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unesp ciência novembro de 2018 ano 10 número 102 © Pixabay MELHORIA CENTRO DE MEDICINA E PESQUISA EM ANIMAIS SELVAGENS (CEMPAS) ESTÁ AMPLIANDO SUAS INSTALAÇÕES VOCÊ CONHECE A JACUTINGA? PROFESSOR CONTA A HISTÓRIA DE AVE CARACTERÍSTICA DA MATA ATLÂNTICA QUE ESTÁ AMEAÇADA DE EXTINÇÃO Inovação com respeito ao ambiente PESQUISADORES INVESTEM NA NANOTECNOLOGIA PARA REDUZIR O VOLUME DE AGROTÓXICOS USADO EM PLANTAÇÕES

novembro de 2018 - unespciencia.com.br · sergio roberto Nobre pró-reitor de planejamento estratégico e Gestão ... (Figura modificada de Oliveira et al. (2015) ... pontos de contato

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unespciêncianovembro de 2018 ∞ ano 10 ∞ número 102

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MELHORIACENTrO DE MEDiCiNa E PESQuiSa EM aNiMaiS SELVagENS (CEMPaS) ESTÁ aMPLiaNDO SuaS iNSTaLaÇÕES

VOCÊ CONHECE A JACUTINGA?PrOfESSOr CONTa a HiSTÓria DE aVE CaraCTErÍSTiCa Da MaTa aTLÂNTiCa QuE ESTÁ aMEaÇaDa DE EXTiNÇÃO

inovação comrespeito ao ambientePESQuiSaDOrES iNVESTEM Na NaNOTECNOLOgia Para rEDuZir O VOLuME DE agrOTÓXiCOS uSaDO EM PLaNTaÇÕES

Produzir conteúdo,Compartilhar conhecimento.Editora Unesp, desde 1987

www.editoraunesp.com.br

Com este volume, que ora inaugura a série de inéditos em prosa de Euclides da Cunha, os organizadores oferecem aos leitores um número significativo de ensaios do autor, cuja produção se inicia em 1883, quando ele tinha apenas 17 anos, e termina em 1909, ano de sua morte. Trata-se de um total de 31 composições de Euclides que, em seu conjunto, reforçam a vertente ensaística de sua admirável escritura e que ficou plasmada notória e definitivamente em Os sertões.

O lado ensaístico de Euclides da Cunha

Com este volume, que ora inaugura a série de inéditos em prosa de Euclides da Cunha, os organizadores oferecem aos leitores um número significativo de ensaios do autor, cuja produção se inicia em 1883, quando ele tinha apenas 17 anos, e termina em 1909, ano de sua morte. Trata-se de um total de 31 composições de Euclides que, em seu conjunto, reforçam a vertente ensaística de sua admirável escritura e que ficou plasmada notória e definitivamente em Os sertões

Ensaios e inéditosEuclides da Cunha | Leopoldo M. Bernucci e Felipe Pereira Rissato (Orgs.) | 458 páginas

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nOvEmbRO 2018 | UnESpCiênCiA 3

editorial

Ciência de fronteiraO s agrotóxicos, embora de grande importância

no controle de pragas, podem ser utilizados em quantidade excessiva em situações nas quais não exis-te orientação técnica adequada, o que leva a impactos negativos ao meio ambiente e à saúde humana.

É por essa fresta que o mercado de controle bioló-gico vem crescendo mundialmente e que uma área de ciência de fronteira, a nanotecnologia, tem encontrado espaço para desenvolver novas formulações com com-postos ativos de interesse agrícola, em busca de uma eficiência, digamos, “mais cirúrgica”.

Ao reduzir o volume de agrotóxicos usado em planta-ções, a nanotecnologia aplicada à agricultura gera, po-tencialmente, menor contaminação do meio ambiente, produzindo um saudável encontro das ciências agronô-micas com a responsabilidade ambiental.

Esta é a nossa matéria de capa, assinada por um gru-po de pesquisadores que envolve sete instituições na-cionais e uma internacional, coordenado pelo professor Leonardo Fernandes Fraceto, do Instituto de Ciência e Tecnologia do câmpus Sorocaba da Unesp – outros dois câmpus da Universidade têm pesquisadores envolvidos, Jaboticabal e Ilha Solteira.

Esta edição da unespciência conta também a história por trás do livro A Illustração, por meio de uma entre-vista com a professora Tania Regina de Luca, autora da obra, lançada pela Editora Unesp com apoio da Fapesp, e destaca o início do relevante trabalho de ampliação das instalações do Centro de Medicina e Pesquisa em Animais Selvagens (Cempas), da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia do câmpus Botucatu.

A revista ainda explica, por meio de um detalhamento cuidadoso do professor Nilson Ghirardello, os concei-tos em torno do que consideramos como “patrimônio religioso” e relata a conquista histórica obtida nos EUA por alunos de graduação no iGEM, a mais importante competição universitária de biotecnologia do mundo.

Nosso artigo é assinado pelo professor Mauro Galetti, do câmpus Rio Claro, sobre a jacutinga, ave caracterís-tica da Mata Atlântica ameaçada de extinção.

Governador márcio França

secretaria de desenvolvimento econômico, ciência, tecnologia e inovaçãovinicius de almeida camarinha

uNiversidade estadual paulistareitorsandro roberto valentinivice-reitorsergio roberto Nobrepró-reitor de planejamento estratégico e Gestãoleonardo theodoro Büllpró-reitora de GraduaçãoGladis massini-cagliaripró-reitor de pós-GraduaçãoJoão lima sant’anna Netopró-reitora de extensão universitáriacleopatra da silva planetapró-reitor de pesquisacarlos Frederico de Oliveira Graeffsecretário-geralarnaldo cortinachefe de Gabinetecarlos eduardo verganiassessor-chefe da assessoria de comunicação e imprensaFábio mazzitelli de almeida

presidente do conselho curadormário sérgio vasconcelosdiretor-presidenteJézio Hernani Bomfim Gutierre superintendente administrativo e financeiroWilliam de souza agostinho

projeto Hankô design & content (ricardo miura)designer andréa cardosoeditores andré louzas, Fabio mazzitelli e marcos Jorgecolaboradores daiana avila, Genira chagas, Halley c. Oliveira, Juliana l. s. mayer, leonardo Fernandes Fraceto, luciana m. a. pinto, mauro Galetti, Nilson Ghirardello, renata de lima, renato Grillo, ricardo polanczyk, sérgio santa rosa, vera castro (texto)apoio administrativo thiago Henrique lúcio endereço rua Quirino de andrade, 215, 4o andar, cep 01049-010, são paulo, sp. tel. (11) 5627-0327. www.unespciencia.com.br [email protected]

É autorizada a reprodução total ou parcial de textos e imagens desde que citada a fonte. Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião da universidade.

NaNOTECNOLOgiaCiência pela agricultura

e pelo ambienteleONardO FerNaNdes FracetO,

ricardO pOlaNczyk, JuliaNa l. s. mayer, reNatO

GrillO, reNata de lima, vera castrO, daiaNa avila,

luciaNa m. a. piNtO eHalley c. Oliveira

ENTrEViSTaA illustração – Revista quinzenal para portugal e brasil circulou entre os anos de 1884 e 1892, além dos países citados na epígrafe, também na FrançaGeNira cHaGas

sumário

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sumário

urBaNiSMOpatrimônio religioso, o que é isso?NilsON GHirardellO

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22MEDiCiNa VETEriNÁria

Centro de medicina e pesquisa em Animais

Selvagens será ampliadosÉrGiO saNta rOsa

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BiOTECNOLOgiaEquipe da Unesp obtém conquista histórica para o brasil nos EUAFaBiO mazzitelli

fOTO MÊSOs fungos moram ao ladopedrO lucas BueNO da silva

OPiNiÃOA jacutinga e as mudanças climáticasmaurO Galetti18

Nanotecnologia

O aumento da produção agrícola brasi-leira visando atender não somente à

crescente demanda global por alimentos, mas também à exportação de grãos e seus subpro-dutos, tem gerado impacto ao ambiente. Essa expansão está atrelada ao uso intenso de in-sumos visando diminuir as perdas causadas por fatores bióticos (que possuem relação com seres vivos – fauna e flora) e abióticos (que estão relacionados com influências recebidas por eles, como luz, temperatura, etc.) durante o processo produtivo. Os agrotóxicos, embora de grande importância no controle de pragas, podem ser utilizados em quantidade excessiva em determinadas situações onde não existe orientação técnica adequada, o que leva a uma série de impactos negativos ao ambiente, à saú-de dos agricultores e dos consumidores. Além disso, as perdas anuais na produção brasileira devido a pragas e insetos são de 7,7%, o que

GrupO utiliza NaNOtecNOlOGia para reduzir vOlume de aGrOtóxicOs usadO em plaNtações

Ciência pela agricultura e pelo ambiente

AUTORES:leONardO FerNaNdes FracetO, ricardO pOlaNczyk, JuliaNa l. s. mayer, reNatO GrillO, reNata de lima, vera castrO, daiaNa avila, luciaNa m. a. piNtO eHalley c. Oliveira

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Nanotecnologia

equivale a cerca de 25 milhões de toneladas de alimentos, com prejuízos econômicos da ordem de US$ 17,7 bilhões.

Em algumas regiões brasileiras, especialmen-te nos Estados pertencentes à nova fronteira agrícola, existem condições climáticas favo-ráveis ao desenvolvimento de pragas (insetos, fungos e plantas daninhas). Isso, somado ao cultivo sucessivo (por exemplo, de algodão, soja e milho), contribui para a proliferação de pragas, em especial as polífagas, isto é, as que se alimentam de várias culturas. Esses dois aspectos levam ao aumento significativo no uso de agrotóxicos (chamados popularmen-te de pesticidas) que, por sua vez, além de eliminarem as pragas, também acabam por eliminar os seus inimigos naturais. Esses as-pectos contribuem para o aumento da resis-tência das pragas aos agrotóxicos, causando maior impacto ao ambiente.

