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O ESTADO BRASILEIRO NO CENTRO DAS DISPUTAS TERRITORIAIS ENTRE INDÍGENAS (GUARANI E KAIOWA) E O AGRONEGÓCIO
SUCROALCOOLEIRO EM MATO GROSSO DO SUL
Juliana Grasiéli Bueno Mota Pesquisadora do Núcleo de Estudos, Pesquisas e Projetos de Reforma Agrária (NERA)
Universidade do Estado de São Paulo – UNESP/Presidente Prudente
Resumo Este artigo propõe analisar o papel do Estado no centro das disputas pelo território entre indígenas (os Guarani e Kaiowa) e fazendeiros-empresários do agronegócio no estado de Mato Grosso do Sul. Estas disputas territoriais se dão porque estes são dois projetos de desenvolvimento distintos e antagônicos de apropriação do território e devem ser entendidas nas tensões e contradições das políticas públicas do Estado brasileiro que, ao mesmo tempo, viabiliza a demarcação de Terras Indígenas para os Guarani e Kaiowa e, contraditoriamente, nestes mesmos territórios, possibilita a expansão do agronegócio sucroalcooleiro. Neste aspecto, o sentido da luta por políticas públicas é a conquista de frações do território do Estado, sendo o mesmo um território heterogêneo, permeado por divergências, contradições, disputas e conflitos. É nesta contradição que as relações de poder possibilitam a construção, desconstrução e reconstrução de territórios nas instituições de um Estado em disputa pela/na sociedade de classes. Palavras-chave: Estado; Guarani e Kaiowa. Fazendeiros-empresário do Agronegócio. Políticas Públicas e Disputas Territoriais. Introdução
São todos iguais E tão desiguais
uns mais iguais que os outros
(Engenheiros do Hawaii – Ninguém=Ninguém)
“O governo promete que vai demarcar nossas terras, mas isso não está acontecendo... a
terra é nossa, a gente nem tem terra, estamos vivendo igual sem terra... não pode vigiar
nosso Tekoha que fazendeiro manda matar índio” (dados de pesquisa de campo, 2012).
Esta narrativa, de uma liderança Kaiowa, demonstra que o estado de Mato Grosso do
Sul é marcado por um contexto de disputa pelo território. Nesta disputa, por um lado,
os Guarani e Kaiowa1 lutam pela retomada de seus territórios tradicionalmente
ocupados, denominados por eles de Tekoha, reivindicando do Estado à demarcação. E,
por outro lado, está ocorrendo à expansão do agronegócio sucroalcooleiro com
incentivos do governo federal e do estado de Mato Grosso do Sul. A partir desta
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premissa, buscaremos compreender estes dois projetos de desenvolvimento distintos e
antagônicos marcados, também, por formas distintas e antagônicas de apropriação do
território. Estas disputas territoriais devem ser entendidas nas tensões e contradições das
políticas públicas do Estado brasileiro que, ao mesmo tempo, viabiliza a demarcação de
Terras Indígenas2 e, contraditoriamente, nestes mesmos territórios, possibilita a
expansão do agronegócio sucroalcooleiro.
Nossa compreensão de território parte de uma concepção multidimensional, por meio de
uma “perspectiva geográfica, intrinsecamente integradora, [...] [abrangendo] o processo
de domínio (político-econômico) e/ou de apropriação (simbólico-cultural) do espaço
pelos grupos humanos”. (HAESBAERT, 2007, p.16). A ênfase no entendimento de
território que estamos desenvolvendo em nossa reflexão parte da análise da
conflitualidade que envolve os modos de apropriação, controle e uso dos mesmos, logo,
afirmamos que existe uma disputa territorial. De acordo com Bernardo Mançano
Fernandes (2008, p. 02): “A conflitualidade é um processo constante alimentado pelas
contradições e desigualdades do capitalismo. O movimento da conflitualidade é
paradoxal ao promover, concomitantemente, a territorialização – desterritorialização –
reterritorialização de diferentes relações sociais”. Ou seja, o território se constrói
pela/na conflitualidade da sociedade de classes, diante das disputas por projetos de
desenvolvimento no campo que são distintos e antagônicos entre si.
Neste contexto de disputa pelo território, os Guarani e Kaiowa e os fazendeiros-
empresários do agronegócio se articulam formando movimentos socioterritoriais, como
discutido por Bernardo Mançano Fernandes (2008) ao considerar que é o território a
questão chave da luta destes movimentos sociais. Ainda, entendemos que estes
movimentos se organizam enquanto classe para si, pois todos os homens e mulheres
pertencem a uma classe social (embora, muitos movimentos sociais lutem por interesses
que não dizem respeito à problemática da luta de classe). A partir de Edward Palmer
Thompson (1981, p.121) partimos do seguinte elemento para entender as lutas sociais
em disputa pelo território, “as classes sociais não antecedem, mas surgem na
luta”. Nicos Poulantzas (2000, p. 26) traz uma significativa contribuição neste debate,
ao dizer que: Assim, os lugares de classe, que se traduzem por poderes, consistem, no seio das relações de produção, em práticas e em lutas de classe. Bem como essas relações e a divisão social do trabalho não constituem uma estrutura econômica exterior (prévia) às classes sociais, também não pertencem a um campo exterior do poder e às lutas. As classes sociais não se colocam “em si”
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nas relações de produção para entrar na luta (classe “para si”) somente depois ou noutro lugar. Situar o Estado em sua ligação com as relações de produção é delinear os contornos primeiros de sua presença na luta de classes.
