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N o 155 Agosto de 2016 - www.pagina13.org.br

o 155 Agosto de 2016 -  · para retomar a ofensiva em favor dos nossos objetivos imediatos e históricos. EXPEDIENTE Página 13 é um jornal publicado sob responsabilidade da direção

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No 155 Agosto de 2016 - www.pagina13.org.br

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Agosto é conhecido, na his-tória do Brasil, por ser mês

trágico. Pois bem: está marcado para o final do mês de agosto de 2016, antes ou até os dias 29 de agosto e 2 de setembro, a votação final do processo de impeach-ment contra a presidenta Dilma Rousseff.

Nossa opinião sobre isto está contida na entrevista de Jan-dyra Uehara e na resolução da direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda. Dito em perspectiva: qualquer que seja o desenlace da votação no Senado, a luta de classes no Brasil terá entrado em uma nova dinâmica.

Frente a isto, a esquerda brasileira terá que “reprogramar” a si mesma. Espe-cialmente o Partido dos Trabalhadores, que corre iminente risco de vida. Risco que não é causado principalmente pela ofensiva da direita, nem tampouco pelos concorrentes de esquerda. O que principalmente ameaça a sobrevivência do PT são os erros cometi-dos pelo petismo ou por setores dele.

Para os que são de esquerda, mas não são (ou nunca foram) petistas, o problema se coloca de uma forma. Para nós de Página 13 e da tendência Articulação de Esquerda, que somos e queremos continuar sendo pe-tistas, a questão coloca-se de outra forma.

Óbvio que nenhum partido é eterno, seguro que há diversas formas de contribuir para a luta pelo socialismo, verdade que a degeneração avançou muito e que há seg-mentos do petismo que são irrecuperáveis. Por tudo isto não é despropositado falar que um ciclo acabou ou pode estar acabando.

Entretanto, mesmo que fosse corre-ta a tese do fim do ciclo, mesmo supondo

que estivéssemos de acordo acerca de qual ciclo é este, ainda assim a maneira como cada militante e cada corrente de opinião se comporta frente a isto tem uma importância político-pedagógica imensa.

Pois caso tenha êxito a operação que o capital, a direita e o oligopólio da mídia fazem para destruir e interditar o PT e im-portantes lideranças da esquerda, operação que está bastante avançada, isto provocará danos profundos para a classe trabalhadora. Por isto, não aceitamos aqueles que falam de “fim de ciclo” como se estivessem falan-do da passagem das estações, frente a qual adotamos uma postura de fatalismo expec-tante (com o outono e inverno) ou de ingê-nuo otimismo (pois depois virão primavera e verão).

Até porque dar como “concluído o ciclo” pode pacificar consciências indivi-duais, mas está longe de resolver os proble-mas reais postos para a classe trabalhadora brasileira e latino-americana, entre os quais definir com qual política vamos, simultane-amente, resistir à contraofensiva reacionária & criar as condições para retomar a ofensiva em favor de mudanças democráticas, popu-

lares e socialistas.Deste ponto de vista, do

ponto de vista dos interesses his-tóricos da classe trabalhadora, Página 13 segue acreditando que a melhor posição é aquela que busca criar as condições para, ao mesmo tempo, preservar o conquistado e voltar a acumular forças. Isto significa, entre outras coisas, preservar o PT e ao mes-mo tempo mudar sua estratégia, seu funcionamento, sua relação com a classe trabalhadora e com os mandatos que encabeça.

Aliás, dizendo de forma mais direta: se quisermos preservar o PT, é preciso mudar o PT. E mudar o PT é, em primeiro lugar, mudar a estratégia do Par-tido, abandonando a linha política de con-ciliação. Do contrário, caso não se altere esta linha política, preservar o conquistado resultará em desacumular forças.

Nada garante que tenhamos êxito. Ali-ás, um mínimo de pessimismo da razão indi-ca que nossas chances são mesmo muito re-duzidas. Mas, com o perdão daquele político conservador inglês, nossa alternativa é a pior possível, com exceção de todas as outras.

Até porque o mínimo que devemos à classe trabalhadora, às gerações que nos antecederam e principalmente às que virão, é lutar para vencer e, portanto, não aceitar derrota sem luta. Não apenas no terreno da política, mas também no terreno da teoria. Portanto, é para a luta que convocamos a todos e a todas: luta em defesa dos direitos e contra o golpismo, luta para eleger as can-didaturas de esquerda em 2016, luta para re-programar o Partido dos Trabalhadores, luta para retomar a ofensiva em favor dos nossos objetivos imediatos e históricos.

EXPEDIENTEPágina 13 é um jornal publicado sob responsabilidade da direção nacional da Articulação de Esquerda, tendência interna do Partido dos Trabalhadores.Circulação interna ao PT. Matérias assinadas não refletem, necessariamente, a posição da tendência.ISSN 2448-0150-155Direção Nacional da AE: Adriano Oliveira/RS, Adriele Manjabosco/RS, Adriana Miranda/DF, Ananda Carvalho/RS, André Vieira/PR, Bárbara Hora/ES, Bruno Elias/DF, Damarci Olivi/MS, Daniela Matos/DF, Eduardo Loureiro/GO, Eleandra Raquel Koch/RS, Eliane Bandeira/RN, Elisa Guaraná/DF, Emílio Font/ES, Fernando Feijão/PI, Giovane Zuanazzi/RS, Gleice Barbosa/MS, Iole Ilíada/SP, Izabel Cristina da Costa/RJ, Ivonete Almeida/SE, Jandyra Uehara Alves/SP, Joel de Almeida/SE, José Gil-derlei/RN, Karen Lose/RS, Leirson Silva/PA, Lício Lobo/SP, Múcio Magalhães/PE, Olavo Brandão/RJ, Patrick Araújo/PE, Rafael Tomyama/CE, Rodrigo Cesar/SP, Rosa-na Ramos/DF, Silvia Vasques/RS, Sônia Fardin/SP, Valteci de Castro/MS, Valter Pomar/SP. Comissão de ética nacional: Ana Affonso/RS, Iriny Lopes/ES, Jonatas Moreth/DF, Júlio Quadros/RSEdição: Valter Pomar e Emilio C. M. Font Secretaria Gráfica e Assinaturas: Edma Walker [email protected] Endereço para correspondência: R. Silveira Martins, 147 conj. 11 - Centro - São Paulo - SP - CEP 01019-000 Acesse: www.pagina13.org.br

Nem farsa, nem tragédia. Luta!Foto Paulo Pinto

EDITORIAL

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Fala JandyraPágina 13. Como você

avalia o governo Temer do ponto de vista dos direitos so-ciais, políticos e econômicos da classe trabalhadora?

Jandyra Uehara. Em ape-nas três meses, o governo gol-pista já mostrou claramente a que veio, a quem serve e o que pretende fazer para atender aos interesses do grande capital e dos demais patrocinadores da ofensiva neoliberal.

Trata-se do retrocesso dos direitos conquistados há pelo menos 80 anos, desde a CLT, passando pelas principais con-quistas da Constituição de 1988, os avanços dos dois governos Lula e do pri-meiro governo de Dilma. É sem dúvida a maior ofensiva contra a classe trabalhadora jamais vista neste país. De Getúlio a Lula e Dilma, tudo o que significa um mínimo de garantia de direitos econômicos, políticos e sociais está na mira dos golpistas.

Rebaixamento dos salários, terceiriza-ção sem limites, o fim das mínimas garan-tias da CLT com o negociado prevalecendo sobre a Lei, ou seja, numa tacada só criar as condições para em poucos anos jogar a clas-se trabalhadora de volta ao passado, para uma situação existente nas primeiras déca-das do século 20. A reforma da previdência é uma indecência, os ideólogos do mercado, com falsos argumentos, impõem a esta e às futuras gerações de trabalhadores e trabalha-doras a sustentação e a ampliação dos mega lucrativos negócios da previdência privada.

A destruição do SUS e da perspecti-va de construção de uma política de saúde pública universal, integral e generosa, que caminhe na contramão dos interesses priva-dos, o estrangulamento das bases de finan-ciamento da educação pública e de todas as políticas sociais, uma política de ajuste fiscal sem precedentes através dos PLs 257 e 241, que se aprovados comprometerão os investimentos públicos por pelo menos duas

décadas, atingindo sem exceção todas as po-líticas sociais e os direitos dos trabalhadores do setor público.

E por fim, para atingir seus objetivos centrais, os golpistas precisam criar um am-biente ultraconservador, tirando da caldeira do neoconservadorismo a homofobia, o ma-chismo, o racismo e propostas totalitárias como a tal “Escola sem Partido”.

PG13. A CUT decidiu fazer assem-bleias sindicais até o dia 31 de julho, as-sim como plenárias dos ramos e estadu-ais para debater com as bases o tema da greve geral. Já dá para fazer um balanço, mesmo que provisório desta discussão?

As CUTs estaduais, ramos e sindicatos seguem fazendo assembleias e plenárias, porém num ritmo aquém do necessário. Im-portantes ramos, a exemplo dos urbanitários --atingidos pela privatização do setor elétri-co-- e da educação estão mais mobilizados, até porque os ataques do governo golpista estão explícitos, com a entrega do pré-sal e o retrocesso das bases de financiamento da educação, com os PLs 257 e 241, com a ofensiva reacionária sobre a Educação atra-vés de propostas como a “Escola Sem Parti-do” e a “ideologia de gênero”.

O desemprego e a crise que atinge cruelmente o setor industrial urbano colo-

cam dificuldades reais que não podem ser minimizadas, inclu-sive porque os trabalhadores identificam boa parte desta si-tuação com a política de ajuste fiscal e de recessão aplicada por Levy em 2015. No entanto, esta situação só será superada com a convicção de que nenhum acor-do por cima resolve esta situa-ção, que é preciso persistir na mobilização, na luta de massas para preservar empregos e di-reitos.

PG13. Qual a expecta-tiva da CUT para as campa-nhas salariais unificadas do segundo semestre?

As campanhas salariais do segundo semestre envolvem categorias importantís-simas tais como petroleiros, metalúrgicos, químicos, bancários, correios e diversas es-tatais. A perspectiva da CUT na unificação destas campanhas é -- para além das pautas de reivindicações específicas -- avançar na construção da greve geral, na conscientiza-ção e na mobilização de milhares de traba-lhadores, mostrando que estão em perigo real e imediato os direitos econômicos, polí-ticos e sociais.

PG13. A CUT tem buscado unificar a sua ação com outras centrais sindicais. Como fazer isto sem rebaixar as bandei-ras da Central?

A crescente mobilização da classe trabalhadora e a greve geral são os pontos chave para deter o maior assalto e retroces-so dos direitos duramente conquistados pela classe trabalhadora. Não temos dúvida de que a unidade da maioria da classe traba-lhadora na defesa dos direitos ameaçados é fator decisivo para uma série de mobiliza-ções e uma greve geral com potência para derrotar o governo golpista.

Neste sentido é correto a CUT buscar a unidade com as demais centrais sindicais. O problema está em como fazer este movi-

Jandyra Uehara é dirigente nacional da Central Única dos Trabalhadores e a única integrante da direção da CUT que também faz parte do Diretório Nacional do PT. Nesta entrevista ao Página 13, ela fala sobre os desafios da conjuntura, especialmente para o movimento sindical cutista.

