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CENTRO UNIVERSITÁRIO DE BELO HORIZONTE Janaina Germano Figueiredo O COLAPSO ESTATAL SOMALI E A AÇÃO DE PIRATAS NO CHIFRE DA ÁFRICA Análise da situação somali à luz da teoria de Estados falidos como causa dos ataques piratas no Oceano Índico Belo Horizonte 2010

O COLAPSO ESTATAL SOMALI E A AÇÃO DE PIRATAS … · população agindo de acordo com os interesses dos senhores da guerra. ... mesmo que se tenham transformado em navios ou aeronaves

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CENTRO UNIVERSITÁRIO DE BELO HORIZONTE

Janaina Germano Figueiredo

O COLAPSO ESTATAL SOMALI E A AÇÃO DE PIRATAS NO

CHIFRE DA ÁFRICA

Análise da situação somali à luz da teoria de Estados falidos como causa dos

ataques piratas no Oceano Índico

Belo Horizonte

2010

1

Resumo:

O artigo busca defender a hipótese de que a pirataria que vem ocorrendo no Chifre da África

é resultado do colapso estatal na Somália. Para tanto, utiliza como embasamento teórico

acerca da pirataria o postulado pela Convenção das Nações Unidas Sobre Direito do Mar

(1982), e o de Estados Falhados feito por autores como Rotberg (2002) e Jackson (1990), bem

como a metodologia utilizada pelo Failed States Índex.

Desta forma, busca-se analisar a situação do país africano em relação a cada variável, de

forma a demonstrar o vácuo de poder existente na região. Através da análise do caso somali,

país que se encontra em situação mais alarmante no Cenário Internacional em relação à

detenção de poder por parte do Estado para o Failed States Index, busca demonstrar que é

necessário restabelecer a legitimidade do Estado somali para que as bases sociais do país

sejam também restabelecidas e a comunidade internacional deixe de estar à mercê de uma

população agindo de acordo com os interesses dos senhores da guerra.

Palavras – chave:

Somália, Estados Falhados, Estados Colapsados, Quase Estados, Chifre da África,

Pirataria

2

Abstract:

The present article aims to support the hypothesis that piracy practiced in the Horn of Africa

is a result of state collapse in Somalia. With this intention, utilizes theoretical framework

made by the United Nations Convention on Law of the Sea about Piracy (1982) and about

Failed States made by authors such as Rotberg (2002), and Jackson (1990), as the

methodology used for the Failed States Index.

It analyses the situation of the African country in relation to each variable, in order to

demonstrate the lack of power in the region. Through the Somali case analyses, the country in

most alarming situation at the International Scenario about the detention of power by the state

for the Failed States Index, intends to demonstrate that it is necessary to reestablish the

legitimacy of the Somali State so that the social bases of the country are restored and the

international community is no longer vulnerable to a population acting in accordance with the

interests of warlords.

Key Words:

Somalia, Failed States, Collapsed States, Quasi States, Horn of Africa, Piracy

3

1 Introdução:

O presente artigo tem por objetivo investigar a hipótese de que a pirataria no Chifre da África

é uma conseqüência da falência estatal da República Somali. A versão defendida é a de que

uma vez que o governo é incapaz de coagir, punir ou oferecer diferentes oportunidades de

trabalho e vida aos cidadãos, estes acabam por ver a pirataria como uma alternativa a ser

considerada.

A definição de pirataria utilizada é a postulada no artigo 101 da Convenção das Nações

Unidas Sobre o Direito do Mar como “todo ato ilícito cometido pela tripulação ou passageiros

de navios ou aeronaves privados contra um navio ou uma aeronave e pessoas e bens a bordo

dos mesmos estando estes em alto-mar ou em um lugar não submetido à jurisdição de um

Estado” (Convenção das Nações Unidas Sobre o Direito do Mar – 1982). Constitui também

todo ato de participação voluntária na utilização de um navio ou de uma aeronave, quando

aquele que o pratica tenha conhecimento de fatos que dêem a esse navio ou a essa aeronave o

caráter pirata ou toda ação que tenha por fim incitar ou ajudar intencionalmente a cometer um

dos atos enunciados.

A Terceira Conferência das Nações Unidas, que aconteceu em 1982, em Montego Bay, na

Jamaica, elaborou a Convenção das Nações Unidas para o Direito do Mar, que possui

colocações de extrema importância para o tema entre os artigos 100 e 107. No primeiro deles,

coloca-se o dever dos Estados de cooperarem para a repressão da pirataria; o artigo 101 define

pirataria, como exposto acima; os artigos 102 e 103 se destinam a deixar claro que qualquer

aeronave ou navio destinados aos fins mencionados serão considerados piratas enquanto se

encontrarem no controle dos culpados pelos atos.

De acordo com o artigo 104 navios ou aeronaves podem conservar as suas nacionalidades,

mesmo que se tenham transformado em navios ou aeronaves piratas, devendo a conservação

ou a perda da nacionalidade ser determinada de acordo com a lei do Estado ao qual esteja

atribuída tal nacionalidade. O artigo 105 dá a todos os Estados o direito de apresar um navio

ou aeronave pirata, prender as pessoas e apreender os bens que se encontrem a bordo, desde

que tragam sinais claros de que estão a serviço de um governo e tenham autorização para

tanto, como colocado posteriormente no artigo 107. Os tribunais do Estado que efetuar o

4

apresamento podem decidir as penas a aplicar e as medidas a tomar no que se refere aos

navios, às aeronaves ou aos bens sem prejuízo dos direitos de terceiros de boa fé. No artigo

106, postula-se que quando um navio ou uma aeronave for apresado por suspeita de pirataria

sem motivo suficiente o Estado que o apresou será responsável, perante o Estado de

nacionalidade do navio ou da aeronave, por qualquer perda ou dano causados por tal ato.

No desenvolvimento do artigo, há uma breve explanação acerca de outras formas de pirataria

marítima e suas semelhanças e diferenças da que é atualmente praticada. Os fatores

geopolíticos da região são abordados uma vez que o Chifre da África é rota para o Mar

Vermelho e Canal de Suez; sua conexão com o Golfo de Adem faz com que passe por ali boa

parte do petróleo extraído na região, especialmente no Irã.

Ao colocar a política somali em foco, além de um breve histórico do que ocorreu e tem

ocorrido com o país, dados atualizados demonstram empiricamente que o país se aplica è

definição de “Estado Colapsado”, dentro da teorização feita por autores como Robert Rotberg

(2002), Gross (1996) e Zartman (1995) e de “Quase Estado”, de Robert Jackson (1990),

estando no topo do ranking do Failed States Index.

