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O COMÉRCIO E A REPRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO NA CIDADE DE UBERLÂNDIA - MG Geisa Daise Gumiero CLEPS Pompeu Figueiredo de CARVALHO Introdução As inovações tecnológicas têm causado profundas transformações no processo produtivo mundial, nos meios de comunicação, na organização e na reorganização dos espaços, na divisão territorial e social do trabalho e, ao mesmo tempo, têm permitido a ligação dos espaços em redes de fluxos cada vez mais densas que ultrapassam as frontei- ras. Nesse sentido, ao analisar o modo de produção, identifica-se momentos históricos nos quais o acúmulo e o desenvolvimento de novas técnicas promovem importantes mu- danças que (re)produzem e (re)organizam os espaços. As condições tecnológicas, sociais, culturais e científicas criaram formas políticas e organizacionais que possibilitaram o desenvolvimento das sociedades, principalmente no mundo Ocidental. Ao considerar o espaço geográfico como produto para a reprodução das relações sociais que ocorrem entre os homens através do trabalho para a apropriação da natureza, justifica-se o estudo das relações entre a cidade e o comércio, visto que, com a globalização da economia, caracterizada pela internacionalização da produção e pela universalização da informação, assiste-se a proliferação de marcas, produtos e serviços que, por sua vez, alteram hábitos, costumes, gostos e preferências. Modificam o estilo de vida e a própria visão de mundo das pessoas. No espaço geográfico, essas transformações modificaram o sistema produtivo. Através da presença quase maciça de supermercados e hipermercados, de shopping centers, de empresas multinacionais de fast food, de redes de franquias, de novos sistemas viários que dão acesso aos grandes estabelecimentos comerciais, geralmente localizados às mar- gens de grandes avenidas, surgiram diferentes formas de apropriação do espaço. Os novos tipos de transportes, a comunicação à distância, a propaganda, a concentração de informa- ções, as novas técnicas monetárias, a busca de conveniência, a interação entre consumo de alimentos e meio ambiente, a valorização da saúde, da vitalidade e da individualidade são elementos que fazem parte do processo produtivo atual e criam novos espaços de produ- ção, circulação, distribuição e consumo. Diante do exposto, acredita-se que para compreender a estruturação e a reestruturação intra e inter-urbana, em nível local, faz-se necessário analisar a relação entre as inovações tecnológicas e a mudança locacional de diferentes atividades, excepci- onalmente do comércio varejista que, criando novos centros e redefinindo novos fluxos materiais e imateriais, promovem a formação de novas centralidades. Este trabalho tem como principal objetivo analisar a importância do comércio varejista na nova dinâmica urbana. Como, em especial, as grandes superfícies comerciais ao se instalarem nas cida-

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O COMÉRCIO E A REPRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANONA CIDADE DE UBERLÂNDIA - MG

Geisa Daise Gumiero CLEPS

Pompeu Figueiredo de CARVALHO

Introdução

As inovações tecnológicas têm causado profundas transformações no processoprodutivo mundial, nos meios de comunicação, na organização e na reorganização dosespaços, na divisão territorial e social do trabalho e, ao mesmo tempo, têm permitido aligação dos espaços em redes de fluxos cada vez mais densas que ultrapassam as frontei-ras. Nesse sentido, ao analisar o modo de produção, identifica-se momentos históricosnos quais o acúmulo e o desenvolvimento de novas técnicas promovem importantes mu-danças que (re)produzem e (re)organizam os espaços. As condições tecnológicas, sociais,culturais e científicas criaram formas políticas e organizacionais que possibilitaram odesenvolvimento das sociedades, principalmente no mundo Ocidental.

Ao considerar o espaço geográfico como produto para a reprodução das relaçõessociais que ocorrem entre os homens através do trabalho para a apropriação da natureza,justifica-se o estudo das relações entre a cidade e o comércio, visto que, com a globalizaçãoda economia, caracterizada pela internacionalização da produção e pela universalização dainformação, assiste-se a proliferação de marcas, produtos e serviços que, por sua vez,alteram hábitos, costumes, gostos e preferências. Modificam o estilo de vida e a própriavisão de mundo das pessoas.

No espaço geográfico, essas transformações modificaram o sistema produtivo.Através da presença quase maciça de supermercados e hipermercados, de shopping centers,de empresas multinacionais de fast food, de redes de franquias, de novos sistemas viáriosque dão acesso aos grandes estabelecimentos comerciais, geralmente localizados às mar-gens de grandes avenidas, surgiram diferentes formas de apropriação do espaço. Os novostipos de transportes, a comunicação à distância, a propaganda, a concentração de informa-ções, as novas técnicas monetárias, a busca de conveniência, a interação entre consumo dealimentos e meio ambiente, a valorização da saúde, da vitalidade e da individualidade sãoelementos que fazem parte do processo produtivo atual e criam novos espaços de produ-ção, circulação, distribuição e consumo.

Diante do exposto, acredita-se que para compreender a estruturação e areestruturação intra e inter-urbana, em nível local, faz-se necessário analisar a relaçãoentre as inovações tecnológicas e a mudança locacional de diferentes atividades, excepci-onalmente do comércio varejista que, criando novos centros e redefinindo novos fluxosmateriais e imateriais, promovem a formação de novas centralidades. Este trabalho temcomo principal objetivo analisar a importância do comércio varejista na nova dinâmicaurbana. Como, em especial, as grandes superfícies comerciais ao se instalarem nas cida-

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des reestruturam os espaços, organizam novos fluxos de comércio e de serviços criandovalores ao lugar. Acredita-se que a centralidade não se define pela localização, mas pelasarticulações entre as localidades, pois se trata de relações espaciais. Assim, estudar ocomércio, suas formas e sua localização, significa compreender a organização do espaçourbano e suas complexidades, entender as mudanças sociais e a evolução dos valores e daestrutura urbana. Investigar as atividades comerciais, possibilita analisar a dinâmica dasociedade e o processo de (re)produção da cidade visto que, para o comércio, a localiza-ção é uma condição estratégica de desenvolvimento.

Para a realização do trabalho de doutoramento, utilizou-se de vários estudos reali-zados por geógrafos e economistas, principalmente aqueles que têm se dedicado aos estu-dos regionais sobre o Triângulo Mineiro e que muito têm contribuído para registrar ahistória da cidade de Uberlândia e da região. Para a obtenção dos dados, realizaram-sevárias pesquisas e levantamentos bibliográficos em publicações especializadas tais como:Rankings Anuais da ABRAS (Associação Brasileira de Supermercados); Jornais de circu-lação nacional e regional; Censos Demográficos do IBGE; Banco de Dados Integrados daPrefeitura Municipal de Uberlândia (BDI); o Plano Diretor da cidade; além dos sites dasprincipais empresas estudadas e das Associações Estaduais dos Supermercados. Aplica-ram-se questionários e entrevistas junto às principais empresas e informantes do setorvarejista (supermercados e hipermercados), estabelecidos na cidade de Uberlândia. Tor-nou-se necessário também, buscar informações sobre a atuação das empresas atacadistas,especialmente do Grupo Martins e do Grupo Peixoto que estão desenvolvendo estratégiascomerciais para o varejo. Outro importante referencial utilizado foi a Lista Telefônica deUberlândia – Guia Sei, que muito auxiliou no processo de identificação e localização dasempresas do ramo do auto-serviço que atuam na cidade, visto que seria praticamente im-possível percorrer todos os bairros de Uberlândia na realização da pesquisa.

