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Novo Regime Especial de Licitações e Contratos Aplicados às Estatais Brasileiras: Busca
pela Eficiência?
1. Introdução
Diversos setores de atividade econômica, devido a suas características intrínsecas,
necessitam de investimentos vultosos e de longo prazo de maturação, que pode se estender
por décadas, tais como estradas e ferrovias. Dessa forma, embora possam não ser de interesse
da iniciativa privada para a sua exploração econômica, são fundamentais para o
desenvolvimento econômico e social de um país e, por esta razão, o Estado decide arcar com
os custos de sua realização por intermédio das Empresas Estatais.
Conforme informações da Secretaria de Coordenacão e Governança das Empresas
Estatais (SEST,2018), subordinada ao Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e
Gestão (MP), no Brasil a União controla 144 (cento e quarenta e quatro) Estatais. A fim de
demonstrar o vultuoso orçamento das Estatais, ainda de acordo com informações da SEST, no
primeiro trimestre de 2018, o executado do Programa de Dispêndios Globais (PDG) das
empresas estatais federais foi de 23% (R$ 321,2 bilhões), sendo a previsão de orçamento para
este exercício de R$ 1,396 trilhões. O PDG refere-se a um conjunto de informações
econômico-financeiras das empresas estatais que tem por objetivo apresentar o volume de
recursos e de dispêndios anuais, compatibilizando-o com as metas de política econômica
governamental (Necessidade de Financiamento do Setor Público).
De acordo com Venâncio Filho (1968), deve-se salientar que a intervenção no
domínio econômico apenas é admitida de forma supletiva e complementar em relação à
atuação dos particulares, naquilo que a própria iniciativa privada não puder prover
satisfatoriamente. Desta forma as Estatais não podem receber benefícios não estendidos às
entidades privadas, como descreve Hely Lopes Meireles (1982):
O que está explícito na Constituição da República é a vedação da
concorrência do Estado às atividades econômicas reservadas precipuamente
às empresas privadas. Nessa área o Poder Público só poderá atuar em
igualdade de condições com as empresas particulares e quando a produção
de bens ou os serviços destas forem insuficientes para as exigências do
mercado. Fora dessa hipótese e sem o requisito da supletividade não é licito
ao Estado entrar no mercado de obras, serviços ou produtos industriais da
economia privada.
Assim, considerando que as Estatais devem travar concorrência com as empresas
privadas, um dos obstáculos enfrentados pelas entidades controladas pela União é a
formalização e gestão das licitações públicas, regidas pela Lei nº 8.666/93. Os procedimentos
de contratação adotados pela empresa estatal exploradora de atividade econômica devem ser
compatíveis com as características da atividade por ela desenvolvida. Ou seja, a empresa
estatal, para se tornar competitiva, deve implantar soluções de contratação similares às de
qualquer empresa privada que atua no mercado. Assim como qualquer empresa privada, o
regime de contratação da estatal deve permitir contratações vantajosas (de qualidade e com o
menor preço possível) e, ao mesmo tempo, eficientes (ágeis e rápidas).
Conforme Herrmann (1998), após a entrada em vigor da Lei 8.666/93, os valores
pagos e os custos nas compras e serviços da Administração Pública aumentaram entre 10% e
20%, em virtude do excessivo formalismo da Lei, da sua ineficácia em evitar a corrupção e da
ausência de mecanismos efetivos que obriguem os licitantes a honrar os contratos.
A fim de disciplinar aspectos jurídicos das empresas públicas, das sociedades de
economia mista e de suas subsidiárias, foi promulgada a Lei nº 13.303, de 30 de junho de
2016. Nesse cenário, observa-se que trecho substancial da referida Lei, do artigo 27 ao 85,
trata do novo regime de licitações e contratos. Esse diploma Legal prescreve um regime
próprio de licitações e contratos para as estatais, que exclui o regime tradicional de licitações,
direcionado para a Administração Pública em geral, baseado na Lei nº 8.666/1993.
Devido às mudanças na Legislação aplicada às Estatais, traz-se a problemática de
pesquisa de investigar a profundidade e extensão dessas alterações. Desta forma, este artigo
tem por objetivo evidenciar e analisar as principais alterações introduzidas pela Lei nº
13.303/2016 - Estatuto Jurídico das Empresas Estatais, referentes ao regime especial de
licitações e contratos estabelecido em relação às expectativas sociais de eficiência do
gasto público.
A fim de se atingir o objetivo, foi realizada uma revisão da literatura e buscou-se
realizar um ensaio teórico. Para Meneghetti (2011) um ensaio é um meio de análise e
elucubrações em relação ao objeto, independentemente de sua natureza ou característica. A
forma ensaística é a forma como são incubados novos conhecimentos, até mesmo científicos
ou pré-científicos. Assim, surge como tentativa permanente de resolver a questão central da
filosofia moderna: a separação e tensão permanente entre sujeito e objeto na compreensão da
realidade.
2. Referencial Teórico
2.1 Finalidade das Empresas Estatais
Segundo Di Pietro (2013), as empresas estatais compreendem as empresas públicas e
sociedades de economia mista. Tal inferência surge, principalmente dos conceitos de empresa
pública e sociedade de economia mista dados pelo Decreto-Lei 900, de 1969 que conferiu
nova redação ao artigo 5º do Decreto-Lei 200, de 1967.
Conforme prescreve Celso Antônio Bandeira de Mello (2008) a empresa pública
compreende a pessoa jurídica de direito privado, criada por autorização legal e com caráter
instrumental (auxiliar na ação governamental), que pode assumir quaisquer das formas
admitidas em Direito, mas cujo capital é formado exclusivamente por recursos de pessoas de
Direito Público ou administração indireta e com predominância de ações de recursos da esfera
federal. A principal distinção entre a Empresa pública e a Sociedade de Economia Mista se
refere à composição do capital (que nas empresas públicas tem que ser unicamente público e
nas sociedades de economia mista deve ser apenas majoritário) e quanto à organização, que
na empresa pública é livre e nas sociedades de economia mista deve ser a de sociedade
anônima (Lei nº 6.404/1976).
