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www.dpu.def.br/esdpu Escola Superior 1 O direito penal militar é um domí- nio geralmente desconhecido dos atores do sistema de justiça, ainda que ao tribu- nal mais antigo do País - o Superior Tri- bunal Militar (STM) -, criado no ano de 1808, seja conferida a atribuição de julgar, em grau recursal, as ações penais que en- volvam condutas delituosas dos militares das Forças Armadas. E desse desconheci- mento resulta que pouco se discute o di- reito penal militar e o direito processual penal militar, não obstante encontrem-se em vigor códigos editados no conturbado ano de 1969, sob a égide da denominada Ditadura Militar. Tem-se, portanto, a esta reflexão, que abrange apenas um dos inú- meros problemas decorrentes da legislação aplicada à Justiça Militar da União (JMU) e, por consequência, os militares e civis julgados por crimes previstos no Código Penal Militar brasileiro. Com efeito, a Lei nº. 8.457/92, que A atual composição dos Conselhos de Justiça na Justiça Militar da União e a sua desconformidade com a garantia de um juízo independente e imparcial DIREITO PENAL MILITAR Publicação da Escola Superior da Defensoria Pública da União V. 4 N o 13, 2018 organiza a JMU, dispõe que, em tempo de paz, são órgãos da Justiça Militar o STM, a Auditoria de Correição, os Con- selhos de Justiça, os Juízes-Auditores e os Juízes-Auditores Substitutos. Outrossim, tem-se que os Conselhos de Justiça se di- videm em permanentes e especiais, sendo aqueles compostos por um juiz-auditor, um oficial superior (que será o presidente) e três oficiais de posto até capitão-tenente ou capitão, renovando-se a composição do colegiado independentemente do térmi- no do processo. Por sua vez, os Conselhos Especiais de Justiça são integrados pelo juiz-auditor e por quatro juízes militares, sob a presidência de um oficial-general ou pelo superior de posto mais elevado (ou de maior antiguidade, no caso de igualdade). Contudo, embora regulamente a composição e a competência dos Conse- lhos de Justiça, a lei brasileira não prevê garantias, direitos e restrições aos militares Por Olinda Vicente Moreira Defensora Pública Federal de 1ª Categoria em Porto Alegre/RS. Foto: https://i1.wp.com/s3.envato.com/files/223181212/590x332.jpg Editorial Por Fernando Mauro Barbosa de Oliveira Junior Página 2 O artigo 290 do Código Penal Militar como alvo do controle de convencionalidade: casos julgados pelo Superior Tribunal Militar Por Maria do Carmo Goulart Martins Setenta Página 3 Da (im)possibilidade da aplicação da Lei nº. 9.099/95 aos civis processados na Justiça Militar da União Por Marcelo Uzeda de Faria Página 4 Crime de deserção: principais aspectos materiais e processuais atuais do tipo penal Por Michelle Leite de Souza Santos Página 5 Brevíssima análise da aplicação do instituto da Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e a intervenção no Rio de Janeiro Por Jorge Luiz Fernandes Pinho Página 7 Entrevista Entrevista concedida pelo Ministro- presidente José Coêlho Página 8 Notas Página 12

o DIREITO PENAL MILITAR A atual composição dos Conselhos ... · O direito penal militar é um domí-nio geralmente desconhecido dos atores do sistema de justiça, ainda que ao tribu-nal

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www.dpu.def.br/esdpu EscolaSuperior 1

O direito penal militar é um domí-nio geralmente desconhecido dos atores do sistema de justiça, ainda que ao tribu-nal mais antigo do País - o Superior Tri-bunal Militar (STM) -, criado no ano de 1808, seja conferida a atribuição de julgar, em grau recursal, as ações penais que en-volvam condutas delituosas dos militares das Forças Armadas. E desse desconheci-mento resulta que pouco se discute o di-reito penal militar e o direito processual penal militar, não obstante encontrem-se em vigor códigos editados no conturbado ano de 1969, sob a égide da denominada Ditadura Militar. Tem-se, portanto, a esta reflexão, que abrange apenas um dos inú-meros problemas decorrentes da legislação aplicada à Justiça Militar da União (JMU) e, por consequência, os militares e civis julgados por crimes previstos no Código Penal Militar brasileiro.

Com efeito, a Lei nº. 8.457/92, que

A atual composição dos Conselhos de Justiça na Justiça Militar da União e a sua desconformidade com a garantia de um juízo independente e imparcial

DIREITO PENAL MILITARPublicação da Escola Superior da Defensoria Pública da União V. 4 No 13, 2018

organiza a JMU, dispõe que, em tempo de paz, são órgãos da Justiça Militar o STM, a Auditoria de Correição, os Con-selhos de Justiça, os Juízes-Auditores e os Juízes-Auditores Substitutos. Outrossim, tem-se que os Conselhos de Justiça se di-videm em permanentes e especiais, sendo aqueles compostos por um juiz-auditor, um oficial superior (que será o presidente) e três oficiais de posto até capitão-tenente ou capitão, renovando-se a composição do colegiado independentemente do térmi-no do processo. Por sua vez, os Conselhos Especiais de Justiça são integrados pelo juiz-auditor e por quatro juízes militares, sob a presidência de um oficial-general ou pelo superior de posto mais elevado (ou de maior antiguidade, no caso de igualdade).

Contudo, embora regulamente a composição e a competência dos Conse-lhos de Justiça, a lei brasileira não prevê garantias, direitos e restrições aos militares

Por Olinda Vicente Moreira Defensora Pública Federal de 1ª Categoria em Porto Alegre/RS.

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Editorial Por Fernando Mauro Barbosa de Oliveira Junior

Página 2O artigo 290 do Código Penal Militar como alvo do controle de convencionalidade: casos julgados pelo Superior Tribunal Militar Por Maria do Carmo Goulart Martins Setenta

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Da (im)possibilidade da aplicação da Lei nº. 9.099/95 aos civis processados na Justiça Militar da União Por Marcelo Uzeda de Faria

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Crime de deserção: principais aspectos materiais e processuais atuais do tipo penalPor Michelle Leite de Souza Santos

Página 5Brevíssima análise da aplicação do instituto da Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e a intervenção no Rio de Janeiro Por Jorge Luiz Fernandes Pinho

Página 7EntrevistaEntrevista concedida pelo Ministro-presidente José Coêlho

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Notas

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EscolaSuperiorwww.dpu.def.br/esdpu

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que participam desses colegiados, duran-te o exercício da judicatura, resultando em uma evidente ausência de garantia de imparcialidade e de independência desses julgadores. Ademais, tem-se que os refe-ridos militares, nesse período, continuam a desempenhar suas atividades rotineiras dentro da caserna, submetendo-se à hie-rarquia e à disciplina ordinárias, ainda que tenham sob a sua responsabilidade o jul-gamento de outros militares, inclusive de sua própria unidade militar.

