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Novelas de Faroeste

Volume IV

L P Baçan

Copyright © 2015 L P Baçan

Todos os direitos reservados. Este livro ou

parte dele não pode ser reproduzido ou

usado de qualquer outra forma nem

divulgado sem a expressa autorização do

autor, exceto o uso de partes para referência

ou comentários.

ISBN 978-1-329-81616-9

Lulu Press, Inc. 3101 Hillsborough St, Raleigh, NC 27607

2015

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O Velho e Selvagem Oeste No Velho e Selvagem Oeste, o saloon era

o local mais movimentado e frequentado da

cidade. Ali aconteciam shows, dança, jogo e

muitas brigas. Ali se encontravam mocinhos

e bandidos, pistoleiros e desafiantes,

mulheres bonitas e perigosas. A maior parte

das histórias de faroeste passava por ele.

Dos ambientes mais simples e rudes aos

mais sofisticados, todos, indistintamente

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acolhiam moradores e forasteiros, cada um

com sua história, cada um com seu destino.

Famosos pistoleiros criaram fama nesse

local. Outros ali encontraram a morte, na

boca esfumaçada de um Colt. A fumaça da

pólvora negra era o manto lúgubre que

cobria mais um morto. Um punhado de

serragem era jogado sobre a poça de

sangue. Uma rodada gratuita de uísque

barato era servida e minutos depois

ninguém mais se lembrava do ocorrido.

Afinal, o Oeste era mesmo um lugar

selvagem e as Novelas de Faroeste mostram

isso.

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Obrigado a Matar

Na fronteira conhecida do oeste, no final

do século passado, a grande riqueza era o

gado, espalhado pelas pradarias, livres das

cercas de arame farpado ainda.

Com o sumiço dos búfalos, sobrou

totalmente para as reses a fartura das

pradarias, onde um clima propício, com

chuvas nas horas certas e uma terra fértil,

ajudaram a consolidar riquezas e a posse da

terra.

A prosperidade ajudou a formar cidades e

a tornar a figura do vaqueiro algo

glamoroso. Para estes, o dinheiro era farto,

o emprego garantido e as viagens, apesar de

duras, pontilhadas de aventuras e lindas

mulheres em cada cidade por onde

passavam.

Muitos ganharam dinheiro e passaram de

empregados a patrões. Outros viveram a

vida simplesmente, sem preocupação com o

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futuro. Ninguém imaginava que dias negros

poderiam um dia ameaçar toda aquela

prosperidade que era a tônica da fronteira.

Em 1885, porém, a natureza se vingou da

invasão desenfreada de suas terras. Após

um inverno rigoroso, a primavera não

trouxe as chuvas como esperado. Apenas

um vento constante, morno, que crestava a

terra, impedindo que a grama brotasse.

O que a princípio pareceu apenas um

atraso, foi se transformando numa

calamidade. O gado estava ameaçado de

morrer de fome no pasto. Sem outra

alternativa, os rancheiros tiveram de

começar a vender o gado.

Levas de compradores vinham do Leste

para aproveitar o preço baixo. O que para

eles significava fortuna, para os rancheiros

era a ruína.

De uma média de quarenta dólares por

cabeça, na época, o preço da cabeça de gado

foi despencando para menos do que dez.

Lotes inteiros eram arrematados por preços

aviltantes e transformados em carne para

abastecer o Norte e o leste do país, mais

rico e industrializado.

Os ranchos começaram a despejar nas

estradas do Oeste bandos de vaqueiros

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desempregados, desesperados, sem futuro,

sem profissão. A única coisa que sabiam na

vida era cavalgar, lidar com o gado e usar

uma arma. Quando as duas primeiras

perderam o sentindo como profissão,

restou-lhe apenas a terceira opção.

O Território do Wyoming foi devastado

por essa nova praga. Em plena primavera de

1885, no auge da crise, Ned Sinclair e Tony

Kansas, dois vaqueiros do Rancho

Shoshone, levavam uma centena de cabeças

de gado para um local conhecido como

Roca do rato, onde o Rio Pólvora e os

canyons por ele escavados impediam a ação

do vento e criava sua própria primavera.

Ali havia grama boa e alta para o gado.

— Ei, Tony! Veja só como eles comem!

— exclamou Ned, cruzando uma das pernas

sobre a sela do cavalo.

Tony fechou a saída de uma desgarrada e

empurrou-a na direção da água.

A rês farejou a grama e desembestou a

sua procura.

— Mais um pouco e teriam morrido de

fome — falou Tony. — Como sabia deste

lugar?

— Nasci em Cásper, sabia? Conheço

cada buraco de rato e toca de cobra desta

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região. Não há um esconderijo por aqui que

eu não saiba como entrar ou sair. Este aqui

mesmo, chamado de Toca do Rato, já foi

abrigo de criminosos nos velhos tempos. Os

índios shoshones se escondiam aqui, após

seus ataques. Para defender um lugar como

este você não precisa de muita gente. Basta

espalhar bons atiradores nas gargantas e

ravinas e ninguém ousará entrar aqui.

— Tem razão! Isto aqui é um labirinto!

Ainda bem que você conhece a saída.

Ned desmontou, tirou a sela de seu

cavalo, depois o soltou para pastar. Tony

fez o mesmo.

A noite não tardaria a chegar. Trataram

de fazer a comida. Na fogueira cercada por

pedras, Ned aqueceu o feijão com toucinho,

fritou ovos e fez café, enquanto Tony

passava água nos pratos e nas colheres

toscas de madeira.

Comeram com apetite, depois arrumaram

os cobertores, junto às selas, que serviriam

de travesseiro. As primeiras estrelas

despontavam no céu sem nuvens.

Tomavam café, enquanto conversavam.

— Estas desgarradas são as últimas que

haviam por aqui — disse Tony. — Quando

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as levarmos para o rancho, com certeza o

patrão levará toda a manada para o leilão.

— Não quero pensar nisso — comentou

Ned, aproveitando a luz da fogueira para

enrolar um cigarro.

— Acho que seremos demitidos, Ned —

opinou Tony.

— Não... Claro que não! Somos os

melhores que o patrão tem, Tony... E

depois, como eu me casaria com Mary Lee?

Sem emprego o pai dela jamais

consentiria...

— Não me venha com essa de novo. Eu

vou me casar com Mary Lee, não você! —

protestou Tony, atirando uma pedra sobre o

amigo, que riu divertido da reação do outro.

Ficaram em silencio, olhando o céu e as

estrelas que iam surgindo aos montes, à

medida que a claridade do sol desaparecia

por completo.

— O que faremos se ele nos despedir,

Ned? — perguntou Tony, angustiado. —

Não sei fazer mais nada.

— Não seremos despedidos, homem. Que

diabos! — protestou Ned, irritado.

Na verdade, nem ele tinha tanta certeza

disso. Vinham trabalhando duro havia uns

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dois anos naquele rancho, certos de que

poderiam se fixar por ali.

Naquele ano poderiam tirar uma

porcentagem em gado, para começarem

suas próprias criações. Após algum tempo,

teriam dinheiro para comprar um pedaço de

terras.

Diziam que em breve o governo abriria as

terras da Faixa Cheyenne, em Oklahoma.

Poderiam se candidatar. Eram sonhos, mas

bem embaçados.

Ninguém esperava, porém, aquele golpe

da natureza.

— Por que você se chama simplesmente

Tony Kansas? — perguntou Ned, tentando

mudar o rumo da conversa.

— Não lhe contei ainda?

— Não, não que eu me lembre.

— Fui criado num prostíbulo, às margens

do Rio Kansas, em Kansas City, na divisa

com o Missouri. As mulheres que me

criavam me chamavam de Tony. Como

estavam sempre em constante movimento,

quando eu tinha cinco anos ninguém se

lembrava mais quem fora a minha mãe ou

quem seria o meu pai. Deram-me, então, o

sobrenome de Kansas, em homenagem à

cidade e ao Estado.

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— E nunca conheceu mesmo seus pai?

— Não. Na certa meu pai era um

vaqueiro como eu, mas não como meus

filhos serão.

— Como assim?

— Meus filhos não serão vaqueiros.

Quero ir para o leste, Ned, aprender uma

profissão por lá e ficar. Lá tem escolas para

as crianças. Eles podem ser qualquer coisa

só estudando...

— Não seja tolo, Tony. O futuro está

aqui, nesta região, no Oeste do país. O Leste

está velho. Só serve para políticos e

preguiçosos.

Tony respirou fundo. Lembrava-se das

mulheres que conhecera no prostíbulo onde

havia morado até ter idade para sair pelo

mundo.

Elas falavam das grandes cidades do

Leste, dos prédios imponentes, de mármore

branco que feriam o olhar ao sol. Contavam

da elegância das mulheres, do

cavalheirismo dos homens e dos

acontecimentos sociais constantes, onde

pessoas se encontravam e se conheciam.

Nada como aquela vastidão solitária,

onde um homem podia virar bicho e

esquecer como falar, de tanta solidão.

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— Se formos despedidos, não voltarei

para Cásper até conseguir um outro trabalho

— afirmou Ned, admitindo, finalmente, o

risco.

— Por que não?

— Porque não poderei me aproximar de

Mary Lee sem ter um trabalho.

— Se ela o ama...

— Você não entendeu, Tony! Como vou

sustentá-la?

— Ela não ama você! — falou Tony,

aborrecido. — Por isso, nem precisa se

preocupar com isso, está bem?

— Ela me ama sim e você vai ver.

Quando eu conseguir um novo trabalho, eu

me caso com ela.

— O que fará com o dinheiro que temos a

receber do patrão?

— Estou preocupado com isso.

— Por quê?

— Porque transformamos o dinheiro em

cabeças de gado. Com a queda do preço,

levamos na cabeça direitinho.

— E se não vendermos? E se deixarmos

o gado aqui?

— Em pouco tempo as pastagens daqui

se acabariam e nós teríamos que vender do

mesmo jeito.

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— Diabos, Ned! que azar! — suspirou

Tony.

— Põe azar nisso, Tony! Põe azar nisso!

A noite estava quieta. O gado se

mantinha em silencio, tranqüilo naquele

oásis, após dias sem um bom pasto. A lua

foi surgindo, enorme no céu, jogando

claridade na pradaria. O marulhar da água

era o único som a embalar os dois cowboys.

Ned dormia com o chapéu sobre os olhos

e um cobertor sobre o corpo. Apesar do

calor do dia, as noites eram frias. Com a

mão sob o cobertor ele segurou a coronha

da sua Winchester e apontou o cano na

direção de Tony, cutucando-o.

Tony pigarreou, dando a entender que

também estava alerta. Passos abafados

soaram na areia que margeava o rio. O gado

se agitou inquietamente. O som de uma

Winchester sendo engatilhada se tornou

nítido dentro da noite.

— Agora, Tony! — gritou Ned, girando o

corpo para o lado.

A bala se encravou no couro da sela,

onde, instantes antes, estava a cabeça do

vaqueiro.

Tony havia feito o mesmo e corria agora

para trás de uma pedra. Uma bala

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ricocheteou na rocha, soando tetricamente.

O gado começou a se mover de um lado

para outro, assustado.

— Cuide do gado, Tony! — avisou Ned,

disparando seu rifle certeiramente.

Um homem caiu para trás, dentro do rio.

O corpo foi flutuando lentamente rio

abaixo. O silencio voltou a reinar na Toca

do Rato. Os dois vaqueiros mantiveram suas

posições. O gado foi se aquietando de novo.

— Ned, está vendo alguma coisa?

— Há, pelo menos, mais dois deles.

— Quem são?

— Desesperados, bandoleiros de

estradas...

— Vaqueiros desempregados... —

ajuntou Tony, com amargura.

O silencio continuou. Os atacantes

noturnos se mantiveram nas sombras das

rochas, protegidos. Tony e Ned também não

deixaram seus abrigos, atrás das rochas.

— Vamos passar a noite toda aqui? —

perguntou Tony.

Ned engatilhou seu rifle.

— Ei, vocês! Por que não dizem logo o

que querem e nos deixam dormir? —

indagou.

Nenhuma resposta quebrou o silencio.

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— Querem comida? Pois temos aqui o

bastante — falou Tony.

— Queremos o gado — respondeu

alguém, em algum ponto próximo dos dois.

— Negativo! Parte deste gado é nossa.

Nada feito! — respondeu Ned.

— Podemos ficar aqui a noite toda —

argumentou o outro.

— Nós também.

— Podemos matar todo o gado também

— continuou o outro, disparando.

Uma rês surgiu e dobrou os joelhos,

ficando se debatendo na relva, próxima do

rio.

— Maldito! — gritou Ned.

— Ned, eles podem matar todo o gado —

disse Tony.

Ned olhou para a rês que ainda se

debatia, ferida de alguma forma, mas não

mortalmente. O animal iria sofrer muito

ainda, antes de estrebuchar.

— Por que não termina o que começou?

Não vê que o animal está sofrendo? —

gritou Ned.

— Ned, que diabos! — repreendeu-o

Tony. — A rês pode estar ferido só de

raspão.

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— Fique quieto, Tony. Eles estão

blefando!

— Como assim?

— Gastaram sua última bala.

— Como pode ter certeza.

Ned pensou por instantes, depois gritou:

— Está bem, vocês podem levar o gado.

— Joguem fora as armas — ordenaram

aos dois.

Ned e Tony jogaram os rifles.

— Joguem os Colts também — ordenou a

voz.

— Não estão conosco. Ficaram junto à

cela, podem ver, se quiserem.

A paisagem permaneceu inalterada por

algum tempo. Depois, dois homens saíram

detrás de uma rocha, à esquerda do rio, e

um outro apareceu na outra margem.

Traziam rifles em suas mãos, mas Ned

não ouvira nenhum deles sendo

engatilhados.

Seu Colts estava preso no cinto, na

barriga. Esperava que Tony tivesse feito o

mesmo.

Os três começaram a se aproximar. Um

deles estava no meio do rio, quando os

outros dois afastaram os cobertores com os

canos de suas armas.

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Ergueram os cinturões dos dois rapazes.

— Foi uma armadilha! — gritou um

deles.

Todos os três se imobilizaram, apertando

nervosamente seus rifles, sem esboçarem o

menor gesto de ataque.

— Eu não avisei? — comentou Ned,

deixando seu esconderijo com o revolver na

mão. — Quem atirou naquela rês? —

perguntou.

— Ele! — apontaram os dois para o

homem no meio do rio.

Ned apontou o revolver para ele e

disparou duas vezes. Uma o atingiu no

peito, outra na barriga, enquanto caía. Seu

corpo desceu lentamente o rio, boiando com

os braços e pernas abertas.

— Ned! Por que fez isso, diabos! —

indagou Tony, surpreso com a atitude do

amigo.

— Quem atira numa rês como ele fez não

passa de um animal e deve morrer como um

animal — respondeu o rapaz.

Estava diante dos outros dois. Tinham a

barba crescida e as roupas sujas e rasgadas.

Pareciam que estava na estrada havia muito

tempo.

— Quem são vocês? — perguntou.

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— Vaqueiros... Despedidos...

— Não ganharam nada? Não sobrou nada

dos dias de trabalho?

— Gastamos com uísque e mulheres —

lamentou um deles, com voz chorosa. —

Estamos em apuros agora. Com fome, sem

dinheiro, sem nada. Apenas cavalos magros

e estas armas sem balas.

— Diabos! — praguejou Ned, olhando

aqueles dois e vendo neles o destino dele e

de Tony.

Era um homem orgulhoso e aquilo não

entrava em sua cabeça. Não podia estar

condenado a roubar e matar como aqueles

pobres coitados. O destino não podia ser tão

cruel com eles.

— O que vamos fazer com vocês? —

indagou ele, andando nervosamente de um

lado para outro.

Aqueles dois eram algo que ele não

gostaria de ter visto nem conhecido.

Engatilhou o Colt.

— O que vai fazer, Ned? — indagou

Tony.

Ned parou na frente dos dois homens.

Levantou o revolver e o apontou para atesta

do primeiro, apertando o gatilho.

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O homem deu um salto para trás e seus

miolos se espalharam na relva.

O segundo olhou atônito para o cano

esfumaçante do Colt, voltando para ele.

Viu apenas a língua de fogo surgindo do

cano e algo quente bater violentamente

entre seus olhos.

Tudo escureceu. Quando seu corpo caiu

junto o de seu parceiro, já estava morto.

Ficaram ali, imóveis, as caras cobertas de

sangue olhando a lua pela última vez.

Tony estava atônito, olhando o amigo,

que começava a remuniciar o revolver, frio

como se nada tivesse acontecido.

As previsões se confirmaram. Após

levarem o gado para o rancho, Tony e Ned

souberam que seriam despedidos, assim

como o restante dos vaqueiros.

Os leilões na cidade estavam rendendo o

mínimo. Lotes estavam sendo vendidos a

sete dólares por cabeça. Os dois, que tinham

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dez cabeças de gado cada um com o patrão,

ao invés de quatrocentos dólares cada um,

terminaram com setenta: muito pouco para

quem pretendia começar um rancho.

Estavam no alojamento, os dois, deitados

em suas camas. Os outros vaqueiros

arrumavam suas coisas. começavam a

partir. Ninguém tinha um rumo certo. Eram

homens acostumados a lidar com o gado.

Não sabiam fazer outra coisa.

— O que tem em mente, Ned? —

indagou Tony.

— Não sei... Ir para Powder River,

talvez.

— Powder River? Por quê?

— Não vou aparecer em Cásper com

setenta dólares no bolso. Como vou poder

olhar Mary Lee nos olhos e lhe dizer que

não poderemos nos casar ainda?

— O que há para nós em Powder River?

— Não sei, vamos descobrir. Tem

alguma idéia melhor?

— Pensei em ir para o Leste... —

respondeu Tony, sonhando.

— Está doido! O que vai fazer lá?

— Não sei, vou descobrir — riu ele.

— Você tem o traseiro acostumado

demais ao lombo de um cavalo, Tony.

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Como acha que vai conseguir viver sem

isso? Vai se acostumar a dormir numa

cama? O que um bronco como você poderá

fazer no Leste para viver?

— Talvez eu tenha lá as mesmas

oportunidades que aqui. Sou um cowboy,

mas ninguém está contratando cowboys.

Terei de fazer qualquer outra coisa. Tanto

faz aqui como no Leste.

— É, tem lógica — respondeu Ned,

ficando pensativo por algum tempo.

Ele é Tony formavam uma boa dupla e já

estavam juntos havia algum tempo.

Jamais haviam discutido e se entendiam

perfeitamente bem. Conheciam o seu

trabalho e eram valentes.

— Vamos fazer uma coisa, então — disse

Ned.

— Diga o que é?

— Vamos até Powder River ver como

andam as coisas. Tentaremos encontrar

algum trabalho por trinta dias. Se não

conseguirmos nada até lá, você poderá ir

para o Leste.

— Diabos, Ned! E, trinta dias terei gasto

até meu último centavo e não terei dinheiro

para pagar minha passagem de trem.

— Quanto é a passagem?

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— Devo gastar uns cinqüenta dólares até

Washington.

— Então está certo. Eu lhe dou os

cinqüenta dólares.

— Como?

Ned enfiou a mão no bolso da camisa e

retirou um pequeno saco de couro

vermelho. Jogou-o para Tony, que o aparou

no ar.

— Que diabos é isto? — indagou,

supresso.

— Abra!

Tony fez o que ele pedia. Abriu o

saquinho de couro para encontrar dentro o

anel de noivado que Ned havia comprado

para presentear Mary Lee.

— Ficou mais maluco do que já é? —

indagou, com indignação, guardando o anel

e devolvendo-o ao amigo.

— Veja bem, Tony! Se eu não arrumar

um bom emprego por aqui, vou embora

para a Califórnia ou para Oklahoma. Mary

Lee jamais iria comigo. Seu pai não

deixaria e ela jamais o desobedeceria. É

uma garota de princípios. Sem ela, para que

me serve o anel? Ele deve valer pelo menos

uns cento e vinte dólares. Paguei três reses

por ele. Dará para você ir para Washington

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e até voltar, caso se arrependa —

argumentou Ned, devolvendo o saquinho

para Tony. — Fique com ele. É a sua

garantia de ida para Washington.

— Não posso ficar com ele, Ned. Você

sabe disso. Está me chantageando, caramba!

— Estou falando sério. Acha que eu

brincaria com algo tão sério para mim como

o amor de Mary e a sua amizade, Tony?

Tony encarou o amigo. Sabia quando

Ned falava sério.

— Está certo, seu doido! Eu topo!

Quando partiremos?

— Se sairmos agora, chegaremos a

Powder River no meio da noite, se a lua

ajudar. A tempo de tomar uma cerveja no

Frontier Saloon.

— Irrah! — gritou Tony, saltando da

cama.

— Irrah! — correspondeu Ned, fazendo o

mesmo.

Menos de meia hora depois os dois

estavam a caminho, cruzando com

cavaleiros com ar cansado e aparência de

derrotados. Eram os desesperados, alijados

de seus empregos pelo tempo inclemente.

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No meio do caminho, já ao escurecer,

pararam num riacho para dar água aos

cavalos.

Havia um grupo enorme de homens

acampados ali, reunidos ao redor de

fogueiras, repartindo os últimos pedaços de

carne assada.

Não longe dali, os restos de uma rês

indicavam o que estava sendo a refeição

deles.

— Não querem aproveitar, amigos? —

convidou um deles. — Parece que estão no

mesmo barco que nós.

Os dois foram até lá e se sentaram diante

da fogueira. Apanharam um pedaço de

carne cada um. O cheiro estava delicioso.

— De onde estão vindo? — indagou o

desesperado.

— Da direção de Cásper. Pretendemos ir

para Powder River — respondeu Ned.

— Se esperam encontrar trabalho por lá,

desistam. Estão vendendo tudo. Gado e

terras. Nunca vi tamanho desespero. Os

rancheiros estão se mudando para a

Califórnia. Muitos estão indo para

Oklahoma, na esperança de ganhar um

pedaço de terra do governo. Tem gente do

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Leste que ficará podre de rico quando as

primeiras chuvas chegarem.

— Por que os rancheiros estão vendendo?

Por que não esperam as chuvas? —

indignou-se Tony.

— Porque todos têm empréstimos nos

Bancos e os Bancos pertencem a gente do

Leste. Estão pressionando para que os

empréstimos sejam pagos ou tomarão as

terras. Em desespero, os rancheiros estão

vendendo por qualquer preço, apenas para

pagar o Banco, o que dá na mesma. De uma

forma ou de outra, o pessoal do Leste é que

fica com as terras.

— Demônios! Então está correndo muito

dinheiro em Powder River! — exclamou

Ned, vendo naquilo algum tipo de

oportunidade.

— Nada disso — respondeu o

desesperado. — Apenas papéis, garoto!

Apenas papéis e nada de dinheiro. —

Aproveitem o café, ele não vai durar toda

noite.

Os dois se serviram. A carne havia

perdido o sabor para os dois rapazes.

— Para onde estão todos indo? —

perguntou Tony.

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— Ninguém sabe... Bandos estão se

formando... Está acontecendo todo tipo de

coisas. Há uma semana, um rancho próximo

de Powder River foi atacado por um bando

de desesperados. Não apenas saquearam

comida, armas e munições, como também

atacaram a mulher e três filhas do rancheiro.

A garota caçula tinha treze anos. Foi um

inferno, homem! Dois dos desesperados

foram pegos, justamente os cabeças.

Amarraram um laço nas pernas dele e as

pontas foram entregues a dois cavaleiros.

Fizeram o Passeio do Inferno com eles,

arrastando-o por sobre pedras e cactus.

Quando já estavam quase morrendo,

penduraram os dois numa árvore.

Finalizaram fazendo tiro-ao-alvo com seus

corpos. Coisa feia de se ver, homem! Feia

mesmo!

— Se forem a Powder River, afastem-se

do Frontier Saloon — gritou um dos

homens.

— Por quê? Pretendíamos ir lá tomar

uma cerveja — respondeu Ned.

— O uísque tem mais água que meu

cantil, a cerveja é choca, as mulheres são

doentes e os jogadores de pôquer são todos

ladrões. Não facilite no Frontier Saloon...

Page 27: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Principalmente porque ele pertence ao

xerife da cidade — completou outro.

— Venham conosco — propôs outro. —

Vamos nos juntar ao bando de Butch

Cassidy, no Buraco no Muro. Lá ninguém

nos pegará e ficaremos ricos roubando o

dinheiro dos homens do Leste que viajam

nas diligências e nos trens.

— Sim, dizem que no Buraco no Muro há

de tudo, uma verdadeira cidade, com uísque

honesto e mulheres de verdade. Nada lá é de

segunda. Todos sãos bem vindos ali —

comentou um velhote que tentava mastigar

um pedaço de carne usando apenas as

gengivas.

— Não, não posso fazer isso, pessoal.

Minha garota me espera e confia em mim.

Só se casará comigo se eu tiver um trabalho

honesto. — opinou Ned.

— Não existe trabalho honesto no Oeste

para gente como nós, garoto. Acabou-se. A

única coisa que temos para usar ainda é isto

— afirmou o desesperado, batendo a mão

no coldre, onde reluzia um Colt.

— Acho que vou arriscar minhas

chances. Eu e meu parceiro aqui — decidiu

Ned. — Obrigado pela carne, pelo café e

pela conversa, pessoal.

Page 28: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Se mudar de idéia, vai nos encontrar

no Buraco no Muro.

— E onde é isso?

— Basta procurar, garoto. Basta procurar

e vai achar.

Buraco no Muro era dos esconderijos

mais comentados da época, onde Butch

Cassidy, Sundance Kid e seu bando

descansavam entre seus assaltos. Para lá

rumavam todos os desesperados em busca

de trabalho, o único trabalho que lhes

restava naquele Oeste devastado: o uso dar

armas.

— Buraco no Muro, Bah! — disse Ned,

com desprezo. — Se eu tivesse que me

esconder de alguém, iria para a Toca do

Rato. Lá tem água, comida, pasto para os

cavalos e nem um Exército conseguiria me

tirar de lá. Por que acha que deixei aquela

meia dúzia de reses lá?

Tony olhou para o amigo sem entender.

— Enquanto você dormia, separei seis

reses prenhas e as levei para o interior da

Toca do rato. Se um dia precisar de um

esconderijo, sei que terei boa comida a

minha espera lá.

— Que diabos tem em mente, Ned? —

estranhou Tony.

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— Nunca se sabe, meu amigo. Nunca se

sabe — respondeu Ned, esporeando seu

cavalo.

A noite seguia em frente. A lua se

instalara no céu, brilhante como um sol,

derramando claridade na pradaria

ressequida, onde o vento levantava ondas de

poeira.

Após mais algum tempo de viagem,

avistaram Powder River, com suas ruas

iluminadas por lampiões e seus cassinos e

cantinas fervilhantes.

Situada às margens do Rio South Fork,

Powder River tinha também no gado sua

principal fonte de riquezas e, como todas as

demais cidades, sofria a ação do tempo

inclemente.

Desesperados enchiam suas ruas,

misturando-se aos homens do Leste,

emissários e compradores de gado e terras,

como abutres se alimentando dos despojos.

Nos saloon, deles eram os melhores

lugares, em frente ao palco, onde as garotas

dançavam só para eles, exibindo suas

roupas íntimas e deixando no ar promessas

de prazer e pecado.

Pistoleiros da pior espécie os cercavam,

garantindo sua segurança. Nenhum deles

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andava sem ao menos três homens armados

ao seu lado.

Afastados, os desesperados se

encostavam nas paredes e no balcão,

bebendo uísque barato e olhando de longe o

show das garotas que, noutros tempos,

dançavam só para eles.

Os dois rapazes pararam diante do

Frontier Saloon, no exato momento em que

um homem de terno, com chapéu preto de

abas retas trazia, preso em seu braço direito,

o pescoço de um cowboy bêbado.

Chutou-o da porta do saloon, fazendo-o

cair na poeira. O cowboy rolou, tentando se

levantar, mas estava bêbado demais.

Procurou a arma em seu coldre, mas ele

estava vazio.

O homem na porta era Blackhat Bill, o

xerife de Powder River, o homem que fizera

da lei um instrumento a seu favor. Impunha

a ordem como desejavam os munícipes, mas

tirava vantagens de todas as formas

possíveis.

— E então, rapazes? Têm dinheiro? —

indagou aos dois.

— Sim, temos nosso dinheiro —

respondeu Ned, demonstrando logo sua

antipatia pelo homem da lei.

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— Neste caso, sejam bem vindos.

Entrem. Encontrarão bom uísque, cerveja

gelada e as garotas mais lindas do sul do

Wyoming. Se forem homens de coragem,

poderão também arriscar sua sorte no

pôquer. Muitos fizeram fortuna em meu

saloon.

— Aposto como você foi um deles —

comentou Ned, baixinho, descendo do

cavalo.

— Ned, não seja idiota! Você ouviu o

que aqueles homens nos disseram.

— Vou entrar e tomar um cerveja, Tony,

conforme tinha prometido a você — disse

Ned, decidido.

Tony conhecia aquele tom de voz.

quando Ned o adotava, significava que

alguma coisa não o tinha agradado.

Estava claro que aquele xerife e seu

saloon haviam provocado seu amigo.

Neste caso, nada havia a ser feito a não

ser acompanhá-lo e tentar mantê-lo fora de

encrencas.

O que não era nada fácil.

— Quero uma dose do uísque que o

xerife toma — disse Ned, junto ao balcão.

O barman olhou-o desconfiado. Não

longe dali, o xerife ouvira o pedido. Riu e

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fez um sinal para o barman. Depois foi se

sentar numa das mesas de pôquer.

Ned provou o uísque.

— Prove, Tony! É do bom — disse,

pegando a garrafa que o barman deixara

sobre o balcão e servindo uma dose para o

parceiro.

Pagou pela garrafa. Encheu mais um

copo e saiu pelo saloon, olhando os quadros

que decoravam as paredes, as garotas no

palco, os homens de terno cercados por

pistoleiros e a mesa de pôquer, onde o

xerife jogava com outros dois homens.

Foi até lá. Tony suspirou, olhando para

cima, esperando a ajuda de algum santo.

Ned estava mesmo à procura de encrenca.

O diabo é que iria achá-la ali, não havia

dúvidas.

Foi atrás dele.

— Que tal procurarmos um lugar para

passar a noite? — disse Tony a ele.

— Veremos isso na hora certa, Tony.

Não se aflija.

Conhecia aquele tipo. Era esquentado e

fácil de ser depenado. Bastava provocá-lo

um pouco.

— E então, amigo? Vai só ficar olhando?

— cutucou o xerife.

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— Só estamos de passagem, xerife —

respondeu Tony, antes que Ned dissesse

alguma coisa.

Ned olhou para o amigo demonstrando

que não gostara da intromissão.

— Eu resolvo minhas paradas, Tony.

Você sabe disso — comentou em voz baixa.

— Vamos embora, Ned. Eu conheço sua

reação. Vai se dar mal aqui. Vamos

procurar outro local, caramba!

— E aí, garoto! Seu amigo cuida de sua

vida para você? — provocou o xerife,

acendendo um cigarro e jogando a fumaça

para o alto, na direção de Ned.

Tony percebeu que Ned estava sendo

provocado. Só seu amigo não via isso.

— Está bem, xerife! Está bem —

concordou Ned, pondo a garrafa e o copo

sobre a mesa.

Retirou todo o seu dinheiro e o colocou

de lado, demonstrando que tinha cacife para

jogar.

— Muito bom! Vamos ver como se saí

com as cartas — falou o homem da lei,

dando-lhe o baralho para cortar.

Tony fechou os olhos. Sabia o que Ned ia

fazer.

Page 34: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

Tony fora criado num prostíbulo, cercado

por trapaceiros de toda a espécie. Com os

jogadores havia aprendido a arte de

trapacear. Com os pistoleiros, a de atirar e,

com as mulheres, a de amar.

Ensinara algumas coisa a Ned. Entre elas,

a arte de mexer no baralho, de encadear as

cartas, deixando o jogo armado e propício.

No desenrolar da disputa que se travava

na mesa, Ned ganhava sempre que punha a

mão no baralho, fosse para cortá-lo ou para

dar as cartas.

De uma forma ou de outra, usando toda a

sua habilidade, ele conseguia boas mãos,

que lhe rendiam um punhado de dólares ao

final.

Quatro jogadores avançaram noite a

dentro. O xerife era o mais tranqüilo deles,

não se importava quando perdia, sempre

que Ned ganhava.

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O xerife ganhava as mãos que carteava

ou cortava. Apenas ele e Ned pareciam

conhecer o segredo daquele baralho.

Por fim, os dois homens foram

depenados, tendo Ned e o xerife ganho todo

o dinheiro deles.

— Bem, acho que só sobramos nós,

garoto — disse o xerife, coma r satisfeito.

— Ned, é hora de parar. Você ganhou

uns duzentos dólares aí, não abuse da sorte

— recomendou Tony.

— Está é a minha noite, Tony. Eu sinto a

sorte me favorecendo. Posso ganhar os

quatrocentos dólares que preciso para me

casar com Mary Lee. Não vou parar.

— É assim que se fala, garoto! Só que vai

ser um jogo até o fim, até que um de nós

fique sem dinheiro, está bem?

O xerife riu, divertido com a piada.

— Vamos jogar lá dentro. É mais

sossegado e estaremos livres de

aborrecimentos. Além disso, poderá

experimentar também a cerveja que só eu

bebo — disse o xerife, levantando-se.

Havia feito um sinal para dois de seus

auxiliares, que se adiantaram e foram para a

sala dos fundos.

— Ned, é loucura! — insistiu Tony.

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— Não se preocupe, amigo! Vou sair

daqui rico, pode estar certo disso —

afirmou Ned.

Os dois foram na direção apontada pelo

xerife. Tony entrou primeiro na sala. O

xerife depois. Ned foi o último. Assim que

entrou, um dos auxiliares do xerife aplicou-

lhe um murro na nuca, jogando-o no

assoalho.

Tony levou a mão ao Colt, mas um dos

auxiliares já apontava uma espingarda de

cano duplo na sua direção.

— Fique quietinho ou espalho seus

miolos naquela parede — disse o auxiliar.

— Por que isso? — indagou Ned,

aturdido, pondo-se de joelhos, ainda sem

entender o que houvera.

— Apenas um mal entendido, filho —

disse o homem da lei, inclinando-se sobre

Ned, como se fosse ajudá-lo a se levantar.

Ao invés disso, seu punho bateu

pesadamente no queixo do rapaz, jogando-o

para trás, na madeira do assoalho.

— Maldito! — rugiu Tony, avançando

contra o xerife.

O auxiliar atrás dele bateu-lhe nos rins

com a coronha da espingarda. Tony sentiu

que o ar havia sido sugado daquele lugar.

Page 37: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

Seis joelhos se dobraram contra a sua

vontade. Nova coronhada atingiu o

músculo, entre o pescoço e o ombro,

fazendo-o gemer e imobilizar o braço

direito.

O xerife não deu tréguas para Ned.

Chutou-lhe as costelas com o bico de sua

boca.

O rapaz gemeu, rolando no assoalho,

tentando se safar dos golpes, até ver-se

encurralado contra a parede.

O homem da lei chutou-lhe o estômago,

depois o rosto, que se cobriu de sangue.

— Pare! Vai matá-lo! — conseguiu gritar

Tony, ainda sem fôlego e sem pernas para

se levantar.

O xerife respirou fundo e se afastou,

enquanto Ned procurava, com esforço, se

sentar, com as costas apoiadas na parede.

— O que eu fiz? — indagou, a boca

babando sangue.

O xerife apanhou um copo de cerveja que

um dos auxiliares deixara sobre a mesa de

jogo. Bebeu um gole, depois se voltou e

atirou o copo contra o corpo de Ned, que

gemeu de novo com o impacto.

— Bastardo! Idiota! Quem pensa que é?

— gritou o xerife irritado.

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— O que eu fiz? — balbuciou Ned de

novo.

Tony se arrastava pelo assoalho, na

direção do amigo.

O xerife chutou-o para o lado e foi

agarrar Ned pelos colarinhos, erguendo-o

contra a parede.

Bateu com o corpo dele algumas vezes

contra a madeira.

— Quem pensa que é para vir na minha

cidade, no meu saloon, trapacear? E da

forma como trapaceou? Felizmente eles

estavam de olho em mim, por isso você

pôde roubar à vontade. Enganou aqueles

trouxas, mas não a mim. Passe-me todo o

dinheiro agora — ordenou o homem da lei.

— Setenta dólares me pertence, e...

— Acabam de ser confiscado para

pagamento de multa por desacato — cortou-

o o xerife, tomando-lhe todas as notas que

trazia nos bolsos.

Jogou-o no assoalho. Levantou Tony em

seguida e fez o mesmo, deixando-os sem

dinheiro.

As armas já lhes haviam sido tiradas.

— Levem os dois para a cadeia e

apliquem neles um pouco do corretivo de

Powder River. Depois ponham-nos sobre

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seus cavalos e os expulsem da cidade —

ordenou o homem da lei.

Os auxiliares agarraram os dois rapazes

pelo pescoço e os levaram, pelos fundos, até

a cadeia, alguns metros abaixo do saloon.

Lá os dois foram amarrados contra as

grades da cela. Suas camisas foram tiradas.

Os auxiliares estalaram sua chibatas.

Os estreitos chicotes de ponta fina,

flexíveis ao extremo, quando bem usados,

deixavam marcas para toda a vida.

Os auxiliares provaram que sabiam usá-

los. As costas dos dois rapazes foram

transformadas em carne viva.

Quando terminaram a surra, jogaram-nos

na cela. Um balde de água fria e salgada foi

atirada sobre as costas deles.

— Vamos deixar seus couros curtirem

um pouco, depois viremos para levá-los

para fora da cidade — disse um deles.

— Certo! Vamos tomar a última cerveja

da noite — propôs o outro.

Os dois saíram, deixando os dois rapazes

arrasados no fundo da cela.

As costas ardiam, além do efeito das

pancadas que haviam levado na sala dos

fundos do saloon.

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— Maldita hora em que fui lhe ensinar

aqueles truques com o baralho, Ned! —

murmurou Tony, sentindo os músculos das

costas se repuxarem, de tanta dor.

— Eu estava indo bem, não? — ironizou

Ned, agarrando-se às grades para se erguer.

Conseguiu ficar em pé. O sangue escorria

de seu rosto e de suas costas.

— Malditos! Juro como vão me pagar por

isso, Ned. Eu juro. Não sou um animal para

ser tratado assim. Se eu visse um homem

espancando um animal como eles fizeram

conosco, Tony, eu o mataria. É isso que eles

merecem — falou ele, com dificuldade,

cuspindo sangue a todo momento.

— Se nós sairmos vivos daqui já será

uma grande coisa, Ned.

— Ficaram com nosso dinheiro...

— E com nossas armas também...

— Malditos! Mil vezes malditos!

Ficaram em silencio por alguns instantes,

ofegantes e doloridos.

Depois tentaram se mover e cada

movimento resultava num gemido de dor.

Ouviram conversa lá fora e o barulho de

cavalos.

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Os dois auxiliares entraram e pareciam

muito satisfeitos, após o último drinque da

noite.

— Tirem as botas e os cinturões —

ordenou um deles.

— Por que isso? — indagou Ned.

— Para onde vão não precisarão delas.

Nem dos cavalos nem das armas —

explicou o homem, rindo com satisfação.

— Não podem fazer isso — argumentou

Tony.

— Não só podemos como vamos fazer —

disse o outro, apanhando o chicote

novamente. — Façam o que nós dissemos

— gritou.

Os dois rapazes não tiveram alternativa.

Primeiro deixaram cair os cinturões. Depois

se sentaram, com dificuldade, para tirar as

botas.

Cada um deles trazia uma faca escondida

ali. Ao retirarem as botas, puseram as facas

dentro das meias.

— Querem as meias também? — indagou

Ned, com ironia.

— Não, isso aí está cheio de pulgas e

piolhos — disse um dos homens, abrindo a

cela.

Apontaram suas espingardas para os dois.

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— Vamos saindo. Os cavalos estão lá

fora. Vamos dar um passeio, garotos —

explicou um dos auxiliares e os dois riram

com satisfação.

Quando Ned e Tony passaram por eles,

foram novamente golpeados nos rins pelas

coronhas das espingardas.

Gemeram, caindo de joelhos no assoalho.

— Isso foi apenas para vocês não

pensarem em bancar os espertinhos — riu

um dos auxiliares.

— Vamos andando. Não temos a noite

toda — falou o outro, empurrando-os.

Os dois rapazes deixaram a cadeia. Lá

fora seus cavalos os esperavam. Nas selas,

ao invés dos rifles, havia uma pá em cada

uma.

— Vão precisar fazer um pequeno buraco

rapazes, mas será coisa breve — disse um

deles.

— Imagino o que seja — comentou

Tony, montando.

Ned fez o mesmo. O grupo desceu a rua

principal, passou diante do saloon, diante do

qual estava o xerife, fumando sorridente.

— Voltem sempre que puderem, rapazes

— falou, acenando cinicamente.

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— Eu voltarei! Prometo! — respondeu-

lhe Ned e seu tom de voz era cheio de

rancor.

— Mortos não voltam jamais —

argumentou um dos auxiliares, cutucando as

costelas de Ned com o cano da espingarda,

fazendo-o gemer e se curvar na sela.

— Sempre em frente! — ordenou o

outro.

Os dois rapazes cavalgaram na frente,

seguindo pela estrada. Já não havia mais

movimento. Pela posição da lua no céu, a

madrugada ia pela metade e o sol não

demoraria a surgir.

— Para onde vão nos levar? — quis saber

Ned, sentindo que o frescor da madrugada

reanimava seu corpo dolorido.

— Não interessa! Vá cavalgando. Nunca

vi ninguém com tanta pressa de morrer —

respondeu um deles.

Cavalgaram por meia hora, até passarem

perto de um riacho.

— Entrem ali! — apontou um deles, com

o cano da arma.

Deixaram a estrada e entraram por uma

trilha que foi dar às margens do riacho.

— Vejam como sou bonzinho. Estou até

facilitando as coisas para vocês. Verão

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como será fácil cavar nesta terra mole —

comentou o auxiliar.

— Somos muito gratos por isso —

respondeu Ned, desmontando do lado

aposto do cavalo, de forma que seu animal

ficasse entre ele e os auxiliares do xerife.

Tony fez o mesmo. Quando puderam,

retiraram as facas das meias e as

esconderam no cinto, por debaixo da

camisa.

— Peguem as pás e comecem a cavar —

ordenaram.

— Onde? — quis saber Ned.

— Onde quiser, diabos! É você que vai

ficar aí mesmo.

Ned enfiou a pá na terra úmida e

levantou, atirando-a para o lado. Tony o

imitou.

Na segunda vez, Ned jogou a pá para o

lado e se inclinou sobre o buraco quer mal

começara a ser aberto.

— Que diabos! Tem ouro nesta terra? —

indagou, fingindo surpresa.

— Mas... É ouro mesmo, Ned! — ajuntou

Tony.

— Que história é essa de ouro? —

apressou-se em perguntar um dos auxiliares,

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jogando seu cavalo sobre os dois rapazes,

que se afastaram.

Os dois homens saltaram dos animais

para examinar o local. Ned deu um tapa no

chapéu do mais próximo, segurou-o pelos

cabelos e pôs a faca em sua garganta.

— Que pena! Não é ouro! — brincou ele.

Tony havia feito o mesmo com o outro

auxiliar.

— Ajoelhem-se! — ordenou Ned.

— Por favor! Não nos mate! —

choramingou um deles.

Ned chutou a costela do seu prisioneiro,

fazendo-o cair de joelhos, soluçando.

— Vamos amarrá-los e deixá-los, Ned —

sugeriu Tony.

Ned respirou fundo. Seu corpo todo doía.

Suas costas estavam lanhadas. A camisa se

colava ao sangue coagulado e cada

movimento provocava dor.

Fora tratado pior que um animal. Sentira-

se um lixo nas mãos daqueles homens,

como se sua vida não valesse um níquel.

Um verme teria tido mais compaixão.

— Meu amigo tem coração mole... —

começou a dizer.

— Obrigado, senhor! — apressou-se em

dizer o homem que Ned segurava.

Page 46: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Mas eu não! — completou o rapaz e

sua faca deslizou de orelha a orelha do seu

prisioneiro que, a principio, não entendeu o

que tinha acontecido.

Ned continuou segurando sua cabeça

pelos cabelos. Ele apenas balançou o tronco

de um lado para outro, numa dança

grotesca, até imobilizar-se.

— O que fez, Ned? — indagou Tony,

horrorizado com o gesto do amigo.

Ned não respondeu. Voltou-se para o

homem que Tony mantinha imobilizado e

encostou a faca em sua barriga.

— Levante-se! — ordenou Ned.

O outro o obedeceu imediatamente.

Tremia. Não conseguia segurar os

intestinos. O mal cheiro provocou uma

careta em Ned.

— Covarde! — murmurou o rapaz. —

Solte o cinturão! — ordenou.

O outro o atendeu. Tony recuou alguns

passos, observando passivamente o que

acontecia.

Aquele não era o amigo dele. Não era o

homem que ele conhecia. O homem a sua

frente era um desesperado do pior tipo.

— Ned, deixe-o ir embora! — pediu

Tony.

Page 47: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Não! Ele viu o que fiz. Além disso,

matei um homem ontem à noite porque ele

fez mal a uma rês. Este aqui me tratou pior

que a um animal. Não merece a minha

compaixão.

— Ned... — ia insistir Tony.

— Por Deus, não! — suplicou o auxiliar,

antes de compreender que o que tocava seu

peito não era mais a ponta da faca, mas a

guarda que separava a lamina do cabo.

Abaixou a cabeça e ficou olhando a faca

toda enterrada em seu peito.

A mancha de sangue começou a se

alastrar. Ele levantou a cabeça para Ned.

Seus olhos estavam baços e sem vida.

Ned torceu o cabo da faca para um lado e

depois para o outro. O homem a sua frente

vomitou sangue, caindo de joelhos.

O rapaz pôs seu pé dele e o empurrou

para trás, retirando a faca, que ficou

gotejando sangue.

O auxiliar ficou olhando para a lua,

enquanto seus olhos iam pouco a pouco

perdendo o brilho, até se fecharem, num

espasmo mais forte.

— Ned! Você ficou louco? — indagou

Tony.

Page 48: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Não, Tony. Você ainda não me viu

louco. Vai ver só quando eu pegar aquele

xerife — falou o rapaz, começando a retirar

o cinturão do cadáver a sua frente.

Os dois rapazes haviam lavado as roupas

manchadas de sangue e banhado seus

corpos feridos.

Tony havia conseguido conter a fúria de

Ned, que acabou concordando em pensar

melhor.

Na realidade, Ned estava apenas fazendo

planos. Nada lhe tiraria o gosto da vingança.

Fizeram uma fogueira para secar as

roupas. Armaram-se com os revolveres e

com as espingardas tiradas dos auxiliares,

cujos corpos eles haviam atirado na água e

empurrado rio abaixo.

— Sorte sua que o xerife não encontrou o

anel, Tony — disse Ned.

— É a única coisa que temos agora.

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— Encontrei alguns dólares nos bolsos

deles, mas nada comparado ao que o xerife

nos tomou.

— Por mim eu me dou por satisfeito —

comentou Tony, aliviado. — Estou vivo e

isso me basta.

— Viver não é tudo, Tony.

— Como não?

— Quando lhe tiram o emprego, os

sonhos, a esperança, o amor, seu dinheiro,

sua dignidade, então o que resta? Que vida é

essa? — indagou Ned, com amargura.

— Calma lá, parceiros! Não fale assim!

Temos cavalos, temos armas e munição e

temos o anel. Podemos ir para qualquer

parte do Oeste.

— Não vou para onde me empurram,

Tony! Nunca! Aprendi a ir apenas para

onde quero ir.

— Os tempos não são fáceis, amigo.

Muita coisa mudou.

— Não para mim.

Uma voz embriagada cortou a noite. Um

cavaleiro vinha pela estrada, cantarolando

alguma coisa.

Ned apanhou o Colt e apenas de ceroulas

correu na direção da estrada.

Page 50: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

Tony, sem ter como detê-lo, armou-se e

correu no encalço dele.

— O que é? — indagou Ned, de tocaia à

beira da estrada.

Uma charrete vinha na direção da cidade.

Junto ao bêbado que cantava estava um

pistoleiro. A cavalo, atrás deles, outro

pistoleiro.

— Estamos com sorte. Deve ser um

comprador de gado ou de terras. Deve estar

cheio do dinheiro — falou Ned, impaciente.

— O que pensa fazer? — surpreendeu-se

Tony.

— Vou pegar a minha parte neste butim

— falou Ned. — Parem! — ordenou, sem

se levantar.

Os pistoleiros imediatamente sacaram

suas armas, sem localizar, porém, quem os

interpelava.

— Quem está aí? — indagou o bêbado na

charrete.

— De onde estão vindo? — quis saber

Ned.

— Do rancho de Mama Dallas, onde

estão as mulheres mais bonitas do

Wyoming — respondeu o homem na

charrete. — O que querem? Se procuram

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diversão, é só seguir pela estrada. Quando

ver luzes e ouvir música, é lá!

— Soltem as armas. Isto é um assalto! —

ordenou Ned, abaixando-se.

No momento seguinte, os pistoleiros

atiraram a esmo na direção deles. As balas

assobiaram ao redor dos dois.

O cavalo que puxava a charrete disparou,

derrubando o pistoleiro e o passageiro na

poeira.

Isso deixou livre o primeiro alvo. Ned

apertou o gatilho e o chapéu do homem a

cavalo voou para o alto, enquanto o

cavaleiro caía para trás, sem a parte de cima

da cabeça.

O pistoleiro no chão procurou sua arma

no meio da poeira. Ned disparou contra as

costas dele, jogando-o de boca na terra.

O bêbado se levantou, cambaleando, com

as mão para cima.

— Não me mate! Não me mate! —

repetia.

— Cadê o dinheiro? — quis saber Ned,

revistando-o.

Sentiu, sob a camisa do outro, a cinta

contendo dinheiro. Rasgou-lhe a camisa e

puxou o cinturão, cheio de repartições, onde

estavam maços de notas.

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— Rapaz! O que é isto? — surpreendeu-

se Ned.

— Por favor, é todo o meu dinheiro! Vou

comprar gado... Não podem ficar com isso...

— Comprar gado? Verdade? E quanto

está pagando por cabeça? — perguntou-lhe

Ned, com desprezo.

— Estou esperando ainda... O preço vai

baixar... — comentou o outro, assustado.

— E quando vai começar a comprar?

— Quando chegar a cinco dólares...