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mento sem rebaixar as nossas bandeiras e dar espaço para que as forças reacionárias e golpistas presentes no cenário sindical fa-çam o trabalho sujo de desmontar a mobili-zação e o processo de construção da greve geral.

Alguém acredita que uma figura nefas-ta, aliada do governo golpista e fiadora dos ataques como Paulinho da Força irá cons-truir a greve geral ou mobilizações contra o governo golpista e a contra a retirada de direitos?

A exemplo do que aconteceu nas mobilizações contra a terceirização e o PL 4330, é preciso ganhar a consciência da maioria das bases sindicais e sociais acerca da necessidade da greve geral para deter a retirada de direitos.

As centrais pelegas, ressalto, assim como concretamente aconteceu na luta contra a terceirização, devem ser levadas a tomar uma posição por pressão da base, a partir de uma forte movimentação sindical e social pela greve geral. Neste sentido, é muito importante que o tema da greve ge-ral também seja pautado pelos movimentos populares da Frente Brasil Popular e Povo Sem Medo.

Evidente que quem convoca greve ge-ral são as centrais sindicais e que este papel é insubstituível, mas é fundamental o papel que os movimentos populares podem cum-prir na construção do ambiente político e de mobilização social pela greve geral.

A CUT não deve ter ilusões com a burocracia sindical pelega e golpista, cuja verdadeira intenção é “negociar” direitos inegociáveis no pior sentido que este termo possa ter, e de preferência fazê-lo envolven-do a CUT e outras centrais que se levanta-ram na luta contra o golpe.

A CUT não pode cair nesta armadilha, e neste sentido foi um “ponto fora da curva” na trajetória da luta que a CUT vem prota-gonizando contra o Golpe e em defesa dos

direitos, o ato realizado em conjunto com as demais centrais no dia 26 de julho. Como não poderia deixar de ser, a julgar pela parti-cipação do golpista Paulinho da Força, saiu dali um documento fraco, genérico, sem rei-vindicações concretas, nenhuma palavra so-bre greve geral ou em defesa da democracia.

Mas “um ponto fora da curva” numa conjuntura tão complexa e cheia de contra-dições não significa, de modo algum, um afrouxamento da CUT na luta pelo Fora Te-mer e por nenhum direito a menos. A julgar pelos balanços que tem sido feitos no inte-rior da CUT sobre esta iniciativa, acredito que isto não afetará o caminho da luta de massas e da greve geral.

PG13. Explique para nós o que é o Dia Nacional de Assembleias da Classe Trabalhadora?

De acordo com a resolução da direção executiva do dia 5 de julho, o Dia Nacio-nal de Assembleias -- assim, no plural -- da Classe Trabalhadora deverá acontecer em todos os estados, buscando a unidade com as demais Centrais, em torno da defesa de direitos e com base numa pauta concreta de exigências e reivindicações. Nestas assem-bleias também se deverá discutir a mobili-zação para a greve geral, bem como fazer o indicativo de data.

Neste ato das Centrais do dia 26 de julho, encaminhou-se a realização de um dia nacional de mobilização e luta contra o desemprego e pela garantia de direitos, a ser realizado em todo o Brasil no dia 16 de agosto. Ou seja, o dia nacional de assem-bleias da classe trabalhadora com o sentido e a direção aprovados na CUT ainda está por vir.

PG13. Dois cenários: com e sem im-peachment. Em cada um destes cenários o que a CUT deve fazer?

Se consumado o golpe, com o impe-achment da presidenta Dilma, a CUT deve abrir um debate sobre o quê fazer para abre-

viar o governo ilegítimo do golpista. Nos dois cenários, obviamente com táticas dife-renciadas para cada situação, que são quali-tativamente diferentes, a CUT deve apostar todas as suas fichas na luta de massas, na reconstrução dos laços da classe trabalhado-ra com um projeto reformas democráticas, populares, anticapitalistas e com perspecti-va de luta pelo socialismo. Isto é estratégico, pois é a única forma de alterar a correlação de forças desfavorável a classe trabalhadora no atual conjuntura da luta de classes.

PG13. Uma última pergunta: você acredita que os sindicalistas cutistas que são petistas vão participar ativamente do Encontro que o PT está convocando para dezembro deste ano?

No V Congresso do PT, em julho de 2015, os cutistas petistas tiveram um papel muito importante, apresentando de forma unificada o Manifesto “O PT de volta para a classe trabalhadora”. Foi este documen-to, com a proposição da necessidade do PT defender claramente mudanças na política econômica do governo Dilma, que provo-cou o debate político fundamental daque-le congresso. Infelizmente, a proposta foi derrotada por pequena margem e a omissão e titubeios do Partido frente a política eco-nômica desastrosa e antipopular de Levy, não foi obviamente o principal fator, mas contribuiu para acelerar a ofensiva da direi-ta e afastar a classe trabalhadora da defesa da democracia. Para os cutistas, a luta pela democracia e por outra política econômica sempre foram indissociáveis, contrapondo--se à política de setores dentro do PT e da esquerda, que privilegiavam a luta demo-crática desprovida de conteúdos da luta econômica. No Encontro que o PT realizará em dezembro será muito importante que os cutistas petistas façam o esforço político de encontrar convergências para a atualização e aprovação do espírito contido no Manifesto “O PT de volta para a classe trabalhadora”.

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Ofensiva golpista amplia repressão e criminalização dos movimentos sociais

No dia 1º de abril, os notórios depu-tados federais José Carlos Aleluia

(DEM-BA) e Antônio Imbassahy (PSDB-BA) entraram com representações na Pro-curadoria da República pedindo nada me-nos do que a prisão de Guilherme Boulos, coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), por su-posta “incitação ao crime” e “formação de milícia privada”, com base em declarações feitas por ele dias antes.

No dia 10 de maio, o procurador-ge-ral do Estado de São Paulo, Elival Silva Ramos, orientou as secretarias do gover-no Geraldo Alckmin (PSDB) a desocupar, sem mandado judicial, os prédios públicos ocupados por estudantes que lutavam por melhorias na merenda.

No dia 23 de maio, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSC-SP) apresentou, no plenário da Câmara dos Deputados, um projeto de lei que criminaliza o comu-nismo. O PL 5.358/2016 altera a redação da Lei 7.716/1989, que trata dos crimes de preconceito de raça ou de cor e da Lei 13.260/2016, que tipifica o crime de terro-rismo, com a finalidade de “criminalizar a apologia ao comunismo”.

No dia 15 de junho, o repórter Ma-theus Chiaparini, do jornal JÁ, foi preso pela Brigada Militar (a PM gaúcha) du-rante cobertura de ocupação do prédio da Secretaria Estadual da Fazenda do Rio Grande do Sul por estudantes. O jornalis-ta foi levado ao Presídio Central de Porto Alegre e só obteve liberdade provisória na madrugada do dia seguinte. Foi a primeira prisão de um jornalista no Rio Grande do Sul desde o fim da Ditadura Militar.

No dia 20 de junho, a jornalista Ve-rônica Pimenta, repórter da Rádio Incon-fidência e diretora do Sindicato dos Jor-nalistas Profissionais de Minas Gerais, foi ilegalmente detida pela Polícia Militar enquanto cobria uma ação de despejo de moradores de duas ocupações populares

em Belo Horizonte. Acusada de “desacato a autoridade” e “desobediência”, foi leva-da a uma delegacia da Polícia Civil, onde foram impedidos de ingressar a advogada da Rádio Inconfidência, Luciana Mansur, e o próprio ouvidor da Polícia, Paulo Alck-min.

Neste cenário em que se tornou pia-da falar em “Estado de Direito”, não sur-preende que os dez presos acusados de terrorismo tenham sido impedidos de falar com seus advogados. Caminha-se para a possível supressão, de facto ou na letra das leis, de direitos elementares. Antes mesmo de a Operação Lava Jato banalizar as “con-duções coercitivas” e as prisões preventi-vas, estas últimas já enchiam os cárceres brasileiros de pessoas inocentes ou de bai-xa periculosidade.

A ofensiva dos golpistas exacerbou a violência contra os movimentos sociais e contra as esquerdas no seu conjunto: “libe-rou geral”. Paralelamente à repressão poli-cial e judicial e às tentativas de ampliar a criminalização dos movimentos sociais e da esquerda, nas áreas rurais pistoleiros a serviço de latifundiários ou de poderes lo-

cais continuam a executar lideranças cam-ponesas e indígenas. Isso se dá ao mesmo tempo em que, no Congresso, a bancada ruralista e seus aliados conduzem a CPI da Funai e do Incra, cujos alvos são as nações indígenas e o Movimento dos Trabalhado-res Sem Terra (MST).

A subprocuradora geral da Repúbli-ca, Deborah Duprat, esteve no Rio Grande do Sul no dia 4 de julho “para ouvir lide-ranças de vários movimentos populares, em audiência aberta ao público, a maioria deles de defesa dos direitos humanos de índias/os, pobres sem terra e sem teto, qui-lombolas, grupos de LGBT e estudantes, pessoas dedicadas à defesa de prisioneiras/os, adolescentes, idosas/os, vítimas de dis-criminação por motivo de etnia ou outro qualquer preconceito”, conforme relato de Jacques Távora Alfonsin.

As duas características mais notáveis da repressão atual, segundo Alfonsin, “sa-lientadas especialmente por estudantes, índias/os e quilombolas, [que] repetiram denúncias anteriores de agressões despro-porcionais, abusivas mesmo, da Polícia Militar do Estado”, são as seguintes: “in-

Pedro Pomar*

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terpretar qualquer manifestação de massa como desrespeito à ordem pública” e “tra-tar qualquer do povo que a integre como inimigo”.

No caso dos indígenas, adverte Al-fonsin, “as violências são de outra ordem e o lamento dolorido de velhos caciques e cacicas deixou o auditório todo, a douto-ra Débora, seus colegas e suas colegas de Procuradoria, visivelmente impressiona-dos e comovidos”. A saber: a construção de estradas e barragens em suas terras, bem como decisões judiciais que relativizam seus “direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer res-peitar todos os seus bens” (artigo 231 da Constituição), facilitam o risco permanente de perderem o pouco que lhes resta. “Como vai certamente acontecer se a PEC 215 for votada e aprovada, já que transfere para o Congresso Nacional a competência para delimitar as terras indígenas e até rever as que já foram homologadas”.

O vice golpista Michel Temer nomeou como ministro da Justiça o tucano Alexan-dre Moraes, em cuja passagem pela Secre-taria de Segurança Pública de São Paulo a

Polícia Militar voltou a matar como nunca. No dia 13 de agosto, a chacina de Osasco e Barueri, sabidamente cometida por PMs e guardas municipais, terá completado

um ano sem que seus autores tenham sido identificados e punidos.*Pedro Pomar é jornalista e militante do PT

NACIONAL

NOTA OFICIAL DA OAB-RJA Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Estado do Rio de Janeiro, vem a público manifestar sua preocupação com o fato de membros da Polícia Militar do Rio de Janeiro terem comparecido na noite de ontem à sede nacional do Partido Comunista Brasileiro (PCB), onde se realizava um debate público sobre a “des-militarização das polícias “, que contava com a presença de vários militantes e estudiosos do tema.

A investida contra a sede do PCB parece fazer parte do clima de paranoia que perpassa vários estamentos de segurança do país, desencadeando, assim, atos e ações que afrontam os direitos constitucionais de reunião, de expressão, manifes-tação e organização e que prontamente rechaçamos como atentatórios ao Estado Democrático de Direito.