Modelo diverso nos é apresentado por Portugal, país no qual se encontra ve-dada a composição majoritária de órgãos judiciais colegiados por militares, tendo em vista que tal modelo implicaria na existência de um tribunal militar1, o qual

1 CANAS, Vitalino; PINTO, Ana Luísa e LEITÃO, Alexandra, Código de Justiça Militar Anota-do, Coimbra: Coimbra Editora, 2004, pp. 10-11, afir-mam que “uma composição integralmente ou maiorita-riamente militar reflectia-se necessariamente na natureza do tribunal, que seria, consequentemente, um tribunal militar, cuja constituição é vedada em tempo de paz. Nessa perspectiva, os tribunais judiciais com compe-tência para o julgamento de crimes estritamente mili-

somente é permitido em tempo de guerra, nos termos da Constituição da República Portuguesa (cf. alteração trazida pela Lei Constitucional nº 01/1997).

Ademais, em Portugal, ao militar integrante dos órgãos colegiados respon-sáveis pelo processo e julgamento dos crimes estritamente militares, aplica-se a Lei nº 101/2003, que estabelece o Esta-tuto dos Juízes Militares e Assessores do Ministério Público. Nessa normativa, en-contram-se previstos o mandato de três anos para o militar, renovável por igual período; a garantia de independência de suas decisões; a sua inamovibilidade; a submissão ao regime disciplinar previsto no Estatuto dos Magistrados Judiciais por fatos praticados no exercício de suas fun-ções; e o óbice à nomeação dos militares condenados a pena privativa de liberdade, decorrente da prática de crimes dolosos ou que se encontrem definitivamente pro-nunciados por crimes comuns ou estrita-

tares têm forçosamente de ter uma composição maio-ritariamente sustentada em magistrados de carreira”.

mente militares, até o trânsito em julgado da decisão final. Outrossim, são impostas a esses magistrados restrições no exercício de atividades (são as chamadas “incompa-tibilidades”), sendo-lhes vedado o exercí-cio de outra função, pública ou privada, exceto a docência ou a investigação cientí-fica de natureza jurídica ou militar, desde que não remuneradas.

Nota-se, pois, que no sistema jurídi-co português, a lei impõe direitos e deve-res ao militar durante o mandato judicial, a fim de garantir a sua independência e a sua imparcialidade, diversamente do que ocorre no Brasil.

Assim, no contexto nacional, deve ser reconhecida a parcial inconstituciona-lidade da Lei nº. 8.457/92, ao não garan-tir ao jurisdicionado um juízo imparcial e independente, contrariando as decla-rações de direitos humanos e o Pacto de Direitos Civis e Políticos, em particular naquilo que impacta o acesso à justiça e o direito a um julgamento justo por órgão independente e imparcial.

Editorial Por Fernando Mauro Barbosa de Oliveira JuniorDiretor da ESDPU, Defensor Público Federal de Categoria Especial.

A Defensoria Pública da União tem sua origem na Justiça Militar da União (JMU), notadamente com a atuação dos advogados de ofício, que foram os primeiros Defensores Públicos Federais. Desse modo, o Fórum DPU aborda, nes-ta edição, a temática da JMU e a corres-pondente atuação da DPU.

O artigo de capa, da Dra. Olinda Moreira, apresenta a estrutura e o fun-cionamento dessa Justiça Especializada, comparando-os com o modelo português

e analisando a ausência “das garantias, dos direitos e das restrições aos militares que participam” dos Conselhos de Justiça, quando no exercício da função judicante.

A intervenção no Rio de Janeiro e o instituto da Garantia da Lei e da Ordem (GLO) são criticados em texto do Dr. Jorge Pinho, uma vez que as decretações das mis-sões de GLO, diferentemente da prática, devem ser consideradas medidas excepcio-nais e buscar, obrigatoriamente, a realização dos direitos e deveres individuais e coletivos.

O artigo 290 do Código Penal Mili-tar (CPM) é apreciado pela Dra. Maria do Carmo Setenta, tendo em vista que deter-minados diplomas internacionais “vedam a imposição de pena privativa de liberdade aos usuários de drogas”. Assim, debate-se a (in)convencionalidade desse dispositivo legal.

A possibilidade de aplicação da Lei dos Juizados Especiais (Lei nº. 9.099/95 e alterações) aos civis no âmbito da Justi-ça Militar da União é discutida pelo Dr.

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O artigo 290 do Código Penal Militar como alvo do controle de convencionalidade: casos julgados pelo Superior Tribunal Militar

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Na definição de Valerio Mazzuoli, controle de convencionalidade é a com-patibilização das leis internas com os tra-tados internacionais de direitos humanos vigentes no país. Segundo o autor, en-quanto o controle de constitucionalida-de afere a compatibilidade entre a lei e as normas constitucionais, o controle de convencionalidade avalia sua adequação com os tratados internacionais de direitos humanos.

O Brasil está inserido no Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos, tendo incorporado a Conven-ção Americana de Direitos Humanos1 e reconhecido, em 10 de dezembro de 1998, a jurisdição obrigatória da Corte Interamericana de Direitos Humanos, po-1 Decreto Presiden-cial nº 678, de 11 de novembro de 1992

dendo ser processado em ações de respon-sabilidade internacional por violações de direitos humanos.

Além do sistema regional, o Brasil está inserido no sistema universal ou glo-bal de proteção aos direitos humanos, que tem sua origem na Carta da Organização das Nações Unidas (ONU), aprovada pela Conferência de São Francisco em 1945, e incorporada à legislação brasileira pelo Decreto nº. 19.841, de 22 de outubro de 1945.

O controle de convencionalidade é, portanto, instrumento de proteção aos di-reitos humanos que desestabiliza as clássi-cas noções de aplicação apenas do direito interno, provocando o enfrentamento en-tre o ordenamento nacional e os tratados e convenções internacionais de direitos

Marcelo Uzeda. Em seu artigo, o Defen-sor considerando o entendimento do STF sobre a sua inaplicabilidade, entende ne-cessária a reapreciação da matéria devido à entrada em vigor da Lei nº. 13.491/2017.

O crime de deserção, um dos mais comuns na atuação da DPU na JMU, é

estudado pela Dra. Michelle Leite. São destacados alguns relevantes aspectos for-mais e materiais desse crime e da respecti-va tramitação da ação penal.

Por fim, o Dr. Guilherme Francisco Paul entrevistou o Excelentíssimo Presi-dente do Superior Tribunal Militar. Nesse

contexto, agradecemos a relevante partici-pação do Ministro Presidente dessa Corte no Fórum DPU e a sua contribuição para o debate sobre o direito penal militar em questões mais afetas à DPU.

Boa leitura a todos!

humanos ratificados pelo país, levando a um diálogo entre cortes e entre fontes do direito na busca da maior proteção ao in-divíduo.

O delito previsto no artigo 290, do CPM não ficou de fora dessa atual siste-mática, tendo sido alvo de controle de convencionalidade, pelo menos, em três recursos de apelação, patrocinados pela DPU, julgados no Superior Tribunal Mi-litar. Os casos foram obtidos por meio de pesquisa ao site do STM2, no dia 10 de março de 2018, com os termos de busca inseridos no campo Ementa/Indexação: “controle de convencionalidade” e “De-fensoria Pública da União”.