— Cinco dólares? Você ouviu isso,

Tony? Cinco dólares por cabeça! Este

maldito aqui não sabe o trabalho que dá

criar uma rês, mantê-la no pasto, livrá-lo

dos pumas, perseguí-las nos

despenhadeiros. Maldito homem do Leste,

explorador e aproveitador! — exclamou

Ned e antes que Tony pudesse fazer alguma

coisa, enfiou o cano no Colt na boca do

prisioneiro e apertou o gatilho.

Sangue e miolos espiraram longe. Tony

ficou estático, sem poder acreditar.

— Não... Não é possível! Ned, o que está

havendo com você, demônios? — indagou

sem saber o que fazer.

— Estou pegando a minha parte.

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— Está agindo como um desesperado,

homem. Não percebeu isso?

— Que seja, Tony! Mas sou um

desesperado que tem dinheiro — falou Ned,

dando de ombros e voltando para a beira do

rio.

Começou a abrir os maços de notas e a

contá-los.

— Tony, há uns vinte cinco mil dólares

aqui... Diabos, rapaz! Isto é muito dinheiro!

É todo o dinheiro do mundo! —

surpreendeu-se Ned, olhando aos eu redor.

Tony vestia rapidamente suas roupas.

— O que pensa que vai fazer? — indagou

Ned, erguendo-se. — Há muito dinheiro

aqui, Tony. O bastante para comprarmos

um rancho, para eu me casar, para fazermos

tudo que desejarmos.

— Com a lei em nosso calcanhares? —

devolveu Tony, começando a selar seu

cavalo.

— E quem saberá que fomos nós? Há

tantos desesperados nas estradas, poderia

ser qualquer um.

— Aquele xerife de Powder River não é

nenhum idiota. Quando der pela falta dos

seus auxiliares, vai começar a ligar as

coisas. Tem uma boa descrição nossa e

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poderá vir em nosso encalço. O que vamos

fazer? Nos escondermos no Buraco no

Muro como os outros desesperados?

— Não, tonto! Nós temos nosso próprio

esconderijo, já se esqueceu? Podemos ir

para a Toca do Rato.

— Vá você, Ned! Eu vou embora daqui.

— Espere, não pode ir. Tem sua parte no

dinheiro e...

— Fique com tudo. É dinheiro sujo e não

quero.

— Pensei que fosse meu amigo, Tony.

— Eu era amigo de um sujeito chamado

Ned, que queria se casar com uma garota

chamada Mary Lee e ter um rancho. Acho

que esse cara morreu em algum lugar do

caminho e eu não vi. Você tomou o lugar,

foi isso.

Ned engoliu seco, abaixando a cabeça.

— É uma coisa muito dura para se dizer

para um amigo, Tony.

— Eu sei e lamento, Ned. Você fez

coisas ontem e hoje que eu jamais suspeitei

que faria. Parece que matar está no seu

sangue. Você adora isso. Você muda,

transfigura-se, torna-se selvagem e

incontrolável. Não dará certo, Ned. Adeus!

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— despediu-se Tony, já montado, olhando o

amigo pela última vez.

— Para onde vai, afinal?

— Para o Leste! — afirmou Tony,

esporeando seu cavalo e se afastando dali.

Ned ficou imóvel, vendo-o sumir na

direção da estrada. O galope do cavalo foi

se perdendo na distancia. Uma sensação de

solidão terrível se abateu sobre ele.

Havia encontrado uma garrafa de uísque

no alforje de um dos auxiliares.

Abriu-a e bebeu um gole, fazendo uma

careta. Olhou os maços de notas perto da

fogueira.

Sentou-se e começou a juntá-los e a

guardá-los no cinturão com divisões.

Vestiu suas roupas e selou o cavalo. Em

breve amanheceria. Tinha dois rumos a

tomar. Afastar-se de Powder River e ir para

Cásper, ao encontro de Mary Lee e de um

futuro tranqüilo ou ir acertar suas contas

com aquele maldito homem da lei.

Pensou por instantes. Um sorriso

provocador desenhou-se em seu rosto.

— E por que não fazer as duas coisas? —

indagou-se.

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O xerife Blackhat Bill bocejou e

começou a contar os maços de notas a sua

frente, enquanto bebericava um resto de sua

cerveja.

Os últimos bêbados já haviam sido

expulsos do saloon. As garotas haviam feito

suas escolhas e dormiam com seus

acompanhantes no andar superior.

O barman fechara a porta e passara a

féria para o xerife, despedindo-se.

Faltava só somar o dinheiro e levá-lo para

casa para guardá-lo com o resto.

Estava se dando muito bem. Com aqueles

homens do Leste andando de um lado para

outro, além dos vasqueiros com dinheiro no

bolso, após os acertos de contas, estava

fazendo um bom pé-de-meia.

Sabia que aquilo não ia durar para

sempre, mas, enquanto durasse, iria

aproveitar.

Logo poderia comprar um rancho inteiro

e esperar pelas chuvas para explorá-lo.

Aquele tempo ruim não iria durar para

sempre.

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Nem aquela maré de sorte.

— Boa féria, xerife? — indagou Ned,

parado atrás dele.

Blackhat se voltou como um raio, a mão

descendo à procura da arma.

A coronha da espingarda de Ned desceu

com força sobre o cotovelo do homem da

lei.

Ouviu-se um estalo. Blackhat segurou o

braço e olhou. Uma lasca de osso

ensangüentada surgia de um rasgo na

manga do seu paletó.

Levantou os olhos para Ned. O rapaz

havia apanhado o chapéu preto, da abas

retas, e posto na cabeça. Servira-lhe

perfeitamente.

Blackhat abriu a boca para dizer alguma

coisa, mas não chegou a pronunciar uma

palavra.

Ned bateu-lhe com um cano da

espingarda, fazendo-o cuspir pedaços de

dentes.

— maldito! — gemeu o homem da lei,

caindo para o lado, sobre o braço

machucado.

O sangue gotejava da manga do paletó e

escorria de sua boca como uma bala

gosmenta.

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Ele olhou Ned com pavor nos olhos.

— Gostei do cinturão — falou o rapaz.

— Solte-o — ordenou, apontando a

espingarda para a cara do outro.

O xerife se apressou em obedecê-lo. O

cinturão negro, com um Colt de cabo de

madrepérola caiu pesadamente no assoalho.

— Empurre-o com o pé! — ordenou o

rapaz, sendo atendido.

Não pegou a arma. Ficou olhando para o

xerife.

— Não me parece grande coisa agora,

seu bastardo, aborto da natureza! —

exclamou.

— Não me mate! Você tem que

entender...

— Você é que tem que entender que um

homem não é animal, seu imundo! —

cortou-o Ned, enfiando o cano da arma no

estômago dele.

O xerife se sobrou para frente. A coronha

da espingarda bateu-lhe no alto da cabeça,

jogando-o de boca na madeira.

— E mesmo que fosse, ainda assim

merecia respeito! — frisou o rapaz,

ajoelhando-se diante do xerife.

— Piedade! — suplicou o ferido.

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— Sim, vou ter a piedade que se tem com

um animal ferido — disse Ned, segurando o

xerife pelos cabelos e erguendo sua cabeça.

Pôs o cano da espingarda na boca dele.

Apertou os dois gatilhos. Recolheu o

dinheiro da mesa, apanhou o cinturão e saiu

rapidamente pelos fundos.

Seis meses depois, numa taverna junto ao

Rio Potomac, em Washington, um homem

barbado comia avidamente um prato de

feijão com molho mexicano e uma fatia de

pão amanhecido.

Estava faminto, pois comia

desesperadamente, como se aquele fosse

sua última refeição.

Era assim que Tony se sentia, após sua

primeira semana em Washington.

Chegara de trem, numa tarde de outono,

fria demais para ele. Seu dinheiro ainda

dava para alguma coisa.

Tinha vindo aos poucos. Após vender o

anel e o cavalo, conseguiu seguir um trecho

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da viagem, até sua cidade natal, Kansas

City.

Ali conseguira fazer alguns trabalhos,

como pistoleiro de homens do Leste, até

juntar o suficiente para seguir em frente.

Mal chegou à cidade, no entanto, fora

roubado. Todo o seu dinheiro simplesmente

sumiu de seus bolsos, na estação.

Havia sido depenado como um pato

ingênuo. A partir daquele primeiro dia na

cidade, apenas sofreu, passando fome,

dormindo ao relento e sendo enxotado como

um cão.

Aquela pocilga, nas docas do Rio

Potomac, era sua única saída para matar sua

fome de alguns dias.

Quando terminou, sentiu que ainda

poderia comer mais uns quatro ou cinco

pratos daqueles.

O dono da taverna se aproximou.

— Meio dólar! — disse, recolhendo o

prato.

— Não tenho dinheiro, mas posso lhe

fazer uma proposta. Dou-lhe esta arma —

disse ele, tirando o cinturão e o pondo sobre

a mesa. — É um Colt praticamente novo. Se

me voltar cinco dólares...

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A resposta veio na forma de um murro

que atingiu sua testa, jogando-o para trás.

Assim que caiu, dois guarda-costas do

cantineiro surgiram e o agrediram a

pontapés.

Ele ficou no chão gemendo, enquanto o

homem examinava a arma.

— É uma bela arma. Já matou alguém

com ela?

Tony, sem fôlego, rastejou até a parede,

lutando contra a ânsia de Vômito que

ameaçava desperdiçar sua única refeição

decente, desde que chagara à cidade.

— Eu não sei... — respondeu ele,

tomando fôlego.

Tudo girava ao seu redor. Ele tapou a

boca com a mão. Não podia vomitar, não

depois de ter comido daquela forma.

— Acho que vou aceitar sua oferta,

cowboy. Fica a arma e o cinturão pela

refeição.

— Mas a arma e o cinturão valem pelo

menos dez dólares...

— Para quem? Para você? Não vendo

armas, por isso nada valem para mim.

— Devolvam-me a arma, por favor! Eu

prometo que voltarei para pagar-lhe a

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refeição — pediu o rapaz, erguendo-se, com

as costas apoiadas na parede.

— Nada feito. Não me venha com

historias agora. Se eu fosse trocar comida

por promessas, seria um homem morto

agora. Vamos, dê o fora! — ordenou o

taberneiro, pondo o cinturão no quadril e

admirando-se.

— Maldito trapaceiro! — rugiu Tony,

avançando contra ele.

Seu punho atingiu em cheio o queixo do

outro, derrubando-o para trás.

Antes que pudesse continuar seu ataque,

foi seguro por trás pelos dois capangas.

O taberneiro se ergueu, esfregando o

queixo.

— É esquentado, não? Pois tenho um

bom remédio para isso. Rapazes, joguem-no

no rio. A água fria fará com que esfrie seu

ânimo.

Debatendo-se, Tony foi arrastado para

fora da taverna e levado até a beira da água.

Chutaram-no para dentro do rio.

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A água fria rapidamente o reanimou, mas

Tony teve de se manter na água, pois os

capangas caminharam pelas docas,

observando-o durante algum tempo.

Começou a se congelar na água, quando

os dois homens pararam, finalmente,

conversaram por instantes, apontando na

direção de um outro, que vinha

caminhando, aparentemente embriagado.

Pela atitude dos dois, Tony concluiu que

iriam assaltar o pobre transeunte. Sentiu-se

grato por isso, pois pôde nadar para a

margem e sair. Pensou em se afastar

rapidamente. Afinal, naquela noite não

morreria de fome. Só se fosse de frio.

Parou, no entanto, pensando no homem

que, ainda que sem querer, salvara sua vida.

Retornou. Os dois capangas do taberneiro

seguiam o homem, que vestia

elegantemente e portava uma bengala.

Os dois foram se aproximando, até

emparelharem com o incauto. Empurraram-

no, então, contra uma parede.

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— Passe a carteira! — disse um dos

bandidos, com uma navalha posta na

garganta do almofadinha.

Inesperadamente, a bengala subiu por

entre as pernas do agressor, atingindo seus

testículos.

Ele urrou de dor, mas seu companheiro

estava atento. Bateu no alto do chapéu coco

do homem contra a parede, fazendo-o cair

de joelhos.

Chutou-lhe, então, o rosto, fazendo sua

cabeça bater contra a madeira atrás dela.

— Maldito! Vou cortar-lhe os ovos! —

rugiu o capanga que havia sido atingido,

avançando contra o homem caído.

Tony veio com tudo. Saltou no ar e o

salto de sua bota cravou-se no rosto do

homem com a navalha, que girou o corpo

para o lado e desferiu um golpe, cortando a

perna do rapaz.

Ambos caíram nas pedras das docas. O

segundo bandido avançou sobre Tony, que

não sentira o golpe na perna.

— Calma aí, amigo! — disse o

almofadinha, enfiando a bengala entre os

pés e torcendo.

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O homem desabou como um fardo,

batendo a cabeça na pedra. Tony havia se

erguido.

— Vou matá-lo! — rugiu o malfeitor,

brandindo a navalha, cuja lamina rebrilhou

diante dos olhos do rapaz.

Ele chutou com força o braço do seu

oponente. A lamina desapareceu no ar.

Naquele momento, ele pensou em Ned,

em sua fúria que, quando desencadeada,

tornava-se incontrolável.

Depois de tudo que passara nos últimos

tempos, sentia-se o mais desesperado de

todos os desesperados.

Sua bota bateu firme contra o rosto do

bandido, derrubando-o. Chutou-o, então, até

ouvir os ossos da costelas estalarem.

— Calma, assim você vai matá-lo —

alertou o almofadinha, tentando contê-lo.

— Este amaldiçoado bem que merecia —

rugiu Tony, segurando o bandido pelos

colarinhos e fazendo-o engatilhar até a beira

do rio.

Chutou-lhe o traseiro, jogando-o na água.

O outro, antes que Tony fizesse alguma

coisa, correu e se atirou na água, nadando

para longe.

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— É muito valente, amigo! Salvou-me a

vida! Sou Jeff Bowie, às suas ordens!

— Tony Kansas! — respondeu o rapaz,

apertando a mão do outro.

— Tony Kansas? Nome original!

— Não me peça para contar a historia do

meu nome. É muito aborrecida — falou o

rapaz, olhando para baixo.

As luzes embaçadas dos lampiões se

refletiam no sangue que escorria de sua

perna.

Ele estranhou aquilo e se afastou um

passo. O sangue gotejando deixou uma

trilha bem marcada.

— Você se feriu? — indagou Jeff.

Tony levantou a barra da calça. Um talho

enorme vertia sangue em sua perna.

— Diabos! Aquele bastardo me cortou!

— exclamou o rapaz, examinando melhor o

estrago.

— Deixe-me ajudá-lo — prontificou-se

Jeff, ajoelhando-se diante dele.

Tirou a echarpe do pescoço e, com ela,

amarrou a perna, tentando estancar o

sangue.

O tecido branco de seda tingiu-se

lentamente de vermelho.

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— Acho que o melhor será levá-lo ao

hospital — disse o almofadinha.

— Estou bem...

— Nada disso. Você foi ferido e eu me

sinto na obrigação de ajudá-lo. Vamos

cuidar disso. Depois eu lhe arrumo roupas

secas e uma bebida para aquecer. Falando

nisso, como foi que se molhou dessa forma?

Tony lhe contou o que acontecera.

— E sua arma ficou lá?

— Sim, não tive escolha.

— A arma de um homem é sua mais cara

propriedade. Vamos lá recuperá-la.

— Você me empresta meio dólar?

— Claro, aqui está — disse o outro,

entregando-lhe uma moeda.

Foram até a taverna. Quando Tony

avançou na direção do taberneiro, este fez

menção de apanhar uma arma atrás do

balcão.

Jeff, no entanto, abriu seu paletó e

mostrou o cabo de sua arma, fazendo um

sinal negativo com a cabeça.

— Aqui está seu meio dólar. Devolva-me

a arma.

O taberneiro viu naquilo a chance de

lucrar.

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— Você disse que a arma e o cinturão

valiam pelo menos dez dólares.

Tony estendeu os braços e o agarrou

pelos colarinhos, puxando-o por cima do

balcão.

O taberneiro trouxe, em sua mão, um

cassetete. O golpe endereçado à cabeça de

Tony, no entanto, foi o rapaz soltou-o,

quando metade de seu corpo já havia

ultrapassado o balcão.

— Maldição! — berrou o comerciante,

caindo de boca no assoalho.

Quando se virou, Tony pesou-lhe no

pulso que segurava o cassetete, obrigando-o

a soltá-lo. Apanhou a arma e bateu com ela

na testa do outro.

Um filete de sangue começou a escorrer

do meio dos cabelos dele.

— Trato feito! — disse o homem,

cruzando os braços diante do rosto.

Tony o soltou e foi espiar atrás do balcão.

Seu cinturão estava lá. apanhou-o e o

afivelou no quadril.

— Não o vi usando uma arma —

observou Tony, quando caminhavam lá fora

já.

— Uso um coldre sob o braço. É mais

prático — mostrou ele.

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— Estranho. Não é difícil para sacar?

— Não, quando se acostuma. Além disso,

quando você tem de correr atrás de alguém,

ele fica mais firme e não atrapalha tanto

quanto os coldres comuns.

— Correr atrás de alguém? Por quê?

— Força da profissão.

— O que você é, um policial?

— Mais ou menos...

— Mais ou menos como?

— Sou uma espécie de Delegado Federal,

com jurisdição em todos os territórios

americanos, do Atlântico ao Pacífico.

— Puxa! Isto é ser importante, não?

— Alguns o consideram! — afirmou Jeff,

com orgulho.

Tony foi levado a um hospital, onde sua

perna foi costurada e um curativo foi

aplicado.

— Terá de voltar amanhã para vermos

isso de novo — determinou o médico.

— Diabos! Como farei isso? — reclamou

Tony.

— Por que diz isso? — quis saber Jeff.

— Por nada — respondeu o rapaz,

mostrando constrangimento.

— Já sei, não tem onde ficar, não é?

— É, já que mencionou o fato...

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— Pois ficará comigo. Tenho uma casa

aqui perto e moro sozinho, com uma criada

que mantém tudo limpo e cozinha a melhor

comida na região do Potomac.

Tony não se sentia na condição de rejeitar

uma oferta como aquela.

— Está bem, mas quando o médico me

der alta, eu vou embora — decidiu ele.

— Para mim tudo bem — concordou

Jeff, examinando-o com o canto dos olhos.

No local onde trabalhava necessitavam de

homens como Tony, decididos, bons nos

punhos e nas armas, curtidos pelo sol do

Oeste.

Para domesticar aquela região feroz,

apenas homens como ele, que a conheciam.

Para Jeff, não havia dúvidas de que Tony

era de lá. Seu modo de se vestir, o jeito de

falar, a pele queimada, tudo indicava isso.

Só que havia percebido que o rapaz era

muito arredio. Iria devagar com ele.

Afinal, era reconhecido por ser muito

convincente em seu trabalho.

— De que região você é do Oeste? —

indagou Jeff, enquanto caminhavam por

uma rua tranqüila, num bairro residencial da

cidade.

— Wyoming.

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— Norte, Sul, que lado?

— Sul, na região de Cásper.

— Cásper? — surpreendeu-se Jeff. —

Saiu de lá há muito tempo?

— Por quê? — indagou, desconfiado.

— Aquela região tem estado em pé de

guerra desde uns seis meses para cá.

— Saí de lá antes disso, quando

começaram os leilões de gado. Meu patrão

foi um dos primeiros a vender.

— Uma pena. Foi um período difícil,

cujos reflexos se estendem até hoje. As

terras foram compradas por pura

especulação. Estão paradas. Não há venda,

não há produção. Com o inverno se

aproximando, o caos será maior ainda.

Estão comprando comida a preço de ouro

por lá. isto quem pode pagar, porque quem

não pode está indo embora ou se mudando.

Tony se manteve em silencio. Pensou em

Ned e na loucura daquela noite.

Era algo que queria esquecer. Fugira de

lá justamente por isso. Jamais voltaria

àquele lugar.

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The Blackhat Bunch ou quadrilha do

Chapéu Preto era temida e procurada na

região que ia de Douglas, a Leste de Cásper,

até Powder River, onde ela começara sua

onda de crimes que já se estendia por mais

de seis meses.

Na terra devastada e explorada, a

quadrilha encontrara abrigo e proteção junto

à população, que via nos homens do Leste

os coiotes que devoravam os despojos

daquela terra.

Os assaltos eram dirigidos apenas aos

almofadinhas e aproveitadores. Nenhum

cidadão ou cidadã havia sido roubado. Eram

sempre postos de lado e não passavam pelos

vexames a que os outros eram submetidos.

Tudo começara em Powder River,

quando o xerife Blackhat Bill fora morto,

em seu saloon, ao amanhecer.

Seu chapéu preto e seu coldre da mesma

cor haviam sido roubados pelos seus

assassinos.

Outros roubos foram realizados. Um

homem com um chapéu preto, de abas retas

e um cinturão negro estava sempre presente.

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Com o tempo, os outros passaram

também a usar o mesmo tipo de chapéu e de

cinturão, confundindo-se num só homem.

Nos ranchos, nos poucos que haviam

resistido à invasão dos ladrões do leste,

chapéu pretos eram afixados no alto dos

celeiros, indicando que, ali, os quadrilheiros

encontrariam proteção.

A lei tentou se aproveitar disso,

preparando armadilhas para os membros da

quadrilha.

O resultado foi que os celeiros eram

incendiados, bem como a fazenda e o que

havia de plantação ainda.

Os xerifes das cidades da região se viram

impotentes para conter a onda de crime.

Agentes da Pinkerton chegaram a circular

pela região, mas não lograram resultados.

Comentavam, agora, que os governo

mandaria Delegados Federais, os melhores,

para combater a quadrilha.

Ninguém julgava que eles conseguiriam,

principalmente os homens que ocupavam

uma cantina na estrada entre Clenrock e

Blate, a mesma que levava de Douglas a

Cásper.

Page 74: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Dizem que eles levam as armas sob os

braços — comentou um dos homens no

balcão, bebendo uísque.

— Sabem por que? — indagou Ned, no

centro de todos eles.

— Não, não sei! — respondeu um.

— Por quê, Ned? — quis saber outro.

— Porque as armas deles têm cheiro de

morte — explicou o rapaz, mas ninguém

entendeu a piada.

Ele riu sozinho, olhando as caras de

idiotas de seus parceiros.

— Vocês não têm senso de humor —

reclamou ele, terminando seu uísque.

Bateu o copo no balcão. O taberneiro se

apressou em servir. Um homem surgiu na

janela da taverna.

— Ned, a diligência vem aí — avisou.

— Muito bem, rapazes! Vamos depenar

esses patos — avisou ele.

Um ritual acontecia ali dentro. Os

homens tiraram lanços pretos de seus bolsos

e amarraram diante no rosto, cobrindo do

nariz para baixo.

Puseram chapéus pretos. Ajuntaram

cinturões pretos nos quadris e ficaram a

postos.

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A diligência parou, envolvida num

nuvem de poeira.

— Muito bem, pessoal! Concedo cinco

minutos para vocês esticarem as pernas,

enquanto trocamos os cavalos — gritou o

cocheiro.

Quando saltou da diligencia, um vulto

surgiu no meio da poeira com uma

Winchester na mão e o golpeou na cabeça.

A mesma sorte teve o guarda, quando

saltou do outro lado. Quando a poeira

assentou, os passageiros, que haviam

começado a descer, viram uma fileira de

dez homens diante deles, apontando armas.

Todos usavam chapéu, lenço e cinturão

pretos.

— A Quadrilha do Chapéu Preto! —

exclamou em uníssono todos eles.

Ned começou a rir, seguido pelos seus

homens. Em toda parte, em todos os

assaltos, a reação era a mesma.

— Como vão, senhores e senhoras? —

cumprimentou ele.

Com o tempo, havia se acostumado a

diferenciar os homens e mulheres da região

dos abutres do Leste.

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Naquela diligencia, por exemplo, havia

um casal de velhos da região, com dois

netos.

Um homem gordo, de casaca e corrente

de ouro prendendo o relógio e cara de

aproveitador.

Pela suas silhueta, Ned podia adivinhar o

tamanho do cinturão de dinheiro que ele

trazia oculto na barriga.

— Você — apontou ele. — Tire a roupa.

— Mas... — gaguejou o outro.

Ned enterrou-lhe o cano de Seul Colt na

barriga e puxou o cão do gatilho para trás.

— Mata ele, moço! O tempo todo ele

veio falando como esta região é miserável e

não prestava para nada — disse a velhinha,

indignada.

— Verdade? — indagou Ned, olhando o

homem do Leste nos olhos.

— Não... Por favor... Eu estava

brincando...

Não chegou a terminar. A bala atravessou

sua barriga, jogou sangue na porta da

diligencia e foi se encravar no assento

empoeirado.

A velhinha olhou para Ned e sorriu

agradecida.

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A carruagem parou nos fundos do

imponente prédio do Congresso americano,

conhecido como Capitólio.

Para Tony, ter percorrido aquelas ruas

famosas e cheirando a Historia fora algo

deslumbrante.

Nada ficava a dever às narrativas que

ouvia atentamente quando era garoto, no

prostíbulo onde fora criado.

— Aqui se reúnem os nomes mais

importantes do país — disse Jeff,

conduzindo o deslumbrado rapaz pela

escadaria, até a entrada.

— O que estamos fazendo aqui? —

indagou Tony, desconfiado.

Jeff havia feito muitas perguntas sobre a

região de Cásper, como que testando-o

sobre o assunto.

Depois falara em oferecer-lhe um

emprego, mas não explicara a natureza

desse emprego.

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— Você não queria conhecer o

congresso? — retrucou Jeff, sem lhe dar

muita atenção.

Penetraram numa ampla sala, com teto

totalmente decorado e olhas de arte nas

paredes.

O piso era feito de blocos alterados,

construindo um desenho intricado, mas cujo

resultado final era belíssimo.

Jeff empurrou Tony para uma sala de um

dos corredores que saíam do salão de

entrada.

Um homem barbudo, atrás de uma

escrivaninha, levantou-se e sorriu ao

reconhecer Jeff.

— Jeff, seu bastardo, como vai? —

indagou, cumprimentando-o efusivamente.

— Muito bem, senador. Espero que o frio

de ontem à noite não tenha afetado sua gota

— respondeu ele.

— Eu já nem ligo. Depois que conheci o

uísque do Kentucky, nada mais se

incomoda. Mas o que o traz aqui?

— Senador, este é Tony Kansas, chegado

há pouco tempo do oeste. É da região de

Cásper. Conhece toda aquela região.

— Verdade? — indagou o homem,

voltando-se para o rapaz.

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— Jeff exagera.. Fui vaqueiro por lá...

— Sabe usar uma arma?

— Sim, sei.

— E está disposto a aceitar o cargo?

Jeff pigarreou, chamando a atenção do

senador.

— Na verdade, não adiantei nada ao

Tony, senador.

— Então sentem-se, vamos conversar.

— A que cargo está se referindo? — quis

saber Tony.

— No seu devido tempo, meu rapaz. No

seu devido tempo — acalmou-o o político.

Se não ainda, meu nome é Lane Sheridan e

sou senador do Wyoming no congresso dos

Estados Unidos.

— Já ouvi falar a seu respeito, senador —

comentou o rapaz.

— Espero que tenha ouvido só boas

coisas — riu o senador. — Mas estou

preocupado com nosso estado, Tony,

principalmente com a região de Cásper.

— É o bando de Sundance Kid? —

indagou o rapaz.

— Esse é um dos problemas, só que

Sundance Kid e seus homens são mais

refinados. Não que não sejam um problema.

São e dos grandes. O que está

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incomodando, realmente, pela violência

gratuita, pelo crueldade e pela

desumanidade de suas ações é o bando do

Chapéu preto.

— Bando do Chapéu Preto? — estranhou

Tony, tentando imaginar quem seriam eles.

— Começaram a agir na primavera deste

ano, no auge da crise do gado. Limitam-se a

assaltar e matar homens e mulheres do

Leste, compradores, negociantes, seja lá o

que for, desde que seja do Leste.

— E por que o nome?

— Deve ter ouvido falar de Blackhat Bill,

o xerife de Powder River — falou o

senador.

Tony esfriou por dentro, engolindo seco.

Ainda conservava nas costas as cicatrizes

daquela noite.

— Eu o conheci pessoalmente e posso lhe

dizer que não era muito amistoso. Tenho a

lembrança dele em minhas costas.

— Como assim?

— O xerife tinha métodos pouco

ortodoxos de reabilitação de presos —

explicou Jeff.

— Não sei o que Jeff quis dizer com isso,

mas Blackhat Bill costumava chicotear os

presos, depois de tomar-lhe todos os

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pertencer. Finalizava mandando expulsá-los

da cidade, só que os pobres coitados eram

levados para fora da cidade e abrigados a

cavar a própria sepultura. Isto eu sei porque

passei pela experiência e consegui sair com

vida — contou Tony.

— Fantástico! Você conheceu mesmo

tudo por lá — comentou o senador.

— Não me digam agora que Blackhat

mudou de lado e formou uma quadrilha —

disse Tony.

— Não, pelo contrário. Blackhat mudou

foi de posição. Da vertical foi para a

horizontal. Descansa em Boot Hill, a Colina

dos Pés Juntos em Powder River. Foi morto

naquela primavera. O assassino lavou seu

chapéu preto e seu cinturão. Desde então,

essa tem sido a marca registrada da

quadrilha, por isso o nome.

Tony ficou pensando em Ned, mas não

poderia ter sido ele. Estava com muito

dinheiro, não precisava ter voltado a

Powder River só para matar o xerife.

Depois, pensando melhor e se lembrando

daquela noite fatídica, acho que sim, que

Ned teria sido bem capaz de ter feito aquela

proeza.

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— Um sem número de pessoas já foram

mortas naquela região, Tony. Os outros

congressistas têm me pressionado, exigindo

providencias. Falaram em mandar a

cavalaria para a região, mas isso seria o

caos, com o povo à beira da revolta após

toda a crise econômica e a perda do gado e

das terras. Preciso de um agente, um agente

dos bons, que conheça, a região e tenha

amigos por lá para me ajudar a desbaratar

essa maldita quadrilha. O que me diz? —

finalizou o senador.

Tony olhou para ele e depois para Jeff.

— Não, de forma alguma. Eu prometi a

mim mesmo que jamais voltaria àquele

lugar, senador. Nada deixei lá, senão os

melhores anos de minha vida. Vi a miséria e

o desespero tomando conta daquelas terras,

antes tão férteis e verdes. Não quero

estragar ainda mais a boa lembrança que

ainda tenho de lá.

— Tony, o vento que soprou na

primavera não acabou apenas com os

pastos. Fez nascer uma erva daninha das

piores, que se alastra sobre aquela terra e

vai acabar por levá-la ao caos. Muitas vidas

poderão ser poupadas...

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— Vidas de gente do Leste, que não

conhece nem ama aquela terra...

— Tony, o Leste sempre foi o ponto de

partida para a construção deste país. Não

podemos nos esquecer disto. O que teria

acontecido àquela gente se não surgissem

homens do Leste para comprarem o gado,

ainda que a preço aviltante? As reses teriam

morrido nos pastos e isso teria sido em

frigoríficos e podem retornar à própria

região para alimentar o povo faminto.

Percebeu a injustiça que essa quadrilha está

cometendo?

Tony não respondeu. Ficou pensando no

que o senador dissera. Tinha sua lógica,

vista de longe agora e após todo aquele

tempo. Mesmo assim, era difícil imaginar-

se voltando para lá.

— Por que a lei não consegue apanhar

essa quadrilha? — indagou ao senador.

— São esperto e contam com a proteção

de todos os moradores de lá. Além disso,

possuem um esconderijo que ninguém sabe

ainda onde é...

— O Buraco no Muro?

— Não, dizem que mais inexpugnável

que o Buraco no Muro, mas mais

apropriado para um esconderijo. Boa água,

Page 84: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

pasto, plantações, cabanas abrigadas do

vento e da chuva, uma verdadeira fortaleza.

Conhece, ao menos, algum lugar assim por

lá?

Pensou consigo mesmo. O senador falava

de algo parecido com a Toca do Rato.

— Há muitos lugares assim por lá,

senador. Muitos mesmo — descartou ele.

— Senador, fale do pagamento —

sugeriu Jeff, percebendo que seria difícil

convencer Tony usando argumentos como a

preocupação com a lei e a ordem ou com a

vida de gente do Leste.

— Bem, Tony! Não sei qual é a sua

intenção, mas Washington é uma cidade

cara para se viver. Já tem um lugar para

ficar?

— Ele está em minha casa, por enquanto

— explicou Jeff.

— Mas sairei logo, conforme combinado

— falou Tony.

— Já tem um emprego ou coisa assim?

— Não...

— Um capital para mantê-lo, então?

— Não...

— Um parente ou alguém para mantê-lo,

eu suponho?

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— Também não. Na verdade, senador, só

tenho a roupa do corpo e, mesmo assim, foi

dado por Jeff. Pretendo arrumar um

emprego e...

O senador riu, então ironicamente, mas

com naturalidade da ingenuidade do rapaz.

— Em Washington você só tem duas

alternativas ou trabalha para o governo ou

está condenado a morrer de fome. Estou lhe

oferecendo a chance de trabalhar para o

governo. Quando terminar este trabalho,

virá para cá e eu cuidarei para que tenha um

emprego definitivo e um bom lugar para

morar, com um salário compensador. Para

isso, no entanto, você terá de nos ajudar a

limpar aquela região...

— Não sou um homem da lei...

— Será, assim que decidir. Receberá

treinamento...

— Treinamento? Como assim?

— Homens especializados lhe ensinarão

tudo que deverá saber como um delgado

especial. Terá autonomia em seus atos e

poder decisório ilimitado. O congresso lhe

dará um documento especial, autorizando-o

a praticar todo e qualquer ato necessário à

eliminação da Quadrilha do chapéu Preto.

— O que nos diz, Tony? — indagou Jeff.

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O rapaz pensava. E se fosse Ned o líder

da quadrilha? Como enfrentar o amigo?

Poderia ter de matá-lo.

Mas teria Ned chegado mesmo àquele

ponto? Seu desespero poderia ter atingido

tamanho grau? Estaria beirando a

insanidade?

Respirou fundo. Era uma decisão

importante. Voltaria ao Wyoming, mas

desta vez pela última vez. Após isso, seu

sonho de viver no Leste se concretizaria.

Era a decisão mais importante de sua

vida.

No inicio do inverno, quando as chuvas

torrenciais começaram a cair, anunciando os

rigores do frio, um homem a cavalo entrou

em Cásper.

Vestia um pesado sobretudo impermeável

e usava um chapéu branco, de abas retas e

copa achatada.

Pela aparência, deveria ter cavalgado de

Douglas até lá, sob a chuva fria.

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Enquanto percorria a rua principal, seus

olhos percebiam o estranho contraste na

cidade.

Muita coisa mudara por ali,

principalmente a moda. Chapéus pretos de

todos os tipos eram a tônica.

Os homens sentados nos alpendres

cobertos em frente das lojas usavam chapéu

pretos e acompanhavam, com olhar

desconfiado, aquele forasteiro.

— Tem cara de delgado — comentou um

deles.

— Só falta usar a arma sob o braço, para

se ter certeza — acrescentou outro.

Tony Kansas não ouvia as conversas.

Apenas o bater da chuva no chapéu e o

barulho das patas do cavalo entrando e

saindo da lama da rua.

Viu o saloon, que já conhecia de outros

tempos. Nada mudara em sua fachada.

Parou em frente, desceu e amarrou o

cavalo. Subiu para o alpendre coberto,

diante do estabelecimento.

Homens de chapéu preto, que estavam

sentados em bancos ao lado da porta, se

levantaram, encarando-o.

Tony limpou os pés, retirando a lama das

botas. Depois tirou o casaco, deixando a

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mostra um cinturão duplo, onde reluziam

dois Colts sem coronhas de madrepérola.

Sem se incomodar com os observadores,

ele entrou. Pendurou o chapéu e o casaco no

cabide da entrada, depois caminhou até o

balcão, fazendo tinir suas esporas no

assoalho.

— Um uísque — pediu ele, esfregando as

mãos.

— De onde vem? — indagou o barman.

— De um lugar onde barman apenas

serve bebida e não se mete na vida dos

outros — respondeu Tony, olhando-o nos

olhos.

Alguém, em alguma das mesas, riu

divertido. O barman ficou furioso. Tony

olhou pelo espelho a sua frente. Homens

com chapéu pretos pontilhavam as mesas

atrás dele.

— Como é? Vai servir ou não? —

insistiu Tony, demonstrando irritação.

O barman olhou-o bem. Depois olhou

para alguém numa das mesas, esperando,

talvez, um sinal de aprovação ou alguma

ajuda.

Tony levantou os olhos para o espelho de

novo. Um homem de chapéu preto se

levantou e caminhou na direção deles.

Page 89: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

O rapaz se voltou para encará-lo.

— Está com algum problema, amigo? —

indagou o homem de chapéu preto.

— Você é padre, pastor, médico ou o

quê? — retrucou Tony, sem se intimidar.

— Por que pergunta isso?

— Porque você está se oferecendo para

fazer caridade. Xerife não é, pois não vejo

nenhuma estrela. Sendo assim, deixe-me

resolver meu problema aqui com o barman

— falou Tony, virando-lhe as costas.

O saloon riu, deixando o homem furioso.

Ele pôs a mão no ombro de Tony.

— Não vire as costas quando eu estiver

falando com você — disse, furioso,

obrigando-o a se virar.

Só que Tony se voltou atacando. Sua mão

foi de encontro ao queixo de seu oponente,

que estalou, fazendo-o gemer.

Somente aquele golpe teria sido

suficiente para dar uma lição no

intrometido.

Tony havia aprendido, no entanto, o

conceito de neutralizar. Nos treinamentos a

que foi submetido, neutralizar era deixar seu

oponente sem condições de reagir.

Sem nenhuma mesmo. O homem a sua

frente usava a arma no lado direito. Tony

Page 90: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

agarrou a mão dele e firmou seus dedos

sobre o dedo indicador do outro.

Um estalido seco e o homem gemeu de

dor, com o indicador quebrado. Aquele

dedo não apertaria nenhum gatilho.

O homem recuou um passo. Tony

chutou-lhe o joelho esquerda violentamente,

derrubando-o no assoalho.

Estava neutralizando, arrastando-se na

madeira. O rapaz se voltou para o barman,

enquanto todo o saloon ficava em silencio.

— Agora, amigo, a respeito daquele

uísque...

O barman se apressou em servi-lo.

— Beba, forasteiro! É seu último uísque

— disse um homem, entrando pela porta

vaivém do saloon.

Tony entornou o copo, depois se virou

sem pressa. Um homem, jovem ainda,

usando chapéu e cinturão pretos, o

observava do outro lado do salão.

— Quem disse isso? — indagou Tony.

— Eu! — respondeu o homem parado na

porta.

— Cidade interessante esta onde

jumentos falam — comentou Tony.

— Vai gostar de saber que cadáveres

também falam aqui.

Page 91: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Pode provar isso?

— Você está falando e você é um homem

morto.

O saloon estava no mais profundo

silencio, esperando o mais mortal dos

duelos.

O forasteiro não conhecia o homem a sua

frente. Estava perdido.

— Quem disse isso?

— Eu, Ned Sinclair.

— Ouvi dizer que é o maior bastardo ao

sul do Wyoming.

— Prove isso, maldito!

— Saque primeiro, seu bastardo! —

provocou Tony, à espera de um movimento

do outro.

O reencontro dos dois amigos, após todos

aqueles meses, foi emocionante.

A encenação inicial serviu apenas para

fazer com que todos no saloon rissem,

Page 92: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

quando os dois se aproximaram um do outro

e se abraçaram.

— Seu bastardo! — disse Ned.

— Filho de uma cadela! — devolveu

Tony, enquanto Ned o empurrava na

direção do balcão.

— Do melhor para nós — ordenou Ned e

uma garrafa de uísque foi posta sobre o

balcão, junto com dois copos.

Ned serviu para os dois. Saudaram um ao

outro e beberam do melhor uísque do

saloon. Ned voltou a encher os copos.

Beberam de novo.

— Vamos com calma, amigo! — pediu

Tony, na terceira vez.

— Você ficou velho e fraco, Tony — riu

Ned, tomando o terceiro copo, depois o

quarto e o quinto.

Só então, olhando o amigo com atenção.

— Quem diria? Meu velho parceiro,

Tony Kansas! — comentou ele, batendo no

ombro do amigo.

— Ned, seu paspalho! Você não mudou

nada. Só esse chapéu preto é novo em você.

— E você não devia andar por aí com um

chapéu branco desses que esta usando —

alertou Ned.

— E por que não?

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— Pode ser confundido com gente do

Leste. E continuamos não gostando de gente

do Leste como antes — afirmou Ned, em

voz alta, olhando aos eu redor.

Os outros levantaram os chapéu,

concordando com ele.

— Viu só? É unânime — ressaltou,

voltando a encher os copos.

Tomou sua dose, sem se importar se

Tony estava ou não bebendo.

Voltou a encher o seu copo.

— O tem feito? Por onde andou?

— Fui para Kansas City. Acabei ama-

seca de um bando de gente do Leste.

— Sério? Pois não diga isso a ninguém

daqui. Será seu fim.

— Era isso ou morrer de fome, Ned. Eu

não tive escolha.

— Tudo bem, o que passou, passou.

Você voltou e aqui você não passará fome.

Vai trabalhar comigo.

— Com você? O que anda fazendo?

— Tenho um rancho.

— Está brincando? — disse Tony, com

receio de perguntar como Ned o havia

conseguido comprar.

Sabia que fora com o dinheiro daquele

assalto, havia mais de seis meses atrás.

Page 94: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— E tem mais: estou casado! — declarou

Ned, com orgulho.

— Mary Lee? — quis saber Tony,

desconfiado.

— Ela mesma!

— Seu filho da mãe sortudo! Conseguiu,

afinal. Eu tinha certeza que ela gostava mais

de mim do que de você.

— Fanfarrão! Pois foi comigo que ela se

casou. Você deveria ter estado aqui para ser

o padrinho. Foi lindo, Tony! Lindo mesmo!

— exclamou Tony, demonstrando emoção

nos olhos marejados de lágrimas.

Fungou disfarçadamente, enquanto servia

mais uma dose. A garrafa já chagava pela

metade.

Ned jamais bebera daquela forma.

Externamente poderia não ter mudado nada.

Interiormente estava diferente, muito

diferente do velho Ned, quando o

conhecera.

As outras pessoas, nas mesas, bebiam e

conversavam. Não pareciam ter grandes

preocupações para uma cidade que deveria

estar em crise.

Ao invés disso, a bebida corria solta.

Alguns fumavam caríssimos charutos.

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Outros exibiam relógios de ouro, presos

com correntes, também de ouro, nos coletes.

Ned parecia o dono do mundo. Ria e

conversava. Todos pareciam respeitá-lo.

Aquele chapéu ridículo era o mesmo que

Blackhat Bill usava naquela noite.

— Beba mais um pouco! — ordenou

Ned, empurrando o copo na direção de

Tony.

Ele entornou toda a dose. Era um

excelente uísque, mas não justificava a

maneira como Ned voltava a encher

compulsivamente os copos.

— Não foi difícil casar com ela, Tony...

Não foi mesmo — afirmou Ned, agora já

demonstrando alteração pela bebida.

Começava a falar enrolado, pensando

antes de falar, como se encontrasse

dificuldade para concatenar os

pensamentos.

— Quando o pai ela viu o meu dinheiro,

Tony, ele me entregou Mary Lee numa

bandeja! Mudou totalmente o modo de

pensar a meu respeito. Então comprei o

rancho. Hoje ele nem quer saber de onde

vem o sustento. Só lhe importa que não lhe

falte o necessário. É um homem

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amargurado também. Pena, Tony! — falou

Ned, silenciando em seguida.

Ficou parado, olhando para os bicos das

botas, oscilando levemente o tronco. A mão

apertava o copo vazio.

— E Mary Lee, onde está? — indagou

Tony.

— No rancho... No meu rancho... Sabe

que devo aquele rancho a você? Metade

dele poderia ser sua — afirmou Ned,

levantando a cabeça e encarando o amigo.

— Não, Ned, ele é todo seu. Você o

conquistou. Você teve coragem para tomar

suas próprias decisões e fazer o seu destino.

Mereceu isso.

Ned começou a rir. Serviu outro copo e

bebeu, limpando a boca com a manga da

camisa.

— O que foi? — quis saber Tony.

Ned se inclinou para falar-lhe baixinho

ao ouvido.

— Você precisava ver a cara daquele

maldito quando me viu.

— De quem está falando?

— Blackhat Bill! Meti-lhe a espingarda

na boca e espalhei seu maldito cérebro por

toda a parede.

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Nesse momento, um grupo de homens

entrou no saloon. Dois almofadinhas,

respingados de lama e chuva, esfregaram os

pés no assoalho para limpá-los.

Atrás deles entraram cinco pistoleiros,

gente da pior espécie, com espingardas

mexicanas nas mãos, as temíveis escopetas,

de coronha e cano curto, devastadoras a

curta distância.

Ned estremeceu. Seus olhos se injetaram

e toda a sua fisionomia se alterou.

O grupo se aproximou do balcão. Ned

olhou para o pessoal das mesas e estes

fizeram um tipo de sinal de aprovação.

— Dê-nos um litro de seu melhor uísque

— ordenou um dos almofadinhas.

— Acabou! — respondeu Ned, sem olhar

para ele.

— Como disse!

— Acabou! — respondeu Ned, agora

alterando o tom.

Os pistoleiros se movimentaram no

saloon, espalhando-se, formando um leque

diante do balcão.

Tony percebeu isso. Ned parecia estar em

outro mundo.

Page 98: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Vamos embora — disse o outro

almofadinha. — Podemos beber em outro

lugar.

— E por que deveríamos? Estou vendo

no balcão uma garrafa de um bom uísque.

Por que não podemos bebê-lo?

— Por que eu disse que acabou —

respondeu Ned, ainda sem encará-lo.

Segurou a garrafa pelo gargalo e virou-a.

O uísque começou a ser derramado no

assoalho.

— Mas é muito abusado mesmo —

reclamou o almofadinha, partindo para cima

de Ned.

A garrafa estilhaçou-se em sua testa e o

sangue escorreu pelo seu rosto.

Tony percebeu as escopetas sendo

apontadas para eles. Estendeu o braço e

agarrou o segundo almofadinha, puxando-o

para frente de si e prendendo-o com uma

gravata.

Nesse ínterim já havia sacado uma das

armas e engatilhado. Ned fizera o mesmo,

quanto o almofadinha, sangrando, caía de

joelhos.

Os pistoleiros ficaram imóveis por

instantes. Depois desengatilharam as

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escopetas e as deixaram cair pesadamente

no assoalho.

Ergueram lentamente as mãos. Atrás de

deles, canos de armas haviam sido

enterrados em suas costelas.

— Por que fez isso? — indagou o

almofadinha, com a cara coberta de sangue,

levantando os olhos para Ned.

— Por que não gosto de você — explodiu

Ned, chutando-lhe o peito com violência.

Tony empurrou seu prisioneiro sobre o

outro, impedindo que Ned voltasse a agredir

o primeiro.

— Calma rapazes! — disse uma voz

áspera na porta do saloon. Era o xerife,

acompanhado de meia dúzia de auxiliares.

— O que está havendo aqui, Ned? —

indagou o homem da lei.

— Eles entraram no local errado, xerife.

O xerife se aproximou dos almofadinhas

que se levantavam, lambuzados de sangue.

— Eu os alertei, cavalheiros. Se querem

beber, vão ao Virgínia Saloon, mais abaixo.

— Este é um país livre. Temos o direito

de ir onde quisermos — insistiu o primeiro

almofadinha.

— Mas é muito arrogante mesmo —

rugiu Ned, partindo de novo para cima dele.

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Tony o segurou.

— Calma lá, amigo! Vamos nos

preocupar com outras coisas. Essa gente não

merece nossa preocupação.

O xerife fez um sinal para os visitantes,

ordenando-lhes que fossem embora.

Saíram, escoltados pelo homem da lei e

seus auxiliares.

— O mesmo esquentado de sempre —

comentou Tony.

— Eu os detesto. O xerife os avisou.

Acham que esses pistoleiros são proteção

suficientes para virem entrando aqui, como

se fosse deles. obrigado, rapazes! Uma dose

por minha conta!

Os outros festejaram e correram ao

balcão, onde o barman foi servindo um a

um.

Nova garrafa foi posta diante de Ned.

Ele encheu os dois copos.

— Vamos nos sentar, Ned — convidou

Tony. — Estou cansado da viagem —

argumentou, percebendo que o amigo já

estava tendo dificuldades para se manter em

pé.

Ned o atendeu. Sentaram-se. Ned bebeu

dois ou três copos seguidos. Olhou Tony.

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— Você vai trabalhar para mim...

Comigo! Seremos sócios. Meio a meio.

Devo isso a você.

— Não sei sem me habituaria de novo a

trabalhar num rancho, Ned — argumentou

Tony.

— Rancho? Quem falou em trabalhar em

um rancho? — divertiu-se Ned.

— E não é para isso que está me

convidando?

— Não, nada de trabalho duro. É trabalho

de professor...

— Professor? — riu Tony, sem entender.

— Sim... Trabalho de ensinar... Ensinar

as pessoas a aprenderem onde é o lugar

delas. É simples, Tony, qualquer um pode

fazer...

— Não estou entendendo, Ned...

— Entenderá! — afirmou Ned,

debruçando a cabeça sobre os braços, na

mesa. — Depois eu lhe explicarei tudo.

Agora só vou dar uma cochilada...

No momento seguinte já ressonava,

totalmente apagado. Tony olhou-o com

preocupação.

Foi até o balcão e perguntou ao barman

onde era o rancho que Ned havia comprado.

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— Lembra-se do rancho do velho Simon,

na estrada para Glenrock?

— Sim, claro. É esse?

— Esse mesmo.

— Conhece o cavalo dele?

— É um cavalo negro, com arreio negro e

enfeites de prata. Deve estar lá fora.

— Quanto lhe devemos?

— Nada — respondeu o barman.

— Nada? Como assim?

— O saloon pertence ao Ned.

— Ned é dono do saloon também?

— Ned é dono de muitas coisas por aqui.

Todos o respeitam e lhe devem favores. Se

não fosse ele, Cásper teria desaparecido,

transformada numa cidade-fantasma, na

época da seca.

— E como ele fez isso?

— Você é amigo dele?

— Sim.

— Então ele lhe dirá, se achar que você

deve saber — respondeu misteriosamente o

barman. — Ele fez algo por nós que não

tem preço: restitui-nos a dignidade. Temos

um resto de orgulho do que somos graças a

ele.

— Bem, só há uma coisa a fazer por ele

agora. Levá-lo para casa.

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— Quer ajuda?

— Não, eu me viro. Já fiz isso muitas

vezes por ele, quando éramos vaqueiros.