A Produção do Espaço Urbano de Urbano de Uberlândia e as Políticas Públi-cas de Planejamento

Localizada na região do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, considerada como umcentro de polarização regional, a cidade conta hoje com mais de 600 mil habitantes eapresenta novas espacialidades urbanas que foram constituídas por atividades do terciário,principalmente pelo comércio, pelas políticas públicas e pela intervenção do capital pri-vado. Conforme escreveu Lefebvre (2002, p.84-85), os conflitos existentes entre as lógi-cas e as estratégias de ocupação e produção do espaço urbano são submetidos “[...] àsexigências e crescimento, a lógica do urbanismo, a do espaço político, [...] entrechocam-se, às vezes se espatifam uma contra a outra”. Na tentativa de tratar desses conflitos ecomplexidades, traduzindo os diversos interesses existentes, sejam eles comuns ou não,surgiram as políticas de planejamento urbano, fortemente presentes no país a partir dadécada de 1960 e 1970, com a “institucionalização/formalização” dos espaços urbanos edas metrópoles brasileiras. Enquanto país periférico, o Brasil adotou os modelos dos pa-íses desenvolvidos para ordenar o planejamento urbano das cidades, apresentando resulta-

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dos bem menos eficazes. De acordo com Carvalho (2000), nos países periféricos as cida-des sofreram um impacto da urbanização/industrialização muito mais dramática e acelera-da.

Desse modo, nunca conseguiram implantar o planejamento urbano mo-derno de modo eficiente e muito menos, de modo eficaz, devido à dimen-são dos problemas sociais, nos quais a população marginalizada não é omenor segmento, mas o maior segmento, ou ainda, de grande peso, emnível de desigualdades também fortemente exacerbado. Assim, surgiramem todas as cidades periféricas, duas cidades, a legal e a ilegal (muitasvezes inadequadamente chamada de clandestina). A legislação urbana quecolocava parâmetros de habitabilidade para uma vida sadia mostrava-seinalcançável para uma grande parte da população. (CARVALHO, 2000, p.:46-47)

A cidade de Uberlândia constitui um exemplo dessa complexidade. Na medida emque ela foi tornando-se pólo de atração populacional, surgiram loteamentos irregulares,totalmente distantes e isolados da área central. Sob pressão da população, o poder públicovê-se acuado e, principalmente nos períodos que antecedem os pleitos eleitorais, acabacriando uma série de infra-estrutura básica nesses locais. Dessa forma, foge-se do plane-jamento traçado para o desenvolvimento urbano da cidade. Assim, as contradições na or-ganização territorial presentes na cidade: a segregação sócio-espacial; a localização doscentros de consumo e de lazer; as novas funções do espaço central da cidade, que foi setransformando em área de concentração de atividades ligadas à prestação de serviços,inclusive financeira; a formação de condomínios fechados (horizontais e verticais); bemcomo a ocupação de áreas que até pouco tempo eram destituídas de valor comercial. Estecrescimento espacial contraditório, resultante das contradições sociais, é parte essencialdo processo que deu condição de cidade média à Uberlândia.

Analisando as mais importantes transformações ocorridas com o setor de distri-buição de produtos industrializados no Brasil, mais especificamente do setor de auto-serviço, desenvolveu-se um estudo sobre essas redes, enfocando as principais estratégiasde expansão, de modernização, de comercialização e de concentração de capital por elasdesenvolvidas. Buscou-se também, compreender como os pequenos e médios varejistasdo setor estão enfrentando a concorrência e mantendo-se em um mercado cada vez maiscompetitivo. Com tais transformações que estão ocorrendo em nível econômico e social,o consumidor brasileiro busca, no seu dia-a-dia, adquirir seus produtos nos supermerca-dos de bairro, nas chamadas “lojas de vizinhança”. Nesse sentido, os pequenos e médiossupermercados, para conquistarem o “novo consumidor” e manterem-se no mercado, es-tão realizando importantes acordos comerciais como, por exemplo, a formação de asso-ciações entre empresas de menor porte ou destas com grandes atacadistas, criando umanova modalidade comercial. Em Uberlândia, essa tem sido a nova estratégia comercialutilizada pelas pequenas e médias empresas do setor com importantes grupos do comér-cio atacadista brasileiro – como é o caso do Grupo Martins e do Grupo Peixoto que, apartir do ano 2000, passaram a conciliar suas atividades de atacado com as do setor devarejo. Lançando suas bandeiras de supermercados de vizinhança, criaram a Rede Smart ea Rede Valor, respectivamente.

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O Comércio de Uberlândia e as Novas Espacialidades Urbanas

Devido à atuação dos grupos de Atacado-Distribuidor em todas as regiões do país,a cidade de Uberlândia possui uma área de abrangência de 600 km e atende, aproximada-mente, cinqüenta milhões de consumidores os quais respondem por 2/3 do PIB brasileiro.(BDI – PMU, 2004) Os dados fornecidos pela Prefeitura Municipal de Uberlândia reve-lam que o número de estabelecimentos da cidade, associados ao setor terciário da econo-mia, vem apresentando um importante crescimento. No período compreendido entre 1997e 2002, o número de estabelecimentos do comércio varejista passou de 2.932 para 4.198,o que representou um aumento de 143%. Com relação aos estabelecimentos que atuam namodalidade do atacado, o crescimento não foi tão expressivo. Em 1997 o atacado localtotalizava 483 estabelecimentos. Em 2002 chegou a 563 estabelecimentos, o que repre-sentou um aumento de 80 novas empresas. Com relação ao setor de serviços, os númerostambém impressionam e denotam características de cidades terciárias, onde predominamas atividades ligadas ao comércio e, principalmente, à prestação de serviços.

Analisando a participação dos setores econômicos na geração do PIB da cidade deUberlândia, no ano 2000, pode-se perceber que a agropecuária representava apenas 4,5%do PIB, enquanto que o setor de serviços participava com 44,8% e o secundário com50,7%. Quanto à participação da mão-de-obra nos setores econômicos, no período com-preendido entre 1960 e 1999, observou-se que o setor secundário manteve-se em condi-ção de equilíbrio no número de pessoal ocupado, porém, continuou a ser o setor que maiscontribuiu com a geração do PIB, devido ao aumento do número de agroindústrias instala-das na cidade. Por outro lado, é notória a redução da mão-de-obra no setor primário que,em 1960, concentrava 61,6% do pessoal ocupado e, em 1999, reduziu a mão-de-obra paraapenas 9,5% do total (90% menos). A causa dessa significativa redução deve-se à moder-nização da agricultura que liberou um grande contingente de mão-de-obra. Por outro lado,em 1999, o terciário passou a ser o setor que mais concentrava mão-de-obra. Em 1960 eleabsorvia apenas 21,1 % da mão-de-obra empregada, já em 1999 esse número chegou a73,41%. A importância da atividade para a cidade de Uberlândia pode ser analisada, ainda,através da arrecadação do ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).No ano de 2001 o setor terciário arrecadou, aproximadamente, R$141 milhões (26,5%do ICMS total recolhido no município). O segmento de serviços contribuiu com R$ 88,3milhões (16,6%), enquanto que o comércio arrecadou R$ 52,5 milhões (9,88% do im-posto gerado pelo terciário).