Tratam-se dos acórdãos nº. 0000199-68.2015.7.01.0101, 0000063-

2 www.stm.jus.br

Por Maria do Carmo Goulart Martins Setenta - Defensora Pública Federal em Porto Alegre/RS.

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Por Marcelo Uzeda de Faria – Defensor Público Federal no Rio de Janeiro/RJ.

41.2015.7.02.0102 e 000096-31.2015.7.02.0102 nos quais, entre ou-tros fundamentos, alegou-se a violação à Convenção de Nova Iorque (Decreto nº. 54.216/64) e à Convenção de Viena (De-creto nº. 154/91), porquanto tais diplo-mas internacionais vedam a imposição de pena privativa de liberdade aos usuários de drogas.

Tal alegação, no entanto, foi afas-tada pelo Ministro Relator, em todos os processos, com os seguintes argumentos: (a) a inexistência de inconvencionalidade porque embora o item 1 do artigo 38 da Convenção de Nova Iorque e o artigo 20 da Convenção de Viena ressaltem, de for-ma expressa, a importância do tratamento e da reabilitação dos usuários de entorpe-centes, não vedam a possibilidade de que sejam condenados pelos crimes que pra-ticam; (b) a menção de que o delito tu-tela bem jurídico coletivo, consistente na

saúde pública do ambiente da caserna cuja lesividade ultrapassa a esfera individual, pois os militares manuseiam armamento, podendo, por essa razão, colocar em ris-co, além da sua integridade, a de tercei-ros; (c) o status supralegal que ostentam as referidas convenções – e não constitu-cional – por força de sua não aprovação nos moldes do artigo 5º, § 3º, da CF, não podendo se sobrepor aos princípios cons-titucionais da hierarquia e da disciplina, vetores da vida castrense; e (d) além de convencional, o artigo 290 do CPM é também constitucional, pois conforme entendimento da Suprema Corte, aplica-se o princípio da especialidade normativo-penal, prevalecendo, assim, a penalidade prevista do direito penal militar, mesmo que mais severa, se comparada com a le-gislação penal comum.

A alegação de inconvencionalida-de do artigo 290 do CPM tem por base

Cediço que, em virtude de expressa vedação legal, não se aplicam à esfera penal militar as disposições da Lei nº. 9.099/95, que trata dos Juizados Especiais Criminais (art. 90-A, da Lei nº. 9.099/95). Contu-do, nem sempre foi assim.

Originalmente, a lei dos juizados especiais criminais não impedia a apli-cação dos institutos da transação penal e do sursis processual à seara castrense. Por esse motivo, o Supremo Tribunal Federal já decidiu que a superveniência da Lei nº. 9.839/99 não se aplica a fatos delituosos ocorridos antes da sua vigência em virtude da garantia da irretroatividade da lei penal in pejus (HC 80099, Primeira Turma, DJ 16 jun. 2000).

Assim, no período compreendido en-tre a publicação da Lei nº. 9.099/95 e a Lei nº. 9.839/99, não houve empecilho para a incidência das normas benéficas da lei dos juizados especiais criminais mesmo nos fa-tos de competência da Justiça Militar.

Argumenta-se, em favor da proi-bição, que a utilização daquelas medidas seria incompatível com o sistema sancio-natório militar, o qual tem como função primordial a preservação da disciplina e da hierarquia, vigas basilares das Forças Ar-madas. Na dicção do Supremo Tribunal Federal, há incompatibilidade da referida lei com o crime militar, pois neste transi-tam outros valores - hierarquia, disciplina, segurança - que não são encontráveis nos

crimes comuns (HC 74581, Tribunal Ple-no, julgado em 01 abr. 1998).

Não obstante, a veracidade de tal premissa quanto aos militares da ativa, no que toca aos civis excepcionalmente processados pela Justiça Militar da União, não subsistiria tal antinomia, adotando-se interpretação conforme a Constituição e invocando o princípio da isonomia.

Contudo, é pacífica a jurisprudência

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Da (im)possibilidade da aplicação da Lei nº. 9.099/95 aos civis processados na Justiça Militar da União

violação a convenções da ONU, inseridas no sistema universal ou global de pro-teção aos direitos humanos. Da análise desses três casos, constata-se um posicio-namento refratário do STM em relação à aplicação interna nos casos concretos de convenções internacionais de direitos humanos e, para além das interpretações sobre o (des)respeito das normas interna-cionais frente aos tipos penais analisados, o principal fundamento consubstancia-se na tradicional hierarquia de normas e na classificação dos tratados com status su-pralegal, ou seja, superior às leis, porém inferior à Constituição. Nos julgados não se lê menção ao princípio pro homine, ao entendimento que melhor tutela a pessoa humana, o indivíduo, e sim, a que melhor tutela as instituições.

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Crime de deserção: principais aspectos materiais e processuais atuais do tipo penal Por Michelle Leite de Souza Santos - Defensora Pública Federal em Brasília/DF.

do Superior Tribunal Militar1 em favor da vedação, independentemente de ser o beneficiário militar ou civil (Apelação nº. 0000108-75.2015.7.01.0101/RJ. Deci-são: 09 fev. 2017). Afirma a Corte Cas-trense que o art. 90-A da Lei nº. 9.099/95, acrescido pela Lei nº. 9.839/99, não esta-beleceu qualquer diferenciação quanto à qualidade do réu (civil ou militar) ao ins-tituir a não aplicação de suas disposições no âmbito da JMU. (Embargos Infrin-gentes nº. 0000008-88.2012.7.09.0009/DF Decisão: 18 out. 2016).

Quanto ao tema, o Plenário do Su-premo Tribunal Federal, após acalorado debate, afirmou que o art. 90-A da Lei nº. 9.099/95 – Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais –, com a redação dada pela Lei nº. 9.839/99, não afronta o art. 98, inciso I, § 1º, da Carta da República, no que veda a suspensão condicional do processo ao militar processado por crime militar (HC 99.743, rel. p/ o ac. min. Luiz Fux, julgamento em 6 out. 2011, Plenário, DJE de 21 ago. 2012).1 Súmula 9 do STM: “A Lei n°. 9.099, de 26 set. 1995, que dispõe sobre os Juízos Es-peciais Cíveis e Criminais e dá outras providên-cias, não se aplica à Justiça Militar da União.”

Registra-se que, no caso supracitado, a Corte Suprema se referiu obiter dictum à ausência da vedação no tocante ao ci-vil, deixando implícita essa conclusão, mas não chegou a votar especificamente o tema, já que não estava incluído no caso concreto.