O aumento dos relatos de resistência das pragas aos ingredientes ativos dos agrotóxicos convencionais, aliado aos elevados custos para desenvolver novas moléculas químicas (cerca de US$ 250 milhões), juntamente com a pre-ocupação ambiental relacionada aos efeitos deletérios dos agrotóxicos, aceleraram o de-senvolvimento de novas tecnologias, como, por exemplo, o uso de agentes de controle biológico, sejam eles micro (fungos, vírus, bactérias) ou macro (parasitoides e predadores).

O mercado do controle biológico vem cres-cendo em media 15% ao ano em todo o mundo, porém, esses organismos são mais suscetíveis a fatores abióticos quando comparados aos inse-ticidas convencionais. Nesse contexto, a micro (estruturas com tamanho entre 1 e 1000 μm) e mais recentemente a nanotecnologia (estru-turas com pelo menos uma dimensão entre 1 e 1.000 nm – 1 nanômetro equivale a 1 bilhonési-mo do metro) tem apresentado grande potencial para o desenvolvimento de novas formulações com compostos ativos de interesse agrícola.

Como exemplo, temos a utilização de nano-partículas produzidas com materiais poliméri-cos (macromoléculas formadas pela união de substâncias simples, chamadas de monôme-ros) ou lipídicos, contendo agentes de controle (agrotóxicos sintéticos e inseticidas/repelentes de origem botânica), que visam aumentar a so-lubilidade desses ingredientes ativos, liberá-los de uma forma lenta ou protegê-los da degra-dação. Dessa maneira, é possível liberar uma quantidade menor do ingrediente ativo ao longo do tempo, mantendo níveis desejáveis do com-posto por longos períodos no ambiente. Essa característica resulta em aumento de eficiên-cia e seletividade, não prejudicando os orga-nismos não alvos, e por consequência gerando menor contaminação ambiental. Além disso, no caso de encapsulação de microrganismos, tal estratégia favorece sua proteção contra fa-tores ambientais, como degradação pela luz e drásticas mudanças de temperatura.

No entanto, cabe destacar que essas novas tecnologias, como a nanotecnologia, devem ser avaliadas antes de chegarem ao mercado,

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Nanotecnologia

visando prevenir riscos ao ambiente e à saú-de humana. Em relação à nanotecnologia, o transporte, o destino e a biodisponibilidade (porcentual de aproveitamento por um orga-nismo de uma data substância) são altamente dependentes dos meios aos quais são expostos; logo, alterações relativamente sutis nas caracte-rísticas físico-químicas da água, por exemplo, podem alterar a morfologia e a hidrofobicidade (resistência à água) desses nanomateriais, que por sua vez afetam a sua biodisponibilidade e o seu potencial de toxicidade.

Sendo assim, existe a necessidade de in-vestigação desses materiais considerando di-ferentes ecossistemas, como os de água doce, salgada, sedimento e solo, já que os diferentes organismos podem responder de forma dife-renciada quando em contato com um mesmo nanomaterial. Por sua vez, o conhecimento dos riscos que os nanomateriais podem causar ao ambiente é de grande importância para sua regulamentação, produção, comercialização e descarte, garantindo que estes sejam realizados de forma adequada e sustentável.

Nesse cenário, um grupo de pesquisadores (detalhes da equipe na Tabela 1) envolvendo 7 Instituições nacionais e 1 internacional (Fi-gura 1), coordenados pelo professor Leonardo

figura 1

Instituições nacionais e internacional participantes do projeto temático.

figura 2

Estrutura do projeto temático e sua integração entre agricultura, micro/nanotecnologia e ambiente.

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amet.

MICRO/NANOTECNOLOGIA

Micro/nanopartículas poliméricas

Nanopartículas metálicas biogênicas

AGRICULTURA

Atividade Biológica

Organismos alvo

AMBIENTEDestino/transporte

Toxicidade em organismos não alvos

Nanotecnologia

Fernandes Fraceto, do Instituto de Ciência e Tecnologia de Sorocaba (ICTS), aprovou recen-temente o projeto temático Agricultura, micro/nanotecnologia e ambiente: da avaliação dos mecanismos de ação a estudos de transporte e toxicidade junto à Fundação de Amparo à Pes-quisa do Estado de São Paulo (Fapesp (Detalhes em: <https://bv.fapesp.br/pt/auxilios/101291/agricultura-micronanotecnologia-e-ambiente-da-avaliacao-dos-mecanismos-de-acao-a-es-tudos-de-trans/>). Nessa proposta, espera-se avaliar as potencialidades de sistemas micro/nanoestruturados para controle de pragas em agricultura a partir da abordagem de avaliação de atividade biológica em organismos alvos, bem como dos destinos e potencial de toxicidade desses sistemas para o ambiente (Figura 2).

Nesse projeto a equipe propõe alternativas mais sustentáveis para o controle de pragas, baseadas em sistemas micro/nanoestruturados (Figura 3). Diferentes estratégias serão utiliza-das para encapsular agentes de controle, como agrotóxicos sintéticos e inseticidas/repelentes de origem botânica. Além disso, serão utiliza-dos fungos e bactérias como agentes biológicos de controle encapsulados em micropartículas.

A partir do desenvolvimento desses siste-mas, serão realizados estudos de transporte e toxicidade de diferentes tipos de micro e nano-partículas com potencialidades para aplicações em agricultura. Dentre os diferentes desafios, destaca-se o fato de poucos estudos na literatura terem avaliado questões relativas ao mecanismo de ação de agentes de controle de pragas em associação com micro/nanotecnologia. Dessa forma, o desenvolvimento e estratégias para avaliar a interação de sistemas micro/nanoes-truturados com organismos alvos é um desafio que esta proposta pretende superar.

Outro aspecto diz respeito ao destino e efeitos em organismos não alvos, de extrema importância para agricultura, uma vez que, o uso de sistemas micro/nanoestruturados visa não somente aumentar a eficácia biológica de agentes de controle, mas também a minimiza-ção de impactos ambientais ocasionados pelo uso de agrotóxicos.

TaBELa 1

mEmbRO dA EqUipE inSTiTUiçãO ÁREA dE ATUAçãO nO pROjETO

Leonardo Fernandes

Fraceto

unesp/

sorocaba

desenvolvimento de sistemas carreadores e estudos de interação com matrizes complexas

Ricardo polanczyk unesp/

Jaboticabal

controle biológico de pragas

Renato Grillo

unesp/

ilha solteira

desenvolvimento de sistemas carreadores e estudos de interação com matrizes complexas

Gerson Araújo de

medeiros

unesp/

sorocabaGestão ambiental

juliana L. S. mayer unicampmorfologia vegetal e mecanismos de interação nanopartículas/planta

marcelo bispo de

jesus

unicamp estudo de interações de nanopartículas e células

Renata de Lima unisotoxicidade de nanomateriais e síntese de nanopartículas biogênicas

Alejandra bravo uNam/ méxicomecanismo de ação de Bacilus thurnigiensis

vera Castro embrapaavaliação toxicológica e de risco de nanopartículas em organismos não-alvo

Claudio jonsson embrapa risco de nanopartículas para o ambiente aquático

Luciana m. A. pinto uFlasíntese e caracterização de nanomateriais

Claudia b. R. martinez uelecotoxicidade de nanomateriais em organismo aquático (prochilodus lineatus)

Halley Caixeta Oliveira uel

Fisiologia vegetal e efeitos de nanomateriais em plantas

daiana Silva Avila unipampatoxicidade de nanomateriais em nematoide de solo caenorhabditis elegans

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Nanotecnologia

Nesse cenário, o estudo de potenciais me-canismos de ação, destino e toxicidade serão propostos utilizando como modelo diferentes organismos e tipos de sistemas micro e na-nopartículas (poliméricos, lipídicos, metáli-cos), bem como diferentes agentes de contro-le, dentre eles compostos sintéticos, naturais e microrganismos. Dessa forma, a partir de estudos de especificidade (atividade biológi-ca) e seletividade (destinos e toxicidade), será possível a obtenção de dados de forma a pro-duzir conhecimento científico necessário para compreensão dos fenômenos e processos que governam a atividade biológica desses siste-mas, assim como contribuir para a geração de sistemas micro e nanoestruturados visando ao controle de pragas em agricultura.

Algumas atividades já foram realizadas por integrantes da equipe e seus resultados iniciais foram obtidos. Em especial, destacamos um sistema baseado em nanopartículas poliméricas carreadoras de atrazina, um herbicida larga-mente utilizado em cultivos de milho e cana-de-açúcar. Essas formulações mostraram-se mais eficientes que a formulação convencional de atrazina no controle de plantas daninhas (Figura 4). Dessa forma, foi possível reduzir em 10 vezes a dosagem do herbicida sem afetar sua atividade biológica, o que implicaria me-nor contaminação ambiental. Por outro lado, as mesmas formulações não levaram a efei-tos persistentes no milho, que é uma cultura

figura 3

Sistemas micro e nanoestruturados como sistemas carreadores de compostossintéticos, botânicos e microorganismos.

figura 4

Controle de plantas de mostarda por nanopartículas poliméricas carreadoras de atrazina em comparação com uma formulação comercial de atrazina. Os sintomas foram registrados 7 dias após o tratamento das plantas com as formulações.

