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Novelas de Faroeste
Volume II
L P Baçan
Copyright © 2015 L P Baçan
Todos os direitos reservados. Este livro ou
parte dele não pode ser reproduzido ou
usado de qualquer outra forma nem
divulgado sem a expressa autorização do
autor, exceto o uso de partes para referência
ou comentários.
ISBN 978-1-329-76698-3
Lulu Press, Inc. 3101 Hillsborough St, Raleigh, NC 27607
2015
O Velho e Selvagem Oeste
No Velho e Selvagem Oeste, o saloon era
o local mais movimentado e frequentado da
cidade. Ali aconteciam shows, dança, jogo e
muitas brigas. Ali se encontravam mocinhos
e bandidos, pistoleiros e desafiantes,
mulheres bonitas e perigosas. A maior parte
das histórias de faroeste passava por ele.
Dos ambientes mais simples e rudes aos
mais sofisticados, todos, indistintamente
acolhiam moradores e forasteiros, cada um
com sua história, cada um com seu destino.
Famosos pistoleiros criaram fama nesse
local. Outros ali encontraram a morte, na
boca esfumaçada de um Colt. A fumaça da
pólvora negra era o manto lúgubre que
cobria mais um morto. Um punhado de
serragem era jogado sobre a poça de
sangue. Uma rodada gratuita de uísque
barato era servida e minutos depois
ninguém mais se lembrava do ocorrido.
Afinal, o Oeste era mesmo um lugar
selvagem e as Novelas de Faroeste mostram
isso.
Justiça de Pistoleiros
O calor punha as pessoas nervosas no
Saloon Green River, em Cortez, no
Colorado, próximo de Durango. A falta de
uma cerveja gelada podia levar um homem
a cometer uma loucura.
Foi o que aconteceu com Ned Murdock.
Enraivecido, ele sacou sua faca Bowie e a
cravou no balcão com violência, olhando
furiosamente para o barman.
— Não pense que me assusta, garoto
nervosinho — disse o homem, retirando
uma espingarda de sob o balcão.
Engatilhou-a e apontou-a para o rapaz.
Os dois devastadores canos eram uma
ameaça que não devia ser ignorada.
Mas Ned Murdock estava bêbado e com
sede.
— Cerveja! Eu quero uma cerveja! —
insistiu ele, batendo as mãos no balcão.
— Quero ver seu dinheiro primeiro,
garoto.
— Meu pai tem dinheiro — respondeu
ele, com a voz enrolada, apoiando-se no
balcão para não cair. — Muito dinheiro!
— Se é assim, traga-o aqui.
— Não está acreditando em mim, não é?
— insistiu o jovem, irritado.
— Acredito em você, mas quero ver a cor
de seu dinheiro primeiro.
Ned correu os olhos ao redor, observando
os presentes. Todos acompanhavam a cena
com interesse e isso o fez se sentir
humilhado.
Podia ver o rosto deles como estavam
adorando aquilo. E de fato estavam. Ned era
um garoto vagabundo e arrogante, metido a
pistoleiro.
— Pegue sua faca e saia daqui —
ordenou o barman. — Será bem vindo
quando tiver dinheiro.
Ned o olhou com profundo rancor.
Arrancou a faca da madeira e a guardou na
bainha, presa no cinturão, às costas dele.
Só que não se retirou. Ficou passeando
por entre as mesas, olhando
desafiadoramente para as pessoas, que
evitavam encará-lo.
Sabiam que, bêbado, Ned era sinônimo
de encrenca.
— Você ainda me pagará por isso. Todos
me pagarão por isso — berrou ele,
repentinamente.
— Cale sua boca ou eu mesmo vou atirá-
lo na rua, rapazola metido e irresponsável!
— gritou de volta o barman, já perdendo a
paciência com ele.
— Ainda serei rico como meu pai...
— Certo, quando for, pode voltar aqui e
tomar a sua cerveja. Até lá, pare de
importunar meus fregueses.
— Pare de provocar o garoto — ordenou
Bluf Blanding, de sua mesa.
O barman olhou na direção dele,
balançou a cabeça de um lado para outro e
sorriu para Bluf, entendendo a situação.
Ned olhou na direção daquela mesa. Bluf
fez-lhe um sinal, pedindo que chegasse até
ele.
— Sente-se e beba conosco — convidou.
— Não quero — respondeu o garoto,
demonstrando todo o seu orgulho e
arrogância.
— Vamos lá, sente-se aqui. Podemos
conversar um pouco, amigo.
— Conversar sobre o quê?
— Negócios, por exemplo.
— Negócios? Quer falar de negócios
comigo? — retrucou o rapaz, sentindo-se
importante.
— Sim, claro. Afinal, penso que nós dois,
trabalhando juntos, poderemos ganhar um
bom dinheiro.
O garoto hesitou por instantes, depois
afastou uma cadeira e se sentou.
Bluf lhe serviu uma boa dose de uísque,
que ele tomou de uma só vez.
— Eu sempre o achei um sujeito muito
esperto, Ned. Pena que seu pai não pense
assim e o trate como a um cão sarnento, não
é verdade?
O rosto de Ned se alterou, demonstrando
ódio e rancor extremos. Ele tomou nova
dose que Bluf havia posto no copo.
— Meu pai ainda verá do que sou capaz.
— Eu não entendo como ele deixa você
ser humilhado dessa forma, aqui, nesta
cidade. Ele é rico o bastante para lhe
comprar toda a cerveja de Cortez, incluindo
os bordéis, saloons e cantinas da região. E
você fica por aí, mendigando uma simples
cerveja, para amenizar o calor de uma dia
quente. Considero isso desumano —
comentou Bluf, melífluo, envolvendo o
rapaz com sua conversa fácil e insinuante.
— Ele não me dá nada... Quer que eu
trabalhe como um burro de carga e que
rasteje por alguns níqueis!
— É muita humilhação. ele não tem esse
direito. Concorda comigo?
— Sim, se concordo!
— Pelo que sei, parte daquela fazenda é
sua, com a morte de sua mãe.
— Um quarto dela já é minha, mas só
poderei dispor disso quando tiver vinte e um
anos...
— A menos que algo aconteça com seu
pai... Um acidente... O velho é metido a ser
domador de cavalo bravo, a perseguir rês
em disparada... Essas coisas acontecem —
disse Bluf, sugestivamente, fazendo o rapaz
encará-lo pensativamente.
Serviu outra dose, que o rapaz emborcou
de uma só vez, limpando a boca na manga
da camisa.
— Que tipo de negócio quer fazer
comigo? — indagou a Bluf.
O jogador se debruçou sobre a mesa,
fazendo Ned inclinar-se também.
— Vai precisar de muita coragem para
este negócio.
— Eu tenho — afirmou Ned.
— É um negocio que poderemos
considerar honesto, dependendo do ponto
de vista — continuou Bluf.
— Como assim?
— Quantas cabeças de gado há na
fazenda?
— Umas dez mil, no mínimo.
— Pois veja: duas mil quinhentas são
suas.
— É, tem lógica. Mas e daí?
— Daí que você pode ir tirando esse gado
aos poucos e vendendo. Pode levá-lo a
Mexican Hat, em Utah, a Red Rock, no
Arizona, ou a Farmington, no Novo
México. Em qualquer uma dessas cidades
conseguirá bons preços e compradores
interessados em bom gado, sem questionar a
procedência.
— Tão fácil assim?
— Mais fácil do que imagina. Posso lhe
conseguir um comprador certo pelas duas
mil e quinhentas cabeças e até por mais.
— Não há como tirar duas mil e
quinhentas cabeças de lá, sem que meu pai
perceba.
— Há um meio de fazer com que ele não
perceba.
— Qual?
— Ao invés de levarmos o seu gado,
poderemos levar o gado de outros
rancheiros. Basta misturá-los com o seu
rebanho e, na hora certa, separá-los para a
venda.
— Está falando de roubo de gado? —
sussurrou Ned, um tanto intimidado com a
proposta.
— Falei que precisaria de coragem para
isso, não falei?
— Sim, mas não disse que teria de
roubar.
— É relativo, Ned. Há muito gado solto,
que se criou sozinho e ainda não tem marca.
Estou falando desse gado, entende? —
explicou Bluf, servindo outra dose ao rapaz.
— Sim... Boa idéia! Recolher os bandos
antes dos outros rancheiros... Ninguém
desconfiará nem poderá acusar de nada. O
gado estará com a marca do meu rancho.
Muito esperto — comentou, cada vez mais
embriagado.
— Quanto acha que isso poderá nos
render? — indagou.
— Vinte mil, trinta mil, cinqüenta mil...
É difícil dizer, Ned. Só posso garantir que é
muito mais do que jamais sonhou, garoto.
Os olhos do rapaz brilharam de cobiça.
Poderia ter dinheiro e, ainda por cima,
vingar-se de seu pai.
— Acho que estou gostando da sua idéia,
Bluf.
— Eu sabia que você era um sujeito
esperto. Não lhe disse isso?
— Sim, você também é esperto, Bluf,
pois percebeu que eu sou esperto,
compreendeu?
— Claro — riu Bluf. — Agora pense
bem: já imaginou como esse dinheiro
poderia ser muito maior, se seu pai estivesse
fora do caminho? Pena que seja seu pai...
Pai é pai, não?
Ned debruçou-se sobre a mesa para
segredar algo ao ouvido de Bluf.
— Na verdade, ele não é meu pai
legítimo. Quando minha mãe casou com
ele, eu já era nascido, só que não tinha pai,
compreendeu? Eu era um bastardo... E
assim ele me trata até hoje. Por isso eu o
odeio tanto.
— Bom, isso muda as coisas... Um
homem que faz isso com uma criança...
Tratá-la como um bastardo... Causa-me
repulsa, sabia? — comentou Bluf.
— Eu devia cuidar dele.
— Sim, devia mesmo — insuflou o
jogador.
— E vai ser esta noite mesmo.
— Se fizer isso, procure-me amanhã,
Ned. Com o controle da fazenda,
poderemos arrebanhar todo o gado solto nas
pastagens, juntando-o ao seu. Ficaremos
ricos.
— Sim, ricos! — exclamou o rapaz,
imaginando-se com todo o dinheiro do
mundo nos bolsos.
Ninguém mais iria humilhá-lo,
principalmente aquele barman. Iria ver só.
Entardecia em Santa Rosa, no norte do
Novo México. O sol já fazia alongar os
picos dos Montes de Cristo, jogando
sombras nos desfiladeiros.
Burt Murdock havia deixado as esporas e
as botas presas na sela de seu cavalo, meia
milha distante, e calçado mocassins para
poder caminhar silenciosamente.
Aproximou-se do platô, à beira do
desfiladeiro, sem um ruído. O guarda
olhava para baixo, fumando tranqüilamente.
Quando percebeu o ruído e se voltou,
Burt já tapava-lhe a boca com a mão e
enfiava sua Bowie nas costelas dele,
rasgando-lhe o pulmão.
O homem se debatei debilmente. Burt
posicionou a faca na garganta do outro,
junto à orelha esquerda, e fez com que a
lamina deslizasse profundamente até a
orelha direita.
O homem ficou imóvel, enquanto o
sangue jorrava na areia. Burt o escorou com
umas pedras, arrumando o rifle diante dele,
como se dormisse.
Examinou o local lá embaixo, quando o
desfiladeiro terminava, abrindo-se num
esconderijo natural, cercado de pedra.
Aquela era a única entrada e também a
única saída. Ele procurou o curral. Os
cavalos roubados estavam afastados da
casa, num grande curral. Perto de uma
centena de cavalos.
— Peguei-os finalmente, miseráveis! —
exclamou, com um suspiro de alivio.
Após duas semanas de vigília e
perseguição, conseguira, finalmente,
descobrir o esconderijo da quadrilha que
vinha roubando cavalos na região de Santa
Rosa.
Os rancheiros, cansados do prejuízo e da
ineficiência do xerife, o haviam contratado.
Burt era um pistoleiro a serviço da lei,
um caçador de recompensas, um homem
que fazia o trabalho sujo que ninguém
queria fazer ou tinha medo de fazer.
Ele adorava aquilo.
Retirou do bolso da capa longa que usava
um pacote de dinamite. Cortou um estopim.
Procurou o melhor lugar para a explosão.
Queria provocar um desmoronamento,
barrando a fuga dos bandidos, se fosse
preciso, mas só usaria esse recurso se não
conseguisse impedir uma reação.
Os rancheiros haviam sido bem claros.
Vivos ou mortos, cada bandido valeria um
bônus extra de cem dólares, mais mil
dólares para desbaratar a quadrilha.
Teria ainda mais cinco dólares por cavalo
recuperado. Burt fez as contas mentalmente.
Já contara pelo menos uns oito homens na
cabana.
Havia ali, a sua disposição, algo em torno
de dois mil e quinhentos dólares.
— Aqui serve — comentou consigo
mesmo, enfiando a dinamite entre as raízes
de uma enorme árvore que pendia sobre o
desfiladeiro.
Se a explodisse, seus galhos impediriam a
fuga dos bandidos, mas poderiam ser
queimados depois, para liberar a saída dos
cavalos.
Procurou um bom local, engatilhou sua
Winchester e esperou que um dos homens
saísse da cabana.
Momentos depois, um deles abriu a porta,
com um balde na mão, caminhando na
direção do poço.
Burt disparou, arrancando o balde da mão
dele. O homem correu se esconder atrás de
um bebedouro.
Portas e janelas da cabana foram
fechadas. Burt olhou o céu. Escurecia
rapidamente. Tinha de resolver aquilo o
mais depressa possível.
Apanhou uma banana de dinamite e
atirou-a próximo da cabana. Apontou seu
rifle e disparou.
A explosão levantou uma nuvem de
fumaça e poeira e ecoou violentamente
pelos muros de pedra do desfiladeiro.
— Vocês aí, quero-os com as mãos para
cima, fora da cabana, em trinta segundos. A
próxima dinamite vai explodir no telhado
— disse, arremessando a banana.
Ela caiu certeiramente no telhado da
cabana, rolou até o beiral e ficou ali,
tomando um resto de sol da tarde que
morria.
— Ele diz a verdade — gritou o homem
atrás do bebedouro. — A dinamite está no
telhado.
— Maldito seja você! O que quer, afinal?
— Quero-os fora dai em vinte segundos.
— Pode vê-lo, Slim? — indagaram da
cabana.
— Não — respondeu o homem fora dela.
— Demônios, homem. Poderemos
negociar. Quanto está ganhando com isso?
— O suficiente — respondeu Burt. —
Enquanto isso, vocês estão perdendo o resto
do tempo e o resto da vida.
— Faça o que ele diz, Duran! — gritou
Slim.
— Cinco segundos... Quatro... Três... —
começou ele a contar.
As portas e janelas se abriram. Armas
jogadas para fora. Os homens começaram a
sair com as mãos para cima.
— Você aí, atrás do bebedouro. Pegue
cordas e comece a amarrá-los. Bem firme.
Se eu encontrar um mal amarrado, você terá
uma banana de dinamite daquela enfiada
naquele lugar, com um pavio curto acesso.
O homem apressou-se em cumprir a
ordem. Burt começou a contar. Sete homens
saíram da cabana.
— Eu disse para que todos saíssem! —
gritou. — O tempo está esgotado.
Os homens lá embaixo olharam
desesperadamente para a cabana. Um rifle
foi atirado pela janela. O oitavo homem
saiu.
Todos olharam na direção do platô,
ansiosamente. Burt continuou abaixado.
Havia oito homens lá embaixo, mais um
vigiando. Nove homens. É uma conta difícil
de ser feita. Dividir o roubo em nove partes
era muito complicado para aqueles homens.
Tinha de haver um décimo bandido.
Lá embaixo, alguns deles olharam para a
cabana, quando uma sombra começou a se
erguer no alto do platô.
Um rifle surgiu na janela da cabana e
disparou. O vulto no alto do platô caiu para
frente, despencando no desfiladeiro.
Um homem ficou em pé, atrás do que
caiu, apontando seu rifle para o telhado da
cabana.
Quando apertou o gatilho, um último raio
de sol iluminou a banana de dinamite no
telhado.
Bluf acertara numa coisa: Ned era mesmo
esperto. Quando saiu do saloon, naquela
tarde, parou no rio Mesa Verde, que contava
as terras do rancho.
Despiu-se e, no comecinho da noite,
mergulhou nas águas frias e nadou durante
algum tempo, até se sentir melhor.
Depois deitou-se na margem e ficou
pensando, vendo as estrelas surgirem no
céu.
Sabia que Bluf Blanding era um
escroque, um jogador ladrão e um
trapaceiro de primeira classe.
Havia dado muitos golpes nos pequenos
rancheiros da região, com a conivência do
xerife, que o protegia.
Só que, agora, Bluf havia mesmo
pensado alto. Naquela região toda deveria
haver, por baixo, mais de cem mil cabeças
de gado.
Roubá-las e vender nos outros Estados
seria uma tarefa muito fácil, considerando
que Cortez estava a igual distancia de três
Estados diferentes: Utah, Arizona e Novo
México.
Havia comércio suficiente para mais do
que cem mil cabeças. Isso renderia muito
mais dinheiro que Ned jamais sonhara em
ter nas mãos.
Quando se sentiu livre dos efeitos do
álcool, Ned foi para casa.
Todas as noites, quando chegava, Jed
Murdock despejava sobre ele o mesmo
sermão.
Às vezes Jed o esmurrava, Ned nem
sentia, de tão bêbado que estava.
Naquela noite, porém, incentivado pelas
palavras de Bluf e acreditando em si
mesmo, Ned iria agir diferente.
Já era noite quando chegou. Após levar
seu cavalo para o estábulo, dirigiu-se à casa
principal do rancho.
— Parece que você só vem aqui para
dormir. Por que não simplifica as coisas e
dorme no saloon. Ou então na sarjeta, que é
o seu lugar — disse Jed, levantando-se da
sua escrivaninha, num canto da sala.
Caminhou na direção de Ned, que o
encarou ameaçadoramente. Jed não
conhecia aquele olhar do enteado.
— Quero falar com você — disse Jed.
Jed esperou, mantendo seu olhar fixo no
dele.
— Acho que devemos desistir de tentar
fazer de você um homem. Diga-me o que
quer para sumir de minha vida para sempre
e não me incomodar mais com essa sua cara
de beberrão — indagou Jed, secamente.
Jed destilou ódio no olhar.
— Basta! Basta, entendeu? Não sou um
cachorro, sou um homem!
— Para mim você é um vagabundo...
Puxou bem a sua mãe, aquela mundana que
tirei de um saloon em Santa Fé para fazer
minha mulher...
— Não toque no nome de minha mãe —
falou Ned, enfurecido. — Ela o fez feliz e,
enquanto esteve aqui, nesta casa, jamais fez
nada que pudesse...
— Cale-se, garoto idiota! O que sabe de
sua mãe?
— Sei que ela morreu e que me deixou,
por direito, um quarto deste rancho e de
todo o dinheiro que ele rende.
— Tem razão. Tem toda razão, mas esse
dinheiro jamais será seu, entendeu?
— Não pode me negar isso.
— Posso e vou. Se lhe der a sua parte, em
dois tempos você a gastará no saloon e logo
estará de novo, rastejando por um níquel.
— Não pode me roubar o que...
— O que disse? Está me chamando de
ladrão, seu bastardo atrevido? — gritou Jed,
ameaçadoramente.
Ned, a principio, se intimidou. Depois, o
ódio maior que qualquer temor. Ele encarou
o padrasto pela primeira vez.
— Sim, é isso mesmo. É um ladrão! Está
roubando o meu dinheiro, o dinheiro que
era de minha mãe e que me pertence por
direito...
A mão de Jed se abateu pesadamente no
rosto do garoto, fazendo-o cambalear.
Ned recuou, a mão indo às costas, no
cinturão, buscar a faca afiada.
Jed avançou, disposto a quebrar-lhe todos
os ossos do corpo, tamanho era seu ódio.
Ned apenas o esperou, erguendo a faca.
Quando Jed percebeu, metade da lamina já
havia penetrado em seu estômago.
— Ned! — exclamou ele, chocado.
— Surpreso, velho sovina? — indagou o
rapaz, girando a lamina no ventre do outro,
depois forçando a ponta para cima, na
direção do coração.
— Ajude-me — suplicou Jed.
— Sim, vou ajudá-lo a ir encontrar com
minha mãe para lhe pedir desculpas, seu
bastardo dos infernos! — vociferou o
garoto, empurrando a faca para cima,
cortando ao meio o coração do rancheiro.
Ned se afastou. O padrasto caiu de
joelhos, olhando com olhos esbugalhados a
lamina enterrada em seu ventre.
Tentou falar alguma coisa, mas apenas
vomitou sangue e caiu para frente.
— O que fez, seu animal imprestável! —
gritou Jay Fowler, capataz do rancho,
entrando naquele momento.
Surpreso, Ned recuou até suas costas
baterem na escrivaninha.
Jay correu levantar o corpo do patrão. O
sangue jorrou pelo ferimento. Ele puxou a
faca e tentou estancar o sangue com a mão.
— Vá buscar ajuda, seu bastardo! —
gritou Jay, em desespero. Ned olhava a
caixa de dinheiro aberta sobre a
escrivaninha. Normalmente ficava trancada
numa gaveta. Seu pai deveria estar
conferindo. Olhou para Jay. A palavra
indesejável ecoava em sua cabeça. Não
queria mais ser chamado de bastardo. Nem
por Jed, por Jay ou por qualquer filho da
mãe no mundo.
Além disso, havia aquele dinheiro ali. E
havia Jay, com a faca na mão, todo molhado
de sangue.
— Nunca mais... Mas nunca mais
mesmo, você me chamará de bastardo
novamente — afirmou Ned, sacando sua
arma.
— O que vai fazer? — surpreendeu-se
Jay.
— O que já devia ter feito há muito
tempo, seu trouxa. Melhor uma bala nessa
sua boca grande.
Jay soltou o corpo do patrão e tentou
sacar a arma. Era rápido, mas Ned, quando
não estava bêbado, era mais rápido ainda
que ele.
O Colt trovejou e uma bala certeira
apanhou Jay em pleno peito, jogando-o para
trás, com a arma na mão.
Num esforço supremo, o capataz tentou
erguer o braço para disparar.
Ned apertou de novo o gatilho, mirando a
cabeça do infeliz caído diante dele.
A bala atingiu o rosto de Jay, bem sobre
o nariz, transformando sua cara numa
máscara sangrenta e retorcida.
O rapaz, então, correu apanhar alguns
maços de dinheiro e pô-los no bolso de Jay.
Depois correu para o pátio, aos gritos:
— Venham depressa! Jay matou meu pai!
Ajudem!
Os empregados do rancho, sonolentos,
começaram a surgir da escuridão, logo
depois.
Burt estava no saloon e já bebera meia
garrafa de uísque, enquanto esperava os
rancheiros retornarem.
Viera para a cidade e indicara onde
estava os cavalos e os membros da
quadrilha, mortos.
A explosão da dinamite, no telhado da
cabana, lançara lascas de madeira para
todos os lados.
A quadrilha teve morte horrível. Para
Burt, isso pouco importava. mereciam
morrer.
— Não quer subir, tomar um banho e
depois relaxar comigo? — perguntou-lhe
Luna, uma lindíssima mexicana, de longos e
negros cabelos, olhos profundos e
misteriosos e um perfume de rosas que
entontecia e a fazia mais desejável.
Havia muito Burt não via uma mulher tão
limpa e tão cheirosa como aquela.
— Mais tarde, querida! — disse ele. —
Estou esperando o meu pagamento.
— E quando ele chega?
— Em breve.
— Posso beber com você?
— Será um prazer para mim —
respondeu ele, empurrando a garrafa na
direção dela.
Luna foi até o balcão e retornava com um
copo, quando um vaqueiro a segurou pelo
braço.
— Ei, Luna, sente um pouco no meu colo
— pediu ele, bêbado e coberto de poeira.
— Deixe-me em paz, vaqueiro! Vá tomar
um banho primeiro.
— Não quer você me dar um banho?
— Até daria, se estivesse disponível. Só
que não estou — falou ela, dando um
repelão e livrando-se dele.
Foi até a mesa.
— Vaqueiros! Bah! — disse ela, com
cara de nojo, enquanto Burt lhe enchia o
copo.
Ela bebeu de um só gole, como ele fazia
a cada vez que enchia o copo. Burt ergueu a
cabeça. O vaqueiro bêbado estava atrás de
Luna e o olhava com rancor.
Luna percebeu e se voltou para olhá-lo.
— Sujo por sujo, pelo menos sou mais
bonito — disse o vaqueiro, com voz
pastosa.
— Caia fora, homem! Estou ocupada! —
falou ela, irritada.
— Eu cheguei aqui antes desse barbado.
Já gastei mais do que ele e você ainda não
me deu atenção. Eu queria que...
— Você ouviu a garota. Caia fora! —
falou-lhe Burt, perdendo a paciência.
O vaqueiro o encarou com despeito.
— Quem você pensa que é? — indagou a
Burt, contornando a mesa.
Parou diante do caçador de recompensas.
Nem viu o que acontecia. Burt levantou o
pé e o atingiu na barriga, jogando-o sobre a
mesa atrás dele.
O vaqueiro levou a mão ao cinturão,
tentando apanhar a arma. Num salto, Burt
caiu sobre ele, levando na mão a garrafa de
uísque, que arrebentou na testa do bêbado.
O vaqueiro desmoronou no assoalho,
com sangue empapando-lhe os cabelos.
— Maldito! Me dez perder meia garrafa
de um bom uísque — falou Burt, revistando
os bolsos do outro.
Encontrou algumas moedas. Levou-as até
o balcão.
— Outro litro! — pediu.
Apanhou-o e retornou para a mesa, onde
Luna o olhava com admiração.
— É mesmo um caçador de recompensa?
— quis ela saber.
— Faço justiça — corrigiu ele.
— Não é a mesma coisa?
— Não para mim.
— Já matou muitos?
— Sim.
— Quantos?
— Não me lembro, mas a maioria fazia
muitas perguntas — disse ele, em tom
ameaçador, brincando com ela.
— Ai, hombre! — exclamou ela, sorrindo
deliciada.
Um tropel de cavalos lá fora anunciou a
chegada dos rancheiros que haviam
contratado Burt.
Três deles entraram, acompanhados do
xerife.
— E então, cavalheiros? Estava tudo lá,
como eu disse?
— Sim, Murdock. Dez cadáveres,
noventa e cinco cavalos e uma cabana
destruída — disse o xerife, num tom de
despeito.
— Uma quadrilha a menos para nos
infernizar, xerife — corrigiu o líder dos
rancheiros. — Murdock fez o que você
deveria ter feito.
O xerife teve de engolir seu
ressentimento, mas ficou ainda mais
recalcado quando os rancheiros juntaram
alguns pacotes de dinheiro e os puseram
sobre a mesa, à frente do pistoleiro.
— Dois mil e quinhentos, arredondando a
conta, Murdock. Com os agradecimentos da
Associação dos Rancheiros de Red River —
disse o líder.
— Às ordens, cavalheiros. Se precisarem
de novo, espero que não precisem, sabem
onde me encontrar.
Os homens agradeceram e saíram. Burt
juntou as notas e guardou-as no bolso
interno de sua capa.
O xerife continuou ali, ao lado da mesa,
sem esconder seu despeito.
— Sou obrigado a lhe pedir algo,
Murdock — disse, finalmente, após
pigarrear.
— Diga, xerife.
— Gostaria que saísse de minha cidade
amanhã mesmo.
— Sua cidade?
— Sim, Murdock, minha cidade. Aqui eu
sou a lei e não quero tipos como você por
aqui. Só atraem encrencas.
Murdock sorriu amargamente, encarando
o xerife com seus olhos frios e cinzentos.
— Vocês xerifes são todos iguais.
Escondem-se atrás de um pedaço de lata e
se tornam arrogantes e mandões. Só que,
quando surge um trabalho sujo, é gente
como eu que vai fazê-lo no seu lugar.
— Ouça bem, Murdock: você mata dez
homens como quem foi pescar. Ganha dois
mil e quinhentos dólares que gastará com
prostitutas, com certeza, e irá atrás de outro
trabalho. Eu tenho que ficar aqui, viver com
cem dólares por mês e casa. Por que devo
arriscar minha vida?
— Acho que tem o emprego que merece,
xerife. Se arriscasse, talvez ganhasse mais.
Só que não tem no meio das pernas o
mesmo que eu — finalizou Burt, apanhando
a garrafa de uísque com uma das mãos e a
cintura de Luna com a outra.
Caminharam na direção da escada que
conduziria ao pavimento superior, onde
estavam os quartos.
— Gostei de ver — disse Luna. — Esse
sujeitinho metido a besta merecia uma lição.
É um galinha!
— Tem razão. Um galinha! E eu, o que
sou?
— Macho... Mui macho! — disse ela,
enfiando a mão entre as pernas dele e
agarrando algo precioso.
Na manhã seguinte, antes do nascer do
sol, Burt foi até o estábulo selar seu cavalo.
Levava consigo o alforje e o dinheiro que
ganhara.
— Pablo! — chamou, assim que
empurrou o pesado portão.
Como das vezes anteriores, Pablo não
veio correndo ao seu encontro. O garoto que
cuidava do estábulo tinha sono leve, muito
leve.
Burt ficou alerta. Todos na cidade sabiam
que ele estava com dois mil e quinhentos
dólares em dinheiro.
Algum idiota poderia ter uma idéia
estúpida a respeito disso.
— Pablo, seu dorminhoco! — chamou de
novo, entrando.
Sua mão direta já sacara o Colt. Ele ouviu
o barulho da palha sendo amassada e o
vulto que avançou na sua direção.
Bateu com o alforje, parando o ataque.
Depois, com a coronha do Colt, provocou
um estalo na cabeça do seu agressor, que
gemeu e caiu.
— Maldito! — murmurou alguém,
furioso, avançando rapidamente. Murdock
desviou-se para o lado e o cano de seu
revólver atingiu a nuca do homem, que se
estatelou no chão.
O primeiro tentou se erguer. Burt
marcou-lhe o queixo para sempre com a
roseta de sua espora.
Acendeu um fósforo. O xerife e um
auxiliar gemiam no chão do estábulo,
lambuzados de esterco.
— Afinal encontrou o seu lugar, xerife —
afirmou Burt, pondo-o para fora a pontapés.
Menos de três horas depois da morte de
Jed, o xerife compareceu na sede do rancho,
chamado por Ned.
Examinou os dois cadáveres, que o rapaz
cobriu com panos, depois foi até a cozinha,
lavar as mãos sujas de sangue.
Ned o seguiu.
— Como aconteceu? — indagou ao
rapaz.
— Acho que Jay tentou roubar meu pai e
foi descoberto. Eles lutaram. Jay o
esfaqueou. Cheguei no momento em que ele
roubava o dinheiro. Tentei convencê-lo a se
entregar, mas ele sacou a arma. Não tive
escolha.
O xerife ouviu tudo atentamente. Era
cúmplice de Bluf, que já lhe contara seus
planos a respeito de Ned.
— Quando você chegou, Jay havia
matado seu pai?
— Sim, e estava pegando o dinheiro.
— E esta faca, a quem pertence? —
indagou, mostrando a arma que retirara do
corpo de Jed.
O garoto empalideceu. Havia se
esquecido daquele detalhe. O xerife lavou a
faca, enxugou-a depois se aproximou do
jovem.
Guardou a faca na bainha, enquanto o
olhava nos olhos.
— Se Jay tivesse pego o dinheiro depois
de ter matado seu pai, então este dinheiro
estaria manchado de sangue — falou o
homem da lei, retirando do bolso um maço
de dinheiro, que tirara do cadáver de Jay.
Ned se viu num beco sem saída. Estava
nas mãos do xerife, que simplesmente
enfiou no bolso o maço de dinheiro.
— Eu e Bluf somos sócios, Ned. Isto nos
torna sócios também. Eu jamais prejudicaria
um sócio, entendeu? — falou o xerife, com
cumplicidade.
— Entendi — respondeu o garoto,
sorrindo aliviado, pois se vira à beira da
forca.
— Fique tranqüilo. Em meu relatório,
tudo será como você disse: Jay tentou
roubar seu pai. Foi descoberto e o matou.
Você chegou naquele momento. Tentou
prendê-lo, mas Jay reagiu, sacando a arma e
não lhe dando alternativa, a não ser baleá-
lo. Ok?
— Ok, xerife! E a faca?
— Jay tinha uma na bota. Deixe-a no
lugar da sua. Agora é o novo dono do
rancho, e poderá ganhar muito dinheiro,
mas muito dinheiro mesmo — insinuou o
homem da lei.
Ned se sentiu muito importante naquele
momento, mas percebeu, também, que todo
aquele dinheiro teria ainda mais um sócio: o
xerife de Cortez.
No outro dia, após o sepultamento do pai,
no alto de uma colina, onde estava o
pequeno cemitério do rancho, Ned fez uma
reunião com todos os empregados dali.
Definiu como seriam as coisas dali em
diante. Despediu alguns empregados,
nomeou um novo capataz e mandou
contratar mais homens.
Assim que deixou tudo conforme
desejava, apanhou um maço de dinheiro e
foi para a cidade.
Encontrou Bluf na porta do saloon.
— Fiquei sabendo o que houve com seu
pai — disse o jogador. — Lamento muito
mesmo.
— Obrigado, Bluf! Foi uma tragédia,
realmente, mas o que se há de fazer?
— Soube que você matou o criminoso.
— Sim, no ato.
— E que o xerife esteve lá e confirmou
sua estória.
— Exatamente.
— Perfeito, garoto! Eu sabia que você era
mesmo muito esperto. Agora tudo é seu,
não?
— Sim, tudo é meu. E para festejar,
gostaria de convidá-lo para um drinque.
— Será um prazer.
Entraram. Ned foi direto ao balcão,
olhando o barman nos olhos.
— Sirva-me um uísque — ordenou.
— Só depois de ver a cor do seu dinheiro,
garoto — respondeu o homem, que não
sabia da morte de Jed Murdock nem que
Ned era, agora, o mais rico herdeiro da
região.
— Terei que ensiná-lo a me respeitar, seu
bastardo — rugiu Ned, inclinando-se sobre
o balcão e esmurrando o barman, que foi
bater contra a prateleira, derrubando
garrafas.
— Vai ter que me pagar cada centavo do
prejuízo — ameaçou o barman, apanhando
uma espingarda sob o balcão.
Ned foi mais rápido. Sua faca se deslocou
no ar e foi se cravar no ombro do outro, que
gritou de dor e soltou a arma.
Ned saltou para o interior do balcão e
agarrou o barman pelo colarinho.
— Você está falando agora com Ned
Murdock, Sr. Murdock para você, de agora
em diante — determinou, esmurrando
selvagemente o rosto do barman, vingando-
se, assim, de toda humilhação que já sofrera
ali.
Retirou sua faca do ombro dele, após
derrubá-lo e chutá-lo algumas vezes.
Depois apanhou algumas notas e atirou-
as sobre ele.
— Isto paga as garrafas quebradas? —
indagou, aos gritos.
— Sim, paga — respondeu o outro,
debilmente.
— Isto paga meu uísque? — insistiu,
jogando mais uma nota sobre o ferido.
— Sim... Sim, Ned... Paga...
— E isto vai amaciar sua língua de agora
em diante — finalizou, enfiando outra nota
na boca do barman. — Quero que leve seu
melhor uísque para minha mesa.
— Você deu a ele o que ele merecia —
comentou Bluf, assim que se sentaram.
— Sem puxasaquismo, Bluf. Quero que
me trate como um sócio e não coimo um
garoto mimado, compreendeu? — corrigiu-
o Ned, surpreendendo o jogador.
— O que houve? — quis saber Bluf.
— Nada mudou. Temos negócios a tratar,
não?
— Sim, claro. Agora mais do que nunca
— concordou Bluf, enquanto o barman,
respeitosamente, punha sobre a mesa uma
garrafa e dois copos, antes de sair à procura
do médico e do xerife.
— Pois bem, Bluf. Antes de mais nada, é
preciso que deixemos bem claro quem vai
dirigir toda a operação — ponderou o
garoto, olhando o outro com seriedade.
Outros homens haviam se aproximado da
mesa. Era capangas de Bluf, que se cercara
de precauções, após saber da morte de Jed
Murdock.
Como o garoto passava a ser o dono de
tudo, não havia como não ganhar dinheiro
com ele.
Sua intenção, juntamente com o xerife,
era a de envolver Ned no roubo de gado,
depois dar sumiço nele, ficando com tudo
que lhe pertencia.
Julgando que Ned não passasse de um
bêbado apenas, Bluf havia cometido um
erro.
— Bem pensado, Ned. Acho que, por
tudo que sei e que conheço desse ramo, eu
posso...
— Indicar a mim como o chefe? —
completou o jovem, para surpresa de Bluf,
que desejava chefiar pessoalmente todo o
trabalho.
Os homens atrás de Bluf se mexeram,
incomodados. Ao serem contratados, Bluf
prometera que eles receberiam ordens dele.
Naquele momento chegou o xerife, que
fora procurado pelo barman.
— Ele vinha provocando Ned há muito
tempo, Hank. Teve o que mereceu. Ned
apenas se defendeu. Todos aqui podem
dizer isso — falou Bluf, apontando para os
homens atrás dele, que concordaram
imediatamente com a estória.
— Está certo, acho que isso encerra a
questão. Vejo que estão comemorando —
observou.
— Pegue um copo e sente-se, xerife. É
meu convidado — disse Ned.
O xerife apanhou o copo e foi se sentar
com eles.
— Estamos tratando de negócios, sócio
— falou Ned, olhando o xerife. — Eu dizia
ao Bluf que tenho todas as condições de
chefiar a sociedade...
— Espere aí, garoto! — cortou-o Hank
chance, o xerife. — Não o ajudei ontem à
noite para receber ordens suas.
— Pois é melhor considerar isso agora,
xerife. Tenho tudo nas mãos. Posso até nem
precisar de sócios para fazer o que é preciso
ser feito.
— Não conseguirá sem nos — afirmou
Hank.
— Provarei que está errado.
— Precisa dos meus contatos para vender
o gado — ajuntou Bluf.
— Posso ir atrás de contatos, mas vocês
não podem roubar e esconder o gado sem a
minha ajuda.
Bluf percebeu que Ned tinha a faca e o
queijo na mão. A melhor estratégia não era
enfrentá-lo, mas, sim, descobrir até onde ele
poderia ir com aquilo.
— Pensando bem, Hank, acho que Ned
está com a razão. Se analisarmos friamente
a situação, ele tem tudo nas mãos. Assim
sendo, ninguém melhor que ele para ser
nosso líder.
— Não vou receber ordens de um bêbado
— protestou o xerife, aborrecido.
Ned o fulminou com um olhar glacial.
— É pegar ou largar, xerife. Não há outra
escolha. Tornou-se meu cúmplice ontem, ao
trocar as facas e ao ficar com meu dinheiro.
— Pois saiba que eu posso prendê-lo
agora mesmo, jogá-lo numa cela e perder a
chave. Você apodrecerá lá, eu prometo.
Diariamente lhe darei uma surra para
amaciar esse seu couro de animal
selvagem...
— Pare, xerife, antes que eu me aborreça
— cortou-o Ned, ameaçadoramente. — Se
olhar no balcão, verá cinco homens
bebendo.
O xerife olhou para lá e confirmou.
— Sim, e daí?
— Erga um dedo contra mim e verá o que
acontece. Um sinal meu eles acabarão com
você — disse o rapaz, pondo dois dedos na
boca e soltando um assobio rápido.
Os cinco homens imediatamente se
voltaram, com as mãos nas armas.
— Tudo bem, rapazes! Só queria ver se
vocês estavam alertas — falou-lhes Ned.
— Eu não disse, Hank? O garoto é vivo,
pode cuidar das coisas. Será nosso chefe e
todos nós lucraremos muito com isso.
Acredite — insistiu Bluf.
Hank encheu o copo e bebeu num só
gole, fazendo uma careta. Olhou Bluf e
depois Ned.
— Está certo! Acabou de provar que é
cauteloso e isso me agrada — falou o xerife.
— Será o manda-chuva.
— Sábia decisão, sócio. Vamos brindar a
isso — propôs Ned, erguendo seu copo.
Após beberem por algum tempo, Ned se
retirou. Bluf e o xerife ficaram a sós para
conversar.
— Não sei o que você pretende fazer,
Bluf, mas não me agrada receber ordens
desse moleque.
— Não se preocupe, Hank. É temporário.
O garoto está pondo em nossas mãos a
chance de ficarmos ricos. Não vamos
desperdiçar isso. Vamos dar-lhe corda. Ele
se enforcará com ela, se está se entendendo.
— Qual é o seu plano?
— Vamos fazer de conta que ele manda
até chegar o momento de mudarmos isso.
Na hora certa, descartamos o idiotazinho e
ficamos com tudo.
O xerife sorriu, compreendendo.
— Agora melhorou.
— Deixe o garoto pensar que manda. Ele
fará exatamente o que nós quisermos.
— Ele já selecionou alguns homens de
confiança. Precisaremos fazer o mesmo.
— Já fiz. Ali, naquela mesa, estão cinco
dos melhores pistoleiros da região.
Trabalham para nós, para mim e para você.
— Acha que é o bastante?
— Para começar, sim. Depois
contratamos mais. Em pouco tempo, meu
amigo, pouco tempo mesmo, estaremos com
o maior rebanho de gado da região. Com
você nos dando cobertura, ninguém vai
suspeitar. quem pensaria que o maior
rancheiro da região é um reles ladrão de
gado?
— Muito bem pensado, Bluf. Pensado
mesmo! — elogiou Hank, satisfeito com o
andamento do plano.
Uma semana depois, pela manhã, um
rancheiro parou seu cavalo coberto de suor
diante da cadeia.
Entrou furiosamente, sobressaltando o
xerife, que cochilava em sua escrivaninha.
— Hank, assim não dá mais. Roubaram
uma cem cabeças de meu melhor gado.
Estavam separadas para a marcação. Com
essas já perdi um quinhentas, percebeu? —
indagou, exaltado.
O xerife tirou os pés da escrivaninha e foi
pegar uma caneca de café no fogão.
Bocejou.
— Eu sinto muito Steve, mas está
acontecendo com muita freqüência. Penso
que são ladrões de gado dos Estados
vizinhos que se aproveitam da nossa
proximidade com as fronteiras.
— Certo, mas você tem que fazer alguma
coisa, homem.
— Fazer o quê, Steve? Eu já pedi meia
dúzia de auxiliares, mas o prefeito negou.
— Mas se você não for atrás, Hank, eles
continuarão agindo impunemente.
— Não posso lutar sozinho contra
fantasmas, que atacam à noite e somem sem
deixar vestígios, Steve. Fale com o prefeito.
Se ele autorizar os auxiliares, poderei fazer
alguma coisa. Esta região é muito grande,
um homem sozinho nada pode fazer.
— Se o prefeito é idiota o bastante para
perceber que, sem nosso apoio, não vai se
reeleger, então nós, da Associação dos
Criadores de Gado, vamos tomar nossas
providências.
— O que pensa fazer?
— Vamos nos organizar e contratar
alguns pistoleiros.
— Se fizer isso estarão contra a lei.
— E você virá nos prender?
— Pistoleiros não são a solução, Steve.
Só pioram a situação. Encher a cidade deles
pode ser perigoso. Podem fugir ao controle
e...
— Então veja Ned Murdock, por
exemplo. Está sempre cercado de pistoleiros
e nunca soube que ele tenha sido roubado.
Nem um mísero bezerro levaram dele. Acha
que estamos errados?
Hank não estava gostando daquilo.
Pistoleiros a serviço dos rancheiros
poderiam complicar tudo, dificultando o
trabalho de Ned e de seus ladrões de gado.
Steve saiu dali furioso e foi para o saloon,
onde encontrou outros rancheiros,
igualmente descontentes.
— E então? — indagaram, esperançosos.
— Nada feito. Hank não pode fazer nada.
Até dou razão a ele. Sozinho não pode
enfrentar a quadrilha de ladrões. Acho que
vamos ter que fazer como Ned Murdock,
pessoal.
— Contratar pistoleiros? — indagou
alguém.
— Sim, gente de nossa confiança.
— E onde encontrá-los?
— Não precisa ir muito longe. Em
Durango há sempre bons pistoleiros.
— Quem irá falar com eles e escolhê-los?
— Eu mesmo vou — afirmou Steve. —
Só quero que vocês, como membros da
Associação dos criadores, me autorizem.
Tratarei os melhores que encontrar. Vamos
gastar algum dinheiro, mas não tanto quanto
perderemos com esses roubos.
— Steve tem razão, pessoal. De minha
parte eu concordo — afirmou um dos
criadores.
— Eu também — ajuntou outro.
Todos concordaram por unanimidade,
autorizando Steve a ir contratar os
pistoleiros necessários.
— Quando partirá, Steve?
— Hoje mesmo, rapazes.
— Bebamos a isso, então, antes da
partida do Steve, pessoal — propôs alguém.
Numa das mesas ali perto, Bluf ouvia a
conversa com cara de quem não gostava
nada da idéia.
Ned chegou um pouco mais tarde no
saloon. Estava satisfeito com o andamento
dos planos.
Foi ao encontro de Bluf. Imediatamente o
barman chegou, trazendo-lhe um copo para
uísque e uma cerveja.
Após terem se entendido, bastava Ned
entrar no saloon que o uísque e a cerveja
iam ao seu encontro.
E ele tinha crédito agora.
— Como vão as coisas? — indagou Ned.
— Acho que vamos ter problemas.
— Como o quê?
— Com a Associação dos Criadores.
Acabaram de fazer uma reunião aqui e
decidiram contratar pistoleiros para se
defenderem dos roubos.
— Demônios! De quem foi essa idéia
maluca?
— De Steve Granger, aquele rancheiro
idiota.
— O pai de Dianne Granger, não?
— Sim.
— Tem uma bela filha o maldito.
— Só que nem ela nem ele gostam de
você, Ned. Já reparou nisso?
— Pouco me importar o que eles pensam
de mim — falou o rapaz, bebendo o uísque,
depois tomando uma golada de cerveja.
Limpou a boca com a manga da camisa.
Nesse momento, dois vaqueiros
empoeirados e cansados entraram no saloon
e foram até o balcão.
Pediram cerveja e beberam,
demonstrando que estavam mesmo
sedentos.
Logo em seguida, Steve Granger entrou
também e foi até os dois.
— E então, rapazes? Seguiram a pista dos
ladrões? — indagou ele aos dois.
— Sim, patrão. Seguimos a pista até a
divisa com as terras de Ned Murdock.
— Ned Murdock? — falou Steve, embora
sem demonstrar surpresa.
— Alguém disse o meu nome? —
indagou o rapaz, erguendo-se e caminhando
na direção do balcão.
— Há qualquer coisa errada com suas
terras, garoto. O gado roubado está sumindo
lá dentro — falou Steve, sem temor.
Ned chutou uma cadeira a sua frente,
provocando barulho e chamando a atenção.
— O que está insinuando? — indagou,
furioso.
— Isso está se tornando freqüente, Ned.
Gado some e todas as pistas levam na
direção de suas terras.
— Minhas terras são muito grandes. Não
posso vigiá-la totalmente. Se os bandidos
estão passando por elas para levarem o gado
para outros Estados, nada posso fazer.
— O interessante é que eles passam
levando gado roubado e não carregam nem
uma de suas reses.
— Eu me defendo...
— Mas acabou de dizer que não tem
como proteger todas as suas divisas, não
foi? — cortou-o Steve, deixando o garoto
ainda mais irritado. Ele se aproximou de
Steve, ficando frente a frente com o
rancheiro, olhando-o nos olhos.
— Vamos lá, Steve. Desembuche logo.
Sinto que tem algo a dizer. Por que não fala
abertamente, ao invés de ficar girando ao
redor do assunto.
— Pois bem, Ned, acho que há alguma
coisa errada em seu rancho e com você.
Todos esses roubos começaram depois que
seu pai morreu e você começou a contratar
esses pistoleiros.
Ned ficou lívido, a mão baixando na
direção da arma.
— Se está tão certo disso, por que não
procura o xerife e me denuncia? — desafiou
o rapaz.
— Porque aquele maldito está
mancomunado com você. Jamais tomaria
qualquer providencia contra você.
— E você, Steve, faria alguma coisa?
— Começaria dando-lhe uma surra de
chicote, pirralho metido a homem —
murmurou Steve, furioso com a arrogância
do rapaz.
— Se você não fosse o pai de Dianne...
— Cale-se, bastardo! Não tem o direito
de pronunciar o nome de minha filha.
— Ela é boa demais para mim?
— Sim, boa demais para você.
— Não me faça perder a cabeça, Steve —
alertou o rapaz, a mão tocando a arma.
Steve não lhe deu chance. Sacou sua
arma, apontando-a para o peito do rapaz.
— Vamos, lá, dê-me a chance de matá-lo,
seu vermezinho ordinário — vociferou
Steve.
— Não vou sacar minha arma — disse o
rapaz, cruzando as mãos nas costas.
— Pior para você, então, pois vou surrá-
lo como seu pai deveria tê-lo surrado —
rugiu Steve, avançando para o garoto.
O movimento foi rápido, muito rápido.
Steve sentiu o impacto no peito e baixou os
olhos para olhar.
A lamina da faca havia penetrado até o
cabo, perfurando seu pulmão.
Ele tossiu, escarrando sangue. Com as
duas mãos ele segurou o cabo da faca e
puxou-a.
O sangue esguichou da ferida. Steve caiu
de joelhos, os olhos esgazeando-se.
Murmúrios roucos escaparam de sua
garganta. Ned, cruelmente, chutou o rosto
do moribundo, jogando-o para trás.
Apanhou sua faca. Limpou-a na roupa de
Steve, depois guardou-a na bainha presa nas
costas.
— Seu filho da mãe! — rugiu um dos
vaqueiros de Steve, levando a mão ao Colt.
Seu gesto foi imitado pelo seu amigo,
ambos desejosos de vingarem o patrão
morto.
Bluf, no entanto, estava atento. Sacou sua
arma e, certeiramente, meteu um balaço na
cabeça de cada um deles.
O assoalho do saloon ficou lavado de
sangue, com três cadáveres estrebuchando.
Atraído pelos tiros, o xerife chegou em
seguida.
— O que houve por aqui? — quis saber.
— Steve queria me surrar e tive de me
defender —f alou o garoto.
— E seus homens tentaram atirar em
Ned, por isso eu os matei — completou
Bluf.
— Foi isso mesmo que aconteceu? —
indagou Hank ao barman, que se apressou
em concordar. — E vocês, viram isso
também? — indagou, então, aos outros
presentes, muitos dos quais pistoleiros do
próprio Ned.
Todos concordaram com a versão dada
por Ned e Bluf.
— Se é assim, foi legitima defesa, então.
Nada há que se possa fazer — determinou
ele.
— Sim, xerife. Agora é trabalho para o
papa-defuntos. — comentou Bluf. — É
melhor o Ned ir para o rancho agora. Os
rancheiros ainda estão por aí e a coisa pode
esquentar. Não queremos encrencas com
eles, não mais que já temos — acrescentou,
assim que Hank se aproximou da mesa.
— Bluf tem razão, Ned. Vá para o rancho
e deixe as coisas esfriarem.
— Não tenho medo dos rancheiros nem
de ninguém.
— Sabemos disso, mas será melhor para
todos — insistiu Bluf.
Ned se deu por vencido. Terminou a
cerveja e foi embora, seguido por seus
capangas.
Hank sentou-se para conversar com Bluf.
— Penso que ele está escapando do nosso
controle, Bluf.
— Posso cuidar dele, não se preocupe.
Ele está embalado, julgando-se o maioral.
Deixe-o seguir em frente. Só temos a lucrar
com isso.
— Não sei, Bluf. Não confio nele. Acho
que pode nos enganar a qualquer momento.
— Que nada, Hank. Ele precisa de nós,
precisa de sua proteção, como xerife. Não
fosse isso, eu até poderia achar que ele
começaria a criar asinhas. Sem sua ajuda,
estaria encrencado no primeiro tiroteio.
— Veremos. Espero que ele perceba isso,
Bluf. Caso contrário, teremos de agir contra
ele.
— Vamos aguardar para ver. Logo
iremos vender a primeira manada de gado
roubado. Ned está terminando de marcá-lo.
Quando os lucros começarem a entrar, as
coisas ficam mais fáceis.
— Espero que sim, sócio — falou Hank,
não muito confiante naquilo.
Aquele foi um dia de tristeza no Rancho
Granger. Dianne chorava a morte do pai,
confortada por amigos e vizinhos.
Uma cova já havia sido cavada na colina
que dominava toda a extensão do rancho.
Ali já repousava a mãe da garota. Agora
seu pai iria fazer-lhe companhia.
Estavam todo preparados, ao entardecer,
para levarem o caixão para a carroça e, dali,
para a sepultura.
Um bando de cavaleiros se aproximou,
no entanto, interrompendo a cerimonia.
Ned e seus homens chegaram e pararam
diante da casa. Ao vê-lo, Dianne ficou
possessa.
— Seu maldito assassino! Vou acabar
com você se não sair daqui imediatamente.
— Acalme-se, querida. Só vim prestar
minhas homenagens ao seu pai. Era um
grande homem.
— Miserável, cínico e covarde! Primeiro
o mata, depois o elogia...
— Acho melhor ser mais educada
comigo, garota. Não vim aqui em busca de
encrenca, mas você me ofende falando
dessa forma — repreendeu-a ele, com rigor.
— É o fim do mundo mesmo. Você está
mais do que buscando encrenca. Você está
trazendo a encrenca com você — disse um
dos rancheiros, avançando para o pátio.
O som de armas sendo engatilhadas o
fizeram pensar duas vezes antes de qualquer
outra coisa.
— Fique quietinho aí, moço! A conversa
ainda não chegou aí — ameaçou-o Ned.
— O que desejas aqui, afinal? — quis
saber Dianne, já quase fora de si com tanto
cinismo.
— Só vim avisá-la que estarei a sua
disposição para o que precisar...
— Não preciso de sua ajuda — cortou-a
ela. — Tenho muitos amigos aqui.
— Nenhum deles vale tanto quanto eu e
nem todos eles juntos tem a força de meu
dedo. Uma garota especial como você
precisa da proteção de um homem como eu.
— Não o considero um homem, Ned.
Para mim você não passa de um animal
arrogante! — rugiu ela, cuspindo na direção
dele.
Ned saltou do cavalo para o alpendre da
casa, vibrando uma bofetada no rosto da
garota.
O rancheiro mais próximo avançou
contra Ned, mas uma bala disparada por um
dos pistoleiros, atingiu-o na perna,
derrubando-o pesadamente.
Ninguém pôde fazer nada, diante das
armas dos pistoleiros, apontadas para eles.
— Espero um pouquinho mais de
respeito de você na próxima — falou Ned,
saltando para seu cavalo.
Olhou Dianne demoradamente,
devorando-a com os olhos, depois esporeou
seu cavalo e se afastou, seguido pelos seus
homens.
— Malditos! Precisamos fazer alguma
coisa. O único capaz de enfrentá-lo era seu
pai. Dianne. Não sei o que faremos agora —
disse o rancheiro que fora ferido.
— Pois eu sei o que fazer. Se meu pai
tinha um plano, nada mudou com a morte
dele. Eu realizarei o que ele pretendia fazer.
Vou a Durango contratar pistoleiros.
— Mas o que você entende disso? —
indagou alguém.
— Nada, mas prometo que vou aprender
depressa, muito depressa mesmo — decidiu
ela, os olhos acompanhando a nuvem de
poeira que se formava à passagem de Ned
de seu cortejo.
No dia seguinte, em Durango, no saloon
Vallecito, um homem bebia sozinho numa
das mesas ao fundo.
Entardecia. Os primeiros vaqueiros e
jogadores começaram a chegar.
O homem que bebia sozinho tinha um
baralho na mão e brincava com as cartas.
Dois jogadores se entreolharam, após
observarem-no. Aproximaram-se da mesa
dele.
— Que tal uma partida de pôquer,
forasteiro? — indagou um deles.