Retornou à mesa, ergueu Ned e o pôs nos

ombros, levando-o para fora. A chuva

continuava caindo, mansamente agora.

Atravessou o amigo sobre a sela.

— Não estou morto ainda — murmurou

Ned.

— Como?

— Ainda não morri. Enquanto estiver

vivo, jamais andarei atravessado em uma

sela.

— Então acomode-se como deseja —

disse Tony.

— Não consigo.

Tony riu e foi ajudá-lo a se acomodar na

sela. Ned cruzou as mãos diante do corpo,

ajeitando-se na sela, depois esporeou de

leve seu cavalo.

Ele trotou na direção da saída da cidade.

Tony o seguiu. Passaram diante do Virgínia

Saloon.

Os dois almofadinhas estavam lá, com as

roupas manchadas de sangue e os

pistoleiros portando as escopetas.

Do outro lado da rua, na cadeia, o xerife

observava tudo atentamente.

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Aquela cidade era um barril de pólvora

prestes a explodir. Quando isso acontecesse,

talvez não restasse muita coisa de Cásper

para contar historia.

Enquanto avançavam pela estrada, Tony

observava mais uma vez os campos.

Estava tudo abandonado. Não se via o

efeito da longa estiagem daquela primavera

e verão.

Com a chegada das chuvas, a vida

voltaria a circular em suas entranhas.

O inverno se encarregaria de incubar toda

aquela fertilidade que explodiria com a

chegada da próxima primavera.

Pensou no que observara no saloon. Todo

aquele desperdício e aquela ostentação não

era próprio de homens desesperados.

Nenhum deles parecia ter problemas de

dinheiro. No entanto, de onde vinha o

sustento deles?

Das terras abandonadas não era, disso ele

tinha certeza. Bastava olhar os campos.

Lembrou-se das palavras de Ned. Olhou-

o atentamente, um boneco se sustentando na

sela de uma cavalo.

Que orgulho ele poderia ter inspirado

naquela gente? Era o mesmo estourado de

sempre.

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De tudo aquilo, o que mais incomodava

Tony era ter de reconhecer a verdade, algo

que ele, quando aceitara aquela missão,

desejara não confirmar.

Se Ned matara Blackhat Bill, conforme

havia dito naquela noite, então ele poderia

ser o chefe da Quadrilha do Chapéu Preto.

Só isso explicaria a tranqüilidade

daqueles homens sem terra e sem emprego

no saloon.

A Mary Lee que esperava no alpendre

não era aquela garota radiante e bonita que

Tony conhecera.

Esta tinha o sofrimento refletido nos

olhos azuis e a preocupação vincando sua

testa.

Ao reconhecê-lo, ela esboçou um sorriso,

que se desfez rapidamente ao ver o estado

em que Ned se encontrava.

— Eu o levo para dentro — disse Tony,

tomando Ned em seus ombros.

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— Mary Lee.. Olhe só quem veio —

murmurou Ned, a voz enrolada e

ininteligível.

— Cale a boca e durma, Ned! Ela já me

reconheceu — disse Tony, levando-o para o

quarto onde Mary Lee os esperava.

Deitou-o, afinal. Por um momento Ned

abriu os olhos e sorriu para os dois. Depois

voltou a dormir.

Mary Lee o cobriu. Deixaram o quarto,

fechando a porta.

— Tenho bolinhos e café quentes. Venha

comigo! — convidou ela.

Tony observou que não havia nenhuma

criada na casa, o que contrastava com toda

aquela ostentação de Ned.

Se tinha dinheiro para comprar um

saloon, por que não havia criados ali? Nem

gente para trabalhar nos campos?

Enquanto Mary Lee se movia pela

cozinha, Tony a observava. Estava gravida.

A barriga já começava a dilatar-se. Sua

beleza, no entanto, em nada fora

prejudicada.

Tirando aquele ar de sofrimento, ainda

mantinha aquele mesmo fascínio de antes.

Ela sentiu os olhos dele sobre ela. serviu-

o. Sentou-se diante dele, na mesa. Olhou-a.

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— Tudo bem? — indagou ele.

— Sim, não poderia estar melhor — disse

ela, sem nenhum entusiasmo.

— Não me engana, Mary Lee. O que há,

afinal?

Os olhos dela se encheram de lágrimas.

Ela apertou os lábios, evitando soluçar.

— É o Ned, Tony. Não é o mesmo

homem que nós conhecíamos. Tornou-se

amargo... Bebe demais... Vive em constante

agitação... Desde que fiquei grávida ele me

evita... Sei que se diverte com as garotas do

saloon... Mantém-me isolada aqui... Às

vezes vem, no meio da noite, e me leva para

um esconderijo qualquer e me deixa lá...

— Não vi ninguém trabalhando nos

campos, nenhuma criada aqui, nenhum

vaqueiro ou gado lá fora. Como se mantém,

Mary Lee?

— Eu não sei, Tony. Perguntei uma vez e

Ned ficou maluco comigo. Só sei que ele

está sempre com muito dinheiro, Tony.

Todos na cidade devem para ele. Quer ver

uma coisa? — indagou ela, levantando-se

indo até a sala.

Parou diante da lareira, feita de blocos de

pedra retangulares.

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Moveu uma delas, retirando-a. Tony se

apressou em ajudá-la. Do buraco ela tirou

uma caixa de metal. Abriu-a.

— Não sei de onde vem tudo isso —

disse Mary Lee, mostrando jóias, relógios,

pulseiras, correntes, colares e toda sorte de

penduricalhos de ouro e pedras preciosas.

O pequeno tesouro parecia o butim de um

saqueador.

— Nem me atrevo a perguntar a ele de

onde está vindo isto. E há mais espalhado

em esconderijos pela casa.

Tony olhou para o meio da sala, onde

havia passado com Ned nos ombros.

O chapéu negro do amigo estava caído

ali. Foi lá e o apanhou.

— Não tem ao menos uma leve suspeita,

Mary Lee? — indagou ele, girando o

chapéu em sua mão.

Ela abaixou os olhos, constrangida,

retornando para a cozinha.

Tony foi ter com ela.

— Para quando é o bebê? — indagou ele,

sentando-se à mesa.

— Para daqui a cinco meses — disse ela,

enxugando disfarçadamente os olhos.

— O que ele diz de tudo isso?

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— Ned? Adorou saber que ia ser pai.

Depois ficou indiferente. Às vezes ele fica

olhando para a minha barriga por um longo

tempo e eu desejaria saber o que ele está

pensando, Tony. Ele mudou muito. Muito

mesmo.

— Também notei isso.

— E você? Por onde andou? O que tem

feito?

— Fugindo daqui, Mary Lee. Na verdade,

meu sonho é viver no Leste.

— Não comente isso por aqui. É muito

perigoso — avisou ela.

— Já percebi.

A chuva continuava caindo mansamente.

Um vento frio soprou, numa lufada lúgubre.

Tony levantou a cabeça. Seus ouvidos

treinados haviam captado um som diferente,

quebrando a harmonia própria do local.

— O que foi? — assustou-se Mary Lee.

— Fique aqui — ordenou ele, indo até a

porta da sala.

Cinco cavaleiros entravam nos limites da

casa, olhando ao redor cautelosamente, mas

seguindo sempre em frente, na direção do

alpendre, onde Tony já os esperava.

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Reconheceu-os logo. Eram os cinco

pistoleiros que estavam no saloon,

protegendo os almofadinhas.

Tony sabia que era encrenca pura.

Tinham vindo tirar satisfação e traziam em

suas mãos as temíveis escopetas.

Ned estava desmaiado de bêbado lá

dentro e não poderia ajudá-lo. A situação

estava crítica.

— O que querem? — indagou Tony,

tendo liberado os dois Colts, deixando-os

preparados para o saque.

Por mais rápido que fosse, no entanto, era

uma empreitada perdida. Bastaria um

disparo deles e seria cortado ao meio.

— Queremos falar com seu amigo —

respondeu um deles.

— Está lá dentro, tomando um café e não

quer ser interrompido — mentiu Tony,

tentando intimidá-los.

Os homens riram e os canos das

escopetas foram descendo lentamente, até

enquadrarem o corpo do rapaz.

— Mande-o sair ou entraremos buscá-lo

— insistiu o chefe do grupo.

— Eu não ousaria incomodá-lo. Vocês já

devem saber quem ele é — blefou o rapaz,

tentando a todo custo evitar um tiroteio.

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Mary Lee seria fatalmente morta, se os

pistoleiros conseguissem seu intento. De

forma alguma deixariam testemunhas.

Os cavaleiros, então, de repente,

moveram-se com inquietação.

Tony se voltou para observar o que os

havia incomodado. Viu apenas o chapéu e o

cano de um rifle mover-se junto à janela.

Não podia ser Ned. Estava Bêbado

demais para ter acordado. Imaginou, então,

que fosse Mary Lee, tentando enganá-los.

— Você aí dentro, saía. Precisamos falar-

lhe! — ordenou um dos pistoleiros.

Em resposta, o rifle foi engatilhado. As

escopetas se moveram na direção da janela.

— Não! — gritou Tony, ao perceber o

que aconteceria.

As armas explodiram ao mesmo tempo.

Buracos enormes se abriram na parede. O

chapéu preto voou para o alto.

Os pistoleiros descanhotaram as

escopetas para recarregá-las. Tony

percebera, pelos buracos na parede, o corpo

retalhado de Mary Lee.

Suas mãos desceram velozmente em

direção às armas, sacando-as.

Neutralizar os oponentes com um tiro,

este era o objetivo. Atirar com as duas mãos

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ao mesmo tempo, em alvos diferentes.

Disparar sem mirar, instintivamente.

Suas armas cuspiram fogo. A primeira

carga derrubou dois pistoleiros, cada um

com uma bala na testa.

Outros dois, assustados, deixaram cair os

cartuchos e se apavoraram.

Tiveram suas cabeças rachadas como

melões podres pelos poderosos projéteis

quarenta e cinco.

O quinto conseguira recarregar e

engatilhar. Tony se jogou para o lado,

vendo a língua de fogo cuspida pela

escopeta.

Os chumbos agrupados bateram na

parede, abrindo novo rombo.

O pistoleiro puxou as rédeas do cavalo,

empinando-o, atrapalhando a mira de Tony.

Ele atirou na coxa do cavaleiro, que girou

o cavalo e se abaixou sobre a sela.

Tony disparou de novo, pegando-o na

espinha. Ele ficou inerte sobre a sela do

cavalo, que saiu em disparada.

Uma angústia enorme invadiu o peito do

rapaz, sem coragem para entrar na casa e

constatar o terrível drama.

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Ouviu um barulho lá dentro. Foi até a

porta. Ned havia tropeçado no corpo de

Mary Lee e caído.

Atônito, sujo com o sangue dela, ele

tentava entender o que havia acontecido.

Nada restara intacto do corpo dela. Seu

rosto, seu corpo e até seus braços estavam

retalhados pelos terríveis disparos das

escopetas.

— Ei, Tony! Rapaz, estou tendo um

pesadelo horrível! Você não quer me

acordar, não? — indagou pateticamente.

— Ned... Ned... — tentou dizer alguma

coisa Tony, mas não conseguiu.

Explodiu num prato convulsivo. Ned se

levantou e foi até o que restara da janela.

Olhou os corpos lá fora, os buracos dos

disparos, depois o corpo da esposa.

— Tony! Eles mataram Mary Lee. Oh,

Deus! Não! — berrou ele, num grito

animalesco e prolongado.

Anoitecia. A chuva continuava. Tony

havia enterrado sozinho o corpo de Mary

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Lee, a pedido de Ned, que se trancara no

quarto desde então.

De volta à casa, Tony ficou olhando a

cruz que fincara na sepultura da garota,

numa colina perto dali. Ficando invisível no

meio da chuva e da escuridão que descia.

Tony lamentou ter voltado justo naquele

dia, justo para ser testemunha daquela

tragédia.

Os corpos dos pistoleiros jaziam na lama.

Seus cavalos estavam ali, no pátio, imóveis

na chuva.

Não sabia o que Ned faria. Se já era

estourado normalmente, o que diria numa

tragédia como aquelas?

Foi até um dos cadáveres e apanhou a

escopeta. Retirou do morto o cinturão de

cartuchos. Apanhou os outros também.

Voltou para o alpendre. Procurou um

lampião e o acendeu, pondo-o sobre a mesa

da cozinha. Começou a examinar e

selecionar os cartuchos que não se

estragado com a chuva.

Examinou a arma, limpando-a. Era uma

calibre doze, com uma coronha própria e

canos de dez polegadas.

Ouviu barulho no quarto. Levantou-se e

foi até a sala. A porta se abriu. Ned surgiu,

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vestido de negro, como um fantasma na

escuridão.

— Aqueles almofadinhas mataram Mary

Lee — disse Ned, adiantando-se para a luz.

Tinha os olhos vermelhos.

— Ned, o xerife cuidará disso. Eu

testemunharei.

— Tony, a cidade é minha, o xerife é

meu. O único antro que ainda não dominei é

o Virgínia Saloon e o hotel ao lado dele.

Sabe por quê?

— Não, Ned. Por que não me conta?

— Porque é preciso deixar uma via aberta

para achegada dos homens do Leste, com

seu dinheiro e sua arrogância. Mas foi um

erro. Eu devia ter expulsado todos daqui.

Dominado esta maldita cidade. Agora vou

consertar o que já deveria ter consertado

antes — falou Ned, enigmaticamente.

Tony se interpôs entre ele e a porta.

— Ned, precisamos conversar.

— O que há para falar, Tony?

— É sobre o que está havendo aqui, sobre

você, sobre esse maldito chapéu.

— Este chapéu comprou o respeito de

todo mundo, sabia?

— O termo perfeito é esse mesmo, Ned.

Comprou o respeito. E você terá respeito

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enquanto tiver dinheiro. Para isso, terá de

continuar matando e roubando. Até quando

vai conseguir isso?

— Muita gente me apoia. Você não sabe

o tamanho de minha quadrilha, Tony. Há

gente aqui na cidade e na Toca do Rato.

Você conhece o lugar.

— Você tem tanta gente com você e, no

entanto, quase foi morto ainda há pouco.

Veja o que aconteceu com Mary Lee...

— Nada aconteceu com Mary Lee, Tony.

Eu a levei à Toca do Rato. Lá ela estará

protegida. Lá nada acontecerá com ela.

— Ned, por favor, não vá!

Em resposta, Ned empurrou-o

delicadamente para o lado e passou por ele.

Saltou sobre seu cavalo.

— Diabos! — praguejou Tony, fazendo o

mesmo.

Galoparam juntos na escuridão cortada

por relâmpagos, que iluminavam as poças

de água da estrada.

— O que vai fazer, Ned?

— Vou queimar tudo aquilo.

— Não pode...

— Posso e vou fazê-lo. Devia ter feito

isso antes. Eles ficam indo e vindo, trazendo

pistoleiros, caçadores de recompensa...

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— Caçadores de recompensa?

— Sim, estão se tornando cada dia mais

freqüentes em Cásper e na região.

Tony pensou, então, nos dois

almofadinhas. Por que teriam insistido em

provocar Ned?

Por que mandaram os pistoleiros para o

rancho? Na certa sabiam que Ned não teria

proteção lá, exceto ele, Tony.

E se tudo aquilo fosse uma armadilha?

Ou matavam Ned no rancho ou o deixavam

tão furioso que ele correria para a cidade.

Estourado como era, sua reação seria

previsível.

— Ned, e se tudo isso for uma armadilha

para pegá-lo?

— Se quisessem me pegar de verdade,

teriam mandado mais gente para o rancho.

Apenas tentaram. São burros.

— Vai chamar ajuda?

— Não posso.

— Não pode? — surpreendeu-se Tony.

— Por quê?

— E o respeito? Sou uma lenda para eles,

Tony...

— Lenda, Ned? De que diabos está

falando?

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— Um homem esteve aqui... Um

jornalista. Escreveu uma porção de coisas

num papel. Disse que faria um livro a meu

respeito e que eu seria considerado uma

lenda, um tal de Robin do Oeste. Não sei o

que era esse sujeito, mas me soou muito

bem.

Tony não sabia se Ned estava falando

sério ou se ainda estava bêbado.

A verdade é que ele parecia disposto a

fazer o que disse que faria.

Quando chegaram à cidade, Ned foi

direto para a Virgínia Saloon.

Saltou do cavalo e entrou como um

furacão. Tony, com a escopeta em punho, o

seguiu.

Os dois almofadinhas estavam numa

mesa, a um canto do saloon. quando viram

Ned, levantaram-se, desabotoando os

paletós.

Os cabos de suas armas surgiram sob os

braços.

— Ninguém se mova ou vou espalhar

seus pedaços por todo o saloon — disse

Tony, engatilhando a arma.

— Não foi isso que Jeff e o senador lhe

pediram para fazer — falou um dos

almofadinhas.

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A testa de Ned se vincou com estranheza.

Ele se voltou para olhar na direção de Tony.

— O que ele está dizendo, Tony? —

indagou Ned, atônito, fitando o amigo.

Tony também nada entendia do que

estava acontecendo. Viu, porém, homens

surgindo no corredor, vindos do pavimento

superior.

Da sala dos fundos apareceram outros.

Junto à porta aglomeraram-se mais deles.

Todos armados. Ned se sentia como um

rato na ratoeira. Tony percebeu que havia

sido usado de alguma forma, embora não

entendesse ao certo o que fora.

— Diga a ele, Tony Kansas — falou o

almofadinha. — Diga a ele que o senador

do Wyoming e o Delegado Especial Jeff

Bowie o mandaram aqui para desbaratar a

Quadrilha do chapéu Preto.

— Quem são vocês? — quis saber Ned.

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— Somos a justiça para você — disse um

deles, tendo em suas mãos uma corda com

um nó de forca.

— Seus comparsas estão sendo mantidos

presos lá no saloon, Ned. Não virão ajudá-

lo. Por que não simplifica tudo soltando a

sua arma?

— Ninguém será desarmado aqui até que

eu saiba o que está acontecendo — disse

Tony, apontando a escopeta na direção dos

dois almofadinhas.

Era um gesto desesperado, na verdade,

com tantos outros armados ali.

— É simples, Tony. Eu e meu parceiro

viemos para ajudá-lo em sua missão...

— Que missão? — quis saber Ned.

— De desbaratar a Quadrilha do Chapéu

preto. Só não esperávamos que você fosse

tão amigo de Ned, como o demonstrou. Não

podíamos confiar em você. Supomos que

você jamais o trairia. Mas nos prestou um

favor, Tony, trazendo-o aqui. Todos os

amigos dele estão imobilizados lá no

saloon. Ninguém virá ajudá-lo desta vez,

Ned.

— Se sabia todo o tempo que ele era o

chefe da quadrilha, por que não o pegaram

antes? — intrigou-se Tony.

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— Porque ele estava sendo útil aos

interesses dos investidores do leste. A cada

novo assalto, a cada nova morte, o preço do

gado e das terras caía mais, permitindo a

compra de grandes lotes por verdadeiras

ninharias. Quando a primavera chegar e o

gado vier para os pastos, os lucros eram

inimagináveis. Quanto a você, Tony,

poderia ter tido tudo que combinou lá em

Washington mas, ao percebemos a amizade

de vocês, achamos melhor descartá-lo. Na

realidade, você só nos seria útil para uma

situação.

— E qual seria ela?

— A de nos levar à Toca do Rato, caso

Ned fosse para lá. Só isso, nada mais.

— Prometeram-me tanto? Fizeram-me

andar tanto para voltar aqui, só para isso?

— Política, meu amigo! — falou o

almofadinha, com ironia.

— Tony, você veio aqui para me trair? —

indagou-lhe Ned, incrédulo.

— Não, Ned! Acho que vim aqui para ser

traído — comentou Tony, abaixando a

arma.

— Não me pegarão vivo! — gritou Ned,

sacando sua arma.

Page 122: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Não, Ned! — gritou Tony, percebendo

a loucura de seu gesto.

— Queremos ele vivo — gritou alguém,

enquanto Ned escolhia seus alvos e ia

derrubando um por um.

Os homens tentaram se esconder, mas de

alguma forma Ned os atingia, matando-os

ou ferindo-os.

Tony decidiu ajudá-lo, apesar de

considerar aquilo uma loucura.

Alguém atingiu sua nuca com a coronha

de um revolver, derrubando-o.

Ned estava sem balas no revolver agora e

os homens caíram sobre ele, esmurrando-o e

chutando-o, jogando-o de um lado para

outro do assoalho.

— Não o matem! — gritou um dos

almofadinhas.

Tony conseguiu se erguer. Tinham lhe

tirado as armas. Ele correu para ajudar Ned.

Alguém estendeu a perna, derrubando-o.

Um outro veio e chutou-lhe a cabeça,

pondo-lhe um gosto de sangue na boca.

Uma bota pisou em seu pescoço.

— Fique quieto, imbecil, ou morrerá com

ele — alertou-o alguém.

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Ned foi posto em pé. Sangrava, com o

rosto transformado numa máscara de

sangue.

Seu chapéu havia sido chutado para outro

lado do balcão.

— Ned Sinclair, hoje nós, homens do

Leste, tomamos posse definitiva de Cásper e

de toda a região. Ela nos pertence. Você é

nada agora, entendeu? Nada! — falou um

dos presentes.

Uma corda foi amarrada nos tornozelos

de Ned. Puxaram-no, derrubando-o.

A ponta foi levada para fora do saloon e

entregou a um cavaleiro, que a enrolou no

arção da sela.

O cavalo foi esporeado. O corpo de Ned

foi arrastado pelo assoalho do saloon e

puxado para fora, indo cair na lama.

Em disparada, o cavaleiro foi até o fim da

rua principal, puxando o corpo do infeliz

bandoleiro.

Retornou, outra vez, em disparada. Ned

era lama e sangue, numa mistura macabra e

chocante.

— Ele é nosso! — gritavam os homens

do leste.

— Sim, vamos enforcá-lo!

— A corda! Tragam uma corda.

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Tony conseguira chegar até a rua, mas

fora seguro. Ned gemia, contorcendo-se na

lama.

Estava arrependido de ter vindo. Não

queria. Deveria ter ficado passando fome

em Washington a ter que presenciar aquilo.

Ned podia ser estourado, violento e cruel,

mas havia algo que ele detestava: ver um

animal ser maltrato.

Naquele momento, Ned não recebia o

mínimo de compaixão. Se o queriam morto,

que o fizessem de um modo digno.

Ao invés disso, queriam tripudiar sobre

seu corpo, como haviam tripudiado sobre

aquela terra.

Tony olhou rua baixo, na direção do

saloon. Homens armados vigiavam as

portas e janelas, onde se aglomeravam

chapéus pretos.

Uma porção de chapéus pretos que,

pouco a pouco, foram sendo tirados das

cabeças e postos de lado.

Ned foi erguido e socado de novo. A

corda foi passada em seu pescoço e ele foi

posto sobre seu cavalo.

Com o olhar ele procurou Tony. Ao vê-

lo, gemeu, num tom suplicante.

— Tony! Por favor! — rouquejou ele.

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Olhando-o, Tony entendeu o que seu

amigo lhe pedia. Era um último pedido,

algo que ele não poderia deixar de atender.

Num movimento brusco, livrou-se dos

braços que o seguravam e sacou a arma do

homem a sua frente.

Apontou-a para a cabeça de Ned e atirou.

O corpo do rapaz voou do cavalo e foi cair

imóvel na lama.

— Maldito! Tirou o nosso prazer — falou

alguém, golpeando a nuca de Tony mais

uma vez.

Ele caiu na lama e foi chutado por

abutres decepcionados.

— Maldição! Queria ver aquele maldito

esperneando na ponta da corda — disse

alguém decepcionado.

— Bebidas por minha conta — gritou

alguém e a animação retornou ao grupo.

Foram entrando no saloon, deixando o

corpo de Ned e de Tony na lama da rua.

Aqueles que vigiavam o saloon onde os

amigos de Ned se encontravam começaram

a voltar.

Havia rendido e tomado todas as armas

deles. Um silencio momentâneo pairou na

rua, quebrado logo depois pela festa no

Virgínia Saloon. Aos poucos os homens da

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cidade começaram a sair para a rua. Foram

rodeando os corpos de Ned e de Tony.

Ned era sangue e lama. Tony também,

mas não estava morto. Quando gemeu e se

moveu com dificuldade, os homens se

apressaram em erguê-lo e tirá-lo dali.

Levaram-no de volta ao saloon de Ned,

onde o lavaram e lhe deram roupas secas.

Quando conseguiu se mover, Tony foi até

o balcão, apanhou a garrafa de uísque e

encheu a boca.

Bochechou, cuspindo no assoalho.

Depois bebeu alguns goles, mais do que

normalmente beberia.

Precisava esquecer a dor em todo o seu

corpo e a visão dos olhos suplicantes de

Ned, pedindo uma morte digna.

Os homens haviam trazido o corpo de

Ned e o posto sobre uma das mesas. Sua

cabeça e suas pernas ficaram dependuradas.

Os braços abertos davam-lhe a aparência de

um estranho crucificado.

Não o haviam lavado. Alguém havia dito

que a última coisa que Ned desejaria era se

livrar daquela terra.

Agora todos se sentiam como órgãos, em

silencio, sentados cabisbaixos, enquanto,

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pela rua, vinham os sons da alegria no outro

saloon.

O xerife apareceu, mas só deu uma

olhada. Era esperto o bastante para saber

quem eram os donos da cidade agora.

— Precisamos de armas — disse Tony.

— Tomaram todas as nossas armas.

— Nada sobrou?

— Só na Toca do rato, lá tem o bastante

escondido — lembrou alguém.

— Quanto tempo até lá? — indagou

Tony.

— Pelo atalho, duas horas de viagem.

— E pela trilha junto ao rio? —

continuou o rapaz.

— Umas quatro horas.

— Há gente lá?

— Pelo menos uns dez homens, algumas

mulheres e muita munição.

Tony apanhou a garrafa e bebeu de novo.

Lembrava-se da trilha do rio para a Toca do

rato.

Lembrava-se também dos olhos

suplicantes de Ned, do corpo retalhado de

Mary Lee, da arrogância de Blackhat Bill,

da superioridade dos homens no saloon,

provando que Ned fora um inocente útil nas

mãos de especuladores e aproveitadores.

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Aqueles abutres não poderiam ficar

impunes.

— Ouçam o que vamos fazer — disse

ele, em voz alta. — Vamos levar o corpo de

Ned para ser sepultado na Toca do Raro.

Vocês vão na frente, levando o corpo pelo

atalho. Eu vou em seguida, levando nossos

convidados pela trilha do rio.

— Convidados? Que convidados? —

indagou um dos homens.

Tony fez um gesto, apontando rua acima,

na direção do Virgínia Saloon.

— Como vai conseguir levá-los?

— Deixem isso comigo.

Os homens se entreolharam, em dúvida.

Não conheciam direito aquele que lhes

falava.

Mas era um amigo de Ned. E os amigos

de Ned eram amigos de todos eles.

— Que diabos, homens! O que temos a

perder? Na Toca do Rato vamos poder dar o

troco a eles. Deixaremos que entrem pela

garganta até próximo do esconderijo.

Fecharemos a saída com um

desmoronamento. Eles estarão a nossa

mercê.

— Depois deles virão outros — falou

alguém.

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— Cuidaremos deles um de cada vez —

disse Tony, calmamente.

O saloon ficou em silencio por instantes.

Depois, alguns homens se levantaram e

foram embrulhar o corpo de Ned com

toalhas de mesa.

Os outros ficaram indecisos por instantes.

Depois começaram lentamente a apanhar

seus chapéus pretos.

Tony esperou até que eles partissem

lentamente, um cortejo fúnebre no meio da

chuva.

Foi até o Virgínia Saloon. Empurrou a

porta e entrou. A primeira coisa que viu foi

o chapéu de Ned pendurado ao lado do

espelho.

Um silencio de morte pairou no local.

— Olha só quem está de volta —

comentou um dos almofadinhas.

— Por favor, pessoal! Eu não vim de

Washington aqui para ficar. Quero voltar

para o Leste. Vocês não podem me tirar

essa oportunidade — falou ele, suplicante,

humilhando-se.

— O que você podia fazer já fez, rapaz.

Agora não nos serve para nada.

— Talvez eu tenha uma utilidade...

Talvez eu possa fazer por vocês o que

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esperavam que eu fizesse desde o

principio...

— Está falando da Toca do Rato? —

perguntou o almofadinha, levantando-se e

caminhando na direção dele.

— Sim, disso mesmo. Os homens de Ned

acabaram de sair com o corpo dele. Vão

enterrá-lo na Toca do Rato.

— E você sabe como encontrar esse

lugar?

— Eu e Ned levávamos gado para pastar

lá. Há uma trilha pelo rio, eu sei como

chegar. Há mais homens lá, muitas armas e

munições. Se vocês forem espertos, poderão

acabar de uma vez por todas com a

Quadrilha do Chapéu Preto. Antes que ela

ressurja e lhe dê mais trabalho. Esses

homens tentarão vingar Ned de alguma

forma. Com armas e munição nas mãos,

ninguém sabe do que serão capazes.

Os homens se entreolharam.

— Tem lógica. Aqui na cidade nós nos

limitamos a tomar-lhes as armas. Não

podíamos fazer um massacre. De forma ou

de outra, estaremos mal lá no Leste. Indo à

Toca do Rato, no entanto, estaremos livres

desse problema. Será uma batalha, uma

guerra, da qual sairemos vencedores.

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Imaginem as honras, pessoal. Invadir a

Toca do Rato e dizimar a quadrilha toda.

— Seria ótima, Frank! — comentou

alguém, mas isso reelegeria o senador?

— Claro que sim. Assim que terminar o

inverno, levas de investidores começarão a

chegar para ocupar as terras. Estão sendo

loteados todos os grandes ranchos. O Leste

recebe imigrantes a toda hora. Precisam

arrumar terras para eles. Quem não

reelegeria o homem que foi o responsável

por livrar esta terra dos malfeitores?

— Frank tem razão, pessoal. E seríamos

recompensados por isso.

— Tudo bem — falou alguém. — Mas o

que o rapazinho aí tem a lucrar com isso?

Os homens pareceram raciocinar melhor.

Todos se voltaram na direção de Tony.

— É uma boa pergunta, rapaz. O que tem

a ganhar com isto? — indagaram.

— O senador me prometeu um emprego

no Leste e uma casa para morar. É tudo que

desejo. Morar em Washington e nunca mais

voltar a esta maldita terra.

— É, foi isso mesmo que o Jeff me

contou que o rapaz ganharia com isso —

falou um deles.

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— É, vamos dar uma ajuda a ele. Afinal,

vai nos guiar à Toca do Rato.

— Isso mesmo, pessoal!

— Vamos reunir as armas...

— Precisaremos de tochas...

O saloon se transformou num corre-corre

de providencias, todas visando a invasão da

Toca do rato.

Tony ficou em pé, olhando o chapéu de

Ned, pendurado no espelho.

Caminhou na direção do balcão. O

barman lhe serviu uísque sem que ele

pedisse.

— Dê-me o chapéu! — pediu.

O barman estranhou o pedido.

— Ei, Frank!

— O que foi?

— Ele quer o chapéu?

— Para que, Tony?

— Prometi ao senador.

— Ok, pode dar a ele.

Tony apanhou o chapéu como quem

segurasse uma relíquia.

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Os preparativos foram feitos como se

todos se aprontassem para uma grande festa.

À margem de toda aquela agitação, Tony

observava aqueles homens, sem entender ao

certo o que os movia.

Conhecia o gado, a terra, o mistério da

primavera e do pasto que alimentava as

reses.

Sabia conhecer as nuvens de chuva e a

aproximação de uma tempestade.

Quando o inverno se aproximava, bastava

olhar para o céu e observar os pássaros.

Tudo era tão simples e estava ao alcance

da mão. Um homem poderia ter o

necessário para viver bem uma vida inteira,

sem precisar juntar coisas, numa obsessão

incompreensível para ele, acostumado às

coisas simples.

Havia sonhado com cidades brancas, de

mármore e riqueza, como se ali estivesse a

felicidade.

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Enganara-se. A ganância transformava os

homens em aves de rapina, em caçadores de

si mesmo.

Entregavam-se a uma luta continua para

amealhar posses, possuir riquezas que

jamais usufruiriam.

Tony simplesmente não entendia aquilo.

Era um homem do Oeste, apenas isso.

— Vamos lhes dar mais algum tempo

para se distanciarem — pediu Tony, quando

todos se disseram prontos para partir.

— Por quê?

— Por que vamos seguí-los com tochas e

barulho. Se perceberem isso, jamais os

pegaremos, idiotas! — explicou o próprio

Frank, antecipando-se a Tony.

— É isso mesmo, pessoal.

— Bebidas para todos, então — gritou o

barman. — Por conta do senador.

— Certo, eu endosso isso — falou Frank.

Todos foram beber junto ao balcão. Tony

se aproximou de Frank, que verificava a

carga de seu revolver.

— Você trabalha para o senador? —

indagou.

— Sim, sou parceiro de Jeff Bowie e

outros mais.

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— Por que não me falaram do plano todo

antes?

— Não podíamos confiar em você. Não

sabíamos para qual lado você penderia. O

plano já estava sendo preparado há algum

tempo, mas a única coisa que atrapalhava

era que, a cada vez que Ned pressentia uma

armadilha, corria para a Toca do Rato. Por

isso você era importante. Você chegou há

pouco e não percebeu. Todo o tempo, havia

homens de chapéus pretos vigiando Ned,

protegendo-o.

— E como aqueles pistoleiros

conseguiram chegar ao rancho daquela

forma?

— Enquanto nós cuidávamos dos vigias,

algumas milhas antes, eles já haviam

partido por um caminho mais longo,

chamando a atenção da guarda de Ned e

permitindo que nós os atacássemos por trás,

neutralizando-os.

— Foi um trabalhão e tanto, mas

conseguiram, afinal. Esta terra terá um novo

dono — comentou Tony, apertando em suas

mãos a aba do chapéu de Ned, o mesmo

chapéu que fora de Blackhat Bill, o xerife

de Powder River.

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Eles entraram no labirinto da Toca do

Rato pouco antes do amanhecer. A chuva os

retardara, além do uísque que haviam

levado e que bebiam como loucos.

A água havia apagado as tochas. Estavam

encharcados e loucos para se encostarem

num canto qualquer e dormir.

Tony os havia feito caminhar mais do que

o necessário. Os cavalos estavam cansados.

— Lá, sempre em frente — indicou

Tony, quando os havia levado ao ponto

ideal, de onde não poderiam se safar.

— Está bem, pessoal. Vamos pegá-los de

surpresa — gritou Frank, acordando a

turma.

— Sim, vamos lá — gritaram os

cavaleiros, sacando suas armas e disparando

pela garganta.

Tony esperou que eles fossem passando.

Quando o último se aproximou, ele bateu

com o chapéu preto na cara dele,

derrubando-o do cavalo.

— Por que fez isso? — indagou o

homem, aturdido.

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— Quero suas armas — explicou Tony,

metendo o bico da bota nos dentes dele,

antes que se levantasse.

Ele caiu para trás, cuspindo lascas de

dentes e praguejando. Sua mão foi em busca

da arma, mas Tony já o chutava de novo,

batendo com o salto na testa dele.

Tony saltou e sentou-se no peito do

homem caído, prendendo-lhe os braços com

os joelhos e apertando com força seu

pescoço, até que ele parasse de se debater.

Tirou-lhe o cinturão. Correu atrás do

cavalo e apanhou o rifle.

Um ruído forte e trepidante se ouviu,

quando os bandoleiros desmoronaram a

encosta, após a passagem dos almofadinhas.

Tony saltou para seu cavalo e cavalgou

naquela direção. Assim que viu a massa de

pedras e lama, saltou do cavalo, levando o

rifle e começou a escalar as rochas.

O céu clareava palidamente. Os primeiros

tiros começaram a soar. Em momento, o

pânico se instalou no meio no meio dos

atacantes.

Eles começaram a retornar, em galope

desenfreado. No alto das ravinas, os homens

de Ned disparavam certeiramente,

derrubando um após outro.

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Os sobreviventes rumavam na direção de

Tony, sobre o entulho que lhes barraria a

passagem.

Na frente vinha Frank, gritando ordens,

apavorado, já não tão seguro de si.

Preocupava-se apenas em safar. Mandava

que os outros atirassem, enquanto ele

esporeava o cavalo.

Ao ver o caminho obstruído, Frank

deteve seu animal, que fincou as quatro

patas na lama, deslizando, até imobilizar-se.

Naquele momento Tony o enquadrou na

mira de seu rifle. Atirar com rapidez e

precisão fora outra das lições.

Frank nem chegou a ver de onde viera o

tiro. A bala pegou-o de cima para baixo,

empurrando a copa do chapéu de encontro

ao crânio.

Um rombo se abriu em suas costas. Ele se

desarticulou como um boneco num show de

marionetes.

Em desespero, os atacantes da Toca do

Rato tentavam alguma reação.

Os que voltavam, eram dizimados. Os

que tentavam subir os entulhos, eram

abatidos implacavelmente.

O tiroteio cerrado continuou, enquanto a

chuva parava. Homens se escondiam atrás

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de cavalos agonizantes, disparando a esmo

contra as encostas.

Lá de cima, à medida que a claridade do

dia se tornava mais presente, os homens só

tinham o trabalho de mirar e apertar o

gatilho.

Muitos nem gritavam ao serem baleados.

Simplesmente estremeciam, depois se

imobilizavam.

— Cessar fogo! — gritou alguém, após

algum tempo.

— Nós nos rendemos! — disseram

alguns dos homens do Leste, soltando suas

armas sem munição e se levantando, com as

mãos para o alto.

— Eles estão sem munição! — falou

alguém.

— Como nós, um dia! — lembrou outro.

Tony achou até que poderia intervir no

sentido de poupar as vidas daqueles

infelizes. Mas havia um bando de

desesperados naquelas encostas, cheios de

mágoa e de desejo de vingança.

Nada os deteria.

Os cavalheiros começaram a se

aproximar dos homens que haviam se

rendido.

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Atiraram laços. Esporearam seus cavalos.

Arrastaram os pobres viventes pelo terreno

áspero da ravina, enquanto os demais

praticavam tiro-ao-alvo nos corpos em

suplício.

Tony desceu até seu cavalo. Preso à sela,

estava com chapéu preto de Ned.

Sem que percebesse, foi sendo rodeado

por uma por uma porção de outros homens

de chapéu preto.

Homens da lei, agentes da Pinkerton e

Delegados Federais circulavam pela região,

sem sucesso.

Numa cantina entre Glenrock e Cásper,

um bando de homens bebia junto ao balcão.

— Tony, você sabe por que os homens do

Leste usam as armas debaixo do braço? —

indagou alguém.

— Nem imagino — respondeu ele.

— Porque o sovaco deles fede quem nem

um defunto — atrapalhou-se o homem.

— Seu idiota! Não era assim que Ned

dizia.

— E como era então, sabichão?

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— Tinha alguma coisa a ver com o cheiro

de morte.

— Vocês não sabem nada. O Ned dizia

que... Ah, sei lá! — confundiu-se o outro.

Tony riu e ajeitou o chapéu preto em sua

cabeça.

— Ai vem a diligência — avisou alguém,

junto à janela.

Os homens iniciaram o ritual de todas as

horas, ajeitando os chapéus pretos e

amarrando os lenços da mesma cor sobre os

narizes.

Verificaram as armas. Tony se adiantou,

ficando junto à porta.

Lá fora, envolvida numa nuvem de

poeira, a diligência parou com as rodas

deslizando travadas no pedregulho.

— Ok, gente! Dez minutos de descanso!

— alertou o cocheiro, travando o freio

numa argola de aço.

As pessoas, sufocadas dentro do

transporte, tossiram e abriram a porta,

saltando rapidamente.

Espanavam-se, enquanto a poeira

baixava. Quando tudo ficou claro, viram o

cocheiro e o guarda com as mãos para cima.

Page 142: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

Homens espetavam rifles em suas

costelas, enquanto que outros saíam da

estação de muda, com armas nas mãos.

— Malditos! — rugiu alguém, no meio

dos passageiros.

— Os Chapéus Pretos! — exclamou

outra pessoa.

Tony se aproximou, encarando cada um

deles, sondando seus semblantes. Ali havia

passageiros do Leste e da região. Era

importante saber separá-los.

— Tudo bem, garoto? — indagou,

olhando para o pequeno que estava

boquiaberto, encarando-o.

— É Tony Kansas, não?

— Sim, por quê?

— Porque aquele sujeito é do Leste e

disse que estava vindo para comprar terras a

preço de chapéu preto.

— Fedelho intrometido! — disse o

homem, com arrogância.

Tony se voltou na direção dele.

— A preço de chapéu preto? Como é

isso?

— Esse garoto é um idiota, não sabe o

que está dizendo.

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— Não sou idiota, sou de Cásper — disse

o garotinho. — Eu digo que ele está

mentindo.

Tony examinou o homem a sua frente.

Era gordo, bem cuidado, com trajes finos e

uma cintura engordada por um cinturão de

notas, com certeza.

— Tire as roupas — ordenou.

— Não pode me obrigar a isso... — ia

dizendo o homem, mas Tony o calou com

uma coronhada no estômago.

O homem caiu de joelhos, tossindo e

apertando a barriga. Olhou o garoto com

ódio.

— Você vai me pagar por isso — rosnou.

— Tire as roupas — insistiu Tony, mas o

homem se encolheu, cruzando as mãos

diante da barriga.

Tony sacou sua faca e o segurou pelo

pescoço. Pôs a ponta da faca na barriga

dele, cortando os tecidos.

Cédulas caíram na areia. Tony puxou o

cinturão.

— A preço de chapéu preto — falou

Tony, com desprezo, tirando o chapéu e

batendo com ele no rosto do homem do

Leste, que recuou.

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Repentinamente, um Derringer surgiu em

sua mão.

— Mata ele, moço! — gritou o garoto.

Tony se moveu com rapidez. Sua faca

atravessou a garganta do agressor, antes que

ele pudesse engatilhar o Derringer.

— Peguem o dinheiro dele e o cofre da

diligência — ordenou Tony, saltando para

seu cavalo.

Os homens fizeram o que ele mandou.

Ele olhou para o garotinho, que sorria cheio

de admiração.

— Para a Toca do Rato, pessoal — gritou

Tony.

— Para o Toca do Ned — gritaram os

outros e saíram, levantando poeira na

estrada.

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Ouro Sangrento

Findava a tarde quando Roy Dale

chegava ao último pico das Montanhas

Rochosas, o maciço que se estendia do

norte ao sul.

Respirou profundamente, enquanto

admirava os vales úmidos e férteis. Seus

olhos azuis refletiam a felicidade que sentia

ao ver os montes de San Juan ao nordeste,

os Mogollons ao sul, os Black Rangers ao

sudoeste e o Grande Cânion do Colorado a

oeste.

A exuberante beleza do panorama e o

intenso verde daqueles vales despertavam

nele novo ânimo para viver. Apesar da sua

juventude, sentia-se desiludido e triste.

Seu rosto queimado pelo sol do deserto e

a barba espessa que o emoldurava,

juntamente com aquele ar de sofrimento,

Page 146: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

faziam-no parecer mais velho do que

realmente era.

Há muitos dias que caminhava pelas

montanhas sem se aproximar de nenhum

povoado. Este tipo de vida solitária não o

desagradava de todo, mas não restava

dúvida de que não podia continuar assim

por muito tempo.

Era do Texas e o trabalho que mais

conhecia era o de vaqueiro. Em sua terra

natal, uma aldeia de Waco, à margem

direita do Brazos, tinha a fama de valente e

decidido, hábil e preciso no uso das armas.

Suas mãos estavam sempre perto dos

Colts. Não havia ninguém que o vencesse

no revólver, na montaria, nem com o laço

num rodeio.

Um infortúnio, no entanto, afastara-o de

sua terra nata, impedindo-o de viver

tranqüilamente e de chegar a ser capataz do

rancho onde trabalhava.

Isto acontecera havia uns cinco anos

atrás. Desde então passara a andar de cidade

em cidade, sem destino certo, indiferente ao

perigo e sempre metido em encrencas.

Depois de tanto tempo absorto em suas

meditações, observando a paisagem, ele

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comentou com seu animal, uma égua

vigorosa que ele chamava de Linda.

— Gosta de paisagem? — perguntou ao

animal, com um sorriso.

A égua respondeu-lhe com um relincho.

O sol descia no horizonte rapidamente.

Logo anoiteceria na montanha. Roy dispôs-

se a passar a noite ali. Preparou uma

refeição rápida, depois de ter levado sua

montaria para um abrigo natural onde havia

água e relva fresca.

Após ter comido, estendeu a manta no

chão, usando a sela como travesseiro, quase

ao lado da fogueira. Fumou um cigarro

tranqüilamente, olhando o céu estrelado,

como gostava de fazer toda noite.

Adormeceu em pouco tempo.

Acordou com o cantar dos pássaros e a

claridade brilhante das montanhas. Seu

estado de espírito melhorava naquele

cenário de calma e beleza, embalado pelo

vento.

Depois de fazer uma refeição ligeira e de

presentear sua égua com torrões de açúcar,

selou o animal e montou para descer a

encosta escarpada.

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Rapidamente chegaram ao vale. A terra

estava coberta de flores e um bosque

oferecia boa madeira para construção.

Enquanto deixava que o animal pastasse,

andou sem rumo pelo vale, imaginando

como seria maravilhoso fincar raízes num

local como aquele, quase virgem e

praticamente inexplorado.

Compreendeu, porém, que aquele era um

sonho impossível. Nada o impediu, porém,

de sonhar. Mais tarde, voltou a montar e

continuou a marcha.

Após algumas horas de cavalgada, ouviu

tiros, mas não soube precisar de onde vinha,

pois os estampidos ecoavam pelo vale.

Continuou avançando com cautela, até

uma pequena elevação. Ao chegar ali, ouviu

o galope de muitos cavalos e de novos

disparos, desta vez mais próximos.

Não demorou muito para ver um

cavaleiro a galope. Roy viu o terror e a

angústia que o rosto do homem expressava

naquele momento.

Seus perseguidores não demoraram para

aparecer. Eram três e Roy percebeu logo

que a vida do homem que perseguiam não

valia um níquel furado.

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— Diabos, por que as encrencas não

passam ao largo e têm que vir justo em

minha direção? — praguejou ele, incapaz de

ficar apenas assistindo o que se passava.

O espírito de aventura cobrou sua

participação. Manobrando o animal com

cuidado e perícia, partiu a galope. Em

poucos instantes estava bastante próximo

dos três homens. Nenhum cavalo se

igualava a Linda no galope rápido e

elegante.

Um dos cavaleiros virou-se ao perceber

que alguém os seguia. Sem poder caprichar

na pontaria, virou-se e disparou duas ou três

vezes contra Roy.

As balas passaram longe e Roy sacou o

Colt.

— O que está havendo, Rawlins? —

perguntou um deles, ao ver que havia um

cavaleiro perseguindo-os.

— Tem alguém querendo nos estragar a

festa — respondeu o que atirara contra Roy

— Parece ser um...

O final da frase ficou presa em sua

garganta, quando seu pescoço foi

destroçado por uma bala, jogando sangue na

crina de seu cavalo. O homem caiu

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pesadamente, rolando como um saco de

batatas no chão.

— Vamos terminar logo com isso, White,

alguém está disposto a nos atrapalhar.

Rawlins a esta hora deve estar tendo um

encontro com Satanás.

— O que você disse?

— Que estamos sendo atacados por trás.

Vou ver se tenho mais sorte que Rawlins,

enquanto você continua no encalço desse

rancheiro. O cavalo dele está a ponto de

arrebentar de cansaço.

O pistoleiro estava certo. Um pouco mais

à frente, o animal caiu por terra. O cavaleiro

foi atirado à distância, e isto o salvou das

balas que lhe era dirigida.

Apressadamente procurou abrigo atrás de

seu cavalo, mas antes de conseguir fazer

isso, gritou e foi jogado para trás, caindo

com a mão no ventre, tentando estancar o

sangue que brotava generosamente.

O bandido que fizera o disparo gritou de

satisfação e apressou o galope de seu

cavalo. As balas de Roy, no entanto,

fizeram com que os dois desistissem de

qualquer outra coisa, fugindo num galope

desesperado.

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Roy desistiu de ir atrás dele para socorrer

o rancheiro, mas nada pôde fazer, pois este

já estava morto. Pelas roupas que vestia,

deveria ser bastante rico.

O cowboy revirou os bolsos à procura de

algum papel que o identificasse, mas nada

encontrou. Cobriu, então, o corpo do

homem com pedras e foi apanhar sua égua,

que pastava ali perto.

Quando caminhava, tropeçou em algo.

Olhando para o chão, viu um alforje de

couro. Apanhou-o. Era bastante pesado.

Abriu-a e encontrou vários saquinhos de

couro, com as bocas amarradas firmemente

por cordões do mesmo material.

Abriu um deles. Eram pepitas de ouro

puro. Roy nunca vira tanto ouro assim

junto. Compreendeu o motivo da

perseguição.

— Que diabos! E agora? — comentou

com Linda.

Ficou imaginando o que fazer com todo

aquele ouro. Pensou no que lhe ocorrera

cinco anos antes, mas sacudiu os ombros,

achando que tudo aquilo não podia voltar a

se repetir.

Continuou indeciso, mas sua consciência

sempre falava mais alto. Nascera honesto e

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tinha certeza de que morreria honesto.

Mesmo que quisesse, não conseguiria

guardar o dinheiro para si.

Precisava encontrar, agora, a quem

devolver todo aquele tesouro.

Quando Roy chegou ao terreiro do

Rancho Grant, o sol ocultava-se atrás dos

picos do Grande Cânion. Estava cansado,

faminto e suado. Seu aspecto era o de um

foragido.

Aproximou-se dos vaqueiros que estavam

sentados na cerca, com os pés apoiados no

travessão, virados para dentro do curral. No

centro, um grupo de peões rodeava um

magnífico cavalo.

— Boa tarde, amigos — disse Roy,

cumprimentando-os.

Só um deles se virou para olhá-lo com

indiferença.

— O que quer, forasteiro?

— Quero falar com o manda-chuva do

rancho — respondeu ele, de olho no

magnífico animal no centro do curral.

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Ao ouvir isto, outra pessoa com roupas

de vaqueiro virou-se em sua direção. Roy

ficou espantado ao ver que se tratava de um

mulher muito bonita.

Seu cabelo ruivo era cortado tão baixo

que não era possível distinguir nela, à

primeira vista, uma mulher, com aquelas

roupas e de costas.

— Espere um momento, forasteiro. —

disse ela, ao mesmo tempo que lhe dava as

costas para apreciar as cabriolas do

garanhão que escoiceava furiosamente.

Seu cavaleiro fazia um esforço

incalculável para manter-se sobre ele.

