14
O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António Vieira Claudia Letícia Pivetti de Carli (UFFS) Resumo: A Retórica Aristotélica era utilizada, principalmente no século XVII, pela eloquência religiosa. Uma das figuras que mais empregou o mecanismo da retórica foi o Padre António Vieira. Considerado um dos maiores representantes da cultura luso-brasileira, António Vieira, jesuíta da Companhia de Jesus, um dos articuladores do sebastianismo, fez missões no Brasil e lutou pelas causas dos índios e de Portugal. Este artigo apresenta um estudo retórico nos Sermões do Advento do Padre António Vieira, escritos e pregados em 1650, e inseridos na segunda fase da vida do Vieira, que, segundo João Lúcio de Azevedo, refere-se ao padre “político”. Tal análise faz parte do projeto de pesquisa intitulado: "A lógica arquitetônica nos sermões de António Vieira" e utilizará como fundamentação teórica textos como “O discurso engenhoso”, de António José Saraiva, e “Teatro do sacramento”, de Alcir Pécora. Da mesma forma, pelo estudo da Retórica, serão analisados os quatro “juízos” que Vieira, através das palavras, utiliza como argumentos nos Sermões do Advento para persuadir os leitores. Palavras-chave: Padre António Vieira; Retórica; Aristóteles; Sermão do Advento. Resúmen: La Retórica Aristotélica era utilizada, principalmente en siglo XVII, por la elocuencia religiosa. Una de las personalidades que más empleó el mecanismo de la retórica fue el Padre António Vieira. Considerado uno de los mayores representantes de la cultura luso-brasileña, António Vieira, jesuita de la Compañia de Jesús, uno de los articuladores del sebastianismo, hizo misiones en Brasil y luchó por las causas de los indios y Portugal. Este artículo presenta un estudio retórico en los Sermones del Advenimiento del Padre António Vieira, escrito y clavado en 1650, y insertó en la segunda fase de la vida del Vieira, que, segundo João Lúcio de Azevedo, se refiere al padre “político”. Tal análisis hace parte de lo proyecto de investigación denominado: “La lógica arquitectónica en los sermones de António Vieira” y utilizará cómo base teórica texto cómo “Lo Discurso Ingenioso”, de António José Saraiva, y “Teatro del Sacramento”, de Alcir Pécora. Del mismo modo, por el estudio de la Retórica, serán estudiados los cuatros “juicios” que Vieira, a través de las palabras, utiliza cómo argumentos en los Sermones del Advenimiento para persuadir los lectores. Palabras-Clave: Padre António Vieira; Retórica; Aristóteles; Sermón del Advenimiento Introdução Padre António Vieira possuía uma preocupação com a absorção e aceitação dos seus argumentos pelos ouvintes-leitores de sua época, século XVII, até os dias de hoje. Cada palavra que Vieira usava em seus sermões portava uma forte significação, não era dita por dizer, pois o padre desdobra-a, como se estivesse fazendo uma anatomia da palavra. Fazendo esse jogo, consegue costurá-las com outras ideias e verbos. Logo essa palavra deixa de ser somente letras,

O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António ... · O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António Vieira Claudia Letícia Pivetti de Carli (UFFS) Resumo:

  • Upload
    tranbao

  • View
    218

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António ... · O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António Vieira Claudia Letícia Pivetti de Carli (UFFS) Resumo:

O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António Vieira

Claudia Letícia Pivetti de Carli (UFFS)

Resumo: A Retórica Aristotélica era utilizada, principalmente no século XVII, pela eloquência

religiosa. Uma das figuras que mais empregou o mecanismo da retórica foi o Padre António

Vieira. Considerado um dos maiores representantes da cultura luso-brasileira, António Vieira,

jesuíta da Companhia de Jesus, um dos articuladores do sebastianismo, fez missões no Brasil

e lutou pelas causas dos índios e de Portugal. Este artigo apresenta um estudo retórico nos

Sermões do Advento do Padre António Vieira, escritos e pregados em 1650, e inseridos na

segunda fase da vida do Vieira, que, segundo João Lúcio de Azevedo, refere-se ao padre

“político”. Tal análise faz parte do projeto de pesquisa intitulado: "A lógica arquitetônica nos

sermões de António Vieira" e utilizará como fundamentação teórica textos como “O discurso

engenhoso”, de António José Saraiva, e “Teatro do sacramento”, de Alcir Pécora. Da mesma

forma, pelo estudo da Retórica, serão analisados os quatro “juízos” que Vieira, através das

palavras, utiliza como argumentos nos Sermões do Advento para persuadir os leitores.