Burt Murdock levantou os olhos para os
dois, examinando-os.
— Como se chamam?
— Sou Ken Willard e este é meu irmão,
Clayton Willard.
Burt reclinou o corpo na cadeira para
examiná-los melhor. Eram típicos
jogadores, com coletes e casaca, chapéu
coco e aquele olhar matreiro que só os
trapaceiros têm.
— Gosto de jogar, mas gosto de jogo
limpo. Não tolero trapaceiros nem ladrões.
Para este tenho um tratamento especial —
disse, em voz alta, para que todos presentes
ouvissem.
Conseguiu chamar a atenção de todos.
— Só sabemos jogar assim, estranho —
disse Ken. — E você, como é seu nome?
— Meu nome é Dois Mil e Quinhentos
Dólares — respondeu ele, depositando o
maço de dinheiro na mesa.
Os olhos de Ken e de Clayton brilharam
de cobiça. Ao verem todo aquele dinheiro,
as pessoas rodearam a mesa, dispostas a
acompanhar o jogo.
Todos os que conheciam os irmãos
Willard sabiam que o estranho não teria
chances.
Aqueles dois trapaceavam como ninguém
e jamais haviam sido apanhados.
— Você carteia — disse Clayton a Burt.
— A primeira mão é sua.
Começaram o jogo. A principio, os dois
irmãos deixaram que Burt ganhasse
pequenas quantias.
À medida que o jogo foi aumentando,
porém, resolveram começar a agira.
Clayton daria as cartas. Distribuiu as
cinco de praxe para cada um.
— Você troca, estranho. Quantas?
— Duas — disse Burt.
— E você, Ken?
— Quero três!
Clayton começou a retirar as três cartas.
Juntou-as na mesa e empurrou-as na direção
do irmão.
Burt agiu rápido como um raio. Sua faca
cravou-se sobre a mão de Clayton,
prendendo-a, juntamente com as três cartas,
no tampo da mesa.
— Seu maldito! O que pensa que está
fazendo? — berrou o outro irmão, pondo-se
de pé.
Burt, porém, já enfiava o cano de seu
revólver na boca do jogador.
— Calado! — ordenou.
— Por que fez isso? — indagou Clayton,
tentando tirar a faca.
— Deixe-a aí — ordenou Burt. — Tenho
um amiguinho, um garoto de seis anos, que
encontrei em Alamosa. Ele me contou como
o pai foi roubado por dois jogadores aqui
em Durango, neste saloon. Prometi a ele
que iria ver isso, pois o pai dele se suicidou,
ao perder todo o dinheiro da família,
deixando-a na miséria.
— Não pode nos acusar de trapacear—
disse Clayton, gemendo de dor.
— Um baralho só tem quatro ases. Eu
tenho dois deles. O terceiro eu descartei e
deveria estar encima do baralho. Só não
poderia estar é entre as três cartas que você
estava passando para o seu irmão. Que acha
de verificarmos? — perguntou Burt,
segurando o cabo da faca e arrancando-a.
Clayton gemeu de dor.
O xerife estivera no saloon e, diante das
provas e das testemunhas, os dois irmãos
foram levados presos.
— Só o aviso para dar o fora da cidade o
mais depressa possível, forasteiro — dissera
o xerife. — Como das vezes anteriores os
dois irmãos vão pagar a fiança e sair.
Quando isso acontecer, virão atrás de você.
— Não terão que andar muito, xerife.
Vou estar bem aqui — afirmou Burt,
calmamente.
— Compreende que nada posso fazer
para impedi-lo de vir atrás de você?
— Compreendo, xerife. Da mesma forma
como você terá de compreender quando eu
os matar — devolveu Burt.
— Os dois são tão trapaceiros com as
armas quanto são com as cartas, por isso
não espere que eles o enfrentem cara a cara,
na certa vão atacá-lo quando você menos
esperar.
— Eu sabia que não seria de outra forma,
xerife. Não se preocupe comigo.
— Mais uma vez eu insisto. Posso
conseguir umas duas ou três horas de
vantagem para você — avisou o xerife.
— Xerife, mais uma vez eu agradeço,
mas não sou homem de fugir de uma briga.
— É, não sei se você é muito corajoso ou
se é muito estúpido, estranho, mas tome
cuidado, de qualquer modo.
— Tomarei, xerife! — finalizou Burt,
agradecendo-o mais uma vez pela
preocupação.
Sua mesa ficou vazia, bem como as
mesas próximas. Ele continuou no fundo do
salão, bebendo sozinho.
Todos o olhavam de longe, receosos,
como se esperassem que, a qualquer
momento, aquele local onde ele se
encontrava fosse ser varrido de bala.
Alguém, então, se aproximou e parou
diante dele. Vestia roupas masculinas,
cobertas de pó. Sob o chapéu, porém, um
rosto feminino.
Os cabelos compridos de Dianne estavam
presos no alto da cabeça e cobertos pelo
chapéu de abas retas.
As roupas masculinas compridas e
folgadas escondiam as formas perfeitas de
seu corpo.
— Posso me sentar com você? —
indagou ela, provocando surpresa nele.
Burt a olhou demoradamente,
demonstrando estar confuso com ela.
Dianne tirou o chapéu e seus cabelos
cascatearam sobre seus ombros.
— Está surpreso? — indagou a garota.
— Não, até que não. Quem é você e o
que quer?
— Posso me sentar?
— Não tem medo?
— De quê?
— Parece que todos no saloon estão
esperando a saída daqueles dois da cadeia.
Com certeza eles virão disparando contra
esta mesa. Portanto este não é um lugar
muito saudável para uma garota, mesmo
que ele porte uma arma. Sabe usá-la?
— Sei com o sacar e atirar.
— Talvez não seja o bastante.
— E não é. Sou uma rancheira, não uma
pistoleira. Afinal, posso ou não me sentar?
— Por favor — disse ele, finalmente, sem
se levantar.
Seus sentidos estavam atentos às reações
das pessoas no saloon.
Quando os dois jogadores viessem atrás
dele, Burt sabia que haveria reações, mesmo
que imperceptíveis, das pessoas no balcão,
na porta e nas janelas.
Por isso não desviava sua atenção,
mantendo-se alerta ao menor sinal.
— Quer beber? — perguntou ele, fazendo
um gesto para o barman que, de longe,
jogou o pequeno copo na direção dele.
Burt o apanhou no ar e riu do medo
demonstrado pelo outro.
— Afinal, o que deseja de mim?
— Sou de Cortez — começou ela. —
Estamos tendo problemas com ladrões de
gado e precisamos contratar pistoleiros para
nossa proteção. Represento a Associação
dos Criadores...
— E o xerife local? — cortou-a Burt.
— É um imprestável. Se duvidar, está
mancomunado com os ladrões.
— Péssimo! Quando não são covardes
são corruptos — comentou Burt.
— Eu o vi agindo contra os dois
jogadores. Penso que seja um pistoleiro...
— Sou mais do que isso, senhorita...
— Desculpe-me! Sou Dianne Granger.
— Ok, Dianne. Noto que usa um laço
negro na camisa. Está de luto?
— Sim, por meu pai.
— Eu sinto muito!
— Foi assassinato por um pirralho
arrogante que se julga o maioral, só porque
é o maior criador de gado da região...
— E porque ele matou seu pai?
— É o que eu gostaria de saber. Meu pai
era um homem estourado, mas honesto.
Deve ter descoberto algum podre de Ned
Murdock, o rapazola...
— Murdock? Ned Murdock? É parente
do velho Murdock?
— Conhece Jed Murdock?
— Há muito tempo passei por Cortez...
Lembro-me de tê-lo conhecido um dia —
disse Burt e seu tom de voz era saudoso.
A expressão de seu rosto também mudou.
Ele ficou triste e isso nublou seus olhos
cinzentos.
— Pois é. Depois da morte do pai...
— Jed Murdock tinha outro filho? —
surpreendeu-se Burt.
— Como outro filho? Desde que o
conheço, sempre soube que Ned era o único
filho dele — estranhou a garota.
— Está bem, acho que estou fazendo
confusão — descartou Burt. — Foi há tanto
tempo...
— Pois bem, como eu ia dizendo, após a
morte do pai, Ned Murdock se tornou
arrogante e cercado de pistoleiros. Matou
meu pai por nada, aparentemente. É o único
que tem ficado livre dos roubos de gado e,
por incrível que pareça, todas as pistas
levam na direção das terras dele, onde
nenhuma cabeça foi roubada até agora.
— Suspeitam que ele esteja por trás dos
roubos?
— De certa forma, sim, mas não se [pode
entender o motivo. Sozinho ele deve ter em
torno de uma cem mil cabeças de gado. Ou
é muito burro para perceber o quanto é isso
ou é ambicioso demais para querer todo o
resto.
— E vocês procuram pistoleiros para
enfrentá-lo ou para protegê-los.
— A idéia é nos proteger, antes de mais
nada. Se continuarem os roubos, muitos
acabarão quebrados, quando chegar o
momento de pagar os empréstimos no
Banco.
— E você quer me contratar.
— Sim, se estiver disponível.
Ele pensou por instantes, os olhos frios e
cinzentos sempre atentos às reações das
pessoas no saloon.
— Acho que estou disponível — afirmou
ele. — Costumo cobrar mil dólares pelo
trabalho, cem dólares para cada membro da
quadrilha preso ou morto, é indiferente para
mim, mais cinco dólares por cabeça de gado
recuperada.
Dianne não precisou fazer a conta
completa para perceber que aquilo
representava muito dinheiro.
Esboçou um sorriso incrédulo.
— Se formos pagar isso para cada
pistoleiros contratado, melhor será entregar
todo o rebanho para os ladrões — concluiu
ela.
— Você não entende o acordo. Pagará o
que eu disse pelo meu trabalho e nada mais.
— E os outros?
— Que outros?
— Os outros pistoleiros que vão ajudá-
lo?
— Ninguém vai me ajudar. Eu sempre
trabalho sozinho, Dianne.
Os olhos dela fitaram com incredulidade
aquele homem, que falava com convicção
sobre seu trabalho macabro.
— O que você é, afinal? — indagou ela,
olhando-o sem entender.
— Um caçador de recompensas —
respondeu ele.
Burt havia estendido o pé e, sem que
Dianne percebesse, apoiando a sola da bota
no braço da cadeira dela.
Repentinamente, ele empurrou a cadeira
dela para trás, ao mesmo tempo em que se
jogava para o lado.
Uma descarga de chumbo picotou o
tempo da mesa onde eles estiveram
conversando.
Dianne ficou imóvel, ouvindo as balas
assobiando sobre sua cabeça.
Os dois jogadores entraram no saloon
com as armas fumegantes na mão.
Ken havia atirado da porta. Clayton da
janela, quebrando os vidros.
— Vamos dar o fora agora — gritou
Clayton.
— Quero ver se o maldito está morto
antes de dar o fora da cidade — respondeu
seu irmão, recarregando o Colt.
Burt se levantou, então, com a arma ainda
no coldre. Fitou os dois irmãos, que haviam
se imobilizado de surpresa.
— Foi um erro terem voltado aqui —
falou e sacou sua arma.
Um tiro atingiu o peito de Clayton,
jogando-o para trás. Seu irmão ergueu o
Colt para responder ao fogo, mas Burt foi
impiedoso.
Disparou duas vezes, atingindo-o na
cabeça e no peito, derrubando-o sobre o
irmão.
Os dois estrebucharam no assoalho,
banhados de sangue. Burt estendeu a mão,
ajudando Dianne a se levantar.
— Como soube? — quis ela saber,
perguntando num fio de voz emocionado.
— As pessoas junto à porta e à janela se
afastaram. Os que estavam no balcão
olharam repetidas vezes para cá e para os
dois irmãos, lá fora.
— Fantástico! Foi muito bom, mas daí a
capturar sozinho toda quadrilha de ladrões
de gado vai uma distancia enorme —
comentou ela.
— Posso lhe dar referencias — falou ele,
com tranqüilidade.
— Referencias?
— Sim. Basta telegrafar para a
Associação dos Criadores de Red River, No
Novo México, de onde estou vindo e para
uma porção de outros lugares que poderei
discriminar.
A garota não estava ainda de todo
convencida. Burt não se preocupou em
insistir.
Pensava em seu pai, Jed Murdock, da
briga que tivera e que o fizera se afastar de
casa havia mais de vinte anos.
Após a morte da primeira esposa, Jed,
que tinha um gênio difícil, ficou pior ainda.
Burt não o suportou. Aos vinte anos fugiu
de casa. Mesmo agora, sabendo da morte do
pai, não podia deixar de se sentir triste.
Apesar de tudo, gostava daquele velho
brigador.
— Você me disse que, após a morte de
Jed, seu filho ficou com todo o rancho?
— Sim, é o único herdeiro.
— Entendo! — comentou Burt,
pensativo. — Tenho de ir para Cortez, de
qualquer forma — continuou ele. — Se
quiser me contratar, nada terá a perder. Só
recebei depois de terminar o trabalho.
— Nada adiantado?
— Nada.
— Tem certeza que dará conta do
trabalho?
— Você verá — afirmou ele, vendo o
papa-defuntos tirar as medidas dos irmãos
mortos e o xerife, parado na porta do
saloon, balançar a cabeça num gesto
cansado.
— Está bem. Trato feito — decidiu ela,
finalmente.
— Muito bem. Antes de mais nada,
poderemos voltar juntos para Cortez, mas,
uma vez lá dentro, você não me conhece
nem nunca ouviu falar em mim. Serei um
desconhecido para você. Se eu precisar de
alguma coisa, a procurarei em sua casa,
sempre à noite, após as oito horas, nunca
antes.
— Terei de falar a seu respeito aos outros
rancheiros.
— Tudo bem, mas quanto menos pessoas
souberem de minha presença, melhor.
Normalmente faço muito barulho quando
chego a algum lugar. Se lhe perguntarem se
sou o pistoleiro que você contratou, negue
sempre.
— Certo, mas por que tudo isso?
— Porque, normalmente, uma quadrilha
como essa sempre conta com a proteção de
alguém. Se souberem que estou lá para
caçá-los, logo eles se voltarão contra mim.
— É, faz sentido. Acho que combinamos
tudo, não? Afinal, qual é o seu nome?
— Burt... Burt Taylor — mentiu ele.
— Ok, Burt! Temos um acordo, então.
Ela estendeu a mão sobre a mesa. Burt a
apertou suavemente, desmentindo toda a
rudeza de seu rosto queimado pelo sol.
No dia seguinte, quando retornou a
Cortez e já estava em sua casa, Dianne foi
procurada por um grupo de rancheiros,
liderados por John Waltman, amigo de seu
falecido pai.
— Contratou os pistoleiros? — indagou
ele.
— Sim, estão contratados.
— E quanto são?
— Meia dúzia, talvez mais. Os melhores
existentes — mentiu ela.
— Quanto custará?
Ela informou o que Burt lhe pedira.
— Parece-me razoável, mas será que
ainda poderá falar com eles e desistir do
acordo? Nem que tenhamos de indenizá-los
pelo trabalho de se porem a caminho.
— Como? — surpreendeu-se ela.
— Espere, deixe-me explicar-lhe —
pediu John. — Ned me procurou ontem.
Ficou sabendo que iríamos contratar
pistoleiros...
— Como ele ficou sabendo?
— Não sei. Viram você deixando a
cidade. Os boatos correm rapidamente. Ned
me procurou. Fez uma oferta...
— Oferta? De Ned? Que tipo de oferta?
— Nós lhe damos um quarto de nossas
manadas e ele nos dá proteção contra os
ladrões de gado.
— O quê? — surpreendeu-se ela, mal
podendo acreditar no que ouvia. — Vocês
pretendem aceitar?
— Veja bem, ainda será vantajoso para
nós. Teremos proteção e...
— E quem garante que os roubos não
continuarão? Quem garante que, após um
quarto de todo o gado, ele não peça mais?
Quem garante que não seja ele mesmo
quem esteja mandando nos roubar? Gente,
temos de pensar friamente. Aquele moleque
é capaz de tudo. Isto é extorsão.
— Pode ser, mas será a solução para os
nossos problemas.
— Eu não aceitarei isso. Lutarei até o
fim. Vocês me deram procuração para
contratar os pistoleiros. Eles estão a
caminho e não há como impedir isso.
Aceitar a proposta de Ned é submeter-se a
chantagem. Não permitirei isso. Meu pai
jamais aceitarei isso também.
— Você tem que ser razoável, Dianne —
insistiu John.
— Não, jamais.
— O gordo nos livrará de problemas.
— Já estamos com problemas. E o gado
que já foi roubado? Será descontado? Será
recuperado? O que Ned fará a respeito?
— Não conversamos sobre isso, querida
— respondeu John.
Dianne notou que os demais rancheiros
permaneciam em silencio e que pareciam
até não concordar com John.
Este, sim, estava muito empenhado em
vender aquela proposta indecente de Ned
Murdock.
— Só há uma forma de resolver isto —
disse ela. — Vamos votar. quem está favor
de minha idéia, levante a mão — disse ela,
decididamente, erguendo a mão direita.
Os outros rancheiros, exceto John
Waltman, a seguiram.
Naquela tarde, Bluf e Ned bebiam e
conversavam no saloon sobre a nova
estratégia desenvolvida pelo garoto.
— E então, o que achou? Com isso,
teremos um quarto de todo o rebanho dos
rancheiros — explicou Ned.
— Fantástico, garoto! Você me
surpreende cada vez mais.
— Dessa forma, eles vão me entregar
reses marcadas. Compreende o que isso
significa, não?
— Que poderemos roubar reses marcadas
também.
— Sim, isso mesmo.
— Mas aí os rancheiros vão protestar.
— Quem protestar, eu me oferecerei para
comprar as terras dele.
— O que pretende com isso? Ser o dono
de toda a região?
— E por que não?
Bluf olhou-o. O garoto era inteligente,
mas era louco, completamente louco.
Só que isso, longe de incomodar o
jogador, mais o animava. Afinal, quanto
mais Ned tivesse, mais ele e Hank
lucrariam.
Quando se cansassem de servi-lo e já
estivessem com tudo nas mãos, poderiam
descartá-lo.
Sairiam daquilo ricos e, sendo Hank o
xerife, poderiam jogar toda a culpa dos
roubos em Ned que, morto, não poderia se
defender.
Bluf adorava aquele plano.
— Que tipo! — comentou Ned,
observando o homem que entrava no
saloon.
Era alto e usava esporas mexicanas, que
tiniam ao bater no assoalho.
Vestia uma longa capa de viagem,
coberta de poeira. Tinha o rosto curtido pelo
sol e um olhar frio e desconfiado nos olhos
de um azul quase cinzento.
Encostou-se no balcão.
— Uma tequila e uma cerveja — pediu
ele.
O barman o serviu. O homem bebeu a
tequila, depois tomou alguns goles de
cerveja.
Estalou a língua, deliciado. Terminou a
cerveja e pediu outra dose.
Sobre o balcão deixara uma moeda de um
dólar.
— Vai beber tudo isso? — apontou o
barman.
— Sim. Vá repetindo até esgotar o
dinheiro.
— Tudo bem, estranho — concordou o
atendente, repetindo a dose.
O xerife entrou logo em seguida. Bluf
fez-lhe um sinal, mostrando o homem junto
ao balcão.
Hank foi até lá. O forasteiro, ao ver a
estrela, não se intimidou.
— Bebe comigo, xerife?
— E por que não? — retrucou Hank,
pedindo um uísque.
— A nossa — disse o forasteiro,
levantando o copo.
— A nossa — aceitou Hank, tocando seu
copo no dele.
— Como é seu nome, estranho?
— Burt Taylor.
— Procura trabalho.
— Não, estou de passagem. Quero
descansar por um dia ou dois, depois seguir
viagem.
— De onde vem?
— Do sul.
— Para onde vai?
— Norte — respondeu Burt, repetindo a
dose de sua bebida.
— Vejo que usa um cinturão todo
especial — observou Hank.
— Gosto do coldre baixo assim. Fica
mais fácil sacar. Há muitas cascavéis na
estrada e é preciso estar atento, se é que me
entende.
— Sim, eu entendo, Burt Taylor. Se
mudar de idéia, desejando ficar e trabalhar,
fale comigo. Acho que tenho um bom lugar
para um homem como você.
— Como eu?
— Sim... Que usa coldres baixos e sabe
atirar em cascavéis, se é que me entende —
brincou Hank, agradecendo pelo uísque e
indo para a mesa de Bluf e Ned.
— Quem é? — quis saber Ned.
— Um viajante.
— Há muito não vejo um homem com
esse tipo de capa — comentou.
— São viajantes...
— Ou caçadores de recompensa —
completou Bluf.
— Sim, era isso que ia dizer — ajuntou
Ned. — Soube que a garota Granger foi até
Durango atrás de pistoleiros.
— Pistoleiros, não caçadores de
recompensa — corrigiu Hank.
— De qualquer forma, fique de olho nele,
Hank. Nunca se sabe — alertou Bluf.
Naquele momento, Arthur Brandon, um
pequeno rancheiro, entrou no saloon.
Trazia uma espingarda engatilhada e o
rosto ensangüentado. Olhou na direção da
mesa de Ned e ergueu a arma.
— Fique aí mesmo, maldito! — gritou.
— Seus pistoleiros acabam de roubar meu
gado, mas eu os segui até seu rancho. Eles
me pegaram, quase me mataram. Deixaram-
me para os abutres, mas tenho o couro duro
— disse o homem, aproximando-se.
— Arthur, fique calmo — pediu o xerife.
— Cale a boca você, seu incompetente
corrupto. Pensa que eu não sei? Você e eles
estão juntos nesse negocio sujo.
— Espere aí. Assim você está me
ofendendo e não posso permitir que... — ia
dizendo Hank, mas calou-se quando os dois
canos da espingarda se voltaram para ele.
— Fique aí mesmo. Eu quero é esse
pirralho bastardo, esse filho de uma
dançarina de cabaré que nem sabe ao certo
quem é o pai dele. Pode ter sido qualquer
um de nós, rapazes — falou o rancheiro,
com ódio, completamente fora de si.
— Maldito boca grande! — falou Ned e
sua mão se moveu com incrível rapidez.
A faca atravessou o saloon e atingiu a
garganta do rancheiro, atravessando-a.
O homem caiu para trás, apertando os
dois gatilhos da espingarda, abrindo um
rombo no forro.
Ned sacou a arma e foi até ele. O velho
estrebuchava, os olhos revirados, a boca
vomitando sangue.
— Chega, Ned! Ele já está morto — disse
Hank, detendo-o, impedindo-o de disparar
contra um cadáver.
— Miserável! Maldito mentiroso! —
repetia Ned, retornando à mesa.
Sem que percebesse, Burt havia
apanhado mais uma tequila e uma cerveja e
ido sentar-se numa das mesas próximas
deles.
Fingiu-se de bêbado e cansado,
debruçando-se sobre a mesa, como se
estivesse dormindo.
— Sente-se, John. O que tem a me dizer
da proposta que fiz aos rancheiros? —
indagou Ned.
O rancheiro olhou para os lados primeiro,
antes de começar a falar.
— Levei sua proposta a eles. Estavam tão
assustados que acabariam concordando.
Quiseram falar com Dianne Granger e ela
os convenceu do contrário.
— Maldita garota! É teimosa como uma
mula. Soube que ela foi contratar
pistoleiros, é verdade?
— Sim, estava em Durango e contratou
seis deles. Estão vindo para cá.
— Ótimo, cuidarei disso. Quer dizer que
nada feito, então?
— Infelizmente, não.
— É uma pena, John. Você perdeu uma
gorda comissão. Devia ter se esforçado
mais.
— Foi aquela garota. Sem ela, eles teriam
concordado.
Ned pensou por instantes, olhando para
seus sócios.
— E se eu cuidar da garota, você
conseguirá convencer os outros rancheiros?
— Com toda certeza.
— Está bem. Espere, então, eu cuidar
dela, depois volte a falar com eles.
— Certo, Ned — despediu-se John,
saindo.
— O que vai fazer, Ned? — indagou
Bluf.
— Deixem comigo — falou o garoto,
fazendo um sinal para um homem no
balcão.
Era Melrose Summer, um de seus
homens de confiança e pistoleiro da pior
espécie.
— Pois não, patrão — apresentou-se ele
rapidamente.
— Mel, quero que vá até o rancho da
garota Granger e diga a ela que desejo
conversar com ela.
— Acho que não será preciso, patrão. Eu
a vi entrar no armazém há uns dez minutos.
— Verdade? Pois vá lá e traga-a até aqui.
Preciso acertar umas coisinhas com aquela
gata selvagem.
— Deixe comigo. Levarei Bob e Will —
falou o pistoleiro, indo até o balcão
conversar com seus parceiros.
Burt se levantou preguiçosamente, bebeu
o resto de tequila e cerveja, depois foi até o
balcão.
— Onde arrumo um quarto e uma boa
janta?
— Na pensão da viuva Moriarty. É só
descer a rua. Verá a placa na frente da casa.
Burt agradeceu e saiu, ainda na frente dos
pistoleiros de Ned.
Olhou a rua, examinando os prédios. O
armazém ficava rua abaixo, na direção da
pensão.
Montou seu cavalo e, sem pressa,
começou a descer a rua. Os homens de Ned
deixaram o saloon.
Burt viu Dianne saindo do armazém. Ao
vê-lo, a garota ficou parada, apenas
olhando-o.
Ele segurou o cavalo.
— Por favor, senhorita! — disse ele. —
Onde fica a pensão da viuva Moriarty?
— Descendo a rua, na próxima esquina.
É aquela casa com a cerca branca —
apontou ela.
Nesse momento, os três homens de Ned
chegaram.
— Temos um recado para você, dona.
Ned quer vê-la agora mesmo — falou
Melrose.
— Digam a ele que vá para o inferno!
Não tenho nada a tratar com ele — falou
ela, virando as costas para se afastar.
Mel a segurou pelo braço, obrigando-a se
voltar.
— Não me faça obrigá-la a ir, dona. Eu
gostaria muito de levá-la sem problemas.
— Largue-me, seu animal — exigiu ela,
tentando se libertar da mão que a segurava.
— Vou levá-la por bem ou por mal —
falou o pistoleiro, irritando-se.
— Já disse que não vou — decidiu ela,
livrando-se dele com um empurrão.
Os outros dois correram e barram-lhe o
caminho. Burt, em seu cavalo ainda,
indagou:
— Precisa de ajuda, dona?
— Meta-se com sua vida, estranho, ou
vai se arrepender! — rosnou-lhe Mel.
— Eu falei com a moça aí — ignorou-o
Burt.
— Sim, preciso de ajuda.
Burt desmontou lentamente, sem pressa
alguma. As pessoas observaram a cena com
interesse.
Antecipadamente já lamentavam a sorte
daquele forasteiro que ousava enfrentar os
homens de Ned Murdock.
Sabiam que ela não teria chance. Aqueles
homens eram cruéis e implacáveis.
Os homens desviaram a atenção de
Dianne para o intrometido que ousava
desafiá-los.
— Qual é seu nome, estranho? —
indagou Mel.
— Burt Taylor, por quê?
— Para mandar escrever em sua lápide,
lá na Colina dos Pés Juntos.
Os outros pistoleiros riram. Burt não se
intimidou, encarando-os com seus olhos
cinzentos.
Dianne se afastou, mas ficou observando
a cena à distancia.
— Você fala demais — disse Burt.
— Acho que não sabe com quem está
lidando — comentou Mel, arrogante.
— Reconheço um coiote pelo cheiro —
zombou Burt.
— É um piadista... Que bom, rapazes!
Temos alguém para pôr no palco do saloon
e nos contar algumas piadas — falou Mel.
— Que acha desta aqui? — acrescentou,
lançando o punho contra o rosto do
forasteiro.
Burt apenas desviou o corpo e o punho
do pistoleiro passou ao lado de seu rosto.
Em resposta, ele socou-o na orelha,
fazendo-o ir se estatelar na poeira da rua.
— Maldito intrometido! — rugiu o
segundo, dando um pontapé em Burt.
O caçador de recompensa segurou-o pela
bota e chutou-lhe os testículos, fazendo-o
urrar de dor e se dobrar para frente.
Burt não teve piedade. Acertou-lhe um
chute no rosto, jogando-o sobre Mel, na
poeira da rua.
O outro pistoleiro sacou de uma faca.
— Arrancar-lhe o couro bem devagarinho
— disse, avançando para o justiceiro.
A faca rebrilhou ao sol por instantes,
depois voou alto e foi cair no meio da rua.
Burt a havia tirado da mão do pistoleiro
com um chute. Antes que seu oponente se
recuperasse da surpresa, ele o golpeou no
queixo, derrubando-o desacordado.
As pessoas aplaudiram, surpresas com a
surra aplicada nos homens de Ned.
Burt saltou para o seu cavalo. Ao passar
por Dianne, disse-lhe em voz alta.
— Está tudo bem agora, senhorita.
Garanto que eles não mais a incomodarão.
— Eu fico muito grata por isso,
forasteiro, mas acho que se meteu numa
encrenca por isso.
— Não me importo. Encrenca tem sido
meu meio de vida, moça.
Ele a saudou tocando a aba do chapéu e
desceu a rua, na direção da pensão da viuva
Moriarty.
Atrás dele, na porta do saloon, Ned não
se conformava com a surra levada por seus
homens.
— Quero que o investigue, Hank. Esse
sujeito me parece perigoso. Num momento
está atrás de nós, dormindo. No outro, está
na rua, brigando com três dos meus
melhores homens e dando-lhes uma lição.
— Já falei com ele, Ned. É um sujeito
perigoso mesmo, deu para perceber. Seus
capangas tiveram sorte dele não ter sacado a
arma. Estariam mortos, tenho certeza.
— Faça-lhe uma oferta, Hank.
— Ora, Ned! Sou o xerife, isso não fica
bem.
— Certo, então, mandarei alguém
convidá-lo para tomar um drinque comigo e
conversar.
— É boa a sua idéia, mas seja lá quem
for, mande-o ir com calma com esse
forasteiro. Não é flor que se cheire. É um
homem acostumado a fazer as suas próprias
regras e jamais obedecer ordens, seja lá de
quem for.
— Isso nós veremos!
— E quanto à garota? — quis saber Bluf.
— Vou mandar os rapazes buscarem um
pouco do gado dela.
— Só isso?
— Não, irei junto e farei uma visita a ela.
Hoje é lua cheia, noite romântica, própria
para um encontro amoroso.
— Vai se dar mal com ela — alertou
Hank.
— É uma gata selvagem, só precisa de
quem a dome — falou ele, com
fanfarronice.
— Espero que tenha razão e não saia de
lá arranhado pela gata que pretende
conquistar.
— Eu sei o que estou fazendo — afirmou
ele, indo selecionar um capanga para
mandar convidar Burt para um drinque.
Burt havia chegado há pouco tempo na
cidade, mas já fora o suficiente para
perceber como as coisas funcionavam.
Ned Murdock, seu meio-irmão, era um
ambicioso tirano, disposto a tomar tudo pela
força pelo terror.
Estava roubando o gado dos rancheiros e
ainda forçando-os a pagarem por proteção.
Era sempre o mesmo em toda parte. Só
que, desta vez, a família dele estava
envolvida.
Não nutria nenhum sentimento por Ned.
Simplesmente não o conhecia e, para agir
daquela forma, Ned não sabia da existência
de um filho de Jed Murdock.
Assim sendo, estavam ambos na mesma
posição, só que Ned se apossara da fortuna
que, por direito, seria toda de Burt.
O caçador ainda não sabia o que faria a
respeito. Seu senso de dever o levava a se
preocupar inicialmente com seu trabalho.
Estava ali para desbaratar uma quadrilha
de ladrões de gado e o faria. tinha
conseguido algumas boas pistas, como a
intenção Ned de mandar roubar gado de
Dianne.
Seria um bom começo para sua
investigação.
— Vi o que fez e adorei — comentou a
viuva Moriarty, quando Burt desceu do
cavalo, diante da cerca nova.
— Parece que aqui ninguém gosta dos
pistoleiros de Ned Murdock — observou
ele.
— Realmente. Aquele garoto arrogante
ainda vai se dar mal, ouça o que lhe digo.
— Imagino mesmo. Soube que tem
quartos para alugar?
— Para você? Oh sim, claro! Entre.
Tenho um ótimo quarto, de frente para a
rua, com banheira e tudo. Você vai adorar
— disse a velhinha, levando-o para o
interior da casa. — Se quiser tomar um
banho, mando esquentar a água para você.
Tenho água fria encanada. É bom no calor,
mas péssimo no inverno.
— Eu adoraria um bom banho. Tenho
algumas roupas que precisam ser lavadas...
— Eu cobro à parte, mas posso fazer isso
por você. Estão no alforje da sela?
— Sim...
— Eu pego, pode deixar.
Burt foi levado a um pequeno e
confortável quarto, no pavimento superior
da casa. Havia uma cama, banheiro no fim
do corredor e um cheiro de limpeza
encantador.
— É o melhor que já tive em toda a
minha vida, Sra. Moriarty —declarou ele.
— Fico feliz que gosta. Vou cuidar do
seu banho.
— Há uma muda de roupa limpa no
alforje. Agradeceria se a passasse para mim.
— Pode deixar que eu cuido de tudo —
afirmou ela, retirando-se.
Burt foi até a janela. Viu um dos homens
que estava no saloon descendo a rua. Ficou
de sobreaviso.
O pistoleiro falou com a viuva, que
retirava o alforje da sela, depois entrou na
casa.
Burt foi esperá-lo no alto da escada, com
o Colt preparado no coldre.
Ao vê-lo, o pistoleiro parou,
impressionado.
— O que deseja? — indagou o caçador
de recompensa.
— Meu patrão o convida para um
drinque.
— Muito gentil, mas quem é seu patrão?
— Ned Murdock.
— Lá no saloon?
— Sim. Ele o espera agora.
— Vou tirar a poeira do couro e vestir
uma roupa limpa. Assim que terminar, irei
até lá — finalizou ele.
O pistoleiro ainda o mediu dos pés à
cabeça, como que avaliando-o. Burt já vira
aquele olhar antes. Normalmente vinha de
um sério candidato a defunto.
Tomou um banho quente, fez a barba,
mudou de roupas, vestiu o cinturão e foi
para o saloon.
Quando passava pela rua, as pessoas
comuns o olhavam com respeito, naquele
comecinho de noite.
Os lampiões da rua começavam a ser
acesos. As pessoas que trabalhavam no
comércio fechavam suas lojas e iam para
casa.
Burt imaginou como seria viver uma vida
monótona e tranqüila como aquela, sem
sobressaltos, tendo sempre um lugar para
onde voltar, com alguém o esperando.
Desconhecia esse ritmo de vida. Tornara-
se um caçador havia mais de quinze anos.
Já nem se lembrava mais dos homens que
matara. Ganhara muito dinheiro, mas tão
fácil como vinha também ia.
Jogo, mulheres e bebida levavam tudo o
que ganhava. Ultimamente, porém, havia
percebido que precisava começar a pensar
na velhice.
Beirava os quarenta anos. Não poderia
ser um caçador o resto de sua vida.
Quando entrou no saloon, um silencio
pairou no ar. Todos ficaram de olho nele e
em Ned Murdock, que bebia juntamente
com Bluf.
Burt foi até a mesa deles.
— Queria me ver? — indagou.
— Sente-se, estranho — convidou Ned.
Burt o atendeu, sempre com cautela,
mantendo seus olhos nos dois homens
diante dele e nos outros, espalhados pelo
salão.
O barman trouxe um copo de tequila e
outro de cerveja.
— Vejo que tem boa memória —
observou Burt.
O homem sorriu e se afastou
rapidamente. Burt bebeu o copo de tequila,
depois tomou alguns goles de cerveja.
Encarou Ned Murdock buscando nele
alguma semelhança com o seu pai, sem
conseguí-lo.
— Soube que é filho de Jed Murdock, é
verdade? — indagou.
— Por quê? Conhecia o velho? —
retrucou Ned.
— Passei por aqui há muito tempo atrás.
Na época ele era viuvo e tinha um filho...
— Filho? Nunca soube de filho nenhum.
Você sabia disso, Bluf? — indagou ao
sócio.
— Nunca ouvi falar.
— Pois nem eu — afirmou o rapaz, já
bastante alto. — Mas não o convidei aqui
para falar de amenidades. Soube que está de
passagem, é verdade?
— Sim.
— Não procura trabalho? Vi o que fez
com três dos meus melhores homens...
— Se aqueles eram os melhores, fico
imaginando que porcaria devem ser os
outros — zombou Burt.
O rosto do rapaz ficou sério, olhando-o
com rancor.
— Não zombe de meus homens,
forasteiro. Está em minha cidade e aqui,
quando eu toco, todos têm que dançar.
— Inclusive eu?
— Eu disse que todos têm que dançar.
Todos, entendeu?
— Perfeitamente — respondeu Burt,
reclinando-se em sua cadeira e olhando o
garoto.
Era um pirralho, realmente, mas
arrogante e senhor de si. Adoraria dar-lhe
uma lição.
— Vou lhe fazer uma proposta...
— Que proposta?
— Uma proposta de trabalho...
— Já disse que não estou à procura de
trabalho.
Ned inclinou-se sobre a mesa para falar
mais de perto.
— Um tipo como você, que surra três dos
meus homens com tamanha facilidade, não
pode ficar nesta cidade sem trabalhar para
mim. Isso me deixa nervoso, sabia? E
quando fico nervoso, eu faço besteiras.
— Assim, não me deixa escolha, não? Ou
trabalho para você ou dou o fora da cidade...
— Acertou — disse Ned, apontando o
dedo direto para a cara do caçador de
recompensa.
Burt inclinou-se. segurou o dedo dele e o
abaixou até a mesa.
— Não gosto que apontem para mim,
seja um dedo ou uma arma. Além disso, não
gosto também de receber ordens. Sou meu
próprio patrão e pretendo continuar assim.
Agradeço pelo drinque — disse,
levantando-se.
— Ainda não terminei — berrou Ned,
possesso com a atitude do outro.
— Você não entendeu, garoto. Eu já
terminei — falou Burt, acabando de beber a
cerveja e depositando o copo com força
sobre a mesa.
Ned ficou olhando para ele como louco.
Sua mão procurou a faca que trazia às
costas.
— Não! — murmurou Bluf, detendo-o.
Melrose e seus dois amigos estavam no
balcão. Foram, se postar diante de Burt,
impedindo-o de sair.
— Não ficaram satisfeitos ainda? —
indagou Burt.
— Você teve sorte, apenas isso — falou
mel.
— Vão tentar a sorte de novo?
— Não vai se sair bem desta vez.
— Vocês me dão pena — disse Burt,
empurrando Mel para passar entre os três.
A reação foi rápida. Um dos homens o
agarrou por trás, imobilizando seus braços.
Mel, diante dele, preparou-se para socá-lo
no estômago.
Burt jogou a cabeça para trás e o som do
nariz se partindo foi seguido por um grito
de dor.
O sangue lavou a cara do pistoleiro que
segurava o caçador. Por uma fração de
segundos, mel deteve seu golpe, tempo
suficiente para Burt atingi-lo no estômago
com um pontapé.
O terceiro homem não quis brincadeira.
Foi logo sacando a arma. Burt segurou-lhe o
pulso e girou o corpo, pondo o braço do
homem sobre seu ombro.
Puxou com força para baixo e o osso
estalou, quebrando-se, rasgando a pele e a
camisa.
Um urro de dor se seguiu ao estalo. Mel
tentou se erguer, ainda sem fôlego. Burt
meteu-lhe o pé na cara, desta vez, jogando-o
de costas no assoalho, com a cara cheia de
sangue.
Deixou o saloon, em seguida, sem olhar
para trás.
— Ele é um homem morto — declarou
Ned. — Quando eu terminar com aquela
garota, hoje à noite, cuidarei dele a meu
modo.
Naquele noite, após o excelente jantar
servido pela viuva, Burt foi se sentar na
varanda da casa para fumar.
Pouca gente passava na rua, apenas um
ou outro cavaleiro. Ele esperava. Precisava
falar com Dianne naquela mesma noite e,
além disso, evitar o roubo do gado dela,
bem como o ataque de Ned.
O garoto era perigoso, não restava a
menor dúvida, mas Burt já havia enfrentado
gente mais perigosa e mais experiente.
O garoto tinha poder, tinha capangas,
mas capangas não eram pessoas de
confiança.
Ao primeiro sinal de perigo trocavam o
pagamento pela vida. O que ganhavam não
justificava morrer pelo patrão.
— Vai sair? — indagou a viuva, quando
ele subiu, para retornar, pouco depois, com
o cinturão e o Colt.
— Vou dar uma volta, arejar as idéias —
disse ele, com tranqüilidade.
— Tome cuidado. Tem gente que não
gosta de você nesta cidade. Não vá pegar
uma indigestão andando por aí.
— Não se preocupe, Sra. Moriarty. Eu
tenho o remédio para isso — afirmou ele,
batendo na coronha do Colt.
Ela riu e ele foi selar o cavalo. Pouco
depois ele sumia no fim da rua.
Sabia onde era o rancho de Dianne.
Naquele dia, quando chegaram juntos de
Durango, ele a deixara na porteira do
rancho.
A noite estava clara. A lua cheia vinha
surgindo, clareando os campos e os pastos,
mostrando a pujança daquela região.
Havia algumas coisas que ele reconhecia
naquela paisagem. O contorno das
montanhas ao longe, a trilha que levava até
a cidade, a localização do rio e de um lago
que havia por ali.
Era imagem familiares, do tempo de sua
juventude, antes de deixar o rancho.
Ao se aproximar do Rancho Granger,
ouviu um tropel de cavalos vindo da cidade.
A nuvem de poeira indicava um grupo de
cavaleiros vindo na sua direção.
Deduziu que era Ned e seus capangas,
por isso esporeou o cavalo, chegando ao
rancho antes deles.
Havia luz na sala de jantar. Burt entrou
rapidamente, surpreendendo Dianne, que
jantava sozinha.
— Pegue uma arma — ordenou ele,
apagando os lampiões que iluminavam a
sala.
Com seu rifle na mão, ele ficou à espera.
Dianne foi se encostar nele, junto à janela.
Ele sentia o corpo dela tremer.
— O que foi? — quis saber a garota.
— Onde estão seus vaqueiros?
— Estão fora, nos pastos caçando as
desgarradas, por quê?
— Há mais alguém na casa?
— Não, faço tudo sozinha. Há dois
homens no alojamento, mas estão feridos.
Caíram do cavalo, quando cavalgavam.
— Ned Murdock está vindo aí com seus
homens. Pretendem roubar seu gado e ele,
pessoalmente, deseja cumprimentá-la —
ironizou ele.
— Imagino o tipo de cumprimento que
ele tem para mim.
— Quanto gado tem no pasto?
— No cercado, umas duas mil cabeças,
mas há muito mais nos pastos.
— Para Ned isso nada significa, mas para
você é bastante, não?
— Se é! — concordou ela, encostando-se
mais nele, quando o tropel de cavalos
invadiu a sede da fazenda.
— Malditos! — murmurou Burt, vendo
que os homens traziam tochas. — Vão
incendiar tudo.
— Ah, isso não — respondeu Dianne,
fazendo pontaria.
Ao seu disparo, um dos homens caiu
sobre a própria tocha, apagando-a. Os
outros abriram fogo contra a casa.
Burt a forçou abaixar a cabeça, enquanto
as balas assobiavam sobre eles.
— Gata selvagem! — berrou Ned,
chutando a porta e entrando como um
furacão.
Os homens pararam de atirar lá fora. Burt
se levantou como um felino e seu punho
atingiu em cheio o rosto do garoto, jogando-
o contra a parede.
Ao cair, ele derrubou uma moldura com
fotografia. O barulho de vidros se
quebrando fez seus homens rirem lá fora.
— Aí, Ned! Cuidado ou ela vai arrancar
seu couro!
Ned se ergueu aturdido, na escuridão. O
punho de Burt afundou-se no estômago dele
repetidas vezes, esgotando todo o ar que o
jovem tinha em seus pulmões.
Finalmente, um soco em seu maxilar o
derrubou sobre a mesa, quebrando pratos e
copos.
Os homens riram mais alto lá fora. Burt
segurou o jovem pelos colarinhos e o levou
para fora.
Quando surgiu na varanda da casa, os
homens silenciaram-se.
— Quem é você? — indagaram eles,
incapazes de definirem, na escuridão, de
quem se tratava.
Burt fez questão de ficar fora da claridade
da lua.
— Vai se arrepender disso, homem —
falou outro pistoleiro.
Em resposta, Burt sacou sua arma. Soltou
Ned, depois chutou-lhe o traseiro, jogando-
o na poeira.
Um dos pistoleiros apontou a arma na
direção de Burt. Seu movimento foi em vão.
Um disparo fez seu chapéu voar longe,
recheado com pedaços de ossos e de crânio.
Ele tombou sobre o cavalo, fulminado.
— Caiam fora daqui agora mesmo —
ordenou ele, disparando para o ar.
Dois homens desceram de seus cavalos
para ajudarem Ned a montar. O bando
partiu a galope.
— Obrigada! Fez um ótimo trabalho —
disse Dianne, agradecida.
— Tudo bem! Foi só o começo. Tenho de
voltar à cidade. Não quero que saibam que
estive aqui.
— Por quê?
— Será melhor para mim e dará a eles o
que pensar — explicou ele, indo apanhar
seu cavalo.
Antes de partir, Burt alertou Dianne:
— Acho que eles não voltarão, mas
aconselho-a a ficar alerta. Se possível,
mande buscar alguns vaqueiros para
protegê-la.
— Farei isso pessoalmente.
— E tome cuidado também com um tal
de John Waltman. Ele não é tão amigo
quanto parece.
— Eu já havia percebido isso. Insistiu
muito para que fizéssemos um acordo com
Ned Murdock. Fiquei desconfiada.
— Ótimo, então! Se precisar de mim,
estarei na pensão da viuva Moriarty.
— E quanto ao gado roubado, alguma
pista?
— Não tenho a menor dúvida de que se
encontra no rancho de Ned. Só preciso
provar, mas essa é uma outra história.
Adeus! — disse ele, esporeando seu cavalo.
Chegou à cidade despistadamente. Viu o
ajuntamento dos homens no saloon e passou
direto, indo para a pensão.
A viuva ainda estava acordada e, assim
que ele entrou, foi lhe servir café.
— Não precisava ficar acordada por
minha causa — disse ele.
— Não seja presunçoso, rapaz. Velhos,
como eu, dormem pouco e se alimentam de
conversa, sabia?
Ele riu, tomando um gole de café. A
mulher o olhava com insistência,
perturbando-o.
— O que houve, Sra. Moriarty?
— Você... Você se parece muito com o
velho Murdock, sabia?
— Fala de Jed Murdock?
— Sim, o pai daquele desmiolado.
— O que sabe sobre o velho Murdock?
— Era um homem, mas muito rigoroso
com o filho e com a esposa, não a segunda,
mas a primeira, que eu conheci muito bem.
Ele teve um filho com ela. Um ótimo
garoto, mas, após morrer a esposa, Murdock
ficou intratável. Acabou expulsando o filho
de casa.
— E o que houve com esse filho? —
indagou Burt.
— Jed dizia que o filho tinha morrido,
mas nunca soube ao certo. Depois de muito
tempo, ele se casou com uma corista de
Santa Fé. A mulher já tinha um filho, esse
que aí está e que ficou com tudo que era do
velho.
— Pelo que vi, ninguém gosta desse
rapaz.
— Era um vagabundo. Não trabalhava.
Vivia bebendo no saloon, arrumando
confusão, até a morte do pai.
— E Jed, como morreu?
— Dizem que foi morto capataz e este foi
morto por Ned. Eu cá tenho minhas
dúvidas. Conheci Jed e seu capataz. Eram
muito amigos. Duvido que tenha sido
conforme dizem.
— O que acha que aconteceu, na
verdade?
— Acho que Ned matou o padrasto e
jogou a culpa no capataz. Para ele foi a
melhor coisa que aconteceu. Tomou conta
de tudo, juntou-se com Bluf, aquele
jogador, e com o xerife. Ao que parece
pretendem se apossar de tudo por aqui.
— É, a ambição acaba cegando as
pessoas, só que, cedo ou tarde, elas acabam
enfrentando a justiça.
— Deus o ouça, meu filho! — disse a
velha senhora, benzendo-se.
Ned não se conformava com o que havia
acontecido. Fora humilhado e surrado
diante de seus homens.
— Ela vai me pagar. Eu juro como vai —
dizia ele, enquanto uma das garotas lhe
fazia um curativo no rosto.
— Os pistoleiros que ela encomendou em
Durango devem ter chegado — opinou o
xerife.
— Se foi isso, você devia fazer alguma
coisa — berrou Ned, empurrando a garota
para trás e derrubando-a.
Chutou-a e foi até o balcão apanhar outra
garrafa de uísque. Cuspiu a rolha no
assoalho e bebeu no gargalo mesmo.
A bebida fez arder ainda mais o
ferimento em sua boca. Ele gargarejou com
a bebida, depois cuspiu-a para o lado.
— Um de meus homens foi
covardemente morto, Hank. Acho que você
devia agir neste caso — sugeriu o rapaz.
Hank olhou na direção de Bluf, que fez
um gesto negativo com a cabeça.
— Não dará certo, Ned. Se ela for levada
a julgamento, os cidadãos de Cortez jamais
a condenarão. Ela sairá livre e Hank será
ridicularizado.
— Maldição! — berrou novamente o
rapaz, chutando algumas cadeiras. —
Aquele forasteiro... Burt Taylor... Alguém
vá até a casa da viúva Moriarty e veja se ele
está lá! — ordenou.
—Vai conversar com ele de novo? —
indagou Bluf.
— Não, seu idiota! Quero só confirmar se
não foi ele quem me atacou lá no rancho.
Dois pistoleiros saíram imediatamente.
Ned continuou andando de um lado para
outro, chutando cadeiras, bebendo e
cuspindo uísque com sangue.
Parou, de repente, pensativo.
— Bluf, o que foi que o forasteiro disse
sobre um filho que o velho Jed tinha?
— Acho que se referia a você quando era
pequeno, não?
— Será?
— Ei, Concho! — gritou Ned para o
Barman. — Quantos anos você tem?
— Sessenta.
— Conheceu o velho Murdock?
— Cansei de levá-lo bêbado, para o
rancho, depois de fechar o saloon.
— Ele teve outro filho?
— Acho que sim... Sim, do primeiro
casamento, mas, pelo que sei, ele morreu.
— Tem certeza?
— O velho Jed não cansava de repetir
isso.
Ned se sentou, finalmente, já mais calmo.
Continuou tomando uísque. Os dois
pistoleiros retornaram.
— E então? — indagou aos dois.
— Vimos o tal sujeito tomando café e
conversando com a velha, na cozinha da
pensão. Acho que ele não saiu de lá.
— Então foram os pistoleiros que Dianne
contratou. Maldição! Temos que fazer
alguma coisa a respeito. O que me diz,
Bluf?
— Acho que devemos sossegar, só isso.
Amanhã chegará um emissário dos
compradores de gado. Devíamos começar a
vender e a entregar o gado, fazendo
dinheiro vivo.
— Certo. Veremos isso amanhã. Eu vou
dormir, mas adoraria quebrar algumas
cabeças antes disso.
— Fique calmo, homem. Faça o que Bluf
lhe sugeriu. Fique calmo. Pegue uma das
garotas e vá para casa se divertir e
descansar.
— Ótimo idéia! — exclamou ele,
escolhendo duas garotas e saindo com elas,
seguido pelos capangas.
Bluf e Hank ficaram praticamente
sozinhos no saloon. O barman começou a
recolher copos e garrafas e a espantar os
bêbados.
— E agora, o que vamos fazer? Pelo que
sei, esse emissário poderá comprar todo o
gado que temos, se o preço for razoável.
Todo o gado, inclusive o gado do rancho. Já
imaginou o quanto isto renderá? — indagou
o xerife.
— Mais dinheiro do que já vimos em
toda a nossa vida. Mais dinheiro que jamais
teremos. Se fizéssemos esse negocio,
vendendo todo o gado, Ned ficaria sem
dinheiro para pagar o Banco. Perderia as
terras, mas o que isso nos importa?
Estaremos longe e ricos.
— Jamais teremos tranqüilidade com Ned
vivo. Para podermos gozar nosso dinheiro,
ele precisa morrer.
— Como fazer isso se ele viver cercado
daqueles capangas?
Os dois se olharam pensativamente. O
xerife parecia ter a solução para o caso.
— Concho, você se lembra do nome do
filho de Jed Murdock? — indagou-lhe
Hank.
O velho barman pensou por instantes.
— Matt... Não, não era esse. Burt... Burt
Murdock, como o avô, pai de Jed.
— Espere um pouco! — disse Bluf. —
Aquele forasteiro disse que se chamava
Burt.
— Burt Taylor, não?
— Sim.
— E se fosse Burt Murdock?
— Seria muita coincidência.
— Ele é rápido e desafiou Ned, que o tem
atravessado na garganta. Pode muito bem
ser um dos pistoleiros contratados por
Dianne.
— Está pensando o mesmo que eu?
— Acho que sim.
— Jogar um contra o outro?
— Você viu aquele sujeito. É um caçador
de recompensas. Não se intimida fácil.
Surrou três homens de Ned com a maior
facilidade.
— Um confronto entre os dois seria a
nossa solução. Se o pistoleiro matasse Ned,
nós teríamos tudo em nossa mãos.
Principalmente depois daqueles papéis em
branco que Ned assinou para mim.
Ambos riram, entusiasmados com o
plano.
— Como vamos fazê-lo se enfrentarem?
— indagou Bluf.
— Sei onde o gado roubado está
escondido. Mandarei um bilhete para o
caçador, indicando a localização. Ele
recupera o gado e incrimina Ned. Nós
tratamos de fazer a cabeça do garoto,
dizendo que a única saída será matar o
forasteiro.
— Certo! Vai ser assim mesmo. Vamos
rabiscar esse bilhete.
Apanharam papel e lápis. Hank indicou a
localização do gado roubado.
— Como fará para que ele receba o
bilhete? — quis saber Bluf. — Se ele ainda
estiver tomando café com a viuva, vou jogá-
lo embrulhado numa pedra.
— Excelente idéia!
Apesar do cansaço de todo aquele dia,
Burt havia se divertido muito com a estória
da viuva.
Algo, porém, não saía da cabeça da
velhinha.
— Agora, cá entre nós, Burt: você é o
filho desaparecido de Jed Murdock, não é?
Ele ficou sério, olhando-a nos olhos.
— Só cá entre nós: sou.
— Eu sabia! Não podia estar enganada.
Que bom que esteja vivo, filho! Fico
contente! Eu o conheci garotinho, senti uma
pena enorme quando seu pai o expulsou.
— Só que isso não pode ser divulgado,
Sra. Moriarty. É muito importante e pode
me custar a vida.
— Não se preocupe. Não direi a
ninguém. E você, o que pretende fazer?
Acho que o legítimo dono do rancho é você.
— Na hora certa verei o que posso fazer
— disse ele.
Naquele momento, uma pedra quebrou a
vidraça, jogando estilhaço de vidro pela
cozinha toda.
Burt apagou o lampião e, num salto,
estava na porta. Abriu-a e saiu. a lua cheia
iluminava generosamente os arredores, mas
ele não viu nenhum movimento.
— Está bem, Sra. Moriarty? — indagou
ele, retornando para dentro da casa.
— Sim, o que houve?
— Não sei. Pensei que fosse um tiro, mas
não houve estampido. Acho que jogaram
uma pedra na vidraça.
— Por que, diabos, fariam isso? —
indagou ela, acendendo o lampião.
— Cuidado! — alertou ele, levando-a
para um canto protegido, longe da janela.
Só então ele viu a pedra e o bilhete que
acompanhava. Apanhou-o.
— Se quer achar o gado roubado, vá ao
Desfiladeiro Mesa Verde — leu ele.
— Mesa Verde! Fica nas terras de
Murdock — falou a Sra. Moriarty.
— Sim, sei onde é. Um ótimo esconderijo
— comentou ele, lembrando-se do local.