Roy ficou admirando aquele espetáculo

emocionado, mas o cavaleiro não

permaneceu montado por mais de um

minuto.

— Vejo que não há ninguém capaz de

domar este animal! — exclamou a moça.

Em seguida virou-se para Roy,

examinando-o cuidadosamente.

— O que deseja falar com o dono deste

rancho?

— Estou à procura de trabalho. Gostei

desta região e desejo ficar por aqui algum

tempo.

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A maneira tranqüila e franca com que

Roy falava agradou profundamente a

proprietária do rancho, pois era ela que

realmente tratava de tudo, ainda que seu pai

fosse vivo.

Ele se ausentava muitas vezes para

negócios, ficando fora até mais de um mês.

Sabia que sua filha era capaz de dirigir os

trabalhos tão bem como ele.

— Você quer trabalho... — repetiu a

jovem com seriedade, tentando ocultar a

simpatia que sentia pelo recém-chegado,

apesar de seu aspecto. — Pela sua aparência

— continuou ela — eu diria que não está

muito acostumado ao trabalho duro e a este

tipo de coisa.

O vaqueiro que estava junto dela

gargalhou zombeteiramente. Roy limitou-se

a olhá-lo fixamente.

— Pode ser que minha aparência

demonstre isso — retrucou sem irritar-se.

— Mas sempre ouvi dizer que as aparências

muitas vezes enganam.

— Talvez tenha razão, ainda que possa

lhe assegurar que nunca erro ao julgar as

pessoas. Em todo caso... O que sabe fazer?

Acredito que conheça os trabalhos comuns

a um rancho?

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— Alguma coisa — disse Roy, com

ironia.

— Gostaria de vê-lo atuando e não

apenas falando. E há outra coisa, além de

trabalho é preciso saber empunhar uma

arma. Poderia mostrar que não as utiliza

apenas como enfeite?

— Não lhe parece que está levando muito

longe as suas brincadeiras? Vim oferecer

meus serviços, não escutar ofensas

gratuitas. Pode negar-me o emprego, mas

não tem o direito de me ofender.

— Se lhe incomodam as minhas palavras

— respondeu a moça — nada o impede de

ir por onde veio. Não fui eu quem o

chamou.

— Não posso negar que é mesmo uma

moça muito mal-educada, madame.

— Cuidado com as palavras, forasteiro

— disse um vaqueiro. — Devia ter mais

amor aos seus dentes.

Os outros, que não participavam da

conversa, viraram-se intrigados.

— Não se meta nisso, Frank — disse a

moça com autoridade. — Isto diz respeito

somente a mim.

O capataz obedeceu e a moça mudou de

tom.

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— Vejamos do que é capaz. Se conseguir

manter-se dois minutos sobre o lombo

daquele cavalo será contratado sem maiores

perguntas.

O rapaz pensou por instantes,

examinando o garanhão, a maneira como

ele escoiceava. Vira-o pulando e jogando a

traseira sempre para o mesmo lado.

— Trato feito, madame! — respondeu

Roy.

— Preparem o Rock de novo para

montaria! — ordenou a jovem e os

vaqueiros vibraram, na expectativa de uma

boa diversão.

— Por que fez isso? — perguntou o

capataz à sua patroa, visivelmente

contrariado.

— Porque me agradou como ele reagiu

— respondeu-lhe secamente.

Roy olhou a jovem, com um sorriso. Era

bela e alta. A roupa masculina, longe de

esconder seus encantos, mais destacava a

sua beleza.

Desmontou e entrou no curral,

aproximando-se do garanhão, que era

mantido preso por meia dúzia de vaqueiros.

— Não se exalte, diabinho! — disse Roy,

sorridente, alisando o dorso do animal com

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as mãos. — Você e Linda fariam um belo

par.

— Vai alisar ou vai montar? — gritou um

dos vaqueiros e todos os outros riram junto.

Roy não se incomodou com a

provocação. Verificou se a barrigueira

estava bem presa e se a sela não estava

frouxa. Um homem poderia morrer,

montando dessa forma num animal tão

impetuoso.

— Está pronto? — perguntou um dos

vaqueiros que seguravam o cavalo.

— Sim, estou — afirmou Roy, com o pé

direito no estribo e uma das mãos no arção

da sela.

Num salto ágil e seguro, pulou para a

sela. Os vaqueiros largaram o animal. Roy

sabia como aquele cavalo reagia, por isso

dominava o animal.

Os vaqueiros, em sua maioria, desejavam

vê-lo cair ao chão. A jovem observava tudo,

emocionada e admirada. Era a força contra

a inteligência.

— Ele está mostrando saber o que é um

cavalo selvagem — disse ela a Frank.

— Mas isto não significa que ele seja um

homem recomendável.

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— Não exagere. Não tem razão para

alimentar suspeitas. Além disso — falou

com ironia — você tem sido um bom

capataz. Não acredito que possa ser

superado pelo forasteiro em todas as suas

tarefas.

— Não temo o forasteiro, nem deixar de

ser capataz — respondeu de mau humor.

Enquanto conversavam, Roy caiu do

cavalo e esteve a ponto de ser pisoteado

pelo animal enfurecido. Frank deu uma boa

gargalhada. Todo o seu mau humor

desapareceu num minuto.

Roy levantou-se do chão. Rogando uma

praga e sacudindo o pó, foi em direção à

jovem. Frank ainda ria.

— Sabia que você não poderia com Rock

— disse a moça, com sua já costumeira

ironia. — Suas habilidades não foram

demonstradas e temo não poder contratá-lo.

— Vejo que tem uma grande necessidade

de ferir-me. Não acreditava que houvesse

mulheres tão bobas como você.

— Cala-se, forasteiro — disse o capataz.

— Engula essas palavras, se não quer que

eu o faça engoli-las.

Roy dirigiu-lhe um olhar duro. Mas se

conteve, dizendo:

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— A esta senhorita — disse com calma

— falei o que ela merecia, o que não

constitui ofensa. Se você for parcial,

admitirá que ela não merece ser tratada com

doçura. Mas se, apesar disso, achar que é

seu dever defendê-la, terei de demonstrar-

lhe sua imprudência em desafiar-me.

Frank compreendeu que já não poderia

voltar atrás. E, pelo olhar duro de Roy, logo

percebeu que ele era difícil de ser

derrubado.

— Vejamos se apara os meus golpes com

a mesma facilidade com que usa sua

asquerosa língua.

Ao dizer isso, desferiu no rosto de Roy

um violento soco que ele não conseguiu

evitar a tempo, sendo arremessado para trás

e mantendo-se em pé com certa dificuldade.

Estava esgotado pela marcha, além do

esforço despendido com Rock. Sua

inferioridade estava apenas nisso.

Rapidamente, no entanto, tratou de

organizar sua defesa.

Manteve-se em pé e esperou que Frank o

atacasse novamente. Este o fez, confiante e

seguro de sua superioridade. Roy esquivou-

se, golpeando-o na orelha com o punho

esquerdo. Frank caiu ao chão, rolando na

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poeira, não tanto pelo golpe, mas por seu

próprio impulso.

Os vaqueiros olharam-se entre si. A

jovem sorriu. Roy continuou na defensiva.

Frank continuou atacando

desordenadamente. De repente conseguiu

atingir Roy com outro soco no rosto.

O rapaz caiu e Frank preparou-se para

pisoteá-lo com o calcanhar da bota. Roy

virou-se instantaneamente e ergueu-se de

um salto. Neste instante a moça interferiu:

— Parem com essa luta! — gritou —

Separem-nos. — E virando para os

vaqueiros. — O que estão olhando,

cumpram minhas ordens, separem os dois.

Como nenhum dos homens se mexeu e

nem os dois lutadores se separaram, a moça

sacou o revólver e meteu-se entre eles, de

arma em punho.

— Já não ouvem mais as minhas ordens?

Quem manda aqui? Todos os meus

empregados têm de me ouvir e atender.

— Seus empregados sim — disse Roy.

— Mas eu não.

— Você também. Antes de começarem

esta luta idiota eu já me decidira a contratá-

lo. Lamento muito que eu tenha sido a

causadora disso tudo. Não quero que

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ninguém brigue por minha causa, e muito

menos dois homens que podem e merecem

ser bons amigos.

Roy a ouvia, aturdido. Mas, atendendo a

vontade da moça, estendeu a mão ao

capataz.

Este fingiu estar distraído.

— Não ouviu as minha ordem? —

perguntou-lhe a rancheira.

De má vontade, Frank a obedeceu.

— Bravo, rapazes! — exclamou o mais

velho dos peões.

— Agora vou apresentá-lo aos meus

vaqueiros — disse ela, sorrindo. — Como é

o seu nome?

— Roy... Roy Dale.

— Bem-vindo ao nosso rancho, Roy.

Este é o capataz, vocês já se conheceram

muito bem — disse ela e, em seguida,

dirigiu-se aos outros: — Aqui está Joe

Thompson, o mais velho de nossos

empregados e o mais leal que já conheci.

— Obrigado, Srta. Evelyn! Bem vindo,

rapaz.

— Este é Jim Brand, Red Curtis, Alan

Ratfford, Tom Logan, Bucky Neal...

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Roy foi-lhes apertando as mãos uma a

uma. Aquela era parte da equipe, os outros

estavam recolhendo o gado.

— Agora só resta apresentá-lo a mim —

disse sorrindo.— Meu nome é Evelyn

Grant.

— Foi um prazer tê-la conhecido, e lhe

peço que esqueça as minhas palavras de

antes. Na verdade, não desejava ofendê-la.

— Não me lembro que tenha feito isso —

disse ela sorrindo.

Depois das apresentações, os outros

foram terminar suas obrigações. Roy tinha

no olhar um brilho de satisfação.

— Frank vai lhe mostrar os alojamentos

— falou Evelyn, sempre olhando para o

recém-chegado com uma certa admiração.

Apesar dele ter sido jogado fora da sela,

ela vira a maneira como ele montava. Roy

sabia exatamente o que fazia. O cansaço, no

entanto, acabara por vencê-lo.

A garota tinha certeza de que, se havia

naquele rancho um homem capaz de montar

Rock, esse homem era Roy.

— Não quer saber do seu salário? —

ironizou Frank, enquanto os dois

caminhavam pelo pátio, na direção do

galpão onde dormiam os vaqueiros.

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— Tenho certeza que será justo —

devolveu-lhe Roy, no mesmo tom, enquanto

acompanhava com os olhos a dona do

rancho caminhando para a casa principal.

Antes de subir para o alpendre, ela se

virou e olhou na direção dele. Roy sorriu de

novo, satisfeito com aquilo.

Frank, ao seu lado, olhou-o com

severidade, como que cobrando o respeito

que o vaqueiro deveria ter para com a

proprietária. Mas vira como Evelyn reagira

em relação a Roy, por isso achou melhor

ficar calado.

Roy logo ficou sabendo de tudo que se

passava no rancho. Os vaqueiros adoravam

conversar. Assim, foi informado da situação

do rancho e da rixa com os vizinhos, os

Benson, que já vinha de alguns anos.

A própria Evelyn se encarregou de

posicioná-lo a respeito do problema com os

vizinhos, uma vez que isso envolvia

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diretamente os vaqueiros que, a qualquer

momento, poderiam se envolver em um

tiroteio ou se ver no meio de uma disputa

violenta.

Roy gostou da franqueza com que Evelyn

lhe falou sobre isso e de como conduzia os

negócios na ausência de seu pai, James

Grant, que se ocupava da venda e da

condução do gado até Winslow.

Segundo ela, o pai fizera a viagem para

vender o gado e de lá seguiria para Chicago

e em seguida para Barstown, a fim de

entrevistar-se com um representante da

Furnish Meat Company, a poderosa

companhia que supervisionava a compra de

gado para o principal matadouro de

Chicago.

A rixa com os Benson era devida ao

egoísmo do velho Benson, pai de um rapaz

chamado Robert Benson. O velho e o pai de

Evelyn haviam sido amigos e vieram para o

vale na mesma época, a fim de escolherem

terras vizinhas.

Os dois alimentavam planos de casar seus

dois filhos, para que todo o vale se tornasse

uma só propriedade. Grant teve sorte de em

sua propriedade correr um riacho que era

afluente do Little Colorado.

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Para não prejudicar Benson ele deixou

uma parte da propriedade aberta, sem cerca,

para que este pudesse utilizar a água e

movimentar o gado com maior facilidade.

No entanto, Jack Benson resolveu cercar

toda aquela área, com a desculpa de que

isso impediria o extravio do gado. Foi então

que Grant descobriu que a intenção do outro

era manter aquele terreno como propriedade

sua.

Com ordens expressas de Grant, os

empregados destruíram a cerca e, desde

então, a animosidade entre os dois ranchos

vinha aumentando constantemente, com

alguns entreveros sérios.

Num deles havia morrido o velho

Benson. O capataz do rancho jurou

vingança, mas apesar disso as lutas tinham

se tornado mais raras, principalmente após a

volta de Robert ao rancho, depois de

formado em advocacia.

Mas a razão do regresso, Evelyn já

percebera. Só podia ser algum desgosto com

a namorada que ele arranjara no Leste, fato

que deixara Evelyn bastante irritada, pois o

seu noivado com ele era tido como certo,

antes mesmo de ele partir para estudar.

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Evelyn, no entanto, sabia que a paz atual

era muito frágil. Robert Benson devia estar

tentando apossar-se do terreno, com alguma

artifício legal.

Para isso, tentaria usar sua lábia de

advogado. E a jovem tinha suas razões, pois

um empregado do rancho o vira sair do

cartório onde fora feito o registro das

propriedades.

Agora Evelyn não hesitara em contratar

mais um vaqueiro. Mas Frank ainda não

aceitara a atitude da moça.

Naquela manhã, por ordem dela, Frank e

Roy foram correr a propriedade. A jovem

queria que todos os empregados fossem

conhecidos pelo novo contratado, e que este

se inteirasse da quantidade de reses que

pastavam naquele vale.

Frank mostrou-se pouco eloqüente

enquanto cavalgavam. De vez em quando

lhe dirigia frases curtas. E uma vez

perguntou:

— Você é do Arizona?

— Não — respondeu Roy — Nasci no

Texas.

Depois de uma breve pausa, o capataz

voltou a perguntar:

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— Faz muito tempo que abandonou seu

Estado?

— Alguns anos.

— O que o trouxe por aqui?

— Na verdade, não saberia dizer. Há

muito que ando de um lado para outro,

deixando quase que a escolha à vontade de

Linda. Ela é muito inteligente, a prova é que

me trouxe a este lugar magnífico.

— No Texas também há lugares

magníficos. Bons ranchos... Terra boa,

tomada dos mexicanos...

— Tomada, não: conquistada, o que é

diferente. Minha terra não me desagrada,

mas...

Roy deixou a frase pelo meio. Em sua

mente desfilaram velhas lembranças. Frank,

ao notar a seriedade do rosto do outro,

achou que alguma encrenca esperava o

rapaz em sua cidade natal.

— Talvez eu decida voltar algum dia —

disse Roy repentinamente, olhando o

capataz. — Só o que me enche de tristeza é

saber que meu retorno se fará nas mesmas

condições de minha partida. Há dez anos eu

acreditava que aquelas terras eram muito

pequenas para a minha ambição. Desejava

viver, conhecer terras distantes... — disse,

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fazendo uma pequena pausa para admirar a

vista magnífica que se descortinava a sua

frente.

— E o que fez depois? — insistiu Frank,

curioso.

— Depois fui à Califórnia e tive uma

grande decepção. Em seguida para Nevada,

onde me convenci de que não adianta a

vontade de ter dinheiro, uma pá e uma

picareta...

— Muitos conseguiram fortuna em pouco

tempo.

— Eu sei. Mas os meios que eles

empregavam não são compatíveis com os

meus princípios. Eu não nasci para ser

abutre.

— E acha que no Arizona as coisas são

diferentes?

— Não. Mas há muito que desisti de me

tornar rico.

Frank parou repentinamente o cavalo e

pôs-se à escuta.

— Ouço o galope de uns cavalos.

Estamos perto do rio. Alguém deve estar

vindo das montanhas nesta direção. Vamos

nos ocultar atrás daquelas árvores.

O capataz não errara. Cinco cavaleiros

desceram pela ladeira, em direção a um

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ponto onde poderiam cruzar o rio, um

pouco mais adiante.

— Se não me engano são homens de

Benson. Possivelmente tentarão passar pela

nossa propriedade. Se fizerem isto, lhes

cortaremos o caminho.

Eram realmente homens de Benson e

cruzaram o rio, indo para onde estavam

Frank e Roy. O capataz saiu de trás das

árvores e atravessou-lhes a frente.

— Como se atrevem a cavalgar por aqui?

Os homens de Benson estacaram. Frank

estava tenso. As mãos próximas do Colt.

Roy parecia alheio a questão, por seu ar

indiferente.

— O mesmo podíamos perguntar-lhe —

disse o sujeito que ia à frente do grupo.

Chamava-se Strong e era o segundo

capataz dos Benson. Sua fama era de bom

pistoleiro e difícil de perder num corpo-a-

corpo.

— Se pensam que por estarem em maior

número nos amedrontam, estão enganados

— disse Frank. — Voltem a cruzar o rio e

partam sem reclamar.

— Que razões nos dá para isso?

Apenas o capataz dos Benson terminou

de falar e ouviu-se o disparo de uma arma.

Page 170: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

Havia sido Roy. Sua indiferença

desaparecera no momento em que viu um

dos homens de Benson com a intenção de

empunhar uma arma.

Strong manteve as mãos bem perto de

seus Colts, mas não se atreveu a sacá-los. O

que tentara fazer isso sem ser notado torcia-

se agora de dor, enquanto apertava a mão

ferida. A sua arma havia caído ao chão.

— Esperavam nos pegar desprevenidos?

— perguntou Roy — Estas razões são

suficientes para cumprir o que meu amigo

disse.

Strong puxou com raiva as rédeas de seu

cavalo e o animal empinou, rodando nas

patas traseiras. Quando já estavam do outro

lado, Strong ameaçou:

— Procurem não se mostrar da próxima

vez, pois atiraremos sem avisar.

Frank e Roy voltaram a cavalgar, assim

que os invasores se afastaram do rio.

— Você foi muito oportuno, Roy.

Confesso que me pegaram desprevenido.

— Por isso, enquanto você falava eu os

observava. Conheço muito bem este tipo de

gente.

Ficaram em silêncio. Frank cavalgava

sério e pensativo.

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O capataz acalentava um sonho quase

impossível, o de casar-se com Evelyn.

Agora que Roy aparecera, via suas

possibilidades já remotas serem reduzidas a

zero. Apesar disso, devia ser-lhe grato por

lhe salvar a vida.

Naquela noite, o assunto durante o jantar

foi o encontro com os vaqueiros de Benson.

Roy recebeu os cumprimentos dos

empregados, com modéstia sincera. Poucas

vezes intervinha na conversação.

Foi Brand que mudou o tema da noite,

lembrando a grande ausência de James

Grant.

— O patrão parece estar gostando muito

de sua permanência em Barstown...

— Não há porque estranhar — retrucou

Red. — Todos sabemos que o velho gosta

de uma farrinha de vez em quando.

— No entanto — interveio Thompson —

acho que já deveria ter regressado. Nunca

ficou tanto tempo ausente sem mandar

notícias.

Roy desejava conversar com Thompson e

o seguiu quando terminaram o jantar. O

vaqueiro foi para o meio do cercado onde

estava Rock, que ele mesmo laçara.

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Ao notar Roy, virou-se para ele e

perguntou:

— Veio também para ver Rock?

— Sim. Gosto muito de cavalos.

— Nossos gostos coincidem. Que acha

deste garanhão vermelho?

— É magnífico.

— É o cavalo mais bonito que já vi em

minha vida. — disse Thompson, orgulhoso.

— Tenho certeza de que será famoso na

região. Você verá. Depois de Evelyn, é o

que mais aprecio em minha vida. Meu

maior orgulho é tê-lo laçado.

Roy o ouvia, sorridente. Ao escutar o

nome da jovem, ficou sério. Aproveitou a

ocasião para tocar no assunto que o

preocupava.

— Aprecia muito Evelyn, não é verdade?

— Como se fosse minha própria filha. Eu

a vi nascer e a ensinei a montar e a manejar

o Colt. Atira como um homem.

— Foi também quem a ensinou a ser

mordaz e arrogante?

— Não. Isto ela aprendeu sozinha —

respondeu ele, rindo — Mas não é tão arisca

como parece à primeira vista. Além do

mais, foi criada no meio de gente rude. E

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não concordou em ir estudar no Leste. Não

queria afastar-se do pai.

— Para viver aqui, é melhor que seja

mesmo como é.

Roy ficou silencioso. Repentinamente,

tomou de novo a palavra.

— A propósito do pai dela, Joe. O que

ouvi durante o jantar me deixou

preocupado.

— Em que sentido?

— A sua ausência prolongada. Ontem

pela manhã eu fui testemunha de um fato

que me fez pensar... É melhor eu lhe contar

tudo.

— Fale sem rodeios, rapaz.

Roy relatou tudo o que vira e fizera na

manhã anterior, antes de ir parar no rancho,

falando da perseguição e da morte daquele

homem, mas ocultando a questão do ouro

que ele encontrara e que estava escondido

agora.

— Não era aquela direção que ele devia

seguir se viesse de Winslow, mas... Quem

sabe? Amanhã eu a convencerei a procurar

saber se o viram em Winslow.

Ao sair do cercado encontraram Evelyn.

Ela seguia para junto do grupo de vaqueiros

que cantava ao som de um violão.

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— Boa noite — cumprimentou a todos.

— Evelyn, queria falar com você — disse

Joe Thompson, chamando-a de lado.

— Que houve, Joe?

— Não é que tenha havido alguma coisa,

mas acho que devíamos procurar saber se

seu pai passou por Winslow ou se ainda está

lá.

— Diz isto pela demora dele?

— Sim. Esta demora já me preocupa.

— Você até parece que não o conhece.

Estou totalmente tranqüila. Aproveitou a

ocasião para fazer uma de suas costumeiras

farras. Tem direito de gozar a vida, não?

— É possível que você tenha razão. Mas

não teríamos nada a perder em investigar.

Frank seguia para o alojamento quando

viu o grupo formado por Evelyn, Joe e Roy.

Tentou passar sem saudá-los, mas a jovem o

chamou:

— Frank! Joe está preocupado com a

demora de papai. Quer que mandemos

alguém a Winslow.

— Não é má idéia. Além disso, poderiam

trazer munições. Já estamos precisando.

— E quem deve ir?

— Joe mesmo poderia ir com Alan e

Tom.

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— E se Roy fosse com eles?

— Para quê?

— Podem cruzar com os Benson...

— Acha que eles fugirão apavorados ao

verem Roy? — ironizou o capataz, que não

conseguia esconder sua antipatia por Roy,

mesmo após este ter-lhe salvado a vida.

— Frank!

— Desculpe, Evelyn. É claro que Roy

poderá acompanhá-los — disse, tentando

consertar a situação, dizendo boa noite e

rumando apressadamente para o alojamento.

— É, você ainda não caiu nas boas graças

do capataz. — disse Evelyn, com ironia.

Ficou em silêncio e acrescentou:

— Ainda há pouco falou em você,

elogiando-o. Segundo me disse, você o

livrou de má situação.

— Ora, coisa sem importância. Além do

que, minha própria segurança também

estava em jogo. Tinha que fazer algo para

me proteger.

Evelyn sorriu e, despedindo-se de todos,

recolheu-se. Roy continuou ao lado dos

músicos, ouvindo seus instrumentos e suas

canções, sentindo-se tranqüilo como havia

muito não se sentia.

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Era isso justamente o que o preocupava.

A aparente tranqüilidade do rancho era

ameaçada por um clima de tensão constante,

como a calmaria que precedia uma

tempestade.

O encontro com os homens do Rancho

Benson, naquela tarde, demonstrava isso.

Aqueles rapazes estavam decididos a iniciar

um tiroteio e só sua sorte e rapidez haviam

impedido que Frank e ele fossem mortos.

Havia se metido em muitas encrencas em

sua vida. Queria apenas um local onde

pudesse trabalhar. Mas as encrencas o

perseguiam. Não havia como evitá-las.

No dia seguinte, antes de clarear, os

vaqueiros designados para a viagem

partiram do rancho.

Em Winslow dirigiram-se imediatamente

para o armazém do velho Sam, bom amigo

de Grant. Joe o cumprimentou antes de

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descer da carroça, depois perguntou pelo

patrão.

— Ele não está na fazenda? — respondeu

o comerciante com outra pergunta. —

Esteve aqui há quatro dias atrás e disse que

viajaria de volta na manhã seguinte. Claro

que nunca se pode afirmar o que vai pela

cabeça do maluco do Grant.

Joe olhou preocupado para Roy.

— Precisamos de algumas coisas, Sam,

aqui está a lista — disse Joe, entregando o

papel ao velho. — Mais tarde passaremos

para pegar as mercadorias.

Foram em seguida para o Marvel Saloon,

o preferido dos apreciadores do melhor

uísque da região. Apesar de ser pouco mais

de meio-dia, o saloon estava bastante cheio.

Joe e seus companheiros foram

diretamente para o balcão:

— Traga-me uma garrafa do bom —

disse Joe.

Enquanto bebiam, Roy virou-se de frente

para os fregueses que estavam nas mesas.

Era um velho hábito seu. Sempre fazia

isto, para ver se alguém o observava. Foi

quando reparou em três sujeitos sentados a

uma das mesas, olhando-o disfarçada mas

insistentemente.

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Fingiu não tê-los notado e virou-se

novamente para seus companheiros.

Joe havia sugerido que percorressem

todos os saloons, tabernas e bordéis para ver

se o patrão estava em algum deles.

— Não é má idéia — assentiu Tom

Logan. — Vamos imediatamente ao Blue

Saloon. É o lugar mais indicado para

encontrar o velho. E ali a gente pode fazer

algo mais do que beber um uísque, se é que

me entendem.

Enquanto eles conversavam, houve

alguma movimentação próxima de Roy,

sem que ele percebesse. De repente, um

homem que se colocara por trás dele deu-

lhe um empurrão.

Ele se virou e constatou que era um dos

três que o haviam observando, desde que

entrara ali.

— Não há espaço suficiente no salão para

você? — perguntou com bons modos.

O outro olhou com desprezo e em

seguida cuspiu no chão.

— Falo com um homem ou com um

porco? — disse Roy, agora em um tom mais

alto.

A resposta de Roy foi um soco

inesperado na direção de seu queixo. Mas a

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rapidez do rapaz o fez esquivar-se e golpear

o outro com a esquerda bem na boca do

estômago.

O soco foi desferido com a força

suficiente para derrubar um boi, fazendo o

desconhecido bufar e gemer, dobrando o

corpo para frente e caindo de cara no

assoalho.

Os fregueses, que já tinham percebido a

briga, começaram a se levantar e a abrir

espaço. Os dois amigos do homem que

brigava com Roy se aproximaram.

Um deles tratou de ajudar o companheiro

caído, que tossia e vomitava o almoço. O

outro pôs-se à frente de Roy.

— Vejo que você é amigo dos ataques à

traição — disse sem rodeios.

Roy olhou-o fixamente.

— Não sabe o que está falando nem com

quem está falando, idiota. Nunca ataquei

ninguém sem antes ser atacado.

— Diga isso a outro, mas não a mim. Eu

o estou observando desde que entrou neste

saloon.

— Se está com vontade de arrumar

confusão — disse Tom — é melhor ir

tocando a música em outro lugar, meu

velho.

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— Deixe que ele fale, Tom. Deve ter

alguma coisa muito interessante a dizer,

ainda que nunca o tenha visto em parte

alguma antes.

— Claro que não. Para desgraça sua, esta

é a primeira vez que nos achamos frente a

frente. Mas isso não quer dizer que eu não o

tenha visto antes. Há alguns dias eu o

surpreendi, quando matou um homem

covardemente, depois de o perseguir até que

o cavalo dele se acabasse. Eu o reconheci

pela sua égua branca. Você é um

indesejável, um pistoleiro, e este foi seu

último copo de uísque, não vai escapar-me

— disse o homem diante de Roy,

distorcendo os fatos e acusando Roy.

— Você está louco, seu covarde? —

explodiu o rapaz, percebendo que a

encrenca novamente vinha ao seu encontro.

— Cuidado, Roy! — gritou Tom.

Simultaneamente soou um disparo. O

velho Thompson e Roy tinham em suas

mãos um Colt fumegante, enquanto o

sujeito que provocara Roy caía no assoalho

contorcendo-se de dor.

— Obrigado, Joe. Eu devo a vida a você.

Eu estava de olho nele, já imaginava quais

eram as intenções desse sujeito.

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— Você foi esperto. Felizmente tem

olhos de lince e isso é necessário, se quiser

continuar vivendo por aqui.

Os outros dois pistoleiros tinham

desaparecido por entre a multidão.

Ninguém se preocupou muito com o

incidente. Os homens do velho Oeste

desprezavam a traição e os covardes. O

xerife apareceu logo depois e ficou

satisfeito com a alegação de legítima defesa,

principalmente diante de tantas

testemunhas.

Os rapazes do Rancho Grant continuaram

sua busca no Blue Saloon. Lá também não

encontraram seu patrão.

Decidiram passar a noite no hotel, e no

dia seguinte partiram bem cedo. Ainda iam

meio embriagados pela noite de farra na

cidade. Procurando pelo patrão, não

deixavam de tomar um gole em cada local

que passavam.

Estavam na metade do caminho, bem

próximos a um pequeno bosque, quando

uma detonação e a súbita parada da carroça

os fez despertar.

Estavam em campo aberto.

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— Miseráveis! — gritou Joe. — Devem

ser homens dos Benson. Aposto cem

dólares.

— Eu acho que são os companheiros do

sujeito que você liquidou ontem à noite.

— Bem, não importa muito que é —

respondeu Allan. — O que interessa agora é

salvar a pele, o que vai ser muito difícil.

A única possibilidade de defesa era a

carroça. Os que estavam a cavalo

desmontaram e abrigaram-se atrás dela.

— Estamos numa ratoeira — disse Alan,

de repente. — Aqui não temos oportunidade

de defesa. Vão nos pegar com facilidade,

não temos como nos esconder por muito

tempo.

— Alan tem razão — concordou alguém.

— Eu também acho — disse Roy. —

Temos que fazer alguma coisa para arrancá-

los de refúgio onde estão, ainda que seja

arriscado para nós. A solução é fingir que

fugimos, fazendo o caminho de volta.

Assim que for possível, vamos contornar a

estrada para atacá-los por trás.

— E se não conseguirmos escapar dos

rifles? — perguntou Joe.

— Tanto faz morrer nesta ratoeira como

em campo aberto— disse Alan.

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— Vamos tentar — decidiu Roy — Um

ou outro conseguirá escapar. Você, Alan, vá

para o norte, como se fosse na direção do

rancho. Eu irei em sentido oposto. Bem

afastados, daremos a volta e cairemos sobre

os atacantes.

Fizeram o que Roy propusera. Os

atacantes acreditaram que eles fugiam

atemorizados e não se preocuparam em

perseguí-los. Quando se deram conta da

manobra, já era tarde.

Roy e Alan caíram sobre os bandidos,

protegendo-se por trás das árvores. Desta

vez foram os outros que saíram em fuga.

Eram quatro sujeitos. Tinham os cavalos

bem próximos, e dois fugiram num galope

desenfreado. Mas os outros dois pagaram

bem caro sua ousadia. Roy sabia muito bem

como disparar uma arma e era implacável

com quem tentava matá-lo.

Com sua pontaria, enfiou uma bala nas

costelas de um deles, quando tentava

montar no cavalo. O outro foi atingido na

cabeça, quando se preparava para sair a

galope. Seus corpos ficaram estendidos ao

sol, na poeira.

Joe e Tom acorreram apressadamente

quando deram conta do que se passava.

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— Conhece algum desses dois canalhas?

— perguntou Roy a Joe.

O vaqueiro aproximou-se dos cadáveres e

virou-os de barriga para cima com a ponta

da bota.

— Não — respondeu. — Nunca vi estes

caras por aqui. Não compreendo o interesse

que tinham em nos eliminar.

— Então deve ser a mim que eles querem

— comentou Roy, pensando naquele alforje

cheio de ouro. — Não sei bem por quê, mas

a minha vinda está perturbando alguém.

— Bem — disse Joe, secando o suor do

rosto... — Quem sabe um dia descobriremos

a razão deste ataque!

Voltaram para junto da carroça. Um dos

animais, o cavalo de Tom estava deitado

sobre a relva, com a pata sangrando.

Joe aproximou-se e examinou-lhe o

ferimento.

— Vamos tentar tirar esta bala — disse.

Amarraram as patas do animal. Roy e

Tom seguraram-lhe a cabeça. Com uma

precisão inacreditável, Joe manejou o

canivete junto ao ferimento e em poucos

segundos a bala estava em suas mãos.

Tom pegou-a e guardou-a no bolso de sua

jaqueta.

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— Ainda quero ter a oportunidade de

cobrar isto — disse ele, entredentes.

Evelyn mandou chamar Frank em seu

escritório, e o esperou sentada por trás da

mesa de trabalho.

— O que houve, Evelyn?

— O que está achando do

desaparecimento de meu pai?

— Começo a ficar preocupado, e acho

que as suspeitas de Joe não eram

infundadas.

— Não tenho tanta certeza. Papai é

imprevisível, pode ter decidido ir até

Flagstaft, por exemplo. Ou ter ido fazer uma

visita aos Slade. Antes de viajar ele falou

que estava pensando em ficar alguns dias na

casa deles.

— Vamos torcer para que você tenha

razão. — fez uma pausa e continuou: —

Outra coisa é Roy. Mostrou que não é

pessoa adequada para trabalhar conosco. A

encrenca o persegue. Já lhe contaram dos

dois incidentes que tiveram na viagem?

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— Sim, mas isto não é razão para o

julgarmos mal.

— Ele é um covarde. Matou um homem

sem motivos, depois baleou quem o

acusava...

— Ora, Frank, como acreditar numa

provocação destas? Além do mais, ele não

tem a menor atitude de um covarde e você,

mais do que ninguém, sabe disso...

— Vejo que não adianta tentar lhe abrir

os olhos. Você deve estar enamorada dele...

— Não, não estou. Mas se estivesse, era

problema meu, Frank.

— Está bem. Não serei o obstáculo que a

impeça de namorar o homem que pode até

ter matado seu pai — falou Frank,

destilando despeito.

Em seguida o capataz levantou-se e saiu,

sem dizer mais nada e sem olhar para

Evelyn, que ficou estupefata.

Os vaqueiros que o viram sair irritado

foram até o alojamento. Observaram-no

arrumar sua mala.

— O que houve? — perguntou-lhe Alan.

— Vou embora do rancho. Renuncio ao

meu cargo.

Roy e Joe e os outros vaqueiros entravam

no cercado naquele momento, preparando-

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se para continuar a domar Rock. Roy foi o

primeiro a querer montá-lo.

Desta vez decidido a não se deixar

vencer.

Evelyn, que vinha saindo para a varanda,

passou a observá-lo. Joe a viu e

compreendeu, pelo olhar dela, o que se

passava em sua mente. Mas nada podia

fazer para ajudá-la, pelo menos por

enquanto.

Evelyn desceu as escadas e foi para junto

da cerca. Nesse instante, Rock lutava para

se livrar de Roy, que já conhecia todas as

manhas do animal e conseguia, com algum

esforço, manter-se firme na sela.

A dona do rancho sorria, admirada,

esquecendo-se, por instantes, de suas

preocupações e da ríspida conversa com

Frank. Inesperadamente, no entanto, Robert

Benson entrou cavalgando no pátio do

rancho e foi amarrar seu cavalo diante da

casa.

— É o Benson, patroa — disse um dos

vaqueiros.

— Maldito! Devia expulsá-lo a pontapés

daqui — rugiu a garota.

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— Ele não viria até aqui se não tivesse

algo importante a tratar, não? — comentou

o mesmo vaqueiro.

Joe, ao lado, observava a reação de sua

patroa.

— Quer que eu vá com você, Evelyn? —

indagou

— Não, acho que ele não viria aqui se

não estivesse com o espírito desarmado.

Vou ver o que ele quer.

Roy continuava sua luta com Rock, mas

perdeu a concentração, observando aquele

homem que, no alpendre, esperava pela

aproximação de Evelyn.

Todos os vaqueiros faziam o mesmo.

Rock aproveitou-se do momento e atirou

Roy ao chão. O vaqueiro teve que rolar com

agilidade para não ficar sob as patas do

animal enfurecido.

— Dome-o, Roy — falou Evelyn,

percebendo a queda e desfazendo a tensão

que se estabelecera no ar.

Os vaqueiros trataram de imobilizar Rock

novamente.

— Vai tentar de novo, Roy? —

perguntou um deles.

— Sim, claro — concordou Roy,

segurando o cavalo pelo cabresto,

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assoprando em seu focinho, depois

conversando com ele com a voz bem calma.

Em seguida voltou a montá-lo e

permanecer firme na sela. Após algum

tempo, conduzia o animal com habilidade

ao redor do curral. Rock cedera à

determinação de seu cavaleiro.

Olhou na direção do alpendre, esperando

ver Evelyn acompanhando a cena, mas não

a encontrou.

Naquele momento, ela estava em seu

escritório com Robert Benson. Com uma

amabilidade que a surpreendia, o advogado

e rancheiro disse:

— Vim para lhe propor uma trégua,

Evelyn, e para lhe assegurar que sou

absolutamente sincero nisso. No caminho,

porém, encontrei seu capataz, que

abandonava o rancho. Eu soube, então, da

terrível notícia...

— Espere um pouco! De que notícia está

falando? — interrompeu-o ela.

— Da morte de seu pai — falou ele,

demonstrando surpresa pela reação dela.

Aquilo foi dito com tanta franqueza que

Evelyn empalideceu, sem saber como

reagir. Diante de seu inimigo, porém,

esforçou-se para demonstrar firmeza.

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— O que sabe sobre isso? — indagou,

num fio de voz.

— Apenas o que seu capataz me contou.

De concreto nada mais sei. Posso dizer,

porém, que estive com seu pai em Winslow.

Desde a minha volta desejava dizer a ele

que as nossas desavenças não favoreciam a

nenhum de nós. Ele concordou comigo e até

chegamos a um acordo. Eu prometi proibir

que meus homens provocassem os do seu

rancho e...

— Você esteve com meu pai em

Winslow? — cortou-o ela novamente.

— Sim, fizemos um acordo, conforme

lhe contei. Ele ia segurar seus homens, da

mesma forma que eu faria. Eu soube que

houve um incidente esses dias atrás, mas

puni severamente meus homens por terem

cruzado o rio. Pensei que já soubesse de

tudo isso, pois seu pai disse que iria

regressar ao rancho o mais depressa

possível. Se não chegou ainda, essa notícia

de que tenha sido assassinado não me

parece tão descabida assim...

Evelyn fez um esforço enorme par

manter o controle e conter as lágrimas que

teimavam em aflorar em seus olhos. Sua

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preocupação com a vida de seu pai tornou-

se muito forte agora.

— O que você me disse me fez ficar

muito preocupada, Robert. Amanhã mesmo

irei a Winslow falar com o xerife.

— Frank me contou que você contratou

um novo vaqueiro...

— Sim, e o que tem ele?

— Bem, pelo que Frank me contou e pelo

que ouvi de alguns de meus vaqueiros que

estavam no saloon, naquele dia, é muito

provável que esse rapaz seja o assassino de

seu pai. Frank disse que, quando ele

chegou, trazia consigo um alforje parecido

com aquele que seu pai usava.

— Frank deve estar maluco! — descartou

a garota.

— Mas não custa verificar...

— Está bem, já fez seu papel de bom

vizinho — ironizou a garota. — Agradeço

sua visita, mas peço-lhe que se vá agora.

— Não sem antes lhe dizer uma coisa que

há muito tempo eu deveria ter dito, mas não

tive coragem — pediu ele e seu tom de voz

era convincente e aparentemente sincero.

— O que é? — perguntou ela, com

rispidez, pois não conseguia acreditar na

sinceridade dele.

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— Eu sempre a admirei muito, Evelyn...

Robert poderia até estar sendo sincero na

declaração que iniciava, mas isso em nada

afetava ou emocionava Evelyn. Pelo

contrário, isso a enfurecia e enojava.

— É melhor parar! Este é um assunto em

que jamais chegaremos a um acordo.

— Por favor, Evelyn! Seja razoável e

menos cruel. Dê-me a oportunidade de

provar-lhe a sinceridade de meus

sentimentos. Eu sei que agi...

— É inútil! — falou ela, elevando o tom

de voz. — Nada sinto por você, Robert...

Exceto asco!

Ele a olhou duramente. Por momentos

sua expressão permaneceu assim, depois foi

se transformando numa careta de ódio e

desprezo que assustou a garota.

— Então é verdade o que disse o seu

capataz — começou ele, com ironia na voz.

— Não sei o que Frank possa ter-lhe

contado e, sinceramente, pouco me interessa

saber o que foi. Agora sai!

— Pois a mim o assunto interessa e

muito. Você está apaixonada pelo provável

assassino de seu pai. Por que não manda

revistar as coisas dele e encontrar esse

alforje?

Page 193: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Basta! — disse ela, apanhando uma

chibata sobre a mesa e vergastando seu

vizinho.

Robert aparou o golpe com o antebraço,

mas a dor foi lancinante. Ele empurrou a

garota, derrubando-a numa poltrona. Olhou-

a como se fosse esganá-la, depois virou as

costas e saiu.

Joe, que estava no lado de fora, entrou

assim que o rancheiro saiu.

— O que houve, patroa? Por que está

chorando? Se aquele canalha a insultou —

disse ele e já ia sacando a arma.

— Não, por favor, Joe, não faça isso! —

pediu ela, levantando o rosto para ele.

Hesitou por instantes, antes de manifestar

sua preocupação.

— Joe, acho que meu pai foi assassinado!

— afirmou.

— Quem lhe disse isso? Benson?

— Frank disse sugeriu a mesma coisa...

— E o que eles sabem a esse respeito?

— Lançaram uma suspeita.

— Sobre quem?

— Roy!

— É um absurdo, Evelyn. Conheço

aquele rapaz há poucos dias, mas ponho a

minha mão no fogo por ele.

Page 194: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Com certeza é uma trama, Joe, uma

calúnia infame... Roy jamais mataria meu

pai... Por que o faria? Que motivo teria para

isso?

— Concordo com você, patroa. Não

acredito que Roy seja um assassino. Se algo

aconteceu a seu pai, o Benson está por trás

disso tudo. É um canalha, como o velho. Eu

devia ir atrás dele agora mesmo e fazê-lo

confessar...

— Não, Joe, por favor! Eu insisto —

gritou ela, ao ver que ele já tomara a

decisão.

Joe não a escutou. Apressadamente ele

deixou a casa e foi para o estábulo selar seu

cavalo. Neal e Jock notaram seu semblante

alterado e se aproximaram para saber o que

estava havendo.

— Tudo indica que o patrão foi

assassinado e eu sei quem está por trás

disso. Vou matar o maldito Benson. Aquele

canalha está tentando jogar a culpa pelo

desaparecimento do velho Grant sobre Roy,

quando ele seria o único beneficiado com

isso, deixando Evelyn desamparada.

Neal foi imediatamente à procura de Roy,

contar-lhe o que estava ocorrendo. O rapaz

havia tomado um banho para se livrar da

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poeira do tombo que levara de Rock.

Terminava de se vestir naquele momento.

— Joe é maluco! — exclamou e foi ao

encontro do velho vaqueiro.

— O que você quer fazer é loucura, Joe

— disse. — Não tem prova de que foram os

homens do Benson. E se alguém tiver de

fazê-lo engolir o que disse serei eu, não

você.

Joe relutou, pois estava realmente fora de

si. Roy conseguiu, finalmente, convencê-lo

a se acalmar. Em seguida foi à procura de

Evelyn, encontrando-a ainda no escritório

da casa.

Sua vontade era contar o que presenciara

no dia em que chegara ao rancho. Estava

quase certo de que o homem que vira

morrer era o pai dela.

Evelyn, no entanto, estava confusa e

abalada. Não conseguiu levantar os olhos

para ele, temendo revelar que tudo a fazia

suspeitar dele.

Desapontado, Roy deixou o escritório

sem nada comentar. Estava disposto a

deixar o rancho, por isso foi arrumar suas

coisas. Quando estava selando seu cavalo,

Joe se aproximou.

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— O que está fazendo, Roy? — indagou,

surpreso.

Roy não respondeu, continuando o que

estava fazendo.

— Pretende deixar o rancho também?

— Não posso continuar aqui, se ela

acredita que eu sou realmente culpado pela

morte do pai dela — confessou o rapaz.

Quando estava pronto para partir, ele

apanhou o alforje, onde estavam o ouro.

— Preste bem atenção no que vou lhe

contar, Joe. É muito importante — pediu o

rapaz.

Joe ouviu atentamente, enquanto ele

contava o que acontecera naquele dia. Em

seguida, pegou o alforje e o pôs nas mãos

do velho vaqueiro.

— Isto não me pertence. Está tudo aí.

Nada tirei. Entregue-o a Evelyn, assim que

eu partir. Isto pode ter sido do pai dela, não

sei. Só sei que estava próximo do homem

que vi morrer.

Joe ficou perplexo. Mal Roy saiu, ele

correu mostrar o alforje a Evelyn.

— É o alforje de papai — disse ela, num

fio de voz.

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— Sim, eu também o reconheci. Todo o

dinheiro da venda da boiada deve estar aí,

Evelyn.

— E agora, Joe? Como acreditar no que

Roy disse? Frank havia me falado deste

alforje...

— Está achando ainda que Roy é

culpado?

— Como não pensar outra coisa? —

falou ela, com desespero.

— Se ele matou seu pai para roubá-lo,

por que teria vindo para este rancho,

trabalhar por cinqüenta dólares por mês? E

por que teria devolvido tudo isto? —

argumentou o vaqueiro.

— Eu não sei, Joe. Eu não sei! —

explodiu ela, confusa, deixando que as

lágrimas fluíssem de seus olhos.

Quando deixou o rancho, Roy pensou

inicialmente em sumir daquela região. Mas

havia algo que o incomodava, por isso,

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cedendo ao apelo da encrenca que vinha

sempre ao seu encontro, rumou para

Winslow.

Quando chegou, já era noite. Procurou

uma pensão onde ficar. Jantou, depois

resolveu ir até o Moonlight Saloon, o mais

perigoso de toda a região.

O balcão ficava de frente para a porta, na

parede dos fundos. As mesas de jogo

espalhavam-se pelo salão. Ele foi pedir um

uísque.

O bartender serviu-o. Ele tomou de um só

gole, depois jogou uma moeda sobre a

madeira. Virou-se e olhou os homens que

jogavam. Resolveu arriscar sua sorte.

Estava ficando sem dinheiro, por isso

nada melhor do que ganhar alguma coisa.

Antes de mais nada, sondou o ambiente.

Viu um homenzinho vestido como um

janota. Tinha cabelos longos e jogava

calculando as apostas.

Aquilo parecia dar resultado, pois ele

ganhava invariavelmente. Roy decidiu

seguir o jogo dele e apostar nos mesmos

números. Se ganhasse, o dinheiro viria bem

a calhar.

Quando ia apostar, percebeu que dois

homens ao lado do jogador haviam tomado

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a mesma decisão. Aborrecido por ser

seguido constantemente no jogo, ele

esperou a roleta ser girada e,

inesperadamente, trocou de número.

Novamente a sorte o privilegiou e ele

ganhou, para desagrado dos dois homens,

que se olharam, enfurecidos.

O crupiê pagou a aposta ganhadora. O

homenzinho começou a recolher as fichas.

Um dos homens segurou-o pelo pulso.

— Você nos enganou! Fez com que

jogássemos no número errado.

— Mudei de idéia no último momento,

apenas isso — disse o jogador.

— Seja como for, vai nos pagar o

prejuízo!

— Você jogou e se deu mal, parceiro —

falou Roy, contornando a mesa e encarando

o homem que tentava juntar as fichas da

mesa.

— Por que se mente onde não é

chamado? — perguntou o homem, com cara

de poucos amigos.

— Não gosto de gente encrenqueira —

afirmou Roy.

— Encrenqueiro? Já verá quem é o

encrenqueiro aqui. Vou lhe mostrar o que

faço com quem se mete em meus assuntos...

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Roy permaneceu na defensiva, esperando

o ataque. No momento exato ele se

esquivou do punho que vinha em sua

direção e, em resposta, acertou o nó dos

dedos violentamente no queixo de seu

agressor.

O homem foi jogado para trás como se

tivesse levado um coice de um cavalo

selvagem. Seu amigo tentou ajudá-lo,

apanhando uma cadeira e erguendo-a para

atingir as costas do vaqueiro.

Uma das garotas do saloon gritou,

alertando-o. Ele se virou a tempo de se

desviar. A cadeira arrebentou-se na mesa de

jogo. Roy enfiou a ponta da bota nas

costelas do homem.

Ele gemeu e se dobrou, caindo de joelhos

diante do vaqueiro. O primeiro deles se

erguia, ainda aturdido, e tentava sacar a

arma. Roy se antecipou, mirando seu Colt

entre os olhos do outro, tirando-lhe toda a

vontade de sacar.

— É melhor dar o fora, parceiro! Gente

da sua laia me deixa nervoso e com cócegas

no dedo — avisou.

Praguejando e jurando vingança os dois

se levantaram e, apoiando-se um no outro,

deixaram o estabelecimento.

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— Você é muito valente, rapaz — disse-

lhe, agradecido, o homenzinho. — Se eu

fosse tão jovem e tão forte como você, juro

como limparia o mundo desses

aproveitadores.

— Seria um trabalho muito nobre,

senhor, mas muito difícil. Duvido que

conseguisse dar cabo de todos eles.

Enquanto falavam, entrou no saloon um

homem corpulento, com o rosto marcado

por uma profunda cicatriz. O dono do

estabelecimento foi ao seu encontro.

— Ali está um que merecia mil vezes a

forca — disse o jogador, disfarçadamente.

Roy olhou naquela direção. O grandalhão

conversava com o dono do saloon, que logo

em seguida foi ao encontro de Roy.

— Meu rapaz, importa-se de aceitar um

trago do cavalheiro que acaba de chegar?

Roy olhou para o homenzinho, que fez

uma careta de desagrado.

— Está bem — concordou Roy, intrigado

com o convite.

Foi até lá. O grandalhão chamava-se

Stevens.

— Soube que lidou facilmente com dois

malandros aqui, ainda há pouco. Sei

também que foi expulso do rancho onde

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trabalhava. Está à procura de trabalho? —

ofereceu o grandalhão.

— Se for rentável...