Embora muitos estudiosos tenham buscado teorizar acerca de falha estatal, não há uma

definição utilizada como padrão. O assunto passou a ter mais destaque no meio acadêmico e

político a partir dos anos 90, embora já fosse abordado por Robert Jackson (1987) de forma

muito similar com a nomenclatura de “Quase Estado” desde 1987. Jackson, tendo como foco

central de seu trabalho a soberania, denomina “Quase Estados” aqueles, que segundo o autor,

são provedores de uma soberania negativa, em oposição à soberania positiva que surge na

Europa durante a formação do chamado Estado moderno.1

Uma definição muito aceita é a feita por Zartman (1995), que defende que a falha é

caracterizada quando as funções básicas do Estado não são mais cumpridas. O State Failure

Task Force, um dos estudos mais extensos acerca do tema, comissionado pelo governo

americano em 2002, liga a falha estatal ao alto número de conflitos internos nas diferentes

regiões do globo, podendo tais conflitos ter a forma de guerras revolucionárias, guerras

1A estrutura dos Estados está diretamente ligada à Paz de Westphalia, acordo assinado em 1648 que foi definido por Krasner (1999) como: “arranjo institucional para a organização da vida política que é baseado em dois princípios: territorialidade e a exclusão de atores externos das estruturas de autoridade domésticas.”

5

étnicas, genocídios e politicídios ou mudança de regime abrupto, estando o caso somali ligado

a esta última. Fukuyama (2002) afirmou em seu trabalho que, desde o fim da Guerra Fria,

Estados fracos e/ou falhados são o problema de maior importância da Ordem Internacional.2

Outro importante estudo acerca do tema foi feito por Gross (1996), que analisa Estados

Falhados enfatizando tanto a capacidade de coerção quanto a capacidade não coercitiva de

provimento de serviços públicos. O autor considera cinco fatores como importantes causas

para a existência de Estados Falhados: fraco desempenho econômico, falta de sinergia social,

autoritarismo, militarismo e a degradação ambiental causada pelo crescimento populacional.

O autor estabelece cinco tipos de Estados Falhados: Estados anárquicos, fantasmas, anêmicos,

capturados e abortados. Dentro de tal divisão a Somália se enquadra em Estado falido

anárquico, uma vez que não possui governo centralizado ou os meios de coerção para garantir

a segurança interna.

Robert Rotberg (2002), por sua vez, considera “Estado Falhado” aquele que não mais

proporciona bens políticos positivos à população, perdendo legitimidade a partir do momento

que deixa de possuí-la na visão dos cidadãos de tal Estado. Segundo a análise feita pelo autor

em 2002 havia, nesta década, sete Estados que exemplificariam a situação de Estado Falhado,

sendo eles: Afeganistão, Angola, Burundi, Libéria, Serra Leoa, Sudão e República

Democrática do Congo. Tendo ido além e se mantido numa situação ainda mais alarmante, a

República da Somália seria a única a exemplificar um Estado Colapsado. O autor afirma que

um Estado se torna falhado quando a violência se torna generalizada, resultando comumente

numa guerra civil; quando as condições de vida se deterioram massivamente; quando a infra-

estrutura da vida cotidiana decai e quando a gana daqueles que criam as regras se sobressai às

responsabilidades de melhorar a vida da população e daquilo que a cerca.

Rotberg (2002) postula que todo Estado Falhado apresenta falta de harmonia entre as

comunidades, o que geralmente é herdado de diferenças étnicas, lingüísticas ou outra

característica interna que gera inimizade. O medo do outro costuma gerar hostilidade entre

entidades criadoras de regras e entidades menos favorecidas ou subordinadas. A avareza de

governantes é, também, segundo ele, motivo muito comum de antagonismos, muitas vezes

2 Segundo Fukuyama (2002), Estados Falhados são a raiz de muitos dos problemas atuais, como pobreza, terrorismo e tráfico de drogas.

6

estimulada pelo descobrimento de recursos naturais como petróleo ou minas de diamantes,

como no caso de Serra Leoa.3

Na teorização feita por Rotberg (2002), Estados Falhados não possuem controle sobre suas

fronteiras, perdendo autoridade em regiões espalhadas de seu território; o poder oficial

costuma estar restringido à capital e uma ou mais zonas éticas específicas. Uma das medidas

da gravidade da falha de um Estado, segundo ele, é quanto de sua extensão geográfica o

governo genuinamente controla. Outro forte indício da falha estatal, ainda segundo Rotberg

(2002), é o crescimento desenfreado de violência criminosa. As ruas são geralmente tomadas

por gangues e sindicatos criminosos e o tráfico de drogas e armas se torna mais comum ao

passo que as forças policiais não mais possuem poder. Uma vez que a anarquia toma conta do

ambiente, é comum que cidadãos procurem senhores da guerra ou outras figuras que

representam sua etnia ou que tenha interesses em comum de forma a se proteger. Como

resultado desta cadeia de acontecimentos, argumenta Rotberg (2002), os senhores da guerra

ou outros atores não estatais passam a assumir diversos papéis do Estado, uma vez que o

Estado em questão não mais tem capacidade de atuar oferecendo aquilo que é intrínseco a

Estados nacionais do mundo moderno.

Segundo Rotberg (2002), o objetivo central dos Estados modernos é a manutenção da

segurança, bem que não mais é oferecido por tais Estados, tornando óbvia a falha estatal

mesmo antes da insurgência de grupos rebeldes. Além, as instituições estatais, se existentes

são extremamente fracas, sendo o executivo o único a funcionar. Cidadãos sabem não poder

contar com o sistema judiciário, que deriva do executivo ao invés de ser independente. A

corrupção costuma estar presente em níveis destrutivos e a inflação também é fator presente.

O autor coloca que a infra-estrutura é tipicamente destruída ou deteriorada, sendo a

manutenção de estradas quase sempre deixada de lado. O Produto Interno Bruto (PIB) é muito

baixo e sistemas de saúde e educação estão geralmente em níveis de deterioração alarmantes

ou foram privatizados, sendo livros e medicamentos de acesso muito difícil. A mortalidade

infantil aumenta, a expectativa de vida cai, epidemias como a Acquired Immune Deficiency

Syndrome (AIDS) tomam conta do sistema de saúde existente e a população pobre passa a ter

uma situação ainda mais difícil.

3 País da África Ocidental que possui a segunda maior taxa de mortalidade infantil do mundo e terceira mais baixa classificação no IDH (CIA Factbook 2009)

7

Robert Rotberg (2002) define ainda, ainda que sem aprofundar muito na teorização do tema, o

Estado Colapsado, que seria uma versão extremada do Estado Falhado, apresentando um

vácuo total de autoridade, sendo uma mera expressão geográfica e dando margem para o

aparecimento de entidades não estatais que tomam o poder de regiões e sub-regiões,

estabelecendo suas próprias leis.