— Quem teria mandado isso?
— Alguém que quer que eu vá até lá.
Pode ser uma armadilha, mas pode ser uma
pista também — opinou ele.
— E você?
— Irei lá ao amanhecer. Pode me acordar
bem cedo amanhã?
— Claro. Nós velhos acordamos com as
galinhas. Pode deixar que eu o acordarei
com o melhor café da manhã que já provou
nesta parte do Oeste, filho — garantiu ela.
No dia seguinte, antes do nascer do sol,
Burt se pôs a caminho.
Só que, ao invés de ir direto para o
Desfiladeiro Mesa Verde, preferiu seguir
um caminho que ele conhecia, de sua
infância ainda.
Se tudo estivesse no lugar, poderia se
aproximar de lá sem correr risco.
Quem quer que tivesse mandado aquele
bilhete não falava de vigias protegendo o
gado.
Isso não garantia que eles não estariam
lá, esperando por algum incauto.
Suas previsões se confirmaram. Chegou
ao Desfiladeiro por um caminho pouco
usado.
Pôde observar bem o local. Havia uma
quantidade muito grande de cabeças de
gado ali, algumas com marcas, mas a
maioria sem marcas.
Um vigia, no ponto mais alto, controlava
os movimentos lá embaixo.
Um grupo de vaqueiros se levantava e se
preparava para continuar marcando o gado.
Nada havia ali a ser feito. O Desfiladeiro
tinha algumas passagens que seriam difíceis
de serem bloqueadas.
De qualquer forma, o gado não seria
tirado dali. Pela movimentação lá embaixo,
todos estavam mais preocupados em
terminar o trabalho começado.
Retornou à cidade, pensando no que
poderia ser feito. Comunicar o xerife seria
perda de tempo.
A melhor coisa, e talvez a única, fosse
informar a Associação dos Criadores,
através de Dianne.
Já teria, com isso, realizado metade de
sua missão. Faltaria apenas apanhar os
membros da quadrilha.
— E então? — indagou a viuva, quando
ele retornou.
A velhinha estava ansiosa por noticias.
— O gado estava lá, conforme dizia o
bilhete.
— E o que você fez?
— Nada. Eles estavam marcando o gado
e não havia com o que se preocupar. Não
vão a parte alguma.
— Só que, enquanto você estava fora,
ouvi alguns comentários.
— O que ouviu.
— Como lhe disse, velhos se alimentam
de conversa. Anabel, a esposa de Concho, o
barman, disse que o marido ouviu umas
conversas ontem à noite. Segundo ela, um
homem está vindo para cá para comprar
gado, o gado de Ned Murdock.
— Interessante! Por isso se apressavam
em marcar o gado e em trocar as marcas
originais.
— Ao que parece, vai ser um negócio e
tanto.
— Só que um emissário não viria apenas
para comprar aquele gado roubado. Há
bastante, mas nada que justifique um
negócio assim — estranhou Burt.
— Você não entendeu — disse ela. —
Ele vem comprar todo o gado de Ned
Murdock: o legal e o roubado.
— Todo? Por quê?
— Acho que aí tem coisa dos sócios do
Ned: Bluf e o xerife. Se meus ossos não me
falham, eles pretendem passar o pirralho
arrogante para trás.
Burt sorriu, admirando aquela mulher. Os
sócios de Ned poderiam mesmo estar
preparando alguma para ele.
— Mas... E o bilhete? Quem o teria
mandado? — indagou-se ele, sem imaginar
a resposta.
Uma coisa Bluf acertara a respeito de
Ned: o rapaz era mesmo esperto.
Desde o principio, ele se mantivera com
um pé atrás em relação aos seus sócios.
A matemática era simples: Ned entrava
com o gado, com os pistoleiros, com o
roubo, com as terras e Bluf com nada.
Hank ainda dava uma pequena
contribuição, fornecendo a proteção
necessária da lei. mas era só.
Nenhum de seus dois sócios contribuía
com uma cota que lhes permitisse morder
um terço de todo o lucro.
Bluf nunca fora de confiança. Em
diversos oportunidades havia recusado um
mísero gole a Ned e isso o rapaz não
esquecia.
Somente quando viu o potencial que ele
representava, foi que Bluf se tornou seu
amigo.
Ned pensara em tudo isso e resolvera não
facilitar. Mantinha seus sócios sob
vigilância discreta, sem que eles soubessem
disso.
Por isso, naquela manhã, quando se
levantou e foi procurar uma xícara de café
para tirar o gosto de ressaca da boca, viu
Archie, o homem que fora destacado, na
noite anterior, para vigiar Bluf e Hank.
A simples presença dele no rancho há
indicava que o capanga tinha noticias
importantes.
— O que houve, Archie? — indagou,
após se servir.
— Aconteceu algo estranho ontem,
patrão — começou o capanga. — Fiquei em
frente do saloon, observando os dois. Hank
escreveu algo num papel, depois saiu.
— Papel? Como assim?
— Era um bilhete, com toda certeza.
— Hank escreveu um bilhete? E para
quem?
— Para aquele forasteiro. Ele e Bluf
estavam no saloon. Hank escreveu, depois
saiu. Embrulhou uma pedra com o bilhete e
foi até a casa da viuva Moriarty. Ela e o
forasteiro conversavam na cozinha. Hank
jogou a pedra com o bilhete na vidraça,
depois se afastou.
— E o que aconteceu em seguida?
— Hank retornou ao saloon. Bebeu mais
alguns goles com Bluf e foram ambos
dormir.
— Só isso? E esse bilhete? — indagou
Ned, confuso.
— Bom, patrão! Eu devia vigiar Bluf e
Hank, mas aquela história do bilhete me
deixou intrigado. Resolvi vigiar a casa da
viuva. De manhãzinha, o forasteiro saiu a
cavalo. Foi direto para o Desfiladeiro Mesa
Verde...
— Mesa Verde? Maldição! Então ele viu
o gado.
— Sim, e os rapazes marcado.
— E como o vigia não o percebeu?
— Ele usou um outro caminho, que nem
eu conhecia. Saiu por trás da entrada que
usamos. É uma trilha antiga...
— Que trilha? Nunca soube de outra
trilha para o Desfiladeiro Mesa Verde...
— Pois ele parecia conhecer muito bem o
caminho, patrão.
Ned ficou pensativo, ligando as coisas e
não ficando nada satisfeito com as
conclusões.
— E o que ele fez em seguida?
— Retornou à cidade, direto para a
pensão.
— Diabos! O que temos aqui, afinal? —
indagou Ned, tomando todo o café,
procurando clarear os pensamentos. —
Archie, volte à cidade e vigie o forasteiro.
Mande outro cuidar de Bluf e de Hank.
O capanga se apressou em cumprir a
ordem. Ned ficou pensando, enquanto
tomava mais café.
Não conseguia entender aquilo. Se Hank
havia mandado o bilhete, informando a
localização do rebanho roubado, por que o
fizera? Tinha tanto a perder quanto Ned.
Ou não? Se Ned fosse preso, quem
cuidaria de todo o plano? começou a
perceber que seus sócios preparavam uma
armadilha. A intenção era ficar com tudo
para eles. Não havia outra explicação.
E o forasteiro? Quem seria ele na
verdade? Como conhecia uma trilha que
nem ele, Ned, sabia que existia?
Lembrou-se da conversa da noite anterior
com o barman. Jed tivera um filho. Um
filho que estaria morto. Mas seria isso
verdade?
— Adelita, quem é a pessoa mais velha
aqui do rancho? — indagou ele à cozinha,
que servia a mesa para o café da manhã.
— Minha avó, patron!
— Como ela está?
— Muy bien, señor.
— Tem boa memória?
— Oh, sim, muito boa. Lembra-se de
tudo que já passou na vida.
— Onde ela está?
— Na cabana onde moramos, atrás do
alojamento dos vaqueiros. Por quê, señor?
— Acho que vou lhe fazer uma visitinha
— decidiu ele. — Só que antes tenho umas
providências a tomar — acrescentou ele,
pensando exatamente no que tinha a fazer.
Bluf e Hank se reuniram com o emissário
dos compradores de gado, nos fundos do
saloon.
Não queriam que Ned participasse da
reunião, até que tivessem acertado tudo com
o comprador.
— Estamos falando de um negócio de
mais de cem mil cabeças de gado,
cavalheiros. Hão de convir que é muito
dinheiro — disse o comprador.
— Exatamente, por isso nós o
procuramos. Sabemos que conseguirá fazer
essa venda, distribuindo-a aos compradores
e donos de ranchos de quatro Estados.
— Além disso, lucrará muito mais do que
todos os seus negócios em um ano —
acrescentou Hank, com razão.
O homem pensou a respeito. Era,
realmente, um excelente negocio. Só que
havia alguns riscos. Isto, ao invés de ser um
entrave, poderia lhe ser favorável. Bastava
saber negociar. Principalmente
considerando que aqueles dois estavam
tentando trapacear o sócio principal e dono
do gado.
— Bom, em um negócio desse tamanho,
vai ser difícil examinar todo o gado e contá-
lo. Terei de aceitar a palavra de vocês,
principalmente porque ele será retirado em
pequenas boiadas pelos compradores finais.
Só que isso é algo a ser considerado no
preço da manada.
— Oh, é claro. Nós entendemos — falou
Bluf. E quanto poderá nos pagar por cabeça.
O comprador havia feito as contas.
Poderia vender facilmente cada cabeça de
gado a cinco dólares.
— Vejam bem, há bezerros, bois, touros,
vacas, aleijados, doentes, tudo junto... —
argumentou.
— Quanto? — insistiu Bluf.
— Um dólar e meio por cabeça.
Bluf e Hank se olharam, fazendo as
contas. Isso seria perto de cento e cinqüenta
mil dólares.
Era mais dinheiro que todo o dinheiro
existente em Cortez. Dividido meio a meio,
seriam setenta e cinco mil para um. O
suficiente para irem morar na Europa, se
fosse o caso.
— E como será o pagamento?
— Depois que assinarmos o contrato, eu
irei pagando à medida que o gado for sendo
retirado.
— Não pode pagar tudo à vista?
— Cento e cinqüenta mil? Nem existe
tanto dinheiro assim em todo o Território —
disse o comprador.
— Ordem bancária... Aceitamos ordem
bancária — falou Bluf, ansioso.
Queriam pôr a mão no dinheiro e dar o
fora dali o mais depressa possível, deixando
para o Banco o trabalho de acertar o
prejuízo.
— Posso tentar, mas nesse caso teria de
reduzir um pouco o preço... Um dólar e
vinte por cabeça!
— Fechado! — falou Bluf.
— Sim, fechado! — concordou Hank.
— Quando vamos pôr a mão no dinheiro?
— insistiu Bluf.
— Assim que o Sr. Murdock assinar o
contrato de compra.
— Acha que pode resolver tudo com
isto? — indagou Bluf entregando um papel
assinado em branco por Ned Murdock.
— Para mim é satisfatório, senhores. Em
três dias terão o dinheiro em seus nomes no
banco.
— Três dias? É muito tempo! —
reclamou Bluf.
— Sim, tempo demais — concordou
Hank.
Os três homens saltaram de suas cadeiras,
quando a porta foi arrebentada e a sala
invadida.
Ned Murdock entrou, encarando seus
sócios.
— Não quiseram me esperar para
negociar? — indagou.
— Você não está entendo, Ned.
Acabamos de chegar e só estávamos... — ia
dizendo Bluf.
— E isto? O que é? — quis ele saber,
apanhando o papel assinado em branco
sobre a mesa.
Continha a custo sua ira. Pusera homens
vigiando a estrada. Eles o avisaram da
chegada do emissário e da reunião com os
dois sócios.
Sabia que os dois tentariam enganá-los.
Não restava a menor dúvida. Resolveu
acertar tudo de uma vez por todas.
— É um papel... Você assinou, lembra-
se? Eu lhe pedi... Para os negócios... —
gaguejou Bluf.
— Devo concluir que você é o
intermediário na compra do gado, não? —
indagou ao viajante.
— Sim, vim atender o chamado de
vocês...
— E quanto está pagando por cabeça?
— Bem.. Ainda não fechamos negócios
e...
— Então por que um papel em branco?
Quanto? — exigiu Ned, segurando o outro
pelos colarinhos.
— Um dólar e vinte — disse o
comprador, num fio de voz.
— Um dólar e vinte? Por cabeça que vale
no mínimo cinco dólares? Vocês estão
loucos! — afirmou, rasgando o papel, mas
segurando os pedaços em sua mão.
Bluf e Hank estavam lívidos,
principalmente porque os capangas de Ned
os havia cercado.
— Se quer fazer negócio, senhor, espere-
me lá na frente. Mas aviso que não acertarei
oferta menor que quatro e oitenta por
cabeça, o que lhe dará um bom lucro, se for
esperto. Vá — ordenou ele.
O homem apressou-se em deixar a sala.
Ned sentou-se diante dos seus sócios. Pôs
os pedaços de papel rasgado sobre a mesa.
— O que dizia o bilhete, Hank? —
perguntou, de chofre.
— Bilhete? Que bilhete? — estremeceu
Hank.
— O que mandou para aquele forasteiro.
— Ned! Eu não fiz nada disso... — ia
dizendo o xerife, mas calou-se quando o
rapaz sacou sua faca e encostou a ponta
afiada na garganta dele.
— Não minta para mim. Sinceramente,
não entendi sua jogada. Se o forasteiro
achasse o gado, nós perderíamos a manada
roubada. Não entendo...
— Foi idéia dele, Ned — entregou Bluf,
percebendo que a situação dos dois
começava a ficar preocupante.
Tratou de salvar o próprio pêlo.
— Bluf, seu traidor miserável!
— Foi sua idéia, não negue — falou Bluf.
— Ele queria que você ficasse zangado com
o forasteiro e o fosse procurar. Acreditava
que, numa luta, você seria morto...
— E vocês ficariam com tudo... Sim...
Muito bom! Nem eu mesmo teria pensado
nisso. Por isso vieram fazer negócio direto
com o emissário dos compradores,
entregando o gado por ninharia. Miseráveis!
Eu sabia que vocês me trairiam — afirmou
ele.
— Não, Ned, você está enganado. Eu
jamais... — ia dizendo Hank, mas calou-se
quando a faca se moveu rapidamente junto a
sua garganta.
Ele nada sentiu. Apenas uma onda de
calor em sua pele, como se um palito de
fósforo fosse riscado nela.
Depois, algo quente desceu-lhe pelo
peito. Ned o olhava nos olhos, com a faca
na mão.
— O que fez? — indagou Hank,
perplexo.
— O que deveria ter feito há muito
tempo.
— Mas... O quê? — insistiu o xerife,
abobalhado, olhando o sangue que escorria
de seu pescoço e empapava sua camisa.
Levou a mão à garganta. O movimento
da faca do garoto havia cortado
superficialmente a pele e as veias também,
provocando uma hemorragia.
Bluf estava branco, imóvel, chocado,
olhando Hank tentar deter o sangue,
apertando os dentes sobre as veias que
esguichavam o liquido vital.
O homem da lei tossiu e cuspiu sangue
sobre a toalha da mesa.
— Até para morrer você é ruim, Hank —
falou Ned, enfiando a faca no peito dele, até
o cabo.
Torceu-a de um lado para outro, depois
ergueu o xerife, segurando a faca com as
duas mão.
Jogou-o para trás. Hank caiu, banhado de
sangue. Bluf olhou para o meio de suas
pernas. Havia urinado nas calças.
Ned começou a rir. Bluf, a principio,
ficou olhando para ele como um idiota.
Depois começou a rir também.
— Bluf! Amigão! — falou Ned,
abraçando-o e fazendo-o se levantar.
— Ned... Eu juro... Foi tudo idéia dele...
— Claro, Bluf. Você é burro demais para
pensar num plano desses... Não o culpo.
— Vai me perdoar?
— E por que não?
— Sério?
— Sim, estou falando a verdade. Eu o
perdôo, meu amigo — afirmou Ned,
enfiando a faca no estômago do jogador e
rasgando-lhe as tripas.
— Ned! — gemeu ele, caindo de joelhos.
O rapaz o olhou sem piedade.
— Você disse que...
— Que o perdoaria?
— Sim...
— E o perdôo, seu idiota. Só não lhe
disse que não o mataria, não foi? —
finalizou ele, pondo o pé no peito dele e
empurrando-o para trás.
Bluf estrebuchou no assoalho banhado de
sangue.
Burt havia decidido informar Dianne e a
Associação dos criadores a respeito da
localização do gado roubado.
Além disso, tentaria obstruir o negócio
entre Ned e o emissário dos compradores de
gado.
— Burt, tem um homem aí fora querendo
falar com você — veio avisar a senhora
Moriarty.
— Quem é?
— Pela aparência, deve ser um dos
pistoleiros de Ned Murdock.
— Está bem, Sra. Moriarty — agradeceu
ele, indo até a varanda da casa.
O pistoleiro no cavalo o olhou, medindo-
o dos pés à cabeça.
— Meu patrão quer falar com você.
— Onde ele está?
— No saloon.
— Sabe o assunto?
— Ele mandou dizer que quer falar sobre
Jed Murdock e o Desfiladeiro Mesa Verde.
— Certo! Estarei lá em quinze minutos
— disse Burt, pensativo.
Ao mencionar aqueles assuntos, Ned
dava a entender que havia descoberto a
verdadeira identidade de Burt.
Isso não o preocupava, no entanto. Ir ao
saloon, após saber que Ned o descobrira, era
cometer suicídio.
Na certa Ned o esperaria com todos os
seus capangas. Burt, pelo contrário, não
teria em quem confiar.
— Você vai, Burt? — indagou a Sra.
Moriarty, que havia ouvido a conversa da
janela.
— Sim, tenho que ir.
— Ele vai matá-lo, sabia?
Burt continuava pensando.
— Lavou aquela minha capa, Sra.
Moriarty?
— A de viagem?
— Sim.
— Está limpa e passada. Não me diga
que pretende fugir?
— Não, pretendo brincar um pouco —
respondeu ele, entrando. Dez minutos mais
tarde ele saía, com um rifle na mão, o
cinturão com dois coldres e a capa cobrindo
o corpo.
A brisa quente agitava as abas da roupa,
fazendo-a dançar, projetando uma sombra
grotesca na poeira da rua.
A cidade parecia já saber do confronto.
Todos acompanhavam Burt com o olhar.
Ele subiu a rua, até o saloon. Entrou,
fazendo tinir suas esporas mexicanas no
assoalho.
Ned sorriu ironicamente ao vê-lo. Burt
foi até o balcão.
— Tequila e cerveja! — pediu ele,
jogando uma moeda sobre o balcão.
Quando o barman o serviu, ele bebeu a
tequila e uma gole de cerveja, depois se
voltou para Ned, que ocupava uma mesa ao
fundo do salão.
— Queria me ver?
— Sim, acho que precisamos acertar
alguns detalhes.
— Como o quê, por exemplo?
— Aquele homem é emissário de
compradores de gado. Quer fazer negócio
com o Rancho Murdock. Com quem ele
deve falar?
— Com o proprietário! — respondeu
Burt, os olhos cinzentos percorrendo o
saloon.
Havia pelo menos uma dúzia de
pistoleiros espalhados por ali.
— O verdadeiro proprietário está morto
— disse Ned, que exibia, no peito, a estrela
de xerife lambuzada de sangue. — Morreu
com uma facada — continuou, sacando sua
Bowie e espetando-a na mesa. — Com uma
faca igual a esta.
— Igual a essa ou com essa? — corrigiu
Burt.
— Você é esperto — riu Ned, reclinando-
se em sua cadeira. — E tem um punho
pesado — completou, acariciando o queixo
ainda marcado pelo golpe que recebera de
Burt, na visita ao Rancho Granger.
— Você quem o diz.
— Estive no Escritório de Registros...
Sabia que Jed tinha um filho? Acho que o
conheceu quando passou por aqui, não
conheceu?
— Por que não poupa meu tempo e me
diz logo o que quer de mim? — pediu Burt,
percebendo que o barman sumira e que as
pessoas que não eram capangas de Ned
haviam se retirado.
— É simples! Quero matá-lo. Mas antes
quero saber o que meu irmão veio fazer
aqui, sem se revelar, sem se apresentar,
tratando-me como se eu fosse um bastardo...
— E você é. Não o considero meu irmão.
Ned ficou lívido e estremeceu de ódio.
Não tolerava ser chamado de bastardo.
Avançou na direção de Burt, brandindo
sua faca. Burt ficou na defensiva.
— Maldito filho de Jed Murdock! —
berrou Ned, jogando o braço para frente, a
faca rebrilhando.
Burt foi ágil e antecipou a manobra,
desviando o corpo para o lado, golpeando o
rosto de seu agressor.
Ned gemeu e rolou no assoalho, sem
soltar a faca. Girou o corpo como um gato,
levantando-se.
Um de seus pistoleiros sacou a arma.
Burt o abateu, metendo-lhe um balaço no
meio dos olhos.
— Parem... Ninguém se meta! Ele é meu!
Quem tentar acertá-lo vai se haver comigo
— ordenou Ned, sentindo o rosto em fogo
após o golpe recebido.
Ele girou ao redor de Burt, passando a
faca de uma para a outra mão, tentando
confundir o caçador de recompensa.
— Esse brinquedo machuca a mão de
criança — zombou Burt, irritando-o ainda
mais.
Ned ameaçou com a esquerda, mas
passou a faca para a mão direita e
empurrou-a na direção do estômago de
Burt.
— Morra, maldito! — gritou.
— Você fala demais — respondeu o
outro, segurando o pulso do rapaz e
torcendo-o.
Ned esperneou, mas a faca foi apontada
para sua garganta, aproximando-se até tocar
a pele.
Burt o enlaçou com o outro braço,
imobilizando-o.
— Quem é você, afinal? — indagou o
garoto, sem fôlego, com a faca espetando
sua goela.
— Sou quem você disse que sou.
— Não vai sair vivo daqui.
— Você não está em posição de decidir
isso — afirmou Burt, forçando a ponta da
faca contra a pele dele.
Um filete de sangue escorreu pelo
pescoço do rapaz, que se debateu.
— Vamos começar a acertar as coisas —
falou o caçador. — Mande seus homens
soltarem os cinturões.
— Jamais. Você está morto, não importa
o que faça comigo.
— O que vou fazer com você é simples
— afirmou Burt, empurrando a faca,
abrindo um pequeno corte na garganta dele.
O sangue deslizou mais forte, manchando
a camisa do rapaz.
— Soltem as armas, rapazes — ordenou
ele.
Os pistoleiros hesitaram. Burt aprofundou
a faca na pele de seu prisioneiro, que gemeu
e amaldiçoou cada um de seus pistoleiros.
— Mato quem não me obedecer —
berrou ele.
Os cinturões caíram no assoalho. Burt
empurrou Ned, tomando-lhe a faca e
golpeando-o nos rins.
Ned cambaleou e caiu de joelhos. Burt
apanhou seu rifle e o engatilhou.
— Caíam fora agora! — ordenou aos
pistoleiros.
— Olhe... Olhe na escada... — falou Ned,
gemendo de dor, levantando-se com
dificuldade.
Burt desviou os olhos para ver. Dianne
estava com as mãos amarradas diante do
corpo e uma tira de pano na boca.
Seu olhar refletia terror. Um pistoleiro
apontava uma arma para a cabeça dela.
— Devolva a minha faca — ordenou
Ned, possesso, mas de olho no rifle
engatilhado nas mãos de Burt.
— Pegue sua faca — respondeu o
caçador, atirando-a para o alto, cravando-a
no forro do saloon.
— Filho da mãe! Era uma boa faca! —
disse Ned, indo até a escada. — Venha,
minha querida! — acrescentou, fazendo um
gesto obsceno para Dianne.
Burt ficou imóvel, de olho no pistoleiro
que apontava a arma para Dianne.
Só precisava de um vacilo, de um
momento de distração para agir, mas a cada
segundo as coisas se complicavam.
Dianne chegou até Ned, que arrancou sua
mordaça e a beijou na boca.
A garota se debateu e cuspiu, enojada,
depois que ele a soltou.
— Esta é uma pequena amostra do que
reservo para ela, quando terminar com você
— sentenciou Ned. — Agora solte suas
armas para eu poder acertar minhas contas.
Ao invés de atendê-lo, Burt desabotoou
sua capa longa de viagem.
Ao redor do peito, presas com o fio de
crochê da Senhora Moriarty, havia dezenas
de bananas de dinamite.
Um silencio mortal pairou no saloon.
— Quem vai se arriscar? — indagou
Burt.
Os pistoleiros se entreolhara,.
— Ele é louco! — disse um.
O homem que apontava a arma para a
cabeça de Dianne desviou o cano para o
lado, ao olhar para seus amigos.
Era o que Burt esperava. ele ergueu o
rifle com a rapidez do raio e apertou o
gatilho.
O pistoleiro foi jogado para trás. Dianne,
livre da ameaça correu se esconder atrás de
uma das mesas.
Os outros homens ergueram as armas,
mas pensaram duas vezes antes de disparar.
Se uma bala atingisse a dinamite, todos
morreriam. Até o próprio Ned, que tinha
tudo a perder com aquilo, hesitou.
— Sou Burt Murdock, o verdadeiro dono
do Rancho Murdock. quem quiser trabalhar
para mim vá me esperar lá fora. Quem
quiser morrer comigo, fique aqui dentro —
disse ele.
Os pistoleiros não precisaram pensar
muito. A decisão era óbvia. Todos correram
para fora. Ned ficou sozinho diante de seu
meio-irmão.
Tudo parecia mesmo perdido. Só que não
daria a Burt a chance de levar tudo sem
resistência.
— Muito bem, acho que você venceu —
falou Ned, indo até o balcão.
Apanhou uma garrafa de uísque, como se
fosse servir uma dose. Burt abaixou o rifle.
O erro lhe custou uma pancada violenta
na cabeça. O vidro quebrado cortou-lhe o
couro cabeludo, fazendo o sangue descer
pelo seu rosto.
Ned alcançou a dinamite presa no corpo
de Burt, puxando-a com força, arrebentando
os fios.
Jogou longe o macabro colar, rindo
sadicamente ao ver o sangue que cobria o
rosto de seu oponente.
Atacou-o, atingindo-o o estômago
repetidas vezes, fazendo-o recuar.
Endereçou um direito no queixo dele, para
finalizar a seqüência de golpes, mas Burt o
aparou e enfiou o joelho no estômago dele.
Ned gemeu, sentindo todo o ar ser
expelido de seu pulmão. O punho de Burt se
abateu sobre a nuca dele, fazendo-o desabar
de cara no assoalho.
Burt respirou fundo, recuperando o
fôlego. Ned ficou de quatro, tentando se
erguer.
Burt chutou-lhe o estômago, o baço e
depois os rins, fazendo-o urrar de dor.
— Não se levante ou eu o mato de tanta
pancada — ordenou Burt.
Nesse momento, a janela do saloon foi
quebrada e uma espingarda surgiu,
apontando na sua direção.
Numa fração de segundos ele reconheceu
John Waltman, o homem que tinha muito a
perder se Ned fosse neutralizado.
O caçador de recompensa deitou-se
rapidamente e a carga dupla passou sobre
seu corpo, arrebentando garrafas nas
prateleiras do bar.
Ao se deitar Burt já tinha na mão seu
Colt. Disparou duas vezes, jogando vidro e
morte na cara de Waltman, que foi
estrebuchar na rua.
Ned, quase sem forças, aproveitando-se
da distração de Burt para tentar fugir.
A caçador foi no seu encalço, saltando
sobre ele na porta do saloon. Os dois
rolaram pela calçada e foram cair na poeira
da rua. Ned tentou se erguer. Burt o acertou
com um pontapé, quebrando-lhe o nariz.
Ofegante, Ned ficou de joelhos na poeira,
vendo o sangue gotejar de seu nariz e de seu
rosto.
— Prazer em conhecê-lo, irmão — disse
e tentou sacar a sua arma.
Burt foi mais rápido, disparando
certeiramente apenas uma vez e acertando o
peito de Ned, que caiu para trás.
Seu corpo se contorceu, agonizando. Burt
se aproximou, olhando os olhos esgazeados
do pequeno assassino.
— O prazer foi todo meu, irmão — disse,
enquanto Ned vomitava sangue e exalava
seu último suspiro.
— Já é tarde — murmurou Dianne,
terminando de soltar o nó que prendia sua
mão.
— Era um louco — comentou Burt.
— E você me enganou direitinho. Todo o
tempo era o filho de Jed Murdock.
— Sim, sou Burt Murdock, filho de Jed
Murdock, um velho cabeça-dura intragável,
mas trabalhador.
— O que vaio fazer agora?
— Sei onde está o gado roubado e
capturei os chefes da quadrilha. vocês não
terão mais problemas com eles. Só me resta
fazermos a conta, agora, para vocês me
pagarem.
— Isto será um prazer. E quanto ao
Rancho Murdock? Ele é seu.
Burt olhou nos olhos dela, tentando
encontrar neles a solução.
— Não conseguirei fazer isso sozinho —
disse ele.
— Por que não pede a minha ajuda?
Ele sorriu. Seus dias de caçador de
recompensa haviam terminado.
Justiça pelas Armas
O Oeste tinha um juiz onipresente e
sempre eficiente, apesar de muitas vezes ser
muito parcial. Esse juiz era o Colt e sua
mais preciosa ajudante foi a Winchester.
Muitas questões aparentemente
insolúveis foram facilmente resolvidas por
eles, que espalharam, durante aqueles
tempos turbulentos, cruzes por toda a
fronteira.
Onde a justiça dos homens falhava, a
justiça das armas prevalecia.
Em uma cidadezinha, em algum ponto do
Arizona, os homens começavam a se reunir
no saloon de Helen Fulton, no comecinho
da tarde. Naquele dia, em especial, falava-se
muito na morte de Gregory Merryl, mas
nunca abertamente.
Quem fosse esperto, fazia seus
comentários em voz baixa e apenas no
ouvido dos amigos.
— Já não foi tarde — falou um vaqueiro,
com mais uísque que juízo na cabeça.
— Cuidado com o que diz, meu velho —
advertiu-o um de seus amigos. — Se os
filhos dele souberem que disse isso, você
terá uma estadia garantida na Colina dos
Pés Juntos.
— Ele tem razão — ajuntou outro.
— Eles falam a verdade — falou um
outro ainda. — Numa situação dessas, eu
detestaria estar em sua pele.
O vaqueiro pareceu não se importar
muito com os conselhos recebidos.
— Mas cá para nós, se alguém está
preocupado com a morte daquele velho
safado, esse alguém é Scott Nelson. Oscar e
Bob Merryl vão cair sobre ele como abutres
famintos.
— Quem o mandou se meter com o
velho? Podia ter feito como todos os outros,
mais ajuizados, vendido seu rancho e dando
o fora. Poderia comprar novas terras na
Califórnia e ficar rico e sossegado. Ao invés
disso, preferiu ficar e arranjar encrenca. E
logo com quem!
— Pensando bem, eu acho que dou razão
ao Scott. Quem tornou os Merryl tão
poderosos assim? Quem lhes deu o direito
de se acharam donos de tudo? Eles não têm
o direito de querer todas as terras só para
eles. Além disso, os preços que pagam são
uma infâmia.
— É, mas não é isso que me preocupe —
comentou um, que estivera calado até então.
— O quê? — perguntaram-lhe.
— Enquanto o velho era vivo, ainda
havia algum freio nas coisas. Com a sua
morte, os filhos vão agir livremente e nós
conhecemos aqueles dois, sabemos como
agem.
— Sem contar com aquele bando de
pistoleiros que os cercam. Se quiserem,
podem dominar esta cidade. Não há mesmo
lei por aqui. Nem juiz nós temos.
— Mas temos um xerife...
— Que segundo consta, já fez seus
acertos com os dois filhos do velho.
— Eu não duvido disso. Esse xerife não é
de confiança.
— Ouvi dizer que roubou gado, quando
foi xerife em Abilene...
— No fundo é um rato covarde, assim
como os dois irmãos — falou Helen, que
ouvia a conversa do outro lado do balcão.
Seu tom de voz foi alto o bastante para
que as pessoas por perto ouvissem. Um dos
vaqueiros do Rancho Merryl estava por ali,
apenas ouvindo. Não reagiu, porque estava
sozinho. Ficou apenas disfarçando e
ouvindo as conversas.
— Você é louca de falar assim
abertamente, Helen — disse o barman.
— Ele tem razão, Helen — ajudou um
vaqueiro.
— Pois eu digo e repito, rapazes. E tudo
como eu disse — continuou ela,
demonstrando coragem. — As coisas vão
ficar piores agora. Ninguém vai deter
aqueles bastardos. Eles e seus pistoleiros
sempre entraram aqui, beberam e farrearam
à vontade, sem pagar a conta. Quando eu os
cobrava, ameaçavam quebrar todo o meu
saloon. Se não fizeram isso por respeito ao
velho, nada vai detê-los agora, a não ser
meu amigo juiz...
— Que juiz, Helen? — indagou o
barman.
— Este — falou ela, mostrando o Colt
que trazia no bolso do vestido.
— Modere a língua, Helen — aconselhou
um dos vaqueiros. — Os Merryl têm olhos e
ouvidos por toda parte e não vão gostar
disso.
— Eles que se danem. É a verdade. Falo
o que penso e o farei enquanto viver. Não
tenho medo deles e nem dos covardes que
trabalham para eles — continuou ela,
olhando provocadoramente para os homens
no saloon. — Inclusive para você, seu rato
— acrescentou ela, ao reconhecer o
vaqueiro do Rancho Merryl.
— Dobre a língua, moça! Não sou
covarde nem rato.
— Olhe só quem está falando! —
zombou ela, rindo.
— Ouça meu aviso, moça. Em boca
aberta não entra só mosquito... Entra
chumbo também.
— Muito valente, ameaçando mulheres,
seu covarde! Não passa de um safado,
acostumado a beber sem pagar. Pois fique
sabendo que, de agora em diante, ou eu vejo
a cor do seu dinheiro ou você fica de boca
seca. E esta lei vai servir para todos os seus
amigos e patrões.
— Pois eu quero vê-la dizer isso na
presença deles — falou o vaqueiro. —
Aposto que de leoa que aparenta ser vai se
transformar numa franguinha assustada,
com medo de ser depenada.
— Falo na presença deles ou de qualquer
outro que queira ouvir minhas opiniões.
O rapaz aproximou-se ameaçadoramente
do balcão, encarando-a.
— Eu, particularmente, adoraria arrancar
suas penas e ver que espécie de galinha há
por baixo delas — disse ele, olhando-a
zombeteiramente.
Helen não era mulher de guardar
desaforos. Nunca fora. O vaqueiro não a
conhecia o suficiente para estar preparado
para sua inesperada reação.
— Tente! — disse ela, enquanto
apanhava um litro cheio de uísque e
vibrava-o certeiramente, com todas as suas
forças, na testa do vaqueiro.
O sangue banhou o rosto dele, misturado
ao uísque e aos cacos de vidro. Ele recuou,
chocado e aturdido. Helen saltou agilmente
sobre o balcão, apanhou o chicote de um
condutor que estava ali e, quando o
vaqueiro tentou sacar a arma, ela o
chicoteou no braço, cortando sua camisa e a
pele também.
— Sua maldita! — rugiu ele, avançando
contra ela, mas Helen reagiu furiosamente.
Chicotadas certeiras fizeram o vaqueiro
dançar no assoalho, tentando proteger o
rosto com os braços, enquanto as chicotadas
iam se repetindo sobre seu corpo.
— Pare... Pare... Pare, pelo amor de
Deus! — gritou ele, caindo de bruços, com
as mãos sobre a cabeça.
— Pare, Helen! É o suficiente — alertou
o barman, deixando seu posto para ir
acalmá-la.
Ela respirou fundo e atirou o chicote para
o lado.
— Agora dê o fora daqui — ordenou ela,
após ter tomado a arma do homem. — E dê
graças a Deus por eu não mandar pendurá-
lo de pernas para o ar diante do saloon para
todos verem o covarde que é.
— Pagará por isso... Juro como pagará —
ameaçou ele, saindo cambaleando.
— Fez mal, Helen, muito mal. Sabe que
isso só lhe trará encrencas — alertou um
dos vaqueiros.
— Mal fazem vocês, deixando-se
intimidar dessa forma. Morrem de medo dos
Merryl. Eu nunca tive medo do velho e
muito menos dos seus filhos bastardos.
— Estou apenas lhe dando um conselho,
Helen. Detestaria ver algo acontecendo a
você. Vai ter trabalho com aqueles dois.
— Pois deixe que venham. Eu estarei
preparada para eles — garantiu ela.
O vaqueiro que Helen havia surrado foi
até o xerifado e apresentou uma queixa por
agressão contra ela. O Xerife Ted Quincy
estava muito apressado no momento,
porém.
— Cuidarei disso assim que voltar do
rancho. Vou ao enterro de seu patrão. Vá ao
barbeiro e peça para ele limpar esses
ferimentos para você. Depois
conversaremos — decidiu ele, saindo e indo
apanhar seu cavalo.
Não poderia faltar ao enterro do velho.
Tinha coisas a discutir e acertar com os
filhos.
Enquanto isso, no Rancho Merryl reinava
grande consternação com a morte do
patriarca da família, pioneiro que ajudara a
expulsar os índios daquelas terras e que,
pouco a pouco, fora se tornando um dos
maiores proprietários de terras.
Quando a seca de 1868 arrasou as
pastagens e acabou com o gado, o velho
beneficiou-se de sua esperteza, quando da
escolha das terras onde construir seu
império. Nada menos que três rios
cortavam-na.
Num trabalho arrojado e original para a
época, ele fez seus empregados e mexicanos
trazidos da fronteira cavarem canais de
irrigação e foi o único, naquele ano, a ter
pasto e, mais tarde, gado bom para vender.
Tudo que tinha fora vendido ao Exército.
E o gado dos anos seguintes também. O
velho descobriu o filão, comprando gado
magro e quase morto de fome de seus
vizinhos, soltando-os em seus pastos
sempre verdes.
Enquanto enriquecia, seus vizinhos
empobreciam. Muitos começaram a vender
suas terras e a procurar melhor
oportunidade em outros Estados mais
favoráveis.
O Rancho Merryl transformou-se num
dos maiores do Estado. Era o orgulho do
velho Gregory, agora morto. Seus dois
filhos, junto ao caixão do pai, na sala
principal da casa do rancho, traçavam
planos.
— A época do velho já passou. Ele não
estará aqui para nos limitar mais. Agiremos
a nossa maneira agora, Bob — falou Oscar.
— Sim, e a primeira coisa a fazer é
demonstrar nossa força. O primeiro a sentí-
lo deverá ser Scott Nelson. Já estou farto da
ousadia dele.
— Não se preocupe, ele não é páreo para
nós. Com o xerife do nosso lado, vamos
transformar a vida de Scott num inferno.
Vamos nos vingar dele na hora certa, não se
preocupe, irmão.
— Quando penso no quanto papai
desejava aquelas terras, sinto ganas de ir lá,
matá-lo com minhas próprias mãos e
arrancar-lhe o coração.
— Faremos isso, não se preocupe.
Aquelas terras são muito boas, iguais às
nossas e uma das melhores do vale para a
criação de cavalos. O Exército tem uma
grande encomenda deles para o ano que
vem. Precisamos criá-los. Por isso aquela
terra tem de ser nossa.
— E quanto aos outros rancheiros que
ainda restam?
— Estão resistindo por causa do Scott.
Quando virem o que acontecerá com ele,
virão correndo entregar-nos suas
propriedades numa bandeja. Vamos abaixar
ainda mais o preço, quando chegar a hora.
— Pena que o velho não possa ver o
resultado do nosso trabalho, não?
— Sim, em breve realizaremos o sonho
de sermos os únicos proprietários de todas
essas terras. O Rancho Merryl será o maior
do país, pode estar certo.
— Pena que papai tenha sido sempre tão
correto em seus negócios. Se usasse nossos
métodos, isso já teria acontecido antes, com
certeza.
— Sim, vamos jogar pesado agora.
Seremos mais persuasivos que papai. A
nova equipe de pistoleiros deve chegar hoje.
Mandei Glenn buscá-los em El Paso.
— Espero que sejam bons e de confiança,
como os últimos que ele trouxe.
— Não se preocupe quanto a isso. Glenn
sabe o que faz e só nós trará o melhor.
— Se não fosse pela morte de papai, eu
poderia jurar que estou me sentindo muito
feliz.
— Pois eu também — disse o outro e os
dois sorriram com ironia.
Instantes depois chegava Ted Quincy, o
xerife, para prestar suas homenagens ao
velho e conversar com os dois.
— Foi bom que tenha chegado agora,
xerife — falou Oscar. — Precisamos
conversar.
— Sim, claro, rapazes. Antes deixem-me
prestar minhas homenagens ao velho
Merryl.
— Sim, mas seja muito breve. Os vivos
podem ser mais lucrativos para você agora,
xerife — acrescentou Bob e o xerife sorriu,
entendendo a mensagem.
Apenas tirou o chapéu e olhou o rosto do
velho, desejando poder chamá-lo de todos
os nomes que tinha reservado para ele, mas
adotou uma expressão compungida,
conforme a situação exigia-lhe.
— Pronto, rapazes! Já terminei o que
tinha de fazer. Podemos conversar agora —
disse, então, aos dois.
— Siga-nos, xerife — convidaram-no.
Deixaram a sala onde estava sendo
realizado o velório e foram para um outro
aposento, onde era o escritório do velho, até
sua morte.
Oscar serviu uísque e ofereceu um
charuto ao homem da lei, que apreciou
todas aquelas gentilezas. Os dois rapazes
prometiam ser generosos para com ele e
isso o agradava.
— Muito bem, xerife, já conversamos
sobre o assunto e deve saber como
pretendemos agir de agora em diante, sem a
presença de nosso pai, não? — indagou-lhe
Oscar.
— Sim, estou a par de seus planos. Onde
eu entro nisso tudo? — quis ele saber.
— Os que ficarem do nosso lado, só terão
a ganhar. Confirma sua posição quanto a
isso?
— Claro que sim, rapazes. Sempre
admirei o trabalho de vocês e estou feliz em
poder participar de seus planos. Ser xerife
não é uma boa profissão nem deixa
ninguém rico — respondeu o homem da lei,
mordendo a ponta do charuto, depois
cuspindo-a.
Bob apressou-se em riscar um fósforo e
acendê-lo para o xerife.
— Ótimo! — afirmou Oscar e os dois
irmãos riram com satisfação.
— Assim que se fala, Ted. De nossa
parte, você só terá a lucrar. Verá que será
muito compensador ser nosso amigo.
— Pois estou ansioso para conhecer tudo
isso. Quais são suas primeiras ações? Já
resolveram o que fazer em seguida?
— Antes de mais nada, vamos tomar o
rancho e Scott Nelson. É o que papai mais
queria em sua vida e nós vamos fazer isso
em homenagem a ele. Seu trabalho será
fechar os olhos a isso e, se precisarmos, dar-
nos suporte.
— Não vai ser uma tarefa fácil, Oscar.
Scott vai oferecer dificuldades.
— Não é de hoje que ele nos causa
aborrecimentos, Ted. Só que agora papai
não está aqui para nos deter. Ele sempre
quis aquelas terras e vai tê-las,
principalmente porque pretendemos criar lá
os cavalos que vamos vender ao Exército no
ano que vem.
— Precisam fazer isso com muito
cuidado — aconselhou Ted.
— Sim, sabemos que Scott é muito
respeitado na cidade e que isso poderá
repercutir contra nós — ponderou Bob.
— Aí entra sua parte, Ted — falou Oscar.
— Você irá se encarregar de fazer as coisas
parecerem legais.
— Como? — indagou o homem com a
estrela.
— Não sabemos ainda, mas você penará
em algo, quando tudo acontecer. Scott
Nelson não deverá sair apenas do vale e de
nossas vidas. Ele terá de sair deste mundo,
para que possamos ficar tranqüilos.
— Quando querem fazer isso?
— O mais depressa possível... Se
possível, ainda hoje, após o sepultamento de
papai — falou Bob.
— Deixem-me pensar — disse o xerife,
indo até onde estava o uísque e despejando
familiarmente uma generosa dose em seu
copo.
Baforou seu charuto por algumas vezes,
depois voltou para junto dos dois.
— Acho que podemos fazer isso de um
modo bem simples, sem necessidade de
complicar as coisas. Mandem alguns de
seus homens soltarem cavalos com a marca
do Rancho Merryl nas terras de Scott.
Depois façam uma queixa. Nós iremos ao
rancho dele, descobriremos os cavalos e
providenciaremos seu linchamento, que é o
que se faz nesta terra com malditos ladr·es e
cavalo. O que me dizem?
Os dois irmãos entreolharam-se.
— Acho que pode funcionar. Destruímos
a reputação de Scott e nos livramos dele —
falou Bob.
— É, é simples e eficiente. É uma boa
idéia, Ted. Já começou a pensar da forma
como nós queremos. Agindo assim,
ninguém poderá dizer que não fizemos a
coisa legalmente, já que linchar ladr·es de
cavalo é prática usual. Nem precisaremos
estar presentes.
— Sim, isso mesmo, Oscar. Basta
mandarem alguns de seus homens para nos
ajudar a reconhecer os cavalos.
Providenciarei para que tudo fique legal
depois de acontecido — afirmou o xerife.
— E o que isso vai representar em termos
de... sua gratidão, rapazes?
Os dois irmãos riram. Oscar foi até a
escrivaninha, abriu uma gaveta e retirou
uma caixa de metal. Dentro dela ele
apanhou um maço de notas. Voltou e
entregou-o ao homem da lei.
O charuto quase caiu da boca de Ted
Quincy, quando calculou a quantia que
havia ali.
— Isto é apenas o começo — falou
Oscar.
— Rapazes, vou adorar trabalhar para
vocês — riu o xerife, tomando mais um
gole de seu uísque.
Lembrou-se, então, do vaqueiro que
havia sido surrado na cidade.
— Há mais alguém que pode servir de
obstáculo a seus planos, rapazes — contou
ele.
— Quem? — surpreendeu-se Bob.
— Sim, quem? — emendou Oscar.
— Helen Fulton, do saloon.
— Helen? Por quê?
— Andou insultando vocês dois lá no
saloon. Um vaqueiro aqui do rancho
resolveu tirar satisfações e Helen o agrediu
e o chicoteou.
— Helen fez isso? Aquela maldita gata
selvagem! — falou Oscar, entre admirado e
ofendido.
— E diante de várias testemunhas.
— E o que fez a respeito, Ted? — quis
saber Bob.
— Nada, estava de saída para cá. Não
queria me atrasar para o sepultamento.
Deixei para resolver o assunto quando
retornasse.
— É melhor não fazer nada, Ted. Nada
conseguirá contra Helen. Ela é muito
estimada e respeitada pelos que freqüentam
seu saloon. Na certa vai aparecer uma
porção de testemunhas para dar razão a ela
— ponderou Oscar.
— Podemos fazer de outro modo — disse
Bob.
— Como?
— Poderemos usar o assunto para testar a
nova equipe que está vindo de El Paso.
Vamos ver se eles são mesmo bons —
propôs Bob.
— Pode ser uma boa idéia. Vamos
resolver dois problemas ao mesmo tempo.
Daremos uma lição em Helen, ensinando-a
a nos respeitar, depois cuidaremos de Scott
Nelson. Com isso a cidade verá que não
estamos para brincadeiras. Todos passarão a
nos respeitar ainda mais.
— É um bom plano, rapazes, mas precisa
ser bem feito. Temos de manter as
aparências. Se seus rapazes fizerem alguma
bobagem, terei de intervir.
— Tudo bem, xerife. Quanto a isso, faça
a sua parte. Encontraremos sempre uma
forma de acertarmos tudo — afirmou Bob.
O velho Gregory Merryl foi enterrado na
mais verdejante colina do rancho, num
ponto de onde tinha-se uma vista completa
de todo o vale.
Ali, ao lado da esposa, ele descansaria
para sempre. Apenas os membros da família
e os empregados estavam presentes. O
único da cidade a participar era o xerife.
Nenhum vizinho viera. Gregory Merryl
nunca se preocupara muito em fazer
amigos. Sempre quis fazer fortuna.
Após o sepultamento, os irmãos estavam
conversando na varanda da casa, quando um
tropel de cavalos se fez ouvir no rancho,
seguido de gritos de saudação.
— São eles — disse Bob, levantando-se.
Oscar seguiu-o. Vinte pistoleiros da pior
espécie acabavam de chegar.
— São os irmãos Merryl? — indagou
aquele que parecia ser o chefe do bando.
— Sim, quem é você?
— Um homem chamado Glenn nos
mandou vir para cá, onde encontraríamos
trabalho. Meu nome é Scar e todos estes
comigo são leais a mim.
— E você é leal a quem? — indagou-lhe
Oscar.
— A quem me pagar mais — respondeu
o pistoleiro.
— Então veio ao lugar certo, Scar. Estão
contratados. Espero que não estejam muito
cansados.
— Foi uma longa viagem, patrão — disse
o cavaleiro. — Estamos com fome e
sedentos.
— Acho que podemos dar um jeito nisso
agora mesmo. Quero que vão até a cidade
fazer um trabalho rápido. Poderão
aproveitar para comer e beber lá.
— Espero que não seja longe...
— Mais perto do que você imagina, Scar.
Ouçam o que vocês devem fazer lá — disse
Bob, passando-lhe algumas instruções e
dinheiro.
O grupo partiu logo em seguida para o
povoado. Enquanto isso, os irmãos
chamavam alguns homens e ordenavam que
fossem soltar cinqüenta cavalos nos pastos
de Scott Nelson.
— Está tudo preparado agora, Bob —
falou Oscar, quando terminaram as
providências.
— Sim, a partir de hoje, apenas um nome
mandará neste vale: Merryl!
— E em pouco tempo teremos mais
dinheiro do que conseguiremos gastar em
toda a nossa vida — afirmou Oscar, com
satisfação. — Viajarei pela Europa, pela
América do Sul, por toda parte.
Enquanto os dois irmãos sonhavam com
um futuro de riqueza e fartura, na cidade,
Helen havia terminado de cantar a primeira
música daquele começo de noite.
Sua voz encantava os homens e ela foi
muito aplaudida, quando silenciou.
Nesse momento, a equipe liderada por
Scar entrou no saloon, de maneira ostensiva
e provocadora.
Encostaram-se no balcão e pediram o
melhor uísque que havia na prateleira.
O barman apressou-se em pôr uma
garrafa sobre o balcão. Scar arrancou a
rolha com o dente, cuspindo-a para o lado.
Bebeu no gargalo da garrafa mesmo.
— Que droga! — falou ele, irritado,
cuspindo toda a bebida sobre o barman. —
Eu pensei ter pedido seu melhor uísque,
idiota! — acrescentou ele.
— É o melhor que temos e até agora
ninguém reclamou — falou Helen, exaltada,
indo ocupar um lugar atrás do balcão para
encarar os homens encostados nele.
— Talvez porque tenham morrido ao
beber esta porcaria — gracejou Scar,
arrancando gargalhadas de seus parceiros.
— Se não lhe agrada meu uísque, moço,
pode ir beber em outro lugar — disse ela.
— O uísque vendido aqui sempre foi
honesto, forasteiro — falou um dos
vaqueiros amigos de Helen.
Sem saber, estava ingenuamente dando a
Scar a oportunidade que ele precisava para
dar início à confusão ordenada pelos irmãos
Merryl.
Scar virou-se no balcão, olhando para os
presentes.
— Quem disse isso? — indagou.
— Eu disse — falou o vaqueiro,
levantando-se e encarando o pistoleiro.
Scar aproximou-se dele lentamente,
sempre olhando-o no fundo dos olhos.
— Eu digo que esse uísque é uma droga,
moço — afirmou Scar, cuspindo saliva
enquanto falava.
— E eu digo que ele é honesto, forasteiro
— respondeu corajosamente o vaqueiro.
— Está me chamando de mentiroso?
— Pois é o que eu acho que é, forasteiro.
Ou então, de onde vem, os homens não são
desmamados a uísque. Deve ter o paladar
muito suave. Por que não pede um copo de
leite? — falou o vaqueiro, sem saber com
quem estava lidando.
— Olhe nos meus olhos — ordenou Scar.
— Sim, por quê?
— O que você vê?
— Vejo um bastardo mentiroso!
— E eu vejo um homem morto — falou o
pistoleiro, sem emoção alguma, levando a
mão ao Colt.
O vaqueiro percebeu o perigo e tentou
sacar. A arma de Scar saltou para fora do
coldre como num passe de mágica. O
vaqueiro caiu morto sobre a mesa, varado
por duas balas certeiras.
— Não devia ter feito isso, moço — falou
um amigo do vaqueiro, jogando a cadeira
para trás, enquanto levantava-se e tentava
sacar sua arma.
Scar não lhe deu chance alguma.
Estendeu o braço, mirando a cabeça do
outro. Quando disparou, sangue e miolos
foram espirrar nas pessoas sentadas nas
mesas atrás do vaqueiro, que tombou
fulminado, coma cabeça aberta como um
melão podre.
Helen saltou para fora do balcão, chocada
com aquele sangue frio. Scar voltou-se e
encarou-a.
— E agora, moça? Onde está aquele bom
uísque desta espelunca? — indagou, com
desprezo.
— Modere a língua, pistoleiro —
ordenou ela, avançando na direção dele.
Havia um revólver na mão dela, mas
quando avançou por entre os pistoleiros, um
deles tomou-o dela. Quando ela quis
protestar, Scar já estava junto dela,
esbofeteando-a com violência.
— Não vamos deixá-lo fazer isso com
Helen, pessoal — gritou um dos vaqueiros.
Minutos depois, uma briga generalizada
tomava conta do saloon. Os homens que
defendiam Helen não sabiam que lutavam
contra bandidos da pior espécie, sem
piedade alguma.
Não foi uma luta limpa nem justa. Os
defensores de Helen foram selvagem e
barbaramente espancados, alguns com
requintes de crueldade mesmo.
Quando a briga terminou, o saloon estava
semi-destruído e muitos homens estavam
caídos, sangrando, com braços, pernas ou
costelas quebradas.
— Que isto sirva de lição para vocês.
Quando pedimos um bom uísque, queremos
o melhor de todos — falou Scar. —
Detestamos ser enganados com venenos
como o que servem aqui.
Helen, que havia sido imobilizada por um
dos pistoleiros, conseguiu se livrar e
apanhar um chicote. Avançou como uma
fera contra Scar, atingindo-o no braço.
Uma mancha vermelha desenhou-se na
camisa do pistoleiro, que se voltou, furioso.
— Vai me pagar, sua gata selvagem, filha
de uma cadela — rugiu ele, tomando-lhe o
chicote.
Helen tentou se defender, mas ele
aplicou-lhe algumas chicotadas violentas
nas costas.
Possivelmente teria sido morta
cruelmente daquela forma, se Ted Quincy
não aparecesse naquele momento, após ter
sido chamado por alguns cidadãos.
— Que diabos aconteceu por aqui? Um
furacão varreu seu saloon, Helen? —
indagou ele.
A garota chorava, com as costas
sangrando, incapaz até de falar.
— E vocês, o que me dizem? — indagou
o homem da lei a Scar e os outros.
— Não foi culpa nossa, xerife. Paramos
aqui para tomar um uísque de verdade e
fomos destratados por essa dona e seus
amigos, além de terem tentado nos vender
uísque da pior categoria que existe.
Examinando-os, Ted logo concluiu que
eram homens do Rancho Merryl,
possivelmente os que Glenn havia escolhido
para aquele novo trabalho.
— E esses dois mortos?
— Eu atirei neles, xerife. Aquele ali
tentou me acertar pelas costas. O outro veio
em defesa do amigo. Quanto à briga, e
garota ali tentou atirar em mim com aquela
arma que meu amigo tomou dela —
apontou ele. — Estava fora de s, dei-lhe
uma bofetada para acalmá-la. Então esse
bando todo aí veio para cima de mim e de
meus amigos.
— É verdade isso? — indagou o xerife,
virando-se para um dos vaqueiros.
