

Scott foi levantar-lhe a cabeça.

— Água... água... — pediu o vaqueiro.

Scott fez um sinal para que Helen

providenciasse água.

— Matt, o que houve, rapaz? — indagou

Scott, compadecido.

— Fuja, Scott... Fuja... Eles querem

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linchá-lo...

— Quem?

— Os Merryl... com a cumplicidade do

xerife... Fuja...

— Por Deus, conte-me o que houve!

Helen chegou, com uma caneca de água.

Scott deu de beber ao vaqueiro ferido, cuja

pele amarelava-se a olhos vistos. Ele

perdera muito sangue. Estava à beira da

morte e nada poderia ser feito para salvá-lo.

Com a voz cada vez mais fraca, o

vaqueiro contou o que acontecera no

rancho. Quando terminou, seus olhos

tornaram-se opacos e seu corpo pesou nos

braços de Scott.

— Matt... Matt... Malditos! Não

perderam tempo mesmo — disse o

rancheiro, indignado.

— Scott, você tem de fugir agora... Você

ouviu o Matt... Eles devem ter preparado

alguma coisa contra você... Virão no seu

encalço...

— Meu Deus! Não posso abandonar tudo

onde dediquei toda a minha vida, a vida de

minha esposa... Dos filhos que eu não tive e

para quem fiz tudo isso... — lastimou

dolorosamente o rancheiro, cedendo ao

desespero.

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— Não Scott, não faça isso. É o que eles

querem. Faça o que lhe disse. Vá para

Phoenix, procure ajuda legal.

— Helen tem razão, Scott. Ficar é morrer

— disse Judy.

— E isso será fazer o jogo deles. Não

facilite, Scott. Resista com inteligência.

Fortaleça-se, depois volte e retome o que é

seu... — incentivou Hellen. — Esta é uma

tarefa que não conseguirá executar sozinho.

Precisa de ajuda. De ajuda de quem sabe

como enfrentar esse tipo de gente.

— Você está certa, Helen. Por que

facilitar as coisas para eles? Sei o que fazer,

como fazer e onde fazer para transformar a

vida deles num inferno. No mesmo inferno

que eles desejaram para mim...

— Sim, Scott! É isso que deve fazer —

falou Helen.

— Obrigado, Helen. Jamais esquecerei

isso. Pode me emprestar seu cavalo? Sei

que é um dos melhores corredores daqui.

Estes de minha carroça são fortes, mas não

são velozes.

— Claro que sim, Scott. Ele está no

estábulo. Corra para lá e fale com o Sam.

Pode levá-lo. Ninguém vai conseguir

alcançá-lo.

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— Não sei como agradecê-la, Helen... Eu

voltarei... Prometo... Não se preocupe

comigo e cuide-se, por favor!

— Vá depressa! — ordenou-lhe a garota,

comovida, abraçando-o e beijando-o

apaixonadamente. — Vá, meu amor! —

repetiu, emocionando-o, fazendo-o olhá-la

com surpresa. — Vá... Mas volte... estarei a

sua espera ... — finalizou ela, empurrando-

o.

Scott olhou-a por instantes, depois tratou

de fazer o que ela lhe pedira.

Momentos depois, ele deixava a cidade,

partindo a galope no cavalo mais veloz da

região, deixando para trás o coração

apaixonado e preocupado da dona do

saloon.

Scott Nelson já havia partido havia algum

tempo, quando os Merryl e seus pistoleiros

chegaram à cidade.

— Lá está a carroça dele — apontou o

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xerife, reconhecendo-a imediatamente.

— Então ele ainda deve estar lá no

armazém — afirmou Bob. — Vamos pegá-

lo.

— Acho melhor cercarmos todo o local

primeiro — sugeriu Oscar.

Parada na porta do saloon, Helen viu

todos aqueles pistoleiros aproximando-se e

suspirou aliviada porque sabia que Scott

estava a salvo naquele momento.

Bob determinou que os pistoleiros

cercassem todas as saídas do armazém. Scar

supervisionou a tarefa. Quando tudo ficou

pronto, foi avisar seus patrões.

— Ele está cercado lá dentro. Não tem

como escapar — afirmou ele.

— Fizemos nossa parte, xerife. Agora

faça tudo parecer legal e prenda-o — disse-

lhe Bob.

Ted Quincy plantou-se diante do

armazém, com uma Winchester nas mãos.

A cidade toda saíra às ruas, portas e janelas.

Ninguém entendia o que estava

acontecendo, pois muitos haviam visto

Scott sair da cidade a cavalo, momentos

antes.

— Scott Nelson, aqui é Ted Quincy, o

xerife. Saia daí de mãos para cima ou

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entraremos para pegá-lo — gritou o homem

da lei, alto o bastante para o povoado todo

ouvir.

As pessoas que sabiam que Scott não

estava lá acharam muita graça em tudo

aquilo e começaram a rir.

— De que eles estão rindo? — indagou

Bob ao seu irmão.

— Quem?

— Todo mundo... Olhe para ver...

Oscar olhou para as pessoas nas ruas.

Eles comentavam e riam, apontando para o

xerife e o armazém.

— Sei lá. Depois veremos isso. Agora

vamos nos concentrar em pegar Scott —

disse ele.

— Pela última vez, Scott. Saia ou vamos

entrar para pegá-lo e daí não me

responsabilizarei por sua vida — berrou o

xerife, achando muito cômodo que Scott

facilitasse o trabalho de matá-lo daquela

forma.

A porta do armazém começou a abrir-se

lentamente. Os irmãos Merryl riram de

satisfação. Scar preparou sua Winchester.

Quando o tal do Scott Nelson surgisse,

deveria baleá-lo certeiramente.

— Mas... É o Gordon, o dono do

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armazém — surpreendeu-se o xerife,

olhando na direção dos Merryl.

Scar deteve o dedo no gatilho a tempo.

— Onde está Scott Nelson? — indagou

Oscar, irritado.

— Saiu há algum tempo...

— Mas a carroça dele ainda está ai, não?

— apontou Bob.

— Não sei explicar o que houve. Ele

estava trazendo os mantimentos para a

carroça. De repente, não voltou mais. Não

sei para onde foi.

Os habitantes ao redor davam boas

gargalhadas do acontecimento e da

trapalhada cometida pelos pistoleiros.

Quando Scar, no entanto, avançou e

agarrou um deles pelo pescoço, jogando-o

na poeira depois chutando-lhe as costelas,

todos calaram-se, assustados diante de tanta

violência gratuita.

— De que estava rindo, seu idiota? Acaso

somos palhaços? — indagou Scar,

agarrando o homem pelos colarinhos e

levantando-o para encará-lo.

— Perdão... Clemência... Eu não fiz por

mal... Não queria aborrecê-lo, senhor...

— Então por que ria? — insistiu o

pistoleiro.

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— É que vocês estão procurando por

Scott Nelson, mas ele já saiu da cidade há

uns dez minutos — explicou o homem.

— E só agora você me diz isso? — falou

Scar, irritado ao extremo, jogando o pobre

homem de novo na poeira e chutando-o

selvagemente.

Só após deixá-lo inerte na poeira é que

conseguiu acalmar-se. Os Merryl também

demonstravam toda a sua contrariedade.

— Fizemos papel de tolos. Enquanto

armávamos todo este circo, Scott fugia de

nós sem preocupação — falou Oscar.

— Vamos atrás dele? — indagou o

xerife.

— Ele já leva uma boa dianteira. Mas

como soube que vínhamos atrás dele?

— Acho que sei como — falou Scar,

apontando para um cavalo, amarrado perto

do armazém, com a sela coberta de sangue.

Ao lado havia um corpo coberto com

uma lona. Assim que a situação acalmou-se,

o papa-defuntos retornou para continuar seu

trabalho.

— Era aquele vaqueiro lá no rancho. Na

certa trouxe o recado a Scott, antes de

morrer — concluiu Bob.

— Precisa melhorar sua pontaria, Scar —

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zombou Bob.

— Ele já estava longe, quando atirei,

mesmo assim ainda o atingi certeiramente.

Só não morreu na hora por verdadeiro

milagre. Devia ser muito fiel a Scott para

ter-se sacrificado dessa forma, cavalgando

até aqui — defendeu-se o pistoleiro.

— Isso nos deixa numa situação delicada.

Não sabemos para onde Scott foi. Pode

muito bem ter ido buscar ajuda em alguma

parte — falou Bob.

— Onde poderia ele encontrar ajuda? Só

se for a Phoenix, tentar convencer um

delegado federal a vir até aqui, o que eu,

particularmente, acho muito difícil —

opinou o xerife. — Se isso acontecer, perco

minha estrela e aí sim vamos ter problemas.

— Então acho que é hora de vermos se os

homens de Scar são mesmo bons — decidiu

Oscar.

— O que sugere? — indagou Bob ao

irmão.

— Vamos tentar pegá-lo, custe o que

custar — disse Oscar, chamando o chefe

dos pistoleiros. — Quero que mande dois de

seus melhores homens atrás de Scott e que o

matem, entendeu? Sem piedade alguma.

— Será feito, não se preocupe —

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assegurou o pistoleiro..

Scar foi até o grupo e selecionou dois

mexicanos, que eram seus melhores

rastreadores e assassinos frios e

sangüinários.

— Pepe, você e Miguel devem partir

agora atrás do homem que fugiu. Ele deve

ser morto. Aqui têm algum dinheiro.

Comprem mantimentos e o que for preciso

aí no armazém e partam em seguida.

Peguem uma descrição do homem, antes de

partir.

— Vão reconhecê-lo facilmente — disse

um vaqueiro do Rancho Merryl que os

acompanhava. — Ele usa um cinturão de

couro negro, com dois coldres e pistolas

niqueladas, com coronhas de madrepérola.

São únicos, cinturão e armas.

— Mui bien! — falou um dos mexicanos.

Os dois foram rapidamente ao armazém,

compraram munição e saíram. Seus cavalos

eram velozes e não se cansavam facilmente.

Não importava qual fosse a dianteira de

Scott. Sabiam que o apanhariam em pouco

tempo.

— Não se preocupem, patrões — falou

Scar aos Merryl. — Pepe e Miguel são

meus melhores assassinos e cavaleiros

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experientes. Quando recebem uma missão,

cumprem-na a todo custo. Scott Nelson já

pode se considerar um homem morto.

— Assim espero. Enquanto esperamos,

vamos até a Cantina do Juan tomar um

pouco de vinho. Tudo isso me deixou

sedento — propôs Bob.

Todos aceitaram o convite.

Enquanto isso, Scott fugia, mas teve a

infelicidade de fazer seu cavalo pisar num

buraco. Quase foi derrubado da sela, mas o

fogoso e valente animal conseguiu manter-

se em pé.

O rancheiro desceu e examinou a pata do

animal, que mancava.

— Maldição! Se estão atrás de mim,

estarei perdido — disse ele para si mesmo.

Tirou o lenço do pescoço e enfaixou a

pata do animal. Não poderia forçá-lo nem

montá-lo. O animal, com um bom descanso,

ficaria bom, pois não quebrara o osso.

Estava terminando de fazer isso, quando

ouviu um galope aproximando-se.

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— Ei, Scott, algum problema? —

indagou um vaqueiro, velho conhecido dele.

— Olá, Bill. Estou com um problema

sim, como pode ver.

— Quebrou a pata do cavalo?

— Não, ele pisou num buraco, mas não

quebrou, felizmente. Terá de ficar de

repouso. E nem meu ele é.

— Sim, eu o reconheço. Pertence a Helen

Fulton, não?

— Exatamente, Bill. Eu preciso mesmo ir

a Phoenix. Vou lhe propor um negócio

irrecusável. Tenho aqui comigo... cinco

dólares — falou o rancheiro, após conferir o

dinheiro que tinha em um dos bolsos.

O restante, que seria usado para pagar o

armazém, estava reservado no bolso traseiro

de sua calça e iria precisar dele para a

viagem.

— Quer comprar meu cavalo, Scott?

— Sim, cinco dólares é um bom preço

por esse pangaré, não?

— É um bom preço, Scott. Eu poderia

comprar um bom cavalo lá no Estábulo do

Hank, na cidade, mas vou ter de andar até

lá. Não poderei montar o outro cavalo.

Certamente você deseja que eu o leve para

Helen, não?

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— Exatamente. Por favor, Bill, você tem

que aceitar. Preciso mesmo ir para Phoenix

e vou ser sincero com você. Os Merryl estão

atrás de mim. Se você não me ajudar, eles

vão me pegar — confessou o rancheiro.

— Assim é diferente, Scott — disse Bill,

desmontando. — Não gosto daquela gente.

Faremos o seguinte negócio. Eu lhe vendo o

cavalo e você me dá seu cinturão. Sempre

cobicei suas armas, Scott.

— Com uma condição. Quando eu voltar,

você me vende o cinturão e as armas de

volta pelo dobro do preço. Não poderia ficar

sem elas.

— Parece justo — concordou o vaqueiro.

Scott deu-lhe os cinco dólares e o

cinturão.

— Obrigado, Bill! Você salvou minha

vida — disse Scott, partindo rapidamente.

Bill examinou o cavalo. Não poderia

montá-lo mesmo. Segurou a rédea a

começou a caminhar na direção da cidade.

Estava satisfeito com o negócio,

principalmente por estar usando as armas de

Scott.

Algum tempo depois, parou num riacho

para tomar água e descansar. Foi quando os

dois cavaleiros aproximaram-se

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velozmente. Quando pararam diante dele,

olharam o cinturão e as armas que ele

usava.

— Belas armas, gringo! — falou Miguel.

— São únicas. Não há iguais em todo o

território — afirmou Bill, orgulhoso.

— O que houve com seu cavalo?

— Machucou a pata em um buraco.

— Seu nome é Scott Nelson? — indagou

Pepe, que mantinha nas mãos sua escopeta,

pronta para atirar.

Bill percebeu logo o que estava

acontecendo. Aqueles homens eram

assassinos a mando dos Merryl e estavam

atrás de Scott para matá-lo. Não podia

deixar isso acontecer. Scott estava

desarmado.

— Estas são as armas de Scott Nelson —

afirmou ele, tentando sacá-las.

Pepe apenas estendeu o braço e disparou

a escopeta na direção da cabeça do

vaqueiro.

Seu crânio partiu-se todo com o impacto

de uma carga de chumbo grosso.

— Idiota! — falou Miguel, desmontando.

— Teve muito azar de machucar a pata do

cavalo — acrescentou, tirando o cinturão

que Bill usava.

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— Vamos levar as armas e o cavalo.

Provarão que o matamos.

— Tem razão — concordou Miguel,

apanhando a rédea do cavalo de Helen e

prendendo-a no arção de sua sela.

— E o cadáver?

— Vamos jogá-lo no rio. Os peixes e os

abutres darão cabo dele.

Após completar o trabalho, os dois

retornaram à cidade. Foram encontrar seus

patrões bebendo e conversando na cantina.

— Vocês o pegaram? — indagou Scar.

— Sim, trouxemos isso e o cavalo como

prova — falou Pepe, exibindo o cinturão.

— Deixem-me ver isso — pediu Bob.

Scar apanhou-o e o pôs sobre a mesa.

— Reconhecem?

— Sim, são de Scott. Suas armas sempre

foram as mais bonitas da cidade —

confirmou Bob. — Trouxeram o cavalo

também?

— Sim, está lá fora.

— Quero ver isso — comentou Oscar.

— Por quê? — quis saber Bob.

— Scott veio para cá de carroça. Alguém

emprestou-lhe um cavalo para fugir. Quero

saber quem foi.

Oscar foi até a porta. Reconheceu logo o

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cavalo pertencente a Helen. Voltou furioso

para a mesa onde estava seu irmão.

— Helen emprestou o cavalo para ele.

— Maldição! — falou Bob. — Aquela

garota insiste em nos desafiar. Acho que

precisa de uma lição. Que tal irmos lá agora

mesmo resolver essa questão?

— Não acho isso é prudente —

aconselhou o xerife. — Depois que Scar a

chicoteou, Helen não se separa de sua arma.

Se vê-los, vai atirar primeiro e perguntar

depois.

— Ted tem razão, Bob. Não precisamos

nos preocupar com Helen.

— Tem razão. Agora que Scott está

morto, ela não nos incomodará mais.

Mesmo assim, adoraria ir lá e fazê-la ter

mais respeito para conosco — falou Bob,

impaciente.

— Acalme-se, por enquanto. Helen não

nos dará mais trabalho. Agora precisamos

comemorar nosso sucesso. Com a posse do

rancho do Scott, temos quase todo o vale

em nossas mãos — disse Oscar, mandando

vir mais bebidas.

Todos foram convidados a brindar com

eles. Ninguém se recusou. Alguns por

medo, outros por serem da mesma laia.

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Bebiam e conversavam animadamente,

quando, repentinamente, Helen entrou na

cantina, portando uma espingarda.

— O que fizeram com Scott, seus

covardes? — indagou ela, corajosamente.

Todos olharam na direção dela. Aquela

espingarda engatilhada tirava o ímpeto de

qualquer um que quisesse reagir. Scar fez

sinal para seus homens que estavam num

canto do balcão, dando-lhes a entender que

deveriam sair pelos fundos e apanhar Helen

pelas costas.

— Scott está morto — afirmou o xerife.

— Quem o matou? — indagou ela.

— Não vem ao caso. Ele seria justiçado

da mesma forma. Era um ladrão de cavalos

nojento e merecia ser linchado.

— Se disser mais uma vez isso, xerife,

esqueço que tem essa estrela de lata no

peito e o faço engolir duas cargas de

chumbo grosso. Scott era um homem

honesto. Jamais faria isso.

— Agora não adianta mais chorar por ele.

Está morto e pronto. O melhor que você tem

a fazer é acalmar-se. Só está conseguindo

arrumar encrencas para você com isso.

— Pois eu insisto em saber quem matou

Scott, xerife — insistiu ela, empunhando

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firmemente a arma.

Os pistoleiros que haviam saído pelos

fundos estavam na porta agora, mas

hesitavam, evitando atacá-la. Se a

espingarda que ela trazia engatilhada

disparasse, levaria para o inferno todos que

estavam à frente dela.

— Procure se acalmar, Helen. Ficou

provado isso. Eu e meus auxiliares

estivemos no rancho de Scott, onde

achamos mais de cinqüenta cavalos

pertencentes ao Rancho Merryl — afirmou

o xerife.

— Scott não tinha motivos nenhum para

roubar pangarés do Rancho Merryl. Ele

tinha os melhores cavalos de todo o vale.

— Não há argumentos contra as provas

que encontrei lá, Helen. Está cometendo um

erro...

— De qualquer forma, Scott tinha direito

a um julgamento, mesmo que tivéssemos

que mandar buscar um juiz em Phoenix.

Agora, pela última vez, diga-me quem o

matou. Caso contrário, atirei nos Merryl —

ameaçou ela, apontando na direção dos dois

irmãos.

— Fomos nós que matamos esse tal

sujeito — disse Pepe, adiantando-se na

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companhia de Miguel.

— Vocês foram juiz e carrasco de Scott.

Isso me dá o direito de ser a mesma coisa

para vocês dois — disse a garota, virando a

espingarda na direção dos dois, sem lhes dar

a menor chance de reação.

O peito de Pepe se esfacelou. A cabeça

de Miguel simplesmente sumiu. Os dois

corpos desabaram no assoalho encardido da

cantina. Uma enorme mancha de chumbo e

sangue marcou a parede atrás dos

cadáveres.

— Peguem-na agora — gritou Scar.

Os pistoleiros entraram e seguraram a

garota firmemente.

— Foi uma tolice sua, Helen. Está nos

dando motivo para linchá-la agora mesmo

— falou Bob, possesso.

— Esperem, rapazes! — pediu o xerife.

— Sou obrigado a lhes pedir que me

deixem fazer a coisa legalmente. Helen

cometeu um duplo homicídio. Terá um

julgamento justo, depois será enforcada em

praça pública.

— Por mim eu a enforcaria agora mesmo

— falou Scar, lamentando pelos dois

pistoleiros mortos.

— Não, acho que o xerife tem razão —

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opinou Oscar. — Servirá como exemplo a

todos que pensarem em se opor a nós.

— E quando será esse julgamento,

xerife? — quis saber Bob.

— Assim que o juiz itinerante passar por

aqui, em uma ou duas semanas, quem

poderá saber? Até lá, Helen vai ficar na

cadeia.

— Acho que está ótimo. Com isso

acabam todas as nossas preocupações —

falou Bob.

— Pois agora que elas vão começar, seus

covardes — gritou Helen.

— O que quer dizer com isso? —

indagou o xerife.

— Esperem e verão o que vai lhes

acontecer...

— Essa víbora traiçoeira preparou

alguma para nós. O que terá feito? —

indagou Bob ao irmão.

— Vamos arrancar isso dela.

— Não precisarão ter esse trabalho,

covardes. Eu lhes contarei. Quero ver a

preocupação em suas caras e o terror em

seus olhos.

— Fale logo, sua cascavel, ou mandarei

um de meus homens chicoteá-la até a morte

— gritou Oscar, exasperado.

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— Já está com medo, não? Isso é bom.

Ficarão mais apavorados ainda quando

souber que um Delegado Federal, em

Phoenix, vai tomar conhecimento do que

aconteceu aqui.

— E quem vai nos denunciar?

— Eu já fiz isso. Assim que Scott saiu da

cidade, fui ao correio e despachei uma carta

para Phoenix, pedindo ajuda.

— Está mentindo só para nos

impressionar — falou Ted, sem conseguir

esconder coma preocupação com o fato

— Quando passa o cavaleiro do Correio

Expresso? — quis saber Bob.

— Passou hoje, há uns vinte minutos —

informou Helen. — Já está levando a carta.

E vocês não conseguirão jamais pegá-lo.

— Maldição! Eu devia matá-la agora

mesmo — ameaçou Bob.

— Calma, Bob — pediu o xerife. — Não

vamos nos precipitar. Nada fizemos de

ilegal até agora, lembram-se? Helen

também terá um julgamento justo. Seu

enforcamento é inevitável. O que um

Delegado Federal teria a fazer aqui?

— Ted tem razão mais uma vez, Bob.

Não precisamos nos preocupar com nada.

Por mais que falem ou comentem, não há

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provas de que cometemos algum crime.

— Acho que vocês têm razão, mas a

presença de um delegado aqui vai nos

incomodar, de qualquer maneira.

— Não se tomarmos todas as precauções

e agirmos sempre protegidos legalmente

pelo xerife. Agiremos sempre com a lei do

nosso lado.

— Não fiquem tão tranqüilos, covardes!

Tenho um amigo que é delegado federal, a

quem enderecei a carta. Mesmo que eu seja

enforcada, ele vai investigar tudo a fundo e

não descansará enquanto não estiver

satisfeito com tudo.

Oscar sorriu ironicamente.

— Leve-a, Ted. Ela está nos aborrecendo

— pediu Oscar.

O xerife atendeu-o imediatamente.

Enquanto ele levava Helen para a cadeia, os

dois irmãos confidenciavam.

— Não gostei dessa idéia de ter um

federal por aqui.

— Também pensei o mesmo. Detestaria

alguém bisbilhotando nossos negócios. O

que tem em mente, Oscar?

— Doravante vamos manter vigiadas as

entradas da cidade. Destacaremos nossos

pistoleiros para isso. Se precisarmos de

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mais homens, entraremos em contato com

Glenn, que nos mandará mais lá de El Paso.

Vamos interrogar e revistar todo forasteiro

que aparecer por aqui. Se descobrirmos o

federal entre eles, nós o mataremos, antes

que chegue à cidade.

— Certo. Assim, caso eles mandem outro

mais tarde, todos na cidade serão unânimes

em confirmar que o federal jamais esteve

aqui.

— Excelente! Vou pedir ao Scar que

tome conta de tudo.

As ordens foram dadas e os pistoleiros

foram instruídos. Com isso os dois irmãos

esperavam barrar a chegada do delegado

federal amigo de Helen.

Enquanto isso, ela esperaria na cadeia,

torcendo para que ele chegasse antes de sua

condenação à morte.

Sabia que não teria defesa. Os Merryl

tinham muitas testemunhas do que ela fizera

e, possivelmente, muitos de seus pistoleiros

acabariam sentados no banco dos jurados,

facilitando a realização daquela farsa.

Sua única chance de viver era que seu

amigo estivesse em Phoenix, quando a carta

chegasse.

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Algumas semanas depois, num ponto da

estrada, afastado da cidade, dois homens

conversavam. Não pareciam muito

animados com o trabalho que faziam, que

parecia ser muito monótono.

— Gostaria de estar na cidade agora —

falou o pistoleiro encostado numa pedra.

— Sim, deve estar movimentado por lá

— disse o outro, que treinava sua rapidez no

saque.

— Acha mesmo que ela vai ser

enforcada?

— Não tenho a menor dúvida. Você

também estava lá, viu quando ela atirou nos

mexicanos a queima-roupa.

— Bem, se ela não fizesse isso, eles iam

atirar nela.

— E daí? Acha que alguém teria peito de

testemunhar que foi legítima defesa? Isso

deixara os Merryl contrariados, o que seria

muito perigoso, não?

— É, mas vai ser uma pena que ela seja

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enforcada. É uma garota muito bonita.

— É como qualquer outra garota de

saloon... — ia dizendo o pistoleiro, mas

calou-se, aguçando os ouvidos.

— Ouviu alguma coisa, Morris? —

indagou.

— Sim, Pitt. Um cavaleiro vem

chegando.

— Parece bêbado ou muito alegre. Está

cantando, pode ouvir?

— Sim e arranha muito mal o banjo.

Os dois foram para o meio da estrada.

Um cavaleiro, vestindo uma capa de viagem

empoeirada, cavalgava com uma das pernas

cruzadas sobre a sala, apoiando sobre ela

um banjo desafinado.

— Que tipo mais estranho — comentou

Morris.

— Não dá para ver se ele carrega uma

arma, mas não tem cara de delegado federal.

— Será que devemos expulsá-lo daqui?

— Não sei... Parece-me inofensivo.

Vamos pará-lo.

Os dois agitaram os braços diante do

cavalo, que espantou-se, derrubando seu

cavaleiro.

— Que diabos estão fazendo? —

protestou ele, levantando-se e espanando a

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poeira.

— Aonde pensa que vai, forasteiro?

— Acho que tem um povoado aí na

frente, não?

— Sim, o que vai fazer lá?

— Não sei... Talvez procurando

trabalho...

— Se quer um conselho, dê a volta e

tome outro rumo. Nada encontrará lá.

— Mas eu não quero ir para outro lugar.

— Deixe de ser idiota, homem. Faça o

que estamos mandando e não crie caso —

falou Morris, com rispidez.

— De onde está vindo? — indagou Pitt,

achando aquele sujeito muito estranho.

— Venho de longe — respondeu o

homem, olhando-o fixamente.

Era alto e forte. Seu olhar tinha a têmpera

do aço, o que intimidou o pistoleiro.

Como estava acompanhado, manteve-se

firme, mas não muito confiante.

— Monte seu cavalo e dê o fora daqui

agora mesmo. Tem um minuto para fazer

isso — determinou Morris.

— Está bem. Não vamos discutir por

causa disso. Posso apanhar meu banjo?

— Sim, claro — respondeu Morris,

olhando para Pitt e sorrindo de modo

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especial.

Quando o forasteiro se abaixou para

apanhar o banjo, Morris e Pitt sacaram suas

armas ao mesmo tempo e dispararam

diversas balas sobre o instrumento,

estraçalhando-o.

— Não deviam ter feito isso — falou o

forasteiro, endireitando o corpo.

— Por que, não gostou? — zombou Pitt.

— Realmente não — respondeu o

forasteiro, desabotoando a capa e jogando-a

para trás.

Os dois pistoleiros viram, então, um Colt

reluzente num coldre tipo Slim Jack,

próprio para saque rápido.

Sem qualquer aviso, o desconhecido

sacou sua arma com incrível rapidez.

O sorriso e os dentes de Pitt afundaram-

se para dentro de sua boca, levados por uma

bala certeira.

Morris, mesmo com a arma na mão, não

teve tempo de puxar o gatilho. Uma bala

ensangüentou-lhe o rosto, jogando-o de

costas na poeira da estrada.

— Não deviam ter feito aquilo com meu

banjo — disse o forasteiro, olhando os dois

corpos estrebuchando.

Implacavelmente ele disparou mais duas

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vezes, pondo fim à agonia dos dois feridos.

— Não suporto ver um animal sofrer —

disse ele, indo recolher o que sobrara de seu

banjo. — Vai ser impossível consertá-lo,

velho amigo. Adeus! — acrescentou,

atirando-o longe.

Depois montou seu cavalo e foi na

direção do povoado. Ao chegar lá,

estranhou toda aquela movimentação.

Como havia cavalgado durante muito

tempo, resolveu molhar a garganta e obter

as respostas que desejava no saloon.

Assim que ele entrou, Judy olhou-o com

surpresa. Havia muito tempo um forasteiro

não entrava na cidade.

— O que deseja? — indagou ela,

encostando-se ao lado dele, no balcão.

O saloon estava vazio naquela hora.

— Primeiro uma cerveja, depois um

banho quente — respondeu ele, sorrindo em

resposta.

— Acabou de chegar, não?

— Sim, ainda estou com a garganta cheia

de poeira.

— Estou admirada que tenha conseguido

isso. Normalmente os homens dos Merryl

não permitem a passagem de forasteiros.

— Bem que tentaram... Dois tipos me

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pararam, quando eu vinha chegando.

— E como conseguiu convencê-los a

deixá-lo passar?

— Matei-os.

Judy olhou-o com surpresa e respeito.

— Você matou dois homens dos Merryl?

— Sim — afirmou ele, interrompendo a

conversa para tomar metade do copo de

cerveja de uma só vez. — Desculpe-me, é

que eu estava mesmo com muita sede.

— Posso compreender isso. Parece que

veio de longe, não?

— Sim, de muito longe. Por que toda

aquela movimentação lá fora?

— Estão todos ansiosos pelo julgamento.

— Que julgamento?

— Um dos atos mais covardes de toda a

história daqui.

— Diga logo. Está me deixando curioso.

— Vão julgar Helen Fulton, a dona deste

saloon, por matar dois pistoleiros nojentos.

O forasteiro olhou Judy com assombro.

— Vão julgar Helen? Por que ela fez

isso?

— Ficou furiosa porque eles mataram um

amigo dela. E com certeza ela será

enforcada. As testemunhas todas trabalham

para os Merryl. Os que não pertencem ao

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rancho deles são covardes demais para dizer

a verdade.

— Devo presumir que Helen é inocente...

— Não tenha dúvidas quanto a isso.

Apenas usou a lei das armas e vingou seu

amigo. Mas você fala como se a

conhecesse...

— Claro que a conheço! Aliás, estou aqui

por causa dela.

— Como é seu nome? — indagou ela.

— David Garret.

— Sou Judy. Helen falou muito em você

— disse a garota, aliviada com a chegada

dele a tempo de salvar Helen. — Venha,

não devemos ficar conversando aqui. Logo

começarão a chegar os fregueses. Eu vou

preparar um banho quente para você.

Conversaremos, então.

No Rancho Merryl, os dois irmãos

demonstravam sua satisfação com o

andamento de seus planos.

— O enforcamento de Helen será uma

demonstração de nossa força — disse

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Oscar.

— Sim, nunca mais nos incomodará.

— E aquela história do delegado federal,

será que ela fez realmente aquilo?

— Acho que ela blefou. De qualquer

modo, os homens que estão mantendo

vigília saberão o que fazer, se ele aparecer.

E depois, um delegado federal apenas não

poderá conosco. Temos muitos homens.

Com os novos que chegaram de El Paso,

temos um verdadeiro exército trabalhando

para nós.

— O que tem nos custado um bom

dinheiro.

— Isso é o de menos. Em breve todo o

vale será nosso. Com o contrato do

Exército, teremos um lucro fantástico.

— Você me fez lembrar de algo. Curley

Ross tem uma partida de cavalos muito boa,

ainda sem marcas em seus pastos.

— Mande Scar cuidar disso. Já esgotei

minha paciência.

— Vou mandá-lo cuidar disso. O dia é

propício. Com o julgamento de Helen, todo

mundo está indo para a cidade. Os ranchos

ficarão vazios.

— Bem lembrado, irmão. Vou cuidar

disso agora mesmo,

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Algum tempo depois, Scar ia ter com

eles.