Não coadunamos e não coadunaremos em quaisquer hipóteses com atitudes como essa e a Seccional estará, mais uma vez, apta e pronta a defender as consignas duramente conquistadas pelo povo brasileiro.

Rio de Janeiro, 29 de julho de 2016.

Felipe Santa Cruz

Presidente da OAB/RJ

http://www.oabrj.org.br/noticia/101099-oabrj-critica-investida-da-pm-contra-evento-do-pcb

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A primeira batalhade uma nova guerra

A direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda, reunida no dia 16 de julho de 2016 na cidade do Rio de Janeiro, realizou um debate sobre a

conjuntura e aprovou uma resolução que Página 13 publicar a seguir, na íntegra.

1. Em agosto deve encerrar uma etapa da história recente do Brasil. Em qualquer dos casos – legalidade ou golpe — terá início um novo período, em que a relação entre as forças políticas, as instituições e as classes sociais, bem como a relação do Brasil com o mundo serão substancial-mente distintas daquilo que prevaleceu durante a maior parte dos governos Lula e Dilma.

2. As forças golpistas manifestam plena consciência disto. Desde o início de sua interinidade, Temer e a quadrilha que o cerca não tiveram o menor pudor em com-portar-se como uma tropa de ocupação.

3. A começar pela composição do minis-tério (na sua maioria homens brancos, ricos e corruptos), passando pelas decla-rações públicas (um festival reacionário de besteiras), até as medidas concretas de corte de políticas sociais, benefícios para o grande capital e seus sócios inter-nacionais, realinhamento com os Estados Unidos e afastamento de nossos aliados latinoamericanos e do BRICS, o governo Temer não deixa a menor dúvida de que está a serviço de um retrocesso em todos os terrenos, que ameaça não apenas o que foi feito desde 2003, mas as conquistas inscritas na Constituição de 1988, assim como os avanços obtidos nos anos 1950 (a Petrobrás) e 1930 (a CLT).

4. Noutras palavras, o governo golpista confirmou o que dizíamos desde o início: não estamos diante de um golpe contra o PT, Dilma e Lula, mas diante de um golpe contra os interesses da maioria do povo brasileiro, contra nosso bem estar, nos-sas liberdades democráticas, contra nossa soberania nacional e nossa política exter-na. Golpe que se tiver pleno êxito, con-sumando o impeachment, nos fará entrar

em uma nova etapa da história do Brasil, profundamente diferente da que vivemos desde 2003.

5. Enquanto as forças golpistas têm clara consciência de seus objetivos estratégicos e buscam acomodar suas divergências tá-ticas sem ameaçar sua perspectiva comum de médio e longo prazo, entre as forças democráticas e populares cresceram as di-vergências de natureza tática e estratégica, o que por sua vez tem contribuído para re-duzir a mobilização contra o golpe.

6. Um exemplo destas divergências é a demora em divulgar uma carta ao povo brasileiro na qual Dilma afirme que, vol-tando ao governo, implementará o pro-grama vitorioso nas urnas de 2014, não havendo o menor espaço para políticas de ajuste fiscal, que descarreguem sobre os trabalhadores a conta da crise. A demora em divulgar esta carta revela a existência, em alguns setores da esquerda, de pesso-as que não entenderam os motivos pelos quais amplos setores da classe trabalhado-ra não defenderam e seguem não defen-

dendo nosso governo. Revela, também, que existem na esquerda aqueles e aque-las que acreditam que, comprometendo-se com a permanência de Henrique Meirel-les, aumentariam nossas chances de retor-nar à presidência.

7. Um segundo exemplo destas divergên-cias foi a divisão dos setores antigolpistas, quando da eleição do presidente da Câma-ra dos Deputados. A renúncia de Eduardo Cunha visava eliminar um foco de desgas-te, ao mesmo tempo em que construíam uma saída que o preserve parcialmente, em troca de evitar uma “delação premia-da” com potencial de devastar Temer e toda a quadrilha golpista. Neste contexto, setores do PT e do PCdoB optaram desde o início pelo apoio ao deputado Rodrigo Maia (DEM), conhecido golpista e neoli-beral. Para além do cretinismo parlamentar (postura caracterizada por definir a tática parlamentar como se o mundo começasse, terminasse e se resumisse ao parlamento), a decisão tática de apoiar Rodrigo Maia foi motivada por uma estratégia que visa alcançar algum tipo de acordo parcial com um setor do golpismo, tendo como prêmio máximo a cassação de Cunha. Ou seja: insiste-se, mesmo depois de tudo o que aconteceu, na mesma estratégia de conci-liação com setores da direita que preparou o terreno para o impeachment.

8. Outro exemplo destas divergências é a realização de alianças com partidos gol-pistas, para disputar as eleições munici-pais de 2016. Novamente, como no creti-nismo parlamentar, a realidade é reduzida a apenas uma de suas partes (no caso, as eleições locais) e a definição da política de alianças é feita como tantas vezes se fez nos últimos anos: como se o cenário estratégico não tivesse se alterado, como se fosse possível resistir à ofensiva inimi-

TENDÊNCIA

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ga e acumular para uma contraofensiva fazendo este tipo de aliança, que impede tornar nítidas para a classe trabalhadora as diferenças que estão em jogo.

9. Mais um exemplo destas divergências é a defesa desde já, antes da votação do impeachment no Senado, de uma proposta de antecipação das eleições presidenciais. Como já dissemos várias vezes, caso o im-peachment seja aprovado, será necessário debater como impedir que o governo gol-pista cumpra um mandato para o qual ele não foi eleito. E para isto, uma campanha pelas “diretas já” está entre as alternati-vas que devem ser analisadas. Entretanto, fazer isto antes da votação do impeach-ment significa dizer que nós estaríamos de acordo em encurtar o mandato legítimo da presidenta Dilma Rousseff. Portanto, mais uma vez estamos diante de uma proposta que visa fazer um acordo com setores do golpismo, à custa de concessões de princí-pio de nossa parte.

10. As divergências estratégicas e táticas existentes entre os que lutam contra o gol-pe são um fato. Em algumas situações, elas não impediram que o movimento contra o golpe ampliasse sua mobilização. No momento atual, entretanto, as diver-gências vêm contribuindo para reduzir a potência da mobilização social organiza-da. Ao mesmo tempo, é importante dizer que cresce o repúdio ao golpismo e se-guem ocorrendo intensas manifestações isoladas ou coletivas de escracho.

11. Se por um lado cresce a indignação molecular contra o governo golpista, por outro lado a mobilização organizada está refluindo. Há uma sólida decisão do gran-de capital e da direita de tirar o PT do go-verno federal, reduzir ao máximo a força eleitoral e a capacidade de mobilização do partido. Por tudo isso, ainda que uma difí-cil vitória seja possível, a tendência prin-cipal continua sendo que o Senado aprove o impeachment em agosto.

12. A partir desta constatação, os setores contrários ao golpismo debatem alternati-vas. Alguns setores acreditam na negocia-ção direta com senadores golpistas. Ou-tros defendem uma “alternativa política” que ganhe o apoio de parcelas importantes da população que são contra Temer, mas

não querem a volta da presidenta Dilma (e do PT). Há, ainda, os que argumentam que não há mais condições de derrotar o impeachment, deduzindo daí que seria ne-cessário criar o ambiente para algum tipo de negociação e convivência com os gol-pistas.

13. Outros setores da Frente Brasil Popu-lar, particularmente a UNE e o PCdoB, mas também a Frente Povo Sem Medo, alguns senadores e inclusive tendências petistas, como a Democracia Socialista, têm defendido um caminho alternativo: o “plebiscito pela antecipação das eleições presidenciais” (a esse respeito, ver resolu-ção “A posição da AE sobre a proposta de plebiscito”). Alguns setores minoritários argumentam em favor do “fora todos”, embora a recente cisão no PSTU tenha revelado o enfraquecimento desta postura maximalista (e similar à da ultradireita).

14. A Frente Brasil Popular, particularmen-te a CUT, o MST, a CMP e o PT, vem in-sistindo que só a mobilização pode barrar o impeachment; que o principal caminho para a mobilização popular está na defe-sa dos direitos ameaçados pelo golpismo; e que a presidenta Dilma pode contribuir com isto assumindo o compromisso de, voltando ao governo, implementar o pro-grama vitorioso em 2014.

15. Não descartamos que a votação no Se-nado possa ser afetada por algum efeito colateral da Operação Lava Jato (ou me-lhor, de alguma das frações que operam esta operação policial-judicial). Mas mes-mo neste caso, uma solução favorável ao povo dependerá da existência de uma in-tensa pressão organizada.

16. Neste sentido, o crescimento da mo-bilização popular será mais fácil caso a presidenta divulgue uma “carta ao povo brasileiro” explicando o que fará quando voltar, reconhecendo os erros de condu-ção na política econômica e na política de alianças, assumindo o compromisso de desfazer os malfeitos dos golpistas e de-fender os direitos ameaçados.

17. A política de ajuste fiscal, que em de-terminado momento foi apoiada por diver-sos setores da esquerda, produziu efeitos danosos, que nos fizeram perder apoios na

classe trabalhadora, criando a correlação de forças que possibilitou a vitória do gol-pismo.

18. O caminho para lidar com os desgastes provocados pelos erros (políticos e de po-lítica econômica) será longo e demorado. Este caminho terá que ser trilhado, mesmo que consigamos reverter o golpe no Sena-do, caso em que teremos que construir uma governabilidade de novo tipo.

19. O primeiro passo para lidar com os er-ros cometidos é colocar toda nossa ener-gia na mobilização popular em defesa dos direitos ameaçados pelos golpistas, pela adoção de uma política econômica que gere empregos, crescimento e distribuição de renda, e por uma reforma política pro-funda que impeça a representação política de ser uma simples representação de inte-resses empresariais e corruptos.

20. A retomada da campanha por uma Constituinte exclusiva para realizar a re-forma política integra o conjunto de ações que podemos implementar para reconectar nossos vínculos com a classe trabalhado-ra, especialmente com aqueles setores que estão desiludidos com o modus operandi da política nacional.

21. Reconstruir os vínculos da esquerda brasileira com a classe trabalhadora é a mais estratégica de nossas tarefas. O que só ocorrerá se, entre muitas outras ações, fizermos uma autocrítica profunda dos erros programáticos e estratégicos come-tidos nos últimos anos, inclusive na polí-tica econômica, na política de alianças e na ausência de uma política estrutural de combate à corrupção, que nos deixou de-samparados para enfrentar a ofensiva da direita neste terreno.

22. É com esta postura que seguiremos participando da luta contra o golpe, das inúmeras mobilizações sociais que es-tão em curso, das eleições municipais de 2016, assim como do Encontro Nacional do PT convocado para os dias 9, 10 e 11 de dezembro de 2016.

23. As mobilizações sociais, organizadas ou não, vão prosseguir, sob as mais va-riadas formas. Podemos contribuir, com nossa atitude, para que elas ganhem mais força. E parte de nossa atitude é não su-

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bestimar a existência, nos setores popu-lares da sociedade brasileira, de energias imensas que buscam expressão política.