É a partir das demandas em comum revindicadas pelas classes e frações de classe que
há nelas uma consciência de si mesma. Para Ruy Moreira (2012)3, os camponeses,
quilombolas e indígenas tem formado o que ele denominou de classes territoriais. Para
ele, estes sujeitos tem se configurado enquanto a vanguarda revolucionária latino-
americana. É no processo de organização destes movimentos que suas reivindicações
podem ou não influenciar e viabilizar políticas públicas que possam priorizar diferentes
projetos de sociedade. Nesta questão, Nicos Poulantzas (2000, p.37) elenca que “onde
existe divisão de classes, há, portanto, luta e poder de classe, existe o Estado, o poder
político institucionalizado”. Esta interpretação nos permite dizer que o Estado se coloca
na condição de campo/território de lutas (POULANTZAS, 2000).
As retomadas de Tekoha divergem do modo de apropriação e uso do território do
agronegócio sucroalcooleiro. Para os Guarani e Kaiowa o retorno aos seus territórios
parte da necessidade de reprodução de seus modos de viver, em aproximação e
comparação ao modo de vida reproduzida pelos antigos e/ou ancestrais em seus Tekoha.
O prefixo Teko dá sentido a um modo de vida, enquanto, o sufixo Ha tem conatação de
lugar. Neste aspecto, Tekoha pode ser entendido enquanto o lugar-território onde é
possível reproduzir o modo de vida Guarani e Kaiowa. (PEREIRA, 2004).
A atual situação vivida por estas sociedades indígenas, no estado de Mato Grosso do Sul,
é considerada a pior situação indígena brasileira, segundo aponta os dados do Conselho
Indigenista Missionário (CIMI, 2011), por meio dos relatórios de Violência Contra os
Povos Indígenas do Brasil, referente ao período de 2003 a 2010. Neste período, é possível
mapear a atual situação Guarani e Kaiowa da seguinte forma: mais 250 homicídios, 190
tentativas de homicídios, 176 ocorrências de suicídios e 4.000 crianças que sofreram por
desnutrição. Somente no ano de 2003 a taxa de mortalidade infantil por desnutrição foi de
93 crianças para cada 1000 nascimentos. Ainda, ocorreu mais de 70 conflitos relativos a
direitos territoriais. Ainda, segundo o CIMI, a expectativa de vida entre os Guarani e
Kaiowa é semelhante aos de países mais pobres do mundo, com altos índices de
assassinatos semelhantes a países em guerra, índices de suicídios que estão entre os
maiores do mundo e de mortalidade infantil acima da média nacional.
Estes dados demonstram a necessidade de demarcação dos territórios Guarani e Kaiowa
que se confronta com o modelo de desenvolvimento capitalista no campo, na forma de
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agronegócio. Para Clifford Andrew Welch e Bernardo Mançano Fernandes (2008) a
base deste desenvolvimento, o agronegócio, se dá por meio da acumulação, do
monocultivo, do trabalho assalariado, do uso intensivo de agrotóxicos e a produção em
grande escala. Ainda, neste debate, Carlos Walter Porto Gonçalves (2004) afirma que o
agro-negócio é, fundamentalmente, negócio, pautado no modelo agrário-agrícola
dominante no campo, ancorado em dois pilares básicos: “[...] (1) no uso de um modo de
produção de conhecimento próprio do capital que se traduz na supervalorização da
ciência das técnicas ocidentais (que se querem universais); (2) na expansão das terras
cultivadas, sobretudo em regiões onde as terras são baratas” (PORTO-GONÇALVES,
2004, p. 224).
A partir destes dois modos de apropriação de territórios, as disputas territoriais entre
indígenas e fazendeiros-empresário do agronegócio tem-se dado a partir de políticas
públicas do Estado brasileiro que tem liberado terras para o plantio de monocultivo da
cana para produção de açúcar e álcool. Por meio do Plano Nacional de Agroenergia
2006-2011, desenvolvido pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e
Secretaria de Produção e Agroenergia (2006) este projeto tem direcionado as políticas
do governo do estado de Mato Grosso do Sul. Fato este que tem sido investigado pelo
Ministério Público Federal (MPF, 2009), pois a territorialização do agronegócio tem-se
consolidado em territórios indígenas, financiado e incentivado pelo Estado brasileiro. Por determinação do Procurador da República Marco Antonio Delfino de Almeida, em 31 de março de 2009, retornei a Aldeia Paso Piraju, em Porto Cambira. Desde a minha última visita, há mais de um ano, houve uma transformação da paisagem do entorno: a Fazenda Campo Belo e outras da região passaram a plantar cana-de-açúcar, em substituição às pastagens e a cultura da soja. Ao chegar na aldeia, um dos primeiros comentários que escuto se refere, justamente à cana: “A cana cresceu. É da empresa Unialco. É [o empresário] Celso dal Lago quem arrenda para o plantio”, dizem os índios.
