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1 O IMPACTO DAS FINANÇAS PÚBLICAS NAS FINANÇAS PESSOAIS NO CONTEXTO DA ATUAL CRISE ECONÔMICA BRASILEIRA Marcelo Gonçalves de Sousa 1 RESUMO Este artigo apresenta uma análise da atual crise brasileira que se consolidou pelo retorno do pesadelo da inflação. Diante deste problema, o cenário econômico se tornou bastante complexo para as famílias, o que se agrava pela elevação contínua da taxa básica de juros promovida pelo governo. O texto mostra que o equívoco na condução das finanças públicas está destruindo a prosperidade nas finanças pessoais, com consequências devastadoras para a nação. Fica claro que a inflação tem piorado, de maneira mais acentuada, devido a ineficiência governamental e o impacto dos preços administrados nos setores de energia e combustível. A oferta de crédito fácil combinada com a cultura do consumismo nos últimos anos também contribuiu fortemente para esta situação. O fato é que já houveram diversas elevações na taxa de juros que se mostraram ineficazes para combater o problema. No entanto, o governo continua com aumentos sucessivos dos juros, colocando o investidor na retranca e ampliando o desemprego de modo injustificado. Pelo contrário, deveria ser feita uma política de redução dos juros como vem ocorrendo no mundo inteiro. Inclusive, uma análise de dados históricos demonstra que as reduções de juros não implicaram necessariamente no aumento da inflação. As diversas manifestações mostram que o país busca rapidamente o rompimento de uma 1 O autor é Aluno Especial de Finanças no Mestrado em Administração da UFBA, Pós-Graduado em Administração de Empresas pela FGV com Módulo Internacional no U.S. Business and Economic Strategies Seminar pela University of California San Diego e Graduado em Administração de Empresas pela UCSAL. Trabalha como Professor da disciplina Orçamento Empresarial na Graduação em Administração de Empresas da Universidade Católica do Salvador, onde também é responsável pelo Curso de Extensão em Finanças Pessoais na modalidade de ensino à distância. Nessa mesma instituição de ensino, teve experiência como docente na disciplina Gestão Financeira. Além disso, foi aprovado em 5º lugar no concurso público do Instituto Federal do Rio Grande do Sul para Professor de Finanças com Dedicação Exclusiva, após prova de conhecimentos específicos em finanças, banca didática sobre investimento em ações e prova de títulos.

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O IMPACTO DAS FINANÇAS PÚBLICAS

NAS FINANÇAS PESSOAIS NO CONTEXTO DA

ATUAL CRISE ECONÔMICA BRASILEIRA

Marcelo Gonçalves de Sousa1

RESUMO

Este artigo apresenta uma análise da atual crise brasileira que se consolidou pelo retorno

do pesadelo da inflação. Diante deste problema, o cenário econômico se tornou bastante

complexo para as famílias, o que se agrava pela elevação contínua da taxa básica de

juros promovida pelo governo. O texto mostra que o equívoco na condução das finanças

públicas está destruindo a prosperidade nas finanças pessoais, com consequências

devastadoras para a nação. Fica claro que a inflação tem piorado, de maneira mais

acentuada, devido a ineficiência governamental e o impacto dos preços administrados

nos setores de energia e combustível. A oferta de crédito fácil combinada com a cultura

do consumismo nos últimos anos também contribuiu fortemente para esta situação. O

fato é que já houveram diversas elevações na taxa de juros que se mostraram ineficazes

para combater o problema. No entanto, o governo continua com aumentos sucessivos

dos juros, colocando o investidor na retranca e ampliando o desemprego de modo

injustificado. Pelo contrário, deveria ser feita uma política de redução dos juros como

vem ocorrendo no mundo inteiro. Inclusive, uma análise de dados históricos demonstra

que as reduções de juros não implicaram necessariamente no aumento da inflação. As

diversas manifestações mostram que o país busca rapidamente o rompimento de uma

1 O autor é Aluno Especial de Finanças no Mestrado em Administração da UFBA, Pós-Graduado em

Administração de Empresas pela FGV com Módulo Internacional no U.S. Business and Economic

Strategies Seminar pela University of California San Diego e Graduado em Administração de Empresas

pela UCSAL. Trabalha como Professor da disciplina Orçamento Empresarial na Graduação em

Administração de Empresas da Universidade Católica do Salvador, onde também é responsável pelo

Curso de Extensão em Finanças Pessoais na modalidade de ensino à distância. Nessa mesma instituição

de ensino, teve experiência como docente na disciplina Gestão Financeira. Além disso, foi aprovado em

5º lugar no concurso público do Instituto Federal do Rio Grande do Sul para Professor de Finanças com

Dedicação Exclusiva, após prova de conhecimentos específicos em finanças, banca didática sobre

investimento em ações e prova de títulos.

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era política por não aceitar, de modo algum, que o êxito econômico decorra do

empobrecimento da nação.

Palavras-chave: finanças públicas; finanças pessoais; crise econômica.