A atuação dessas duas espécies de entidades controladas pelo Estado pode se revestir
de duas formas. De acordo com Grau (2008), a doutrina tradicionalmente compreende que a
Constituição Federal (CF) de 1988,em seu artigo 173, aduz que as Estatais podem exercer
atividades econômicas em sentido estrito, nos casos em que o Estado atua em regime de
competição quando necessário aos imperativos de segurança nacional e de relevante interesse
coletivo, ou ainda naquelas situações em que o Poder Público assume-se como monopolista
em determinado ramo econômico (art. 177). Nesses casos, a atuação do Estado se legitima por
razões de ordem estratégica. Já a segunda forma de atuação econômica consubstancia-se na
execução de serviços públicos cuja prestação é considerada essencial para a garantia da
fruição de direitos fundamentais.
2.2 Prestação de serviços públicos e atuação em atividade econômica pelas Estatais
Conforme suscitado em linhas pretéritas, Barroso (2014) reforça que o texto
constitucional estabeleceu como matriz para o funcionamento das Estatais que o seu regime
seja de igualdade de condições econômicas em relação às empresas privadas. Essa regra de
isonomia foi conferida pelo inc. II, §1º, do art. 173 da CF, o qual afirma a sua sujeição ao
regime jurídico privado, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais,
trabalhistas, tributários, bem como veda o gozo, por parte das Estatais, de privilégios fiscais
não extensivos ao setor privado.
Nesta senda, Mendes (2017) esclarece que nos casos em que a atuação empresarial
volta-se à prestação de serviços públicos, o regime jurídico deverá ser mais próximo ao
direito público, ao passo que, quando a atividade exercida apresenta natureza de atividades
econômicas em sentido estrito, o regime jurídico deverá ser ajustado ao direto privado. Em
ambos os casos prevalece aplicável, em sentido amplo, o princípio da igualdade das condições
econômicas em relação às empresas privadas.
Em verdade, a certo tempo a doutrina aponta a obsolescência da dualidade tradicional
entre empresas estatais prestadoras de serviços públicos e de atividade econômica em sentido
estrito. Nesse sentido, Marcal Justen Filho (2006) já havia alertado que “a nitidez da distincão
foi-se nublando tornando difícil a manutenção da dicotomia na sua configuracão original”.
Trata-se de uma situação usual, uma vez que as empresas estatais prestadoras de serviços
públicos estão autorizadas a desempenhar atividades econômicas conexas, como exploração
de publicidade, inclusive como forma de agir o fim da modicidade tarifária. O exercício
cumulativo de atividade econômicas privadas e serviços públicos, por sua vez, enseja
consideráveis desafios à tarefa de definição de regime jurídico aplicável às estatais
(MENDES,2017).
2.3 Competição das Estatais com entidades privadas: lucros?
Nas sociedades empresariais, cujos meios de produção, seus provedores e
organizadores são privados, os interesses são homogêneos e centrados exclusivamente no
lucro. Assim, pode-se inferir que os conflitos de agência giramem torno de problemas
monotemáticos, a exemplo da apropriação ilegal do lucro pelo controlador ou pelos
administradores, ou postergação daistribuição do lucro em prol de objetivos sociais de médio
e de longo prazo (WARDE JÚNIOR,2017).
Por outro lado, Warde Júnior (2017) afirma que no âmbito das empresas estatais, ora o
Estado atua como empresário (empresas públicas) ora como controlador da sociedade
empresária (sociedade de economia mista). Entre as empresas privadas, um ente privado é
proprietário dos meios de produção e organiza a empresa. Isso significa que o empresário ou o
seu controlador será sempre um particular.
Essa assertiva impõe que se distingam empresa estatal e empresa privada, muito
embora, nos dois casos, a palavra empresa corresponda, em essência aos fatos descritos de
modo indiferenciado pelo art. 966 do Código Civil. A distinção se difere tanto na natureza de
quem organiza e exerce a empresa quanto em sua finalidade precípua, a qual no primeiro caso,
o da empresa estatal, são necessariamente interesses públicos, enquanto que no último o da
empresa privada é o lucro. A questão da lucratividade é essencial. Se todas as empresas têm
fins lucrativos e empresas estatais são empresas, então, a lógica mandaria que elas tivessem
finalidade lucrativa.
Esse não é, contudo, o caso das empresas estatais, pois o elemento programático
central é a consecução de finalidades e de interesses públicos determinados em lei, pela qual a
atuação do Estado nos sistemas econômicos, na condição de empresário ou de controlador,
ainda que possa gerar sobras positivas (em decorrência de trocas econômicas nos mercados),
não tem no lucro uma finalidade precípua. Enquanto nas empresas privadas o lucro é o fim e o
serviço prestado é o meio, no âmbito das empresas estatais prestadoras de serviços públicos, o
lucro é o meio; obtém-se lucro pra prestar o serviço, e o serviço é tão importante que, mesmo
que não haja lucro, ainda assim ele deve ser preservado (ARAGÃO, 2015).
2.4 Eficiência do aparelhamento do Estado
Por meio da promulgação da Emenda Constitucional n.º 19/1998 o conceito de
eficiência tornou-se princípio fundamental da Administração Pública. Desde então, os entes
governamentais e gestores públicos tiveram de adaptar suas práticas de gestão aplicadas às
diversas áreas da atuação governamental. Como atributo de gestão, os significados de
eficiência e eficácia têm sido teorizados sob os mais diversos pontos de vista das ciências
sociais. No âmbito da administração, Chiavenato (2011) atribui ao conceito de eficácia uma
medida do alcance de resultados, enquanto eficiência é uma medida da utilização dos recursos
nesse processo.
Na esfera da economia, Vasconcelos (2015) afirma que eficiência econômica é a
capacidade que um processo possui de produzir a mesma quantidade ao menor custo
econômico; enquanto a eficiência técnica, por sua vez, trata-se do critério utilizado para
escolher, entre processos possíveis de produção, aquele que permite produzir uma mesma
quantidade de produto, utilizando menor quantidade física de fatores de produção. O termo
eficiência não é de uso privativo de nenhuma ciência; trata-se de um signo da língua natural,
apropriado pelo legislador em sua acepção comum ou com sentido técnico próprio.