— Curley Ross tem uma partida muito

boa de cavalos. Vá lá e compre os cavalos

dele. Pague dois dólares por cabeça. Traga

os animais para cá e mande pôr a nossa

marca.

— E se ele não quiser vender?

— Convença-o.

— Entendi — disse o pistoleiro, sorrindo

cinicamente.

Assim que saiu, Scar reuniu alguns

pistoleiros e diversos vaqueiros, tomando

rumo do rancho de Curley Ross.

Quando chegaram lá, Curley e sua esposa

estavam saindo para ir à cidade, assistir ao

julgamento de Helen.

— Olá, rapazes! — cumprimentou ele,

demonstrando logo sua insatisfação com a

presença deles ali.

— Como vai, Sr. Ross? — cumprimentou

Scar, de olho na jovem esposa do rancheiro.

Este percebeu os olhares descarados do

pistoleiro, mas nada podia fazer. Ficou

apenas na defensiva, diante daquele bando.

— O que desejam? — indagou.

— Soubemos que tem um lote de bons

cavalos.

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— Sim, mas não estão à venda.

— Vocês ouviram isso, rapazes? Ele cria

cavalos para guardá-los — disse o pistoleiro

e seus homens riram com ele.

— O que foi? Eu disse alguma piada? —

indagou o rancheiro.

— Sim, uma boa piada, idiota.

— Modere a língua pistoleiro —

ameaçou Curley.

— Pensando bem, não viemos aqui

comprar seus cavalos...

— Então caiam fora de meu rancho!

— Viemos roubar seus cavalos —

zombou Scar.

— Roubar? Você é muito descarado

mesmo...

Alguns vaqueiros do rancho, quando

perceberam o que estava havendo, trataram

de agrupar-se, esperando encrenca.

— Seus cavalos são bons e estão sem

marcas. Nada poderá provar, depois que

eles forem marcados...

— Aqueles seus patrões são duas

cobras...

— Modere a língua quando falar deles —

rugiu Scar.

— Não me assusta, pistoleiro. Dou-lhes

um minuto para sumirem da minha frente

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— falou Curley, levando a mão à arma.

Seu movimento foi lento demais. Scar

sacou sua arma com rapidez e meteu duas

balas no peito do rancheiro, que desabou de

cima da carroça.

Ao verem o patrão cair morto, os

vaqueiros do rancho levaram as mãos às

coronhas de suas armas.

Os homens que acompanhavam Scar

eram especialistas nesse tipo de coisa.

Estavam prontos para a ação e o inferno

abateu-se sobre os pobres vaqueiros. Foram

literalmente fuzilados.

Quando a fuzilaria terminou, estavam

todos mortos ou estrebuchando, numa

mesma poça de sangue.

Com o tiroteio, o cavalo da carroça onde

ainda estava a esposa de Curley disparou.

— Vou atrás dela — falou Mike, um dos

pistoleiros.

— Deixe-a ir. Vamos levar os cavalos.

— De ela for à cidade, vai nos denunciar

ao xerife.

— Ele saberá como agir. Afinal, é pago

para isso.

— Mesmo assim, gostaria de ir. Ela é

uma mulher muito bonita — insistiu o

pistoleiro.

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— Entendi, seu safado! Pode ir. Depois

você me conta como foi.

O pistoleiro esporeou seu cavalo e saiu

em perseguição à carroça. Rose, a

condutora, conseguira controlar o animal,

mas chicoteou-o ao ver-se perseguida.

O pistoleiro, no entanto, era um excelente

cavaleiro e em poucos instantes seu animal

já corria paralelo à carroça.

— Vamos lá, beleza. Pare essa carroça. O

velho Mike só deseja falar com você um

pouquinho...

— Afaste-se de mim, seu animal! —

gritou ela, tentando acertá-lo com o chicote.

Ao receber uma chicotada no braço, Mike

ficou ainda mais excitado e decidido.

Apoiou-se apenas num dos estribos e saltou

para o cavalo que puxava a carroça.

O perigo divertia-o. A recompensa era

uma bela mulher e nada mais importava

para ele. Segurou as rédeas com firmeza,

puxando-as com força e parando o animal.

Rose, desesperada, viu o rifle de seu

marido no fundo da boléia. apanhou-o e

engatilhou-o, apontando-o para o pistoleiro,

que saltou do cavalo, olhando-a.

— Calma, beleza! Não vou machucá-la.

Só quero conversar com você — disse ele.

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— Fique aí mesmo ou vou matá-lo...

— Fique calma... Você não vai ter

coragem de atirar em mim, vai? — disse

ele, caminhando lentamente na direção dela.

Ao sentir a aproximação dele, Rose não

hesitou em apertar o gatilho. Mike rodopiou

e caiu na poeira, ferido mortalmente na

barriga.

Tentou sacar sua arma ainda, mas Rose

não lhe deu chance. Pensou no que haviam

feito com seu marido e apertou novamente o

gatilho. O corpo do pistoleiro ficou imóvel

numa poça de sangue. Ela retomou as

rédeas do cavalo e chicoteou-o na direção

do povoado.

Naquele momento, na cidade, David

Garret acabava de tomar um banho e de

ouvir o relato de Judy.

— Como vê, são uma praga que precisa

ser exterminada deste vale para que possa

haver justiça e paz.

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— Mas se é como você disse, as coisas

são difíceis de resolver. Se o xerife lhes dá

cobertura, fica difícil encontrar uma brecha

para pegá-los.

— Bem, essa é toda a história —

finalizou ela.

— Vou precisar apresentar provas aos

meus superiores. Se alguém tiver coragem

de desafiar os Merryl e apresentar uma

queixa, tudo ficaria mais fácil.

— Então desista. Todos são uns covardes

e temem os Merryl.

— Quantos homens você calcula que

trabalham para ele?

— Uns cinqüenta pistoleiros, além de

todos os vaqueiros.

— É muita gente para um homem só

enfrentar, mas em breve receberei ajuda.

— Verdade? Então virá um contingente...

David riu, enquanto afivelava seu

cinturão.

— Não, mais um homem, apenas.

— E o que apenas dois de vocês poderão

fazer?

— Confie em nós.

— Tenho de confiar, pois Helen pode ser

enforcada. Não há como você impedir isso,

sendo um delegado federal?

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— Não porque o julgamento tem ares de

legal. Se ao menos encontrássemos alguém

para depor a favor dela, confirmando a

legítima defesa.

— De nada adiantaria. O júri não vai

hesitar em mandá-la para a forca só para

agradar os Merryl.

— Posso assumir a custódia dela após o

julgamento ou, então, tentar transferir o

julgamento para um condado neutro.

— Acha que isso daria certo?

— É o que posso tentar fazer. Para que

horas está marcado o julgamento?

— Para as três da tarde. O que pretende

fazer?

— Vou dar uma olhada por aí...

— Fique alerta! Os pistoleiros dos Merryl

não apreciam forasteiros.

— Eu já não aprecio os pistoleiros dos

Merryl. Assim, estamos quites — afirmou

ele, deixando o quarto.

Judy olhou com admiração aquele

homem decidido e corajoso. David desceu

para o saloon, que começava a encher-se

àquela hora. Todos falavam no julgamento.

Ele foi até a porta. Uma carroça estranha,

fechada, com letreiros coloridos passava

diante do saloon naquele momento.

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David desceu até a rua. O condutor da

carroça, um homem de longas barbas e

bigode olhou para ele e sorriu. O delegado

federal acenou com a cabeça, retribuindo o

cumprimento.

De repente, uma carroça surgiu em

disparada, entrando pela rua principal do

povoado. Uma mulher, na boléia, gritava

por socorro.

A carroça parou diante do xerifado, numa

nuvem de poeira. O xerife, alertado pela

confusão, surgiu à porta.

— Que diabos está acontecendo aqui Sra.

Ross? — indagou.

— Eles mataram meu marido — falou

ela, desesperada.

O xerife percebeu logo do que se tratava.

Levou a mulher para dentro e dispersou os

curiosos. David assistiu a tudo aquilo com

especial interesse.

— Quem é aquela mulher? — indagou

ele a Judy, que também deixara o saloon na

hora da confusão.

— É a esposa de Curley Ross, um criador

de cavalos..

— Ela disse que o marido foi morto...

— O que vem comprovar tudo que eu lhe

disse. Pode ter certeza que foi obra dos

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Merryl. Ted a levará na conversa e darão

sumiço nela. Na falta de herdeiros, os

Merryl tomarão posse do rancho,

acobertados pelo xerife.

— Que patifaria! — falou David,

indignado, verificando se sua arma saía fácil

do coldre. — Acho que vou tentar agora

mesmo conseguir uma prova para

apresentar aos meus superiores.

— Vai se meter em encrencas...

— Isso é o de menos — falou ele,

atravessando a rua.

A carroça colorida estava parada não

muito longe do xerifado e o condutor

apregoava as virtudes milagrosas do único e

verdadeiro Elixir Mágico.

David entrou decididamente.

— Estou ocupado, volte depois — disse o

xerife, levantando a cabeça para olhá-lo.

— Vai interrogar aquela mulher que

trouxe para dentro? — indagou David, com

autoridade.

— Sim, mas isso não é da sua conta,

estranho.

— Eu lhe digo o contrário, xerife. Quero

assistir o depoimento dela.

Alguns pistoleiros dos Merryl que

estavam aglomerados por ali, haviam se

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aproximado da porta e olhavam para dentro

com curiosidade.

Ao vê-los, Ted Quincy ficou mais

confiante.

— Não sei quem é, mas posso prendê-lo

por desacato...

— Você não tem autoridade para isso,

xerife.

— Não vamos discutir isso agora. Há

homens atrás de você que não hesitarão em

matá-lo se eu ordenar.

— Ordene então, xerife. Posso matá-lo

antes que qualquer um deles saque sua arma

— disse David, sacando seu Colt com uma

rapidez espantosa. — Está praticando um

tipo estranho de justiça aqui nesta cidade,

xerife. Não gosto nem um pouco disso —

afirmou David, mostrando sua credencial de

delegado federal.

O xerife empalideceu, suando frio. Os

pistoleiros atrás de David hesitaram,

dispersando-se rapidamente.

— Onde está a mulher que trouxe para

cá? Quero falar com ela.

— Está lá nos fundos, numa das celas...

— E por que a trancou?

— Ela estava muito nervosa... Deixei-a lá

para se acalmar...

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— É um mentiroso e covarde, xerife. Vai

lamentar isso quando eu terminar com você.

Agora abra logo aquela porta — ordenou,

rispidamente.

Sem outra alternativa, Ted abriu a porta

que levava ao corredor das celas.

— Fique aqui fora! Eu o chamarei se

precisar. E não tente nenhum truque. Sei de

suas trapaças e não vou tolerá-las. Se você

se meter a engraçadinho comigo, vou lhe

dar o mesmo destino que dei aos pistoleiros

que vigiavam a entrada da cidade.

— Está bem... Está bem... — gaguejou

Ted, limpando o suor frio que lhe escorria

pela testa.

Assim que David entrou pela porta, Ted

correu para fora à procura dos homens dos

Merryl.

— Que diabos está havendo lá dentro,

xerife? — indagou um pistoleiro chamado

Joe Bigfeet.

— Seus amigos incompetentes deixaram

passar um delegado federal...

— Maldição! Como ele conseguiu isso?

— Não importa como. A questão é que

ele está aqui, disposto a arrumar encrenca. E

os Merryl não vão gostar nada disso. Vamos

dar um jeito na situação agora mesmo.

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Quero um homem naquele telhado. Um em

cada lado do xerifado, para quando ele sair

e o restante nos becos em frente da cadeia.

Quando ele sair, quero uma chuva de balas

naquele bastardo arrogante — disse o

xerife, com ódio.

— Deixe conosco, xerife. Ele nem saberá

o que o acertou — prometeu Joe.

— Assim espero, para o nosso bem —

afirmou o xerife.

O delegado federal passou pela primeira

cela e julgou reconhecer a mulher estendida

no catre. Abriu a grade e entrou. Ela estava

deitada de bruços e pela abertura de seu

vestido, nas costas, percebia-se que sua pele

estava infeccionada. Segurou-a gentilmente

pelos ombros. Ela voltou a cabeça,

reconhecendo-o.

— David Garret? Graças a Deus! É você

mesmo? — indagou ela, surpresa,

levantando-se com dificuldade para abraçá-

lo.

— Helen, por Deus, o que fizeram com

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você?

— Oh, David, que bom que tenha vindo

— soluçou ela.

— Está tudo bem agora, querida. Vou

tirá-la disso aqui. Mas o que houve com

suas costas?

— Fui chicoteada por uns capangas dos

Merryl. Fiquei sem cuidados aqui e as

feridas infeccionaram.

— Malditos Merryl! Quanto mais ouço

falar neles, mais os odeio — rugiu o

delegado.

— Como conseguiu entrar? — indagou

ela.

— Tive de esfregar minha credencial de

delegado no focinho dele..

— Fez mal. Agora você será caçado

impiedosamente.

— Estou pronto para eles...

— Os Merryl têm muitos cães para

farejarem e morderem por eles, David.

— Não se preocupe. Haveremos de sair

desta, como saímos daquela em Dodge City.

— Oh, sim. Você foi fantástico naquela

ocasião, mas agora as coisas mudaram um

pouco. Os Merryl são cachorros loucos,

nada os detém. São ambiciosos e

sangüinários.

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— Discutiremos isso mais tarde. Antes

precisamos fazer um curativo em suas

costas, antes que piore.

— Isso vai cicatrizar. Minhas costas não

serão mais aquela beleza de antes, mas

ficarei satisfeita se conseguir permanecer

viva...

— Deixe-me ver esses ferimentos —

pediu ele.

Helen voltou-lhes as costas e abaixou o

vestido até a cintura.

— Se você for medicada, nem ficarão

cicatrizes — afirmou ele. — Providenciarei

isso imediatamente. Por que o xerife não fez

isso antes?

— Ele disse que seria trabalho perdido, já

que eu seria enforcada mesmo...

— Estranha justiça essa.

— Na verdade, o xerife é um lacaio

covarde dos Merryl, ninguém duvida disso.

— Cuidarei desse bastardo quando

chegar a hora. Fique tranqüila agora, vou

encontrar uma forma de tirá-la daqui...

A mulher que estava presa na outra cela

ouvia a conversa dos dois com muita

atenção.

— Você é mesmo um delegado federal?

— indagou Rose.

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— Sim — confirmou ele.

— Então Deus ouviu as minhas preces —

desabafou a mulher.

David reconheceu-a. Era a mulher que o

xerife recolhera lá fora.

— Xerife! — chamou ele, possesso, pois

percebera que a cela estava trancada.

O homem da lei apresentou-se

rapidamente.

— Esta cela está trancada — disse David,

procurando a chave entre aquelas que tinha

na mão.

— Bem, é que...

— Pelo que sei, esta mulher é uma vítima

e uma testemunha, não uma prisioneira —

vociferou o delegado.

— Eu sinto muito, acho que foi um

descuido meu — disse, humilhado.

— Você não me convence, Quincy. Cada

vez gosto menos de você e mais da idéia de

meter-lhe uma bala nos miolos podres.

Humilhado, Ted Quincy retirou-se,

remoendo vingança.

— Muito bem, senhora! Conte-me o que

houve — pediu ele, após abrir a cela.

— Os capangas dos Merryl foram até o

rancho e exigiram comprar um lote de

cavalos que meu marido criava... Curley

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não concordou e eles o abateram a tiros... —

soluçou ela.

Helen amparou-a. Com dificuldade ela

contou o que acontecera depois.

— Com toda certeza fizeram isso para

tomar posse do rancho, David. É a forma

como eles agem. Simplesmente se apossam

do que querem, não importa de quem seja.

David havia escutado tudo com muita

atenção. Os músculos de seu corpo estavam

contraídos, de tanta fúria.

— E isso aconteceu justo no momento

em que Curley havia se decidido a vir no

julgamento, Helen.

— Por que ele queria tanto vir? — quis

saber a garota.

— Curley sabia que iria arriscar a vida e

eu o apoiei, quando soube de sua decisão.

Ele sempre foi um homem e princípios...

— Ainda não entendi onde quer chegar,

Sra. Ross — observou David.

A mulher olhou para Helen, sorrindo com

simpatia.

— Curley achava que podia e devia

salvar a vida de Helen.

— Como? — surpreendeu-se a garota.

— Ele estava na cantina, quando tudo

aconteceu...

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— Continue — pediu David, interessado,

já que aquele depoimento poderia trazer

alguma mudança na situação de Helen.

— Bem, naquele dia ele chegou em casa

nervoso e irritado com o que acontecera na

cantina. Contou que Helen havia agido em

legítima defesa, mas que todos lá ficaram

intimidados porque os dois mortos eram

homens dos Merryl.

— Confirma isso, Helen?

— Sim, David, mas em que isso me

ajuda?

— Sra. Ross, concorda em depor no

julgamento de Helen?

— Sim, claro. Farei qualquer coisa para

dar uma lição nesses covardes que mataram

meu marido.

— E apresentará uma queixa pelo roubo

dos cavalos e pela morte de seu marido?

— Quando quiser, delegado.

— Ótimo! Acho, então, que tenho o que

preciso para pegar os Merryl. Assassinato e

roubo de cavalo são punidos com a morte

neste território.

— Vai precisar de muita cautela e

perspicácia, David. Quando eles souberem

que Rose vai depor, ela se transformará em

alvo para as balas dos pistoleiros.

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— Tem razão. Preciso pensar em algo —

disse ele, caminhando de um lado para

outro.

— David, antes de entrar nisso, por que

não procura alguma ajuda? — sugeriu

Helen.

— Já tenho toda a ajuda de que preciso,

Helen.

— Se ao menos Scott estivesse vivo...

Você poderia contar com ele.

— Não se preocupe com o Scott, ele está

vivo. Por que achou que ele estava morto?

— Mas... Eu vi o cinturão dele com os

mexicanos... Por isso matei aqueles dois...

— Depois você me conta isso tudo.

Agora acho que sei como agir com a Sra.

Ross. Tem para onde ir e ficar em

segurança?

— Sim, posso ir para a casa de minha

amiga, Penny De Morney.

— Sabe onde fica, Helen, para o caso de

precisarmos localizar a Sra. Ross?

— Sei, mas é muito longe, caso ela vá

comparecer no meu julgamento. O melhor é

ir até o saloon. Poderá entrar pelos fundos e

mandar chamar Judy, ela a esconderá.

— Volte para a cela, Helen. Acharei um

jeito de tirá-la.

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O delegado, então, levou a Sra. Ross até a

sala do xerife.

— Xerife, solte esta mulher. Ela diz que

nada viu e que nada sabe. Uns

desconhecidos estiveram no rancho e

mataram o marido dela. Acho que deveria ir

investigar isso...

— Sim, eu o farei. Vou mandar meu

ajudante para lá.

Após a saída de Rose Ross, David foi se

sentar na cadeira do xerife. Preencheu um

papel, depois entregou-o ao homem da lei.

— O que é isto? — surpreendeu-se ele.

— Um mandato para prender os Merryl,

xerife.

— Como! — exclamou ele,

empalidecendo.

— Por que a surpresa, xerife? Tem medo

de fazer isso? Vai acobertá-los de novo?

Isso o tornará cúmplice deles.

— É um absurdo o que está dizendo,

delegado!

— Se é assim, então vá prendê-los.

— Está cometendo um erro delegado...

— Eu me responsabilizarei pelas

conseqüências...

— Não posso me ausentar da cidade.

Haverá um julgamento logo mais...

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— Talvez não tenhamos um julgamento.

— Como assim?

— Não tenho de lhe dar satisfações,

xerife. O juiz já chegou?

— Sim, está no hotel...

— Então irei falar com ele. Vou

conseguir um adiamento para o julgamento

de Helen.

— Não sabe o que está dizendo... Está

comprando muito mais encrenca do que

pode imaginar.

— Você ainda não viu nada, xerife.

Agora saia daqui e vá fazer seu trabalho

antes que eu lhe meta uma bala na cabeça

— ameaçou David.

O xerife olhou-o cheio de ódio. Depois

apanhou seu chapéu e saiu furioso. Havia

sido humilhado como nunca fora antes em

sua vida. Ao sair, fez um sinal para os

homens que estavam de emboscada. Estes

logo compreenderam que o delegado sairia

logo e prepararam-se, engatilhando suas

armas.

David avisou Helen que retornaria em

breve, depois deixou o xerifado. Quando

pôs os pés fora da cadeia, alguém gritou.

— Cuidado, David!

Um disparo seguiu-se ao grito. O homem

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que estava no telhado despencou para a rua,

levantando uma nuvem de poeira ao redor

de seu corpo sem vida.

David sacou sua arma e ficou atento. Os

outros emboscadores, tomados de surpresa,

resolveram desistir da armadilha e se

afastarem dali o mais depressa possível.

— Essa foi por pouco, obrigado! — falou

David, aproximando-se do homem que

estava na carroça do Elixir Mágico.

— Vi toda a movimentação deles. O

xerife estava de acordo com eles.

— Aquele patife! Eu devia tê-lo matado,

mas preciso dele para os meus planos de

apanhar os Merryl. Ele será uma boa

testemunha, quando tiver que salvar sua

maldita carcaça.

— Como vê, a situação aqui está feia,

não?

— Sim, mas folgo em vê-lo de novo.

Como conseguiu passar pelos guardas?

— Foi simples: quando cheguei, os

guardas estavam mortos. Achei que você

tinha chegado antes de mim. E Helen, você

a viu?

— Sim, ela está bem. Não se preocupe,

eu vou tirá-la de lá.

— Quando? — indagou o outro, aflito.

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— Em breve, fique tranqüilo.

Um garoto estava por ali. David lhe deu

uma moeda para que fosse chamar o doutor

e mandá-lo cuidar de Helen, na cadeia.

— Mande-o receber a conta comigo

depois — avisou.

— Como está ela? O que houve? — quis

saber seu interlocutor, o condutor da carroça

e vendedor de elixir que não era outro senão

o próprio Scott Nelson disfarçado.

— Calma, ela está bem, já lhe disse. Foi

chicoteada, mas não é nada sério. O médico

cuidará dela.

— Aqueles covardes malditos! Quero

matá-los com minhas próprias mãos —

rugiu Scott.

— Acalme-se, você terá sua chance.

Vamos até o saloon conversar. Precisamos

traçar um plano de ação.

Foram, então, para o saloon. Judy

esperava ansiosa pela chegada de David.

— Ela está bem? — indagou ele,

referindo-se a Rose.

— Sim, vai ficar bem, não se preocupe. E

Helen?

— Não se preocupe com ela, está ótima.

Já conhece meu amigo aqui?

— É a ajuda que você esperava?

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— Sim, ele mesmo.

— Fico encantada e aliviada em conhecer

um amigo de David — falou a garota.

— Deixe de frescuras, Judy — falou

Scott, confundindo-a.

— Você me conhece? — estranhou ela,

olhando-o.

— Sim e você também me conhece...

— Acho que está enganado. Eu não

esqueceria um... Espere um pouco! Santo

Deus! É você mesmo?

— Sim, eu mesmo, mas não fale meu

nome, Judy.

— Helen sabe que você está vivo? Ela

sofreu muito quando descobriu que você

estava morto...

— Eu? Morto? Que tolice? De onde

tiraram essa idéia?

Judy contou-lhe a respeito do cinturão

que os dois mexicanos tinham trazido,

supondo que fosse o dele.

— Aliás, foi isso que deu motivo a Helen

para matar os dois.

— Ela fez isso por mim?

— Sim, ficou realmente furiosa quando

concluiu que eles o tinham matado.

Scott sorriu, pensando nela.

— É uma mulher fantástica! Logo

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poderei manifestar minha gratidão,

apertando-a em meus braços.

— Agora chega de conversas — disse

David. — Mandei o xerife prender os

Merryl. Duvido que ele faça isso.

— Só que isso vai ser o estopim que

explodirá o barril de pólvora desta cidade

— falou Judy.

— E quanto a Helen? — quis saber Scott.

— Vou cuidar disso agora mesmo.

Falarei com o juiz e conseguirei um

adiamento.

— Vai ser decisivo isso, David.

— Sabendo o que sei agora e com uma

boa testemunha para incriminar os Merryl,

como no caso da Sra. Ross, tudo será mais

fácil — disse David, contando-lhes sobre a

conversa que tivera com Rose.

— Pobre mulher! Está inconsolável com

a morte do marido.

David saiu logo em seguida e foi até o

hotel, onde falou com o Juiz Brenson. O

velho homem estava cansado e dolorido da

viagem, aceitando de bom grado a idéia de

um adiamento.

David voltou ao saloon e comunicou o

fato a Scott e Judy, que ficaram satisfeitos

com isso, pois agora haveria tempo para

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livrar Helen das acusações.

Não muito longe do povoado, os

pistoleiros que haviam tentado emboscar

David agruparam-se.

— Maldição! Alguém viu quem deu

aquele primeiro tiro? — indagou o que os

liderava.

— Não, mas me parece que veio das

direção daquela carroça colorida.

Naquele momento, dois cavaleiros se

aproximavam a galope.

— É o Budd e o Thompson. O que será

que houve?

— O que houve, rapazes? — indagou

alguém aos homens que chegavam.

— Fomos substituir Pitt e Morris.

Encontramos os dois mortos. O que está

havendo na cidade? Chegou alguém novo

por lá?

— Sim, um delegado federal e um

vendedor de elixir mágico.

— Diabos, isso não podia ter acontecido.

Temos que ir até lá e resolver isso ou Scar

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vai arrancar nosso couro.

— Se eu fosse vocês, pensaria duas

vezes. Tentamos matar o delegado federal e

nos demos mal..

— Pior vão ficar se voltarem ao rancho.

Acho que devemos ir até a cidade e matar

esses dois, levando suas cabeças numa

bandeja para nossos patrões.

— Acho que eles estão certos — falou

MacBrown, que liderava o grupo que saíra

corrido do povoado. — Se voltarmos dessa

forma, vamos ser mortos por Scar.

— Acha que nós poderemos dar conta

daquele delegado e do vendedor de elixir?

— Se usarmos a cabeça, acho que sim —

afirmou MacBrown. — Vamos localizá-los

e cercá-los.

— Talvez recebamos alguma recompensa

por isso — lembrou alguém. Nossos patrões

sempre se mostraram muito generosos.

— Sim, vamos lá, pessoal! — estimulou-

os MacBrown

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Os dois homens conversavam no saloon,

alheios ao perigo que se aproximava.

— Com quem ficaram minhas armas,

Judy? — indagou Scott.

— Acho que as vi com Bob Merryl.

— Aquele bastardo! Sempre desejou tê-

las para si. Não merece usá-las. Vou

recuperá-las na primeira oportunidade.

Naquele momento, um grupo de seis

homens entrou no saloon. Judy percebeu

logo de quem se tratava.

— Cuidados, rapazes! Ali estão seis

capangas dos Merryl.

— Reconheço quatro deles — falou

Scott. — Estavam falando com o xerife

antes da emboscada contra você, lá na

cadeia.

— Se procuram encrenca, vão encontrá-

la — afirmou David.

— Atenção! Estão se espalhando.

— Judy, afaste-se — ordenou David.

A garota imediatamente buscou a

proteção ao lado da escada para o

pavimento superior, observando o

desenrolar dos acontecimentos. Os seis

pistoleiros estavam espalhados atrás dos

dois homens. Scott e David podiam vê-los

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pelo espelho à frente deles.

— Não resta a menor dúvida que vieram

atrás de nós, David.

— Acham que podem se sair melhor,

espalhando-se assim.

— Vamos encará-los — decidiu Scott.

Os dois se voltaram e olharam

alternadamente para os pistoleiros. Os

freqüentadores do saloon perceberam

alguma coisa errada e trataram de sair da

linha de tiro.

— Vocês dois, forasteiros, como

passaram pela vigilância na estrada? —

indagou Budd.

— Eles estavam dormindo, quando passei

— falou David.

— Tem razão, havia dois homens

dormindo lá na estrada... — ironizou Scott.

— Deixem de piadinhas vocês dois.

Nossos amigos foram mortos e algo nos diz

que foram vocês.

— E se eu disser que você está certo, o

que fará? — indagou David, intimidando-

os.

Os pistoleiros remexeram-se, as mãos

próximas das coronhas dos Colts.

— Seremos obrigados a matá-los —

afirmou Budd.

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— Por que não tentam fazer isso?

A decisão e a frieza nos olhos de David e

Scott intimidavam os pistoleiros.

— Vamos lá, Budd. Já falamos demais

com eles — disse MacBrown.

— Tem razão. Se eles querem assim... —

falou Budd, levando a mão à arma.

Os outros pistoleiros imitaram-no. David

e Scott, no entanto, já empunhavam seus

revólveres, disparando com rapidez e

pontaria. Não deram a menor chance aos

pistoleiros, baleando-os e espalhando

cadáveres pelo saloon.

Quando a fumaça dissipou-se, todos eles

estrebuchavam em poças de sangue.

— Tiveram o que mereciam — falou

David/

Diante do espanto dos presentes, Judy

apressou-se em dizer a todos quem era

David.

Quando souberam da presença de um

delegado federal, rápido no gatilho,

corajoso e decidido, os habitantes do

povoado manifestaram sua solidariedade.

— Quando penso que enforcariam Helen

só para agradar os Merryl, tenho vontade de

enforcá-los também — esbravejou o

delegado federal.

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— Mas o que podíamos fazer? Não

sabemos usar as armas. Não há lei na

cidade. Eles têm os pistoleiros para nos

intimidar — defendeu-se um dos cidadãos.

— Não negue que vocês acharam muito

mais cômodo e seguro ficarem à sombra dos

Merryl do que enfrentá-los. Uma mulher foi

mais corajosa que todos vocês juntos e seria

enforcada por isso. Demonstraram covardia,

esta é a verdade.

— Espere aí, delegado, isso não lhe dá o

direito de... — ia dizendo um vaqueiro, mas

calou-se quando uma bala assobiou próximo

ao seu ouvido.

— Cale-se, covarde! Acho que não

entendeu ainda qual é o papel de um

delegado federal. Eu tenho a lei em minhas

mãos e, em momentos de emergência, sou o

juiz, o júri e o carrasco. E eu decido quando

é esse momento. Não gosto de covardes,

muito menos covardes que não assumem o

que são. Para que o Arizona seja um grande

Estado e não um território sem lei, é preciso

que esse tipo de coisa seja abominada pelos

cidadãos honestos.

Os homens calaram-se, envergonhados.

David ainda disse-lhes mais algumas

verdades, deixando-os arrasados.

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— Vou lhes dar, agora, a chance de

provarem que não são covardes. Tenho

certeza que os Merryl e seus pistoleiros

estão vindo para cá agora mesmo. Quem

ficará do nosso lado? — indagou.

Todos se entreolharam surpresos e

assustados.

— Tenho mulher e filho... — disse um.

— Preciso voltar ao meu rancho... —

falou outro.

Todos tinham uma boa desculpa para dar

o fora.

— Seus covardes! — falou David. —

Caiam fora daqui senão eu estouro suas

cabeças vazias a bala — rugiu ele em

seguida, assustando a todos, que saíram

apressadamente.

— Foi muito duro com eles, David —

falou Judy.

— Tentei sacudi-los um pouco, mas isso

de nada adiantou. Ainda morrem de medo

dos Merryl.

— O que vamos fazer agora, David? —

indagou Scott.

— Conhece toda a região, não?

— Sim, como a palma de minha mão.

— Então vamos fazer uma visita ao

rancho do finado Curley Ross. Sua esposa

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quer o corpo para sepultá-lo dignamente.

— Aquilo deve estar infestado de homens

dos Merryl.

— Eu se, mas iremos à noite.

— Certo, se é para atazanar a vida dos

Merryl, eu topo qualquer coisa.

Ted Quincy, escorraçado pelo delegado

federal, chegou ao rancho dos Merryl como

se tivesse o diabo em seus calcanhares.

Estava trêmulo de indignação e medo, pois

não sabia também como explicar aos dois

irmãos o mandato que David dera-lhe para

prendê-los.

— O que houve, Ted, parece que viu o

diabo? — observou Bob.

— É mais ou menos isso — disse o

xerife, desmontando.

— Algum problema?

— Sim, um maldito problema sério —

afirmou.

Bob levou-o para dentro. Nunca o tinha

visto tão nervoso e assustado. Ofereceu-lhe

um uísque, que Ted tomou com mãos

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trêmulas.