NANOATRAZINA(DOSE PADRÃO)

NANOATRAZINA(DOSE 10 x MENOR)

ATRAZINA CONVENCIONAL

(DOSE PADRÃO)ATRAZINA CONVENCIONAL

(DOSE 10 x MENOR)

(Figura modificada de Oliveira et al. (2015) PlosOne 10:e0132971, sob os termos da Creative Commons Attribution License)

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Nanotecnologia

resistente à atrazina, bem como reduziram a toxicidade da atrazina em células humanas. Esses ensaios foram realizados em casa de vegetação e o próximo desafio é a avaliação da eficiência desse produto em condições de campo, o que já está em andamento.

Em relação ainda a esse sistema, estudos de mecanismos de ação têm sido conduzidos para elucidar como as nanocápsulas potencia-lizam a atividade da atrazina. Dessa forma, análises anatômicas de microscopia eletrônica de varredura e de transmissão fornecem in-formações importantes sobre como ocorrem os danos causados pelo herbicida atrazina e como a nanocápsula é capaz de modificar essa resposta nos tecidos foliares, tornando o herbicida 10 vezes mais eficiente. Somado a isso, análises em microscopia confocal (que acentua o contraste e produz imagens tridi-mensionais) das folhas tratadas com os nano-pesticidas permitem a visualização e o acom-panhamento do transporte das nanocápsulas marcadas com fluorescência diretamente no tecido vegetal (Figura 5).

Também, para estudos de toxicidade, o gru-po de pesquisa já evidenciou e interação de nanopartículas formadas pelo polímero sinté-tico PCL (poli-ε-caprolactona) em nematoides C. elegans. Neste estudo foi possível observar que tais partículas causaram problemas no desenvolvimento dos organismos (Figura 6). Por outro lado, em estudos em andamento com outros tipos de partículas poliméricas (zeína, uma proteína de milho), foi observa-do que tais partículas apresentaram menor toxicidade nos vermes, indicando assim uma melhor biocompatibilidade do organismo com esse tipo de nanocarreador e possivelmente menor impacto no bioma do solo.

Nos próximos cinco anos, a equipe espera, através do uso de abordagens multidisciplina-res, contribuir para geração de conhecimento científico e tecnológico, bem como potencializar a formação de recursos humanos qualificados nessa área, no sentido de propor soluções mais seguras e eficientes para o controle de pragas em agricultura.

figura 5

Células do parênquima clorofiliano da folha da mostarda (vermelho) e as nanopartículas contendo atrazina marcadas (verde) dentro das células condutoras do xilema da planta.

figura 6

Imagens de C. elegans após exposição a nanopesticidas. A imagem apresenta o animal que foi exposto à nanopartículas marcadas com a sonda fluorescente rodamina. A região em vermelho indica que as partículas foram ingeridas pelo organismo sendo estas digeridas pelo mesmo.

Figura modificada de Jacques et al (2017) Ecotoxicology and Environmental Safety 139:245-253, sob os termos da Elsevier Inc.

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entrevista

meses em Lisboa, vasculhando os arquivos da revista na Biblioteca Nacional de Portugal.

O livro A Ilustração resulta do Projeto Te-mático financiado pela Fapesp “Circulação Transatlântica dos Impressos – a globalização da cultura no século XIX.” A iniciativa reúne 40 pesquisadores de 23 instituições de pes-quisa do Brasil, França, Inglaterra e Portugal. Além de A Ilustração, o projeto rendeu mais cinco publicações, sendo uma dela somente para a Inglaterra, pela Taurus. Esse livro inglês deriva de um sub-projeto, um curso chamado Escola São Paulo, durante o qual foram reu-nidos cem alunos, sendo 50 do Brasil e 50 de outras partes do mundo.

O objetivo do Projeto é dar a conhecer os impressos e as ideias em circulação dos quatro países no “longo século XIX” (1789-1914). Seus

a Illustração – Revista quinzenal para Por-tugal e Brasil circulou entre os anos de

1884 e 1892, além dos países citados na epí-grafe, também na França. A publicação foi idealizada pelo português residente no Brasil Elísio Mendes, proprietário do jornal fluminen-se Gazeta de Notícias. O projeto da publicação já previa sua edição em Paris, tarefa realizada pelo português Mariano Pina. Em seus oito anos, A Illustração fez circular ideias, textos e imagens de forma simultânea nos três países. A história e a importância da publicação são temas de livro homônimo, de autoria de Tania Regina de Luca, lançado pela Editora Unesp neste 2018, com apoio da Fapesp. Tania é his-toriadora e docente da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp, câmpus de Assis. Para fa-zer sua pesquisa, a docente permaneceu três

taNia reGiNa de luca Fala sOBre livrO Que laNçOu a respeitO de revista Que circulOu NO Brasil, em pOrtuGal e Na FraNça eNtre 1884 e 1892

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principais objetivos são identificar e analisar os processos culturais, políticos e econômicos colocados em movimento pela circulação dos impressos e ideias em escala transnacional, analisando as apropriações dessas ideias nos quatro países. Para saber mais sobre o Projeto consulte o site <http://www.circulacaodosim-pressos.iel.unicamp.br/>

uc O que fez despertar seu interesse por estudar a trajetória de A Illustração? tania de luca Foi por mero acaso. Eu recebi um convite da professora Márcia Azevedo de Abreu, do Departamento de Teoria Literá-ria do Instituto de Estudos da Linguagem, da Unicamp. Ela estava reunindo pesquisadores para integrar um Projeto Temático da Fapesp (Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de

São Paulo) intitulado “Circulação Transatlân-tica dos Impressos – a globalização da cultura no século XIX”. Um projeto dessa natureza se caracteriza por reunir cientistas de diferentes instituições e distintos paises. Esse Projeto Temático tem a periodização de 1789 a 1914, correspondente a metodologia dos historiado-res de marcar os séculos não pelos seus limites cronológicos, mas a partir de processos. Por esse entendimento, o século XIX começa com a Re-volução Francesa (que ainda ocorre no XVIII) e acaba com a Primeira Guerra Mundial. Em compensação, o século XX começa em 1918 e termina com a queda do muro de Berlim. Es-se período marca uma mudança importante na política e na cultura com o fim da Guerra Fria. Então, se o século XIX é longo, o século XX é curto. Raramente o período do século dos historiadores corresponde ao do século civil.

Voltando à questão da escolha, naquele mo-mento eu trabalhava com a revista Diretrizes,

uma publicação que circulou no Estado Novo (1937-1945), portanto, um período posterior. Então eu agradeci o convite. Mas a professo-ra da Unicamp insistiu. Com o chamado em mente, fui ao setor de obras raras da Facul-dade de Ciências e Letras, Câmpus de Assis, onde realizo minhas atividades acadêmicas-científicas, e me deparei com oito volumes de algo que eu não sabia o que era. Quando abri um volume estava escrito: A Illustração – Pa-ris, com o preço do número em Lisboa e no Rio de Janeiro, o que despertou, de imediato, a minha a atenção. Esse impresso circulou entre 1884 e 1892, entre Paris, onde era im-pressa, Portugal e Brasil. Eu havia encontrado um material que respondia perfeitamente aos interesses do projeto.

Eu não conhecia a revista. Fui procurar

caBia a mariaNO piNa respONder pela ediçÃO de a illustraçÃO, O Que iNcluÍa recrutar Os autOres dOs textOs e escOlHer as imaGeNs deNtre as dO acervO dO le mONde illustrÉ

1 Damas celebres: A Princeza de Galles. (A Illustração, Ano 1, v. 1, n.1, capa, 5/5/1884.

2 Exposição de Paris – As festas – Illuminações no Bosque de Bolonha. (A Illustração, Ano 6, v. 6, n.14, capa, 20/7/1889.

3 A Republica dos Estados Unidos do Brazil. (A Illustração, Ano 6, v. 6, n.23, capa, 5/12/1889.

4 Monumento a Gambetta (A Illustração, n.184, capa, 1/1/1892.

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entrevista

as mãos de Pina e assim permaneceu até o encerramento do periódico, em 1892.

uc Quem foi Mariano Pina?tania de luca Pina foi jornalista. Tinha pou-co mais de 20 anos quando assumiu o cargo de editor de A Illustração. Desde 1882 era correspondente em Paris do jornal Gazeta de Notícias. Cabia a ele responder pela edição de A Illustração, o que incluía recrutar os autores dos textos e escolher as imagens dentre as do acervo do Le Monde Illustré. Quando se lê a revista, não aparece outro nome além do de Mariano Pina. Mas na documentação relativa à publicação, depositada na Biblioteca Nacio-nal de Portugal, observa-se a colaboração de seu irmão, Augusto Pina, importante artista plástico e que chegou a ajudar na supervisão

na documentação da Faculdade a origem da coleção. Vi que havia sido comprada de um sebo, na década de 1960, possivelmente por algum professor que percebeu a importân-cia do material, ainda inédito em termos de pesquisa. Depois verifiquei se existia algum estudo sobre essa revista. Achei um conjunto de artigos escritos por Elza Miné, professora da USP, que já tinha consultado não só a re-vista, mas o acervo do diretor, um jornalista português chamado Mariano Pina. Embora ela não tivesse feito um estudo sistemático, apontou uma questão interessante e que me ajudou bastante. Elza descobriu que a ideia de fundar a revista foi de um empresário do ramo jornalístico, Elíseo Mendes, proprietário do Gazeta de Notícias do Rio de Janeiro, um dos principais jornais do Brasil naquele mo-mento, década de 1880. Era considerado um jornal moderno, com uma tipografia robusta. Só que ele não era um homem de letras. Era um português que vivia entre Lisboa e Rio de Janeiro. Ele percebe que não existe condição no Brasil de se fazer uma revista, a preços competitivos, nos moldes de A Illustração – tamanho grande, totalmente ilustrada.