Vale ressaltar, que o princípio da eficiência tem sido objeto de pesquisa na doutrina
brasileira antes da emenda constitucional nº 19. Hely Lopes Meirellles (1995, p.90) já
denominava entre os poderes e deveres do administrador público o “dever de eficiência”,
conceituando-o como “o mais moderno princípio da funcão administrativa, que já não se
contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o
serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus
membros”. Segundo o mesmo autor, o princípio da eficiência impõe que todo agente público
deve realizar as suas atribuições com presteza, precisão, perfeição e rendimento funcional.
No tocante ao princípio da eficiência e seus reflexos econômicos, Modesto (2014)
esclarece que o Estado hoje manipula uma parte expressiva do produto interno bruto nacional.
Fomenta e tributa, executa e delega serviços, regula a atividade econômica e cultural em
dimensões nunca vistas, controla, reprime e estimula, produzindo e reproduzindo tanto a
riqueza quanto a exclusão social. O princípio da eficiência exige do administrador público
posturas no tratamento com a coisa pública, que não foram suficientemente debatidas
(COELHO,2013).
Nesse contexto, a obrigação de atuação eficiente das empresas estatais, para o
cumprimento de suas finalidades e atendimento às expectativas sociais, deve pautar-se pela
ação idônea (eficaz), econômica (otimizada) e satisfatória (dotada de qualidade) de seus
gestores. Segundo Juarez Freitas (2013) o administrador público está obrigado a agir tendo
como parâmetro o melhor resultado, à luz do princípio da proporcionalidade.
Trata-se de um equívoco pensar que apenas o direito privado e os entes privados
possam assegurar e impor padrões de eficiência nos serviços oferecidos ao cidadão e que a
exigência de atuação eficiente não tenha sentido jurídico. No âmbito do direito público,
modificam-se a natureza dos resultados pretendidos e a forma de execução da atividade, mas
a necessidade de otimização ou obtenção da excelência no desempenho da atividade continua
a ser um valor fundamental da atuação administrativa. O governo não pode ser uma empresa,
mas pode se tornar mais empresarial (CAIDEN, 1991).
Modesto (2014) afirma que pode ser esse o papel do princípio da eficiência: revigorar
o movimento de atualização do direito público, para mantê-lo dominante no Estado
democrático e social, exigindo que este último cumpra efetivamente a tarefa de oferecer
utilidades concretas ao cidadão, conjugando equidade e eficiência.
2.5 Evolução das licitações no Brasil
De acordo com Wood (1980), os sistemas jurídicos contemporâneos mundiais são
geralmente baseados em um dos quatro sistemas básicos: direito civil (ou direito
romano),direito comum,lei estatutária,lei religiosaou combinações destes.No entanto, o
sistema legal de cada país é moldado por sua história única e, portanto, incorpora variações
individuais.
O sistema jurídico brasileiro encontra-se formatado em origens romanas (codelaw). O
princípio da legalidade insculpido nos artigos 5º e 37 da Constituição de 1988, impõe ao
administrador público o dever de atuar somente no que é permitido por lei, de acordo com os
meios e formas legalmente estabelecidos, e segundo os interesses públicos.
Segundo Nunes (2017), Ribeiro (2007) e Meireles (1995), um dos primeiros
dispositivos legais que regulamentou as compras e alienações pela administração pública no
Brasil foi o Decreto nº 2.926 (1862). Desde então, o procedimento licitatório se estruturou na
esfera federal por meio do Decreto nº 4.536 (1922), tendo ocorrida sua sistematização com o
advento da reforma administrativa instituída pelo Decreto-Lei nº 200 (1962). O processo
licitatório ganhou notoriedade através do Decreto-Lei nº 2.300/86 (atualizado em 1987, pelos
Decretos–lei nº 2.348 e 2.360). Assim, pela primeira vez, se instituiu o Estatuto das Licitações
e Contratos Administrativos, reunindo normas gerais e especificas relacionada à matéria
licitação.
Com o advento da Constituição de 1988, no art. 37, inciso XXI a licitação recebeu
status de principio constitucional, de observância obrigatória pela Administração Pública
direta e indireta de todos os entes da Federação: União, Estados, Distrito Federal e Municípios
(MORAIS, 2016).
A promulgação da Lei nº 8.666/1993 constitui um marco na aplicação do processo
licitatório brasileiro. No entanto, as diversas modalidades instituídas pelo estatuto licitatório
(convite, tomada de preços, concorrência, e leilão), sofriam resquícios da administração
burocrática, engessando o rito através dos prazos, analise documental prévia de todos os
partícipes legalmente habilitados e interposição de recursos.Assim, a administração pública,
ancorada no princípio da legalidade, perdia agilidade processual e aumentava seus custos nos
procedimentos licitatórios.
Tal perda de agilidade, burocratização, e ineficiência nos deveres do Estado em
otimizar seus gastos públicos, motivou o legislador a restituir princípios contidos no processo
licitatório medieval denominado “vela pregão” (MAURANO,2004), capturando sua essência
na agilidade processual. Dessa forma, ao aplicar um novo arcabouço legal, fora instituída a
nova modalidade licitatória através da Medida Provisória nº 2.026 (2000), o Pregão, cuja
conversão na lei nº 10.520 ocorreu em 2002.
Convém ressaltar que, com o objetivo precípuo de otimizar a forma como se
processam as licitações públicas, tendo por premissa subjacente o aumento da eficiência dos
gastos públicos, o Congresso Nacional promulgou a Lei nº 12.462 (2011) pelo qual foi
instituído o Regime Diferenciado de Contratações Públicas. (DI PIETRO, 2013)
No entanto, as alterações constitucionais introduzidas pela emenda constitucional nº
19 (1998) explicitaram a necessidade de que as empresas estatais sejam submetidas a um
regime licitatório diferenciado do regime da administração direta e das entidades de direito
público da administração indireta. Há que se conceber, para as estatais, um regime
consentâneo com a sua conformação e, sobretudo, com a sua atuação empresarial. Devem
submeter-se, sim, à licitação, porém sob um regime mais flexível e menos rígido do que o
definido pela Lei no 8.666/93, que se ajusta à administração direta e às pessoas de direito
público da administração indireta, mas não a entidades empresariais do Estado, como no caso
das estatais (SUNDFELD; DE SOUZA, 2007).