ABSTRACT

This paper presents an analysis of the current Brazilian crisis which was consolidated by

inflation nightmare return. Faced with this problem, the economic environment has

become very complex for families, which is aggravated by the continuous increase in

the basic interest rate promoted by the government. The text shows that the mistake in

the conduct of public finances is destroying prosperity in personal finance, with

devastating consequences for the nation. It is clear that inflation has worsened more

sharply due to government inefficiency and the impact of administered prices in the

energy and fuel sectors. Easy credit availability combined with consumerism culture in

recent years has also contributed greatly to this situation. The fact is that there have

been several increases in interest rates that proved ineffective to combat the problem.

However, the government continues with successive increases in interest rates, placing

the investor on the boom and extending unjustifiably unemployment. On the contrary,

an interest reduction policy should be made as it has worldwide. Including a historical

data analysis shows that interest rate cuts do not necessarily implicated in rising

inflation. The various manifestations show that the country quickly search the breaking

of a policy was not to accept, in any way, that the economic success arises from the

nation`s impoverishment.

Keywords: public finances; personal finance; economic crisis.

INTRODUÇÃO

A realidade atual apresenta um contexto econômico e social cada vez mais difícil.

Diariamente, ao ligar a televisão ou ler o jornal, fica claro que o Brasil vive um

momento delicado com inflação elevada, aumento da taxa de juros e do desemprego.

Consequentemente, as pessoas estão com dificuldades de gerenciar seus rendimentos,

lidam com maiores despesas e acabam entrando em uma avalanche de dívidas.

Para tentar conter a inflação, o governo insiste no aumento dos juros. As empresas

demitem as pessoas e continuam fazendo propaganda em massa para estimular o

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consumo por impulso, ditando a cultura do consumismo como o mainstream da inclusão

social. O resultado dessa pressão é o endividamento elevado das famílias brasileiras.

Domingos (2011, p. 11) afirma que “Estar endividado já é uma realidade para a maior

parte da população do Brasil. Estimativas indicam que o endividamento atinge mais de

80 milhões de brasileiros”. De um lado, o governo torna as dívidas mais caras devido à

elevação dos juros. As empresas, por sua vez, tentam vender mais estimulando o

aumento do consumo para obter uma taxa de retorno que compense a elevação do custo

do capital2. O grande perigo é que tudo que sobe demais, em algum momento irá cair.

Uma das técnicas utilizadas pelas empresas para avaliação de projetos de investimento é

o Valor Presente Líquido (VPL) que se trata do valor presente de todas as entradas de

caixa projetadas menos o investimento inicial. Para calcular o valor presente de cada

entrada de caixa utiliza-se a fórmula:

( )

Nesta fórmula, VP é o valor presente que se busca, VF é o valor futuro da entrada de

caixa, i é o custo do capital e n é o prazo. Como exemplo, pode-se imaginar um projeto

que prometa entradas de caixa anuais de R$ 30.000, durante 5 anos. O investimento

inicial é de R$ 110.000 e o custo do capital é de 10%. O [(

( )

( )

( )

( )

( ) ) – ] = (R$ 27.272,73 + R$

24.793,39 + R$ 22.539,44 + R$ 20.490,40 + R$ 18.627,64) – R$ 110.000 = R$

113.723,60 – R$ 110.000 = R$ 3.723,603. Como VPL > 0, o projeto é lucrativo, o

investidor faria o investimento e empregos seriam gerados.

Por outro lado, se o mesmo projeto tiver um custo de capital de 15%, devido à política

2 Gitman (2010, p . 432) ensina que “O custo de capital é a taxa de retorno que uma empresa precisa obter

nos projetos em que investe, para manter o valor de mercado de sua ação”. 3 O cálculo fica muito mais simples de ser realizado na calculadora financeira HP 12C, utilizando a

seguinte rotina: f FIN, 110.000 CHS g CF0, 30.000 g CFj, 5 g Nj, 10 i, f NPV. Como resultado, o visor

mostrará o valor presente líquido de R$ 3.723,60 que é o lucro obtido com o investimento. A rotina f FIN

inicialmente serve para limpar os registradores financeiros da calculadora, evitando a interferência de

valores utilizados em outros cálculos. A sigla CHS vem do inglês Change Signal e serve para mudar o

sinal do valor que está na tela. Foi necessário tornar o valor de R$ 110.000 negativo por se tratar de um

investimento, ou seja, uma saída de caixa. A tecla azul g serve para utilizar a função de cor azul da tecla

PMT. É importante mencionar que, na HP 12C, a maioria das teclas tem mais de uma utilidade. A tecla

CF vem do inglês Cash Flow, quando seguida de zero trata do primeiro fluxo de caixa e quando seguida

de j é usada para os demais fluxos de caixa. A rotina 5 g Nj foi utilizada para informar a calculadora que

os 5 fluxos de caixa futuros são iguais, tendo o valor de R$ 30.000 (isso tem o nome de anuidade). Se os

fluxos de caixa fossem diferentes, ou seja, uma série mista, teriam que ser digitados individualmente. Em

seguida, foi digitado o custo de oportunidade do capital seguido da tecla i que vem do inglês interest.

Com o comando f NPV, do inglês Net Present Value, solicita-se da calculadora o Valor Presente Líquido.