Palavras-chave: Padre António Vieira; Retórica; Aristóteles; Sermão do Advento.

Resúmen: La Retórica Aristotélica era utilizada, principalmente en siglo XVII, por la elocuencia

religiosa. Una de las personalidades que más empleó el mecanismo de la retórica fue el Padre António

Vieira. Considerado uno de los mayores representantes de la cultura luso-brasileña, António Vieira,

jesuita de la Compañia de Jesús, uno de los articuladores del sebastianismo, hizo misiones en Brasil y

luchó por las causas de los indios y Portugal. Este artículo presenta un estudio retórico en los Sermones

del Advenimiento del Padre António Vieira, escrito y clavado en 1650, y insertó en la segunda fase de

la vida del Vieira, que, segundo João Lúcio de Azevedo, se refiere al padre “político”. Tal análisis hace

parte de lo proyecto de investigación denominado: “La lógica arquitectónica en los sermones de

António Vieira” y utilizará cómo base teórica texto cómo “Lo Discurso Ingenioso”, de António José

Saraiva, y “Teatro del Sacramento”, de Alcir Pécora. Del mismo modo, por el estudio de la Retórica,

serán estudiados los cuatros “juicios” que Vieira, a través de las palabras, utiliza cómo

argumentos en los Sermones del Advenimiento para persuadir los lectores.

Palabras-Clave: Padre António Vieira; Retórica; Aristóteles; Sermón del Advenimiento

Introdução

Padre António Vieira possuía uma preocupação com a absorção e aceitação dos seus

argumentos pelos ouvintes-leitores de sua época, século XVII, até os dias de hoje. Cada palavra

que Vieira usava em seus sermões portava uma forte significação, não era dita por dizer, pois

o padre desdobra-a, como se estivesse fazendo uma anatomia da palavra. Fazendo esse jogo,

consegue costurá-las com outras ideias e verbos. Logo essa palavra deixa de ser somente letras,

Page 2: O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António ... · O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António Vieira Claudia Letícia Pivetti de Carli (UFFS) Resumo:

passa a ter um sentido, segundo António José Saraiva (1980) é mutável e imprevisível, sempre

se metamorfoseando.

Seu discurso é conhecido como “engenhoso” pela estrutura que António Vieira

trabalhava, pois cada premissa, exemplos que ilustram seus argumentos, são engrenagens para

fazer com que seu engenho funcione.

A palavra “engenhoso” me parece muito própria para indicar o gênero do

discurso de que tratarei aqui. No sentido em que emprego, é uma palavra

muito freqüente no século XVII em Portugal, na Espanha e na Itália. O Pe.

Bouhours, um dos teóricos do discurso “clássico”, a usou, a seu modo, para

caracterizar especialmente a maneira de expressão que condenava nos

italianos e espanhóis, chamados, hoje, por nós, de “barrocos”. (SARAIVA,

1980, p. 8).

António Vieira escolhe premissas coerentes para obter conclusões corretas e assim seus

argumentos geram lógica e uma possível aceitação dos seus ouvintes-leitores, mas também

utiliza o jogo retórico, através das palavras, para o convencimento dos receptores com suas

razões. “Não há nele palavras átonas, indiferentes e languescentes. Cada uma parece ocupar o

lugar que lhe é próprio, como em estado de alerta.” (cf. SARAIVA, 1980, p. 9).

Em muitos sermões, o padre utiliza a etimologia e a alegoria para explicação de suas

ideias, usa do conhecimento físico de mundo para exemplificar seus argumentos. Segundo

Saraiva (1980, p. 88) o texto do Vieira é uma leitura e uma explicação, pois com argumentos

ligados à textos profanos, exemplos da Natureza e também da História, formam um contexto

próprio que se explicam entre si. Os textos de António Vieira possuem um forte conhecimento

de inteligência espontânea e uma profunda imersão nos acontecimentos, nos temas e no

contexto que o jesuíta produz os seus textos (cf. Pécora, 1944, p. 39). E é por isso que seus

sermões são os mais temíveis e desejados até os dias de hoje.

A Retórica Aristotélica foi muito utilizada pelos eloquentes religiosos do século XVII,

mas desde seu surgimento, com os sofistas, ela é aplicada em diversos casos. Aristóteles,

filósofo grego, estudou sobre o discurso e escreveu dois tratados: a Arte Poética e a Arte

Retórica. Para o grego a definição de Retórica seria "a capacidade de descobrir o que é

adequado a cada caso com o fim de persuadir", e dividiu sua obra em três livros: a) o primeiro

Page 3: O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António ... · O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António Vieira Claudia Letícia Pivetti de Carli (UFFS) Resumo:

sendo livro do emissor da mensagem; b) o segundo sendo livro do receptor da mensagem; c)

o terceiro sendo livro da mensagem.