Dessa forma, objetivando maior eficiência nas contratações públicas realizadas pelas
empresas estatais e, na tentativa de adequar seu processo de gestão ao modus operandi
empresarial, foi promulgada em 2016 a Lei nº 13.303, a qual institui o estatuto jurídico das
estatais.
Tácito (1994) esclarece que as estatais, regidas pelo regime de direito privado
parcialmente derrogado pelo regime constitucional mínimo, demandam regras próprias que
considerem as suas peculiaridades. Noronha, Frazão e Mesquita (2017) afirmam que licitar tal
qual um órgão da administração direta ou uma autarquia pode acarretar desvantagem
competitiva com as empresas privadas. Dessa forma, o estatuto jurídico das estatais é de
fundamental importância para a atuação de modo mais eficiente, criando regras que aliviam a
carga burocrática pública e as aproximam de empresas privadas atuantes no mercado.
3. Metodologia
Maren (1995) citado por Oliveira (2011) apresenta que a metodologia trata de estudos
e pesquisas através da utilização de métodos, técnicas e discursos, sendo um conjunto de
operações sistematizadas e racionalmente encadeadas para operacionalização da pesquisa que
se pretende realizar, desde a fase inicial em que se escolhe o tema de pesquisa, até a fase final
com a análise dos dados coletados e as considerações finais, com possíveis recomendações.
Os procedimentos utilizados no presente ensaio consistiram em identificar, com base
na revisão da literatura e nos normativos vigentes específicos, subsidiado na técnica de análise
de conteúdo de Bardin (1977), todos os dispositivos constantes da Lei das Estatais (lei nº
13.303/16), especificamente relativos aos procedimentos pertinentes ao regime de compras
(arts. 28 a 84), confrontando-os ao estatuto jurídico licitatório até então vigente
consubstanciado na lei nº 8.666/93 e demais dispositivos legais e infra-legais aplicáveis às
licitações e contratos, notadamente a lei nº 10.520/02 que instituiu o pregão e a lei nº
12.462/11 que institui o Regime Diferenciado de Contratações públicas - RDC.
4. O Estatuto Jurídico das Estatais. Principais inovações rumo à eficiência do Estado
A Lei nº 13.303/2016, que instituiu o estatuto jurídico das estatais, também
denominada “Lei da Responsabilidade das Estatais - LRE”, ou simplesmente “Lei das
Estatais”, disciplina a exploração direta de atividade econômica pelo Estado por intermédio
de suas empresas públicas e sociedades de economia mista, conforme previsto no art. 173 da
Constituição Federal.
Em especial, a Lei das Estatais confere uma identidade ao regime jurídico das
empresas públicas e das sociedades de economia mista, mesclando institutos de direito
privado e de direito público. Ela estabelece uma série de mecanismos de transparência e
governança a serem observados pelas estatais, como regras para divulgação deinformações,
práticas de gestão de risco, códigos de conduta, formas defiscalização pelo Estado e pela
sociedade, constituição e funcionamento dos conselhos, assim como requisitos mínimos para
nomeação de dirigentes.
Outro ponto de destaque da Lei são as normas de licitações e contratos específicas
para empresas públicas e sociedades de economia mista, o qual será o foco central do presente
ensaio. Uma vez que a Lei das Estatais passou a disciplinar a realização de licitações e
contratos no âmbito das referidas empresas, de forma independente da natureza da atividade
desempenhada (exploradora de atividade econômica ou prestadora de serviços), a Lei
8.666/1993 deixou de ser aplicada a essas entidades.
No entanto, conforme disciplinado na Lei 10.520/2002, a modalidade do pregão, será
adotada preferencialmente, nas empresas públicas e sociedades de economia mista, para
aquisição de bens e serviços comuns. Dessa forma, ainda que as estatais não se utilizem mais
das modalidades de licitação de convite, tomada de preços, concorrência e leilão previstas na
Lei 8.666/93, elas devem se valer do instituto do pregão para a aquisição de bens e serviços
comuns, assim especificados em lei.
Assim, com base no teor dos dispositivos legais em vigor, bem como nos estudos de
Noronha, Frazão e Mesquita (2017); Antunes (2017);e, Marques Neto e Palma (2017),
apresentam-se a seguir os quadros 1 a 5 contendo, de forma temática,os principais aspectos
inovadores da lei nº 13.303/2016 em seus artigos 28 a 84consolidados em relação ao disposto
nas leis nº 8.666/93 e nº 12.462/11:
Quadro 1 : Abrangência, Dispensa de Licitação e Contratação Direta.
Aspecto de
análise
Dispositivo
legal
Inovação
Abrangência
das licitações
Art.28 Inclui, além dos sete tipos de contratos previstos pela Lei nº 8.666/93
(obras, serviços, compras, alienações, locações, concessões e
permissões) o ônus real sobre bens.
Abrangência
das licitações
§ 1º, art. 28 Aplica às licitações das empresas públicas as disposições constantes
dos arts. 42 a 49 da Lei Complementar nº 123/2006. Trata-se de
tratamento simplificado e diferenciado para as micro e pequenas
empresas (MPE).
Abrangência
das licitações
§ 2º, art. 28 Aplica-se aos convênios e contratos de patrocínio celebrados com
pessoas físicas ou jurídicas.
Abrangência
das licitações
§3º,inc. I, art. 28 Não se aplica licitação para a realização de obras ou negociação de
produtos e serviços relacionados com o objeto social das estatais.
Abrangência
das licitações
§3º,inc. II, art. 28 Não se aplica licitação para escolher parceiro singular vinculado a
oportunidade de negócio específica.
Abrangência
das licitações
§4º, art. 28 Define “oportunidade de negócio” para fins de dispensa de licitacão.