Lamentavelmente, em julgado pos-terior envolvendo um civil acusado de de-sacato e desobediência praticados contra um militar das Forças Armadas no desem-penho de serviço de vigilância, garantia e preservação da ordem pública, a primeira Turma do Supremo Tribunal Federal re-lembrou que o plenário declarara a cons-titucionalidade do art. 90-A da Lei nº. 9.099/95, com a redação dada pela Lei nº. 9.839/99, afirmando a inaplicabilidade da Lei dos Juizados Especiais Criminais no âmbito da Justiça Militar. (HC 113128, PUBLIC 20 fev. 2014).

Sem embargo, o tema merece ser rediscutido, após o advento da Lei nº. 13.491, de 13 de outubro de 2017, a qual expandiu o rol de crimes militares, abrangendo figuras típicas que, embora não previstas na parte especial do Código Penal Militar, passaram a ser consideradas

crimes militares por extensão, quando praticadas por militar da ativa nas situa-ções indicadas nas alíneas do inciso II do artigo 9º do CPM.

Ocorre, porém, que a expansão do conceito do crime militar não para por aí, considerando que o inciso III do mesmo artigo remete ao inciso anterior. Logo, também devem ser considerados crimes militares por extensão os praticados por civis, ainda que previstos na legislação pe-nal comum, se enquadrados nas situações definidas nas suas alíneas.

Portanto, ao deslocar para a compe-tência da Justiça Militar infrações penais previstas na legislação extramilitar, cujos autores fariam jus às benesses da Lei nº. 9.099/95 se fossem processados na jus-tiça comum, a novel legislação amplia a vedação, o que vai de encontro à proposta constitucional de uma justiça consensual dos Juizados Especiais Criminais, bem como acarreta evidente violação ao prin-cípio da isonomia.

Como sabido, a Lei nº. 13.491/2017 já é alvo de questionamento perante o Su-premo Tribunal Federal, cujo pronuncia-mento aguardamos.

Com previsão no artigo 187 e se-guintes do Código Penal Militar, o delito de deserção é considerado crime militar

por excelência, porquanto a condição de militar é exigida no momento da consu-mação do ilícito e, ainda, a manutenção

da qualidade de militar da ativa é uma condição de procedibilidade da própria ação penal.

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Para a configuração do crime de deserção, é suficiente que ocorra ausên-cia injustificada do militar à unidade em que serve ou ao lugar em que deveria per-manecer por prazo superior a oito dias. Assim, a partir do nono dia de ausência desautorizada, fato analisado puramente sob o aspecto objetivo, tem-se consumada a deserção.

Para a prisão do desertor, basta que tenha sido lavrado o competente termo de deserção, consistindo, pois, em uma das hipóteses de exceção à regra do artigo 5º, LXI, da Carta Magna, por tratar-se de de-lito propriamente militar.

O delito de deserção é classifica-do pela doutrina como crime de mera conduta de caráter permanente, pois sua consumação protrai-se no tempo e, para que se incorra no tipo penal, conforme já delineado, basta a ausência desautorizada, sem exigência de qualquer resultado natu-ralístico decorrente daquela.

O crime de deserção também apre-senta regras diferenciadas para a configu-ração da prescrição. Para que a pretensão punitiva estatal seja fulminada pela pres-crição, além do prazo comum, fixado no artigo 125 do CPM, há o estabelecimento de um critério etário, a saber o atingimen-to da idade de 45 e 60 anos, para as pra-ças e oficiais, respectivamente, conforme regra do artigo 132 do CPM.

Importante anotar que, consumada a deserção, a lei processual penal militar ordena a lavratura de Termo de Deserção, com a respectiva exclusão do desertor do serviço militar ativo, consoante dispõe o artigo 128, § 2º do Estatuto dos Militares, Lei nº. 6.880/1980, com a comunicação imediata à justiça militar competente para instauração de Instrução Provisória de Deserção (IPD).

A IPD é o procedimento pré-pro-cessual e inquisitorial que precede a ação penal. A instauração da ação penal, por seu turno, em se tratando de delito de de-serção, depende da captura ou da apresen-tação voluntária do desertor. Não há, por-tanto, a previsão de citação por edital ou mesmo do instituto da revelia. De forma particular, para que haja prosseguimento da persecutio criminis, a presença física do desertor é indispensável.

O processamento do delito de de-

serção sujeita-se a rito especial de natureza sumária, segundo as regras dos artigos 456 e seguintes do Código de Processo Penal Militar (CPM).

Segundo a legislação processual cas-trense, após a captura ou a apresentação voluntária, o desertor deve ser imediata-mente submetido à inspeção de saúde para análise de sua capacidade para fim de serviço militar. Uma vez considerado ca-paz, é lavrado termo de reinclusão ao ser-viço ativo, retornando o agente à condição de militar. Apenas após retomar a quali-dade de militar, poderá então o cidadão ser processado pelo delito de deserção. Se for considerado incapaz, definitivamente, para o desempenho do serviço militar, o desertor não poderá ser reincluído ao ser-viço ativo, isentando-se também da ação penal, por força do que dispõe o artigo 457, § 2º, do CPPM.

A partir de construção doutrinária e jurisprudencial, a qualidade de militar não se configuraria apenas como uma condi-ção de procedibilidade para a instauração da ação penal, mas também de prosse-guibilidade de ação penal. Nesse sentido, convém citar entendimento de Claudio Amim Miguel e Nelson Coldibelli:

“(...) se o legislador estabeleceu essa condição para oferecimento da denúncia, deve-se interpretar que não desejava que um civil viesse a cumprir pena por esse de-lito, ao qual é vedada a concessão da sus-pensão condicional da pena. Conclui-se, portanto, que, em qualquer fase do pro-cesso, mesmo sendo o de execução, será julgado extinto se o militar perder essa condição.”1

Impende ressaltar que esse também foi o entendimento pacificado do Supe-rior Tribunal Militar que, mudando seu posicionamento por maioria no ano de 2017, passou a entender que a condição de militar da ativa deve ser aferida apenas no momento do recebimento da denún-cia, podendo, dessa forma, um civil figurar no polo passivo do processo de deserção (vide Apelação nº 2- 80.2014.7.10.0010/CE. Relator o Ministro Marco Antonio de Farias. DJe de 22 fev. 2017).

1 Elementos de Direito Processu-al Penal Militar, p. 172, 3ª ed., 2008, Lumen Juris.

Ocorre, contudo, que o entendi-mento do Supremo Tribunal Federal, por sua maioria, haja vista que a matéria não foi apreciada pelo Plenário do Pretório Excelso, caminha na contramão daquele esposado pelo STM, no sentido de que a qualidade de militar é elemento estru-tural do tipo penal de deserção, a saber as recentes decisões monocráticas de de-zembro de 2017 a abril de 2018: HC 151.390/DF, Relator Ministro Edson Fa-chin; HC 15.217/DF, Relator Ministro Celso de Mello; HC 150.163/PR, Relator Ministro Ricardo Lewandowski.