Segundo Lausberg (2011) a elaboração do discurso se compõe em 5 fases, que são: o

invention (a invenção do que dizer); o dispositio (ordenação dos argumentos); elocutio (estilo,

a enunciação); memoria (associação dos “arquivos” do orador com do ouvinte); pronuntiatio

(entrega do discurso).

O foco do artigo será no dispositio do discurso nos Sermões do Advento do Padre

António Vieira, como jesuíta organizou suas ideias. Mas antes é necessário entender a

composição do dispositio, ou seja, entender suas etapas que compõem o discurso: o exórdio, a

parte que introduz o assunto; a narração, é a apresentação do assunto, porém fundamentado

com a evidência da tese; a prova, apresentação das prova, da confirmação para sustentação da

tese; o epílogo, dispor o ouvinte a um comportamento emocional.

No Advento, os cristãos apelam pela penitência e fazem reflexões sobre a

fragilidade humana, o arrependimento, a misericórdia divina e a esperança pela vida eterna (cf.

MARQUES, 2014, p. 50). Com o pensamento sobre o “fim do mundo”, “a vinda de Jesus para

salvação”, “o Juízo Final” é que se constrói os Sermões do Advento do António Vieira. Foi

pregado na Capela Real em 1650, em uma época em que Portugal passava por graves problemas

internos, com conspiradores e espiões infiltrados na capital do país, etc. Na dispositio dos

sermões, Vieira teve como objetivo “[...] ressumar o mesmo espírito dos insistentes temas

barrocos sobre a precariedade da vida, a imprevisibilidade da morte e a certeza cristã de um

rigoroso juízo divino, ditando a inapelável perdição ou salvação eterna.” (ibidem, p. 51). Para

que esse objetivo ocorresse foi necessário que os ouvintes/leitores encaixassem os

acontecimentos da época com o exame de consciência para se arrependerem de seus erros e

assim mudarem suas condutas morais. Da mesma forma que o próprio Vieira exigia-se que

antes de pregar algo era necessário olhar para seu “interior psicológico” e saber sobre quem era

e como executava seus deveres como pregador e humano (cf. ibidem, p. 51).

1 António Vieira e os sermões do advento (1650)

1.1. A primeira dominga

António Vieira elimina o exórdio e inicia com a matéria do discurso, dizendo sobre a

Page 4: O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António ... · O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António Vieira Claudia Letícia Pivetti de Carli (UFFS) Resumo:

passagem do Evangelho de S. Lucas que relata sobre Cristo em relação ao juízo universal. Essa

matéria tem um cunho moral e doutrinário, pois era dessa forma que os padres pregavam suas

ideias e assim o objetivo de convencimento da população. São Jerônimo disse “Levantai-vos

mortos, e vinde a Juízo” (VIEIRA, 2014, p. 150), o juízo não só virá para os vivos, mas para

os mortos também.

Para o Pe. é melhor chorar e se arrepender dos pecados agora do que fazer tudo depois,

porque não haverá misericórdia para as lágrimas e nem perdão para os arrependimento. “Agora

vivemos como queremos; e ainda mal porque depois havemos de ressuscitar como não

queremos” (ibidem, p. 150). A primeira consideração que Vieira faz no seu discurso é pessoas

que foram bem nascidas, mas que no juízo será mal ressuscitada, pois na ressurreição natural

cada um ressuscita da forma como nasceu e na ressurreição sobrenatural cada um ressuscita

como viveu. Um exemplo para esse argumento é sobre Pedro, uma vez que “na ressurreição

nasce Pedro, e ressuscita Pedro; na ressurreição sobrenatural nasce pescador, e ressuscita

Príncipe.” (ibidem, p. 150). É nesse sentido que o jesuíta explica o cunho moral de que Deus

não é injusto com aqueles que nascem sem riqueza, mas são humildes, pessoas boas, porém é

justo com aqueles que possuem fortuna, mas são de má fé.

Dando continuidade com a narração, explica o que ocorrerá no julgamento final. No

julgamento todos terão a mesma “medida”, ou seja, todos serão julgados da mesma forma, não

importa o seu status e sim as suas obras. Perante isso, o Pe. diz que serão colocados no mesmo

lugar, juntos, nessa ordem: a) os Papas; b) Imperadores; c) os Reis; d) os Bispos; e) os

Religiosos; f) os demais. Aqui o Vieira compara a situação que estava ocorrendo em Portugal

naquela época, pois muitas dioceses estavam sem pastores. E assim todos serão divididos, em

seus estados no mundo, entre os bons e os maus.