Inova ao incluir a extinção de parcerias ou equivalentes, e ao incluir a
aquisição e alienação de participações societárias ou equivalentes.
Dispensa de
licitação
Incs. I e II, art. 29 Aumento dos valores de dispensa para obras e demais contratos para
R$100 mil e R$ 50 mil, respectivamente. Os valores podem ser
aumentados a critério do Conselho de Administração de cada estatal
para refletir a variação de seus próprios custos.
Dispensa de
licitação
Inc. IV, art. 29 Permite que a contratação direta não fique limitada pelo valor máximo
constante do registro de preços.
Dispensa de
licitação
Inc. X, art. 29 Estende a contratação direta para todos os serviços públicos e não
somente energia elétrica e gás natural..
Dispensa de
licitação
Inc. XI, art. 29 Restringe que a contratação entre a estatal e sua subsidiária tenha
relação com o objeto social da contratada, para evitar abuso de poder.
Dispensa de
licitação
Inc. XII, art. 29 Não exige que o poder público reconheça formalmente o catador de
recicláveis como tal.
Dispensa de
licitação
Inc. XV, art. 29 Exclui o vínculo da hipótese de calamidade pública nas situações
emergenciais.
Dispensa de Inc. XVI, art. 29 Permite que a contratação direta na transferência de bens a órgãos e
licitação entidades da administração pública, e não só permuta de móveis ou
venda de materiais equipamentos.
Dispensa de
licitação
Inc. XVIII, art. 29 Amplia para a compra e venda de qualquer título de crédito e dívida, e
não somente para a compra de ações.
Dispensa de
licitação
§ 3º, art. 29 Inova ao permitir que os valores para dispensa de licitação fossem
periodicamente atualizados pela inflação, mediante critério aprovado
pelo Conselho de Administração e divulgado no regimento interno
sobre licitações e contratos de cada empresa.
Contratação
direta
Inc. I, art. 30
Simplifica o art. 25, inc. I, da Lei 8.666/93 ao excluir regramento rígido
para atestar a exclusividade de fornecedor, e autoriza a preferência de
marca.
Fonte: elaboração própria dos autores.
Conforme depreende-se da leitura do Quadro 1 a Lei nº 13.303/16 inova ao exigir
licitacão para ônus real sobre bens. O termo “ônus real” não consta em nenhum momento na
Lei nº 8.666/93 ou na Lei nº 12.462/11. Vale ressaltar que o art. 2º da Lei nº 8.666/93 prevê
sete possibilidades de termos de contratos com termos simples, são eles : compras, serviços,
obras, alienações, locações, concessões e permissões.
Outra inovação refere-se as hipóteses de dispensa de licitação e contratação direta.
Destaca-se o mandamus constitucional preconizado no art. 173 para que as regras relativas a
licitações e contratos aplicáveis às estatais tivessem especificidades distintas do regime geral
de licitações previsto pela Lei nº 8.666/93. Tal medida se fez necessária para que o novo
estatuto abrangesse as particularidades que envolvem as atividades de uma pessoa jurídica de
direito privado, em especial quando atuante no mercado.
Fortini e Vieira (2016) esclarecem que a natureza econômica da atividade das
empresas estatais“impunha tratamento ímpar de forma a amalgamar a necessidade de
observância dos princípios vetores da administração pública à flexibilidade procedimental que
o ambiente de negócios reclamaria”.
Quadro 2 : Objetivos, Diretrizes, Edital, Sigilo, Divulgação e Pré-Qualificação.
Aspecto de
análise
Dispositivo
legal
Inovação
Objetivo da
licitação
Art. 31 Exclui os princípios da isonomia e legalidade, os quais devem
continuar sendo observados por força do art. 173,§ 1º, inc. III, da
Constituição Federal/88.
Objetivo da
licitação
§ 1º, inc. I, art. 31 Define sobrepreço. Apesar do Acórdão nº 310/2006, TCU-Plenário
assinalar que a diferença entre superfaturamento e sobrepreço se dá
pelo momento em que a irregularidade é constatada
Objetivo da
licitação
§ 1º, inc. II, art.
31
Define superfaturamento. Apesar do Acórdão nº 310/2006, TCU-
Plenário assinalar que a diferença entre superfaturamento e sobrepreço
se dá pelo momento em que a irregularidade é constatada.
Objetivo da
licitação
§ 4, art. 31.º Dispõe sobre Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI). O
PMI é uma etapa intermediária para realizar empreendimentos cuja
operacionalização depende da elaboração prévia de levantamentos,
investigações, projetos ou estudos técnicos.
Diretrizes para
licitações e
contratos
Inc. V, art. 32 Define procedimento de governança que exige a elaboração, divulgação
e fiscalização pela empresa de sua política de transações com as partes
relacionadas, no intuito de evitar a ocorrência de operações duvidosas
entre instituições sob controle do mesmo ente público.
Diretrizes para
licitações e
contratos
§ 2º, art. 32 Exige que as contratações com impacto negativo sobre patrimônios
tombados sejam (previamente) aprovadas pelo órgão de proteção do
respectivo patrimônio.
Diretrizes para
licitações e
contratos
§ 3º, art. 32 Obriga que o pregão eletrônico seja feito em portal público na internet.
Diretrizes para
licitações e
contratos
§ 4º, art. 32 Obriga a empresa a disponibilizar lance eletrônico em todas as
licitações com etapas de lances. Agiliza o procedimento e fortalece o
controle.
Edital da
licitação
Art. 33 Exclui as exigências dos arts. 38 e 40 da Lei 8.666/93 Se limita a
manter a descrição sucinta do objeto e remeter todo o restante para o
regulamento interno de cada empresa, o qual deve ser publicado.
Valor estimado
sigiloso
Art. 34 Define que o valor estimado será mantido em sigilo, salvo se a empresa
desejar divulgá-lo.
Divulgação dos
atos e
procedimentos
licitatórios
Art. 35 Autoriza livre acesso ao processo licitatório para quem solicitar, exceto,
temporariamente para proposta fechada até sua abertura e,
permanentemente para o valor estimado sigiloso.