O Failed States Índex, resultado de cooperação entre a revista Foreign Policy4 e o Fund for

Peace5, divulga anualmente um ranking de falha estatal envolvendo os países reconhecidos

pela ONU feito através da comparação de doze indicadores de vulnerabilidade, sendo eles:

pressões demográficas; refugiados e deslocados; legado de violência entre grupos rivais; fuga

de cérebros; desigualdade social; declínio econômico acentuado; criminalização e perda de

legitimidade do Estado; nível de deteriorização dos serviços públicos; direitos humanos;

aparato de segurança; fraccionalização das elites e intervenção dos outros Estados. A Somália

encontra-se no topo do ranking, que será mais profundamente investigado ao tratarmos do

caso específico do país.

2 Pirataria: Prática presente nos livros de história e na atual realidade do Oceano Índico

Podemos identificar na história da humanidade diversas práticas que podem ser caracterizadas

como pirataria, datando as mais diferentes épocas. A pirataria que vem ocorrendo na costa

leste africana vem crescendo a passos largos e despertando grande preocupação internacional.

Segundo Max Boot (2009), foram 41 navios atacados em 2007, 122 em 2008 e 102 até maio

de 2009.

Os primeiros ataques vikings foram no final do século VIII, às costas e ilhas britânicas. Os

vikings foram uma sociedade proveniente da Escandinávia que, segundo Mark Task (2000),

possuía alta tecnologia de construção naval para a sua época. Tal povo teria ligação direta

com a formação dos reinos independentes da Inglaterra e da Escócia.

4 Revista publicada pelo Slate Group, que pertence ao washingtonpost. http://www.foreignpolicy.com 5ONG norte americana fundada em 1975 que declara como missão de prevenir a guerra e aliviar as condições que causam a guerra. Veja mais em: http://www.fundforpeace.org/

8

Nos séculos XVII e XVIII diversas comunidades piratas surgiram nos arredores dos Oceanos

Atlântico e Índico, além de estarem presentes no leste da Ásia. Boot (2009) afirma que no

início do século XVIII um grupo de 40.000 piratas dominaram as águas ao sul da China, sob a

liderança de Cheng Yih. Ainda segundo o autor, tendo iniciado seus ataques na década de

1690, os “Homens do Mar Vermelho” o faziam numa região próxima de onde hoje agem os

piratas somalis, atacando navios ingleses, holandeses, franceses, além de indianos e de outras

regiões da Ásia. O historiador Jan Rogozinski (2002) chamou tais homens de “os criminosos

mais bem sucedidos da história da humanidade”, estimando que um único navio atacado em

1695 valesse, no mínimo, o equivalente a US$ 200 milhões.

Os estereotipados piratas de tapa-olho e que navegavam com bandeiras com caveiras ou

corações sangrando são, segundo afirma Boot (2009), herança dos que agiam nas águas do

Caribe. Segundo ele, os homens que usavam tais artifícios o faziam com o objetivo de

amedrontar as vítimas para que as mesmas se entregassem sem que fosse necessário lutar.

Estes estariam alocados nas Bahamas, Ilhas Virgens, Jamaica e outras ilhas. O autor afirma

ainda que uma das ações mais ousadas da área teria sido liderada por Henry Morgan, um

famoso pirata que atacou a bem preparada cidade do Panamá, em 1671. Boot (2009) afirma

que Morgan tentou manter-se dentro da lei ao pedir sanções ao governo da Jamaica, que era

então uma colônia britânica, mas não teria tido êxito. Desta forma, o pirata teria sido

capturado e enviado a Londres. O episódio é importante para demonstrar o início da mudança

de postura oficial no combate à pirataria.

Max Boot (2009) postula que no século XVII a pirataria se tornou um empecilho ao crescente

comércio marítimo e a posição estatal em relação a tal prática começou a mudar. Os Estados

teriam se tornado menos tolerantes em relação a esta, uma vez que tinham agora muito mais a

perder. Oficiais corruptos ligados à prática passaram a ser removidos e teve início também a

contratação de grupos privados para encontrar piratas. Aos caçadores de piratas seriam

oferecidas altas quantias ou a oportunidade de manter para si parte ou, em alguns casos, tudo

o que encontravam em poder dos piratas. Teria sido de importância central a aplicação de

penas aos piratas e a construção da imagem de “inimigos da raça humana”. Os mesmos

seriam capturados e executados através do que era chamado de “doutrina de jurisdição

universal”. Mas a execução até 1700 teria se mostrado, no entanto, muito mais complicada na

prática, uma vez que o julgamento era feito em tribunais comuns e não se mostrava muito

eficaz.

9

Em 1700 o Parlamento inglês criou tribunais itinerantes chamados Vice-Almirantes cujos

participantes eram oficiais da marinha e dentro dos quais não havia direito de representação

legal aos julgados. Rediker (2004) estimou que, durante a era de ouro da pirataria (entre 1716

e 1726), entre 400 e 600 piratas foram executados através de tal sistema. Segundo o autor,

foram também criadas leis que previam pena de morte para aqueles que cooperassem com os

piratas e seis meses de prisão àqueles que não conseguissem defender seus navios dos ataques

piratas. Ainda que a lei se mostrasse muito dura, havia flexibilidades que se mostraram de

suma importância na luta contra a pirataria, como a possibilidade de absolvição àqueles que

provassem coação a uma vida criminosa ou de clemência, bem como de recompensas aos que

cedessem informações valiosas.

Importantíssimo também no controle da pirataria teria sido o alto crescimento da marinha

inglesa, ainda muito fraca em 1600 e já possuidora de 124 navios em 1718 e 214 em 1815,

segundo Boot (2009). Outras potências da época teriam também começado a aumentar suas

tropas, tendo a França 80 navios, a Espanha 25 e os Estados Unidos 17. Aos poucos os países

teriam passarado a destinar mais poderio naval para policiar os mares; se em 1670 a marinha

britânica dispunha de apenas dois navios para tal trabalho, em 1700 o número já tinha passado

para 24, estacionados em posições estratégicas como Barbados, Cabo Verde, Jamaica e

Virgínia com um total de 3.500 marinheiros. As forças inglesas teriam chegado também a

cooperar com outros países, especialmente com os Estados Unidos após a guerra de 1812,6

ocasião em que os países uniram forças para deter piratas do caribe nos mares ao leste da

China.

Um dos mais valiosos trabalhos das forças navais era proteger os navios mercantes, que quase

sempre navegavam armados, embora geralmente não tentassem resistir aos ataques piratas

que possuíam mais armamento e maior tripulação; sua defesa ficava mesmo a cargo da

marinha, como afirma Boot (2009). Com o aumento da atividade naval, teria havido

conseqüente acontecimento de batalhas que, em geral, acabavam com melhor colocação da

marinha, com maior disciplina e conhecimento da tripulação.

6Segundo Gribbin (1973), Guerra Anglo-Americana, tendo de um lado os Estados Unidos e a Grã Bretanha e de outro suas colônias, incluindo o Canadá Inferior (Quebec), Canadá Superior (Ontario), Nova Escócia, Bermuda e Ilha da Terra Nova.