Terminado de explicar a fase da separação, António Vieira inicia a análise das

consciências, como se fizesse uma anatomia minuciosa e diz sobre os dois pecados “mais

terríveis do mundo”: de omissão e de consequência. Utiliza os príncipes e ministros como

exemplos dos pecados, pois será pedido para ambos do que fizeram e do que deixaram de fazer,

e por conta disso serão todos condenados pelo que não fizeram e muitos pelo que fizeram.

Pecado de omissão advém da impenitência final, pois “por uma omissão perde-se uma

inspiração, por uma inspiração perde-se um auxílio, por um auxílio perde-se uma contrição,

Page 5: O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António ... · O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António Vieira Claudia Letícia Pivetti de Carli (UFFS) Resumo:

por uma contrição perde-se uma Alma.” (cf. ibidem, p. 162). Para o Padre António Vieira:

A omissão é o pecado que com mais facilidade se comete, e com mais

dificuldade se conhece: e o que facilmente se comete, e dificilmente se

conhece, raramente se emenda. A omissão é um pecado que se faz não

fazendo: e pecado que nunca é má obra, e algumas vezes pode ser obra boa,

ainda os muito escrupulosos vivem muito arriscados em este pecado. (ibidem,

p. 163).

Para provar sobre esse pecado, cita sobre o Profeta Elias enquanto no deserto, estando

em uma cova, Deus lhe perguntou do por que estava ali, e Elias diz que ele estava ali na cova,

distante do mundo, que estava se disciplinando. Mas Deus não lhe deu essa função, pois o que

Elias estava fazendo era devoção, mas não sua obrigação que era de andar na Corte, estar

emendando a Terra. Então Elias enquanto salvava sua Alma, perdia muitas, deixou de fazer

sua obrigação de salvar as demais almas e ficou na ignorância de salvar a sua. “Os menos maus

perdem-se pelo que fazem; os piores perdem-se pelo que deixam de fazer, [...] por omissões,

por negligências, por descuidos, por desatenções, por divertimentos, por vagares, por dilações,

por eternidades.” (idem, ibidem).

O segundo pecado se dá pela consequência, porque “há pecados que acabam em si

mesmo; há outros que [...] ainda duram em suas consequências.” Sobre esse pecado, Vieira

emprega sobre as metáforas de Jó1: “Considerastes, Senhor, as pegadas de meus pés”. Ou seja,

o que fica são as pegadas e os passos passam, então Deus não só pedirá conta dos pecados, mas

senão das consequências desses pecados. Vieira novamente remete à prova para explicar sobre

essa metáfora usando o exemplo de Zaqueu, quando roubou de alguns indivíduos. Pois o autor

do roubo é obrigado a pagar o valor que tomou para si, mas também é obrigado a pagar do que

perdeu a vítima e o que nem chegou a obter.

O Pe. também cita sobre as consequências dos votos nas eleições para vice-reis,

ministros, generais, governadores, generais e etc. E os que mais protestam pelas más escolhas

são os pobres, as viúvas e os órfãos e eles são os mais inocentes. E por causa dessas eleições

“injustas” ficam a:

República mal servida; os bons escandalizados; os Príncipes murmurados; o

governo odiado; o mesmo Conselho, em que assistis, ou presidis, infamado;

o merecimento sem esperança; o prémio sem justiça; o descontentamento com

1 [Jó 13, 27]

Page 6: O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António ... · O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António Vieira Claudia Letícia Pivetti de Carli (UFFS) Resumo:

desculpa; Deus ofendido, o Rei enganado, a Pátria destruída. (ibidem, pp.

166-167).

E por fim, seu epílogo inicia dizendo:

Todo o homem, que é causa gravemente culpável de algum dano grave, se o

não restitui, quando pode, não se pode salvar: todos, ou quase todos os que

governam são causas gravemente culpáveis de graves danos, e nenhum, ou

quase nenhum restitui o que pode; logo nenhum, ou quase nenhum dos que

governam se pode salvar. (ibidem, pp. 168-169).

E termina com Cristo após tomar conta de todos os humanos, olha para Sua mão direita

e entrega-lhe seu Reino para os bem-aventurados e para aqueles à Sua esquerda os mandará

para o Inferno.

1.2. A segunda dominga

Como disse no sermão anterior, sobre a existência do Juízo final e de que Deus é justo

com os bons e condena os maus, usará de referência, neste sermão, à prisão de João Batista2.