Fonte: elaboração própria dos autores.
O caput do art. 31 da Lei nº 13.303/16, ao dispor sobre as disposições gerais sobre
licitações e contratos estabelece os princípios a serem observados e os objetivos gerais aos
quais as empresas estatais devem perseguir em seus processos seletivos e contratações. Dessa
forma, determina a observância aos princípios da moralidade, da igualdade, da
impessoalidade, da publicidade, da eficiência, da probidade administrativa, da economicidade,
da vinculação ao instrumento convocatório, do desenvolvimento nacional sustentável, da
obtenção de competitividade e do julgamento objetivo.
Marçal Justen Filho (2016) assevera que, no tocante à seleção da proposta mais
vantajosa pelas estatais, a Administração tem o dever de realizar a prestação menos onerosa e
o particular se obriga a realizar a melhor e mais competente prestação, em uma relação de
custo-benefício.
Ressalta-se que os objetivos, diretrizes e simplificação dos requisitos de pré-
qualificação estabelecidos no quadro 2 estão voltados para o cumprimento do dever de
eficiência pelas estatais. Segundo Sundfeld (2008), o princípio da eficiência é central, para o
reconhecimento da transição do modelo estatal burocrático (direito administrativo dos clips)
para o modelo estatal gerencial (direito administrativo dos negócios).
No tocante ao sobrepreço e superfaturamento, a LRE estabelece a utilização de
referências oficiais na definição de orçamento. No entanto, o Tribunal de Contas da União em
seus acórdãos (895/2015 – Plenário; 1.392/2016-Plenário; e, 1.923/2016 – Plenário) esclarece
que o registro de preços por órgãos e entidades da administração pública não podem ser os
únicos parâmetros para se auferir sobrepreço ou superfaturamento. Devem ser utilizados,
ainda, referenciais de preço de mercado, de modo que o preço seja definido consoante a
metodologia executiva mais econômica e tecnicamente viável.
A regra do orçamento sigiloso estipulado pela LRE, seguindo a tendência do Regime
Diferenciado de Contratações (RDC), tem como finalidade o combate à formação de cartéis
de acordo com as recomendações da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico - OCDE em suas diretrizes para o combate a conluios em contratações públicas. A
referida diretriz, aprovada pelo Conselho em 17/02/2012, estabelece que não seja publicado o
“preco de reserva (estimativa de precos), mas deixe a informacão confidencial depositada
com outra autoridade pública”.
Outra importante inovação que será referenciada no quadro 4 refere-se à possibilidade
do autor do projeto básico participar da licitação para a execução do empreendimento,
podendo ser ressarcido pelos custos aprovados pela estatal caso não vença o certame. Nessa
hipótese, o vencedor do PMI (procedimento de manifestação de interesse) deverá promover a
cessão dos direitos prevista no art. 80, que passarão a ser propriedade da empresa pública que
os tenha contratado.
Quadro 3: Cadastro de inidôneos, Impedimentos, Prazos e Regulamento de Licitações.
Aspecto de
análise
Dispositivo
legal
Inovação
Cadastro de
inidôneos
§ 1º, art. 37 Amplia a sanção administrativa aos contratados, pois qualquer sanção,
inclusive advertência, gera registro automático no Cadastro de
Empresas Inidôneas e Suspensas – CEIS.
Cadastro de
inidôneos
§ 2º, art. 37 Explicita regras para a baixa no registro automático no Cadastro de
Empresas Inidôneas e Suspensas – CEIS.
Impedimentos
para participar
de licitação
Art. 38 Exclui como impedimentos para participar de licitação os previstos
pelo art. 9º da lei 8.666/93 e art. 36 da lei 12.462/11, e cria outros.
Impedimentos
para participar
de licitação
Inc. VIII, art. 38 Inova ao definir que se o diretor de empresa inidônea assume a
diretoria de outra empresa, essa outra empresa não pode licitar com a
administração. Impropriedade técnica uma vez que o art. 5º, inc. XLVII
da Constituição federal veda pena perpétua.
Prazos mínimos Art. 39 Dispõe sobre requisito novo de transparência.
Conteúdo
mínimo de
regulamento de
licitações
Art. 40 Estabelece requisito novo de transparência. O novo regramento permite
a atualização e adaptação pelas empresas, considerando a dinâmica e a
especificidade de suas atuações.
Fonte: elaboração própria dos autores.
A LRE incorporou no seu arcabouço jurídico dispositivos de sanções e impedimentos
previstos na Lei nº 12.846/2013, também denominada de Lei Anticorrupção. A referida Lei
Anticorrupção prevê em seu art. 23 que os órgãos e entidades dos três Poderes da União
deverão informar e manterem atualizados, para fins de publicidade, no Cadastro de Empresas
Inidôneas e Suspensas – CEIS, de caráter público, todos os dados relativos as sanções por eles
aplicadas.
Além do regime sancionatório, a LRE define um rol de impedimentos para
participação de licitações e contratações pelas estatais, por força dos princípios
constitucionais da moralidade e impessoalidade.
Impende frisar que doravante as empresas públicas e sociedades de economia mista
deverão publicar e divulgar regulamento interno de licitações e contratos, disciplinando regras
e regulamentos próprios com vistas à garantia de autonomia gerencial.
Quadro 4: Obras e Serviços de Engenharia, Impedimentos Adicionais, Regimes de
Contratação e “Ônus Real”.
Aspecto de
análise
Dispositivo
legal
Inovação
Normas
específicas para
obras e serviços
Inc. V, art. 42 Prevê tipo de contratação semi-integrada, não prevista na Lei nº
8.666/93.
Normas
específicas para
obras e serviços
Inc. VII, art. 42 Exige documentos obrigatórios do anteprojeto de engenharia, não
previstos na Lei nº 8.666/93 e 12.462/11.
Normas
específicas para
obras e serviços
Inc. VIII, art. 42 Exclui o orçamento detalhado no projeto básico, o qual poderá ser
apresentado apenas no projeto executivo.
Normas
específicas para
obras e serviços
Inc. X, art. 42 Exige novo requisito de controle (matriz de riscos). Mecanismo
importante para aprimorar o planejamento empresarial.