— Nunca o vi assim, Ted. O que houve?

— quis saber Bob.

— Sabem quem está na cidade? Um

maldito delegado federal.

Os dois rancheiros empalideceram.

— Não sabe o que está falando. Temos as

estradas vigiadas... — falou Oscar.

— Sei disso, mas ele passou. Está lá na

cidade agora — disse Ted, contando-lhes

tudo que ocorrera lá.

— E que providências você tomou? —

indagou Bob.

— Havia alguns de seus homens por lá.

Ordenei que armassem uma emboscada para

o delegado, mas eles se acovardaram,

quando um deles foi morto. Fugiram como

ratos.

— Malditos covardes! Pagarão por isso.

Agora temos que resolver essa situação. Se

o delegado falou com a viúva Ross, deve

saber alguma coisa.

— Maldita mulher! Não sei como matou

Mike e ainda conseguiu ir para a cidade.

Devíamos matá-la logo. Cedo ou tarde

acabará falando. Sabe onde ela está, xerife?

— perguntou Oscar.

— Eu a vi refugiar-se no saloon de

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Helen. Judy deve tê-la escondido.

— Daremos um jeito nisso, então.

— E quanto ao delegado federal? Ele me

deu um mandato para vir prendê-los.

Os dois irmãos riram da pergunta do

xerife.

— Esse delegado já está morto, xerife. É

carta fora do baralho.

— Como pretendem fazer isso?

— Jogando toda a nossa força contra ele

— sugeriu Bob.

— Como assim? — quis saber Oscar.

— Vamos mandar Scar e todos os

homens disponíveis para a cidade. Eles

provocarão o delegado e o matarão. A

cidade conhecerá nossa força e saberá que

ainda mandamos aqui.

— O que acha, Ted?

— Pode ser uma boa idéia. Fui

ridicularizado e humilhado por aquele

delegado. Não vejo a hora de vingar-me

dele. Depois dele morto, eu mando um

relatório para Phoenix, informando que ele

se envolveu numa briga e acabou morto.

Assim não mandam outro idiota para cá.

— Excelente! Vamos chamar Scar.

Momentos depois, Scar apresentava-se

diante de seus patrões.

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— Temos um trabalho para você

resolver, Scar. Precisa ir à cidade e matar

um delegado federal — falou Bob.

— Adoro matar delegados federais.

Quem é esse?

— O nome dele é David Garret —

informou o xerife.

— Tem certeza? Mas isso é muito bom

— falou o pistoleiro, rindo de um modo

especial, como se ruminasse uma idéia que

o agradava muito.

— Já o conhece? — perguntou Ted.

— Sim, já nos encontramos antes. Tenho

contas a ajustar com ele.

— Pois então, vá até lá e mate-o.

— Não tão rápido. David Garret é

alguém especial. Merece morrer pedindo

clemência, sofrendo muito mesmo.

— Por que o odeia tanto? — insistiu Ted.

— Aquele bastardo matou meu irmão

numa briga, há alguns anos. Prometi vingar-

me e minha hora chegou.

— Acho que podemos usar Scar para

matar dois coelhos com uma só cacetada —

comentou Bob.

— O que tem em mente?

— Que ele mate o delegado e nos livre

daquela mulher e de Judy, também, por

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ajudá-la.

— Vamos pegar as mulheres, então. Com

elas atrairemos o delegado a uma cilada —

disse Scar.

— Faça o que for preciso, Scar. Você tem

o comando agora — ordenou Oscar.

O pistoleiro riu com satisfação e saiu para

reunir seus homens, montando seu plano de

ação.

— Lou e Cooper, vocês dois irão para o

lado norte da cidade e simularão um

tiroteio. Espero, com isso, atrair a atenção

do delegado para lá, enquanto nós entramos

pelo lado oposto.

— Logo anoitecerá, Scar. Acha que ele

irá?

— Sim, ele é bisbilhoteiro e irá ver o que

está acontecendo. Agora vamos, quero

chegar à cidade antes do anoitecer —

determinou ele, ansioso pela sua vingança.

David e Scott bebiam e conversavam no

saloon, esperando pela chegada da noite,

para irem para o rancho de Curley Ross.

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— Não é prudente ficarem aqui, rapazes

— observou Judy. — Os Merryl logo

saberão que vocês liquidaram mais alguns

de seus homens.

— Não temos medo deles, Judy e

sabemos nos cuidar. Fique tranqüila, não se

preocupe conosco — disse Scott.

— O xerife ainda não voltou, aquele

covarde — observou Scott.

— E nem voltará — opinou Scott. — A

esta hora está no Rancho Merryl,

planejando um modo de matá-lo, David.

— Então acho que devíamos ir até a

cadeia e soltar Helen.

— Não terá problemas com o juiz?

— Eu assumirei a custódia dela perante a

lei. Deixá-la lá é deixá-la à mercê de nossos

inimigos. Ela ficará melhor aqui, com Judy

e com a viúva Ross.

Os dois foram até a cadeia e libertaram

Helen. Ao reconhecer Scott por debaixo da

barba e do bigode postiços, ela mal pode

conter sua emoção. Abraçou-o e beijou-o

com um carinho especial.

— Sofri ao saber que tinha morrido —

disse ela, chorando.

— Imagino, querida. Judy contou-me o

que fez por mim... Eu sempre a achei uma

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mulher corajosa... Mas não sabia que

gostava tanto de mim...

Ela o beijou novamente, provando o

quanto amava-o.

— Helen, queremos que vá para o saloon

e fique coma viúva Ross e Judy, até

resolvermos esta situação.

— E vocês, para onde vão?

— Vamos ao Rancho Ross resgatar o

corpo dele.

— Se trouxerem algum dos pistoleiros

com vida, obrigando-o a testemunhar,

poderão acabar com os Merryl, não?

— Sim, contamos com isso, Helen —

afirmou Scott.

Naquele momento, diversos disparos

cortaram o entardecer, vindos do lado norte

do povoado.

— O que acha que pode ser, David? —

indagou Scott.

— Não sei, mas acho bom irmos dar uma

olhada...

— Cuidado, rapazes! — pediu Helen.

— Estaremos bem, Helen. Vá para o

saloon. Nós a encontraremos lá mais tarde

— disse-lhe Scott, com carinho.

Assim que ela se afastou na direção do

saloon, os dois apanharam seus cavalos e

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galoparam na direção dos disparos, que

ainda eram ouvidos esparsamente.

Quando se distanciaram do povoado,

aproximando-se do local de onde vinham os

tiros, estes cessaram. Tudo ficou em

silêncio e nada de anormal via-se por lá.

— Que diabos foi isso? — comentou

Scott.

— Estranho, não? Vamos dar mais uma

olhada.

Procuraram por mais algum tempo, mas

não conseguiram encontrar sinais dos

autores do tiroteio.

— Talvez foram vaqueiros treinando a

pontaria, enquanto seguiam seu caminho —

opinou Scott.

— Talvez... Mesmo assim, acho estranho.

— Já que estamos aqui, por que não

vamos para o Rancho Ross?

— É para o norte mesmo. Vamos lá!

— Avise-me quando estivermos nos

aproximando. Precisamos usar de toda

cautela desta vez.

Scott concordou e os dois cavalgaram

lado a lado na direção do rancho. Scott,

apesar de toda tensão, parecia feliz e sorria.

Scott percebeu isso.

— O que o faz tão feliz assim? —

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indagou David.

— Estou pensando em Helen.

— Deu para perceber que ela o ama

muito.

— Sim e eu também o amo.

— Não tinham descoberto isso antes?

— Eu sempre tive uma queda por ela,

mas jamais imaginei que ela gostasse de

mim... Faltou-me um pouco de decisão.

Assim que tudo terminar, no entanto, vou

pedí-la em casamento.

— E eu achei Judy uma garota

sensacional, o tipo de mulher que me

agrada, sabia?

— Posso imaginar, pela maneira como

ela o olha e preocupa-se com você. É quase

uma sócia de Helen no saloon.

— Você acha mesmo que ela viu algo em

mim?

— Tenho certeza disso.

— Acha que ela e eu...

— Por que não pergunta isso a ela,

quando voltarmos? — sugeriu Scott,

esporeando seu cavalo.

David imitou-o, cavalgando ao encontro

do perigo. Para o delegado federal, aquela

vida aventureira, de cidade em cidade,

desempenhando misses perigosas estavam

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cansando.

Sempre sonhara encontrar um lugar novo,

onde pudesse fincar raízes e começar uma

vida sólida, com uma mulher de fibra que

lhe desse muitos filhos.

Naquele povoado, talvez isso pudesse

acontecer. A lei ali era necessária. Podia

candidatar-se ao cargo e xerife. Além disso,

tinha algumas reservas, poderia comprar

também um pedaço de terra e crescer com o

povoado.

Era uma idéia a ser considerada. Judy era

uma garota de fibra, corajosa e decidida,

demonstrando ser também muito carinhosa.

Encerrar sua carreira ali começava a

parecer-lhe uma boa opção.

Já tinha muitas cicatrizes no corpo e

muitas histórias para contar. Estava

habituado a lidar com gente da pior espécie

e isso já não era vida para um homem.

Sempre envolvido em tiroteios, matando

para não morrer, chegava a um ponto em

que, se persistisse nessa vida, acabaria

insensibilizado.

Esse não era o tipo de futuro que David

desejara para si, quando entrara para aquela

profissão.

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Enquanto isso, um verdadeiro exército de

pistoleiros entrou pelo lado sul da cidade.

As ruas ficaram limpas. Todos correram,

assustados, escondendo-se atrás de portas e

janelas, com medo de uma represália dos

homens dos Merryl.

A presença dos pistoleiros, daquela forma

ostensiva, significava encrenca e tiroteio.

— Vamos até o xerife primeiro —

ordenou Scar. — Vamos pegar aquela

linguaruda, já que escapou ao julgamento.

O grupo parou diante da cadeia. Alguns

pistoleiros desmontaram e correram para

dentro, retornando e seguida.

— Não há ninguém lá dentro, Scar —

afirmou um deles.

— Tem certeza?

— Sim, as celas estão todas vazias, com

as portas escancaradas.

— Para onde podem tê-la levado? —

indagou-se o pistoleiro.

— Só pode ter ido para o saloon, Scar —

emendou o pistoleiro, montando

rapidamente.

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— Veremos isso — decidiu o líder deles.

O bando todo desceu a rua lentamente,

parando em frente do saloon.

— Está tudo muito quieto por aqui esta

noite — observou um dos homens.

— Vamos fazer um pouco de barulho —

falou Scar, desmontando, seguido pelos

pistoleiros.

Apenas o barman limpava copos atrás do

balcão.

— Onde está Helen? — indagou-lhe

Scar.

— Na cadeia, onde mais poderia estar?

— respondeu o barman, fazendo-se de

desentendido.

Uma coronhada inesperada atingiu-o na

cara, jogando-o para trás, contra a prateleira

de garrafas, quebrando-as.

Um dos pistoleiros saltou para dentro do

balcão e o levantou. Seu nariz sangrava

abundantemente.

— Eu lhe fiz uma pergunta, rapaz —

insistiu Scar.

— Não sei... ela deveria estar lá...

Scar sacou sua arma e enfiou o cano

dentro da boca do outro, engatilhando-a. O

barman estremeceu, apavorado.

— Tem um minuto para começar a falar

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ou arrebento-lhe a cabeça — ameaçou Scar.

— Eu não sei... Juro!

— Trinta segundos agora.

Quando Scar ia apertar o gatilho, uma

voz feminina se fez ouvir.

— Estou aqui, seu covarde. O que quer

de mim?

Scar e seus homens voltaram-se. Helen

estava no alto da escada, encarando-os

corajosamente.

— Desça daí, beleza. Vamos dar um

passeio.

— Não vou a parte alguma com você...

— Deixe de ser estúpida, mulher, e

obedeça-me — falou ele, com rispidez.

— Por que não vem me buscar? —

desafiou ela.

Scar fez um sinal de cabeça. Dois

pistoleiros rumaram para a escada, parando

no primeiro degrau.

— Vamos logo, o que estão esperando,

seus idiotas? — gritou ele, enervado.

— Parem aí mesmo, rapazes, se têm amor

à pele — ordenou Helen.

Os dois pistoleiros tinham mais medo de

Scar do que dela e começaram a subir a

escada.

Helen tirou do bolso de seu vestido um

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Colt, engatilhou-o e apontou. Os pistoleiros

não pararam. Ela estourou a cabeça de um.

O outro fez menção de sacar a arma e ela

disparou contra o peito dele, jogando-o de

costas no assoalho.

Os outros pistoleiros não se conformaram

com a morte de seus amigos e sacaram suas

armas, disparando na direção de Helen,

enquanto procuravam abrigo.

A garota já havia recuado para o

corredor, onde não seria atingida.

— Parem, seus idiotas! — berrou Scar.

— Não vamos atingí-la nunca desta forma.

— É só uma... — disse um pistoleiro,

mas calou-se imediatamente, quando três

disparos quase simultâneos arrancaram

lascas da mesa atrás da qual ele se ocultava.

— São três e podem nos deter aqui

embaixo. Quem subir por aquela escada

será morto.

— Demônios! — praguejou Scar. — O

delegado federal já deve ter ouvido o

tiroteio e logo estará aqui.

Naquele momento, ouviu-se um tropel de

cavalos na rua, parando diante do saloon.

— Maldição! Deve ser ele — falou Scar.

— Não, são Lou e Cooper — avisou

alguém.

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Scar esgueirou-se por entre as mesas ao

encontro dos dois.

— Onde está o delegado? — quis saber.

— Eles foram até lá, verificar a razão do

tiroteio, depois seguiram em frente...

— Eles quem? Quem está com ele?

— Não sei ao certo, mas pareceu-me

aquele vendedor de elixir.

— Que diabos é isso? — intrigou-se

Scar. — Em que direção eles foram.

— Na direção do rancho de Curley Ross.

— Tem certeza?

— Sim, eu e Cooper os seguimos por

algum tempo.

— O que estarão tramando — perguntou-

se o pistoleiro, intrigado. — Há guardas

nossos lá no rancho?

— Dois ou três apenas. Os vaqueiros

retornaram para o Rancho Merryl, após

recolher os cavalos.

— Não consigo imaginar o que aquele

maldito delegado federal foi fazer lá... Mas

não gosto disso. Essa raça é mais ardilosa

que o demônio!

— Talvez seja alguma coisa que a viúva

Ross tenha dito a ele.

— Ou procurar alguma testemunha da

morte do rancheiro para jogar contra nós —

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opinou um outro pistoleiro.

— Tem razão. Pode se tornar uma

ameaça irreparável para nós. Mas acho que,

com isso, eles nos prestaram um favor —

disse Scar.

— Como assim, chefe?

— Podemos prendê-lo e ao seu amigo

numa armadilha. Vamos para lá o mais

depressa possível. Vamos cercar o rancho e

invadí-lo. Aquele maldito David Garret não

sabe, mas está ido direto para a própria

sepultura — sentenciou Scar.

— E quanto às mulheres?

— Já não são importantes no momento.

Depois nós as pegamos. O importante agora

é apanhar o delegado. Você e mais dois

homens fiquem aqui, vigiando o saloon.

Ninguém entra ou saia dele, entendido? O

resto vem comigo. Vamos acabar com isso

agora mesmo.

Pouco depois, quase trinta homens

cavalgavam, deixando uma nuvem de

poeira atrás deles.

Próximos do rancho, ocultos atrás de

algumas árvores, David e Scott analisavam

a situação.

— Vejo luz na casa — disse Scott.

— Sim, mas é difícil saber quantos estão

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lá. Não vejo movimento em nenhuma outra

parte, nem no alojamento dos vaqueiros.

— Estranho isso...

— A menos que tenham sido mortos, o

que não seria de causar espanto.

— Vamos nos aproximar um pouco mais.

Trouxe sua faca?

— Nunca me separo de uma — falou

Scott, retirando-a de sua boa.

— Ótimo! Talvez tenhamos que usá-las.

Aproximaram-se da sede do rancho,

protegidos pela vegetação e pelo capim.

Atravessaram um curral e foram ocultar-se

atrás do alojamento dos vaqueiros.

Examinaram por uma janela aberta.

Estava realmente vazio. Scott apontou na

direção da casa. Os dois esgueiraram-se nas

sombras, chegando até uma das janelas.

— Vejo apenas dois deles lá dentro —

falou David.

— Pode haver mais nos outros cômodos.

— Vamos verificar com cuidado.

Após fazerem isso, os dois comprovaram

que apenas dois pistoleiros guardavam o

local.

— Como vamos pegá-los? — quis saber

Scott.

— Qual é a maneira mais fácil de entrar

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em uma casa?

— Pela porta, é claro!

— É por onde entraremos. Eles estão

tranqüilos, não tem motivo algum para

estarem alertas — deduziu David,

aproximando-se da porta e batendo.

— Quem é? — indagaram lá de dentro.

— David! — respondeu ele, com

naturalidade.

— E quem diabos é você, David?

Um pistoleiro escancarou a porta, num

gesto nervoso. David agarrou-o pelo

pescoço, pondo a faca em sua garganta. O

homem debateu-se, no entanto, tentando

fugir e a lâmina deslizou de orelha a orelha,

fazendo o sangue jorrar.

O outro pistoleiro surgiu diante da porta,

com a arma na mão. Scott não teve outra

alternativa a não ser arremessar sua faca,

que atingiu o malfeitor na garganta. Ele

gemeu e caiu, contorcendo-se, enquanto

esvaía-se em sangue.

— Maldição! — reclamou David. —

Queria pegar pelo menos um deles com

vida. Agora não há como descobrir onde

está o corpo de Curley.

— Perdemos nosso tempo — afirmou

Scott. — De qualquer forma, vamos voltar

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para o povoado. Não quero deixar as

garotas sozinhas por muito tempo.

— Vamos só dar uma olhada pela casa

antes de sair — propôs David.

Vasculharam a casa, mas nada

encontraram de anormal. Quando iam sair,

um tropel de muitos cavalos quebrou o

silêncio da noite.

Os dois correram para uma janela,

observar. Os cavaleiros chegavam e

cercavam a casa.

— Diabos, vão nos encurralar —

percebeu David.

Scott correu e apagou os lampiões.

Ficaram ambos observando lá fora. Os

homens movimentavam-se como gatos nas

sombras, espalhando-se por toda parte.

— Vocês dois aí dentro, estão cercados.

Saiam de mãos para cima — ordenou Scar.

— Veja ali, a sua esquerda — apontou

Scott.

Um pistoleiro esgueirava-se na direção da

casa. David apontou sua arma e fez fogo. O

homem gemeu e tombou na poeira.

— É inútil resistir, David. Eu o tenho

numa ratoeira. Você morrerá de qualquer

forma.

— Quem está falando?

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— Aqui é Scar Owens, lembra-se de

mim?

— E como eu poderia esquecer um réptil

rastejante como você, seu porco asqueroso?

— Você matou meu irmão e terá que

pagar por isso agora.

— Terá que me apanhar primeiro, Scar.

— É o que farei, nem que tenha que

incendiar a casa — rugiu o pistoleiro,

ordenando a seus homens que disparassem.

Línguas de fogo surgiram de toda parte,

indicando a localização das armas que

disparavam incessantemente. Balas

choveram de todas as direções,

arrebentando vidros, quebrando objetos e

arrancando lascas da madeira.

Abaixados, Scott e David aguardavam

pacientemente.

— Se ao menos tivesse um pouco de luz

lá fora. Poderíamos ver nossos alvos —

sugeriu Scott.

— Você acaba de me dar uma grande

idéia — falou David, lembrando-se de algo

que vira na parede, sobre a lareira da casa.

— O que vai fazer? — indagou-lhe Scott,

ao vê-lo rastejar pelo assoalho.

— Providenciar um pouco de luz — disse

ele, indo até a lareira.

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Sobre ela, como enfeite, havia um arco e

flechas. Ergueu-se rapidamente, apanhando-

os. Pegou também um lampião e retornou

ao seu posto, junto à janela.

— Bem pensado, mas o que vai queimar?

— Pensei em queimar aquele velho

celeiro ali na frente. Acho que a viúva Ross

não se importará, desde que a ajudemos a

reconstruí-los depois.

David improvisou as tochas nas pontas

nas flechas, molhando-as no combustível do

lampião. Acendeu a primeira e disparou-a

contra a parede do celeiro. Um dos

pistoleiros correu para tentar apagar. Scott

fulminou-o sem piedade.

Novas flechas foram lançadas, cravando-

se por toda a parede. Logo o fogo espalhou-

se e as chamas iluminavam os pistoleiros.

David e Scott não os poupavam, disparando

certeiramente, espalhando o fogo e o pânico

entre eles.

Mesmo com toda a pontaria, os

pistoleiros ainda eram muitos e agora

estavam bem abrigados, disparando sem

cessar. O fogo, no entanto, havia alertado os

vizinhos de Curley Ross que, apesar de

saber que os Merryl haviam se apossado do

rancho, foram verificar o que estava

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acontecendo.

Ao perceberem que alguém na casa

enfrentava os pistoleiros, já tendo matado

uma porção deles, resolveram também

ajudar. Reuniram-se e esgueiraram-se de

modo a pôr Scar e seus homens em fogo

cruzado.

Quando começaram a disparar, a

confusão estabeleceu-se entre os pistoleiros.

— Demônios, o que está havendo? —

indagou Scar, apavorado.

— Estamos entre dois fogos — informou

alguém.

— Vamos dar o fora daqui — ordenou

Scar e os pistoleiros correram em busca de

seus cavalos.

O cenário estava iluminado e eles eram

alvos perfeitos. As balas de David, Scott e

dos rancheiros foram exterminando-os

impiedosamente.

Scar e meia dúzia deles conseguiram

escapar ao meio a uma chuva de balas,

sumindo na escuridão.

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Os irmãos Merryl e Ted Quincy bebiam e

conversavam animadamente, quando

ouviram o barulho de cavalos chegando.

— Devem ser Scar e os homens, após

terem liquidado o delegado federal — falou

Bob, rindo satisfeito.

— Acho que seus problemas acabaram,

Ted. Vai poder voltar ao xerifado e assumir

seu posto, continuando a nos ajudar como

antes — disse Oscar.

— Sim, mas de agora e diante vamos

tomar cuidado com os delegados federais.

Não quero mais nenhum por aqui

novamente.

— Você cuidará disso para nós —

afirmou Bob, levantando-se para ir até a

porta.

Scar e seus homens entraram

abruptamente, como se o próprio satanás

perseguisse-os.

— O que houve? Onde está o resto da

equipe? — quis saber Oscar.

Os pistoleiros foram até a mesa e se

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serviram de generosas doses de uísque.

Estavam todos trêmulos, com o suor

cobrindo seus corpos.

— Vamos, fale, homem! — intimou Bob.

— Cercamos o delegado e seu amigo no

Rancho Ross...

— Espere um pouco, quem estava com

ele? — quis saber Oscar.

— Acho que era o vendedor de elixir...

— Sim, foi o tal que ajudou David Garret

a escapar da emboscada na porta da cadeia.

O vendedor de elixir está com ele — falou

Ted.

— Pode ser um outro delegado — disse

Scar.

— E o que eles foram fazer no Rancho

Ross?

— Não faço a menor idéia, mas nós os

surpreendemos lá. Tínhamos a situação

dominada, quando ele recebeu uma ajuda

inesperada, não sei de quem.

— E onde está o resto dos homens?

— Acredito que estejam mortos...

Os dois irmãos e Ted entreolharam-se,

pálidos e assustados.

— Eu lhes disse que aquele delegado não

seria presa fácil — falou Ted.

— O diabos é que ele está vivo e deve vir

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atrás de nós — falou Oscar.

— Que diabos vamos fazer agora, irmão?

— Vamos enfrentá-los, é a única maneira

— falou Scar.

— Você acaba de perder um batalhão e

ainda fala em enfrentá-lo! — surpreendeu-

se Bob, nervoso.

— Vejam bem o meu plano! Eles devem

ter ido para a cidade agora. Se nos

juntarmos, reunindo todos os pistoleiros de

que ainda dispomos, mais uma equipe de

vaqueiros dispostos a ganhar um dinheiro

extra, poderemos ir para a cidade e... — ia

dizendo Scar.

— Que idéia mais maluca! — cortou-o

Bob.

— Espere, Bob! — interrompeu-o Oscar.

— Há lógica na proposta de Scar. Não

podemos abandonar tudo que temos aqui.

Vamos ter de enfrentá-lo com todas as

nossas forças.

— Acha que daria certo, Ted? —

indagou-lhe Bob.

— E por que não? Não esperam um

contra-ataque desses. Chegaríamos de

surpresa. Deveremos encontrá-lo e ao seu

amigo no saloon. Será fácil...

— Então acho que não deveríamos trocar

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tiros com eles. Se estão no saloon, vamos

explodir toda aquela porcaria — falou Scar,

furioso.

— Explodi-los? Está aí uma boa idéia —

elogiou Oscar.

— Isso mesmo. Com algumas bananas de

dinamite mandaríamos aquele saloon pelos

ares, juntamente com todos os nossos

problemas, começando por Helen, passando

pela viúva Ross e finalizando com o

delegado federal.

— Sim, é uma grande idéia, Scar. Nem

precisaríamos de muitos homens para isso

— falou Oscar.

— Mas levaríamos um bando para

qualquer eventualidade — ponderou Bob.

— Então o que estamos esperando? Vou

apanhar a dinamite e partiremos em seguida

— falou Scar.

O delegado federal e os vizinhos do

Rancho Ross chegavam à cidade. Quando

aproximavam-se do saloon, foram recebidos

a bala pelos capangas que Scar deixara de

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guarda. Mas bastou que eles se

descuidassem para que Helen e suas amigas

fuzilassem-nos sem piedade.

— Bom trabalho, garotas! — elogiou

David.

— Que bom que tenham voltado — falou

Judy, com satisfação. — Estávamos

preocupadas. O que houve?

Em rápidas palavras, David contou o que

havia acontecido.

Rose ficou muito emocionada quando

soube da participação de seus vizinhos.

— Eu sabia que cedo ou tarde vocês

iriam unir-se a nós contra os Merryl —

falou ela, com orgulho.

— Reconhecemos que fomos covardes,

mas percebemos que isso era errado. Todos

acabaríamos perdendo diante da ganância

dos dois — falou um dos rancheiros.

— Eu agradeço por isso. Estou certa que

Curley apreciaria isso de vocês — falou a

viúva.

— E agora, David, qual vai ser o próximo

passo? — indagou Judy.

— Capturar os Merryl e enforcá-los pelos

seus crimes. Não lhes resta muitos homens

agora. Com a ajuda dos rancheiros, vamos

apanhá-los.

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— E quando pretende fazer isso, hoje à

noite mesmo?

— Não, alguns pistoleiros escaparam ao

tiroteio e na certa foram avisar os Merryl.

Se conheço criminosos, na certa estarão

esperando algum ataque e ficarão na

defensiva.

— E se resolverem nos atacar? —

indagou Helen.

— Vamos montar turnos de guarda nas

entradas da cidade. Assim não seremos

surpreendidos.

— Conte conosco, delegado — falaram

os rancheiros, que logo estabeleceram os

turnos de guarda e os locais mais adequados

para isso, partindo em seguida.

Os que ficaram queriam saber o que

aconteceria na seqüência.

— Vamos atacá-los ao amanhecer? —

indagou um deles.

— Sim, se nada acontecer até lá —

afirmou David. — Enquanto isso, que tal

alguma coisa para comer, barman? Estou

morto de fome.

— Vamos providenciar um jantar para

vocês — falou Helen.

Judy apressou-se em ir ajudá-la. Os

rancheiros acomodaram-se nas mesas, pois

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a maioria já havia jantado. Providenciaram

bebidas para todos. Conversavam

animadamente, sem saber que o perigo

cavalgava na direção do povoado.

Os Merryl, à frente de um grupo de

pistoleiros, com Scar e o xerife de

contrapeso, galopavam para lá.

— Vão ter uma bela surpresa —

comentava Oscar, impaciente para ver tudo

terminado.

— Só queria estar perto para ver a cara

do delegado federal, quando a dinamite

explodisse bem debaixo de seu nariz xereta

— acrescentou Bob.

— Logo todas as nossas preocupações

estarão terminadas. Aquele delegado vai se

arrepender de ter-me humilhado — falou o

xerife.

— Se ficou tão zangado com ele, por que

não o enfrentou cara a cara num duelo? —

zombou Scar, o único que não se mostrava

tão confiante assim.

Já conhecia aquele delegado. Sabia que

ele era mais tinhoso que o próprio capeta.

— O pistoleiro aqui é você e correu dele

com o rabo no meio das pernas, não foi,

Scar? Vai me dizer que não foi isso que

aconteceu lá no Rancho Ross? — devolveu-

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lhe o xerife, ferinamente.

— Cale a boca, xerife, ou vou me

esquecer que estamos do mesmo lado —

ameaçou Scar.

— Ora, vá para o inferno! — exclamou

Ted Quincy, exasperado.

— Calma, rapazes! Por que não guardam

toda essa raiva para o delegado e seus

amigos? — aconselhou Bob.

— Não se preocupe, patrão. É isso que

pretendo fazer Scar.

Bem à frente deles, no alto de uma

colina, Jonah Butterfly notou aquela nuvem

de poeira e aquele grupo de cavaleiros

vindo a direção da cidade. Rapidamente

correu para seu cavalo e rumou para o

saloon, onde estavam todos reunidos.

— Há um grupo de cavaleiros, vindo dos

lados do Rancho Merryl, aproximando-se.

— Quantos são, conseguiu definir? —

indagou David.

— Uns vinte homens.

— Acho que estão mais desesperados que

imaginamos, Scott. Ou então estão

tramando alguma coisa.

— Bem, estão vindo na hora certa. O que

vamos fazer?

— Vamos preparar a recepção. Reunam

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todos os homens aqui no saloon. Quero um

grupo no telhado do prédio da frente. O

resto fica aqui, preparado para tudo.

Rapidamente os homens acataram as

ordens, organizando-se. Todos os que

estavam de vigia foram avisados,

retornando. Todos ficaram atentos pela

chegada dos pistoleiros.

— Acha que o homem estava assustado a

ponto de julgar ter visto alguma coisa? —

indagou Scott a David, enquanto

esperavam, já que nenhum sinal dos

atacantes fora detectado.

— Pode ser, apesar de eu não acreditar

que um homem valente como aquele tenha

visões causadas pelo medo — afirmou

David, indo até a janela.

Tudo estava muito calmo lá fora.

— Acho que vou dar uma olhada —

decidiu ele. — Cubram-me.

— Quer que eu vá junto? — ofereceu-se

Scott.

— Não, fique aqui com o resto dos

homens. Só vou dar uma olhada.

David desceu até a rua. No telhado em

frente os homens fizeram-lhe um sinal. Ele

ficou atento, olhando ao seu redor.

David estava intrigado. Teria o homem

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realmente visto o grupo de cavaleiros

aproximando-se? Como que respondendo a

sua pergunta, um vulto deslizou pelas

sombras, no outro lado da rua.

— Pare aí mesmo ou será um homem

morto — ordenou David, sacando

rapidamente sua arma.

— Calma, moço! Eu só estou dando um

passeio — respondeu o vulto, tirando o

charuto da boca.

— Aonde pensa que vai?

— Só tomar um pouco de ar... Está muito

abafado dentro de casa... Isso não é crime,

é?

David não ficou satisfeito com as

respostas e começou a atravessar a rua na

direção do homem, no outro lado.

De repente, ouviu um chiado

característico, seguindo de muitas fagulhas.

— Tome este presentinho, delegado! —

falou o pistoleiro, jogando o pacote na

direção dele..

David não hesitou. Disparou

certeiramente e o vulto bateu contra uma

parede, depois veio cair na poeira da rua.

O pacote de dinamite caiu a seus pés. Ele

pisou firme no estopim, apagando-o.

No momento seguinte, o inferno abateu-

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se sobre ele. Uma chuva de balas zumbiu ao

seu redor. David tratou de abrigar-se

rapidamente.

— O que houve, David? Você está bem?

— indagou Scott, numa das janelas do

saloon.

— Sim, estou bem, mas eles estão aqui.

Fogo neles!

O tiroteio foi intenso, mas sem baixas, já

que todos estavam bem abrigados. David

conseguiu rastejar de volta ao saloon.