10

Segundo Max Boot (2009), visando proteger os mares da pirataria os países tomaram várias

atitudes que deveriam ser consideradas nos dias de hoje por aqueles interessados em acabar

com o problema que voltou a ter relevância no cenário internacional. Teriam sido necessárias

mudanças de atitudes envolvendo questões públicas, a contratação de grupos privados para a

caça aos piratas, o melhor desenvolvimento de questões concernentes à administração da

justiça, o oferecimento de perdão a piratas que se entregassem voluntariamente, cooperação

internacional e ocupação de portos piratas. Mas o autor defende que não é isso que se tem

observado na questão atual. Segundo ele, os países não vêm tratando a pirataria com a

seriedade necessária, o que está fazendo com que a prática fique totalmente fora de controle.

Ralph Peters (2009), oficial aposentado da marinha americana sugeriu que toda empresa que

cedesse dinheiro aos piratas deveria ter negado o direito de negociar nos Estados Unidos. Já

Boot (2009) acredita no aumento do número de navios de guerra alocados no Chifre da

África, uma vez que embora hajam por volta de 30 na região provenientes de mais de 20

países, a maioria deles está encarregado de missões antiterroristas, deixando, geralmente,

apenas 14 para o combate aos piratas. O autor defende ainda que a Grã Bretanha e os Estados

Unidos, devido a seus históricos na ação marítima, devem ser incumbidos de adquirir mais

navios de guerra para serem disponibilizados na luta contra os piratas.

Há ainda a sugestão de Berube (2007), que acredita que se deve contratar empresas

particulares para auxiliar no combate à pirataria, fazendo em seu artigo “Blackwaters for the

Blue Waters: The Promise of Private Naval Companies” alusão à controversa empresa

americana, que seria uma poderosa organizadora de exércitos mercenários.

Segundo Boot (2009), a área a ser defendida é equivalente a quatro vezes o tamanho do

Texas7 e os piratas modernos são equipados com tecnologia de ponta, possuindo telefones

satélites e aparelhos de GPS suficientemente sofisticados para monitorar a movimentação

naval, o que torna fácil a ação em locais não patrulhados. O autor afirma ainda que os piratas

ameaçam uma região do oceano por onde passa quase metade de todo o comércio marítimo

mundial, incluindo um terço do suprimento de óleo da Europa. Segundo ele, há que se tomar

uma atitude com urgência e medidas paliativas, como as supracitadas, são de extrema

importância, mas enquanto não se reconstituir a centralização de poder na Somália, a chance

7 Segundo o Texas Almanac, o condado possui uma área de 3 054 km². (http://www.texasalmanac.com/)

11

de os ataques cessarem é muito remota. O autor acredita que seja um problema que emerge de

dois elementos: a não existência de autoridade legal e a falta de determinação dos governos

em impor a autoridade existente. Boot (2009) sugere ainda a criação de um acordo

internacional que autorizasse a adoção de medidas contra os piratas através de tribunais

especiais como o Tribunal Penal Internacional ou que um tribunal Ad Hoc fosse criado pelas

Nações Unidas especialmente para os casos de pirataria.8

O Conselho de Segurança da ONU concluiu resoluções que autorizam forças militares a

capturar piratas ainda que dentro das águas territoriais somalis e até mesmo em terra caso

necessários; dessa forma os Estados Unidos possuem o direito legal de realizar ações anfíbias

na captura, mas, até a presente data, nenhuma foi realizada. Acredita-se que depois do grande

número de baixas ocorridas na Operação de Paz enviada em 1993, há relutância estadunidense

em reenviar tropas para a região, como afirma Dudfield (2001).

Além disto, o fato de a atividade ter se mostrado direcionada para o pedido de pagamento de

resgate das embarcações ou da tripulação tem garantido baixos índices de violência contra as

vítimas e contra os materiais contidos em tais embarcações, segundo Peter Lesson (2009). O

autor afirma que os piratas começam demandando altos valores, mas têm aceitado valores

bem menores, facilitando a negociação e pagamento. O MV Faina, navio ucraniano, teria sido

liberado por US$3,2 milhões e o MV Sirius Starpor por US$3 milhões. Tais números

demonstram que, embora os valores pareçam muito altos, as demandas não se mostram

exorbitantes quando se tratam de presas tão valiosas. Os proprietários e companhias de seguro

costumam considerar o pagamento relativamente vantajoso quando comparado com o valor

do navio, carga e tripulação.

Segundo relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), toda a indústria de seguro nos

Estados Unidos teve lucro US$ 455,6 bilhões em 2008 enquanto foram pagos aos piratas,

entre janeiro e novembro do mesmo ano, de 25 a 30 milhões de dólares. Por outro lado, todos

estes valores tornam-se extremamente elevados ao compararmos à aqueles que representam a

realidade Somali, que, ainda segundo relatório da ONU, obteve investimento externo direto de

US$ 2 milhões em 2007.

8 O Tribunal "ad hoc" é uma corte de justiça convocada unicamente para apreciar a questão que motivou sua criação, segundo Mettraux (2005)

12

No livro “O Gancho Invisível”, Peter Leeson (2009) discute a importância econômica da

pirataria e defende que a ganância é a principal causa da prática, que tem, segundo ele, se

baseado no recrutamento de componentes de clãs organizados, que asseguram certa coesão

social. Os piratas que seqüestraram o navio francês Le Ponant em abril de 2008, por exemplo,

teriam um esquema que assegurava o pagamento de US$15 mil à família de um pirata que

fosse morto.

A partir de 2007 o Conselho de Segurança passou a dar mais atenção ao problema ao fazer

referência à pirataria nas Resoluções 1.272 (2007) e 1.814 (2008). Tais resoluções tratavam

da situação da Somália como um todo e buscavam encorajar Estados-membros com navios ou

aeronaves militares na região a proteger os navios mercantes, especialmente os que

transportavam ajuda humanitária para o país.

Em 29 de novembro de 2007 a International Maritime Organization (IMO) aprovou a

Resolução IMO-A (2002) que trata da pirataria e do roubo armado contra navios na costa da

Somália. A IMO demanda que o governo provisório do país tome medidas que ajudem no

combate da atividades nas suas águas. Em 2 de junho de 2008 o Conselho de Segurança

adotou a Resolução 1.816, específica para enfrentar o problema, estabelecendo uma série de

medidas para combater a pirataria e o roubo armado nas costas da Somália. Considerando a

falta de capacidade do Governo Federal Transitório (GFT) em impedir as práticas criminosas,

permite que as forças navais dos Estados que cooperassem com GFT pudessem entrar, por um

período de seis meses, nas águas territoriais e usar todos os meios necessários para reprimir os

atos de pirataria e roubo armado. A Resolução buscou realçar o princípio de soberania,

reafirmando nas considerações e no parágrafo 9° que tal autorização só se efetivou devido ao

consentimento do Governo Transitório, mesmo que na prática tal governo não tivesse

nenhuma condição de resistir às pressões. A Resolução destacou ainda seu caráter específico

de aplicabilidade somente ao caso da Somália e que não devia ser considerada como

formadora de jurisprudência no Direito Internacional e que não afetaria os direitos e

obrigações dos Estados especificados na Convenção das Nações Unidas para o Direito do

Mar.