Mendes, que conhecia a lógica empresarial da imprensa, percebeu que se fizesse um acordo com uma tipografia europeia ele conseguiria concretizar seu projeto e, ainda, ganharia di-nheiro. Assim, contratou os serviços de uma grande tipografia francesa, chamada Sociedade Anônima de Publicações Periódicas. A empre-sa publicava mais de dez títulos, entre eles, uma revista intitulada Le Monde Illustré, que circulava desde 1853. O contrato se baseava na utilização de ilustrações de segunda mão, ou seja, que já tivessem sido publicadas no Le Monde Illustré. Isso fazia cair o preço da Illustração, pois elas eram revendidas já com direito autoral incluso.

O que era caro na revista eram justamen-te as imagens. Feito o acordo, ele contratou o português Mariano Pina, correspondente em Paris do jornal Gazeta de Notícias. Mendes ficou responsável por A Illustração até 1885. Depois se afastou e a propriedade passou para

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entrevista

a revista era Feita para eNcaNtar O leitOr. Os destaQues eram a aGeNda cultural de paris, literatura, trecHOs de livrOs, pOemas, teatrO. Havia alGum espaçO para Questões pOlÍticas

da impressão da publicação. Nota-se aí a re-levância de Elíseo Mendes na concepção e lançamento da publicação.

uc Qual era o diferencial de A Illustração?tania de luca O importante nela não era a notícia como entendemos hoje, mas a novida-de. Esse tipo de publicação surgiu na Europa em meados do século XIX. A primeira revista desse gênero foi The Illustrated London News, iniciada em 1842, na Inglaterra. No ano se-guinte, surgiu La Ilustración, na França. Es-se estilo de publicação caracteriza-se por ter metade composta por textos e a outra metade por imagens. O difícil naquela época era a composição das ilustrações. Embora já exis-tisse a fotografia, ainda não havia a técnica para imprimi-la diretamente nos periódicos.

Em geral, as ilustrações eram feitas a partir do trabalho de um desenhista, que compunha um rascunho do que deveria ser a imagem de um determinado local ou pessoa. Em segui-da, aquele rascunho era enviado ao estúdio, onde alguém, que não necessariamente esti-vera no local em que o primeiro registro fora feito, concluía o desenho que, posteriormente, era entalhado em madeira. Só depois desse processo é que a matriz estava pronta para a impressão. Era um procedimento longo e ca-ro que, no Brasil, nem sempre se podia fazer a preços competitivos. Por vezes, o processo tinha início com uma fotografia e não com um desenho.

uc Como foi o lançamento da revista no Brasil e quem eram os leitores?tania de luca Houve uma panfletagem no Rio de Janeiro, com a edição do número zero, em tamanho de bolso, que eles chamavam bijou.

A chegada da revista, a cada quinze dias, era motivo de anúncio nos grandes jornais, não somente na Gazeta de Notícias, interessada na publicação. As cartas que Pina trocava com autores brasileiros mostram que a revista era lida pela elite alfabetizada. Os contratos de edição indicam a impressão de uma média de quatro mil exemplares por edição quinzenal.

uc Qual era o conteúdo da publicação? tania de luca A revista era feita para encantar o leitor. Os destaques eram a agenda cultural de Paris, literatura, trechos de livros, poe-mas, teatro. Havia algum espaço para ques-tões políticas. Mais especificamente ligadas às questões europeias e suas colônias. Rara-mente eram publicados fatos brasileiros. Mas quando houve a proclamação da República,

Na foto, Tania Regina de Luca autora do livro A Ilustração (1884-1892) – Circulação de textos e imagens entre Paris, Lisboa e Rio de Janeiro. É professora Livre Docente em História do Brasil Republicano (2009), Unesp. Foi editora da Revista Brasileira de História (ANPUH, biênio 1999/2001) e da revista História (Programas de pós-graduação em História da Unesp/Assis e Franca).

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por exemplo, a volta de D. Pedro para a Euro-pa foi destaque na revista. Devemos lembrar que o acordo com a tipografia era para utili-zação de imagens de segunda mão. Brasil ou Portugal só foram notícias quando acontecia algum fato que justificasse a publicação no Le Monde Illustré. Pina tinha de bancar os custos dos clichês caso desejasse uma publi-cação específica.

uc No livro a senhora discute o concei-to de colaborador. Como eram feitas as colaborações na revista? tania de luca De acordo com os moldes da pu-blicação, o editor utilizava-se com frequência do método ao qual chamamos na atualidade de “corta e cola”. Olavo Bilac contribuiu com 24 textos, sem nunca ter escrito nada especi-ficamente para a revista. Pina não necessaria-mente consultava os autores para reproduzir seus textos, uma vez que a lei de direitos au-torais ainda não estava em vigor em âmbito internacional. Ele se apropriava de poemas ou textos já publicados de Bilac, assim como

de outros escritores, e os reproduzia. Por isso eu discuto no livro a noção de colaborador, que podia acontecer de forma involuntária. Atualmente entendemos essa figura como alguém ativo. Em A Illustração o sentido de colaborador era outro. Eles reproduziam textos não inéditos ou de escritores mortos e, é bom lembrar, sem pagar direitos autorais. O Brasil não era signatário da Convenção de Berna de 1886, relativa à proteção das obras literárias e artísticas. Naquele momento, os direitos autorias não estavam claramente estipula-dos. Contudo, vez por outra a revista pagava por colaborações encomendadas. Na pesqui-sa, encontrei documento sobre essa prática. Outra método muito comum naquela época era algum amigo enviar para a publicação um texto sem o conhecimento do seu autor. As-sim, o conceito de colaborador era algo fluido. Mas Pina tinha uma noção da importância de fazer crer que o que era publicado na revista provinha de colaboradores, razão pela qual mencionava os nomes de todos os autores no expediente da revista.

uc Mariano Pina não conhecia o Brasil. De que forma isso impactou na publicação?tania de luca O fato de o editor ser português e ter relações muito próximas com a intelec-tualidade portuguesa dá uma coloração mais lusitana para a revista. Até pouco profissional do ponto de vista do negócio, uma vez que a quantidade de leitores em potencial no Brasil era maior do que em Portugal. O Brasil era, realmente, uma temática menor. Do ponto de vista da produção, contudo, era mais barato fazer a revista em Paris do que aqui. Pode-mos dizer que, já no século XIX, existia um mercado globalizado das imagens. Inclusive a imprensa francesa dependia desses negócios internacionais para se manter.

uc A Exposição Universal de 1889 foi um momento importante para a publicação. De que forma A Illustração capitalizou o evento?tania de luca Foi realmente um momento

A Ilustração (1884-1892) – Circulação

de textos e imagens entre Paris, Lisboa e

Rio de Janeiro,Tania Regina de Luca,

Editora Unesp,274 páginas, R$ 68.

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entrevista

a puBlicaçÃO tamBÉm diFuNdia as imaGeNs e cONstruçõeseurOpeias sOBre O OrieNte. a revista cOlaBOrOu para a diFusÃO ecirculaçÃO de ideias e valOres culturais eurOpeus NO Brasil

importante para o editor Mariano Pina, que se mobilizou pela presença portuguesa no evento, o que causava certo constrangimento às monarquias uma vez que, afinal, o que se comemorava era o centenário da Revolução Francesa, que colocou um freio no cadafalso. Em Portugal foi criada uma comissão, não de cunho oficial, para representar o país. Pina foi convidado a fazer parte daquele grupo e usou a revista como instrumento político. Fez tanta oposição ao presidente da comissão que hou-ve mudança da direção, fato que contribuiu para aumentar sua força. E como membro da comissão portuguesa ele teve acesso, em primeira mão, às imagens e dados da expo-sição. É interessante perceber como o fato de o pavilhão do Brasil estar mais adiantado que o português serviu de arma para criticar o presidente ao qual ele se opôs. Quando ele publicou na revista o projeto do pavilhão bra-sileiro não foi por interesse no Brasil, mas para mostrar que os portugueses estavam atrasados no projeto. A exposição também foi a porta de entrada de Pina na política. Ele se aproximou de Mariano de Carvalho, o novo articulador e chefe da comissão portuguesa e ex-ministro da fazenda de Portugal. Em 1889, a pauta da revista foi dominada pelo andamento da exposição universal. Talvez tenha sido um dos momentos mais interessantes da revista.

Mostrar o encantamento de subir a torre Eiffel e poder ver Paris do alto, então uma sensação nova e que permitia ter outra apreensão da cidade. A re-vista também expôs a visão con-sagrada sobre as regiões coloniais dominadas pela Europa. Dentro da exposição, havia os pavilhões coloniais. Então, França e Ingla-terra dominavam grande parte do mundo. Os povos subjugados eram retratados na publicação como exóticos e atrasados. Uma seção inteira da exposição repre-sentava aldeias, o que acabava por justificar a dominação colonial pelos povos industrializados. As

cabanas e as montagens relativas aos povos e sociedades considerados primitivos estavam entre os espetáculos preferidos das senhoras e crianças. Em um dos artigos da revista lê-se: “Essas cabanas em estado primitivo de habitação onde se vêem os mais interessantes exemplares da grande família humana. Exem-plares chegados de todos os campos do globo. A aldeia dos Cabilés é um dos pontos que mais atrai a curiosidade dos visitantes. Já os senhores preferem a rua do Cairu, não pelos bazares, mas porque tinha a dança do ventre”. A publicação também dwifundia as imagens e construções europeias sobre o oriente. A re-vista colaborou para a difusão e circulação de ideias e valores culturais europeus no Brasil.

uc Por que A Illustração deixou de cir-cular em 1892?tania de luca Existe a hipótese de que, a partir da relação de Pina com os membros da comissão da exposição universal, ele te-nha se aproximado de Mariano de Carvalho, uma figura importante do ponto de vista po-lítico. Pina tornou-se secretário de Carvalho. Além disso, ele assumiu a administração de um jornal em Portugal, fato que o obrigou ficar menos em Paris. A partir de 1890, seu irmão, Augusto Pina, começou a ajudá-lo na tarefa de imprimir a revista. Porém, o negócio começou a desandar. A qualidade da revista caiu e isso deve ter influenciado no número

de assinantes. Assim, a pu-blicação acabou morrendo. Enquanto existiu, forneceu uma visão da Paris do Segundo Império, e isso com qualidade técnica dificilmente atingível em publicações feitas no Bra-sil. Sem o leitor ter ido a Paris, ele conhecia os itens da moda e os costumes do parisiense. O leitor sabia da agenda ar-tística e cultural da cidade. A Illustração também contribuiu para a formação de um gosto estético.