— São eles, sem sombra de dúvidas. Só

que vamos trocar tiros a noite toda, sem

resultado. Temos de achar um meio de

cercá-los.

— Vamos levar um grupo pelos fundos

do saloon — sugeriu um rancheiro. — Eles

estão escondidos no armazém.

— Muito bem, rapazes! Vamos fazer isso

— disse David, reunindo um grupo bem

armado e saindo pelos fundos.

Num ponto seguro, bem à frente,

atravessaram a rua, depois retornaram, até o

beco ao lado do armazém. Bloquearam a

porta dos fundos. Os pistoleiros só tinham

uma saída agora, só que estavam muito bem

protegidos, sem contar que tinham

mantimentos e munição para muito tempo.

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— Não vamos conseguir tirá-los dali

facilmente — observou Scott.

— Só que não sabem que estamos aqui.

Vamos rastejar pela rua, até a calçada. Dali

levantaremos e dispararemos contra eles,

nas janelas e na porta. Acho que

conseguiremos acertar uma porção deles.

Os homens fizeram como David sugerira.

Quando se levantaram e dispararam

praticamente a queima-roupa, muitos

pistoleiros foram atingidos, desfalcando as

fileiras dos Merryl.

— Bob Merryl, seu covarde! — gritou

Scott.

— Quem disse isso?

— Sou eu, Scott Nelson. Soube que você

está usando meu cinturão. Eu o quero de

volta, covarde!

— Scott Nelson está morto...

— Estou bem vivo e quero minhas armas.

— Então venha buscá-las.

O tiroteio havia cessado, enquanto os

dois conversavam. David percebeu, pelos

gemidos lá dentro, que muitos deles

estavam feridos. Retornou até o beco,

depois esgueirou-se junto à parede, até ficar

ao lado da porta.

Fez um sinal que Scott entendeu. Os dois

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verificaram suas armas, remuniciando-as.

Então, num gesto de extrema coragem, que

pegou seus adversários de surpresa, ele se

virou, chutou a porta e entrou rolando para

dentro do armazém.

— Maldição! Ele está aqui! — berrou

Scar, antes de receber um balaço na testa,

que abriu sua cabeça como uma abóbora

podre.

Os outros pistoleiros tentaram atingir

David, que não parava um instante,

deslocando-se para um canto. Scott

aproveitou a distração e entrou atrás,

pegando-os de surpresa, ceifando-os um a

um. As armas dos dois cuspiram chumbo

com incrível precisão, espalhando a morte e

a confusão entre os pistoleiros.

Alguns, em desespero, tentaram fugir,

saltando pela janela e correndo porta a fora,

sendo abatidos pelos homens que os

esperavam.

Tudo ficou em silêncio então. Ocultos,

David e Scott não viam os dois irmãos

carniceiros.

— Atrás do balcão — avistou-os Scott.

— Vocês dois aí, não tem chance alguma.

É melhor entregarem-se ou vão morrer

como cães aí mesmo — gritou o delegado.

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— Iremos todos juntos para o inferno —

esbravejou Oscar, disparando sua arma

repetidas vezes, juntamente com o irmão.

As balas ricocheteavam por toda parte,

arrancando lascas da madeira ou quebrando

coisas ao redor de David e Scott.

— Vocês estão encurralados — avisou-os

Scott.

— Não nos pegarão com vida — gritou

Bob, despejando chumbo em resposta.

David e Scott estavam em desvantagem,

porque os tocheiros que iluminavam a rua

atrás deles denunciava suas silhuetas,

enquanto os dois irmãos, ocultos atrás do

balcão, estavam totalmente fora da visão

deles. Tinham de encontrar uma forma de

desentocá-los dali rapidamente.

O delegado percebeu, então, que a única

forma de atingí-los seria quando

disparassem, valendo-se do clarão

produzido pelos disparos. Não seria uma

missão segura, por isso teria de usar a

cabeça.

Atrás dele havia uma pilha de cabos de

picareta. Ele pôs seu chapéu num deles e

estendeu-o para o lado. Scott percebeu o

que ele pretendia e ficou atento.

— Agora Scott! — falou David,

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erguendo a madeira com o chapéu.

Os dois irmãos levantaram-se, disparando

incessantemente. David deixou cair o cabo

de picareta e fez fogo certeiramente. Os

dois irmãos, atingidos, foram jogados para

trás estrepitosamente.

— Mate-me agora! — pediu Bob, ferido,

quando os homens entraram com tochas.

— Uma bala é bom demais para você,

seu canalha. Quero vê-lo espernear na ponta

de uma corta — disse Scott, arrancando o

cinturão de Bob e apanhando suas armas.

Oscar estava também ferido, os olhos

esbugalhados cheios de terror. O sangue

banhava seu tronco e escorria para o

assoalho.

— O que faremos com eles? —

indagaram os rancheiros.

— Pelo meu poder excepcional de ser

juiz, júri e carrasco ao mesmo tempo, eu os

condeno à morte por seus crimes. Alguém

tem alguma coisa a dizer em defesa deles?

A resposta foi óbvia. Os rancheiros

arrebataram os dois e levaram-nos para fora.

Enquanto os rancheiros encarregavam-se

de justiçar os dois, David e Scott dirigiram-

se ao saloon com um só pensamento: falar

de amor com uma bela mulher.

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O Herói Renegado

Um clima tenso pairava sobre o Forte

Bowie, naquela manhã de verão, quase no

final do século passado. O horizonte tingia-

se de vermelho, anunciando a chegada do

sol que, por mais um dia, fustigaria aquela

terra desolada.

O corneteiro terminou de polir seu

instrumento, depois avançou até o centro do

pátio, junto ao mastro onde a bandeira seria

hasteada na hora oportuna.

O soldado ficou ali, em posição de

sentido, olhando na direção do alojamento

dos oficiais. Quando a porta se abriu, o

coronel Donald saiu na frente, ainda

calçando suas luvas. Atrás dele, em fila pela

importância, vinham os oficiais.

Eles se enfileiraram lado a lado no

alpendre do alojamento, olhando o céu,

trocando informações. O corneteiro

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continuou atento a eles. O general tirou o

relógio do bolso. Comentou algo com o

Major, que fez um sinal de cabeça para o

oficial do dia.

O Tenente Jones avançou até junto do

corneteiro e ordenou o toque da alvorada. O

soldado pigarreou, esfregou as costas da

mão na boca, depois levou o instrumento

aos lábios.

Os acordes ligeiros percorreram os

alojamentos do forte e ecoaram nas

montanhas que o circundavam, no norte do

Arizona. Em instantes, as portas dos

alojamentos foram se abrindo e os soldados

foram deixando suas seções sem pressa,

indo perfilar-se ao redor do mastro, em

posições preestabelecidas.

Naquela manhã não havia nenhum rosto

sonolento. Todos haviam acordado cedo e

se preparado para a cerimônia. Havia

revolta em seus rostos.

Os oficiais esperaram até que todos os

pelotões estivessem formados. Só então

caminharam até a frente deles. Dois

soldados se adiantaram e prepararam a

bandeira para o hasteamento.

A um sinal do oficial de dia, o corneteiro

foi desfiando afinadamente o hino Stars of

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Glory. A bandeira foi subindo, imóvel, até

atingir a brisa que soprava por cima das

paliçadas de madeira do forte.

Começou, então, a agitar-se, com as

pontas estalando ao vento e as estrelas

parecendo cintilar no céu do amanhecer. Os

soldados desfizeram a continência, mas

mantiveram a posição de sentido.

Todos estavam muito constrangidos com

o que havia acontecido. Nenhum deles

acreditava em nada do que fora dito pelas

testemunhas e julgavam aquela corte

marcial uma farsa, nada mais.

O coronel se adiantou, então, olhando

para o oficial de dia.

— Tenente, prepare-se para a execução

da sentença ditada pela Corte Marcial do

Forte Bowie, em relação a execução aos

atos praticados pelo Capitão Steve Masters.

— Compreendido, coronel. Cabo da

Guarda, vá e escolte o prisioneiro até aqui

— ordenou o oficial de dia.

Enquanto o cabo se apressava em

cumprir a ordem, o coronel voltou ao seu

lugar, junto aos oficiais. Ao seu lado estava

o Tenente Bolt.

— Fico satisfeito em ver que ele teve um

julgamento justo e uma justa condenação —

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comentou o tenente.

— Sim, Tenente Bolt, eu também me

sinto da mesma forma — respondeu o

coronel, gravemente. — Tenho tolerado

muitas coisas e visto muitas coisas nesta

terra esquecida de Deus. Vejo soldados

bêbados, indisciplinados, criminoso de toda

espécie, escória do norte e do sul, mas

jamais vi algo parecido com esse homem.

Ele supera tudo que abominamos no

Exército. Jamais entenderei como ele

chegou ao posto de Capitão, sendo um

ladrão, desertor e covarde, tudo ao mesmo

tempo — afirmou o coronel, demonstrando

toda a sua indignação.

— Foi uma mancha negra para a

Cavalaria, Senhor. Felizmente foi apanhado

a tempo.

— Por mim ele deveria ser fuzilado,

tenente, apesar das prerrogativas que possui

como oficial e cavalheiro, coisas que ele

desonrou e desprezou. Fico feliz, porém, em

ver que ele será punido também por uma

corte civil, onde o roubo e o assassinato

serão punidos com rigor. Não escapará com

vida, pode apostar nisso.

Um tropel de cavalos, vindo da estrada

que conduzia ao forte interrompeu a

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conversa de ambos. O tenente, empertigado,

virou ligeiramente a cabeça para a sentinela

no alto da plataforma, sobre o portão.

— Cavaleiros se aproximam! — gritou

um das sentinelas ao oficial do dia.

— Pode identificá-los?

— É o xerife e uma patrulha, senhor.

Três homens ao todo.

— Muito bem, soldado! Pode abrir o

portão e deixá-los entrar — ordenou o

oficial em comando.

O Xerife Barnes e dois de seus auxiliares

cavalgaram para o interior do forte,

demonstrando na poeira em suas roupas e

no suor dos cavalos que tinham cavalgado

bem rápido para chegarem a tempo.

Foram amarrar os cavalos diante da

cantina. Havia ali um cocho de água, onde o

xerife, após tirar a capa de viagem coberta

de poeira, lavou as mãos e o rosto,

espantando também, assim, o cansaço e o

sono.

Enquanto caminhava, depois, na direção

do coronel e dos oficiais do forte,

enxugava-se com o lenço que trouxera ao

pescoço.

— Temi não chegar a tempo, coronel.

— Deve ter uma corrida e tanto, não?

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— Sim, cavalgamos à noite, tão logo eu

tomei conhecimento da sentença e da

execução dela. Não esperava que fosse tão

rápida assim...

— Não posso manter esse homem aqui,

no forte, xerife. É péssima influência e

abala o moral da tropa. Quero-o o mais

longe daqui logo que possível.

O xerife voltou a amarrar o lenço no

pescoço. Um murmúrio percorreu os

pelotões perfilados, como uma onda de

inquietação e revolta.

No momento seguinte, escoltado por dois

soldados, tendo à frente o Cabo da Guarda,

o Capitão Steve Masters, da Cavalaria dos

Estados Unidos, era conduzido, da prisão,

para uma posição de destaque junto ao

mastro da bandeira.

O capitão era um homem alto, pele

curtida pelo sol Arizona, forte fisicamente.

Seus lábios finos exibiam um sorriso triste

e, ao mesmo tempo, irônico. Seus olhos

azuis estavam fixos na bandeira que ele

jurara, um dia, honrar, mesmo ao preço de

sua própria vida.

— É impressionante o cinismo dele —

observou o Tenente Bolt, olhando o

acusado.

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Apesar de tudo, o capitão ostentava um ar

de total tranqüilidade, incomodando o

tenente.

— Parece-me tranqüilo demais, embora

as provas contra ele sejam esmagadoras. As

evidências de seus crimes são muito fortes,

não há como ele escapar da punição —

opinou o Xerife Barnes.

O tenente se voltou para olhar o xerife.

Apesar de tudo, o tom do homem da lei

demonstrava uma parente contradição.

— Afirma isso num tom hesitante, xerife.

Parece não acreditar muito no que fala.

Ainda não está certo da culpa dele? —

questionou o tenente.

— Prefiro deixar que o tribunal decida se

ele é culpado mesmo ou inocente. Se for

culpado do assalto e das mortes, será

enforcado, com certeza.

— Não tenho dúvidas disso. O

julgamento militar só podia apreciar seu

caso sob as acusações de deserção e

covardia. Poderia ter outra punição, mas

optamos por esta, sabendo que ele iria

enfrentar a lei dos civis, certamente mais

rigorosa que nós.

— Com certeza — concordou o xerife.

ficou em silêncio, observando a

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cerimônia. Seus sentimentos, porém,

quando a tudo aquilo, estavam evidentes em

sua expressão e no seu modo de comentar o

caso.

Para ele, tudo aquilo era uma farsa. Steve

fora julgado sem uma chance honesta de

defesa. Quando entraram na sala para

enfrentar a Corte Marcial, já sabia que seria

condenado, assim como todos os outros.

O Capitão Steve Masters foi colocado a

meio caminho entre o mastro da bandeira e

o portão do forte. O coronel fez um sinal

para o oficial de dia e este retirou um papel

dobrado do bolso de sua jaqueta.

Abriu-o diante de si e começou a ler em

alto e bom tom. Era o libelo da acusação e a

sentença de expulsão sem honras da

Cavalaria Americana.

Enquanto isso era lido, o Cabo da guarda

ia arrancando as divisas e adereços que

indicavam a patente do capitão. O

condenado enfrentou tudo aquilo com

serenidade, olhos fixos na bandeira que

tremulava no alto do mastro.

— Eu sinto muito, capitão! — murmurou

o cabo, quando retirou a espada da bainha e

a quebrou no joelho, jogando os dois

pedaços na poeira, aos pés do condenado.

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— Faça seu trabalho, cabo! Não se

preocupe comigo — ordenou-lhe Steve,

com bondade.

Os portões do forte foram abertos. Os

soldados da escolta acompanharam o

capitão até lá, onde os dois assistentes do

xerife o esperavam para algemá-lo.

Ordens foram dadas. Os soldados se

dispersaram lentamente, lamentando a

ocorrência. Alguns ficaram ali. Olhando o

ex-capitão, agora cercado pelo xerife e seus

homens. A revolta e a tristeza continuavam

vivas em suas expressões.

— Como se sente agora, Steve? —

indagou-lhe o xerife, verificando se as

algemas estavam bem fechadas.

— Não muito feliz, Barnes.

— Posso imaginar isso...

— Não, Barnes, acho que não pode

imaginar o que seja isso. Ser acusado de

covarde, de desertor, de ladrão e de

assassino, tudo ao mesmo tempo, é coisa

que mexe com a cabeça de um homem.

— Vou lhe dizer uma coisa, Steve. Você

pode não acreditar em mim, mas eu confio

em sua inocência.

— Só que não terei a menor chance de

prová-la, preso como estou. Se me levar à

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cidade, então, serei um homem condenado.

Talvez nem esperem o julgamento para me

enforcarem.

— Eu lamento, Steve, mas nada posso

fazer. Minha obrigação é levá-lo até lá...

— Então fique preparado, xerife. Vai

enfrentar alguns aborrecimentos pelo

caminho. Não pense que isso será uma

viagem tranqüila.

— Por que diz isso?

— Porque aquele maldito mestiço que me

acusou de covarde e desertor não vai

permitir que eu continue vivo para ameaça-

lo. Creio firmemente que alguém o

subornou para que ele e seus capangas

depusessem contra mim.

O xerife pediu aos ajudantes que fossem

buscar os cavalos. A sós de alguma forma,

questionou o...

— Tem alguma idéia de quem possa ter

sido? Talvez eu possa ajudar de alguma

forma, investigando isso...

— Vai ser difícil, Barnes. Tenho alguns

inimigos declarados aqui no forte. Sei que

foi alguém daqui. O motivo, desconheço,

mas tenho minhas suspeitas.

— Está me dizendo que sabe de alguma

coisa que poderia ajuda-lo? Po que não usou

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isso na corte marcial?

— Não se livra de uma acusação

simplesmente acusando outras pessoas sem

provas, Barnes. Tudo não passava de uma

suposição de minha parte.

— Por que não me conta o que

suspeitava?

— Acho que posso confiar em você,

Barnes. Sempre foi mesmo um bom amigo.

Antes de tudo isso acontecer, eu estava

conferindo o arsenal. Faltavam dez caixas

de rifles de repetição novos e muita

munição. Para um homem como Charlie,

isso teria muito valor.

— E relatou isso ao coronel?

— Não houve tempo. Quando viram que

eu dera por falta das armas, já tinham todo o

complô. Eles sabem que eu sei dessas

armas, por isso acho que vão silenciar-me.

Fornecer armas a Charlie é o mesmo que

fornecer aos índios renegados e bandoleiros

mexicanos, todos da mesma lia dele.

Os dois ajudantes chegaram, trazendo os

cavalos. Steve tentou montar no seu, mas as

algemas atrapalhavam. Olhou para o xerife

pateticamente.

— Não pode me livrar destes braceletes,

Barnes? Vai ser difícil cavalgar assim —

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reclamou Steve.

O homem da lei hesitou por instantes,

olhando os soldados afastados, os oficiais

que os observavam no alojamento.

— Eu sinto muito, Steve. Terá de se

acostumar com elas durante a viagem...

O xerife o ajudou a subir para a cela do

cavalo. Depois apanhou a rédea e foi

amarrá-la em sua própria cela. Montou,

então.

— Não vai descasar um pouco, xerife? —

indagou Steve. — Acabou de chegar.

— Tenho pressa em sair daqui, Steve —

disse o xerife, esporeando seu cavalo.

Os sentinelas esperaram que eles saíram,

depois fecharam os portões. Alguns

homens, na paliçada, fizeram uma

continência dissimulada, quando Steve

olhou para trás.

Doía-lhe deixar aqueles homens que

comandara em algumas batalhas e em quem

confiava. Infelizmente nada poderia fazer

agora por eles.

Sua preocupação estava na estrada que

enfrentariam. Lá na frente, em algum ponto,

ele sabia que Charlie e seus renegados

estariam à espera dele.

Seria longe do forte, com certeza, para

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que não ouvissem os tiros da emboscada.

Steve até imaginava qual era o terreno

escolhido para a emboscada.

Quando se aproximavam desta região, já

no fim da manhã, ficou atento, observando

insistentemente o caminho à frente deles,

analisando sua conveniência ou não para

uma emboscada.

— O que há, Steve? — indagou Barnes.

— Posso sentir o cheiro deles, Barnes.

Está no ar — comentou Steve.

— Fiquem alertas, rapazes! — disse ele,

aos dois ajudantes. — Poderemos ter

surpresas pela frente.

— Algum amigo do tenente? —

perguntou Peter, um dos ajudantes.

— Antes fosse, Peter. Antes fosse... E ele

é um capitão!

— Quem mais teria interesse no capitão,

então? — questionou o outro auxiliar, cujo

nome era Mark.

— Tem alguma coisa nesta historia que

não está cheirando bem, rapazes — afirmou

o xerife, estudando com cautela o terreno a

diante.

— Por que diz isso? — quis saber Peter.

— A acusação em si, sem sentido para

um homem com seu histórico militar, as

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testemunhas que foram aceitas no caso e

uma porção de outras coisas.

— Está querendo dizer que ele é

inocente, então?

— Sim, Mark. Tenho fortes razões para

crer que tudo não passou de uma trama para

incriminá-lo.

— E conseguiram. Transformaram-no em

um renegado agora.

— É, conseguiram. Só que covardia e

deserção são coisas que não cabem na

figura de Steve Master. Eu o conheço há

muito tempo. É um homem de fibra.

— Mas ele perdeu cinqüenta homens

naquela batalha e só ele escapou com vida,

fugindo — adiantou Peter.

Steve acompanhava a conversa deles sem

intervir. Mantinha-se atento às rochas e

árvores do caminho. Tinha certeza de que

seriam emboscados e queria estar preparado

para isso. O que diziam ou deixavam de

dizer a respeito dele já não lhe importava

mais. O que tinha de ter acontecido, já

acontecera. Precisava agora manter-se vivo.

— Apenas Charlie e sua corja de bêbados

pode testemunhar sobre o que aconteceu lá.

Juraram que viram o capitão se escondendo

e depois fugindo, enquanto seus homens

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eram chacinados. Apenas o Exército mesmo

para acreditar em alguém como Charlie,

rapazes — falou o xerife, esporeando um

pouco seu animal para emparelhá-lo com o

de Steve, que ia um pouco mais à frente.

Percebeu que ele tinha os olhos fixos

numa pequena colina logo à frente, ao pé da

qual passariam. Havia rochas e árvores por

ali. Algo ali chamando a atenção do ex-

militar. Pareceu-lhe ter visto o brilho de

uma arma, refletindo o sol que, naquele

instante, encontrava-se quase a pino.

— Livre-me destas algemas e dê-me uma

arma, xerife — pediu Steve.

— Não posso, Steve. O que viu?

— Havia alguém naquela colina a nossa

frente. Rápido, estamos muito perto. Dê-me

uma arma, então.

— Não vejo nada...

— Eu vi um reflexo. Deve ser uma arma.

Com certeza é uma emboscada.

— Eu cuidarei disso — falou Barnes.

— Tire-me isto, Barnes, por favor! —

suplicou Steve, certo do perigo que os

rondava.

Não queria morrer sem lutar, amarrado

como um porco e sem poder se defender.

— Você é um prisioneiro, Steve, sei que

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isso o desagrada tanto quanto a mim, mas

terá de se acostumar com a idéia — falou o

xerife, com firmeza. — Quando e se sua

inocência for comprovada, eu terei o maior

prazer em livrá-lo de toda e qualquer cadeia

que o prenda.

— Se houver tempo para isso...

Em resposta aos temores de Steve, um

tiro ecoou na planície deserta, vindo

daquela colina fatídica. Mark, o auxiliar que

vinha um pouco mais atrás, caiu para trás

com os olhos esbugalhados e a testa

afundada por uma bala.

— Protejam-se— gritou o xerife, sacando

sua arma e atirando-se do cavalo.

Steve e Peter fizeram o mesmo.

— Somos alvos fáceis aqui — advertiu

Steve. — Temos que tentar sair.

Novos disparos espantaram os cavalos.

Steve tentou segurar um deles, mas

atrapalhou-se com as algemas. Ainda assim,

conseguiu agarrar a coronha de um rifle na

sela e puxá-lo.

Rolou para junto dos outros.

— Quantos homens calcula que estejam

lá, Steve? — indagou o xerife, livrando-o

das algemas.

As palavras foram abafadas por um

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saraivada de balas que levantavam poeira

no atingir o chão e zumbiam tetricamente ao

rebater-se nas rochas.

— Já contei cinco — disse Steve. —

Podem haver mais por aí, contornando-nos.

— Demônios! Sem cavalos e sem água,

sob esse sol, não será fácil suportar por

muito tempo. Ele tem tudo na mão e podem

esperar até que nos desesperemos —

comentou Peter.

Steve já havia analisado toda a situação

rapidamente. Sua habilidade militar e

estratégica agia naturalmente, por hábito,

em situações como aquela.

— Posso tentar chegar até aquela ravina e

procurar pegá-los por trás, xerife — disse o

ex-capitão.

— Talvez eu possa fazer isso melhor,

xerife. Sou mais rápido — falou Peter.

— Quer tentar? Acha que tem uma

chance?

— Se eu não conseguir, ninguém mais

consegue, xerife — firmou Peter, com

convicção.

O xerife e Steve começaram a disparar

ininterruptamente na direção da colina.

Peter correu velozmente na direção da

ravina. Antes que a alcançasse, porém, uma

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bala atingiu-o na coxa, fazendo-o rolar na

poeira.

Ele tentou se levantar, mas caiu de

joelhos, a poucos metros da ravina.

Os homens na colina mão o perdoaram.

Puderam mirar com calma e crivá-lo de

chumbo. As balas penetraram em suas

costas com um ruído desagradável,

jogando-o de boca na terra. O sangue

banhou suas costas.

— Diabos! — praguejou Barnes, furioso.

— Ele quase conseguiu...

— É minha vez agora, xerife. Vou tentar

chegar à ravina também...

— É loucura, Steve. Você viu o que

aconteceu com o Peter. Ele era mais jovem

e mais rápido que você.

— Peter podia correr mais do que eu, mas

eu ainda me desvio das balas melhor que

qualquer um.

— Está bem, não temos outra saída

mesmo. Vá, eu lhe darei cobertura.

— Prepare-se! — ordenou Steve —

Agora!

O xerife começou a disparar furiosamente

na direção da colina, sabendo que aquilo

dependiam suas vidas. Steve correu na

direção ravina.

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No meio do caminho, porém, percebeu

que o xerife para de atirar.

— Acabou a munição do rifle — gritou o

homem da lei.

Steve não tinha outra escolha. Retornar

ou seguir em frente, ofereciam o mesmo

perigo. A ravina, no entanto, poderia ser a

única chance dos dois.

Barnes abaixou-se atrás da pedra,

remuniciando a arma. Steve deu o máximo

de si, correndo, sentindo as balas cravando-

se no chão, próximo de seus pés.

A distância diminuiu consideravalmente.

Ele julgou que conseguiria chegar a salvo,

mas enganara-se.

Quando estava prestes a atingir a ravina,

uma bala rasgou-lhe as carnes do lado

direito do ombro, fazendo-o cair e rodopiar

na poeira.

O xerife praguejou furiosamente, ao ver

Steve tombar na poeira e ficou imóvel. O

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tiroteio vindo da colina cessou.

— Você está bem, Steve? — gritou ele.

O silêncio foi a resposta.

— Malditos! — exclamou o xerife,

voltando a erguer-se e a disparar

sucessivamente sua arma contra a colina.

Neste momento aproveitando-se da

distração provocada pelo xerife, Steve

encontrou forças para capengar até a ravina,

rolando para dentro dela.

— Steve! — gritou o xerife, ao perceber

que ele conseguira chegar até lá.

— Estou ferido — gritou o ex-capitão,

bem alto. — Não posso ir adiante... Estou

sangrando... Vou morrer aqui...

— Inferno! — exclamou o xerife,

sentindo-se como um rato em uma ratoeira.

Nova saraivada de balas levantou poeira

ao seu redor. Projéteis ricocheteavam as

pedras, provocando um ruído incômodo e

macabro.

Ele abaixou-se, tentando pensar em algo

que pudesse tirá-lo dali. Os tiros cessaram e

uma voz rouca e grave gritou-lhe:

— Xerife Barnes, vamos fazer um trato.

Posso poupar-lhe a vida, se me entregar o

prisioneiro.

O xerife não teve dúvidas. Aquela era a

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voz conhecida e inconfundível de Charlie, o

mestiço. Falando daquela forma, sabia que

seria reconhecido, portanto, mesmo que o

homem da lei entregasse Steve a ele, sabia

que não iria sair dali com vida. Barnes

jamais deixaria uma testemunha,

principalmente o xerife.

— Que garantias tenho que cumprirá sua

promessa — perguntou o xerife, pensando

no que fazer naquela situação.

— Nenhuma. Terá que confiar em mim.

É sua única chance de sair daqui com vida.

— Deixe-me pensar por alguns instantes

— pediu o xerife, percebendo que Steve

estava conseguindo, apesar de seu

ferimento, caminhar pela ravina e contornar

a colina.

— Seu tempo já se esgotou, xerife. O que

decidiu?

— Steve está ali, naquela ravina,

praticamente morto. Mande-me um cavalo e

eu darei o fora daqui. Você poderá fazer o

que quiser com ele...

— Trato feito, xerife!

Um cavalo apareceu do outro da colina,

sendo enxotado na direção do xerife.

Galopou, porém, até parar no meio do

caminho, entre os emboscadores e o xerife.

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Barnes sabia o risco que corria, mas

precisava fazer o máximo para dar a Steve

tempo de encurralar os atiradores.

Levantou-se lentamente e caminhou na

direção do cavalo.

Steve já sumira de vista. Havia

contornado a colina e subia por trás dos

pistoleiros. Barnes percebeu que poderia

pôr o cavalo entre ele e os seus agressores,

usando-o como escudo, quando chegasse o

momento certo.

Se o fizesse, teriam os emboscadores

entre dois fogos, invertendo a situação.

— Pare aí mesmo, xerife! — ordenou

Charlie. — Tem certeza que Steve está

mesmo ferido na ravina?

— Deve estar morto agora...

— Então não precisamos mais de você.

Nosso trato está desfeito — afirmou

Charlie, engatilhando sua Winchester.

Barnes percebeu a armadilha tarde

demais. Tentou correr na direção do cavalo,

mas diversas balas penetraram em seu

corpo, fazendo-o cair em plena corrida e

rolar na poeira.

Steve, que havia terminado de subir a

colina sorrateiramente, olhou para os cinco

homens a sua frente.

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Percebeu a armadilha vitimando o seu

amigo, xerife.

— Charlie, seu maldito! — gritou, fora

de si, ao perceber o crime cometido.

O mestiço, advertido pelo grito de Steve,

rodopiou como um felino por entre as

pedras, escapando das balas que Steve lhe

endereçou.

A dor, a fraqueza e o cansaço tiravam do

ex-capitão a destreza e a portaria. Viu um

dos homens e atirou nele, conseguindo

acertar em cheio.

— Cometeu um erro, soldadinho —

gritou-lhe Charlie, com ironia e zombaria.

— Avisou-me de sua presença. Deveria ter

atirado antes e me amaldiçoado depois.

— Não importa como, Charlie, mas vou

matá-lo, nem que isto me custe a vida —

respondeu Steve, levantando-se para atirar.

Sentiu a vista turva e uma vertigem

inesperada abalar seu corpo. Não sabia em

que direção atirar, totalmente atordoado. O

esforço fora demais para a gravidade de seu

ferimento, que continuava sangrando.

Os pistoleiros aproveitaram a chance.

Duas novas balas o acertaram em cheio,

atirando-o de costas e fazendo seu corpo

rolar encosta abaixo.

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— Acho que isso o liquida de uma vez

por todas — disse Charlie.

— Quer que a gente vá verificar se ele

está mesmo morto? — indagou um deles.

— Ele já estava morrendo quando o

acertamos de novo. Deixem-no lá. Se as

balas e a queda não o mataram, o sol e os

abutres o farão. Vamos embora, temos um

pagamento para receber, homens — decidiu

ele.

— E o Hernandez? O soldado o matou...

— Deixem-no aí, não me serve para mais

nada mesmo. Vamos embora daqui. Estou

louco por um gole.

Os quatros homens montaram e

cavalgaram na direção do Forte Bowie.

Após algumas horas, chegaram e se

dirigiram direto para a cantina.

Os soldados, aos perceberem a presença

deles, sentiram-se incomodados e

enfurecidos. Todos acreditavam na

inocência de Steve e sabiam que Charlie era

um bandido.

— Olá, Tenente Bolt — cumprimentou-o

Charlie, indo até o militar.

O tenente estava sentado numa das mesas

a um canto, afastado do balcão. Tinha uma

xícara de café a sua frente e pareceu muito

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contente com a chegada de Charlie e seus

homens.

— Olá, Charlie! Como vão as coisas?

— Não posso reclamar de nada, Tenente.

— Por que não se senta um pouco? —

convidou o militar e, assim que o

bandoleiro se sentou, o tenente continuou:

— Tudo resolvido?

— Sim, nós o pegamos — informou

Charlie, no mesmo tom de confidência do

outro. — Está morto, agora, servindo como

pasto para os abutres.

— Ótimo, Charlie! — exclamou o

tenente, tomando um pouco de seu café.

— Bem, só nos falta agora receber o resto

do pagamento — cobrou o bandido.

— Vai encontrar tudo aqui — disse o

tenente, depositando sobre a mesa uma

pequena bolsa índia feita de couro.

Charlie abriu uma ponta e examinou as

notas em seu interior. Sorriu satisfeito.

— Tem uma coisinha a mais, tenente.

— Sim, Charlie?

— Preciso de mais dez caixas de rifles e

de mais munição também.

— Está maluco! É impossível, não

perceber? O trato foram dez caixas e mil

dólares, nada mais do que isso.

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O bandoleiro sorriu, reclinando-se em sua

cadeira. Atrás deles, os seus pistoleiros

acompanhavam a conversa. No outro

extremo do balcão, os soldados olhavam

naquela direção com raiva e desejo de

vingança.