Atrás dele, um dos homens de Scar sacou
a arma, apontando-a para o vaqueiro, que
engoliu seco.
— Sim, xerife. Ele fala a verdade —
disse, sem outra alternativa.
— Está feito, então. Vou levar todos os
vaqueiros para a cadeia por perturbarem a
ordem. Uma semana de jaula ou multa de
vinte dólares cada um.
Um murmúrio geral de revolta percorreu
o saloon, enquanto Helen, indignada,
conseguia, finalmente recuperar o controle
de si mesma.
— Ele é um covarde maldito, xerife. Não
deve acreditar nas palavras dele — falou a
garota, caminhando com dificuldade.
— O que houve em suas costas?
— Ela me chicoteou primeiro, xerife. Dei
a ela uma amostra de seu próprio remédio
— informou Scar.
— É, acho que isso equilibra as coisas,
Helen. Parece que não gostou do remédio
que aplica nos outros. Que isso lhe sirva de
lição. Eu mesmo já andava cansado de sua
valentia.
A garota mal podia acreditar no que
estava ouvindo da bocas do homem
responsável pela lei na cidade.
— Quer dizer que não vai fazer nada
contra esse bando de pistoleiros? —
questionou ela.
— Pelo que me disse este cavalheiro,
confirmado por aquele vaqueiro, seus
amigos provocaram toda a confusão, Helen.
— Cavalheiro? Você está chamando de
cavalheiro esse pistoleiro fedorento aí?
— Modere a língua, moça, ou serei
obrigado e lhe dar mais um pouco de
remédio para acalmar sua raiva — ameaçou
Scar, ainda brandindo o chicote.
— É um covarde e canalha, pistoleiro. Eu
me vingarei de você, juro como me
vingarei. Você não perde por esperar.
Mexeu com a mulher errada, moço —
prometeu ela, entredentes.
— Fique quieta, Helen, ou acabo
prendendo-a também por desacato. Está
tudo resolvido agora. Dê graças a Deus por
eu ter chegado a tempo ou você seria morta
a chicotadas.
— Está me dizendo que surrar mulheres
agora é permitido e amparado pela lei,
xerife?
— Você começou tudo com sua pose de
galinha choca enraivecida, dona. É melhor
ficar quieta agora. Só tem a ganhar com isso
— advertiu Scar.
— Se eu tivesse uma arma, eu o mataria
agora mesmo, seu covarde!
— Estou morrendo de medo — disse
Scar.
Os pistoleiros riram, divertidos.
— Muito bem, pessoal, estão todos
presos agora. Vamos indo para a cadeia —
ordenou Ted Quincy aos amigos de Helen,
sob reclamação geral.
— Espere um pouco, xerife — protestou
Helen, indignada com tudo aquilo que
acontecia.
— O que foi agora? — indagou o homem
da lei, impaciente.
— Quem vai pagar o meu prejuízo?
— De que prejuízo está falando?
— Olhe a baderna que fizeram em meu
saloon... Mesas, cadeiras, candelabros... Só
aquele espelho na prateleira de bebidas
custou-me duzentos dólares...
— Isto aqui está parecendo o que sempre
foi, Helen Fulton. Uma baderna. Se quer
receber alguma coisa, cobre o prejuízo dos
vaqueiros, que começaram toda a bagunça.
— Você conhece esses homens que está
prendendo, xerife. Sabe que não foi assim.
Por que está defendendo esses pistoleiros?
Está com medo deles?
— Se eu fosse você, não a deixaria falar
assim comigo, xerife — falou Scar.
— Não se intrometa, eu sei cuidar dela.
— E os dois vaqueiros mortos, vai deixar
por isso mesmo, xerife? — ainda insistiu a
jovem.
— Pelo que vejo, foi uma luta leal e eles
tiveram todas as chances. Percebo que
chegaram a sacar suas armas — apontou o
xerife.
Helen olhou e teve uma surpresa
inesperada. Na verdade, os dois vaqueiros
nem haviam tido tempo de sacar suas
armas, antes de serem mortos por Scar.
Durante a briga, alguém havia tirado seus
Colts dos coldres, dando a entender que
haviam sacado também.
— Está acontecendo alguma coisa por
aqui, xerife — comentou ela, sem entender
tudo aquilo. Mas eu acho que já estou
entendendo tudo. Para quem vocês
trabalham? — indagou ela a Scar.
O pistoleiro não respondeu, olhando-a
com desprezo.
— Percebeu agora, xerife? Esses
pistoleiros devem ser os novos contratados
do Rancho Merryl. Aqueles dois nem
esperaram o cadáver do pai esfriar e já estão
preparando das suas. Com a morte do velho,
com certeza eles vão implantar sua vontade
sobre a região. Mas cedo ou tarde serão
punidos. Tenho certeza disso — afirmou
ela.
Os pistoleiros riram zombeteiramente,
depois ajudaram o xerife a levar os
vaqueiros para a cadeia.
Quando os pistoleiros voltaram ao rancho
e contaram o ocorrido aos dois irmãos,
Oscar riu muito de toda a história,
divertindo-se com o acontecido. Bob ficou
igualmente muito satisfeito com a lição
dada a Helen.
— Fez um bom trabalho, Scar. Quero que
conheça depois toda a equipe. Talvez você
seja o novo líder deles — disse Bob.
— Sim, uma boa idéia. Vamos nos dar
bem — afirmou Oscar.
— Gosto de trabalhar assim. Vocês
mandam e pagam, eu os faço felizes — riu
Scar.
— Ótimo! Agora pode ir descansar com
seus homens. Há lugares preparados no
alojamento número cinco. Depois
conversaremos mais — despediu-o Bob.
O pistoleiro retirou-se, juntamente com
seus homens. A noite havia caído sobre o
vale e tudo parecia muito tranqüilo agora. O
capataz do rancho e mais alguns vaqueiros
retornaram pouco depois.
Assim que desmontou, foi até a casa
conversar com seus patrões, que bebiam e
conversavam, animados com os últimos
acontecimentos.
— E então, Mark? Fez tudo conforme lhe
ordenamos? — perguntou Bob.
— Sim, patrão! Fizemos tudo conforme
ordenado. Pusemos cinqüenta cabeças de
cavalo no pasto de Scott Nelson, deixando
uma pista como se eles tivessem sido
levados do pasto norte.
— Ótimo! Amanhã pela manhã, vá à
cidade e chame o xerife. Informe que
tivemos um roubo de cavalos aqui.
— Entendido, patrão.
— E deixe uma equipe pronta e armada
para ajudar o xerife a capturar o ladrão de
nossos cavalos.
— Certo, patrão! Tudo vai ser perfeito.
Scott não terá como negar o roubo.
— Bom trabalho, Mark. Não me deixe
esquecer de lhe acrescentar algo mais no
pagamento desta semana — avisou Bob.
— É muita gentileza sua, patrão —
agradeceu o homem, saindo.
Bob foi apanhar a garrafa de uísque e
completar seu corpo e o do irmão.
Brindaram com satisfação.
No dia seguinte, pela manhã, o xerife e
alguns ajudantes, que serviriam de
inocentes úteis, testemunhando a culpa de
Scott Nelson, apareceram no rancho logo
pela manhã.
Ted, para impressionar os ajudantes,
representou muito bem seu papel, dando a
entender que nada sabia sobre o plano
engendrado por ele mesmo para acusar
Scott.
— Mandaram me chamar? — indagou
ele, assim que chegaram lá.
Bob e Oscar já o esperavam na varanda
da casa.
— Sim, xerife — respondeu Oscar. —
Estamos com um problema aqui.
— Que tipo de problema?
— Problema com nossa criação de
cavalos, xerife. Ultimamente têm
desaparecido cavalos de nosso rancho.
Achei que poderia nos ajudar. Hoje cedo os
rapazes deram pela falta de cinqüenta
cavalos em nosso pasto norte.
— Alguma pista?
-Longe de nós qualquer acusação sem
provas, xerife, mas o pasto norte faz divisa
com o rancho de Scott Nelson e, como sabe,
estamos tendo alguns problemas com ele.
— Certo. É melhor darmos uma olhada.
Querem vir conosco?
— Eu gostaria de ver isso de perto —
disse Bob ao irmão, em voz baixa.
— Então vamos junto.
— Podemos levar alguns de nossos
rapazes, xerife? Não queremos encrencas
com Scott Nelson — pediu Bob.
— Tudo bem, Bob. Acho que será útil —
decidiu o xerife.
Momentos depois, os Merryl e meia
dúzia de homens acompanhavam o xerife,
na direção do pasto norte.
Seguiram a divisa com o rancho de Scott,
sempre de olho na cerca que separava as
duas propriedades.
— Como vê, xerife, não há buracos na
cerca, que justificassem a fuga dos cavalos.
Se saíram daqui, devem ter sido levados.
— Preciso apurar isso com cuidado. Não
quero cometer nenhum engano — falou o
xerife, piscando um olho para os dois
irmãos.
Um dos homens do Rancho Merryl
seguia na frente. Fizera parte do grupo que
passara os cavalos para o pasto do outro
rancho.
— Veja aqui, patrão! — disse ele,
mostrando o ponto onde a relva amassada
mostrava que muitos cavalos haviam
passado de um para outro lado da cerca.
O xerife foi até lá. O arame farpado
estava precariamente preso aos palanques,
mostrando um conserto improvisado.
Bastou puxá-los para que se soltassem.
— Parece que os cavalos passaram por
aqui — disse o xerife. — E não fizeram esta
abertura na cerca sozinhos.
— Vejam, ali na frente, há uma manada.
Vamos dar uma olhada — falou Oscar.
O grupo cavalgou até os cavalos que
pastavam sossegadamente. Como era de se
esperar, muitos cavalos com a marca do
Rancho Merryl foram encontrados entre
eles.
— Aí está a prova, xerife — acusou Bob.
— Não há dúvida.
— Sim, ele anda roubando nossos
animais, xerife — completou Oscar.
— Vejo que é uma prova contundente,
rapazes. Vamos à procura dele — disse o
homem da lei.
Cavalgaram para a sede do rancho, onde
procuraram pelo proprietário. Scott Nelson,
no entanto, não se encontrava lá.
— Algum problema, xerife? — indagou
um dos homens que trabalhavam naquele
rancho.
— Sim, há um problema muito sério por
aqui — afirmou Ted. — Onde está seu
patrão?
— Foi à cidade comprar mantimentos,
por quê?
— Encontramos cinqüenta cavalos do
Rancho Merryl entre a manada que pasta no
pasto sul deste rancho. E um conserto muito
malfeito na cerca que separa os dois
ranchos.
— O que está querendo insinuar, xerife?
— Não estou insinuando nada, rapaz.
Recebi uma queixa dos Merryl, alegando
que seus cavalos estavam desaparecendo.
Investigando agora, encontramos os cavalos
do lado de cá e a cerca violada. Não preciso
insinuar nada. A verdade está na cara: seu
patrão anda roubando gado do Rancho
Merryl.
— Não pode acreditar nisso, xerife! É
mentira! Por que Scott faria isso? Ele tem
os melhores cavalos do vale.
— Não queira discutir comigo o que eu
vi pessoalmente, rapaz. O que digo é que
seu patrão está em apuros. As provas são
todas contra ele. Roubar cavalos é punido
com linchamento neste território e você
sabe disso.
— Meu patrão é inocente e muito me
admira você, xerife, acreditando numa
bobagem dessas — falou o vaqueiro,
encarando o homem da lei.
— Não discuto isso com você, rapaz.
Cadê seu patrão?
— Assim que se faz, xerife. Por que ficar
discutindo com um idiota de um vaqueiro?
— ironizou Oscar. — Talvez Scott esteja
escondido em algum ponto por aí, como
uma galinha assustada.
— É uma hipótese a ser considerada —
afirmou o xerife.
— Já lhe disse, xerife. Meu patrão não
está em casa e eu posso garantir-lhe isso.
— Cale-se, vaqueiro! Já lhe dei
importância demais. Vou verificar isso com
meus próprios olhos — decidiu o xerife,
desmontando e fazendo um sinal para seus
auxiliares. — Vamos revistar a casa,
rapazes.
— Espere um pouco, Quincy — disse o
rapaz e seu tom de voz já não era mais
amistoso. — Sou responsável pelo rancho
na ausência do meu patrão. Ninguém aqui
vai revistar nada sem autorização dele —
decidiu o vaqueiro, fazendo um sinal com
seu chapéu.
Vaqueiros armados começaram a surgir
de todos os pontos ao redor dos cavaleiros.
Traziam suas Winchesters engatilhadas e
prontas para disparar.
Todos pareciam muito decididos. O que
parecia uma ação fácil começava a tornar-se
complicada e perigosa. O xerife percebeu
que estavam em menor número diante da
equipe do rancho.
Olhou para Bob e Oscar, que
compreenderam que o plano fora por água
abaixo.
— É melhor darmos o fora, xerife —
sugeriu Bob.
— Vamos fazer isso, mas vão se
arrepender de terem atrapalhado o trabalho
da lei — ameaçou o xerife.
Os cavaleiros deram meia-volta e
trataram de sair dali o mais depressa
possível.
— O que acham que devo fazer agora?
— indagou o xerife, quando já se afastavam
do rancho.
Cavalgava entre os dois poderosos
rancheiros, todos contrariados com a
resistência encontrada.
— Acho que Scott está oculto no rancho
dele — afirmou Oscar. — Devíamos
reforçar este grupo com nossos homens e
voltarmos lá. Vamos tirar isso a limpo e dar
uma lição naqueles abusados.
— Acho que é o melhor mesmo a ser
feito. Posso nomear todos os membros do
grupo como meus assistentes temporários.
Isso vai tornar o que acontecer lá legal.
— De acordo. Vamos parar aqui e
esperar. Mandarei um dos homens buscar
Scar e seu bando — falou Bob.
As ordens foram dadas. Um dos
vaqueiros do rancho foi até a sede, de onde
retornou, pouco tempo depois, com Scar e
seus facínoras de El Paso.
— Está com algum problema, patrão? —
indagou Scar a Bob, assim que chegaram.
O pistoleiro parecia impaciente para
entrar em ação e mostrar serviço. No dia
anterior, os dois irmãos já haviam
demonstrado a generosidade deles.
— Sim, temos um problema para
resolver. Sigam-nos. Eu lhe conto no
caminho.
O agora numeroso grupo retornou ao
rancho de Scott Nelson. Ao vê-los
aproximando-se, os vaqueiros armaram-se
de novo e ficaram à espera.
Um grupo deles foi se postar diante da
casa, resolvidos a defendê-la. O xerife freou
seu cavalo diante deles, olhando-os
ameaçadoramente. Tinha respaldo agora. Os
pistoleiros de El Paso já haviam provado
que sabiam ser eficientes.
— Muito bem, rapazes, não vou repetir
minhas ordens. Saiam da frente agora
mesmo ou vão se arrepender — disse ele.
— Só por cima de nossos cadáveres,
xerife, o que seria difícil de explicar depois,
não? — respondeu o vaqueiro que os
liderava.
— Aviso-os que farei isso, se for preciso.
Posso prendê-los por obstruírem o trabalho
da lei.
— Lei? De que lei está falando? —
ironizou o vaqueiro.
— Você é mesmo muito abusado — disse
Scar, aproximando seu cavalo o máximo
possível do vaqueiro. — Saia da frente ou
faremos o que tem que ser feito —
ameaçou.
— Então o que está esperando? — foi a
resposta do rapaz.
Os homens de Scar baixaram suas mãos
na direção dos coldres, soltando as presilhas
de couro que prendiam os revólveres no
lugar, impedindo-os de cair enquanto
cavalgavam.
Todos ficaram atentos a Scar, esperando
um sinal dele para começar a ação.
— Pela última vez, rapazes. Saiam da
frente! Só quero revistar a casa e comprovar
que Scott não está aí.
— Terá que acreditar na honestidade de
minha afirmação, xerife. Eu digo que ele
não está.
— Você mentiria para proteger seu
patrão. Ele é um ladrão e merece ser
justiçado, assim como todos que estão com
ele. São cúmplices de roubo também —
alertou o xerife.
O clima tornava-se cada vez mais tenso.
Um sinal, um gesto, um movimento em
falso e a carnificina se instalaria naquele
local.
— Gostaria de vê-lo repetir isso diante de
meu patrão, xerife. Queria ver sua coragem,
então.
— Para mim chega de conversa, rapaz.
Você é muito abusado mesmo. Vamos
passar e quem se opor será morto como um
cachorro raivoso.
— É o que veremos, xerife — disse o
vaqueiro, engatilhando seu rifle.
Seu movimento foi lento demais e muito
previsível para um pistoleiro com a
experiência de Scar, que já estava preparado
para isso.
Sacou sua arma com extrema rapidez e,
com um tiro certeiro, atravessou a garganta
do vaqueiro, que expeliu uma golfada de
sangue pela boca, antes de cair de joelhos.
Ficou estremecendo, enquanto tentava
dizer alguma coisa, mas apenas sons roucos
e ininteligíveis saíram de sua garganta. Ele
apertava o próprio pescoço, tentando
estancar o sangue, que esguichava por entre
seus dedos.
— Ele esta morrendo... — gritou um de
seus amigos. — Alguém faça alguma coisa.
Em resposta a seu apelo, Scar engatilhou
de novo seu Colt e a bala explodiu a cabeça
do vaqueiro, espalhando seus miolos na
poeira.
Os cachorros, atraídos pelo cheiro de
sangue, aproximaram-se. Um deles
abocanhou um pedaço dos miolos do
vaqueiro e tratou de correr. Os pistoleiros
divertiram-se muito com isso, enquanto os
vaqueiros do rancho ficavam chocados e
enojados.
— Mais alguém quer bancar o valente?
— indagou Scar, encarando-os.
Sob a mira das armas de Scar e de seus
homens, os vaqueiros não tiveram
alternativa, senão submeter-se.
O xerife e seus ajudantes revistaram a
casa, sem encontrar o proprietário do
rancho.
— Muito bem, homens, ouçam o que vou
dizer! — falou Oscar. — O patrão de vocês
é um maldito ladrão de cavalos e deverá
receber a punição que merece.
— Ele nos roubou — acrescentou Bob, e
como compensação pelo crime eu invoco a
pena de indenização. Este rancho será
nosso, como pagamento dos prejuízos que
ele nos causou. É difícil dizer desde quando
ele vem roubando nossos cavalos. Aqueles
de vocês que quiserem trabalhar conosco e
receberem um bom pagamento, maior do
que o que recebem agora, podem ficar.
Quem não quiser, pode apanhar suas coisas
e dar o fora.
Os vaqueiros entreolharam-se, indecisos.
Trabalhar para os Merryl, naquela altura,
tinha dupla vantagem: mantinha a vida e
merecia um aumento.
Três vaqueiros, no entanto, decididos e
leais, separaram-se dos outros e foram
apanhar seus cavalos.
— Não trabalharei para canalhas e
covardes — comentou um deles.
— Sim, eu prefiro morrer de fome a trair
a confiança do Scott, que sempre foi um
bom patrão — acrescentou outro.
Os três montaram seus cavalos e trataram
de afastar-se. Oscar, porém, fez um sinal
para Scar. O pistoleiro apanhou sua
Winchester e mirou cuidadosamente. O
primeiro tiro derrubou um dos vaqueiros.
Os outros dois, assustados, trataram de
esporear seus cavalos. Scar engatilhou de
novo a arma e mirou, sem precisar fazer
mira demorada.
O vaqueiro restante, em desespero, cortou
os flancos de seu cavalo com as esporas.
rezando para sair logo do alcance das balas.
Scar disparou pela terceira vez e o
vaqueiro tombou para frente da sela,
enquanto seu cavalo continuava sua corrida
desenfreada.
— Isso liquida a questão — falou Scar.
— Sim. Mais alguém deseja dar o fora do
rancho? — acrescentou Bob.
Nenhum dos vaqueiros do rancho
demonstrou ânimo para enfrentar gente tão
impiedosa e traiçoeira.
— Muito bem, xerife, acho que está tudo
resolvido por aqui, mas não terminamos o
que começamos fazer. Se Scott está na
cidade, vamos para lá atrás dele. Será
excelente pegá-lo lá e linchá-lo diante de
toda a população. Vão nos respeitar mais
depois disso — propôs Oscar.
— Certo. Já que começamos, vamos
terminar isso — determinou o xerife.
Bob separou meia dúzia de pistoleiros
para ficarem no rancho e coordenarem os
trabalho. O restante do bando partiu a
galope na direção do povoado.
Alheio a todo o drama e à sórdida trama
tecida contra ele, Scott Nelson, na cidade,
terminava de carregar a carroça com os
mantimentos necessários.
Helen Fulton e Judy, uma garota que
trabalhava com ela no saloon viram-no e
foram ao seu encontro.
— O que houve com você, Helen. Parece
que levou uma surra? — brincou ele.
— Sim, e levei mesmo — afirmou ela.
Scott olhou-a sem entender
— Está falando sério?
— Sim, eu fui chicoteada, se é que se
pode acreditar nisso..
— Quem? Como? Por quê? —
horrorizou-se ele.
— Foi tudo graças à conivência do xerife
e aos pistoleiros que os Merryl mandaram
vir de El Paso.
— Que pistoleiros? — surpreendeu-se
ele.
— Acho que agora os dois farão o que
sempre desejaram fazer e o velho não
permitia. E você, mais do que ninguém,
sabe o que isso significa, não?
— Eu não tenho medo deles — afirmou
Scott.
— Helen também não tinha e olhe em
que estado eles a deixaram — falou Judy.
— Não me acovardarei diante deles,
Judy.. Sei que eles querem meu rancho e
farão todo o possível e o impossível para tê-
lo. Meu rancho é minha vida. Nada me
separará dele. Lutarei como for preciso para
mantê-lo. Fugirei como um covarde se for
preciso, para retornar no momento certo,
com a ajuda certa, para fazer prevalecer a
justiça. Só que o que é meu, é meu. Disso
não abro mão. Podem tomar-me o que
puderem, mas no momento devido, eu volto
para resgatar o que me pertence.
— E faz muito bem, Scott. Eles têm
muitos homens agora. Enfrentá-los é
loucura — aconselhou Helen.
— Lutei muito para transformar meu
rancho no melhor do vale. Não é o maior,
mas não preciso mais do que já tenho.
Podem tentar, mas o que é justo é justo.
— Aqueles covardes não conhecem
justiça, Scott. Se eu fosse você, iria para
Phoenix, procurar um delegado federal. É a
única maneira de trazer justiça para esta
maldita terra...
Naquele momento, um cavalo entrou em
disparada pela rua principal do povoado.
Sobre ele, um cavaleiro com o peito e as
costas manchadas de sangue lutava
bravamente para manter a lucidez, que se
esvaía no sangue que lambuzava seu corpo
e a sela de seu cavalo.
Ao reconhecer o animal e o seu cavaleiro,
Scott atirou-se corajosamente no meio da
rua e deteve o animal extenuado.
O cavaleiro caiu pesadamente na poeira.
Scott foi levantar-lhe a cabeça.
— Água... água... — pediu o vaqueiro.
Scott fez um sinal para que Helen
providenciasse água.
— Matt, o que houve, rapaz? — indagou
Scott, compadecido.
— Fuja, Scott... Fuja... Eles querem
linchá-lo...
— Quem?
— Os Merryl... com a cumplicidade do
xerife... Fuja...
— Por Deus, conte-me o que houve!
Helen chegou, com uma caneca de água.
Scott deu de beber ao vaqueiro ferido, cuja
pele amarelava-se a olhos vistos. Ele
perdera muito sangue. Estava à beira da
morte e nada poderia ser feito para salvá-lo.
Com a voz cada vez mais fraca, o
vaqueiro contou o que acontecera no
rancho. Quando terminou, seus olhos
tornaram-se opacos e seu corpo pesou nos
braços de Scott.
— Matt... Matt... Malditos! Não
perderam tempo mesmo — disse o
rancheiro, indignado.
— Scott, você tem de fugir agora... Você
ouviu o Matt... Eles devem ter preparado
alguma coisa contra você... Virão no seu
encalço...
— Meu Deus! Não posso abandonar tudo
onde dediquei toda a minha vida, a vida de
minha esposa... Dos filhos que eu não tive e
para quem fiz tudo isso... — lastimou
dolorosamente o rancheiro, cedendo ao
desespero.
— Não Scott, não faça isso. É o que eles
querem. Faça o que lhe disse. Vá para
Phoenix, procure ajuda legal.
— Helen tem razão, Scott. Ficar é morrer
— disse Judy.
— E isso será fazer o jogo deles. Não
facilite, Scott. Resista com inteligência.
Fortaleça-se, depois volte e retome o que é
seu... — incentivou Hellen. — Esta é uma
tarefa que não conseguirá executar sozinho.
Precisa de ajuda. De ajuda de quem sabe
como enfrentar esse tipo de gente.
— Você está certa, Helen. Por que
facilitar as coisas para eles? Sei o que fazer,
como fazer e onde fazer para transformar a
vida deles num inferno. No mesmo inferno
que eles desejaram para mim...
— Sim, Scott! É isso que deve fazer —
falou Helen.
— Obrigado, Helen. Jamais esquecerei
isso. Pode me emprestar seu cavalo? Sei
que é um dos melhores corredores daqui.
Estes de minha carroça são fortes, mas não
são velozes.
— Claro que sim, Scott. Ele está no
estábulo. Corra para lá e fale com o Sam.
Pode levá-lo. Ninguém vai conseguir
alcançá-lo.
— Não sei como agradecê-la, Helen... Eu
voltarei... Prometo... Não se preocupe
comigo e cuide-se, por favor!
— Vá depressa! — ordenou-lhe a garota,
comovida, abraçando-o e beijando-o
apaixonadamente. — Vá, meu amor! —
repetiu, emocionando-o, fazendo-o olhá-la
com surpresa. — Vá... Mas volte... estarei a
sua espera ... — finalizou ela, empurrando-
o.
Scott olhou-a por instantes, depois tratou
de fazer o que ela lhe pedira.
Momentos depois, ele deixava a cidade,
partindo a galope no cavalo mais veloz da
região, deixando para trás o coração
apaixonado e preocupado da dona do
saloon.
Scott Nelson já havia partido havia algum
tempo, quando os Merryl e seus pistoleiros
chegaram à cidade.
— Lá está a carroça dele — apontou o
xerife, reconhecendo-a imediatamente.
— Então ele ainda deve estar lá no
armazém — afirmou Bob. — Vamos pegá-
lo.
— Acho melhor cercarmos todo o local
primeiro — sugeriu Oscar.
Parada na porta do saloon, Helen viu
todos aqueles pistoleiros aproximando-se e
suspirou aliviada porque sabia que Scott
estava a salvo naquele momento.
Bob determinou que os pistoleiros
cercassem todas as saídas do armazém. Scar
supervisionou a tarefa. Quando tudo ficou
pronto, foi avisar seus patrões.
— Ele está cercado lá dentro. Não tem
como escapar — afirmou ele.
— Fizemos nossa parte, xerife. Agora
faça tudo parecer legal e prenda-o — disse-
lhe Bob.
Ted Quincy plantou-se diante do
armazém, com uma Winchester nas mãos.
A cidade toda saíra às ruas, portas e janelas.
Ninguém entendia o que estava
acontecendo, pois muitos haviam visto
Scott sair da cidade a cavalo, momentos
antes.
— Scott Nelson, aqui é Ted Quincy, o
xerife. Saia daí de mãos para cima ou
entraremos para pegá-lo — gritou o homem
da lei, alto o bastante para o povoado todo
ouvir.
As pessoas que sabiam que Scott não
estava lá acharam muita graça em tudo
aquilo e começaram a rir.
— De que eles estão rindo? — indagou
Bob ao seu irmão.
— Quem?
— Todo mundo... Olhe para ver...
Oscar olhou para as pessoas nas ruas.
Eles comentavam e riam, apontando para o
xerife e o armazém.
— Sei lá. Depois veremos isso. Agora
vamos nos concentrar em pegar Scott —
disse ele.
— Pela última vez, Scott. Saia ou vamos
entrar para pegá-lo e daí não me
responsabilizarei por sua vida — berrou o
xerife, achando muito cômodo que Scott
facilitasse o trabalho de matá-lo daquela
forma.
A porta do armazém começou a abrir-se
lentamente. Os irmãos Merryl riram de
satisfação. Scar preparou sua Winchester.
Quando o tal do Scott Nelson surgisse,
deveria baleá-lo certeiramente.
— Mas... É o Gordon, o dono do
armazém — surpreendeu-se o xerife,
olhando na direção dos Merryl.
Scar deteve o dedo no gatilho a tempo.
— Onde está Scott Nelson? — indagou
Oscar, irritado.
— Saiu há algum tempo...
— Mas a carroça dele ainda está ai, não?
— apontou Bob.
— Não sei explicar o que houve. Ele
estava trazendo os mantimentos para a
carroça. De repente, não voltou mais. Não
sei para onde foi.
Os habitantes ao redor davam boas
gargalhadas do acontecimento e da
trapalhada cometida pelos pistoleiros.
Quando Scar, no entanto, avançou e
agarrou um deles pelo pescoço, jogando-o
na poeira depois chutando-lhe as costelas,
todos calaram-se, assustados diante de tanta
violência gratuita.
— De que estava rindo, seu idiota? Acaso
somos palhaços? — indagou Scar,
agarrando o homem pelos colarinhos e
levantando-o para encará-lo.
— Perdão... Clemência... Eu não fiz por
mal... Não queria aborrecê-lo, senhor...
— Então por que ria? — insistiu o
pistoleiro.
— É que vocês estão procurando por
Scott Nelson, mas ele já saiu da cidade há
uns dez minutos — explicou o homem.
— E só agora você me diz isso? — falou
Scar, irritado ao extremo, jogando o pobre
homem de novo na poeira e chutando-o
selvagemente.
Só após deixá-lo inerte na poeira é que
conseguiu acalmar-se. Os Merryl também
demonstravam toda a sua contrariedade.
— Fizemos papel de tolos. Enquanto
armávamos todo este circo, Scott fugia de
nós sem preocupação — falou Oscar.
— Vamos atrás dele? — indagou o
xerife.
— Ele já leva uma boa dianteira. Mas
como soube que vínhamos atrás dele?
— Acho que sei como — falou Scar,
apontando para um cavalo, amarrado perto
do armazém, com a sela coberta de sangue.
Ao lado havia um corpo coberto com
uma lona. Assim que a situação acalmou-se,
o papa-defuntos retornou para continuar seu
trabalho.
— Era aquele vaqueiro lá no rancho. Na
certa trouxe o recado a Scott, antes de
morrer — concluiu Bob.
— Precisa melhorar sua pontaria, Scar —
zombou Bob.
— Ele já estava longe, quando atirei,
mesmo assim ainda o atingi certeiramente.
Só não morreu na hora por verdadeiro
milagre. Devia ser muito fiel a Scott para
ter-se sacrificado dessa forma, cavalgando
até aqui — defendeu-se o pistoleiro.
— Isso nos deixa numa situação delicada.
Não sabemos para onde Scott foi. Pode
muito bem ter ido buscar ajuda em alguma
parte — falou Bob.
— Onde poderia ele encontrar ajuda? Só
se for a Phoenix, tentar convencer um
delegado federal a vir até aqui, o que eu,
particularmente, acho muito difícil —
opinou o xerife. — Se isso acontecer, perco
minha estrela e aí sim vamos ter problemas.
— Então acho que é hora de vermos se os
homens de Scar são mesmo bons — decidiu
Oscar.
— O que sugere? — indagou Bob ao
irmão.
— Vamos tentar pegá-lo, custe o que
custar — disse Oscar, chamando o chefe
dos pistoleiros. — Quero que mande dois de
seus melhores homens atrás de Scott e que o
matem, entendeu? Sem piedade alguma.
— Será feito, não se preocupe —
assegurou o pistoleiro..
Scar foi até o grupo e selecionou dois
mexicanos, que eram seus melhores
rastreadores e assassinos frios e
sangüinários.
— Pepe, você e Miguel devem partir
agora atrás do homem que fugiu. Ele deve
ser morto. Aqui têm algum dinheiro.
Comprem mantimentos e o que for preciso
aí no armazém e partam em seguida.
Peguem uma descrição do homem, antes de
partir.
— Vão reconhecê-lo facilmente — disse
um vaqueiro do Rancho Merryl que os
acompanhava. — Ele usa um cinturão de
couro negro, com dois coldres e pistolas
niqueladas, com coronhas de madrepérola.
São únicos, cinturão e armas.
— Mui bien! — falou um dos mexicanos.
Os dois foram rapidamente ao armazém,
compraram munição e saíram. Seus cavalos
eram velozes e não se cansavam facilmente.
Não importava qual fosse a dianteira de
Scott. Sabiam que o apanhariam em pouco
tempo.
— Não se preocupem, patrões — falou
Scar aos Merryl. — Pepe e Miguel são
meus melhores assassinos e cavaleiros
experientes. Quando recebem uma missão,
cumprem-na a todo custo. Scott Nelson já
pode se considerar um homem morto.
— Assim espero. Enquanto esperamos,
vamos até a Cantina do Juan tomar um
pouco de vinho. Tudo isso me deixou
sedento — propôs Bob.
Todos aceitaram o convite.
Enquanto isso, Scott fugia, mas teve a
infelicidade de fazer seu cavalo pisar num
buraco. Quase foi derrubado da sela, mas o
fogoso e valente animal conseguiu manter-
se em pé.
O rancheiro desceu e examinou a pata do
animal, que mancava.
— Maldição! Se estão atrás de mim,
estarei perdido — disse ele para si mesmo.
Tirou o lenço do pescoço e enfaixou a
pata do animal. Não poderia forçá-lo nem
montá-lo. O animal, com um bom descanso,
ficaria bom, pois não quebrara o osso.
Estava terminando de fazer isso, quando
ouviu um galope aproximando-se.
— Ei, Scott, algum problema? —
indagou um vaqueiro, velho conhecido dele.
— Olá, Bill. Estou com um problema
sim, como pode ver.
— Quebrou a pata do cavalo?
— Não, ele pisou num buraco, mas não
quebrou, felizmente. Terá de ficar de
repouso. E nem meu ele é.
— Sim, eu o reconheço. Pertence a Helen
Fulton, não?
— Exatamente, Bill. Eu preciso mesmo ir
a Phoenix. Vou lhe propor um negócio
irrecusável. Tenho aqui comigo... cinco
dólares — falou o rancheiro, após conferir o
dinheiro que tinha em um dos bolsos.
O restante, que seria usado para pagar o
armazém, estava reservado no bolso traseiro
de sua calça e iria precisar dele para a
viagem.
— Quer comprar meu cavalo, Scott?
— Sim, cinco dólares é um bom preço
por esse pangaré, não?
— É um bom preço, Scott. Eu poderia
comprar um bom cavalo lá no Estábulo do
Hank, na cidade, mas vou ter de andar até
lá. Não poderei montar o outro cavalo.
Certamente você deseja que eu o leve para
Helen, não?
— Exatamente. Por favor, Bill, você tem
que aceitar. Preciso mesmo ir para Phoenix
e vou ser sincero com você. Os Merryl estão
atrás de mim. Se você não me ajudar, eles
vão me pegar — confessou o rancheiro.
— Assim é diferente, Scott — disse Bill,
desmontando. — Não gosto daquela gente.
Faremos o seguinte negócio. Eu lhe vendo o
cavalo e você me dá seu cinturão. Sempre
cobicei suas armas, Scott.
— Com uma condição. Quando eu voltar,
você me vende o cinturão e as armas de
volta pelo dobro do preço. Não poderia ficar
sem elas.
— Parece justo — concordou o vaqueiro.
Scott deu-lhe os cinco dólares e o
cinturão.
— Obrigado, Bill! Você salvou minha
vida — disse Scott, partindo rapidamente.
Bill examinou o cavalo. Não poderia
montá-lo mesmo. Segurou a rédea a
começou a caminhar na direção da cidade.
Estava satisfeito com o negócio,
principalmente por estar usando as armas de
Scott.
Algum tempo depois, parou num riacho
para tomar água e descansar. Foi quando os
dois cavaleiros aproximaram-se
velozmente. Quando pararam diante dele,
olharam o cinturão e as armas que ele
usava.
— Belas armas, gringo! — falou Miguel.
— São únicas. Não há iguais em todo o
território — afirmou Bill, orgulhoso.
— O que houve com seu cavalo?
— Machucou a pata em um buraco.
— Seu nome é Scott Nelson? — indagou
Pepe, que mantinha nas mãos sua escopeta,
pronta para atirar.
Bill percebeu logo o que estava
acontecendo. Aqueles homens eram
assassinos a mando dos Merryl e estavam
atrás de Scott para matá-lo. Não podia
deixar isso acontecer. Scott estava
desarmado.
— Estas são as armas de Scott Nelson —
afirmou ele, tentando sacá-las.
Pepe apenas estendeu o braço e disparou
a escopeta na direção da cabeça do
vaqueiro.
Seu crânio partiu-se todo com o impacto
de uma carga de chumbo grosso.
— Idiota! — falou Miguel, desmontando.
— Teve muito azar de machucar a pata do
cavalo — acrescentou, tirando o cinturão
que Bill usava.
— Vamos levar as armas e o cavalo.
Provarão que o matamos.
— Tem razão — concordou Miguel,
apanhando a rédea do cavalo de Helen e
prendendo-a no arção de sua sela.
— E o cadáver?
— Vamos jogá-lo no rio. Os peixes e os
abutres darão cabo dele.
Após completar o trabalho, os dois
retornaram à cidade. Foram encontrar seus
patrões bebendo e conversando na cantina.
— Vocês o pegaram? — indagou Scar.
— Sim, trouxemos isso e o cavalo como
prova — falou Pepe, exibindo o cinturão.
— Deixem-me ver isso — pediu Bob.
Scar apanhou-o e o pôs sobre a mesa.
— Reconhecem?
— Sim, são de Scott. Suas armas sempre
foram as mais bonitas da cidade —
confirmou Bob. — Trouxeram o cavalo
também?
— Sim, está lá fora.
— Quero ver isso — comentou Oscar.
— Por quê? — quis saber Bob.
— Scott veio para cá de carroça. Alguém
emprestou-lhe um cavalo para fugir. Quero
saber quem foi.
Oscar foi até a porta. Reconheceu logo o
cavalo pertencente a Helen. Voltou furioso
para a mesa onde estava seu irmão.
— Helen emprestou o cavalo para ele.
— Maldição! — falou Bob. — Aquela
garota insiste em nos desafiar. Acho que
precisa de uma lição. Que tal irmos lá agora
mesmo resolver essa questão?
— Não acho isso é prudente —
aconselhou o xerife. — Depois que Scar a
chicoteou, Helen não se separa de sua arma.
Se vê-los, vai atirar primeiro e perguntar
depois.
— Ted tem razão, Bob. Não precisamos
nos preocupar com Helen.
— Tem razão. Agora que Scott está
morto, ela não nos incomodará mais.
Mesmo assim, adoraria ir lá e fazê-la ter
mais respeito para conosco — falou Bob,
impaciente.
— Acalme-se, por enquanto. Helen não
nos dará mais trabalho. Agora precisamos
comemorar nosso sucesso. Com a posse do
rancho do Scott, temos quase todo o vale
em nossas mãos — disse Oscar, mandando
vir mais bebidas.
Todos foram convidados a brindar com
eles. Ninguém se recusou. Alguns por
medo, outros por serem da mesma laia.
Bebiam e conversavam animadamente,
quando, repentinamente, Helen entrou na
cantina, portando uma espingarda.
— O que fizeram com Scott, seus
covardes? — indagou ela, corajosamente.
Todos olharam na direção dela. Aquela
espingarda engatilhada tirava o ímpeto de
qualquer um que quisesse reagir. Scar fez
sinal para seus homens que estavam num
canto do balcão, dando-lhes a entender que
deveriam sair pelos fundos e apanhar Helen
pelas costas.
— Scott está morto — afirmou o xerife.
— Quem o matou? — indagou ela.
— Não vem ao caso. Ele seria justiçado
da mesma forma. Era um ladrão de cavalos
nojento e merecia ser linchado.
— Se disser mais uma vez isso, xerife,
esqueço que tem essa estrela de lata no
peito e o faço engolir duas cargas de
chumbo grosso. Scott era um homem
honesto. Jamais faria isso.
— Agora não adianta mais chorar por ele.
Está morto e pronto. O melhor que você tem
a fazer é acalmar-se. Só está conseguindo
arrumar encrencas para você com isso.
— Pois eu insisto em saber quem matou
Scott, xerife — insistiu ela, empunhando
firmemente a arma.
Os pistoleiros que haviam saído pelos
fundos estavam na porta agora, mas
hesitavam, evitando atacá-la. Se a
espingarda que ela trazia engatilhada
disparasse, levaria para o inferno todos que
estavam à frente dela.
— Procure se acalmar, Helen. Ficou
provado isso. Eu e meus auxiliares
estivemos no rancho de Scott, onde
achamos mais de cinqüenta cavalos
pertencentes ao Rancho Merryl — afirmou
o xerife.
— Scott não tinha motivos nenhum para
roubar pangarés do Rancho Merryl. Ele
tinha os melhores cavalos de todo o vale.
— Não há argumentos contra as provas
que encontrei lá, Helen. Está cometendo um
erro...
— De qualquer forma, Scott tinha direito
a um julgamento, mesmo que tivéssemos
que mandar buscar um juiz em Phoenix.
Agora, pela última vez, diga-me quem o
matou. Caso contrário, atirei nos Merryl —
ameaçou ela, apontando na direção dos dois
irmãos.
— Fomos nós que matamos esse tal
sujeito — disse Pepe, adiantando-se na
companhia de Miguel.
— Vocês foram juiz e carrasco de Scott.
Isso me dá o direito de ser a mesma coisa
para vocês dois — disse a garota, virando a
espingarda na direção dos dois, sem lhes dar
a menor chance de reação.
O peito de Pepe se esfacelou. A cabeça
de Miguel simplesmente sumiu. Os dois
corpos desabaram no assoalho encardido da
cantina. Uma enorme mancha de chumbo e
sangue marcou a parede atrás dos
cadáveres.
— Peguem-na agora — gritou Scar.
Os pistoleiros entraram e seguraram a
garota firmemente.
— Foi uma tolice sua, Helen. Está nos
dando motivo para linchá-la agora mesmo
— falou Bob, possesso.
— Esperem, rapazes! — pediu o xerife.
— Sou obrigado a lhes pedir que me
deixem fazer a coisa legalmente. Helen
cometeu um duplo homicídio. Terá um
julgamento justo, depois será enforcada em
praça pública.
— Por mim eu a enforcaria agora mesmo
— falou Scar, lamentando pelos dois
pistoleiros mortos.
— Não, acho que o xerife tem razão —
opinou Oscar. — Servirá como exemplo a
todos que pensarem em se opor a nós.
— E quando será esse julgamento,
xerife? — quis saber Bob.
— Assim que o juiz itinerante passar por
aqui, em uma ou duas semanas, quem
poderá saber? Até lá, Helen vai ficar na
cadeia.
— Acho que está ótimo. Com isso
acabam todas as nossas preocupações —
falou Bob.
— Pois agora que elas vão começar, seus
covardes — gritou Helen.
— O que quer dizer com isso? —
indagou o xerife.
— Esperem e verão o que vai lhes
acontecer...
— Essa víbora traiçoeira preparou
alguma para nós. O que terá feito? —
indagou Bob ao irmão.
— Vamos arrancar isso dela.
— Não precisarão ter esse trabalho,
covardes. Eu lhes contarei. Quero ver a
preocupação em suas caras e o terror em
seus olhos.
— Fale logo, sua cascavel, ou mandarei
um de meus homens chicoteá-la até a morte
— gritou Oscar, exasperado.
— Já está com medo, não? Isso é bom.
Ficarão mais apavorados ainda quando
souber que um Delegado Federal, em
Phoenix, vai tomar conhecimento do que
aconteceu aqui.
— E quem vai nos denunciar?
— Eu já fiz isso. Assim que Scott saiu da
cidade, fui ao correio e despachei uma carta
para Phoenix, pedindo ajuda.
— Está mentindo só para nos
impressionar — falou Ted, sem conseguir
esconder coma preocupação com o fato
— Quando passa o cavaleiro do Correio
Expresso? — quis saber Bob.
— Passou hoje, há uns vinte minutos —
informou Helen. — Já está levando a carta.
E vocês não conseguirão jamais pegá-lo.
— Maldição! Eu devia matá-la agora
mesmo — ameaçou Bob.
— Calma, Bob — pediu o xerife. — Não
vamos nos precipitar. Nada fizemos de
ilegal até agora, lembram-se? Helen
também terá um julgamento justo. Seu
enforcamento é inevitável. O que um
Delegado Federal teria a fazer aqui?
— Ted tem razão mais uma vez, Bob.
Não precisamos nos preocupar com nada.
Por mais que falem ou comentem, não há
provas de que cometemos algum crime.
— Acho que vocês têm razão, mas a
presença de um delegado aqui vai nos
incomodar, de qualquer maneira.
— Não se tomarmos todas as precauções
e agirmos sempre protegidos legalmente
pelo xerife. Agiremos sempre com a lei do
nosso lado.
— Não fiquem tão tranqüilos, covardes!
Tenho um amigo que é delegado federal, a
quem enderecei a carta. Mesmo que eu seja
enforcada, ele vai investigar tudo a fundo e
não descansará enquanto não estiver
satisfeito com tudo.
Oscar sorriu ironicamente.
— Leve-a, Ted. Ela está nos aborrecendo
— pediu Oscar.
O xerife atendeu-o imediatamente.
Enquanto ele levava Helen para a cadeia, os
dois irmãos confidenciavam.
— Não gostei dessa idéia de ter um
federal por aqui.
— Também pensei o mesmo. Detestaria
alguém bisbilhotando nossos negócios. O
que tem em mente, Oscar?
— Doravante vamos manter vigiadas as
entradas da cidade. Destacaremos nossos
pistoleiros para isso. Se precisarmos de
mais homens, entraremos em contato com
Glenn, que nos mandará mais lá de El Paso.
Vamos interrogar e revistar todo forasteiro
que aparecer por aqui. Se descobrirmos o
federal entre eles, nós o mataremos, antes
que chegue à cidade.
— Certo. Assim, caso eles mandem outro
mais tarde, todos na cidade serão unânimes
em confirmar que o federal jamais esteve
aqui.
— Excelente! Vou pedir ao Scar que
tome conta de tudo.
As ordens foram dadas e os pistoleiros
foram instruídos. Com isso os dois irmãos
esperavam barrar a chegada do delegado
federal amigo de Helen.
Enquanto isso, ela esperaria na cadeia,
torcendo para que ele chegasse antes de sua
condenação à morte.
Sabia que não teria defesa. Os Merryl
tinham muitas testemunhas do que ela fizera
e, possivelmente, muitos de seus pistoleiros
acabariam sentados no banco dos jurados,
facilitando a realização daquela farsa.
Sua única chance de viver era que seu
amigo estivesse em Phoenix, quando a carta
chegasse.
Algumas semanas depois, num ponto da
estrada, afastado da cidade, dois homens
conversavam. Não pareciam muito
animados com o trabalho que faziam, que
parecia ser muito monótono.
— Gostaria de estar na cidade agora —
falou o pistoleiro encostado numa pedra.
— Sim, deve estar movimentado por lá
— disse o outro, que treinava sua rapidez no
saque.
— Acha mesmo que ela vai ser
enforcada?
— Não tenho a menor dúvida. Você
também estava lá, viu quando ela atirou nos
mexicanos a queima-roupa.
— Bem, se ela não fizesse isso, eles iam
atirar nela.
— E daí? Acha que alguém teria peito de
testemunhar que foi legítima defesa? Isso
deixara os Merryl contrariados, o que seria
muito perigoso, não?
— É, mas vai ser uma pena que ela seja
enforcada. É uma garota muito bonita.
— É como qualquer outra garota de
saloon... — ia dizendo o pistoleiro, mas
calou-se, aguçando os ouvidos.
— Ouviu alguma coisa, Morris? —
indagou.
— Sim, Pitt. Um cavaleiro vem
chegando.
— Parece bêbado ou muito alegre. Está
cantando, pode ouvir?
— Sim e arranha muito mal o banjo.
Os dois foram para o meio da estrada.
Um cavaleiro, vestindo uma capa de viagem
empoeirada, cavalgava com uma das pernas
cruzadas sobre a sala, apoiando sobre ela
um banjo desafinado.
— Que tipo mais estranho — comentou
Morris.
— Não dá para ver se ele carrega uma
arma, mas não tem cara de delegado federal.
— Será que devemos expulsá-lo daqui?
— Não sei... Parece-me inofensivo.
Vamos pará-lo.
Os dois agitaram os braços diante do
cavalo, que espantou-se, derrubando seu
cavaleiro.
— Que diabos estão fazendo? —
protestou ele, levantando-se e espanando a
poeira.
— Aonde pensa que vai, forasteiro?
— Acho que tem um povoado aí na
frente, não?
— Sim, o que vai fazer lá?
— Não sei... Talvez procurando
trabalho...
— Se quer um conselho, dê a volta e
tome outro rumo. Nada encontrará lá.
— Mas eu não quero ir para outro lugar.
— Deixe de ser idiota, homem. Faça o
que estamos mandando e não crie caso —
falou Morris, com rispidez.
— De onde está vindo? — indagou Pitt,
achando aquele sujeito muito estranho.
— Venho de longe — respondeu o
homem, olhando-o fixamente.
Era alto e forte. Seu olhar tinha a têmpera
do aço, o que intimidou o pistoleiro.
Como estava acompanhado, manteve-se
firme, mas não muito confiante.
— Monte seu cavalo e dê o fora daqui
agora mesmo. Tem um minuto para fazer
isso — determinou Morris.
— Está bem. Não vamos discutir por
causa disso. Posso apanhar meu banjo?
— Sim, claro — respondeu Morris,
olhando para Pitt e sorrindo de modo
especial.
Quando o forasteiro se abaixou para
apanhar o banjo, Morris e Pitt sacaram suas
armas ao mesmo tempo e dispararam
diversas balas sobre o instrumento,
estraçalhando-o.
— Não deviam ter feito isso — falou o
forasteiro, endireitando o corpo.
— Por que, não gostou? — zombou Pitt.
— Realmente não — respondeu o
forasteiro, desabotoando a capa e jogando-a
para trás.
Os dois pistoleiros viram, então, um Colt
reluzente num coldre tipo Slim Jack,
próprio para saque rápido.
Sem qualquer aviso, o desconhecido
sacou sua arma com incrível rapidez.
O sorriso e os dentes de Pitt afundaram-
se para dentro de sua boca, levados por uma
bala certeira.
Morris, mesmo com a arma na mão, não
teve tempo de puxar o gatilho. Uma bala
ensangüentou-lhe o rosto, jogando-o de
costas na poeira da estrada.
— Não deviam ter feito aquilo com meu
banjo — disse o forasteiro, olhando os dois
corpos estrebuchando.
Implacavelmente ele disparou mais duas
vezes, pondo fim à agonia dos dois feridos.
— Não suporto ver um animal sofrer —
disse ele, indo recolher o que sobrara de seu
banjo. — Vai ser impossível consertá-lo,
velho amigo. Adeus! — acrescentou,
atirando-o longe.
Depois montou seu cavalo e foi na
direção do povoado. Ao chegar lá,
estranhou toda aquela movimentação.
Como havia cavalgado durante muito
tempo, resolveu molhar a garganta e obter
as respostas que desejava no saloon.
Assim que ele entrou, Judy olhou-o com
surpresa. Havia muito tempo um forasteiro
não entrava na cidade.
— O que deseja? — indagou ela,
encostando-se ao lado dele, no balcão.
O saloon estava vazio naquela hora.
— Primeiro uma cerveja, depois um
banho quente — respondeu ele, sorrindo em
resposta.
— Acabou de chegar, não?
— Sim, ainda estou com a garganta cheia
de poeira.
— Estou admirada que tenha conseguido
isso. Normalmente os homens dos Merryl
não permitem a passagem de forasteiros.
— Bem que tentaram... Dois tipos me
pararam, quando eu vinha chegando.
— E como conseguiu convencê-los a
deixá-lo passar?
— Matei-os.
Judy olhou-o com surpresa e respeito.
— Você matou dois homens dos Merryl?
— Sim — afirmou ele, interrompendo a
conversa para tomar metade do copo de
cerveja de uma só vez. — Desculpe-me, é
que eu estava mesmo com muita sede.
— Posso compreender isso. Parece que
veio de longe, não?
— Sim, de muito longe. Por que toda
aquela movimentação lá fora?
— Estão todos ansiosos pelo julgamento.
— Que julgamento?
— Um dos atos mais covardes de toda a
história daqui.
— Diga logo. Está me deixando curioso.
— Vão julgar Helen Fulton, a dona deste
saloon, por matar dois pistoleiros nojentos.
O forasteiro olhou Judy com assombro.
— Vão julgar Helen? Por que ela fez
isso?
— Ficou furiosa porque eles mataram um
amigo dela. E com certeza ela será
enforcada. As testemunhas todas trabalham
para os Merryl. Os que não pertencem ao
rancho deles são covardes demais para dizer
a verdade.
— Devo presumir que Helen é inocente...
— Não tenha dúvidas quanto a isso.
Apenas usou a lei das armas e vingou seu
amigo. Mas você fala como se a
conhecesse...
— Claro que a conheço! Aliás, estou aqui
por causa dela.
— Como é seu nome? — indagou ela.
— David Garret.
— Sou Judy. Helen falou muito em você
— disse a garota, aliviada com a chegada
dele a tempo de salvar Helen. — Venha,
não devemos ficar conversando aqui. Logo
começarão a chegar os fregueses. Eu vou
preparar um banho quente para você.
Conversaremos, então.
No Rancho Merryl, os dois irmãos
demonstravam sua satisfação com o
andamento de seus planos.
— O enforcamento de Helen será uma
demonstração de nossa força — disse
Oscar.
— Sim, nunca mais nos incomodará.
— E aquela história do delegado federal,
será que ela fez realmente aquilo?
— Acho que ela blefou. De qualquer
modo, os homens que estão mantendo
vigília saberão o que fazer, se ele aparecer.
E depois, um delegado federal apenas não
poderá conosco. Temos muitos homens.
Com os novos que chegaram de El Paso,
temos um verdadeiro exército trabalhando
para nós.
— O que tem nos custado um bom
dinheiro.
— Isso é o de menos. Em breve todo o
vale será nosso. Com o contrato do
Exército, teremos um lucro fantástico.
— Você me fez lembrar de algo. Curley
Ross tem uma partida de cavalos muito boa,
ainda sem marcas em seus pastos.
— Mande Scar cuidar disso. Já esgotei
minha paciência.
— Vou mandá-lo cuidar disso. O dia é
propício. Com o julgamento de Helen, todo
mundo está indo para a cidade. Os ranchos
ficarão vazios.
— Bem lembrado, irmão. Vou cuidar
disso agora mesmo,
Algum tempo depois, Scar ia ter com
eles.
— Curley Ross tem uma partida muito
boa de cavalos. Vá lá e compre os cavalos
dele. Pague dois dólares por cabeça. Traga
os animais para cá e mande pôr a nossa
marca.
— E se ele não quiser vender?
— Convença-o.
— Entendi — disse o pistoleiro, sorrindo
cinicamente.
Assim que saiu, Scar reuniu alguns
pistoleiros e diversos vaqueiros, tomando
rumo do rancho de Curley Ross.
Quando chegaram lá, Curley e sua esposa
estavam saindo para ir à cidade, assistir ao
julgamento de Helen.
— Olá, rapazes! — cumprimentou ele,
demonstrando logo sua insatisfação com a
presença deles ali.
— Como vai, Sr. Ross? — cumprimentou
Scar, de olho na jovem esposa do rancheiro.
Este percebeu os olhares descarados do
pistoleiro, mas nada podia fazer. Ficou
apenas na defensiva, diante daquele bando.
— O que desejam? — indagou.
— Soubemos que tem um lote de bons
cavalos.
— Sim, mas não estão à venda.
— Vocês ouviram isso, rapazes? Ele cria
cavalos para guardá-los — disse o pistoleiro
e seus homens riram com ele.