Neste sentido, é necessário entender quem é o Estado e como ele se articula, se cria e se
recria na sociedade capitalista. Em primeiro lugar, é necessário dizer que o Estado é
uma instituição, e que ele é tensionado pelas disputas existentes na sociedade. Para
Álvaro García Linera (2010, p. 26) “Quando definimos o Estado, estamos falando de
elementos diversos, tão objetivos e materiais como as Forças Armadas e o sistema de
ensino, e tão etéreos – mas, como efeito, igualmente materiais – como crenças,
obediências, submissões e símbolos. Não há Estado sem instituições”. Ainda, para o
autor devemos nos atentar para a dimensão material e imaterial do Estado:
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Era o que Lenin denominava “a máquina do Estado”. É a dimensão material do Estado, o regime e o sistema de instituições: governo, parlamento, justiça, cultura, educação, comunicação. Mas o Estado constitui-se também, além dessa dimensão material, desta lista que dissemos que ele é, de concepções, aprendizados, saberes, expectativas, conhecimentos. Essa seria a dimensão ideal do Estado. O Estado tem uma dimensão material muito bem descrita por Lenin, como o regime de instituições. Contudo, por trás dessa materialidade e idealidade, ele é também relações e hierarquias no uso, mando, condução e usufruto dessas crenças – crenças essas que não surgem do nada, são fruto de correlações de força, lutas e enfrentamentos, guerras, sublevações, revoluções, movimentos, exigências e petições. (LINERA, 2010, p. 26).
Podemos entender o Estado a partir de três componentes: “[...] todo Estado é uma
estrutura material e institucional; todo Estado é estrutura ideal, de concepções e
percepções e é uma correlação de forças. Mas é também um monopólio da força, da
legislação, da tributação e do uso de recursos públicos” (LINERA, 2010, p. 26).
Apreender o Estado enquanto uma relação, que não está fora das contradições da
sociedade, mas é parte dela, permite considerar que o Estado é fruto da sociedade divida
em classes, que produz também um Estado de classe. Pois, como salienta Nicos
Poulantzas (2000, p. 130, grifo nosso), é necessário entender o Estado “como uma
relação social, mais especificamente, como a condensação material de uma relação de
forças entre classes e frações de classe, que se expressam, de maneira sempre
específica, no seio deste Estado”. Assim, o Estado “não é sujeito nem objeto, mas sim
uma relação social, ou melhor, a condensação das relações presentes numa dada
sociedade” (GRAMSCI apud MOLINA, 2012, p. 593).
A condensação das relações existente no Estado, os jogos de poder entre classes sociais
e frações de classe, se dão também para viabilizar garantias de direitos, por meio de
políticas públicas que viabilize, neste caso, garantias sobre o território. Neste aspecto, é
importante não perder de vista que o Estado baliza campos de lutas (POULANTZAS,
2000). E, também, como adverte Álvaro García Linera (2010, p. 25) “está claro que um
nó de condensação do fluxo político da sociedade passa pelo Estado, e que não se pode
deixar de lado o momento de materializar e objetivar uma correlação de forças sociais e
políticas ao redor dele”.
Assim, no momento que as classes sociais e frações de classe na sociedade capitalista se
articulam para viabilizar seus projetos de sociedade, elas estão disputando o poder sobre
o Estado. O estabelecimento da política do Estado deve ser considerado como a resultante das contradições de classe inseridas na própria estrutura do Estado (o Estado-relação) [...]. As contradições de classe constituem o Estado,
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presentes na sua ossatura material, e armam assim sua organização: a política do Estado é o efeito de seu funcionamento no seio do Estado (POULANTZAS, 2000, p.134-135).
A correlação de força existente no Estado está diretamente relacionada ao bloco que
está no poder. A burguesia, assim como os movimentos populares não são homogêneos,
mas estão divididos por interesses, frações de classe, que podem ou não ter interesses
comuns no contexto de suas lutas. Todavia, é necessário partir do pressuposto de que o
Estado, como pontua Nicos Poulantzas (2000, p. 129), “representa e organiza as classes
dominantes, em suma, representa, organiza o interesse político a longo prazo do bloco
no poder [...]”. O que se quer enfatizar é a compreensão do Estado para muito além de um bloco monolítico compreendido unicamente como “aparelho repressor da classe dominante”, homogêneo, sem espaço para divergências e contradições. Compreende-se o Estado como um território em disputa, espaço heterogêneo, de conflitos e contradições. É possível e necessário disputar o Estado, na perspectiva de colocar frações do Estado a serviço da classe trabalhadora. É sabido que na sociedade capitalista, com a hegemonia da classe burguesa, o Estado está majoritariamente apropriado para garantir a reprodução do capital; [...]. A compreensão da importância da luta por Políticas Públicas dá-se, portanto, nessa perspectiva de lutar para ampliar a esfera pública e tentar reduzir e barrar a ampliação da esfera do mercado, da privatização, da exclusão dos direitos. (MOLINA, 2010, p. 145, grifo nosso).