Normas
específicas para
Inc. VII, art. 42 Exige documentos obrigatórios do anteprojeto de engenharia, não
obras e serviços previstos na Lei nº 8.666/93 e 12.462/11.
Normas
específicas para
obras e serviços
§ 1º, Inc. I, alínea
b, art. 42
Dispensa projeto básico para o instrumento convocatório de
contratação por tarefa, exigido pelo art. 8º, § 5º, lei 12.462/11.
Normas
específicas para
obras e serviços
§ 1º, Inc. IV, art.
42
Permite a alteração de projeto básico em contratação semi-integrada.
Normas
específicas para
obras e serviços
§ 2º, Inc. IV, art.
42
Estabelece diretrizes para a contratação integrada.
Normas
específicas para
obras e serviços
§ 3º, Inc. IV, art.
42
Define responsabilidade pelo risco associado à escolha da solução de
projeto básico..
Regimes de
contratação
Art. 43 Cria a modalidade semi-integrada e ao exigir justificativa para não a
usar.
Regimes de
contratação
Inc. V, art. 43 Define que a “semi-integrada” envolve quantidade mensurável de
serviços a serem executados e objeto executável com diferentes
métodos.
Impedimentos
adicionais para
licitação de
obras e serviços
de engenharia
Art. 44 Cria vedação para o autor do anteprojeto; ao excluir o impedimento
para o autor do projeto executivo; e, ao excluir o impedimento para
funcionário da empresa.
Impedimentos
adicionais para
licitação de
obras e serviços
de engenharia
§ 1º, art. 44 Estabelece encargo do projeto executivo para o contratado.
Impedimentos
adicionais para
licitação de
obras e serviços
de engenharia
§ 3º, art. 44 Exclui impedimento para o autor do projeto executivo.
Marca,
amostragem e
certificação
Art. 47 Permite a exigência de padrão ABNT ou Sinmetro como pré-requisito
em qualquer tipo de licitação.
Divulgação da
relação de
aquisições
Art. 48 Estabelece novo requisito de transparência.
Avaliação e
licitação para
atribuir ônus
real
Art. 50 Estabelece ônus real. A atribuição de ônus real ocorre quando a
empresa grava determinado bem como garantia de uma operação.
Fonte: elaboração própria dos autores.
Outra inovação introduzida pela LRE refere-se à criação da contratação semi-
integrada, instituto não previsto nos normativos legais até então vigentes, que se diferencia da
contratação integrada pela ausência da necessidade de projeto básico. Dessa forma, são
estabelecidos requisitos mínimos e formalidades a serem observadas nesse tipo de contratação.
Com o objetivo de auxiliar o gestor público em aprimorar o planejamento empresarial,
a LRE introduziu conceitos sobre gestão de riscos em licitações. Assim, foram criadas
obrigatoriedades relativas a elaboração de matriz de riscos com requisitos de controle e
transparência.
Doravante, com a edição da Lei nº 13.303/16, permitiu-se às estatais a exigência de
padrão ABNT ou Sinmetro como pré-requisito em qualquer tipo de licitação de obras ou
serviços de engenharia, podendo ser ampliado para qualquer comprovação de qualidade
anteriormente estabelecida em fase de pré-qualificação aberta de produtos de acordo com
autorização concedida pelo §6º, art. 64.
Quadro 5: Fases, Julgamento, Recursos, Formalização de Contratos, Duração,
Subcontratação, Direitos Autorais e Alterações.
Aspecto de
análise
Dispositivo
legal
Inovação
Fases da
licitação
Art. 51 Identifica dois procedimentos como fases: a verificação de efetividade
ou desclassificação; e, a negociação com o vencedor. Subdivide o
encerramento em duas fases: adjudicação e homologação; e, revogação.
Critérios de
julgamento
Art. 54 Introduz “melhor destinacão” como critério de julgamento.
Negociação § 1º, Art. 57 Transforma a negociação de facultativa para obrigatória.
Habilitação Art. 58 Simplifica a seção II da lei 8.666/93.
Recursos Art. 59 Simplifica o art. 27 da lei 12.462/11.
Homologação Art. 60 Estabelece direito do vencedor firmar o contrato da licitação
homologada.
Revogação Art. 62 Promove quatro alterações do art. 49 da lei 8.666/93: exclusão de
referência a ato fundamentado para revogação por fato superveniente;
exigência de óbice manifesto e incontornável para revogação; vedação
a anulação por ilegalidade quando os defeitos forem sanáveis; e,
permissão para dois casos de revogação compulsória (preços acima do
orçado e não assinatura em prazo estabelecido).
Pré-
qualificação
permanente
Art. 64 Concede permissão genérica para exigir qualquer tipo de comprovante
de qualidade na pré-qualificação aberta de produtos.
Formalização
dos contratos
Arts. 68 e 69 Simplifica o art. 61 da lei 8.666/93 e ao excluir a exigência de
indicação orçamentária prévia para empresa estatal não dependente.
Formalização
dos contratos
Inc. X, art. 69 Exige a obrigatoriedade de a matriz de riscos ser cláusula contratual.
Duração dos
contratos
Art. 71 Permite a duração máxima dos contratos em até dez anos.
Alteração dos
contratos
Art 72 Veda a alteração unilateral do contrato.
Formalização
dos contratos
Art. 73 Simplifica a documentação para despesas de pronta entrega e que não
resultem em obrigações futuras.
Subcontratação § 1º, Art. 78 Exige que a subcontratada cumpra a qualificação técnica exigida do
licitante.
Subcontratação § 2º, Art. 78 Veda a subcontratação de quem participou da licitação, do projeto
básico ou do projeto executivo.
Direitos de
produto técnico
desenvolvido
pelo contratado
Art. 80 Define a assunção pela empresa estatal dos direitos relativos a projetos
ou serviços técnicos desenvolvidos pelo contratado.
Prazo de
aplicação.
Art. 91 Define vacatio legis de 24 meses para que as empresas possam
promover as adaptações necessárias à adequação do disposto na lei nº
13.303/2016.