A concentração e a diversificação das atividades comerciais e de serviços, aliadas àampliação do consumo gerado pelo aumento populacional, evidenciam o crescimento eco-nômico da cidade. Aumentando-se a demanda por produtos para alimentar o contingenteurbano, surgiu a necessidade de se incrementar o número de escolas, de assistência médi-co-hospitalar, de entretenimento, de cultura e de lazer. É nesse contexto que se instalamna cidade novas modalidades comerciais como os shopping centers, as redes de super-mercados e de hipermercados. Tais estabelecimentos comerciais indicam a existência desegmentos populacionais de maior poder aquisitivo. Além de capturarem uma parcela sig-nificativa dos consumidores locais, acabam também por fazê-lo regionalmente, na área deinfluência da cidade.

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Santos (1988, p. 89-90) afirma que “[...] as cidades intermediárias, que hoje sãotambém chamadas de cidades médias, as que então chamávamos de centros regionais, sãoo lugar onde há respostas para níveis de demanda de consumo mais elevados.” No caso deUberlândia, pode-se auferir que existe na cidade uma classe de consumidores que possu-em alto poder aquisitivo cuja origem provém do capital agrário e comercial, principal-mente.

No que concerne ao sistema financeiro existente na cidade, segundo a PrefeituraMunicipal - PMU, em 2003 existiam em Uberlândia 19 empresas bancárias as quais so-mavam 46 agências, 42 postos de serviços e 114 postos de atendimento eletrônico. (BDI– PMU, 2003) As agências bancárias da cidade concentram-se na Avenida Afonso Pena, naárea central de Uberlândia, “antigo centro”, e no entorno do Complexo Shopping Centere Carrefour. Na Avenida João Naves de Ávila e Segismundo Pereira, localizadas, respecti-vamente, no setor Centro e Leste, no entorno do complexo, existem atualmente noveagências bancárias, quatro postos de serviço e quatro de atendimento eletrônico, sem con-siderar os caixas eletrônicos de atendimento 24 horas. Essa concentração denota a polari-zação exercida pelo comércio, representado pelo Complexo, pelo Campus Santa Mônica,e pelo Centro Administrativo, localizados na referida área.

Ainda com relação ao setor de serviços existentes na cidade, cabe destacar que,desde a década de 1970, os serviços de comunicação, especialmente os de telecomunica-ções, foram os que mais se desenvolveram, dando origem a importantes redes que interli-gam a cidade ao restante do país e ao mundo. Através dos equipamentos de transmissão ede recepção, que possibilitam a existência de fluxos distantes e descontínuosterritorialmente, garantiu-se à cidade e à sua região de polarização a fluidez exigida noperíodo técnico-científico-informacional. Os investimentos neste setor foram realiza-dos, desde 1954, pela CTBC Telecom, carro chefe da Holding Algar, que, apesar davinculação ao Sistema Telebrás, em 1969, permaneceu privada, o que garantiu a manuten-ção de suas atividades e de sua área de cobertura quando ocorreu o processo de privatizaçãodo sistema nacional de telecomunicações. Cabe destacar ainda os investimentos realiza-dos na utilização da fibra óptica, na implantação do sistema móvel de telefonia celular e nacriação de uma empresa do tipo call center, que atua na prestação de serviços detelemarketing.

Diante do exposto, pode-se afirmar que os fixos artificiais associados aos servi-ços de comunicação, especialmente os de telecomunicações, originaram um importantesistema de objetos e de redes que possibilitaram a existência de fluxos distantes edescontínuos. Essa dinâmica apresentada pela cidade de Uberlândia criou uma grande com-plexidade na sua configuração territorial, gerando fluxos materiais e imateriais que re-sultaram no seu desenvolvimento econômico, primordialmente das atividades eminente-mente urbanas como a indústria, o comércio e os serviços, passando a atender também àsdemandas da agropecuária modernizada, ampliando-se ainda mais o processo de urbaniza-ção da cidade.

A nova espacialidade urbana de Uberlândia, criada a partir da implantação do Com-plexo Center Shopping, localiza-se no Setor Leste da Cidade, de acordo com as Zonas dePlanejamento. Aproveitando-se da infra-estrutura, principalmente a do transporte, criada

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pelo poder público local, a concentração comercial e de serviços neste setor promoveu avalorização da área, principalmente do atual Bairro Santa Mônica, onde também está situ-ado o Campus Santa Mônica da UFU e o Centro Administrativo. O entroncamento dasAvenidas João Naves de Ávila e Rondon Pacheco, com a implantação do Complexo Co-mercial do Center Shopping, transformou-se num dos eixos viários mais importantes dacidade. As estatísticas da Secretaria de Trânsito e Transporte (STT) da Prefeitura Munici-pal de Uberlândia revelam o volume de veículos que circulam no referido cruzamento e anecessidade de minimizar os congestionamentos no entorno do “novo centro comercial”da cidade.

No contexto de mudanças da rede urbana brasileira, cabe reconhecer os novos pa-péis e valores desempenhados pelas cidades e suas respectivas regiões, assim como asnovas funções urbanas e as novas interações espaciais que delas derivam, particularmenteas relações cidade-região e as inter-urbanas. Tais mudanças determinam os novos modosde inserção das cidades na rede urbana, alteraram o tamanho, a densidade, as funções e asinterações espaciais dos centros urbanos e, por conseguinte, a própria forma espacial darede urbana. Nesse sentido, nos itens seguintes deste capítulo, através da análise da ativi-dade comercial desenvolvida em Uberlândia, estudou-se a organização espacial da cidadee a nova espacialidade urbana criada a partir da instalação do complexo comercial formadopelo shopping e pelo hipermercado Carrefour.

O Desenvolvimento atual do Comércio de Uberlândia e a Formação de NovasEspacialidades Urbanas

Nos últimos anos, mais precisamente, a partir da década de 1970, a cidade deUberlândia, que tem no comércio seu principal elemento de surgimento e desenvolvimen-to, intensificou seu processo de urbanização. A necessidade de abastecer o mercado con-sumidor local e, posteriormente, regional, criou os quesitos necessários à instalação denovos estabelecimentos comerciais. Analisando-se as formas de abastecimento que sur-giram em Uberlândia após a referida década, denota-se que a cidade possui uma atividadecomercial ampla e extremamente dinâmica.

O aumento da população urbana e o acúmulo de capital constituem-se as principaiscausas do incremento comercial. No Brasil, o processo rápido e desarticulado de urbani-zação, possibilitou a instalação de modernas formas de distribuição comercial, principal-mente dos supermercados, hipermercados e shopping centers. Atualmente, mais de 85%dos produtos consumidos no país são comercializados por essas modalidades comerciais.

Em Uberlândia os supermercados começaram a se instalar a partir da década de1960. O primeiro deles foi o Bom Preço, em 1964. Em 1972, a empresa atacadista AlôBrasil implantou, na área central da cidade, o Supermercado Alô-Brasil, onde atualmenteencontra-se instalada uma das lojas dos Supermercados Bretas. Em 1978, chegaram àcidade as Lojas Americanas, presentes até hoje. No início dos anos de 1980 foi a vez doPão de Açúcar instalar uma loja na cidade, mais tarde vendida para empresas locais, ainda

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em meados dos anos 1990. Em 1989 foi inaugurada uma loja do Makro atacadista, perten-cente ao Grupo holandês SHV MAKRO NV.