Neste aspecto, é por meio do poder político do Estado que as classes dominantes
buscam a materialização de seus interesses de classe. É o potencial de influência de
determinada fração de classe sobre o Estado que vai possibilitar e viabilizar seus
objetivos/projetos de sociedade. Deste modo, é possível considerar os aparelhos de
hegemonia que parte sempre de uma visão de mundo. É por meio desta visão de mundo
que um grupo se impõe sobre os demais, fazendo que seus interesses sejam partilhados
por toda sociedade por meio do convencimento, no caso do agronegócio
sucroalcooleiro, de que este é o melhor modelo de produção para o campo (GRAMSCI
apud MOLINA, 2010). Nesta perspectiva, de acordo com Paulo Freire (1993, p. 17),
“Do ponto de vista das elites, a questão se apresenta de modo claro: trata-se de
acomodar as classes populares emergentes, domesticá-las em algum esquema de poder
ao gosto das classes dominantes”.
Jogos de poder de Estado e viabilidade de garantias de direitos pela constituinte de 1988 Todos são iguais perante a lei, garante a Constituição da República Federativa do Brasil,
promulgada em 05 de outubro de 1988. Esse direito independe de cor, raça, etnia,
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gênero e classe social. Entretanto, diante do discurso de direitos iguais, têm-se
contradições e tensões que envolvem os jogos de poder do Estado, que refletem,
diretamente, os jogos de interesses da sociedade que está divida em classes sociais.
Mabel Thwaites Rey (2010, p. 45) demonstra as impossibilidades de indissociação de
Estado e poder. “E não porque o poder não exceda os limites do Estado em sentido
estrito, mas porque apesar de todas as loas que se cantaram à perda de sua relevância, o
Estado ‘realmente existente’ ainda continua sendo um nó incontornável na articulação
política”.
O conceito de poder abordado neste artigo, parte da premissa de Claude Raffestin
(1993) ao demonstrar em sua obra intitulada “Por uma geografia do poder” que todas as
relações sociais comportam relações de poder. Assim, o Estado se reproduz pelas
relações de poder existente nos tensionamentos, conflitos, conflitualidades, tensões e
disputas na/da sociedade capitalista. O poder está e se dá nas relações, de modo que
toda relação é marcada pelo poder. Este poder não se restringe ao poder de Estado, mas
se reproduz de maneira intensa por meio dele. O Estado é uma das faces do poder.
Também, Nicos Poulantzas (2000, p. 43), ao discutir o poder relacional do Estado,
elenca que o poder não se reduz ao Estado, mas que a constituição das relações de poder
está nas lutas marcadas por correlações de forças e que estas se dão no “campo primeiro
das relações de poder, que sempre detêm a primazia sobre o Estado”.
Deste modo, podemos dizer que sem poder não há Estado. O poder é sempre uma
negociação. Assim, se o Estado se reproduz por correlações de forças, esta relação se
materializa nos jogos de poder que produzem os territórios e o Estado a partir de
projetos de sociedade distintos e antagônicos. Esta construção é marcada por
intencionalidades que se materializam nas disputas que envolvem indígenas e o
agronegócio sucroalcooleiro em Mato Grosso do Sul, que por serem formas distintas de
apropriação do território, poderá dar origem aos territórios indígenas e/ou territórios do
agronegócio.
Para entender a correlação de forças que envolvem projetos de sociedade antagônicos, a
intencionalidade é sem dúvida um elemento extremamente importante para esta
compreensão. Para Bernardo Mançano Fernandes (2008, p. 04), a partir das discussões
de John R. Searle, “a intencionalidade expressa, portanto, um ato político, um ato de
criação, de construção”. Assim, a intencionalidade reflete os modelos de
desenvolvimento defendidos pelo Estado brasileiro por meio de suas políticas públicas
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que direcionam projetos de sociedade. Estas políticas estão amarradas e imbricadas
pelas/nas relações de poder marcadas pelas intencionalidades de classe e frações de
classe. A intencionalidade é, portanto, sempre marcada pela capacidade de
direcionamento do poder do Estado a partir dos interesses de classe que estão em
disputa.
Neste contexto, quais seriam as intencionalidades do Estado no campo da correlação
de forças marcadas pelas disputas entre indígenas e o agronegócio sucroalcooleiro?