Vale destacar que o delito de de-serção possui natureza peculiar, pois ao mesmo tempo em que a pena cominada pode variar de seis meses a dois anos de detenção para a deserção cometida em tempo de paz, a deserção em presença do inimigo, praticada em tempo de guerra, pode sujeitar seu agente à pena de morte, executada por fuzilamento, nos termos do artigo 392 do CPM e do artigo 5º, XLVII, da CF/88.

A DPU, a quem incumbe o patro-cínio obrigatório da defesa de todas as praças em processo penal militar, segun-do norma disposta no artigo 71, § 5º, do CPPM, tem nos delitos de deserção uma parcela considerável de sua atuação peran-te a Justiça Militar da União, haja vista que as deserções são cometidas em sua maioria por soldados não engajados, em cumprimento do serviço militar obrigató-rio, denominados integrantes do Efetivo Variável (EV).

No tocante ao mérito, adentran-do ao aspecto defensivo, norteador da atuação institucional da defensoria, as ausências desautorizadas ocorrem hodier-namente sob a justificativa de situações emergenciais e familiares, assim como da necessidade de o jovem militar ter que, por outros meios, garantir a saúde e sub-sistência material de sua família.

Vê-se, portanto, que não raras vezes, o dever de servir à pátria, como também os pilares da hierarquia e disciplina, en-tram em conflito com as vulnerabilidades sociais dos militares enquanto cidadãos, cumprindo à Defesa sobrelevar aos Con-selhos de Justiça os argumentos de caráter humanitário, invocando ainda princípios de política criminal.

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Por Jorge Luiz Fernandes Pinho – Defensor Federal no Rio de Janeiro/RJ.

Brevíssima análise da aplicação do Instituto da Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e a intervenção no Rio de Janeiro

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Para Alexy, “entre o conceito de nor-ma de direito fundamental e o conceito de direito fundamental há estreitas conexões. Sempre que alguém tem um direito fun-damental, há uma norma que garante esse direito. Se a recíproca é verdadeira, isso já é duvidoso [...] Direitos fundamentais e normas de direitos fundamentais seriam, assim, sempre dois lados da mesma mo-eda”.

O catedrático português Jorge Mi-randa aponta a dificuldade de identificar qual teoria do Direito justifica os Direitos Fundamentais. Mas, sabemos que quase todas as teorias jurídicas defendem a exis-tência de direitos básicos do ser humano. Assim, de plano nos afastamos de qual-quer pretensão de registrar um conceito de Direitos Humanos ou Fundamentais, mas consignamos o entendimento que o Di-reito à Segurança se alinha nesse conceito, bem como a secular busca de equilíbrio da segurança e as liberdades individuais.

Numa esteira positivista, destacamos que o texto constitucional, expressamen-te, prevê a segurança como direito, em seu preâmbulo e nos artigos 5º e 6º. E, dedica um capítulo próprio “Da Segurança Pú-blica”, a partir do artigo 144.

Nos socorrendo do seguinte leading case, observamos que “o direito à seguran-ça é prerrogativa constitucional indisponí-vel, garantido mediante a implementação de políticas públicas, impondo ao Estado a obrigação de criar condições objetivas que possibilitem o efetivo acesso a tal ser-viço (RE 559.646 AgR, rel. min. Ellen Gracie, j. 07/06/2011, 2ª T, DJE de 24 de jun. 2011 ARE 654.823 AgR, rel. min. Dias Toffoli, j. 12/11/2013, 1ª T, DJE, de 5 dez. 2013).

Usando da lógica que “o direito à segurança é prerrogativa constitucional indisponível” e que se imbrica num direi-to humano fundamental, temos como legítimas as missões de Garantia da Lei e

da Ordem (GLO). Neste diapasão, utili-zamos do conceito do Manual da GLO para sua definição: “é uma operação mili-tar determinada pelo Presidente da Repú-blica e conduzida pelas Forças Armadas de forma episódica, em área previamente es-tabelecida e por tempo limitado, que tem por objetivo a preservação da ordem pú-blica e da incolumidade das pessoas e do patrimônio em situações de esgotamento dos instrumentos para isso previstos no art. 144 da Constituição ou em outras em que se presuma ser possível a perturbação da ordem” (Artigos 3º, 4º e 5º do Decreto nº 3.897, de 24 de agosto de 2001).

A existência do instrumento, em si, não depõe contra o Estado Democrático de Direito, não por outra razão, está ins-culpida no título V, da Carta Constitucio-nal, “Da Defesa do Estado e Das Institui-ções Democráticas”.

No entanto, o que impõe uma refle-xão é que um instituto que só pode ser

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1. O senhor avalia como po-sitiva eventual alteração do artigo 124 da CRFB/1988, no sentido de a JMU julgar as lides relacionadas à

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visto como a ultima ratio na manutenção da paz social foi empregada vinte e nove vezes entre 2010 e junho de 2017 e vivifi-camos, em 2018, uma intervenção federal no Rio de Janeiro, instituída pelo Decre-to nº. 9.288, de 16 de fevereiro de 2018, aprovado pelo Decreto Legislativo nº. 10, de 20 de fevereiro de 2018.

Propositalmente não enfrentaremos a (in)constitucionalidade das normas op-tando por sublinhar que o fenômeno do uso destemperado da medida vem desali-nhar o conceito de segurança como per-tencente ao eixo dos Direitos Humanos ou Fundamentais, e a contrario sensu vem denotar um sentimento social, contrário aos institutos dos Direitos Humanos e fomentar desprestígio aos operadores que efetivam a busca da concretização dos Direitos Fundamentais, na qual se inclui vividamente a Instituição Defen-soria Pública.

Alinhando, ainda que de forma sim-plória, com a teoria discursiva de Jürgen Habermas, temos que na instituciona-

lização da formação racional da opinião e da vontade temos o cerne do processo democrático. Sendo de todo essencial o regular estabelecimento da comunicação na sociedade o que precipuamente forma o cerne da justiça e da democracia, não agir sob esses filtros pode culminar em um regime arbitrário. No caso específico da intervenção e do esmiuçamento dos procedimentos para decretações da GLO, não vislumbramos respeito à emanação da vontade discursiva dos cidadãos livres, sendo por vezes de todo turvos os procedi-mentos que levaram àquela norma.

Ademais, no silêncio da vontade popular, temos uma apropriação do dis-curso, de modo que o falante leva aos ouvintes uma comunicação falsa, mas que ganha sinceridade e credibilidade de modo que as decretações da Intervenção e da GLO não se coadunariam com os Di-reitos Humanos, o que leva a uma verdade que desvirtua os paradigmas da justiça e da democracia.

Assim, de todo essencial que a De-

fensoria Pública da União avoque seu múnus (artigo 4º, III, LC 80/94) de pro-mover a difusão e a conscientização com relação às normas e aos valores vigentes na sociedade, e que possa criticar e refletir sobre a essência normativa da Intervenção e da GLO.