De acordo com as informações da Secretaria de Planejamento da Prefeitura Muni-cipal, em 2004 existiam na cidade 4.198 empresas varejistas e 563 que atuavam no co-mércio atacadista. A falta de informações mais precisas sobre o varejo alimentício (aque-le que atuava com a denominação de “secos e molhados”), fez com que a pesquisa fosserealizada no Guia Sei, Lista Telefônica de Uberlândia. Mesmo sabendo-se que nem todasas empresas do ramo divulgam seus estabelecimentos nessa publicação, esta foi uma al-ternativa encontrada para que se pudesse trabalhar com um número mais próximo do real.Pelas dimensões do espaço urbano de Uberlândia, seria praticamente impossível buscartal informação em todos os bairros que compõem os setores da cidade. Encontrou-se umtotal de 176 empresas do auto-serviço alimentar. Nesse grupo estão relacionados dozeempórios, 143 supermercados, um hipermercado, quatro mercearias, três mini-merca-dos, dois mini-boxes, nove lojas no formato peg-pag e uma loja do atacadista Makro, queatua também na modalidade de varejo. De acordo com as informações na referida figura,constata-se que o Setor Leste da cidade é o que concentra o maior número de lojas doauto-serviço alimentar (dezesseis lojas no bairro Santa Mônica, sete no Tibery e quatro noUmuarama e Custódio Pereira). Esses bairros apresentam grandes adensamentospopulacionais o que justifica a concentração comercial. O Hipermercado Carrefour, oMakro e um dos Supermercados da Rede Irmãos Bretas são as maiores lojas do setorsituadas nessa região da cidade. Outro destaque importante é o bairro São Jorge, que tam-bém apresenta uma grande concentração demográfica, onde se constatou um total de onzelojas. Pode-se mencionar ainda os bairros Nossa Senhora das Graças, Santa Helena Presi-dente Roosevelt, Jardim Brasília, Canaã, Jardim das Palmeiras, Mansour, Tocantins, Gra-nada e Laranjeiras com uma variação de cinco a seis lojas em cada um. Na área central dacidade, destaca-se o bairro Nossa Senhora Aparecida que possui nove lojas em atuação.Conforme anteriormente citado, uma das propostas do Plano Diretor da cidade era, base-ado no Sistema de Transporte Integrado, implantar os Eixos Estruturais e promover a ins-talação de estabelecimentos comerciais no entorno dos Terminais de Transporte Público.Verifica-se a carência desses estabelecimentos em vários bairros, principalmente os maisdesprovidos de infra-estruturas. Pelo que se constatou, em todos os bairros da cidadeexiste pelo menos uma mercearia que comercializa “gêneros de primeira necessidade”.Porém, devido às condições financeiras, muitos comerciantes não possuem nem mesmouma linha telefônica. Isso explica, pelo menos em parte, a falta de estabelecimentos co-merciais em muitos bairros que compõem a malha urbana de Uberlândia.

Na década de 1960, nos bairros Aparecida e Martins, foram criados dois empreen-dimentos comerciais na área central da cidade, que, por possuírem várias lojas, receberama designação de Shopping Center Norte e Shopping Center Sul, respectivamente. Taisestabelecimentos eram organizados de forma que algumas lojas voltavam-se para a rua eoutras para pátios internos. Pelas características que apresentavam não se pode classificá-los como shopping e sim como galerias comerciais. Nesses espaços foram instaladaslojas de vestuário, barbearias, farmácias, bares, mercearias, entre outras. Atualmente elesainda fazem parte da história, da paisagem e da cultura da cidade. Contudo, encontram-se

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bastante deteriorados e têm seus produtos voltados para um comércio mais popular, alémde possuírem várias unidades de serviço. Naquela década, as galerias também já faziamparte dos estabelecimentos varejistas de Uberlândia. Inicialmente localizavam-se apenasna área central, posteriormente, expandiram-se e chegaram a diversos bairros. As localiza-das no centro foram instaladas no piso térreo de diversos edifícios, chegando, inclusive, aatingir vários andares. Nos bairros mais afastados, elas formavam um conjunto de lojasvoltadas para a rua.

O primeiro shopping da cidade foi instalado em 1987. O Ubershopping, confor-me foi denominado, possuía uma área de 17.000m² de área bruta para aluguel e localizava-se no Jardim Karaíba que, hoje, constitui uma área nobre do Setor Sul da cidade. Quandoda sua inauguração, possuía 91 lojas que comercializavam diferentes produtos, três “lojasâncora” e cerca de 1.200 vagas de estacionamento. O Ubershopping foi o segundo em-preendimento do setor em Minas Gerais e o primeiro do Triângulo Mineiro. Chegou apossuir um conjunto de lojas composto por grifes famosas que, hoje, apesar de aindaexistirem em outras regiões do país, não atuam mais na cidade. Nesse empreendimentocomercial existia uma praça de alimentação e um espaço reservado para a realização deshows artísticos. Porém, devido à sua localização afastada do centro da cidade e, princi-palmente, à falta de infra-estrutura e de transporte que facilitasse o deslocamento até olocal, o shopping era freqüentado apenas pela classe de maior poder aquisitivo da cidade.Até mesmo os funcionários tinham enormes dificuldades de acesso, pois além de nãoexistir transporte público que suprisse a demanda, não havia uma via rápida que facilitasseo fluxo de veículos. (Pesquisa de Campo, 2004). O empreendimento Ubershopping, foiconstruído com a finalidade de valorizar os terrenos localizados no seu entorno que, se-gundo moradores mais antigos do local, pertenciam ao prefeito da cidade. Para atingir talobjetivo, amplas avenidas foram abertas e pavimentadas, os terrenos foram valorizados eloteados pela imobiliária pertencente ao então prefeito. Atualmente, esses espaços com-põem a área mais valorizada e elitizada da cidade.

No início da década de 1990, algumas lojas foram fechadas. Com uma administra-ção pouco eficiente que não logrou reverter o quadro e a construção do HipermercadoCarrefour, em 1990, iniciou-se a construção de um novo shopping, ao lado dohipermercado. O novo shopping – o Center Shopping, construído pelo Grupo Arcom,um dos maiores atacadista-distribuidores do país, inaugurado em 1992, representou a fa-lência definitiva do Ubershopping cujas instalações passaram a ser ocupadas por institui-ções de ensino superior da rede particular.

O Complexo Center Shopping e a Concentração do Comércio e dos Serviçosem Uberlândia

Um equipamento urbano do porte de um shopping influencia sobremaneira a vida,os fluxos e as relações comerciais, econômicas e sociais de uma cidade. A partir da cons-trução do Center Shopping e do Hipermercado Carrefour - “os novos templos do con-sumo”, uma série de modificações espaciais foram engendradas no urbano de Uberlândia.

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Novos fluxos surgiram valorizando e desvalorizando áreas, criando novas dinâmicasterritoriais. Pois, á medida que o entorno destes empreendimentos passaram a receberfluxos de populações de renda mais elevada, novos investimentos públicos foram realiza-dos, valorizando e criando uma nova centralidade no tecido urbano.