— Fique por aí, eu o procuro — disse o

grandão.

Roy retornou em seguida para junto do

homenzinho.

— Pensei que fossem brigar. Aquele

grandão é amigo dos dois homens que você

expulsou daqui.

— As coisas nem sempre precisam ser

resolvidas com violência — falou Roy.

— Concordo com você. Na verdade,

detesto violência. Ela sempre tira a minha

concentração e muda a minha sorte — disse

o homenzinho e estava com a razão.

A partir daquele momento, sua sorte

sumiu como por encanto e seu

temperamento antes calmo mudou-se da

mesma maneira.

Fez uma série de apostas seguidas,

perdendo todas.

— Maldição! — gritava ele, quando a

bola não parava no número apostado. —

Para mim chega. Eu já vou — disse ele,

irritado, afastando-se.

Roy continuou jogando, já que a sorte o

favorecia. Após ter ganho dólares

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suficientes para alguns dias, deixou a mesa

e foi para a pensão descansar.

Na manhã seguinte, após o desjejum,

quando saiu para andar pela cidade,

encontrou o homenzinho no alto de um

palanque de madeira improvisado na

traseira de uma carroça. Um grupo de

pessoas o ouvia com interesse.

— Senhoras, senhores, rapazes e

senhoritas, agora vou lhes oferecer um

produto maravilhoso. Algo excepcional.

Esta pomada foi elaborada por abnegados

homens de ciência, que trabalham

incansavelmente para o bem da

humanidade. Com ela estarão protegidos de

mordidas de cobras, aranhas...

Roy sorriu. Aproveitou para levar sua

égua até o ferreiro para fixar novas

ferraduras. Enquanto esperava, viu Frank e

Stevens, o grandalhão, passando juntos e

entrando numa casa logo à frente.

— Quem mora ali? — indagou ao

ferreiro.

— Normalmente fica desocupada, à

disposição do juiz itinerante. Pelo que sei,

ele está lá hoje.

Roy ficou intrigado com tudo aquilo.

Quando Linda ficou pronta, finalmente,

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levou-a para o estábulo, mandou escová-la e

dar-lhe uma ração extra de aveia.

Em seguida foi para a pensão almoçar.

Assim que se acomodou, viu o homenzinho

entrar e procurar uma mesa livre. Com um

aceno de mão, Roy convidou-o para se

juntar a ele.

O homenzinho agradeceu e se sentou,

com um sorriso cansado nos lábios.

— Como foram os lucros hoje? —

indagou Roy.

— Não me incomodo com os lucros —

respondeu ele. — Faço isso apenas para me

divertir e viajar pelo país. É o tipo de vida

que me agrada.

— É um sujeito interessante. Está há

muito tempo aqui?

— Alguns dias.

— Conhece o sujeito grandalhão de

ontem, o da cicatriz na cara?

— É Stevens Forest, um cascavel de

perigoso, um fora-da-lei!

— Interessante! — comentou Roy. — Eu

o vi entrando hoje na casa do juiz

itinerante...

Os olhos do homenzinho brilharam.

— Foi bom você tocar no assunto. Deve

haver alguma coisa entre aqueles dois.

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Conheço o Juiz Bradley há muito tempo.

Tenho cruzado com ele pelos condados do

Arizona todo. O que é interessante é que,

mais cedo ou mais tarde, onde está o juiz

aparece o tal de Stevens. Não sei que tipo

de arranjo há entre esses dois, mas tenho

curiosidade em saber.

— Eu também — afirmou o rapaz.

— Curiosidade?

— Na verdade, não. Tenho uma razão

especial para descobrir o que anda se

passando por aqui. Há alguns dias atrás,

presenciei o assassinato de um homem e

agora estão tentando lançar a culpa desse

crime sobre mim. Vou lhe contar em

detalhes o que houve — falou o rapaz.

Roy contou o que havia acontecido desde

que chegara à região. O homenzinho

olhava-o com preocupação, enquanto ouvia

sua história.

— Se eu fosse você, rapaz, dava o fora

logo dessa região. Isto aqui é um ninho de

cascavéis.

— Não posso me afastar agora. Se fizer

isso, estarei confirmando as acusações

falsas. E Evelyn acabará acreditando que eu

assassinei o pai dela.

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— Ficarei de olhos e ouvidos abertos por

aí. Se souber de algo, eu o avisarei.

— Grato por isso — falou o rapaz,

pensando que tipo de proposta de trabalho

Stevens lhe apresentaria.

O Moonlight Saloon estava repleto

naquela noite. Stevens entrou, olhando ao

redor. Foi até o balcão, onde indagou:

— Viu aquele rapaz com quem tomei

uma bebida ontem? — indagou ao

bartender.

— Ainda não apareceu.

— Quem está lá em cima?

— Buck e Streacky. Jim Rebound acaba

de chegar.

Stevens virou-se para a porta. Um

homem, com chapéu de abas largas, rumava

na direção do balcão.

— Olá, chefe! Cheguei a tempo?

— Sim, vamos subir — convidou-o

Stevens.

Foram até uma porta ao lado do balcão,

entrando num corredor. No fundo dele via-

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se uma escada que conduzia à parte de cima

da construção.

Enquanto isso, Roy e o homenzinho

também chegavam. O rapaz foi até o balcão,

enquanto o outro ia jogar.

— Esperam-no lá em cima — disse o

bartender, apontando a porta ao lado, onde o

dono do saloon esperava por ele.

Seguiu-o. Subiram os degraus até um

corredor com portas de ambos os lados. O

homem que o acompanhava levou-o até a

última delas, onde bateu com os nós dos

dedos.

Um cheiro azedo de uísque recebeu-os,

quando a porta foi aberta.

— Olá, rapaz! — cumprimentou Stevens,

olhando para Roy. — Sente-se! Tome uma

bebida conosco!

Roy obedeceu, atento a tudo o que

acontecia ao seu redor. Sentiu no ar o cheiro

de encrenca e havia indícios disso por toda

parte.

A cadeira reservada para ele punha-o no

lado oposto da porta onde, agora,

encostava-se um dos homens, com as mãos

descansando nas coronhas de seus Colts.

Roy tinha certeza de reconhecê-lo.

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Stevens serviu pessoalmente o copo do

vaqueiro.

— Como deve ter observado — disse

Stevens, — aqui estão alguns dos melhores

homens com quem já trabalhei. Penso

também que conhece alguns deles, como o

velho amigo Buck, ali na porta.

— Eu me lembro muito bem de sua cara

— falou Buck. — Temos uma velha conta

para resolver — acrescentou e as mãos se

fecharam nas coronhas de seus revólveres,

que voaram para fora de seus coldres, antes

que Roy pudesse fazer um movimento.

— Acalme-se, Buck! Estamos aqui para

algo muito mais importante. Essas questões

pessoais ficam para depois — falou

Stevens, pondo-se em pé, entre Buck e Roy.

Buck hesitou, depois acalmou-se. Stevens

voltou a se sentar e encarar Roy.

— Temos uma missão muito importante,

Roy. Precisamos recuperar o ouro que

estava com James Grant, no dia em que ele

foi morto. Sabemos que o alforje foi visto

com você. Assim, o que tem a fazer e

devolvê-lo para nós.

— E se eu me negar?

— Teremos que matá-lo — respondeu

Stevens, sorrindo cinicamente. — Por outro

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lado, não poderá usufruir daquele dinheiro,

pois estaremos em sua cola. Para mostrar

como somos compreensivos, vamos lhe dar

uma parte... Dez por cento, digamos!

Roy sabia que tudo aquilo era um jogo e

que Stevens jamais cumpriria aquele

acordo. Nada lhe restava fazer, no entanto,

senão fingir que aceitava tudo aquilo e

esperar o melhor momento para reagir.

Entendia agora o que Frank fazia na

companhia de Stevens naquela manhã. Na

certa o ex-capataz contara ao grandalhão

sobre o alforje.

— O ouro está escondido... Terei de ir

buscá-lo — disse o rapaz.

— Tudo bem, nós iremos com você.

— Só que não poderá ser feito esta noite.

Não conheço tão bem a região para fazer

isso. Teremos que ir ao amanhecer para

poder encontrar o local.

— Só tem que nos dar a direção.

Poderemos ganhar tempo cavalgando à

noite. Quando amanhecer, estaremos perto

— propôs Stevens, frustrando o plano do

vaqueiro.

— Acho que não me resta outra

alternativa senão obedecer. Vocês estão

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com a faca e o queijo nas mãos. Vamos lá,

então.

— Certo, rapazes! Vão preparar os

cavalos. Eu e Roy desceremos em seguida.

Os homens foram cumprir as ordens.

— Não tente nenhuma gracinha, pois eu

estarei atrás de você — falou Stevens,

fazendo Roy caminhar na sua frente.

Desceram para o salão. Quando

atravessavam-no, o homenzinho veio ao

encontro de Roy, mostrando um punhado de

fichas.

— Veja, estou com sorte hoje — afirmou,

distraindo Stevens.

Roy agiu como um felino. Deu um passo

para o lado e outro para trás, enquanto

sacava sua arma. Enfiou o cano nas costelas

de Stevens.

— Fique fora, homenzinho! — pediu

Roy.

Quando o pistoleiro se deu conta do que

acontecia, estava à mercê do vaqueiro.

— A situação mudou, Stevens — falou

Roy. — Agora posso lhe dizer a verdade: o

ouro não está mais comigo, já foi devolvido

à verdadeira proprietária.

— Pagará caro por isso — afirmou o

grandalhão.

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Os outros pistoleiros retornaram com os

cavalos, inclusive com a imponente égua

que pertencia ao vaqueiro. Pararam na porta

ao ver que Roy dominava Stevens.

— Vou levá-lo direto para o xerife. Vai

contar a ele o que sabe sobre a morte de

James Grant. Diga aos seus amigos para que

se afastem.

O grandalhão hesitou. Seus homens

estavam com as armas nas mãos, esperando

suas ordens.

— Atirem! O ouro está com a filha do

velho — gritou, ao mesmo tempo em que

tentava se jogar no assoalho.

Roy percebeu a intenção dele, segurando-

o pelo colarinho da jaqueta de couro,

mantendo-o a sua frente, como escudo. O

corpo do grandalhão estremeceu repetidas

vezes, enquanto as balas cravavam-se nele.

O vaqueiro respondeu ao fogo com

rapidez. Dois dos homens que estavam

parados na porta foram arremessados para

trás, indo se estatelar na poeira da rua.

A confusão foi geral no saloon, com as

pessoas se atirando no assoalho ou

escondendo-se atrás das mesas. As

bailarinas e as garotas que serviam gritavam

apavoradas.

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Rapidamente os outros pistoleiros

sumiram. O homenzinho correu para junto

de Roy.

— Que diabos está acontecendo por

aqui? — indagou.

— Tenho certeza agora. Stevens e seus

homens estavam por trás do assassinato de

James Grant, o rancheiro de quem lhe falei.

Dois deles escaparam e sabem do ouro.

Temo que vão atrás de Evelyn. Com certeza

devem formar um bando. Vou até o rancho

avisá-los. Não tenho outra saída — decidiu-

se o rapaz.

Linda estava selada, diante do saloon.

Montou-a e galopou o mais rápido que

podia na noite clara. Era madrugada,

quando chegou ao rancho. Havia um

homem vigiando na porteira. Ao ouvir o

galope, armara-se e esperava.

— Abra, sou eu, Roy — disse ele, ao

reconhecer o vaqueiro. — Vá avisar os

outros. Acho que o rancho vai ser atacado.

O vaqueiro hesitou, depois atendeu. Pelo

que conhecia de Roy, sabia que ele era

honesto. O velho Joe insistia nisso.

Os dois homens correram para o

alojamento.

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— Acorde, pessoal! Temos que proteger

o rancho. É uma longa história e depois eu

conto tudo. Vamos nos espalhar e esperar

por eles. Alguém vá avisar Evelyn...

— Evelyn não está. Soube que o juiz

itinerante estava na cidade e foi até lá falar

com ele a respeito do desaparecimento do

pai dela e do alforje que estava com você,

Roy — explicou Joe.

— Diabos! Por que não cruzei com ela?

Mas agora não importa. Vamos preparar

nossa defesa — decidiu o rapaz.

Os homens se posicionaram e

aguardaram. Após pouco mais de meia

hora, viram sombras se movendo pelo

pasto, vindo na direção da casa.

— Lá estão eles — apontou Roy.

Os pistoleiros vinham em silêncio,

trazendo rifles. Naquele momento, estavam

em campo aberto e era um alvo fácil.

— Fogo neles! — ordenou Roy.

A primeira descarga derrubou três dos

invasores, que ficaram se contorcendo e

gritando de dor na grama. Imediatamente

eles se dispersaram e mais alguns deles

ainda foram atingidos, até que os restantes

pudessem sumir de vista.

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Roy mandou reunir os cadáveres. Entre

eles estava Buck, o assassino de James

Grant.

— Este foi o assassino de Grant — disse

o rapaz.

— É o sujeito que o empurrou no Marvel

Saloon — reconheceu Joe.

— Sim, esse mesmo.

— Fico feliz em saber de sua inocência,

meu rapaz — falou Joe, com sinceridade. —

Acho que Evelyn também se convencerá

disso. Aliás, acho que ela nunca duvidou

realmente.

— Espero que sim, Joe. Mas há mais

coisas envolvidas na morte de seu patrão e

vou descobrir isso ainda.

Evelyn havia conversado com algumas

pessoas na cidade, inclusive com vaqueiros

que haviam acompanhado seu pai, durante a

entrega da manada.

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Todos foram unânimes em afirmar que o

viram com aquele alforje. Os vaqueiros

informaram terem sido pagos com ouro

também, o que reforçava a tese que ela

relutava em aceitar.

Seu coração mais e mais foi se tornando

oprimido e, por fim, não tinha mais como

não admitir que seu pai havia realmente

sido assassinado por aquele ouro.

Assim, com as informações de que

dispunha, resolveu procurar o xerife, antes

de falar com o juiz itinerante. No fundo,

apesar de todas as pistas apontarem na

direção de Roy, ela se recusava em aceitar

isso.

Não conseguia imaginar que ele fosse

capaz de assassinar alguém.

Na delegacia, contou tudo que sabia ao

xerife, inclusive suas dúvidas. O homem da

lei ouviu-a atentamente.

— Acha mesmo que esse rapaz nada teve

a ver com a morte de seu pai? Tem mesmo

certeza?

Ela hesitou.

— Percebe que, pelo que me contou, ele

passa a ser o principal suspeito, não?

— Sim, entendo, mas não pode ter sido

ele...

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— Investigaremos isso. Sabe que ele se

envolveu ontem à noite num tiroteio?

— Roy? E o que houve com ele?

— Não sei, sumiu da cidade, o que torna

tudo mais complicado para ela, muito

embora tenha feito um favor para esta

cidade, matando Stevens Forest e dois de

seus capangas.

— E por que Roy teria se envolvido com

eles? — estranhou ela.

— Para isso precisamos encontrá-lo, mas

meus ajudantes já vasculharam a cidade

toda, inutilmente.

— Bom, o que acha de tudo isso, xerife.

Devo procurar o juiz itinerante?

— Não vejo motivos para isso, Evelyn.

Está tudo muito vago ainda para termos um

caso concreto nas mãos. O juiz vai se

recusar a julgar Roy com apenas essas

informações que você me passou.

— Acho que tem razão, xerife. Eu o

procurarei se souber de mais alguma coisa.

— Sim, faça isso — disse o homem da

lei, despedindo-a.

Assim que a garota saiu, ele ficou

pensativo, tentando entender toda aquela

situação. A morte de Stevens e de seus

capangas fora um alívio, mas restava ainda

Page 217: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

algo que ele não entendia: a misteriosa

ligação de um bandido com um juiz.

Não lhe passaram despercebidas as

visitas do marginal à casa do magistrado.

Resolveu que era hora de tentar descobrir

alguma coisa a respeito.

Apanhou seu chapéu e tomou o rumo da

casa ocupada pelo juiz, um homem de

cabelos brancos e olhos bondosos, mas

tristes.

— Olá, xerife! Eu estava mesmo

querendo falar com você. O que foi aquele

tiroteio ontem à noite?

— Stevens Forest e dois de seus homens

foram baleados — falou o xerife, sondando

a reação do juiz.

Por momentos o velho ficou estupefato,

depois até sorriu, com certo alívio.

— Gente como ele não fará falta — disse,

num suspiro. — Quem o matou?

— Um jovem chamado Roy Dale, mas

isso não é tudo. O mesmo Roy está sendo

acusado de ter matado James Grant...

— Grant? O rancheiro?

— Sim, ele mesmo. Conhecia-o, não?

— Sim, claro. Mas como foi isso?

— James aparentemente foi morto por

causa de um alforje com alguns milhares de

Page 218: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

dólares em ouro, fruto da venda de uma

enorme boiada.

— E o que o leva a crer que foi o rapaz?

— Ele estava com o alforje, muito

embora o tenha devolvido à filha do

rancheiro...

— Espere um pouco! Está me dizendo

que o ladrão devolveu o produto do roubo?

— Aparentemente.

— Então, ou ele é inocente ou se

arrependeu.

— Acho que ele é inocente — afirmou o

xerife. — Penso também que saia quem era

o verdadeiro assassino, daí seu tiroteio com

Stevens e os outros.

— Muito interessante tudo isso, xerife.

Deveria investigar melhor o caso.

— Farei isso, juiz. Assim que tiver

alguma coisa mais positiva, eu o procurarei.

— Tem três dias para isso. Se nada

conseguir até lá, partirei para o próximo

condado e só voltarei aqui em três meses,

mais ou menos.

— Verei o que posso fazer — disse o

homem da lei, despedindo-se.

Assim que ele saiu, o juiz cobriu o rosto

com as mãos e sua expressão era de

desespero. A morte de Stevens poderia ser o

Page 219: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

alívio que já fizera por merecer, mas

infelizmente não seria assim.

O maldito contara tudo ao seu sócio, um

tal de Frank. O mesmo homem que, naquele

momento, descansava num dos quartos da

casa do juiz.

— Bom trabalho, juiz! — disse-lhe

Frank, surgindo por uma porta.

Estivera com os capangas de Stevens no

ataque ao Rancho Grant. Apenas ele e

outros cinco haviam retornado, após um

galope desesperado no meio da madrugada.

Não tinha onde se esconder nem um álibi.

Então lembrara-se do que Stevens havia lhe

contado a respeito do juiz. Ninguém poderia

lhe dar um álibi melhor que o magistrado.

— O que fizeram ontem à noite? —

indagou o Juiz Bradley.

— Nada que deva saber, juiz. O que

precisa informar é que estive hospedado em

sua casa e que jogamos cartas a noite toda.

— Não vai escapar impune a seus

crimes...

Frank gargalhou, seguro de si.

— Poupe-se de seu sermão, juiz. Olhe só

para você! Como tem coragem de me negar

impunidade? Acaso esqueceu-se que até

hoje seu crime está impune?

Page 220: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Não pode me torturar mais... Durante

esses anos todos, Stevens tem se

aproveitado de mim... De minha fraqueza...

De minha condição... Jamais bebi outra

gole, depois daquela noite...

— Pois é, juiz. Agora sabe que um

homem bêbado é capaz de coisas

abomináveis... Até de espancar e matar uma

pobre garota de saloon...

— Eu não fiz isso...

— Claro que fez... Estava tão bêbado que

nem se lembrava... Mas as testemunhas

assinaram seus depoimentos. Sua sorte foi

Stevens ter se apossado deles, senão você

teria ido parar na forca, juiz.

O pobre homem, em desespero, soluçou,

mas nada podia fazer. Estava nas mãos de

Frank.

— Mais uma coisa, juiz. Trate de aceitar

a acusação contra esse tal de Roy, pelo

morte de James Grant. Descubra um jeito de

enforcá-lo logo e me livrar dessa encrenca

— ordenou Frank, antes de sair.

Foi até uma taverna, onde encontrou com

os capangas.

— Estou assumindo o posto de Stevens.

Já fiz os acertos com o juiz. Quem de vocês

está comigo? — indagou aos cinco homens.

Page 221: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Diabos, Frank! Só temos nos metido

em confusão, desde que viemos para cá... —

falou um deles.

— Isso está acabando. Só peço que

fiquem calmos por alguns dias, até as coisas

esfriarem. Até lá terei pensado numa forma

de tirar proveito da situação.

Os homens concordaram. Frank saiu dali

e foi para o centro da cidade. Pensava em

Evelyn e nas suas terras. Com o pai morto e

Roy fora do caminho, poderia se aproveitar

da rixa entre os Benson e os Grant para

jogar um contra o outro. Com a ajuda do

juiz, poderia ficar com as duas

propriedades, o que seria o maior e melhor

negócio de toda a sua vida.

Gostou dessa idéia. Sentiu que as coisas

poderiam dar certo no momento seguinte.

Ao passar diante do hotel, viu dois dos

vaqueiros do Rancho Grant, com os cavalos

prontos para partir. Eram Jim Brand e Red

Curtis.

— Olá, rapazes! — cumprimentou-os. —

Estão de partida?

— Sim, vamos voltar para o rancho agora

mesmo.

— Onde está a patroa?

— Lá dentro, aprontando-se.

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Frank pensou por instantes. Poderia ser

um bom momento para tentar uma

reaproximação. Agradeceu os rapazes e

entrou. Evelyn já estava de saída, com

alguns pacotes.

— Deixe-me ajudá-la — ofereceu-se ele.

Reparou que, apesar do semblante triste,

ela estava muito bonita, com roupas

femininas de montaria, em lugar das roupas

de vaqueiro que costumava usar no rancho.

— Está muito bonita, sabia? — elogiou.

— Obrigada, Frank — agradeceu ela,

aceitando a ajuda e o elogio.

Foram para a rua. Enquanto os vaqueiros

prendiam os pacotes no lombo de um

cavalo, Evelyn pensava na situação. Com a

morte de seu pai, precisaria mais do que

nunca de um capataz.

Frank havia sido sempre irrepreensível

em seu trabalho. Não tinha como

administrar uma propriedade como a sua

sem a ajuda de um homem experiente como

ele.

Achou que deveria fazer-lhe o convite.

— Frank, por que não volta para o rancho

conosco? Vou precisar de sua ajuda, agora

que não tenho mais dúvidas de que papai

está mesmo morto.

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— Fala sério? — surpreendeu-se ele.

— Sim, falo sério. Não posso tocar

aquele rancho sem você.

— Isso me deixa muito feliz.

— Diga que aceita.

— Considerando que as razões de minha

partida desapareceram com a saída de Roy...

— Sim, ele também foi embora.

— Não pretende contratá-lo de novo,

pretende?

— Claro que não — afirmou ela, num fio

de voz.

— Sendo assim, dê-me tempo de ir

apanhar minhas coisas — falou ele,

exultante.

Nada poderia ser mais oportuno que o

convite de Evelyn. De volta ao rancho

poderia tramar um bom plano para se

apoderar daquelas terras.

Para garantir tudo isso, só precisava fazer

com que o juiz ficasse mais algum tempo na

cidade, até o desfecho de tudo. A melhor

forma de conseguir isso seria incriminar

definitivamente Roy Dale.

Iria pensar numa forma de conseguir isso.

Algum tempo depois cavalgavam para o

rancho. Frank ia na frente, ao lado de

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Evelyn, seguidos pelos dois vaqueiros e o

cavalo de carga.

— Soube que Benson a visitou — disse o

capataz.

— Sim, queria me propor paz e

casamento ao mesmo tempo, aquele

bastardo!

— E você?

— Eu o expulsei de lá.

— Temos de tomar cuidado com ele,

Evelyn. Agora que o Sr. Grant faleceu,

Robert Benson vai tentar de todas as formas

se apossar de suas terras.

— Ele que tente isso. Declararei guerra a

ele e a todos os que o ajudarem nessa

empreitada.

— E se ele fizer uma oferta de compra?

— O rancho não está à venda, Frank.

Jamais esteve e jamais estará, enquanto eu

for viva.

Haviam cavalgado metade da manhã,

quando perceberam um cavaleiro se

aproximando.

Evelyn estremeceu, porque reconhecia

aquela égua e seu cavaleiro. Eram Roy e

Linda, vindo a galope pela estrada. Ele

esperara o dia nascer lá no rancho,

procurando pelos arredores para ver se

Page 225: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

encontrava mais alguns dos bandidos que

haviam atacado o rancho.

Encontraram dinamite e querosene. Com

certeza pretendiam explodir e queimar o

alojamento, matando os vaqueiros para

poderem atacar com calma a casa e

vasculhá-la, à procura do ouro.

Roy surpreendeu-se ao ver Frank junto de

Evelyn, principalmente porque suspeitava

que ele era um dos que havia participado do

ataque. Tinha fugido como um coelho, mas

por que estaria de volta?

Freou sua égua diante dele, olhando-o

nos olhos.

— Você anda muito rápido, Frank, se é

que me entende — ironizou.

— Não sei do que está falando.

— Estou falando de uma porção de

amigos que você deixou lá no rancho. Eles

mandaram lembranças — frisou Roy.

— Está ficando maluco? Não sei do que

está falando... — descartou Frank.

— Claro que sabe — zombou Roy. — No

momento certo, eu provarei isso e você vai

se ver comigo.

— Estarei à espera desse momento

ansiosamente — devolveu Frank.

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Roy deu-lhe as costas para encarar

Evelyn, que o olhava totalmente confusa.

Não sabia o que estava se passando.

— O que faz aqui? — indagou ela.

— Estou vindo do seu rancho...

— E o que foi fazer lá? Pensei que

tivesse partido definitivamente — falou ela,

com rispidez, tentando entender tudo aquilo.

No fundo, não estava preparada para se

encontrar com Roy. A participação dele na

morte do pai dela era algo ainda difícil de

lidar.

— Estou vindo do seu rancho, onde fui

lhe prestar um favor — informou ele, no

mesmo tom. — Talvez devesse ter deixado

que você resolvesse sozinha — completou

ele, manobrando seu animal e afastando-se

a galope, deixando a garota e Frank

pensativos, cada qual com sua cota de

preocupações.

Roy chegou a Winslow após o meio-dia.

Estava faminto, cansado e com sono. Queria

apenas um banho, uma refeição quente e

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uma cama macia para dormir até se

recuperar daquela noite tão agitada.

Deixou seu animal do estábulo e

caminhou pela rua, na direção do hotel. Do

alto de seu palanque improvisado, o

vendedor de pomada milagrosa viu-o e

interrompeu sua pregação sempre igual,

saltando e indo ao encontro dele.

— E daí, Roy? O que houve no rancho?

— Matamos mais quatro deles, mas não

pegamos todos. Alguns deles escaparam e

voltaram para cá. Segui a pista deles até a

entrada da cidade.

— Se eu fosse você, virava nos

calcanhares e dava o fora daqui agora

mesmo...

— E por que deveria fazer isso?

— O xerife e seus ajudantes estão a sua

procura...

— Alguma coisa a ver com a morte do

Stevens e de seus capangas?

— Não, alguma coisa a respeito da morte

do rancheiro. Você está sendo apontado

como o assassino... Devia fugir!

Roy esfregou as mãos no rosto cansado.

Desde o princípio, deveria ter apanhado

aquele alforje de ouro e ido embora do

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Estado. Poderia ter ido para a Califórnia ou

para o Oregon, onde viveria como um rei.

Mas não podia viver sem encrencas. Não

podia ficar sem ir ao encontro delas. E

quando não fazia isso, elas se encarregavam

de ir ao encontro dele.

— Não, doutor, não posso fazer isso.

Estaria assinando minha confissão de culpa.

Tenho de encarar o assunto de frente e

expor meu ponto de vista ao xerife.

— Pode ser um erro...

— Talvez não. Os homens que poderiam

me ligar ao caso estão mortos. Como o

xerife provará minha culpa?

— Eu iria um pouco mais longe — falou

o homenzinho. — Lembra-se de ter visto

Stevens e Frank entrando na casa do juiz?

— Sim, mas como isso me afetaria?

— Ninguém sabe quais eram as ligações

entre eles. Digamos que o levem a

julgamento e que o juiz esteja

mancomunado com esses assassinos. O que

vai acontecer com você?

— Tem razão — concordou Roy, mas

não conseguia pensar em nenhuma outra

alternativa. — Talvez eu devesse ter uma

conversa franca com esse juiz e tentar

descobrir.

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— Não vai poder ficar circulando pela

cidade livremente — lembrou-o o

homenzinho.

— O que me sugere então?

— Deixe-me fazer isso por você — pediu

o outro, com uma expressão enigmática no

rosto.

— Você? Por que faria isso?

— Quer queira ou não, você me envolveu

nisso. Somos parceiros e quero ajudar. O

que me diz?

— Eu agradeceria se fizesse isso. Estou

mesmo morto de cansaço, incapaz de

raciocinar direito. Preciso tomar um banho,

comer e dormir...

— Faça isso. Eu verei o que posso fazer...

Mas agora é tarde para você — falou,

quando viu os ajudantes do xerife cercando-

os.

Roy pensou em reagir, mas isso só iria

complicar sua situação. O melhor a fazer

era se deixar levar pelos homens da lei e

tentar esclarecer aquela situação toda de

alguma forma.

— Você vai conversar com o juiz? —

indagou Roy ao homenzinho.

— Sim, vou fazer isso.

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— Obrigado! E a propósito, você deve ter

um nome?

— Pensei que nunca fosse perguntar! —

riu o outro. — É Doutor Robles!

Roy achou que já havia ouvido aquele

nome antes, mas estava cansado demais

para pensar a respeito.

Quando Evelyn e seus empregados

chegaram ao rancho, os vaqueiros saudaram

a volta de Frank. O velho Joe foi o único

que lhe dirigiu um olhar carregado de ódio e

surpresa.

— O que houve por aqui? — quis saber a

garota.

— Eu lhe conto — falou Joe,

acompanhando-a até o escritório.

Frank fez menção de acompanhá-los, mas

o velho pediu que ele esperasse.

— Frank vai ser o capataz de novo —

frisou ela.

Page 231: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Pode ser, mas gostaria de lhe contar o

que sei em particular — insistiu Joe.

— Está bem. Espera lá fora, Frank! —

determinou a jovem, estranhando o

comportamento do velho vaqueiro.

Conhecia-o havia muito tempo e confiava

nele o bastante para saber que havia um

motivo por trás daquela atitude.

— E então, Joe, o que está havendo?

Quem está aqui no rancho? — quis ela

saber.

— Como assim? — estranhou o velho.

— Encontramos Roy a meio caminho

daqui e ele disse a Frank que alguns amigos

dele, que estavam aqui, mandavam

lembranças...

— Pois é justamente sobre isso que

preciso lhe falar, Evelyn. Nesta madrugada

tivemos uma visita inesperada e nada

amistosa. Graças ao Roy, conseguimos

impedir que o rancho fosse assaltado. Pelo

que sabemos, estavam atrás do seu ouro.

Matamos quatro deles, mas outro tanto

fugiu. Entre os homens mortos, Roy

identificou o homem que matou o Sr. Grant.

— Tudo isso aconteceu na minha

ausência?

— Sim.

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— E graças a Roy o assalto foi evitado?

— O assalto e a morte de nossos

vaqueiros. Os bandidos traziam querosene e

dinamite. Seria uma carnificina. Felizmente

Roy chegou antes e pudemos nos preparar

para a defesa.

— E como Roy sabia de tudo isso?

— Deixe-me lhe contar tudo que ouvi de

Roy — pediu ele.

A garota ouviu com atenção. Apenas Joe

sabia do que se passara, pois Roy confiara a

ele apenas o que sabia e quais eram as suas

suspeitas.

Os vaqueiros, que com alegria haviam

recebido Frank, na certa teriam tido outro

tipo de reação se soubessem que ele estava

envolvido no assalto.

Roy recomendara sigilo. Não queria que

essas notícias circulassem antes de uma

confirmação cem por cento positiva.

— Vou voltar imediatamente a Winslow

— decidiu Evelyn. — Lancei suspeitas

sobre Roy e preciso falar novamente com o

xerife e inocentá-lo de uma vez por todas.

— Eu lhe disse desde o princípio que se

poderia confiar naquele rapaz.

Page 233: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Tem razão, Joe. Eu fui uma tola em

não ter acreditado nisso desde o princípio.

Acho que, no fundo, estava assustada...

— Assustada? Por quê? — estranhou o

velho.

— Por causa dos sentimentos que ele

despertou em mim...

— Está apaixonada por ele?

— Agora mais do que nunca! —

reconheceu ela.

— E o que vamos fazer com Frank? Roy

tem certeza absoluta que ele está envolvido

em tudo isso.

— Vamos deixá-lo aqui. Você ficará de

olho nele. Mande dois vaqueiros de

confiança se prepararem para me

acompanhar de volta à cidade.

— Está bem, mas eu ainda preferiria que

Frank fosse mandado embora.

— Não posso fazer isso, não agora, Joe,

sem provas definitivas. Acabo de contratá-

lo de volta. Talvez tenha sido um erro, mas

tudo se ajeitará, você verá.

Após a saída de Joe, Frank entrou e

tentou descobrir o que estava havendo.

Quatro de seus amigos estavam mortos,

estendidos no estábulo. Nenhum dos

vaqueiros, no entanto, suspeitava dele, mas

Page 234: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

ficara desconfiado com a insistência de Joe

para falar a sós com Evelyn.

— E então, o que está havendo por aqui?

— indagou ele.

— Sei tanto quanto você. Esses homens

tentaram atacar o rancho e foram repelidos.

Conhece algum deles?

Uma brilhante idéia lhe ocorreu naquele

momento e Frank percebeu que aquela era a

chance que esperava para semear a

discórdia no vale.

— Para lhe dizer a verdade, eu os

conheço — afirmou ele. — Vi-os no

Moonlight Saloon, conversando com Roy e

com Robert Benson...

— Como? — surpreendeu-se Evelyn,

chocada.

— Sim, pareciam muito amigos. E

haviam outros com eles. Achei estranho que

Roy tivesse tanta intimidade com o

Benson...

Novamente a dúvida instalou-se em seu

coração.

— Sabe o que penso? — continuou ele.

— Não, não faço a menor idéia...

— Acho que Robert Benson está por trás

de tudo isso. Ele quer suas terras, Evelyn, e

já começou a agir.

Page 235: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Não posso acreditar nisso...

— E quem mais teria tanto interesse em

explodir e queimar todos os nossos

vaqueiros? E se eles tivessem tido sucesso e

encontrassem você aqui, na casa? O que

teriam feito com você?

Frank conseguia ser muito convincente

em seus argumentos, fazendo balançar a

confiança que ela depositava em Roy.

Errara em relação a ele uma vez. Decidiu

que, doravante, não cometeria o mesmo

erro.

Só não queria alarmar Frank, cuja

verdadeira face ela começava a conhecer

agora.

— Você pode ter razão, Frank. Acho que

há algo que deve ser feito imediatamente e

só confio em você para isso. Pegue um

grupo de homens e examine todas as nossas

divisas com o Rancho Benson,

principalmente aquela do rio.

— E se nos encontrarmos com eles?

— Você tomará a decisão correta —

afirmou ela, torcendo para que nenhum

encontro entre os dois grupos rivais

acontecesse.

Frank foi preparar o grupo, mas

continuava de olho em Joe. Parecia ter

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sentido alguma coisa soando falsa nas

palavras de Evelyn, por isso queria o velho

consigo. No momento oportuno ele o faria

falar.

Partiram logo em seguida. Evelyn

esperou que se distanciassem, depois partiu

de volta para a cidade. Queria se encontrar o

mais depressa possível com Roy e pôr um

fim em todas aquelas dúvidas que a estavam

torturando. Estava decidida a confiar nele

definitivamente, seguindo sua intuição e seu

coração.

Na delegacia da cidade, o xerife esperou

que Roy comesse alguma coisa, após

acordar, antes de interrogá-lo. Roy lhe

pedira isso por se achar esgotado, após

aquela noite tão longa.

— Sabe de que está sendo acusado, não?

— Sim, mas está enganado, xerife.

Deixe-me contar-lhe o que aconteceu

naquele dia — falou o rapaz, contando o

que sabia.

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— E por que não procurou a lei, antes de

mais nada?

— Não sou daqui, xerife! Não sabia para

que lado ficava a próxima cidade. Assim,

segui em frente e fui parar justamente no

rancho que pertencia ao homem que vi

morrer. Eu não sabia quem era ele ainda,

por isso mantive o alforje escondido.

Quando tive certeza, mandei entregá-lo a

Evelyn.

O xerife terminou de enrolar um cigarro,

depois acendeu-o, usando um graveto do

fogão, sobre o qual mantinha-se aquecido

um bule de café.

— E Stevens, por que o matou?

— Stevens estava por trás dos assaltantes.

Queria apenas recuperar o ouro, forçando-

me a entregá-lo. Fiz seu jogo, até dominá-

lo. Contei-lhe a verdade. Quando seus

homens surgiram, ele gritou que o ouro

estava com a garota, ordenando que eles

atirassem. Mataram-no, mas já sabiam do

ouro, por isso foram atrás dele, no rancho.

Antecipei-me e, graças a Linda, minha

égua, cheguei pouco antes deles.

O xerife continuava fumando e olhando

pela janela.

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— Não matei o pai de Evelyn, xerife —

insistiu Roy.

O xerife observava dois homens que

subiam a rua, na sua direção. Um era o

homenzinho que vendia pomada milagrosa.

O outro era o Juiz Bradley.

Tudo aquilo era muito estranho, mas não

o surpreendia. De alguma forma, o juiz

tinha alguma coisa a ver com tudo aquilo,

só não sabia onde nem como.

— Dr. Robles! — alegrou-se Roy, ao ver

o amigo entrar com o homem de cabelos

brancos.

— Este aqui é o Juiz Bradley, Roy. Acho

que ele tem alguma coisa a nos contar.

— O rapaz é inocente, xerife, pode ter

certeza disso. Stevens estava por trás de

tudo. Quando ele morreu, Frank assumiu

seu lugar. Stevens era um chantagista. Há

alguns anos atrás eu pensei ter matado uma

garota, num saloon, em Carson City.

Stevens fez tudo para me proteger, mas isso

me deixou em suas mãos. Forçava-me a

favorecê-lo e a seus amigos em todo tipo de

questões judiciais, onde podiam tirar algum

proveito. Eu me envergonho do que fiz. Um

homem da lei, acobertando criminosos, mas

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tive medo de receber o mesmo tratamento

que eu dispensava aos criminosos comuns...

— E por que resolveu contar tudo isso

agora?

— O Dr. Robles é, na verdade, um agente

do governo federal, do Departamento

Correcional. Viaja este Estado cuidado para

que a lei seja cumprida e os juízes sejam

imparciais. Tem provas de que eu não matei

a garota em Carson City. Tudo foi armado

por Stevens para me chantagear. Ele

planejou tudo nos mínimos detalhes.

— Por isso eu sabia que conhecia seu

nome, doutor — falou Roy. — Disseram-

me um dia que, caso cruzasse com você e

precisasse de ajuda, era só pedir.

— E quem lhe disse isso?

— Um amigo, delegado federal.

— Como viu, não pediu e acabou

recebendo a ajuda assim mesmo.

Naquele momento chegou Evelyn,

ansiosa para esclarecer a questão. Ao ver

Roy, antes de mais nada, lançou-se nos

braços dele, apertando-o com força.

— Perdoe-me por ter duvidado de você

— pediu ela, com sinceridade na voz.

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Roy abraçou-a com força, sentindo um

alívio enorme por perceber que seus

sentimentos eram correspondidos por ela.

Enquanto esclareciam a situação, os dois

vaqueiros que haviam acompanhado Evelyn

até a cidade decidiram ir tomar uma cerveja

num dos saloons.

Estavam no balcão, conversando sobre o

que Evelyn comentara durante a viagem,

uma vez que ela estava muito nervosa.

— Acha mesmo que Frank teve alguma

coisa a ver com tudo isso?

— Eu não sei. Conheço o Frank, mas não

ponho a minha mão no fogo por ele —

respondeu o outro.

Um dos amigos de Frank, remanescente

da quadrilha de Stevens, estava ao lado e

ouvia a conversa, enquanto esperava que lhe

trouxessem uma garrafa de uísque.

— Quando Evelyn libertar Roy, tenho

certeza de que ele irá atrás do Frank. Quero

estar lá para ver essa briga...

O pistoleiro voltou para junto de seus

amigos na mesa e contou o que ouvira.

— Demônios! Frank está perdido!

— Acho que deveríamos ajudá-lo —

sugeriu um deles.

— Como?

Page 241: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Vamos armar uma emboscada para

esse tal de Roy. Se ele está lá na cadeia,

quando sair será um alvo fácil.

— Tem razão. Vamos pegar os rifles,

rapazes. Frank vai nos agradecer por isso.

Enquanto os pistoleiros preparavam-se,

Evelyn se certificava, afinal, da inocência

de Roy.

— E Frank, onde está agora?

— Eu o mandei verificar nossas divisas

com o Rancho Benson — explicou ela.

— Acho melhor irmos para lá — decidiu

o xerife. — É bem possível que ele inicie

uma guerra por lá, só para tirar alguma

vantagem.

— Com certeza quer os dois ranchos.

Com a ajuda do juiz, não seria difícil

conseguir isso, não é mesmo? — comentou

Roy, olhando para o magistrado, que

abaixou a cabeça, envergonhado,

confirmando.

— Vamos para lá impedí-lo —

determinou o xerife.

O grupo dispôs-se a partir imediatamente.

Os ajudantes saíram na frente. O xerife, Roy

e os outros vinham em seguida, quando uma

descarga vindo do outro lado da rua

Page 242: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

derrubou quatro dos ajudantes e arrebentou

as vidraças da cadeia.

— Para dentro! — ordenou Roy, puxando

Evelyn e o xerife.

Este, porém, não teve sorte. Um balaço

atingiu-o no peito, jogando-o para dentro do

prédio.

Os homens caídos lá fora gemiam de dor.

Alguns apenas ofegavam, olhando o sangue

esguichar dos ferimentos em seus corpos.

As pessoas que passavam pela rua

sumiram como que por encanto. As janelas

e portas foram fechadas. O cheiro de

pólvora e morte espalhou-se pela rua

principal. O silêncio pesado só era quebrado

pelos gemidos de dor e pedidos de ajuda.

— O que está havendo? — indagou

Evelyn, aturdida, tentando estancar o

sangue que escorria do peito do xerife.

— Não sei... Com certeza os homens que

conseguiram escapar do assalto ao rancho

— opinou Roy, apanhando a Winchester

que o xerife deixara cair.

Pôs um chapéu que estava caído no cano

e levantou-o lentamente na janela. Uma bala

certeira jogou o chapéu para trás, na direção

da parede, mostrando que os emboscadores

Page 243: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

estavam atentos e não desistiriam

facilmente de seu intento.

Roy engatilhou o rifle. Lembrou-se que

aqueles homens haviam levado querosene e

dinamite para o ataque ao rancho. Se

haviam feito a mesma coisa para aquela

emboscada, a situação era crítica para eles,

encurralados ali.

Olhou a porta aberta.

— Doutor, pode atirar por aquela janela

ali, distraindo os emboscadores?

— O que pretende fazer?

— Pegá-los de surpresa.

— Não, Roy, é perigoso! — pediu

Evelyn.

— Se eles tiverem dinamite ainda,

estamos perdidos — mencionou ele.

Foi o bastante para o doutor atendê-lo

sem pestanejar. Apanhou o Colt do xerife e,

apontando apenas o cano pela janela,

começou a disparar um tiro atrás do outro.

Roy respirou fundo e saiu como um

felino pela porta, rolando no alpendre. Ao

fazer isso, foi memorizando a posição dos

homens do outro lado da rua.

Estes, quando o viram, desviaram seus

tiros na direção dele. Roy fez fogo e atingiu

um deles na testa, fazendo-o recuar e bater

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num amigo, que se desequilibrou e caiu

junto.

Ao se levantar aturdido, o pistoleiro

procurou por seu rifle e um tiro certeiro

atingiu-o nas costelas, fazendo-o gemer e

cuspir sangue imediatamente.

Os outros três esgotaram a munição de

seus rifles, sem atingir o vaqueiro.

— Ele é um demônio! — gritaram,

tentando correr para os cavalos.

Roy se ergueu e fez fogo no último deles.

A bala partiu-lhe a espinha e ele caiu como

um boneco desarticulado. Os outros dois

conseguiram chegar aos cavalos.

Sem hesitar, o vaqueiro atirou no animal,

derrubando-o sobre um dos pistoleiros. O

último ainda conseguiu firmar-se no estribo.

Quando Roy disparou, seu chapéu voou

para cima, levando consigo cabelos e

miolos do pistoleiro, que caiu como um

saco de batatas da sua sela.

Apenas um estava vivo e preso sob o

cavalo. O animal debatia-se, enlouquecido

pela dor. A cada movimento, quebrava mais

um osso do corpo do pistoleiro, que uivava

de dor, enquanto lascas de osso afloravam

em sua pele.

Ele agonizava junto com o animal.

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Enquanto percorria as divisas do rancho,

Frank ia armando seu plano. Jogar Evelyn

contra Robert Benson não seria tão difícil

assim, já que a rivalidade entre eles era

antiga.

Todo o tempo, porém, preocupava-o a

vigilância que Joe exercia sobre ele. Além

disso, a expressão no rosto do velho

vaqueiro era realmente inquietante.

Precisava encontrar uma forma de livrar-

se dele também.

— Sabem, rapazes, acho que temos um

espião em nosso meio — comentou ele,

quando retornavam para o rancho, após

verificar as divisas e nada encontrar de

anormal.

— Como assim? — indagou alguém.

— Alguém que está aqui e que manda as

informações para o Benson, alertando-o.

Por isso não encontramos com nenhum

grupo deles hoje.

— Tem certa lógica — afirmou um deles.

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— E como esse espião teria informado o

Benson que estávamos a caminho? —

indagou Joe, querendo pegar Frank pela

palavra.

— Eu não sei... Um sinal de espelho já

seria o bastante...

— Está ficando louco, Frank — afirmou

o velho e, naquele momento, Frank teve

certeza de que ele suspeitava.

De volta ao rancho, Frank foi à casa

principal, à procura de Evelyn, mas não a

encontrou no escritório. Estranhou isso.

— Não vai encontrá-la aí — falou Joe,

aparecendo em seguida.

— Olhe aqui, velho, já estou farto de

você me seguindo e me observando todo o

dia hoje. O que quer de mim, afinal?

— Que conte a verdade — exigiu o

velho.

— E qual é a verdade?

— Você era cúmplice de Stevens Forest.

Esteve aqui, no ataque ao rancho, para

recuperar o ouro. Na certa tem algum plano

para se apoderar das terras. Acho que ficou

ambicioso demais em muito pouco tempo,

Frank.

— E o que você sabe sobre ambição,

velho? Todo esse tempo servindo aquela

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garota mimada e idiota, paparicando-a,

arrastando-me aos seus pés para que ela

olhasse para mim. Sim, sou ambicioso.

Queria me casar com ela para herdar este

rancho. Como sei que isso não será mais

possível, tentarei outros meios.

— Foi longe demais, Frank.

— Não, velho! Você é que foi longe

demais. Sabe o que vou fazer? Vou matá-lo

aqui e agora. Direi que você era o traidor.

Vou pôr um espelhinho no seu bolso, para

reforçar as suspeitas...

— Tarde demais — falou uma voz, vinda

de algum ponto do aposento.

Frank estremeceu, reconhecendo-a. A

porta, que estava entreaberta, foi

empurrada. Roy surgiu, emoldurado pelos

batentes.

— Mas que diabos! Nunca vai me dar

paz? — resmungou ele, olhando com ódio

para seu rival.

— Entregue-se, Frank. O Juiz Bradley

contou como estava sendo chantageado e

que você pretendia se apossar das terras de

Evelyn...

— Bastardo! Já me incomodou demais!

— rugiu Frank, levando a mão a sua arma.

Page 248: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

Roy estava atento, esperando por aquele

movimento. Sacou sua arma com incrível

rapidez e disparou, atingindo o peito do seu

oponente, que deixou cair o revólver e

arregalou os olhos, enquanto recuava, até

apoiar-se na parede.

Ficou ali, olhando atonitamente,

enquanto Evelyn surgia ao lado de Roy,

abraçando-o. O casal olhava para o ex-

capataz, que agonizava.

— Eu não queria muita coisa —

murmurou e começou a escorregar

lentamente para o assoalho, deixando uma

trilha de sangue na parede.

Sentou-se e estremeceu. Vomitou sangue,

depois seu tronco tombou para frente e ele

ficou imóvel.

— Foi horrível! — exclamou Evelyn.

— Por um triz, meu amigo. Se demorasse

um pouquinho mais, esse bastardo teria me

matado.

— Não tinha perigo. Eu estava na porta,

atrás de você. Felizmente tudo acabou agora

— falou Roy.

— Sim, acho que teremos paz por aqui,

inclusive com o Benson. Depois do que vai

acontecer aqui, tenho certeza de que ele

jamais pensará em incomodar-nos de novo.

Page 249: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

Evelyn e Roy se olharam, intrigados.

— E o que vai acontecer aqui? —

indagou a garota.

— Ora, vamos ter um patrão. Quando

pretendem se casar?

A garota olhou Roy nos olhos. Ele

pensou por instantes. Por que correr atrás de

encrencas, se podia ficar ali esperando por

elas, ao lado de uma mulher fantástica?

— O que me diz, querida? — perguntou

ele.

— Você é o patrão agora, você diz

quando — falou ela, num tom submisso.

— Nesse caso, por que não mandamos

chamar logo o Juiz Bradley e resolvemos

isso agora mesmo?

— Imediatamente, patrão — prontificou-

se Joe, saindo rapidamente.

Os dois abraçaram-se e trocaram seu

primeiro beijo de amor.

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Retrato de um Pistoleiro

Os jornais do Leste haviam descoberto

um rico filão, que aguçava a curiosidade

dos habitantes das metrópoles, habituados

apenas aos roubos e crimes comuns e às

intrigas políticas.

De repente, o Oeste surgia nas páginas

diárias mitificado com heróis tratados como

verdadeiros paladinos da justiça e da lei.

Bandoleiros foram transformados de uma

hora para outra em Robin Hood da fronteira

e a vida no Oeste transformada numa

seqüência interminável de aventuras.

Muitos dos que escreviam para os jornais

jamais haviam saído das cidades do Leste e

criavam seus relatos com base no que

ouviam de testemunhas nem sempre

confiáveis.

As noticias que vinham do Oeste eram

trabalhadas e qualquer criminoso, de um

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momento para outro, deixava as páginas

policiais para ganhar a admiração dos

homens e fascinar as mulheres sonhadoras.

Poucos escritores e jornalistas foram a

fundo, descrevendo a tragédia do Oeste,

cuja conquista foi feita com armas, suor e

muito sangue. Poucos se aventuraram a ir

tão perto do perigo e a aspirar aquele cheiro

nauseante de pólvora e sangue.