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de elevação da taxa de juros do governo, o [(

( )

( )

( )

( )

( ) ) – ] = (R$ 26.086,96 + R$ 22.684,31 + R$ 19.725,49 +

R$ 17.152,60 + R$ 14.915,30) – R$ 110.000 = R$ 100.564,66 – R$ 110.000 = - R$

9.435,34. Como VPL < 0, o projeto apresenta prejuízo, o investidor não faria o

investimento e oportunidades de empregos seriam perdidas. É evidente que, mantidas

todas as condições do investimento, o aumento do custo de capital decorrente da

elevação da Selic pode levar um projeto do lucro para o prejuízo, acarretando no

engavetamento da proposta, o que inibe o crescimento do país.

O objetivo deste trabalho é mostrar a forte influência de políticas equivocadas de

finanças públicas na destruição da prosperidade nas finanças pessoais, o que representa

um grande erro. Bodie e Merton (2002, p. 35) explicam que “No final das contas, todos

os recursos da sociedade pertencem às famílias, porque são elas as donas das empresas

(diretamente ou através da propriedade de ações, planos de pensão ou apólices de

seguro de vida) e pagam impostos gastos pelo governo”.

A ideia é deixar claro que não há vantagem alguma em prejudicar as finanças das

famílias, pois elas farão menos investimentos produtivos e terão dificuldade para pagar

os impostos.

O DIAGNÓSTICO EQUIVOCADO DA INFLAÇÃO

Enquanto as empresas estimularam o consumismo exagerado e o imediatismo do

consumo fazendo com que as pessoas se endividassem para obter um padrão de vida

ilusório, muito além da sua produtividade, nos últimos anos o governo injetou um

volume substancial de crédito consignado na economia para financiar esses gastos.

Infelizmente, a estabilização da moeda acabou favorecendo o crédito fácil sem a devida

maturidade para absorvê-lo. Quando a procura por bens e serviços é maior do que a

oferta, os preços sobem. Entretanto, a inflação não é governada apenas pela demanda,

mas também pelo custo da oferta. Quando o processo produtivo é muito caro devido a

ineficiência e a carga tributária elevada, as empresas certamente repassam esses custos

para as famílias.

O governo apesar de arrecadar muito, não oferece qualidade de vida para a população

que é obrigada a gastar cada vez mais dinheiro até mesmo em serviços essenciais, como

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saúde e educação. Recentemente, por exemplo, a Agência Nacional de Saúde

Suplementar (ANS) promoveu um reajuste perverso nas mensalidades dos planos de

saúde individuais e coletivos em uma proporção bem superior à inflação, trazendo o

impacto negativo para o orçamento pessoal de milhões de brasileiros. Inclusive, este

problema levou o Conselho Federal de Administração a publicar uma nota condenando

a decisão do reajuste de um serviço que, diga-se de passagem, é prestado com péssima

qualidade. Na área de educação, a precariedade do ensino público obriga as famílias a

pagarem escolas particulares a um custo cada vez mais elevado.

A maioria das pessoas não irão cancelar seus planos de saúde ou deixar de estudar. Elas

continuarão comprando cigarros, automóveis, bebidas alcoolicas, remédios, serviços de

internet, alimentos e muitas outras coisas, quer sejam necessárias ou não,

independentemente de custarem mais caro. A ideia de que o aumento do imposto

enxuga dinheiro da economia, o que reduziria o consumo, na prática é um tanto

equivocada. Na verdade, as famílias atrasam o pagamento desses tributos e continuam

consumindo produtos e serviços a um preço mais alto. É muita ingenuidade achar que a

elevação da carga tributária, isoladamente, seja uma medida suficiente para retirar o

dinheiro da economia e reduzir a inflação.

O enxugamento de dinheiro da economia, inclusive, já foi praticado de modo extremo

quando houve o bloqueio das aplicações do Plano Collor, não resolvendo o problema da

inflação. Luquet (2008, p. 74) lembra que “Quando o presidente Fernando Collor de

Mello foi eleito, no fim da década de 80, o país vivia um dos maiores momentos

econômicos, com forte instabilidade monetária. A taxa de inflação chegava a incríveis

80% ao mês, e era urgente a adoção de um plano de estabilidade da moeda. O Plano

Collor foi o primeiro plano econômico do governo eleito depois de mais de 20 anos de

ditadura (governo) militar. O objetivo era acabar com a inflação. O plano, elaborado

pela ministra da Fazenda e assessora econômica do então candidato Collor, Zélia

Cardoso de Mello, consistia basicamente na retirada de moeda de circulação com o

bloqueio dos recursos depositados em bancos em aplicações de CDBs, fundos de renda

fixa, caderneta de poupança etc. Isso ocorreu em março de 1990”.

Na verdade, a estabilização econômica só ocorreu com o Plano Real que acabou com a

inflação crônica vivida pelo país. No entanto, a âncora cambial que manteve a inflação

sob controle durante o plano acabou em 1999, levando à continuidade das taxas de juros

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altas para prevenir a influência do aumento do dólar, agora flutuante, na inflação. Os

juros também subiram no ano de 2002, nas eleições presidenciais que levaram ao

primeiro mandato do Presidente Lula, devido à fuga de capitais pelo temor de que a

esquerda não cumprisse seus compromissos. Sempre que as pessoas vendem títulos

públicos, o dinheiro retorna do governo para a economia e influencia no aumento do

consumo, dos preços e, consequentemente, da inflação.