Até a década de 1980, a área onde hoje está localizado o Complexo Center Shoppingera ocupada predominantemente por residências de pequeno porte, acomodando pessoasde média e baixa renda, existindo também, uma grande quantidade de lotes vagos, na época,desprovidos de valor. As áreas destinadas ao comércio e aos serviços apresentavam-secomo uma paisagem descontínua, presentes apenas nos locais de maior adensamentopopulacional. No referido mapa, destaca-se ainda a Área Institucional, o Campus da Edu-cação Física da UFU, localizado no Bairro Nossa Senhora Aparecida, Setor Central. Quan-to ao uso e a ocupação do solo da região do entorno, evidencia-se que, após a construçãodo Hipermercado Carrefour e do Center Shopping, ocorreu uma supervalorização daárea. Os terrenos vazios foram apropriados pelo capital imobiliário e praticamente desa-pareceram, enquanto as áreas residenciais passaram a apresentar-se como a principal for-ma de ocupação e uso do solo. Além das áreas residenciais, sobressaem-se ainda os espa-ços ocupados por atividades comerciais, institucionais e de serviços, com destaque para oHipermercado Carrefour, o Center Shopping, o Centro Administrativo Municipal, oCampus Santa Mônica da UFU, o Serviço Social do Comércio – SESC, várias igrejascomo a Igreja Evangélica Assembléia de Deus, entre outros. Porém, cabe ressaltar que oprincipal fator deste adensamento populacional, de comércio e de serviços foi a proximi-dade com os eixos de vias rápidas que contornam a área estudada – as Avenida João Navesde Ávila e a Rondon Pacheco que interligam os bairros do Setor Sul e Leste ao SetorCentral, bem como às principais rodovias federais e estaduais que passam por Uberlândia.A partir de então, os bairros localizados no Setor Leste da cidade começaram a concentrarum grande número de população e a exigir do poder público local a implantação de infra-estruturas, como a abertura e a pavimentação de ruas, implantação de serviços de saúde, depraças, de creches, de equipamentos urbanos e a reformulação do transporte público, en-tre outros, que contribuíram de forma significativa para a valorização imobiliária da re-gião, atraindo a instalação de novos estabelecimentos comerciais e de serviços.

Os bairros Santa Mônica e Saraiva constituem-se exemplos dessas transformações,visto que foram os que mais se beneficiaram com a implantação do shopping e doCarrefour. Passaram a ser habitados por famílias com maior poder aquisitivo, tornando-se bairros cada vez mais cobiçados pela população local. O bairro Tibery, situado “atrás”do shopping, também tem sido valorizado. Porém, por ser mais antigo, habitado por pes-soas de origem mais humilde e que se recusam a vender suas casas, poucas modificaçõesespaciais têm ocorrido no local.

Enquanto isso, outros lugares começaram a perder seu poder de atração ou tive-ram-no diminuído, como muitas áreas centrais de cidades grandes e médias que, após aconstrução de grandes superfícies comerciais – shopping centers e hipermercados emlocais de acesso rápido, geralmente mais periféricos – passaram a receber menor atençãoe menor fluxo de investimentos públicos, a exemplo das periferias. Em Uberlândia, a áreacentral do núcleo urbano foi ocupada por um comércio mais popular. Algumas ruas e ave-

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nidas especializaram-se na prestação de serviços financeiros, imobiliários, clínicas médi-cas e hospitais, além da presença de uma intensa atividade ambulante. Na cidade, o comér-cio informal levou o poder público a criar espaços destinados à comercialização de pro-dutos, basicamente importados e de baixo valor agregado. No início, eles foram denomi-nados “camelódromos”, atualmente são conhecidos como “shoppings populares”.

Em 1989, deu-se início à construção do Hipermercado Carrefour de Uberlândiaque começou a operar em 1991. Atualmente, o hipermercado possui 37 check-outs,comercializa cerca de cinqüenta mil itens em uma área de aproximadamente 10.000 m². Aloja possui seção de frios e laticínios, de jardinagem, bazar, “secos e molhados”, bebidas,eletrodomésticos e eletroeletrônicos, comercializa celulares e pneus, possui padaria, açou-gue, entre outros departamentos. No prédio da loja estão presentes outras empresasprestadoras de serviço como, cabeleireiro, chaveiro, relojoaria, consultório odontológico,lojas de fast-food, de perfumaria (o Boticário) e de equipamentos de som e imagem.Possui ainda caixas automáticos na entrada da loja e na parte externa, em frente à loja,vários quiosques de banco 24 horas. A partir da instalação do hipermercado, começa àconcentração comercial, de serviços e populacional no seu entorno, inclusive o shoppingcenter.

Quando da aquisição desse terreno, o grupo tinha a pretensão de construir no locala sede do atacado, pois várias vias de circulação rápida passam por esse setor da cidade.Esta acessibilidade seria de fundamental importância para o escoamento das mercadoriascomercializadas, tanto em direção ao centro da cidade quanto em direção às principaisrodovias que passam por Uberlândia, visto que este se encontra no cruzamento de duasavenidas de fluxo rápido, a Avenida Rondon Pacheco e a João Naves de Ávila. Ao analisarmais detalhadamente a região, observou-se que esta estava passando por um grandeadensamento populacional, principalmente pela proximidade com o Campus Santa Môni-ca, da UFU, e pelo projeto municipal de construir a nova sede do poder executivo elegislativo do município, ao lado do terreno adquirido pelo Grupo. A intensa mobilidadeque certamente ocorreria no local, prejudicaria o fluxo de caminhões utilizados pelo ata-cado. Assim, surgiu a idéia de construir um novo shopping. A logística que serviria à distri-buição de produtos acabou facilitando a instalação do novo empreendimento que, para seinstalar, busca lugares servidos de vias rápidas e grandes áreas para que possam serconstruídos. Junto a esse terreno, já estava em andamento á construção do HipermercadoCarrefour que, posteriormente, passou a ser uma das lojas âncora do shopping, junta-mente com mais duas lojas de departamento e a praça de alimentação. Atualmente essaancoragem é realizada principalmente pelos serviços de entretenimento e lazer, pelas lo-jas de departamento (Renner, Magazine Luíza), duas Mega Stores de móveis e eletrodo-mésticos (Ponto Frio e o Mig), dez salas de cinema no sistema multiplex, boliche, casanoturna (Swingers), duas choperias, diversos restaurantes e uma ampla praça de alimenta-ção. Possui ainda um total de 210 lojas, uma escola de ensino médio, cursos de idiomas,sede de escritórios de empresas que atuam na cidade e 2.500 vagas para estacionamento,sendo 900 vagas cobertas. Anexo ao shopping, em 1996 o grupo construiu um hotel, o“Plaza Inn”, com 153 apartamentos e, em 2000, um Centro de Convenções que, juntamen-te com o Center Shopping, formam um dos maiores complexos comerciais de serviços elazer do interior do Brasil. Após a ampliação mencionada, o Complexo Shopping Center

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passou a ocupar uma era total de 98.436,11 m², sendo 79.000 m² de área do shopping e31.000 m² de área bruta para locação – ABL. (Pesquisa de Campo, set./2004)

O Centro de Convenções com 61.749,19 m², com capacidade de receber até 4.000pessoas, compõe-se de salas para feiras e exposições, seminários, palestras, festas e shows.O complexo de cinema possui 10 salas de exibição, comportando um total de 2.000 luga-res A diversidade comercial, de serviços e de lazer.

Como modalidade comercial que requer grandes áreas para a sua instalação, osshopping centers criam uma nova centralidade nos locais onde são construídos, dinami-zam o espaço do seu entorno, atraem formas comerciais e de serviços, além da atenção dopoder público que acaba realizando toda a infra-estrutura necessária à instalação destes.Ruas e avenidas são pavimentadas; viadutos, rotatórias e contornos são construídos; cabose redes de comunicação são instalados, além da estrutura básica como as redes de água,luz e de esgoto, entre outros.