Com a expansão das fronteiras, o

Governo Americano necessitou de homens

come experiência naquela região atribulada,

que fossem bons com as armas e soubessem

impor respeito.

Pistoleiros e bandidos foram

transformados em delegados federais,

prestando serviços por algum tempo em

troca da tão sonhada anistia.

Alguns não conseguiram se adaptar no

trabalho. Outros não conseguiram separar as

duas coisas, tornando-se piores ainda, agora

bandoleiros com distintivos. Poucos,

finalmente, conseguiram deixar para trás a

carreira de crimes, assumindo efetivamente

o papel de defensores da lei.

Samuel Bakley foi um desses. Num dia

calmo, no verão de 1890, ele estava em

Laramie havia dois dias, aguardando a

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chegada de um telegrama muito importante

para ele.

Tentava localizar, sem sucesso, Walk

Sommers. Queria fazê-lo o mais depressa

possível. Aquela inatividade exasperava-o,

principalmente numa cidade inquieta como

era Laramie, caminho de passagem para

gente de toda espécie, vinda de toda parte.

Aquele distintivo de delegado federal

espetado no seu colete já não tinha mais

sentido. Fizera por ele o que prometera em

seu juramento, cinco anos antes. Era muito

tempo para um homem se manter alerta e

vivo, com um alvo espetado no peito,

naquela região selvagem.

Além disso, fizera tudo aquilo pela

anistia e se julgava, agora, no direito de

exigi-la. Queria ser um homem livre de

verdade, finalmente, e partir para realizar

um velho sonho.

Haveria de encontrar um lugar, no Texas,

onde se estabelecer e esquecer aquela vida

perigosa de pistoleiro a serviço da lei, uma

mescla de bandido e procurado com homem

da justiça.

Para todos os efeitos, em alguns Estados

ainda pregavam em paredes e árvores

retratos seus de procura-se. A anistia federal

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iria acabar com isso de uma vez por todas,

tornando-o um homem livre.

Acostumado ao constante movimento,

aquela espera irritava-o. Felizmente no

saloon de Patty Delgado havia uma corista

muito bonita e meiga, do tipo que Sam

apreciava.

Dessa forma, conseguiu tornar a espera

menos irritante, nos braços da bela e

envolvente garota, em cuja cama ele pode,

por algum tempo, esquecer as atribulações

que o perseguiam.

— Já está aqui a cinco dias, delegado.

Espero que não tenha se cansado de mim —

disse ela, enquanto se vestia.

Sam, ainda na cama, tronco nu coberto de

pelos, braços e peito musculosos, girou

preguiçosamente a cabeça para olhá-la e

admirá-la.

Lorna tinha seios fartos e rijos, cintura

afunilada e coxas perfeitas. Desejou detê-la

e impedi-la de cobrir aquele corpo

maravilhoso.

— Eu jamais me cansaria de uma mulher

como você, querida. Sabe como fazer um

homem se sentir importante.

— E você sabe como satisfazer uma

mulher.

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— E você, ainda não se cansou de mim?

— E poderia? — comentou ela, com um

sorriso malicioso nos lábios carnudos e

tentadores.

— Sabia que o pessoal fica muito

inquieto com a presença de um delegado

federal na cidade?

— Por que será? Só estou de passagem,

não pretendo criar problemas para ninguém.

Se tudo correr bem, logo serei um homem

comum sem o distintivo.

— Então partirá? — quis ela saber, com

um acento de tristeza na voz.

— Sim. Estou apenas aguardando a

chegada de um telegrama com a informação

definitiva de minha anistia.

— Vou sentir sua falta — disse ela,

terminando de se vestir. — Vamos descer?

Estou com sede.

— Eu prefiro que você vá até lá e me

traga uma garrafa. Poderíamos tomar juntos,

aqui no quarto...

— Está tão quente aqui... Não prefere

uma cerveja bem gelada? Talvez uma

partida de pôquer, para ajudar a passar o

tempo?

Samuel pensou por instantes e acabou

concordando. Espreguiçou-se

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demoradamente e ruidosamente, depois

levantou-se e começou a se vestir.

— Eu o espero lá embaixo — disse ela,

saindo e deixando a porta semi-aberta.

Ele terminou de se vestir, calçando as

botas e prendendo as esporas mexicanas que

eram suas favoritas. Passou diante do

espelho para alisar os cabelos com cuidado

e assentar o chapéu.

Apanhou, então, o cinturão de coldres

duplos preso nos pés da cama e afivelou-o

nos quadris. Examinou os revólveres,

depois os guardou. tinham as coronhas com

um serrilhado interminável, lembrança de

seus tempos de pistoleiro, quase julgava

importante registrar o número de homens

que havia matado em duelos.

Aquelas pistolas eram famosas em pelo

menos cinco Estado, onde, na década

anterior, deixara um rastro de vítimas e

exibicionistas tentando provar que eram

mais rápidos nas armas.

Deixara aquela vida quando recebera o

convite para ser delegado federal. Era uma

chance única de refazer seu destino e ele a

agarrou com unhas e dentes.

Quando descia para o saloon, um silêncio

repentino se fez, alertando-o. Um

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ajuntamento perto do balcão se desfez

rapidamente. Alguém dobrou e guardou

apressadamente um pedaço de papel.

Baixou um clima pesado e tensos no ar,

incômodo o bastante para aborrecer o

delegado. Sabia o que aconteceria. Não era

a primeira vez que enfrentava aquele tipo de

sensação.

— Duas cervejas — pediu ele,

observando que Lorna se mantinha à

distancia.

Era sinal de que havia encrenca a

caminho. O garçom servi-o rapidamente,

depois se afastou para o lado, fugindo da

linha de tiro. O homem ao lado de Sam, que

minutos antes havia guardado um pedaço de

papel, voltou-se lentamente para o delegado

e mediu-o da cabeça aos pés, com deboche

no sorriso.

Sam conhecia aquele sorriso. Já o vira

dezenas de vezes antes. Eram sorrisos de

homens mortos.

Encarou o homem que o fitava daquela

forma.

— Algum problema, parceiro? —

indagou.

— É Samuel Bakley, não?

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— Sou — respondeu o delegado federal,

levando o copo de cerveja à boca com a

mão esquerda, enquanto a direita

permanecia sobre o balcão, pronta para

descer em busca da coronha do Colt.

Seu interlocutor ficou inquieto diante da

frieza do delegado e se voltou para a porta,

onde dois homens estavam imóveis,

portando carabinas. Vestiam capaz longas e

empoeiradas, demonstrando que estavam

havia muitos dias na estrada.

— O que quer comigo? — indagou Sam.

— Um golpe de sorte a gente ter se

cruzado, Samuel. Vejo que ainda tem suas

famosas armas — falou o outro, apontando

para os Colts com as coronhas serrilhadas.

Sam havia estendido um dos copos de

cerveja para Lorna. Ela se aproximou e o

apanhou. O barman fez um sinal para que

ela se afastasse, o que ela fez rapidamente.

Sam observava tudo com cuidado. Não

duvidava mais do que tinha pela frente.

— Quem é você e o que quer? —

indagou Sam, percebendo que as pessoas

atrás deles também se afastavam, abrindo

um corredor que levava diretamente aos

homens com as carabinas.

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Percebeu que eles as apontavam baixo, na

direção de suas pernas.

— Calma, Sam, não queremos fazer mal.

Não é nada pessoal, é apenas negócio. Há

uma porção de gente em cinco Estados

querendo a sua pele...

— Já não devo nada a ninguém. Sou um

homem da lei, cumpro minha parte no trato

e estou sendo anistiado — falou ele,

apontando para o distintivo preso no seu

colete.

— De quem o roubou, Sam? — indagou

o outro, com um sorriso sarcástico nos

lábios.

Sam sentiu dentro de si aquelas velhas

reações que, em outros tempos, o faziam

jamais engolir um desaforo.

Seu corpo se retesou. Ele olhou pelo

espelho. Os homens com as armas de cano

longo continuavam à porta, apontando-as

para suas pernas.

— Escute, seu animal imbecil — disse,

em voz baixa e num tom ameaçador. —

Não gosto do que está tentando fazer.

Muitos como você tentaram bancar os

espertinhos e se transformaram num

serrilhado na coronha de meu Colt. É isso o

que deseja também?

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O homem ficou sério por instantes,

depois esboçou um sorriso sem-graça.

— Deveriam ter ouvido isso, rapazes.

Bem que nos avisaram que ele era valente

— falou ele, em voz alta.

Os homens à porta riram, mas não se

descuidaram das armas.

— Escute aqui, Samuel Bakley, você é

procurado e vale mais vivo do que morto.

Se tentar reagir, estraçalhamos suas pernas.

Vai voltar conosco agora mesmo e inteiro

ou prefere voltar aos pedaços?

Sam não respondeu. Terminou de tomar a

cerveja e depositou o copo sobre o balcão.

Limpou a boca com as costas da mão e

encarou o seu provocador.

— Sugiro que fiquem bem quietinhos

agora, enquanto examino suas armas.

Aposto como conseguiu todos esses

serrilhados matando pássaros e garotos por

aí — disse o estranho, fazendo rir as

pessoas que estavam ali.

Sam respirou fundo e apoiou as duas

mãos no balcão. Seus olhos cintilaram, frios

e atentos. Quando o outro se aproximou um

pouco mais e estendeu a mão para apanhar

uma de suas armas, Sam ergueu o corpo

com rapidez.

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Sua espora abriu um talho profundo no

rosto do homem, por onde o sangue

esguichou, molhando o assoalho. Ele caiu

de joelhos e rolou para o lado.

No mesmo instante, dois estrondos

soaram em uníssono. As cargas de chumbo

grosso abriram um rombo no balcão, bem

debaixo de Sam, que saltou para o outro

lado, já de armas nas mãos.

Os dois homens atiraram as espingardas

para os lados e trataram de sacar seus

revolveres.

Antes que pudessem encontrar seu alvo.

Sam surgiu no extremo do balcão,

disparando certeiramente seus Colts

infalíveis.

Cabeças racharam-se em ruídos

desagradáveis. Miolos foram se grudar à

parede atrás deles. Os olhos esbugalhados

dos dois pistoleiros ficaram fixos no teto,

enquanto a vida se esvaía de seus corpos.

Sam aproximou-se do homem que gemia,

tentando estancar o sangue que lhe escoria

pelo rosto.

— Agora, maldito! Onde estão os

pássaros e os garotos? — indagou, furioso,

agarrando-o pelos colarinhos e erguendo-o

do assoalho e olhando-o direto nos olhos.

Page 261: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Piedade, Sr. Bakley — gemeu o

pistoleiro, encolhendo-se covardemente.

Sam atirou-o sobre uma das mesas,

arrebentando-a. O homem tentou rastejar

para fora do saloon. O delegado foi no seu

encalço e o fez parar, chutando-lhe os rins.

Ele gemeu e rolou no assoalho.

— Por favor... Não se mate — suplicou.

— Por que estavam atrás de mim? —

indagou Sam.

— O cartaz... O cartaz... — repetiu o

homem caído, apontando para o peito.

— Qual cartaz?

— Eu mostro... Nós o encontramos numa

árvore... Somos caçadores de recompensa...

— Deixe-me vê-lo — intimou Sam.

— Está aqui mesmo, em meu bolso —

disse o caçador, metendo lentamente a mão

dentro da capa de viagem empoeirada.

Sam observou atentamente os olhos

daquele homem aparentemente vencido. Por

momentos, um brilho de triunfo cintilou

naquele olhar acovardado.

Sem pestanejar, Sam sacou uma das

armas, rápido como um castigo de Deus,

metendo duas balas no peito do outro, que

estrebuchou e ficou imóvel, enquanto uma

poça de sangue se formava ao redor dele.

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Naquele momento, o gordo xerife da

cidade entrou no saloon, acompanhando de

alguns assistentes armados até os dentes.

— Pare aí mesmo — ordenou a Sam.

— Está tudo calmo agora, xerife. Esses

homens tentaram me matar e tiveram o que

mereciam...

— É mentira! ele é um procurado pela lei

— disse o barman. — Há um cartaz de

procurado no bolso do homem que ele

matou. Não é delegado coisa nenhuma...

— É verdade isso? — questionou o

xerife, enquanto os auxiliares apontavam

suas armas para Sam.

— Já fui um homem procurado, xerife,

mas hoje estou livre da perseguição. Fui

anistiado pelo governo federal, após

cumprir meu tempo...

O xerife o olhou com desprezo.

— Nunca gostei mesmo de delegados

federais. São uma escória e nunca me

enganaram. Esse distintivo esconde um

bandido e essas armas aí não são próprias

de um homem da lei.

— Ao diabo com suas conclusões, xerife.

Goste ou não goste, terá que respeitar as

minhas credenciais.

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— Mesmo que seja um homem da lei, ele

matou esse aí a sangue-frio, xerife —

insistiu o barman.

Sam fuzilou-o com seu olhar mais

glacial.

— Sim, foi isso mesmo, xerife — Ajudou

alguém que Sam não distingui na multidão.

— Baixe suas armas agora, rapazes. Você

está na mira de meus auxiliares. Não tente

nenhuma gracinha ou vai se arrepender —

intimou o xerife.

— Está cometendo um erro...

— Cometerei um pior se você não soltar

logo essas armas.

— Está bem — concordou Sam, não

gostando nada da maneira de agir daquele

xerife nem daquelas armas apontadas para

ele.

Aquilo sempre o punha nervoso.

Depositou seus Colt sobre o balcão e

encarou o homem da lei.

— Deixe-me ver suas credenciais agora

— exigiu o outro.

Sam meteu a mão no bolso do paletó e

tirou a carteira de couro envernizada, onde

havia, em geral, o selo dos Estados Unidos.

Abriu-a. Havia uma carteira, assinada pelo

presidente e uma placa de metal dourado,

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com uma estrela de cinco pontas gravada

em baixo relevo, sob a qual estava escrito:

Delegado Federal.

— isso aqui tem força de lei e me livra de

imbecis como você, xerife — falou Sam,

irritado.

— Não banque o espertinho comigo,

Bakley. Você ainda está sendo acusado de

assassinato aqui, delegado federal ou não.

— É um tolo, xerife. Vai acreditar nas

palavras daquela besta ali, que só entende

de misturar água com uísque e dizer que é

bebida de qualidade?

— E por que não? eu vi, todos viram.

Você não deu a menor chance a ele. Quando

ele ia lhe mostrar o cartaz que todos nós já

vimos, você o matou. Atirou nele friamente,

xerife! — voltou a acusar o barman.

— Vá até ali e olhe na mão daquele

pistoleiro, xerife — falou Sam, com

tranqüilidade.

Embora desconfiado, o homem da lei fez

o que Sam lhe pedira. Foi até lá e puxou o

braço do caçador de recompensa, que ainda

estava metido dentro da capa de viagem.

Sua mão escorregou para o lado,

deixando cair um Colt de cano curto, que

estava num coldre auxiliar.

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Sam olhou para o xerife, fazendo-o se

encolher todo diante da fúria que lia nos

olhos dele.

— Entende agora por que não pude dar

uma chance aquele idiota ali? — indagou

Sam ao xerife.

— Está tudo explicado agora, delegado...

Cometemos erros, às vezes... Acho que

entende, não?

— Ora, não me aborreça mais, xerife —

rosnou Sam, irritado, apanhando suas armas

e começando e recarregá-las.

O xerife ordenou a seus homens que

arrastassem os cadáveres para a rua. Um

dos empregados do saloon correu espalhar

serragem nas poças de sangue e depois

varrer.

— E quem vai pagar prejuízos do balcão

e da mesa? — indagou o barman.

— Cobre deles — apontou, na direção

dos cadáveres que saíam arrastados pela

porta.

— Você quebrou a mesa — insistiu o

outro.

Sam respirou fundo e se aproximou do

balcão. Apanhou uma garrafa de uísque que

estava pela metade ainda, sobre o balcão.

Examinou-a, depois perguntou:

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— Quanto custa isso?

— Um dólar.

— Fico com ela, então — disse Sam,

retirando algumas moedas e pondo-as sobre

o balcão. — Um dólar, mais dois, são três...

— Por que três dólares? — quis saber o

outro.

— Dois são para o dentista...

— Que dentista? — insistiu o outro,

pateticamente.

— O que você vai visitar daqui a pouco

— respondeu Sam, com calma, dando um

murro com toda a sua raiva na boca do

barman, que foi jogado contra a prateleira

de bebidas, derrubando algumas garrafas

em sua queda.

Deixou o saloon, em seguida, irritado ao

extremo, e foi até o posto telegráfico.

— Nada ainda para mim? — indagou.

— Espere um pouco, delegado! Está

acabando de chegar — respondeu o rapaz,

conversando nas batidas no telégrafo e

anotando a mensagem que chegava.

Sam aguardou com impaciência, até que

ela se completasse. Quando a recebeu, leu

com interesse.

— Bom... Muito bom... Aquele bastardo

vai estar em Denver, então. Irei até lá —

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comentou Sam, agradecendo e rumando

para o hotel.

Arrumou sua bagagem, pagou a conta,

depois foi até o saloon, despedir-se de

Lorna.

— Tão rápido assim? — choramingou

ela.

— Sim, tenho de encontrar alguém em

Denver.

— Promete que voltará para me ver?

— Talvez sim, talvez não. Se tudo der

certo, deixo esta vida de alvo e de matador a

serviço da lei. Estou cansado disso, Lorna.

Quero descansar e viver em paz agora.

— Vai precisar de uma mulher... Para

cuidar de você.

— Saberei onde procurar, se isso

acontecer — disse ele, beijando-a

gentilmente.

Foi para o estábulo apanhar seu cavalo. O

garanhão parecia estar impaciente com tanta

inatividade.

— É hora de ir, parceiro! — disse Sam,

selando-o ritualmente, depois prendendo

seu alforje na garupa.

Recompensou o garoto que cuidara do

animal e deixou a cidade lentamente.

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Na varanda do saloon, Lorna acenava

tristemente.

Não muito distante de Parkville, uma

cidade na rota para Denver, havia uma

formação rochosa conhecida como Montes

Parks, cheia de intrincados labirintos e

alguns vales naturais, ocultos e alguns até

inexplorados.

Ali, em um desses vales, percebia-se

certa agitação de homens a cavalo,

retornando para o que parecia ser um

acampamento mineiro.

Por toda parte, homens armados

caminhavam com cautela, observando tudo

atentamente, acompanhando o trabalho dos

mineiradores, que eram escravizados.

O grupo de cavaleiros avançou pelo vale

até parar diante de uma construção maior.

Ao redor, espalhavam-se outras, parecendo

barracões ou dormitórios.

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Um homem envergando um ultrapassado

uniforme do Exército Confederado saiu pela

porta e avançou pela varanda, até ser

iluminado pelo sol.

Trazia um chicote em uma das mãos e o

batia contra o cano alto da bota, num

movimento de puro nervosismo, ou

impaciência. Era alto e forte. Os cabelos

grisalhos contrastavam com os vastos

bigodes e os olhos de uma vivacidade

incrível.

— E então, encontraram aquele fugitivo?

— indagou aos homens que começavam a

desmontar.

— Sim, general, nós o pegamos —

respondeu o pistoleiro que liderava o grupo.

— E onde está ele, então?

— Nós o deixamos numa ravina. Ele

escorregou, quando o perseguimos...

— Diabos, Laurel! Aquele negro trabalha

bastante e eu o queria vivo. Além disso, que

lição vamos dar aos outros agora? Ele devia

servir de exemplo.

— Eu sinto muito general, mas não se

preocupe. Estamos certos de que eles não

tentarão nenhuma besteira semelhante. É só

espalhar entre eles o que aconteceu.

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— Está bem, veja o que pode fazer,

então. Precisamos desses homens

trabalhando dobrado. Estamos próximos

daquele filão e quero explorá-lo o quanto

antes.

— Certo, senhor. Deixe comigo.

Precisamos mandar uma equipe buscar

suprimentos ainda hoje...

— Vá a Parkville buscá-los. Aproveite e

fale com o xerife. Talvez ele tenha algum

bom trabalho para nós. E providencie mais

dinamite também. Quero apressar o

processo.

O general ficou ali, no alpendre,

enquanto seus capangas se espalhavam pelo

acampamento. Ele respirou fundo, gozando

o ar quente da tarde. Depois desceu

lentamente a escada até o pátio.

Caminhou na direção da mina. Homem

com chicotes gritando ordens apressadas

aos mineiros.

O general passou por eles com olhar

insensível. Havia alguns negros e homens

brancos também, todos entregues ao

trabalho forçado. Suas costas estavam

despidas e viam-se nelas marcas de chicote

antigas e recentes.

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Seus corpos rebrilhavam ao sol, cobertos

de suor. O esforço que faziam era

desesperador, empurrando carretes de

minério sobre os trilhos, até as peneiras

onde jorrava água em abundância.

Ali o minério era lavado e pesquisado

cuidadosamente por outros homens, sob os

olhares de meia dúzia de pistoleiros que os

vigiavam.

As pepitas encontradas eram separadas e

jogadas numa caixa de madeira. O restante

do minério bruto seguia por uma esteira até

outro barracão, onde seria pulverizado e

lavado novamente, para a coleta do ouro em

pó.

— Como está a produção, Josh? —

indagou o coronel a um homem que

inspecionava o trabalho.

— Muito bom, general. Estamos

arrancando a pele deles para chegar ao veio

principal. Ele não está distante, pelo

tamanho das pepitas que estão surgindo —

explicou o outro.

— Ótimo trabalho, Josh. Espalhe entre

eles, só para animá-los e fazê-los pensar

melhor antes de qualquer besteira, que o

negro fugitivo foi morto.

— Realmente?

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— Sim, o corpo dele agora é pasto para

os abutres, numa ravina perto daqui.

Continue com o trabalho, será bem

recompensado depois, Josh — finalizou o

general, tocando com o chicote a aba larga

de seu chapéu, numa despedida.

Antes de se afastar, porém, olhou a caixa

de madeira, onde pepitas de ouro de todos

os tamanhos rebrilhavam, acentuando os

indícios de que o filão maior estava

próximo.

Samuel já estava sentado naquela

poltrona macia havia muito tempo, num

canto daquela sala ricamente decorada e por

onde passavam pessoas a todo instante,

olhando-o como se ele fosse uma espécie de

curiosidade ou enfeite rústico.

A porta a sua frente abria-se e fechava-se

a todo instante. Ele sabia que Walk

Sommers estava lá dentro, só que o tratante

maldito parecia disposto a falar com todo

mundo em Denver primeiro, antes de dar

atenção a Samuel.

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Sam pôs-se em pé num salto e entrou

como um furacão, esbarrando no secretário

que o esperava para fechar a porta. Walk

Sommers levantou-se sorridente e estendeu-

lhe a mão.

— Foi um ótimo trabalho esse último que

fez, Sam — ia dizendo com orgulho.

Sam olhou-o duramente, ignorou a mão

estendida, arrancou o distintivo do peito e o

bateu sobre a mesa.

A mão estendida de Walk recolheu-se e

um sorriso maroto desenhou-se em seus

lábios.

— Dê-me logo! — ordenou Sam.

— Dar-lhe o quê, Sam?

— Aquele maldito papel que você me

prometeu. Eu fiz jus a ele. Quero a minha

maldita anistia definitiva!

— Calma, homem. Sente-se aí, vamos

conversar...

— Calma coisa nenhuma, Walk. E não

vou me sentar. Não tente me enrolar mais.

Você me mandou limpar aquela região de

uma quadrilha de ladrões de gado, mas não

disse que eram bandidos mexicanos. Tive

de enfrentar um bando enorme deles. Fiz a

minha parte. Era meu último trabalho.

Agora acabou. Vamos acertar nossas contas.

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Dê-me a anistia e prometo que nunca mais

vai ouvir falar em mim. — desabafou o

delegado federal.

Walk havia apanhado o distintivo de Sam

e o examinava, como se o outro nem

estivesse ali.

— Sem perda de tempo, Walk. Quero

aquele papel agora. Pretendo dar o fora

daqui imediatamente.

Naquele momento, a porta se abriu e o

secretário fez entrar um homem com o

uniforme do Exército Americano.

— Sam, esse é o Sargento Holister, do

Forte Denver — apresentou-o Walk.

— Sim, prazer, sargento — falou o

pistoleiro rapidamente, depois se voltou

para Walk. — O papel, Sommers. Preciso

dele agora para ir embora.

Walk reclinou-se em sua poltrona e

cruzou as mãos diante do peito. Olhou Sam

com resignação. Suspirou, preparando-se

para enfrentar uma tempestade.

— Sam, ainda é cedo para você se retirar.

Precisamos de sua ajuda uma última vez —

disse e esperou a reação do outro.

Samuel Bakley olhou seu interlocutor

sem poder acreditar no que ouvia. Balançou

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a cabeça de uma lado para outro, incapaz de

aceitar a proposta que recebera.

— Você é louco! Sommers! Louco se

pensa que vou fazer isso. Acabou,

entendeu? Acabou! — berrou Sam.

— Sam, por favor, estamos sem ninguém

para cuidar disso. Você é o único em quem

posso confiar agora...

— E você, por que não vai pessoalmente

cuidar disso?

— Tenho algo inadiável a resolver em

Washington. E depois, estou há muito

tempo fora disso, Sam. Perdi o jeito.

— E os outros delegados?

— O Oeste é uma região dura e perigosa,

Sam. Você sabe disso. Temos poucos

homens ainda...

— Walk, não quero saber de seus

problemas. Nos últimos cinco anos não fiz

outra coisa senão resolvê-los para você.

Tenho meus próprios problemas, sabia?

Quero resolvê-los agora.

— Está bem, Sam. Nem se eu lhe disser

que pagarei dobrado esta missão.

— Não, já consegui juntar todo o

dinheiro de que preciso.

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— Certo, você manda, então. Antes de ir,

porém, quero que venha comigo primeiro.

Vamos ver duas pessoas.

— O que está tramando, Walk? Eu

conheço seus truques...

— Sem truques, eu prometo!

— Certo, combinado. Irei com você, mas

só se me mostrar o papel primeiro.

— Ele está com meu secretário, que vai

providenciar a sua divulgação nos Estados

onde você é procurado. Fique tranqüilo. Por

que eu o enganaria com isso?

— Está bem, Walk. Mas se estiver me

enganando...

— Não se preocupe. Agora vamos —

insistiu Walk. — Leve isto, por enquanto.

Ainda não se demitiu — completou ele,

estendendo o distintivo.

Sam apanhou-o e hesitou por instantes.

Depois, com uma expressão de resignação,

espetou-o no colete e seguiu Walk pelas

ruas de Denver, até o hospital local.

— Que diabos viemos fazer aqui, Walk?

— indagou Sam, intrigado.

— Tenha calma, já saberá!

Walk falou com um dos médicos, que os

acompanhou pelos corredores, até um dos

quartos.

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Ali, deitado numa posição

desconfortável, um negro gemia

debilmente. O médico foi até a janela e

abriu parcialmente a persiana, iluminando

melhor o corpo encolhido.

— O que houve com ele? — indagou

Sam, ao perceber o péssimo estado em que

se encontrava o doente.

— Venha ver de perto — convidou Walk,

fazendo-o se aproximar do leito.

O homem estava deitado encolhido, de

lado na cama, com o corpo descoberto.

Dando a volta, Sam entendeu o que Walk

queria lhe mostrar.

Uma careta de surpresa e piedade

desenhou-se inesperadamente no rosto de

Sam, acostumado a ver todo tipo de

atrocidade naquele seu trabalho.

— Chicoteado?

— Sim. Algumas chibatadas cortaram a

carne até os ossos. Já tinha visto tamanha

selvageria antes?

— Diabos, mas só me lembro de ter visto

isso na Geórgia, antes da guerra.

— Este homem se arrastou precariamente

para pedir ajuda, não para ele, mas para

seus amigos, presos como escravos num

acampamento mineiro, em algum ponto dos

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Montes Parks. Há negros e brancos

morrendo lá, Sam.

— É desumano, eu concordo, mas não

vejo onde isso me afeta, Sommers...

— Alguém tem que ir lá e acabar com

isso, Sam.

— E por que eu?

— É o melhor... E o único que tenho no

momento.

— Diabos, Walk! Já arrisquei minha pele

dezenas de vezes. Não tenho intenção de

fazer isso de novo. Ser um homem da lei

pode ser mais perigoso que ser um

pistoleiro procurado.

— Deixe de pensar apenas em seus

problemas, bastardo — falou Walk,

alterando a voz e demonstrando irritação.

— Vamos com calma, Walk! — alertou-o

Sam. — Somos iguais, usando estes

distintivos. Assim, não sou obrigado a

aturar seu mal humor. Fizemos um trato e

eu paguei, a duras penas, a minha parte. Por

que reluta em fazer a sua parte agora?

— Está bem, vamos nos acalmar...

Desculpe-me. Vamos conversar lá fora —

falou Walk, caminhando para a porta.

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Antes de se retirar, Sam deu mais uma

olhada nas costas feridas daquele homem

que gemia na cama.

Quem quer que tivesse feito aquilo, o

fizera com ódio, com a intenção de ferir e

marcar indelevelmente. Era uma punição

cruel e desumana. Quem tinha feito aquilo

merecia a pior das mortes por tratar outro

ser humano como animal.

Walk o esperava no corredor.

— Vá tomar um banho, fazer essa barba e

comprar umas roupas decentes — intimou

Walk.

— Que diabos, homem! Quer parar de

me dar ordens? Não sou obrigado mais a

aturá-las, sabia?

— Vá para o inferno, Samuel Bakley!

Faça o que estou lhe mandando ou ponho

todos os xerifes do oeste atrás de você.

— É uma ameaça?

— É uma promessa!

Walk adiantou-se, deixando o hospital.

Sam hesitou por instantes, depois foi ao seu

encalço.

— Para que tudo isso afinal? — quis

saber.

— Vamos nos encontrar com aquela

segunda pessoa hoje à noite — disse Walk.

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— Á noite? Mas eu queria estar longe

daqui até a noite — protestou Sam.

— Desista.

— E por que deveria?

— Porque estou lhe ordenando,

demônios! Enquanto você não estiver com

aquele papel nas mãos, eu ainda dou as

ordens, compreendeu bem?

— Não sou mais um delegado federal! —

gritou Sam, arrancando o distintivo e

jogando-o na poeira.

Walk encarou-o furioso. Os olhos

chisparam.

— Pare de se comportar como uma

criança mimada e apanhe isso, Sam — disse

ele e seu tom de voz não admitia recusa.

— Não! Quero aquele maldito papel e

nada mais. Dê-me e irei embora.

— Apanhe esse maldito distintivo ou não

terá nada, a não ser cartazes com sua cara

pregados em todas as árvores deste país.

Terá centenas de caçadores de recompensa

em seus calcanhares, loucos para arrancar

sua pele e ganhar a recompensa.

Por momentos Sam ficou tenso. Aquele

era o tipo de coisa que poderia tirá-lo do

sério. Pensou nos cincos anos que se

submetera às ordens de Walk, indo para

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toda parte, enfrentando bandidos de toda

espécie.

Não poderia jogar tudo isso fora. Seu

futuro dependia daquele papel.

— Eu lhe prometo uma coisa, Walk

Sommers — disse Sam, apanhando o

distintivo.

— O que é?

— Quando estiver de posse daquele

papel, juro que a primeira coisa que farei

será socá-lo nessa boca sempre cheia de

ordens, entendeu?

— Faça isso, Sam! Faça isso! —

respondeu Walk, num tom de pura

aprovação.

Sam encontrou-se com Walk nos

corredores do hotel, onde estavam ambos

hospedados. Walk mediu-o dos pés à

cabeça, aprovando com um sorriso.

Sam vestia roupas novas e próprias para a

cidade, além de estar barbeado e ter cortado

os cabelos.

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— Vamos a um lugar onde não serão

necessários essas pistolas — apontou Walk.

— Eu vou, elas vão. Elas ficam, eu não

vou. Compreendeu?

— Acho que tem estado caçando

bandidos por muito tempo, parceiro —

comentou Walk. — Pelo menos está

apresentável agora. Mantenha o paletó

fechado e as armas não aparecerão...

— Diabos! Lá vem você com ordens de

novo. Fiz o que me pediu. Vamos acabar

logo com isso? Tenho muito o que fazer.

Quero voltar às minhas roupas velhas,

apanhar meu cavalo e sumir daqui,

Sommers.

— Está certo, vamos acabar logo com

isso.

— Para onde vamos?

Walk não respondeu e Sam preferiu não

insistir. Desceram até o saguão do hotel e,

dali, foram para o restaurante, pouco

movimentado àquela hora que antecedia o

jantar.

Quando entraram, Walk apontou para

uma das mesas, onde estava uma jovem

muito bonita, que sorriu ao vê-lo.

— Olá, Delegado Sommers! —

cumprimentou ela.

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— Srta. Russel! — exclamou ele,

tocando a aba do chapéu num cumprimento

rápido, antes de tirá-lo e pô-lo no espaldar

da cadeira.

Sam fez o mesmo e estremeceu, quando

ela voltou para ele seus olhos lindos e

expressivos, perturbadores ao extremo.

— Presumo que este é o Delegado

Bakley, não? — indagou ela e Sam

experimentou uma emoção nova ao ouvir

seu nome pronunciado por ela.

— Sim, eu mesmo — confirmou ele,

desmanchando-se num sorriso enorme.

— Sam, está é Jane Russel!

— Olá, Sam! — cumprimentou-o ela,

com um sorriso cativante nos lábios

carnudos e sensuais.

— Sam, Jane é jornalista... — ia dizendo

Walk.

— Jornalista!— interrompeu-o Sam,

fechando o rosto. — Que diabos quer fazer

comigo?

— Calma, Sam! Deixe-me explicar

primeiro...

— Não sei o que está tramando,

Sommers, mas tenho meus motivos para

não apreciar jornalistas e você sabe disso.

Não é nada pessoal, Srta. Russel... A

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verdade é que nada temos a conversar um

com o outro.

— Pelo contrário, Sam. Acredite em

mim, homem! Acho que vocês dois têm

muito a conversar — acudiu Walk,

convincente.

— Como assim, diabos?

— Acho que precisa ver isso, então, Sam

— disse a garota, estendendo um livro que

deixara sobre a mesa.

— Mas... Sou eu... Não estou

entendendo... — balbuciou ele, confuso.

— É tudo que pude apurar sobre sua vida,

Sam, colhendo depoimentos aqui e ali. Foi

publicado no Leste, por um jornal de Nova

Iorque e fez muito sucesso. Conta sua vida,

até se tornar um delegado federal. O

sucesso foi tanto que desejam um segundo

livro, agora narrando suas aventuras como

delegado federal, em busca da redenção e

da anistia.

— Eu não sei... — atrapalhou-se ele,

folheando o livro, sem saber o que pensar.

— Até sei por que detesta jornalistas,

mas precisava falar com você. Pedi ao

Delegado Sommers que conseguisse um

encontro entre nós dois. Vim para cá o mais

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depressa possível, quando soube que estaria

aqui.

— E o que quer exatamente de mim?

— Apenas que me conte o que enfrentou

como delegado federal.

— Há gente interessada em saber sobre

todo esse sangue esses cadáveres que deixei

para trás em nome da lei?

— Muito mais do que imagina. Mas por

que não nos sentamos? —convidou ela.

Sam se sentiu envolvido em alguma

coisa, mas não pode identificar o que era.

De repente descobria que sua vida fora

levada ao conhecimento de uma porção de

pessoas que, não satisfeitas, ainda queriam

saber mais.

— E então, aceita? Só terá que me contar

as histórias. Além disso, o jornal pagará sua

estadia, suas despesas e ainda lhe dará

algum dinheiro por conta do livro.

— Posso ganhar dinheiro com isso?

— Sim, claro que pode.

Sam olhou desconfiado para Walk,

depois para Jane, tentando descobrir o que

havia por trás daquilo. Não percebeu,

porém, nenhum sinal de tramóia ou truque.

— O que acha de pedir mil dólares, Sam?

— sugeriu Walk.

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— Mil dólares? Eles pagariam mil

dólares?

— Acho uma quantia razoável. Vou

telegrafar hoje mesmo para que mandem o

dinheiro.

— Espere aí, eu não disse que aceitava —

falou Sam, ainda incomodado com tudo

aquilo.

— Além disso, Sam, quero fazer alguns

desenhos seus com suas famosas armas,

para ilustrar o livro. Esse detalhe foi algo

que agradou aos leitores na primeira

publicação.

— Desenhos? Retratos?

— Sim, algo mais refinado e honesto que

aquelas fotos que estão nos cartazes e que

usamos para ilustrar o primeiro livro. Nela

você aparece como um demônio, vestido de

negro. Quero fazer alguns desenhos e

apresentá-lo vestido de branco, como um

anjo da lei e da justiça.

— Não sei... — hesitou ele, aturdido.

Não estava convencido de toda aquela

história ainda. Sentia que por trás de tudo,

havia alguma trama de Sommers para

obrigá-lo a trabalhar novamente, só que não

conseguia perceber a ligação entre uma

coisa e outra.

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Estava fora de seu ambiente. No meio da

planície ou tramando algum plano para

desbaratar uma quadrilha, Sam se sentia à

vontade. Aquele era seu mundo. Saberia

reagir conforme o estímulo recebido.

Ali, diante de Walk e de Jane, no

restaurante de um luxuoso hotel, não

conseguia entender o que pretendiam dele

afinal.

— O que me diz? — insistiu Jane.

— É uma boa oferta, Sam. Devia aceitá-

la. Mil dólares comprarão um bom rebanho

para você levar para o Texas.

— Vou pensar a respeito — descartou

Sam a principio, desejando estudar melhor

aquilo tudo.

— Será uma forma de passar o tempo,

Sam — insistiu Walk.

— Passar o tempo? Que tempo? — quis

ele saber, sentindo cheiro de truque.

— Vai demorar uma semana até que eu

possa liberá-lo com os papéis, Sam.

— Como assim?

— Todos os jornais dos cincos Estados

terão de ter publicado a anistia para que

você não seja caçado injustamente. Os

xerifes de todos os condados receberão

ordens para inutilizar todos os cartazes de

Page 288: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

procura-se com sua cara. Enquanto isso não

acontece, é mais prudente você permanecer

em Denver por algum tempo.

Sam ia protestar, mas não encontrou

argumentou. Walk parecia estar sendo

sincero no que dizia.

— Certo, estou convencido, ficarei,

então.

— Vai me contar suas aventuras e me

deixar pintá-lo com suas famosas armas? —

indagou Jane.

— Sim, tão logo receba o meu dinheiro.

— Não poderia me dar um voto de

confiança e começar agora, contando-me

alguma coisa durante o jantar? — convidou

ela, num tom irrecusável.

— Está bem, mas você paga a conta —

disse ele.

— Trato feito, Samuel Bakley —

respondeu ela.

Page 289: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

O que, a principio, parecia um

aborrecimento, acabou se transformando,

para Sam, nas horas mais agradáveis e

descontraídas de sua vida.

Não tinha nada com que se preocupar, a

não ser aguardar o recebimento de sua

anistia que Walk prometera para logo.

Enquanto isso, ele e Jane se tornaram bons

amigos.

Passavam o dia todo juntos. Ele contava

suas façanhas e ela anotava seguidamente.

Às vezes faziam uma pausa nas histórias

para ela esboçar um desenho. Nesses

momentos, enquanto desenhava, ela falava

de si.

Os dias passavam rápidos para o

delegado federal. Naquela tarde, Jane

insistiu em fazer um desenho dele sobre o

cavalo, em algum ponto fora da cidade, num

local tranqüilo.

Imponente sobre seu animal, Sam fazia

questão de exibir as armas que, na opinião

de Jane, eram as mais famosas no leste,

naquele tempo.

Com atenção e capricho, ela foi traçando

o esboço daquele novo retrato.

— Walk disse que sua anistia chegará

definitivamente aprovada amanhã, com a

Page 290: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

divulgação feita a todos os Estados onde

você era procurado.

— Ótimo! Já não era sem tempo —

comentou ele, satisfeito.

— Mantenha a cabeça erguida! — pediu

ela.

— Assim? — indagou ele, rindo.

Ela continuou absorta, rabiscando o

papel, dando contornos definitivos no

desenho. Às vezes levantava a cabeça e o

olhava por algum tempo, pensativa, depois

voltava a desenhar.

— O oeste precisa de homens como você,

Sam — disse ela, após algum tempo. —

Não estou aqui há muito tempo e percebo

que a lei tem de ser imposta a ferro e fogo.

Muita gente ainda não acredita na lei...

— Por que me diz isso? — estranhou ele.

— Vi aquele negro lá no hospital —

comentou ela, com um acento de piedade na

voz doce e modulada.

— Deve ter-se metido numa grande

encrenca para apanhar daquela forma.

— Walk está desesperado com aquilo...

Não sabe como ajudar o pobre homem.

— Walk é um incompetente! Fica aí,

parado, quando já podia ter ido lá e

resolvido o caso.

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— Walk está aqui ao mesmo tempo que

você — disse ela e havia um tom de leve

reprovação em sua voz.

— Eu sei, mas é obrigação dele, não

minha. Eu não precisaria de mais do que

esses poucos dias para ter ido lá e resolvido

a questão — falou ele, com convencimento.

— Verdade? — admitiu-se ela, parando

de traçar para levantar os olhos para ele.

— Por que está me olhando assim? —

encabulou-se ele.

— Não é nada... Uma pergunta idiota que

está em minha cabeça agora...

— E o que é?

— Não tenho o direito de fazê-la...

— Por favor, diz respeito a mim?

— Sim, mas...

— Eu lhe dou o direito de fazê-la. Pode

perguntar — insistiu ele.

— Está bem, você insistiu, mas não vá se

ofender. Se é assim tão fácil, por que não

vai lá e cuida do assunto? — perguntou ela,

com inocência.

Sam ia responder, mas hesitou, olhando-a

duramente, como se percebesse que tudo

aquilo não havia passado de uma manobra

de Sommers para pô-lo no caso.

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Aquela historia de jornalista do Leste,

livro, historias e desenhos lhe pareceu uma

grande jogada, apenas para convencê-lo a

fazer o trabalho do outro.

— Não, não, moça! Vocês não me

convencem. Está muito enganada. Vá dizer

ao Walk que o plano dele não deu certo. Se

ele não quer ir fazer o trabalho, que mande

outro, não eu — falou ele, guardando as

armas e preparando-se para partir, ofendido.

— Você disse que não ia se zangar...

— Não sabia até que ponto você

pretendia chegar.

— Sam, você está sendo injusto.

— Injusto, mas não imbecil. Acho que

chegou a hora de me pagar aqueles mil

dólares. Amanhã pego minha anistia e dou o

fora daqui, antes que Walk tenta outra

palhaçada comigo.

Uma série de gargalhadas zombeteiras

interromperam a conversa. Ali perto, sob a

sombra de uma árvore, um grupo de três

vaqueiros chegara e riam agora da pose que

Sam fizera sobre o cavalo, para Jane

desenha-lo.

Sem, pestanejar, o pistoleiro sacou suas

armas e disparou na direção deles,

arrancando lascas da árvore.

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Os três deram meia-volta e esporearam

seus cavalos, afastando-se a galope. Jane

olhava-o incrédulo.

— Sabe o que você é? Um enganador,

mentiroso, um tipo muito desprezível, um

cobarde de marca maior, Samuel Bakley.

Você é como dizem por aí: conseguiu essas

marcas na coronha das armas atirando

contra pássaros e meninos. Você não tem

fibra. Vou arrasar com você no próximo

livro, você vai ver. — declarou ela, furiosa

com ele.

— Mas espere um pouco, você não... —

ia dizendo ele, enquanto guardava os Colt

fumegantes.

— Seu grande cavaleiro! — exclamou

ela, olhando o desenho que esboçara. —

Grande cavaleiro mesmo! — arrematou,

arrancando o papel e rasgando-o.

Atirou os pedaços na direção de Sam,

depois correu apanhar seu cavalo e retornar

direto para a cidade.

Ele ficou ali, surpreso com a reação dela,

que lhe pareceu sincera. Desmontou a foi

apanhar os pedaços do desenho. Montou-os

sobre a relva. Era um bom desenho. Jane

estava mesmo caprichando.

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Sorriu brevemente, depois juntou os

pedaços e foi guardá-los em seu alforje.

Voltou para a cidade, onde procurou

imediatamente Walk Sommers.

— Se está ansioso por causa daqueles

malditos papeis, eu juro como amanhã eles

estarão em suas mãos — prometeu ele.

Sam andou de um lado para outro,

inquieto. Parou junto a uma garrafa de

uísque. Serviu uma dose e tomou-a de só

gole, fazendo uma careta.

Walk esboçou um sorriso. Naqueles

cinco anos, aprendera a conhecer Sam. Este

acabou sentando-se diante da escrivaninha

ocupada por Walk, na suíte do hotel.

— Conte-me sobre aquele homem

chicoteado, Walk. O que sabe sobre ele e os

amigos dele?

— E por que você quer saber?

— Diabos! Walk! Todo o tempo você

esteve me empurrando para isso. Fale logo,

caramba!

Walk olhou-o surpreso, sem entender o

que ele dizia, mas não perdeu a

oportunidade de apresentá-lo ao caso.

— Em algum ponto nas imediações de

Parkville há uma mina oculta num daqueles

vales nos Montes Parks. Homens estão

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sendo forçados a trabalhar ali em regime de

escravidão. É preciso acabar com isso,

descobrindo os culpados e punindo-os.

— É só o que tem?

— Sim, mas é mais do que o bastante

para um homem como você.

— Está certo, Walk. Vou para lá resolver

isso, mas com direito a gratificação. Posso

ter meus papeis amanhã cedo?

— Não quer que eu os leve para você, no

Texas?

— Está certo! Onde o encontro para

receber minha anistia?

— El Passo lhe parece bom?

— Sim, irei ao México comprar um

pouco de gado. Estarei lá, pode ter certeza.

Em duas semanas?

— Não vai precisar de mais tempo?

— Viajo muito depressa, Walk.

— Está certo, então. Em duas semanas.

Sam levantou-se e já ia saindo.

— Vai despedir-se dela? — indagou.

Sam o olhou carrancudo, depois virou-se

sem dizer nada e saiu batendo a porta. Foi

preparar suas coisas. Queria partir o mais

depressa possível.

Foi apanhar seu cavalo, amarrou o alforje

e o cobertor e montou. Cavalgou lentamente

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pela cidade. Passou diante do hotel. Parou e

ficou olhando para a porta de entrada.

— Demônios! — praguejou ele,

desmontando e entrando.

Procurou por Jane. Informaram que ela

estava no quarto. Foi até lá. bateu e esperou.

Quando a garota abriu, Sam meteu o pé

entre o batente e a porta, impedindo-a de

fechá-la na sua cara.

— Não quero vê-lo mais na minha frente,

seu bastardo egoísta — rugiu ela, furiosa.

— Vai ter que me ouvir agora, doçura.

Você me botou em uma nova encrenca e

precisa saber disso para carregá-lo em sua

consciência — informou ele.

— De que está falando? — indagou ela,

abrandando o tom de voz.

— Aceitei a maldita missão! —

exclamou ele. — Não era isso que você

queria?

— Verdade? — surpreendeu-se ela.

— Sim. Vou enfrentar um bando de

homens perigosos e malvados que não

hesitarão em arrancar-me o couro, por sua

causa, está entendendo? Talvez tenha que

lutar contra toda uma cidade... Posso morrer

lá e ser atirado numa ravina, virando pasto

de urubus... Nem ao menos uma sepultura

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digna eu terei — exagerou ele, para

impressioná-la.

— Eu não pensei que fosse tão perigoso,

Sam — disse ela, fingindo que acreditava

em todo aquele exagero.

— Irei, Jane. Era isso mesmo o que você

queria, não era? Queria me certificar antes

de ir.

— Quando vai partir?

— Já estou de saída...

— Já? — surpreendeu-se ela.

— Sim, meu cavalo está lá fora. Quero

estar nas montanhas, antes do escurecer.

— Diabos por que não me avisou antes?

— esbravejou ela.

— Pensei que não quisesse me ver mais...

— Ora, vá dando o fora daqui, Samuel

Bakley. Tenho muito o que fazer — falou

ela, empurrando-o para fora e fechando a

porta.

Sam ficou parado ali, por algum tempo,

tentando entender aquela atitude.

— Ora, com mil demônios! — exclamou

ele, surpreso. — Garotas! Ora bolas!

Apanhou seu cavalo e partiu, deixando a

cidade para trás. Sobre a sela de seu cavalo,

Sam se sentia realmente à vontade. Aquela

vida na cidade não o agradava. Era muito

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complicada e o fazia se sentir preso e

tolhido.

Gostava de ar livre, da sensação de ser de

todo o oeste, daqueles planícies e pradarias,

do céu e do vento. Dormia melhor

encostado na sela e sob as estrelas do que

numa cama macia de um hotel da cidade.

Não trocaria aquela vida por nada,

concluiu, pensando agora naquela sua nova

missão. Conhecia Parkville. Passara por lá,

certa vez, seguindo a trilha do ouro da

Califórnia.

Havia um xerife encrenqueiro naquela

cidade. Sam imaginou que, após tanto

tempo, seria interessante encontrá-lo

novamente e devolver-lhe a hospitalidade.

Escurecia, quando atingiu as montanhas.

Havia algum tempo ele se voltava na sela

para olhar para trás, imaginando estar sendo

seguido.

Procurou um local onde pudesse acampar

e preparou uma fogueira. Faria frio à noite e

nada melhor que um bom fogo para um

homem se sentir melhor, aqueceu seu café e

espantar as pumas da montanha que descia

para caçar à noite.

Desvencilhou seu cavalo e o soltou para

pastar tranqüilamente durante a noite. Perto

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havia um regato e o animal estaria bem.

Acomodou a sela junto a uma pedra,

estendeu o cobertor e deixou pronta sua

cama para aquela noite.

Pretendia preparar um café e um feijão

mexicano para o jantar, quando ouviu o som

de casos ferrados aproximando-se.

Ficou em alerta, sacando as armas. Todo

o tempo tivera certeza de estar sendo

seguido. Torceu para que não fosse mais um

daqueles idiotas caçadores de recompensa.

O cavaleiro desmontou e se aproximou,

sem maiores preocupações. Sam o

aguardou, oculto atrás de uma pedra.

Quando o estranho passou, Sam encostou o

revólver na nuca e engatilhou-o.

— Sam? — indagou ela.

— Jane? — surpreendeu-se ele.

— Bastardo, quase me matou de susto —

disse ela, virando-se para encará-lo. — Não

sabe ser hospitaleiro? Tem de receber todo

mundo com essas malditas armas?

— E como eu poderia saber que era

você? E o que faz aqui? Por que me seguiu?