Neste escopo, deve a DPU, no sentir do subscritor, a uma, emanar a mensagem que só é concebível manejar de medidas constitucionais excepcionais no ensejo de garantir Direitos Fundamentais, e, a duas, na vigência da Intervenção e da GLO de-vem ser respeitados e atendidos sem qual-quer flexibilização os Direitos e Deveres Individuais e Coletivos. E, a par disso, sempre que possível, ser instrumento a aprofundar a discussão do que é interesse público primário e interesse público se-cundário no Estado Democrático de Di-reito Brasileiro.

Não podendo ser diferente, como úl-timo registro, louvo a criação, bem como as ações já adotadas, pelo grupo DPU Mais Rio: www.dpu.def.br/dpumaisrio.

EntrevistaEntrevista concedida por José Coêlho Ferreira – Ministro-presidente do Superior Tribunal Militar

reforma e pensão dos militares?

Tramita hoje na Câmara dos Depu-tados a PEC 358/2005, já aprovada no

Senado Federal e na Comissão de Cons-tituição e Justiça da Câmara dos Depu-tados, conferindo competência à Justiça Militar da União para processar e julgar as

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cias e promoções; estabilidade; cursos e estágios; bem como as matérias previstas no Regime Jurídico dos Militares que pos-sam afetar o cumprimento de missões das Forças Armadas (licenças, afastamentos, férias, etc).

Objetiva-se, portanto, a inclusão no âmbito de competência da Justiça Militar das ações judiciais que afetem diretamente as funções das Forças Armadas, com re-flexos na vida na caserna e nos princípios que a regem. Essa nova competência con-feriria maior tecnicidade aos julgamentos, desafogaria as varas federais e respeitaria a tendência atual de especialização das cau-sas judiciais.

2. O senhor considera adequa-do e razoável aplicar sanção penal, em razão do delito de deserção, ao jovem que já cumpriu o serviço mili-tar obrigatório e deixou as fileiras das Forças Armadas, sobretudo diante do entendimento do STF de que nesse caso a ação careceria de condi-ção de prosseguibilidade? Não seria possível aplicar medidas despenali-zadoras ou substitutivas à restrição da liberdade?

Inicialmente, é necessário estabelecer uma distinção entre condição de procedi-bilidade e condição de prosseguibilidade da ação. Com efeito, tem-se entendido que, enquanto não oferecida a denúncia, por ser a deserção crime propriamente militar, a reinclusão do desertor ao serviço ativo de sua respectiva força é condição de procedibilidade da ação penal militar. No caso em que a pretensão punitiva estatal já foi deflagrada com o oferecimento da De-núncia, o status de militar da ativa passa a ser condição de prosseguibilidade para que o feito tenha andamento até a entrega da prestação jurisdicional, perante a Pri-meira Instância ou em fase recursal.

Seguindo essa linha de raciocínio, entendo que a passagem do militar para a inatividade suprime, de forma inconteste, uma das condições da ação, qual seja, a legitimidade para a causa e para o proces-so, dando causa a ausência de condição de prosseguibilidade do recurso interposto,

até porque a legitimidade da parte é pres-suposto subjetivo para admissibilidade do recurso.

Neste sentido, alinhando-me ao entendimento do STF, acredito não ser possível o prosseguimento da ação pela manifesta perda de objeto.

3. O cerne do escabinato está em os militares serem julgados por militares mais experientes e gradua-dos, conhecedores das lides castren-ses e dos princípios da hierarquia e disciplina. Este objetivo não vai de encontro à Constituição Federal quando se trata de réu civil?

A Justiça Militar da União é com-petente para julgar os crimes militares de-finidos em lei, uma vez que a prática de crime desta natureza por civil não anula a vis atrativa decorrente da especialidade do crime militar, impondo-se a aplicação do artigo 9º, inciso III, alínea “a”, do CPM, disposição legal tranquilamente recep-cionada pelo artigo 124 da Constituição Federal. Entretanto, desde o julgamento da Apelação nº. 89-90.2012.7.04.0004/MG, em 11 de novembro de 2014, te-nho sustentado que nada justifica que um conselho, formado em sua maioria por militares, julgue civis em tempo de paz. Acredito que o civil deveria ser processado e julgado pelo Juiz-Auditor, monocratica-mente.

A meu sentir, cabe ao Juiz-Auditor, monocraticamente, realizar a entrega da prestação jurisdicional quando se tratar de julgamento de civis pela prática de condu-tas delituosas nessas circunstâncias.

Vale relembrar que a Proposta de Emenda Constitucional nº. 358/2005, enquanto tramitava regularmente, manti-nha a atual competência da Justiça Mili-tar da União para o julgamento de crimes militares definidos em lei, independente-mente de quem seja o seu autor, permitin-do, assim, o julgamento de civis, quando sujeitos ativos, coautores ou partícipes de crimes militares previstos em lei. A Justiça Militar da União não sofre a mesma limi-tação imposta pela Constituição à Justiça Militar estadual, que somente pode julgar

ações decorrentes do Direito Disciplinar Militar. Assim, à Justiça Militar da União passaria o exercício do controle jurisdicio-nal sobre as punições disciplinares aplica-das aos membros das Forças Armadas.

Ressalto que o CNJ, em 2016, en-tendendo a importância da matéria, criou a Comissão Permanente de Aperfeiçoa-mento da Justiça Militar nos âmbitos fe-deral e estadual. Dentre os trabalhos por ela realizados, há uma minuta de Propos-ta de Emenda Constitucional bem mais completa e detalhada do que a redação da PEC 358/2005.

No texto proposto pelo CNJ, passa-se a agregar à competência da Justiça Mi-litar da União o processamento e o julga-mento das causas decorrentes do Direito Disciplinar Militar (assim como na PEC 358/2005), assim entendidas como aque-las destinadas a apreciar a legalidade dos atos exarados pela administração militar que objetivem, imediata e diretamente, impor uma sanção disciplinar ao inte-grante das Forças Armadas que cometa infração, excetuando-se aquelas de com-petência originária do Superior Tribunal de Justiça, previstas nas alíneas “b” e “c” do inciso I do artigo 105 da Constituição Federal.

Outra importante proposição da Comissão do CNJ atribui à JMU a com-petência para processar e julgar as causas relativas ao Direito Administrativo Militar com reflexos diretos sobre as Forças Arma-das. Trata-se de ações judiciais complexas e específicas que, atualmente, por não se-rem de competência expressa de nenhum ramo do Poder Judiciário, são apreciadas pela justiça comum, nos termos da com-petência residual da Justiça Federal.

Então, passaria a considerar o Direi-to Administrativo Militar o ramo do Di-reito que disciplina a atuação dos órgãos, dos membros e das atividades militares associadas ao cumprimento das destina-ções constitucionais das Forças Armadas, insculpidas no artigo 142 da Constituição Federal.

Incluem-se nesse campo as matérias concernentes ao ingresso, à permanência e ao desligamento da carreira das Armas (exclusão, agregação, transferência para a reserva, reforma, exclusão por licencia-mento, etc); movimentações, transferên-

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de crimes militares praticados por civis, in verbis:

“I-B processar e julgar civis nos casos previstos nos incisos I e III do artigo 9º do Decreto-Lei n. 1.001, de 21 de outubro de 1969 (Código Penal Militar) e, tam-bém, os militares quando estes forem acu-sados juntamente com aqueles no mesmo processo.”