23. Por isto é fundamental não cometer o equívoco de confundir, desrespeitar e, no limite, trair o sentimento democrático que se mobilizou contra o golpe, como fazem aqueles que pensam em negociar com os golpistas, com seus aliados na Câmara e/ou fazer chapas com os partidos ou lide-ranças golpistas para disputar as eleições de 2016.

24. Do mesmo modo, é fundamental não incorrer no erro de achar que a crise polí-tica vai resolver-se em 2018, através das eleições presidenciais. Os acontecimentos desde 2013 até hoje vêm demonstrando que mudou a dinâmica da luta política no país e também no mundo.

25. A principal variável da atual conjuntu-ra internacional é o agravamento da crise, em suas múltiplas dimensões: econômica, social, política – o que explica a crescente polarização ideológica, bem como a es-calada de conflitos militares, em todas as partes do planeta.

26. Tanto nos Estados Unidos quanto na Europa, cresce a presença de forças polí-ticas de ultradireita, em alguns casos de assumida orientação fascista. Um quarto de século depois do desaparecimento da União Soviética, o mundo assiste ao re-aparecimento de ameaças que se fizeram sentir no período das guerras mundiais, no início do século 20.

27. A esquerda vem resistindo, tanto nos Estados Unidos quanto na Europa. Mas até o momento essa resistência é limita-da. Nos EUA, por exemplo, a candidatura Sanders confirmou existirem condições para romper com os paradigmas tradicio-nais das eleições naquele país. Entretanto, os setores majoritários da esquerda nos Estados Unidos não constituíram até hoje uma alternativa político-eleitoral inde-pendente, tornando-se agora reféns e in-clusive apoiadores de uma candidatura da direita supostamente civilizada, conheci-da lobista de Israel e fiadora dos recentes golpes na América Latina.

28. Na Europa, os setores majoritários da esquerda criticam os rumos da União Eu-

ropeia, que segue controlada pelo grande capital, causando danos aos direitos so-ciais e às liberdades democráticas da clas-se trabalhadora europeia, além de engajar a UE na política imperialista dos EUA. Mas a maioria da esquerda europeia não cogita outra hipótese além da “reforma democrática” da UE. E como essa refor-ma democrática nunca acontece, o terreno fica livre para que a direita nacionalista hegemonize amplos setores da classe tra-balhadora que sofrem o desmantelamento de seus direitos.

29. O Brexit (saída da Inglaterra da União Europeia) é o resultado desta tendência contraditória: por um lado, uma decisão em que teve importante peso a influência da direita; por outro lado, um protesto de amplas camadas do povo contra o caráter neoliberal da União Europeia. Para impe-dir o avanço da direita, a esquerda euro-peia deve mudar sua orientação política. Talvez esta seja a única maneira de mate-rializar a palavra-de-ordem “outra Euro-pa é possível”: desmontando a realmente existente.

30. Na América Latina prossegue a contra-ofensiva reacionária. Neste momento, re-tomado o governo da Argentina, seus dois principais alvos são a Venezuela e o Bra-sil. Noutros países, como Equador e Bo-lívia, a direita também arma o cerco. No caso da Venezuela, combinam-se o cerco externo e a ofensiva interna. A esquerda venezuelana está diante da difícil tarefa de, ao mesmo tempo, superar a crise eco-nômica, em especial o desabastecimento, e evitar as provocações da direita, que tem como objetivo ganhar as eleições pelo cansaço ou empurrar o país para algum tipo de guerra civil e regime de exceção.

31. No caso do Brasil, a instabilidade polí-tica (por razões internas e externas, políti-cas, jurídicas e econômicas) vai continuar e tende a se agravar, aconteça o que acon-tecer no Senado, nas Olimpíadas e nas eleições municipais de 2016. Devemos estar alertas, especialmente nas Olimpía-das, para provocações visando “justificar” o uso da Lei Antiterrorismo. A recente propaganda da ABIN falando de como “identificar” um possível terrorista é um dos muitos sinais disto.

32. É neste contexto extremamente difícil que vamos realizar o próximo Encontro Nacional do PT, em dezembro. Ele será ainda mais decisivo se o Senado referen-dar o impeachment em agosto e o partido sofrer uma contundente derrota nas elei-ções em outubro. Definitivamente fora do governo federal, enfraquecido nas prefei-turas e câmaras de vereadores e principal-mente sem a antiga hegemonia nas ruas, a experiência do Partido dos Trabalhadores corre risco de vida. Embora este cenário não seja inevitável, acreditamos que se não tomarmos medidas imediatas e ino-vadoras o Encontro de dezembro pode se realizar em condições muito desfavorá-veis, tornando ainda mais difícil que uma “reprogramação” de nosso Partido possa ter sucesso.

33. Nosso Encontro já deveria ter sido re-alizado há muito tempo, para que tivésse-mos podido realizar um duro balanço da derrota histórica que se desenhava, para armar o partido nesta segunda fase do combate contra o golpe e para rediscutir o processo eleitoral de outubro à luz da nova conjuntura. Diante da imobilidade e falta de sensibilidade da maioria da atual direção partidária, a alternativa que res-tou é preparar o Encontro de dezembro. Entretanto, nas condições e regras atuais, é muito difícil que ele consiga responder aos enormes desafios que estarão colo-cados então, já numa conjuntura que se desenha ainda mais difícil, seja qual for a decisão do Senado. Por isso, insistimos na proposição de novas e imediatas medi-das, que envolvam mais diretamente nos-sa base militante e reforcem os mandatos dos participantes do Encontro:

a) a direção do PT precisa ser convencida a aceitar que este Encontro se realize com delegados eleitos pelo sistema de encon-tros, inclusive com delegados eleitos dire-tamente pela base (sem passar pelo filtro das tendências e mandatos), e não pelo sistema do PED;

b) igualmente, a atual direção do PT pre-cisa ser convencida da necessidade de que este Encontro possa eleger uma nova dire-ção para o Partido;

34. Este Encontro não é o fim, mas o início de um processo de “reprogramação” do

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Partido dos Trabalhadores, um momento em que a “Nação Petista” comece a recu-perar o controle do “Estado Petista”, em que possamos realizar um balanço de nos-sa trajetória e construir uma nova estraté-gia e um novo padrão de funcionamento para o novo período.

35. Para que este Encontro tenha êxito, será necessária uma intensa cooperação entre os setores do petismo que estão com-prometidos com uma análise crítica da tra-jetória seguida até aqui e, principalmente, comprometidas com a construção de uma nova estratégia, de um novo padrão de funcionamento e com o resgate de nossa relação com as bases sociais do Partido, especialmente com a classe trabalhadora.

36. Há várias maneiras de materializar esta cooperação, desde a votação de normas democráticas para a eleição das delega-ções, a composição de chapas, as ativi-dades comuns entre as diversas chapas, a aliança nas votações e, acima de tudo, a criação de um ambiente interno e externo que aponte para uma mudança na direção seguida até aqui pelo PT.

37. Para contribuir com estes objetivos, a tendência petista Articulação de Esquerda apresentará, para debate neste Encontro, seja com base nas regras atuais, seja com base em novas regras que esperamos con-seguir aprovar, três documentos: um deles de balanço da trajetória partidária; outro tratando do programa, estratégia, concep-ção e construção partidária; e um terceiro tratando da conjuntura internacional, re-gional e nacional, bem como nossas tare-fas táticas, inclusive eleitorais.

38. Sem prejuízo de reavaliar esta decisão à luz da movimentação e da posição de outros setores do Partido, organizaremos, com base nestes documentos, uma chapa para eleger delegados e delegadas a este Encontro. Entendemos que é melhor para o Partido que cada setor apresente suas próprias posições e que a síntese seja feita no debate público e não em negociações prévias.

39. Além disso, nosso gesto visa estimular que o atual grupo majoritário reconheça a existência, no seu interior, de diferentes correntes políticas, algumas profunda-mente contraditórias entre si. E que faria

bem ao Partido se cada uma destas cor-rentes lançasse sua própria plataforma e debatesse sem constrangimento suas po-sições.

40. Se não soubermos lidar hoje com os enormes e inéditos desafios que nos apre-sentam, o PT poderá, em curto espaço de tempo, repetir as trajetórias de diferentes partidos de esquerda, sobretudo europeus, e se transformar, por período menor ou maior, em uma estrutura secundária da vida política nacional, sem condições de exercer qualquer papel de protagonismo semelhante ao dos últimos tempos. Por isso, reiteramos: em nossa opinião, a ex-periência do PT corre risco de vida. Este risco não é causado principalmente pela ofensiva da direita, nem tampouco pelos concorrentes de esquerda. O que ameaça a sobrevivência do PT são os erros co-metidos pelo petismo ou por setores dele. Aos dirigentes petistas cabe corrigir seus rumos, tomar medidas e impedir uma fase de agonia que outros partidos de esquerda viveram, no Brasil e no mundo.

41. De nossa parte a decisão está tomada há tempos: seguiremos lutando para que o PT altere sua linha política, saia mais forte da presente crise e cumpra seu dever na luta por um Brasil democrático, popular e socialista.

42. Por fim, convocamos o conjunto da militância a engajar-se nas atividades con-vocadas pela Frente Brasil Popular, entre as quais citamos:

a) fortalecer o esforço de traduzir o golpe

para a população, explicitando o progra-ma e as medidas do governo golpista;

b) intensificar a panfletagem massiva do panfleto da Frente Brasil Popular durante o mês de julho, organizando a impressão nos estados, bem como brigadas de pan-fletagem;

c) reforçar as mobilizações nos estados e nas bases eleitorais dos Senadores que es-tão em disputa, em especial no DF, TO, MA, GO, RO, MT, AM, PI;

d) fortalecer ações setoriais em torno da defesa do petróleo, saúde e educação;

e) reforçar a convocatória da Greve Geral, através de ações nos espaços de trabalho e em plenárias de categorias e reuniões re-gionais;

f) realizar uma grande Mobilização Nacio-nal pelo Fora Temer e de denúncia do Gol-pe, no Rio de Janeiro no dia 5 de Agosto, abertura das Olimpíadas, mobilizando além do RJ, os estados mais próximos para essa concentração.

g) realizar, durante toda a agenda das Olimpíadas, atos Fora Temer, inclusive nas cidades fora do RJ que também terão competições olímpicas: Belo Horizonte (Mineirão), Brasília (Estádio Mané Gar-rincha), Manaus (Arena Amazônia), Sal-vador (Arena Fonte Nova) e São Paulo (Arena Corinthians).

h) organizar materiais e atividades especí-ficos para o diálogo com turistas e impren-sa internacional;

i) realizar uma Jornada Nacional pelo Fora Temer no dia 9 de Agosto com marchas em todas as capitais, pois nesta data esta prevista a primeira votação no plenário do Senado;

j) realizar um ato nacional em Brasília no período da votação final no Senado, entre os dias 24 a 29 de Agosto.

43. O impeachment não é uma fatalidade, portanto, pode ser revertido, principal-mente se encararmos a luta contra o golpe não como a última batalha da guerra anti-ga, mas como a primeira batalha de uma nova guerra.

Fora Temer! Nenhum direito a menos!

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Ocupa, SUS!Janine de Azevedo Machado*

Durante um mês, entre os dias 3 de ju-nho e 2 de julho de 2016, militantes

do SUS ocuparam o prédio do Ministério da Saúde em Belo Horizonte, em protes-to contra as declarações de desmonte do Sistema Único de Saúde vindas do minis-tro do governo interino golpista. Este, que teve sua campanha eleitoral financiada ma-joritariamente por empresas que vendem planos privados, desferiu já nos primeiros dias um golpe no SUS, ao propor planos de saúde a preços baixos para diminuir a de-manda pelo SUS, num claro favorecimento ao mercado privado da saúde.