— E por que não?

— Ora, demônios! Estou indo para

Parkville, resolver um caso...

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— E daí? Também estou indo para lá.

Pode ter uma boa história em Parkville e os

donos do jornal vão adorar isso.

— Está falando sério?

— Sim, nunca falei tão sério.

— Você é mais doida do que eu pensava

— disse ele, indo apanhar o bule para pegar

água.

— Não posso perder isso por nada, Sam.

Tem que entender. É o meu trabalho.

Imagino como o pessoal do jornal reagiria

se eu deixasse passar uma chance como

essa? vou fazer um relato ao vivo de uma

autêntica missão do Delegado Federal

Samuel Bakley...

— Eles vão vibrar, garanto — disse ele,

indo até o regato.

Ela foi atrás dele, comentando excitada

sobre todos os seus planos para aquela

historia. Sam arrumou pedras em círculo e

preparou a fogueira. Pôs a água esquentar.

Jane não parava de falar.

De repente, sem que ela entendesse, ele a

apanhou em seus braços fortes e a pôs de

volta na sela do cavalo.

— O que pensa que está fazendo?

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— Mandando-a de volta. Não vamos

cavalgar juntos, mocinha. A trilha que eu

percorro é muito perigosa para você.

— Está muito enganado se...

— Diabos, mulher! — esbravejou ele. —

Será que não consegue entender o perigo?

isto aqui não é um piquenique onde você

vai se divertir e fazer desenhos. O inferno

nos espera em Parkville, entendeu?

Ela olhou-o fazendo beicinho.

— Não vejo nada mais seguro do que ir

para o inferno com você, Sam — disse ela.

— Acho que até o demônio o respeita e

teme.

— Você não sabe o que está dizendo...

— Quero ir com você. Tenho o direito de

ir.

— Que direito, Jane? quem lhe deu o

direito?

— Este é um país livre. Qualquer um

pode ir para qualquer lugar. Já leu isso em

algum lugar antes?

— Está bem, você tem razão e pode ir

para onde quiser. Só que eu tenho o direito

de escolher minhas companhias. E não

quero ser responsável por ninguém...

— É disso que tem medo? De assumir

responsabilidades?

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— Ao diabo com você, Jane Russel.

Dane-se. Faça o que bem entender e não me

amole mais.

— Obrigada! — disse ela, desmontando

rapidamente.

Sam procurou ignorá-la, mas preparou

café e comida para dois. A noite caiu

rapidamente e começou a esfriar. Um

homem como ele, habituado às viagens no

lombo de um cavalo, sabia o que precisava

levar de essencial.

Mais tarde, metido embaixo de seu

cobertor de lã pura, especial para noites

frias como aquela, Sam cantarolava,

observando os constantes esforços de Jane

para se agasalhar com um pequeno e fino

cobertor.

— Não quer mesmo comer? —

perguntou ele.

— Não quero sua maldita comida...

— Tome um café, então, ainda está

quente.

— Ao diabo você, e seu café, Samuel

Bakley!

— Está bem — disse ele, puxando o

chapéu para cima dos olhos. — Não se

assuste se ouvir uivos e rugidos. É só

manter a fogueira acesa que os ursos,

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coiotes, lobos e pumas não se

aproximarão...

Os olhos dela se arregalaram, enquanto

ela olhava ao redor assustada. Sam fechou

os olhos. Estava de volta ao seu mundo,

onde a regra era dormir cedo e se levantar

antes do sol.

Sabia que seria uma noite terrível para

Jane, por isso deixou uma providencial

sobra de seu cobertor para ela, caso

resolvesse se aquecer.

Ela ficou imóvel em seu lugar, junto à

fogueira. Sam fechou os olhos e logo

adormeceu. Quando os primeiros pumas

rugiram ao longe, ela jogou alguns gravetos

no fogo e correu se deitar ao lado dele.

Na manhã seguinte, quando acordou, ela

estava deitada ali, ao lado dele, abraçando-

o. Sam sorriu, levantando-se lenta e

silenciosamente para não acordá-la.

Ficou em pé, após arrumar o cobertor

sobre ela, olhando-a demoradamente.

Depois foi fazer o café e preparar o

desjejum.

Quando Jane acordou, havia um xícara de

café fumegante no seu lado.

— Há bacon e ovos na frigideira — disse

ele. — E já selei seu cavalo.

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— Vamos partir tão cedo?

— Sim. Você não se esqueceu do que eu

disse, não é? É só voltar em linha reta...

Ela se pôs em pé num salto, olhando-o

furiosa.

— Não importa o que faça, Sam. Eu vou

com você. Sei que pode ser perigoso, mas

não me interessa. Vou estar lá para noticiar

isso. Não pode me negar esta chance. Por

favor!

Ele se afastou, chutando pedras, furioso,

por não encontrar um argumento capaz de

convencê-la. Jane era a maior cabeça-dura

que ele já conhecera.

— Está certo, eu a levo — falou ele. —

Sob uma condição.

— Qual? É só dizer.

— Vou nomeá-la ajudante de delegado

federal. Tenho poderes para isso.

— E o que faz um ajudante

— Obedece ordens...

— Não espera me obrigar...

— Não, nada disso. Não vou mandá-la

embora. Já que você é maluca mesmo, vou

lhe dar uma missão. Além de contar toda

esta aventura, se sairmos vivos dela, você

poderá contar também que trabalhou lado a

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lado com o grande e famoso Delegado

Samuel Bakley. Satisfeita?

— Sam, vou adorar isso. Vai ser ótimo!

O que vou precisar fazer?

— Quando chegarmos lá, você vai tentar

arrumar um trabalho no saloon.

— No saloon? Terei que dançar e dormir

com aqueles homens... Jamais!

— Deixe de ser idiota, Jane. Uma garota

de saloon dança com quem ela quiser e vai

para a cama com que ela quiser. O trabalho

principal consiste em fazer um show de

dança ou canto e deixar os homens bêbados.

— Só isso?

— Sim, mas terá de ficar de ouvidos

abertos. Ouve-se e descobre-se muita coisa

num saloon, principalmente de bêbados.

Suas informações poderão ser muito úteis

para mim.

— Certo, eu aceito então.

— Agora vá comer alguma coisa. Temos

uma longa cavalgada pela frente. — disse

ele, não deixando de admirar a coragem e a

decisão daquela garota.

Ou isso ou então ela era completamente

maluca.

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Na pacata delegacia da cidade de

Parkville, o Xerife Harry Late recebia a

inesperada visita do general. Como sempre,

desmanchou-se em atenção para com o

velho militar.

Ofereceu-lhe a poltrona mais confortável,

depois levou-lhe uma caneca de café, onde

despejara um pouco de uísque. O general

apreciava muito esses agrados.

— Está confortável, general? O café está

bom?

— Sim, está tudo perfeito, Harry. Você

sabe como agradar um velho cansado como

eu...

— Que é isso, general. Ainda é um

homem forte e saudável. Como vão as

coisas na mina?

— Não soube ainda?

— Bem, ouvi as explosões daqui, achei

que estavam se aproximando do veio. Vocês

o encontraram?

— O diabo, Harry! Um idiota calculou

mal a carga e fez os túneis desmoronarem.

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Perdemos um tempo precioso. Vamos ter de

tirar todos os entulhos. Foi isso que me

trouxe aqui...

— Como assim?

— Preciso de mais gente.

— Ninguém mais passa por Parkville,

general, não nesta época do ano.

— Não sei... Talvez tenhamos que ir

buscar gente em Denver, mas isso pode ser

muito perigoso. Teríamos de inventar uma

boa história para atraí-los para cá, sem

mencionar a existência do ouro. Se isso

acontecesse, teríamos uma corrida e seria o

inferno.

— Quanto a isso, tem razão, general. Não

será fácil convencer gente a vir de Denver

para cá...

— Soube que uma família se fixou ao

norte, naquelas terras que eram dos Smith, é

verdade?

— Sim, um casal e três filhos moços.

Hei, é gente forte, general! — comentou o

xerife, lembrando-se do detalhe.

— Acha que pode achar um jeito de levá-

los para mim? — indagou o militar,

retirando um pequeno saco de ouro e

balançando-o, fazendo os olhos do xerife

brilharem de cobiça.

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— Posso dar um jeito sim, general —

confirmou ele.

— Faça isso, Harry. Por favor! — disse o

general, com gentileza, atirando o saquinho

para o homem da lei.

— Reunirei os homens ao anoitecer e

iremos até lá. E quanto à mulher, o que

faremos com ela?

— Mulheres idosas não tem serventia

para mim, Harry. Acredito que nem para

você — falou ele, dando a entender o que

deveria ser feito. — Apareça por lá um dia

desses, Harry. Terei o máximo prazer em

retribuir sua hospitalidade.

— Farei isso em breve, general —

prometeu Harry.

O homem uniformizado se levantou.

Harry o acompanhou até a porta. Quando

olharam para a rua, algo chamou-lhe a

atenção, mais ao general que ao xerife,

inicialmente.

— Veja aquilo, Harry — apontou ele.

O homem da lei observou com atenção o

cavaleiro alto e forte que passava pela rua

naquele momento, acompanhando de uma

mulher que, sob a poeira, exibia traços de

rara beleza.

— O que me diz daquele homem, Harry?

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— Parece-me muito forte e saudável, o

tipo ideal para trabalhar na mina.

— Eu o quero, Harry. Pegue-o para mim.

— E quanto à garota?

— Faça o quiser, Harry. Já estou velho

para certas coisas, mas não o bastante para

não me lembrar da utilidade de uma mulher

bonita.

O xerife riu da observação do general,

que se despediu e foi apanhar seu cavalo.

Quando montou, foi logo rodeado por seus

homens, afastando-se a galope.

Em frente ao saloon, Sam os acompanhou

com curiosidade, até que eles saíssem da

cidade.

— Viu aquilo? — comentou ele.

— Se não me engano, aquele era um

uniforme dos confederados, não?

— Sim, mas o que um graduado rebelde

estaria fazendo por aqui atualmente? E de

uniforme ainda? — resmungou Sam,

desviando os olhos para o xerife que, na

entrada da cadeia, conversava com dois

outros homens.

Qualquer coisa o alertou em relação

àquela conversa. Podia jurar, pela maneira

como olhavam, que ele e Jane eram o

assunto principal daquela conversa.

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— Desmonte — ordenou ele à garota.

— Vamos entrar aí?

— Sim, por que não?

— É o saloon...

— Disso não tenho a menor dúvida. Já

traçamos nossos planos. Se você quer me

ajudar, é a única forma. além disso, poderá

traçar um interessante painel do homem do

oeste para seus leitores...

— Sob um ponto de vista muito íntimo,

não? — comentou ela, com ironia.

— Ora, não enrole, Jane — riu ele,

desmontando e puxando-a da sela.

Segurou-a pelo braço e levou-a para

dentro do saloon, quase vazio naquele

momento. Apenas dois homens

conversavam com o barman, no extremo do

balcão.

Sam respirou fundo e se preparou para a

representação.

— O que vai querer? — indagou o

barman, aproximando-se preguiçosamente.

— Quem é o dono desta espelunca? —

indagou Sam, audaciosamente.

O barman mediu-o com um sorriso

brincalhão nos lábios. Um dos homens que

estavam no extremo do balcão se

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aproximou, examinando Sam da mesma

forma.

— O que deseja com o dono? — indagou.

— É você?

— Não, mas...

— Então vá chamá-lo, se o conhece.

Tenho um negócio muito interessante a

propor.

— Não sou garoto de recados —r

espondeu o outro, com desprezo.

— Isso quem decide sou eu — respondeu

Sam, abrindo a capa e o paletó, para exibir

suas armas de coronhas serrilhadas.

Os dois homens examinaram-nas

atentamente, depois trocaram olhares

respeitosos.

— O que você é? — indagou o barman.

— Não interessa. Já estão demorando

demais — irritou-se o delegado. — Vá

chamar o proprietário — ordenou ao

barman.

Nesse momento, os dois homens que

estavam falando com o xerife entraram.

Pelo modo como eles o olharam, Sam

farejou encrenca a caminho.

— O que houve, Sid? — indagou um

deles ao barman.

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— O forasteiro aqui está impaciente.

Quer falar com o dono do saloon.

— Realmente? Por que não disse antes.

Nesse caso, é nosso dever levá-lo até lá, não

é? — comentou ele, e todos riram, exceto

Sam.

— Por que ele não pode vir até aqui? —

perguntou ele.

— Porque ele é o dono e, se você quiser

vê-lo, terá de vir conosco — disse um dos

homens e, logo em seguida, o outro homem

no extremo do balcão se aproximou

também.

Sam percebeu que estava rodeado por

eles.

— Jane, por favor, espere-me numa

daquelas mesas — disse ele à garota,

empurrando-a para fora da roda, de modo

que ela ficasse segura.

— E então, forasteiro? perdeu a pressa?

Não quer ver o proprietário?

— Sim, quero vê-lo...

— Nesse caso, é bom deixar aqui, com o

velho Sid, essa artilharia. O dono tem certa

aversão por amar — explicaram-lhe.

— Nada feito. Eu vou, eles vão; eles

ficam, eu fico — respondeu.

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— Bem, agora estamos dispostos a levá-

lo de qualquer forma, estranho. E podemos

ficar violentos...

— Estou morrendo de medo — comentou

Sam, virando-se para pedir ao barman uma

bebida.

— Sam, cuidado! — gritou Jane.

Sam tentou se desviar da garrafa que o

barman endereçara a sua cabeça, mas a

pancada ainda o atingiu no ombro.

— Pau nele, pessoal! — ordenou o

barman.

Os quatros homens se atiraram sobre

Sam, atingindo-o com socos e pontapés. O

delegado federal, não foi, no entanto, pego

totalmente de surpresa. Sua reação foi

imediata.

Sua bota atingiu o joelho de um dos

atacantes, fazendo-o gemer e rolar pelo

assoalho.

Alguém o atingiu por trás, com uma

cadeira que se espatifou. Sam percebeu que

as coisas começavam a ficar feias para ele e

passou a atacar.

Desferiu uma potente cotovelada na

espinha do homem que o agarrara pelas

pernas, derrubando-o a seus pés. Chutou-o

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com força, enquanto tentava sacar suas

armas.

Antes que pudesse usá-las, no entanto, o

barman o alertou!

— Não faça isso, forasteiro. largue isso

ou arrebento a cabeça da moça!

Sam olhou para ele. Uma espingarda de

cano duplo estava apontada para Jane e o

barman não demonstrava estar blefando.

— Obedeça! — insistiu ele.

Sem outra alternativa, Sam deixou cair as

armas. Dois homens seguraram seus braços

com firmeza, enquanto os outros dois se

postaram diante dele, olhando-o com

desprezo.

— É um valente e forte, forasteiro, mas

verá que isso só tem uma utilidade por aqui

— disse um deles.

— Sim, o trabalho duro. E não tente

bancar o espertinho porque temos meios de

amaciar carnes de pescoço como você —

completou o outro, enfiando o punho no

estômago de Sam, inesperadamente e com

toda força.

O delegado sentiu que todo o ar de seus

pulmões foi expulso com o golpe.

Antes que pudesse se refazer, no entanto,

novo golpe atingiu seus rins, fazendo seus

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joelhos fraquejarem e um gosto amargo

subir-lhe à boca.

A pancada seguinte atingiu seu queixo,

jogando sua cabeça violentamente para trás.

Ele tentou se defender com os pés, mas suas

pernas pesaram como chumbo.

Os homens continuaram se revezando

naquela seqüência de golpes contra o corpo

dele, até que Sam não visse nem sentisse

mais nada.

Acordou sentindo como se uma manada

de búfalos tivesse passado sobre seu corpo.

Não sabia onde estava nem como havia

chegado até ali. e não gostava nada do que

via.

Estava numa espécie de jaula, com as

mãos e os pés firmemente amarrados. Os

olhos doíam, mas ele conseguiu mantê-los

abertos para observar as atividades de

homens empurrando vagões que saíam de

um buraco na montanha.

Guardas brandindo chicotes apressavam

os trabalhos e gritavam palavrões,

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distribuindo generosa e impiedosamente

chicotadas à direita e à esquerda.

Mais adiante, pendurado num galho, o

corpo de um homem balançava-se. coberta

de sangue. As mãos estavam amarradas na

corda. De baixo dele, uma poça de sangue e

um chicote longo manchado de sangue.

Um grupo de homens deixou a casa

maior. Entre eles vinha, caminhando com

imponência, aquele general confederado

que Sam vira na cidade.

Os homens se aproximaram e pararam

diante da jaula.

— Vejo que já acordou — disse o

general. — Temi que eles o tivessem

machucado muito...

— O que está havendo por aqui, afinal de

contas? — indagou Sam, sentindo todo o

corpo doer a cada palavra que pronunciava.

— Nada de especial, meu rapaz. Quero

apenas parabenizá-lo pelo novo emprego...

— Emprego? Que diabo! eu estava à

procura de emprego...

— Que pena! agora já está empregado...

— É um velho muito engraçado mesmo

— falou Sam, com ironia e desprezo.

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— Cale-se e respeite o coronel! —

ordenou um dos homens, chicoteando as

grades da jaula.

— Deixe o rapaz, Ed, pelo menos por

enquanto. Eu preciso de homens na mina.

Se ele mantiver esse gênio ruim,

cuidaremos de amansá-lo, mas não vamos

estragá-lo para o trabalho. Há muito a ser

feito ainda.

— Alguém quer me explicar o que está

havendo? O que é isto aqui, afinal?

— Isto aqui é uma mina, rapaz, se já não

o percebeu ainda. Estamos escavando para

extrair ouro. É este o trabalho que você fará

para mim.

— E se eu me recusar?

— Não fará isso — disse o general, com

severidade, apontando o corpo que pendia

da árvore.

Nada podia ser mais eloqüente que

aquele corpo. Entendia agora o que estava

se passando em Parkville e irritou-o ver-se

apanhando tão facilmente por eles.

Mais irritado ainda ficou quando viu um

dos homens que estava no saloon, usando

suas armas. Olhou-o com profundo ódio.

Era um dos que o agrediram. O outro sorriu,

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diante daquele olhar, acariciando

significativamente o cabo de seu chicote.

— Trabalhe direito e será bem tratado e

alimentado. Dê-nos problemas e garanto

como o faremos se arrepender disso.

Preparem uma bola para ele — finalizou o

general, afastando-se.

Um dos homens também se afastou e foi

até um galpão, de onde retornou com uma

bola de ferro unida a uma corrente,

terminando numa algema.

Dois homens apontando as armas

engatilhadas para Sam, enquanto o terceiro

abria a porta e libertava os pés dele.

— Saia já dai! — ordenou.

Sam não teve outra alternativa senão

obedecer. Seu corpo doía a cada

movimento. Ele deixou a jaula, ainda

incapaz de se pôr ereto por causa da surra

que levara.

O homem com o bola de ferro inclinou-se

diante dele. A algema foi presa ao tornozelo

dele, sobre a bota.

— Bom, muito bom — disse o homem,

levantando-se. — Estou certo que não nos

dará trabalho com isso. Para onde o

levaremos para trabalhar. — indagou aos

outros.

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— Vamos pô-lo nas escavações. Não

poderá se movimentar muito por lá e nem

precisará fazê-lo — respondeu outro.

— Apanhe a bola — ordenou outro, o

que usava as armas de Sam.

Respirou fundo e se inclinou para

apanhá-la. Sabia que qualquer tentativa de

reação naquele momento era pura loucura.

Não tinha chances.

Precisava agora se manter vivo e inteiro

para conseguir se safar dali. O empurrão

com a coronha de um rifle, seguido de uma

chicotada nas pernas não contavam, pelo

menos por enquanto.

Tinha de engolir aqueles desaforos para

se manter vivo. Tudo seria, no entanto, uma

questão de tempo para os homens que o

haviam aprisionado.

Para eles, Sam reservaria uma atenção

toda especial.

Jane sabia que a profissão de jornalista

poderia ser perigosa, mas jamais imaginaria

algo como aquilo. Após ver Sam ser

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espancado selvagemente e arrastado por

fora do saloon, um homem a havia agarrado

pelo braço e a arrastado para um quarto, no

andar superior.

Ali foi empurrada rudemente para cima

de uma cama. O xerife sorriu

significativamente, olhando-a em desalinho

sobre a cama. Ela ainda apertava firme em

suas mãos a carteira com a credencial e o

distintivo de Sam, posta ali quando ele e

empurrara para fora do círculo feito pelos

seus agressores.

Com certeza ele estava prevendo tudo

aquilo e não desejou que sua identidade

fosse revelada.

— Não sei que diabos vieram fazer aqui

na cidade, garota, mas só tenho a agradecê-

los por isso — falou ele, fechando a porta

atrás de si.

Jane entendia agora todos os alertas que

Sam lhe dera sobre os perigos que poderiam

correr, só que ele não estava ali para ajudá-

la agora.

Precisava cuidar de si sozinha e, ainda

por cima, tentar encontrar aquele imbecil,

que se deixara apanhar daquela forma.

Olhou o rosto do xerife. Estava escrito

em seus olhos suas intenções. No momento

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do perigo, havia coisas que um homem não

podia ensinar a uma mulher.

Jane sabia que pouco conhecia dos

costumes do Oeste, exceto o que lhe haviam

contado e o que ela havia inventado em sua

historia sobre Sam. Só que não era uma

garotinha indefesa. Era uma garota

experiente e esperta e teria de usar tudo isso

para se livrar daquela situação.

Decidida a agir da melhor maneira,

procurou não demonstrar medo, quando o

xerife se aproximou da cama.

— Estendendo-se na cama! — ordenou

ele.

Ela espreguiçou-se, sem dar-lhe atenção.

Levantou-se e foi até o espelho.

— Meu Deus! Estou horrível... Olhe

isso... Poeira... — falou, passando as mãos

nos cabelos. — Preciso de um banho

urgentemente. Pode conseguir isso, xerife?

— arrematou, olhando-o com charme e

sedução.

— Sente-se feia?

— Horrível! você deve estar achando o

mesmo, não? Um homem tão forte... Tão

charmoso como você... Não vale! Estou

muito feia para você ficar me olhando assim

— falou ela, correndo se esconder atrás de

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um biombo. — Eu me recuso a falar com

você, enquanto não tomar um banho e não

trocar esta roupa suja. Estou fedendo a

cavalo e suor.

O xerife, julgando-a geniosa. Era bonita e

interessante. Limpa e bem vestida ficaria

ainda mais tentadora.

— Não está preocupada com seu amigo?

— indagou ele.

— Meu amigo? Aquele desmiolado? Não

me interessa o que aconteceu com ele. Sabe

o que ele pretendia? Vender-me para o dono

deste saloon.

— Que bastardo! Fique tranqüila! Ele

não virá aqui incomodá-la mais.

— Para onde o levaram?

— Ele foi para o trabalho — respondeu o

xerife, laconicamente, sorrindo.

Ela ficou sem entender.

— Mandarei uma das garotas vir aqui

para ajudá-la com seu banho. Logo mais, à

noite, voltarei para vê-la. Quero-a linda e

perfumada a minha espera.

— Estarei aqui, prometo! — sorriu ela,

ainda escondida atrás do biombo.

O xerife, todo convencido, saiu,

antecipando os rapazes de experimentar

uma nova garota naquela noite.

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— Porco nojento! — resmungou Jane,

examinando o aposento onde se encontrava.

Não teve muito tempo para isso. Logo em

seguida a porta se abriu e uma garota

entrou.

— Olá, meu nome é Danny e me

mandaram cuidar de você. Pelo que vejo,

não exageraram. Você precisa mesmo de

um banho e de uma roupa mais condizente.

— Está bem, Danny, obrigada pela ajuda.

Danny foi até a porta e retornou,

arrastando uma banheira de metal,

deixando-a no centro do aposento. No

momento seguinte, ela e outras duas

mulheres se revezaram, trazendo baldes de

água para encher o recipiente, misturando

sempre a água, mantendo-a morna e

agradável.

— O que há com esta cidade? — indagou

Jane, quando Danny retornou, desta vez

com sabão e toalhas.

— Como assim?

— Sinto que há alguma coisa

acontecendo por aqui...

— Nada acontece em Parkville, exceto

nos sábados, quando os rapazes vêem para

cá se divertir.

— Que rapazes?

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— Os rapazes da mina.

— Que mina?

— Aquela para onde levaram seu

homem...

— Refere-se ao Sam?

— Sim, se for aquele que chegou com

você. Está lá agora e não gostaria de estar

na pele dele.

— Por quê?

— Há coisas aqui que é bom nem saber,

garota. Vá se despindo agora, enquanto

trago o vestido.

— Danny, espero um pouco! — pediu

Jane, aflita. — O que vão fazer com ele lá

na mina?

Em sua mente veio-lhe a imagem daquele

homem no hospital, com o corpo retalhado

por um chicote.

— Quer mesmo saber?

— Sim, conte-me, por favor!

— Não diga que eu lhe disse essas coisas

a ninguém, principalmente ao xerife. Eles

vão acorrentar seu homem e obrigá-lo a

trabalhar. Se protestar será chicoteado. Se

tentar fugir, será morto. Se ficar doente, eles

o deixarão morrer. Assim, o melhor que tem

a fazer e esquecê-lo.

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— Esquecê-lo? — retrucou Jane,

pateticamente, sentindo-se inútil diante

daquele quadro aterrador.

— Vamos, tire a roupa agora! — insistiu

Danny. — Para todos os efeitos, ele está

morto. Você está viva, porém, e terá de ser

muito esperta para continuar assim. Agrade

ao xerife. Ele é o dono do saloon. Amanhã é

sábado e o pessoal da mina estará aqui. Faça

com que eles bebam. Poderá cobrar até cem

gramas de ouro daqueles que quiserem se

deitar com você...

— Cem gramas? — surpreendeu-se ela.

— Sim, é o que uma garota nova vale por

aqui. Enquanto você for novidade,

aproveite.

— E o xerife, como é ele?

— Violento, quando contrariado, mas

sabe ser carinhoso quando quer. Gosta de

bater, mas não tem a mão pesada. Assim, se

ele a espancar, grite bem alto, como se ele

estivesse moendo seus ossos, entendeu?

Jane ficou boquiaberta olhando a outra

falar aquilo com tanta naturalidade. Não

podia admitir aquele tipo de comportamento

tão passivo, diante da tirania de um homem.

— Está falando sério mesmo, Danny?

— Sobre o xerife?

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— Sim, sobre apanhar e não reagir...

A outra olhou-a com uma expressão de

puro medo no rosto. Seus olhos fixaram-se

nos de Jane, como se ela tentasse entender o

pensamento daquela recém-chegada à

cidade.

— Venha até aqui — pediu Danny,

tomando-a pela mão e levando-a até a

janela.

Apontou na direção de uma colina, não

muito afastada da cidade.

— Sabe o que é lá?

— Pelo que vejo, é um cemitério, não?

— Sim, e é para lá que vão as garotas que

tentam reagir contra o xerife. Como eu disse

a vocês, ele pode ser violento... Muito

violento...

Jane encolheu-se toda, percebendo agora

a dimensão da encrenca onde se metera.

Na semi escuridão da mina, Sam

golpeava ferozmente a muralha de entulho a

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sua frente. Já nem sabia mais dizer o que

doía mais, se a surra que levara ou seus

músculos, prestes e se arrebentarem pelo

esforço constantes.

Junto dele, outros homens, igualmente

mergulhados na poeira, faziam o mesmo,

gemendo a cada novo golpe. Bem atrás,

livres da poeira e do calor insuportável,

quatro guardas, de armas nas mãos,

conversavam e riam, vigiando os

prisioneiros.

— Escutem! — disse Sam aos demais

homens com ele. — Há algum modo de

fugir daqui?

Os homens se entreolharam, balançaram

as cabeças num sinal de desânimo, depois

continuaram seu doloroso trabalho.

— Vocês não perceberam ainda, seus

idiotas? — falou ele, furioso. — ficar aqui é

morte certa.

— Esqueça! — falou um deles.

— Por quê?

— Porque tentar fugir também é morte

certa. Ninguém escapou daqui ainda.

— Enganam-se. Um homem escapou

daqui. Um negro, que deixaram jogado

numa ravina. Conseguiu se arrastar até a

estrada e ir à procura de ajuda.

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— Negro? Ravina? Foi Noah, pessoal!

Tem certeza que ele está vivo? — indagou

um deles.

— Sim, foi quem falou sobre o que está

acontecendo aqui...

— Falou? E você, quem é?

— Alguém que ficou sabendo disso,

apenas isso — descartou.

Não seria prudente revelar sua verdadeira

identidade naquele momento. Pressionados

como eram, aqueles homens poderiam

vender a alma ao diabo por um pouco de

descanso.

— Acha mesmo que é possível escapar

daqui? — perguntou outro deles,

demonstrando certo interesse.

— Sim, basta planejar com cuidado.

Alguém aqui conhece bem a região?

— Todos nós conhecemos...

— Quando poderemos falar com calma?

— À noite, após o escurecer, quando nos

recolherem. Só que vamos estar cansados

demais para qualquer coisa.

— Mais força nessas picaretas, seus

molóides — gritou um dos guardas,

avançando com o chicote na mão.

Com o movimento rápido ele agitou o

látego no ar, fazendo-o ir estalar nas costas

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de Sam, que sentiu o gosto de sangue em

sua boca, tamanha a dor provocada.

O sangue começou a escorrer, molhando

sua camisa. O corte ardia como fogo.

Imprimiu mais vigor na picareta, olhando

com o canto dos olhos seu agressor.

Era o mesmo que usava suas armas. Sam

debitou aquela chicotada na conta que

deveria cobrar daquele homem, tão logo

surgisse a oportunidade.

E ele não iria ficar esperando que ele

surgisse. Pelo contrário, pretendia empregar

o que lhe restava de energia para encontrar

uma forma de sair dali o mais depressa

possível.

Estava não apenas preocupado com sua

própria vida, mas com Jane, que deixara

numa grande encrenca ao permitir que ela

viesse com ele.

Quando começou a escurecer, os homens

foram recolhidos e confinados em galpões,

onde receberam um prato de uma comida

gosmenta e mal cheirosa.

— Diabos! isto é comida de porcos —

protestou Sam, deixando seu prato ao seu

lado.

— Cale-se e coma! Não é muito gostosa,

mas sustenta. Vai precisar de todas as suas

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forças amanhã, homem — alertou-o um

prisioneiro ao seu lado.

Sam olhou o prato, respirou fundo e o

apanhou. Foi se sentar nos fundos dos

alojamento, junto com outros homens, todos

extenuados.

Ele notou que poucos estavam algemados

a bolas de ferro. Deveria haver algum

motivo especial e ele desejou sabê-lo.

— Acho que formamos uma equipe de

homens especiais, não? — disse ele,

apontando as bolas de ferro.

Os outros não demonstraram muito

interesse na conversa de Sam preocupados

em engolir rapidamente a comida. Todos

tinham o medo estampado em seus rostos.

— Escutem, preciso de ajuda, só isso.

Acabo de chegar aqui e não gostei do

tratamento, da comida e das instalações.

Pretendo ficar apenas o necessário e dar o

fora o mais cedo possível. Só me

respondam o seguinte: como é que se foge

daqui?

Os homens entreolharam-se e sorriram,

balançando as cabeças com incredulidade.

Quando voltaram a encarar Sam,

perceberam, pela expressão do rosto dele,

que ele falava sério realmente.

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— Quer mesmo saber? — indagou um

homem barbado e muito forte.

— Sim, claro que sim — confirmou Sam,

com veemência.

— Inicialmente, livre-se dessa bola, se

puder. Em seguida, saia deste alojamento,

se conseguir. Depois, tome a trilha que fica

à esquerda da estrada da mina e corra o

mais depressa que puder.

— Só isso?

— Sim, a trilha vai levá-lo direto a

Parkville, onde o xerife lhe dará uma nova

surra e o trará de volta, isto é, se os

capangas do general não o apanharem antes.

Agora, se quiser evitar esse tipo de

aborrecimento, tome o caminho à direita da

mina. Ele o levará direto às ravinas, onde

ficará para sempre.

— Você não é muito otimista nem

animador — disse-lhe Sam, com um sorriso

desanimado.

— Quer saber de uma verdade

irrefutável, forasteiro?

— Bom, depois de tantas más noticias,

uma a mais não fará diferença alguma.

— Você acabou de chegar e ainda não

descobriu. Leva pouco tempo, posso lhe

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garantir. Vou apenas antecipar para você,

estamos mortos, homem! Mortos, entendeu?

Sam encarou-o, incapaz de aceitar aquela

realidade terrível.

— Não eu, meu amigo! Não eu! pretendo

sair daqui de qualquer maneira, custe o que

custar, ou morrer tentando, então.

— Vai morrer tentando. Como se livraria

dessa bola de ferro, por exemplo?

Sam sorriu e olhou ao seu redor. Os

homens que distribuíam a comida já haviam

saído. Os outros ouviram o desafio e

olhavam para ele com interesse.

O delegado, então retirou o cinto de sua

calça e, com o pino da fivela, escavou no

orifício da algema, até que ela produzisse

um estalido.

Ele ergueu, então, a corrente, exibindo a

algema aberta, fazendo com que uma

centelha de esperança brilhasse nos rostos

daqueles homens condenados.

— O que achou? — indagou Sam ao

grandão.

— Muito bom, realmente hábil, rapaz,

mas os problemas de sua fuga apenas

começaram.

— Só preciso que me ajudem a descobrir

uma forma de superar os outros. Vocês

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conhecem o lugar e a região. Só precisam

me contar o que sabem — falou ele,

voltando a fechar a algema em seu

tornozelo.

Pouco a pouco o cansaço havia dominado

os homens naquele alojamento imundo e

desconfortável. Muitos já haviam procurado

a melhor acomodação para dormirem sobre

as tábuas nuas e eram logo vencidos pelo

sono.

Sam apoiara-se precariamente a uma das

paredes, evitando que suas costas

machucadas pela chicotada tocassem a

madeira. Pensava numa forma de sair dali.

Os homens haviam tentando dissuadi-lo,

avisando que era loucura tentar.

Ele se recusava a aceitar isso. Sua

preocupação com Jane aumentava.

Continuava se sentindo responsável por ela,

apesar de ainda julgar desmiolada e

teimosa.

Se fosse esperta, poderia se arrumar

sozinha. Só que estava longe de conforto e

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da proteção de uma grande cidade. Ali, no

oeste, a lei era feita visando interesses de

quem fosse o mais poderoso.

Era o que acontecia em Parkville, onde

aquele general maluco parecia mandar.

Subitamente, no silêncio cansado do

alojamento, alguém começou a rir.

— O que foi, Hollyrock? — indagou

alguém.

— O Ed, de armas novas... Vocês viram?

Parecia um palhaço mal agüentando o peso

daquele cinturão — contou o homem,

sempre rindo.

— Sim ,estava cheio de posse...

— Aposto que nem sabe como usar

armas como aquelas...

— Ele fez isso para impressionar a

namorada...

— Hoje ele terá alguma coisa grande para

mostrar para a namorada — acrescentou

outro e todo o alojamento ria, divertido com

os comentários que iam sendo

acrescentados.

Sam ouviu tudo atentamente e procurou

se aproximar do foco inicial daquela

estranha e histeria diversão.

— Quem é o Ed? — indagou Sam.

— Você é o novato?

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— Sim...

— Ed é o sujeito que ficou com suas

armas...

— E ainda me deu algo em troca —

comentou Sam, sentindo a pele das costas

arder ainda.

— Ed vai todas as noites para a cidade.

Ele tem uma garota lá no saloon. Ela não

recebe mais ninguém e Ed a paga com o

ouro que rouba da mina. Mesmo assim, é

um dos homens de confiança do general,

um privilegiado.

— E esse general, quem é essa figura,

afinal de contas? — quis saber Sam,

percebendo que, agora, o pessoal parecia

mais disposto a falar.

— Ninguém sabe dele. Só o conhecemos

quando viemos para cá. Mas tem pinta de

louco, como tem. Com aquele roupa do

exército confederado, parece o próprio

senhor dos escravos, não?

— E esse Ed vai e volta toda noite? —

insistiu Sam.

— Sim, como um relógio. Sai daqui após

o jantar e retornar ao amanhecer. Aquele

maldito tem do bom e do melhor, enquanto

nós morremos aqui.

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Sam pensou por instantes, vislumbrando

uma chance de escapar dali. Retirou o cinto

e, novamente, usou o pino da fivela para

abrir a algema.

Levantou-se e foi até a porta, espreitar lá

fora. Havia dois homens próximos dali,

portando espingardas.

— Diabos! — praguejou Sam.

— O que pensa que vai fazer? —

perguntou um deles.

— Dar o fora daqui, já disse. Acho que

há um meio de sair sem ser notado, pelo

menos até o dia amanhecer — explicou ele.

— Quer mesmo sair? — falou alguém.

— Não desejo outra coisa...

— Pelo telhado, você chega até o

barranco. Se estiver disposto a arriscar o

pelo, é só escapar e subir a montanha, ou

descer por ele e ir até o estábulo.

Olhou imediatamente para cima. Traves

sustentavam o teto, mas eram altas.

Precisaria de ajuda.

— Preciso que alguém me levante até

aquela viga — disse ele.

O grandão, com quem Sam havia

conversado algum tempo antes pensou por

instantes, depois se levantou e foi até lá.

Com extrema facilidade levantou Sam em

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seus ombros, de onde ele pôde chegar até a

viga.

Os músculos e o corpo doíam

terrivelmente. Ele procurou um ponto onde

as telhas estavam soltas, abrindo uma

passagem por ali. Estava cansado, mas

decidido.

A preocupação com Jane e um ódio

mortal àqueles homens dava-lhe forças

extras para vencer a dor e o sofrimento. No

telhado ele respirou fundo algumas vezes,

recuperando as energias.

Viu, então, o barranco, contra o qual fora

construído o alojamento. Avançou pelo

telhado e depois, com cuidado, desceu até o

chão.

Lembrou-se do que lhe haviam dito no

interior do alojamento. Indo pela esquerda

chegaria à trilha que conduzia à cidade. Por

ali seguramente passaria Ed, em sua visita à

namorada.

Sam tinha um plano que talvez

funcionasse e o levasse inteiro até a cidade,

à procura de Jane. A idéia era bem simples.

Se conseguisse apanhar Ed e tomar seu

lugar, não teria dificuldades para passar

pelos guardas.

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Observou atentamente, descobrindo a

posição de todos os guardas da noite.

Depois, evitando-os, conseguiu chegar até a

trilha que levava à cidade.

Avançou cautelosamente por ela. Num

ponto oculto dos guardas que estavam no

alto dos morros, havia uma árvore com um

dos galhos se projetando sobre a estrada.

Era o ponto ideal para a emboscada.

Apanhou um pedaço de madeira pesada e

dura e subiu rapidamente na árvore,

posicionando-se e aguardando

impacientemente.

Não precisou esperar muito. Pouco

depois, o ruído de cascos alertava-o da

aproximação de um cavaleiro. Só poderia

ser o Ed, concluiu.

O maldito havia se apossado também do

cavalo de Sam.

— Vai ter o que merece — sentenciou o

delegado.

quando o pistoleiro se aproximou, Sam

desferiu-lhe um golpe no alto da cabeça,

com tudo que lhe restava de força no corpo

ainda.

O ruído desagradável deu a entender que

a cabeça do pistoleiro fora partida. Ed

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deslizou pela sela como um boneco

desarticulado, amontoando-se na poeira.

Sam saltou sobre a sela do cavalo e, dali,

para o chão. Apanhou suas armas, depois

arrastou o corpo de Ed para um local

escondido. Pegou seu chapéu e seu casaco.

Tinha pressa agora de chegar à cidade.

Jane estava apreensiva demais com a

chegada da noite, pois ela traria consigo o

xerife. Estava sozinha no quarto e usava um

vestido um tanto escandaloso para o seu

gosto, mas adequado para uma garota de

saloon.

De repente, à porta se abriu e Danny

apareceu.

— Venha, vou lhe mostrar algo — disse a

Jane, atravessando o quarto e indo até a

janela.

Jane a seguiu.

— O que está havendo? — quis saber a

jornalista.

— Eles vão sair novamente.

— Eles? Quem são eles?

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— Olhe lá — apontou Danny, na direção

da cadeia.

Diante do prédio, quatro cavaleiros

montavam. Um deles era o próprio xerife.

Logo em seguida, um grupo de mais meia

dúzia de homens veio para a rua e se juntou

a eles. Levavam correntes e chicotes e

pareciam ter um objetivo determinado, pois

saíram a galope pela rua.

— O que eles vão fazer? — indagou

Jane.

— Caçar escravos. Devem estar

precisando muito de gente lá na mina.

— São caçadores de escravos? mas Não

vi nenhum negro por aqui?

— Não precisa. Há brancos que podem

fazer o mesmo trabalho que os negros. Esta

noite eles vão apanhar alguém por aí, com

certeza. Alguém que esteja de passagem

pela cidade, como seu homem, ou que tenha

chegado para se estabelecer. Será como se

tivessem sumido no ar.

— E o povo da cidade, não reclama?

— A maior parte deles está empregada

como guarda lá na mina e acha muito bom.

O general paga em ouro e todos ficam

satisfeitos.

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Jane sentiu um calafrio percorre sua

espinha. A historia era absurda demais,

terrível demais, mas precisava ser contada.

Tinha de conseguir a oportunidade de

contá-la.

Pensou em Sam, na encrenca que o

metera com aqueles homens maus e se

preocupou por ele. Ficou ali, na janela,

olhando a rua, enquanto Danny se retirava e

o saloon começou a encher-se de homens.

Ficou aliviada sabendo que o xerife não

viria logo. Tinha algo sujo a fazer.

De repente, observou um cavaleiro que

descia a rua sozinho. Um arrepio percorreu-

a. Conhecia aquele jeito de se sentar na sela.

Conhecia aquela figura muito bem.

— Sam! — murmurou ela, reconhecendo

o cavalo também.

Ele parou diante do saloon. Jane abriu a

janela e pôs a metade do corpo para fora

para chamá-lo desesperadamente.

O delegado levantou a cabeça. Seu rosto

demonstrava o que fora aquele dia para ele.

— Jane! — murmurou ele, com alivio.

— Sam, que bom que esteja vivo!

— Vou tirá-la daí agora mesmo — disse

ele desmontando e entrando no saloon.

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Quando entrou, o silêncio caiu sobre o

local. os homens da cidade, que não

trabalhavam na mina, levantaram a cabeça.

Um murmúrio percorreu o saloon. Logo

todos souberam quem era aquele fantasma

parado à porta.

Reconheceu dois homens que

conversavam com o barman. Haviam

ajudado a surrá-lo naquele dia. Ao vê-lo, os

homens arregalaram os olhos, incrédulos.

— Não sei como conseguiu fazer isso,

homem, mas foi a maior besteira que já fez.

— falou o barman, contornando o balcão e

surgindo com uma espingarda de cano

serrado nas mãos.

— É um imbecil, o maior imbecil que já

conheci em toda a minha vida. Fugiu da

mina e veio direto para cá — disse outro.

Os três enfileiraram-se diante de Sam. O

restante ou saiu apressadamente ou

encostou-se na parede para assistir ao

confronto.

— Onde está a garota? — indagou ele.

Naquele momento, Jane havia deixado o

quarto e avançado pelo corredor. Parou no

alto da escada, com o coração na mão ao

ver a cena lá embaixo.

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Por momentos conseguiu distrair a

atenção dos homens. Sam não perdeu a

oportunidade, ao ver que ela estava bem.

Sua sede de vingança era terrível.

Seus Colts voaram para fora dos Coldres,

vomitando chumbo e fumaça. Ele disparou

duas vezes com a mão direita e uma com a

esquerda.

O barman apertou o gatilho de sua

espingarda quando estava caindo, abrindo

um rombo no teto. Sua cabeça fora aberta

por um balaço certeiro.

O homem ao seu lado rodopiou e levou a

mão ao peito, tentando estacar o sangue que

jorrava abundantemente de seu coração

traspassado.

O terceiro, também com um buraco no

peito, rodopiou e foi bater no balcão, onde

tentou se segurar, mas acabou escorregando

para o assoalho, onde estrebuchou e ficou

imóvel.

— Sam! — exclamou Jane, descendo a

escada apressadamente e correndo jogar-se

nos braços dele.

— Fizeram-lhe algum mal? — indagou

ele, guardando suas pistolas ainda

fumegantes.

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— A mim não, mas vejo que judiaram de

você — observou a jovem, examinando-o.

— Isso aqui é o próprio inferno —

declarou ele. — Eu entrei nele e saí.

— Sim, é muito pior que imaginamos. O

xerife acaba de sair com mais alguns

homens. Vão caçar escravos.

— Onde?

— Numa fazenda ao norte daqui — falou

Danny, no alto da escada. — Conheço os

rapazes, já estiveram aqui, Jane. O xerife

vai acorrentá-los também...

— Pode me mostrar o caminho, moça?

— indagou Sam.

— Sim, não será difícil chegar lá,

garanto.

— Onde estão minhas credenciais e meu

distintivo, Jane?

— Vou buscá-los. Acha mesmo que está

em condições de ir atrás deles?

— Eu não perderia esta chance por nada

no mundo — assegurou ele, completando a

carga de balas de seus Colts, enquanto Jane

disparava escada acima.

Page 345: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

Em algum ponto ao norte da cidade, o

inferno se abatia sobre aquela família. Os

quatros homens estavam acorrentados e

haviam sidos chicoteados, enquanto a velha

senhora implorava, caída aos pés do xerife.

A velha casa onde eles se abrigavam

havia sido incendiada. Os homens agora

lançavam seus laços contra os alicerces da

nova casa em construção e puxavam-nos,

derrubando-os.

— Por favor, xerife! Eles nada fizeram,

não pode permitir isso — suplicou a

mulher.

— Ora, não me amole — disse o xerife,

com rispidez, chutando-a.

— Seu animal! — gritou o chefe da

família, encontrando forças para se levantar

e correr na direção do homem da lei.

O xerife sorriu com escárnio e manobrou

seu cavalo para cima dele, quase

pisoteando-o. Um dos seus asseclas se

encarregou de chicotear novamente o

homem caído.

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— Levante-se, idiota! guarde suas forças

para o trabalho que o espera amanhã —

disse.

— Prenda-nos uns aos outros. Assim não

se debaterão tanto — ordenou o xerife.

Os homens terminaram de derrubar os

alicerces da casa, depois apanharam mais

correntes e foram prendendo os capturados

entre si.

— O que pretendem fazer conosco? —

indagou um dos rapazes.

— Vão para a mina!

— Não, por favor, não os leve! não sei o

que será de mim — lamentou a mãe.

— Pois então vamos ajudá-la a decidir a

questão — falou o xerife, sacando sua arma

e, com firmeza absoluta, disparou na cabeça

da mulher.

O sangue transformou o rosto dela numa

estranha e macabra máscara. Ela caiu para

trás, boca aberta e olhos esbugalhados e

assustados.

— Maldito! — gritaram os homens da

família, tentando atacar o xerife, mas

embaraçaram-se nas correntes e caíram.

O xerife e os homens que o

acompanhavam riram da situação,

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brandindo seus chicotes. Gemidos de dor e

estalos se ouviram na noite.

— Levantem-se! Ou vocês se comportem

ou vamos arrancar-lhes a pele — ameaçou o

homem da lei.

Naquele momento, guiado pelas

labaredas da velha casa que ardia, um

cavaleiro se aproximava a toda.

— Quem será? — quis saber o xerife.

— Na certa algum dos nossos chegando

atrasado para a festa — explicou um dos

pistoleiros, ainda rindo.

Como um cavaleiro do apocalipse saído

do ventre escuro da noite, Sam avançou,

com as armas em punho e a revolta em seu

coração.

— Demônios! — gritou alguém. — Ele

também usa um distintivo — observou em

seguida, quando as chamas iluminaram o

cavalo que se aproximava.

— Diabos, é aquele forasteiro, xerife!

— O que está fazendo aqui? como fugiu

da mina? — indagou o xerife, possesso.

— Seus animais nojentos, malditos

torturadores! — berrou Sam, começando a

atirar.

Suas armas dispararam com incrível

precisão. Um a um, como folhas

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despregadas de uma árvore à passagem de

um vento forte, os pistoleiros foram

tombando e estrebuchando na relva.

Passou por entre os pistoleiros como um

furacão e sumiu atrás das chamas. Quando

retornou, havia remuniciado suas armas e as

postos nos coldres.

O xerife e mais três homens olhavam,

atônitos, o estrago feito. Meia dúzia deles

estava tombada, imóvel, os rostos

assustados iluminados pelas chamas.

Todos os olharem se voltaram para Sam.

— Foi um tolo em ter vindo aqui,

maldito. E esse distintivo, o que significa

isso? — falou o xerife.

Os homens começaram a rodear Sam, que

percebeu a manobra mas não se intimidou.

As rédeas estavam soltas no arção da sela.

As mãos pendiam ao lado das coronhas

serrilhadas.

— Sou Samuel Bakley, delegado federal

e estou aqui para acabar com toda essa

injustiça que estão cometendo. Pode fazer

sua escolha, xerife. Morrer aqui ou

pendurado na ponta de uma corda.

O xerife começou a rir, embora não visse

muita diversão naquela situação. Aqueles

corpos imóveis ao seu redor demonstravam

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que o homem a sua frente sabia usar uma

arma.

— Tem muito peito para vir aqui assim,

delegado.

— Estou esperando sua decisão, xerife.

Solte a arma e renda-se ou o levarei para a

cidade atravessado na sela.

— Ouviram isso, rapazes? — falou o

xerife, começando a rir, como se o delegado

tivesse dito uma grande piada.

Sam esbouçou também um leve sorriso,

enquanto sacava suas armas de novo.

A primeira bala penetrou pela boca aberta

do xerife, arrebentando-lhe os dentes e

saindo pela parte de trás da cabeça, levando

sangue, miolos e cabeças.

Com sua pirueta, o homem da lei foi

jogado para trás, rolando sobre o lombo de

seu cavalo. os outros três tentaram atirar,

mas não tiveram a menos chance.

Foram arrancados das selas e atirados

para trás por certeiros balaços que vararam

seus corpos mortalmente.

— Vocês estão bem? — indagou Sam aos

prisioneiros, enquanto saltava do cavalo

para atender a mulher ferida.

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— Apenas com a pele arranhada, mas

vamos viver. E ela, como está? —

preocupou-se um dos rapazes.

Com dificuldades os quatros homens se

aproximaram, lutando contra as correntes

que prejudicavam seus movimentos.

— Está morta! — declarou Sam, com

tristeza.

O desespero se abateu sobre os quatros

homens.

— Vocês também precisam de cuidados

— observou Sam, notando os cortes

produzidos pelos chicotes. Há um médico

na cidade?