— Não tem escolha, tenente! Agora está

em minhas mãos. Se não me der o que estou

lhe pedindo, denunciarei seu plano ao seu

comandante.

— Não pode fazer isso. Arruinará toda a

minha carreira. Não fiz tudo isso para ser

traído agora! — rugiu o tenente, lívido de

ódio.

— Então dê-me o que estou pedindo. São

apenas mais dez caixas e alguma munição.

Sei que o Forte Bowie está estocando armas

para todos os fortes da fronteira. Ninguém

dará pela falta de uma quantidade tão

pequena de armas... Não farão falta à

poderosa Cavalaria dos Estados Unidos.

O Tenente Bolt procurou se controlar.

Havia cometido uma bobagem ao confiar

num elemento tão desqualificado como

Charlie. Precisava, antes de mais nada,

mantê-lo calado, enquanto pensava num

modo de tirá-lo de seu caminho.

— Está bem, seu tratante! Ainda vale a

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pena, pelo favor que me fez. Verei o que

posso fazer...

— Quando?

— Que tal amanhã cedo? Eu deixarei as

caixas no mesmo local da outra remessa. O

que me diz?

— Para mim parece bom, mas há um

pequeno problema...

— Qual, diabos?

— Preciso dessas armas hoje à noite

mesmo. Amanhã quero estar no México,

onde ficarei por um bom tempo, meu

amigo. Essas armas me darão muito

dinheiro lá.

— Certo, certo! — respondeu Bolt, com

irritação. — Você os terá hoje mesmo.

Charlie sorriu, agradeceu e saiu, seguido

de seus capangas. O tenente ficou olhando

até que eles deixassem a cantina, depois

levou a xícara nos lábios. Fez uma careta e

cuspiu fora.

— Demônios, King! Traga-me outro

café. Este aqui está tão frio quanto o seu

traseiro, seu idiota!

O soldado encarregado da cantina correu

providenciar o pedido do tenente. Todos

estranharam a reação de fúria do tenente,

mas calaram-se. Era um oficial superior.

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— Agora vá buscar o Cabo Storm.

Preciso falar com ele imediatamente,

entendeu.

— Sim, tenente!

Após ter feito rapidamente a continência,

o soldado deixou a cantina, retornando,

pouco mais tarde, na companhia do Cabo

Storm.

— O que houve, tenente? — indagou o

cabo, percebendo que o oficial parecia

transtornado.

— Sente-se, cabo — ordenou o outro. —

Aquele maldito mestiço está dando um de

espertinho...

— Não matou o capitão?

— Pelo contrário, fez o que eu tinha

ordenado. Steve Master está morto agora,

mas Charlie está querendo mais dez caixas

de rifles e mais munição.

— Maldito patife! Mais dez caixas? O

que ele pretende? Iniciar outra revolução?

— Vai armar os bandos da fronteira, só

isso. Ele venderá, em troca de ouro, só isso.

— De qualquer forma, não temos

escolha, não? — afirmou o cabo.

— Pelo contrário, cabo. Estou pensando

em não dar os rifles a ele. Prefiro preparar-

lhe uma bela surpresa. Avise nosso pessoal

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para se preparar para a ação. Falarei com

vocês depois. Agora preciso ir ver o

coronel. Estou esperando ansiosamente uma

noticia que ele deve ter recebido e que nos

interessa.

— Aquilo? — indagou o cabo, em

suspense.

— Possivelmente.

— Ótimo, senhor! — respondeu o cabo,

levantando-se, batendo continência e

saindo.

Bolt terminou seu café, depois se dirigiu

até o comando do forte. Sentia-se seguro de

si e esperançoso quanto ao resultado de seus

planos.’

Se tudo corresse perfeitamente, em breve

seria um fazendeiro rico no México, livre

para sempre de todas as atribulações e

preocupações.

Um soldado cortou-lhe o caminho,

ficando em posição de sentindo.

— O que deseja, soldado? — perguntou,

surpreso, respondendo à continência do

outro.

— Senhor, sabe como os homens aqui do

forte gostavam do Capitão Masters. Nós...

Bem... Ninguém aqui engoliu muito aquela

historia e...

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— Vamos logo ao ponto, soldado. O que

tem a me dizer?

— Na verdade, ninguém acredita que ele

foi culpado daquelas acusações. Todos o

conhecíamos e sabíamos de sua coragem e

sua capacidade...

— E daí?

— Daí, senhor... Bem... Charlie e seus

bêbados estão aqui no forte. Deixe-nos

cuidar deles. Prometo que se os levarmos

até o estábulo vamos arrancar deles toda a

verdade...

O rosto do tente demonstrou

contrariedade e rigor.

— O que é isso, soldado? percebe o que

está me dizendo? Está questionando o

resultado de uma Corte Militar? Cuidado,

muito cuidado com o que diz e com o faz.

Charlie e seus homens são civis e, enquanto

estiverem neste forte ou fora dele, estarão

sob nossa proteção. Não quero que nada

aconteça a eles, entendido? Se eu tomar

conhecimento de qualquer ação que vá

contra estas minhas ordens, você será o

primeiro a ser levado a uma Corte Marcial

por desobediência, entendido mesmo?

— Entendido, senhor! Desculpe-me,

senhor! — respondeu o soldado,

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visivelmente contrariado com a conversa.

Bolt, pelo contrário, percebia como os

homens pensavam e reagiam ao que Charlie

havia feito. Um plano começava a se

delinear em sua mente.

Se tudo corresse bem, Charlie deixaria de

ameaçá-lo para sempre. Assim pensando,

rumou para a sala de comando. Estava

muito ansioso pela noticia que já deveria ter

chegado.

Joe Pena Branca era uma velha ratazana

do deserto, um índio sem tribo, renegado

em sua juventude por se indispor com o

cacique de sua tribo. Quando podia

distender a corda de uma arco, ele

infernizara metade do Arizona com sua

corja de fora-da-lei índios e mestiços.

Agora velho, vivia de pequenas

pilhagens, como um coiote, aproveitando-se

de despojos para continuar a viver. Ao

encontrar aqueles três cavalos soltos e

selados na planície, recolheu-os e seguiu-

lhes a trilha.

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Havia ouvido o tiroteio e sabia que

alguma coisa poderia ser aproveitada.

Encontrou os mortos. Retirou-lhes as

armas, chapéus e tudo que pudesse ser

vendido ou transformado em comida em

trocas com outros renegados como ele.

Quando pretendia se afastar, percebeu um

vulto que se arrastava pela encosta da

colina. Pelas roupas, deduziu que era um

soldado. Foi até lá, sem muita pressa,

arrastando o velho esqueleto. Quando se

debruçou para olhar melhor, o ferido girou

o corpo e ficou de cara para o sol, ofegante

e banhado de sangue.

— Capitão Master! — reconheceu o

velho.

— Joe, que satisfação ver sua cara feia,

seu malcheiroso! — balbuciou o homem

que o velho reconhecera. — O que faz por

aqui?

— Ouvi os tiros... Está muito mal,

capitão! O que houve? Ouvi muitos tiros...

— É uma historia complicada para contar

agora, Joe. Preciso de sua ajuda... Estou

muito ferido mesmo.

— Eu vou cuidar de você, Capitão. Vou

levá-lo para a minha toca e cuidar desses

ferimentos. Posso contar três buracos de

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bala no seu couro.

— Terá de fazer uma maca, meu velho.

Não tenho forças para cavalgar...

— Não se preocupe. Ainda sei como

fazer essas coisas, capitão. Vou levá-lo em

segurança e confortavelmente.

O velho índio não teve dificuldades para

arrumar dois galhos longos e prendê-los no

lombo de dois cavalos. Com uma das

mantas, improvisou a maca, presa aos

varais, entre os animais.

Uma hora mais tarde chegavam ao

esconderijo do velho, numa encosta, à beira

de um regato. Joe aplicou alguns

medicamentos índios nas feridas, mas sabia

que elas não poderiam curar Steve. Uma das

balas havia lhe varado as costelas e saído do

outro lado, mas duas outras ainda estavam

dentro dele.

— Medicina de Joe Pena Branca é boa,

mas não fará balas caminharem para fora de

seu corpo, capitão. Joe não sabe como tirá-

las daí sem cortar demais...

— Ainda bem que você não é curandeiro

fanático, Joe, senão eu estaria morto em

suas mãos. Mas se as balas ainda estão aqui,

vai ter que tirá-las de qualquer jeito... —

falou Steve, percebendo que não tinha

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escolha.

— Não, Joe não fará isso, capitão.

Melhor chamar o Dr. Kane, lá no forte.

— Não, Joe, você não deve ir ao forte.

Ninguém mais deve saber onde estou.

Poderia ser o meu fim.

— Joe não tem escolha. Vai ter que

chamar o doutor ou ver o capitão morrer...

— falou o velho, decidindo-se.

Apesar dos protestos do ex-capitão, o

velho índio saiu. Nas condições em que se

encontrava, nada restou a Steve senão

esperar, a sua volta.

Algumas horas mais tarde Joe retornou

com o Capitão Kane, médico do

destacamento. Steve estava fraco, mas não

tivera febre. A medicina de Joe Pena Branca

funcionava em alguns casos.

Ao reconhecê-lo, o médico hesitou. Sabia

que Steve era um homem condenado por

uma Corte Marcial e entregue à Justiça

comum. Naquela situação, seu dever como

militar era dar-lhe voz de prisão.

Ele, no entanto, como muitos outros, não

acreditavam na culpa do capitão.

— Como se sente, Steve? — indagou,

abrindo os curativos que Joe fizera para

examinar os ferimentos.

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— Sinto-me péssimo, capitão... Mas

antes de mais nada, preciso de sua

discrição... Prometa-me que não revelará

que me viu aqui, com vida.

— Diabos, Steve! Minha posição é

delicada...

— A minha também, Kane, mas eu lhe

contarei a minha versão agora, enquanto

você me arranca essas duas balas que ainda

tenho comigo.

— Está bem! Beba uns bons goles deste

uísque medicinal. Vai amenizar a dor —

receitou o médico.

Steve o atendeu, deixando que a bebida o

entorpecesse. Enquanto o médico retirava as

balas ele contou tudo que se passara na

verdade.

Às vezes interrompia a narrativa, e

ofegava, pela dor violenta que sentia.

— Joe, faça uma boa fogueira e esquente

aquele ferro ali — disse o médico,

apontando para um sabre partido ao meio,

cravado na terra.

— Retirou as balas, doutor? — quis saber

Steve.

— Não, mas já as localizei. Estou num

dilema, meu amigo. Posso matá-lo se tentar

tirá-las... Ou deixá-lo morrer se não o fizer.

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Um pouco de movimento de sua parte e elas

atingirão uma artéria.

— Vamos lá, doutor. Não deve ser tão

difícil assim — incentivou o ex-militar.

Joe entendeu o que estava acontecendo.

Tratou de fazer logo uma fogueira, ponto a

lâmina partida no meio das chamas.

Gradativamente ela foi ficando rubra.

— Tome mais um pouco disso — falou o

médico, passando-lhe a garrafa de uísque.

A bebida era fortíssima e era usada como

anestésico, pela sua alta concentração de

álcool.

— Vai doer tanto assim? — indagou

Steve.

— Acho que sim, não imagino o quanto.

Quer saber o que será feito?

— Já o vi em ação antes, doutor. Vai

pinçar a bala e cauterizar a ferida com a

lâmina quente, não?

— Sim, será a única forma de afastar

qualquer possibilidade hemorragia. Depois

que eu o costurar, se você sangrar estará

certo de um modo terrível e doloroso.

— Certo, doutor. Você tem o diploma.

O médico olhou na direção de Joe, que

levantou o sabre. A lâmina ainda não estava

totalmente rubra. Podiam esperar um pouco

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mais. Havia pinçado a artéria que poderia

provocar um sangramento maior, mas teria

de liberá-la no momento da retirada da bala.

Tentou distrair Steve.

— Ainda não entendi que razões tinha

Charlie para matá-lo, capitão.

— A mesma razão que teve para

apresentar um falso testemunho contra mim.

Só que não sei o que o levou a isso.

— Isso é estranho, muito estranho.

Charlie está lá no forte agora, como se nada

tivesse acontecido.

— Ele entrou em contato com alguém?

— Não que eu tenha visto, por quê?

O médico fez um sinal para o índio, que

retirou o sabre das chamas e o levou até

perto do médico. Ele havia prendido a bala

com uma pinça. Puxou-a de uma vez,

depois, com rapidez, introduziu o sabre na

ferida.

Steve urrou de dor, enquanto Joe o

segurava pelos braços. Imediatamente o

outro ferimento começou a sangrar. O

médico não perdeu tempo. Pinçou a bala e

repetiu a operação. Steve havia desmaiado

de dor.

— Isso facilita tudo, Joe — concluiu o

médico, observando as feridas.

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— Joe, ele vai ter que ficar aqui por

algum tempo. Vou lhe mostrar como trocar

esses curativos. Venha até aqui.

O médico explicou detalhadamente tudo

ao índio. Quando terminou, o índio o olhava

com incredulidade.

— Medicina de Joe não é tão

complicada...

— A medicina de Joe salvou a vida do

capitão. A minha medicina vai ajudá-lo a se

recuperar. Mas isso será possível se você

me ajudar...

O índio pensou por instantes.

— Está bem, eu faço isso — concordou.

O médico aguardou algum tempo, até que

o ferido recuperasse a consciência.

— Como se sente?

— Mal, muito bem.

— Então está normal. Por que você me

perguntou se Charlie tinha entrado em

contato com alguém?

— Tenho razões para crer que ele vai se

encontrar com alguém lá. Por favor, Kane,

vigie-o e veja o que descobre. Não posso

exigir nada, mas sou inocente e preciso de

toda a ajuda de que puder dispor. Preciso de

uma chance para provar a minha inocência.

O Xerife Barnes era o único que poderia me

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ajudar, após aquela emboscada, mas está

morto agora e não poderá testemunhar

contra Charlie e seus ratos...

— Tudo bem, Steve, não se exalte. Vou

ajudá-lo. Nunca acreditei naquele mestiço

mesmo.

— Mandarei Joe amanhã cedo ao forte.

Transmita a ele o que descobrir.

— Farei isso, mas é bom que você

repouse. Não queria ser valente demais. Os

ferimentos foram sérios e você perdeu

muito sangue. Vai ter que se alimentar bem

e repousar. Darei a Joe alguns mantimentos

amanhã, quando ele for ao forte.

— Obrigado por acreditar em mim, Kane.

— Confie em mim, Steve. Vamos ajudá-

lo a provar sua inocência.

Gradativamente a cidade começava a se

agitar com achegada dos vaqueiros que

vinham dos ranchos próximos da cidade. A

maioria tinha destino certo: O saloon, de

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onde, já no começo da tarde, vinham os

acordes de uma pianola tocando

alegremente.

Lá dentro, o cheiro de bebida e cigarro

era característico daquelas paredes e

assoalho. As mesas já estavam totalmente

cheias, com bebedouros tagarelas ou

jogadores de pôquer.

Kay Gregor, proprietária do saloon, o

melhor de Tucson, desceu lentamente as

escadas, satisfeita com o movimento.

Olhares e comentários elogiosos

acompanharam seus movimentos.

No auge de sua beleza e juventude, Ray

chamava a atenção por onde passava, fosse

no saloon, com um decotado vestido

vermelho ou na rua, com um recatado

modelo de missa.

Foi até o balcão cumprimentar o barman.

— Tudo bem, Joe?

— Sim, patroa. Não esperava um

movimento como este numa tarde de

sábado, principalmente porque não é época

de pagamento.

— O pessoal está curioso. Sabe se o

Xerife Barnes já voltou do Forte Benson?

Penso que isso esteja atraindo toda essa

gente.

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Joe sorriu, balançando a cabeça de um

lado para outro. Sabia que o interesse dela

não era pelo xerife, mas pelo Capitão

Master. Todos que freqüentavam o saloon

sabiam de sua afeição pelo Capitão da

Cavalaria.

— Ainda não voltou, patroa. Eu a

avisarei quando souber de alguma coisa.

— Obrigada, Joe!

Deu alguns passos ao longo do balcão,

olhando para a mesa ao fundo, onde alguns

homens jogavam pôquer pesado, com altas

apostas.

— Estou com sorte hoje! — ouviu um

dos jogadores exclamar, num tom de voz

mais alto.

Caminhou até lá, distribuindo sorrisos e

esquivando-se agilmente das mãos que se

estendiam a sua passagem, tentando segurá-

la ou fazê-la sentar nas mesas.

— Vejo que está mesmo com sorte,

Carlson — observou ela, notando a aposta

alta na mesa e uma quadra de sete nas mãos

de Carlson.

— Realmente estou com muita sorte,

Kay. Além de estar ganhando no jogo, sei

que logo aquele renegado será enforcado e

isso me dará alguma chance com você.

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Kay empalideceu ao ouvir aquilo. Suas

mãos se crisparam, mas ela procurou manter

a calma. Seu desejo era sacar a arma que

trazia oculta e meter uma bala na boca suja

e grande se Carlson.

— Como pode ter tanta certeza de que ele

será mesmo enforcado? Acaso sabe de

alguma coisa que nós não sabemos? Ele

ainda nem foi julgado.

— Steve Master é um renegado maldito.

Se o Exército o condenou, a justiça civil

também o fará. Em breve vamos vê-lo

balançando na ponta de uma corda. Então

nada nem ninguém ficará entre nós,

querida!

— Não esteja tão certo de suas chances,

Carlson. Eu posso não aprová-las.

— Como não? Quer ver como anda a

minha sorte? Vou apostar quinhentos

dólares nesta mão. Verá como eles correrão

como coelhos assustados — disse o jogador,

sorrindo com superioridade, atirando quase

todo o resto de suas fichas no meio da mesa.

Seus adversários suspiraram, tentando

descobrir se aquilo não passava de um

blefe. Após alguns instantes, porém,

percebendo que Carlson se mantinha com

aquele sorriso de triunfo nos lábios, um a

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um foram atirando suas cartas na mesa, com

uma praga, até que restou apenas um

forasteiro.

O desconhecido, até então, não havia

ganhado nem perdido. Parecia estar apenas

esperando uma chance de ganhar uma

bolada, num golpe que valesse a pena.

— Seus quinhentos... — disse ele,

atirando as fichas no meio da mesa.

Depois, começou a separar e contar as

fichas que ainda tinha consigo.

— E mais mil dólares! — acrescentou,

empurrando as fichas para junto das outras.

Um murmúrio percorreu as pessoas que

assistiam ao jogo. O sorriso morreu nos

lábios de Carlson. Ele examinou o rosto do

forasteiro, depois as próprias cartas.

— Jeff, pegue mais mil dólares no banco

e traga-o agora mesmo...

— O banco está fechado, Carlson!

— Mande abrir! — ordenou ele, furioso,

sempre olhando o forasteiro nos olhos.

O homem alto e forte, com o chapéu

caído até os olhos, não piscava nem movia

um músculo. Seus olhos, de um azul quase

cinza, mantinham-se fixos nos de Carlson.

Kay fez um sinal para o barman, que se

apressou em servir alguns drinques. O

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forasteiro agradeceu com um sorriso,

entornando seu uísque de uma vez. Jeff

chegou logo depois, esbaforido, com as

notas na mão.

Carlson as apanhou, atirando-as na mesa.

— Vamos ver como anda sua sorte,

forasteiro, ou se deu uma terrível mancada

blefando contra mim — falou o jogador.

— Estou curioso para ver a sua também

— respondeu o seu adversário.

— Quadra de setes — falou Carlson, com

um sorriso zombeteiro, estendendo os

braços para recolher a bolada a sua frente.

Um pulso forte segurou sua mão direita,

torcendo-a e empurrando-o para trás.

— Não tão depressa — falou o forasteiro,

sem alterar o tom de voz.

Surpresa, Carlson empalideceu. Jamais

alguém ousaria falar e agir daquela forma

contra ele.

— O que há, forasteiro? Não gosta de

perder? — indagou, percebendo que Jeff,

seu capanga, já estava com a mão direita

descansando na coronha do Colt.

— O jogo ainda não acabou. Quer ver as

minhas cartas primeiro? — perguntou o

forasteiro, começando a depositá-las uma a

uma na mesa.

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— Quadra de dez! — exclamaram as

pessoas ao redor.

Kay sorriu com satisfação, percebendo

que Carlson acabava de levar uma surra no

jogo, perdendo uma boa quantia. O

forasteiro, sem se alterar, começou a

recolher a mesa.

Carlson olhou ao seu redor, furioso.

Notou o sorriso de Kay, entendendo aquilo

como zombaria.

— Não estará tão alegre quando o seu

capitão for enforcado, Kay — disse

Carlson, com rancor.

— Poupe-me de suas previsões

pessimistas, Carlson!

— Virá se arrastando a meus pés quando

ele morrer.

— Jamais!

— Verá que uma prostituta cara como

você não encontrará alguém que pague seu

preço, exceto eu — falou ele, com

arrogância.

Em resposta, Kay o esbofeteou

violentamente, marcando o rosto dele com a

palma de sua mão. Carlson ficou imóvel por

instantes, aturdindo ainda, depois reagiu,

desferindo uma violenta bofetada, com as

costas da mão, no rosto da garota,

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derrubando-a sobre uma das mesas ali perto.

Carlson não soube exatamente o que

aconteceu em seguida. Apenas sentiu o

baque de uma pesada mão em seu ombro,

agarrando-o e fazendo-o girar.

Em seguida, um punho fechado o atingiu

violentamente no queixo e a luz do sol se

apagou para ele, que desabou pesadamente

no assoalho.

— Não devia ter feito isso — falou Jeff,

tentando sacar a arma.

O forasteiro foi mais rápido, segurando-

lhe o braço, ao mesmo tempo em que

sacava seu Colt e desferia poderosa pancada

no alto da cabeça do outro, derrubando-o ao

lado de Carlson.

— Detesto homens que batem em

mulheres — acrescentou o forasteiro,

percebendo que Carlson começava a se

levantar.

Aplicou-lhe um formidável pontapé na

cabeça, fazendo-o rolar desacordado.

Carlson era chefe de um bando de

cocheiros encarregados das diligências da

Arizona Horselines, que formavam um

grupo fechado e forte na região, pois

ninguém era admitido sem sua autorização.

Assim, quando ele foi chutado daquela

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forma, três outros cocheiros ali presentes

avançaram sobre o forasteiro, dispostos a

estraçalhá-lo.

— Cuidado, forasteiro! — gritou Kay,

recuperando-se, ainda aturdida, da bofetada.

— Obrigado, dona! — respondeu o

estranho, enquanto atingia a testa do

primeiro com uma garrafa.

O homem urrou, enquanto o sangue

escorria, misturando ao uísque.

O segundo cocheiro avançou mais furioso

ainda, mas imobilizou-se ao receber um

pontapé no estômago que lhe tirou o fôlego.

Antes que percebesse o que estava

acontecendo, o joelho do forasteiro subiu

para atingir em cheio a sua cara, jogando-o

de costas.

O terceiro estremeceu, quando uma

cadeira foi arrebentada em sua cabeça. O

sangue começou a escorrer, manchando sua

camisa. Ele oscilou. O forasteiro completou

o serviço, esmurrando-o no queixo o pondo-

o para dormir.

— Deve-me um dólar pelo uísque e dois

pela cadeira — disse Kay, com um sorriso.

— Eles pagarão — respondeu o

forasteiro, abaixando-se para se livrar de

uma cadeira que passou voando por cima de

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sua cabeça.

Agilmente se desviou de um homem que

tentava atingi-lo com uma garrafa. Em

resposta, apanhou um lampião na parede ao

lado dele e arrebentou-o nos dentes do

outro.

— Mais um dólar! — gritou Kay, que

fora se refugir atrás do balcão.

— Deixem-no para mim — pediu

Carlson, levantando-se com a cara inchada e

os olhos injetados de tanta raiva.

Quatro homens encurralaram o forasteiro

num dos cantos do saloon.

— Que tal fazermos as pazes, amigos? —

brincou o forasteiro, de bom humor.

— Para o inferno com você — rugiu

Carlson, cuspindo sangue. — Não sairá

daqui com vida.

Os quatros homens avançaram a um

sinal. Um pontapé tirou o bom humor do

forasteiro, atingindo-o nas costelas e

jogando-o sobre uma das mesas.

— Diabos! — exclamou ele, furioso.

Apanhou a mesa e usou-a como um

escudo para investir contra seus atacantes,

derrubando-os. Possesso, passou a distribuir

socos e pontapés com uma violência

incomum, até que não restasse mais nenhum

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dos atacantes em pé.

O forasteiro estava ofegante, com os

punhos manchados de sangue.

— Cuidado! — gritou uma voz feminina.

Instintivamente atirou o corpo para o lado

e sacou sua arma. O cocheiro que havia

recebido um golpe no inicio da briga se

recuperara e resolvera atirar contra seu

agressor.

Antes de tocar o assoalho, o forasteiro já

havia disparado duas vezes. Quando a

fumaça se dissipou, o cocheiro estava

parado, pálido, com as mãos no peito,

tentando estancar o sangue que escorria por

entre seus dedos.

Com uma expressão de terror nos olhos

arregalados ele caiu de joelhos.

— Fui baleado! — murmurou ele e caiu

de cara no assoalho, morto.

O forasteiro se levantou. Apanhou uma

garrafa de uísque caída de uma das mesas

durante a briga, arrancou a rolha com os

dentes e derramou o líquido sobre sua mão

direita e depois, na esquerda. Enxugou-as

numa toalha de mesa.

Depois foi até o balcão, onde Kay o

aguardava com um sorriso de gratidão e um

brilho de admiração nos olhos.

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— Meu nome é Skip, dona. Devo-lhe a

vida. Se não tivesse me avisado, ele teria

me acertado — disse ele, olhando-a com

atenção e notando a beleza dela.

— Não gosto de ver homens morrendo

pelas costas, principalmente em meu saloon

e especialmente que me defendem— falou

ela, retirando o lenço de seda que trazia no

pescoço, rasgando-o ao meio e tomando as

mãos do recém-chegado.

— Foi um prazer defendê-la, madame —

falou ele, enquanto ela enfaixava as mãos

dele, na altura dos nós dos dedos, esfolados

durante a briga.

— Sou Kay Gregor, a dona do saloon.

Pode me chamar de Kay, por favor. Deixe-

me oferecer-lhe uma bebida.

— Com todo prazer!

Ela escolheu uma garrafa de uísque de

sua reserva especial, sob o balcão, servindo-

lhe um copo. Ele bebeu e apreciou. Ela

repetiu a dose.

O barman fora até a mesa e recolheu o

dinheiro dele, ganho no jogo. Levou-o, no

próprio chapéu do forasteiro, pondo-o sobre

o balcão.

— Obrigado, amigo! — agradeceu ele,

retirando dez dólares do chapéu e pondo-o

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sobre o balcão. — Acho que isto cobre os

prejuízos, não?

— Vai ser por conta da casa. Deixe para

lá — afirmou Kay, retornando as moedas

para dentro do chapéu dele.

Ele sorriu, agradecido, despejando o

conteúdo do chapéu no balcão. Separou as

notas, fichas e moedas. Guardou o dinheiro

e pediu ao barman para trocar as fichas.

Kay olhava com atenção e curiosidade

aquele rosto sorridente e brincalhão. Ficou

intrigada com alguma semelhança, julgando

já tê-lo visto antes.

— Será que já não nos conhecemos,

Skip? — perguntou.

— Se eu tivesse tido este prazer antes,

juro como não teria me esquecido de você,

Kay. Seria impossível. Você é uma mulher

que não se consegue esquecer, mesmo que

se queira...

— Muito lisonjeiro de sua parte, Skip,

mas seu rosto me é familiar.

Ele riu alegremente, antes de explicar.

— Creio que sei a resposta para sua

dúvida. Minha mãe sempre dizia que nós

nos parecíamos muito...

— Nós? quem?

— Eu e meu irmão, você deve conhecê-

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lo.

O rosto dela se iluminou de repente.

— Acho que entendo agora — sorriu ela.

— Meu irmão se chama, Steve, Steve

Master, você o conhece? É capitão no forte

Benson. Soube que se meteu numa

embrulhada, por isso vim aqui, ver o que

poderia fazer para ajudá-lo.

— Isso explica tudo. A semelhança entre

os dois é notável, com exceção dos olhos...

— Steve tem os olhos de minha mãe e eu,

os de meu pai. Fico feliz que o conheça.

Sabe em que tipo de problema ele se meteu?

Parece que é alguma coisa séria, não?

— Muito mais séria do que pode

imaginar, Skip. Vou lhe contar tudo que

aconteceu — disse ela.

Naquele momento, amparado por dois de

seus amigos, Carlson parou ao lado de Skip,

chamando-lhe a atenção. Seu olhar era

cheio de rancor. Seu rosto estava inchado

pela boca.

— Nós nos encontraremos de novo,

forasteiro. Você pagará caro pelo que fez.

— Estarei a sua espera, meu caro, quando

quiser. E pare de me chamar de forasteiro.

Tenho nome e me orgulho dele.

— Diga-me, então, qual é seu nome!

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Preciso saber para mandar escrever em sua

lápide.

— Skip Master!

— Master? Por acaso é parente daquele...

— Cuidado com o que fala, moço. Se vai

mencionar o Capitão Master, é bom que fale

com respeito. Ele é meu irmão.

— Mais um motivo para eu querer matá-

lo, Skip Master — afirmou Carlson, com

fúria.

— Cachorro que ladra não morde —

zombou Skip.

— Os que duvidaram de minhas

promessas estão espalhados pelas Colinas

dos Pés Juntos de todo o Arizona, moço...

— E os que tentara fazer calar fazem

companhia a eles — interrompeu-o Skip. —

Agora dê o fora logo. Sua cara me enoja e

fico tentado a modificá-la a pancadas.

Skip esperou até que Carlson e os outros

saíssem. Depois se voltou para Kay.

— Quem é esse tipo?

— Ben Carlson, chefe dos cocheiros da

Arizona Horselines. Um estúpido, arrogante

e metido a poderosos.

— Parece não gostar de meu irmão.

— Sim, mas essa é outra historia. Venha

comigo, vou contar tudo que sei —

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convidou ela.

O Tenente Bolt chegava ao fim de sua

longa conversa com o Coronel Donald,

comandante do forte. Durante quase três

horas ambos haviam se debruçado sobre o

mapa do Arizona, traçando uma rota que

fosse a ideal. Haviam trocado idéias e

analisado sugestões para chegar até ela.

Estavam ambos exaustos e cansados

daquilo.

— Creio que esse é o nosso melhor

caminho, coronel — falou o tenente.

— Concordo plenamente. Foi um ótimo

trabalho, tenente. Eu sabia que poderia

contar com seus conhecimentos do

território.

— Fiz questão de tomar todas as

precauções, coronel. Apanharemos o ouro

em Douglas, passaremos pelo deserto para

devotar os ladrões que infestam Tucson e

chegaremos a Phoenix sem passar por

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Mesa. É uma rota muito segura e pouco

utilizada, o que garante nosso caráter

secreto.

O coronel acendeu seu cachimbo e foi até

a janela respirar um pouco de ar. Ficou

baforando por instantes, antes de se voltar e

encarar o oficial.

— Sabe, Bolt, esta missão seria do

Capitão Master, se não tivesse acontecido

tudo aquilo?

— Sei como se sente, coronel, mas não

deve se culpar por ter cumprido seu dever.

Master mereceu a punição. Acho até que

fomos condescendentes com ele.

— Era um bom oficial, com uma folha de

serviços impecável. Não pude entender.

Após esta missão, com certeza ele seria

promovido, sem sombra de dúvidas.

O Tenente Bolt escondeu sua satisfação,

apresentou continência e deixou a sala do

comando, confiante no resultado de seus

planos.

— Tenente, por favor, preciso falar-lhe

— disse o cavaleiro que acaba de desmontar

diante do alojamento dos oficiais.

Era o Capitão Kane, médico do

destacamento.

— O que houve, capitão? Parece

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assustado? — observou o tenente.

— Vai se assustar da mesma forma que

eu — falou Kane, segurando Bolt pelo

braço e levando-o para um local isolado,

onde não seriam ouvidos.

— O que aconteceu afinal, Kane? você

parece transtornado!

— Acabo de me encontrar sabe com

quem?

— Não tenho a menor idéia. Deixe de

segredos e conte logo o que viu.

— Eu me encontrei com Master.

— O Capitão Master? — estranhou Bolt.