As diversas ocupações dos prédios da Funarte pelo país inspiraram essa forma de luta, e enquanto o ato em Belo Horizonte era planejado para o dia 3 de junho, o pré-dio do ministério da saúde em Salvador foi ocupado em 30 de maio. E cinco dias após a ocupação de Minas, militantes do Rio de Janeiro também iniciaram essa nova tática de luta contra o golpe em curso. A ocupa-ção de orgãos federais foi um sinal de que a luta não estaria só nas ruas, e que existem outras possibilidades de enfrentamento e resistência a qualquer momento, caso Dil-ma não retorne ao cargo que lhe foi confe-rido através de um legítimo processo elei-toral.

Com a decisão não só de ocupar e resistir, mas de tam-bém produzir, inspirada na ocupação da Funarte em BH, inúmeras atividades se realiza-ram no 16º andar do Ministé-rio da Saúde, desde uma Ple-nária da Frente Brasil Popular até um belo debate com a po-pulação de rua. As atividades foram tantas e tão ricas que está se organizando um me-morial da ocupação, para que essa história de luta pelo SUS fique registrada e alimente a energia da mi-litância da saúde na luta contra o golpe.

Mas, dialéticos que são os processos, um encontro prolongado com tantas e di-versas forças trouxe também desafios. As principais divergências se relacionaram à duração da ocupação e a discordâncias quanto ao “Volta Dilma!”.

Quanto ao tempo de ocupação, havia

quem propusesse uma ação breve, com os manifestantes se retirando do prédio qua-tro dias após a ocupação, até a proposta de que a desocupação só se desse com a saída do golpista Temer do poder. E nos debates outras propostas intermediárias de desocu-pação foram apresentadas, como os dias 10/06 (Mobilização Nacional Fora Temer), 24/06 (São João do SUS) e 05/07 (parti-da para a Marcha Nacional em Defesa do SUS).

O ineditismo (para a maioria dos mi-litantes envolvidos) de uma ação de ocu-pação e a diversidade da militância levou a dificuldades práticas na organização e divergências políticas. Em 24/06 parte dei-

xou a ocupação, enquanto parte permane-ceu. A defesa maior dos companheiros que abandonaram a ocupação foi de que eram necessárias ações nas ruas, enquanto a mi-litância que defendia a resistência dentro de um prédio federal do governo golpista argumentava que as duas coisas poderiam ser feitas caso escalas fossem organizadas.

É necessário também considerar aqui

a enorme possibilidade do PMDB, que ocupa hoje o governo de Minas ao lado do governador petista Fernando Pimentel, ter interferido no abandono precoce da ocupa-ção por algumas forças.

Já no que se refere ao Volta Dilma, houve dificuldades na participação da Frente Povo Sem Medo e do PSOL na ocu-pação devido a esta pauta, assim como po-sicionamentos de setores do PT favoráveis a novas eleições em algumas plenárias. De-fesas pragmáticas de alto risco nesta ainda frágil democracia brasileira, assolada hoje por um golpe. Tal debate ainda permanece

diante do ato nacional da Povo Sem Medo “Fora Temer! O povo deve decidir! Defender nossos direitos, radicalizar a democracia!”, que não contou com o apoio da Frente Brasil Popular.

Mas com todas as diferenças e embates que afloraram naquele déci-mo sexto andar do ministério, há uma unanimidade no reconhecimento dos frutos dessa nova forma de luta, que mobilizou a militância da saúde de Belo Horizonte como há muito não

víamos, finalizando com a criação da Frente em Defesa do SUS numa grande plenária.

Passar pela Rua Espírito Santo, 500 nunca mais será o mesmo! *Janine de Azevedo Machado é mili-tante petista e do SUS; Maxwell Vilela é fotógrafo militante da Frente Brasil Po-pular - Minas

SAÚDE

Foto: Maxwell Vilela

Foto: Maxwell Vilela

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ELEIÇÕES 2016

Cloves de Castro, Edma Walker, Marly dos Santos e Rodrigo Cesar*

A ofensiva conservadora que resultou no golpe em curso, com o afastamen-

to temporário da presidente eleita Dilma Rousseff e a instalação de um governo inte-rino ilegítimo, teve na cidade de São Paulo um de seus postos avançados.

A alta burguesia reacionária e seto-res tradicionais da classe média paulista-na, com a Avenida Paulista como ponto de referência, mobilizaram-se nas ruas, nas redes, no oligopólio midiático e nas insti-tuições para promover um processo de im-peachment sem base legal. Mais uma vez na história brasileira, a capital paulista foi expressão daquilo que há de mais retrógra-do, autoritário e antidemocrático na cultura política do país.

Mas foi também na cidade de São Paulo que a resistência popular, democrá-tica e progressista tem demonstrado seu vigor, por meio de inúmeras ocupações estudantis, as manifestações das mulheres, a mobilização dos trabalhadores e trabalha-doras da cultura e os atos e paralisações dos sindicatos e movimentos populares.

À medida que o tempo passa e o go-verno golpista e ilegítimo de Temer avança na implementação de seu programa neoli-beral e na tentativa de bloquear o combate à corrupção, fica mais evidente para am-plos setores do povo paulistano que Dilma Rousseff não cometeu crime de responsa-bilidade e, portanto, seu afastamento é um golpe contra os direitos da classe trabalha-dora e a democracia.

Desde que Temer assumiu, inúme-ras manifestações, atos e mobilizações tem demonstrado a insatisfação popular contra o retrocesso representado pelo arrocho de salários e aposentadorias, eliminação de direitos trabalhistas, corte de gastos com programas sociais, redução de verbas cons-titucionais para educação e saúde, diminui-ção de investimentos públicos, privatização de empresas estatais, desnacionalização de nossas terras e a entrega da soberania brasi-leira sobre o pré-sal.

À escalada conservadora e à tenta-tiva de intimidação contra os movimentos

populares, as organizações de esquerda e o PT – como ficou evidente com os atentados contra a sede nacional do Partido – dize-mos: não temos nada a temer! Mas também não temos tempo a perder, pois se aproxima a votação no Senado que julgará o processo de impeachment, o que exige unir esforços em torno da mobilização em defesa dos direitos, vinculada à denúncia do golpe. A luta democrática só terá êxito se combinada com a luta pelos direitos.

Se por um lado estaremos em melho-res condições de enfrentar as eleições caso consigamos derrotar os golpistas no Sena-do, por outro, ela será um dos momentos desta luta contra a ofensiva conservadora e o golpismo e na defesa dos direitos e da democracia. Portanto, devemos encarar a campanha pela reeleição de Haddad para a Prefeitura de São Paulo como parte desta luta geral, não apenas como uma disputa eleitoral.

Certamente, a defesa das conquistas e realizações da gestão petista à frente do go-

verno municipal será fundamental para dia-logar com o povo paulistano e garantir a vi-tória do PT. Ao mesmo tempo, a Prefeitura deve reorientar suas ações, sobretudo onde está mal avaliada, especialmente no caso da saúde e nas regiões periféricas da cidade. Além de garantir mais investimentos nestas áreas e territórios, o próximo programa de governo deve expressar o necessário apro-fundamento das mudanças necessárias.

Mas trata-se de defender também a le-gitimidade do mandato da presidenta e seu retorno com um programa que aponte para transformações estruturais de caráter demo-crático e popular. Do mesmo modo, deve-mos cerrar fileiras na defesa do legado dos governos Lula e Dilma, do PT e dos direitos que estão sendo retirados e ameaçados por Temer e os golpistas.

O PT tem o desafio de reconquistar o apoio da classe trabalhadora, altamente concentrada no município de São Paulo e região metropolitana. Portanto, a ilusão de insistir em uma repactuação com setores que abraçaram o golpismo e trabalham para nos criminalizar e aniquilar deve passar longe também da tática eleitoral na cidade. Isso supõe tratar inimigos como inimigos e não achar que um suposto bom-mocismo no primeiro turno pode render frutos no segundo, inclusive porque nossa vaga não está garantida.

Pesquisas indicam que Haddad (PT) continua com baixa intenção de votos (7%), embaralhado com Marta Suplicy (PMDB, 10%), Erundina (PSOL, 8%), João Dória (PSDB, 7%) e Andrea Matarazzo (PSD, 5%), que agora é vice de Marta. Celso Rus-somano (PRB) segue com folga na diantei-ra (29%). De todo modo, ao invés de uma tendência, os números indicam uma inde-finição, de modo semelhante aos primeiros momentos da campanha de 2012.

Há quatro anos, dizíamos que existe amor em SP. Agora, vamos mostrar que o amor resiste em SP!

* Cloves de Castro, Edma Walker, Mar-ly dos Santos e Rodrigo Cesar são mili-tantes do PT em São Paulo.

O amor resiste em SP

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Carolina RousseffPágina 13. Como você se aproximou

do PT?Em 2010, durante as aulas de História,

minha professora pediu para que realizásse-mos um trabalho sobre a Ditadura Militar no Brasil. Na época, escolhi fazer um trabalho sobre a participação das mulheres na luta contra a ditadura e, por ser durante o proces-so eleitoral, a figura da Dilma me chamou atenção. A partir de então, passei a pesqui-sar sobre a história da Dilma e, consequen-temente, me engajei na campanha de 2010. Embora sempre tenha tido alguma simpatia com o Partido dos Trabalhadores, só me aproximei realmente do PT em 2015. Isso ocorreu por conta da conjuntura que estava se desenhando, com as grandes manifesta-ções da direita, e a não reação do partido. Por isso, procurei o diretório municipal do PT para perguntar qual o posicionamento e as ações frente aquilo. Tomei contato com a Juventude do PT, participei do congresso municipal e estadual da JPT e comecei a participar ativamente dos atos contra o ajuste fiscal, contra a redução da maio-ridade penal, pelo Fora Cunha etc.

PG13. Como você avalia o ce-nário das eleições de 2016 em Porto Alegre?

As eleições de 2016 serão atípi-cas em todo o país, pois se dão em um momento de golpe de Estado, numa ofensiva conservadora que visa ata-car os direitos dos trabalhadores, das mulheres, da juventude, dos negros e dos LGBTs. Em Porto Alegre, a mega-coligação arquitetada pelo atual vice--prefeito Sebastião Melo (PMDB) é a principal representante do golpismo e do retrocesso que ocorre a nível nacional, es-tadual e municipal. O companheiro Raul Pont junto a camarada Silvana Conti terão o dever fazer a denúncia do golpe e a defesa da democracia na nossa cidade, bem como de apresentar um pragrama que venha na contramão do caos que foi instaurado pelas políticas neoliberais implementadas nos úl-timos 12 anos. Acredito que além de sofrer-mos ataques dos setores de direita, também teremos que lidar com a irresponsabilidade dos setores esquerdistas, representada pela figura de Luciana Gênero, os quais elege-

ram o PT como principal inimigo, fazendo coro com a direita.

PG13. Como você vê a situação da cidade de Porto Alegre Hoje?