Luquet (2008, p. 32) explica que “O governo promove uma alta nas taxas de juro

sempre que enxerga focos de perigo inflacionário. Com taxas muito altas, espera-se que

os cidadãos adiem o consumo e com isso reduzam a pressão inflacionária. É uma

espécie de freio na economia. Pois as pessoas passam a consumir menos, com isso as

vendas caem e as empresas, então, reduzem os investimentos e toda a atividade

econômica do país passa por uma redução”.

É importante ainda mencionar a necessidade de que os investidores avaliem o impacto

da inflação nos seus investimentos, levando em conta a taxa real de juros e não apenas

as taxas nominais anunciadas pelos fornecedores de fundos. Bodie e Merton (2002, p .

149) explicam que “É tão importante levar em conta a inflação nas decisões de

investimentos quanto nas decisões de poupança. Quando se investe dinheiro em ativos

reais como imóveis, fábricas e equipamentos, os fluxos de caixa futuros do investimento

tendem a aumentar seu valor nominal devido à inflação. Se você deixar de fazer os

ajustes necessários, poderá deixar passar oportunidades de investimento que valem a

pena”4.

A conclusão é que a combinação de crédito fácil, ineficiência governamental e aumento

de impostos repassados aos preços são problemas criados pelo próprio governo que

contaminam a taxa de inflação.

4 Na ocasião, os autores demonstram um interessante exemplo sobre um investimento em um

equipamento de aquecimento a gás que custa $ 10.000 e proporciona benefício anual infinito no valor de

$ 500, tendo ainda a possibilidade de não comprar o equipamento e deixar o dinheiro na conta bancária

rendendo 8% ao ano. Ao questionar sobre a melhor opção, o investidor poderia ficar inclinado a manter o

dinheiro na conta porque a taxa interna de retorno do sistema de aquecimento a gás é de 5% ao ano (ou

seja, $ 500/$ 10.000). No entanto, se o índice de inflação for de 5%, então a taxa real de juros da

aplicação bancária passa a ser de 2,875% [(0,08 – 0,05) / 1,05]. Assim, “O lucro real de 5% a.a. no

investimento no aquecimento a gás é maior, de modo que talvez o investimento, afinal de contas, valha a

pena” (BODIE & MERTON, 2002, p. 149)

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A política de finanças públicas de aumento da taxa de juros é um remédio amargo que

não está funcionando. É o preço pago pelas finanças das famílias que estão sendo

fortemente prejudicadas.

A MANIPULAÇÃO INEFICAZ DA TAXA DE JUROS

Em 30 de julho de 2015 foi divulgado nos principais jornais televisivos mais um

aumento da taxa de juros no Brasil, que agora atingiu o patamar de 14,25%. Este é o

sétimo aumento seguido da taxa, que já é a maior desde 2006. Quando o governo

aumenta a taxa básica, logo em seguida todos os bancos aumentam os juros e os

consumidores pagam muito mais pelo uso do cheque especial e do cartão de crédito.

De forma unânime, os economistas que são entrevistados sobre o assunto na televisão

afirmam que essa providência não funciona porque a principal causa da taxa acumulada

da inflação de 6,17% é o aumento de preços administrados, como no caso da energia

elétrica. O fato é que o Banco Central pretende manter a taxa de juros alta por um bom

tempo para tentar trazer a inflação de volta ao teto de 4,5%, inibindo outros aumentos

de preços pela desaceleração do consumo e queda das vendas.

EVOLUÇÃO DOS JUROS E DA INFLAÇÃO – 2006 A 2015

Fonte: Banco Central do Brasil e portal de economia Globo (acesso em 30/07/15)5

5 A taxa selic foi obtida no site www.bcb.gov.br, na página do histórico das taxas de juros, obtendo a taxa

selic a.a. no final de 2006 a 2014. Para o ano de 2015, foi adotada a taxa mais recente divulgada pela

0

2

4

6

8

10

12

14

16

2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Taxa Selic

IPCA

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O gráfico anterior mostra que a manipulação de taxas de juros desde 2006, não possui

necessariamente um impacto direto sobre a inflação. Em 2008 a inflação subiu apesar

do aumento da taxa de juros, o que também ocorreu no período de 2009 até 2011. De

2012 até 2015, a inflação continua se elevando apesar do aumento acentuado dos juros.

No geral, percebe-se que a curva do IPCA tem uma tendência de crescimento. Outra

constatação interessante deste gráfico é que a queda brusca dos juros de 2008 para 2009

e de 2011 para 2012, não provocou aumento na inflação. Na verdade, houve até mesmo

uma redução do IPCA. Em suma, fica comprovado que nos últimos anos o aumento dos

juros não reduziu a inflação, assim como a redução da Taxa Selic não provocou o

aumento do IPCA. Inclusive, é importante destacar que o Brasil foi incluído no ranking

das 10 maiores taxas de juros do mundo6 e a comentarista Mírian Leitão opinou que o

país está na contramão7. Enquanto todos os países buscam uma redução dos juros, o

Brasil segue o caminho inverso. A próxima tabela mostra o comparativo dos juros

brasileiros com o de algumas outras nações.