— Está maluco! Ele foi levado pelo xerife.

— Não, não foi. O grupo foi emboscado

e Master foi o único que sobreviveu,

embora muito ferido. Eu tratei dele ainda há

pouco, sei do que estou falando.

— Onde se encontrou com ele?

— Nas montanhas, na caverna de Joe

Pena Branca, aquele velho índio.

— Ele disse alguma coisa? Master fez

algum comentário sobre o ataque? — quis

saber o tenente, apreensivo.

— Sim, ele reconheceu os homens que os

atacaram.

— Quem eram?

— Charlie e seu grupo.

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— Impossível, Master está tentando por

todos os meios incriminar Charlie para se

livrar da acusação. Deve ter matado o xerife

e os outros para tentar fugir e sido ferido.

— Não tinha pensado nisso — comentou

o médico, agora em dúvida.

O tenente estava contrariado, mas

esforçando-se para disfarçar isso. A

imprudência de Charlie poderia jogar por

terra um plano longamente elaborado por

Bolt e alguns de seus soldados.

Tivera de agir prontamente, incriminando

Steve Master no roubo das armas, onde

duas sentinelas haviam morrido. Depois

disso, esforçara-se para conseguir sua

nomeação como comandante da escolta de

uma partida de ouro, adquirida pela União

para a confecção de moedas.

Bolt teve de pensar rápido novamente.

Precisava afastar o capitão de tudo aquilo.

— O que pretende fazer agora, capitão?

— Eu ia comunicar o fato ao coronel,

embora Steve Master tivesse insistido pra

que eu não revelasse o fato a ninguém.

— Não sei, capitão. Os homens têm

vindo conversar comigo, todos gostavam

muito do Steve. Se comunicar o fato ao

coronel, ele terá de mandar prender o

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capitão novamente. Sou amigo dele, como

os outros soldados, acho que ele merece

uma chance de provar a sua inocência...

— O que tem em mente, tenente?

— Por que não deixa que a ética médica

fale mais alto neste caso em particular,

capitão? Não comunique o fato ao coronel.

Steve era meu amigo também, dê-lhe está

chance.

O capitão hesitou. Estava um tanto

atrapalhado. Era um bom médico, mas

jamais fora um soldado, apegado às

tradições e ao respeito às normas militares.

Sua patente vinha simplesmente de sua

condição de médico. Kane pensava como

um civil e Bolt confiava nisso.

— Vai ajudá-lo — indagou ao tenente.

— Farei tudo que estiver ao meu alcance,

capitão. Só que ninguém mais pode saber

disso ou a vida de Steve nada valerá.

— Certo, tenente, vou deixar que você

cuide disso, então. Como militar de carreira

tem mais experiências que eu. Para todos os

efeitos, eu nada sei sobre o assunto.

— Obrigado, capitão, pela confiança.

Não se arrependera. Garanto que o Steve

lhe será grato para sempre — assegurou o

tenente, satisfeito com a saída para a

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situação.

Enquanto o capitão se dirigia ao estábulo,

Bolt pensou por instantes no que deveria

fazer em seguida.

Deu meia-volta e retornou à sala de

comando.

— Sim, tenente? — indagou o coronel,

estranhando vê-lo de volta após aquela

demorada reunião.

— Eu percebi algumas coisas depois que

saí daqui, coronel, e achei que devia levar

ao seu conhecimento.

— E de que se trata?

— É sobre Charlie, senhor. Ele e seus

homens estão aqui no forte, no momento.

Andei observando que os soldados não os

apreciam. Estou temeroso de uma represália

contra eles. Os homens podem querer se

vingar de Charlie por causa de seu

depoimento na Corte Marcial.

— Está tão sério assim?

— Sim, os homens andam tensos e se

agrupam nas proximidades de onde estão

Charlie e seus homens. Temo que logo

comecem a entrar em atrito.

O coronel meditou por instantes.

— Acho que pode cuidar disso, tenente.

Deixou o assunto em suas mãos. Tome as

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providências que julgar necessárias. eu,

particularmente, não gosto também de

Charlie e de seus bêbados. São péssimo

exemplo para a tropa.

— Está bem, coronel. Farei o que estiver

ao meu alcance para resolver isso —

afirmou o tenente, deixando a sala.

Tudo estava correndo bem agora. Poderia

dar cabo de Charlie e seu grupo,

eliminando, assim, uma testemunha

perigosa para seus planos.

Assim que saiu dali, foi à procura do

Cabo Storm, também envolvido no plano.

— E então, tenente? — quis saber Storm,

ansioso pela noticia importante.

— Tudo perfeito, cabo. Acabo de sair de

uma reunião de três horas com o coronel.

Como afastamos Master da jogada, ele me

encarregou de todos os procedimentos para

a escolta do ouro, inclusive de recrutamento

dos homens.

— Perfeito, tenente! — sorriu o cabo

Storm, aliviado. — E quanto a Charlie e seu

bando de renegados?

— Reuna nosso pessoal. Vamos dar um

fim em Charlie e nos outros. A culpa será

de todos os soldados do forte, que adorarão

saber que ele está morto.

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— Muito bem pensado, tenente. Todos

aqui têm motivos de sobra para quererem

tirar o couro de Charlie e dos outros.

— Só que temos um probleminha para

resolver.

— Qual? — quis saber o cabo, intrigado.

Todas as providencias estavam em

andamento e desconhecia algo que pudesse

atrapalhá-los.

— Master ainda está vivo!

— Que diabos! Aquele maldito mestiço

mentiu para nós. Ele falhou!

— Sim, e o que é pior. O capitão Kane

foi chamado para tratar dos ferimentos do

Steve. Diz que ele está mal, mas acho que

vai se safar dessa. Master informou ao

capitão que reconheceu Charlie e seus

renegados.

— Um motivo a mais para liquidar

aquele renegado — falou Storm, com raiva.

— Sim, penso da mesma forma, cabo.

Vamos cuidar do Charlie e depois do Steve.

Agora vá selar meu cavalo. Vou à cidade

conversar com Carlson, da Horselines. Ele

conduzirá o ouro. Quero que venha comigo.

— Certo, tenente! Tudo está saindo

conforme foi planejado, não?

— Sim, cabo. Controlado com uma

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operação militar, em seus mínimos detalhes.

Estou certo que poderia ter até uma

promoção após a missão, mas não vou estar

aqui para ver isso. Com minha parte no

ouro, pretendo viver no México, sossegado

para o resto da vida, numa hacienda,

cercado de senhoritas!

— Que vida! — exclamou Storm, rindo,

contagiando o tenente.

Steve Master acordara e tentava comer

um pouco do excelente guisado de coelho

preparado pelo índio. Estava com o tronco

apoiado numa porção de cobertores e podia

olhar ao seu redor e observar, com espanto,

a quantidade enorme de coisas, resultado

das pilhagens do índio.

— Joe, venha cá! — pediu, após ver algo

que lhe chamara a atenção.

— O que houve, capitão? Não apreciou a

comida de Joe Pena Branca?

— Não se trata disso. Traga-me aquele

rifle ali — apontou ele, na direção de uma

pilha de armas, cinturões e munição.

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— Qual deles, capitão?

— Aquele rifle Springfield, de repetição.

O índio foi apanhá-lo e trazer para o

capitão, que o examinou cuidadosamente.

Havia ali um número de série e todas as

marcas de provas do Exército dos Estados

Unidos.

Era, com certeza, uma das armas

roubadas do arsenal do forte.

— Onde a encontrou?

— Tirei de uma bandoleiro morto. Ele foi

ferido num encontro com vocês e acabou

vindo parar aqui, com meia dúzia de balas

no lombo. Por que, capitão?

— Muitas armas destas foram roubadas

do forte, Joe, quando eu comandava a

guarda. Alguém me bateu na cabeça. Duas

sentinelas foram mortas e dez caixas de

rifles e munições foram roubadas.

— Quem pode ter feito isso, capitão?

— Não sei, Joe, mas suponho que tenha

sido alguém do forte. Alguém que usou

esses rifles para pagar Charlie pela mentira

que contou na Corte Marcial. Charlie

vendeu os rifles aos bandoleiros, com

certeza.

— O capitão tinha inimigos no forte?

— Difícil dizer, Joe. A impressão que

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ficou de tudo isso é que alguém desejava

me tirar do caminho por algum motivo, a

qualquer preço.

— E o que vai fazer agora, capitão?

— Há uma coisa que preciso que você

faça por mim, Joe. Quero que você vá a

Tucson e procure Kay, a dona do saloon,

você a conhece, não?

— A ruiva bonita?

— Sim, ela mesmo. Você leva um recado

para ela?

— Tudo que o capitão precisar, Joe fará.

O que devo dizer à mulher dos cabelos

vermelhos?

— Vou escrever um bilhete para ela. E só

entregar o papel.

Steve retirou do bolso de sua jaqueta um

livro de notas e um lápis. Escreveu alguma

coisa, depois dobrou e entregou ao índio

que o guardou rapidamente.

— Vou precisar de ajuda aqui, Joe. Estou

pedindo a Kay que tente localizar meu

irmão. O endereço dele está no papel. Só ele

poderá me ajudar a sair desta encrenca.

— Joe irá sem demora, capitão.

— E faça um outro favor, Joe. Procure o

juiz e comunique-o da morte do Xerife

Barnes e de seus auxiliares. Conte-lhe que

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foram emboscados por renegados.

— Posso falar que foi Charlie e seu

bando?

— Não, Joe, você não estava lá na hora

do ataque. Não pode afirmar isso.

— Joe mente.

— Obrigado, meu amigo, mas não será

preciso. Quando eu puder sair daqui,

provarei a minha inocência, pode ter certeza

disso.

Joe concordou e foi apanhar um dos

cavalos que guardava num cercado ali perto.

Pôs o freio e as rédeas e apenas uma manta

sobre o lombo do animal. Saltou sobre ele

com uma agilidade incomum para sua

idade. Ali encima ele se sentia à vontade.

Cavalgou velozmente na direção de

Tucson, onde chegou em menos de duas

horas. Foi direto para o saloon de Kay.

Quando desceu para amarrar o cavalo,

percebeu que havia ali dois animais da

Cavalaria, significava que havia soldados

ali dentro. Hesitou por instantes, um tanto

apreensivo. O único soldado que ele gostava

e respeitava era o Capitão Master.

Comentava sempre que soldado bom era

soldado morto, com seu cavalo vivo. Ficava

com suas roupas, armas e vendia o cavalo e

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a sela.

Andou de um lado para outro,

observando pela janela, tentando ver

alguma coisa lá dentro. Só precisava

encontrar Kay, a mulher dos cabelos

vermelhos.

Enchendo-se de coragem, acabou

entrando, embora soubesse que um índio

entrando num saloon em Tucson era o

mesmo que uma borboleta pousar num

formigueiro.

— O que quer aqui, índio — já lhe

indagou um vaqueiro, assim que ele entrou.

O índio foi direto ao balcão, onde estava

o barman.

— O que foi, Joe? Está com vontade de

perder o escalpo, entrando assim desta

maneira?

— Preciso falar com a mulher dos

cabelos de fogo.

— E quem disse que ela quer falar com

você? Está ocupada agora e não vai querer

que eu a incomode, vai?

— Sim, vou. Tenho assunto importante

para falar com ela — disse o índio, com

firmeza.

O barman hesitou por instantes, mas

percebeu que tinha de ser alguma coisa

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importante mesmo para fazer o índio entrar

ali. Joe era um índio esperto, não se

arriscaria por nada.

— Espere aqui, Joe! — ordenou. — Vou

chamá-la.

O índio foi para o canto do balcão, onde

ficava quase que escondido das vistas dos

outros freqüentadores. Ficou olhando as

garrafas de bebida, sentindo uma enorme

vontade irresistível de abrir e provar cada

uma delas.

Não percebeu que, no fundo do saloon,

Bolt e Storm o observam com interesse.

— É aquele maldito renegado, tenente. O

que ele está fazendo aqui?

— Como vou saber? Storm? Acho que o

miserável está vindo avisar Kay. Na certa

traz um recado do Steve para ela. Ela nunca

escondeu o romance que havia entre os

dois.

— Se ele está aqui para falar com ela, vai

contar o que houve com o Steve, inclusive a

emboscada.

— Tem razão. Demônios! Temos que

calar a boca desse imbecil — considerou o

tenente.

— Vá lá e trate de descobrir isso. Veja o

que ele veio fazer. Se achar que ele pode

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atrapalhar, o que é certo, livre-se dele.

— Aqui, na frente de todos?

— Somos a Cavalaria, Storm. Fomos

criados para eliminar índios, lembra-se?

— Certo, tenente! — concordou o cabo,

levantando-se.

Era um homem alto, de largos ombros e

rosto curtido pelo sol do Arizona. Gingava

levemente o corpo, como os homens

acostumados a passar longo tempo no

lombo de uma cavalo.

Aproximou-se do velho índio.

— Olá, Joe? O que faz aqui? — indagou.

O velho estremeceu, tentando sair dali,

mas o corpanzil de Storm barrou-lhe a

passagem. Conhecia-o. Era um dos mais

truculentos soldados do forte. Já havia sido

maltratado algumas vezes por ele, por isso

tentou evitar o confronto.

— Está muito longe de seu covil, coiote.

O que pensa que pode fazer aqui dentro, seu

índio sujo? Quem lhe deu autorização para

entrar aqui?

O índio percebeu logo que estava sendo

provocado. Só que não via nenhum jeito de

escapar dali. Preferiu não responder,

abaixando a cabeça e torcendo para que a

senhora de cabelos vermelhos viesse logo.

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Storm olhou ao seu redor. Vaqueiros

bebiam no saloon, mas ninguém prestava

atenção a ele e ao índio. Sentiu-se seguro.

Até o barman havia se afastado do posto

para chamar Kay.

— Eu sei exatamente o que faz aqui,

velho. Veio trazer um recado do Master,

não?

— Não, Joe não...

O índio não chegou a terminar o que

pretendia dizer. A mão fechada de Storm

desceu pesadamente sobre a cabeça dele,

derrubando-o no assoalho com um gemido

de dor.

O índio tentou rastejar, atordoado. Storm

desferiu-lhe um violento pontapé na cabeça,

fazendo-o rolar. Apanhou, então, uma

garrafa do balcão pelo gargalo e bateu-a

contra a madeira, quebrando-a.

Segurou o índio pelos cabelos e fez

menção de enterrar-lhe o resto da garrafa na

garganta.

— Se fizer isso eu o mato, soldado! —

falou uma voz grave e ameaçadora.

Storm interrompeu o gesto, olhando ao

seu redor. Viu o homem que descia a

escada, acompanhado de Kay Gregor.

Soltou o índio e encarou o outro.

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— Quem é você, intrometido?

— Não lhe interessa, seu bastardo. Fico

decepcionado ao ver que a Cavalaria decai

tanto ultimamente. Ouvi dizer que, nos

áureos tempos, costumava enfrentar índios

bravos, todos fortes e jovens guerreiros.

Jamais soube que combatia velhos fracos e

alquebrados — ironizou o estranho.

— Vá para o inferno! — rugiu Storm,

arremessando o pedaço de garrafa na

direção de Skip.

O recém-chegado desviou-se e o que

restava da garrafa espatifou-se na parede

atrás dele. Irritado, Skip avançou sobre

Storm, aplicando-lhe um golpe no estômago

e outro no queixo, derrubando-o

pesadamente.

O militar tentou se levantar, mas Skip

aplicou-lhe um pontapé nos rins, pondo-o

todo encolhido e gemendo num canto. Bolt

a tudo assistia sem nada dizer.

Skip foi até o índio, que Kay examinava.

— Como está ele?

— Não sei... Acho que a pancada foi

violenta demais...

Skip inclinou-se, pondo seu ouvido no

peito do índio, tentando ouvir alguma coisa.

— Ainda vive, mas está muito mal. Há

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algum médico por aqui? Temo que ele não

resista muito tempo.

— Creio que é melhor deixar que o

assunto seja resolvido pela cavalaria —

disse Bolt, levantando-se, finalmente, com a

arma na mão, apontada para Skip.

Skip levantou-se resolutamente,

encarando-o. Seus olhos fulminaram Bolt,

que estremeceu diante da determinação que

lia neles.

— Não sei que diabos anda aprontado a

cavalaria hoje em dia, tenente, mas é melhor

guarda essa arma. Este homem precisa de

cuidados e eu vou levá-lo a um médico.

— Não se preocupe quanto a isso. Nós

temos um bom médico lá no forte...

— Pelo que vi aqui, parece-me que a

Cavalaria está mais interessada na morte

deste homem do que em salvar-lhe a vida.

Eu vou cuidar dele agora — falou com

decisão.

Sem se importar com a arma que era

apontada para ele, Skip levantou o índio,

pondo o sobre o ombro e caminhando para a

porta seguido por Kay.

Uma bala assobiou perto de sua cabeça.

Ele se virou, sacando sua arma com rapidez

e arrancando a arma da mão do tenente com

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um certeiro balaço.

— Se não vestisse esse uniforme, tenente,

eu juro como o teria matado agora mesmo

pela sua covardia — afirmou ele.

Depois virou-se e seguiu Kay, na direção

da casa do médico, quase esbarrando em

Carlson, que vinha entrando no saloon. O

cocheiro olhou-o com ódio e depois entrou,

sem dizer nada.

— Olá, tenente! — cumprimentou-o

Carlson. — Vim assim que recebi seu

recado. Mas que diabos houve por aqui? —

indagou, observando Storm se levantar com

dificuldades e o tenente examinar seu

revolver, cujo tambor fora danificado pelo

certeiro tiro de Skip.

— Esse maldito forasteiro que se meteu

em nosso negócios, mas ele vai se haver

comigo.

— Então somos dois, tenente, porque eu

e ele tivemos uma rusga hoje. Veja como

deixou meu rosto.

— Parece que você foi atropelado por

uma manada de búfalos.

— Ele vai pagar por isso, pode deixar.

— Vamos cuidar desse forasteiro mais

tarde. Agora temos de acertar alguns

detalhes... Vamos nos sentar.

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Foram se sentar ao fundo, na mesa que já

vinham ocupando. Storm mal conseguia se

equilibrar na cadeira.

— Está tudo encaminhado, Carlson.

Recebi a confirmação hoje do coronel.

Daqui a três dias poderemos agir. Você se

encarregará de conduzir a carroça.

— E a escolta?

— Será composta de vinte homens. Dez

deles já estão do nosso lado. O restante será

morto quando estivermos atravessando o

deserto.

— Isso merece um brinde, tenente! —

disse Carlson, entusiasmado.

— Ainda é cedo para brindes. Estamos

com alguns problemas. Charlie não

conseguiu matar Steve Master. Ele ainda

está vivo. Além disso, Charlie ficou muito

ambicioso e temo que ele venha a dar com a

língua nos dentes.

— Quer uma ajuda para se livrar dele?

Eu nunca gostei daquele renegado mesmo.

— Sim, acho uma boa idéia. Que tal ir até

o forte hoje à noite, com alguns de seus

homens, e dar um jeito de fechar aquela

boca grande e fedorenta do renegado?

— Vai ser um prazer, tenente.

Storm gemia na cadeira ao lado.

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— Puxa, esse cara o acertou de verdade,

Storm. Parece que você está pior do que eu

— observou Carlson.

— Você conhece o forasteiro?

— Sim, tive uma briga com ele. Ainda

não sabe quem ele é?

— Não, deveria?

— É irmão de Steve Master.

— O quê? Diabos! Será que ouvi direito?

— É isso mesmo, tenente. Se não

bastasse um Master para infernizar sua vida,

agora tem dois! — ironizou o cocheiro.

— E ele está com o velho índio que sabe

onde está o Capitão Master! Demônios!

Que complicação! — reclamou Bolt.

— É outro de quem eu gostaria de me

vingar. Quer que eu o livre dele?

— Eu agradeceria isso, Carlson.

— Então deixe-o comigo. Considere isso

uma cortesia especial pela nosso sociedade,

tenente.

— Certo, cuide dele, então, da melhor

maneira possível. Não sei o que faz aqui e

nem quero saber. Eu e Storm vamos voltar

ao forte, mas antes passaremos pelo

esconderijo de Joe Pena Branca e

cuidaremos do Capitão. Isso livra nossos

planos de qualquer imprevisto.

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— Eu vou cuidar do intrometido, então

— falou Carlson.

— Enquanto isso, aguarde o comunicado

oficial sobre o transporte do ouro. Ele

indicará o dia do embarque.

— Perfeito, tenente. Até a noite, então!

Saíram os três do saloon. Carlson esperou

até que os dois soldados montassem e se

afastassem, depois atravessou a rua, entrou

num beco e chegou aos fundos da casa do

médico da cidade.

Aproximou-se sorrateiramente de uma

das janelas. Pode ver o doutor examinando

o velho índio. Engatilhou a arma, quebrou a

vidraça com o cano do revólver e disparou

três vezes, atingindo o índio, mas errando

quanto a Skip, que rapidamente sacou sua

arma e correu para lá.

Carlson já havia retornado ao beco e se

misturado às pessoas na rua. De arma na

mão, Skip saiu à rua, mas nada viu.

Retornou à sala do médico.

— O que houve? — indagou o médico.

— Ele acertou o velho índio.

— Está morto?

— Sim, bem morto.

— Chegou a ver quem atirou?

— Não, fui pego de surpresa. Foi tudo

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muito rápido — falou o médico, cortando as

roupas do índio para examinar o ferimento,

embora nada mais pudesse fazer por ele.

Ao afastar o tecido, um papel caiu no

chão. Skip abaixou-se e o apanhou.

— É para você, Kay — disse ele, lendo.

A garota abriu o papel.

— É do Steve! — exclamou ela. — Pede

que eu tente localizar você, Skip.

— Mais alguma coisa.

— E onde ele está?

— Eu não sei...

Skip deixou algum dinheiro para que o

médico providenciasse o enterro do índio.

Quando saíam à rua, Kay apontou para um

cavaleiro que acabava de entrar na cidade.

— É Ken Patersson, o auxiliar do xerife

— disse ela, chamando-o. — Ken, localizou

o xerife?

— Não, Kay. Fui até o trecho do

caminho, mas nem sinal dele e dos outros.

Estou ficando preocupado com isso.

— Joe Pena Branca foi morto há pouco,

no consultório do xerife. Trazia um bilhete

do Steve, pedindo que eu chamasse o irmão

dele...

— E como Joe conseguiu esse bilhete?

— Não sei, não teve tempo de nos contar.

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— Se descobrir alguma coisa, avise-me.

Vou reunir uma patrulha e ir ao encontro do

xerife.

De volta ao saloon, Kay terminou de

contar a Skip tudo que sabia sobre os

acontecimentos que envolveram Steve.

— Então ele deve estar chegando na

cidade hoje?

— Sim, só não entendi o bilhete do Joe,

por que Steve o teria mandado? E como o

entregou ao índio?

— Jamais saberemos agora. Que chances

nós temos de inocentar meu irmão, Kay?

— A única pista que conheço é Charlie, o

mestiço renegado que depôs contra Steve.

— E onde posso encontrá-lo?

— Na Taberna San Diego, no fim da rua.

Se não estiver lá, pode estar em qualquer

parte do Arizona. É um tipo sem parada, um

bandoleiro que serve o Exército como

batedor, às vezes, e isso o tem mantido

longe da cadeia.

— Gostaria de falar com ele, então. Vou

tentar achá-lo. Foi ele que depôs contra o

Steve a respeito da escaramuça com os

índios mescaleros?

— Sim, ele mesmo. Todos que conhecem

Steve sabem que ele jamais desertaria, mas

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ele não tinha como provar sua inocência

contra o testemunho de Charlie e outros.

Steve foi ferido e ficou descordado, dado

como morto, enquanto seus homens eram

massacrados.

— Eu vou esclarecer tudo isso, então.

Skip deixou o saloon e caminhou pela

rua, na direção indicada por Kay, até a

taberna. Antes de entrar, examinou seu

revólver, recarregando-o.

Assim que entrou, dirigiu-se ao homem

atrás do balcão, um mexicano grandalhão,

de vastos bigodes e com cara de poucos

amigos.

— Quer tequila?

— Não, quero uma informação — falou

Skip, em voz alta, para ser ouvido pelos

outros.

— Que tipo de informação?

— Procuro um tal de Charlie, um rato

renegado, um mestiço filho da mãe que faz

ponto aqui. Você o conhece?

— Não, não conheço nenhum Charlie.

Agora é melhor dar o fora daqui, estranho, a

menos que deseje beber alguma coisa.

— E se eu não quiser?

— É melhor fazer o que ele manda,

gringo! — disse uma voz ameaçadora atrás

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dele.

Ele se virou e encarou o homem que o

ameaçara. Era um mexicano, com seu

sombrero atirado às costas e a mão

descansando sobre a coronha da arma.

— Obrigado pelo conselho, amigo, mas

ninguém o convidou para esta conversa.

— O que quer com Charlie?

— Trocar algumas palavras com aquele

rato mentiroso e, se possível, dar-lhe alguns

tapas para que deixe de ser mentiroso e

covarde.

— Se quer um aviso, gringo, é melhor...

— ia dizendo o mexicano, ladeado por

alguns outros que haviam se aproximado.

— Escute aqui — reagiu Skip, agarrando-

o pela gola da camisa e levantando-o. — Se

você sabe onde Charlie se esconde, é

melhor que me diga antes que eu quebre

todos os seus dentes.

Um ruído de arma deslizando pelo coldre

advertiu Skip. Ele arremessou o mexicano

sobre o outro, que tentava sacar a arma,

derrubando os dois.

Antes que mais alguém fizesse um

movimento, Skip havia sacado e

engatilhado sua arma.

— E então, o que tem a me dizer? —

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indagou ele ao homem caído a seus pés.

— Não tenho nada a lhe dizer —

resmungou o homem, tentando se levantar.

— Então fique aí mesmo — falou Skip,

desferindo-lhe um pontapé no queixo e

jogando-o desacordado no assoalho.

— E vocês, também querem discutir o

assunto? Alguém sabe onde achar aquela

bastardo chamado Charlie? — indagou aos

outros.

Os homens se entreolharam, abaixando a

cabeça, Skip percebeu logo que mentiam.

Foi até uma das mesas, com a arma

apontada.

— E vocês, alguém sabe do Charlie?

Os homens nada disseram.

— Você! — apontou Skip, pondo a arma

no ouvido de um deles. — Você tem cara de

quem sabe onde encontrar o Charlie. Diga-

me logo ou vou decorar aquela parede com

os seus miolos.

— Está bem, homem. Acalme-se! —

falou o mexicano. — Não precisa ficar

nervoso. Charlie está no forte Benson, foi

para lá esta manhã.

— Obrigado, amigo. Eu sabia que podia

contar com sua gentileza — agradeceu Skip,

guardando a arma.

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Subiu a rua de volta para o saloon de

Kay. Tencionava ir até o Forte Benson, após

conversar com a garota.

Não percebeu que cinco homens haviam

deixado a cantina e o olhavam subir a rua.

Havia ódio nos olhos deles. Todos eram

amigos de Charlie.

— Maldito gringo! — resmungou um

deles.

Steve Master estava apreensivo. Não

sabia até que ponto o velho Joe não acabaria

revelando seu paradeiro, quando notificasse

o juiz das mortes do xerife e dos ajudantes.

Além disso, ninguém, na cidade gostava

muito do índio. Se soubessem que ele levou

um recado do ex-capitão para Kay, na certa

o pressionariam de todas as formas para que

ele contasse o paradeiro de Steve.

Sabia que o índio era esperto com uma

raposa, mas com a sua idade, pouco

resistiria nas mãos daqueles interessados na

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morte do militar.

Não podia facilita. O melhor a fazer era

agir com cautela. Assim, com dificuldade,

cuidando para que os ferimentos não

abrissem, ele amontoou pedras próximo da

caverna, dando o formato de um túmulo.

Espetou um galho em forma de cruz e,

enroscando nele, pôs sua túnica, furada de

bala e manchada de sangue.

Selou um dos cavalos, apanhou armas e

munição e partiu, sem saber ao certo ainda

para onde ir. Após algum tempo que tinha

se afastado, chegaram Bolt e Storm a

galope.

— Vamos com calma, Storm —

recomendou o tenente. — Não sabemos o

que vamos encontrar aí dentro.

— Não creio que ele nos ofereça mais

perigo — disse Storm, apontando para a

sepultura feita com pedras.

Os dois caminharam até lá. Bolt apanhou

aquela túnica, onde os furos de balas e o

sangue eram visíveis.

— É a túnica do Steve, reconhece?

Foram retirados os botões e os distintivos

militares. Não há duvida — afirmou Bolt.

— Sim, é a dele mesmo. E pelos buracos

e pelo sangue, tudo leva a crer que esse que

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está aí, debaixo das pedras, é ele.

— Que recado, então, Joe estava levando

para Kay lá na cidade?

— Talvez ia avisá-la da morte do Steve.

Todos sabemos que a garota sempre teve

uma queda pelo capitão. Nada mais justo

ele se lembrar dela, principalmente em seus

últimos momentos.

— É, você tem razão. Nada mais nos

prende aqui. Estamos tranqüilos agora.

Ninguém mais vai atrapalhar nossos planos.

— Sim, isso praticamente liquida nosso

problemas. Agora só falta nos livrarmos do

Charlie e de sua corja.

— Falei com o Carlson. Ele e seus

homens cuidarão de tudo para nós. Depois

disso, o caminho estará livre para o ouro e

para o México — finalizou o tenente, com

satisfação.

Chegando ao forte, Bolt foi até a sala do

comandante falar com o coronel.

— Tudo certo com o pessoal da

Horselines?

— Sim, falei com Carlson que iríamos

precisar transportar um material. Ele

aguarda apenas a confirmação da data exata.

— Farei isso no momento oportuno.

Conseguiu convencê-lo sobre o sigilo da

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operação?

— Sim, eu lhe disse que era uma partida

de metralhadores e que não seria

conveniente transportarmos em carroças da

Cavalaria para não despertar o interesse dos

bandoleiros.

— E ele?

— Engoliu fácil. É de confiança, não

comentará. Eu pedi todo sigilo possível a

ele.

— Ótimo! Estou satisfeito com o

andamento da operação, tenente. Agora,

com respeito a Charlie e seus homens,

estive observando os homens, depois

daquela conversa que tivemos a respeito.

Acho melhor mesmo você tirá-los daqui.

— Eu já os avisei, coronel. Vão deixar o

forte ao entardecer para cavalgar à noite.

Partirão para Tucson.

— Concordo, mas seria melhor ainda se

eles fossem acampar fora do forte.

— Vou cuidar disso agora mesmo.

O tenente deixou o comando e foi direto

para a cantina. No caminho, traçava seu

plano. Assim que viu Charlie, foi falar com

ele.

— Charlie, acabei de falar com o coronel.

Ele acha prudente que você e seus homens

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acampem fora do forte, até a hora de

partirem.

— Por mim, tudo bem, tenente. Sabe o

que estamos esperando para partir, não? Tão

logo recebemos nosso pagamento, daremos

o fora daqui.

— Eu sei disso, Charlie. Agora leve seus

homens e acampem perto do riacho. Eu

levarei os rifles até lá.

— E nada de truques, tenente. Estaremos

preparados para qualquer eventualidade.

— Não seja imbecil ameaçando-me,

Charlie. Espero ainda fazer uma porção de

negócios com você. Só que tem de ser mais

cuidadoso. Steve Master não estava morto

quando o deixaram lá.

— Claro que estava! Eu mesmo meti

duas balas no couro dele.

— Só que ele não morreu na hora. O

Capitão Kane foi levado até lá por Joe para

atendê-lo. Da próxima vez, seja mais

cuidadoso. É só que lhe peço, Charlie.

Principalmente no seu próximo trabalho.

— E quando será isso?

— O mais depressa possível. Quero que

mate o Capitão Kane.

— Matá-lo? Por quê?

— Porque ele viu Steve Master vivo e

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não sabemos o que Master pode ter contado

a ele, entendeu? Deve ser morto por isso.

— Está certo, tenente. Só que isso terá

um preço...

— Esqueça! Vai fazer esse trabalho por

conta do serviço malfeito em Master.

O mestiço pensou por instantes. O

tenente havia sido bem rigoroso. Não

adianta regatear àquela altura. Outros

negócios poderiam vir pela frente e ele

poderia recuperar isso.

— Está bem, tenente! Este vai ser

cortesia da casa — concordou o mestiço.