Caótica. A gestão do PDT/PMDB des-de 2004 implementa um programa de suca-teamento geral da cidade, reflexo disso é a situação vivemos. Não existe segurança em Porto Alegre, princialmente para nós mu-lheres. Eu mesma já fui assaltada três vezes neste ano. A total sensação de insegurança é o que paira sobre a nossa população e o que está em jogo não são apenas questões mate-riais, mas também nossa integridade física e emocional. Para além disso, nossos espaços vêm sendo gradativamente privatizados e abandonados, limitando o acesso da popula-ção a locais que antes eram pontos de convi-vência, cultura e lazer dos porto-alegrenses, principalmente de nós jovens, tais como a Orla do Guaíba, o Cais do Porto, a Reden-ção, o Auditório Araujo Viana etc. Outra questão que para nós jovens é muito cara,

é em relação a educação. O próprio cursi-nho pré-vestibular da prefeitura possui di-versos problemas e não consegue atender as demandas. A situação se agrava nos outros níveis de ensino, a defasagem de creches e escolas de turno integral tem sido respon-sável pela evasão de diversas mães jovens que tinham intenção de estudar, mas não tem onde deixar as crianças. Temos tam-bém, um grande problema com os estágios ofertados pela prefeitura, que tem muito mais interesse em ter mão de obra barata do que em qualificar a juventude para o mundo do trabalho. Com relação ao transporte de

Porto Alegre, que em outro momento já foi referência para o país, hoje se encontra em uma situação precária. Tri caro, tri lotado, tri demorado e além de tudo isso, nós, mu-lheres, ainda somos constantemente vítimas de assédio. Por isso, nestas eleições, será preciso um programa político que dê conta de responder a todas essas questões.

PG13. Quais os principais debates pretende apresentar para a população de Porto Alegre?

O nosso programa está em processo de construção coletiva, as principais pautas que estão sendo debatidas até agora são: o direito e o acesso da juventude a cidade, ao transporte público de qualidade e a ocupa-ção dos espaços de cultura e lazer; o direito das Mulheres a cidade e a todos os espaços com segurança; educação pública, demo-

crática e popular; assistência estudan-til para jovens mães; trabalho decente para a juventude e conciliação entre estudo e trabalho; defesa dos direitos e de politicas públicas específicas para a juventude LGBT e Negra. Ressalta-mos também que pretendemos nessas eleições ser mais um instrumento da luta contra o golpe e de defesa dos di-reitos classe trabalhadora.

PG13. Quais os principais de-safios de uma candidatura de uma jovem mulher?

Enfrentar a conjuntura atual do nosso país, combatendo o golpe; enfrentan-do o machismo que existe e, infelizmente, ainda é muito forte na política. Também é preciso enfrentar, dia após dia, a falta de confiança e de credibilidade na juventude, que muitas vezes é subestimada e tacha-da de irresponsável, sendo desconsiderada como sujeito político de transformação. O momento que vivemos requer muita cora-gem, especialmente de nós, jovens mulheres petistas, pois somos convocadas a protago-nizar a construção de um projeto democráti-co-popular e feminista de cidade e socieda-de, mudando os rumos da história

Carolina Rousseff é a pré-candidata a vereadora mais jovem do PT de Porto Alegre. Jovem trabalhadora, Carol estuda em um cursinho pré-vestibular e acompanhou o processo de ocupação das escolas no Rio Grande do Sul.

ELEIÇÕES 2016

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Relato de um atoRodrigo Cesar*

Na noite do dia 23 de julho, no Clube Homs, em São Paulo (Av. Paulista),

foi realizado o lançamento de uma nova organização de esquerda, o Movimento por uma Alternativa Independente e So-cialista (MAIS), impulsionada pela re-cente cisão do PSTU, que havia lançado o manifesto “É preciso arrancar a alegria ao futuro”.

A casa estava cheia. Segundo os or-ganizadores, havia cerca de 1200 pessoas presentes. Os jovens estavam em peso, talvez compondo a maioria do público. Muitas crianças também foram levadas por seus responsáveis e o espaço contava com uma creche. Camisas e broches #Fo-raTemer eram usados por muitas pessoas. O ato começou com uma apresentação ao vivo, em voz e violão, de músicas de Chi-co Buarque (Tanto mar) e Milton Nasci-mento (Maria Maria; Fé cega, faca amola-da; e Clube da esquina nº 2).

Assim que as cortinas vermelhas do palco se abriram, era possível ver grandes letras que compunham a palavra "ALE-GRIA" ao fundo. Logo em seguida, apre-sentaram-se os mestres de cerimônia: Nes-tor Bezerra, sindicalista e trabalhador da construção civil de Fortaleza (CE); Janaína Oliveira, jovem negra de Olinda, da execu-tiva nacional da ANEL; e Carlos Daniel, do setorial LGBT da CSP-Conlutas.

Foi anunciada a presença de delegações de MG, RJ, RS, CE, AL e RN. Delegações e militantes de cidades de SP também estavam presentes.

Depois de apre-sentar o nome da nova organização e anunciar sua fundação, puxaram a seguinte palavra de ordem: “Mais, mais /

na luta somos mais / pela revolução e o socialismo eu vou atrás”.

Em seguida, foi convidado a falar Mauro Puerro, membro da secretaria exe-cutiva da CSP-Conlutas, que iniciou afir-mando a necessidade de respeitar o passado e a organização que até então compuseram, o PSTU, a quem chamou de parceiros. De-pois, leu o poema Reinauguração, de Car-los Drummond de Andrade.

Em seguida, foi chamada a falar a vereadora de Natal (RN), Amanda Gurgel, que logo no início emocionou-se. Choran-do, explicou: “é de alegria, não é de triste-za”. Disse ser preciso dialogar de um jeito

diferente com as pessoas e que pensa nisso diariamente. O título do manifesto que lan-çaram, verso de um poema de Maiakovski, teria feito “muita diferença” no processo de cisão que viveram, já que “a forma faz diferença”. Segundo Amanda, o conteúdo da organização continuava sendo socia-lista e revolucionário, mas “por que não pode ser alegre, por que não pode ser co-lorido?”, questionou, indicando que isso não os aproximaria do “neorreformismo”. Afirmou que a natureza da luta revolucio-nária pode passar do ponto da firmeza, che-gando à dureza e ao engessamento, e cri-ticou a prática de produzir “panfletos de 3 páginas”, dizendo ser necessário superar a autoproclamação e a arrogância utilizando uma mais leve de diálogo com o povo para que este se sentisse como “dentro de um abraço”. O desafio seria, assim, para além da forma, explicar o socialismo e a revolu-ção partindo da realidade concreta das pes-soas para criar consciência revolucionária. Como professora de português, falou da importância da linguagem neste processo e disse que não precisavam de um dialeto que só eles mesmos compreendessem.

Em seguida, indicando os vínculos da nova organização com a Liga Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional (LIT-QI), foi convidado a fazer uso da pa-lavra o português João Pascoal, anunciado como morenista, que participou da Revo-lução dos Cravos, membro fundador do Movimento Alternativa Socialista (MAS) em 2012, em Portugal. Falou que a luta é internacional e tem avanços e recuos, que estavam todos juntos construindo uma or-ganização internacional e que se a luta so-cialista fosse fácil ela já teria triunfado em todo o mundo e não estariam próximos de passar “100 anos sem uma única revolução triunfante dirigida, como nó queremos, por um partido revolucionário, por um partido bolchevique como aquele que em 1917, com Lenin e Trotsky, conseguiu uma revo-

O texto a seguir relata como foi o ato de criação do MAIS, uma nova organização de esquerda surgida da cisão do PSTU. Ao publicar este texto, o jornal Página 13 -- totalmente engajado na construção e defesa do Partido dos Trabalhadores – busca demonstrar que é possível ter uma imprensa partidária e por isto mesmo objetiva na descrição dos acontecimentos e dos debates.

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lução triunfante na Rússia”.

Pascoal mencionou as lutas e mobili-zações contra a austeridade do sul da Euro-pa (Portugal, Espanha e Grécia) em 2012 e 2013, que, segundo ele, foram desmobili-zadas e canalizadas para o parlamentaris-mo e as eleições burguesas “pelos velhos e novos reformistas”. Disse que depois da Revolução dos Cravos, foram 42 anos de luta por um projeto revolucionário. Sem sectarismos nem dogmas, aprenderam com o passado e conseguiram momentos de vi-tória. Considerou o momento atual como ainda mais difícil, sem grandes mobiliza-ções, mas o importante seria a construção da ferramenta de luta para a revolução, seja nos momentos difíceis ou favoráveis. Fina-lizou com vivas ao MAIS, à LIT e à Quarta Internacional, ao que se seguiu novamente a música Tanto mar, de Chico Buarque.

André Freire, do Rio de Janeiro, foi o orador seguinte. Assim como Janaí-na Oliveira na abertura, iniciou dizendo “Primeiramente, fora Temer!”. Falou que a nova organização “vai lutar e atuar sob a bandeira do marxismo, do internacio-nalismo, da independência de classe e da revolução socialista”; se coloca contra a adaptação ao regime podre da burguesia; deve ter inserção no movimento operário, mas também na juventude, nos movimen-tos contra opressões e nos movimentos po-pulares combativos. Foi muito aplaudido quando afirmou que as bandeiras do MAIS iriam tremular nos atos do Fora Temer do dia 31/07, realizados pela Frente Povo Sem Medo, que, registre-se, não foi menciona-da em nenhum momento ao longo de todo o ato. Afirmou também que não querem #VoltaDilma e defendem novas eleições com novas regras.

Segundo André Freire, a nova orga-nização que estão criando não basta em si mesma e não se considera acabada, mas busca a unir os revolucionários socialis-

tas no Brasil, contribuindo para o reagru-pamento necessário desses setores para construir uma alternativa programática que desse três passos iniciais: 1) estabelecer um campo alternativo da classe trabalha-dora que seja contra Temer e contra a con-ciliação do PT e do PCdoB; 2) apresentar uma frente de esquerda e socialista com independência de classe nas eleições mu-nicipais, onde não caberia a Rede de Mari-na Silva; e 3) realizar debates e seminários sobre os 100 anos da Revolução Russa, devendo ter orgulho do que fizeram. Por fim, defendeu uma política de frente única dos setores socialistas e revolucionários no movimento de massas e disse que o MAIS seria apenas um ponto de apoio para ajudar no reagrupamento dessas forças.

Após sua fala, o plenário entoou a se-guinte palavra de ordem: “Contra a direita / e o PT / com unidade não há nada a temer”.

Apresentado como "professor dos professores", discursou em seguida Fábio José, que foi vereador em Juazeiro do Norte (CE) e atualmente é professor da Universi-dade Regional do Cariri (URCA). Sua fala tratou da interpretação sobre a história dos anos 1990, após o fim da União Soviética. Disse que aquela foi “a década da suspen-são do socialismo como ideologia e projeto de sociedade” pois, ainda que burocráticos, os Estados socialistas eram fortalezas cria-das na luta contra o capital. Sua derrocada e a destituição dos dirigentes burocráticos não veio de uma revolução política con-forme pensado por Trotsky e Moreno, mas significou, na verdade, o triunfo da reação burguesa e a restauração capitalista.