Com essa referência, procurou mostrar o quanto é “temeroso, rigoroso” o Juízo dos homens

para com os outros. Para provar o quanto esse juízo é temível, mostrará 5 razões, e a partir

dessas razões, o pregador mescla a narração e a prova do discurso.

A primeira razão: Deus julga com o entendimento, os homens julgam com a vontade.

Segundo António Vieira, quem julga com o entendimento tanto pode julgar bem quanto julgar

mal, mas quem somente julga com a vontade, não julga bem. “Porque quem julga com o

entendimento, se entende mal, julga mal, se entende bem, julga bem. Porém quem julga com a

vontade, ou queira mal, ou queira bem, sempre julga mal: se quer mal, julga como apaixonado,

se quer bem, julga como cego.” (ibidem, p. 205). E para obter um juízo perfeito é necessário

da ciência, da justiça e do poder, pois respectivamente, a ciência é para examinar o juízo, a

justiça é para julgar o juízo e o poder para executar o juízo.

No julgamento de Deus tanto o entendimento quanto a vontade dividem as funções,

logo o entendimento é que julga e a vontade é que dá. Diferente do julgamento dos homens, o

entendimento não possui um ofício, então a vontade é que dá e julga. E por isso que o Juízo

dos homens são mais assustadores do que de Deus. E para comprovar que o juízo dos homens

2 [Mt 11]

Page 7: O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António ... · O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António Vieira Claudia Letícia Pivetti de Carli (UFFS) Resumo:

julga com a vontade, Vieira mostra o julgamento de Cristo perante Pilatos. Onde Pilatos depois

de examinado as testemunhas, as acusações, declarou Cristo como inocente. Porém logo após

levaram Cristo ao Calvário e pregaram-no na Cruz e colocaram nela “a causa escrita”3. Mas o

pregador se questiona do porque puseram a escrita na cruz se Pilatos não achou causa. E a

resposta que encontrou foi no Evangelho de São Lucas4, onde Pilatos após declarar inocência

de Jesus, cedeu as acusações para o juízo da vontade dos Príncipes Sacerdotes5 e da população

que estavam no julgamento. Então como Jesus foi julgado na vontade dos homens, assim

acharam a causa e crucificaram o Nazareno. “[...] o entendimento acha o que há, a vontade

acha o que quer.” (ibidem, p. 207).

A segunda razão: No juízo de Deus basta o testemunho da própria consciência, no dos

homens a vontade prevalece. Nessa razão, Vieira diz que todos podem acusar de algo, tanto

Deus, homens, Demônios, o mundo todo, porém se sua consciência não vos acusa, então estará

tranquilo rindo de todos. No julgamento dos homens é diferente, pois podem ter a consciência

mais limpa, inocente, mas se uma pessoa invejosa, mal informada, injusta, irá te julgar igual

mesmo sabendo de sua inocência, ou seja, nada adianta as defesas do coração se a vontade de

julgar é a que prevalece. “Oh desgraçada sorte a do coração humano! Poder ser julgado dos

homens para a culpa, e não poder ser visto dos homens para a defesa!” (ibidem, p. 209).

A terceira razão: No juízo de Deus, o que nos defendem são nossas obras, no juízo dos

homens as nossas obras são nossas maiores inimigas. O jesuíta inicia essa razão com o

exemplo de Abel sendo julgado por Caim, e a causa desse julgamento foi de Abel ser o melhor

para Deus. Outro exemplo seria de Saul sentenciar Davi muitas vezes a morte por Davi ser o

mais valente que Saul. Então Davi quis que Deus o julgasse e não os homens, porque “no juízo

de Deus perdoam-se os pecados como fraqueza; no juízo dos homens, castigam-se as valentias

como pecados.” (ibidem, p. 210).

A quarta razão: Deus julga o que conhece, os homens o que não conhece. Nesta razão

além dos homens julgarem as obras que veem e as palavras que escutam, também julgam os

pensamentos mais íntimos. Esse julgamento será tanto bem quanto mal, pois julgarão

pensamentos que nem se quer conhecem e muitas vezes nem se passam pela mente. A diferença

do julgamento de Deus, o pensamento necessita existir, podem ser bons ou maus, porém ele

tem que consentir. Porém na dos homens não é necessário o consentimento do pensamento,

3 [Mt, 27, 37] “Jesus de Nazaré, Rei dos Judeus”. 4 [Lc 23, 1.25]

5 Eram a classe dominante dos sacerdotes daquela época, os mais próximos de Pilatos.

Page 8: O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António ... · O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António Vieira Claudia Letícia Pivetti de Carli (UFFS) Resumo:

nem que seja bom ou mau, e nem que exista o pensamento. O exemplo que Vieira nos mostra

é dos irmão de José no Egito. Os irmão aparecem para José e logo depois que disseram quem

eram e o que faziam lá, José os julgou mal e mandou prender os irmãos. A “desculpa” para

prender os irmãos foi: “Sois espias, vindes a explorar os Reinos de Faraó, meu Senhor”6. José

prendeu os irmãos sabendo quem eram, e nem passou pela mente dos irmãos que seriam presos.

