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1 O Critério Verificacionista de Significado no Círculo de Viena Vitor Vieira Vasconcelos Bacharel em Filosofia pela Universidade Federal de Minas Gerais UFMG Belo Horizonte, Minas Gerais, 2005 O critério verificacionista de significado é o método como alguns filósofos do Círculo de Viena (como Neurath e Schlick) utilizaram-se para afirmar se a proposição incluída em uma sentença é passível ou não de ser comprovada pelas informações advindas das experiências empírico-cientificas. Os defensores do critério verificacionista pretendem com isso eliminar todos os traços remanescentes da metafísica no pensamento ocidental. É assim que eles resolvem o problema da demarcação entre ciência e não- ciência: se uma preposição não puder ser verificada pela experiência, então ela não é nem falsa e nem verdadeira, mas sim destituída de significado. Dentre essas proposições sem significado, estariam às questões metafísicas tradicionais e, também, certas proposições infiltradas na ciência, mas que ainda possuam caráter ontológico e transcendente. Estas últimas são chamadas de pseudo-questões, e estariam bastante presentes em teorias como marxismo, psicanálise, psicologia, vitalismo e outras teorias de aspiração cientifica, que necessitariam ainda de ser ‘’purificadas’’. Apesar disso, o critério verificacionista encontrou problemas para tratar de entidades abstratas, inclusive as presentes nas teorias da Física (ciência esta que era considerada como a mais madura e mais isenta de proposições metafísicas). Também foram enfrentados problemas para definir com rigor o que é a verificação e qual é o seu método, pois para decidir o que pode ou não ser testado é preciso, primeiro decidir em que consiste essa teste. Afinal, ao se

O Critério Verificacionista de Significado no Círculo de Viena

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O critério verificacionista de significado é o método como alguns filósofos do Círculo de Viena (como Neurath e Schlick) utilizaram-se para afirmar se a proposição incluída em uma sentença é passível ou não de ser comprovada pelas informações advindas das experiências empírico-cientificas. Os defensores do critério verificacionista pretendem com isso eliminar todos os traços remanescentes da metafísica no pensamento ocidental. Apesar disso, o critério verificacionista encontrou problemas para tratar de entidades abstratas, inclusive as presentes nas teorias da Física (ciência esta que era considerada como a mais madura e mais isenta de proposições metafísicas). Também foram enfrentados problemas para definir com rigor o que é a verificação e qual é o seu método, pois para decidir o que pode ou não ser testado é preciso, primeiro decidir em que consiste essa teste. Afinal, ao se defender certas informações ditas empíricas como sendo o fundamento base para a construção do conhecimento humano, assemelha-se muito à forma dos argumentos das filosofias realistas, sendo que estas últimas também eram consideradas como metafísicas.

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O Critério Verificacionista de Significado no

Círculo de Viena

Vitor Vieira Vasconcelos

Bacharel em Filosofia pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG

Belo Horizonte, Minas Gerais, 2005

O critério verificacionista de significado é o método como alguns filósofos

do Círculo de Viena (como Neurath e Schlick) utilizaram-se para afirmar se a

proposição incluída em uma sentença é passível ou não de ser comprovada

pelas informações advindas das experiências empírico-cientificas.

Os defensores do critério verificacionista pretendem com isso eliminar

todos os traços remanescentes da metafísica no pensamento ocidental. É

assim que eles resolvem o problema da demarcação entre ciência e não-

ciência: se uma preposição não puder ser verificada pela experiência, então ela

não é nem falsa e nem verdadeira, mas sim destituída de significado. Dentre

essas proposições sem significado, estariam às questões metafísicas

tradicionais e, também, certas proposições infiltradas na ciência, mas que

ainda possuam caráter ontológico e transcendente. Estas últimas são

chamadas de pseudo-questões, e estariam bastante presentes em teorias

como marxismo, psicanálise, psicologia, vitalismo e outras teorias de aspiração

cientifica, que necessitariam ainda de ser ‘’purificadas’’.