TAXAS DE JUROS MUNDIAIS – MARÇO/2015

País Taxa de Juros

Brasil 12,75% Mongólia 11,50%

Polônia 1,50%

Noruega 1,25%

Emirados Árabes 1,00%

Canadá 0,75%

Reino Unido 0,50%

EUA 0 a 0,25%

Japão 0 a 0,1%

Zona do Euro 0,05% Fonte: site do infomoney (acesso em 30/07/15)8

imprensa televisiva em 30 de julho de 2015. Os dados do IPCA foram obtidos em notícias publicadas na

página de economia g1.globo.com, nas notícias: Inflação oficial fecha 2012 em 5,84%, aponta IBGE, de

10 de janeiro de 2013; Inflação oficial fecha 2013 em 5,91%, diz IBGE, de 10 de janeiro de 2014;

Inflação fecha 2014 em 6,41%, abaixo do teto da meta, de 09 de janeiro de 2015 (nesta página também

foram obtidos os dados históricos de 2006 a 2011 no gráfico de variação anual do IPCA); e Previsão do

mercado para inflação sobe pela 15ª semana, para 9,23%, de 27 de julho de 2015. Assim, o IPCA de 2006

a 2014 retrata o fechamento de cada ano, enquanto o IPCA de 2015 retrata a expectativa dos analistas

para o fechamento deste ano. 6 Este ranking foi obtido no site do infomoney que divulgou a notícia “Brasil tem um dos 10 maiores

juros do mundo; veja as taxas de outros países”, publicada em 05 de março de 2013. 7 O comentário mencionado de Mírian Leitão ocorreu no jornal televisivo Bom Dia Brasil, apresentado

pela Rede Globo em 30 de julho de 2015. 8 A tabela não representa o ranking das 10 maiores taxas do mundo, mas apenas as taxas de juros de

algumas nações mais conhecidas que foram escolhidas aleatoriamente.

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Na China, os juros estão sendo cortados continuamente. O quarto corte ocorreu em

junho de 2015, quando a taxa básica caiu para 4,85%9 ao ano.

Gitman (2010, p. 246) explica que “As taxas de juros exercem um impacto direto sobre

o planejamento financeiro pessoal”. Essas taxas afetam as decisões de investimento, os

problemas de dívidas das famílias e favorecem a perda do emprego.

Mesmo as pessoas que tentam lucrar com a situação devem ter cautela. Recentemente,

muitos consultores de finanças pessoais tem sugerido aplicação no Tesouro Selic para

proporcionar ganhos para os investidores devido a elevação da taxa de juros. No

entanto, Henrique Meirelles publicou um artigo na Folha de São Paulo em 03 de maio

de 2015 que explica porque a taxa de juros no Brasil é tão alta10

. A lição que fica é que

a taxa de juros reflete os diversos tipos de riscos que nela influenciam como a

expectativa de inflação, a solvência do Tesouro Nacional e os riscos políticos, sendo

consequência deles. Deste modo, qualquer investimento com rentabilidade elevada é

acompanhada de uma parcela substancial de risco.

A elevação das taxas de juros também prejudica as famílias já endividadas ou aquelas

que necessitam de algum tipo de empréstimo, pois o crédito fica bem mais caro. Deste

modo, até mesmo o financiamento para compras de equipamentos importantes como

uma geladeira ou um fogão fica mais difícil.

As famílias que usam cheque especial11

são bastante penalizadas e aquelas que pagam

apenas uma parte da fatura do cartão acabam tendo um grande prejuízo. Gitman (2010,

p. 581) explica que “O uso excessivo do crédito de curto prazo, sobretudo com cartões

de crédito, pode criar problemas de liquidez pessoal e, em casos extremos, levar à

insolvência”12

. Infelizmente, muitas vezes o cartão de crédito é usado com grande

9 Ver notícia “China corta taxa de juros pela 4ª vez para impulsionar a economia” da Reuters publicada na

página da globo.com em 27 de junho de 2015. 10

O artigo “Consequência, não causa” foi escrito por Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central

do Brasil entre 2003 e 2011 (note que neste período a curva da taxa de juros parecia ter uma tendência de

queda e que após sua saída do BCB, a partir de 2012, a taxa de juros passou a ter crescimento bem mais

acentuado). 11

Domingos (2011, p. 77) lembra que “Usar o cheque especial sem ter noção exata das implicações e dos

riscos dessa linha de crédito, sem conhecer em detalhes o funcionamento do sistema, é uma das faces do

comportamento de risco financeiro mais comuns na cultura do endividamento”. 12

Para quem já está endividado no cartão de crédito, há a opção do parcelamento do débito total como

uma forma de evitar que o devedor volte a utilizar o cartão, uma vez que ele fica temporariamente

desativado durante o parcelamento. Além disso, caso seja impossível pagar a parcela ou se o valor

negociado não couber no orçamento, a alternativa é ser enfático e dizer: “Devo; não nego. Pago quando e

como puder” (DOMINGOS, 2011, p. 73)

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frequência para o consumo porque a maioria das pessoas que perderam o emprego

utilizam esse meio de pagamento para compensar a falta de renda. Nem sempre os

desempregados tem disciplina para reduzir radicalmente seu padrão de vida em resposta

a uma situação de desemprego.