Ressalte-se que essa matéria está sen-do objeto de profícuos debates no Supre-mo Tribunal Federal, onde se encontram pendentes de julgamento a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamen-tal nº. 289, de relatoria do eminente Mi-nistro Gilmar Mendes e o Habeas Corpus nº. 112.848, de relatoria do eminente Mi-nistro Ricardo Lewandowski. Em relação a este último, a Segunda Turma daquela Corte, em 18 de fevereiro de 2014, deci-diu que a matéria ficaria afeta ao Plenário, motivo pelo qual os autos aguardam mar-cação de data de julgamento.

Aliás, vale destacar que o impetran-te do Habeas Corpus nº. 112.848 formu-lou diversos pedidos na inicial, inclusive quanto à inconstitucionalidade dos artigo 16 e 26 da Lei nº. 8.457/1992, que de-terminam a composição dos Conselhos

os militares dos Estados nos crimes mili-tares.

Não obstante o atual posiciona-mento do STM, não se pode olvidar que o julgamento de civis por juízes militares temporários, aqueles que compõem os Conselhos Permanentes de Justiça, já foi objeto de discussão e de estudos no âm-bito desta Corte. Recordo que o STM elaborou estudos com vistas a apresen-tar proposições para alteração de artigos pontuais da Lei nº. 8.457/1992. Aliás, esses trabalhos foram desenvolvidos pela Comissão de Direito Militar do STM e foram exaustivamente debatidos no X En-contro de Magistrados da JMU, no perío-do de 19 a 23 de maio de 2014, na cidade de Salvador/BA.

Enfim, prevaleceu o consenso da Corte para o encaminhamento de ante-projeto de lei à Câmara dos Deputados, cujas propostas foram aprovadas pelo Plenário em 4 de junho de 2014, e absor-vidas pelo Projeto de Lei nº. 7683/2014, destacando-se a proposição referente ao acréscimo do inciso I-B ao artigo 30 da LOJM, que preconizará a competência do Juiz-Auditor para decidir, monocra-ticamente, os feitos envolvendo a prática

Permanentes de Justiça por militares des-providos das garantias de jurisdição inde-pendente e imparcial, com fulcro no arti-go 95, incisos I a III, da Constituição da República, bem como no artigo 8º, item 1, da Convenção Americana sobre Direi-tos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica). Apesar de o relator já ter votado pela concessão da ordem, o eminente Ministro Gilmar Mendes proferiu o seu voto-vista, concluindo que concedia a ordem em par-te, reconhecendo a competência da Justiça Militar para processar e julgar os ilícitos penais, em tese, praticados pelo civil con-tra militares, ressalvando, contudo, que cabe exclusivamente ao juiz togado o exa-me e o julgamento da ação penal.

Importa lembrar, ainda que pen-dente de julgamento naquela Corte, a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 5.032, de relatoria do eminente Ministro Marco Aurélio, que poderá alcançar rele-vante repercussão no julgamento de civis no âmbito da Justiça Militar da União, uma vez que no referido processo discute-se a constitucionalidade do § 7º do artigo 15 da Lei Complementar nº. 97, de 9 de junho de 1999, cujo conteúdo preconiza que, para os fins do artigo 124 da Consti-

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tuição Federal, deve ser considerada ativi-dade militar o emprego das Forças Arma-das na defesa da Pátria e na garantia dos poderes constitucionais, da lei e da ordem, e na participação em operações de paz.

Nesse contexto, a questão pode ser equalizada tanto por decisão judicial, me-diante o pronunciamento do STF nos au-tos da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº. 289, do Habeas Corpus nº. 112.848, da ADI nº. 5.032, como também pela aprovação do novo Projeto de Lei nº. 7683/2014.

Como já defendido pelo Ministro Gilmar Mendes, ao apresentar o voto-vis-ta no julgamento do Habeas Corpus nº. 112.848, não se pode esquecer que os ju-ízes-militares que integram os Conselhos não estão investidos das prerrogativas da magistratura e continuam sujeitos à hie-rarquia e à disciplina do seu comandante, sendo certo que fica prejudicada a jurisdi-ção independente e imparcial.

Pode-se acrescentar que a existência do escabinato no âmbito da Justiça cas-trense, bem como sua existência como Justiça especializada, encontra justificati-va no fato de que existem regras, normas, princípios e códigos éticos muito particu-lares que regem a vida profissional e pesso-al dos militares, via de regra, mais rígidos que aqueles que regem a vida do cidadão comum. Portanto, a legitimidade do jul-gamento de civis por militares é mitigada, pois o que motiva a presença de juízes-mi-litares é a preservação de valores próprios da caserna.

Como se vê, não se trata, portanto, de interpretação contra legem, na medida em que preserva a competência da Justiça Militar para julgar crimes militares, a qual decorre do artigo 124 da Constituição Fe-deral, respeitando-se, contudo, princípios como o da isonomia e do juiz natural, já que os civis serão julgados por um juiz que possui todas as prerrogativas da magistra-tura que possuem os demais membros do Poder Judiciário, não se submetendo a princípios e normas que não lhe são ine-rentes.

4. Qual o seu posicionamento sobre a possibilidade de aplicação dos institutos despenalizadores da

Lei nº. 9.099/95 para o réu civil, e mesmo para o réu militar, quando denunciado por crime que não está tipificado no Código Penal Militar (abuso de autoridade, por exemplo)?

O artigo 90-A da Lei nº. 9.099/1995, acrescentado pela Lei nº. 9.839/1999, dis-põe que a Lei dos Juizados Especiais Cri-minais não se aplica no âmbito da Justiça Militar, ou seja, as normas insertas na Lei nº. 9.099/1995 são incompatíveis com a legislação processual castrense. Anote-se que o legislador não fez qualquer ressal-va em relação aos civis que respondem a processos criminais perante esta justiça castrense, não cabendo interpretação di-versa no sentido de fomentar a suspen-são condicional do processo nos feitos de competência da Justiça Militar.

Ressalto que a questão sobre a in-constitucionalidade do artigo 90-A da Lei nº. 9.099/1995 já foi levada ao Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, no julgamento dos autos do Habeas Corpus nº. 99.743, de relatoria do Ministro Mar-co Aurélio, tendo como redator para o Acórdão o Ministro Luiz Fux, ocasião em que a Suprema Corte, por unanimidade de votos, denegou a ordem, havendo o relator reconhecido a plena constituciona-lidade da lei.

Eis a Ementa do referido julgado, in litteris:

“EMENTA: PENAL MILITAR.HABEAS CORPUS. DESERÇÃO – CPM, ART. 187. CRIME MILITAR PRÓPRIO. SUSPENSÃO CONDI-CIONAL DO PROCESSO - ART. 90-A, DA LEI N. 9.099/95 – LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS. INAPLICABILIDADE, NO ÂMBITO DA JUSTIÇA MILI-TAR. CONSTITUCIONALIDADE, FACE AO ART. 98, INCISO I, § 1º, DA CARTA DA REPÚBLICA. OBITER DICTUM: INCONSTITUCIONALI-DADE DA NORMA EM RELAÇÃO A CIVIL PROCESSADO POR CRIME MILITAR.