Anoitecera. Kay via os primeiros

tocheiros serem acesos nas ruas, com as

chamas iluminando fantasmagoricamente as

construções e pessoas que passavam.

O saloon começava a se encher de

fregueses. A cada homem que ela via

chegar, um sobressalto agitava seu coração.

Um pressentimento doloroso instalou-se

dentro dela.

Algo lhe dizia que Steve corria perigo.

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Joe Pena Branca fora assassinado ao trazer

aquele recado. Tudo era muito estranho. O

que o índio sabia que lhe custara a vida?

Quando Ken Paterson, o auxiliar do

xerife voltou e a procurou, Kay teve a

certeza de que algo sucedera a Steve.

— Ken, onde está ele? — indagou,

apreensiva.

— Sinto muito, Kay! Steve está morto.

Ele e o xerife, bem como os auxiliares...

— Não! — exclamou ela, angustiada. —

Não pode ser verdade! Diga que não!

— Eu lamento, Kay, mas é verdade.

Encontrei o xerife e os dois auxiliares

mortos. Foram emboscados. Segui uma

trilha que pensei que fosse me levar aos

assassinos, mas acabei dando na caverna de

Joe. Encontrei uma sepultura e a túnica do

capitão. Estava furada de bala e manchada

de sangue.

— Mas não pode ser, meu Deus! Ele

estava vivo, escreveu-me um bilhete...

— Que bilhete?

Kay lhe contou sobre o bilhete e sobre a

morte de Joe.

— Agora jamais saberemos o que Joe

tinha a nos contar, mas penso que Steve

morreu após ter escrito o bilhete, Kay. De

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qualquer forma, eu e a patrulha voltaremos

amanhã ao local da emboscada e tentaremos

encontra alguma pista dos assassinos. É

uma pena que Steve tenha morrido antes de

provar sua inocência.

— Alguém fará isso por ele, Ken.

— Você?

— Não, Skip Master, o irmão dele.

— Onde está ele agora?

— Partiu para o forte à procura de

Charlie e seus homens. Espera descobrir

alguma coisa com eles.

— Diga-lhe que me procure assim que

voltar, está bem? Será bom conhecer um

irmão do Steve.

Kay se despediu do ajudante e foi para o

seu quarto. Aquela noite estava perdida para

ela. A dor pela morte de Steve cortava seu

coração. Ela se recolheu para pratear o

homem que amava.

Enquanto isso, Skip chegava ao Forte

Benson. Havia cavalgado o mais rápido que

pudera, aproveitando a luz do dia.

Identificou-se com o sentinela, que lhe

indicou onde era a casa do comandante.

Ao se aproximar dela, percebeu um vulto

esgueirando-se nas sombras, perto do

alojamento dos oficiais. Ficou observando,

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intrigado.

O vulto chegou à janela, sacou sua arma e

disparou. Instintivamente, Skip sacou

também seu Colt e fez fogo. O vulto

rodopiou e caiu pesadamente.

— O que está havendo aqui? — gritou a

sentinela, correndo até lá.

Viu Skip com a arma fumegante na mão.

— Está maluco? em quem atirou?

— Fique tranqüilo, soldado! Alguém

disparou para dentro do alojamento e eu...

— Fique aí mesmo, não se mova! —

ordenou o sentinela. — É melhor soltar essa

arma, até esclarecermos tudo aqui.

— Está bem, se isso o deixa mais

tranqüilo — concordou o civil, soltando o

revólver.

— O que houve, Beef? — indagou o

coronel Donald, surgindo em companhia de

outros oficiais, inclusive o Tenente Bolt.

Diversos soldados, acordados pelos

disparos, observavam a cena.

— Este homem estava fazendo disparos

com sua arma, coronel — informou o

sentinela.

— Deixe-me explicar, coronel. Havia

alguém perto da daquela janela. Ele sacou a

arma e disparou sobre alguém lá dentro.

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— É o alojamento dos oficiais... O

Capitão Kane dorme próximo daquela

janela — falou Bolt, correndo para lá.

Ao entrar, sorriu satisfeito. Daquela vez,

Charlie não havia falhado. Fizera um

serviço perfeito. O Capitão Kane jazia

imóvel.

— O capitão está morto, coronel —

informou ele. — Vai ter muito que explicar,

forasteiro.

— Deve haver um homem caído do lado

de fora — falou Skip. — Eu atirei contra

ele.

— Verifique tudo por lá, Cabo Storm! —

ordenou Bolt.

Storm sabia o que tinha que fazer. Foi até

lá e vasculhou. Viu um dos homens de

Charlie perto da paliçada.

— Rápido, seu idiota! Trate de dar o fora

daqui. Aproveite que o sentinela deixou o

portão. Não devem encontrá-lo aqui —

ordenou ele.

O homem, apesar de ferido, conseguiu

escapar pelas sombras, sumindo pelo portão

afora. Storm voltou para junto dos outros.

— Não há ninguém por lá, senhor.

Vasculhei tudo cuidadosamente.

— É impossível — protestou Skip. —

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Tenho certeza de que o acertei.

Bolt já havia reconhecido o homem a sua

frente. Ficou satisfeito. Skip Master havia

se envolvido numa bela encrenca e teria

muito o que explicar.

— É melhor levá-lo para a minha sala.

Quero interrogá-lo — ordenou o coronel.

Skip, resignado, se deixou conduzir.

Uma breve agitação movimentou o

acampamento de Charlie e seus homens,

quando o ferido retornou.

— O que aconteceu? — indagou Charlie,

quando o encarregado de liquidar o Capitão

Kane retornou.

— Ajudem-me... Estou ferido — gemeu

o homem.

— Pare de choramingar como uma velha

e diga-me o que houve. Quem o feriu? —

quis saber Charlie.

— Um desconhecido... Eu não o vi... Só

o percebi quando ele atirou em mim, após

eu matar o capitão...

— Matou-o mesmo?

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— Sim, de onde atirei não podia errar.

Mirrei bem no coração e acertei.

— E o homem que atirou em você?

Como ele era? Como você escapou?

— Eu não pude ver direito o homem. O

Cabo Storm me ajudou a sair. Com um

pouco de sorte, vão incriminar aquele

homem com o assassino do capitão...

— Pode ser, seu idiota! Mas aposto como

deixou uma pista do tamanho de uma

manada de búfalos direto para cá.

— O que eu poderia fazer, Charlie.

Estava ferido...

— Cuidem desse idiota. Se conheço o

Tenente Bolt, ele vai dar um jeito de apagar

todas as pistas.

Um tropel de cavalos chegou até eles,

pondo-os em guarda. A fogueira acesa

atraía a atenção de quem passasse na

estrada.

— Vejam quem é — ordenou.

Seus homens se movimentaram e, pouco

depois, retornaram acompanhados dos

cincos homens que haviam ficado na

cidade, durante a emboscada.

— O que fazem aqui, seus idiotas?

Ordenei que ficassem na cidade —

esbravejou Charlie.

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— Descobrimos algo e achamos que você

gostaria de saber, por isso viemos.

— Então falem logo!

— Há um homem vindo para cá. É irmão

do Capitão Master. Nós o encontramos lá na

cidade.

— E o que ele quer?

— Falar com você, Charlie.

— Falar comigo? Para quê?

— Parece que ele tem algumas perguntas

a fazer a você a respeito do irmão dele.

O homem que estava ferido levantou a

cabeça para falar.

— Charlie, deve ser o homem que

encontrei lá no forte, o que atirou em mim.

— Se for esse, acho que não

precisaremos nos preocupar com ele. O

Tenente Bolt cuidará dele, como cuidou do

irmão. Em todo caso, já que estão aqui, vão

trabalhar, homens. Espalhem-se por aí e

fiquem alertas. Não gostei muito da maneira

como aquele tenente tem conversado

comigo. Tenho certeza que ele anda

preparando algo.

O mestiço estava adivinhando a cilada.

Na realidade, enquanto ele conversava com

seus homens, Carlson e seus amigos já os

observavam, ocultos na outra margem do

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rio.

— O que faremos, Carlson? Eles são

nove ao todo e nós somos apenas cinco.

— Não seja idiota, estamos em vantagem

ainda. Observe-os. Estão se dividindo.

Cinco deles foram para trás daquelas

árvores. Isso facilita tudo para nós.

— O que tem em mente, Carlson? —

indagou um deles.

— Vamos pegá-los primeiro. Charlie

deve se sentir muito confiante com aqueles

cinco protegendo-o. Vamos fazer-lhe uma

surpresa, rapazes.

— Como vai ser, Carlson?

— Vamos usar as facas e não deixar que

nenhum deles grite. Não quero alertar nosso

amigo Charlie! — disse ele. — Vamos lá,

rapazes!

O grupo cruzou o rio silenciosamente,

contornando o acampamento de Charlie e se

aproximando das árvores, onde se

ocultavam os capangas do mestiço.

Localizaram-nos facilmente e se

aproximaram. Pegos de surpresa, os

renegados não esboçaram nenhuma

resistência. Após uma ação rápida, os

cincos homens de Charlie jaziam com suas

gargantas abertas.

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Carlson fez um sinal para seus homens se

espalharem ao redor do acampamento, no

centro do qual havia uma fogueira. Isso

deixava os homens de Charlie em

desvantagem agora.

— Charlie, levante os braços e diga aos

seus homens para fazerem o mesmo ou

serão crivados de bala — ordenou o chefe

dos cocheiros.

Charlie ficou surpreso, mas não perdeu a

confiança. Contava com uma força extra, os

cinco homens ocultos ali perto. Levantou-

se, então, dizendo a seus homens que

obedecessem a ordem. Em seguida, ergueu

os braços com um sorriso irônico nos

lábios.

— Isso, você até que é um bom menino,

Charlie — zombou Carlson, aproximando-

se.

— O que faz aqui, cheirador de rabo de

mula — indagou o mestiço.

— Vim pagar-lhe uma conta.

— Conta? Que conta?

— Uma conta que lhe deve o Tenente

Bolt.

— Aquele bastardo traidor! Eu imaginava

mesmo que ele estava aprontando alguma,

mas vai me pagar caro por isso, eu posso

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garantir a vocês.

— Não vai se vingar de ninguém,

Charlie, muito menos fazer ameaças. Sua

vida está por um fio, não percebeu ainda?

— falou Carlson, ficando frente a frente

com o renegado.

— Tenho cinco homens atrás daquelas

árvores, com as armas apontadas para vocês

agora. Larguem suas armas, seus palhaços,

ou vão morrer agora mesmo — falou

Charlie, começando a gargalhar.

Carlson, no entanto, gargalhou mais alto,

seguido por seus capangas, enquanto exibia

sua face, manchada de sangue. A

gargalhada morreu na garganta do mestiço e

o terror estampou-se em seus olhos.

— Sim, Charlie! Isso mesmo. Seus

amigos não apontarão armas para mais

ninguém agora.

— Espere, Carlson. Podemos fazer um

acordo. Você não precisa me matar...

— E por que não?

— Por favor, não me mate...

— Implore, Charlie! Implore e talvez eu

poupe a sua vida — ordenou o cocheiro.

— Por favor, não mate o pobre Charlie.

Vai deixar vinte filhos e dez mulheres

viúvas — gemeu o mestiço, ajoelhando-se

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aos pés de seu carrasco.

— Beije minhas botas, escória!

— Sim, Carlson, Charlie faz tudo que

você mandar. Eu irei embora, se não me

matar. Vou para o México. Juro como não

volto mais aqui — continuou implorando,

enquanto beijava as botas do outro.

Carlson e seus homens se divertiam com

a covardia do mestiço, implorando e

rastejando diante da morte.

— Está bem, Charlie! Não vou atirar em

você — disse, então.

O mestiço levantou a cabeça e tentou

beijar a mão de Carlson. Este, sem nenhuma

piedade, deslizou a lâmina de sua faca pela

garganta do ouro, de orelha a orelha, num

gesto rápido e cruel.

O espanto e a dor tomaram conta do rosto

do mestiço, que tentou falar alguma coisa,

mas uma golfada de sangue saiu do buraco

em sua goela, manchado suas roupas.

Ele tentou se levantar, mas sua cabeça

caiu para trás bizarramente e ele tombou,

completamente imóvel.

A um sinal de Carlson, os outros

capangas de Charlie tiveram o mesmo

destino. Foram degolados rapidamente.

— O que faremos agora, Carlson?

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— Vamos deixá-los aqui e aguardar a

chegada do tenente.

Não precisaram esperar muito. Logo Bolt

apareceu.

— Parabéns! Pelo que vejo, fizeram um

ótimo trabalho. Joguem-nos no rio. Vou

voltar ao forte. Felizmente apanhamos

aquele forasteiro numa bela armadilha.

— Fala do irmão de Steve Master?

— Sim, será acusado da morte do

Capitão Kane e nós ficaremos livres

daquele intrometido. Com Steve Master

definitivamente morto, nada nos atrapalhará

agora.

— Ótimo, tenente! Vamos voltar à cidade

e aguardar o aviso para o transporte do

ouro.

— Deverá ser em breve, rapazes. Até lá!

Na sala estavam presentes o coronel,

Skip, o sentinela e dois outros soldados

apenas. O coronel assim o determinara.

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Sentado em sua escrivaninha, apontou uma

cadeira para Skip.

— Como é seu nome, rapaz? — indagou.

— Skip Master, senhor. E antes que me

pergunte, afirmou, com orgulho, que sou

irmão do Capitão Steve Master.

O coronel olhou-o sem surpresa.

— Eu sinto muito o que aconteceu com

seu irmão, rapaz. Você também está agora

numa bela enrascada. Não vou tirar

conclusões precipitadas. Conte-me sua

versão do que aconteceu.

— Não se trata de minha versão, coronel.

Foi como aconteceu, eu juro.

— Seja lá como for, conte-me, então!

— Pois bem, eu vim até a forte à procura

de Charlie, o mestiço renegado, e seus

homens. Soube que estariam aqui. Pretendia

falar com ele a respeito do testemunho que

prestara sobre meu irmão, incriminando-o.

— Até aí, tudo bem. Charlie e seus

homens realmente estavam aqui. Devem

estar acampados agora lá fora, em algum

lugar. E depois, o que aconteceu quando

chegou aqui?

— Apresentei-me ao sentinela, dizendo

que precisava falar com o comandante e ele

me permitiu a entrada, indicando-me sua

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residência, coronel.

— E os disparos?

— Eu chego lá. Aconteceram logo em

seguida. Havia um vulto se esgueirando

perto do alojamento. Fiquei curioso e passei

a observá-lo.

— Acha que poderá reconhecê-lo se o

encontrar novamente?

— Vai ser difícil. Ele caminhava

protegido pelas sombras, não pude ver

como ele era. Só vi quando ele parou ao

lado de uma das janelas, sacou sua arma e

disparou. Eu saquei a minha arma também,

atirando contra ele.

— Por quê?

— Não sei dizer, foi um ato instintivo.

Para alguém estar agindo nas sombras,

daquela forma, não deveria ser alguém bem

intencionado.

— Entendi. Acha que o acertou?

— Tenho certeza disso.

— Como pode provar que está falando a

verdade?

— Pergunte ao sentinela. Acho que o

senhor mesmo só ouviu dois tiros.

— É verdade, coronel. Foram dois tiros,

um seguido ao outro — falou o sentinela.

— E o que isso prova? — quis saber o

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coronel.

— O Capitão Kane foi atingido por

apenas uma bala, senhor — — informou um

dos soldados.

— Isso mesmo — confirmou Skip.

— Você pode ter errado o primeiro tiro

— ponderou o militar.

— Se eu errei e se os fatos aconteceram

como supõe, senhor.

— Pois aí estão os fatos, senhor, mande

verificar no alojamento do capitão. Se errei

o tiro, a bala deve estar encravada na parede

ou em alguma parte.

— Faça isso, Beef — ordenou o coronel.

O soldado saiu e foi cumprir a ordem.

quando retornou, informou:

— Verifiquei seguindo o ângulo do tiro,

coronel. Não há nenhum sinal de bala

cravada em lugar nenhum...

— Isso ainda não prova a sua inocência...

— comentou o militar, hesitante.

A arma de Skip estava sobre a mesa do

coronel. O rapaz apontou-a.

— Examine a minha arma, coronel. Verá

que apenas uma cápsula está deflagrada.

O coronel fez o que ele sugerira. Havia

apenas uma bala disparada.

— E se isso ainda não for suficiente,

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tenho a prova final de minha inocência,

coronel. Examine melhor minha arma. Verá

que é um tipo novo de Colt, que adquiri

recentemente no Leste. As balas não são

calibre 45, mas um calibre inferior. Mande

extrair a bala do corpo do capitão morto e

verá que digo a verdade. Vai encontrar ali

uma 45 normal.

O coronel se levantou e deu alguns

passos pela sala. A segurança com que Skip

lhe falara demonstrava sua inocência. Só

faltava mesmo mandar extrair aquela

maldita bala para ter a confirmação.

— E que motivos eu teria para matar o

Capitão Kane? — insistiu Skip. — Nem ao

menos sei se ele fez parte da corte marcial

que julgou e condenou meu irmão.

— E de fato o Capitão Kane não o fez.

Usamos alguns oficiais daqui e o resto, do

Forte Douglas.

— Pois aí estão os fatos, senhor. Não há

como me incriminar dessa morte estúpida.

O coronel pensou por instantes, tomando

logo uma decisão sobre o assunto.

— Acredito em você, Skip. Vou ordenar

uma busca imediata ao homem que você

disse que havia ferido.

— Posso ajudar na busca, coronel?

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— Se for do seu interesse.

O coronel devolveu a arma a Skip e

ordenou aos soldados que trouxessem

tochas. Quando deixavam a sala de

comando, encontraram-se com Bolt, que

retornava.

— Pode deixar, senhor, eu levo este

bastardo para a prisão — ofereceu-se ele,

certo de que Skip não conseguiria se livrar

das acusações.

— Este homem não está preso, tenente.

— Mas como, senhor? Ele matou o

Capitão Kane — surpreendeu-se Bolt.

— Cuidado com suas acusações

infundadas, tenente. Não foi ele quem atirou

no capitão e isso já me foi provado. Agora

vamos investigar isso direto. Apanhe uma

tocha e siga-nos.

Bolt ficou temeroso, a principio.

Naturalmente encontrariam a pista do

homem ferido e chegariam ao acampamento

de Charlie. Depois pensou melhor e

tranqüilizou-se. Charlie e os outros jamais

falariam.

O grupo, carregando tochas, aproximou-

se da janela do alojamento, onde Skip vira o

homem disparar contra o capitão lá dentro.

Skip foi direto no local onde viu o vulto

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cair, após seu tiro certeiro.

— Veja, coronel! Sangue — apontou ele,

mostrando a mancha evidente na madeira.

As manchas que se seguiam mostravam

que o assassino sangrava muito.

— Vai na direção da paliçada! —

informou Skip.

— Vamos seguí-las — ordenou o

comandante.

— Aqui há uma mancha, junto à paliçada

— mostrou de novo o rapaz. — Parece que

ele parou aqui para recuperar as forças ou,

então, para se esconder. Depois seguem ao

longo da paliçada, com certeza na direção

do portão.

— Vamos ver onde isso vai dar —

determinou o comandante.

Não tiveram dificuldades para seguir a

trilha de sangue pela areia. Ela continuava

após o portão do forte e seguia na direção

do rio, onde se via uma fogueira ainda

queimando.

— Ela vai na direção do acampamento de

Charlie e seus homens — informou o

sentinela.

— Sim, isso mesmo — confirmou Skip.

— Não estou entendendo — confundiu-

se o coronel.

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Chegaram logo ao acampamento. Não

viram ninguém, no entanto, mas as enormes

manchas de sangue e a relva amassada na

direção do rio indicavam que havia

acontecido ali uma chacina.

— Vamos descer o rio, rapazes —

ordenou o coronel.

As tochas foram levadas para a margem.

O grupo foi descendo, acompanhando o

leito do rio, até um ponto onde uma árvore

havia caído, atravessando-o.

Ali, misturados e enroscados aos galhos,

estavam os corpos de Charlie e de seus

homens.

Todos os homens, apesar de acostumados

às piores cenas de batalha, não deixaram de

sentir engulhos ao se depararem com

Charlie e seus homens quase degolados,

numa carnificina covarde e sangrenta.

— Diabos, que matança! — exclamou

Skip. — Quem teria motivo para fazer isso?

— Uma atrocidade! Isso me deixa cada

vez mais confuso. Eram civis e estavam sob

nossa proteção — murmurou o coronel,

enojado com a cena. — Por que um dos

homens de Charlie atiraria no Capitão

Kane? E depois, quem mataria Charlie e

seus homens? Qual o objetivo de tudo isso?

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O que está acontecendo aqui?

Skip riu um dos corpos, com uma

mancha de sangue na altura da barriga.

— Veja, senhor — disse ao comandante.

— Aquele homem ali parece ser o único

que apresenta um ferimento de bala. Deve

ser o homem contra quem eu atirei lá no

forte. Se pudermos extrair a bala, teremos a

confirmação.

O coronel concordou com Skip. Estava

transtornado com o que cia a sua frente.

— Tenente Bolt, eu lhe disse que

protegesse Charlie e seus homens — falou

ele, furioso.

— Eu sinto muito, coronel, mas nada

pude fazer. Eu pedi a Charlie que deixasse o

forte. Ele me atendeu e veio para cá. Eu

temia que, mesmo assim, pudesse haver

uma represália por parte dos soldados...

— Acha que os soldados fizeram isso,

comandante? Por quê? — indagou Skip.

Ele hesitou, antes de responder.

— Os soldados gostavam de seu irmão e

tinham verdadeira aversão por Charlie, por

causa de seu depoimento. Não acredito, no

entanto, que meus homens chegassem a tais

excessos.

— É difícil prever o que um homem pode

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fazer por vingança, coronel — falou Bolt.

— Ordeno uma investigação imediata,

tenente. Reuna os homens, tenente, vamos

ver o que eles têm a dizer sobre isso —

ordenou o coronel.

— Imediatamente, senhor!

Enquanto Bolt tomava as providências, o

coronel mandou que uma turma viesse para

retirar os corpos do rio. Skip aproveitou

para dar uma volta pelas redondezas,

observando as pistas ainda recentes.

Quando retornou ao forte, tinha feito

algumas observações importantes, por isso

foi ter com o coronel.

— Não creio que os soldados tiveram

alguma coisa a ver com aqueles mortos,

coronel.

— O que descobriu?

— Os atacantes vieram do outro lado do

rio, não do forte. Depois que fizeram essa

barbaridade, não tomaram o rumo do forte.

— Para onde foram?

— Na direção de Tucson.

O semblante do coronel indicava que ele

estava cada vez mais confuso com tudo

aquilo.

— Talvez tenha sido uma vingança,

coronel — sugeriu Bolt. — Charlie tinha

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inimigos de ponta a ponto do território.

— Pode ser — concordou o coronel. —

Vai voltar à cidade ainda hoje, Skip?

— Sim, coronel. Cavalgarei para lá agora

mesmo.

— Procure o xerife e conte-lhe o que

aconteceu aqui...

— Foi bom mencionar isso, coronel.

Quando saí de Tucson, o xerife e meu irmão

não tinha chegado ainda. Não os encontrei

pelo caminho. Sabe que trilha podem ter

tomado?

— Estranho! Saíram logo depois da

alvorada... Não é possível! Tinham de ter

chegado — surpreendeu-se o militar.

— Alguma coisa deve ter acontecido —

falou Skip, apreensivo.

— Sugiro, então, que parta

imediatamente para lá, em companhia do

soldado Beef. Caso alguma coisa tenha

acontecido ao xerife, Beef voltará para me

avisar.

— Farei isso, coronel. Vamos, soldado!

— disse Skip ao homem que o

acompanharia.

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Amanhecia um novo dia em Tucson. A

cidade despertava com as primeiras carroças

e cavaleiros atravessando suas ruas cobertas

de poeira.

Uma ponta de sol penetrou por entre as

cortinas e despertou Kay. Sentia-se

indisposta, pois havia chorado muito na

noite anterior ao saber da morte de Steve.

Um ruído na porta dos fundos de seu

quarto chamou-lhe a atenção. Aquela porta

dava para um beco nos fundos do saloon e

não seria a primeira vez que tentariam

molestá-la.

Apanhou sua Winchester, disposta a dar

uma lição no desordeiro, como já havia

feito antes, com alguns deles. Ao abrir a

porta, teve uma surpresa.

— Steve! — gritou ela, doida de alegria,

ao vê-lo com vida a sua porta.

— Ajude-me, Kay — pediu ele. — Estou

ferido.

Ela o ajudou a entrar. Levou-o e deitou-o

em sua cama.

— Deixe-me ver esses ferimentos —

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pediu ela.

— Estou bem... O Capitão Kane fez um

ótimo trabalho.

— O que aconteceu? Quase fiquei louca,

imaginando que você tivesse morrido...

— Não falou com Joe Pena Branca?

— Joe morreu antes de me contar

qualquer coisa.

— Joe? Morto? como diabos isso

aconteceu?

— Deixe-me ver esses ferimentos

primeiros — pediu ela, desabotoando a

camisa que ele vestia. — Vou buscar

ataduras. Será bom trocar os curativos.

Após apanhar o que precisava, Kay

contou-lhe o que tinha acontecido, enquanto

trocava o curativo.

— Graças a Deus Skip está aqui —

comentou Steve. — Isso me deixa mais

aliviado. Posso contar com ele para me

ajudar.

— Assim que ele voltar do Forte Bowie,

eu o trarei aqui. Agora descanse, enquanto

vou lhe preparar alguma coisa para comer.

Você me parece muito fraco.

Kay desceu até o restaurante, anexo ao

saloon, e pediu que preparassem uma

bandeja com um reforçado desjejum. Assim

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que ficou pronta, levou para Skip, após ter

recomendado ao pessoal que a

informassem, tão logo Skip voltasse do

forte.

— Quem foi o responsável por tudo isso,

Steve? — indagou ela, enquanto ele comia.

— Foi Charlie e seu bando de renegados.

— Charlie? Tem certeza? Então Skip

pode estar correndo perigo...

— Não se preocupe com meu irmão,

Kay. Ele sabe se defender.

— Então vou avisar Paterson, o ajudante

de xerife que está assumindo o cargo, na

ausência do xerife...

— Não, você não pode avisá-lo, não até

que eu possa provar a minha inocência.

— Não se preocupe! Ken Paterson é

amigo e está do nosso lado...

— Mesmo assim, prefiro não me arriscar.

— Não se preocupe. Deixe que eu cuido

de tudo. Agora que está alimentado, durma.

Eu o acordarei assim que o Skip chegar.

Enquanto Kay esperava Steve dormir,

Skip chegava à cidade e se dirigia até a

cadeia, onde se identificou. Perguntou de

Steve ao xerife.

— Estão todos mortos, o grupo todo que

saiu daquele forte — informou Paterson. —

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Eu sinto muito!

— Tem certeza disso?

— Absoluta. Descobri o local da

emboscada. Dali segui uma trilha até a toca

de Joe Pena Branca.

— Eu o conheço, foi morto ao trazer um

recado para Kay...

— Sei disso. No esconderijo de Joe,

havia uma sepultura recém-feita com a

túnica do Capitão Master espetada no galho

que servia de cruz. Havia buracos de três

balas e muito sangue...

— Steve... Morto? Não posso acreditar!

— falou Skip, desolado, sentando-se e

demonstrando seu cansaço pelas

atribulações que havia enfrentado. —

Charlie também está morto. Era o único que

poderia livrar meu irmão dessas acusações...

Tudo estava muito complicado para o

ajudante de xerife. Ele foi apanhar um

pouco de café para si e para os outros com

ele, enquanto pensava no assunto.

— Não sei, Skip, mas há algumas coisas

estranhas em tudo isso. Quando estive

ontem, na caverna do Joe, notei rastros de

cavalos que vinham da cidade e depois

seguiram na direção do forte.

— E o que há de estranho nisso?

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— Bem, os cavalos do Exército usam

uma ferradura fácil de ser reconhecida.

Posso lhe afirmar que eram da Cavalaria.

— Quantos cavalos? — indagou Skip,

interessado.

— Dois, por quê?

— Havia dois homens da cavalaria ontem

no saloon. Um deles era um tenente e o

outro, um cabo. Foram eles que agrediram

Joe.

— Soldados agrediram Joe? — estranhou

Paterson.

— Sim, e foram, com toda certeza, os

mesmo que visitaram a caverna do índio.

Kay os conhece. Vou perguntar a ela quem

aram.

— Sim, faça isso. Acho que deveríamos

retornar ao forte, em seguida.

Skip concordou e deixou a cadeia,

dirigindo-se ao saloon. Subiu até o quarto

de Kay. Bateu na porta. Ela o atendeu,

pedindo silêncio.

— Não faça barulho — disse ela. —

Steve está aqui e está vivo!

— Oh, graças a Deus! E como está ele?

— Ferido, mas bem. Vai se recuperar.

— Então agora só tenho que me

concentrar em provar a sua inocência. Diga-

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me uma coisa: quem eram aqueles dois

militares com quem briguei ontem?

— Tenente Bolt e Cabo Storm, por quê?

— Cuide de meu irmão. Depois eu

explico — disse ele, deixando-os e

descendo até o saloon. Quando ia sair,

encontrou-se com Carlson e seus homens.

— Saia da minha frente, irmão do

renegado! — disse Carlson.

Com uma rapidez espantosa, Skip sacou a

arma e bateu com o cano na cabeça de

outro, derrubando-o. Os outros homens

tentaram reagir, mas Skip lhes apontou sua

arma, já engatilhada.

Carlson se levantava, aturdido.

— Não gostei de você desde o principio,

Carlson. Sei que anda metido em alguma

armação. Se tem a ver com toda essa

história que prejudicou meu irmão, juro

como o faço se arrepender do que fez. —

afirmou Skip, deixando-os.

Foi até a cadeia, onde Ken o aguardava,

contando-lhe sobre Steve.

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No forte Bowie, após receber uma

mensagem, o Coronel Donald solicitou a

presença do Tenente Bolt. Quando este

chegou à sala, Donald relia a mensagem

recebida.

— Tenente, acabo de receber esta

mensagem do Forte Douglas. O embarque

foi marcado. Você, a escolta e a carroça

deverão partir ao entardecer. Cavalgarão

toda a noite para evitar curiosos. Apanharão

o ouro amanhã cedo e tomarão a rota para

Phoenix.

— Entendido, senhor! Temos de mandar,

então, um mensageiro a Tucson informar

Carlson.

— Quem você sugere?

— Mande o Cabo Storm.

— Certo, faça isso. Vou preparar o

comunicado oficial para ser entregue a

Carlson. Oriente Storm, depois faça a

seleção dos homens para a escolta.

Bolt saiu satisfeito. Tudo corria dentro

dos seus planos. Foi avisar Storm para que

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pegasse o comunicado com o coronel e

fosse imediatamente avisar Carlson.

Storm apanhou a mensagem com o

coronel e se dirigiu à cidade. Lá se

encontrou com Carlson e combinaram os

últimos detalhes do plano, conforme

orientado por Bolt.

— Há um probleminha ainda, Storm —

informou Carlson. — Aquele intrometido

do Skip Master precisa ser liquidado. Acho

que suspeita de alguma coisa.

— Então precisamos nos livrar dele. Com

o plano em andamento não podemos mais

correr riscos.

— Tem razão.

— Pegue a carroça e um cocheiro auxiliar

e vamos partir. Deixe alguns de seus

homens para cuidar desse Skip.

— Certo, vou nomear Ben e Jim para

cuidar disso. São homens de confiança e

bons atiradores.

— Perfeito! Vamos nos apressar. O

Tenente não vai admitir atrasos —

apressou-o Storm. — Nosso investimento é

muito grande e exige ações rápidas agora.

— Vou preparar a carroça. Em menos de

meia hora estaremos a caminho —

prometeu Carlson.

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Skip, naquele momento, conversava com

o xerife, terminado de lhe contar que

encontrara Steve com vida no saloon de

Kay. Sugeriu que esperassem até que ele

acordasse, antes de tomar qualquer decisão,

inclusive ir até o forte, por isso adiaram,

então, a viagem.

Skip saiu para a rua. Havia percebido que

seu cavalo mancava, desde que voltara do

forte. Decidiu levá-lo ao ferreiro.

— Penso que tenha soltado a ferradura —

falou ele.

— Sim, já percebi. Vai deixá-lo aqui?