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urbanismo

de lotes ou terrenos), se dará por enfiteuse ou aforamento, um sistema de transferência de uma área sem sua posse plena.

Em geral o olhar é de perplexidade, pois são poucas as pessoas que já ouviram tal ter-mo com esse sentido, somado a outros que o complementam, como aforamento, enfiteuse, laudêmio. O léxico parece muito distante e depois da surpresa sobra a falsa sensação de que tal sistema era próprio da história antiga portuguesa ou, quando muito, do período co-lonial no Brasil. Novamente sou obrigado a informar que o “Patrimônio Religioso” é um fenômeno urbano pouco estudado, mas que explica como se deu o “surgimento dos chãos”

H abitualmente, estudantes interessados em nossa pós-graduação na área de Ar-

quitetura e Urbanismo me procuram no sentido de solicitarem orientação sobre as edificações religiosas e seus bens. De praxe, tento mos-trar a eles que minha área de pesquisa não é necessariamente voltada aos templos e de-mais pertences da Igreja Católica e, sim, aos “Patrimônios Religiosos”. Claro, a partir dai é necessário explicar de forma breve o sentido disso, apontando que se trata de terras rurais concedidas por particulares à Igreja Católica para a criação de um povoado com sua cape-la (MONBEIG, 1984, p.235 e 236), e que a ocupação das datas (atualmente chamaríamos

trata-se de terras rurais cONcedidas pOr particulares À iGreJa católica para criaçÃO de pOvOadO

patrimônio religioso, o que é isso?

Rio Claro, 1949.

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onde se assentaram boa parte das cidades do interior paulista (e certamente não só em nosso Estado), a partir dos meados dos novecentos, e mais celeremente, nas últimas três décadas do século XIX. Ou seja, esse processo é relativa-mente recente e seus reflexos se fazem sentir até nossos dias nas urbes onde o aforamento ainda é presente!!!.

A doação da terra para se constituir um Pa-trimônio se dava em honra a um santo, em seu nome, e a denominação desse local expressava claramente sua origem religiosa, quase sempre se iniciava pelo nome do canonizado ou cano-nizada padroeira, sucedido pelo do acidente geográfico que caracterizava a área, em geral

um rio (MARX, 1980, p.23). O orago que seria homenageado com a ereção da capela era do agrado do doador, um fazendeiro (ou mesmo grupo deles) que separava uma parte de sua propriedade para a atribuição. Com o passar do tempo e na maioria dos casos, a denomi-nação religiosa desapareceu, ficando apenas o nome ligado à geografia, por exemplo: São Sebastião do Bauru ou São João do Rio Claro, conhecidas hoje apenas por Bauru e Rio Claro.

As terras da nova vila, quando arruadas pelo poder civil, seriam administradas e transmiti-das pela Fábrica Paroquial, nome também an-cestral que designa a entidade ligada à Igreja que cuidava dos bens, direitos e rendimentos de uma igreja matriz (ALVES, 1897, p.564). A Fábrica, que se constituía numa corporação formada por clérigos e leigos que administravam os bens da paróquia, disporia da terra doada em datas urbanas, cedidas por aforamento aos interessados em viver no patrimônio. A corporação era composta de pessoas da comu-nidade e, quase sempre, presidida por pároco indicado pelo bispo. O nome Fábrica vem do

fabrico da igreja, sua construção, aformosea-mento e compra de alfaias, que era para onde deveriam, em tese, se dirigir os recursos do aforamento das terras urbanas.

Mesmo que o Patrimônio ascendesse ao estágio de cidade, seus limites originais e tam-bém os direitos imanentes a ele permaneciam, pois sua doação e transmissão eram perpétu-as, conforme as antigas leis pré-capitalistas que o guiavam, alteradas lentamente confor-me os novos Códigos Civis se sucederam. Ou seja, aqueles que estivessem ocupando áreas do Patrimônio, ou da área foreira, como tam-bém eram designados, além de não terem pos-se definitiva do bem, apenas direito de uso e

O patrimÔNiO se cONstituÍa em ceNtrO de uma exteNsa Área de OcupaçÃO rural; ele asseGurava aOs cOmpradOres das FazeNdas, FazeNdOlas e sÍtiOs dO eNtOrNO um mÍNimO de seGuraNça e ‘vida urBaNa’

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gozo, precisavam pagar o foro anual à Igreja Católica, e, em caso de repassá-las a outrem, o laudêmio. Para os Patrimônios irrelevantes tais taxas eram cobradas com certa frouxidão; entretanto, naqueles em crescimento, onde os imóveis se valorizavam muito, a Fábrica uti-lizava até mesmo ameaças via imprensa para as demandas de arrecadação.

Aspecto fundamental para entendermos o processo é o fato de o Patrimônio constituir-se em centro de uma extensa área de ocupação rural; ele assegurava aos compradores das fa-zendas, fazendolas e sítios do entorno um mí-nimo de segurança e “vida urbana”. Portanto, também funcionava como estratégia na venda da terra rural, essa a rigor liberada ao mercado desde a Lei de Terras de 1850, diferentemente dos “chãos” dentro do Patrimônio, presos às antigas práticas de aforamento.

Em São Paulo, o avanço da lavoura do café, tocada por força de trabalho imigrante, pro-piciou a abertura de centenas de Patrimônios Religiosos, futuras cidades, num primeiro mo-mento antes da chegada das plantações e, logo após, tendo as lavouras ao seu redor, grande parte em áreas de terras devolutas apropria-

A vila (Bauru) era subordinada ao município de Fortaleza (próximo de Agudos) criado em 1887, cuja instalação, bastante solene, aconteceu no dia 7 de janeiro de 1889.

Vista de Presidente Prudente, “Praça da Bandeira”.

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urbanismo

das por particulares, consideradas nos mapas oficiais como ¨terrenos despovoados .̈ Grosso modo, tal região do Estado pode ser demar-cada por um polígono que abrange o centro e centro-oeste do Estado, onde se encontram cidades criadas como Patrimônios Religiosos, entre os meados, e mais expressivamente nas últimas três décadas do século XIX, devido à expansão da cultura cafeeira.

Para se ter uma idéia da amplidão da for-mação urbana paulista no século XIX, Pierre Monbeig nos dá alguns números: em 1879, a província possuía 100 municípios; no final do século XIX, o Estado terá 161, 41 criados na última década (MONBEIG, 1984, p.113), claro, sem considerarmos os inúmeros Patri-mônios já existentes e que estavam, ainda, por se constituir em sedes municipais. A rapidez do processo e sua escala são únicas no Brasil. Em 1872, na província, apenas a capital con-tava com mais de 30 mil moradores; em 1920, eleva-se a 34 o número delas, e reúnem uma população de 2.351.673 habitantes. O cres-cimento das cidades de São Paulo com mais de 30 mil habitantes, entre 1872 a 1920, é de 7.393%, contra um crescimento de 448% da população do Estado em conjunto. No país, em período idêntico, é de 412% o crescimento das cidades e de 203% para toda população (SILVA, 1976, p.99).

O termo Patrimônio Religioso ou, mais co-mumente, “Patrimônio” foi bastante usual até meados do século XX, para designar povoados cujas origens vieram de terras aforadas pela Igreja Católica. De certa forma, a denomina-ção tornou-se sinônimo de povoado, vila ou pequeno aglomerado urbano, ao menos até que o mesmo fosse elevado a sede de municí-pio, quando a designação “Cidade” seria usu-almente empregada.

Embora a Igreja fosse, até a primeira cons-tituição republicana, parte do Estado, e de certa maneira braço deste para a implantação de cidades (MARX, 1991), é importante ob-servar que para o arruamento das terras dos Patrimônios Religiosos, bem como para sua administração, fazia-se necessário todo um ar-

cabouço legislativo e burocratas ligados à esfera temporal, e que, portanto, o civil e o religioso entrelaçavam-se continuamente, parte das ve-zes com previsíveis conflitos. O mesmo se deu em relação àqueles particulares que aforavam os terrenos da Igreja, que se sentiam injusti-çados pelas contínuas cobranças de tributos.

Entretanto, após a Republica e principalmen-te a partir do século XX, passa a vigorar para a constituição de novas cidades o loteamento privado, mesmo que ainda denominado de “Pa-trimônio” por força da tradição. São exemplos as cidades situadas mais a oeste e extremo oeste do Estado, como Marília e Presidente Prudente, entre dezenas de outras, forjadas a partir de loteamentos privados. Marília se es-tabelece a partir da junção de “Patrimônios” pertencentes a vários coronéis, sendo os prin-cipais os do “Alto Cafezal” e o de “Marília”. Mesmo as expansões urbanas dos antigos Pa-trimônios Religiosos, constituídas por bairros e vilas estabelecidos ao seu redor, terão seus lotes vendidos de forma livre e desembaraçada como uma mercadoria capitalista.