Ao analisar a questão, Gaeta (apud PINTAUDI; FRÚGOLI Júnior, 1992) afirmouque:

A transformação que esse espaço comercial representa, o significado desua inserção no urbano, vem indicar que há um processo novo que apontapara uma organização do espaço cada vez mais gerenciada e monopoliza-da. Os diversos elementos que se transformam e se desenvolvem relaçõesde interesse da geografia, como o ponto comercial, as externalidades, arelação próximo/ distante, a relação continuidade/ descontinuidade, aobsolescência do produto especializado, a ideologização do espaço, a rela-ção espaço público/ espaço privado, o espaço sistematicamente adminis-trado pelo político, a política miúda do espaço, a transformação de todo oespaço em espaço de poder e controle. (GAETA apud PINTAUDI;FRÚGOLI JÚNIOR, 1992, p. 55-56)

Os agentes imobiliários tiram grande proveito da instalação desses empreendimen-tos. Lançam loteamentos que atraem principalmente a classe média, ávida de consumo.Surgem ainda áreas para comércio e serviços, valorizando ainda mais o entorno destes quese configuram como verdadeiros centros comerciais. A área onde foi construída o CenterShopping configura-se como um exemplo dessa nova centralidade. Após a inauguração,os terrenos localizados no seu entorno foram altamente valorizados. As avenidas que secruzam próximas ao novo shopping passaram por um intenso processo de ocupação. Ne-las estabeleceu-se um grande e diversificado número de lojas comerciais como empóri-os, lojas de conveniência, supermercados; prestadoras de serviços como agências de cor-reio, lotéricas, chaveiros, agências bancárias; concessionária de veículos da Fiat,Volkswagen, Peugeot, Citroen e da Renault; um grande número de hotéis, a maior partedeles concentrada na Avenida João Naves de Ávila; Instituições de Ensino e Escolas deIdiomas; clínicas médicas e veterinárias; casas de show; bares, restaurantes, pizzarias, can-tinas, churrascarias; hospitais; moto-táxi; imobiliárias; locadoras de veículos; lojas demóveis; quadras de esporte; salões de festas, entre outros.

Um número muito grande de estabelecimentos comerciais da cidade, especialmentelojistas e restaurantes, saiu das áreas centrais da cidade e fixaram-se nas proximidades doshopping, criando um novo centro de consumo, de lazer e de entretenimento.

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A fixação desses estabelecimentos nesses locais revitalizou os bairros por ondepassam as Avenidas João Naves de Ávila e Rondon Pacheco. Esta última, até meados dosanos de 1990, vivia inundada, pois foi construída sobre o Córrego São Pedro, que corta acidade. Várias obras de canalização foram realizadas pelo poder público local, criando ainfra-estrutura necessária para que ela fosse urbanizada e, conseqüentemente, valorizada.

Para dar prosseguimento ao estudo do comércio existente na cidade, passar-se-á aanalisar alguns dos principais estabelecimentos do ramo que atuam em Uberlândia. Taisempreendimentos localizam-se nas Avenidas João Naves de Ávila e Rondon Pacheco, umpouco mais distantes do “Complexo Center Shopping e Carrefour”, contudo, também cri-aram no seu entorno um sub-centro de comércio e de serviço.

As Redes de Associações de Supermercados em Uberlândia

Considerando as formas de flexibilidade organizacional na experiência internacio-nal, caracterizada por conexões entre empresas, Castells (1999, p. 181) afirma que “pe-quenas e médias empresas muitas vezes ficam sob o controle de sistemas de sub-contrataçãoou sob o domínio financeiro/tecnológico de empresas de grande porte”. Prosseguindo, oautor escreve ainda que essas empresas também tomem a“[...] iniciativa de estabelecerrelações em redes com várias empresas grandes e/ou com outras menores e médias, en-contrando nichos de mercado e empreendimentos cooperativos.” Sob essa ótica, a forma-ção de redes entre os pequenos e médios estabelecimentos comerciais do auto-serviçoalimentar configura-se como a mais recente estratégia empresarial do setor.

Conforme se salientou, a internacionalização das grandes redes, as fusões e aquisi-ções que ocorreram no setor supermercadista, principalmente a partir da década de 1990,tornaram a concorrência muito mais acirrada. Pequenos e médios varejistas foram, cadavez mais, perdendo seu espaço de atuação. Para sobreviver no novo mercado, eles tiveramque investir na automação das lojas e adotar um perfil “mais agressivo” que pudesse atingiro consumidor. Foi preciso adaptar-se ao novo mercado, buscando novas maneiras de ex-posição de produtos, layout de lojas, investindo em marketing, reduzindo os estoques efazendo novas parcerias com os distribuidores, especialmente com os grandes grupos doatacado-distribuidor.

Com o objetivo de aumentar os lucros e fidelizar clientes, dois grandes atacadistasque conciliam suas atividades com o varejo, o Grupo Martins e o Grupo Peixoto, comsede na cidade de Uberlândia, em 2000 lançaram suas bandeiras de “supermercado devizinhança”: a Rede Smart e a Rede Valor, respectivamente.

Na verdade, a estratégia de investir no varejo já se evidenciava no final da década de1990, quando o Grupo Arcom e o Grupo Martins passaram a investir no varejo. O primei-ro, conforme mencionado, foi o empreendedor do Center Shopping. Quanto ao segundo,implantou várias lojas de varejo em Uberlândia e em Goiânia.

Com o objetivo de desenvolver tecnologias que, depois de testadas, seriamtransferidas aos seus clientes, o Grupo Martins criou na empresa atacadista um setor de-nominado de Núcleo de Clientes Exclusivos cuja finalidade era tornar moderna e eficien-

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te a operação do varejo para os clientes considerados exclusivos. Dessa forma, em 1992foi fundada a primeira loja/laboratório de varejo o Emporium Franquia de Varejo Ltda.,conhecida como Empório da Gente. Moldada no conceito de “loja de vizinhança”, eladestinava-se a atender as necessidades de consumo nas suas circunvizinhanças, com horá-rio de funcionamento ampliado, das 7 às 23 horas, inclusive aos sábados, domingos eferiados. (CLEPS, 1997, p.169)

Essas lojas localizavam-se em bairros estratégicos, com grande número de popula-ção e de poder aquisitivo, ou nos que apresentavam expansão, a exemplo do Setor Leste dacidade, onde o Grupo instalou uma loja nas proximidades do Centro Administrativo e doCampus Santa Mônica da UFU. Além de fornecer as mercadorias, o atacadista orientava aforma de gestão, de layout das lojas, a variedade dos produtos e os modelos de tecnologiaa serem utilizados nas lojas. Com a criação da Rede Smart de Supermercados, as LojasEmpório da Gente foram vendidas.

Para alavancar a expansão varejista, o Grupo Martins criou o Banco Tribanco, quetem como uma das principais prioridades, financiar a montagem de supermercados devizinhança e garantir a expansão da Rede Smart. Outro importante investimento do Grupofoi a implantação da Universidade Martins de Varejo (em 1990), com uma unidade móvel,que ministra cursos de gestão e capacitação profissional a supermercadistas de váriascidades do país. Nos países mais desenvolvidos essa tem sido uma estratégia utilizada jáhá algum tempo. Através dela, pequenos, médios e grandes supermercados criaram sólidasparcerias com seus atacadistas-distribuidores que, através da garantia de suprimentos ne-cessários nas lojas de varejo, permitiram aos empresários maior lucratividade em seusnegócios. Essas parcerias fortaleceram-se e tornaram mais competitivas as cadeias deprodução-distribuição-varejo proporcionando, assim, uma aliança através da qual todospuderam aumentar seus ganhos.