— O que foi? Eu disse alguma piada? —
indagou o rancheiro.
— Sim, uma boa piada, idiota.
— Modere a língua pistoleiro —
ameaçou Curley.
— Pensando bem, não viemos aqui
comprar seus cavalos...
— Então caiam fora de meu rancho!
— Viemos roubar seus cavalos —
zombou Scar.
— Roubar? Você é muito descarado
mesmo...
Alguns vaqueiros do rancho, quando
perceberam o que estava havendo, trataram
de agrupar-se, esperando encrenca.
— Seus cavalos são bons e estão sem
marcas. Nada poderá provar, depois que
eles forem marcados...
— Aqueles seus patrões são duas
cobras...
— Modere a língua quando falar deles —
rugiu Scar.
— Não me assusta, pistoleiro. Dou-lhes
um minuto para sumirem da minha frente
— falou Curley, levando a mão à arma.
Seu movimento foi lento demais. Scar
sacou sua arma com rapidez e meteu duas
balas no peito do rancheiro, que desabou de
cima da carroça.
Ao verem o patrão cair morto, os
vaqueiros do rancho levaram as mãos às
coronhas de suas armas.
Os homens que acompanhavam Scar
eram especialistas nesse tipo de coisa.
Estavam prontos para a ação e o inferno
abateu-se sobre os pobres vaqueiros. Foram
literalmente fuzilados.
Quando a fuzilaria terminou, estavam
todos mortos ou estrebuchando, numa
mesma poça de sangue.
Com o tiroteio, o cavalo da carroça onde
ainda estava a esposa de Curley disparou.
— Vou atrás dela — falou Mike, um dos
pistoleiros.
— Deixe-a ir. Vamos levar os cavalos.
— De ela for à cidade, vai nos denunciar
ao xerife.
— Ele saberá como agir. Afinal, é pago
para isso.
— Mesmo assim, gostaria de ir. Ela é
uma mulher muito bonita — insistiu o
pistoleiro.
— Entendi, seu safado! Pode ir. Depois
você me conta como foi.
O pistoleiro esporeou seu cavalo e saiu
em perseguição à carroça. Rose, a
condutora, conseguira controlar o animal,
mas chicoteou-o ao ver-se perseguida.
O pistoleiro, no entanto, era um excelente
cavaleiro e em poucos instantes seu animal
já corria paralelo à carroça.
— Vamos lá, beleza. Pare essa carroça. O
velho Mike só deseja falar com você um
pouquinho...
— Afaste-se de mim, seu animal! —
gritou ela, tentando acertá-lo com o chicote.
Ao receber uma chicotada no braço, Mike
ficou ainda mais excitado e decidido.
Apoiou-se apenas num dos estribos e saltou
para o cavalo que puxava a carroça.
O perigo divertia-o. A recompensa era
uma bela mulher e nada mais importava
para ele. Segurou as rédeas com firmeza,
puxando-as com força e parando o animal.
Rose, desesperada, viu o rifle de seu
marido no fundo da boléia. apanhou-o e
engatilhou-o, apontando-o para o pistoleiro,
que saltou do cavalo, olhando-a.
— Calma, beleza! Não vou machucá-la.
Só quero conversar com você — disse ele.
— Fique aí mesmo ou vou matá-lo...
— Fique calma... Você não vai ter
coragem de atirar em mim, vai? — disse
ele, caminhando lentamente na direção dela.
Ao sentir a aproximação dele, Rose não
hesitou em apertar o gatilho. Mike rodopiou
e caiu na poeira, ferido mortalmente na
barriga.
Tentou sacar sua arma ainda, mas Rose
não lhe deu chance. Pensou no que haviam
feito com seu marido e apertou novamente o
gatilho. O corpo do pistoleiro ficou imóvel
numa poça de sangue. Ela retomou as
rédeas do cavalo e chicoteou-o na direção
do povoado.
Naquele momento, na cidade, David
Garret acabava de tomar um banho e de
ouvir o relato de Judy.
— Como vê, são uma praga que precisa
ser exterminada deste vale para que possa
haver justiça e paz.
— Mas se é como você disse, as coisas
são difíceis de resolver. Se o xerife lhes dá
cobertura, fica difícil encontrar uma brecha
para pegá-los.
— Bem, essa é toda a história —
finalizou ela.
— Vou precisar apresentar provas aos
meus superiores. Se alguém tiver coragem
de desafiar os Merryl e apresentar uma
queixa, tudo ficaria mais fácil.
— Então desista. Todos são uns covardes
e temem os Merryl.
— Quantos homens você calcula que
trabalham para ele?
— Uns cinqüenta pistoleiros, além de
todos os vaqueiros.
— É muita gente para um homem só
enfrentar, mas em breve receberei ajuda.
— Verdade? Então virá um contingente...
David riu, enquanto afivelava seu
cinturão.
— Não, mais um homem, apenas.
— E o que apenas dois de vocês poderão
fazer?
— Confie em nós.
— Tenho de confiar, pois Helen pode ser
enforcada. Não há como você impedir isso,
sendo um delegado federal?
— Não porque o julgamento tem ares de
legal. Se ao menos encontrássemos alguém
para depor a favor dela, confirmando a
legítima defesa.
— De nada adiantaria. O júri não vai
hesitar em mandá-la para a forca só para
agradar os Merryl.
— Posso assumir a custódia dela após o
julgamento ou, então, tentar transferir o
julgamento para um condado neutro.
— Acha que isso daria certo?
— É o que posso tentar fazer. Para que
horas está marcado o julgamento?
— Para as três da tarde. O que pretende
fazer?
— Vou dar uma olhada por aí...
— Fique alerta! Os pistoleiros dos Merryl
não apreciam forasteiros.
— Eu já não aprecio os pistoleiros dos
Merryl. Assim, estamos quites — afirmou
ele, deixando o quarto.
Judy olhou com admiração aquele
homem decidido e corajoso. David desceu
para o saloon, que começava a encher-se
àquela hora. Todos falavam no julgamento.
Ele foi até a porta. Uma carroça estranha,
fechada, com letreiros coloridos passava
diante do saloon naquele momento.
David desceu até a rua. O condutor da
carroça, um homem de longas barbas e
bigode olhou para ele e sorriu. O delegado
federal acenou com a cabeça, retribuindo o
cumprimento.
De repente, uma carroça surgiu em
disparada, entrando pela rua principal do
povoado. Uma mulher, na boléia, gritava
por socorro.
A carroça parou diante do xerifado, numa
nuvem de poeira. O xerife, alertado pela
confusão, surgiu à porta.
— Que diabos está acontecendo aqui Sra.
Ross? — indagou.
— Eles mataram meu marido — falou
ela, desesperada.
O xerife percebeu logo do que se tratava.
Levou a mulher para dentro e dispersou os
curiosos. David assistiu a tudo aquilo com
especial interesse.
— Quem é aquela mulher? — indagou
ele a Judy, que também deixara o saloon na
hora da confusão.
— É a esposa de Curley Ross, um criador
de cavalos..
— Ela disse que o marido foi morto...
— O que vem comprovar tudo que eu lhe
disse. Pode ter certeza que foi obra dos
Merryl. Ted a levará na conversa e darão
sumiço nela. Na falta de herdeiros, os
Merryl tomarão posse do rancho,
acobertados pelo xerife.
— Que patifaria! — falou David,
indignado, verificando se sua arma saía fácil
do coldre. — Acho que vou tentar agora
mesmo conseguir uma prova para
apresentar aos meus superiores.
— Vai se meter em encrencas...
— Isso é o de menos — falou ele,
atravessando a rua.
A carroça colorida estava parada não
muito longe do xerifado e o condutor
apregoava as virtudes milagrosas do único e
verdadeiro Elixir Mágico.
David entrou decididamente.
— Estou ocupado, volte depois — disse o
xerife, levantando a cabeça para olhá-lo.
— Vai interrogar aquela mulher que
trouxe para dentro? — indagou David, com
autoridade.
— Sim, mas isso não é da sua conta,
estranho.
— Eu lhe digo o contrário, xerife. Quero
assistir o depoimento dela.
Alguns pistoleiros dos Merryl que
estavam aglomerados por ali, haviam se
aproximado da porta e olhavam para dentro
com curiosidade.
Ao vê-los, Ted Quincy ficou mais
confiante.
— Não sei quem é, mas posso prendê-lo
por desacato...
— Você não tem autoridade para isso,
xerife.
— Não vamos discutir isso agora. Há
homens atrás de você que não hesitarão em
matá-lo se eu ordenar.
— Ordene então, xerife. Posso matá-lo
antes que qualquer um deles saque sua arma
— disse David, sacando seu Colt com uma
rapidez espantosa. — Está praticando um
tipo estranho de justiça aqui nesta cidade,
xerife. Não gosto nem um pouco disso —
afirmou David, mostrando sua credencial de
delegado federal.
O xerife empalideceu, suando frio. Os
pistoleiros atrás de David hesitaram,
dispersando-se rapidamente.
— Onde está a mulher que trouxe para
cá? Quero falar com ela.
— Está lá nos fundos, numa das celas...
— E por que a trancou?
— Ela estava muito nervosa... Deixei-a lá
para se acalmar...
— É um mentiroso e covarde, xerife. Vai
lamentar isso quando eu terminar com você.
Agora abra logo aquela porta — ordenou,
rispidamente.
Sem outra alternativa, Ted abriu a porta
que levava ao corredor das celas.
— Fique aqui fora! Eu o chamarei se
precisar. E não tente nenhum truque. Sei de
suas trapaças e não vou tolerá-las. Se você
se meter a engraçadinho comigo, vou lhe
dar o mesmo destino que dei aos pistoleiros
que vigiavam a entrada da cidade.
— Está bem... Está bem... — gaguejou
Ted, limpando o suor frio que lhe escorria
pela testa.
Assim que David entrou pela porta, Ted
correu para fora à procura dos homens dos
Merryl.
— Que diabos está havendo lá dentro,
xerife? — indagou um pistoleiro chamado
Joe Bigfeet.
— Seus amigos incompetentes deixaram
passar um delegado federal...
— Maldição! Como ele conseguiu isso?
— Não importa como. A questão é que
ele está aqui, disposto a arrumar encrenca. E
os Merryl não vão gostar nada disso. Vamos
dar um jeito na situação agora mesmo.
Quero um homem naquele telhado. Um em
cada lado do xerifado, para quando ele sair
e o restante nos becos em frente da cadeia.
Quando ele sair, quero uma chuva de balas
naquele bastardo arrogante — disse o
xerife, com ódio.
— Deixe conosco, xerife. Ele nem saberá
o que o acertou — prometeu Joe.
— Assim espero, para o nosso bem —
afirmou o xerife.
O delegado federal passou pela primeira
cela e julgou reconhecer a mulher estendida
no catre. Abriu a grade e entrou. Ela estava
deitada de bruços e pela abertura de seu
vestido, nas costas, percebia-se que sua pele
estava infeccionada. Segurou-a gentilmente
pelos ombros. Ela voltou a cabeça,
reconhecendo-o.
— David Garret? Graças a Deus! É você
mesmo? — indagou ela, surpresa,
levantando-se com dificuldade para abraçá-
lo.
— Helen, por Deus, o que fizeram com
você?
— Oh, David, que bom que tenha vindo
— soluçou ela.
— Está tudo bem agora, querida. Vou
tirá-la disso aqui. Mas o que houve com
suas costas?
— Fui chicoteada por uns capangas dos
Merryl. Fiquei sem cuidados aqui e as
feridas infeccionaram.
— Malditos Merryl! Quanto mais ouço
falar neles, mais os odeio — rugiu o
delegado.
— Como conseguiu entrar? — indagou
ela.
— Tive de esfregar minha credencial de
delegado no focinho dele..
— Fez mal. Agora você será caçado
impiedosamente.
— Estou pronto para eles...
— Os Merryl têm muitos cães para
farejarem e morderem por eles, David.
— Não se preocupe. Haveremos de sair
desta, como saímos daquela em Dodge City.
— Oh, sim. Você foi fantástico naquela
ocasião, mas agora as coisas mudaram um
pouco. Os Merryl são cachorros loucos,
nada os detém. São ambiciosos e
sangüinários.
— Discutiremos isso mais tarde. Antes
precisamos fazer um curativo em suas
costas, antes que piore.
— Isso vai cicatrizar. Minhas costas não
serão mais aquela beleza de antes, mas
ficarei satisfeita se conseguir permanecer
viva...
— Deixe-me ver esses ferimentos —
pediu ele.
Helen voltou-lhes as costas e abaixou o
vestido até a cintura.
— Se você for medicada, nem ficarão
cicatrizes — afirmou ele. — Providenciarei
isso imediatamente. Por que o xerife não fez
isso antes?
— Ele disse que seria trabalho perdido, já
que eu seria enforcada mesmo...
— Estranha justiça essa.
— Na verdade, o xerife é um lacaio
covarde dos Merryl, ninguém duvida disso.
— Cuidarei desse bastardo quando
chegar a hora. Fique tranqüila agora, vou
encontrar uma forma de tirá-la daqui...
A mulher que estava presa na outra cela
ouvia a conversa dos dois com muita
atenção.
— Você é mesmo um delegado federal?
— indagou Rose.
— Sim — confirmou ele.
— Então Deus ouviu as minhas preces —
desabafou a mulher.
David reconheceu-a. Era a mulher que o
xerife recolhera lá fora.
— Xerife! — chamou ele, possesso, pois
percebera que a cela estava trancada.
O homem da lei apresentou-se
rapidamente.
— Esta cela está trancada — disse David,
procurando a chave entre aquelas que tinha
na mão.
— Bem, é que...
— Pelo que sei, esta mulher é uma vítima
e uma testemunha, não uma prisioneira —
vociferou o delegado.
— Eu sinto muito, acho que foi um
descuido meu — disse, humilhado.
— Você não me convence, Quincy. Cada
vez gosto menos de você e mais da idéia de
meter-lhe uma bala nos miolos podres.
Humilhado, Ted Quincy retirou-se,
remoendo vingança.
— Muito bem, senhora! Conte-me o que
houve — pediu ele, após abrir a cela.
— Os capangas dos Merryl foram até o
rancho e exigiram comprar um lote de
cavalos que meu marido criava... Curley
não concordou e eles o abateram a tiros... —
soluçou ela.
Helen amparou-a. Com dificuldade ela
contou o que acontecera depois.
— Com toda certeza fizeram isso para
tomar posse do rancho, David. É a forma
como eles agem. Simplesmente se apossam
do que querem, não importa de quem seja.
David havia escutado tudo com muita
atenção. Os músculos de seu corpo estavam
contraídos, de tanta fúria.
— E isso aconteceu justo no momento
em que Curley havia se decidido a vir no
julgamento, Helen.
— Por que ele queria tanto vir? — quis
saber a garota.
— Curley sabia que iria arriscar a vida e
eu o apoiei, quando soube de sua decisão.
Ele sempre foi um homem e princípios...
— Ainda não entendi onde quer chegar,
Sra. Ross — observou David.
A mulher olhou para Helen, sorrindo com
simpatia.
— Curley achava que podia e devia
salvar a vida de Helen.
— Como? — surpreendeu-se a garota.
— Ele estava na cantina, quando tudo
aconteceu...
— Continue — pediu David, interessado,
já que aquele depoimento poderia trazer
alguma mudança na situação de Helen.
— Bem, naquele dia ele chegou em casa
nervoso e irritado com o que acontecera na
cantina. Contou que Helen havia agido em
legítima defesa, mas que todos lá ficaram
intimidados porque os dois mortos eram
homens dos Merryl.
— Confirma isso, Helen?
— Sim, David, mas em que isso me
ajuda?
— Sra. Ross, concorda em depor no
julgamento de Helen?
— Sim, claro. Farei qualquer coisa para
dar uma lição nesses covardes que mataram
meu marido.
— E apresentará uma queixa pelo roubo
dos cavalos e pela morte de seu marido?
— Quando quiser, delegado.
— Ótimo! Acho, então, que tenho o que
preciso para pegar os Merryl. Assassinato e
roubo de cavalo são punidos com a morte
neste território.
— Vai precisar de muita cautela e
perspicácia, David. Quando eles souberem
que Rose vai depor, ela se transformará em
alvo para as balas dos pistoleiros.
— Tem razão. Preciso pensar em algo —
disse ele, caminhando de um lado para
outro.
— David, antes de entrar nisso, por que
não procura alguma ajuda? — sugeriu
Helen.
— Já tenho toda a ajuda de que preciso,
Helen.
— Se ao menos Scott estivesse vivo...
Você poderia contar com ele.
— Não se preocupe com o Scott, ele está
vivo. Por que achou que ele estava morto?
— Mas... Eu vi o cinturão dele com os
mexicanos... Por isso matei aqueles dois...
— Depois você me conta isso tudo.
Agora acho que sei como agir com a Sra.
Ross. Tem para onde ir e ficar em
segurança?
— Sim, posso ir para a casa de minha
amiga, Penny De Morney.
— Sabe onde fica, Helen, para o caso de
precisarmos localizar a Sra. Ross?
— Sei, mas é muito longe, caso ela vá
comparecer no meu julgamento. O melhor é
ir até o saloon. Poderá entrar pelos fundos e
mandar chamar Judy, ela a esconderá.
— Volte para a cela, Helen. Acharei um
jeito de tirá-la.
O delegado, então, levou a Sra. Ross até a
sala do xerife.
— Xerife, solte esta mulher. Ela diz que
nada viu e que nada sabe. Uns
desconhecidos estiveram no rancho e
mataram o marido dela. Acho que deveria ir
investigar isso...
— Sim, eu o farei. Vou mandar meu
ajudante para lá.
Após a saída de Rose Ross, David foi se
sentar na cadeira do xerife. Preencheu um
papel, depois entregou-o ao homem da lei.
— O que é isto? — surpreendeu-se ele.
— Um mandato para prender os Merryl,
xerife.
— Como! — exclamou ele,
empalidecendo.
— Por que a surpresa, xerife? Tem medo
de fazer isso? Vai acobertá-los de novo?
Isso o tornará cúmplice deles.
— É um absurdo o que está dizendo,
delegado!
— Se é assim, então vá prendê-los.
— Está cometendo um erro delegado...
— Eu me responsabilizarei pelas
conseqüências...
— Não posso me ausentar da cidade.
Haverá um julgamento logo mais...
— Talvez não tenhamos um julgamento.
— Como assim?
— Não tenho de lhe dar satisfações,
xerife. O juiz já chegou?
— Sim, está no hotel...
— Então irei falar com ele. Vou
conseguir um adiamento para o julgamento
de Helen.
— Não sabe o que está dizendo... Está
comprando muito mais encrenca do que
pode imaginar.
— Você ainda não viu nada, xerife.
Agora saia daqui e vá fazer seu trabalho
antes que eu lhe meta uma bala na cabeça
— ameaçou David.
O xerife olhou-o cheio de ódio. Depois
apanhou seu chapéu e saiu furioso. Havia
sido humilhado como nunca fora antes em
sua vida. Ao sair, fez um sinal para os
homens que estavam de emboscada. Estes
logo compreenderam que o delegado sairia
logo e prepararam-se, engatilhando suas
armas.
David avisou Helen que retornaria em
breve, depois deixou o xerifado. Quando
pôs os pés fora da cadeia, alguém gritou.
— Cuidado, David!
Um disparo seguiu-se ao grito. O homem
que estava no telhado despencou para a rua,
levantando uma nuvem de poeira ao redor
de seu corpo sem vida.
David sacou sua arma e ficou atento. Os
outros emboscadores, tomados de surpresa,
resolveram desistir da armadilha e se
afastarem dali o mais depressa possível.
— Essa foi por pouco, obrigado! — falou
David, aproximando-se do homem que
estava na carroça do Elixir Mágico.
— Vi toda a movimentação deles. O
xerife estava de acordo com eles.
— Aquele patife! Eu devia tê-lo matado,
mas preciso dele para os meus planos de
apanhar os Merryl. Ele será uma boa
testemunha, quando tiver que salvar sua
maldita carcaça.
— Como vê, a situação aqui está feia,
não?
— Sim, mas folgo em vê-lo de novo.
Como conseguiu passar pelos guardas?
— Foi simples: quando cheguei, os
guardas estavam mortos. Achei que você
tinha chegado antes de mim. E Helen, você
a viu?
— Sim, ela está bem. Não se preocupe,
eu vou tirá-la de lá.
— Quando? — indagou o outro, aflito.
— Em breve, fique tranqüilo.
Um garoto estava por ali. David lhe deu
uma moeda para que fosse chamar o doutor
e mandá-lo cuidar de Helen, na cadeia.
— Mande-o receber a conta comigo
depois — avisou.
— Como está ela? O que houve? — quis
saber seu interlocutor, o condutor da carroça
e vendedor de elixir que não era outro senão
o próprio Scott Nelson disfarçado.
— Calma, ela está bem, já lhe disse. Foi
chicoteada, mas não é nada sério. O médico
cuidará dela.
— Aqueles covardes malditos! Quero
matá-los com minhas próprias mãos —
rugiu Scott.
— Acalme-se, você terá sua chance.
Vamos até o saloon conversar. Precisamos
traçar um plano de ação.
Foram, então, para o saloon. Judy
esperava ansiosa pela chegada de David.
— Ela está bem? — indagou ele,
referindo-se a Rose.
— Sim, vai ficar bem, não se preocupe. E
Helen?
— Não se preocupe com ela, está ótima.
Já conhece meu amigo aqui?
— É a ajuda que você esperava?
— Sim, ele mesmo.
— Fico encantada e aliviada em conhecer
um amigo de David — falou a garota.
— Deixe de frescuras, Judy — falou
Scott, confundindo-a.
— Você me conhece? — estranhou ela,
olhando-o.
— Sim e você também me conhece...
— Acho que está enganado. Eu não
esqueceria um... Espere um pouco! Santo
Deus! É você mesmo?
— Sim, eu mesmo, mas não fale meu
nome, Judy.
— Helen sabe que você está vivo? Ela
sofreu muito quando descobriu que você
estava morto...
— Eu? Morto? Que tolice? De onde
tiraram essa idéia?
Judy contou-lhe a respeito do cinturão
que os dois mexicanos tinham trazido,
supondo que fosse o dele.
— Aliás, foi isso que deu motivo a Helen
para matar os dois.
— Ela fez isso por mim?
— Sim, ficou realmente furiosa quando
concluiu que eles o tinham matado.
Scott sorriu, pensando nela.
— É uma mulher fantástica! Logo
poderei manifestar minha gratidão,
apertando-a em meus braços.
— Agora chega de conversas — disse
David. — Mandei o xerife prender os
Merryl. Duvido que ele faça isso.
— Só que isso vai ser o estopim que
explodirá o barril de pólvora desta cidade
— falou Judy.
— E quanto a Helen? — quis saber Scott.
— Vou cuidar disso agora mesmo.
Falarei com o juiz e conseguirei um
adiamento.
— Vai ser decisivo isso, David.
— Sabendo o que sei agora e com uma
boa testemunha para incriminar os Merryl,
como no caso da Sra. Ross, tudo será mais
fácil — disse David, contando-lhes sobre a
conversa que tivera com Rose.
— Pobre mulher! Está inconsolável com
a morte do marido.
David saiu logo em seguida e foi até o
hotel, onde falou com o Juiz Brenson. O
velho homem estava cansado e dolorido da
viagem, aceitando de bom grado a idéia de
um adiamento.
David voltou ao saloon e comunicou o
fato a Scott e Judy, que ficaram satisfeitos
com isso, pois agora haveria tempo para
livrar Helen das acusações.
Não muito longe do povoado, os
pistoleiros que haviam tentado emboscar
David agruparam-se.
— Maldição! Alguém viu quem deu
aquele primeiro tiro? — indagou o que os
liderava.
— Não, mas me parece que veio das
direção daquela carroça colorida.
Naquele momento, dois cavaleiros se
aproximavam a galope.
— É o Budd e o Thompson. O que será
que houve?
— O que houve, rapazes? — indagou
alguém aos homens que chegavam.
— Fomos substituir Pitt e Morris.
Encontramos os dois mortos. O que está
havendo na cidade? Chegou alguém novo
por lá?
— Sim, um delegado federal e um
vendedor de elixir mágico.
— Diabos, isso não podia ter acontecido.
Temos que ir até lá e resolver isso ou Scar
vai arrancar nosso couro.
— Se eu fosse vocês, pensaria duas
vezes. Tentamos matar o delegado federal e
nos demos mal..
— Pior vão ficar se voltarem ao rancho.
Acho que devemos ir até a cidade e matar
esses dois, levando suas cabeças numa
bandeja para nossos patrões.
— Acho que eles estão certos — falou
MacBrown, que liderava o grupo que saíra
corrido do povoado. — Se voltarmos dessa
forma, vamos ser mortos por Scar.
— Acha que nós poderemos dar conta
daquele delegado e do vendedor de elixir?
— Se usarmos a cabeça, acho que sim —
afirmou MacBrown. — Vamos localizá-los
e cercá-los.
— Talvez recebamos alguma recompensa
por isso — lembrou alguém. Nossos patrões
sempre se mostraram muito generosos.
— Sim, vamos lá, pessoal! — estimulou-
os MacBrown
Os dois homens conversavam no saloon,
alheios ao perigo que se aproximava.
— Com quem ficaram minhas armas,
Judy? — indagou Scott.
— Acho que as vi com Bob Merryl.
— Aquele bastardo! Sempre desejou tê-
las para si. Não merece usá-las. Vou
recuperá-las na primeira oportunidade.
Naquele momento, um grupo de seis
homens entrou no saloon. Judy percebeu
logo de quem se tratava.
— Cuidados, rapazes! Ali estão seis
capangas dos Merryl.
— Reconheço quatro deles — falou
Scott. — Estavam falando com o xerife
antes da emboscada contra você, lá na
cadeia.
— Se procuram encrenca, vão encontrá-
la — afirmou David.
— Atenção! Estão se espalhando.
— Judy, afaste-se — ordenou David.
A garota imediatamente buscou a
proteção ao lado da escada para o
pavimento superior, observando o
desenrolar dos acontecimentos. Os seis
pistoleiros estavam espalhados atrás dos
dois homens. Scott e David podiam vê-los
pelo espelho à frente deles.
— Não resta a menor dúvida que vieram
atrás de nós, David.
— Acham que podem se sair melhor,
espalhando-se assim.
— Vamos encará-los — decidiu Scott.
Os dois se voltaram e olharam
alternadamente para os pistoleiros. Os
freqüentadores do saloon perceberam
alguma coisa errada e trataram de sair da
linha de tiro.
— Vocês dois, forasteiros, como
passaram pela vigilância na estrada? —
indagou Budd.
— Eles estavam dormindo, quando passei
— falou David.
— Tem razão, havia dois homens
dormindo lá na estrada... — ironizou Scott.
— Deixem de piadinhas vocês dois.
Nossos amigos foram mortos e algo nos diz
que foram vocês.
— E se eu disser que você está certo, o
que fará? — indagou David, intimidando-
os.
Os pistoleiros remexeram-se, as mãos
próximas das coronhas dos Colts.
— Seremos obrigados a matá-los —
afirmou Budd.
— Por que não tentam fazer isso?
A decisão e a frieza nos olhos de David e
Scott intimidavam os pistoleiros.
— Vamos lá, Budd. Já falamos demais
com eles — disse MacBrown.
— Tem razão. Se eles querem assim... —
falou Budd, levando a mão à arma.
Os outros pistoleiros imitaram-no. David
e Scott, no entanto, já empunhavam seus
revólveres, disparando com rapidez e
pontaria. Não deram a menor chance aos
pistoleiros, baleando-os e espalhando
cadáveres pelo saloon.
Quando a fumaça dissipou-se, todos eles
estrebuchavam em poças de sangue.
— Tiveram o que mereciam — falou
David/
Diante do espanto dos presentes, Judy
apressou-se em dizer a todos quem era
David.
Quando souberam da presença de um
delegado federal, rápido no gatilho,
corajoso e decidido, os habitantes do
povoado manifestaram sua solidariedade.
— Quando penso que enforcariam Helen
só para agradar os Merryl, tenho vontade de
enforcá-los também — esbravejou o
delegado federal.
— Mas o que podíamos fazer? Não
sabemos usar as armas. Não há lei na
cidade. Eles têm os pistoleiros para nos
intimidar — defendeu-se um dos cidadãos.
— Não negue que vocês acharam muito
mais cômodo e seguro ficarem à sombra dos
Merryl do que enfrentá-los. Uma mulher foi
mais corajosa que todos vocês juntos e seria
enforcada por isso. Demonstraram covardia,
esta é a verdade.
— Espere aí, delegado, isso não lhe dá o
direito de... — ia dizendo um vaqueiro, mas
calou-se quando uma bala assobiou próximo
ao seu ouvido.
— Cale-se, covarde! Acho que não
entendeu ainda qual é o papel de um
delegado federal. Eu tenho a lei em minhas
mãos e, em momentos de emergência, sou o
juiz, o júri e o carrasco. E eu decido quando
é esse momento. Não gosto de covardes,
muito menos covardes que não assumem o
que são. Para que o Arizona seja um grande
Estado e não um território sem lei, é preciso
que esse tipo de coisa seja abominada pelos
cidadãos honestos.
Os homens calaram-se, envergonhados.
David ainda disse-lhes mais algumas
verdades, deixando-os arrasados.
— Vou lhes dar, agora, a chance de
provarem que não são covardes. Tenho
certeza que os Merryl e seus pistoleiros
estão vindo para cá agora mesmo. Quem
ficará do nosso lado? — indagou.
Todos se entreolharam surpresos e
assustados.
— Tenho mulher e filho... — disse um.
— Preciso voltar ao meu rancho... —
falou outro.
Todos tinham uma boa desculpa para dar
o fora.
— Seus covardes! — falou David. —
Caiam fora daqui senão eu estouro suas
cabeças vazias a bala — rugiu ele em
seguida, assustando a todos, que saíram
apressadamente.
— Foi muito duro com eles, David —
falou Judy.
— Tentei sacudi-los um pouco, mas isso
de nada adiantou. Ainda morrem de medo
dos Merryl.
— O que vamos fazer agora, David? —
indagou Scott.
— Conhece toda a região, não?
— Sim, como a palma de minha mão.
— Então vamos fazer uma visita ao
rancho do finado Curley Ross. Sua esposa
quer o corpo para sepultá-lo dignamente.
— Aquilo deve estar infestado de homens
dos Merryl.
— Eu se, mas iremos à noite.
— Certo, se é para atazanar a vida dos
Merryl, eu topo qualquer coisa.
Ted Quincy, escorraçado pelo delegado
federal, chegou ao rancho dos Merryl como
se tivesse o diabo em seus calcanhares.
Estava trêmulo de indignação e medo, pois
não sabia também como explicar aos dois
irmãos o mandato que David dera-lhe para
prendê-los.
— O que houve, Ted, parece que viu o
diabo? — observou Bob.
— É mais ou menos isso — disse o
xerife, desmontando.
— Algum problema?
— Sim, um maldito problema sério —
afirmou.
Bob levou-o para dentro. Nunca o tinha
visto tão nervoso e assustado. Ofereceu-lhe
um uísque, que Ted tomou com mãos
trêmulas.
— Nunca o vi assim, Ted. O que houve?
— quis saber Bob.
— Sabem quem está na cidade? Um
maldito delegado federal.
Os dois rancheiros empalideceram.
— Não sabe o que está falando. Temos as
estradas vigiadas... — falou Oscar.
— Sei disso, mas ele passou. Está lá na
cidade agora — disse Ted, contando-lhes
tudo que ocorrera lá.
— E que providências você tomou? —
indagou Bob.
— Havia alguns de seus homens por lá.
Ordenei que armassem uma emboscada para
o delegado, mas eles se acovardaram,
quando um deles foi morto. Fugiram como
ratos.
— Malditos covardes! Pagarão por isso.
Agora temos que resolver essa situação. Se
o delegado falou com a viúva Ross, deve
saber alguma coisa.
— Maldita mulher! Não sei como matou
Mike e ainda conseguiu ir para a cidade.
Devíamos matá-la logo. Cedo ou tarde
acabará falando. Sabe onde ela está, xerife?
— perguntou Oscar.
— Eu a vi refugiar-se no saloon de
Helen. Judy deve tê-la escondido.
— Daremos um jeito nisso, então.
— E quanto ao delegado federal? Ele me
deu um mandato para vir prendê-los.
Os dois irmãos riram da pergunta do
xerife.
— Esse delegado já está morto, xerife. É
carta fora do baralho.
— Como pretendem fazer isso?
— Jogando toda a nossa força contra ele
— sugeriu Bob.
— Como assim? — quis saber Oscar.
— Vamos mandar Scar e todos os
homens disponíveis para a cidade. Eles
provocarão o delegado e o matarão. A
cidade conhecerá nossa força e saberá que
ainda mandamos aqui.
— O que acha, Ted?
— Pode ser uma boa idéia. Fui
ridicularizado e humilhado por aquele
delegado. Não vejo a hora de vingar-me
dele. Depois dele morto, eu mando um
relatório para Phoenix, informando que ele
se envolveu numa briga e acabou morto.
Assim não mandam outro idiota para cá.
— Excelente! Vamos chamar Scar.
Momentos depois, Scar apresentava-se
diante de seus patrões.
— Temos um trabalho para você
resolver, Scar. Precisa ir à cidade e matar
um delegado federal — falou Bob.
— Adoro matar delegados federais.
Quem é esse?
— O nome dele é David Garret —
informou o xerife.
— Tem certeza? Mas isso é muito bom
— falou o pistoleiro, rindo de um modo
especial, como se ruminasse uma idéia que
o agradava muito.
— Já o conhece? — perguntou Ted.
— Sim, já nos encontramos antes. Tenho
contas a ajustar com ele.
— Pois então, vá até lá e mate-o.
— Não tão rápido. David Garret é
alguém especial. Merece morrer pedindo
clemência, sofrendo muito mesmo.
— Por que o odeia tanto? — insistiu Ted.
— Aquele bastardo matou meu irmão
numa briga, há alguns anos. Prometi vingar-
me e minha hora chegou.
— Acho que podemos usar Scar para
matar dois coelhos com uma só cacetada —
comentou Bob.
— O que tem em mente?
— Que ele mate o delegado e nos livre
daquela mulher e de Judy, também, por
ajudá-la.
— Vamos pegar as mulheres, então. Com
elas atrairemos o delegado a uma cilada —
disse Scar.
— Faça o que for preciso, Scar. Você tem
o comando agora — ordenou Oscar.
O pistoleiro riu com satisfação e saiu para
reunir seus homens, montando seu plano de
ação.
— Lou e Cooper, vocês dois irão para o
lado norte da cidade e simularão um
tiroteio. Espero, com isso, atrair a atenção
do delegado para lá, enquanto nós entramos
pelo lado oposto.
— Logo anoitecerá, Scar. Acha que ele
irá?
— Sim, ele é bisbilhoteiro e irá ver o que
está acontecendo. Agora vamos, quero
chegar à cidade antes do anoitecer —
determinou ele, ansioso pela sua vingança.
David e Scott bebiam e conversavam no
saloon, esperando pela chegada da noite,
para irem para o rancho de Curley Ross.
— Não é prudente ficarem aqui, rapazes
— observou Judy. — Os Merryl logo
saberão que vocês liquidaram mais alguns
de seus homens.
— Não temos medo deles, Judy e
sabemos nos cuidar. Fique tranqüila, não se
preocupe conosco — disse Scott.
— O xerife ainda não voltou, aquele
covarde — observou Scott.
— E nem voltará — opinou Scott. — A
esta hora está no Rancho Merryl,
planejando um modo de matá-lo, David.
— Então acho que devíamos ir até a
cadeia e soltar Helen.
— Não terá problemas com o juiz?
— Eu assumirei a custódia dela perante a
lei. Deixá-la lá é deixá-la à mercê de nossos
inimigos. Ela ficará melhor aqui, com Judy
e com a viúva Ross.
Os dois foram até a cadeia e libertaram
Helen. Ao reconhecer Scott por debaixo da
barba e do bigode postiços, ela mal pode
conter sua emoção. Abraçou-o e beijou-o
com um carinho especial.
— Sofri ao saber que tinha morrido —
disse ela, chorando.
— Imagino, querida. Judy contou-me o
que fez por mim... Eu sempre a achei uma
mulher corajosa... Mas não sabia que
gostava tanto de mim...
Ela o beijou novamente, provando o
quanto amava-o.
— Helen, queremos que vá para o saloon
e fique coma viúva Ross e Judy, até
resolvermos esta situação.
— E vocês, para onde vão?
— Vamos ao Rancho Ross resgatar o
corpo dele.
— Se trouxerem algum dos pistoleiros
com vida, obrigando-o a testemunhar,
poderão acabar com os Merryl, não?
— Sim, contamos com isso, Helen —
afirmou Scott.
Naquele momento, diversos disparos
cortaram o entardecer, vindos do lado norte
do povoado.
— O que acha que pode ser, David? —
indagou Scott.
— Não sei, mas acho bom irmos dar uma
olhada...
— Cuidado, rapazes! — pediu Helen.
— Estaremos bem, Helen. Vá para o
saloon. Nós a encontraremos lá mais tarde
— disse-lhe Scott, com carinho.
Assim que ela se afastou na direção do
saloon, os dois apanharam seus cavalos e
galoparam na direção dos disparos, que
ainda eram ouvidos esparsamente.
Quando se distanciaram do povoado,
aproximando-se do local de onde vinham os
tiros, estes cessaram. Tudo ficou em
silêncio e nada de anormal via-se por lá.
— Que diabos foi isso? — comentou
Scott.
— Estranho, não? Vamos dar mais uma
olhada.
Procuraram por mais algum tempo, mas
não conseguiram encontrar sinais dos
autores do tiroteio.
— Talvez foram vaqueiros treinando a
pontaria, enquanto seguiam seu caminho —
opinou Scott.
— Talvez... Mesmo assim, acho estranho.
— Já que estamos aqui, por que não
vamos para o Rancho Ross?
— É para o norte mesmo. Vamos lá!
— Avise-me quando estivermos nos
aproximando. Precisamos usar de toda
cautela desta vez.
Scott concordou e os dois cavalgaram
lado a lado na direção do rancho. Scott,
apesar de toda tensão, parecia feliz e sorria.
Scott percebeu isso.
— O que o faz tão feliz assim? —
indagou David.
— Estou pensando em Helen.
— Deu para perceber que ela o ama
muito.
— Sim e eu também o amo.
— Não tinham descoberto isso antes?
— Eu sempre tive uma queda por ela,
mas jamais imaginei que ela gostasse de
mim... Faltou-me um pouco de decisão.
Assim que tudo terminar, no entanto, vou
pedí-la em casamento.
— E eu achei Judy uma garota
sensacional, o tipo de mulher que me
agrada, sabia?
— Posso imaginar, pela maneira como
ela o olha e preocupa-se com você. É quase
uma sócia de Helen no saloon.
— Você acha mesmo que ela viu algo em
mim?
— Tenho certeza disso.
— Acha que ela e eu...
— Por que não pergunta isso a ela,
quando voltarmos? — sugeriu Scott,
esporeando seu cavalo.
David imitou-o, cavalgando ao encontro
do perigo. Para o delegado federal, aquela
vida aventureira, de cidade em cidade,
desempenhando misses perigosas estavam
cansando.
Sempre sonhara encontrar um lugar novo,
onde pudesse fincar raízes e começar uma
vida sólida, com uma mulher de fibra que
lhe desse muitos filhos.
Naquele povoado, talvez isso pudesse
acontecer. A lei ali era necessária. Podia
candidatar-se ao cargo e xerife. Além disso,
tinha algumas reservas, poderia comprar
também um pedaço de terra e crescer com o
povoado.
Era uma idéia a ser considerada. Judy era
uma garota de fibra, corajosa e decidida,
demonstrando ser também muito carinhosa.
Encerrar sua carreira ali começava a
parecer-lhe uma boa opção.
Já tinha muitas cicatrizes no corpo e
muitas histórias para contar. Estava
habituado a lidar com gente da pior espécie
e isso já não era vida para um homem.
Sempre envolvido em tiroteios, matando
para não morrer, chegava a um ponto em
que, se persistisse nessa vida, acabaria
insensibilizado.
Esse não era o tipo de futuro que David
desejara para si, quando entrara para aquela
profissão.
Enquanto isso, um verdadeiro exército de
pistoleiros entrou pelo lado sul da cidade.
As ruas ficaram limpas. Todos correram,
assustados, escondendo-se atrás de portas e
janelas, com medo de uma represália dos
homens dos Merryl.
A presença dos pistoleiros, daquela forma
ostensiva, significava encrenca e tiroteio.
— Vamos até o xerife primeiro —
ordenou Scar. — Vamos pegar aquela
linguaruda, já que escapou ao julgamento.
O grupo parou diante da cadeia. Alguns
pistoleiros desmontaram e correram para
dentro, retornando e seguida.
— Não há ninguém lá dentro, Scar —
afirmou um deles.
— Tem certeza?
— Sim, as celas estão todas vazias, com
as portas escancaradas.
— Para onde podem tê-la levado? —
indagou-se o pistoleiro.
— Só pode ter ido para o saloon, Scar —
emendou o pistoleiro, montando
rapidamente.
— Veremos isso — decidiu o líder deles.
O bando todo desceu a rua lentamente,
parando em frente do saloon.
— Está tudo muito quieto por aqui esta
noite — observou um dos homens.
— Vamos fazer um pouco de barulho —
falou Scar, desmontando, seguido pelos
pistoleiros.
Apenas o barman limpava copos atrás do
balcão.
— Onde está Helen? — indagou-lhe
Scar.
— Na cadeia, onde mais poderia estar?
— respondeu o barman, fazendo-se de
desentendido.
Uma coronhada inesperada atingiu-o na
cara, jogando-o para trás, contra a prateleira
de garrafas, quebrando-as.
Um dos pistoleiros saltou para dentro do
balcão e o levantou. Seu nariz sangrava
abundantemente.
— Eu lhe fiz uma pergunta, rapaz —
insistiu Scar.
— Não sei... ela deveria estar lá...
Scar sacou sua arma e enfiou o cano
dentro da boca do outro, engatilhando-a. O
barman estremeceu, apavorado.
— Tem um minuto para começar a falar
ou arrebento-lhe a cabeça — ameaçou Scar.
— Eu não sei... Juro!
— Trinta segundos agora.
Quando Scar ia apertar o gatilho, uma
voz feminina se fez ouvir.
— Estou aqui, seu covarde. O que quer
de mim?
Scar e seus homens voltaram-se. Helen
estava no alto da escada, encarando-os
corajosamente.
— Desça daí, beleza. Vamos dar um
passeio.
— Não vou a parte alguma com você...
— Deixe de ser estúpida, mulher, e
obedeça-me — falou ele, com rispidez.
— Por que não vem me buscar? —
desafiou ela.
Scar fez um sinal de cabeça. Dois
pistoleiros rumaram para a escada, parando
no primeiro degrau.
— Vamos logo, o que estão esperando,
seus idiotas? — gritou ele, enervado.
— Parem aí mesmo, rapazes, se têm amor
à pele — ordenou Helen.
Os dois pistoleiros tinham mais medo de
Scar do que dela e começaram a subir a
escada.
Helen tirou do bolso de seu vestido um
Colt, engatilhou-o e apontou. Os pistoleiros
não pararam. Ela estourou a cabeça de um.
O outro fez menção de sacar a arma e ela
disparou contra o peito dele, jogando-o de
costas no assoalho.
Os outros pistoleiros não se conformaram
com a morte de seus amigos e sacaram suas
armas, disparando na direção de Helen,
enquanto procuravam abrigo.
A garota já havia recuado para o
corredor, onde não seria atingida.
— Parem, seus idiotas! — berrou Scar.
— Não vamos atingí-la nunca desta forma.
— É só uma... — disse um pistoleiro,
mas calou-se imediatamente, quando três
disparos quase simultâneos arrancaram
lascas da mesa atrás da qual ele se ocultava.
— São três e podem nos deter aqui
embaixo. Quem subir por aquela escada
será morto.
— Demônios! — praguejou Scar. — O
delegado federal já deve ter ouvido o
tiroteio e logo estará aqui.
Naquele momento, ouviu-se um tropel de
cavalos na rua, parando diante do saloon.
— Maldição! Deve ser ele — falou Scar.
— Não, são Lou e Cooper — avisou
alguém.
Scar esgueirou-se por entre as mesas ao
encontro dos dois.
— Onde está o delegado? — quis saber.
— Eles foram até lá, verificar a razão do
tiroteio, depois seguiram em frente...
— Eles quem? Quem está com ele?
— Não sei ao certo, mas pareceu-me
aquele vendedor de elixir.
— Que diabos é isso? — intrigou-se
Scar. — Em que direção eles foram.
— Na direção do rancho de Curley Ross.
— Tem certeza?
— Sim, eu e Cooper os seguimos por
algum tempo.
— O que estarão tramando — perguntou-
se o pistoleiro, intrigado. — Há guardas
nossos lá no rancho?
— Dois ou três apenas. Os vaqueiros
retornaram para o Rancho Merryl, após
recolher os cavalos.
— Não consigo imaginar o que aquele
maldito delegado federal foi fazer lá... Mas
não gosto disso. Essa raça é mais ardilosa
que o demônio!
— Talvez seja alguma coisa que a viúva
Ross tenha dito a ele.
— Ou procurar alguma testemunha da
morte do rancheiro para jogar contra nós —
opinou um outro pistoleiro.
— Tem razão. Pode se tornar uma
ameaça irreparável para nós. Mas acho que,
com isso, eles nos prestaram um favor —
disse Scar.
— Como assim, chefe?
— Podemos prendê-lo e ao seu amigo
numa armadilha. Vamos para lá o mais
depressa possível. Vamos cercar o rancho e
invadí-lo. Aquele maldito David Garret não
sabe, mas está ido direto para a própria
sepultura — sentenciou Scar.
— E quanto às mulheres?
— Já não são importantes no momento.
Depois nós as pegamos. O importante agora
é apanhar o delegado. Você e mais dois
homens fiquem aqui, vigiando o saloon.
Ninguém entra ou saia dele, entendido? O
resto vem comigo. Vamos acabar com isso
agora mesmo.
Pouco depois, quase trinta homens
cavalgavam, deixando uma nuvem de
poeira atrás deles.
Próximos do rancho, ocultos atrás de
algumas árvores, David e Scott analisavam
a situação.
— Vejo luz na casa — disse Scott.
— Sim, mas é difícil saber quantos estão
lá. Não vejo movimento em nenhuma outra
parte, nem no alojamento dos vaqueiros.
— Estranho isso...
— A menos que tenham sido mortos, o
que não seria de causar espanto.
— Vamos nos aproximar um pouco mais.
Trouxe sua faca?
— Nunca me separo de uma — falou
Scott, retirando-a de sua boa.
— Ótimo! Talvez tenhamos que usá-las.
Aproximaram-se da sede do rancho,
protegidos pela vegetação e pelo capim.
Atravessaram um curral e foram ocultar-se
atrás do alojamento dos vaqueiros.
Examinaram por uma janela aberta.
Estava realmente vazio. Scott apontou na
direção da casa. Os dois esgueiraram-se nas
sombras, chegando até uma das janelas.
— Vejo apenas dois deles lá dentro —
falou David.
— Pode haver mais nos outros cômodos.
— Vamos verificar com cuidado.
Após fazerem isso, os dois comprovaram
que apenas dois pistoleiros guardavam o
local.
— Como vamos pegá-los? — quis saber
Scott.
— Qual é a maneira mais fácil de entrar
em uma casa?
— Pela porta, é claro!
— É por onde entraremos. Eles estão
tranqüilos, não tem motivo algum para
estarem alertas — deduziu David,
aproximando-se da porta e batendo.
— Quem é? — indagaram lá de dentro.
— David! — respondeu ele, com
naturalidade.
— E quem diabos é você, David?
Um pistoleiro escancarou a porta, num
gesto nervoso. David agarrou-o pelo
pescoço, pondo a faca em sua garganta. O
homem debateu-se, no entanto, tentando
fugir e a lâmina deslizou de orelha a orelha,
fazendo o sangue jorrar.
O outro pistoleiro surgiu diante da porta,
com a arma na mão. Scott não teve outra
alternativa a não ser arremessar sua faca,
que atingiu o malfeitor na garganta. Ele
gemeu e caiu, contorcendo-se, enquanto
esvaía-se em sangue.
— Maldição! — reclamou David. —
Queria pegar pelo menos um deles com
vida. Agora não há como descobrir onde
está o corpo de Curley.
— Perdemos nosso tempo — afirmou
Scott. — De qualquer forma, vamos voltar
para o povoado. Não quero deixar as
garotas sozinhas por muito tempo.
— Vamos só dar uma olhada pela casa
antes de sair — propôs David.
Vasculharam a casa, mas nada
encontraram de anormal. Quando iam sair,
um tropel de muitos cavalos quebrou o
silêncio da noite.
Os dois correram para uma janela,
observar. Os cavaleiros chegavam e
cercavam a casa.
— Diabos, vão nos encurralar —
percebeu David.
Scott correu e apagou os lampiões.
Ficaram ambos observando lá fora. Os
homens movimentavam-se como gatos nas
sombras, espalhando-se por toda parte.
— Vocês dois aí dentro, estão cercados.
Saiam de mãos para cima — ordenou Scar.
— Veja ali, a sua esquerda — apontou
Scott.
Um pistoleiro esgueirava-se na direção da
casa. David apontou sua arma e fez fogo. O
homem gemeu e tombou na poeira.
— É inútil resistir, David. Eu o tenho
numa ratoeira. Você morrerá de qualquer
forma.
— Quem está falando?
— Aqui é Scar Owens, lembra-se de
mim?
— E como eu poderia esquecer um réptil
rastejante como você, seu porco asqueroso?
— Você matou meu irmão e terá que
pagar por isso agora.
— Terá que me apanhar primeiro, Scar.
— É o que farei, nem que tenha que
incendiar a casa — rugiu o pistoleiro,
ordenando a seus homens que disparassem.
Línguas de fogo surgiram de toda parte,
indicando a localização das armas que
disparavam incessantemente. Balas
choveram de todas as direções,
arrebentando vidros, quebrando objetos e
arrancando lascas da madeira.
Abaixados, Scott e David aguardavam
pacientemente.
— Se ao menos tivesse um pouco de luz
lá fora. Poderíamos ver nossos alvos —
sugeriu Scott.
— Você acaba de me dar uma grande
idéia — falou David, lembrando-se de algo
que vira na parede, sobre a lareira da casa.
— O que vai fazer? — indagou-lhe Scott,
ao vê-lo rastejar pelo assoalho.
— Providenciar um pouco de luz — disse
ele, indo até a lareira.
Sobre ela, como enfeite, havia um arco e
flechas. Ergueu-se rapidamente, apanhando-
os. Pegou também um lampião e retornou
ao seu posto, junto à janela.
— Bem pensado, mas o que vai queimar?
— Pensei em queimar aquele velho
celeiro ali na frente. Acho que a viúva Ross
não se importará, desde que a ajudemos a
reconstruí-los depois.
David improvisou as tochas nas pontas
nas flechas, molhando-as no combustível do
lampião. Acendeu a primeira e disparou-a
contra a parede do celeiro. Um dos
pistoleiros correu para tentar apagar. Scott
fulminou-o sem piedade.
Novas flechas foram lançadas, cravando-
se por toda a parede. Logo o fogo espalhou-
se e as chamas iluminavam os pistoleiros.
David e Scott não os poupavam, disparando
certeiramente, espalhando o fogo e o pânico
entre eles.
Mesmo com toda a pontaria, os
pistoleiros ainda eram muitos e agora
estavam bem abrigados, disparando sem
cessar. O fogo, no entanto, havia alertado os
vizinhos de Curley Ross que, apesar de
saber que os Merryl haviam se apossado do
rancho, foram verificar o que estava
acontecendo.
Ao perceberem que alguém na casa
enfrentava os pistoleiros, já tendo matado
uma porção deles, resolveram também
ajudar. Reuniram-se e esgueiraram-se de
modo a pôr Scar e seus homens em fogo
cruzado.
Quando começaram a disparar, a
confusão estabeleceu-se entre os pistoleiros.
— Demônios, o que está havendo? —
indagou Scar, apavorado.
— Estamos entre dois fogos — informou
alguém.
— Vamos dar o fora daqui — ordenou
Scar e os pistoleiros correram em busca de
seus cavalos.
O cenário estava iluminado e eles eram
alvos perfeitos. As balas de David, Scott e
dos rancheiros foram exterminando-os
impiedosamente.
Scar e meia dúzia deles conseguiram
escapar ao meio a uma chuva de balas,
sumindo na escuridão.
Os irmãos Merryl e Ted Quincy bebiam e
conversavam animadamente, quando
ouviram o barulho de cavalos chegando.
— Devem ser Scar e os homens, após
terem liquidado o delegado federal — falou
Bob, rindo satisfeito.
— Acho que seus problemas acabaram,
Ted. Vai poder voltar ao xerifado e assumir
seu posto, continuando a nos ajudar como
antes — disse Oscar.
— Sim, mas de agora e diante vamos
tomar cuidado com os delegados federais.
Não quero mais nenhum por aqui
novamente.
— Você cuidará disso para nós —
afirmou Bob, levantando-se para ir até a
porta.
Scar e seus homens entraram
abruptamente, como se o próprio satanás
perseguisse-os.
— O que houve? Onde está o resto da
equipe? — quis saber Oscar.
Os pistoleiros foram até a mesa e se
serviram de generosas doses de uísque.
Estavam todos trêmulos, com o suor
cobrindo seus corpos.
— Vamos, fale, homem! — intimou Bob.
— Cercamos o delegado e seu amigo no
Rancho Ross...
— Espere um pouco, quem estava com
ele? — quis saber Oscar.
— Acho que era o vendedor de elixir...
— Sim, foi o tal que ajudou David Garret
a escapar da emboscada na porta da cadeia.
O vendedor de elixir está com ele — falou
Ted.
— Pode ser um outro delegado — disse
Scar.
— E o que eles foram fazer no Rancho
Ross?
— Não faço a menor idéia, mas nós os
surpreendemos lá. Tínhamos a situação
dominada, quando ele recebeu uma ajuda
inesperada, não sei de quem.
— E onde está o resto dos homens?
— Acredito que estejam mortos...
Os dois irmãos e Ted entreolharam-se,
pálidos e assustados.
— Eu lhes disse que aquele delegado não
seria presa fácil — falou Ted.
— O diabos é que ele está vivo e deve vir
atrás de nós — falou Oscar.
— Que diabos vamos fazer agora, irmão?
— Vamos enfrentá-los, é a única maneira
— falou Scar.
— Você acaba de perder um batalhão e
ainda fala em enfrentá-lo! — surpreendeu-
se Bob, nervoso.
— Vejam bem o meu plano! Eles devem
ter ido para a cidade agora. Se nos
juntarmos, reunindo todos os pistoleiros de
que ainda dispomos, mais uma equipe de
vaqueiros dispostos a ganhar um dinheiro
extra, poderemos ir para a cidade e... — ia
dizendo Scar.
— Que idéia mais maluca! — cortou-o
Bob.
— Espere, Bob! — interrompeu-o Oscar.
— Há lógica na proposta de Scar. Não
podemos abandonar tudo que temos aqui.
Vamos ter de enfrentá-lo com todas as
nossas forças.
— Acha que daria certo, Ted? —
indagou-lhe Bob.
— E por que não? Não esperam um
contra-ataque desses. Chegaríamos de
surpresa. Deveremos encontrá-lo e ao seu
amigo no saloon. Será fácil...
— Então acho que não deveríamos trocar
tiros com eles. Se estão no saloon, vamos
explodir toda aquela porcaria — falou Scar,
furioso.
— Explodi-los? Está aí uma boa idéia —
elogiou Oscar.
— Isso mesmo. Com algumas bananas de
dinamite mandaríamos aquele saloon pelos
ares, juntamente com todos os nossos
problemas, começando por Helen, passando
pela viúva Ross e finalizando com o
delegado federal.