Além do uso exagerado do cartão de crédito, a maioria das famílias se vê abalada com

empréstimos pessoais, a hipoteca do apartamento e a parcela do financiamento do

automóvel, dentre outras mazelas. As empresas, por outro lado, são pressionadas a

pagarem um salário cada vez maior porque os ganhos sempre se tornam insuficientes

para os trabalhadores. Muitos negócios acabam não se sustentando por confusão na vida

financeira pessoal dos empreendedores, o que impacta em atrasos dos salários, dívidas

com fornecedores e com instituições financeiras ou, até mesmo, no fechamento das

empresas e no desemprego dos funcionários.

A CRISE DO DESEMPREGO E SUAS CONSEQUÊNCIAS

A obtenção de um emprego é um fator de grande relevância para a saúde das finanças

pessoais. No entanto, houve uma redução significativa dos postos de trabalho devido ao

corte nos investimentos produtivos e aumento das demissões em função da taxa de juros

cada vez maior. Além disso, o desemprego decorre do desenvolvimento tecnológico,

conjugado com o enxugamento das estruturas organizacionais. Para piorar, com a

globalização pessoas de diferentes países e regiões podem disputar o mesmo cargo. Por

exemplo, os americanos já estão cientes de que os chineses e indianos estão estudando

muito e que enquanto um trabalhador americano não qualificado custa em torno de 12

dólares/hora, paga-se 25 centavos de dólar/hora para um trabalhador chinês qualificado.

Os americanos parecem muito preocupados com os chineses, devido ao seu crescimento

acelerado e o Vietnã começa a se mostrar um ambiente com mão de obra mais barata do

que a China. Com o salário de um engenheiro americano é possível pagar onze

engenheiros indianos13

.

13

Este conhecimento foi obtido em agosto de 2014 quando o autor questionou o Professor Dan Rudick da

Universidade da Califórnia em San Diego sobre os benefícios da globalização, no momento em que os

americanos perderam 30.000 empregos em função da saída de uma fábrica automotiva que mudou suas

instalações para outro país que pagava menos aos funcionários. Na ocasião, o Professor comentava que só

via benefícios com a globalização porque antigamente os chineses só usavam chinelos e agora é possível

vê-los calçando tênis. Na sua resposta, parece que o Professor tentou justificar que o próprio americano

era culpado pela busca de mão de obra mais qualificada e barata em outros países devido ao estilo de vida

negligente, explicando que o trabalhador americano só está preocupado em ter um emprego na fábrica,

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11

Existe uma polêmica antiga sobre como administrar as finanças públicas, de modo a

favorecer o aumento do emprego. Santos (2001, p. 56) comenta que “a recomendação

de Smith para uma boa política econômica era sustentar um orçamento equilibrado e

resgatar a dívida o quanto antes para possibilitar o nível de emprego e da produção”.

O problema deste ponto de vista de Smith é que ele ignora que os gastos e o

endividamento público impulsionam a construção de estradas, ferrovias, aeroportos,

dentre outras iniciativas que utilizam mão de obra intensiva e colocam o governo no

patamar de um importante empregador. Santos (2001, p. 56) explica que “a posição de

Malthus é diametralmente oposta. Apesar de reconhecer que a dívida nacional pode

trazer incômodos e se constituir num instrumento perigoso, ainda assim ele a vê, em

geral, como um importante mecanismo capaz de alavancar o crescimento econômico e

ampliar o bem-estar social. Por essa razão, Malthus se diz inteiramente convencido de

que o resgate da dívida, na forma proposta pelos seus oponentes, antes de melhorar o

bem-estar da sociedade, a tornaria mais pobre”.

Talvez o ponto de conciliação dessas duas ideias seja utilizar a dívida pública no estágio

inicial de desenvolvimento, para gerar o máximo de empregos possíveis. Quando este

objetivo fosse atingido, seria priorizado o equilíbrio orçamentário para manter a

sustentabilidade das conquistas obtidas.

O fato é que o aumento da taxa de desemprego no Brasil saltou para 8% no trimestre

que encerrou em abril, enquanto no mesmo período de 2014 esse índice era de 7,1%. A

população desempregada subiu para 8,029 milhões de pessoas14

.

Infelizmente, a perspectiva da Organização Internacional do Trabalho (OIT) é de que

ocorra um aumento do desemprego no Brasil até o ano de 2016, conforme pode ser

percebido no próximo gráfico que compara a taxa de desemprego brasileira, com a dos

americanos e chineses. Além disso, o índice real de 2014 é comparado com as

tendências para 2015 e 2016 apontadas pelo relatório “Perspectivas para o emprego e o

social no mundo”.

pagar a hipoteca e assistir jogos de futebol nos finais de semana. Uma família americana típica tem em

média 13 cartões de crédito, o que ele julgou bem preocupante. 14

Ver a matéria “Taxa de desemprego vai a 8% no trimestre até abril, aponta IBGE” , publicada em 03 de

junho de 2015, no site do jornal Valor Econômico.