Fábio José disse que Trotsky se preo-cupava com o destino da URSS e não queria que a derrocada dos regimes burocráticos levasse consigo as conquistas sociais obti-das e que a traição do stalinismo não seria esquecida pela vanguarda proletária, mas a derrota dos soviéticos foi uma contrarrevo-

lução que trouxe retrocessos e impactou na consciência da classe trabalhadora no mun-do. Assim, com a erosão ideológica dos anos 1990, a classe seguia em luta, mas não enxergava além do seu cotidiano. Afirmou, porém, que “não há qualquer lei universal que diga que o socialismo não volte a gozar de autoridade junto à classe operária”. As-sim como o orador anterior, afirmou que o MAIS surge para contribuir modestamente com o reagrupamento de forças dos mar-xistas. Considerou que só a luta de classes poderia “oferecer a matéria prima para a manufatura da revolução” e, nesse sentido, começavam de um ponto recuado, pois a história não andou para frente com a derro-ta dos Estados operários. A causa, porém, foi apenas momentaneamente perdida.

Em seguida, Marcinha, apresentada como jovem negra, LGBT e professora, leu um trecho de “Grande Sertão: veredas” de Guimarães Rosa. Curiosamente, ainda que tivessem recortado um trecho mais longo, tratava-se justamente daquele também ci-tado por Dilma em seu discurso de posse em 2011: “O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem”.

Henrique Carneiro, professor do de-partamento de história da USP e militante da luta antiproibicionista, foi o orador se-guinte, que saudou não apenas os que assi-naram o manifesto lançado, mas “milhares que querem uma coisa nova”. Disse que a URSS, China e Cuba foram cúmplices da guerra às drogas e que a China é hoje o país que mais executa pessoas que são presas por porte e comércio de drogas ilí-citas. Denunciou o genocídio da juventude negra decorrente do proibicionismo e citou a Ambev como a maior empresa capitalista do Brasil, apontando a necessidade de ob-servar o Canadá, que estatizou o comércio de álcool, gerando um fundo social, e indi-cou que o mesmo poderia ser feito com as

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drogas ilícitas. Lamentou que o PSTU não tenha se aberto para esse eixo programático e saudou a iniciativa de um manifesto antiproibicionis-ta do MAIS que estaria em construção.

Após esta sequência de falas, foram anunciadas e convidadas a fazer falas breves as organizações pre-sentes que foram prestigiar o ato: Andes-SN, PSOL (SP), Conspiração Socialis-ta, MRT, PCB, NOS, LSR, Socialismo ou Barbárie, In-surgência, CST, MES, Pas-toral Operária, Luta Socialista, Esquerda Marxista e APS – trata-se, no caso, de um dos agrupamentos originários da cisão na APS ocorrida em 2013, denominado APS--Nova Era.

Primeiro falou a Pastoral Operá-ria, representado por Paulo Pedrini, que leu uma nota conjunta assinada por ele e Plínio de Arruda Sampaio Jr., na qual consideram a iniciativa de criar a nova organização como “uma importante con-tribuição para a formação de um bloco de esquerda socialista comprometido com os desafios da revolução” que teria “grandes responsabilidades na reorganização da es-querda socialista”. Ao final, disse que, se lá estivessem, Plínio de Arruda Sampaio e Waldemar Rossi também assinariam a nota.

Ana Maria, do Andes-SN, infor-mou que o sindicato se posiciona contra o governo interino, que teria lá chegado por meio de uma “manobra parlamentar, jurídica e midiática”. Não usou o termo “golpe”. Depois de dizer “primeiramente, Fora Temer”, leu uma nota que criticava o governo, a conciliação de classes e o ajuste fiscal, apontando para uma greve nacional da educação, a greve geral e a importância de lutar contra o projeto Es-cola sem partido.

Representando a seção paulista do PSOL, o deputado estadual Carlos Giana-zzi disse que ao saírem do PSTU, aqueles militantes estariam mudando de casa, mas não de rua, e contariam com mais flexibi-

lidade nas ações, citando o #ForaTemer e as eleições gerais.

Edmilson Costa, do PCB, avaliou que a esquerda vive o fim de um ciclo, como fracasso da conciliação de classes, dizendo que, por mais que o PT estivesse com a burguesia, esta o descartou.

Marcelo Badaró, da Nova Organi-zação Socialista (NOS), também avaliou que a esquerda vivia uma virada de ciclo: vinha de um período de fragmentações e dissidências e passaria a uma fase de uni-dade e frentes amplas. “Desde 2013, a esquerda vive um processo de reorganiza-ção. E parece que o momento de fragmen-tação está chegando ao seu final”, afirmou.

Representando a Insurgência, Tostão considerou que vivemos um novo ciclo de recomposição estratégica da esquerda. Ézio Expedito, da Conspiração Socialis-ta, enfatizou a importância da unificação dos socialistas revolucionários e Marzeli, da LSR, considerou correta a posição do MAIS de buscar unificar estes setores.

Por sua vez, pela APS (Nova Era) falou Pedro Paulo, afirmando que conver-giam com o #ForaTemer e a convocação de eleições gerais, que são igualmente contra o adesismo ao lulismo e ao sectaris-mo do isolacionismo e defendem a cons-trução de um terceiro campo. Em sua fala, Adriano, da CST, enfatizou que defendem o #ForaTemer, mas não o #VoltaDilma.

Nanci, representando a Luta Socia-lista, fez menção a uma crise de direção na esquerda e a necessidade de apresen-

tar uma alternativa ao PT, que teria se transformado na nova direita. Em nome do MES, Samia fez menção especial às mulheres que lu-taram contra a cultura do es-tupro, Cunha e o ajuste fiscal e travam lutas contra o go-verno reacionário de Temer. Pelo MRT falou Diana, que considerou o golpe um di-visor de águas na esquerda, expressão da crise do popu-lismo na América Latina, e colocou-se contra o “neor-reformismo” do Syriza, na Grécia, e do Podemos, na

Espanha.

O MTST enviou ao encontro uma nota assinada por sua coordenação, di-zendo que consideravam a nova organiza-ção uma aliada e essa parceria deveria se aprofundar. Também foi lida uma nota da Construção Socialista.

Em seguida, foi aberto outro bloco de falas: Gisele, militante de Belém, re-presentando a região norte, que criticou a construção da usina de Belo Monte; Jés-sica Milaré, mulher trans, que defendeu o socialismo, a revolução, a livre orientação sexual e de gênero; Renato Bento, meta-lúrgico de São José dos Campos, que de-nunciou contratações da General Motors em São José dos Campos pela metade do salário; e Matheus Gomes, jovem negro de Porto Alegre, que denunciou o racismo e o genocídio da juventude negra.

Antes das falas finais, houve uma apresentação do grupo de teatro Galpão, que representou duas cenas, adaptações li-vres de Bertold Brecht. Na primeira, Dil-ma e a empreiteira Odebrecht enganavam o povo; na segunda, o Exército reprimia e torturava uma presa política.

Posteriormente, Silvia Ferraro, pro-fessora da rede estadual de educação de SP e candidata à prefeita de Campinas em 2012, fez a penúltima fala do ato. Come-çou dizendo que os ventos de junho de 2013 apontavam a luta por mais direitos, por mais escolas e menos estádios, e que o governo do PT não teve condições de re-compor seu prestígio. Dilma disse que não

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retiraria direitos “nem que a vaca tussa”, mas teria feito o oposto. Para ela, o gol-pe mostra que as classes dominantes “não perdoam os serviçais que não cumprem bem o seu serviço”, em referência a Dil-ma e Lula, que teriam aberto o caminho para a reação. Criticou duramente as ma-nifestações da direita como manifestações da casa-grande [muitos aplausos], afir-mou “comemos pão com mortadela, sim” [aplausos] e disse que as camisas amarelas estampadas com uma mão com quatro de-dos suja de expressava o pensamento da burguesia de que “um operário, a classe operária não poderia nunca mais governar o país” [pouquíssimos aplausos].

Para Ferraro, os trabalhadores não quiseram ser liderados pela direita e não se sentem representados pela FIESP; se sentiram órfãos e não houve comemora-ção na “quebrada” na votação do impe-achment. Disse, ademais, que o PT não conseguiu acabar com o instinto de classe dos trabalhadores e Dilma teria cavado a própria cova. Conclamou a todos e todas para, sempre que começarem um discurso dizerem: “primeiramente, Fora Temer!”, mas mantendo-se contra o #VoltaDilma e defendendo eleições gerais já. Eles teriam como tarefa construir um terceiro campo, apresentando uma alternativa nas elei-ções, mas enfatizando que eleições não são o horizonte, e sim a revolução. Encer-rou convocando todos à luta para derrubar Temer, a burguesia e os conciliadores.

O último a falar foi Valério Arcary. Chamou a atenção o fato de que o público fez mais silêncio que nas falas anteriores e quem seguia conversando recebia dos demais uma advertência. Arcary iniciou dizendo que o padrão das cisões na his-tória da esquerda são a não discussão de ideias, as acusações morais, as expulsões por diferenças políticas, escândalos por anos, inimizades eternas; que sabiam ser perigoso constituir-se como tendência in-terna do PSTU, pois as diferenças eram grandes; que foram publicados 75 bole-tins de debate interno, o que equivaleria a seis grandes volumes: “Nós não fizemos um pré-congresso, nós construímos uma biblioteca”, ironizou.

Avaliando que a organização se en-

contrava dividida no meio, propuseram um cessar fogo e um debate na LIT-QI que melhor seria uma experiência em separa-do, resultando em uma negociação e uma divisão respeitosa. Disse que consideram o PSTU uma organização revolucioná-ria, que não ficou menos revolucionária porque não estavam mais lá, pois não se consideram os únicos revolucionários. Afirmou a intenção de que a constituição dessa nova organização seja a conver-gência para os revolucionários no Brasil, avaliando que para a abrir caminho para a unificação seria necessária a divisão. Con-siderou que seria melhor não ter sido as-sim, pois a divisão do PSTU foi uma der-rota, mas caíam, se levantavam, sacudiam a poeira e davam a volta por cima; e não responsabilizam unilateralmente a maio-ria da direção do PSTU pelo que ocorreu.

Disse que para defender a continui-dade do rigor teórico, da adesão aos prin-cípios e da flexibilidade tática seria neces-sário dar um passo em frente e que a nova organização, pequena, de quadros, sofreria pressões terríveis. Segundo Arcary, gran-de parte das organizações revolucionárias foram destruídas pois subestimaram que a democracia burguesa é a doença infantil do oportunismo; sucumbiram às pressões burocráticas dos aparatos sindicais; não compreenderam a LGBTfobia, a luta das mulheres e que não seriam aceitáveis con-dutas machistas dentro das organizações; sucumbiram ao academicismo e ao anti--intelectualismo. Por outro lado, afirmou que eles não haviam caído no caldeirão da poção mágica, que ninguém é imune, mas que se fossem humildes, íntegros e hones-tos poderiam se corrigir uns aos outros, fazer mais e melhor.

Lembrou que, quando viviam um momento mais intenso da luta interna, em uma plenária deles em São Paulo, Paulo Aguena, o Catatau, pediu coragem, con-fiança e esperança. “É o que eu paço a vo-cês hoje”, disse Arcary. Depois de consi-derar que as batalhas decisivas ainda não ocorreram, falou que a manipulação da Folha de São Paulo indicava a embriaguez da burguesia com a vitória que tiveram e o medo de que circulasse a informação de que a maioria da população quer a anteci-

pação das eleições. Neste momento, reite-rou que nenhuma organização revolucio-nária é um fim e si mesmo, que não são os únicos e criticou os que pensam assim.