— Sim, mas ele não ousará cuidar de nós,

quando souber o que sofremos.

— E por que não?

— Chicotadas são marca registrada por

aqui, delegado. Todos temem aquele

general, dono da mina.

— Eu estou pouco me importando com

ele. Vou libertá-los. Depois quem estiver

melhor vai comigo até a cidade para trazer o

medico.

— É um homem muito corajoso,

delegado, e nós o agradecemos por isso.

Sou John Connors e estes são meus filhos,

Zake, Billy e Morgan.

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— Lamento o que aconteceu aqui e não

ter podido chegar a tempo para salvar esta

senhora. Mas prometo que isso não ficará

impune — assegurou o delegado, indo

revistar os bolsos do xerife e dos outros, até

encontrar o que procurava. — Aqui estão as

chaves dos cadeados. Livrem-se dessas

correntes.

— Não nos esqueceremos do que fez por

nós esta noite, delegado — falou John. —

Se precisar de ajuda, sabe onde encontrá-la

agora.

— É bom saber disso — respondeu Sam.

— Agora vamos, vocês precisam de

cuidados.

Billy foi destacado para acompanhar Sam

até a cidade. Lá eles se dirigiram a casa do

médico, onde o delegado bateu com

insistência na porta.

— Há alguns homens feridos por

chicotadas ao norte daqui, doutor.

Acompanhe este rapaz até lá — ordenou o

delegado, fazendo com que o outro visse

claramente seu distintivo.

O médico hesitou por instantes, olhando a

expressão marcada e dura do homem da lei.

— Está bem, já vou pegar minhas coisas

— falou o médico.

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Pouco depois partia na companhia de

Billy. Sam foi para o Saloon. havia algumas

pessoas lá, atraídas pelo tiroteio de antes.

Ele passou por elas, empurrando-as com os

cotovelos. Jane correu para ele.

— Sam, você corre grande perigo. Já

foram avisar o general lá na mina...

— Certo — respondeu ele, demostrando

cansaço. — Sabe manejar uma espingarda?

— indagou ele à garota.

— Sim, mas para quê?

— Vamos para a cadeia. O xerife não vai

precisar dela mesmo. Quero que você vigie,

enquanto eu durmo.

Na mina, o general pesava

cuidadosamente os saquinhos de ouro em

pó, fechava-os e marcava seu número e

peso num livro. Foi quando chegou

informação do que estava acontecendo na

cidade.

— O que está dizendo? — indagou o

general, levantando-se possesso,

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esmurrando a mesa com as duas mãos,

fazendo saltar o que estava sobre ele.

— Aquele bastardo é um delegado

federal, general. Não sei como conseguiu

escapar daqui. Ninguém deixou o

acampamento, além do Ed...

— E onde está ele agora?

— Ninguém sabe. Não chegou à cidade...

— Imbecis... Podem procurar por aí que

vão achá-lo morto. É fácil deduzir como

aquele maldito saiu daqui. Mas o que ele

está fazendo na cidade? É mais louco do

que pensei. Tudo bem, pessoal. Vamos

manter a calma. Ele está facilitando as

coisas para nós. É apenas um homem e nós

somos muitos.

— Então deixe-nos cuidar dele agora

mesmo — pediu um dos pistoleiros.

— Acha que vai poder com ele?

— Claro que sim. Levo meia dúzia de

homens e...

O general não respondeu. Sentou-se e

ficou cofiando os bigodes, enquanto

pensava.

— Eu me pergunto por que ele foi para a

cidade? Se é um delegado federal, é tudo,

menos estúpido. Por que ele foi para lá.

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Alguém pode me dizer? — indagou ele,

olhando para seus homens.

Eles se entreolharam, sem saber a

resposta.

— Acho melhor pensarmos no assunto.

Reuna um grupo, os melhores homens e vá

para a cidade. Sonde tudo primeiro, antes de

agir. Pode ser que ele tenha algum tipo de

ajuda com o qual nós não contamos. Não

quero erros. Se possível, tragam-no vivo.

Quero ter o prazer de cortar-lhe o couro a

chicotadas — decretou o general.

Ainda que tentasse, Jane que não

conseguia pregar os olhos naquela noite.

Com uma enorme espingarda em suas mãos,

caminhava de um lado para outro da cadeia,

olhando a todo momento pela janela.

Sam dormia profundamente e

tranqüilamente numa das celas e ela não

conseguia entender como ele podia fazer

aquilo. Havia um silencio sinistro pairando

sobre a cidade. As ruas estavam vazias. Os

nervos da garota à flor da pele.

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Suportou corajosamente aquela noite de

vigília, cheia de sobressaltos. quando a

claridade do dia surgiu, ela foi acordar Sam,

conforme ele pedira.

Ao se mover na cama, ele gemeu.

— O que foi? — quis saber ela.

— Minhas costas...

— Deixe-me ver isso — pediu ela.

Sam virou-se para o lado. Jane notou que

a camisa limpa que ele pusera na noite

anterior colara-se ao corte feito pela

chicotada.

— Rapaz, isso deve doer um bocado —

comentou ela, puxando rapidamente o

tecido e descolando-o.

— E como dói! — murmurou ele,

cerrando os dentes, sentindo o sangue

escorrer mornamente pelas suas costas.

— Acho que deve ter alguma coisa para

ferimentos por aqui — comentou Jane,

começando a vasculhar gavetas e armários.

— Depois pegue uma outra camisa para

mim. Está no alforje da sela...

— Certo — concordou ela.

Havia encontrado um pouco de uísque e

ataduras. Não era muito, mas já daria para

limpar o ferimento. Antes de ir atender

Sam, foi buscar a camisa. Ao abrir a porta,

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percebeu o grupo de cavaleiros que entrava

na cidade e avançava ameaçadoramente

pela rua principal.

Correu até Sam. ao ver a expressão no

rosto dela, ele se pôs em pé num salto.

— Eles estão vindo — disse ela, num fio

de voz.

— Onde estão?

— Entrando na rua principal.

— muitos?

— Uns dez. O que vai fazer?

— Acho que vai ter de mostrar que sabe

usar aquela arma — falou ele, já com o

cinturão afivelado nos quadris e

examinando as cargas dos Colts.

Jane foi apanhar a espingarda e munição,

enquanto Sam ia até a janela contar o

número de pistoleiros que vinha ao seu

encontro.

— Sete apenas, mas me parecem muito

dispostos — comentou ele.

Os sete cavaleiros pararam diante da

delegacia. A maioria deles tinha

espingardas de cana serrado e apontavam-

nas para a porta e janelas.

— Ei, delegado! Sabemos que está aí —

disse um deles. — Tem um minuto para

sair.

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— Um minuto é muito tempo —

comentou Sam, olhando-os pelo canto da

janela.

Mirou um homem que acabara de falar e

apertou o gatilho. Os olhos do pistoleiro se

esbugalharam e ele rodopiou sobre a sela,

estatelando-se na poeira.

Os outros se assustaram de procurar

abrigo. Sam ainda atingiu mais um deles na

confusão, jogando-o dentro do bebedouro

em frente à loja do outro lado da rua, ao

lado do saloon.

— Agora são cinco! — exclamou.

— Estamos encurralados — disse Jane,

assustada quando a fuzilaria começou.

— Abaixe-se e não levante a cabeça por

nada. Deixe-os gastarem munição a toa.

As balas choviam na delegacia,

arrancando lascas das paredes e quebrando

os vidros das janelas. Sam nem se

preocupou em responder ao fogo. Seria até

uma temeridade levantar a cabeça naquele

momento.

Do outro lado da rua, Josh Leigh assumiu

o comando do grupo de pistoleiros.

— Muito bem, homens. Já vimos que ele

não brinca em serviço. Bill, vá até o

armazém e traga querosene. Vamos fazer

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alguma tochas e pôr fogo naquela porcaria

de delegacia.

— Mas o general o quer vivo... — avisou

alguém.

— Eu sei., Que dois de vocês com uma

rede em cima do telhado. quando o fogo e a

fumaça o forçarem a sair, quero que o

peguem.

— Grande idéia, Josh! — elogiaram,

tratando de fazer o que Josh ordenara.

Lá dentro Sam havia ouvido a ordem e

pensava numa maneira de sair daquela

enrascada.

— Delegado! — gritou Josh, que havia

ficado diante da cadeia, controlando a

situação com outros pistoleiros.

— Pode falar — respondeu Sam.

— Vou lhe dar mais uma chance.

entregue-se por bem...

Não chegou a terminar. Uma bala

assobiou por sobre sua cabeça.

— Está bem. Se quer assim, assim será,

delegado.

Lá dentro, Sam se voltou para Jane, que o

olhava assustada.

— E agora? — indagou ela.

— Calma, deixe-me pensar.

— Eles vão nos queimar aqui dentro...

Page 359: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— De qualquer forma, estaremos mortos

mesmos. Temos chances. Só preciso

descobrir onde está cada um deles. Só

restam cinco.

— Sam, estou morrendo de medo...

— Coragem, Jane. Está conseguindo sua

melhor história.

— Grande consolo!

Lá fora haviam preparado as tochas. Dois

homens estavam no telhado, segurando uma

rede para capturar escravos em fuga.

— Vamos lá! — determinou Josh.

Depois pistoleiros se esgueiraram juntos

as paredes vizinhas à cadeia, levando tochas

e galões com mais querosene. O destino de

Sam e de Jane parecia selado.

De repente, quatro cavaleiros fortemente

armados entraram a galope na cidade.

Traziam o ódio nos olhos e a cólera nas

mãos que empunhavam armas prontas para

abrir fogo.

Por um momento, Josh e seus homens

julgaram que erma reforços chegando. Esse

momento de distração custou-lhes as vidas.

Os quatros cavaleiros começaram a atirar.

Os dois homens sobre o telhado rolaram e

foram se estalar na poeira como frutas

podres caídas do pé.

Page 360: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

Os que levavam as tochas tentaram se

proteger, mas não houve tempo. As balas os

atingiram pelas costas, jogando-os contra a

parede e, depois, de volta para a poeira da

rua.

Josh, aturdido, saiu para o meio da rua,

sem saber para que lado apontar sua arma.

Jimmy Connor lançou seu cavalo sobre ele,

pisoteando-o impiedosamente.

Josh ainda tentou levantar a arma, mas os

fazendeiros não lhe deram tréguas,

disparando suas armas contra ele, sem

piedade. Crivado de balas, seu corpo ficou

imóvel no chão, vertendo sangue.

Sam deixou a cadeia para receber seus

amigos.

— É um prazer vê-los de novo, amigos.

Parecem bem melhores hoje.

— Chegamos a tempo, delegado?

— Felizmente sim. Obrigado pela ajuda.

— Pois estamos aqui para isso, delegado.

Pode nomear-nos seus ajudantes.

— Será uma ajuda preciosa, John.

Obrigado! — falou Sam.

Enquanto os homens desmontavam, ele

olhou ao redor, procurando por Jane. Não a

vendo, correu para o interior da delegacia.

Ela estava caída junto da janela.

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— Jane! — exclamou Sam, penalizado,

abaixando-se e examinando-a. — ela foi

ferida!

John Connors e outros chegaram em

seguida.

— Não, delegado, não está ferido —

falou o fazendeiro. — Está apenas

dormindo, por incrível que pareça.

— Dormindo? — duvidou Sam,

percebendo que ela não tinha mesmo

nenhum ferimento.

Tomou-a nos braços, então, levando-a

para uma cela e acomodando-a na cama.

Olhou-a por instantes, com ternura, depois

foi ao encontro de John e de seus filhos.

— Como vai ser agora, delegado? — quis

saber John.

— Ainda não sei, mas garanto que não

será fácil.

— O general virá com tudo contra nós,

não?

— Sim, com certeza.

— Acha que teremos alguma chance

contra ele e seus homens?

— Já provamos que sim. Vamos usar a

cabeça contra eles.

— Como assim?

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— Vamos começar nos preparando. Vou

requisitar munição no armazém.

— Nós iremos buscar — prontificou-se

dois dos rapazes.

— Certo, tragam comida também. Talvez

tenhamos que ficar aqui por algum tempo.

Acham que encontraríamos mais alguma

ajuda na cidade?

— Muito difícil, delegado. Ninguém vai

se pôr contra o general por aqui. De um

modo ou de outro, todos aqui lucram com a

mina. O ouro escorrega para a mão de cada

uma das pessoas daqui. O general e seu

ouro compraram todos.

— É uma estranha cidade, corrompida e

covarde — lamentou o delegado federal.

O general recebeu a notícia de seus

pistoleiros com extrema frieza, até com uma

certa satisfação. Ficou um longo tempo

sentado em sua cadeira, fumando e

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pensando, enquanto os pistoleiros, inquietos

e intrigados, aguardavam.

O militar parecia satisfeito de ver

aparecer um adversário a sua altura para

matar-lhe a saudade de antigos campanhas.

Ele se levantou, finalmente, e bateu o

cachimbo na mesa, retirando as cinzas,

antes de guardá-lo.

— Quais são as ordens, general? —

indagou um dos homens.

— Selem meu cavalo.

— Vai pessoalmente à cidade?

— Sim, vou.

Os homens se entreolharam, sem

entender. Raramente o general tomava parte

em coisas como aquela.

Percebendo, porém, a confusão que

provocara entre seus homens, ele sorriu e

explicou:

— Rapazes, esse delegado me faz

lembrar um oficial ianque que enfrentei na

guerra. Comandava um pequeno grupo de

bravos e me enfrentou com galhardia. Uma

de minhas glórias foi ter vencido em

combate aquele oficial.

— Vai comandar um ataque então?

— Não, por enquanto, não. Quero

espionar o inimigo, descobrir-lhe os pontos

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fracos e os fortes, sondar o terreno onde ele

combate e só então preparar uma estratégia

para vencê-lo.

— Está bem, senhor — concordaram os

pistoleiros.

Trataram de selar seu cavalo. Momentos

mais tarde, envergando um impecável

uniforme de campanha, o general e grupo

de dez homens partiram.

— Martin, quero que os pistoleiros

fiquem acorrentados. Estaremos fora e não

quero nenhuma surpresa por aqui.

Após essas providências, o grupo partiu

na direção da cidade. O general se sentia

remoçado, com o coração novamente

pulsando e vibrando com aquela emoção

que antecedia as batalhas.

Quando se aproximaram da cidade, ele

deteve o grupo, no entanto, para surpresa

dos homens.

— Vocês esperam aqui — ordenou.

— Esperar, general — espantaram-se

todos.

— Sim. E vou sozinho até a cidade.

Quero dar o que pensar àquele delegado

federal. Dois de vocês vão comigo. Quero

que um entre pelos fundos do saloon e vigie

a delegacia. O outro se posicionará nos

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fundos da cadeia, verificando as saídas.

Entendido?

— Sim, general — concordaram eles,

separando os dois homens que seguiriam

com ele.

Sem qualquer outra preocupação, ele

cavalgou confiante até a cidade, como se

estivesse num passeio. Sam e os outros

ficaram surpresos ao ver aquele antiquado

guerreiro descer pela rua principal e parar

diante do saloon.

Ali desmontou mas, ao invés de entrar,

caminhou até o meio da rua.

— Delegado! — chamou com sua voz

possante.

— Diabos! Que espécie de truque é esse?

— surpreendeu-se o homem da lei.

— Eu posso meter uma bala na cabeça

dele agora mesmo — falou um dos

Connors.

— Esperem, vamos com calma. Com

certeza ele deve estar preparando alguma.

Não viria assim, se não se sentisse seguro.

Quero que observem as janelas e os fundos.

Vejam se descobrem quantos homens ele

tem.

— Delegado, quero falar-lhe! — insistiu

o general.

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Sam verificou suas armas, depois abriu a

porta lentamente, observando a rua e os

telhados. Saiu para a calçada.

— Estou aqui, o que quer de mim? —

disse, finalmente, atento a qualquer

movimento.

— É um homem esperto e digno

guerreiro, delegado. Isso me agrada muito.

— Veio aqui apenas para me elogiar?

— Poderemos conversar um pouco?

Gostaria que fosse até o saloon. A

cavalgada me deixou com sede e ainda não

tive tempo de lhe demonstrar minha

verdadeira hospitalidade — declarou ele,

para surpresa de Sam.

— Não vá, delegado. Deve ser uma

emboscada — alertou John Connors, na

porta entreaberta.

— Estão vendo mais alguém?

— Não, mas podem estar ocultos em

qualquer parte.

— Acho que ele quer apenas conversar.

Não iria se expor dessa forma. Se fossem

atirar em mim, já o teriam feito —

respondeu Sam, olhando ainda intrigado o

rosto sorridente e divertido do homem no

meio da rua.

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— E então, delegado? Tem a minha

palavra de cavaleiro do Sul — insistiu o

outro.

Sam pensou por instantes. Sabia que

houvera um tempo em a palavra de um

homem do sul valia por sua honra. O

general parecia ser um homem de palavra.

— Está bem! Vamos tomar um drinque

juntos — concordou ele, avançando para a

rua.

Caminharam lado a lado até o saloon. O

delegado mantinha as mãos próximas das

armas, pronto para sacar, se fosse preciso.

Sabia que seu primeiro alvo seria o general,

caso aquilo fosse uma cilada.

O saloon estava vazio. O general foi até a

prateleira e escolheu uma garrafa. Apanhou-

a, juntamente com dois copos e levou tudo

para uma das mesas. sentou-se e empurrou

com o pé uma cadeira, fazendo um gesto

para que Sam se sentasse.

Serviu dois copos de bebida. levantou o

seu.

— Ao Sul! — brindou.

— À união! — falou Sam, tocando seu

copo no dele.

Beberam num só gole.

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— Delegado, isso aqui estava por demais

monótono. Agradeço-o por ter vindo —

falou o general, servindo novamente os

copos.

— Eu não faria isso, general. Estou aqui

para acabar com sua operação...

— Isso não me preocupa, delegado. Você

está sozinho e eu tenho um pequeno

exército.

— Talvez eu não esteja tão sozinho assim

— afirmou Sam.

O general olhou-o fixamente. Sam

sustentou o olhar.

— Não posso entender por que teve de

agir dessa forma, general...

— Explorar a mina?

— Escravizar pessoas.

— Temos conceitos diferentes sobre isso,

meu caro. Convivi com a escravidão em

nossa propriedade, no sul. Era algo comum

para nós. Na guerra, lutei pela sua

manutenção e contra o absurdo cometido

por Lincoln. Como vê, escravizar pessoas é

algo que não me afeta. Acho-a necessária.

— Não haveria outro modo?

— Não, delegado, pode estar certo que

não. Homens livres roubariam pouco a

pouco meu ouro. Os escravos não podem

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fazer isso. Além disso, não tenho de pagá-

los e isso torna tudo mais lucrativo,

percebeu?

— Posso denunciá-lo em Denver,

general. Seu negocio aqui está acabado.

Aposto como o comandante do forte

mandaria com satisfação uma companhia

para cá. como vê, nem preciso enfrentá-lo.

Basta que vá fazer a denuncia.

O general tomou mais um gole e sorriu

confiante.

— Para fazer isso, teria de deixar a

cidade, delgado. Esse é o seu problema

agora. Quanto à mina, vou continuar

explorando-a. Em relação a você, delegado,

sabia que vou matá-lo, mas a minha

maneira.

— Já demonstrei que sei me defender.

Acha mesmo necessário sacrificar mais

vidas?

— Guerra é guerra, delegado. Eu estava

mesmo saudoso de uma boa companhia.

Será como nos velhos tempos. Vou reviver

algumas de minhas gloriosas batalhas pelo

Exercito Confederado. Você e quem mais

que o ajude estão cercados e a minha mercê.

Espero que lutem e resistam bravamente

para valorizar a minha vitoria — finalizou

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ele, levantando-se, saudando Sam com uma

continência e caminhando para a porta.

— General! — chamou-o Sam.

— Sim? — indagou ele, voltando-se

ligeiramente.

— O sul foi derrotado.

O rosto dele endureceu-se e seus olhos

destilaram mágoa e fúria.

— Não de todo, delegado. Não de todo

— comentou o general, retirando-se.

Sam tomou mais um gole de uísque,

depois foi para a cadeia. O general retornou

ao encontro de seus homens. Durante o

caminho de volta, preparava sua estratégia

de luta.

Sabia que Sam era um delegado federal e,

como todos, muito esperto e combativo.

Isso valorizava todo o empenho do general

em derrotá-lo.

— Quais são as ordens, general? —

indagou Martin.

— Já vi tudo que precisava ver. Então

encurralados naquela delegacia e vão ficar

lá. Quero que vocês desçam de dois em

dois, a cada meia hora, disparando contra a

cadeia. Vamos enervá-los e cansá-los. Ao

entardecer eu retornarei com o resto dos

homens para o ataque final. Você

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comandará o pessoal, Mark. Quero que

Martin volte comigo para organizar as

coisas.

— Está bem, general — concordou Mark

Temple, que ficou comandando o grupo de

homens encarregado.

— Além disso, quero que o homem no

saloon e outro, nos fundos da cadeia,

disparem durante os intervalos das descidas,

mantendo os homens na cadeia sempre em

estado de tensão.

— Eu não queria estar na pele deles,

general.

— Nem eu, Mark. Nem eu — sorriu o

velho general, esporando seu cavalo.

A cidade estava deserta e silenciosa. O

sol inclemente sobre a rua principal. Sam e

seus amigos haviam terminado a refeição

preparada por um dos Connors. Jane

acabara de acordar.

— O que houve? — indagou ela,

surgindo sonolenta.

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— Nada de especial, querida. Dormiu

bem? Como se senta?

— Estou ótima. Quem são eles?

— Os Connors, nossos amigos — disse

Sam, apresentando um por um. — Coma

alguma coisa, está delicioso.

Enquanto ela se servia, Sam foi até a

janela, onde John observava a rua.

— Quando acha que atacarão? —

indagou a Sam.

— Vão atacar antes do anoitecer.

— É um palpite?

— Quase uma certeza. À noite teríamos

mais chance de fugir.

— E por que não fazemos isso agora?

— Não iríamos longe. Aquele general é

muito matreiro. Com certeza estamos

cercados. Sair é morte certa.

— Eles são muitos. Precisamos de mais

gente para nos ajudar, mas onde conseguí-

los?

— Onde conseguir gente? — retrucou

Sam, pensando e tendo uma idéia incrível.

— Pensou em algo, delegado?

— É algo meio maluco, mas mataríamos

dois coelhos com uma só cajadada:

conseguiríamos gente para nos ajudar e

ainda deixaríamos o general furioso.

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— Como? — quis saber John Connors.

Sam não teve tempo de responder. Um

tropel de cavalos e uma nuvem de poeira os

alertou, no começou da rua principal.

— São uns cinqüenta! — gritou um dos

Connors, alarmado.

Sam olhou com atenção.

— A poeira não anda na frente dos

cavalos — comentou ele, observando

melhor.

De repente, antes que alguém pudesse

impedi-lo, Sam se atirou no meio da rua,

rolando até o outro lado, já com suas armas

nas mãos, bem à frente dos cavalos que se

aproximavam.

Seus Colts vomitaram chumbo e dois

pistoleiros rodopiaram sobre suas selas,

estatelando-se na poeira. Os dois cavalos

continuaram seu trajeto, arrastando galhos e

laços na sela.

— Aí está o exército dele — gritou Sam,

antes de sentir o assobio fúnebre de uma

lata junto de sua orelha.

Atirou-se para o lado, rolando agilmente

na poeira, tentando localizar quem disparar

contra ele.

Viu o homem no alto da sacada do

saloon, engatilhando novamente o rifle e

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disposto a não errar de novo. Sam não lhe

deu chance. Suas armas dispararam de novo

e o pistoleiro recuou, até bater

violentamente contra a parede e avançar

para frente, quebrando a amurada e

despencando para a rua como uma fruta

podre.

Tiros foram ouvidos nos fundos da

cadeia. Sam correu para junto de seus

amigos.

— O que está havendo?

— Há alguém disparando contra nós lá

nos fundos...

Sam pensou por instantes, depois saiu

novamente pela porta da frente. A poeira

ainda cobria a rua. Ele se esgueirou pelo

beco e viu o homem oculto atrás de uma

árvore, disparando contra as janelas dos

fundos da delegacia.

Suas armas trataram de silenciá-lo

imediatamente. O pistoleiro gemeu de dor e

soltou o rifle, cambaleando antes de cair

para trás e ficar estrebuchando.

Sam se aproximou dele.

— Por favor... Não quero morrer... —

suplicou o homem ferido.

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— Devia ter pensado nisso antes de ter

entrado numa guerra — falou-lhe Sam,

metendo-lhe uma bala no meio dos olhos.

O delegado retornou para a cadeia.

— Está bem, Sam? Não foi ferido? —

indagou Jane, correndo jogar-se nos braços

dele.

— Estaria melhor se estivéssemos em

Denver e você estivesse pintando meu

retrato — disse Sam.

— Também acho — concordou ela.

— Acho que esse general tentou nos

enganar — disse Sam, soltando Jane e indo

para junto das caixas de munição recarregar

seus Colts e municiar os vazios em seu

cinturão.

— Por que diz isso, delegado? — quis

saber John.

— Não estamos tão cercados assim...

Acho até que eu poderia sair daqui e ir fazer

aquilo que me veio à cabeça.

— O que pretende fazer, Sam? —

intrigou-se Jane.

— Libertar um exército. Temos armas e

munição de sobra, mas sei onde encontrar

mais armas e munições e também homens

para usá-las contra o general.

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— E se o general nos atacar durante sua

ausência? — lembrou John. — Se usar

todos os seus homens, vai nos esmagar num

piscar de olhos.

— Talvez possamos resolver isso e

ganhar um pouco de tempo. Morgan, venha

comigo — disse Sam e um dos rapazes.

Os dois correram até o armazém, de onde

retornaram com mais armas e munição,

além de uma caixa de dinamite.

— O que vai fazer com isso? — quis

saber Jane.

—Explodir, se for preciso, Jane, pode nos

dar algumas tiras de seu saiote?

— Para quê?

— Por favor! — insistiu ele.

Ela estranhou o pedido, mas o atendeu.

Sam foi amarrando pedaços de peno branco

nas bananas de dinamite. Depois foi até a

porta e as atirou, de um lado e de outro da

rua principal.

— Depois vocês fazem mais e jogam na

rua, como eu fiz. Se houver algum ataque,

atirem contra a dinamite. O pano branco é o

alvo.

— Estou certo que os deteremos com isso

por algum tempo, mas quando escurecer

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não veremos as marcas para atirar nelas —

lembrou Morgan.

— Até lá espero estar de volta, rapazes,

com toda a ajuda que precisarmos.

Naquele momento, novo tropel de

cavalos e mais dois cavaleiros começavam a

descer a rua, arrastando galhos e disparando

para o alto.

— Vamos ver se deu certo — disse Sam,

apanhando um rifle. Foi até a janela e

esperou que os cavaleiros se aproximassem

na dinamite mais próxima.

No momento certo, ele abriu fogo. A

explosão jogou cavalo, cavaleiro e galhos

para o alto, como folhas ao vento. eles

caíram em seguida, ficando imóveis na

poeira.

— Ótimo! Funciona! — falou Sam.

— Tome cuidado, Sam — falou Jane,

vendo que ele se preparava para sair.

— Tomarei. Vou aproveitar a poeira que

tomou conta da rua para sair sem ser visto

— declarou ele, correndo para seu cavalo,

amarrado diante do saloon.

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O general consultou tranqüilamente seu

relógio, depois voltou a guardá-lo no bolso

da farda. Observou sua espada com orgulho

e respeito. Havia acabado de poli-la.

Sobre a mesa estava seu Colt,

cuidadosamente limpo e lubrificado. O

general carregou-o, cartucho por cartucho,

depois guardou-o no coldre.

A porta se abriu e um dos homens se

apresentou. Era Martin.

— Os homens estão prontos para ir,

senhor.

— Quantos ficarão?

— Cinco.

— E os escravos?

— Agrilhoados, general. Não fugirão.

— Avisou os homens que haverá um

pagamento extra no final da batalha?

— Sim, general. Tudo conforme ordenou.

Ele guardou, então, a espada na bainha

presa à cintura, afivelou o cinturão militar e

deixou a cabana. Seu cavalo o esperava.

Montou-o pomposamente, depois olhou ao

seu redor com satisfação.

Trinta homens armados e dispostos

estavam sob seu comando, prontos para

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serem levados para um vitoria naquele

entardecer em Parkville.

— Eu teria preferido não matar aqueles

homens. Seriam mais úteis na mina, mas

não posso resistir à emoção de mais uma

batalha — falou o general, dando o sinal de

partida.

Oculto atrás de algumas rochas, na saída

do vale, Sam observava a passagem da

coluna. O general e seus homens haviam se

descuidado com a guarda e pareciam não ter

pressa para chegar à cidade. Calculou que

planejavam mesmo atacar antes do

anoitecer.

Precisava se apressar, portanto. Com

cautela ele avançou, até ver os cinco

homens diante do alojamento. Os

prisioneiros estavam lá, com certeza.

Aproximou-se o máximo que pôde.

Então, repentinamente, ele se expôs

corajosamente, tomando os guardas de

surpresa. Eles tentaram engatilhar suas

armas, mas Sam foi mais rápido. O eco dos

estampidos ficou ressoando, mas a coluna

liderada pelo general não o ouvira, com o

som de tantos cascos no chão pedregoso,

provocando eco também.

Correu até o alojamento, então, entrando.

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— Muito bem, pessoal! Vocês estão

livres! —a visou.

— É aquele novato que escapou —

reconheceu alguém.

— Como conseguiu? E por que voltou?

— Calma, pessoal, um de cada vez —

disse ele, vendo as chaves que prendiam os

cadeados às correntes penduradas junto à

porta, inacessíveis aos prisioneiros.

À medida que os soltava, Sam foi lhe

contando o que estava acontecendo.

— Nós o ajudaremos, Sam. Temos contas

a ajustar com o general e seus homens.

— Vamos fazer isso legalmente, pessoal.

Eu os nomeio Delegado Federais

Temporários. Juram fazer o que eu mandar?

Todos juraram.

— Deve haver um depósito de armas e

munições aqui. Armem-se e selem cavalos.

Há muitos lá no curral. Estou indo para a

cidade. Espero-os lá. Organizem-se para o

combate.

— Como faremos quando chegarmos lá?

— quis saber alguém.

— Se encontrar o general e seus homens,

fogo neles! — explicou Sam, assobiando

para que seu cavalo viesse ter com ele.

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No momento seguinte ele partia para a

cidade. Fora um plano improvisado, mas era

tudo que podia dispor no momento.

Quando chegou à colina, de onde podia

observar toda a cidade, o general estranhou

não encontrar os homens que deixaria ali.

Corpos espalhados pela rua principal

indicava qual havia sido o destino deles.

Muitos estavam caídos junto a pedaços de

seus cavalos, destroçados pelas explosões

que os Connors haviam provocado.

— Que diabos aconteceu aqui? —

indagou o general. — Onde estão os

homens que deixei? — acrescentou,

olhando pelo seu binóculo novamente.

— Parece que estão todos mortos —

disse Martin, que havia observando

também.

— Diabos, mil vezes diabos! Que truque

estão usando? — comentou o general. —

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Aquele bastardo é mais perigoso do que eu

imaginava.

— Quais são as ordens, general?

Ele pensou por instantes. Precisava

descobrir o que estava acontecendo ali

realmente.

— Quero um grupo de cinco homens

realizando ataques de saturação. Vão descer

e subir aquela rua, disparando contra a

cadeia. Quando seus cavalos se cansarem,

outros cinco entram em seus lugares.

Por momentos, Martin separou os

homens que comporiam o primeiro grupo.

Eles examinaram as armas, depois

aguardaram o sinal do general.

— Ao ataque! — ordenou ele, com o

dedo em riste apontando na direção da

cidade.

Os cincos cavaleiros desceram

velozmente a colina e entraram na rua

principal da cidade, avançando

resolutamente. Começaram a disparar

repetidas vezes.

Numa das janelas, Morgan Connors

dormia na mira, olho fixo no pedaço branco

de pano no meio da rua. Esperou

pacientemente, até que os homens

chegassem até ela, então apertou o gatilho.

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O general e os outros homens mal

puderam acreditar em seus olhos, quando a

explosão violenta jogou homens e cavalos

para o alto.

Eles caíram aos pedaços no meio da rua e

nos telhados. Havia sangue salpicando as

paredes.

— Demônios! com mil demônios! —

vociferou o general, surpreso. —

Menosprezei aquele demônio. Ele minou

toda a rua, mas está enganado se pensa que

pode me deter.

— O que vamos fazer, general? —

indagou Martin, confuso.

— Vamos ser mais cautelosos agora.

Vamos desmontar e invadir a cidade. Quero

que bloqueiem as saídas pelos fundos da

cadeia. Quero-os presos lá dentro como

ratos numa ratoeira. Vamos nos concentrar

no saloon. Vai ser um jogo de paciência —

determinou o militar.

Morgan observou do alto da colina e

percebeu que os homens tomavam uma

estrada lateral, que os levaria para o outro

lado da rua principal, possivelmente no

saloon.

— Acho que eles estão tramando alguma

coisa — falou o rapaz.

Page 384: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— O que pôde ver?

— Eles se dividiram em um grupo maior,

que está vindo pelos lados do saloon e um

grupo pequeno, talvez uns cinco, vindo

pelos fundos.

— Diabos, filhos! Tenho a impressão que

isto aqui vai ferver como o próprio inferno

— comentou John.

— Acha que o delegado conseguiu o que

queria, pai? — indagou o filho mais novo.

— De qualquer forma, vamos bloquear a

porta e as janelas dos fundos e depois fazer

uma barricada aqui na frente. Vai chover

balas por aqui. Protejam as caixas de

munição e o que resta da dinamite.

Algum tempo depois, a poeira e a fumaça

provocadas pelo ataque e pela explosão

foram se assentando, melhorando

totalmente a visão do campo de batalha.

Um silencio opressivo pairava sobre a

rua. No saloon, o general falava aos seus

homens.

— Nós os temos presos lá dentro. Não

sairão pelos fundos e muito menos pela

frente...

— Vamos queimá-los? — sugeriu

alguém.

Page 385: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

— Não seja maluco. Acabaremos com a

cidade se fizermos isso.

— É isso mesmo, rapazes — resolveu o

general. — Vamos esperar e cansá-los. Eles

terão de sair cedo ou tarde.

— A noite vaio chegar logo, general.

Precisamos fazer alguma coisa para impedir

que saíam.

— Providenciem fogueiras no meio da

rua, diante da cadeia. Joguem móveis e

madeira pela sacada do saloon, depois

atirem um lampião com combustível. Será o

bastante. Agora, enquanto um grupo faz

isso, quero que os outros dêem uma carga

de boas-vindas aos nosso amigos —

ordenou o general, sacando seu revolver e

indo até a janela, apontando para a cadeia.

Mais de duas dezenas de armas

começaram a disparar e o fizeram até que as

cargas se esgotassem. Mais de uma centena

de projéteis bateu contra as vidraças, a porta

e paredes da cadeia, como se fosse um

inferno.

Lascas e pedaços de vidro voaram.

Objetos foram atingidos, espatifando-se.

John e seus filhos, juntamente com Jane,

abaixaram-se contra o assoalho, enquanto as

balas voavam por sobre suas cabeças.

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— É o bastante, homens. Recarregar! —

ordenou o general.

Naquele momento, um cavaleiro saiu do

beco ao lado do armazém e avançou para o

outro lado da rua, desmontando já na

calçada e se atirando por uma das janelas

estilhaçadas.

— É Sam! — reconheceu Jane, enquanto

o delegado voava pela janela e rolava pelo

assoalho.

A garota correu abraçar-se nele.

— Como estão as coisas por aqui? —

indagou ele, levando-a para trás da proteção

de um móvel pesado que os Connors

haviam posto ali como barricada.

— Mal, muito mal — respondeu John.

— Libertei os homens da mina. Eles

estão se armando e vão apanhar os cavalos.

Muitos estão muito fraco, mas espero que o

desejo de vingança lhes dê forças extras.

— Tomara que cheguem a tempo. O

general já nos deu as boas-vindas. Estão ali,

no saloon.

Sam arriscou uma olhada. A rua estava

vazia, exceto pelos móveis que os homens

começavam a atirar pela sacada do saloon.

— Que diabos! Acho que preparam uma

boa fogueira — comentou ele. — Gostaria

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de saber exatamente qual é a estratégia

desse general maluco. Não se mostra afoito

em atacar. Não tem pressa nenhuma. Parece

acha que estamos em suas mãos. É uma

brincadeira que não me agrada nem um

pouco.

Enquanto isso, na janela do saloon, o

general olhava intrigado para a cadeia.

Reconhecera o delegado, mas não tinha a

menor idéia do que estaria ele fazendo fora

dali. Aquele homem era imprevisível, um

inimigo à altura da astúcia do general.

— Muito bem, rapazes! Vamos continuar

com a saturação. Quero grupos de cinco

homens indo às janelas e disparando na

direção da cadeia. Quando eles esgotarem a

munição, outros tomarão seu lugar e assim

por diante. Quero chumbo quente chovendo

para aqueles lados até a noite chegar —

sentenciou.

— Entendido, general — falou Martin,

começando a dividir os homens em grupos.

— Essas malditas estratégicas estão nos

matando, já perceberam? — segredou a um

de seus amigos.

— Sei disso, mas estamos nas mãos dele.

Se ao menos soubéssemos onde ele esconde

o ouro, depois de pesado e registrado...

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— É o que eu gostaria de saber também.

Enquanto isso não acontece, vamos lhe

fazendo os gostos...

Os homens, em grupos, começaram a

disparar contra a cadeia, transformando-a

num inferno.

— Que será que vai acontecer agora,

delegado? — indagou John Connors,

aturdido no meio do tiroteio.

— Deixe-os gastar a munição.

— Devem ter muita...

— Mas acabarão gastando-a dessa forma.

Caso não se lembre, retiramos tudo que

havia no estoque do armazém. Nossa hora

chegará. eu prometo — falou Sam.

Enquanto anoitecia, as balas continuavam

chovendo contra a delegacia. Se aquilo

persistisse, as paredes acabariam se

esfacelando, de tanto chumbo acumulado

nelas.

De repente, cessou toda a fuzilaria e um

silencio mortal pairou.

— Delegado! — gritou a voz

inconfundível do Cavaleiro do Sul.

— Sim, general!

— Não quer negociar?

Sam pensou por instantes se teria ou não

o direito de sacrificar as vidas de Jane e dos

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Connors. Talvez pudesse negociar com o

outro a vida deles.

— Sam! — gritou uma outra voz, que ele

reconheceu imediatamente.

Era de um dos prisioneiros. Durante o

tiroteio, eles haviam chegado à cidade e se

organizado. Naquele momento, tinha a

situação sob controle, aparentemente.

— O que foi? — falou Sam.

— Acabamos de chegar e cercamos o

saloon. O que quer que façamos agora?

Sam exultou. A ajuda havia sido das

melhores. No saloon, no entanto, o general,

rubro de cólera, via sua situação inverter-se.

De caçador passava a caça e não gostava

nada daquilo.

— General, quer negociar? — gritou-lhe

Sam. — Podemos conversar sobre os

termos de sua rendição?

— Nunca!

— Poupe sua vida e a de seus homens.

Estão cercados. Temos toda a munição que

havia na cidade. Poderemos mantê-lo aí até

o amanhecer e, então, desalojá-los.

— Podemos negociar em outros termos,

delegado. Venha para o meu lado. Há muito

ouro para nós dois...

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— Não dará certo, general. Você está

derrotado!

— Jamais admitirei isso — berrou o

general. — O que estão esperando? Fogo!

Uma pesada fuzilaria tomou conta de

ambos os lados. Os homens do saloon

disparavam contra a cadeia e contra as

sombras lá fora. Os ex-escravos disparavam

contra as sombras que surgiam atrás das

janelas.

Balas se cruzavam, fazendo vítimas de

ambos os lados. Sam não apreciava aquilo.

Os homens que serviam ao general eram

cidadãos de Parkville, iludidos pela febre do

ouro. Os outros eram forasteiros e vítimas

inocentes da cobiça dos outros.

— Diabos! Tenho que acabar com isso!

— exclamou ele, inconformado com os

gemidos que ouvia na noite.

— Como, delegado? Estamos

encurralados! — falou John.

— Sam, acho que isto aqui pode nos

ajudar — disse Jane, surgindo com a caixa

de dinamite nas mãos.

— largue isso, garota! — berrou Sam,

lançando-se sobre ela. — Uma bala perdida

fará picadinho de nós se acertar isso.

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Depois, olhando para o rosto da garota,

Sam entendeu o que ela estava sugerindo.

Apanhou algumas bananas e instalou-lhes

estopins não muito compridos. Depois foi

até a janela. Ordenou aos ex-escravos que

cessassem o fogo. Demorou algum tempo

até ser ouvido e entendido.

— General! — gritou.

— O que quer? — respondeu ele, quando

a fuzilaria diminuiu.

— Dou-lhe a última chance. Deponham

as armas e evitarão mortes inúteis.

— Aqui está a minha resposta, delegado!

— respondeu o general, voltando a abrir

fogo.

A fuzilaria recomeçou, mais intensa do

que antes. Sam apanhou uma das bananas

de dinamite, posicionando-se num ponto da

janela onde poderia fazer o arremesso. Após

tantos disparos, da janela onde poderia fazer

o arremesso. Após tantos disparos, da janela

só existia mesmo o buraco na parede.

— Jane, acenda para mim — pediu ele.

— Deixe comigo, Sam — falou ela,

apanhando o fósforo que John Connors lhe

estendeu.

As mãos dela tremiam tanto quanto a de

Sam, segurando o explosivo.

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O pavio curto chiou repentinamente,

soltando fagulhas e assustando Jane, que

recuou. Sam mirou uma das janelas e

arremessou com força.

A dinamite bateu contra a parede, porém,

voltando para a rua, junto ao bebedouro de

animais. A explosão foi forte o bastante

para arrebentar o que restava de vidros nas

janelas do saloon, ferindo alguns homens.

O pânico se estabeleceu definitivamente.

Sam arremessou outra banana, desta vez

acertando a janela. Ela rolou pelo assoalho,

diante dos homens estáticos e assustados,

até os pés do general.

Com um sorriso maligno nos lábios ele a

chutou com força para frente. A dinamite

foi explodir debaixo de um grupo de

homens que havia procurado abrigo num

canto do saloon.

A carnificina chegou a chocar até o

próprio general, quando ele conseguiu se

levantar.

Olhou aturdido ao seu redor. Estava

chamuscado e atordoado pela explosão.

Seus homens gemiam. Alguns olhavam para

membros amputados, como se não

entendessem o que se passava. Outros,

imóveis, jamais entenderiam mesmo.

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O general brandiu sua espada. Os homens

depunham as armas e levantavam as mãos,

à medida que os ex-escravos surgiam na

porta e nas janelas, apontando as armas.

Na cadeia, Sam percebeu que conseguira

o que pretendia. Só então se lembrou do

desejo de vingança que havia movido cada

um daqueles homens até ali.

— Não façam nada com eles! — gritou,

mas sua voz foi superada por uma outra

mais alta e mais convincente.

— Eles são nosso, pessoal! — gritou um

dos escravos.

Antes que Sam conseguisse chegar à rua,

os ex-escravos entraram no saloon e

vingaram-se de todas as humilhações e

sofrimentos que o general e seus capangas

lhes haviam causado.

O banho de sangue lavou o saloon e fez

Parkville ser conhecida no oeste como a

cidade das Viúvas.

Barbeado e limpo, Sam estendeu-se na

cama, cobrindo-se com um lençol e levando

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consigo uma garrafa de uísque e uma certa

senhorita do saloon e Hotel Horseshoes.

Estava em Denver havia uma semana,

após o relatório que tivera que fazer ao

comandante do Forte, aguardando

instruções. Jane estivera sumida o tempo

todo, tratando de escrever sua historia que

possivelmente, seria a mais convincente e

eloqüente sobre o Delegado Bakley.

Ia começar a abrir a garrafa de uísque e a

desvendar os mistérios da senhorita, quando

bateram na porta e um bilhete foi

introduzido por debaixo dela.

A garota foi lá, apanhou-o e levou-o para

Sam. Eram palavras de Jane, convidando-o

para posar para o retrato que ilustraria a

capa de seu novo livro.

Ela estava lá embaixo, no restaurante,

esperando por ele. Sam apanhou algumas

notas em sua carteira.

— Conchita, faça-me um favor — pediu

ele à garota que estava com ele.

Deu-lhe o dinheiro e instruções. Ela

sorriu, saindo em seguida. Sam ficou

esperando. Parkville era uma coisa distante,

John Connors e seus filhos haviam

permanecido lá, nomeados delegados por

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Sam, até que nova eleição para xerife fosse

feita. O Exército cuidaria desse detalhe.

Para Sam, aquela cidade deveria ser

varrida do mapa simplesmente, apesar de

todas aquelas viuvas ricas, que haviam se

apossado da mina do general.

Ele ouviu passos no corredor. Noutros

tempos, sacaria a arma e esperaria. Ali

apenas esperou que alguém batesse na

porta.

— Entre! — ordenou ele, simulando dor.

— Sam, você está bem? — indagou Jane,

deixando cair sua tralha de pintura e

correndo para ele. — O que você tem?

— Minhas costas... Acho que a chicotada

infeccionou...

Ela se inclinou sobre a cama para

examinar. Ele a abraçou e a puxou para si.

— Seu mentiroso! — murmurou ela,

antes que ele a calasse com um beijo.

— Tenho que ir a El Passo ao encontro

de Walk para apanhar minha anistia...

— Soube que há um bando de renegados

barbarizando naquela região...

Ele ficou perplexo.

— Aquele maldito! Tramou tudo. Quer

me levar para lá para me envolver de novo

em encrenca...

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— Estou aguardando autorização do meu

editor para ir junto — falou ela.

Sam quis protestar, mas desta vez foi ela

quem o calou com um beijo apaixonado.

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L P Baçan O Mago das Letras

1975: escreveu e publicou seu primeiro

livro de bolso, a novela Uma Tese

para o Amor, pela Editora Cedibra,

Rio de Janeiro, passando, daí, a

escrever mensalmente novelas por

encomenda para essa e outras

editoras.

1985: teve 11 letras incluídas no LP

Saudação ao Mato Grosso, da dupla

Estudante & Caminhoneiro.

1986: teve 6 letras incluídas no LP

Oração de Um Caminhoneiro, da

mesma dupla.

1991: participou da Coletânea do I

Concurso Nacional de Literatura da

FENAE, com um conto premiado

em 1º. lugar.

1994: participou da Antologia Os Poetas,

do V Concurso Helena Kolody de

Poesia, Governo do Paraná, Curitiba

– PR.

1995: traduziu a obra El Contuberneo

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Judeo-Maçónico-Comunista, de José

Antonio Ferrer Benimelli, em 2

volumes intitulados Maçonaria &

Satanismo, para a Editora "A

Trolha".

1996: publicou a novela rural Sassarico,

sobre o fim do ciclo do café, início

da rotação de culturas (soja e trigo)

e surgimento dos bóias-frias e editou

os livros Vida Minha, de Emília

Ramos de Oliveira (biografia) e

Círculo Vicioso, de Arlene Cirino de

Oliveira.

1997: participou da coletânea Poema,

Poesia... Maçom, Maçonaria,

organizada por Mário Cardoso para

a Editora Arte Real.

1998: publicou o livro de poemas

Alchimia.

1999: publicou o livro Redação Passo a

Passo e editou o livro URAÍ - Nossa

Terra, Nossa Gente, 2 volumes, de

Emília Ramos de Oliveira.

2000: teve 2 letras incluídas no CD

Nosso Negócio É Cantar, da dupla

Márcio Rogério & Luciano e 3 letras

no CD Mais, do cantor Cícero de

Souza. Publicou, neste ano de 2000,

Page 399: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

Brincando nos Caminhos do Senhor,

revista infantil cristã, Editora e

Gráfica Cotação da Construção,

Londrina – PR.

2001: editou e prefaciou o livro

Templários, de Lori Andrei Perez

Baçan.

2002: foi o autor da letra do hino da Loja

Maçônica Londrina, em parceria

com o músico Wilmar Cirino.

2004: organizou, editou e participou do

livro I Antologia do Portal "Cá

Estamos Nós".

2006: organizou, editou e participou do

livro II Antologia do Portal "Cá

Estamos Nós".

2007: publicou os livros A Sabedoria dos

Salmos, A Sociedade Secreta dos

Templários e O Livro Secreto da

Maçonaria, pela Universo dos

Livros Editora Ltda.

2010: publicou os livros Manual da

Futura Mamãe, Quem Disse Que

Cozinha Não è Lugar de Homem e

Receitas Naturais pela editora

Universo dos Livros. Editou o livro

de contos Solidariedade, do autor

baiano João Justiniano da Fonseca.

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Produziu, dirigiu e apresentou uma

série de 7 (sete) programas

radiofônicos Vila das Artes, na

Rádio Boa Nova FM, de Pérola, PR,

sobre literatura atual.

2012: traduziu, editou e publicou o livro

A Origem do Satanismo na

Maçonaria, de Arthur Edward

Waite.

2013: traduziu, editou e publicou em

formato eletrônico os livros Carmila,

de J Sheridan LeFanu, e Teoria da

Esgrima a Cavalo, de Alex Muller,

Anjos, o Caminho de Volta, Os Olhos

do Carrasco, Novelas de Terror

(Volumes I e II) Novelas Policiais

(Volumes I a 7) e Novelas de Faroeste

(Volumes I a IX) pela Lulu Press, Inc.

e Editora Saraiva.

1975 até 2015: hoje escreveu mais de 700

livros, publicados em sua maioria

em formato de bolso, sobre os mais

diferentes assuntos, como:

romances, erotismo, palavras

cruzadas, charadas, passatempos,

literatura infantil, passatempos

infantis, horóscopos, esoterismo,

simpatias populares, rezas, orações,

Page 401: DE FAROESTE 4.pdfacolhiam moradores e forasteiros, cada um com sua história, cada um com seu destino. Famosos pistoleiros criaram fama nesse local. Outros ali encontraram a morte,

intenções, anjos, fadas, gnomos,

elementais, amuletos, talismãs,

estresse, manuais práticos, religião e

outros livros de bolso com os mais

diversos temas e letras para músicas.

Já editou em formato eletrônico

mais de 1000 títulos, entre

publicações individuais e antologias,

de autores de Língua Portuguesa e

Espanhola.

Publicou ao longo dos últimos 40 anos

poemas e contos em jornais de

circulação regional. Ultimamente,

Tem traduzido e editado livros

eletrônicos e empenhado em editar

todos seus títulos em formato

eletrônico para serem

disponibilizados a seus leitores.

www.acasadomagodasletras.net