No Brasil, através da associação com a rede, as pequenas empresas procuram tirarproveito das vantagens que esse conceito proporciona. De acordo com as informaçõesobtidas através da pesquisa realizada na empresa em 2004, os benefícios encontrados poressa modalidade referem-se às compras realizadas com os fornecedores, que passam a serem conjunto, aumentando o poder de barganha dos pequenos varejistas, visto que, ao com-prar grandes volumes e diretamente da indústria, os preços dos produtos diminuem, au-mentando o lucro do pequeno comerciante. As negociações são feitas pelas centrais decompras e por profissionais especializados no processo. Como conseqüência imediata,os preços das mercadorias ficam menores e os prazos maiores, aumentando a margemoperacional do varejista. Essa também tem sido uma das estratégias utilizadas pelas gran-des redes de supermercados e hipermercados.

Como modelo organizacional, a interligação entre estas empresas de grande porte,também denominado de “alianças estratégicas”, difere muito dos cartéis e dos acordosoligopolistas, pois “dizem respeito a épocas, mercados, produtos e processos específicose não excluem a concorrência em todas as áreas [...].” (CASTELLS, 1999, p. 183) Nessesentido, a prática do associativismo tem sido vista pelo setor como uma forma de se man-ter no mercado, visto que as vantagens apresentadas por essas associações não se referemapenas ao aumento dos lucros e à comercialização.

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A história do comércio varejista brasileiro mostra que diversas redes foram cons-tituídas como uma central de compras e, posteriormente, expandiram sua área de atuação.O trabalho em conjunto pode abranger várias iniciativas, tais como: cartão de crédito,campanhas de marketing, assessoria jurídica e contábil, criação de produtos com marcaprópria, automatização, treinamento de funcionários, a centralização da seleção e da ad-ministração dos recursos humanos.

O associativismo permite ainda a padronização das operações, do layout das lojas,do uniforme dos funcionários, das sacolas, dos pacotes, das tabelas de preços e dos carta-zes e tablóides de promoções. Outro aspecto relevante é que tais associações estão inte-gradas com um operador logístico que garante a centralização e a distribuição das merca-dorias. Com isso, as lojas diminuem os espaços de depósito e evitam os inconvenientes deter diversos caminhões abastecendo uma loja, às vezes de forma simultânea. A prática doassociativismo não proporciona apenas preços menores. Permite também regular aestruturação das pequenas empresas, possibilita a troca de experiência entre os associa-dos, uma maior profissionalização das operações, acarretando redução dos desperdícios.Por outro lado, os principais problemas enfrentados pelas redes de associativismo dizemrespeito à integração de diferentes culturas empresariais, visto que as grandes redes damodalidade, especialmente as destacadas neste trabalho, atuam em vários estados do país;além da não previsão das centrais de compras como figura tributária, pois os fornecedoresemitem uma nota fiscal única.

Mesmo apresentando tais dificuldades empresariais, de logística e de distribuição,a formação de redes tem fortalecido as pequenas empresas do varejo alimentício, tornan-do-as mais competitivas.

Após essas breves considerações, apresentar-se-á um estudo de caso das duas mai-ores Redes e Associações de Varejo, com sede em Uberlândia, a Rede Smart e a RedeValor.

A Rede Smart de Supermercados

A concentração das grandes redes varejistas é uma tendência que se verifica emtodo o mundo. A internacionalização e a concentração fizeram com que a concorrênciaficasse cada vez mais acirrada. A partir da década de 1990, os hábitos de consumo dobrasileiro e o perfil do varejo mudaram muito. Foi preciso buscar novas formas e estraté-gias que pudessem atender os novos hábitos de consumo impostos pela urbanização e peloprocesso de globalização econômica e cultural. Porém, a investida das multinacionais e aconcentração do setor não têm tirado o mercado dos pequenos comerciantes do varejo.

Com o fim da inflação o consumidor brasileiro deixou de fazer compras mensais.Os afazeres e a correria do cotidiano também têm modificado os hábitos de compras dosbrasileiros. Nesse cenário a importância das lojas de vizinhança tem aumentado. Pensandonessas mudanças e num mecanismo de atuação para concorrer com as grandes redes dosetor supermercadista, foi criada, no ano 2000, a Rede Smart (Figura 1). Presente em seisestados brasileiros (Ceará, Paraíba, Bahia, Goiás, Minas Gerais e São Paulo) e no Distrito

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Federal, a Rede Smart possui 439 lojas associadas. O Grupo Martins, que atua em váriosramos de negócio, no setor atacadista, possui mais de duzentos mil clientes constituídospor pequenos e médios varejistas e distribuídos em todo o país. Desse total, quatorze milestão associados à Universidade do Varejo. O ingresso do comerciante na rede é feitomediante o pagamento de uma taxa no valor de 15.000 reais. Mensalmente, os varejistaspagam uma taxa de administração que pode variar entre um 1 e 1,6 mil reais, dependendodo número de caixas da loja. Para realizar as negociações entre os fornecedores e osassociados da rede, existem oitenta funcionários do Grupo Martins que se dedicam comexclusividade a essa atividade.

Foram criados 15 pólos regionais, localizados nos estados em que a rede atua.Cada um possui uma central de compras criada para atender os varejistas. Essas centraisadquirem 5% dos itens vendidos nas lojas. (Pesquisa de Campo, jan./2004) As lojas asso-ciadas à rede estão concentradas nos estados de Minas Gerais (106 lojas, 38,0%), SãoPaulo (68 lojas, 23,0%) e Bahia (32 lojas, 11,5%). No Pólo Triângulo Mineiro, em feve-reiro de 2004, existiam 35 lojas associadas à Rede as quais se localizavam em dezenovecidades da Mesorregião Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba.(Figura 2) Quinze das 35 lo-jas pertencentes à Rede Smart do Pólo Triângulo Mineiro, estão localizadas na cidade deUberlândia (43,0%), duas na cidade de Prata e em Santa Vitória. Nas demais cidades regi-onais onde ela atua, existe apenas uma loja para cada uma. A rede não forneceu a localiza-ção das lojas associadas de Uberlândia. Nos trabalhos de campo, realizados em 2004,observou-se que essas se concentram nos bairros mais populosos e de maior poder aqui-sitivo. São “lojas de vizinhança”, que atendem os consumidores residentes próximo a elas.Pode-se localizá-las nos bairros Santa Mônica, Luizote de Freitas, Saraiva, Cidade Jardim,Tocantins e Aurora, Setores Leste, Oeste e Sul da cidade. Assim, como estabelecimentosque visam atender às necessidades diárias da população do local onde estão instalados, aslojas da rede localizam-se, preferencialmente nos bairros mais adensados e distantes dasgrandes redes que atuam na cidade.

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A Rede Valor de Supermercados

Empresa do Grupo Peixoto, um dos maiores atacadistas de Uberlândia e do Brasil,começou a ser idealizada em 1989, iniciando a sua atuação em meados do ano 2000. Como objetivo de aproximar o pequeno varejista da indústria, o grupo passou a apoiar o desen-volvimento e a profissionalização do comércio de pequeno porte (Figura 2).