Em seguida, disse que a maioria da direção do PT teria cedido ao apetite e a própria burguesia brinca que a profissão mais perigosa hoje seria a de tesoureiro do PT. Mas a burguesia não teria corrompido apenas os dirigentes, mas também milha-res de ativistas, pois desenvolveu-se na esquerda um “apetite feroz por posições, cargos e prestígio”.

Depois de falar da necessidade da co-ragem para enfrentar os inimigos, disse que ter confiança no outro é difícil, que quando se é criança é muito mais fácil, mas que re-constituir relações de confiança é vital para construir um instrumento revolucionário, pois nele não há lugar para dissimulação, não havendo regime interno saudável sem o direito de expressar opinião e lutar por suas ideias. Considerou que tal instrumento é uma fortaleza que deve ter muralhas para se proteger dos inimigos, mas que se fos-sem muito altas não conseguiriam se ligar aos trabalhadores, gerando o risco da mar-ginalidade e o vício sectário.

Falando da esperança, considerou o proletariado brasileiro do século XXI maior e mais forte que o da geração an-terior e afirmou ter acabado o tempo dos líderes infalíveis e messiânicos, pois era chegado a etapa dos coletivos, com porta--vozes controlados, onde ninguém é mais importante que o outro, com lugar para jo-vens, operários, mulheres, negros, LGBTs e intelectuais. Falou que a nova organiza-ção não prometia nada, a não ser um senti-do para as suas vidas, abraçados ao projeto da revolução mundial.

Encerrou dizendo que foi solicitado a responder uma pergunta: vale a pena? De-pois de algumas considerações sobre o que motiva cada um a lutar, disse que eles não têm nada a perder e encerrou dando vivas à revolução brasileira e à 4ª Internacional.

O ato foi encerrado com todos can-tando a Internacional.

* Rodrigo Cesar é historiador e militante do PT.

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Ollanta Humala: crônica de um “gran desengaño”

José F. Cornejo*

El pasado 28 de julio el Presidente pe-ruano Ollanta Humala cedió su cargo

al nuevo Presidente electo Pedro Pablo Kuczynski, poniendo fin a cinco años de gobierno que generaron en el 2011 grandes esperanzas de cambio en el Perú y en la re-gión y que han concluido el 2016 con un gran desengaño.

El candidato de la Gran Transformación

La transición democrática en el Perú se caracterizó por alcanzar altas tasas de crecimiento económico, favorecidas por los altos precios internacionales de las ma-terias primas, pero con una redistribución profundamente desigual y excluyente. A pesar de que el Perú triplicó su PIB en diez años, el coeficiente de Gini no bajaba del 0,6%. La figura política del ex comandante Humala había despegado en las eleccio-nes presidenciales del 2006, cuestionan-do este modelo de crecimiento neoliberal excluyente, posicionándose como un can-didato nacionalista de izquierda, con un programa de “La Gran Transformación” y declarando su empatía con los gobiernos progresistas en la región.

En las elecciones del 2011 Ollanta Humala fue elegido finalmente presidente con una política de alianzas con sectores de centro derecha que le permitieron alcanzar la victoria definitiva en el ballotage de la segunda vuelta. Obligado a moderar algu-nas de sus propuestas de cambio más ra-dicales para garantizar la gobernabilidad y enfrentar la campaña desestabilizadora de la derecha neoliberal renuente a aceptar su derrota electoral. El gobierno de Humala, sin embargo, disponía aún de un amplio es-

pacio político para avanzar en algunas re-formas económicas básicas de su programa de gobierno. Contaba con la legitimidad electoral, disponía de una mayoría políti-co en el Congreso en alianza con partidos de centro derecha, del apoyo de amplios movimientos sociales y sindicales, de la simpatía de un sector de la prensa y de la confianza de las Fuerzas Armadas.

Brasilia Durante su campaña electoral, Ollan-

ta Humala había manifestado la necesidad de fortalecer los vínculos estratégicos con Brasil para garantizar el desarrollo soste-nible y la seguridad de la Amazonía. Esta región, que constituye la frontera más ex-tensa del Perú, es la menos desarrollada y cuenta con una débil presencia del estado lo que ha favorecido el crecimiento del nar-cotráfico y de la minería informal generan-do graves problemas a la seguridad nacio-nal en ambos países. Además, el Presidente Humala había alabado el modelo econó-

mico y social brasileño, manifestando su simpatía con los programas de inclusión social desarrollados por los gobiernos del PT que él se comprometía a llevar adelante en el Perú. En su primera gira por la región como Presidente electo, Humala visita en primer lugar Brasilia para ratificar su vo-luntad de establecer una alianza estratégica con Brasil y hacer del eje Lima Brasilia el pivote de una integración regional sudame-ricana que vincule el Atlántico con el Pa-cífico en miras a una asociación equitativa con las emergentes economías asiáticas y en particular con China.

El giro a la derechaPero nada de esto fue lo que ocurrió.

La rapidez con la que el gobierno de Huma-la abandonó sus promesas de reformas y a sus aliados de izquierda nacionales y regio-nales fue sorprendente. En menos de seis meses los técnicos y asesores de izquierda aglutinados en el primer gabinete, dirigido por Salomón Lerner, fueron separados del

O texto a seguir é de um militante da esquerda peruana, com o qual Página 13 mantém intercâmbio frequente. Sem que isto signifique necesariamente acordo com suas opiniões, encomendamos a ele um artigo de balanço sobre o governo Ollanta Humala, que encerrou em julho seu mandato. O artigo será publicado como veio, na língua de Cervantes. Aos que considerarem difícil a leitura, recomendamos: tentar vale a pena. Se nosso futuro passa pela América Latina e Caribe, vale o esforço de aprender a ler e falar na língua em que foi escrito a aventura do grande Dom Quixote de La Mancha.

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gobierno por su oposición al proyecto mi-nero de Conga que revertía las promesas electorales ambientalistas que había hecho Humala como candidato. Esta ruptura coin-cide con el viaje del Presidente Humala a la Cumbre del Foro Económico Asia Pacífico (APEC) en Hawái en noviembre del 2011, en la que el Presidente Obama presenta el Acuerdo de Asociación Trans Pacífico (TPP). Al giro a la derecha expresado en la política interna se sumará un movimiento similar en la política exterior. El Ministro de Comercio peruano, respaldado por el Presidente Humala, defenderá entusiasta-mente el TPP ante el Congreso exigiendo su rápida aprobación. A partir de esa fecha las energías diplomáticas del Perú se orien-taran a fortalecer la Alianza del Pacífico y el TPP, abandonando la promesa de una alian-za estratégica con Brasil para desarrollar la integración sudamericana que embrionaria-mente se empezaba a forjar en la UNASUR.

Su rápido giro a la derecha sacó a la luz las debilidades institucionales de un proyecto de transformación que reposa-ban excesivamente sobre una sola persona. Ollanta Humala, desde su ingreso en políti-ca en el año 2006, nunca estuvo interesado en construir una organización política mí-nimamente estructurada y con mecanismos de decisión colectivos. Organizó alrededor suyo diferentes círculos de consejeros pero mantuvo siempre un manejo cerrado, casi familiar, de la toma última de decisiones en la que jugaría un rol primordial y nefasto su esposa Nadine Heredia. Los grupos de poder derrotados en las elecciones hicieron presión y obtuvieron rápidamente concesio-nes en el manejo de la política económica al conseguir el nombramiento del Ministro de Economía y la continuidad en la dirección del Banco Central de Reserva. Luego de la ruptura con sus asesores de la izquierda fue cediendo progresivamente a los cantos de sirena empresariales que le garantizaban la continuidad de la inversión y del crecimien-to económico para que su gobierno se dedi-cara a llevar adelante los programas de in-clusión social prometidos. Su alineamiento

en política internacional sería coherente con esta opción de continuismo con el modelo económico neoliberal a nivel nacional.

Su formación militar, que algunos veían como la posibilidad de un liderazgo firme y carismático, terminó convirtiéndo-se en un lastre que sacó a relucir su inha-bilidad para la conducción política. Ante la contestación por su giro a la derecha en el seno de su bancada política, el presidente Humala no tuvo otro discurso que pedir una obediencia ciega a sus decisiones y exigir de sus parlamentarios, como si estos fueran sus soldados, “disciplina y lealtad”. Su gru-po parlamentario progresivamente se fue reduciendo de 47 parlamentarios iniciales a solamente 26 incondicionales al culminar su gestión. Al no presentar candidatos en las recientes elecciones, su partido político (el Partido Nacionalista) desaparece del esce-nario político peruano.

Esta falta de capacidad de dirección política se expresaría también en su con-ducción del gobierno que tiene el record de haber tenido siete consejos de ministros en un mismo período presidencial, graficándo-se así el carácter errático, mediocre y desor-denado de su gestión. El Presidente Humala se contentaba en hacer declaraciones públi-cas retóricas mientras que los problemas so-ciales y de inseguridad se iban acumulando. Diversas denuncias de casos de corrupción de algunos de sus colaboradores cercanos terminarían de hundir los índices de apro-bación de su gestión a niveles que bordean el 20%.

Ante los primeros signos de desace-leración económica a partir del 2013, el gobierno de Humala capitula y se entrega completamente en las manos de los gru-pos de poder que insistían desde un inicio en mayores medidas desregulatorias para facilitar sus inversiones. Con un paquete de reformas neoliberales presentadas en el 2014 como “reactivadoras” de la economía, se consuma la captura total del estado por los grupos económicos que habían perdido las elecciones en el 2011.

La ruptura de la integración sudamericana

Para finalizar es necesario subrayar el rol discreto pero fundamental que cumplió la diplomacia de los EEUU en el giro po-lítico conservador del gobierno del Presi-dente Humala. La alianza estratégica entre Lima y Brasilia, para fortalecer el control soberano de la Amazonía y propulsar la integración sudamericana construyendo puentes del Pacífico al Atlántico, fue vista por Washington como una amenaza mayor a su hegemonía en nuestra región. Desde un inicio los esfuerzos diplomáticos injeren-cistas de la Embajada americana estuvie-ron dirigidos a bloquear la posibilidad de una política antidrogas conjunta con Brasil. Luego de haber perdido la base ecuatoria-na de Manta, los EEUU no podían aceptar perder también su presencia militar en el Perú. A inicios del 2012 obtienen la salida de la dirección de DEVIDA (la institución que rige la política sobre drogas en el Perú) de Ricardo Soberón, experto de izquierda en temas de narcotráfico, reemplazándo-lo por una persona cercana a la Embaja-da americana. Posteriormente los EEUU consiguieron frustrar la compra de aviones Tucanos a Brasil, el gobierno de Humala optó por aviones de Corea del Sur, derrum-bando así toda posibilidad de avanzar en una cooperación militar entre Perú y Brasil para el control soberano de la Amazonía. Finalmente el Lavo Jato no sólo fue utili-zado para encubrir el golpe parlamentario en contra de la Presidenta Dilma, también fue utilizado para iniciar el desprestigio a la presencia de las empresas brasileñas en el Perú, destruyendo así los lazos económi-cos que en los pasados años se venía desar-rollando entre nuestros países, rompiendo al mismo tiempo la columna vertebral de una posible integración sudamericana.

*José Cornejo é militante da esquerda peruana. O artigo foi escrito em Lima (Peru), em julho de 2016.