Em 2008 o Conselho de Segurança aprovou quatro resoluções que tratavam do caso (1.838,

1.844, 1.846 e 1.851) e que mostram a reação deste às novas táticas empregadas pelos piratas,

13

além de securitizar a pirataria, relacionando-a como problema de segurança e estabilidade da

Somália. O Conselho reconhece que para a erradicação da pirataria e do roubo armado nas

áreas marítimas do país é preciso de elementos como paz, estabilidade, fortalecimento das

instituições, respeito aos direitos humanos e desenvolvimento econômico e social na

Somália..

3 A República Somali: Histórico e dados geopolíticos convergindo para a fragilidade

instalada no país

A Somália é um país com área total de 637,657 km², sendo 627,337 km² de terra e 10,320

km² de água. O país faz fronteira com três países, sendo eles Djibuti (58 km), Etiópia (1,600

km) e Quênia (682 km), além de possuir uma grande costa marítima, correspondendo a 3,025

km. Os dados são do factbook da Cia, que estima que o número de habitantes seja 9,832,017,

mas enfatiza que os números estão longe de serem precisos, devido às condições em que o

país se encontra.

Segundo o factbook da CIA, o clima do país é principalmente desértico, tendo temperaturas

moderadas no norte e quente no sul de Dezembro a Fevereiro, quente no norte e sul de Maio a

Outubro e chuvas irregulares, períodos quentes e úmidos em março e novembro. O terreno é,

em sua maior parte, plano, mas com planaltos ondulantes em direção ao Norte. Os recursos

naturais encontrados são urânio, e grandes reservas inexploradas de ferro, estanho, gesso,

bauxita, cobre, sal, gás natural e provavelmente petróleo.

A República Somali está situada no Chifre da África, no leste do continente africano, rota

para o Mar Vermelho e Canal de Suez; sua conexão com o Golfo de Adem faz com que passe

por ali boa parte do petróleo extraído na região, especialmente no Irã, sendo o Golfo de

Adem, atualmente, considerado a região mundialmente mais propensa a ataques piratas, uma

vez que passam por ali cerca 22 mil navios por ano segundo a Organização Marítima

Internacional (OMI).

Podemos observar, na figura 1.1, a localização exata do país e o local de atuação pirata;

estima-se que cerca de metade do comércio marítimo mundial passe pela região.

14

Figura 1 – Rota de navios e local de atuação pirata.

Fonte: Revista de Marinha, 2009

A República Somali é um dos únicos países da África que possui apenas um grupo étnico,

uma língua, uma religião e uma cultura.9 Segundo Richard Dowden (2008), estudioso do

continente africano, seria possível falar de uma raça somali. Apesar disso, o país tornou-se

palco de grandes disputas pelo controle do Estado, com grupos diversos acusando-se de

paternalismo e favorecimento na administração dos negócios públicos a partir do final da

década de 70.

Segundo dados do factbook da CIA, a Somália tornou-se uma nação independente em 1960,

unindo os territórios antes pertencentes à Inglaterra e Itália. Em 1969 uma cúpula liderada por

9 A lingua é somali e a religião o Islã Sunita (CIA Factbook, 2010)

15

Siad Barre estabeleceu um regime autoritário socialista que manteve certa estabilidade no país

por pouco mais de duas décadas, vindo a colapsar em 1991. Em maio do mesmo ano clãs do

norte declararam a independência da República da Somalilândia, que hoje inclui as regiões

administrativas de Awdal, Woqooyi Galbeed, Togdheer, Sanaag e Sool. Nenhum governo

jamais reconheceu a autonomia da região, mas a entidade continua a lutar pelo

estabelecimento de uma democracia constitucional. O estado de Puntland se auto declarou

autônomo e vem se autogovernando desde 1998, mas não luta por independência. O mesmo

abrange as áreas de Bari, Nugaal e o norte de Mudug e disputa fronteira com a Somalilândia e

luta também por partes dos territórios de Sool e Sanaag. Antonio Ruy de Almeida Silva

(2010) acredita que, embora o fato de tais regiões possuírem tal autonomia seja positivo, uma

vez que passam a exercer o papel de governança que o Estado não consegue, por outro lado,

estruturas descentralizadas somam para a dificuldade de fortalecer o poder central. O mapa da

figura 2 mostra a localização de cada região do país.

16

Figura 2 - Regiões da Somália

Fonte: CIA Maps and Publications, 2002

Segundo obra de Ramonet e Gresh (1996), no dia 4 de janeiro de 1993 iniciou-se uma ação

humanitária da ONU destinada a assentar as bases de uma reunificação somali que veio a ter

17

grande repercussão na mídia devido a um filme nela inspirado.10 A situação demandava ação

imediata, cem mil pessoas já haviam sido vítimas de fome e da guerra civil em um ano e meio

e um milhão de somalis fugiram para o Quênia, Etiópia, Djibuti e Yemen. Mas o

desconhecimento das causas da crise e do funcionamento da sociedade somaliana teria levado

a uma repressão que foi fatal para centenas de civis, em sua maioria mulheres e crianças. As

tropas começaram a retirada a partir de outubro de 1993, mostrando o fracasso de uma

política voltada mais para o engajamento militar do que social, na qual, segundo os autores, se

subestimou o nacionalismo dos somalis.

Conforme colocado no factbook da CIA, em 2002 o governo do Kenia liderou um processo de

paz que viria a durar dois anos e que em sua conclusão, em 2004, elegeu Abdullahi Yusuf

Ahmed para presidente do TFG e a formação de governo, conhecida como Instituições do

TFG. Yusuf deixou o cargo no final de 2008 e em 31 de janeiro de 2009 o parlamento elegeu

Sheikh Sharif Sheikh para presidente e em 13 de fevereiro de 2009 o mesmo nomeou Omar

Abdirashid ali Sharmarke para primeiro ministro do país.