Figura 2 - Localização e Número de Lojas Associadas àRede Valor em Minas Gerais - 2004

No início das atividades da rede, o processo estava todo concentrado na atividadedo atacado. Posteriormente, o grupo percebeu a necessidade de aumentar o portifólio deserviços e a quantidade de produtos para atender os clientes e fidelizá-los. Para que isso

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acontecesse, o atacado teria que se adequar ao perfil dos clientes da rede que, na época,era em torno de quarenta lojas. Com culturas e hábitos de consumo diferenciados, o ataca-do necessitaria formar um mix de produtos voltado exclusivamente para esses clientes, oque seria inviável, pois, para se ter uma idéia do volume de negócios do atacado, atualmen-te, o Peixoto Atacadista conta com 80.000 clientes ativos, distribuídos em quase todos osestados do país. Assim, o grupo sentiu a necessidade de criar uma empresa que tivessecomo meta desenvolver todo um processo logístico e comercial voltado ao atendimentodo pequeno varejista, surgindo a Rede Valor.

Inicialmente, por questões logísticas, pelo número de clientes com um relaciona-mento comercial com o atacadista e por possuir lojas com perfil muito parecido com oidealizado pela nova empresa, as áreas escolhidas para a sua atuação foram os estados deMinas Gerais, o Norte do Paraná e a região de Campinas. Durante quase dois anos, todosos negócios e operações desenvolvidos pela Rede eram baseados no atacado.

Em 2005, a Rede possuía 232 lojas sediados em cinco regionais: a Regional MinasGerais, com 18 lojas (7,8%); a Regional Norte do Paraná, com 34 lojas (14,7%); a Regi-onal da Grande São Paulo, com 120 lojas (51,7%); a Regional de Campinas, com 25 lojas(10,8%) e a Regional de Ribeirão Preto, com 35 lojas (15,0%). Em Uberlândia são seislojas de auto-serviço localizadas nos bairros Lagoinha (Setor Sul), Planalto e Jardim Pa-trícia (Setor Oeste), Nossa Senhora Aparecida (Setor Central), Pacaembu e Marta Helena(Setor Norte). As lojas associadas às redes encontram-se localizadas nos bairros que con-centraram o maior número de população. A partir da criação dos Eixos de Estruturação eda implantação dos terminais urbanos do Sistema Integrado de Transporte, formaram-sesub-centros de comércio e de serviços que passaram a atrair a população. Enquanto peque-nos e médios comerciantes do auto-serviço alimentar, as “lojas de vizinhança” aproveita-ram-se dessas vantagens locacionais e buscaram esses lugares para se estabelecerem.

Esses dados demonstram que o varejo brasileiro ainda constitui-se como um mer-cado onde, utilizando-se de estratégias comerciais, empresariais e econômicas, é possí-vel prosperar. Revelam ainda que, mesmo frente à forte concorrência existente no setor,na qual as grandes redes de hipermercados ainda lideram através da nova modalidade – aformação de redes de associativismo -, os pequenos comerciantes do varejo estão conse-guindo manter-se no mercado e conquistando o mercado de vizinhança onde estão instala-dos. Contrariando a lógica capitalista imposta pela presença das grandes redes de auto-serviço que, quando se instalaram no país, impuseram novos hábitos de compra e de con-sumo; um novo ritmo nas vendas, nas negociações e nos preços praticados – ocasionandoo fechamento de um grande número de pequenos estabelecimentos que não conseguirammanter-se no mercado – a formação das redes de associativismo demonstram que a con-centração do setor também pode ser realizada por pequenos e médios comerciantes. Atra-vés de investimentos em tecnologia, treinamento dos funcionários, melhor atendimentoao cliente, e, localização estratégica, as essas redes tornaram-se competitivas e conquis-taram os consumidores que habitam no entorno das “lojas de vizinhança”.

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Considerações Finais

Enquanto produto das relações entre os homens e a natureza, o lugar revela as ca-racterísticas da sociedade que o produz. Na sociedade capitalista, o espaço encontra-secada vez mais urbanizado. Nele, as cidades tornaram-se verdadeiras máquinas de consumoonde o que antes era considerado como produto de luxo, hoje é visto como necessidadescriadas, que fazem parte do cotidiano das pessoas.

Estudando-se a importância da atividade comercial na organização do espaço urba-no, observou-se que os hipermercados e os shopping centers constituem-se como im-portantes modalidades comerciais que foram inseridas em diferentes nações, de diferen-tes culturas e modos de vida, onde o local e o mundial encontram-se justapostos, Essasnovas formas de se realizarem as trocas são consideradas como objetos sociais que, ondese instalam, provocam mudanças estruturais e alteram o cotidiano das pessoas que sãoconvidadas a consumir.

Da antiguidade aos dias atuais, nas metrópoles mundiais, grandes e médias cidades,as áreas para a instalação do comércio sempre foram estrategicamente escolhidas. Tanto opoder público quanto o privado investem para que esses “novos espaços” possam apresen-tar a infra-estrutura básica à implantação das grandes superfícies comerciais que, ao seinstalarem, agregam valor ao lugar. Com a exigência de grandes áreas para sua instalação,os empreendedores do comércio buscaram espaços em avenidas de fluxo rápido e às mar-gens dos principais eixos viários do país. Tal apropriação engendrou importantes transfor-mações na organização interna das cidades. Criaram-se novas espacialidades destinadas àdistribuição de mercadorias, de serviços, de lazer e de entretenimento.

Através dos estudos realizados obteve-se a oportunidade de descobrir como ospequenos e médios comerciantes do varejo brasileiro estão buscando novas formas parase manter no mercado. Alguns, inclusive, competem no mesmo espaço de atuação dasgrandes empresas do setor, como é o caso das Redes de Associações, formadas por ataca-distas, e por redes internacionais de hipermercados, que descobriram a importância do“comércio de vizinhança”. É no fortalecimento das lojas de vizinhança que se reforça atese.

No caso de Uberlândia, apoiadas na estrutura dos grandes atacadistas, as redes deassociações fortaleceram-se e criaram as condições necessárias para que seus clientespossam sobreviver no mercado. Enquanto estabelecimentos comerciais voltados ao abas-tecimento de populações que habitam os lugares próximos a eles, esses impuseram umanova dinâmica local que suscitou a formação de sub-centros.

A partir do trabalho desenvolvido, concluiu-se que com a implantação de grandessuperfícies comerciais, várias cidades médias tiveram o seu tecido urbano modificado,pois, a concentração do comércio e dos serviços no entorno desses equipamentos fezcom que o social, o econômico e o cultural se modificassem criando novas centralidades.Nesse sentido, acredita-se que Uberlândia, ao ter seu crescimento urbano influenciadopela atuação dessas novas modalidades comerciais, passou por um processo de desenvol-vimento econômico que transformou a cidade num importante pólo de atração e de influ-

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ência. Constatou-se, ainda, que as políticas públicas, praticadas na cidade, impuseram umnovo ritmo de crescimento econômico, de reordenamento do espaço e de reformulaçãodo sistema urbano, o que implicou aspecto modernizante e contribui para dar à cidade ummovimento de urbanização, um novo conteúdo e uma nova dinâmica, marcados pela ampli-ação dos papéis por ela desempenhados.

Referências

BRAGA, R.; CARVALHO, P. F. (Orgs.) Estatuto da Cidade: Política urbana e cidadania.

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