Pois os homens julgam, condenam pelo que nem os inocentes imaginam.

A quinta razão: No juízo de Deus, a sentença é dita no juízo final; e no dos homens,

não se espera pelo fim para julgar. O pregador inicia com a parábola do proprietário que

observa a cizânia (joio) crescer no meio de sua plantação, e Deus pede para deixar crescer e

amadurecer para depois separar o trigo do joio. Entre os homens isso não ocorre, pois “[...]

regulam os fins pelos princípios” (cf. ibidem, p. 215), pois muito o que acontece na vida não

só depende da vontade própria dos indivíduos. E nem sempre os bons princípios causam bons

fins e Vieira cita Judas e os ladrões como exemplo. Em Judas os princípios começaram bem,

mas seguiram-se maus fins, e do mau ladrão os princípios começaram maus e acabaram mau,

do bom ladrão começaram maus e acabaram bons fins. “Por isso quem quiser julgar bem há de

aguardar pelos fins” (ibidem, p. 215). Logo que no juízo de Deus só se julgue no final, pois

ainda existirá possibilidade do indivíduo se emendar. Outro ponto que o jesuíta deixa explícito

é sobre o juízo final ocorrerá somente um dia e no vale de Josafá, no juízo dos homens não

importa o dia, todos os dias julgam e independente do local. Deus não julgará antes do homem

adquirir a razão, ou seja, antes de saber entender suas ações; os homens julgam bem antes disso.

Segundo Vieira (2014, p. 221), “Deus julga a cada um pelo que é, os homens julgam a

cada um pelo que são. Deus julga-nos a nós por nós; os homens julgam-nos a nós por si”. Para

finalizar o sermão, o padre ressalta que para ser bem julgado no juízo de Deus é necessário que

sejas bom, e para ser bem julgado no juízo dos homens, ninguém deve ser mau, todos devem

ser inocentes. Por isso que, para Vieira, esse é o pior juízo.

1.3. A terceira dominga

O pregador inicia seu exórdio mencionando as palavras propostas pelos Sacerdotes, que

fizeram ao João Batista: Tu quis es? Quid dicis de te ipso?7 Com esse relato, a tese a ser

6 [Gn 42, 9]

7 [Jo 1, 19.22] Quem és tu? Que dizes de ti mesmo? (NT)

Page 9: O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António ... · O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António Vieira Claudia Letícia Pivetti de Carli (UFFS) Resumo:

trabalhada nesse sermão é o “Juízo de cada um para consigo”. Conforme o padre (2014, p.

247), essa matéria é gravíssima e de maior importância em qualquer parte do mundo.

Quando os homens testemunham de si, enganam-se por dois motivos: primeiro no que

são e segundo no que dizem de si. Pois dizem mais do que são e são bem diferentes do que

dizem que são: “[...] todo homem mente duas vezes, uma vez mente-se a si, e outra vez mente-

nos a nós: mente-se a si, porque sempre cuida mais do que é; mente-nos a nós, porque sempre

diz mais do que cuida.” (cf. ibidem, p. 247).

Como prova do seu argumento, o padre utilizou o exemplo do velho Tobias8. O Anjo

Rafael falou com o Tobias em traje de caminhante, e antes de Tobias entregar seu filho ao

Anjo, fez-lhe uma pergunta: “De que família és?”, então o Anjo respondeu que era Azarias,

filho de Ananias, o Magno. Porém anjos não possuem pais, filhos, e assim não podem mentir,

mas como o Anjo Rafael disse que era filho de Ananias?. E Vieira responde de uma forma bem

simples e clara, pois o Anjo não era homem, estava se fazendo de homem e assim falou com

Tobias como um homem, logo não mentiu. O Anjo Rafael só fez o que os homens fazem, dizem

serem uma coisa, mas são outra (cf. ibidem, p. 249).