Ao investigar o campo de pesquisa normativo acerca da soberania, Robert Jackson caracteriza

a situação da Somália como sendo um "Quase-Estado" ou como um Estado de 'soberania

negativa', em contraste com a estrutura tradicional de 'soberania positiva'. O autor enfatiza,

entretanto, que as colocações ‘positivo’ e ‘negativo’ não significam ‘bom’ e ‘ruim’, mas

somente o direito de não intervenção e capacidade de ação ou detenção. Tal denominação é

utilizada de forma a chamar atenção ao fato de que tais Estados não são capazes de aplicação

empírica de condições civis mínimas, como paz, ordem e segurança. O autor demonstra em

seus estudos a crença pelo direito do que ele chama de Terceiro Mundo à soberania,

envolvendo autodeterminação, direitos humanos e soberania.11 Segundo ele, países em

situação como a da Somália, ao buscar tais objetivos, geralmente requerem o envolvimento de

instituições, leis, tratados, conferências e muito mais coisas relacionadas. O estudo apresenta

o chamado Terceiro Mundo muito mais como delimitações territoriais do que entidades

empíricas, uma vez que não possuem o controle de tal território. O autor afirma, ainda, que

10 Black Hawk Down – Columbia Pictures; Sony Pictures Entertainment 11Ainda que a expressão remeta a outros significados, como o da divisão do mundo em termos de riqueza e classe ou àqueles que evocam ajuda socioeconômica internacional ou ainda às ex colônias que agora possuem soberania da mesma forma e que agora lutam pelo mesmo nível de desenvolvimento das antigas metrópoles, o autor usa a expressão para denominar o que ele classifica como “Quase Estados”

18

regras e normas podem ter efeitos não previstos na política do país que muitas vezes podem

ser contrárias aos originalmente esperados.

Postulando que regras sempre envolvem predileções que trazem vantagens a um e

desvantagens a outros, Jackson coloca que no caso de soberanias negativas, as regras,

geralmente, trazem vantagens aos soberanos e desvantagens aos cidadãos e, no contexto

global, vantagens aos países de terceiro mundo e desvantagens aos chamados segundo e

primeiro mundos. Os chamados “Quase Estados” recebem tal nomenclatura uma vez que suas

populações não dispõem de várias das vantagens que associamos a Estados independentes, os

governos são geralmente ineficazes no que concerne a objetivos políticos, autoridade

institucional e organizações que se dedicam a direitos humanos ou ao bem estar

socioeconômico. Os benefícios concretos que justificam historicamente a existência de

Estados soberanos são geralmente repassados a uma minoria. Segundo o autor, tais Estados

estão ainda muito longe de serem completos uma vez que sua aplicação empírica não foi

alcançada, justificando-se a nomenclatura dada pelo mesmo.

Robert Rotberg (2002), por sua vez, já utilizando o termo “Estados Falhados”, alega que são

aqueles que não mais proporcionam bem-estar à população; deterioração das condições de

vida e da infra-estrutura básica não somente por condições geográficas, ambientais ou causas

externas, mas pelas decisões dos líderes e falhas dos mesmos, que provocam o

enfraquecimento do Estado. Além disso, tais Estados viveriam sob tensão permanente, seriam

profundamente conflitivos, perigosos e fortemente contestados por facções contrárias. As

instituições políticas param de funcionar, há perda de monopólio de força e dados como

mortalidade infantil e comportamento do PIB são cruciais para determinar se um Estado é

Falhado ou ainda Colapsado. Uma vez que os Estados Colapsados representam uma versão

mais extrema dos Estados Falados, os mesmos costumam ser mera representação geográfica,

havendo um vácuo de autoridade, facilitando a tomada de outras forças que passam a tomar

conta do Estado.

O PIB da Somália em 2008 foi $5.575.000.000, ocupando o 154° lugar mundial e a

expectativa de vida não chega aos 50 anos (49.87, segundo estimativa feita em 2005 pela

CIA); menos de 38% da população pode ler ou escrever (37.8, segundo estimativa de 2001 da

CIA). Segundo Rodrigues (2000), em setembro de 1992 mais de trezentas mil pessoas, dentre

19

as quais 75% de crianças até os cinco anos, haviam morrido de fome enquanto cerca de 1,5

milhão de somalis corriam risco de morrer por inanição.

Podemos observar nas figuras 3.1 e 3.2 a situação dos países do continente africano em

relação ao PIB e à mortalidade infantil, respectivamente:

20

Existe ainda o problema da pesca ilegal e da poluição marinha, o consumo de água

contaminada vem contribuindo para o alto número de problemas de saúde da população,

21

conforme afirma a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO).

Segundo relatório de 2003 da mesma, cerca de 700 embarcações pesqueiras estrangeiras

pescavam ilegalmente na Zona Econômica Exclusiva12 da Somália, além de ressaltar que

havia forte suspeita de lançamento ilegal de resíduos industriais e lixo nuclear nas águas do

país. Em 2005 foi preparado um relatório para o Departamento de Desenvolvimento

Internacional da Grã-Bretanha que estima que a Somália tenha perdido cerca de cem milhões

de dólares com a pesca ilegal realizada por embarcações de outros países. Tais atividades

comprometem o sistema marinho, diminuindo a quantidade de peixes e prejudicando os

pescadores da região, já que estes ficam sem sua principal fonte de alimento e sobrevivência.

O Failed States Index classificou 177 países em 2009, estando a Somália no topo do ranking.

A metodologia utilizada foi o Conflict Assessment System Tool (CAST), um modelo flexível

que emprega quatro etapas em linha-análise de tendência, que consistem em: 1) classificar 12

indicadores econômicos, sociais, políticos e militares; 2) avaliação das capacidades de cinco

instituições centrais consideradas essenciais para manter a segurança, 3) identificar os fatores

idiossincráticos e surpresas, e 4) colocar os países em um mapa que mostra o conflito

histórico de risco dos países em análise. No caso do Índex o Fund for Peace focou

exclusivamente na primeira etapa, que proporciona visão do estado de vulnerabilidade ou

risco de violência durante uma janela de tempo. O software CAST analisa centenas de

milhares de artigos e relatórios através de um sistema de coleta de dados poderoso e que

inclui mídia local e internacional e outros documentos públicos, incluindo relatórios do

Departamento de Estado dos Estados Unidos, estudos independentes e até mesmo empresas

arquivamentos. Os dados utilizados em cada índice são coletados de janeiro a dezembro do

ano anterior. Os índices de software e as notas dos artigos são baseados em seu significado

em relação aos 12 indicadores. Peritos internos e externos, em seguida, fazem revisão das

pontuações, bem como dos próprios artigos, quando necessário, para confirmar as contagens e

garantir a precisão.

De forma a clarear cada ponto analisado pelo Índex, estão abaixo apresentados cada um deles:

a) Aumento de pressões demográficas envolve, além de pressões decorrentes da elevada tava

de população em relação ao fornecimento de alimentos e outros produtos de primeira

necessidade, pressões decorrentes do estabelecimento de padrões de grupo que afetam a

12 A ZEE foi postulada pela Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar como uma linha imaginária postulada a 200 milhas marítimas da costa, separando as águas nacionais das águas internacionais.