Como demonstrou Nicos Poulantzas (2000), o Estado não é uma unidade homogênea
de comando de uma classe (ao contrário da perspectiva ortodoxa muito difundida e
equivocada de que é apenas a burguesia que comanda o Estado de maneira irrestrita e
ilimitada). O Estado é atravessado pelas contradições e interesses das classes que
disputam o poder de Estado. Para compreendermos o papel relacional do poder do
Estado, podemos visualizá-lo a partir da garantia de direitos reconhecidos pelo Estado
brasileiro. Para entender esta relação contraditória de poder do Estado, Marcos
Homero Ferreira Lima e Verônica Maria Bezerra Guimarães (2011, p. 58-59)
demonstram a partir do dito popular “a mesma mão que afaga é a mesma que
apedreja”, que o Estado é marcado por múltiplas intencionalidades, interesses e
contradições da/na sociedade que produz o Estado. Nas palavras dos autores,
A questão fundiária indígena no Estado de Mato Grosso do Sul é bem ilustrativa. Por um lado, o Estado brasileiro promove o processo de identificação e delimitação das terras indígenas para que possa “proteger e fazer respeitar todos os seus bens”; por outro, o mesmo Estado cria mecanismos e empreende ações que, ao mesmo tempo em que fomentam o desenvolvimento econômico, põe por terra qualquer premissa multicultural4. A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Hoje, mais do que em qualquer momento da história, o poder do Estado reflete o poder
econômico na mais nova versão, o poder econômico do capital financeiro
mundializado. Ou seja, o interesse político do Estado é, também, redirecionado pela
política econômica global que direciona as políticas públicas. Isso, por sua vez, não
significa que o Estado esteja perdendo seu poder de mando, já que:
Desde el punto de vista de la política, el Estado es ante todo institucionalización de relaciones de poder entre fuerzas sociales y de su articulación con el sistema internacional de relaciones políticas, comerciales y financieras […]. La soberanía del Estado consiste en la capacidad que éste tiene para asegurar que esos mandatos serán efectivamente aceptados dentro de la delimitación territorial de sus competencias. (VILAS, 2004, p.23).
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Desta forma, frente à política econômica global, que tem direcionado o poder político
do Estado assim como as políticas públicas, o funcionamento da ossatura do Estado
implica sempre em uma autonomia relativa que está sempre em negociação, como
demonstra Carlos M. Vilas (2004). Para entender esta negociação, é necessário dizer
que normalmente é o poder econômico que se sobressai sobre o poder político (ver
Figura I).
Figura I – Jogos de poderes na sociedade capitalista
Fonte: < http://herlonps.blogspot.com.br/2012/05/poder-economico-poder-politico-poder.html >.
Se a constituição do Estado é a história da criação/constituição do capitalismo, a base de
sua recriação é pautado no poder econômico que é, por sua vez, um poder de classe da
burguesia, de uma fração dela. Este poder econômico, por sua vez, sucumbe outros
poderes, tais como o poder político e o poder público. No que concerne ao poder
político, que não se restringe ao poder de Estado, é necessário compreender que este
poder é tensionado pela sociedade com múltiplos interesses distintos que direcionam as
políticas públicas de Estado.
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Para visualizarmos esta correlação de forças, demonstraremos como ocorrem as
disputas pelo território Guarani e Kaiowa, frente aos fazendeiros-empresários do
agronegócio, a partir da discussão do direcionamento das políticas públicas de Estado.
A garantia de direitos constitucionais está em disputa pelas classes e frações de classe
perante o Estado. Exemplo desta realidade é a Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988, que apesar das contradições de suas leis no que concerne a garantia de
direitos e deveres dos cidadãos, ela é, sem dúvida, a mais democrática da história
brasileira, também conhecida como constituição cidadã.
Nesta constituição, no capítulo I, “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”, consta no
artigo 5º, inciso XXII o seguinte: “é garantido o direito de propriedade”. Entretanto, no
inciso XXIII acrescenta que “a propriedade atenderá a sua função social” a partir de
quatro critérios indicados em cada um de seus incisos:
Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I - aproveitamento racional e adequado; II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
Também, esta constituinte garante o reconhecimento à sociedades indígenas do direito
sobre seus territórios tradicionalmente ocupados, assim como o direito de viver
segundo seus costumes e tradições. Cabe, ainda, a União à função de demarcá-las e
protegê-las. Capítulo VIII - Dos Índios Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
As leis fundamentais da constituinte de 1988 é a representação das disputas de classe e
frações de classe na organização de políticas públicas de Estado à sociedade brasileira.
E mais do que isso, responde as correlações de forças dos vários segmentos da
sociedade reivindicando garantias de direitos. Por meio da constituinte, podemos
visualizar como o Estado tem que organizar suas diretrizes de governança a fim de
contemplar os diversos segmentos da sociedade que estão em disputas, inclusive, na
disputa pelo poder de Estado.