— Sim, eu volto para pegá-lo mais tarde.

Ao sair, Skip notou, pela primeira vez, os

dois homens de Carlson, plantados do outro

lado da rua. Não deu muita importância ao

fato e dirigiu-se ao saloon.

— Como está ele, Kay? — indagou à

garota.

— Ainda dorme, Skip. Isso é bom.

Trouxe o doutor para dar uma olhada nos

ferimentos. Está tudo normal, sem nenhuma

infeção, felizmente.

— Podemos confiar no médico?

— Sim, ele não revelará a ninguém a

presença de Steve aqui. O que pretende

fazer agora?

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— Tem algo me incomodando. Vou dar

uma volta para ver se esclareço — disse ele,

referindo-se aos dois homens que o

seguiam.

Deixando o saloon, Skip quase esbarrou

neles. Suas suspeitas se confirmaram. Para

se assegurar, dirigiu-se ao restaurante onde

comeu alguma coisa.

Durante todo o tempo os homens

permaneceram ali perto, observando-o. Não

teve mais dúvida. Foi até o ferreiro, que

terminara o serviço, apanhou o cavalo e foi

cavalgar nas imediações, como se tivesse

um destino definido.

Não demorou muito para constatar que os

dois homens o seguiam ali também.

Escondeu seu cavalo, apanhou seu rifle e

ficou aguardando, oculto.

Ben e Jim conversavam, enquanto

seguiam a pista de Skip.

— O que ele estará fazendo por aqui? —

indagou Jim.

— Não tenho a menor idéia, mas isso

vem bem a calhar para nós. Um pouco mais

e poderemos acertá-lo sem nenhuma

testemunha.

— O filho da mãe mal sabe que está

cavalgando para a morte.

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— Veja, a pista segue para aquela trilha

ali, nas pedras.

— Vamos apressar o passo para alcançá-

lo e liquidá-lo logo. Quero voltar logo ao

saloon e tomar uma boa cerveja gelada...

— Eu não teria tanta pressa assim —

disse-lhes uma voz forte e ameaçadora,

seguida do ruído característico de um rifle

sendo engatilhado.

Os dois cavaleiros estacaram, surpresos e

sem reação, quando Skip saiu de trás de

uma pedra com a arma engatilhada.

— Desmontem! Vamos ter uma conversa

— ordenou.

Os dois, sem outra alternativa,

obedeceram.

— Agora soltem seus cinturões com

bastante cuidado!

— O que deseja de nós? — quis saber

Ben, assustado.

— Algumas informações.

— O quê?

— Quero que me digam tudo que puder

me interessar. Vocês escolhem.

— Não pode nos obrigar a falar — disse

Jim.

— Isso quem decidirá sou eu. Eu tenho a

arma — falou Skip, com energia.

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Skip apanhou um pedaço de corda em seu

alforje e o atirou para Jim, ordenando:

— Amarre as mãos de seu amigo! E nada

de truques.

— O que vai fazer conosco?

— Dependerá de vocês. Se falarem

espontaneamente, tudo será mais fácil.

Quando Jim terminou de amarrar as mãos

de Ben, Skip se aproximou dele.

— Estenda a mão! — ordenou.

Jim pareceu que obedeceria, mas, quando

Skip se voltou ligeiramente para apanhar

outro pedaço de corda, Jim avançou sobre

ele resolutamente.

O rapaz desviou-se agilmente e golpeou a

nuca de seu atacante com a coronha do rifle,

provocando um ruído seco, de algo se

quebrando.

Jim caiu imóvel na poeira e ali ficou.

— Maldito! você o matou! — berrou

Ben, vendo o corpo do amigo imóvel a sua

frente.

— Que lhe sirva de lição para não bancar

o engraçadinho comigo — respondeu Skip,

indo apanhar seu laço.

Prendeu a ponta nas mãos amarradas de

Ben, depois montou seu cavalo. Amarrou a

ponta da corda no arção da sela.

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— Ok, meu amigo! Tem duas opções: ou

conta o que sabe ou vamos dar um passeio

por entre as pedras e os cactos.

— Não pode fazer isso... Se me matar...

— O que acontece? Você fica aqui e

apodrece, servindo de pasto para os abutres.

— Pode me matar! — disse Ben,

valentemente. — Não saberá de nada. E não

há meio de me fazer abrir a boca.

— Não sei... Sempre pode haver alguma

coisa nova, não? — respondeu Skip,

esporeando seu cavalo.

Procurou não maltratar muito o homem

que trazia de arrasto na ponta da corda, mas

provocou-lhe algumas boas escoriações e

arranhados.

E estava apenas começando. Após

cavalgar por algum tempo por entre pedras

e cactos, notou que Ben já apresentava

diversos ferimentos pelo corpo todo e

berrava feito um carneiro degolado.

Cavalgou um pouco mais e diminuiu a

marcha, encontrando algo interessante a sua

frente.

— E então, vai me contar o que sabe? —

indagou Skip.

— Maldito! Vai queimar no fogo do

inferno e nunca saberá de nada pela minha

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boca!

— É, você é um osso duro de roer,

homem, mas só está piorando as coisas para

você — disse Skip, desmontando.

Caminhou até o feiro, que tentava se

levantar. Sem nenhuma palavra, golpeou-o

na cabeça, desacordando-o.

Quando Ben voltou a si, notou,

horrorizado, que estava amarrado a quatro

estacas onde estava presos seus braços e

pernas, à moda índia.

As roupas haviam sido rasgadas, expondo

seus ferimentos ao sol. Erguendo

dolorosamente a cabeça, viu que Skip

triturava algo com uma rocha, batendo

numa cavidade na pedra. Depois, derramou

ali um pouco de água.

Feito isso, retirou o lenço do pescoço e

ensopou-o naquele líquido. Aproximou-se

em seguida do pistoleiro.

— O que é isso?

— Uma receita índia para curar feridas,

não conhece? E feita com isto com isto —

falou-lhe Skip, mostrando algo em sua outra

mão.

Ben olhou e, após assegurar-se de que

seus olhos realmente viam uma pimenta

brava na mão de Skip, contorceu-se todo,

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tentando se libertar.

— É inútil, meu amigo. De nada vai lhe

adiantar se debater dessa forma. Quando

mais o fizer, mais sangrará. Fale ou vai

arder vivo!

— Não falarei! — gritou Ben, fechando

os olhos.

Skip não hesitou, apertou o lenço em sua

mão, fazendo com que o líquido que o

impregnava gotejasse sobre as feridas de

seu prisioneiro.

Ben sentiu sua cabeça latejar e tudo girar

ao seu redor ante o sofrimento que lhe era

imposto. Um urro animal escapou-lhe da

garganta, antes de gemer, quase sem

consciência.

— Eu falo... Eu falo o que quiser... —

disse ele, num sopro de voz. — Estou

pegando fogo...

— Comece me contando o que é mais

importante...

— Carlson vai roubar o ouro da

Cavalaria... Ele e o tenente.

— Qual tenente? Bolt?

— Sim, esse mesmo.

— O que meu irmão teve a ver com tudo

isso?

— Seu irmão era inocente de tudo. Bolt

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roubou os rifles e matou os sentinelas. Os

rifles foram dados a Charlie para que

mentisse durante a Corte Marcial,

incriminando o capitão...

— Por que tiveram que tirá-lo do

caminho?

— Steve Master comandaria a escolta.

Bolt queria aquele posto para poder roubar

o ouro. Armou toda aquela trama contra seu

irmão, conseguindo afastá-lo. Agora solte-

me... Não agüento mais... Estou em fogo...

— Sim, agora acho que já entendi tudo

— comentou Skip, cortando as cordas que

prendiam Ben e atirando-lhe um cantil de

água.

Ben, desesperado, esfregou água pelo

corpo, contorcendo-se em dores. Viu que

seu algoz se distraía, pensando em alguma

coisa. Abaixou-se, fingindo que se lavava, e

apanhou um punhado de areia.

— Master! — chamou.

Quando Skip se voltou para ele, Ben

tirou-lhe a areia nos olhos com rapidez.

Cego de dor, Skip ainda golpeou o ar com o

rifle, tentando atingi-lo.

Seu cavalo e o de Jim haviam seguido a

montaria de Skip. Por isso, foi fácil para ele

saltar no lombo de seu animal e esporeá-lo

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na direção da cidade.

— Maldito verme! Devia tê-lo matado

logo — resmungava Skip, derramando água

nos olhos.

Mais tarde, quando conseguiu chegar à

cidade, falou com Paterson, contando-lhe

tudo que conseguira descobrir de seu

prisioneiro.

— É uma pena que ele tenha escapado,

Skip. Poderia testemunhar a favor de seu

irmão, livrando-o das acusações.

— Não faz mal. Estamos na pista certa. O

importante agora é localizar Carlson e

prendê-lo. Se ele se negar a admitir a culpa,

eu darei a ele o mesmo tratamento que dei a

um de seus homens. Depois dele, resta-nos

acertar contas com o Tenente Bolt —

sugeriu Skip.

— Concordo com você. Vamos até a

Horselines, Carlson deve estar lá.

Os dois foram até lá, onde receberam a

informação que Carlson havia partido para

uma viagem a serviço da Cavalaria.

— Precisamos andar rápidos — disse

Skip. — Vamos para o forte. Vou até o

saloon avisar Kay. Ela ficará contente ao

saber da inocência de meu irmão.

Skip dirigiu-se rapidamente no saloon e

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falou com a garota.

— Sempre acreditei na inocência dele —

afirmou ela.

— E eu a agradeço por isso Kay. Quando

Steve acordar, diga a ele que os problemas

acabaram.

— Mas você ainda terá que provar isso.

Como vai fazer?

— Eu e Paterson vamos ao Forte Bowie

agora mesmo. Falaremos com o coronel e

ele nos ajudará, tenho certeza.

— Boa sorte, Skip!

O rapaz deixou o saloon. Ken o esperava

à porta, com os cavalos.

— Precisamos nos apressar. O amigo de

Carlson que fugiu pode estar indo avisá-lo.

— Chegaremos a tempo! — garantiu

Paterson.

Pouco depois cavalgavam a galope pela

trilha que os levaria ao Forte Bowie.

Ken e Skip haviam chegado ao forte no

meio da noite. Após acordarem o coronel,

Skip contou-lhe tudo que descobriu por

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intermédio do capanga de Carlson.

— Tudo fica claro agora, coronel. O

tenente Bolt vai roubar o ouro — afirmou o

rapaz.

— Não posso acreditar. Bolt era um

oficial e cavalheiro, não faria isso. Tinha

uma folha de serviços excelente!

— Meu irmão também tinha uma ficha

excelente, mas isso não foi empecilho para

que o desacreditassem, coronel. A única que

sempre teve alguma coisa a lucrar com a

condenação dele foi Bolt, que desejava todo

o controle do transporte do ouro para si.

— Há uma escolta de vinte soldados com

ele — informou o comandante.

— Nem todos devem estar ao lado dele.

— Pode nos arrumar alguns soldados,

coronel? Vamos precisar de ajuda para

capturar o tenente e seus homens. Não

sabemos quantos soldados estão

mancomunados com ele — falou Paterson.

— É uma situação delicada. Estou

desfalcado de vinte de meus melhores

soldados. Não posso comprometer ainda

mais a segurança do forte.

— A região está tranqüila, coronel. De

qualquer modo, diga-nos então qual a rota

que eles tomarão — pediu Skip.

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— O que estão me pedindo é sigilo

militar. Não tenho meios de saber se estão

mentindo ou não, se isso não é um plano

para se apossarem do ouro...

— Terá de acreditar em nós, coronel —

afirmou Skip.

O coronel indeciso pela sala, soltando

longas baforadas de seu cachimbo. Skip e

Ken estavam impacientes.

— Quanto mais nos demorarmos, melhor

para eles, coronel — apressou-o Skip.

— Tem que acreditar em nós,

comandante. Se aquele ouro for roubado,

toda a sua carreira poderá ser destruída, tem

de considerar esta possibilidade —

ponderou Ken.

— Demônios! Vocês têm razão. Estou

convencido. Vejam, esta vai ser a rota —

disse ele, finalmente, abrindo o mapa sobre

a mesa e apontando o traço marcado que

indicava a rota a ser seguida para

transportar o ouro.

— É o bastante, coronel. Vamos partir

imediatamente. Eles levam uma boa

dianteira, mas vamos encontrar uma forma

de neutralizar isso — comentou Skip.

— Talvez eu possa ajudar nisso,

senhores, já que me prestam um inestimável

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serviço. Há um homem que vai ajudá-los.

Conhece todo o território como a palma da

mão.

O coronel dirigiu-se ao seu ordenança,

dando-lhe uma ordem. O soldado saiu

rapidamente, retornando logo depois em

companhia de um velho batedor da

Cavalaria.

— Este é Old Horse, trabalha comigo há

mais de vinte anos e conhece este território

de ponta a ponta.

— Muito bem, Old Horse. Diga-nos qual

a melhor maneira de chegarmos a Forte

Douglas à frente do tenente?

— Quando ele saiu?

— No fim da tarde — informou o

coronel.

O velho índio examinou o mapa

estendido a sua frente. Após analisá-lo,

concluiu sabiamente:

— Não há como chegar na frente dele. O

melhor agora é esperá-lo, quando retornar

do Forte Douglas.

— Pode ser uma alternativa, mas quem

nos garante que ele não tomará logo uma

trilha para o México? — questionou Skip.

— Nenhuma trilha para carroça segue

para o México, antes do Desfiladeiro da

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Águia. Ali é o melhor lugar para esperá-los

— informou o índio, apontando no mapa o

local.

— O que me diz, Ken? — indagou-lhe

Skip.

— Acho que ele tem toda razão. Agora só

dependemos de você, coronel. Sozinhos não

poderemos enfrentar todos eles.

— É uma questão a considerar, senhores

— comentou o coronel depositando seu

cachimbo na mesa. — Minha carreira pode

estar em jogo. Acho que devo tomar as

minhas precauções. Vou acompanhá-los, é a

única maneira de evitar o roubo do ouro.

— Boa decisão, coronel — elogiou Skip.

— Ordenança, acorde os homens. Quero

os melhores atiradores prontos para partir

em dez minutos.

— Old Horse vai guiá-los. Estaremos no

desfiladeiro logo ao nascer do sol! —

informou o índio.

Dez minutos mais tarde, quinze dos

melhores atiradores do forte formavam uma

coluna sob as ordens do coronel. partiram

imediatamente, em companhia de Skip e de

Paterson.

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As carroças já haviam sido carregadas.

Bolt assinou o recibo pelo transporte e

partiu de Douglas, seguindo a rota traçada.

Pretendia, ao chegar ao deserto, dar cabo

dos homens da escolta que não estivessem

com ele e, após a partilha, seguir para o

México, onde o esperava uma vida de rei.

— Há alguém nos seguindo — informou

um soldado.

— Vejam quem é e tragam-no aqui —

ordenou Bolt.

Pouco mais tarde, os soldados traziam

Ben até ela.

— O que houve? Onde está Jim? — quis

saber Carlson.

— Jim está morto. Skip Master o matou.

Sabe de todo o plano.

— Sabe? E como descobriu?

— Olhe para mim... Tive de contar-lhe

ou ele me matava.

— E como escapou?

— Ele se distraiu e eu pude fugir.

Infelizmente não pude matá-lo, o que me

daria muito prazer.

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— Está bem, você fez o que pôde. Siga

com a gente. Tomará parte no bolo também

— falou Carlson.

O tenente aproximou seu cavalo de

carroça conduzida por Carlson e pulou para

a boléia, sentando-se ao lado do cocheiro.

— O que vamos fazer? Master deve ter

informado o coronel. Eles devem estar em

nosso encalço agora — comentou Carlson.

— Não precisamos nos preocupar.

Levamos um boa dianteira sobre eles. Após

o Desfiladeiro da Águia, há uma trilha que

nos conduzirá ao México. Deixaremos a

carroça após a partilha.

— Quantos homens são fiéis a você na

escolta?

— Todos. Eu os escolhi a dedo.

— Excelente, então está melhor do que

eu imaginava.

— Sim, eu resolvi jogar seguro. Com

todo esse dinheiro em jogo, não podia

facilitar. São leais a mim e lutarão até à

morte, pela sua parte no ouro.

— Bem pensado, tenente.

— Metade do ouro é minha, um quarto é

seu e o restante será dividido entre eles.

— Ainda assim, haverá mais ouro do que

poderemos carregar — falou Carlson,

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satisfeito.

A viagem foi tranqüila até o desfiladeiro.

Bolt havia alertado seus homens para que

ficassem atentos a qualquer nuvem de

poeira que indicasse a aproximação de

alguma patrulha.

Quanto mais se aproximavam do

desfiladeiro, mas sua segurança aumentava.

Estava confiante que não seriam mais

alcançados.

Quando entraram na garganta rochosa,

havia um desmoronamento tapando a

passagem. Fora, na verdade, provocado

pelos homens do forte, sob as ordens de

Skip.

Bolt cavalgou até lá, quando os batedores

informaram.

— Demônios! Só faltava essa — disse

ele, olhando ao redor.

Não sentiu cheiro de pólvora, que

indicaria que a explosão havia sido

provocada. Tudo parecia muito natural.

— Vamos tratar de limpar a estrada,

rapazes. Não temos o dia todo e o México

nos espera — ordenou.

Os homens desmontaram e se atiraram

animados ao trabalho, procurando abrir uma

trilha para a passagem dos cavalos e da

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carroça.

Inesperadamente, um tiro soou pelo

desfiladeiro, seguido pela voz do coronel.

— Tenente Bolt, considere-se preso, você

e seus homens, bando maldito de traidores!

Bolt pulou de seu cavalo para baixo da

carroça, juntamente com Carlson.

— Demônios! Como chegaram aqui tão

depressa? — indagou o tenente.

— Acho que é muito lógico. Eles se

anteciparam a nós, tenente. Ao invés de nos

seguirem até o Forte Douglas, vieram nos

esperar aqui, única rota para o México.

— Temos armas e homens. Arrisquei

minha carreira neste golpe. Não vou me

render, Carlson.

— E então, tenente? O que me diz? Tem

um minuto para depor as armas e se

entregar. Enfrentará uma Corte Marcial por

deserção e roubo. Não tem saída! — insistiu

o coronel.

— Ora, vá para o inferno! — rugiu Bolt,

fora de si, disparando sua arma a esmo.

O tiroteio que se seguiu fez estremecer as

paredes do desfiladeiro. A fumaça

obscureceu o sol, mas a vitoria não pendia

para nenhum dos lados.

Os homens do coronel, abrigados atrás

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das pedras, tinham que lutar contra os

homens de Bolt, o culto sob a carroça e

atrás das pedras do desabamento.

As balas ricocheteavam e zumbiam por

todos os lados.

— Ficaremos aqui o dia todo, coronel, e

não conseguiremos desentocá-los. Quando

anoitecer, poderão fugir — opinou Skip.

— Precisamos fazer alguma coisa para

tirá-los de lá — ajuntou Paterson.

— Nada podemos fazer, sem prejuízo do

ouro, cavalheiros. Pensei em dinamitar

aquelas rochas e a carroça, mas perderia o

ouro.

— Tentar atear fogo à carroça também

está fora de questão. Alguém teria que se

expor perigosamente para atirar uma tocha e

mesmo isso não seria muito eficaz —

ponderou Skip.

— Temos que pensar em um outro plano

e jogar com a paciência — sugeriu

Paterson.

— Nesse caso, só há uma coisa que

poderemos fazer — ponderou Skip. —

Vamos esgotá-los. Fecharemos a saída do

desfiladeiro e poremos guardas ali. A idéia

é deixá-los encurralados lá dentro. Se o

plano der certo, cedo ou tarde eles terão de

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sair.

— Pode demorar alguns dias — falou o

coronel.

— Mas haverá uma vantagem nisso.

— Qual?

— Pegaremos todos eles com vida.

Podemos mandar um emissário ao Forte

Douglas pedir reforços, água e comida.

Teremos todo o tempo do mundo, enquanto

que eles, não. O que me diz, coronel?

— Acho que pode dar certo, Skip.

Assuma o comando disso. Pedirei que

cessem o fogo e você transmitirá o plano

para os meus homens.

— Muito bem, homens. A idéia é

evitarmos ao máximo baixas de nosso lado.

Vocês farão o seguinte, então. Quero que

matem todo os cavalos que estão lá

embaixo, principalmente aqueles atrelados à

carroça. Quero que furem, também, os

tambores de água presos à carroça.

— Qual o objetivo disso, senhor? —

indagou um deles.

— Mesmo que cada um deles ainda tenha

água em seu cantil, ela não vai durar muito.

Vamos fechar a saída deles também. Em

breve eles começarão a sofrer pela fome e

pela sede. Além disso, os animais mortos

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logo vão saturar o ar com a pior carniça que

aqueles homens já sentiram.

— Isso pode dar certo — comentou

outro.

— Vai dar certo. Vamos tentar, depois,

pela última vez, obter a rendição. Se eles

não concordarem, vou mandar um emissário

ao Forte Douglas pedir reforços, água e

comida. Poderemos ficar indefinidamente,

enquanto eles, não. Em breve estarão

desesperados — anunciou o coronel.

— Vamos lá, rapazes. Caprichem na

pontaria — finalizou Skip.

Os homens foram tomar posição e, pouco

depois, foram disparando certeiramente,

abatendo os cavalos, destruindo os barris de

água.

Bolt ficou atônito diante daquilo. Carlson

entendeu imediatamente o plano.

— Diabos! tenente! Estamos

encurralados como ratos numa ratoeira!

— Mataram os cavalos... Malditos!

Cortaram nosso único meio de fuga...

— Acabaram com nossa reserva de água.

Podem nos manter aqui por quanto tempo

quiserem. Sem contar que, em breve, a

carniça vai tornar isso insuportável.

— Só temos uma chance agora. Vamos

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esperar anoitecer e tentar fugir.

— A pé? Seríamos caçados como

coelhos.

— Não, vamos agir como soldados.

Vamos atacar. Há cavalos com eles. Nós os

tomaremos...

— Está sendo muito otimista, tenente.

— Confie em mim. Eu sei o que falo.

Naquele momento, o coronel voltou a

falar.

— Atenção, homens! Rendam-se! A

loucura do tenente vai levar todos vocês à

morte. Prometo um julgamento justo para

aqueles que depuserem suas armas.

— Se alguém fizer isso, será morto como

um rato — ameaçou o tenente.

Os homens não se moveram.

Permaneceram em seus esconderijos,

embora muitos desejassem se entregar.

Sabia que a situação era insuportável. Só

sairiam dali mortos, se seguissem o tenente.

Bolt determinou que esperassem o

anoitecer. Mandou Storm correr entre os

soldados, informando que, à noite, iriam

atacar a posição dos outros soldados,

tomando-lhes os cavalos para poderem

fugir.

Quando anoiteceu, no entanto, os homens

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do coronel fizeram fogueiras na entrada e na

saída do desfiladeiro, iluminando tudo e

impedindo qualquer ação.

— E agora, tenente? O que vai fazer?

Meteu-nos numa boa encrenca. Grande

plano foi o seu! — zombou Carlson.

— Não banque o espertinho agora,

Carlson. Foi o seu homem idiota que nos

pôs nesta armadilha. Se ele não fosse

covarde e tivesse mentido a boca fechada, já

estaríamos a caminho do México com o

ouro.

— Não sou covarde — reclamou Ben,

sob a carroça, com eles.

— Ele tem razão, tenente. Não temos

mais saída agora. Vamos nos entregar. Seus

soldados estão com medo de morrer

também. Tudo está perdido — ponderou

Carlson.

— Ninguém vai desertar aqui. O primeiro

que fizer isso será morto — gritou o

tenente, fora de si.

— Pois eu vou, não sou um de seus

soldadinhos de chumbo para obedecer suas

ordens — respondeu Ben, rolando para fora

e levantando-se com as mãos para cima.

O Tenente Bolt engatilhou seu Colt e

disparou nas costas dele, jogando-o para

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frente, de boca na poeira.

— Maldito, sanguinário! Não pode

reconhecer a derrota? — indagou-lhe

Carlson, encostando o cano de sua arma na

barriga dele e disparando.

O tenente rolou, gemendo de dor e

tentando apagar o fogo que queimava sua

túnica, ateado pela pólvora do tiro de

Carlson.

— Maldição! Ele me baleou! — falou

Bolt, levantando-se, gemendo de dor.

Um novo disparo ecoou pelo desfiladeiro

e o tenente parou de gemer no ato. Seu

corpo foi arremessado na poeira pelo

disparo certeiro da arma de Carlson.

— Seu covarde traiçoeiro! — rugiu

Storm, ao ver o tenente estrebuchar na

poeira.

— É melhor se acalmar, cabo, ou terá o

mesmo destino do tenente.

— Seu idiota, não vê que estamos

perdidos de qualquer modo? Se nos

entregarmos, seremos enforcados. Já devem

ter descoberto nossa participação nas mortes

do xerife, do Capitão Kane, de Charlie e

seus renegados...

— E o que sugere, sabichão?

— Vamos lutar, é a única maneira.

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Vamos lutar por nossas vidas e tentar sair

daqui da melhor maneira possível.

Encheremos nosso alforjes com ouro,

tentaremos roubar alguns cavalos deles.

Mandaremos os soldados na frente.

Enquanto eles atraem a atenção, fugiremos

por outro lado.

— Pode dar certo — concordou Carlson.

Storm deu as ordens aos homens. Eles,

em desespero e cheios de cobiça ao verem o

ouro, encheram bolsos e alforjes e tentaram

abrir caminho a bala, mas não tiveram sorte.

Foram sendo abatidos como moscas.

Skip e Paterson viram quando Carlson e

Storm tentavam escapar em direção oposta.

Foram ao encontro deles.

— Acho que aqui é o fim da linha —

determinou Skip.

— Maldito bastardo! Eu devia saber que

você estava por trás disso — rugiu Carlson,

tentando sacar a arma.

Storm o imitou, mas os homens diante

deles eram mais rápidos. Skip varou a

garganta e a testa de Carlson e, de quebra,

ainda acertou o peito de Storm, que já

tombava, varado por uma bala de Paterson.

Um silêncio mortal abateu-se sobre o

Desfiladeiro da Águia.

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Duas semanas depois, já refeito dos

ferimentos que recebera, Steve Master era

reintegrado ao seu posto de Capitão da

cavalaria dos Estados Unidos.

— Creio que cometemos um erro muito

grande com você, capitão, mas felizmente

tivemos tempo para reparar isso —

comentou o coronel.

— Graças ao trabalho de meu irmão e à

sua colaboração, senhor.

— Felizmente o ouro não foi roubado,

capitão. Agora é sua responsabilidade levá-

lo a Phoenix, sem mais demora.

— Partirei imediatamente, senhor.

— Não se esqueça que, na volta, será

promovido, conforme a decisão inicial. Só

tem que levar esse carregamento a salvo até

lá.

— Será feito, senhor. Eu lhe garanto.

Steve pôs seu chapéu ao sair da sala de

comando. Kay e Skip esperavam por ele do

lado de fora.

— E então, mano? tudo volta ao seu

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lugar?

— Sim, tudo como antes, Skip, graças a

você. O que pretende fazer agora. Vai ficar

para o nosso casamento? — perguntou-lhe

Steve, abraçando Kay.

— Claro que sim. Além disso, vai haver

brevemente uma eleição para xerife de

Tucson. Pensei em concorrer.

— E Paterson?

— Quer ser meu ajudante.

— Então pode se considerar eleito. Como

primeira missão, peço-lhe que escolte Kay

até a cidade. Partirei para Phoenix para

levar o ouro. Quando voltar, nos casaremos.

— Estarei esperando ansiosa —

respondeu Kay, beijando-o ardentemente

sob os olhares cúmplices de todos os

homens do forte.

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L P Baçan O Mago das Letras

1975: escreveu e publicou seu primeiro

livro de bolso, a novela Uma Tese

para o Amor, pela Editora Cedibra,

Rio de Janeiro, passando, daí, a

escrever mensalmente novelas por

encomenda para essa e outras

editoras.

1985: teve 11 letras incluídas no LP

Saudação ao Mato Grosso, da dupla

Estudante & Caminhoneiro.

1986: teve 6 letras incluídas no LP

Oração de Um Caminhoneiro, da

mesma dupla.

1991: participou da Coletânea do I

Concurso Nacional de Literatura da

FENAE, com um conto premiado

em 1º. lugar.

1994: participou da Antologia Os Poetas,

do V Concurso Helena Kolody de

Poesia, Governo do Paraná, Curitiba

– PR.

1995: traduziu a obra El Contuberneo

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Judeo-Maçónico-Comunista, de José

Antonio Ferrer Benimelli, em 2

volumes intitulados Maçonaria &

Satanismo, para a Editora "A

Trolha".

1996: publicou a novela rural Sassarico,

sobre o fim do ciclo do café, início

da rotação de culturas (soja e trigo)

e surgimento dos bóias-frias e editou

os livros Vida Minha, de Emília

Ramos de Oliveira (biografia) e

Círculo Vicioso, de Arlene Cirino de

Oliveira.

1997: participou da coletânea Poema,

Poesia... Maçom, Maçonaria,

organizada por Mário Cardoso para

a Editora Arte Real.

1998: publicou o livro de poemas

Alchimia.

1999: publicou o livro Redação Passo a

Passo e editou o livro URAÍ - Nossa

Terra, Nossa Gente, 2 volumes, de

Emília Ramos de Oliveira.

2000: teve 2 letras incluídas no CD

Nosso Negócio É Cantar, da dupla

Márcio Rogério & Luciano e 3 letras

no CD Mais, do cantor Cícero de

Souza. Publicou, neste ano de 2000,

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Brincando nos Caminhos do Senhor,

revista infantil cristã, Editora e

Gráfica Cotação da Construção,

Londrina – PR.

2001: editou e prefaciou o livro

Templários, de Lori Andrei Perez

Baçan.

2002: foi o autor da letra do hino da Loja

Maçônica Londrina, em parceria

com o músico Wilmar Cirino.

2004: organizou, editou e participou do

livro I Antologia do Portal "Cá

Estamos Nós".

2006: organizou, editou e participou do

livro II Antologia do Portal "Cá

Estamos Nós".

2007: publicou os livros A Sabedoria dos

Salmos, A Sociedade Secreta dos

Templários e O Livro Secreto da

Maçonaria, pela Universo dos

Livros Editora Ltda.

2010: publicou os livros Manual da

Futura Mamãe, Quem Disse Que

Cozinha Não è Lugar de Homem e

Receitas Naturais pela editora

Universo dos Livros. Editou o livro

de contos Solidariedade, do autor

baiano João Justiniano da Fonseca.

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Produziu, dirigiu e apresentou uma

série de 7 (sete) programas

radiofônicos Vila das Artes, na

Rádio Boa Nova FM, de Pérola, PR,

sobre literatura atual.

2012: traduziu, editou e publicou o livro

A Origem do Satanismo na

Maçonaria, de Arthur Edward

Waite.

2013: traduziu, editou e publicou em

formato eletrônico os livros Carmila,

de J Sheridan LeFanu, e Teoria da

Esgrima a Cavalo, de Alex Muller,

Anjos, o Caminho de Volta, Os Olhos

do Carrasco, Novelas de Terror

(Volumes I e II) Novelas Policiais

(Volumes I a 7) e Novelas de Faroeste

(Volumes I a IX) pela Lulu Press, Inc.

e Editora Saraiva.

1975 até 2015: hoje escreveu mais de 700

livros, publicados em sua maioria

em formato de bolso, sobre os mais

diferentes assuntos, como:

romances, erotismo, palavras

cruzadas, charadas, passatempos,

literatura infantil, passatempos

infantis, horóscopos, esoterismo,

simpatias populares, rezas, orações,

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intenções, anjos, fadas, gnomos,

elementais, amuletos, talismãs,

estresse, manuais práticos, religião e

outros livros de bolso com os mais

diversos temas e letras para músicas.

Já editou em formato eletrônico

mais de 1000 títulos, entre

publicações individuais e antologias,

de autores de Língua Portuguesa e

Espanhola.

Publicou ao longo dos últimos 40 anos

poemas e contos em jornais de

circulação regional. Ultimamente,

Tem traduzido e editado livros

eletrônicos e empenhado em editar

todos seus títulos em formato

eletrônico para serem

disponibilizados a seus leitores.

www.acasadomagodasletras.net