22

liberdade de participar em formas comuns de atividade física e humana, incluindo a

produtividade econômica, viagens, interação social, culto religioso. Inclui também pressões

decorrentes do estabelecimento de grupo afetando padrões físicos, incluindo litígios

transfronteiriços, a posse ou ocupação de terras, acesso aos meios de transporte, controle de

locais históricos ou religiosos e da proximidade aos riscos ambientais; pressões de

distribuições de população enviesada, ou de taxas divergentes de crescimento da população

entre os grupos concorrentes.

b) Movimento maciço de refugiados ou deslocados engloba o deslocamento forçado de

grandes comunidades como resultado da violência aleatória ou orientada e / ou repressão. Tais

movimentos causam escassez de alimentos, doenças, falta de água potável, a competição por

terra, agitação que pode resultar em maiores problemas humanitários e de segurança, tanto

dentro como entre países.

c) Legado de violência entre grupos rivais analisa a história de grupos comunitários e

injustiças recentes ou do passado, que podem datar séculos; atrocidades cometidas

impunemente contra grupos comunitário ou grupos específicos apontados pelas autoridades

estatais ou por grupos dominantes, por perseguição ou repressão; exclusão política

institucionalizada; grupos que acreditavam ter adquirido a riqueza, status ou poder, tal como

evidenciado o surgimento de "ódio" de rádio, panfletagem e estereotipadas ou retórica política

nacionalista.

d) “Fuga de cérebros” envolve emigração de profissionais, intelectuais e dissidentes políticos,

temendo a perseguição ou repressão; emigração voluntária de "classe média",

economicamente produtiva segmentos da população especialmente, como empresários,

artesãos e comerciantes, devido à deterioração econômica e crescimento das comunidades de

exílio.

e) Desigualdade social analisa a base da desigualdade: a desigualdade na educação, emprego e

status econômico do grupo; empobrecimento de grupo medido pelos níveis de pobreza,

mortalidade infantil, níveis de ensino; ascensão do nacionalismo baseado em real ou

percebida desigualdade de grupo.

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f) Declínio econômico acentuado engloba o declínio econômico da sociedade como um todo,

medido pela renda per capta, o PIB, dívida, as taxas de mortalidade infantil, os níveis de

pobreza, falências de empresas e outras medidas econômicas; repentina queda nos preços das

commodities, o faturamento do comércio, investimento ou pagamentos da dívida externa;

colapso ou desvalorização da moeda nacional; extremas dificuldades sociais impostas pelos

programas de austeridade econômica; crescimento da economia paralela, incluindo o tráfico

de drogas, contrabando e fuga de capitais ; aumento dos níveis de corrupção e transações

ilícitas entre a população em geral; fracasso do Estado para pagar salários de funcionários do

governo e das forças armadas ou para satisfazer outras obrigações financeiras para com seus

cidadãos, tais como pagamentos de pensões.

g) Em criminalização e / ou deslegitimação do Estado, analisa-se a corrupção massiva por

elites governantes; resistência das elites dominantes com a transparência e representação

política; generalizada perda de confiança popular nas instituições do Estado e dos processos,

por exemplo, boicotando ou contestando as eleições, sustentando desobediência civil, a

incapacidade do Estado para arrecadar impostos, a resistência ao recrutamento militar, a

ascensão de insurgentes armados; crescimento do crime organizado ligado às elites

dominantes.

h) Deterioração dos serviços públicos envolve o desaparecimento de funções básicas do

Estado, incluindo a falha em proteger os cidadãos do terrorismo e da violência e de prestação

de serviços essenciais, como saúde, educação, saneamento, transporte público; aparelho de

Estado que se sujeita às agências que atendem as elites dominantes, como as forças de

segurança, equipe presidencial, o banco central, serviço diplomático.

i) A suspensão ou a aplicação arbitrária do Estado de Direito e violação generalizada dos

direitos humanos envolve surgimento dos regimes ditatoriais, ou regime militar autoritário, no

qual as instituições democráticas e constitucionais e os processos são suspensos ou

manipulados; surto de violência contra civis inocentes com inspiração política; aumento do

número de presos políticos ou dissidentes que não são julgados devido processo coerente com

as normas e práticas internacionais; generalizado abuso dos aspectos jurídicos, sociais e

direitos políticos, incluindo os indivíduos, grupos ou instituições culturais (por exemplo, o

assédio da imprensa politização do poder judicial, para uso interno das forças armadas para

fins políticos, a repressão pública de opositores políticos, culturais ou perseguição religiosa).

24

j) Dentro de aparatos de segurança funcionando como um “Estado dentro de um Estado”, está

o surgimento de elite ou que opera com impunidade; surgimento de milícias privadas apoiadas

ou patrocinadas pelo Estado que aterrorizam os opositores políticos; surgimento de um

"exército num exército" que serve os interesses dos militares ou políticos dominantes;

surgimento de milícias, guerrilha ou de exércitos privados em uma luta armada ou

prolongadas campanhas violentas contra as forças de segurança do Estado.

k) Faccionalização de elites envolve a fragmentação das elites dirigentes e as instituições do

Estado ao longo de linhas grupo; uso da retórica política nacionalista por parte das elites

dominantes.

l) Intervenção externa envolve intromissão nos assuntos internos do Estado em situação de

risco pelos exércitos no exterior, Estados, grupos de identidade ou entidades que afetam o

equilíbrio interno de poder ou de resolução do conflito e intervenção por parte dos doadores,

especialmente se há uma tendência para a excessiva dependência da ajuda externa ou de

missões de paz.

Na figura 4 podemos identificar o mapa que representa o ranking para a junção de todos estes

fatores, de acordo com a metodologia utilizada pelo Fund for Peace.

25

26

4 Análise da situação somali à luz dos indicadores do Fund for Peace:

Uma vez esclarecidos todos os pontos, cada um deles está colocado abaixo em relação à

situação da República Somali:

a)Segundo dados de 2010 da CIA, a taxa de fecundidade é de 6.44 crianças por mulher, sendo

a quarta mais alta taxa do mundo. No Brasil, essa taxa é de 2.19. Ainda segundo dados deste

ano da CIA, o acesso rodoviário, porto e aeroporto de Mogadíscio são os únicos com

segurança parcialmente garantida pela Amison. O aumento das pressões demográficas no país

é claro, estando ele classificado Pelo FSI como 9.8 numa classificação que vai de 0 a 10.

b)Dados de 2007 da CIA apontam para o número de 1.1 milhão de Internally Displaced

Persons (IDP), que são aqueles que não tiveram que migrar de onde estavam por razões

religiosas, mas que continuam dentro das terras somalis. Segundo a United Nations High

Commissioner for Refugees (UNHCR) haviam, aproximadamente, 360.000 refugiados

somalis distribuídos em seis campos no leste da Etiópia em 1990. Ainda segundo a UNHCR,

haviam, no mesmo ano, mais de 50.000 refugiados em campos em Mombasa, Quênia; outros

150.000 na Província Nordeste do Quênia; além de mais de 400.000 no leste da Etiópia.

c)O país é visivelmente dividido em milícias rivais que se enfrentam com freqüência.