— Sim, é uma grande idéia, Scar. Nem
precisaríamos de muitos homens para isso
— falou Oscar.
— Mas levaríamos um bando para
qualquer eventualidade — ponderou Bob.
— Então o que estamos esperando? Vou
apanhar a dinamite e partiremos em seguida
— falou Scar.
O delegado federal e os vizinhos do
Rancho Ross chegavam à cidade. Quando
aproximavam-se do saloon, foram recebidos
a bala pelos capangas que Scar deixara de
guarda. Mas bastou que eles se
descuidassem para que Helen e suas amigas
fuzilassem-nos sem piedade.
— Bom trabalho, garotas! — elogiou
David.
— Que bom que tenham voltado — falou
Judy, com satisfação. — Estávamos
preocupadas. O que houve?
Em rápidas palavras, David contou o que
havia acontecido.
Rose ficou muito emocionada quando
soube da participação de seus vizinhos.
— Eu sabia que cedo ou tarde vocês
iriam unir-se a nós contra os Merryl —
falou ela, com orgulho.
— Reconhecemos que fomos covardes,
mas percebemos que isso era errado. Todos
acabaríamos perdendo diante da ganância
dos dois — falou um dos rancheiros.
— Eu agradeço por isso. Estou certa que
Curley apreciaria isso de vocês — falou a
viúva.
— E agora, David, qual vai ser o próximo
passo? — indagou Judy.
— Capturar os Merryl e enforcá-los pelos
seus crimes. Não lhes resta muitos homens
agora. Com a ajuda dos rancheiros, vamos
apanhá-los.
— E quando pretende fazer isso, hoje à
noite mesmo?
— Não, alguns pistoleiros escaparam ao
tiroteio e na certa foram avisar os Merryl.
Se conheço criminosos, na certa estarão
esperando algum ataque e ficarão na
defensiva.
— E se resolverem nos atacar? —
indagou Helen.
— Vamos montar turnos de guarda nas
entradas da cidade. Assim não seremos
surpreendidos.
— Conte conosco, delegado — falaram
os rancheiros, que logo estabeleceram os
turnos de guarda e os locais mais adequados
para isso, partindo em seguida.
Os que ficaram queriam saber o que
aconteceria na seqüência.
— Vamos atacá-los ao amanhecer? —
indagou um deles.
— Sim, se nada acontecer até lá —
afirmou David. — Enquanto isso, que tal
alguma coisa para comer, barman? Estou
morto de fome.
— Vamos providenciar um jantar para
vocês — falou Helen.
Judy apressou-se em ir ajudá-la. Os
rancheiros acomodaram-se nas mesas, pois
a maioria já havia jantado. Providenciaram
bebidas para todos. Conversavam
animadamente, sem saber que o perigo
cavalgava na direção do povoado.
Os Merryl, à frente de um grupo de
pistoleiros, com Scar e o xerife de
contrapeso, galopavam para lá.
— Vão ter uma bela surpresa —
comentava Oscar, impaciente para ver tudo
terminado.
— Só queria estar perto para ver a cara
do delegado federal, quando a dinamite
explodisse bem debaixo de seu nariz xereta
— acrescentou Bob.
— Logo todas as nossas preocupações
estarão terminadas. Aquele delegado vai se
arrepender de ter-me humilhado — falou o
xerife.
— Se ficou tão zangado com ele, por que
não o enfrentou cara a cara num duelo? —
zombou Scar, o único que não se mostrava
tão confiante assim.
Já conhecia aquele delegado. Sabia que
ele era mais tinhoso que o próprio capeta.
— O pistoleiro aqui é você e correu dele
com o rabo no meio das pernas, não foi,
Scar? Vai me dizer que não foi isso que
aconteceu lá no Rancho Ross? — devolveu-
lhe o xerife, ferinamente.
— Cale a boca, xerife, ou vou me
esquecer que estamos do mesmo lado —
ameaçou Scar.
— Ora, vá para o inferno! — exclamou
Ted Quincy, exasperado.
— Calma, rapazes! Por que não guardam
toda essa raiva para o delegado e seus
amigos? — aconselhou Bob.
— Não se preocupe, patrão. É isso que
pretendo fazer Scar.
Bem à frente deles, no alto de uma
colina, Jonah Butterfly notou aquela nuvem
de poeira e aquele grupo de cavaleiros
vindo a direção da cidade. Rapidamente
correu para seu cavalo e rumou para o
saloon, onde estavam todos reunidos.
— Há um grupo de cavaleiros, vindo dos
lados do Rancho Merryl, aproximando-se.
— Quantos são, conseguiu definir? —
indagou David.
— Uns vinte homens.
— Acho que estão mais desesperados que
imaginamos, Scott. Ou então estão
tramando alguma coisa.
— Bem, estão vindo na hora certa. O que
vamos fazer?
— Vamos preparar a recepção. Reunam
todos os homens aqui no saloon. Quero um
grupo no telhado do prédio da frente. O
resto fica aqui, preparado para tudo.
Rapidamente os homens acataram as
ordens, organizando-se. Todos os que
estavam de vigia foram avisados,
retornando. Todos ficaram atentos pela
chegada dos pistoleiros.
— Acha que o homem estava assustado a
ponto de julgar ter visto alguma coisa? —
indagou Scott a David, enquanto
esperavam, já que nenhum sinal dos
atacantes fora detectado.
— Pode ser, apesar de eu não acreditar
que um homem valente como aquele tenha
visões causadas pelo medo — afirmou
David, indo até a janela.
Tudo estava muito calmo lá fora.
— Acho que vou dar uma olhada —
decidiu ele. — Cubram-me.
— Quer que eu vá junto? — ofereceu-se
Scott.
— Não, fique aqui com o resto dos
homens. Só vou dar uma olhada.
David desceu até a rua. No telhado em
frente os homens fizeram-lhe um sinal. Ele
ficou atento, olhando ao seu redor.
David estava intrigado. Teria o homem
realmente visto o grupo de cavaleiros
aproximando-se? Como que respondendo a
sua pergunta, um vulto deslizou pelas
sombras, no outro lado da rua.
— Pare aí mesmo ou será um homem
morto — ordenou David, sacando
rapidamente sua arma.
— Calma, moço! Eu só estou dando um
passeio — respondeu o vulto, tirando o
charuto da boca.
— Aonde pensa que vai?
— Só tomar um pouco de ar... Está muito
abafado dentro de casa... Isso não é crime,
é?
David não ficou satisfeito com as
respostas e começou a atravessar a rua na
direção do homem, no outro lado.
De repente, ouviu um chiado
característico, seguindo de muitas fagulhas.
— Tome este presentinho, delegado! —
falou o pistoleiro, jogando o pacote na
direção dele..
David não hesitou. Disparou
certeiramente e o vulto bateu contra uma
parede, depois veio cair na poeira da rua.
O pacote de dinamite caiu a seus pés. Ele
pisou firme no estopim, apagando-o.
No momento seguinte, o inferno abateu-
se sobre ele. Uma chuva de balas zumbiu ao
seu redor. David tratou de abrigar-se
rapidamente.
— O que houve, David? Você está bem?
— indagou Scott, numa das janelas do
saloon.
— Sim, estou bem, mas eles estão aqui.
Fogo neles!
O tiroteio foi intenso, mas sem baixas, já
que todos estavam bem abrigados. David
conseguiu rastejar de volta ao saloon.
— São eles, sem sombra de dúvidas. Só
que vamos trocar tiros a noite toda, sem
resultado. Temos de achar um meio de
cercá-los.
— Vamos levar um grupo pelos fundos
do saloon — sugeriu um rancheiro. — Eles
estão escondidos no armazém.
— Muito bem, rapazes! Vamos fazer isso
— disse David, reunindo um grupo bem
armado e saindo pelos fundos.
Num ponto seguro, bem à frente,
atravessaram a rua, depois retornaram, até o
beco ao lado do armazém. Bloquearam a
porta dos fundos. Os pistoleiros só tinham
uma saída agora, só que estavam muito bem
protegidos, sem contar que tinham
mantimentos e munição para muito tempo.
— Não vamos conseguir tirá-los dali
facilmente — observou Scott.
— Só que não sabem que estamos aqui.
Vamos rastejar pela rua, até a calçada. Dali
levantaremos e dispararemos contra eles,
nas janelas e na porta. Acho que
conseguiremos acertar uma porção deles.
Os homens fizeram como David sugerira.
Quando se levantaram e dispararam
praticamente a queima-roupa, muitos
pistoleiros foram atingidos, desfalcando as
fileiras dos Merryl.
— Bob Merryl, seu covarde! — gritou
Scott.
— Quem disse isso?
— Sou eu, Scott Nelson. Soube que você
está usando meu cinturão. Eu o quero de
volta, covarde!
— Scott Nelson está morto...
— Estou bem vivo e quero minhas armas.
— Então venha buscá-las.
O tiroteio havia cessado, enquanto os
dois conversavam. David percebeu, pelos
gemidos lá dentro, que muitos deles
estavam feridos. Retornou até o beco,
depois esgueirou-se junto à parede, até ficar
ao lado da porta.
Fez um sinal que Scott entendeu. Os dois
verificaram suas armas, remuniciando-as.
Então, num gesto de extrema coragem, que
pegou seus adversários de surpresa, ele se
virou, chutou a porta e entrou rolando para
dentro do armazém.
— Maldição! Ele está aqui! — berrou
Scar, antes de receber um balaço na testa,
que abriu sua cabeça como uma abóbora
podre.
Os outros pistoleiros tentaram atingir
David, que não parava um instante,
deslocando-se para um canto. Scott
aproveitou a distração e entrou atrás,
pegando-os de surpresa, ceifando-os um a
um. As armas dos dois cuspiram chumbo
com incrível precisão, espalhando a morte e
a confusão entre os pistoleiros.
Alguns, em desespero, tentaram fugir,
saltando pela janela e correndo porta a fora,
sendo abatidos pelos homens que os
esperavam.
Tudo ficou em silêncio então. Ocultos,
David e Scott não viam os dois irmãos
carniceiros.
— Atrás do balcão — avistou-os Scott.
— Vocês dois aí, não tem chance alguma.
É melhor entregarem-se ou vão morrer
como cães aí mesmo — gritou o delegado.
— Iremos todos juntos para o inferno —
esbravejou Oscar, disparando sua arma
repetidas vezes, juntamente com o irmão.
As balas ricocheteavam por toda parte,
arrancando lascas da madeira ou quebrando
coisas ao redor de David e Scott.
— Vocês estão encurralados — avisou-os
Scott.
— Não nos pegarão com vida — gritou
Bob, despejando chumbo em resposta.
David e Scott estavam em desvantagem,
porque os tocheiros que iluminavam a rua
atrás deles denunciava suas silhuetas,
enquanto os dois irmãos, ocultos atrás do
balcão, estavam totalmente fora da visão
deles. Tinham de encontrar uma forma de
desentocá-los dali rapidamente.
O delegado percebeu, então, que a única
forma de atingí-los seria quando
disparassem, valendo-se do clarão
produzido pelos disparos. Não seria uma
missão segura, por isso teria de usar a
cabeça.
Atrás dele havia uma pilha de cabos de
picareta. Ele pôs seu chapéu num deles e
estendeu-o para o lado. Scott percebeu o
que ele pretendia e ficou atento.
— Agora Scott! — falou David,
erguendo a madeira com o chapéu.
Os dois irmãos levantaram-se, disparando
incessantemente. David deixou cair o cabo
de picareta e fez fogo certeiramente. Os
dois irmãos, atingidos, foram jogados para
trás estrepitosamente.
— Mate-me agora! — pediu Bob, ferido,
quando os homens entraram com tochas.
— Uma bala é bom demais para você,
seu canalha. Quero vê-lo espernear na ponta
de uma corta — disse Scott, arrancando o
cinturão de Bob e apanhando suas armas.
Oscar estava também ferido, os olhos
esbugalhados cheios de terror. O sangue
banhava seu tronco e escorria para o
assoalho.
— O que faremos com eles? —
indagaram os rancheiros.
— Pelo meu poder excepcional de ser
juiz, júri e carrasco ao mesmo tempo, eu os
condeno à morte por seus crimes. Alguém
tem alguma coisa a dizer em defesa deles?
A resposta foi óbvia. Os rancheiros
arrebataram os dois e levaram-nos para fora.
Enquanto os rancheiros encarregavam-se
de justiçar os dois, David e Scott dirigiram-
se ao saloon com um só pensamento: falar
de amor com uma bela mulher.
O Herói Renegado
Um clima tenso pairava sobre o Forte
Bowie, naquela manhã de verão, quase no
final do século passado. O horizonte tingia-
se de vermelho, anunciando a chegada do
sol que, por mais um dia, fustigaria aquela
terra desolada.
O corneteiro terminou de polir seu
instrumento, depois avançou até o centro do
pátio, junto ao mastro onde a bandeira seria
hasteada na hora oportuna.
O soldado ficou ali, em posição de
sentido, olhando na direção do alojamento
dos oficiais. Quando a porta se abriu, o
coronel Donald saiu na frente, ainda
calçando suas luvas. Atrás dele, em fila pela
importância, vinham os oficiais.
Eles se enfileiraram lado a lado no
alpendre do alojamento, olhando o céu,
trocando informações. O corneteiro
continuou atento a eles. O general tirou o
relógio do bolso. Comentou algo com o
Major, que fez um sinal de cabeça para o
oficial do dia.
O Tenente Jones avançou até junto do
corneteiro e ordenou o toque da alvorada. O
soldado pigarreou, esfregou as costas da
mão na boca, depois levou o instrumento
aos lábios.
Os acordes ligeiros percorreram os
alojamentos do forte e ecoaram nas
montanhas que o circundavam, no norte do
Arizona. Em instantes, as portas dos
alojamentos foram se abrindo e os soldados
foram deixando suas seções sem pressa,
indo perfilar-se ao redor do mastro, em
posições preestabelecidas.
Naquela manhã não havia nenhum rosto
sonolento. Todos haviam acordado cedo e
se preparado para a cerimônia. Havia
revolta em seus rostos.
Os oficiais esperaram até que todos os
pelotões estivessem formados. Só então
caminharam até a frente deles. Dois
soldados se adiantaram e prepararam a
bandeira para o hasteamento.
A um sinal do oficial de dia, o corneteiro
foi desfiando afinadamente o hino Stars of
Glory. A bandeira foi subindo, imóvel, até
atingir a brisa que soprava por cima das
paliçadas de madeira do forte.
Começou, então, a agitar-se, com as
pontas estalando ao vento e as estrelas
parecendo cintilar no céu do amanhecer. Os
soldados desfizeram a continência, mas
mantiveram a posição de sentido.
Todos estavam muito constrangidos com
o que havia acontecido. Nenhum deles
acreditava em nada do que fora dito pelas
testemunhas e julgavam aquela corte
marcial uma farsa, nada mais.
O coronel se adiantou, então, olhando
para o oficial de dia.
— Tenente, prepare-se para a execução
da sentença ditada pela Corte Marcial do
Forte Bowie, em relação a execução aos
atos praticados pelo Capitão Steve Masters.
— Compreendido, coronel. Cabo da
Guarda, vá e escolte o prisioneiro até aqui
— ordenou o oficial de dia.
Enquanto o cabo se apressava em
cumprir a ordem, o coronel voltou ao seu
lugar, junto aos oficiais. Ao seu lado estava
o Tenente Bolt.
— Fico satisfeito em ver que ele teve um
julgamento justo e uma justa condenação —
comentou o tenente.
— Sim, Tenente Bolt, eu também me
sinto da mesma forma — respondeu o
coronel, gravemente. — Tenho tolerado
muitas coisas e visto muitas coisas nesta
terra esquecida de Deus. Vejo soldados
bêbados, indisciplinados, criminoso de toda
espécie, escória do norte e do sul, mas
jamais vi algo parecido com esse homem.
Ele supera tudo que abominamos no
Exército. Jamais entenderei como ele
chegou ao posto de Capitão, sendo um
ladrão, desertor e covarde, tudo ao mesmo
tempo — afirmou o coronel, demonstrando
toda a sua indignação.
— Foi uma mancha negra para a
Cavalaria, Senhor. Felizmente foi apanhado
a tempo.
— Por mim ele deveria ser fuzilado,
tenente, apesar das prerrogativas que possui
como oficial e cavalheiro, coisas que ele
desonrou e desprezou. Fico feliz, porém, em
ver que ele será punido também por uma
corte civil, onde o roubo e o assassinato
serão punidos com rigor. Não escapará com
vida, pode apostar nisso.
Um tropel de cavalos, vindo da estrada
que conduzia ao forte interrompeu a
conversa de ambos. O tenente, empertigado,
virou ligeiramente a cabeça para a sentinela
no alto da plataforma, sobre o portão.
— Cavaleiros se aproximam! — gritou
um das sentinelas ao oficial do dia.
— Pode identificá-los?
— É o xerife e uma patrulha, senhor.
Três homens ao todo.
— Muito bem, soldado! Pode abrir o
portão e deixá-los entrar — ordenou o
oficial em comando.
O Xerife Barnes e dois de seus auxiliares
cavalgaram para o interior do forte,
demonstrando na poeira em suas roupas e
no suor dos cavalos que tinham cavalgado
bem rápido para chegarem a tempo.
Foram amarrar os cavalos diante da
cantina. Havia ali um cocho de água, onde o
xerife, após tirar a capa de viagem coberta
de poeira, lavou as mãos e o rosto,
espantando também, assim, o cansaço e o
sono.
Enquanto caminhava, depois, na direção
do coronel e dos oficiais do forte,
enxugava-se com o lenço que trouxera ao
pescoço.
— Temi não chegar a tempo, coronel.
— Deve ter uma corrida e tanto, não?
— Sim, cavalgamos à noite, tão logo eu
tomei conhecimento da sentença e da
execução dela. Não esperava que fosse tão
rápida assim...
— Não posso manter esse homem aqui,
no forte, xerife. É péssima influência e
abala o moral da tropa. Quero-o o mais
longe daqui logo que possível.
O xerife voltou a amarrar o lenço no
pescoço. Um murmúrio percorreu os
pelotões perfilados, como uma onda de
inquietação e revolta.
No momento seguinte, escoltado por dois
soldados, tendo à frente o Cabo da Guarda,
o Capitão Steve Masters, da Cavalaria dos
Estados Unidos, era conduzido, da prisão,
para uma posição de destaque junto ao
mastro da bandeira.
O capitão era um homem alto, pele
curtida pelo sol Arizona, forte fisicamente.
Seus lábios finos exibiam um sorriso triste
e, ao mesmo tempo, irônico. Seus olhos
azuis estavam fixos na bandeira que ele
jurara, um dia, honrar, mesmo ao preço de
sua própria vida.
— É impressionante o cinismo dele —
observou o Tenente Bolt, olhando o
acusado.
Apesar de tudo, o capitão ostentava um ar
de total tranqüilidade, incomodando o
tenente.
— Parece-me tranqüilo demais, embora
as provas contra ele sejam esmagadoras. As
evidências de seus crimes são muito fortes,
não há como ele escapar da punição —
opinou o Xerife Barnes.
O tenente se voltou para olhar o xerife.
Apesar de tudo, o tom do homem da lei
demonstrava uma parente contradição.
— Afirma isso num tom hesitante, xerife.
Parece não acreditar muito no que fala.
Ainda não está certo da culpa dele? —
questionou o tenente.
— Prefiro deixar que o tribunal decida se
ele é culpado mesmo ou inocente. Se for
culpado do assalto e das mortes, será
enforcado, com certeza.
— Não tenho dúvidas disso. O
julgamento militar só podia apreciar seu
caso sob as acusações de deserção e
covardia. Poderia ter outra punição, mas
optamos por esta, sabendo que ele iria
enfrentar a lei dos civis, certamente mais
rigorosa que nós.
— Com certeza — concordou o xerife.
ficou em silêncio, observando a
cerimônia. Seus sentimentos, porém,
quando a tudo aquilo, estavam evidentes em
sua expressão e no seu modo de comentar o
caso.
Para ele, tudo aquilo era uma farsa. Steve
fora julgado sem uma chance honesta de
defesa. Quando entraram na sala para
enfrentar a Corte Marcial, já sabia que seria
condenado, assim como todos os outros.
O Capitão Steve Masters foi colocado a
meio caminho entre o mastro da bandeira e
o portão do forte. O coronel fez um sinal
para o oficial de dia e este retirou um papel
dobrado do bolso de sua jaqueta.
Abriu-o diante de si e começou a ler em
alto e bom tom. Era o libelo da acusação e a
sentença de expulsão sem honras da
Cavalaria Americana.
Enquanto isso era lido, o Cabo da guarda
ia arrancando as divisas e adereços que
indicavam a patente do capitão. O
condenado enfrentou tudo aquilo com
serenidade, olhos fixos na bandeira que
tremulava no alto do mastro.
— Eu sinto muito, capitão! — murmurou
o cabo, quando retirou a espada da bainha e
a quebrou no joelho, jogando os dois
pedaços na poeira, aos pés do condenado.
— Faça seu trabalho, cabo! Não se
preocupe comigo — ordenou-lhe Steve,
com bondade.
Os portões do forte foram abertos. Os
soldados da escolta acompanharam o
capitão até lá, onde os dois assistentes do
xerife o esperavam para algemá-lo.
Ordens foram dadas. Os soldados se
dispersaram lentamente, lamentando a
ocorrência. Alguns ficaram ali. Olhando o
ex-capitão, agora cercado pelo xerife e seus
homens. A revolta e a tristeza continuavam
vivas em suas expressões.
— Como se sente agora, Steve? —
indagou-lhe o xerife, verificando se as
algemas estavam bem fechadas.
— Não muito feliz, Barnes.
— Posso imaginar isso...
— Não, Barnes, acho que não pode
imaginar o que seja isso. Ser acusado de
covarde, de desertor, de ladrão e de
assassino, tudo ao mesmo tempo, é coisa
que mexe com a cabeça de um homem.
— Vou lhe dizer uma coisa, Steve. Você
pode não acreditar em mim, mas eu confio
em sua inocência.
— Só que não terei a menor chance de
prová-la, preso como estou. Se me levar à
cidade, então, serei um homem condenado.
Talvez nem esperem o julgamento para me
enforcarem.
— Eu lamento, Steve, mas nada posso
fazer. Minha obrigação é levá-lo até lá...
— Então fique preparado, xerife. Vai
enfrentar alguns aborrecimentos pelo
caminho. Não pense que isso será uma
viagem tranqüila.
— Por que diz isso?
— Porque aquele maldito mestiço que me
acusou de covarde e desertor não vai
permitir que eu continue vivo para ameaça-
lo. Creio firmemente que alguém o
subornou para que ele e seus capangas
depusessem contra mim.
O xerife pediu aos ajudantes que fossem
buscar os cavalos. A sós de alguma forma,
questionou o...
— Tem alguma idéia de quem possa ter
sido? Talvez eu possa ajudar de alguma
forma, investigando isso...
— Vai ser difícil, Barnes. Tenho alguns
inimigos declarados aqui no forte. Sei que
foi alguém daqui. O motivo, desconheço,
mas tenho minhas suspeitas.
— Está me dizendo que sabe de alguma
coisa que poderia ajuda-lo? Po que não usou
isso na corte marcial?
— Não se livra de uma acusação
simplesmente acusando outras pessoas sem
provas, Barnes. Tudo não passava de uma
suposição de minha parte.
— Por que não me conta o que
suspeitava?
— Acho que posso confiar em você,
Barnes. Sempre foi mesmo um bom amigo.
Antes de tudo isso acontecer, eu estava
conferindo o arsenal. Faltavam dez caixas
de rifles de repetição novos e muita
munição. Para um homem como Charlie,
isso teria muito valor.
— E relatou isso ao coronel?
— Não houve tempo. Quando viram que
eu dera por falta das armas, já tinham todo o
complô. Eles sabem que eu sei dessas
armas, por isso acho que vão silenciar-me.
Fornecer armas a Charlie é o mesmo que
fornecer aos índios renegados e bandoleiros
mexicanos, todos da mesma lia dele.
Os dois ajudantes chegaram, trazendo os
cavalos. Steve tentou montar no seu, mas as
algemas atrapalhavam. Olhou para o xerife
pateticamente.
— Não pode me livrar destes braceletes,
Barnes? Vai ser difícil cavalgar assim —
reclamou Steve.
O homem da lei hesitou por instantes,
olhando os soldados afastados, os oficiais
que os observavam no alojamento.
— Eu sinto muito, Steve. Terá de se
acostumar com elas durante a viagem...
O xerife o ajudou a subir para a cela do
cavalo. Depois apanhou a rédea e foi
amarrá-la em sua própria cela. Montou,
então.
— Não vai descasar um pouco, xerife? —
indagou Steve. — Acabou de chegar.
— Tenho pressa em sair daqui, Steve —
disse o xerife, esporeando seu cavalo.
Os sentinelas esperaram que eles saíram,
depois fecharam os portões. Alguns
homens, na paliçada, fizeram uma
continência dissimulada, quando Steve
olhou para trás.
Doía-lhe deixar aqueles homens que
comandara em algumas batalhas e em quem
confiava. Infelizmente nada poderia fazer
agora por eles.
Sua preocupação estava na estrada que
enfrentariam. Lá na frente, em algum ponto,
ele sabia que Charlie e seus renegados
estariam à espera dele.
Seria longe do forte, com certeza, para
que não ouvissem os tiros da emboscada.
Steve até imaginava qual era o terreno
escolhido para a emboscada.
Quando se aproximavam desta região, já
no fim da manhã, ficou atento, observando
insistentemente o caminho à frente deles,
analisando sua conveniência ou não para
uma emboscada.
— O que há, Steve? — indagou Barnes.
— Posso sentir o cheiro deles, Barnes.
Está no ar — comentou Steve.
— Fiquem alertas, rapazes! — disse ele,
aos dois ajudantes. — Poderemos ter
surpresas pela frente.
— Algum amigo do tenente? —
perguntou Peter, um dos ajudantes.
— Antes fosse, Peter. Antes fosse... E ele
é um capitão!
— Quem mais teria interesse no capitão,
então? — questionou o outro auxiliar, cujo
nome era Mark.
— Tem alguma coisa nesta historia que
não está cheirando bem, rapazes — afirmou
o xerife, estudando com cautela o terreno a
diante.
— Por que diz isso? — quis saber Peter.
— A acusação em si, sem sentido para
um homem com seu histórico militar, as
testemunhas que foram aceitas no caso e
uma porção de outras coisas.
— Está querendo dizer que ele é
inocente, então?
— Sim, Mark. Tenho fortes razões para
crer que tudo não passou de uma trama para
incriminá-lo.
— E conseguiram. Transformaram-no em
um renegado agora.
— É, conseguiram. Só que covardia e
deserção são coisas que não cabem na
figura de Steve Master. Eu o conheço há
muito tempo. É um homem de fibra.
— Mas ele perdeu cinqüenta homens
naquela batalha e só ele escapou com vida,
fugindo — adiantou Peter.
Steve acompanhava a conversa deles sem
intervir. Mantinha-se atento às rochas e
árvores do caminho. Tinha certeza de que
seriam emboscados e queria estar preparado
para isso. O que diziam ou deixavam de
dizer a respeito dele já não lhe importava
mais. O que tinha de ter acontecido, já
acontecera. Precisava agora manter-se vivo.
— Apenas Charlie e sua corja de bêbados
pode testemunhar sobre o que aconteceu lá.
Juraram que viram o capitão se escondendo
e depois fugindo, enquanto seus homens
eram chacinados. Apenas o Exército mesmo
para acreditar em alguém como Charlie,
rapazes — falou o xerife, esporeando um
pouco seu animal para emparelhá-lo com o
de Steve, que ia um pouco mais à frente.
Percebeu que ele tinha os olhos fixos
numa pequena colina logo à frente, ao pé da
qual passariam. Havia rochas e árvores por
ali. Algo ali chamando a atenção do ex-
militar. Pareceu-lhe ter visto o brilho de
uma arma, refletindo o sol que, naquele
instante, encontrava-se quase a pino.
— Livre-me destas algemas e dê-me uma
arma, xerife — pediu Steve.
— Não posso, Steve. O que viu?
— Havia alguém naquela colina a nossa
frente. Rápido, estamos muito perto. Dê-me
uma arma, então.
— Não vejo nada...
— Eu vi um reflexo. Deve ser uma arma.
Com certeza é uma emboscada.
— Eu cuidarei disso — falou Barnes.
— Tire-me isto, Barnes, por favor! —
suplicou Steve, certo do perigo que os
rondava.
Não queria morrer sem lutar, amarrado
como um porco e sem poder se defender.
— Você é um prisioneiro, Steve, sei que
isso o desagrada tanto quanto a mim, mas
terá de se acostumar com a idéia — falou o
xerife, com firmeza. — Quando e se sua
inocência for comprovada, eu terei o maior
prazer em livrá-lo de toda e qualquer cadeia
que o prenda.
— Se houver tempo para isso...
Em resposta aos temores de Steve, um
tiro ecoou na planície deserta, vindo
daquela colina fatídica. Mark, o auxiliar que
vinha um pouco mais atrás, caiu para trás
com os olhos esbugalhados e a testa
afundada por uma bala.
— Protejam-se— gritou o xerife, sacando
sua arma e atirando-se do cavalo.
Steve e Peter fizeram o mesmo.
— Somos alvos fáceis aqui — advertiu
Steve. — Temos que tentar sair.
Novos disparos espantaram os cavalos.
Steve tentou segurar um deles, mas
atrapalhou-se com as algemas. Ainda assim,
conseguiu agarrar a coronha de um rifle na
sela e puxá-lo.
Rolou para junto dos outros.
— Quantos homens calcula que estejam
lá, Steve? — indagou o xerife, livrando-o
das algemas.
As palavras foram abafadas por um
saraivada de balas que levantavam poeira
no atingir o chão e zumbiam tetricamente ao
rebater-se nas rochas.
— Já contei cinco — disse Steve. —
Podem haver mais por aí, contornando-nos.
— Demônios! Sem cavalos e sem água,
sob esse sol, não será fácil suportar por
muito tempo. Ele tem tudo na mão e podem
esperar até que nos desesperemos —
comentou Peter.
Steve já havia analisado toda a situação
rapidamente. Sua habilidade militar e
estratégica agia naturalmente, por hábito,
em situações como aquela.
— Posso tentar chegar até aquela ravina e
procurar pegá-los por trás, xerife — disse o
ex-capitão.
— Talvez eu possa fazer isso melhor,
xerife. Sou mais rápido — falou Peter.
— Quer tentar? Acha que tem uma
chance?
— Se eu não conseguir, ninguém mais
consegue, xerife — firmou Peter, com
convicção.
O xerife e Steve começaram a disparar
ininterruptamente na direção da colina.
Peter correu velozmente na direção da
ravina. Antes que a alcançasse, porém, uma
bala atingiu-o na coxa, fazendo-o rolar na
poeira.
Ele tentou se levantar, mas caiu de
joelhos, a poucos metros da ravina.
Os homens na colina mão o perdoaram.
Puderam mirar com calma e crivá-lo de
chumbo. As balas penetraram em suas
costas com um ruído desagradável,
jogando-o de boca na terra. O sangue
banhou suas costas.
— Diabos! — praguejou Barnes, furioso.
— Ele quase conseguiu...
— É minha vez agora, xerife. Vou tentar
chegar à ravina também...
— É loucura, Steve. Você viu o que
aconteceu com o Peter. Ele era mais jovem
e mais rápido que você.
— Peter podia correr mais do que eu, mas
eu ainda me desvio das balas melhor que
qualquer um.
— Está bem, não temos outra saída
mesmo. Vá, eu lhe darei cobertura.
— Prepare-se! — ordenou Steve —
Agora!
O xerife começou a disparar furiosamente
na direção da colina, sabendo que aquilo
dependiam suas vidas. Steve correu na
direção ravina.
No meio do caminho, porém, percebeu
que o xerife para de atirar.
— Acabou a munição do rifle — gritou o
homem da lei.
Steve não tinha outra escolha. Retornar
ou seguir em frente, ofereciam o mesmo
perigo. A ravina, no entanto, poderia ser a
única chance dos dois.
Barnes abaixou-se atrás da pedra,
remuniciando a arma. Steve deu o máximo
de si, correndo, sentindo as balas cravando-
se no chão, próximo de seus pés.
A distância diminuiu consideravalmente.
Ele julgou que conseguiria chegar a salvo,
mas enganara-se.
Quando estava prestes a atingir a ravina,
uma bala rasgou-lhe as carnes do lado
direito do ombro, fazendo-o cair e rodopiar
na poeira.
O xerife praguejou furiosamente, ao ver
Steve tombar na poeira e ficou imóvel. O
tiroteio vindo da colina cessou.
— Você está bem, Steve? — gritou ele.
O silêncio foi a resposta.
— Malditos! — exclamou o xerife,
voltando a erguer-se e a disparar
sucessivamente sua arma contra a colina.
Neste momento aproveitando-se da
distração provocada pelo xerife, Steve
encontrou forças para capengar até a ravina,
rolando para dentro dela.
— Steve! — gritou o xerife, ao perceber
que ele conseguira chegar até lá.
— Estou ferido — gritou o ex-capitão,
bem alto. — Não posso ir adiante... Estou
sangrando... Vou morrer aqui...
— Inferno! — exclamou o xerife,
sentindo-se como um rato em uma ratoeira.
Nova saraivada de balas levantou poeira
ao seu redor. Projéteis ricocheteavam as
pedras, provocando um ruído incômodo e
macabro.
Ele abaixou-se, tentando pensar em algo
que pudesse tirá-lo dali. Os tiros cessaram e
uma voz rouca e grave gritou-lhe:
— Xerife Barnes, vamos fazer um trato.
Posso poupar-lhe a vida, se me entregar o
prisioneiro.
O xerife não teve dúvidas. Aquela era a
voz conhecida e inconfundível de Charlie, o
mestiço. Falando daquela forma, sabia que
seria reconhecido, portanto, mesmo que o
homem da lei entregasse Steve a ele, sabia
que não iria sair dali com vida. Barnes
jamais deixaria uma testemunha,
principalmente o xerife.
— Que garantias tenho que cumprirá sua
promessa — perguntou o xerife, pensando
no que fazer naquela situação.
— Nenhuma. Terá que confiar em mim.
É sua única chance de sair daqui com vida.
— Deixe-me pensar por alguns instantes
— pediu o xerife, percebendo que Steve
estava conseguindo, apesar de seu
ferimento, caminhar pela ravina e contornar
a colina.
— Seu tempo já se esgotou, xerife. O que
decidiu?
— Steve está ali, naquela ravina,
praticamente morto. Mande-me um cavalo e
eu darei o fora daqui. Você poderá fazer o
que quiser com ele...
— Trato feito, xerife!
Um cavalo apareceu do outro da colina,
sendo enxotado na direção do xerife.
Galopou, porém, até parar no meio do
caminho, entre os emboscadores e o xerife.
Barnes sabia o risco que corria, mas
precisava fazer o máximo para dar a Steve
tempo de encurralar os atiradores.
Levantou-se lentamente e caminhou na
direção do cavalo.
Steve já sumira de vista. Havia
contornado a colina e subia por trás dos
pistoleiros. Barnes percebeu que poderia
pôr o cavalo entre ele e os seus agressores,
usando-o como escudo, quando chegasse o
momento certo.
Se o fizesse, teriam os emboscadores
entre dois fogos, invertendo a situação.
— Pare aí mesmo, xerife! — ordenou
Charlie. — Tem certeza que Steve está
mesmo ferido na ravina?
— Deve estar morto agora...
— Então não precisamos mais de você.
Nosso trato está desfeito — afirmou
Charlie, engatilhando sua Winchester.
Barnes percebeu a armadilha tarde
demais. Tentou correr na direção do cavalo,
mas diversas balas penetraram em seu
corpo, fazendo-o cair em plena corrida e
rolar na poeira.
Steve, que havia terminado de subir a
colina sorrateiramente, olhou para os cinco
homens a sua frente.
Percebeu a armadilha vitimando o seu
amigo, xerife.
— Charlie, seu maldito! — gritou, fora
de si, ao perceber o crime cometido.
O mestiço, advertido pelo grito de Steve,
rodopiou como um felino por entre as
pedras, escapando das balas que Steve lhe
endereçou.
A dor, a fraqueza e o cansaço tiravam do
ex-capitão a destreza e a portaria. Viu um
dos homens e atirou nele, conseguindo
acertar em cheio.
— Cometeu um erro, soldadinho —
gritou-lhe Charlie, com ironia e zombaria.
— Avisou-me de sua presença. Deveria ter
atirado antes e me amaldiçoado depois.
— Não importa como, Charlie, mas vou
matá-lo, nem que isto me custe a vida —
respondeu Steve, levantando-se para atirar.
Sentiu a vista turva e uma vertigem
inesperada abalar seu corpo. Não sabia em
que direção atirar, totalmente atordoado. O
esforço fora demais para a gravidade de seu
ferimento, que continuava sangrando.
Os pistoleiros aproveitaram a chance.
Duas novas balas o acertaram em cheio,
atirando-o de costas e fazendo seu corpo
rolar encosta abaixo.
— Acho que isso o liquida de uma vez
por todas — disse Charlie.
— Quer que a gente vá verificar se ele
está mesmo morto? — indagou um deles.
— Ele já estava morrendo quando o
acertamos de novo. Deixem-no lá. Se as
balas e a queda não o mataram, o sol e os
abutres o farão. Vamos embora, temos um
pagamento para receber, homens — decidiu
ele.
— E o Hernandez? O soldado o matou...
— Deixem-no aí, não me serve para mais
nada mesmo. Vamos embora daqui. Estou
louco por um gole.
Os quatros homens montaram e
cavalgaram na direção do Forte Bowie.
Após algumas horas, chegaram e se
dirigiram direto para a cantina.
Os soldados, aos perceberem a presença
deles, sentiram-se incomodados e
enfurecidos. Todos acreditavam na
inocência de Steve e sabiam que Charlie era
um bandido.
— Olá, Tenente Bolt — cumprimentou-o
Charlie, indo até o militar.
O tenente estava sentado numa das mesas
a um canto, afastado do balcão. Tinha uma
xícara de café a sua frente e pareceu muito
contente com a chegada de Charlie e seus
homens.
— Olá, Charlie! Como vão as coisas?
— Não posso reclamar de nada, Tenente.
— Por que não se senta um pouco? —
convidou o militar e, assim que o
bandoleiro se sentou, o tenente continuou:
— Tudo resolvido?
— Sim, nós o pegamos — informou
Charlie, no mesmo tom de confidência do
outro. — Está morto, agora, servindo como
pasto para os abutres.
— Ótimo, Charlie! — exclamou o
tenente, tomando um pouco de seu café.
— Bem, só nos falta agora receber o resto
do pagamento — cobrou o bandido.
— Vai encontrar tudo aqui — disse o
tenente, depositando sobre a mesa uma
pequena bolsa índia feita de couro.
Charlie abriu uma ponta e examinou as
notas em seu interior. Sorriu satisfeito.
— Tem uma coisinha a mais, tenente.
— Sim, Charlie?
— Preciso de mais dez caixas de rifles e
de mais munição também.
— Está maluco! É impossível, não
perceber? O trato foram dez caixas e mil
dólares, nada mais do que isso.
O bandoleiro sorriu, reclinando-se em sua
cadeira. Atrás deles, os seus pistoleiros
acompanhavam a conversa. No outro
extremo do balcão, os soldados olhavam
naquela direção com raiva e desejo de
vingança.
— Não tem escolha, tenente! Agora está
em minhas mãos. Se não me der o que estou
lhe pedindo, denunciarei seu plano ao seu
comandante.
— Não pode fazer isso. Arruinará toda a
minha carreira. Não fiz tudo isso para ser
traído agora! — rugiu o tenente, lívido de
ódio.
— Então dê-me o que estou pedindo. São
apenas mais dez caixas e alguma munição.
Sei que o Forte Bowie está estocando armas
para todos os fortes da fronteira. Ninguém
dará pela falta de uma quantidade tão
pequena de armas... Não farão falta à
poderosa Cavalaria dos Estados Unidos.
O Tenente Bolt procurou se controlar.
Havia cometido uma bobagem ao confiar
num elemento tão desqualificado como
Charlie. Precisava, antes de mais nada,
mantê-lo calado, enquanto pensava num
modo de tirá-lo de seu caminho.
— Está bem, seu tratante! Ainda vale a
pena, pelo favor que me fez. Verei o que
posso fazer...
— Quando?
— Que tal amanhã cedo? Eu deixarei as
caixas no mesmo local da outra remessa. O
que me diz?
— Para mim parece bom, mas há um
pequeno problema...
— Qual, diabos?
— Preciso dessas armas hoje à noite
mesmo. Amanhã quero estar no México,
onde ficarei por um bom tempo, meu
amigo. Essas armas me darão muito
dinheiro lá.
— Certo, certo! — respondeu Bolt, com
irritação. — Você os terá hoje mesmo.
Charlie sorriu, agradeceu e saiu, seguido
de seus capangas. O tenente ficou olhando
até que eles deixassem a cantina, depois
levou a xícara nos lábios. Fez uma careta e
cuspiu fora.
— Demônios, King! Traga-me outro
café. Este aqui está tão frio quanto o seu
traseiro, seu idiota!
O soldado encarregado da cantina correu
providenciar o pedido do tenente. Todos
estranharam a reação de fúria do tenente,
mas calaram-se. Era um oficial superior.
— Agora vá buscar o Cabo Storm.
Preciso falar com ele imediatamente,
entendeu.
— Sim, tenente!
Após ter feito rapidamente a continência,
o soldado deixou a cantina, retornando,
pouco mais tarde, na companhia do Cabo
Storm.
— O que houve, tenente? — indagou o
cabo, percebendo que o oficial parecia
transtornado.
— Sente-se, cabo — ordenou o outro. —
Aquele maldito mestiço está dando um de
espertinho...
— Não matou o capitão?
— Pelo contrário, fez o que eu tinha
ordenado. Steve Master está morto agora,
mas Charlie está querendo mais dez caixas
de rifles e mais munição.
— Maldito patife! Mais dez caixas? O
que ele pretende? Iniciar outra revolução?
— Vai armar os bandos da fronteira, só
isso. Ele venderá, em troca de ouro, só isso.
— De qualquer forma, não temos
escolha, não? — afirmou o cabo.
— Pelo contrário, cabo. Estou pensando
em não dar os rifles a ele. Prefiro preparar-
lhe uma bela surpresa. Avise nosso pessoal
para se preparar para a ação. Falarei com
vocês depois. Agora preciso ir ver o
coronel. Estou esperando ansiosamente uma
noticia que ele deve ter recebido e que nos
interessa.
— Aquilo? — indagou o cabo, em
suspense.
— Possivelmente.
— Ótimo, senhor! — respondeu o cabo,
levantando-se, batendo continência e
saindo.
Bolt terminou seu café, depois se dirigiu
até o comando do forte. Sentia-se seguro de
si e esperançoso quanto ao resultado de seus
planos.’
Se tudo corresse perfeitamente, em breve
seria um fazendeiro rico no México, livre
para sempre de todas as atribulações e
preocupações.
Um soldado cortou-lhe o caminho,
ficando em posição de sentindo.
— O que deseja, soldado? — perguntou,
surpreso, respondendo à continência do
outro.
— Senhor, sabe como os homens aqui do
forte gostavam do Capitão Masters. Nós...
Bem... Ninguém aqui engoliu muito aquela
historia e...
— Vamos logo ao ponto, soldado. O que
tem a me dizer?
— Na verdade, ninguém acredita que ele
foi culpado daquelas acusações. Todos o
conhecíamos e sabíamos de sua coragem e
sua capacidade...
— E daí?
— Daí, senhor... Bem... Charlie e seus
bêbados estão aqui no forte. Deixe-nos
cuidar deles. Prometo que se os levarmos
até o estábulo vamos arrancar deles toda a
verdade...
O rosto do tente demonstrou
contrariedade e rigor.
— O que é isso, soldado? percebe o que
está me dizendo? Está questionando o
resultado de uma Corte Militar? Cuidado,
muito cuidado com o que diz e com o faz.
Charlie e seus homens são civis e, enquanto
estiverem neste forte ou fora dele, estarão
sob nossa proteção. Não quero que nada
aconteça a eles, entendido? Se eu tomar
conhecimento de qualquer ação que vá
contra estas minhas ordens, você será o
primeiro a ser levado a uma Corte Marcial
por desobediência, entendido mesmo?
— Entendido, senhor! Desculpe-me,
senhor! — respondeu o soldado,
visivelmente contrariado com a conversa.
Bolt, pelo contrário, percebia como os
homens pensavam e reagiam ao que Charlie
havia feito. Um plano começava a se
delinear em sua mente.
Se tudo corresse bem, Charlie deixaria de
ameaçá-lo para sempre. Assim pensando,
rumou para a sala de comando. Estava
muito ansioso pela noticia que já deveria ter
chegado.
Joe Pena Branca era uma velha ratazana
do deserto, um índio sem tribo, renegado
em sua juventude por se indispor com o
cacique de sua tribo. Quando podia
distender a corda de uma arco, ele
infernizara metade do Arizona com sua
corja de fora-da-lei índios e mestiços.
Agora velho, vivia de pequenas
pilhagens, como um coiote, aproveitando-se
de despojos para continuar a viver. Ao
encontrar aqueles três cavalos soltos e
selados na planície, recolheu-os e seguiu-
lhes a trilha.
Havia ouvido o tiroteio e sabia que
alguma coisa poderia ser aproveitada.
Encontrou os mortos. Retirou-lhes as
armas, chapéus e tudo que pudesse ser
vendido ou transformado em comida em
trocas com outros renegados como ele.
Quando pretendia se afastar, percebeu um
vulto que se arrastava pela encosta da
colina. Pelas roupas, deduziu que era um
soldado. Foi até lá, sem muita pressa,
arrastando o velho esqueleto. Quando se
debruçou para olhar melhor, o ferido girou
o corpo e ficou de cara para o sol, ofegante
e banhado de sangue.
— Capitão Master! — reconheceu o
velho.
— Joe, que satisfação ver sua cara feia,
seu malcheiroso! — balbuciou o homem
que o velho reconhecera. — O que faz por
aqui?
— Ouvi os tiros... Está muito mal,
capitão! O que houve? Ouvi muitos tiros...
— É uma historia complicada para contar
agora, Joe. Preciso de sua ajuda... Estou
muito ferido mesmo.
— Eu vou cuidar de você, Capitão. Vou
levá-lo para a minha toca e cuidar desses
ferimentos. Posso contar três buracos de
bala no seu couro.
— Terá de fazer uma maca, meu velho.
Não tenho forças para cavalgar...
— Não se preocupe. Ainda sei como
fazer essas coisas, capitão. Vou levá-lo em
segurança e confortavelmente.
O velho índio não teve dificuldades para
arrumar dois galhos longos e prendê-los no
lombo de dois cavalos. Com uma das
mantas, improvisou a maca, presa aos
varais, entre os animais.
Uma hora mais tarde chegavam ao
esconderijo do velho, numa encosta, à beira
de um regato. Joe aplicou alguns
medicamentos índios nas feridas, mas sabia
que elas não poderiam curar Steve. Uma das
balas havia lhe varado as costelas e saído do
outro lado, mas duas outras ainda estavam
dentro dele.
— Medicina de Joe Pena Branca é boa,
mas não fará balas caminharem para fora de
seu corpo, capitão. Joe não sabe como tirá-
las daí sem cortar demais...
— Ainda bem que você não é curandeiro
fanático, Joe, senão eu estaria morto em
suas mãos. Mas se as balas ainda estão aqui,
vai ter que tirá-las de qualquer jeito... —
falou Steve, percebendo que não tinha
escolha.
— Não, Joe não fará isso, capitão.
Melhor chamar o Dr. Kane, lá no forte.
— Não, Joe, você não deve ir ao forte.
Ninguém mais deve saber onde estou.
Poderia ser o meu fim.
— Joe não tem escolha. Vai ter que
chamar o doutor ou ver o capitão morrer...
— falou o velho, decidindo-se.
Apesar dos protestos do ex-capitão, o
velho índio saiu. Nas condições em que se
encontrava, nada restou a Steve senão
esperar, a sua volta.
Algumas horas mais tarde Joe retornou
com o Capitão Kane, médico do
destacamento. Steve estava fraco, mas não
tivera febre. A medicina de Joe Pena Branca
funcionava em alguns casos.
Ao reconhecê-lo, o médico hesitou. Sabia
que Steve era um homem condenado por
uma Corte Marcial e entregue à Justiça
comum. Naquela situação, seu dever como
militar era dar-lhe voz de prisão.
Ele, no entanto, como muitos outros, não
acreditavam na culpa do capitão.
— Como se sente, Steve? — indagou,
abrindo os curativos que Joe fizera para
examinar os ferimentos.
— Sinto-me péssimo, capitão... Mas
antes de mais nada, preciso de sua
discrição... Prometa-me que não revelará
que me viu aqui, com vida.
— Diabos, Steve! Minha posição é
delicada...
— A minha também, Kane, mas eu lhe
contarei a minha versão agora, enquanto
você me arranca essas duas balas que ainda
tenho comigo.
— Está bem! Beba uns bons goles deste
uísque medicinal. Vai amenizar a dor —
receitou o médico.
Steve o atendeu, deixando que a bebida o
entorpecesse. Enquanto o médico retirava as
balas ele contou tudo que se passara na
verdade.
Às vezes interrompia a narrativa, e
ofegava, pela dor violenta que sentia.
— Joe, faça uma boa fogueira e esquente
aquele ferro ali — disse o médico,
apontando para um sabre partido ao meio,
cravado na terra.
— Retirou as balas, doutor? — quis saber
Steve.
— Não, mas já as localizei. Estou num
dilema, meu amigo. Posso matá-lo se tentar
tirá-las... Ou deixá-lo morrer se não o fizer.
Um pouco de movimento de sua parte e elas
atingirão uma artéria.
— Vamos lá, doutor. Não deve ser tão
difícil assim — incentivou o ex-militar.
Joe entendeu o que estava acontecendo.
Tratou de fazer logo uma fogueira, ponto a
lâmina partida no meio das chamas.
Gradativamente ela foi ficando rubra.
— Tome mais um pouco disso — falou o
médico, passando-lhe a garrafa de uísque.
A bebida era fortíssima e era usada como
anestésico, pela sua alta concentração de
álcool.
— Vai doer tanto assim? — indagou
Steve.
— Acho que sim, não imagino o quanto.
Quer saber o que será feito?
— Já o vi em ação antes, doutor. Vai
pinçar a bala e cauterizar a ferida com a
lâmina quente, não?
— Sim, será a única forma de afastar
qualquer possibilidade hemorragia. Depois
que eu o costurar, se você sangrar estará
certo de um modo terrível e doloroso.
— Certo, doutor. Você tem o diploma.
O médico olhou na direção de Joe, que
levantou o sabre. A lâmina ainda não estava
totalmente rubra. Podiam esperar um pouco
mais. Havia pinçado a artéria que poderia
provocar um sangramento maior, mas teria
de liberá-la no momento da retirada da bala.
Tentou distrair Steve.
— Ainda não entendi que razões tinha
Charlie para matá-lo, capitão.
— A mesma razão que teve para
apresentar um falso testemunho contra mim.
Só que não sei o que o levou a isso.
— Isso é estranho, muito estranho.
Charlie está lá no forte agora, como se nada
tivesse acontecido.
— Ele entrou em contato com alguém?
— Não que eu tenha visto, por quê?
O médico fez um sinal para o índio, que
retirou o sabre das chamas e o levou até
perto do médico. Ele havia prendido a bala
com uma pinça. Puxou-a de uma vez,
depois, com rapidez, introduziu o sabre na
ferida.
Steve urrou de dor, enquanto Joe o
segurava pelos braços. Imediatamente o
outro ferimento começou a sangrar. O
médico não perdeu tempo. Pinçou a bala e
repetiu a operação. Steve havia desmaiado
de dor.
— Isso facilita tudo, Joe — concluiu o
médico, observando as feridas.
— Joe, ele vai ter que ficar aqui por
algum tempo. Vou lhe mostrar como trocar
esses curativos. Venha até aqui.
O médico explicou detalhadamente tudo
ao índio. Quando terminou, o índio o olhava
com incredulidade.
— Medicina de Joe não é tão
complicada...
— A medicina de Joe salvou a vida do
capitão. A minha medicina vai ajudá-lo a se
recuperar. Mas isso será possível se você
me ajudar...
O índio pensou por instantes.
— Está bem, eu faço isso — concordou.
O médico aguardou algum tempo, até que
o ferido recuperasse a consciência.
— Como se sente?
— Mal, muito bem.
— Então está normal. Por que você me
perguntou se Charlie tinha entrado em
contato com alguém?
— Tenho razões para crer que ele vai se
encontrar com alguém lá. Por favor, Kane,
vigie-o e veja o que descobre. Não posso
exigir nada, mas sou inocente e preciso de
toda a ajuda de que puder dispor. Preciso de
uma chance para provar a minha inocência.
O Xerife Barnes era o único que poderia me
ajudar, após aquela emboscada, mas está
morto agora e não poderá testemunhar
contra Charlie e seus ratos...
— Tudo bem, Steve, não se exalte. Vou
ajudá-lo. Nunca acreditei naquele mestiço
mesmo.
— Mandarei Joe amanhã cedo ao forte.
Transmita a ele o que descobrir.
— Farei isso, mas é bom que você
repouse. Não queria ser valente demais. Os
ferimentos foram sérios e você perdeu
muito sangue. Vai ter que se alimentar bem
e repousar. Darei a Joe alguns mantimentos
amanhã, quando ele for ao forte.
— Obrigado por acreditar em mim, Kane.
— Confie em mim, Steve. Vamos ajudá-
lo a provar sua inocência.
Gradativamente a cidade começava a se
agitar com achegada dos vaqueiros que
vinham dos ranchos próximos da cidade. A
maioria tinha destino certo: O saloon, de
onde, já no começo da tarde, vinham os
acordes de uma pianola tocando
alegremente.
Lá dentro, o cheiro de bebida e cigarro
era característico daquelas paredes e
assoalho. As mesas já estavam totalmente
cheias, com bebedouros tagarelas ou
jogadores de pôquer.
Kay Gregor, proprietária do saloon, o
melhor de Tucson, desceu lentamente as
escadas, satisfeita com o movimento.
Olhares e comentários elogiosos
acompanharam seus movimentos.
No auge de sua beleza e juventude, Ray
chamava a atenção por onde passava, fosse
no saloon, com um decotado vestido
vermelho ou na rua, com um recatado
modelo de missa.
Foi até o balcão cumprimentar o barman.
— Tudo bem, Joe?
— Sim, patroa. Não esperava um
movimento como este numa tarde de
sábado, principalmente porque não é época
de pagamento.
— O pessoal está curioso. Sabe se o
Xerife Barnes já voltou do Forte Benson?
Penso que isso esteja atraindo toda essa
gente.
Joe sorriu, balançando a cabeça de um
lado para outro. Sabia que o interesse dela
não era pelo xerife, mas pelo Capitão
Master. Todos que freqüentavam o saloon
sabiam de sua afeição pelo Capitão da
Cavalaria.
— Ainda não voltou, patroa. Eu a
avisarei quando souber de alguma coisa.
— Obrigada, Joe!
Deu alguns passos ao longo do balcão,
olhando para a mesa ao fundo, onde alguns
homens jogavam pôquer pesado, com altas
apostas.
— Estou com sorte hoje! — ouviu um
dos jogadores exclamar, num tom de voz
mais alto.
Caminhou até lá, distribuindo sorrisos e
esquivando-se agilmente das mãos que se
estendiam a sua passagem, tentando segurá-
la ou fazê-la sentar nas mesas.
— Vejo que está mesmo com sorte,
Carlson — observou ela, notando a aposta
alta na mesa e uma quadra de sete nas mãos
de Carlson.
— Realmente estou com muita sorte,
Kay. Além de estar ganhando no jogo, sei
que logo aquele renegado será enforcado e
isso me dará alguma chance com você.