O artigo 90-A, da Lei nº. 9.099/95

- Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Cri-minais -, com a redação dada pela Lei nº.

9.839/99, não afronta o artigo 98, inciso I, § 1º, da Carta da República no que veda a suspensão condicional do processo ao militar processado por crime militar.

In casu, o pedido e a causa de pedir referem-se apenas a militar responsabiliza-do por crime de deserção, definido como delito militar próprio, não alcançando ci-vil processado por crime militar.

Obiter dictum: inconstitucionalida-de da norma que veda a aplicação da Lei nº. 9.099 ao civil processado por crime militar.

Ordem denegada. (Habeas Corpus nº. 99743, Relatora: Min. MARCO AURÉLIO, Redator p/ o Acórdão: Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, Decisão pu-blicada em 21 ago. 2012).” (sem grifos no original).

Assim, não há espaço para o reco-nhecimento da inconstitucionalidade par-cial, seja com ou sem redução de texto, do artigo 90-A da Lei nº. 9.099/1995.

No que se refere à adoção do ins-tituto da suspensão condicional do pro-cesso, nos termos do artigo 89 da Lei nº .9.099/95, é matéria objeto da súmula nº. 9, desta Corte, no sentido de sua não apli-cabilidade.

5. O senhor compreende apli-cável a Lei de Execução Penal no âmbito da JMU, precipuamente no que tange aos regimes carcerários, suas progressões, e as regras especiais para lactantes/gestantes?

Conforme se extrai da leitura dos artigos 61 e 62, do Código Penal Militar, e do parágrafo único do artigo 2º da Lei nº. 7.210/84, a Lei de Execução Penal somente será aplicada ao condenado pela Justiça Militar da União quando este esti-ver recolhido a estabelecimento sujeito à jurisdição ordinária.

Contudo, com o advento da Lei nº. 13.491/2017, talvez tenhamos que aplicar alguns dispositivos da LEP, como os que tratam do regime de progressão da pena, por exemplo.

6. Na visão do senhor, quais foram os impactos do HC nº.

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NO

TAS

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grações (OIM) e a DPU, será ofertado o

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tivos”, com tutoria do Dr. Antônio Carlos

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edições de 2018, abordará os seguintes te-

mas: Direito Constitucional e Migrações/

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material que reflita sobre as temáticas,

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PUBLICAÇÃO DA ESCOLA SUPERIOR DA DPUPeriodicidade: trimestralISSN: 2526-9828Idioma: portuguêsEditores Fernando Mauro Barbosa de Oliveira JuniorOlinda Vicente MoreiraEquipe de produção editorialCoordenação de Publicações e Incentivo à Pesquisa -COPPDiagramaçãoAssessoria de Comunicação Social - DPUContato:Coordenação de Publicações e Incentivo à Pesquisa -COPPSAUN Quadra 5, lote C, torre C, 16º andar70.040-250 - Brasília/DF Tel.: (61) 3318 [email protected]

127.900, do STF, nos procedimen-tos adotados na JMU? Os efeitos limitaram-se à postergação do inter-rogatório do réu ao final da instru-ção ou também levaram à supressão de fases como as do artigo 417, § 2º, 427 e 428 do CPPM, em função de eventual audiência em único ato, ou seja, audiência “una”?

O HC nº. 127.900 do STF im-pactou positivamente os procedimentos adotados pela JMU. A citada modificação valorizou a natureza jurídica defensiva do interrogatório no âmbito da Justiça Mili-tar. O ato passou a ser considerado como ato de natureza mista, já que se revelou tanto como um meio de defesa, quanto como um meio de prova, uma vez que tanto o juiz quanto as partes poderão fazer perguntas pertinentes à elucidação dos fa-tos e sanar pontos controversos em relação às demais provas produzidas nos autos.

Sobre o tema, muito antes da de-cisão do Supremo Tribunal Federal, eu, após ter refletido sobre o contexto em que se deu a alteração do artigo 400 do CPP, já havia adotado este posicionamento, contra a maioria dos ministros da Corte Castrense e do enunciado da Súmula nº.

Os textos publicados são de inteira responsabilidade de seus autores. As opiniões neles emitidas não exprimem, necessariamente, o ponto de vista da Escola Superior da DPU.

15 deste STM, que previa que “A altera-ção do art. 400 do CPP, trazida pela Lei nº. 11.719, de 20 de junho de 2008, que passou a considerar o interrogatório como último ato da instrução criminal, não se aplica à Justiça Militar da União.”

É importante ressalvar que a altera-ção promovida pelo artigo 400 do CPP não interferiu nos dispositivos do CPPM mencionados.

7. Há percepção ou perspectiva de aumento no número de proces-sos em trâmite na Justiça Militar da União, desde que em vigor a Lei nº. 13.491/2017?

Dentre as modificações trazidas pela Lei nº. 13.491/17, o inciso II do art. 9º do CPM passou a prever que a conduta praticada pelo agente, para ser crime mi-litar, pode estar prevista tanto no Código Penal Militar quanto na legislação penal comum.

E essa é outra grande inovação. A partir desta Lei, qualquer crime previsto em leis esparsas, bem como no Código Penal Brasileiro, passa a ser de competên-cia da Justiça Militar, desde que, por certo, a situação se amolde a uma das situações previstas nos artigos 9º e 10 do CPM.

Essa mudança acrescenta em poten-cial inúmeros casos à competência da Jus-tiça Militar, até o momento, foram enca-minhados 6 IPs e 2 IPMs à JMU em razão da Lei nº. 13.491/17. Exemplos disso são os crimes previstos na Lei de Licitações, na Lei Maria da Penha, na Lei de Tortura, dentre outros que, se amoldados aos ar-tigos 9º e 10 do CPM, serão julgados, a partir de agora, pela Justiça Militar.

Essa inovação, que amplia a compe-tência da Justiça Militar, trará a necessida-de de muitos estudos e adaptações. Aqui, desde logo, afirmo que será uma mudança lenta e gradual, que dependerá de diversos fatores.

Por isso, afirmo que esta mudança não será imediata. Em realidade, depen-derá, e muito, de como os Juízes Federais interpretarão a Lei nº. 13.491/17 e, con-sequentemente, em quais situações decli-narão a competência em favor desta justi-ça especializada e, também, do Ministério Público, que é o órgão responsável pelo oferecimento das denúncias.

Inclusive, nos dias 11 e 12 do mês de abril deste ano, o STM, em parceria com o MPM e a DPU, realizou o Seminário “A leitura da Lei nº. 13.49/2017. O enfoque da Intervenção Federal na área de segurança pública no estado do Rio de Janeiro”.