O novo século passa a impor outras relações para o urbano e com elas caem em anacro-nismo as concessões através de “Patrimônio”, bem como o termo, na acepção exposta por este breve artigo.

Nilson ghirardello é professor do departamento de arquitetura, urbanismo e Paisagismo da faculdade de arquitetura, artes e Comunicação (faaC), Câmpus da unesp de Bauru.

Este artigo é baseado no livro: A formação dos patrimônios religiosos no processo de expansão urbana paulista (1850-1900), Nilson Ghirardello,Editora Unesp, 2010,268 páginas, R$ 60.

REFERênCiAS bibLiOGRÁFiCAS

alves, J.a.F. consolidação das leis relativas ao juízo da provedoria. rio de Janeiro, laemmert & cia., 1897.

marx, m. cidade brasileira. são paulo, melhoramentos, editora da universidade de são paulo, 1980.

---------------. cidade no Brasil, terra de quem? são paulo, edusp-Nobel, 1991.

mONBeiG, p. pioneiros e fazendeiros de são paulo. são paulo, Hucitec, polis, 1984.

silva, s. expansão cafeeira e origens da indústria no Brasil. são paulo, alfa-Omega, 1976.

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medicina veterinária

NOva estrutura terÁ um ceNtrO cirÚrGicOcOmpletO, cOm duas salas de cirurGia, umapara aNimais de GraNde pOrte e OutraespecÍFica para aNimais de peQueNO pOrte

Centro de medicina e pesquisa em Animais Selvagens será ampliado

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medicina veterinária

e m outubro de 2018, tiveram início as obras de ampliação do Centro de Medicina e

Pesquisa em Animais Selvagens (Cempas) da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootec-nia (FMVZ) da Unesp, câmpus de Botucatu.

O Cempas foi criado a partir do serviço de atendimento a animais selvagens na FMVZ, iniciado em 1994. No ano de 2005, com sua mudança para as instalações anteriormente ocupadas pelo Centro de Venenos e Animais Peçonhentos (Cevap) da Unesp, o serviço con-verteu-se num centro de prestação de aten-dimento especializado nas áreas de clínica, cirurgia e de diagnóstico a animais selvagens em situação de risco, apreendidos, resgatados pelo poder público, trazidos pela população ou encaminhados por instituições parceiras, como zoológicos e criatórios. Em 2017 foram 1429 atendimentos. Até agosto de 2018 já eram 813.

Além do atendimento, o Cempas também

O serviçO cONverteu-se Num ceNtrO de prestaçÃO de ateNdimeNtO especializadO Nas Áreas de clÍNica, cirurGia e de diaGNósticO a aNimais selvaGeNs em situaçÃO de riscO

tem uma significativa atividade de pesquisa. Foram as pesquisas desenvolvidas no Centro que fundamentaram a criação em 2015 do Pro-grama de Pós-Graduação em Animais Selvagens da FMVZ, o primeiro criado no Brasil em sua área de atuação. Em agosto de 2018, foi defen-dida a primeira tese de doutorado do Programa.

A ampliação das instalações deverá dinami-zar e dar mais segurança a todas essas ativida-des. A nova estrutura terá um centro cirúrgico completo, com duas salas de cirurgia, uma pa-ra animais de grande porte e outra específica para animais de pequeno porte. Atualmente, o Cempas utiliza os centros cirúrgicos do Hospi-tal Veterinário da FMVZ.

Também serão construídos dois novos am-bulatórios para atendimento, com sala de es-pera, banheiro, estacionamento para usuários e um quarentenário, espaço para que animais

oriundos de apreensão ou resgatados possam ser mantidos isolados e sob observação, até que exames garantam sua colocação junto de outros animais abrigados pelo Cempas.

“Essa estrutura vai dar melhores condições de trabalho para nossa equipe e, claro, possi-bilitar um melhor atendimento aos animais e seus proprietários, pois não trabalhamos apenas com animais de vida livre. Temos uma casuísti-ca grande de animais exóticos que são trazidos por proprietários, como pássaros e coelhos, por exemplo”, explica o professor Carlos Roberto Teixeira, coordenador do Cempas. “Além disso, os novos ambulatórios e centros cirúrgicos de-vem agilizar o atendimento e dinamizar o ser-viço, contribuindo também com um aumento da nossa capacidade de produção científica”.

Também será construído um anfiteatro com 100 lugares, que poderá ser utilizado em aulas, congressos, reuniões científicas e nos diversos

Grupo de Proteção Ambiental resgata diversos animais em pontos diferentes de Botucatu.

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medicina veterinária

mo uma referência quando se trata de animais selvagens. Em agosto, por exemplo, a equipe do Cempas foi chamada para auxiliar na captura de uma onça-parda que estava em cima de uma árvore, no terreno de uma indústria metalúrgi-ca, no município de Tatuí.

Com a chegada dos médicos veterinários Luna Scarpari Rolim e Raphael Baldissera, resi-dentes do Cempas, o animal foi sedado e enca-minhado para a FMVZ. O animal, uma fêmea jovem, pesando aproximadamente 30kg, estava saudável e permaneceu no Cempas por quatro dias, onde passou por uma bateria de exames.

A soltura do animal foi realizada pelo Insti-tuto Pró-Carnívoros, entidade que promove a conservação dos mamíferos carnívoros neotro-picais e de seus habitats. Antes da sua soltura, o animal recebeu um rádio-colar, equipamento de alta tecnologia que permite que o animal seja acompanhado à distância, por meio de sinais que são enviados periodicamente via satélite. “Dessa forma, o animal vai contribuir para pes-quisas que fornecerão um embasamento cien-

cursos de treinamento e capacitação em manejo e contenção de animais selvagens em situação de risco que o Cempas realiza regularmente para entidades como a Polícia Militar Ambiental do Estado de São Paulo, a Guarda Civil Municipal de Botucatu e Corpo de Bombeiros. Atualmen-te, o Cempas está em tratativas com o Depar-tamento de Estradas de Rodagem (DER) para fornecer esse tipo de treinamento a agentes que atuam em 14 diferentes escritórios do DER. “O Cempas e a FMVZ têm essa preocupação constante em devolver para a sociedade o que ela investe na universidade na forma de seus impostos”, comenta o professor Teixeira. “Com essa nova estrutura, vamos estar melhor prepa-rados para continuar a fornecer essas informa-

ções às entidades públicas de forma a colaborar com a conservação da fauna silvestre e do maio ambiente, de maneira geral”.

As obras envolverão uma área de aproximada-mente 930m² e serão executadas com recursos advindos de um convênio com o Fundo Esta-dual de Defesa de Interesses Difusos (FID) por meio da Secretaria Estadual da Justiça e da Defesa da Cidadania. O FID é um fundo mantido por recursos provenientes do resultado judicial de ações civis públicas que buscam o ressarcimento à coletividade de danos causa-dos ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, na esfera estadual. A expectativa é que em um ano a nova estrutura do Cempas esteja em pleno funcionamento.

atividadesA equipe, coordenada pelo professor Teixei-ra, conta hoje com 5 residentes e cerca de 30 estagiários por mês. Além da alta casuística o Cempas, ao longo dos anos, se consolidou co-

as OBras eNvOlverÃO uma Área de prOximadameNte 930m2 e serÃO executadas cOm recursOs adviNdOs de um cONvÊNiO cOm O FuNdO estadual de deFesa de iNteresses diFusOs

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Acima, área demarcada para o início das obras no Cempas.

Ao lado, avaliação em um Lobo Guará.

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Acima, equipe Cempas com um filhote de tamanduá. Ao lado, realização de curativo em um pequeno animal silvestre.

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idade, abrigado na FMVZ. Sem correr risco de morte, Fiona deve ser encaminhada para algu-ma instituição. “O tamanduá vive nas costas da mãe até cerca de um ano de idade. Por isso, a reabilitação de filhotes para a soltura na natu-reza é muito difícil. Mas o animal saudável po-de ser destinado a criadores conservacionistas, zoológicos, mantenedouros e programas de pro-criação”, afirma o professor Teixeira. “O Cem-pas fornece um laudo informando se o animal está apto ou não para a soltura e a Secretaria do Meio Ambiente do Estado é que determina para onde ele será destinado”.

No mesmo dia em que a tamanduá chegou, o Cempas recebeu três filhotes de cachorro do mato com menos de 30 dias de vida, encontrados em meio a uma plantação. Os animais, ainda

muito pequenos, chegaram feridos, um deles com uma fratura exposta de crânio. Após duas semanas de tratamento, o animal já se alimen-tava sozinho, ganhava peso e não apresentava mais nenhum sinal neurológico.

“Nosso sucesso aqui depende do sucesso da captura de animais em situação de risco e do seu rápido encaminhamento para atendimen-to. Se o animal demora para ser atendido, ele pode ficar desidratado, perder sangue e outras características que tornam impossível sua recu-peração. Quando o processo de resgate é rápido, aumentam as chances de termos sucesso e o tempo de recuperação, como qualquer pacien-te, inclusive humanos, tende a ser mais rápido”, explica Luna. O professor Teixeira complementa “Essa nova estrutura deve nos ajudar em todos esses aspectos. Poderemos capacitar melhor quem faz os resgates e também atender com mais dinamismo e qualidade. Todas as etapas do processo de recuperação dos animais serão melhoradas”.

tífico que vai auxiliar na conservação de outras espécies de carnívoros”, comenta Luna. Esse caso, marcou a primeira parceria do Cempas com o Instituto Pró-Carnívoros.