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COMPARATIVO DAS TAXAS DE DESEMPREGO ENTRE ALGUNS DOS

MAIORES PAÍSES DO MUNDO EM EXTENSÃO TERRITORIAL

Fonte: Site da BBC Brasil (acesso em 10/08/15)

Pela análise do gráfico, é possível perceber que a China tem as menores taxas e que

haverá uma queda nos níveis de desemprego nos Estados Unidos da América. A

situação no Brasil é bem mais desanimadora, pois a taxa de desemprego que foi de 6,8%

em 2014 tende a aumentar para 7,1% em 2015 e 7,3% em 201615

.

Fica claro que o Brasil vive uma crise do desemprego que tende a ficar ainda pior,

devido a incapacidade ou teimosia do governo para enxergar o óbvio: quando o ritmo

do crescimento econômico desacelera, o mercado de trabalho é afetado. Em suma, há

uma relação direta entre o aumento da taxa de juros e o desemprego. Os americanos, por

exemplo, apresentam um patamar de desemprego bem menor e com tendência de queda,

justamente por praticarem uma Federal Funds Rate16

entre 0% a 0,25%. Outro ponto

que chama a atenção é que a gestão do banco central dos Estados Unidos, Federal

Reserve System – FED, está a cargo de um Conselho de Administração. Por outro lado,

a única preocupação do governo brasileiro é retirar dinheiro da economia por meio da

15

Esses dados foram obtidos no site da BBC Brasil na reportagem “Desemprego aumentará no Brasil até

2016, diz OIT”, publicada em 19 de janeiro de 2015. 16

Trata-se da taxa de juros americana que é determinada pelo mercado e não especificamente pelo FED

que influencia na busca de uma taxa pretendida pela reposição ou retirada de dinheiro na economia. A

impressão é que essa metodologia acaba fazendo com que os ofertantes e demandantes de fundos

obtenham uma taxa eficiente.

0,0%

1,0%

2,0%

3,0%

4,0%

5,0%

6,0%

7,0%

8,0%

Brasil Estados Unidos China

2014

2015

2016

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venda de títulos públicos, especialmente aqueles atrelados a Taxa Selic, estimulando a

retração da produção e o desemprego que traz prejuízos econômicos, psicológicos e

sociais.

Os danos na economia resultam da elevação da taxa de juros que induz a redução dos

investimentos das empresas e, consequentemente, aumenta as demissões. Ao mesmo

tempo, há um desestímulo ao empreendedorismo devido ao crescimento do custo do

capital e a maior vantagem de outras aplicações atreladas à Selic. O impacto imediato

da falta de trabalho é a sensação psicológica de inutilidade e fracasso. Quando diversas

famílias americanas perderam suas casas na última crise, os Estados Unidos entraram

em colapso. Domingos (2011, p. 13) explica que “No auge da crise econômica nos

Estados Unidos, os norte-americanos desesperavam-se e diziam estar perdendo tudo o

que tinham”. O Brasil segue o mesmo caminho e, se não houver uma mudança urgente

na condução das finanças públicas, o resultado mais provável será a pobreza que

ocasionará a ruína social. O definhamento do Estado, devido ao baixo contingente de

servidores e aos salários pífios, aumentará a precariedade da educação, da saúde e da

segurança. Os alunos não terão motivação para estudar, devido a perda de valor do

diploma e a falta de perspectiva no mercado de trabalho. Os professores, por sua vez,

não terão ânimo para ensinar, já que as salas de aula estarão vazias e os salários

atrasados. Sem condições sequer para pagar um plano de saúde, as pessoas não poderão

tratar suas doenças que são agravadas pelo próprio processo de desemprego e

endividamento familiar. Também não poderão contar com o Sistema Único de Saúde,

pois o mesmo não funciona. A criminalidade resultará do aumento da violência para

atender instintivamente até mesmo às necessidades humanas mais básicas.

Pode até parecer exagero, mas as diversas manifestações que estão ocorrendo no Brasil

são a evidência mais forte de que o país está caminhando a passos largos para um ponto

de ruptura. Essa insatisfação nacional com o governo decorre do acirramento da crise

econômica, devido principalmente à elevação dos juros e do desemprego, que colocou o

país à beira de uma crise política. A má gestão das finanças públicas criou grandes

dificuldades nas finanças pessoais dos brasileiros e se somou aos diversos escândalos de

corrupção rotineiramente noticiados pela imprensa.

