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SETEMBRO 2011 / PLACAR / 95 No Rio, não sou levado a sério. Eu joguei muito no Vasco, mas não fui bem no Flamengo. E todos os formadores de opinião de lá são flamenguistas. Em São Paulo, me respeitam mais. © FOTO RENATO PIZZUTTO

O Animal ainda rosna

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Entrevista com o ex-jogador Edmundo

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setembro 2011 / placar / 95

No Rio, não sou

levado a sério. Eu

joguei muito no

Vasco, mas não fui

bem no Flamengo.

E todos os

formadores de

opinião de lá são

flamenguistas.

Em São Paulo, me

respeitam mais.

© foto renato pizzutto

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batebola

Hoje comentarista, Edmundo dinamita os bons

moços do futebol e descarta uma despedida

pelo Vasco contra o flamengo no brasileirÃo

por BrEILLEr pIrES

O Animal ainda rosna

P| Você tem adotado um perfil

comportado como comentarista

de TV. Amansaram o Animal?

R| Pra falar a verdade, eu sempre

fui uma pessoa tranquila. Dentro de

campo eu era rebelde. Queria ganhar

a qualquer preço, e os nervos estão

sempre à flor da pele quando você

está jogando. Eu acabava extrapo-

lando em alguns momentos. Mas

agora estou com 40 anos. A veloci-

dade com que penso e faço as coi-

sas é menor. Estou sossegado e sa-

tisfeito com meu modo de ser.

P| Mas você costuma evitar

os temas polêmicos...

R| Quando uma pessoa se omite pa-

ra não criar polêmica, ela deixa de

ser autêntica. Eu sou comentarista

de futebol, estou na Band para co-

mentar futebol. Se existe uma polê-

mica de pênalti, eu vou dizer se foi

pênalti ou não. Nunca gostei que fa-

lassem da minha intimidade. Aceita-

va qualquer crítica ao meu futebol. E

hoje é natural que eu não me meta

na vida pessoal dos outros.

P| O futebol está politicamente

correto demais?

R| Lembra o passinho à frente do

Nilton Santos na Copa de 62 para en-

ganar o juiz? Aquilo é maravilhoso.

Eu mesmo dava um empurrãozinho

no zagueiro antes de subir para ca-

becear. Hoje cada estádio tem dez

câmeras, a televisão repete o lance

mil vezes, o jogador é punido porque

não pode isso, não pode aquilo... Mas

pode, porra! O futebol brasileiro per-

deu sua essência, aquela malícia

que os europeus não têm.

P| Você não teve um jogo

de despedida no Vasco...

R| Não fui a favor da primeira ideia

que o pessoal do Vasco me passou,

que era jogar o último jogo do Brasi-

leiro deste ano contra o Flamengo,

em São Januário. Não aceitei porque

existe muita rivalidade. O Flamengo

pode estar disputando o título, o

Vasco também. Sem contar que eu

teria que treinar pra caramba, entrar

em forma. Não vou querer jogar por

jogar, só para fazer número. Mas

provavelmente ainda vamos voltar a

conversar sobre essa possibilidade.

P| Se arrepende de ter jogado

no Flamengo em 95?

R| Me arrependo de ter ido para o

Flamengo. Eu estava muito bem no

Palmeiras, com um monte de pro-

postas para ir para fora. Cheguei ao

Flamengo e nada deu certo.

P| Se aquela final do Brasileiro

de 97 fosse hoje, você torceria

por quem: Vasco ou Palmeiras?

R| Fui para o Palmeiras com 20 e

poucos anos e tenho um carinho

enorme pela torcida. Fico dividido

entre o amor de mãe e o amor de mu-

lher. Um clube eu conheci quando

nasci; o outro, só quando adulto. Eu

seria hipócrita em esconder que o

Vasco é a minha casa.

P| Há pouco tempo você foi

preso por causa do acidente de

carro em 95. O que passou pela

sua cabeça quando soube que

estava foragido?

R| Exageraram por causa do meu

rótulo. Como alguém pode ser consi-

derado foragido dentro da própria

casa? Se a polícia não tinha meu en-

dereço, não é problema meu. Eu não

iria sair batendo nas delegacias pa-

ra dizer onde moro.

P| E as acusações de que

estaria alcoolizado no acidente?

R| Esse boato foi plantado na mídia.

Daí as pessoas acabam acreditando

que eu estava bêbado e causei o aci-

dente. Mas, ao longo dessa vida de

20 e poucos anos de disposição,

aprendi que, quando tem notícia

ruim, é melhor a gente não ver. Sim-

plesmente não vi nada do que fala-

ram sobre a prisão. Foi cansativo

passar a noite na delegacia, cum-

prindo todos os procedimentos for-

mais, mas fui muito bem tratado lá.

P| A repercussão do caso pela

imprensa o surpreendeu?