Para António Vieira, os homens tem que se contentar com o que são e crescer dentro de

suas esferas, não quererem ser outro e esquecerem de quem são, visto que “[...] nenhum se

contenta com crescer dentro da sua espécie” (cf. ibidem, p. 253). O que era mais importante

para o jesuíta pretendia com esse sermão era fazer com que cada ouvinte/leitor conhecesse

quem era, Tu quis es, e o que define quem és são suas ações, e são elas que serão suas essências.

E para finalizar o sermão, o epílogo, Vieira afirma “As ações generosas, e não os pais

ilustres, são as que fazem fidalgos” (ibidem, p. 265), ou seja, cada indivíduo é suas ações, e

não é mais que elas e nem menos. Segundo o pregador, Batista não era o Messias e nem Elias,

mas é “Ego vox clamantis in deserto”9, é suas ações, é a voz que clama no deserto. Não importa

se és filho de fidalgos, o que importa são as suas ações e elas determinarão sua riqueza.

1.4. A quarta dominga

O exórdio deste sermão inicia quando o Pe. António Vieira fala sobre o quarto juízo e

engata junto a tese a ser defendida, que seria “o juízo dos três juízos”: o juízo de cada um para

8 [Tb 5, 11.16]

9 [Jo 1, 23] “Eu sou a voz daquele que clama no deserto” (NT)

Page 10: O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António ... · O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António Vieira Claudia Letícia Pivetti de Carli (UFFS) Resumo:

consigo mesmo; o juízo dos homens para um com os outros; juízo de Deus para com os homens.

Pois, conforme Vieira (2014, p. 268) “vêm hoje chamados a juízo”. Esse sermão tem como o

Evangelho de S. João o principal tema, “que refere a pregação do Batista nas margens do rio

Jordão, o rio do juízo, anunciando o batismo de penitência para remissão dos pecados.”

(VIEIRA, 2014, p. 268).

As causas desses três juízos são, respectivamente, a apelação, o agravo e a suspeição,

pois cumprida a penitência, os esperam a revogação, o desprezo e a emenda. Importante

ressaltar que se os outros sermões foram dirigidos ao entendimento, esse será ao coração.

Nos sermões anteriores comentou sobre o juízo de Deus para com os homens, juízo dos

homens uns para os outros e juízo de cada um para consigo. Mas antes de começar a falar sobre

o quarto juízo, ele faz uma recapitulação dos sermões anteriores usando o exemplo de como

esses juízos comportam em um tribunal, neste caso o tribunal da Penitência.

A narração inicia-se pelo juízo de si mesmo, que perante a corte, entra com os olhos

tapados (vale ressaltar que Vieira compara a entrada deste juízo com o tribunal dos

Areopagitas10 em Atenas), pois não há juízo mais cego que esse. Para o jesuíta “a cegueira dos

olhos faz que não vejamos as coisas, a cegueira do amor-próprio faz que a vejamos diferentes

do que são: que é muito maior cegueira.” (ibidem, p. 270). O juízo da Penitência, em primeiro,

quer “voltando-nos os olhos de fora para dentro, para que nos vejam; ou virando-nos a nós

mesmos de dentro para fora, para que nos vejamos”, em segundo, põe-nos “a nós diante de nós,

como objeto diante do espelho, para que nos vejamos”, ou seja, é necessário que nos

reconhecemos quem somos e como somos. Para António Vieira somos vaidosos e

desvanecidos de nós mesmo, isso se dá por de não nos reconhecermos, saber quem somos. A

gravidade de nossos pecados que “tampam” nossos olhos e faz com que não nos conhecemos.

Com o início da narração, Vieira nos mostra a primeira prova do dispositio que é o

exemplo do Rei Davi, que ao lado das suas pinturas das suas aventuras guerreiras, mandou

pintar diversos quadros sobre suas “lastimosas histórias de seus pecados”. Diante dos quadros

de seus pecados, com suas meditações alcançou o conhecimento de si mesmo através de suas

vitórias, ou seja, Davi depois de observar tanto as obras de seus pecados, conheceu a si mesmo

10 São membros do Areópago que foram antigos supremos Tribunais de justiça de Atenas, encarregava-se

dos casos de religião e políticos, porém eram reconhecidos pelo senso de justiça e castidade.

Page 11: O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António ... · O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António Vieira Claudia Letícia Pivetti de Carli (UFFS) Resumo:

e para Vieira, nós também conseguiremos saber quem somos se fazermos o mesmo que Davi

fez.

A partir do momento que o indivíduo se reconhece pelos seus erros e se arrepende, o

juízo de si mesmo é emendado, pois os nossos erros é quem diz sobre nós (cf. ibidem, p. 275).