Podemos usar como exemplo o recente confronto entre o Al Shabab,13 que luta para derrubar

o TFG, e a milícia pró governamental Ahlu Sunna14, ocorrido no último dia 2 matando pelo

menos 20 pessoas e deixando outras 50 feridas, como publicado na folha da mesma data.

d)No que tange à “fuga de cérebros”, segundo o FSI apontava uma pontuação de 8.3 em 2008

e passou para 8.5 em 2009. Segundo o Fund for Peace, uma vez que as condições continuam

a se deteriorar, cerca de 20.000 Somalis saíam do país por mês entre os dois anos

supracitados. A ONG afirma ainda que, devido aos longos anos de conflito, a maioria dos

somalis pertencentes à classe profissional já deixou o país.

13 Grupo radical islâmico que, segundo Omar Abdirashid Ali Sharmarke (2009), tem aumentado sua influência e comprometido estabilidade regional. 14 Segundo boletim do Africa Union, buscando a união de forças, o Ahlu Sunna assinou acordo de divisão de poderes com o TFG dia 15 de março de 2010.

27

e)A desigualdade social atinge níveis alarmantes, tendo subido de 7.5 para 7.7. Segundo

dados de 2009 da CIA, cerca de dois milhões de somalis sobrevivem com doações de

alimento, mas há ainda uma classe executiva rica no país.

f)Segundo o FFP, o país vem mantendo, dentro das limitadas possibilidades, uma economia

considerável, principalmente na agricultura, mas a violência e a pirataria acabaram por fazer

que a pontuação que era de 9.4 em 2008 passar para 9.5 em 2009.

g)O item de criminalização ou deslegitimização do Estado manteve a nota máxima desde o

primeiro índex, de 2007. Segundo o Transparency International’s Corruption Perceptions

Index, a Somália é o Estado mais corrupto do mundo, dividindo a posição 180 com Burma15.

O TFG não tem sido capaz de se estabelecer como o governo legítimo do país e a maior parte

do território está fora de controle. Em junho de 2008 o TFG tentou assinar um acordo de paz

com grupos de oposição que foi rejeitado pelo Islamic Courts Union (ICU), segundo o FFP.

h)Os serviços públicos são quase inexistentes no país, que é altamente dependente de ajuda

externa, sendo esta basicamente de comida. Segundo o FFP, com o aumento da violência, até

mesmo as equipes de ajuda humanitária passaram a ser alvo de seqüestro e assassinatos. O

Repórteres Sem Fronteiras16 considerou a Somália o “país africano mais passível de morte

para jornalistas” em 2008. A pontuação do país no quesito é 9.9.

i)A situação do país fez com que os Direitos Humanos fossem altamente comprometidos,

tendo a Anistia Internacional17 e o Human Rights Watch18 chamaram a atenção da

comunidade internacional para a crise humanitária na Somália, que tem se tornado, segundo

estes, cada vez mais séria.

j)O indicador de aparatos de segurança funcionando como Estado obteve nota máxima todos

os anos, uma vez que a insurgência de grupos extremistas islâmicos teve continuidade,

contribuindo para o conflito entre as milícias.

15 País do sudeste asiático que foi administrado como província da Índia até 1937. 16 Organização Não Governamental (ONG) que luta pela liberdade de imprensa desde sua fundação, em 1985. Saiba mais em: http://en.rsf.org/ 17 ONG criada em 1961, hoje presente em mais de 80 países buscando frear o abuso dos Direitos Humanos. Veja mais em: http://www.amnesty.org/ 18 ONG americana dedicada a defender e proteger direitos humanos. Saiba mais: http://www.hrw.org

28

k)O indicador de faccionalização de elites também manteve nota maxima todos os anos, já

que, segundo o FFP, o país está todo dividido em grupos políticos baseados em clãs.

l)Quanto à intervenção externa, o indicador obteve sutil melhora de 2008 para 2009, tendo

passado da nota máxima para 9.9, uma vez que as tropas etíopes se retiraram da Somália.

5 Conclusão

A falta de condições socioeconômicas gera um ambiente favorável para o desenvolvimento da

pirataria. Peter Leeson considera que aos piratas se aplicam pressupostos econômicos de que

eles são autointeressados, racionais e respondem a incentivos; o método da escolha racional se

aplica à tal atividade, quando as vantagens e o lucro aumentam , a tendência é o incremento

da pirataria.

A African Union Mission (Amisom) atua hoje em dia no país com cerca de 4.350 militares de

Uganda e Burundi garantindo segurança no aeroporto, no porto e em um acesso rodoviário de

Mogadíscio. Mas isso não garante a estabilidade da segurança nem na capital, muito menos

no resto do país. Uma força de paz da ONU vem sendo estudada para substituir a Amisom,

mas a possibilidade parece remota, já que dentre os cerca de 60 países consultados para

contribuir com o efetivo dessa força apenas dez responderam e, em sua maioria,

negativamente. Frente tal situação, a estratégia sugerida pelo secretário-geral da ONU e aceita

pelo Conselho de Segurança da ONU tem três fases: a primeira é a continuidade no apoio da

Amisom para que ela consiga atingir o efetivo previsto de 8 mil militares que garantam um

relativo grau de segurança e ajuda ao governo no processo político de reconciliação, criação

de instituições do Estado, criação de força de segurança nacional e em outras medidas de

caráter socioeconômico e humanitário; o segundo passo dependeria do sucesso do primeiro

plano de ação, já que se trata de uma operação de paz de pequeno porte para ajudar a Amisom

e a terceira fase já envolve uma missão de paz mais robusta para substitui-la. Mas não se tem

certeza nem mesmo se a Amisom irá prosseguir, devido aos custos políticos, humanos e

materiais que a força tem sofrido. Da mesma forma, não se sabe se o governo provisório

conseguirá se manter no poder, ante a atuação dos grupos que não o apóiam, principalmente

os de orientação islâmica.

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A probabilidade de fim da pirataria sem uma atitude mais robusta da comunidade

internacional é muito remota; não há dúvidas que bem como as gerações passadas, a nossa

será capaz de combater tal prática, mas para isso é preciso tratar da raiz do problema.

Enquanto a população somali não tiver nada a perder e a pirataria se mostrar como uma das

únicas oportunidades de ascensão, não haverá mudança de postura dos cidadãos; é preciso

reconstituir as bases sociais do país para que as pessoas não se unam às facções como forma

de proteção. Atores de alta relevância no cenário internacional já compreenderam tal fato, mas

medidas de real eficácia ainda não foram adotadas.

30

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