R| Os jornais publicam o que não

têm certeza. Logo após o episódio, o

jornal Extra deu: “Edmundo, livre da

prisão, vai pra balada na casa de Ro-

naldinho Gaúcho”. Mas eu tinha ido

ao apartamento do meu amigo Ro-

naldo, que nem gaúcho é, no mesmo

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batebola

gols, quem batia falta e pênalti no ti-me, quem seria o capitão...P| Mas já brigaram por mulher?R| Até que por isso não. Mas tam-bém rolava uma competição. Chegá-vamos a uma festa juntos e aparecia uma mulher bonita? Ele queria, e eu também. Era páreo duro.P| O Romário demonstra uma posição crítica em relação à CBF no Congresso. É fachada ou ele realmente nunca gostou do Ricardo Teixeira?R| Não é fachada, não. Depois da

Copa de 94, ele ficou uns três anos fora da seleção, porque ele queria ganhar um percentual das cotas de publicidade da CBF. O Romário está me surpreendendo como deputado. P| E você, o que pensa sobre CBF e Ricardo Teixeira?R| Quando o Ricardo pegou a CBF, a instituição estava falida. Hoje é uma das entidades mais fortes do mun-do. Ele tem seus méritos. Só que eu acho que a CBF precisa ser de domí-nio público. O cargo de técnico da seleção só perde para o de presiden-te. Não é justo que só uma pessoa escolha esse nome, que o dinheiro da seleção vá para cofres privados.P| E a dívida que o Luxemburgo teria com você?R| Emprestar dinheiro para ele foi um erro. Em 96, nos encontramos num restaurante em São Paulo. Ele disse que precisava de dinheiro pa-ra fazer investimentos lá no Sul. O Djalminha emprestou uma quantia, e eu emprestei 400 000 reais. Ele pa-gou o Djalma, mas não me pagou. Co-brei mais de 50 vezes. Mas, durante certo período, ele conseguia me en-rolar. Era técnico da seleção e do Co-rinthians, ia prometendo que me le-varia para trabalhar com ele. Eu liga-va e ele atendia: “Oi, Edmundo, meu irmão, tudo bem? Eu tô aqui em tal lugar, oi, oi...” e pum!, caía a ligação. Depois eu telefonava para o mesmo número e não existia mais. Quando o levei na Justiça, ele desceu a lenha, falou que eu era mau-caráter e ban-dido. Já ganhei o processo, agora só falta achar alguma coisa em nome dele para executar, né? Antes, ele me tinha como filho, dizia que eu era o melhor jogador do mundo, que, se tivesse o Edmundo no time dele, se-ria campeão. Por isso, eu fico chate-ado e não faço acordo. Com os juros, ele já me deve 2 milhões de reais.

prédio do Ronaldinho, porém em ou-tro bloco. É falta de responsabilida-de, sacanagem! Depois eles ficam putos quando me ligam. “Edmundo, aqui é fulano do jornal tal...” Antes de terminarem a frase, eu já desligo.

P| O peso da fama de “Animal” atrapalha nessas horas?R| Se o Kaká bater no meu carro pa-rado na rua, o culpado sou eu. Adoro o Ronaldo, mas imagina se fosse eu que tivesse sido pego com travesti, com drogas? Eu sairia preso. O Ro-naldo não, coitado, “se enganou” — e deve ter se enganado mesmo. Ele tem o rótulo de pessoa boa. Eu já rea lizei um monte de ação benefi-cente, dei casa para todo mundo da minha família e nunca fiz questão de divulgar. Cansei de ver atleta de Cristo na balada bebendo cerveja em latinha de refrigerante. O cara um pouquinho mais culto, que fala duas línguas, é craque por aqui. Eu joguei mais que o Kaká, que o Leo-nardo, que o Raí... Mas eles são boni-tinhos, falam duas línguas, diferente do estereótipo da maioria dos joga-dores que fala “nóis vai, nóis foi”. Te-nho até vergonha de dizer que sou ex-jogador. Eu sou comentarista. P| Como lida com as notícias sobre a sexualidade de seu filho Alexandre (com a ex-modelo Cristina Mortágua)?R| Encaro com naturalidade. O pai precisa apoiar os filhos. Ele nunca falou comigo abertamente sobre is-so. Até por vergonha ou por falta de intimidade. É uma coisa de foro ínti-mo, que a pessoa faz entre quatro paredes. Mas eu não sou bobo e já percebi. Não vai faltar oportunidade para conversarmos. Já joguei com um goleiro que era gay e não teve problema. Era um cara sensacional. P| A concorrência com o Romário ainda existe?R| Nunca briguei com o Romário ca-ra a cara. Era sempre via imprensa. Meu negócio com ele era no campo. A gente disputava para provar quem jogava mais, quem marcava mais

© foto renato pizzutto

Dizem que o Kléber é o novo Edmundo. Eu era dez vezes melhor. Vejo mais características minhas no Neymar: rápido, driblador.

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Edmundo analisa sua carreira através das capas de PLACARhttp://www.abr.io/1KZH

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