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A contradição fundamental se estabelece da seguinte forma: por um lado à constituição
garante a base fundamental da nossa sociedade, o direito de propriedade, sendo o
principal discurso utilizado pelos ruralistas em oposição à demarcação de Terras
Indígenas, no que concerne a propriedade privada rural. Por outro, também, garante o
direito dos indígenas aos seus territórios, que neste caso não se dá pelo direito de
propriedade, mas de uso e posse sobre os mesmos. Segundo a constituinte:
§ 1º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições. § 2º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.
O que é notório, entre os fazendeiros-empresários do agronegócio e os indígenas, é que
são formas distintas de apropriação do território e que esta distinção aparece na
constituição. Ainda que, no contexto de lutas dos movimentos indígenas pelos seus
territórios perante o Estado, há, por outro lado, o conservacionismo em garantir o direito
da propriedade privada, fundamentalmente, em garantir o direito à concentração da terra
por parte da oligarquia agrária brasileira, mantendo a estrutura agrária vigente no Brasil.
Neste contexto, se por um lado à constituição prevê a garantia e o direito de propriedade
privada da terra, também a mesma considera que esta tem que cumprir sua função social
perante a sociedade. Interpretando a constituição, partimos da premissa de que o direito
indígena antecede qualquer direito sobre o território, pois se uma propriedade privada é
Terra Indígena, esta não está cumprindo com sua função social, já que compete ao
Estado fazer valer o direito indígena sobre seus territórios, há medida que ela está sendo
reivindicada. Este fato reflete na atual situação Guarani e Kaiowa, com a existência de
39 Tekoha em processo de demarcação, por meio Termo de Ajustamento de Conduta
(TAC), firmado pelo Ministério Público Federal de Mato Grosso do Sul (MPF/MS) e
Fundação Nacional do Índio (FUNAI), em 2007. O Estado brasileiro garante a
demarcação, entretanto, contraditoriamente, estes territórios estão sendo utilizados para
a produção de açúcar e álcool por empresas nacionais e transnacionais.
Índios da tribo Guarani, no Brasil, exigiram que a gigante da energia, Shell, pare de usar suas terras ancestrais para produção de etanol. Ambrosio Vilhalva5, um Guarani de uma das comunidades afetadas, disse à Survival International, “A Shell tem que sair das nossas terras... as empresas têm que
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parar de trabalhar na terra dos indígenas. Queremos a justiça, e a demarcação das nossas terras.” A Shell se tem unido com a Cosan, empresa brasileira de etanol, em um empreendimento conjunto chamado Raízen. Parte do etanol da Raízen, que é vendido como biocombustível, é produzido a partir de cana de açúcar cultivada em terras ancestrais dos Guarani. Em uma carta para as empresas, os índios advertem que “depois que começou a funcionar a usina [referente à usina Nova América], a saúde ficou ruim para todos - crianças, adultos e animais” (ECODEBATE, 2011).
A expansão do setor sucroalcooleiro tem dado origem às novas formas de disputa pelo
território, impulsionadas pelo governo de Mato Grosso do Sul e subsidiadas com
incentivos e financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento e Banco do Brasil,
constado no relatório do Ministério Público Federal de Dourados/MS (BRASIL/MPF,
2009). Referente aos subsídios concedidos pelo Estado brasileiro para a implantação
destes empreendimentos, o governo de Mato Grosso do Sul se apresenta como “o
melhor lugar para produzir etanol no Brasil”, publicação feita pelo governo do estado de
Mato Grosso do Sul, intitulado “Projetos Estratégicos de Desenvolvimento”, Nesta
publicação constam os seguintes incentivos: Disponibilidade de terras com valor
competitivo; Solos apropriados à mecanização (até 100%); Localização estratégica
(próxima aos centros consumidores); Clima apropriado; Apoio institucional do Governo
de MS.
Neste contexto, há aproximadamente 42 empreendimentos sucroalcooleiros para este
estado, entre projetos de implantação, em operação e em processo de implantação.
Deste total, 16 empreendimentos estão localizados em municípios onde há terras já
identificadas, delimitadas e demarcadas pela FUNAI, porém não estão homologadas e
registradas6, como é o caso da Terra Indígena Guiraroka que já foi demarcada pelo
Estado brasileiro, mas ainda espera o processo de homologação e registro da Terra
Indígena (BRASIL/MPF, 2009).
A partir destes dados é perceptível que o avanço do agronegócio sucroalcooleiro impede
ou dificulta os processos de demarcação e ocupação dos territórios reivindicados pelos
Guarani e Kaiowa que hoje se encontram sobre o controle de empresas nacionais e
transnacionais para a produção de açúcar e álcool. O que demonstra que as disputas pelo
território envolvendo indígenas e agronegócio sucroalcooleiro é marcado por
tensionamentos e contradições presentes no aparato institucional do Estado brasileiro.