Finalmente, toda essa situação indica que a possibilidade do modelo de governo em

vigor dar certo é cada vez mais remota porque no contexto brasileiro atual as finanças

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públicas e as finanças pessoais não estão convergindo para um objetivo em comum, já

que o orçamento das famílias tem sido perversamente prejudicado pelas políticas

governamentais, o que nunca será aceito pela população.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho procurou mostrar que o bem-estar individual é essencial para o bem-estar

do país. Por esta simples razão, qualquer tentativa de resolver problemas econômicos às

custas do empobrecimento das famílias é fadada ao fracasso. A melhor forma de reduzir

a inflação é cortar o crédito fácil e promover a eficiência governamental, pela

eliminação dos desperdícios que sempre acarretam em maiores preços dos serviços

públicos cobrados da população. O uso abusivo dos empréstimos faz com que as

pessoas passem a consumir mais do que se produz, uma fórmula que nunca dá certo. A

falta de administração no governo é outro problema e o brasileiro já está pagando caro

por energia e combustível justamente por isso.

Enquanto o mundo inteiro busca o crescimento pela redução das taxas de juros, o Brasil

segue o caminho contrário. Já ficou claro que o uso deste instrumento e o foco

excessivo na ciência econômica é insuficiente. O país necessita ouvir todas as outras

profissões que certamente possuem uma contribuição valiosa para a resolução dos

problemas da nação. Quase todos os jornais exibem um caderno de economia, mas não

dão espaço para ouvir engenheiros, empreendedores e administradores.

O governo gasta muito dinheiro construindo casas populares, quando poderia utilizar

conhecimentos da engenharia para promover a desfavelização das cidades a um custo

muito menor. Este conceito consiste em fazer uma reorganização das próprias favelas

para que as famílias não percam suas raízes e possam desfrutar de uma boa moradia

com infra-estrutura, saneamento básico, limpeza e segurança, dentro da própria

comunidade. A incrível criatividade do brasileiro é desperdiçada e falta um clima

favorável para a inovação. A elevada carga tributária é um desestímulo para o

empreendedorismo17

e várias oportunidades de geração de empregos são perdidas. O

desemprego e as greves constantes mostram que o país carece de administração para

17

É importante pontuar que o estímulo ao empreendedorismo pelo governo não se limita à redução da

carga tributária, mas deve criar um ambiente econômico propício para o desenvolvimento da atividade

empreendedora e promover a capacitação para empreender. Na verdade, um negócio possui alto risco.

Assim, apesar de ser uma fonte alternativa de renda, não é necessariamente uma saída imediata para

pessoas com dificuldades financeiras. Pelo contrário, um empreendimento mal planejado pode piorar e

agravar ainda mais as finanças de uma pessoa.

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15

gerenciar efetivamente o crescimento do país18

. No entanto, infelizmente, os

administradores nunca foram ouvidos pela classe política e pela imprensa. É raro ver um

administrador sendo entrevistado na televisão ou até mesmo no rádio. Por este motivo,

falta planejamento estratégico e o país gastou milhões de reais na copa do mundo,

enquanto o povo passava fome e carecia dos serviços públicos mais essenciais.

Devido a essa incompetência gerencial dos governantes, o Brasil caminha para um

cenário cada vez mais desanimador. Ao mesmo tempo em que o aumento da taxa do

Financiamento Estudantil retira diversos alunos das universidades, aumentam as

demissões dos docentes na rede de ensino privada por falta de alunos. Se o governo

continuar ignorando que a educação e o trabalho árduo são as únicas coisas necessárias

para resolver todos os problemas deste país, o desemprego aumentará, as famílias

ficarão mais pobres e as finanças públicas serão bastante comprometidas, com sérias

consequências sociais para a nação.

BIBLIOGRAFIA

BODIE, Zvi; MERTON, Robert C. Finanças. Porto Alegre: Bookman Editora, 2002

DOMINGOS, Reinaldo. Livre-se das dívidas: como equilibrar as contas e sair da

inadimplência. São Paulo: DSOP Educação Financeira, 2011

GITMAN, Lawrence J. Princípios de administração financeira. 12 ed. São Paulo:

Pearson Prentice Hall, 2010

LUQUET, Mara. O mapa do tesouro direto: seu guia para ser credor do governo.

São Paulo: Saraiva: Letras & Lucros, 2008

SANTOS, Reginaldo Souza. A teoria das finanças públicas no contexto do

capitalismo – uma discussão com os filósofos economistas: de Smith a Keynes. São

Paulo: Mandacaru; Salvador: Cetead, 2001

18

Stephen Kanitz tem um ponto de vista, disponível no seu site www.kanitz.com, que sugere uma nova

forma de administração para aumentar o crescimento do país, reduzindo o risco do desemprego. No texto

“Distribuir a Renda ou a Produção?”, ele ensina que toda a produção brasileira está voltada para a classe

média e que o correto seria reorientar a economia para a produção de produtos populares. O que ocorre,

segundo ele, é que todo mundo está produzindo para a classe média cuja renda está sendo reduzida para

um patamar mais correto. Dentre diversas considerações, Stephen Kanitz propõe a simples eliminação do

FGTS e a sua distribuição imediata ao trabalhador para aumentar sua renda sem onerar os custos das

empresas. Defende a opção por produtos populares argumentando que o trabalhador jamais terá dedicação

e esmero se não tiver condição de comprar o produto que fabrica. E fecha sua linha de pensamento com a

seguinte frase: “Não é a renda que precisa ser distribuída, e sim a produção”.