Em setembro, o Cempas atendeu uma onça atropelada na região de Bauru. O animal foi en-caminhado pela equipe do Zoológico de Bauru. O animal chegou ao Cempas com traumatis-mo craniano. Não conseguia andar, tentava se levantar e caía, tinha sintomas de problemas neurológicos. “Nossa preocupação é que esse trauma pudesse interferir na vida do animal. Será que ele conseguiria enxergar e se movi-mentar plenamente para poder caçar?”, conta Luna. “Após o tratamento, ele voltou a ter uma vida normal. Ele caça, não tem mais dificul-dades para se locomover e se situar dentro do ambiente. Temos monitorado o animal por vídeo e estamos na expectativa de soltá-lo na natu-reza, utilizando o rádio-colar em parceria com o Instituto Pró-Carnívoros”.

A equipe do Cempas também têm alcan-çado sucesso com animais de menor porte. Segundo o professor Teixeira, o protocolo de atendimento estabelecido pelo Cempas para o atendimento de filhotes de tamanduá tem ti-do muito êxito. “Nos anos de 2017 e 2018, não perdemos nenhum filhote de tamanduá. Todos que chegaram a nós foram tratados e sobrevi-veram. Temos recebido consultas de várias ins-tituições do país solicitando informações sobre alimentação e tratamento para esses filhotes”, relata o professor Teixeira.

Um exemplo recente é uma fêmea filhote de tamanduá-bandeira, de aproximadamente 3 meses de idade, que foi atacada por cães, na região do município de Pratânia. Trazida pela Guarda Municipal de Botucatu, tinha uma fratura no crânio, sangramento nasal, dificul-dade de respirar, não se movimentava, não se alimentava, apresentando claros sinais de pro-blemas neurológicos.

Após passar por tratamento, com medicação e alimentação na mamadeira. O animal, bati-zado carinhosamente de Fiona pela equipe do Cempas, hoje anda e se alimenta normalmen-te e interage com outro tamanduá da mesma

a eQuipe dO cempas tamBÉm tem alcaNçadO sucessO cOm aNimais de meNOr pOrte. O prOtOcOlO de ateNdimeNtO estaBelecidO para O ateNdimeNtO de FilHOtes de tamaNduÁ tem tidO muitO ÊxitO.

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Biotecnologia

O time da Unesp composto por 17 estu-dantes de graduação de duas unidades

do câmpus de Araraquara, a Faculdade de Ciências Farmacêuticas e o Instituto de Quí-mica, obteve a melhor performance de uma universidade brasileira na história do iGEM (Competição Internacional de Máquinas Ge-neticamente Modificadas), a mais importan-te competição universitária de biotecnologia do mundo.

Sediada em Boston, nos Estados Unidos, a fase final da competição foi realizada de 24 a 28 de outubro e a participação da equipe da Unesp se encerrou com a medalha de ouro, em razão do cumprimento de metas gerais estabelecidas pela organização do iGEM, a conquista do prêmio especial de melhor har-dware, superando as outras 316 equipes par-

aluNOs da FcF e dO iQ alcaNçam O melHOr desempeNHO de uma uNiversidade Brasileira NO iGem

Equipe da Unesp obtém conquista histórica para o brasil nos EUA

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Biotecnologia

ticipantes, e mais duas indicações aos prê-mios especiais de melhor coleção de partes biológicas e melhor projeto educacional e de engajamento público.

Participaram da edição de 2018 do iGEM 317 times das principais universidades do mundo, muitas das quais líderes no ensino de biotec-nologia, como o MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), as universidades de Boston e de Stanford e as universidades europeias de Munique (Alemanha) e de Zurique (Suíça). Do Brasil, a Universidade de São Paulo também participou e foi premiada – a USP levou um prêmio especial, mas ficou com uma medalha de prata no geral.

O desempenho histórico da Unesp ocorre apenas na segunda participação da Universi-dade nesta competição. A primeira ocorreu em 2017, quando o time unespiano também conquistara a medalha de ouro. Até a edição deste ano nenhuma equipe brasileira havia ganho prêmio especial.

“Esse resultado tem ainda mais relevância para nós porque todas essas grandes univer-sidades que geralmente levam os prêmios es-peciais têm uma estrutura gigantesca ao redor da competição e a participação delas já é insti-tucionalizada como uma disciplina dentro do curso”, pontua a professora Danielle Biscaro Pedrolli, coordenadora da equipe iGEM na Unesp ao lado professor Marcel Otavio Cerri.

BiOrreatOrO troféu pela premiação especial foi conferido ao trabalho de desenvolvimento e construção de um biorreator de proporções semelhantes às do intestino humano. Trata-se de um reci-piente usado para se cultivar bactérias intes-tinais e assim simular o comportamento das bactérias terapêuticas neste ambiente.

A equipe desenvolveu um sistema de pro-dução controlada de biofármacos por bactérias probióticas, conhecidas por causarem bene-fícios ao organismo. Também foi construído um mecanismo para transporte do biofármaco através do epitélio intestinal.

O biorreator, usado para testar in vitro os

reprOduzidOs NO amBieNte dO BiOrreatOr, esses micrOrGaNismOs Fazem a prOduçÃO e a eNtreGa (delivery) dOs BiOFÁrmacOs pra tratar a dOeNça diretameNte NO iNtestiNO da pessOa

probióticos geneticamente modificados, si-mula uma porção do intestino, tendo como dimensões 25cm de comprimento por 6cm de diâmetro e foi construído com mangueiras daquelas de regar jardim residencial e peças de plástico produzidas por meio de impressora 3D.

“Fizemos um projeto aberto com materiais acessíveis, que podem ser reproduzidos facil-mente”, conta Danielle.

O projeto de construir um biorreator que simula o crescimento de bactérias probióticas geneticamente modificadas no intestino hu-mano também carrega consigo a ideia de se reduzir o número de testes feitos com animais no desenvolvimento de um medicamento.

Reproduzidos no ambiente do biorreator, esses microrganismos fazem a produção e a entrega (delivery) dos biofármacos para tratar a doença diretamente no intestino da pessoa.

A realização desta simulação prévia pode eliminar algumas possibilidades durante o

processo de desenvolvimento da terapia viva, descartando cenários que não funcionam e levando o mínimo possível de testes para o modelo animal.

“É realmente uma possibilidade de, pelo menos, reduzir os testes feitos em animais”, diz a professora.

O biorreator é um subprojeto integrante do projeto Hope, de desenvolvimento de uma pla-taforma microbiana para terapia viva, com obje-tivo de tratar desordens metabólicas humanas. As informações do projeto inscrito pelo time da Unesp no iGEM 2018 estão detalhadas no site desenvolvido para a competição, que segui-rá em funcionamento: <http://2018.igem.org/Team:Unesp_Brazil>. A equipe também man-tém uma página no Facebook em que detalha a experiência: <facebook.com/igem.unespbrazil/>.

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FaBiO mazzitelli

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Biotecnologia

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Acima, foto do time de 2018. Ao lado, alguns integrantes, em Boston.

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Biotecnologia

comunidade externa à universidade, o que foi feito em Araraquara na escola pública do As-sentamento Bela Vista, localizado na cidade.O time da Unesp desenvolveu na escola, durante dois meses, o projeto “Mulheres na Ciência”, dentro do qual os alunos do 9º ano do ensi-no fundamental puderam descobrir juntos as contribuições científicas e tecnológicas das mulheres ao longo da história. Tudo com material didático, e lúdico, desenvolvido pela própria equipe unespiana.

Os estudantes que compuseram a equipe vitoriosa da Unesp no iGEM 2018 foram, do curso de engenharia de bioprocessos e bio-tecnologia, Amanda Gracindo, Ana Flávia Martins Costa, Bruna Fernandes Silva, Da-

niel Augusto Cozetto, Débora Zamaro Toledo dos Santos, Mariana Biondi Cesar, Mariana Santana da Mota, Nathan Vinicius Ribeiro, Patrick Neves Squizato, Paulo Jose Correa Freire, Rafael Brull Tuma, Victor Nunes de Jesus e Vitor Teixeira Mazziero; do curso de farmácia-bioquímica, Ana Paula Cardoso, La-rissa de Souza Crispim, Nadine Vaz Vanini; e do curso de engenharia química, Natália Agostinis Silva.

A viagem do time unespiano contou com o apoio do Convênio Unesp-Santander, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas e do Instituto de Química, além de recursos das empresas Promega, Kasvi, Mendel e Merck.

Além dos docentes Danielle Biscaro Pe-drolli e Marcel Otavio Cerri, coordenadores do projeto, foram conselheiros os professores Guilherme Peixoto, Álvaro de Baptista Neto, Sidineia Barrozo e Gustavo Nakamura Alves Vieira. Trabalharam como instrutores de apoio técnico Flavio Pereira Picheli, Gabriela Barbo-sa de Paiva e Rone Aparecido De Grandis.

“O nosso projeto só tinha alunos de gra-duação e concorreu com times que tinham integrantes da pós-graduação. Conseguimos mostrar a importância do nosso trabalho e isso acabou virando trabalho de iniciação científi-ca deles. Pelo grande volume de resultados, a ideia é que os dados sejam publicados em um artigo no ano que vem”, afirma a professora Danielle Pedrolli.

iNteraçÃO cOm cOmuNidade exterNaO iGEM é uma competição criada no MIT no início dos anos 2000 e, após tomar proporções globais depois de alguns anos, passou a ser organizada por uma fundação própria, reunin-do um número cada vez maior de universida-des participantes. Por ser fundamentada nos princípios da biologia sintética, a competição apresenta aos participantes o desafio de desen-volver um projeto inovador e interdisciplinar, integrando conhecimentos de biotecnologia, engenharias, farmácia, química e matemática.