Assim, podemos dizer que é o mesmo Estado que cria políticas públicas para garantir os
direitos das sociedades indígenas e inviabiliza o retorno destas sociedades aos seus
territórios a partir do incentivo financeiro e ideológico do avanço do agronegócio
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sucroalcooleiro nestes mesmos territórios. Diante da atual situação de disputa que
envolve os indígenas e o agronegócio, há uma emenda inconstitucional que busca
favorecer os interesses dos fazendeiros-agronegócio. Esta emenda busca impedir a
demarcação de territórios indígenas. I - Proposição de mudanças na constituição: Trata-se de Proposta de Emenda Constitucional de nº 215, de 2000, apresentada por parlamentares, tendo à frente o Deputado Almir Sá, que foi aprovada, na qual sugere que: 1. Se acrescente ao art. 49 da Constituição Federal, o inciso, renumerando-se os demais, com o seguinte teor: Art. 49 – É da competência exclusiva do Congresso Nacional: (novo inciso) – aprovar a demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios e ratificar as demarcações já homologadas; 2. Se altere a redação do § 4º do art. 231 da Constituição Federal e acrescenta um oitavo parágrafo neste mesmo art. 231 da CF, de forma a passar a vigorar com as seguintes redações: “§ 4º As terras de que trata este artigo, após a respectiva demarcação aprovada ou ratificada pelo Congresso Nacional, são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis”; “§ 8º Os critérios e procedimentos de demarcação das Áreas indígenas deverão ser regulamentados por lei”.
A demarcação de terras indígenas pelo Estado brasileiro impede o avanço do modelo de
desenvolvimento do agronegócio, por isso os ruralistas buscam impedir a demarcação e
homologação destas novas Terras Indígenas e, por outro lado, buscam liberá-los para o
agronegócio, por meio do PEC/215. Segundo Marcos Homero Ferreira Lima e Verônica
Maria Bezerra Guimarães (2011) há uma busca em instalar estes empreendimentos
antes da homologação de territórios indígenas. A intenção é burocratizar ainda mais este
processo, e a partir disto, viabilizar a exploração do setor sucroalcooleiro nestes
territórios.
Apesar de todo o processo demarcatório que envolve as terras Guarani e Kaiowa, o
avanço do setor sucroalcooleiro continua a expandir sua área de domínio no estado de
Mato Grosso do Sul. Segundo dados do IBGE (20117) é neste estado que o setor
sucroalcooleiro mais tem aumentado suas áreas de cultivo, pois tem buscado atrair os
produtores com terras férteis e baratas subsidiadas pelo governo. Este processo pode ser
visualizado no aumento de 113. 415 hectares da área cultivada com monocultivo da
cana, quase 40% em relação ao ano de 2009. Ainda, segundo dados da Campanha
Nacional de Abastecimento (CONAB, 2011), referente à safra 2011/2012: A previsão do total de cana moída na safra 2011/12 é de 571.471,0 milhões de toneladas, com queda de 8,4% em relação à safra 2010/11, que foi de 623,905 milhões de toneladas, que significa que a quantidade que será moída
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deve ser 52 milhões de toneladas a menos que a moagem da safra anterior. A produção de cana da região Centro-Sul ficou em 501.380,4 milhões de toneladas, 10,6% menor que a produção da safra anterior.
Por outro lado, o reflexo deste modelo de desenvolvimento traz grandes impactos para
as sociedades indígenas que tem o território enquanto um importante elemento para
reprodução de seu modo de vida. Levi Marques Pereira (2004) diz que sem Teko (modo
de vida) não há Tekoha (os territórios) e sem Tekoha não há Teko, ao demonstrar que o
território é um elemento imprescindível para estas sociedades, esclarece também, que
sem ele, os Guarani e Kaiowa continuaram a viver em uma situação precária e sub-
humana que impossibilita reprodução de seu modo de vida. Para garantir a reprodução
de seu modo de viver, estas sociedades estão organizadas para exigir do Estado
brasileiro o reconhecimento de seus direitos. São, aproximadamente, 27 acampamentos
de retomadas por seus territórios no estado de Mato Grosso do Sul, e para viabilizar esta
conquista, os Guarani e Kaiowa têm conseguido articular uma importante rede de
solidariedade e apoio, como: as universidades; Movimentos Sociais não indígenas,
como é o caso do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST; Políticos de
partidos progressistas; Organizações Não Governamentais – ONGs; Entidades de apoio:
Conselho Indigenista Missionário - CIMI e Comissão Pastoral da Terra – CPT. Estas
sociedades estão disputando o poder de mando do Estado para revindicar suas
demandas, embora esta correlação de forças seja infinitamente menor do que o poder
dos fazendeiros-empresários do agronegócio. Porém, com certeza, é um importante
meio de resistir ao modelo de desenvolvimento do agronegócio, em busca de outras
possibilidades de viver a partir de outras formas de apropriação do território. A base
desta territorialização é a reprodução da vida, de modos de ser e estar Guarani e Kaiowa
nos preceitos do Teko Porã – Bem Viver.