Fonte: elaboração própria dos autores.
O estatuto licitatório das estatais prevê as seguintes fases como rito procedimental :
preparação; divulgação; apresentação de lances/propostas; julgamento; efetividade dos
lances/propostas; negociação; habilitação; recursos; adjudicação; e homologação ou
revogação do certame. Marques Neto e Palma (2017) esclarecem que tal qual a modalidade de
pregão, o art. 51 da LRE estabeleceu o julgamento antes da habilitação como requisito à
eficiência e celeridade processual.
Ademais, no tocante a fase de verificação da efetividade dos lances ou propostas, a
LRE faculta que seja feita apenas com relação aos melhores classificados, cabendo à
autoridade competente definir a métrica que separa as licitantes nas melhores posições. A lei
permitiu, ainda, às estatais o poder de realizarem diligências para aferir a exequibilidade das
propostas, bem como exigir que as licitantes demonstrem se seus lances ou propostas são
exequíveis.
Relativamente a fase de negociação, a LRE não a especifica ou a limita. A negociação
pode se constituir em um efetivo compromisso entre licitante e estatal. Trata-se, portanto, de
um acordo integrativo ou uma negociação com vistas à formalização de um contrato
condicionado (PALMA, 2015), em decorrência da busca das condições mais efetivas
previstas pela Lei nº 13.303/16.
Verifica-se, ainda, que as inovações constantes do quadro 5 relativamente à
formalização, duração, alteração e subcontratação são autoaplicáveis e objetivam
precipuamente, otimizar as contratações. A LRE prevê procedimentos auxiliares às licitações
os quais possibilitam in tottum a identificação prévia de fornecedores e bens, a padronização
do objeto a ser adquirido, entre outros, por meio da pré-qualificação permanente, do
cadastramento, do catalogo eletrônico de padronização e do sistema de registro de preços.
Consoante o Art. 91 da LRE as empresas públicas e as sociedades de economia mista
constituídas anteriormente, terão o prazo de dois anos, ou 24 meses, para promoverem as
adaptacões necessárias a adequacão (vacatio legis). Sancionada em 30 de junho de 2016, as
empresas estatais poderão ser objeto de fiscalização pelos órgãos de controle quanto à
aderência ao citado diploma legal a partir de 01 de julho de 2018.
Em reportagem divulgada pelo jornal Estado de São Paulo1, 84 das 147 empresas da
União não haviam ajustado, até fevereiro de 2018, seus estatutos para atender a legislação.
Em nova publicação datada de 02 de julho de 20182, o mesmo periódico afirmou que
“o prazo de adaptação das empresas públicas à nova Lei das Estatais venceu em 1º de julho,
mas mesmo as estatais com elevado grau de governança corporativa ainda não estão 100%
adequadas, segundo estudo da FGV”.
No entanto, empresas estatais de grande porte como a Petrobrás 3 e a
Eletrobrás4sinalizaram em seus portais eletrônicos cronograma de implantação dos novos
procedimentos e rotinas no que tange a licitações e contratos.
Marques Neto e Palma (2017) asseveram que a Lei nº 13.303/2016 se configurou na
mais nova lei geral de licitações e contratos administrativos para as empresas estatais,
contendo regras mais adequadas à realidade empresarial na qual estão inseridas. Ainda que
muitas das inovações jurídicas já se encontrassem em fase de experimentação decorrentes do
avanço do Regime Diferenciado de Contratos (RDC), o esforço de implementação será
imenso.
5. Conclusão
O presente ensaio objetivou apresentar as inovações trazidas pela Lei de
Responsabilidade das Empresas Estatais – LRE a qual se configurou no mais recente estatuto
1Disponível em https://economia.estadao.com.br/noticias/governanca,mais-da-metade-das-empresas-federais-ainda-nao-cumpre-a-lei-das-
estatais,70002166035 2 Disponível em https://economia.estadao.com.br/noticias/governanca,estatais-ainda-descumprem-nova-lei,70002377522
3 Disponível em https://contratacao.petrobras.com.br
4 Disponível em http://eletrobras.com/pt/GestaoeGorvernancaCorporativa/Estatutos_politicas_manuais/ Regulamento_de_Licitacoes_e_Contratos.pdf
jurídico para licitações e contratos a ser observado pelas empresas públicas e sociedades de
economia mista. O referido estatuto, em síntese, contém regras mais adequadas à realidade
empresarial na qual as estatais encontram-se inseridas em termos de competitividade e gestão.
Trata-se, notadamente, de avanços em relação ao dever de licitar nos termos da
disfuncional lei nº 8.666/93. Além de abarcar alterações importantes já postas em prática por
ocasião do Regime Diferenciado de Contratações, as empresas públicas e sociedades de
economia mista, conforme evidenciado nos supramencionados quadros comparativos,
doravante possuem importantes ferramentas de gestão mais flexíveis que possibilitarão maior
agilidade e celeridade em seus procedimentos licitatórios, além de expressiva redução de
custos.
Ao redefinir aspectos de governança corporativa a lei pormenorizou regras de
fiscalização e controle. No âmbito das licitações e contratos, objeto do presente ensaio, a LRE
inova ao dispensar as estatais da obrigatoriedade de licitação em caso de comercialização,
prestação ou execução, de forma direta, de produtos, serviços ou obras especificamente
relacionadas com suas atividades finalísticas estabelecidas em seus objetos sociais. De forma
peculiar, também foi estabelecida a hipótese de dispensa de licitação quando a escolha do
parceiro esteja associada a suas características particulares, vinculadas a oportunidades de
negócio claramente definidas e específicas, devendo-se justificar a inviabilidade de
procedimento licitatório.
Outro ponto de destaque, refere-se ao aumento de valores limites para contratação
direta; a descrição das hipóteses de uso do orçamento sigiloso; e a incorporação de
mecanismos de gestão de riscos nas contratações.
Espera-se com tais mudanças, alavancar a capacidade de competição das empresas
estatais,promovendo a redução de custos e trazendo-as para mais perto do mercado
competitivo, com a eficiência e transparência esperada pela sociedade.
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