O desafio inclui ainda o envolvimento da

O iGem É uma cOmpetiçÃO criada NO mit NO iNÍciO dOs aNOs 2000 e, após tOmar prOpOrções GlOBais, passOu a ser OrGaNizada pOr FuNdaçÃO própria, reuNiNdO um NÚmerO cada vez maiOr de uNiversidades

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Foto do mês

OS FUnGOS mORAm AO LAdO imagens de fungos encontrados nos arredores das instalações do instituto de Biociências, letras e ciências exatas (ibilce), câmpus são José do rio preto. a foto é de autoria de pedro lucas Bueno da silva, doutorando do programa de pós-Graduação em microbiologia da unesp.

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pedro lucas Bueno da silva

Foto do mês

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Opinião

maior biomassa na Mata Atlântica. Se cada jacutinga morta em Itajaí pesasse 1,5 quilo, 75 toneladas de jacutingas foram mortas em uma única manhã. Um ditado catarinense diz “Ninguém resiste a jacutinga com arroz”. Hoje, tanto a jacutinga como esse ditado estão ameaçados de extinção. Em Blumenau, não existe mais nenhuma jacutinga.

Os ornitólogos estimam que exista menos de 4 mil indivíduos em toda a Mata Atlânti-ca. Em São Paulo ocorre somente em treze cidades; em Santa Catarina, cinco; no Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro ocorre em apenas uma. Em Minas Gerais, somente uma população reintroduzida; na Bahia e Espírito Santo a jacutinga está extinta há muitos anos. As jacutingas deviam ser tão comuns que em Minas Gerais uma cidade foi batizada de Ja-cutinga. Hoje, não existem mais jacutingas em Jacutinga.

Mas e daí que a jacutinga está sendo ex-tinta? Sabe aquele seu tio chato que te per-gunta: mas para que serve o mosquito? Acho que todo biólogo já deve ter sido questionado com esse tipo de pergunta. Por que gastar

N o passado a jacutinga vivia em bandos enormes e realizava grandes migrações

subindo as serras no verão e descendo no in-verno. Por ser tão abundante e parecida com uma galinha bem mansa, a ave também come-çou a ser alvo fácil de caçadores. E assim foi o destino da jacutinga. Mataram milhares delas anualmente. Em Blumenau, Santa Catarina, as jacutingas eram tão comuns que chamou até a atenção de um médico alemão, Fritz Müller. Ele escreveu para o amigo Charles Darwin “O inverno de 1866 foi incomumen-te frio e as jacutingas vieram da serra em tão grande número que em poucas horas foram abatidas no Itajaí aproximadamente 50.000”. Fritz Müller não era de contar vantagens para Darwin e é bem provável que a jacutinga te-nha sido uma das aves de grande porte mais comuns de toda a Mata Atlântica. Elas não chegavam a ser como os pombos passageiros (Ectopistes migratorius), uma espécie de pombo norte americano que possuía uma população estimada em vários bilhões de indivíduos e que foram caçados até sua extinção em 1914. Mas a jacutinga certamente devia ser a ave com

A jacutinga e as mudanças climáticas

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Opinião

para conservar a jacutinga se existem tantos problemas como desemprego, saúde, violên-cia e habitação no nosso país? Por que um cidadão comum deveria se preocupar com a extinção de espécies que ele nunca viu e pro-vavelmente nunca verá? Certamente na época de Fritz Müller as pessoas achavam que tinha tanta jacutinga que mesmo caçando muitas, ela nunca iria acabar. Assim, vamos matando e aniquilando uma, duas, dezenas, centenas de espécies, sem descobrir porque essa ou aquela espécie “servia”.

Para minha sorte, as jacutingas não eram tão raras no Saibadela, onde fiz meu doutora-do na década de 90. Com o tempo, fui desco-brindo que a jacutinga é um mega dispersor de sementes, uma máquina de comer frutos e plantar árvores. Eu e meu colega ornitólo-go Alexandre Aleixo registramos mais de 40 árvores que são plantadas pelas jacutingas, entre elas, várias plantas medicinais como a espinheira-santa (Maytenus ilicifolia), popu-larmente utilizada no tratamento de gastrite, úlcera e azia. Tenho certeza que você já ouviu falar do chá da espinheira santa. Dê graças a jacutinga de termos muita espinheira santa na mata. Se extinguirmos as aves disperso-ras de sementes como a jacutinga, estaremos perdendo não apenas uma ave, mas o que os cientistas chamam de “serviço ambiental”, ou seja, algo que o ser humano utiliza de graça e que advém da natureza.

Recentemente, juntamente com a profes-sora Laurence Culot, do Departamento de Zoologia da Unesp de Rio Claro, e minha aluna de doutorado Carolina Bello, calcula-mos quanto vale o serviço da jacutinga em plantar uma única árvore na Mata Atlântica. Escolhemos uma árvore que captura muito carbono da atmosfera, a canela nós moscada (Cryptocarya mandioccana). Árvores “de lei” ou de madeira dura, são particularmente im-portantes de serem plantadas porque retiram mais carbono da atmosfera. Como o ser hu-mano libera muito carbono na forma de gases CO2 com a queima de combustíveis fósseis na atmosfera, as espécies de árvores que absorvem

bastante carbono podem nos ajudar a reverter mudanças climáticas. Pois bem, nós quanti-ficamos quantas canelas são potencialmente produzidas pelas jacutingas. Como o carbono é uma commodity, ou seja, uma mercadoria que você pode comprar e vender na bolsa de valores, estimar quanto vale uma jacutinga é até simples. Primeiro tivemos que quantificar quantas sementes uma jacutinga come, quan-tas dessas sementes viram plântulas e qual a chance dessas pequenas plântulas virarem uma árvore adulta. Depois medimos a quantidade de canelas na floresta e calculamos quanto de carbono cada árvore estoca.

Para nossa surpresa, descobrimos que so-

mente uma população de algumas dezenas de jacutingas vale 12,50 dólares por hectare (um hectare é um campo de futebol) por seus serviços de plantadora de carbono advindos da canela. Pode parecer pouco não é mesmo? mas somente em um único parque na Mata Atlântica a jacutinga vale mais de 1 milhão de dólares. Isso plantando apenas canelas, sem contar com a espinheira santa do seu chá, ou o plantio de outras árvores que ajudam a esta-bilizar o solo íngreme das Serras. Ainda bem que a jacutinga não está cobrando nada por esse serviço. Nem a jacutinga, nem o mono carvoeiro, nem o tangará, nem o sairá-sete-cores. A natureza não cobra nada. Não cobra o carbono que absorve e que deixa o planeta menos quente, não cobra pela água limpa que tomamos, nem pelos remédios produzidos pa-ra curar nossas doenças. Talvez damos pou-co valor a ela simplesmente por isso. Por isso quando seu tio chato te perguntar para que serve o mosquito, a rã, a cobra, conte para ele sobre a jacutinga. Talvez depois de te ouvir, ele diga aos amigos que tem orgulho de ter um sobrinho biólogo.

Mauro galetti é um Naturalista no antropoceno, <www.maurogaletti.com>.

Texto publicado originalmente no site O Eco: <www.oeco.org.br/colunas/colunistas-convidados/a-jacutinga-e-as-mudancas-climaticas/>.

Na ÉpOca de Fritz müller as pessOas acHavam Que tiNHa taNta JacutiNGa Que mesmO caçaNdO muitas, ela NuNca iria acaBar

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maurO Galetti

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“Podemos construir práticas, instituições e formas de vida nas quais o empoderamento de alguns não implique a falta de poder de outros? Se não, qual é o objetivo da luta feminista?”, pergunta Nancy Fraser. Em busca de construir pontos e contrapontos, nasceu Debates feministas - Um intercâmbio filosófico, em que as norte-americanas Seyla Benhabib, Judith Butler, Drucilla Cornell e Nancy Fraser discutem questões-chave enfrentadas pela teoria feminista e respondem às visões de cada uma, criando um diálogo genuíno sobre o papel da teoria no pensamento feminista atual.

Pensadoras expõem pontos e contrapontos da teoria feminista

“Podemos construir práticas, instituições e formas de vida nas quais o empoderamento de alguns não implique a falta de poder de outros? Se não, qual é o objetivo da luta feminista?”, pergunta Nancy Fraser. Em busca de construir pontos e contrapontos, nasceu feministas - Um intercâmbio filosóficoque as norte-americanas Seyla Benhabib, Judith Butler, Drucilla Cornell e Nancy Fraser discutem questões-chave enfrentadas pela teoria feminista e respondem às visões de cada uma, criando um diálogo genuíno sobre o papel da teoria no pensamento feminista atual.

Debates feministas - Um intercâmbio �losó�coSeyla Benhabib, Judith Butler, Drucilla Cornell e Nancy Fraser | 270 páginas

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Fruto de anos de pesquisa, este livro reúne centenas de fábulas clássicas, oriundas de diversas culturas. Tendo como ponto de partida a tradição e mantendo sempre em vista a recepção contemporânea dessas fábulas – em especial a recepção brasileira, com base no fabulário trabalhado por Monteiro Lobato e Millôr Fernandes –, este livro proporciona profundo e elucidativo mergulho no tema, analisando a fábula como gênero literário e iluminando os pontos de contato entre a tradição clássica e a fabulística brasileira.’

Antologia resgata fábulas de Esopo a Millôr Fernandes

Fruto de anos de pesquisa, este livro reúne centenas de fábulas clássicas, oriundas de diversas culturas. Tendo como ponto de partida a tradição e mantendo sempre em vista a recepção contemporânea dessas fábulas – em especial a recepção brasileira, com base no fabulário trabalhado por Monteiro Lobato e Millôr Fernandes –, este livro proporciona profundo e elucidativo mergulho no tema, analisando a fábula como gênero literário e iluminando os pontos de contato entre a tradição clássica e a fabulística brasileira.’

A tradição da fábula: de Esopo a La FontaineMaria Celeste Consolin Dezotti (Org.) | 246 páginas

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