Apontamentos finais O que tentamos demonstrar por meio deste artigo são questões iniciais que permeiam
nossas inquietações diante da territorialização do setor sucroalcooleiro em territórios
Guarani e Kaiowa. Neste contexto de disputa, a questão central foi compreender o
papel do Estado nesta correlação de forças e as contradições que envolvem o papel do
Estado brasileiro frente estas disputas. O poder de Estado é condicionado por
interesses e intencionalidades de classe e de frações de classe antagônicos, assim ele
age e coage sendo, ao mesmo tempo, o veneno e o antídoto das tensões existentes na
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sociedade. Pois, ao mesmo tempo em que viabiliza meios para demarcação de
territórios indígenas, por outro, concomitantemente, viabiliza também a expansão do
setor sucroalcooleiro.
Neste contexto de luta Guarani e Kaiowa pelo Tekoha versus a expansão do
agronegócio sucroalcooleiro, se coloca em disputa a correlação de forças sobre o poder
de Estado. Neste aspecto, o sentido da luta por políticas públicas é a conquista de
frações do território do Estado, sendo o mesmo um território heterogêneo, permeado por
divergências, contradições, disputas e conflitos. Assim, a disputa pelo território integra
a disputa pela política de Estado, que para os Guarani e Kaiowa se colocam como a
necessidade de demarcação de Terras Indígenas. É nesta contradição que as relações de
poder possibilitam a construção, desconstrução e reconstrução de territórios nas
instituições de um Estado em disputa pela/na sociedade de classes.
Exemplo desta disputa é a conquista de algumas reivindicações dos indígenas diante da
expansão da cana de açúcar em seus territórios, como ocorreu recentemente, em junho
de 2012, referente ao acordo entre a Raízen (união das empresas Cosan e Shell) e a
FUNAI. Este acordo diz que a Raízen não irá comprar cana de açúcar cultivado em
Terras Indígenas, o que demonstra uma barreira para o avanço do setor sucroalcooleiro
em Mato Grosso do Sul. Ou seja, esta conquista está imbricada na luta do movimento
Guarani e Kaiowa pela demarcação de seus Tekoha, assim como é um modo de frear o
avanço deste modelo de produção sobre seus territórios. Fundamentalmente, esta
conquista demonstra, para fim de considerações finais, através da narrativa de uma
liderança Kaiowa de fevereiro de 2012, que “se a gente não lutar a gente não consegue
nossas terras de volta”.
Notas ____________ 1 Os Guarani e Kaiowa são falantes da língua guarani, pertencente ao tronco-linguístico Tupi-Guarani. Os mesmos se encontram territorializadas em vários estados do território nacional brasileiro (Paraná, Rio Grande do Sul, São Paulo, Santa Catarina e Mato Grosso do Sul) e países da América Latina (Paraguai e Argentina), segundo Instituto Socioambiental (2011). 2 Terras Indígenas é um termo jurídico utilizado a partir da constituição de 1988. Referente ao processo demarcatório, consta na Lei de Terras Indígenas, Decreto 1775/96 | Decreto no 1.775, de 8 de janeiro de 1996. O processo de demarcatório de Terras Indígenas é conduzido pelo antropólogo de qualificação reconhecida, que elaborará, no prazo determinado, estudo antropológico de identificação, incumbindo-se um grupo técnico especializado, coordenado por antropólogo, dos estudos complementares de natureza etno-histórica, sociológica, jurídica, cartográfica, ambiental e o levantamento fundiário necessário à delimitação das terras. Concluídos os trabalhos de identificação e delimitação, o grupo técnico
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apresentará relatório circunstanciado ao órgão federal de assistência ao índio, caracterizando a terra indígena a ser demarcada (SILVA, 2008). 3 Informação Verbal: Aula Magna - Tema: “Século XXI – Final dos Tempos e o Destrutivismo Imanente da Sociedade do Capital: Desafios Epistemológicos para a Geografia e Necessidades Emancipatórias”. Data: 28/03/2012. Local: Unesp – campus de Presidente Prudente. 4 O movimento multicultural surgiu nos Estados Unidos, a partir de um conjunto de lutas dos negros em busca do reconhecimento de sua cultura, com base na diversidade étnica, cultural e identitária. A discussão engendrada pelos autores é construída a partir de Boaventura de Souza Santos, ao dizer que “o termo Multiculturalismo caracterizou-se como um modo de designar as diferenças culturais em um contexto transnacional e global” (LIMA; GUIMARÃES, 2011, p.58). 5 Liderança do Tekoha Guiraroka, localizado no município de Caarapó/MS. 6 Homologação é o procedimento demarcatório submetido pelo Presidente da República por meio de um decreto. Após este momento a TI deve ser registrada. Este momento é de responsabilidade da FUNAI que tem o prazo de 30 dias para registrá-la no cartório de registro de imóveis da comarca correspondente e no SPU (Secretária de Patrimônio da União) (ARAÚJO, 2006). 7 Fonte: Agora MS. Acesso em: 10 dez. 2011. Disponível em: <http://www.udop.com.br/index.php/meteorologia/meteorologia/index.php?item=noticias&cod=1079134>.
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