Kay empalideceu ao ouvir aquilo. Suas
mãos se crisparam, mas ela procurou manter
a calma. Seu desejo era sacar a arma que
trazia oculta e meter uma bala na boca suja
e grande se Carlson.
— Como pode ter tanta certeza de que ele
será mesmo enforcado? Acaso sabe de
alguma coisa que nós não sabemos? Ele
ainda nem foi julgado.
— Steve Master é um renegado maldito.
Se o Exército o condenou, a justiça civil
também o fará. Em breve vamos vê-lo
balançando na ponta de uma corda. Então
nada nem ninguém ficará entre nós,
querida!
— Não esteja tão certo de suas chances,
Carlson. Eu posso não aprová-las.
— Como não? Quer ver como anda a
minha sorte? Vou apostar quinhentos
dólares nesta mão. Verá como eles correrão
como coelhos assustados — disse o jogador,
sorrindo com superioridade, atirando quase
todo o resto de suas fichas no meio da mesa.
Seus adversários suspiraram, tentando
descobrir se aquilo não passava de um
blefe. Após alguns instantes, porém,
percebendo que Carlson se mantinha com
aquele sorriso de triunfo nos lábios, um a
um foram atirando suas cartas na mesa, com
uma praga, até que restou apenas um
forasteiro.
O desconhecido, até então, não havia
ganhado nem perdido. Parecia estar apenas
esperando uma chance de ganhar uma
bolada, num golpe que valesse a pena.
— Seus quinhentos... — disse ele,
atirando as fichas no meio da mesa.
Depois, começou a separar e contar as
fichas que ainda tinha consigo.
— E mais mil dólares! — acrescentou,
empurrando as fichas para junto das outras.
Um murmúrio percorreu as pessoas que
assistiam ao jogo. O sorriso morreu nos
lábios de Carlson. Ele examinou o rosto do
forasteiro, depois as próprias cartas.
— Jeff, pegue mais mil dólares no banco
e traga-o agora mesmo...
— O banco está fechado, Carlson!
— Mande abrir! — ordenou ele, furioso,
sempre olhando o forasteiro nos olhos.
O homem alto e forte, com o chapéu
caído até os olhos, não piscava nem movia
um músculo. Seus olhos, de um azul quase
cinza, mantinham-se fixos nos de Carlson.
Kay fez um sinal para o barman, que se
apressou em servir alguns drinques. O
forasteiro agradeceu com um sorriso,
entornando seu uísque de uma vez. Jeff
chegou logo depois, esbaforido, com as
notas na mão.
Carlson as apanhou, atirando-as na mesa.
— Vamos ver como anda sua sorte,
forasteiro, ou se deu uma terrível mancada
blefando contra mim — falou o jogador.
— Estou curioso para ver a sua também
— respondeu o seu adversário.
— Quadra de setes — falou Carlson, com
um sorriso zombeteiro, estendendo os
braços para recolher a bolada a sua frente.
Um pulso forte segurou sua mão direita,
torcendo-a e empurrando-o para trás.
— Não tão depressa — falou o forasteiro,
sem alterar o tom de voz.
Surpresa, Carlson empalideceu. Jamais
alguém ousaria falar e agir daquela forma
contra ele.
— O que há, forasteiro? Não gosta de
perder? — indagou, percebendo que Jeff,
seu capanga, já estava com a mão direita
descansando na coronha do Colt.
— O jogo ainda não acabou. Quer ver as
minhas cartas primeiro? — perguntou o
forasteiro, começando a depositá-las uma a
uma na mesa.
— Quadra de dez! — exclamaram as
pessoas ao redor.
Kay sorriu com satisfação, percebendo
que Carlson acabava de levar uma surra no
jogo, perdendo uma boa quantia. O
forasteiro, sem se alterar, começou a
recolher a mesa.
Carlson olhou ao seu redor, furioso.
Notou o sorriso de Kay, entendendo aquilo
como zombaria.
— Não estará tão alegre quando o seu
capitão for enforcado, Kay — disse
Carlson, com rancor.
— Poupe-me de suas previsões
pessimistas, Carlson!
— Virá se arrastando a meus pés quando
ele morrer.
— Jamais!
— Verá que uma prostituta cara como
você não encontrará alguém que pague seu
preço, exceto eu — falou ele, com
arrogância.
Em resposta, Kay o esbofeteou
violentamente, marcando o rosto dele com a
palma de sua mão. Carlson ficou imóvel por
instantes, aturdindo ainda, depois reagiu,
desferindo uma violenta bofetada, com as
costas da mão, no rosto da garota,
derrubando-a sobre uma das mesas ali perto.
Carlson não soube exatamente o que
aconteceu em seguida. Apenas sentiu o
baque de uma pesada mão em seu ombro,
agarrando-o e fazendo-o girar.
Em seguida, um punho fechado o atingiu
violentamente no queixo e a luz do sol se
apagou para ele, que desabou pesadamente
no assoalho.
— Não devia ter feito isso — falou Jeff,
tentando sacar a arma.
O forasteiro foi mais rápido, segurando-
lhe o braço, ao mesmo tempo em que
sacava seu Colt e desferia poderosa pancada
no alto da cabeça do outro, derrubando-o ao
lado de Carlson.
— Detesto homens que batem em
mulheres — acrescentou o forasteiro,
percebendo que Carlson começava a se
levantar.
Aplicou-lhe um formidável pontapé na
cabeça, fazendo-o rolar desacordado.
Carlson era chefe de um bando de
cocheiros encarregados das diligências da
Arizona Horselines, que formavam um
grupo fechado e forte na região, pois
ninguém era admitido sem sua autorização.
Assim, quando ele foi chutado daquela
forma, três outros cocheiros ali presentes
avançaram sobre o forasteiro, dispostos a
estraçalhá-lo.
— Cuidado, forasteiro! — gritou Kay,
recuperando-se, ainda aturdida, da bofetada.
— Obrigado, dona! — respondeu o
estranho, enquanto atingia a testa do
primeiro com uma garrafa.
O homem urrou, enquanto o sangue
escorria, misturando ao uísque.
O segundo cocheiro avançou mais furioso
ainda, mas imobilizou-se ao receber um
pontapé no estômago que lhe tirou o fôlego.
Antes que percebesse o que estava
acontecendo, o joelho do forasteiro subiu
para atingir em cheio a sua cara, jogando-o
de costas.
O terceiro estremeceu, quando uma
cadeira foi arrebentada em sua cabeça. O
sangue começou a escorrer, manchando sua
camisa. Ele oscilou. O forasteiro completou
o serviço, esmurrando-o no queixo o pondo-
o para dormir.
— Deve-me um dólar pelo uísque e dois
pela cadeira — disse Kay, com um sorriso.
— Eles pagarão — respondeu o
forasteiro, abaixando-se para se livrar de
uma cadeira que passou voando por cima de
sua cabeça.
Agilmente se desviou de um homem que
tentava atingi-lo com uma garrafa. Em
resposta, apanhou um lampião na parede ao
lado dele e arrebentou-o nos dentes do
outro.
— Mais um dólar! — gritou Kay, que
fora se refugir atrás do balcão.
— Deixem-no para mim — pediu
Carlson, levantando-se com a cara inchada e
os olhos injetados de tanta raiva.
Quatro homens encurralaram o forasteiro
num dos cantos do saloon.
— Que tal fazermos as pazes, amigos? —
brincou o forasteiro, de bom humor.
— Para o inferno com você — rugiu
Carlson, cuspindo sangue. — Não sairá
daqui com vida.
Os quatros homens avançaram a um
sinal. Um pontapé tirou o bom humor do
forasteiro, atingindo-o nas costelas e
jogando-o sobre uma das mesas.
— Diabos! — exclamou ele, furioso.
Apanhou a mesa e usou-a como um
escudo para investir contra seus atacantes,
derrubando-os. Possesso, passou a distribuir
socos e pontapés com uma violência
incomum, até que não restasse mais nenhum
dos atacantes em pé.
O forasteiro estava ofegante, com os
punhos manchados de sangue.
— Cuidado! — gritou uma voz feminina.
Instintivamente atirou o corpo para o lado
e sacou sua arma. O cocheiro que havia
recebido um golpe no inicio da briga se
recuperara e resolvera atirar contra seu
agressor.
Antes de tocar o assoalho, o forasteiro já
havia disparado duas vezes. Quando a
fumaça se dissipou, o cocheiro estava
parado, pálido, com as mãos no peito,
tentando estancar o sangue que escorria por
entre seus dedos.
Com uma expressão de terror nos olhos
arregalados ele caiu de joelhos.
— Fui baleado! — murmurou ele e caiu
de cara no assoalho, morto.
O forasteiro se levantou. Apanhou uma
garrafa de uísque caída de uma das mesas
durante a briga, arrancou a rolha com os
dentes e derramou o líquido sobre sua mão
direita e depois, na esquerda. Enxugou-as
numa toalha de mesa.
Depois foi até o balcão, onde Kay o
aguardava com um sorriso de gratidão e um
brilho de admiração nos olhos.
— Meu nome é Skip, dona. Devo-lhe a
vida. Se não tivesse me avisado, ele teria
me acertado — disse ele, olhando-a com
atenção e notando a beleza dela.
— Não gosto de ver homens morrendo
pelas costas, principalmente em meu saloon
e especialmente que me defendem— falou
ela, retirando o lenço de seda que trazia no
pescoço, rasgando-o ao meio e tomando as
mãos do recém-chegado.
— Foi um prazer defendê-la, madame —
falou ele, enquanto ela enfaixava as mãos
dele, na altura dos nós dos dedos, esfolados
durante a briga.
— Sou Kay Gregor, a dona do saloon.
Pode me chamar de Kay, por favor. Deixe-
me oferecer-lhe uma bebida.
— Com todo prazer!
Ela escolheu uma garrafa de uísque de
sua reserva especial, sob o balcão, servindo-
lhe um copo. Ele bebeu e apreciou. Ela
repetiu a dose.
O barman fora até a mesa e recolheu o
dinheiro dele, ganho no jogo. Levou-o, no
próprio chapéu do forasteiro, pondo-o sobre
o balcão.
— Obrigado, amigo! — agradeceu ele,
retirando dez dólares do chapéu e pondo-o
sobre o balcão. — Acho que isto cobre os
prejuízos, não?
— Vai ser por conta da casa. Deixe para
lá — afirmou Kay, retornando as moedas
para dentro do chapéu dele.
Ele sorriu, agradecido, despejando o
conteúdo do chapéu no balcão. Separou as
notas, fichas e moedas. Guardou o dinheiro
e pediu ao barman para trocar as fichas.
Kay olhava com atenção e curiosidade
aquele rosto sorridente e brincalhão. Ficou
intrigada com alguma semelhança, julgando
já tê-lo visto antes.
— Será que já não nos conhecemos,
Skip? — perguntou.
— Se eu tivesse tido este prazer antes,
juro como não teria me esquecido de você,
Kay. Seria impossível. Você é uma mulher
que não se consegue esquecer, mesmo que
se queira...
— Muito lisonjeiro de sua parte, Skip,
mas seu rosto me é familiar.
Ele riu alegremente, antes de explicar.
— Creio que sei a resposta para sua
dúvida. Minha mãe sempre dizia que nós
nos parecíamos muito...
— Nós? quem?
— Eu e meu irmão, você deve conhecê-
lo.
O rosto dela se iluminou de repente.
— Acho que entendo agora — sorriu ela.
— Meu irmão se chama, Steve, Steve
Master, você o conhece? É capitão no forte
Benson. Soube que se meteu numa
embrulhada, por isso vim aqui, ver o que
poderia fazer para ajudá-lo.
— Isso explica tudo. A semelhança entre
os dois é notável, com exceção dos olhos...
— Steve tem os olhos de minha mãe e eu,
os de meu pai. Fico feliz que o conheça.
Sabe em que tipo de problema ele se meteu?
Parece que é alguma coisa séria, não?
— Muito mais séria do que pode
imaginar, Skip. Vou lhe contar tudo que
aconteceu — disse ela.
Naquele momento, amparado por dois de
seus amigos, Carlson parou ao lado de Skip,
chamando-lhe a atenção. Seu olhar era
cheio de rancor. Seu rosto estava inchado
pela boca.
— Nós nos encontraremos de novo,
forasteiro. Você pagará caro pelo que fez.
— Estarei a sua espera, meu caro, quando
quiser. E pare de me chamar de forasteiro.
Tenho nome e me orgulho dele.
— Diga-me, então, qual é seu nome!
Preciso saber para mandar escrever em sua
lápide.
— Skip Master!
— Master? Por acaso é parente daquele...
— Cuidado com o que fala, moço. Se vai
mencionar o Capitão Master, é bom que fale
com respeito. Ele é meu irmão.
— Mais um motivo para eu querer matá-
lo, Skip Master — afirmou Carlson, com
fúria.
— Cachorro que ladra não morde —
zombou Skip.
— Os que duvidaram de minhas
promessas estão espalhados pelas Colinas
dos Pés Juntos de todo o Arizona, moço...
— E os que tentara fazer calar fazem
companhia a eles — interrompeu-o Skip. —
Agora dê o fora logo. Sua cara me enoja e
fico tentado a modificá-la a pancadas.
Skip esperou até que Carlson e os outros
saíssem. Depois se voltou para Kay.
— Quem é esse tipo?
— Ben Carlson, chefe dos cocheiros da
Arizona Horselines. Um estúpido, arrogante
e metido a poderosos.
— Parece não gostar de meu irmão.
— Sim, mas essa é outra historia. Venha
comigo, vou contar tudo que sei —
convidou ela.
O Tenente Bolt chegava ao fim de sua
longa conversa com o Coronel Donald,
comandante do forte. Durante quase três
horas ambos haviam se debruçado sobre o
mapa do Arizona, traçando uma rota que
fosse a ideal. Haviam trocado idéias e
analisado sugestões para chegar até ela.
Estavam ambos exaustos e cansados
daquilo.
— Creio que esse é o nosso melhor
caminho, coronel — falou o tenente.
— Concordo plenamente. Foi um ótimo
trabalho, tenente. Eu sabia que poderia
contar com seus conhecimentos do
território.
— Fiz questão de tomar todas as
precauções, coronel. Apanharemos o ouro
em Douglas, passaremos pelo deserto para
devotar os ladrões que infestam Tucson e
chegaremos a Phoenix sem passar por
Mesa. É uma rota muito segura e pouco
utilizada, o que garante nosso caráter
secreto.
O coronel acendeu seu cachimbo e foi até
a janela respirar um pouco de ar. Ficou
baforando por instantes, antes de se voltar e
encarar o oficial.
— Sabe, Bolt, esta missão seria do
Capitão Master, se não tivesse acontecido
tudo aquilo?
— Sei como se sente, coronel, mas não
deve se culpar por ter cumprido seu dever.
Master mereceu a punição. Acho até que
fomos condescendentes com ele.
— Era um bom oficial, com uma folha de
serviços impecável. Não pude entender.
Após esta missão, com certeza ele seria
promovido, sem sombra de dúvidas.
O Tenente Bolt escondeu sua satisfação,
apresentou continência e deixou a sala do
comando, confiante no resultado de seus
planos.
— Tenente, por favor, preciso falar-lhe
— disse o cavaleiro que acaba de desmontar
diante do alojamento dos oficiais.
Era o Capitão Kane, médico do
destacamento.
— O que houve, capitão? Parece
assustado? — observou o tenente.
— Vai se assustar da mesma forma que
eu — falou Kane, segurando Bolt pelo
braço e levando-o para um local isolado,
onde não seriam ouvidos.
— O que aconteceu afinal, Kane? você
parece transtornado!
— Acabo de me encontrar sabe com
quem?
— Não tenho a menor idéia. Deixe de
segredos e conte logo o que viu.
— Eu me encontrei com Master.
— O Capitão Master? — estranhou Bolt.
— Está maluco! Ele foi levado pelo xerife.
— Não, não foi. O grupo foi emboscado
e Master foi o único que sobreviveu,
embora muito ferido. Eu tratei dele ainda há
pouco, sei do que estou falando.
— Onde se encontrou com ele?
— Nas montanhas, na caverna de Joe
Pena Branca, aquele velho índio.
— Ele disse alguma coisa? Master fez
algum comentário sobre o ataque? — quis
saber o tenente, apreensivo.
— Sim, ele reconheceu os homens que os
atacaram.
— Quem eram?
— Charlie e seu grupo.
— Impossível, Master está tentando por
todos os meios incriminar Charlie para se
livrar da acusação. Deve ter matado o xerife
e os outros para tentar fugir e sido ferido.
— Não tinha pensado nisso — comentou
o médico, agora em dúvida.
O tenente estava contrariado, mas
esforçando-se para disfarçar isso. A
imprudência de Charlie poderia jogar por
terra um plano longamente elaborado por
Bolt e alguns de seus soldados.
Tivera de agir prontamente, incriminando
Steve Master no roubo das armas, onde
duas sentinelas haviam morrido. Depois
disso, esforçara-se para conseguir sua
nomeação como comandante da escolta de
uma partida de ouro, adquirida pela União
para a confecção de moedas.
Bolt teve de pensar rápido novamente.
Precisava afastar o capitão de tudo aquilo.
— O que pretende fazer agora, capitão?
— Eu ia comunicar o fato ao coronel,
embora Steve Master tivesse insistido pra
que eu não revelasse o fato a ninguém.
— Não sei, capitão. Os homens têm
vindo conversar comigo, todos gostavam
muito do Steve. Se comunicar o fato ao
coronel, ele terá de mandar prender o
capitão novamente. Sou amigo dele, como
os outros soldados, acho que ele merece
uma chance de provar a sua inocência...
— O que tem em mente, tenente?
— Por que não deixa que a ética médica
fale mais alto neste caso em particular,
capitão? Não comunique o fato ao coronel.
Steve era meu amigo também, dê-lhe está
chance.
O capitão hesitou. Estava um tanto
atrapalhado. Era um bom médico, mas
jamais fora um soldado, apegado às
tradições e ao respeito às normas militares.
Sua patente vinha simplesmente de sua
condição de médico. Kane pensava como
um civil e Bolt confiava nisso.
— Vai ajudá-lo — indagou ao tenente.
— Farei tudo que estiver ao meu alcance,
capitão. Só que ninguém mais pode saber
disso ou a vida de Steve nada valerá.
— Certo, tenente, vou deixar que você
cuide disso, então. Como militar de carreira
tem mais experiências que eu. Para todos os
efeitos, eu nada sei sobre o assunto.
— Obrigado, capitão, pela confiança.
Não se arrependera. Garanto que o Steve
lhe será grato para sempre — assegurou o
tenente, satisfeito com a saída para a
situação.
Enquanto o capitão se dirigia ao estábulo,
Bolt pensou por instantes no que deveria
fazer em seguida.
Deu meia-volta e retornou à sala de
comando.
— Sim, tenente? — indagou o coronel,
estranhando vê-lo de volta após aquela
demorada reunião.
— Eu percebi algumas coisas depois que
saí daqui, coronel, e achei que devia levar
ao seu conhecimento.
— E de que se trata?
— É sobre Charlie, senhor. Ele e seus
homens estão aqui no forte, no momento.
Andei observando que os soldados não os
apreciam. Estou temeroso de uma represália
contra eles. Os homens podem querer se
vingar de Charlie por causa de seu
depoimento na Corte Marcial.
— Está tão sério assim?
— Sim, os homens andam tensos e se
agrupam nas proximidades de onde estão
Charlie e seus homens. Temo que logo
comecem a entrar em atrito.
O coronel meditou por instantes.
— Acho que pode cuidar disso, tenente.
Deixou o assunto em suas mãos. Tome as
providências que julgar necessárias. eu,
particularmente, não gosto também de
Charlie e de seus bêbados. São péssimo
exemplo para a tropa.
— Está bem, coronel. Farei o que estiver
ao meu alcance para resolver isso —
afirmou o tenente, deixando a sala.
Tudo estava correndo bem agora. Poderia
dar cabo de Charlie e seu grupo,
eliminando, assim, uma testemunha
perigosa para seus planos.
Assim que saiu dali, foi à procura do
Cabo Storm, também envolvido no plano.
— E então, tenente? — quis saber Storm,
ansioso pela noticia importante.
— Tudo perfeito, cabo. Acabo de sair de
uma reunião de três horas com o coronel.
Como afastamos Master da jogada, ele me
encarregou de todos os procedimentos para
a escolta do ouro, inclusive de recrutamento
dos homens.
— Perfeito, tenente! — sorriu o cabo
Storm, aliviado. — E quanto a Charlie e seu
bando de renegados?
— Reuna nosso pessoal. Vamos dar um
fim em Charlie e nos outros. A culpa será
de todos os soldados do forte, que adorarão
saber que ele está morto.
— Muito bem pensado, tenente. Todos
aqui têm motivos de sobra para quererem
tirar o couro de Charlie e dos outros.
— Só que temos um probleminha para
resolver.
— Qual? — quis saber o cabo, intrigado.
Todas as providencias estavam em
andamento e desconhecia algo que pudesse
atrapalhá-los.
— Master ainda está vivo!
— Que diabos! Aquele maldito mestiço
mentiu para nós. Ele falhou!
— Sim, e o que é pior. O capitão Kane
foi chamado para tratar dos ferimentos do
Steve. Diz que ele está mal, mas acho que
vai se safar dessa. Master informou ao
capitão que reconheceu Charlie e seus
renegados.
— Um motivo a mais para liquidar
aquele renegado — falou Storm, com raiva.
— Sim, penso da mesma forma, cabo.
Vamos cuidar do Charlie e depois do Steve.
Agora vá selar meu cavalo. Vou à cidade
conversar com Carlson, da Horselines. Ele
conduzirá o ouro. Quero que venha comigo.
— Certo, tenente! Tudo está saindo
conforme foi planejado, não?
— Sim, cabo. Controlado com uma
operação militar, em seus mínimos detalhes.
Estou certo que poderia ter até uma
promoção após a missão, mas não vou estar
aqui para ver isso. Com minha parte no
ouro, pretendo viver no México, sossegado
para o resto da vida, numa hacienda,
cercado de senhoritas!
— Que vida! — exclamou Storm, rindo,
contagiando o tenente.
Steve Master acordara e tentava comer
um pouco do excelente guisado de coelho
preparado pelo índio. Estava com o tronco
apoiado numa porção de cobertores e podia
olhar ao seu redor e observar, com espanto,
a quantidade enorme de coisas, resultado
das pilhagens do índio.
— Joe, venha cá! — pediu, após ver algo
que lhe chamara a atenção.
— O que houve, capitão? Não apreciou a
comida de Joe Pena Branca?
— Não se trata disso. Traga-me aquele
rifle ali — apontou ele, na direção de uma
pilha de armas, cinturões e munição.
— Qual deles, capitão?
— Aquele rifle Springfield, de repetição.
O índio foi apanhá-lo e trazer para o
capitão, que o examinou cuidadosamente.
Havia ali um número de série e todas as
marcas de provas do Exército dos Estados
Unidos.
Era, com certeza, uma das armas
roubadas do arsenal do forte.
— Onde a encontrou?
— Tirei de uma bandoleiro morto. Ele foi
ferido num encontro com vocês e acabou
vindo parar aqui, com meia dúzia de balas
no lombo. Por que, capitão?
— Muitas armas destas foram roubadas
do forte, Joe, quando eu comandava a
guarda. Alguém me bateu na cabeça. Duas
sentinelas foram mortas e dez caixas de
rifles e munições foram roubadas.
— Quem pode ter feito isso, capitão?
— Não sei, Joe, mas suponho que tenha
sido alguém do forte. Alguém que usou
esses rifles para pagar Charlie pela mentira
que contou na Corte Marcial. Charlie
vendeu os rifles aos bandoleiros, com
certeza.
— O capitão tinha inimigos no forte?
— Difícil dizer, Joe. A impressão que
ficou de tudo isso é que alguém desejava
me tirar do caminho por algum motivo, a
qualquer preço.
— E o que vai fazer agora, capitão?
— Há uma coisa que preciso que você
faça por mim, Joe. Quero que você vá a
Tucson e procure Kay, a dona do saloon,
você a conhece, não?
— A ruiva bonita?
— Sim, ela mesmo. Você leva um recado
para ela?
— Tudo que o capitão precisar, Joe fará.
O que devo dizer à mulher dos cabelos
vermelhos?
— Vou escrever um bilhete para ela. E só
entregar o papel.
Steve retirou do bolso de sua jaqueta um
livro de notas e um lápis. Escreveu alguma
coisa, depois dobrou e entregou ao índio
que o guardou rapidamente.
— Vou precisar de ajuda aqui, Joe. Estou
pedindo a Kay que tente localizar meu
irmão. O endereço dele está no papel. Só ele
poderá me ajudar a sair desta encrenca.
— Joe irá sem demora, capitão.
— E faça um outro favor, Joe. Procure o
juiz e comunique-o da morte do Xerife
Barnes e de seus auxiliares. Conte-lhe que
foram emboscados por renegados.
— Posso falar que foi Charlie e seu
bando?
— Não, Joe, você não estava lá na hora
do ataque. Não pode afirmar isso.
— Joe mente.
— Obrigado, meu amigo, mas não será
preciso. Quando eu puder sair daqui,
provarei a minha inocência, pode ter certeza
disso.
Joe concordou e foi apanhar um dos
cavalos que guardava num cercado ali perto.
Pôs o freio e as rédeas e apenas uma manta
sobre o lombo do animal. Saltou sobre ele
com uma agilidade incomum para sua
idade. Ali encima ele se sentia à vontade.
Cavalgou velozmente na direção de
Tucson, onde chegou em menos de duas
horas. Foi direto para o saloon de Kay.
Quando desceu para amarrar o cavalo,
percebeu que havia ali dois animais da
Cavalaria, significava que havia soldados
ali dentro. Hesitou por instantes, um tanto
apreensivo. O único soldado que ele gostava
e respeitava era o Capitão Master.
Comentava sempre que soldado bom era
soldado morto, com seu cavalo vivo. Ficava
com suas roupas, armas e vendia o cavalo e
a sela.
Andou de um lado para outro,
observando pela janela, tentando ver
alguma coisa lá dentro. Só precisava
encontrar Kay, a mulher dos cabelos
vermelhos.
Enchendo-se de coragem, acabou
entrando, embora soubesse que um índio
entrando num saloon em Tucson era o
mesmo que uma borboleta pousar num
formigueiro.
— O que quer aqui, índio — já lhe
indagou um vaqueiro, assim que ele entrou.
O índio foi direto ao balcão, onde estava
o barman.
— O que foi, Joe? Está com vontade de
perder o escalpo, entrando assim desta
maneira?
— Preciso falar com a mulher dos
cabelos de fogo.
— E quem disse que ela quer falar com
você? Está ocupada agora e não vai querer
que eu a incomode, vai?
— Sim, vou. Tenho assunto importante
para falar com ela — disse o índio, com
firmeza.
O barman hesitou por instantes, mas
percebeu que tinha de ser alguma coisa
importante mesmo para fazer o índio entrar
ali. Joe era um índio esperto, não se
arriscaria por nada.
— Espere aqui, Joe! — ordenou. — Vou
chamá-la.
O índio foi para o canto do balcão, onde
ficava quase que escondido das vistas dos
outros freqüentadores. Ficou olhando as
garrafas de bebida, sentindo uma enorme
vontade irresistível de abrir e provar cada
uma delas.
Não percebeu que, no fundo do saloon,
Bolt e Storm o observam com interesse.
— É aquele maldito renegado, tenente. O
que ele está fazendo aqui?
— Como vou saber? Storm? Acho que o
miserável está vindo avisar Kay. Na certa
traz um recado do Steve para ela. Ela nunca
escondeu o romance que havia entre os
dois.
— Se ele está aqui para falar com ela, vai
contar o que houve com o Steve, inclusive a
emboscada.
— Tem razão. Demônios! Temos que
calar a boca desse imbecil — considerou o
tenente.
— Vá lá e trate de descobrir isso. Veja o
que ele veio fazer. Se achar que ele pode
atrapalhar, o que é certo, livre-se dele.
— Aqui, na frente de todos?
— Somos a Cavalaria, Storm. Fomos
criados para eliminar índios, lembra-se?
— Certo, tenente! — concordou o cabo,
levantando-se.
Era um homem alto, de largos ombros e
rosto curtido pelo sol do Arizona. Gingava
levemente o corpo, como os homens
acostumados a passar longo tempo no
lombo de uma cavalo.
Aproximou-se do velho índio.
— Olá, Joe? O que faz aqui? — indagou.
O velho estremeceu, tentando sair dali,
mas o corpanzil de Storm barrou-lhe a
passagem. Conhecia-o. Era um dos mais
truculentos soldados do forte. Já havia sido
maltratado algumas vezes por ele, por isso
tentou evitar o confronto.
— Está muito longe de seu covil, coiote.
O que pensa que pode fazer aqui dentro, seu
índio sujo? Quem lhe deu autorização para
entrar aqui?
O índio percebeu logo que estava sendo
provocado. Só que não via nenhum jeito de
escapar dali. Preferiu não responder,
abaixando a cabeça e torcendo para que a
senhora de cabelos vermelhos viesse logo.
Storm olhou ao seu redor. Vaqueiros
bebiam no saloon, mas ninguém prestava
atenção a ele e ao índio. Sentiu-se seguro.
Até o barman havia se afastado do posto
para chamar Kay.
— Eu sei exatamente o que faz aqui,
velho. Veio trazer um recado do Master,
não?
— Não, Joe não...
O índio não chegou a terminar o que
pretendia dizer. A mão fechada de Storm
desceu pesadamente sobre a cabeça dele,
derrubando-o no assoalho com um gemido
de dor.
O índio tentou rastejar, atordoado. Storm
desferiu-lhe um violento pontapé na cabeça,
fazendo-o rolar. Apanhou, então, uma
garrafa do balcão pelo gargalo e bateu-a
contra a madeira, quebrando-a.
Segurou o índio pelos cabelos e fez
menção de enterrar-lhe o resto da garrafa na
garganta.
— Se fizer isso eu o mato, soldado! —
falou uma voz grave e ameaçadora.
Storm interrompeu o gesto, olhando ao
seu redor. Viu o homem que descia a
escada, acompanhado de Kay Gregor.
Soltou o índio e encarou o outro.
— Quem é você, intrometido?
— Não lhe interessa, seu bastardo. Fico
decepcionado ao ver que a Cavalaria decai
tanto ultimamente. Ouvi dizer que, nos
áureos tempos, costumava enfrentar índios
bravos, todos fortes e jovens guerreiros.
Jamais soube que combatia velhos fracos e
alquebrados — ironizou o estranho.
— Vá para o inferno! — rugiu Storm,
arremessando o pedaço de garrafa na
direção de Skip.
O recém-chegado desviou-se e o que
restava da garrafa espatifou-se na parede
atrás dele. Irritado, Skip avançou sobre
Storm, aplicando-lhe um golpe no estômago
e outro no queixo, derrubando-o
pesadamente.
O militar tentou se levantar, mas Skip
aplicou-lhe um pontapé nos rins, pondo-o
todo encolhido e gemendo num canto. Bolt
a tudo assistia sem nada dizer.
Skip foi até o índio, que Kay examinava.
— Como está ele?
— Não sei... Acho que a pancada foi
violenta demais...
Skip inclinou-se, pondo seu ouvido no
peito do índio, tentando ouvir alguma coisa.
— Ainda vive, mas está muito mal. Há
algum médico por aqui? Temo que ele não
resista muito tempo.
— Creio que é melhor deixar que o
assunto seja resolvido pela cavalaria —
disse Bolt, levantando-se, finalmente, com a
arma na mão, apontada para Skip.
Skip levantou-se resolutamente,
encarando-o. Seus olhos fulminaram Bolt,
que estremeceu diante da determinação que
lia neles.
— Não sei que diabos anda aprontado a
cavalaria hoje em dia, tenente, mas é melhor
guarda essa arma. Este homem precisa de
cuidados e eu vou levá-lo a um médico.
— Não se preocupe quanto a isso. Nós
temos um bom médico lá no forte...
— Pelo que vi aqui, parece-me que a
Cavalaria está mais interessada na morte
deste homem do que em salvar-lhe a vida.
Eu vou cuidar dele agora — falou com
decisão.
Sem se importar com a arma que era
apontada para ele, Skip levantou o índio,
pondo o sobre o ombro e caminhando para a
porta seguido por Kay.
Uma bala assobiou perto de sua cabeça.
Ele se virou, sacando sua arma com rapidez
e arrancando a arma da mão do tenente com
um certeiro balaço.
— Se não vestisse esse uniforme, tenente,
eu juro como o teria matado agora mesmo
pela sua covardia — afirmou ele.
Depois virou-se e seguiu Kay, na direção
da casa do médico, quase esbarrando em
Carlson, que vinha entrando no saloon. O
cocheiro olhou-o com ódio e depois entrou,
sem dizer nada.
— Olá, tenente! — cumprimentou-o
Carlson. — Vim assim que recebi seu
recado. Mas que diabos houve por aqui? —
indagou, observando Storm se levantar com
dificuldades e o tenente examinar seu
revolver, cujo tambor fora danificado pelo
certeiro tiro de Skip.
— Esse maldito forasteiro que se meteu
em nosso negócios, mas ele vai se haver
comigo.
— Então somos dois, tenente, porque eu
e ele tivemos uma rusga hoje. Veja como
deixou meu rosto.
— Parece que você foi atropelado por
uma manada de búfalos.
— Ele vai pagar por isso, pode deixar.
— Vamos cuidar desse forasteiro mais
tarde. Agora temos de acertar alguns
detalhes... Vamos nos sentar.
Foram se sentar ao fundo, na mesa que já
vinham ocupando. Storm mal conseguia se
equilibrar na cadeira.
— Está tudo encaminhado, Carlson.
Recebi a confirmação hoje do coronel.
Daqui a três dias poderemos agir. Você se
encarregará de conduzir a carroça.
— E a escolta?
— Será composta de vinte homens. Dez
deles já estão do nosso lado. O restante será
morto quando estivermos atravessando o
deserto.
— Isso merece um brinde, tenente! —
disse Carlson, entusiasmado.
— Ainda é cedo para brindes. Estamos
com alguns problemas. Charlie não
conseguiu matar Steve Master. Ele ainda
está vivo. Além disso, Charlie ficou muito
ambicioso e temo que ele venha a dar com a
língua nos dentes.
— Quer uma ajuda para se livrar dele?
Eu nunca gostei daquele renegado mesmo.
— Sim, acho uma boa idéia. Que tal ir até
o forte hoje à noite, com alguns de seus
homens, e dar um jeito de fechar aquela
boca grande e fedorenta do renegado?
— Vai ser um prazer, tenente.
Storm gemia na cadeira ao lado.
— Puxa, esse cara o acertou de verdade,
Storm. Parece que você está pior do que eu
— observou Carlson.
— Você conhece o forasteiro?
— Sim, tive uma briga com ele. Ainda
não sabe quem ele é?
— Não, deveria?
— É irmão de Steve Master.
— O quê? Diabos! Será que ouvi direito?
— É isso mesmo, tenente. Se não
bastasse um Master para infernizar sua vida,
agora tem dois! — ironizou o cocheiro.
— E ele está com o velho índio que sabe
onde está o Capitão Master! Demônios!
Que complicação! — reclamou Bolt.
— É outro de quem eu gostaria de me
vingar. Quer que eu o livre dele?
— Eu agradeceria isso, Carlson.
— Então deixe-o comigo. Considere isso
uma cortesia especial pela nosso sociedade,
tenente.
— Certo, cuide dele, então, da melhor
maneira possível. Não sei o que faz aqui e
nem quero saber. Eu e Storm vamos voltar
ao forte, mas antes passaremos pelo
esconderijo de Joe Pena Branca e
cuidaremos do Capitão. Isso livra nossos
planos de qualquer imprevisto.
— Eu vou cuidar do intrometido, então
— falou Carlson.
— Enquanto isso, aguarde o comunicado
oficial sobre o transporte do ouro. Ele
indicará o dia do embarque.
— Perfeito, tenente. Até a noite, então!
Saíram os três do saloon. Carlson esperou
até que os dois soldados montassem e se
afastassem, depois atravessou a rua, entrou
num beco e chegou aos fundos da casa do
médico da cidade.
Aproximou-se sorrateiramente de uma
das janelas. Pode ver o doutor examinando
o velho índio. Engatilhou a arma, quebrou a
vidraça com o cano do revólver e disparou
três vezes, atingindo o índio, mas errando
quanto a Skip, que rapidamente sacou sua
arma e correu para lá.
Carlson já havia retornado ao beco e se
misturado às pessoas na rua. De arma na
mão, Skip saiu à rua, mas nada viu.
Retornou à sala do médico.
— O que houve? — indagou o médico.
— Ele acertou o velho índio.
— Está morto?
— Sim, bem morto.
— Chegou a ver quem atirou?
— Não, fui pego de surpresa. Foi tudo
muito rápido — falou o médico, cortando as
roupas do índio para examinar o ferimento,
embora nada mais pudesse fazer por ele.
Ao afastar o tecido, um papel caiu no
chão. Skip abaixou-se e o apanhou.
— É para você, Kay — disse ele, lendo.
A garota abriu o papel.
— É do Steve! — exclamou ela. — Pede
que eu tente localizar você, Skip.
— Mais alguma coisa.
— E onde ele está?
— Eu não sei...
Skip deixou algum dinheiro para que o
médico providenciasse o enterro do índio.
Quando saíam à rua, Kay apontou para um
cavaleiro que acabava de entrar na cidade.
— É Ken Patersson, o auxiliar do xerife
— disse ela, chamando-o. — Ken, localizou
o xerife?
— Não, Kay. Fui até o trecho do
caminho, mas nem sinal dele e dos outros.
Estou ficando preocupado com isso.
— Joe Pena Branca foi morto há pouco,
no consultório do xerife. Trazia um bilhete
do Steve, pedindo que eu chamasse o irmão
dele...
— E como Joe conseguiu esse bilhete?
— Não sei, não teve tempo de nos contar.
— Se descobrir alguma coisa, avise-me.
Vou reunir uma patrulha e ir ao encontro do
xerife.
De volta ao saloon, Kay terminou de
contar a Skip tudo que sabia sobre os
acontecimentos que envolveram Steve.
— Então ele deve estar chegando na
cidade hoje?
— Sim, só não entendi o bilhete do Joe,
por que Steve o teria mandado? E como o
entregou ao índio?
— Jamais saberemos agora. Que chances
nós temos de inocentar meu irmão, Kay?
— A única pista que conheço é Charlie, o
mestiço renegado que depôs contra Steve.
— E onde posso encontrá-lo?
— Na Taberna San Diego, no fim da rua.
Se não estiver lá, pode estar em qualquer
parte do Arizona. É um tipo sem parada, um
bandoleiro que serve o Exército como
batedor, às vezes, e isso o tem mantido
longe da cadeia.
— Gostaria de falar com ele, então. Vou
tentar achá-lo. Foi ele que depôs contra o
Steve a respeito da escaramuça com os
índios mescaleros?
— Sim, ele mesmo. Todos que conhecem
Steve sabem que ele jamais desertaria, mas
ele não tinha como provar sua inocência
contra o testemunho de Charlie e outros.
Steve foi ferido e ficou descordado, dado
como morto, enquanto seus homens eram
massacrados.
— Eu vou esclarecer tudo isso, então.
Skip deixou o saloon e caminhou pela
rua, na direção indicada por Kay, até a
taberna. Antes de entrar, examinou seu
revólver, recarregando-o.
Assim que entrou, dirigiu-se ao homem
atrás do balcão, um mexicano grandalhão,
de vastos bigodes e com cara de poucos
amigos.
— Quer tequila?
— Não, quero uma informação — falou
Skip, em voz alta, para ser ouvido pelos
outros.
— Que tipo de informação?
— Procuro um tal de Charlie, um rato
renegado, um mestiço filho da mãe que faz
ponto aqui. Você o conhece?
— Não, não conheço nenhum Charlie.
Agora é melhor dar o fora daqui, estranho, a
menos que deseje beber alguma coisa.
— E se eu não quiser?
— É melhor fazer o que ele manda,
gringo! — disse uma voz ameaçadora atrás
dele.
Ele se virou e encarou o homem que o
ameaçara. Era um mexicano, com seu
sombrero atirado às costas e a mão
descansando sobre a coronha da arma.
— Obrigado pelo conselho, amigo, mas
ninguém o convidou para esta conversa.
— O que quer com Charlie?
— Trocar algumas palavras com aquele
rato mentiroso e, se possível, dar-lhe alguns
tapas para que deixe de ser mentiroso e
covarde.
— Se quer um aviso, gringo, é melhor...
— ia dizendo o mexicano, ladeado por
alguns outros que haviam se aproximado.
— Escute aqui — reagiu Skip, agarrando-
o pela gola da camisa e levantando-o. — Se
você sabe onde Charlie se esconde, é
melhor que me diga antes que eu quebre
todos os seus dentes.
Um ruído de arma deslizando pelo coldre
advertiu Skip. Ele arremessou o mexicano
sobre o outro, que tentava sacar a arma,
derrubando os dois.
Antes que mais alguém fizesse um
movimento, Skip havia sacado e
engatilhado sua arma.
— E então, o que tem a me dizer? —
indagou ele ao homem caído a seus pés.
— Não tenho nada a lhe dizer —
resmungou o homem, tentando se levantar.
— Então fique aí mesmo — falou Skip,
desferindo-lhe um pontapé no queixo e
jogando-o desacordado no assoalho.
— E vocês, também querem discutir o
assunto? Alguém sabe onde achar aquela
bastardo chamado Charlie? — indagou aos
outros.
Os homens se entreolharam, abaixando a
cabeça, Skip percebeu logo que mentiam.
Foi até uma das mesas, com a arma
apontada.
— E vocês, alguém sabe do Charlie?
Os homens nada disseram.
— Você! — apontou Skip, pondo a arma
no ouvido de um deles. — Você tem cara de
quem sabe onde encontrar o Charlie. Diga-
me logo ou vou decorar aquela parede com
os seus miolos.
— Está bem, homem. Acalme-se! —
falou o mexicano. — Não precisa ficar
nervoso. Charlie está no forte Benson, foi
para lá esta manhã.
— Obrigado, amigo. Eu sabia que podia
contar com sua gentileza — agradeceu Skip,
guardando a arma.
Subiu a rua de volta para o saloon de
Kay. Tencionava ir até o Forte Benson, após
conversar com a garota.
Não percebeu que cinco homens haviam
deixado a cantina e o olhavam subir a rua.
Havia ódio nos olhos deles. Todos eram
amigos de Charlie.
— Maldito gringo! — resmungou um
deles.
Steve Master estava apreensivo. Não
sabia até que ponto o velho Joe não acabaria
revelando seu paradeiro, quando notificasse
o juiz das mortes do xerife e dos ajudantes.
Além disso, ninguém, na cidade gostava
muito do índio. Se soubessem que ele levou
um recado do ex-capitão para Kay, na certa
o pressionariam de todas as formas para que
ele contasse o paradeiro de Steve.
Sabia que o índio era esperto com uma
raposa, mas com a sua idade, pouco
resistiria nas mãos daqueles interessados na
morte do militar.
Não podia facilita. O melhor a fazer era
agir com cautela. Assim, com dificuldade,
cuidando para que os ferimentos não
abrissem, ele amontoou pedras próximo da
caverna, dando o formato de um túmulo.
Espetou um galho em forma de cruz e,
enroscando nele, pôs sua túnica, furada de
bala e manchada de sangue.
Selou um dos cavalos, apanhou armas e
munição e partiu, sem saber ao certo ainda
para onde ir. Após algum tempo que tinha
se afastado, chegaram Bolt e Storm a
galope.
— Vamos com calma, Storm —
recomendou o tenente. — Não sabemos o
que vamos encontrar aí dentro.
— Não creio que ele nos ofereça mais
perigo — disse Storm, apontando para a
sepultura feita com pedras.
Os dois caminharam até lá. Bolt apanhou
aquela túnica, onde os furos de balas e o
sangue eram visíveis.
— É a túnica do Steve, reconhece?
Foram retirados os botões e os distintivos
militares. Não há duvida — afirmou Bolt.
— Sim, é a dele mesmo. E pelos buracos
e pelo sangue, tudo leva a crer que esse que
está aí, debaixo das pedras, é ele.
— Que recado, então, Joe estava levando
para Kay lá na cidade?
— Talvez ia avisá-la da morte do Steve.
Todos sabemos que a garota sempre teve
uma queda pelo capitão. Nada mais justo
ele se lembrar dela, principalmente em seus
últimos momentos.
— É, você tem razão. Nada mais nos
prende aqui. Estamos tranqüilos agora.
Ninguém mais vai atrapalhar nossos planos.
— Sim, isso praticamente liquida nosso
problemas. Agora só falta nos livrarmos do
Charlie e de sua corja.
— Falei com o Carlson. Ele e seus
homens cuidarão de tudo para nós. Depois
disso, o caminho estará livre para o ouro e
para o México — finalizou o tenente, com
satisfação.
Chegando ao forte, Bolt foi até a sala do
comandante falar com o coronel.
— Tudo certo com o pessoal da
Horselines?
— Sim, falei com Carlson que iríamos
precisar transportar um material. Ele
aguarda apenas a confirmação da data exata.
— Farei isso no momento oportuno.
Conseguiu convencê-lo sobre o sigilo da
operação?
— Sim, eu lhe disse que era uma partida
de metralhadores e que não seria
conveniente transportarmos em carroças da
Cavalaria para não despertar o interesse dos
bandoleiros.
— E ele?
— Engoliu fácil. É de confiança, não
comentará. Eu pedi todo sigilo possível a
ele.
— Ótimo! Estou satisfeito com o
andamento da operação, tenente. Agora,
com respeito a Charlie e seus homens,
estive observando os homens, depois
daquela conversa que tivemos a respeito.
Acho melhor mesmo você tirá-los daqui.
— Eu já os avisei, coronel. Vão deixar o
forte ao entardecer para cavalgar à noite.
Partirão para Tucson.
— Concordo, mas seria melhor ainda se
eles fossem acampar fora do forte.
— Vou cuidar disso agora mesmo.
O tenente deixou o comando e foi direto
para a cantina. No caminho, traçava seu
plano. Assim que viu Charlie, foi falar com
ele.
— Charlie, acabei de falar com o coronel.
Ele acha prudente que você e seus homens
acampem fora do forte, até a hora de
partirem.
— Por mim, tudo bem, tenente. Sabe o
que estamos esperando para partir, não? Tão
logo recebemos nosso pagamento, daremos
o fora daqui.
— Eu sei disso, Charlie. Agora leve seus
homens e acampem perto do riacho. Eu
levarei os rifles até lá.
— E nada de truques, tenente. Estaremos
preparados para qualquer eventualidade.
— Não seja imbecil ameaçando-me,
Charlie. Espero ainda fazer uma porção de
negócios com você. Só que tem de ser mais
cuidadoso. Steve Master não estava morto
quando o deixaram lá.
— Claro que estava! Eu mesmo meti
duas balas no couro dele.
— Só que ele não morreu na hora. O
Capitão Kane foi levado até lá por Joe para
atendê-lo. Da próxima vez, seja mais
cuidadoso. É só que lhe peço, Charlie.
Principalmente no seu próximo trabalho.
— E quando será isso?
— O mais depressa possível. Quero que
mate o Capitão Kane.
— Matá-lo? Por quê?
— Porque ele viu Steve Master vivo e
não sabemos o que Master pode ter contado
a ele, entendeu? Deve ser morto por isso.
— Está certo, tenente. Só que isso terá
um preço...
— Esqueça! Vai fazer esse trabalho por
conta do serviço malfeito em Master.
O mestiço pensou por instantes. O
tenente havia sido bem rigoroso. Não
adianta regatear àquela altura. Outros
negócios poderiam vir pela frente e ele
poderia recuperar isso.
— Está bem, tenente! Este vai ser
cortesia da casa — concordou o mestiço.
Anoitecera. Kay via os primeiros
tocheiros serem acesos nas ruas, com as
chamas iluminando fantasmagoricamente as
construções e pessoas que passavam.
O saloon começava a se encher de
fregueses. A cada homem que ela via
chegar, um sobressalto agitava seu coração.
Um pressentimento doloroso instalou-se
dentro dela.
Algo lhe dizia que Steve corria perigo.
Joe Pena Branca fora assassinado ao trazer
aquele recado. Tudo era muito estranho. O
que o índio sabia que lhe custara a vida?
Quando Ken Paterson, o auxiliar do
xerife voltou e a procurou, Kay teve a
certeza de que algo sucedera a Steve.
— Ken, onde está ele? — indagou,
apreensiva.
— Sinto muito, Kay! Steve está morto.
Ele e o xerife, bem como os auxiliares...
— Não! — exclamou ela, angustiada. —
Não pode ser verdade! Diga que não!
— Eu lamento, Kay, mas é verdade.
Encontrei o xerife e os dois auxiliares
mortos. Foram emboscados. Segui uma
trilha que pensei que fosse me levar aos
assassinos, mas acabei dando na caverna de
Joe. Encontrei uma sepultura e a túnica do
capitão. Estava furada de bala e manchada
de sangue.
— Mas não pode ser, meu Deus! Ele
estava vivo, escreveu-me um bilhete...
— Que bilhete?
Kay lhe contou sobre o bilhete e sobre a
morte de Joe.
— Agora jamais saberemos o que Joe
tinha a nos contar, mas penso que Steve
morreu após ter escrito o bilhete, Kay. De
qualquer forma, eu e a patrulha voltaremos
amanhã ao local da emboscada e tentaremos
encontra alguma pista dos assassinos. É
uma pena que Steve tenha morrido antes de
provar sua inocência.
— Alguém fará isso por ele, Ken.
— Você?
— Não, Skip Master, o irmão dele.
— Onde está ele agora?
— Partiu para o forte à procura de
Charlie e seus homens. Espera descobrir
alguma coisa com eles.
— Diga-lhe que me procure assim que
voltar, está bem? Será bom conhecer um
irmão do Steve.
Kay se despediu do ajudante e foi para o
seu quarto. Aquela noite estava perdida para
ela. A dor pela morte de Steve cortava seu
coração. Ela se recolheu para pratear o
homem que amava.
Enquanto isso, Skip chegava ao Forte
Benson. Havia cavalgado o mais rápido que
pudera, aproveitando a luz do dia.
Identificou-se com o sentinela, que lhe
indicou onde era a casa do comandante.
Ao se aproximar dela, percebeu um vulto
esgueirando-se nas sombras, perto do
alojamento dos oficiais. Ficou observando,
intrigado.
O vulto chegou à janela, sacou sua arma e
disparou. Instintivamente, Skip sacou
também seu Colt e fez fogo. O vulto
rodopiou e caiu pesadamente.
— O que está havendo aqui? — gritou a
sentinela, correndo até lá.
Viu Skip com a arma fumegante na mão.
— Está maluco? em quem atirou?
— Fique tranqüilo, soldado! Alguém
disparou para dentro do alojamento e eu...
— Fique aí mesmo, não se mova! —
ordenou o sentinela. — É melhor soltar essa
arma, até esclarecermos tudo aqui.
— Está bem, se isso o deixa mais
tranqüilo — concordou o civil, soltando o
revólver.
— O que houve, Beef? — indagou o
coronel Donald, surgindo em companhia de
outros oficiais, inclusive o Tenente Bolt.
Diversos soldados, acordados pelos
disparos, observavam a cena.
— Este homem estava fazendo disparos
com sua arma, coronel — informou o
sentinela.
— Deixe-me explicar, coronel. Havia
alguém perto da daquela janela. Ele sacou a
arma e disparou sobre alguém lá dentro.
— É o alojamento dos oficiais... O
Capitão Kane dorme próximo daquela
janela — falou Bolt, correndo para lá.
Ao entrar, sorriu satisfeito. Daquela vez,
Charlie não havia falhado. Fizera um
serviço perfeito. O Capitão Kane jazia
imóvel.
— O capitão está morto, coronel —
informou ele. — Vai ter muito que explicar,
forasteiro.
— Deve haver um homem caído do lado
de fora — falou Skip. — Eu atirei contra
ele.
— Verifique tudo por lá, Cabo Storm! —
ordenou Bolt.
Storm sabia o que tinha que fazer. Foi até
lá e vasculhou. Viu um dos homens de
Charlie perto da paliçada.
— Rápido, seu idiota! Trate de dar o fora
daqui. Aproveite que o sentinela deixou o
portão. Não devem encontrá-lo aqui —
ordenou ele.
O homem, apesar de ferido, conseguiu
escapar pelas sombras, sumindo pelo portão
afora. Storm voltou para junto dos outros.
— Não há ninguém por lá, senhor.
Vasculhei tudo cuidadosamente.
— É impossível — protestou Skip. —
Tenho certeza de que o acertei.
Bolt já havia reconhecido o homem a sua
frente. Ficou satisfeito. Skip Master havia
se envolvido numa bela encrenca e teria
muito o que explicar.
— É melhor levá-lo para a minha sala.
Quero interrogá-lo — ordenou o coronel.
Skip, resignado, se deixou conduzir.
Uma breve agitação movimentou o
acampamento de Charlie e seus homens,
quando o ferido retornou.
— O que aconteceu? — indagou Charlie,
quando o encarregado de liquidar o Capitão
Kane retornou.
— Ajudem-me... Estou ferido — gemeu
o homem.
— Pare de choramingar como uma velha
e diga-me o que houve. Quem o feriu? —
quis saber Charlie.
— Um desconhecido... Eu não o vi... Só
o percebi quando ele atirou em mim, após
eu matar o capitão...
— Matou-o mesmo?
— Sim, de onde atirei não podia errar.
Mirrei bem no coração e acertei.
— E o homem que atirou em você?
Como ele era? Como você escapou?
— Eu não pude ver direito o homem. O
Cabo Storm me ajudou a sair. Com um
pouco de sorte, vão incriminar aquele
homem com o assassino do capitão...
— Pode ser, seu idiota! Mas aposto como
deixou uma pista do tamanho de uma
manada de búfalos direto para cá.
— O que eu poderia fazer, Charlie.
Estava ferido...
— Cuidem desse idiota. Se conheço o
Tenente Bolt, ele vai dar um jeito de apagar
todas as pistas.
Um tropel de cavalos chegou até eles,
pondo-os em guarda. A fogueira acesa
atraía a atenção de quem passasse na
estrada.
— Vejam quem é — ordenou.
Seus homens se movimentaram e, pouco
depois, retornaram acompanhados dos
cincos homens que haviam ficado na
cidade, durante a emboscada.
— O que fazem aqui, seus idiotas?
Ordenei que ficassem na cidade —
esbravejou Charlie.
— Descobrimos algo e achamos que você
gostaria de saber, por isso viemos.
— Então falem logo!
— Há um homem vindo para cá. É irmão
do Capitão Master. Nós o encontramos lá na
cidade.
— E o que ele quer?
— Falar com você, Charlie.
— Falar comigo? Para quê?
— Parece que ele tem algumas perguntas
a fazer a você a respeito do irmão dele.
O homem que estava ferido levantou a
cabeça para falar.
— Charlie, deve ser o homem que
encontrei lá no forte, o que atirou em mim.
— Se for esse, acho que não
precisaremos nos preocupar com ele. O
Tenente Bolt cuidará dele, como cuidou do
irmão. Em todo caso, já que estão aqui, vão
trabalhar, homens. Espalhem-se por aí e
fiquem alertas. Não gostei muito da maneira
como aquele tenente tem conversado
comigo. Tenho certeza que ele anda
preparando algo.
O mestiço estava adivinhando a cilada.
Na realidade, enquanto ele conversava com
seus homens, Carlson e seus amigos já os
observavam, ocultos na outra margem do
rio.
— O que faremos, Carlson? Eles são
nove ao todo e nós somos apenas cinco.
— Não seja idiota, estamos em vantagem
ainda. Observe-os. Estão se dividindo.
Cinco deles foram para trás daquelas
árvores. Isso facilita tudo para nós.
— O que tem em mente, Carlson? —
indagou um deles.
— Vamos pegá-los primeiro. Charlie
deve se sentir muito confiante com aqueles
cinco protegendo-o. Vamos fazer-lhe uma
surpresa, rapazes.
— Como vai ser, Carlson?