Apesar disso, o critério verificacionista encontrou problemas para tratar

de entidades abstratas, inclusive as presentes nas teorias da Física (ciência

esta que era considerada como a mais madura e mais isenta de proposições

metafísicas). Também foram enfrentados problemas para definir com rigor o

que é a verificação e qual é o seu método, pois para decidir o que pode ou não

ser testado é preciso, primeiro decidir em que consiste essa teste. Afinal, ao se

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defender certas informações ditas empíricas como sendo o fundamento base

para a construção do conhecimento humano, assemelha-se muito à forma dos

argumentos das filosofias realistas, sendo que estas últimas também eram

consideradas como metafísicas.

Otto Neurath e, inicialmente, R. Carnap defendiam o critério

verificacionista de significado, pretendendo, por meio da delimitação entre o

que pode ou não ser testado, excluir as proposições metafísicas presentes nos

discursos cientificas e filosóficos.

Neurath, empreendendo neste intuito, propôs um método que

denominou de atomismo epistemológico. Sua proposta é que se reduzissem

logicamente todas as sentenças ao que ele chamava de ‘’proposições

protocolares’’. Essas proposições poderiam ser testadas diretamente por

experimentos científicos, e não restariam dúvidas acerca de sua falsidade ou

veracidade. Ao contrário, as sentenças que não conseguiam ser reduzidas a

sentenças protocolares seriam taxadas de metafísicas e, portando, deveriam

ser excluídas. Criaria-se um ‘’INDEX’’ de palavras banidas.

Sentença protocolar seria aquela cuja proposição possa ser provada

diretamente pela experiência empírica, desde que essa siga o protocolo

cientifico. Esta definição, aparentemente, clarifica a explicação de que as

teorias cientificas são caracterizadas como rigorosas e exatas em suas

asserções sobre o mundo.

Todavia, muitas questões se levantam sobre as sentenças protocolares.

Uma delas é sobre até que ponto as experiências cientificas podem ser

objetivas, ou seja, como o cientista é influenciado por seu próprio arcabouço

teórico, no momento de relatar os resultados de uma experiência. Aliás, os

instrumentos de medição utilizados nos experimentos já possuem uma

necessidade teórica: por exemplo, os termômetros são construídos a partir de

teorias de propagação de calor e energia, ao passo que os telescópios são

construídos a partir de conhecimentos de teorias de óptica e física ondulatória.

Outra questão importante é sobre até onde as sentenças complexas

precisam ser reduzidas para se chegar as sentenças protocolares. Saber que a

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sentença ‘’X é um inseto’’ pode ser decomposta nas seguintes sentenças talvez

não seja suficiente:

‘’ X é um animal’’

‘’ X tem seis patas’’

‘’ X tem exoesqueleto de quitina’’

‘’ X tem patas articuladas’’

Afinal, pode-se ainda reduzir mais ainda as proposições acima, exigindo

análises químicas para a confirmação da quitina no exoesqueleto, pedindo-se

análises embrionárias para checar algum possível ocultamento de um dos

pares de pontas, ou exigindo-se até análises de DNA para se comprovar se o

animal se inclui realmente na linha evolutiva dos insetos. Caso venha-se a

adotar uma abordagem mais convencionalista da ciência, pode se dizer que a

comunidade cientifica entrará em consenso, escolhendo em que ponto deve ir

essa redução das sentenças complexas. Por outro lado, ao adotar essa

postura, as ciências perdem um pouco de sua pretensão de veracidade

rigorosa e exata sobre o mundo dos fatos.

Nesse contexto, ao perceber o radicalismo das teses de Neurath,

Carnap argumentou que o atomismo epistemológico corria o grande risco de

‘’jogar fora a criança junto com a água suja’’. Mostrou enfaticamente que, para

salvar o uso de entidades abstratas (mas nem por isso metafísicas) nos

discursos científicos, era necessário um novo método de demarcação entre

ciência e metafísica.

A partir disso, Carnap propôs um espécie de ‘’Holismo epistemológico’’,

onde o critério de verificação era substituído pelo ‘’critério de confirmação’’.

Nesse critério, o sistema teórico era testado em diversos pontos-chave, mas

não há mais a exigência de que absolutamente todas as suas sentenças se

reduzam a proposições protocolares. As entidades abstratas passam a ser

aceitas, desde que claramente ligadas a outras proposições verificáveis. O

critério para se escolher ou não determinada teoria cientifica passa a ser o

teste do sistema como um todo, bem como sua utilidade para fazer previsões.