— Vamos usar as facas e não deixar que
nenhum deles grite. Não quero alertar nosso
amigo Charlie! — disse ele. — Vamos lá,
rapazes!
O grupo cruzou o rio silenciosamente,
contornando o acampamento de Charlie e se
aproximando das árvores, onde se
ocultavam os capangas do mestiço.
Localizaram-nos facilmente e se
aproximaram. Pegos de surpresa, os
renegados não esboçaram nenhuma
resistência. Após uma ação rápida, os
cincos homens de Charlie jaziam com suas
gargantas abertas.
Carlson fez um sinal para seus homens se
espalharem ao redor do acampamento, no
centro do qual havia uma fogueira. Isso
deixava os homens de Charlie em
desvantagem agora.
— Charlie, levante os braços e diga aos
seus homens para fazerem o mesmo ou
serão crivados de bala — ordenou o chefe
dos cocheiros.
Charlie ficou surpreso, mas não perdeu a
confiança. Contava com uma força extra, os
cinco homens ocultos ali perto. Levantou-
se, então, dizendo a seus homens que
obedecessem a ordem. Em seguida, ergueu
os braços com um sorriso irônico nos
lábios.
— Isso, você até que é um bom menino,
Charlie — zombou Carlson, aproximando-
se.
— O que faz aqui, cheirador de rabo de
mula — indagou o mestiço.
— Vim pagar-lhe uma conta.
— Conta? Que conta?
— Uma conta que lhe deve o Tenente
Bolt.
— Aquele bastardo traidor! Eu imaginava
mesmo que ele estava aprontando alguma,
mas vai me pagar caro por isso, eu posso
garantir a vocês.
— Não vai se vingar de ninguém,
Charlie, muito menos fazer ameaças. Sua
vida está por um fio, não percebeu ainda?
— falou Carlson, ficando frente a frente
com o renegado.
— Tenho cinco homens atrás daquelas
árvores, com as armas apontadas para vocês
agora. Larguem suas armas, seus palhaços,
ou vão morrer agora mesmo — falou
Charlie, começando a gargalhar.
Carlson, no entanto, gargalhou mais alto,
seguido por seus capangas, enquanto exibia
sua face, manchada de sangue. A
gargalhada morreu na garganta do mestiço e
o terror estampou-se em seus olhos.
— Sim, Charlie! Isso mesmo. Seus
amigos não apontarão armas para mais
ninguém agora.
— Espere, Carlson. Podemos fazer um
acordo. Você não precisa me matar...
— E por que não?
— Por favor, não me mate...
— Implore, Charlie! Implore e talvez eu
poupe a sua vida — ordenou o cocheiro.
— Por favor, não mate o pobre Charlie.
Vai deixar vinte filhos e dez mulheres
viúvas — gemeu o mestiço, ajoelhando-se
aos pés de seu carrasco.
— Beije minhas botas, escória!
— Sim, Carlson, Charlie faz tudo que
você mandar. Eu irei embora, se não me
matar. Vou para o México. Juro como não
volto mais aqui — continuou implorando,
enquanto beijava as botas do outro.
Carlson e seus homens se divertiam com
a covardia do mestiço, implorando e
rastejando diante da morte.
— Está bem, Charlie! Não vou atirar em
você — disse, então.
O mestiço levantou a cabeça e tentou
beijar a mão de Carlson. Este, sem nenhuma
piedade, deslizou a lâmina de sua faca pela
garganta do ouro, de orelha a orelha, num
gesto rápido e cruel.
O espanto e a dor tomaram conta do rosto
do mestiço, que tentou falar alguma coisa,
mas uma golfada de sangue saiu do buraco
em sua goela, manchado suas roupas.
Ele tentou se levantar, mas sua cabeça
caiu para trás bizarramente e ele tombou,
completamente imóvel.
A um sinal de Carlson, os outros
capangas de Charlie tiveram o mesmo
destino. Foram degolados rapidamente.
— O que faremos agora, Carlson?
— Vamos deixá-los aqui e aguardar a
chegada do tenente.
Não precisaram esperar muito. Logo Bolt
apareceu.
— Parabéns! Pelo que vejo, fizeram um
ótimo trabalho. Joguem-nos no rio. Vou
voltar ao forte. Felizmente apanhamos
aquele forasteiro numa bela armadilha.
— Fala do irmão de Steve Master?
— Sim, será acusado da morte do
Capitão Kane e nós ficaremos livres
daquele intrometido. Com Steve Master
definitivamente morto, nada nos atrapalhará
agora.
— Ótimo, tenente! Vamos voltar à cidade
e aguardar o aviso para o transporte do
ouro.
— Deverá ser em breve, rapazes. Até lá!
Na sala estavam presentes o coronel,
Skip, o sentinela e dois outros soldados
apenas. O coronel assim o determinara.
Sentado em sua escrivaninha, apontou uma
cadeira para Skip.
— Como é seu nome, rapaz? — indagou.
— Skip Master, senhor. E antes que me
pergunte, afirmou, com orgulho, que sou
irmão do Capitão Steve Master.
O coronel olhou-o sem surpresa.
— Eu sinto muito o que aconteceu com
seu irmão, rapaz. Você também está agora
numa bela enrascada. Não vou tirar
conclusões precipitadas. Conte-me sua
versão do que aconteceu.
— Não se trata de minha versão, coronel.
Foi como aconteceu, eu juro.
— Seja lá como for, conte-me, então!
— Pois bem, eu vim até a forte à procura
de Charlie, o mestiço renegado, e seus
homens. Soube que estariam aqui. Pretendia
falar com ele a respeito do testemunho que
prestara sobre meu irmão, incriminando-o.
— Até aí, tudo bem. Charlie e seus
homens realmente estavam aqui. Devem
estar acampados agora lá fora, em algum
lugar. E depois, o que aconteceu quando
chegou aqui?
— Apresentei-me ao sentinela, dizendo
que precisava falar com o comandante e ele
me permitiu a entrada, indicando-me sua
residência, coronel.
— E os disparos?
— Eu chego lá. Aconteceram logo em
seguida. Havia um vulto se esgueirando
perto do alojamento. Fiquei curioso e passei
a observá-lo.
— Acha que poderá reconhecê-lo se o
encontrar novamente?
— Vai ser difícil. Ele caminhava
protegido pelas sombras, não pude ver
como ele era. Só vi quando ele parou ao
lado de uma das janelas, sacou sua arma e
disparou. Eu saquei a minha arma também,
atirando contra ele.
— Por quê?
— Não sei dizer, foi um ato instintivo.
Para alguém estar agindo nas sombras,
daquela forma, não deveria ser alguém bem
intencionado.
— Entendi. Acha que o acertou?
— Tenho certeza disso.
— Como pode provar que está falando a
verdade?
— Pergunte ao sentinela. Acho que o
senhor mesmo só ouviu dois tiros.
— É verdade, coronel. Foram dois tiros,
um seguido ao outro — falou o sentinela.
— E o que isso prova? — quis saber o
coronel.
— O Capitão Kane foi atingido por
apenas uma bala, senhor — — informou um
dos soldados.
— Isso mesmo — confirmou Skip.
— Você pode ter errado o primeiro tiro
— ponderou o militar.
— Se eu errei e se os fatos aconteceram
como supõe, senhor.
— Pois aí estão os fatos, senhor, mande
verificar no alojamento do capitão. Se errei
o tiro, a bala deve estar encravada na parede
ou em alguma parte.
— Faça isso, Beef — ordenou o coronel.
O soldado saiu e foi cumprir a ordem.
quando retornou, informou:
— Verifiquei seguindo o ângulo do tiro,
coronel. Não há nenhum sinal de bala
cravada em lugar nenhum...
— Isso ainda não prova a sua inocência...
— comentou o militar, hesitante.
A arma de Skip estava sobre a mesa do
coronel. O rapaz apontou-a.
— Examine a minha arma, coronel. Verá
que apenas uma cápsula está deflagrada.
O coronel fez o que ele sugerira. Havia
apenas uma bala disparada.
— E se isso ainda não for suficiente,
tenho a prova final de minha inocência,
coronel. Examine melhor minha arma. Verá
que é um tipo novo de Colt, que adquiri
recentemente no Leste. As balas não são
calibre 45, mas um calibre inferior. Mande
extrair a bala do corpo do capitão morto e
verá que digo a verdade. Vai encontrar ali
uma 45 normal.
O coronel se levantou e deu alguns
passos pela sala. A segurança com que Skip
lhe falara demonstrava sua inocência. Só
faltava mesmo mandar extrair aquela
maldita bala para ter a confirmação.
— E que motivos eu teria para matar o
Capitão Kane? — insistiu Skip. — Nem ao
menos sei se ele fez parte da corte marcial
que julgou e condenou meu irmão.
— E de fato o Capitão Kane não o fez.
Usamos alguns oficiais daqui e o resto, do
Forte Douglas.
— Pois aí estão os fatos, senhor. Não há
como me incriminar dessa morte estúpida.
O coronel pensou por instantes, tomando
logo uma decisão sobre o assunto.
— Acredito em você, Skip. Vou ordenar
uma busca imediata ao homem que você
disse que havia ferido.
— Posso ajudar na busca, coronel?
— Se for do seu interesse.
O coronel devolveu a arma a Skip e
ordenou aos soldados que trouxessem
tochas. Quando deixavam a sala de
comando, encontraram-se com Bolt, que
retornava.
— Pode deixar, senhor, eu levo este
bastardo para a prisão — ofereceu-se ele,
certo de que Skip não conseguiria se livrar
das acusações.
— Este homem não está preso, tenente.
— Mas como, senhor? Ele matou o
Capitão Kane — surpreendeu-se Bolt.
— Cuidado com suas acusações
infundadas, tenente. Não foi ele quem atirou
no capitão e isso já me foi provado. Agora
vamos investigar isso direto. Apanhe uma
tocha e siga-nos.
Bolt ficou temeroso, a principio.
Naturalmente encontrariam a pista do
homem ferido e chegariam ao acampamento
de Charlie. Depois pensou melhor e
tranqüilizou-se. Charlie e os outros jamais
falariam.
O grupo, carregando tochas, aproximou-
se da janela do alojamento, onde Skip vira o
homem disparar contra o capitão lá dentro.
Skip foi direto no local onde viu o vulto
cair, após seu tiro certeiro.
— Veja, coronel! Sangue — apontou ele,
mostrando a mancha evidente na madeira.
As manchas que se seguiam mostravam
que o assassino sangrava muito.
— Vai na direção da paliçada! —
informou Skip.
— Vamos seguí-las — ordenou o
comandante.
— Aqui há uma mancha, junto à paliçada
— mostrou de novo o rapaz. — Parece que
ele parou aqui para recuperar as forças ou,
então, para se esconder. Depois seguem ao
longo da paliçada, com certeza na direção
do portão.
— Vamos ver onde isso vai dar —
determinou o comandante.
Não tiveram dificuldades para seguir a
trilha de sangue pela areia. Ela continuava
após o portão do forte e seguia na direção
do rio, onde se via uma fogueira ainda
queimando.
— Ela vai na direção do acampamento de
Charlie e seus homens — informou o
sentinela.
— Sim, isso mesmo — confirmou Skip.
— Não estou entendendo — confundiu-
se o coronel.
Chegaram logo ao acampamento. Não
viram ninguém, no entanto, mas as enormes
manchas de sangue e a relva amassada na
direção do rio indicavam que havia
acontecido ali uma chacina.
— Vamos descer o rio, rapazes —
ordenou o coronel.
As tochas foram levadas para a margem.
O grupo foi descendo, acompanhando o
leito do rio, até um ponto onde uma árvore
havia caído, atravessando-o.
Ali, misturados e enroscados aos galhos,
estavam os corpos de Charlie e de seus
homens.
Todos os homens, apesar de acostumados
às piores cenas de batalha, não deixaram de
sentir engulhos ao se depararem com
Charlie e seus homens quase degolados,
numa carnificina covarde e sangrenta.
— Diabos, que matança! — exclamou
Skip. — Quem teria motivo para fazer isso?
— Uma atrocidade! Isso me deixa cada
vez mais confuso. Eram civis e estavam sob
nossa proteção — murmurou o coronel,
enojado com a cena. — Por que um dos
homens de Charlie atiraria no Capitão
Kane? E depois, quem mataria Charlie e
seus homens? Qual o objetivo de tudo isso?
O que está acontecendo aqui?
Skip riu um dos corpos, com uma
mancha de sangue na altura da barriga.
— Veja, senhor — disse ao comandante.
— Aquele homem ali parece ser o único
que apresenta um ferimento de bala. Deve
ser o homem contra quem eu atirei lá no
forte. Se pudermos extrair a bala, teremos a
confirmação.
O coronel concordou com Skip. Estava
transtornado com o que cia a sua frente.
— Tenente Bolt, eu lhe disse que
protegesse Charlie e seus homens — falou
ele, furioso.
— Eu sinto muito, coronel, mas nada
pude fazer. Eu pedi a Charlie que deixasse o
forte. Ele me atendeu e veio para cá. Eu
temia que, mesmo assim, pudesse haver
uma represália por parte dos soldados...
— Acha que os soldados fizeram isso,
comandante? Por quê? — indagou Skip.
Ele hesitou, antes de responder.
— Os soldados gostavam de seu irmão e
tinham verdadeira aversão por Charlie, por
causa de seu depoimento. Não acredito, no
entanto, que meus homens chegassem a tais
excessos.
— É difícil prever o que um homem pode
fazer por vingança, coronel — falou Bolt.
— Ordeno uma investigação imediata,
tenente. Reuna os homens, tenente, vamos
ver o que eles têm a dizer sobre isso —
ordenou o coronel.
— Imediatamente, senhor!
Enquanto Bolt tomava as providências, o
coronel mandou que uma turma viesse para
retirar os corpos do rio. Skip aproveitou
para dar uma volta pelas redondezas,
observando as pistas ainda recentes.
Quando retornou ao forte, tinha feito
algumas observações importantes, por isso
foi ter com o coronel.
— Não creio que os soldados tiveram
alguma coisa a ver com aqueles mortos,
coronel.
— O que descobriu?
— Os atacantes vieram do outro lado do
rio, não do forte. Depois que fizeram essa
barbaridade, não tomaram o rumo do forte.
— Para onde foram?
— Na direção de Tucson.
O semblante do coronel indicava que ele
estava cada vez mais confuso com tudo
aquilo.
— Talvez tenha sido uma vingança,
coronel — sugeriu Bolt. — Charlie tinha
inimigos de ponta a ponto do território.
— Pode ser — concordou o coronel. —
Vai voltar à cidade ainda hoje, Skip?
— Sim, coronel. Cavalgarei para lá agora
mesmo.
— Procure o xerife e conte-lhe o que
aconteceu aqui...
— Foi bom mencionar isso, coronel.
Quando saí de Tucson, o xerife e meu irmão
não tinha chegado ainda. Não os encontrei
pelo caminho. Sabe que trilha podem ter
tomado?
— Estranho! Saíram logo depois da
alvorada... Não é possível! Tinham de ter
chegado — surpreendeu-se o militar.
— Alguma coisa deve ter acontecido —
falou Skip, apreensivo.
— Sugiro, então, que parta
imediatamente para lá, em companhia do
soldado Beef. Caso alguma coisa tenha
acontecido ao xerife, Beef voltará para me
avisar.
— Farei isso, coronel. Vamos, soldado!
— disse Skip ao homem que o
acompanharia.
Amanhecia um novo dia em Tucson. A
cidade despertava com as primeiras carroças
e cavaleiros atravessando suas ruas cobertas
de poeira.
Uma ponta de sol penetrou por entre as
cortinas e despertou Kay. Sentia-se
indisposta, pois havia chorado muito na
noite anterior ao saber da morte de Steve.
Um ruído na porta dos fundos de seu
quarto chamou-lhe a atenção. Aquela porta
dava para um beco nos fundos do saloon e
não seria a primeira vez que tentariam
molestá-la.
Apanhou sua Winchester, disposta a dar
uma lição no desordeiro, como já havia
feito antes, com alguns deles. Ao abrir a
porta, teve uma surpresa.
— Steve! — gritou ela, doida de alegria,
ao vê-lo com vida a sua porta.
— Ajude-me, Kay — pediu ele. — Estou
ferido.
Ela o ajudou a entrar. Levou-o e deitou-o
em sua cama.
— Deixe-me ver esses ferimentos —
pediu ela.
— Estou bem... O Capitão Kane fez um
ótimo trabalho.
— O que aconteceu? Quase fiquei louca,
imaginando que você tivesse morrido...
— Não falou com Joe Pena Branca?
— Joe morreu antes de me contar
qualquer coisa.
— Joe? Morto? como diabos isso
aconteceu?
— Deixe-me ver esses ferimentos
primeiros — pediu ela, desabotoando a
camisa que ele vestia. — Vou buscar
ataduras. Será bom trocar os curativos.
Após apanhar o que precisava, Kay
contou-lhe o que tinha acontecido, enquanto
trocava o curativo.
— Graças a Deus Skip está aqui —
comentou Steve. — Isso me deixa mais
aliviado. Posso contar com ele para me
ajudar.
— Assim que ele voltar do Forte Bowie,
eu o trarei aqui. Agora descanse, enquanto
vou lhe preparar alguma coisa para comer.
Você me parece muito fraco.
Kay desceu até o restaurante, anexo ao
saloon, e pediu que preparassem uma
bandeja com um reforçado desjejum. Assim
que ficou pronta, levou para Skip, após ter
recomendado ao pessoal que a
informassem, tão logo Skip voltasse do
forte.
— Quem foi o responsável por tudo isso,
Steve? — indagou ela, enquanto ele comia.
— Foi Charlie e seu bando de renegados.
— Charlie? Tem certeza? Então Skip
pode estar correndo perigo...
— Não se preocupe com meu irmão,
Kay. Ele sabe se defender.
— Então vou avisar Paterson, o ajudante
de xerife que está assumindo o cargo, na
ausência do xerife...
— Não, você não pode avisá-lo, não até
que eu possa provar a minha inocência.
— Não se preocupe! Ken Paterson é
amigo e está do nosso lado...
— Mesmo assim, prefiro não me arriscar.
— Não se preocupe. Deixe que eu cuido
de tudo. Agora que está alimentado, durma.
Eu o acordarei assim que o Skip chegar.
Enquanto Kay esperava Steve dormir,
Skip chegava à cidade e se dirigia até a
cadeia, onde se identificou. Perguntou de
Steve ao xerife.
— Estão todos mortos, o grupo todo que
saiu daquele forte — informou Paterson. —
Eu sinto muito!
— Tem certeza disso?
— Absoluta. Descobri o local da
emboscada. Dali segui uma trilha até a toca
de Joe Pena Branca.
— Eu o conheço, foi morto ao trazer um
recado para Kay...
— Sei disso. No esconderijo de Joe,
havia uma sepultura recém-feita com a
túnica do Capitão Master espetada no galho
que servia de cruz. Havia buracos de três
balas e muito sangue...
— Steve... Morto? Não posso acreditar!
— falou Skip, desolado, sentando-se e
demonstrando seu cansaço pelas
atribulações que havia enfrentado. —
Charlie também está morto. Era o único que
poderia livrar meu irmão dessas acusações...
Tudo estava muito complicado para o
ajudante de xerife. Ele foi apanhar um
pouco de café para si e para os outros com
ele, enquanto pensava no assunto.
— Não sei, Skip, mas há algumas coisas
estranhas em tudo isso. Quando estive
ontem, na caverna do Joe, notei rastros de
cavalos que vinham da cidade e depois
seguiram na direção do forte.
— E o que há de estranho nisso?
— Bem, os cavalos do Exército usam
uma ferradura fácil de ser reconhecida.
Posso lhe afirmar que eram da Cavalaria.
— Quantos cavalos? — indagou Skip,
interessado.
— Dois, por quê?
— Havia dois homens da cavalaria ontem
no saloon. Um deles era um tenente e o
outro, um cabo. Foram eles que agrediram
Joe.
— Soldados agrediram Joe? — estranhou
Paterson.
— Sim, e foram, com toda certeza, os
mesmo que visitaram a caverna do índio.
Kay os conhece. Vou perguntar a ela quem
aram.
— Sim, faça isso. Acho que deveríamos
retornar ao forte, em seguida.
Skip concordou e deixou a cadeia,
dirigindo-se ao saloon. Subiu até o quarto
de Kay. Bateu na porta. Ela o atendeu,
pedindo silêncio.
— Não faça barulho — disse ela. —
Steve está aqui e está vivo!
— Oh, graças a Deus! E como está ele?
— Ferido, mas bem. Vai se recuperar.
— Então agora só tenho que me
concentrar em provar a sua inocência. Diga-
me uma coisa: quem eram aqueles dois
militares com quem briguei ontem?
— Tenente Bolt e Cabo Storm, por quê?
— Cuide de meu irmão. Depois eu
explico — disse ele, deixando-os e
descendo até o saloon. Quando ia sair,
encontrou-se com Carlson e seus homens.
— Saia da minha frente, irmão do
renegado! — disse Carlson.
Com uma rapidez espantosa, Skip sacou a
arma e bateu com o cano na cabeça de
outro, derrubando-o. Os outros homens
tentaram reagir, mas Skip lhes apontou sua
arma, já engatilhada.
Carlson se levantava, aturdido.
— Não gostei de você desde o principio,
Carlson. Sei que anda metido em alguma
armação. Se tem a ver com toda essa
história que prejudicou meu irmão, juro
como o faço se arrepender do que fez. —
afirmou Skip, deixando-os.
Foi até a cadeia, onde Ken o aguardava,
contando-lhe sobre Steve.
No forte Bowie, após receber uma
mensagem, o Coronel Donald solicitou a
presença do Tenente Bolt. Quando este
chegou à sala, Donald relia a mensagem
recebida.
— Tenente, acabo de receber esta
mensagem do Forte Douglas. O embarque
foi marcado. Você, a escolta e a carroça
deverão partir ao entardecer. Cavalgarão
toda a noite para evitar curiosos. Apanharão
o ouro amanhã cedo e tomarão a rota para
Phoenix.
— Entendido, senhor! Temos de mandar,
então, um mensageiro a Tucson informar
Carlson.
— Quem você sugere?
— Mande o Cabo Storm.
— Certo, faça isso. Vou preparar o
comunicado oficial para ser entregue a
Carlson. Oriente Storm, depois faça a
seleção dos homens para a escolta.
Bolt saiu satisfeito. Tudo corria dentro
dos seus planos. Foi avisar Storm para que
pegasse o comunicado com o coronel e
fosse imediatamente avisar Carlson.
Storm apanhou a mensagem com o
coronel e se dirigiu à cidade. Lá se
encontrou com Carlson e combinaram os
últimos detalhes do plano, conforme
orientado por Bolt.
— Há um probleminha ainda, Storm —
informou Carlson. — Aquele intrometido
do Skip Master precisa ser liquidado. Acho
que suspeita de alguma coisa.
— Então precisamos nos livrar dele. Com
o plano em andamento não podemos mais
correr riscos.
— Tem razão.
— Pegue a carroça e um cocheiro auxiliar
e vamos partir. Deixe alguns de seus
homens para cuidar desse Skip.
— Certo, vou nomear Ben e Jim para
cuidar disso. São homens de confiança e
bons atiradores.
— Perfeito! Vamos nos apressar. O
Tenente não vai admitir atrasos —
apressou-o Storm. — Nosso investimento é
muito grande e exige ações rápidas agora.
— Vou preparar a carroça. Em menos de
meia hora estaremos a caminho —
prometeu Carlson.
Skip, naquele momento, conversava com
o xerife, terminado de lhe contar que
encontrara Steve com vida no saloon de
Kay. Sugeriu que esperassem até que ele
acordasse, antes de tomar qualquer decisão,
inclusive ir até o forte, por isso adiaram,
então, a viagem.
Skip saiu para a rua. Havia percebido que
seu cavalo mancava, desde que voltara do
forte. Decidiu levá-lo ao ferreiro.
— Penso que tenha soltado a ferradura —
falou ele.
— Sim, já percebi. Vai deixá-lo aqui?
— Sim, eu volto para pegá-lo mais tarde.
Ao sair, Skip notou, pela primeira vez, os
dois homens de Carlson, plantados do outro
lado da rua. Não deu muita importância ao
fato e dirigiu-se ao saloon.
— Como está ele, Kay? — indagou à
garota.
— Ainda dorme, Skip. Isso é bom.
Trouxe o doutor para dar uma olhada nos
ferimentos. Está tudo normal, sem nenhuma
infeção, felizmente.
— Podemos confiar no médico?
— Sim, ele não revelará a ninguém a
presença de Steve aqui. O que pretende
fazer agora?
— Tem algo me incomodando. Vou dar
uma volta para ver se esclareço — disse ele,
referindo-se aos dois homens que o
seguiam.
Deixando o saloon, Skip quase esbarrou
neles. Suas suspeitas se confirmaram. Para
se assegurar, dirigiu-se ao restaurante onde
comeu alguma coisa.
Durante todo o tempo os homens
permaneceram ali perto, observando-o. Não
teve mais dúvida. Foi até o ferreiro, que
terminara o serviço, apanhou o cavalo e foi
cavalgar nas imediações, como se tivesse
um destino definido.
Não demorou muito para constatar que os
dois homens o seguiam ali também.
Escondeu seu cavalo, apanhou seu rifle e
ficou aguardando, oculto.
Ben e Jim conversavam, enquanto
seguiam a pista de Skip.
— O que ele estará fazendo por aqui? —
indagou Jim.
— Não tenho a menor idéia, mas isso
vem bem a calhar para nós. Um pouco mais
e poderemos acertá-lo sem nenhuma
testemunha.
— O filho da mãe mal sabe que está
cavalgando para a morte.
— Veja, a pista segue para aquela trilha
ali, nas pedras.
— Vamos apressar o passo para alcançá-
lo e liquidá-lo logo. Quero voltar logo ao
saloon e tomar uma boa cerveja gelada...
— Eu não teria tanta pressa assim —
disse-lhes uma voz forte e ameaçadora,
seguida do ruído característico de um rifle
sendo engatilhado.
Os dois cavaleiros estacaram, surpresos e
sem reação, quando Skip saiu de trás de
uma pedra com a arma engatilhada.
— Desmontem! Vamos ter uma conversa
— ordenou.
Os dois, sem outra alternativa,
obedeceram.
— Agora soltem seus cinturões com
bastante cuidado!
— O que deseja de nós? — quis saber
Ben, assustado.
— Algumas informações.
— O quê?
— Quero que me digam tudo que puder
me interessar. Vocês escolhem.
— Não pode nos obrigar a falar — disse
Jim.
— Isso quem decidirá sou eu. Eu tenho a
arma — falou Skip, com energia.
Skip apanhou um pedaço de corda em seu
alforje e o atirou para Jim, ordenando:
— Amarre as mãos de seu amigo! E nada
de truques.
— O que vai fazer conosco?
— Dependerá de vocês. Se falarem
espontaneamente, tudo será mais fácil.
Quando Jim terminou de amarrar as mãos
de Ben, Skip se aproximou dele.
— Estenda a mão! — ordenou.
Jim pareceu que obedeceria, mas, quando
Skip se voltou ligeiramente para apanhar
outro pedaço de corda, Jim avançou sobre
ele resolutamente.
O rapaz desviou-se agilmente e golpeou a
nuca de seu atacante com a coronha do rifle,
provocando um ruído seco, de algo se
quebrando.
Jim caiu imóvel na poeira e ali ficou.
— Maldito! você o matou! — berrou
Ben, vendo o corpo do amigo imóvel a sua
frente.
— Que lhe sirva de lição para não bancar
o engraçadinho comigo — respondeu Skip,
indo apanhar seu laço.
Prendeu a ponta nas mãos amarradas de
Ben, depois montou seu cavalo. Amarrou a
ponta da corda no arção da sela.
— Ok, meu amigo! Tem duas opções: ou
conta o que sabe ou vamos dar um passeio
por entre as pedras e os cactos.
— Não pode fazer isso... Se me matar...
— O que acontece? Você fica aqui e
apodrece, servindo de pasto para os abutres.
— Pode me matar! — disse Ben,
valentemente. — Não saberá de nada. E não
há meio de me fazer abrir a boca.
— Não sei... Sempre pode haver alguma
coisa nova, não? — respondeu Skip,
esporeando seu cavalo.
Procurou não maltratar muito o homem
que trazia de arrasto na ponta da corda, mas
provocou-lhe algumas boas escoriações e
arranhados.
E estava apenas começando. Após
cavalgar por algum tempo por entre pedras
e cactos, notou que Ben já apresentava
diversos ferimentos pelo corpo todo e
berrava feito um carneiro degolado.
Cavalgou um pouco mais e diminuiu a
marcha, encontrando algo interessante a sua
frente.
— E então, vai me contar o que sabe? —
indagou Skip.
— Maldito! Vai queimar no fogo do
inferno e nunca saberá de nada pela minha
boca!
— É, você é um osso duro de roer,
homem, mas só está piorando as coisas para
você — disse Skip, desmontando.
Caminhou até o feiro, que tentava se
levantar. Sem nenhuma palavra, golpeou-o
na cabeça, desacordando-o.
Quando Ben voltou a si, notou,
horrorizado, que estava amarrado a quatro
estacas onde estava presos seus braços e
pernas, à moda índia.
As roupas haviam sido rasgadas, expondo
seus ferimentos ao sol. Erguendo
dolorosamente a cabeça, viu que Skip
triturava algo com uma rocha, batendo
numa cavidade na pedra. Depois, derramou
ali um pouco de água.
Feito isso, retirou o lenço do pescoço e
ensopou-o naquele líquido. Aproximou-se
em seguida do pistoleiro.
— O que é isso?
— Uma receita índia para curar feridas,
não conhece? E feita com isto com isto —
falou-lhe Skip, mostrando algo em sua outra
mão.
Ben olhou e, após assegurar-se de que
seus olhos realmente viam uma pimenta
brava na mão de Skip, contorceu-se todo,
tentando se libertar.
— É inútil, meu amigo. De nada vai lhe
adiantar se debater dessa forma. Quando
mais o fizer, mais sangrará. Fale ou vai
arder vivo!
— Não falarei! — gritou Ben, fechando
os olhos.
Skip não hesitou, apertou o lenço em sua
mão, fazendo com que o líquido que o
impregnava gotejasse sobre as feridas de
seu prisioneiro.
Ben sentiu sua cabeça latejar e tudo girar
ao seu redor ante o sofrimento que lhe era
imposto. Um urro animal escapou-lhe da
garganta, antes de gemer, quase sem
consciência.
— Eu falo... Eu falo o que quiser... —
disse ele, num sopro de voz. — Estou
pegando fogo...
— Comece me contando o que é mais
importante...
— Carlson vai roubar o ouro da
Cavalaria... Ele e o tenente.
— Qual tenente? Bolt?
— Sim, esse mesmo.
— O que meu irmão teve a ver com tudo
isso?
— Seu irmão era inocente de tudo. Bolt
roubou os rifles e matou os sentinelas. Os
rifles foram dados a Charlie para que
mentisse durante a Corte Marcial,
incriminando o capitão...
— Por que tiveram que tirá-lo do
caminho?
— Steve Master comandaria a escolta.
Bolt queria aquele posto para poder roubar
o ouro. Armou toda aquela trama contra seu
irmão, conseguindo afastá-lo. Agora solte-
me... Não agüento mais... Estou em fogo...
— Sim, agora acho que já entendi tudo
— comentou Skip, cortando as cordas que
prendiam Ben e atirando-lhe um cantil de
água.
Ben, desesperado, esfregou água pelo
corpo, contorcendo-se em dores. Viu que
seu algoz se distraía, pensando em alguma
coisa. Abaixou-se, fingindo que se lavava, e
apanhou um punhado de areia.
— Master! — chamou.
Quando Skip se voltou para ele, Ben
tirou-lhe a areia nos olhos com rapidez.
Cego de dor, Skip ainda golpeou o ar com o
rifle, tentando atingi-lo.
Seu cavalo e o de Jim haviam seguido a
montaria de Skip. Por isso, foi fácil para ele
saltar no lombo de seu animal e esporeá-lo
na direção da cidade.
— Maldito verme! Devia tê-lo matado
logo — resmungava Skip, derramando água
nos olhos.
Mais tarde, quando conseguiu chegar à
cidade, falou com Paterson, contando-lhe
tudo que conseguira descobrir de seu
prisioneiro.
— É uma pena que ele tenha escapado,
Skip. Poderia testemunhar a favor de seu
irmão, livrando-o das acusações.
— Não faz mal. Estamos na pista certa. O
importante agora é localizar Carlson e
prendê-lo. Se ele se negar a admitir a culpa,
eu darei a ele o mesmo tratamento que dei a
um de seus homens. Depois dele, resta-nos
acertar contas com o Tenente Bolt —
sugeriu Skip.
— Concordo com você. Vamos até a
Horselines, Carlson deve estar lá.
Os dois foram até lá, onde receberam a
informação que Carlson havia partido para
uma viagem a serviço da Cavalaria.
— Precisamos andar rápidos — disse
Skip. — Vamos para o forte. Vou até o
saloon avisar Kay. Ela ficará contente ao
saber da inocência de meu irmão.
Skip dirigiu-se rapidamente no saloon e
falou com a garota.
— Sempre acreditei na inocência dele —
afirmou ela.
— E eu a agradeço por isso Kay. Quando
Steve acordar, diga a ele que os problemas
acabaram.
— Mas você ainda terá que provar isso.
Como vai fazer?
— Eu e Paterson vamos ao Forte Bowie
agora mesmo. Falaremos com o coronel e
ele nos ajudará, tenho certeza.
— Boa sorte, Skip!
O rapaz deixou o saloon. Ken o esperava
à porta, com os cavalos.
— Precisamos nos apressar. O amigo de
Carlson que fugiu pode estar indo avisá-lo.
— Chegaremos a tempo! — garantiu
Paterson.
Pouco depois cavalgavam a galope pela
trilha que os levaria ao Forte Bowie.
Ken e Skip haviam chegado ao forte no
meio da noite. Após acordarem o coronel,
Skip contou-lhe tudo que descobriu por
intermédio do capanga de Carlson.
— Tudo fica claro agora, coronel. O
tenente Bolt vai roubar o ouro — afirmou o
rapaz.
— Não posso acreditar. Bolt era um
oficial e cavalheiro, não faria isso. Tinha
uma folha de serviços excelente!
— Meu irmão também tinha uma ficha
excelente, mas isso não foi empecilho para
que o desacreditassem, coronel. A única que
sempre teve alguma coisa a lucrar com a
condenação dele foi Bolt, que desejava todo
o controle do transporte do ouro para si.
— Há uma escolta de vinte soldados com
ele — informou o comandante.
— Nem todos devem estar ao lado dele.
— Pode nos arrumar alguns soldados,
coronel? Vamos precisar de ajuda para
capturar o tenente e seus homens. Não
sabemos quantos soldados estão
mancomunados com ele — falou Paterson.
— É uma situação delicada. Estou
desfalcado de vinte de meus melhores
soldados. Não posso comprometer ainda
mais a segurança do forte.
— A região está tranqüila, coronel. De
qualquer modo, diga-nos então qual a rota
que eles tomarão — pediu Skip.
— O que estão me pedindo é sigilo
militar. Não tenho meios de saber se estão
mentindo ou não, se isso não é um plano
para se apossarem do ouro...
— Terá de acreditar em nós, coronel —
afirmou Skip.
O coronel indeciso pela sala, soltando
longas baforadas de seu cachimbo. Skip e
Ken estavam impacientes.
— Quanto mais nos demorarmos, melhor
para eles, coronel — apressou-o Skip.
— Tem que acreditar em nós,
comandante. Se aquele ouro for roubado,
toda a sua carreira poderá ser destruída, tem
de considerar esta possibilidade —
ponderou Ken.
— Demônios! Vocês têm razão. Estou
convencido. Vejam, esta vai ser a rota —
disse ele, finalmente, abrindo o mapa sobre
a mesa e apontando o traço marcado que
indicava a rota a ser seguida para
transportar o ouro.
— É o bastante, coronel. Vamos partir
imediatamente. Eles levam uma boa
dianteira, mas vamos encontrar uma forma
de neutralizar isso — comentou Skip.
— Talvez eu possa ajudar nisso,
senhores, já que me prestam um inestimável
serviço. Há um homem que vai ajudá-los.
Conhece todo o território como a palma da
mão.
O coronel dirigiu-se ao seu ordenança,
dando-lhe uma ordem. O soldado saiu
rapidamente, retornando logo depois em
companhia de um velho batedor da
Cavalaria.
— Este é Old Horse, trabalha comigo há
mais de vinte anos e conhece este território
de ponta a ponta.
— Muito bem, Old Horse. Diga-nos qual
a melhor maneira de chegarmos a Forte
Douglas à frente do tenente?
— Quando ele saiu?
— No fim da tarde — informou o
coronel.
O velho índio examinou o mapa
estendido a sua frente. Após analisá-lo,
concluiu sabiamente:
— Não há como chegar na frente dele. O
melhor agora é esperá-lo, quando retornar
do Forte Douglas.
— Pode ser uma alternativa, mas quem
nos garante que ele não tomará logo uma
trilha para o México? — questionou Skip.
— Nenhuma trilha para carroça segue
para o México, antes do Desfiladeiro da
Águia. Ali é o melhor lugar para esperá-los
— informou o índio, apontando no mapa o
local.
— O que me diz, Ken? — indagou-lhe
Skip.
— Acho que ele tem toda razão. Agora só
dependemos de você, coronel. Sozinhos não
poderemos enfrentar todos eles.
— É uma questão a considerar, senhores
— comentou o coronel depositando seu
cachimbo na mesa. — Minha carreira pode
estar em jogo. Acho que devo tomar as
minhas precauções. Vou acompanhá-los, é a
única maneira de evitar o roubo do ouro.
— Boa decisão, coronel — elogiou Skip.
— Ordenança, acorde os homens. Quero
os melhores atiradores prontos para partir
em dez minutos.
— Old Horse vai guiá-los. Estaremos no
desfiladeiro logo ao nascer do sol! —
informou o índio.
Dez minutos mais tarde, quinze dos
melhores atiradores do forte formavam uma
coluna sob as ordens do coronel. partiram
imediatamente, em companhia de Skip e de
Paterson.
As carroças já haviam sido carregadas.
Bolt assinou o recibo pelo transporte e
partiu de Douglas, seguindo a rota traçada.
Pretendia, ao chegar ao deserto, dar cabo
dos homens da escolta que não estivessem
com ele e, após a partilha, seguir para o
México, onde o esperava uma vida de rei.
— Há alguém nos seguindo — informou
um soldado.
— Vejam quem é e tragam-no aqui —
ordenou Bolt.
Pouco mais tarde, os soldados traziam
Ben até ela.
— O que houve? Onde está Jim? — quis
saber Carlson.
— Jim está morto. Skip Master o matou.
Sabe de todo o plano.
— Sabe? E como descobriu?
— Olhe para mim... Tive de contar-lhe
ou ele me matava.
— E como escapou?
— Ele se distraiu e eu pude fugir.
Infelizmente não pude matá-lo, o que me
daria muito prazer.
— Está bem, você fez o que pôde. Siga
com a gente. Tomará parte no bolo também
— falou Carlson.
O tenente aproximou seu cavalo de
carroça conduzida por Carlson e pulou para
a boléia, sentando-se ao lado do cocheiro.
— O que vamos fazer? Master deve ter
informado o coronel. Eles devem estar em
nosso encalço agora — comentou Carlson.
— Não precisamos nos preocupar.
Levamos um boa dianteira sobre eles. Após
o Desfiladeiro da Águia, há uma trilha que
nos conduzirá ao México. Deixaremos a
carroça após a partilha.
— Quantos homens são fiéis a você na
escolta?
— Todos. Eu os escolhi a dedo.
— Excelente, então está melhor do que
eu imaginava.
— Sim, eu resolvi jogar seguro. Com
todo esse dinheiro em jogo, não podia
facilitar. São leais a mim e lutarão até à
morte, pela sua parte no ouro.
— Bem pensado, tenente.
— Metade do ouro é minha, um quarto é
seu e o restante será dividido entre eles.
— Ainda assim, haverá mais ouro do que
poderemos carregar — falou Carlson,
satisfeito.
A viagem foi tranqüila até o desfiladeiro.
Bolt havia alertado seus homens para que
ficassem atentos a qualquer nuvem de
poeira que indicasse a aproximação de
alguma patrulha.
Quanto mais se aproximavam do
desfiladeiro, mas sua segurança aumentava.
Estava confiante que não seriam mais
alcançados.
Quando entraram na garganta rochosa,
havia um desmoronamento tapando a
passagem. Fora, na verdade, provocado
pelos homens do forte, sob as ordens de
Skip.
Bolt cavalgou até lá, quando os batedores
informaram.
— Demônios! Só faltava essa — disse
ele, olhando ao redor.
Não sentiu cheiro de pólvora, que
indicaria que a explosão havia sido
provocada. Tudo parecia muito natural.
— Vamos tratar de limpar a estrada,
rapazes. Não temos o dia todo e o México
nos espera — ordenou.
Os homens desmontaram e se atiraram
animados ao trabalho, procurando abrir uma
trilha para a passagem dos cavalos e da
carroça.
Inesperadamente, um tiro soou pelo
desfiladeiro, seguido pela voz do coronel.
— Tenente Bolt, considere-se preso, você
e seus homens, bando maldito de traidores!
Bolt pulou de seu cavalo para baixo da
carroça, juntamente com Carlson.
— Demônios! Como chegaram aqui tão
depressa? — indagou o tenente.
— Acho que é muito lógico. Eles se
anteciparam a nós, tenente. Ao invés de nos
seguirem até o Forte Douglas, vieram nos
esperar aqui, única rota para o México.
— Temos armas e homens. Arrisquei
minha carreira neste golpe. Não vou me
render, Carlson.
— E então, tenente? O que me diz? Tem
um minuto para depor as armas e se
entregar. Enfrentará uma Corte Marcial por
deserção e roubo. Não tem saída! — insistiu
o coronel.
— Ora, vá para o inferno! — rugiu Bolt,
fora de si, disparando sua arma a esmo.
O tiroteio que se seguiu fez estremecer as
paredes do desfiladeiro. A fumaça
obscureceu o sol, mas a vitoria não pendia
para nenhum dos lados.
Os homens do coronel, abrigados atrás
das pedras, tinham que lutar contra os
homens de Bolt, o culto sob a carroça e
atrás das pedras do desabamento.
As balas ricocheteavam e zumbiam por
todos os lados.
— Ficaremos aqui o dia todo, coronel, e
não conseguiremos desentocá-los. Quando
anoitecer, poderão fugir — opinou Skip.
— Precisamos fazer alguma coisa para
tirá-los de lá — ajuntou Paterson.
— Nada podemos fazer, sem prejuízo do
ouro, cavalheiros. Pensei em dinamitar
aquelas rochas e a carroça, mas perderia o
ouro.
— Tentar atear fogo à carroça também
está fora de questão. Alguém teria que se
expor perigosamente para atirar uma tocha e
mesmo isso não seria muito eficaz —
ponderou Skip.
— Temos que pensar em um outro plano
e jogar com a paciência — sugeriu
Paterson.
— Nesse caso, só há uma coisa que
poderemos fazer — ponderou Skip. —
Vamos esgotá-los. Fecharemos a saída do
desfiladeiro e poremos guardas ali. A idéia
é deixá-los encurralados lá dentro. Se o
plano der certo, cedo ou tarde eles terão de
sair.
— Pode demorar alguns dias — falou o
coronel.
— Mas haverá uma vantagem nisso.
— Qual?
— Pegaremos todos eles com vida.
Podemos mandar um emissário ao Forte
Douglas pedir reforços, água e comida.
Teremos todo o tempo do mundo, enquanto
que eles, não. O que me diz, coronel?
— Acho que pode dar certo, Skip.
Assuma o comando disso. Pedirei que
cessem o fogo e você transmitirá o plano
para os meus homens.
— Muito bem, homens. A idéia é
evitarmos ao máximo baixas de nosso lado.
Vocês farão o seguinte, então. Quero que
matem todo os cavalos que estão lá
embaixo, principalmente aqueles atrelados à
carroça. Quero que furem, também, os
tambores de água presos à carroça.
— Qual o objetivo disso, senhor? —
indagou um deles.
— Mesmo que cada um deles ainda tenha
água em seu cantil, ela não vai durar muito.
Vamos fechar a saída deles também. Em
breve eles começarão a sofrer pela fome e
pela sede. Além disso, os animais mortos
logo vão saturar o ar com a pior carniça que
aqueles homens já sentiram.
— Isso pode dar certo — comentou
outro.
— Vai dar certo. Vamos tentar, depois,
pela última vez, obter a rendição. Se eles
não concordarem, vou mandar um emissário
ao Forte Douglas pedir reforços, água e
comida. Poderemos ficar indefinidamente,
enquanto eles, não. Em breve estarão
desesperados — anunciou o coronel.
— Vamos lá, rapazes. Caprichem na
pontaria — finalizou Skip.
Os homens foram tomar posição e, pouco
depois, foram disparando certeiramente,
abatendo os cavalos, destruindo os barris de
água.
Bolt ficou atônito diante daquilo. Carlson
entendeu imediatamente o plano.
— Diabos! tenente! Estamos
encurralados como ratos numa ratoeira!
— Mataram os cavalos... Malditos!
Cortaram nosso único meio de fuga...
— Acabaram com nossa reserva de água.
Podem nos manter aqui por quanto tempo
quiserem. Sem contar que, em breve, a
carniça vai tornar isso insuportável.
— Só temos uma chance agora. Vamos
esperar anoitecer e tentar fugir.
— A pé? Seríamos caçados como
coelhos.
— Não, vamos agir como soldados.
Vamos atacar. Há cavalos com eles. Nós os
tomaremos...
— Está sendo muito otimista, tenente.
— Confie em mim. Eu sei o que falo.
Naquele momento, o coronel voltou a
falar.
— Atenção, homens! Rendam-se! A
loucura do tenente vai levar todos vocês à
morte. Prometo um julgamento justo para
aqueles que depuserem suas armas.
— Se alguém fizer isso, será morto como
um rato — ameaçou o tenente.
Os homens não se moveram.
Permaneceram em seus esconderijos,
embora muitos desejassem se entregar.
Sabia que a situação era insuportável. Só
sairiam dali mortos, se seguissem o tenente.
Bolt determinou que esperassem o
anoitecer. Mandou Storm correr entre os
soldados, informando que, à noite, iriam
atacar a posição dos outros soldados,
tomando-lhes os cavalos para poderem
fugir.
Quando anoiteceu, no entanto, os homens
do coronel fizeram fogueiras na entrada e na
saída do desfiladeiro, iluminando tudo e
impedindo qualquer ação.
— E agora, tenente? O que vai fazer?
Meteu-nos numa boa encrenca. Grande
plano foi o seu! — zombou Carlson.
— Não banque o espertinho agora,
Carlson. Foi o seu homem idiota que nos
pôs nesta armadilha. Se ele não fosse
covarde e tivesse mentido a boca fechada, já
estaríamos a caminho do México com o
ouro.
— Não sou covarde — reclamou Ben,
sob a carroça, com eles.
— Ele tem razão, tenente. Não temos
mais saída agora. Vamos nos entregar. Seus
soldados estão com medo de morrer
também. Tudo está perdido — ponderou
Carlson.
— Ninguém vai desertar aqui. O primeiro
que fizer isso será morto — gritou o
tenente, fora de si.
— Pois eu vou, não sou um de seus
soldadinhos de chumbo para obedecer suas
ordens — respondeu Ben, rolando para fora
e levantando-se com as mãos para cima.
O Tenente Bolt engatilhou seu Colt e
disparou nas costas dele, jogando-o para
frente, de boca na poeira.
— Maldito, sanguinário! Não pode
reconhecer a derrota? — indagou-lhe
Carlson, encostando o cano de sua arma na
barriga dele e disparando.
O tenente rolou, gemendo de dor e
tentando apagar o fogo que queimava sua
túnica, ateado pela pólvora do tiro de
Carlson.
— Maldição! Ele me baleou! — falou
Bolt, levantando-se, gemendo de dor.
Um novo disparo ecoou pelo desfiladeiro
e o tenente parou de gemer no ato. Seu
corpo foi arremessado na poeira pelo
disparo certeiro da arma de Carlson.
— Seu covarde traiçoeiro! — rugiu
Storm, ao ver o tenente estrebuchar na
poeira.
— É melhor se acalmar, cabo, ou terá o
mesmo destino do tenente.
— Seu idiota, não vê que estamos
perdidos de qualquer modo? Se nos
entregarmos, seremos enforcados. Já devem
ter descoberto nossa participação nas mortes
do xerife, do Capitão Kane, de Charlie e
seus renegados...
— E o que sugere, sabichão?
— Vamos lutar, é a única maneira.
Vamos lutar por nossas vidas e tentar sair
daqui da melhor maneira possível.
Encheremos nosso alforjes com ouro,
tentaremos roubar alguns cavalos deles.
Mandaremos os soldados na frente.
Enquanto eles atraem a atenção, fugiremos
por outro lado.
— Pode dar certo — concordou Carlson.
Storm deu as ordens aos homens. Eles,
em desespero e cheios de cobiça ao verem o
ouro, encheram bolsos e alforjes e tentaram
abrir caminho a bala, mas não tiveram sorte.
Foram sendo abatidos como moscas.
Skip e Paterson viram quando Carlson e
Storm tentavam escapar em direção oposta.
Foram ao encontro deles.
— Acho que aqui é o fim da linha —
determinou Skip.
— Maldito bastardo! Eu devia saber que
você estava por trás disso — rugiu Carlson,
tentando sacar a arma.
Storm o imitou, mas os homens diante
deles eram mais rápidos. Skip varou a
garganta e a testa de Carlson e, de quebra,
ainda acertou o peito de Storm, que já
tombava, varado por uma bala de Paterson.
Um silêncio mortal abateu-se sobre o
Desfiladeiro da Águia.
Duas semanas depois, já refeito dos
ferimentos que recebera, Steve Master era
reintegrado ao seu posto de Capitão da
cavalaria dos Estados Unidos.
— Creio que cometemos um erro muito
grande com você, capitão, mas felizmente
tivemos tempo para reparar isso —
comentou o coronel.
— Graças ao trabalho de meu irmão e à
sua colaboração, senhor.
— Felizmente o ouro não foi roubado,
capitão. Agora é sua responsabilidade levá-
lo a Phoenix, sem mais demora.
— Partirei imediatamente, senhor.
— Não se esqueça que, na volta, será
promovido, conforme a decisão inicial. Só
tem que levar esse carregamento a salvo até
lá.
— Será feito, senhor. Eu lhe garanto.
Steve pôs seu chapéu ao sair da sala de
comando. Kay e Skip esperavam por ele do
lado de fora.
— E então, mano? tudo volta ao seu
lugar?
— Sim, tudo como antes, Skip, graças a
você. O que pretende fazer agora. Vai ficar
para o nosso casamento? — perguntou-lhe
Steve, abraçando Kay.
— Claro que sim. Além disso, vai haver
brevemente uma eleição para xerife de
Tucson. Pensei em concorrer.
— E Paterson?
— Quer ser meu ajudante.
— Então pode se considerar eleito. Como
primeira missão, peço-lhe que escolte Kay
até a cidade. Partirei para Phoenix para
levar o ouro. Quando voltar, nos casaremos.
— Estarei esperando ansiosa —
respondeu Kay, beijando-o ardentemente
sob os olhares cúmplices de todos os
homens do forte.
L P Baçan O Mago das Letras
1975: escreveu e publicou seu primeiro
livro de bolso, a novela Uma Tese
para o Amor, pela Editora Cedibra,
Rio de Janeiro, passando, daí, a
escrever mensalmente novelas por
encomenda para essa e outras
editoras.
1985: teve 11 letras incluídas no LP
Saudação ao Mato Grosso, da dupla
Estudante & Caminhoneiro.
1986: teve 6 letras incluídas no LP
Oração de Um Caminhoneiro, da
mesma dupla.
1991: participou da Coletânea do I
Concurso Nacional de Literatura da
FENAE, com um conto premiado
em 1º. lugar.
1994: participou da Antologia Os Poetas,
do V Concurso Helena Kolody de
Poesia, Governo do Paraná, Curitiba
– PR.
1995: traduziu a obra El Contuberneo
Judeo-Maçónico-Comunista, de José
Antonio Ferrer Benimelli, em 2
volumes intitulados Maçonaria &
Satanismo, para a Editora "A
Trolha".
1996: publicou a novela rural Sassarico,
sobre o fim do ciclo do café, início
da rotação de culturas (soja e trigo)
e surgimento dos bóias-frias e editou
os livros Vida Minha, de Emília
Ramos de Oliveira (biografia) e
Círculo Vicioso, de Arlene Cirino de
Oliveira.
1997: participou da coletânea Poema,
Poesia... Maçom, Maçonaria,
organizada por Mário Cardoso para
a Editora Arte Real.
1998: publicou o livro de poemas
Alchimia.
1999: publicou o livro Redação Passo a
Passo e editou o livro URAÍ - Nossa
Terra, Nossa Gente, 2 volumes, de
Emília Ramos de Oliveira.
2000: teve 2 letras incluídas no CD
Nosso Negócio É Cantar, da dupla
Márcio Rogério & Luciano e 3 letras
no CD Mais, do cantor Cícero de
Souza. Publicou, neste ano de 2000,
Brincando nos Caminhos do Senhor,
revista infantil cristã, Editora e
Gráfica Cotação da Construção,
Londrina – PR.
2001: editou e prefaciou o livro
Templários, de Lori Andrei Perez
Baçan.
2002: foi o autor da letra do hino da Loja
Maçônica Londrina, em parceria
com o músico Wilmar Cirino.
2004: organizou, editou e participou do
livro I Antologia do Portal "Cá
Estamos Nós".
2006: organizou, editou e participou do
livro II Antologia do Portal "Cá
Estamos Nós".
2007: publicou os livros A Sabedoria dos
Salmos, A Sociedade Secreta dos
Templários e O Livro Secreto da
Maçonaria, pela Universo dos
Livros Editora Ltda.
2010: publicou os livros Manual da
Futura Mamãe, Quem Disse Que
Cozinha Não è Lugar de Homem e
Receitas Naturais pela editora
Universo dos Livros. Editou o livro
de contos Solidariedade, do autor
baiano João Justiniano da Fonseca.
Produziu, dirigiu e apresentou uma
série de 7 (sete) programas
radiofônicos Vila das Artes, na
Rádio Boa Nova FM, de Pérola, PR,
sobre literatura atual.
2012: traduziu, editou e publicou o livro
A Origem do Satanismo na
Maçonaria, de Arthur Edward
Waite.
2013: traduziu, editou e publicou em
formato eletrônico os livros Carmila,
de J Sheridan LeFanu, e Teoria da
Esgrima a Cavalo, de Alex Muller,
Anjos, o Caminho de Volta, Os Olhos
do Carrasco, Novelas de Terror
(Volumes I e II) Novelas Policiais
(Volumes I a 7) e Novelas de Faroeste
(Volumes I a IX) pela Lulu Press, Inc.
e Editora Saraiva.
1975 até 2015: hoje escreveu mais de 700
livros, publicados em sua maioria
em formato de bolso, sobre os mais
diferentes assuntos, como:
romances, erotismo, palavras
cruzadas, charadas, passatempos,
literatura infantil, passatempos
infantis, horóscopos, esoterismo,
simpatias populares, rezas, orações,
intenções, anjos, fadas, gnomos,
elementais, amuletos, talismãs,
estresse, manuais práticos, religião e
outros livros de bolso com os mais
diversos temas e letras para músicas.
Já editou em formato eletrônico
mais de 1000 títulos, entre
publicações individuais e antologias,
de autores de Língua Portuguesa e
Espanhola.
Publicou ao longo dos últimos 40 anos
poemas e contos em jornais de
circulação regional. Ultimamente,
Tem traduzido e editado livros
eletrônicos e empenhado em editar
todos seus títulos em formato
eletrônico para serem
disponibilizados a seus leitores.
www.acasadomagodasletras.net