O padre dá continuidade com a narração no momento que apresenta sobre o juízo dos

homens perante o tribunal da Penitência, que consigo traz “todos os sentidos, e com todas as

potências livres, e muito livres; porque com todas julga a todos” (cf. ibidem, p. 276). Esse juízo

é o mais adorado, temido e respeitado no mundo, pois só merece desprezo: aquele que procura

ser bem julgado por Deus, não dará atenção pelo julgamento dos homens. Aquele penitente

arrependido pouco faz caso da “opinião do mundo”. Novamente se remete a Davi como prova

para seus argumentos, pois após Davi estar arrependido, jamais se lembrou de seus pecados e

do que os homens diziam sobre esses pecados. Conforme Vieira:

Faça-se tudo o que for necessário à salvação, e digam os homens o que

quiserem. Que importa ser bem julgado dos homens, se vós não vos salvais?

E se vós vos salvais, que importa ser mal julgado dos homens? Eis aqui como

o juízo dos homens se despreza no juízo da Penitência. (ibidem, p. 282).

E é assim que o juízo dos homens se despreza, pois sabendo quem sois e como sois, não

tem porque dar-lhe ouvidos ao julgamento dos homens.

E dando continuidade com seus argumentos, diz sobre o último a se apresentar no

tribunal da Penitência, que foi o juízo de Deus, que será revogado no Juízo final, no último dia

do mundo. Entrará no Tribuna acompanhado com um majestoso aparato que o torna “horrível

e tremendo”, e traz consigo uma espada de dois gumes, a pena de sentido e a de dano. Com

isso, Deus possui o poder para condenar tanto corpos quanto espíritos. Nesse sentido, o que

fará a Penitência? Ela irá partir para o lado do coração em direção a Deus (penitência dá voltas

no coração) e tentar retirar a condenação desses indivíduos. Ou seja, tem dois lados o “Juízo

Final” e a “Penitência”, então o tribunal manda o indivíduo para o lado da Penitência, pois do

lado do juízo de Deus esse indivíduo não terá recursos para sua absolvição.

Com esses argumentos, Vieira retorna a nos provar por que a penitência é a nossa

salvação. O exemplo utilizado é “o maior exemplo que no mundo até hoje houve para

documentar” foi o de Jonas, quando pregou em Nínive a destruição da cidade, seria destruída

se a população não fizesse penitência por quarenta dias. Todos ouviram o pregão do profeta,

desde o Rei até o mais humilde dos habitantes, e se penitenciaram. Aqui está o exemplo de “o

Page 12: O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António ... · O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António Vieira Claudia Letícia Pivetti de Carli (UFFS) Resumo:

que no juízo de Deus se sentenceia, no juízo da Penitência se revoga” (ibidem, p. 285). Então,

se no juízo final “Não é lícito apelar da justiça de Deus para Sua misericórdia; no juízo da

Penitência é lícito apelar da justiça de Deus” para o Seu perdão. No juízo de Deus será

condenado os pecadores pelos seus erros e no juízo da Penitência os erros serão condenados,

assim os errantes serão absoltos. Não adianta se arrepender dos seus erros e cometê-los

novamente, o certo é se arrepender e não cometer mais os mesmos erros. Por mais que a pessoa

é condenada, ela pode ser perdoada depois de um tempo mostrando seus arrependimentos.

E para finalizar, o epílogo inicia quando António Vieira diz sobre uma fala de Santo

Agostinho, que diz: “Si aliquando cur no modo?11”, ou seja, se um dia eu me arrependerei dos

erros, por que não hoje? Essa pergunta não tem resposta, nem mesmo os filósofos, os santos e

anjos sabem essa resposta. Mas, segundo Vieira, se não se arrepender agora, não irão se

arrepender depois. “Dê-me licença Santo Agostinho por trocar a pergunta,[...] Eu digo então:

Si no modo cur aliquando? Se não nos arrependermos agora, porque cuidamos que nos

havemos de converter depois?” (cf. ibidem, p. 288). Ou seja, se as razões que tendes não bastam

para se arrepender agora, como bastará para se arrepender depois? Foi o que ocorreu com Judas.

Nesse ponto, utilizou outra prova para a sustentação do discurso e convencer os

ouvintes/leitores das suas ideias morais. Judas disse: “maiores motivos do que eu tive para me

converter não são possíveis, porque tive o mesmo Cristo aos meus pés: pois se Cristo aos meus

pés não foi bastante motivo para me converter; não me fica que esperar, venha um laço.”

(ibidem, p. 285).

Para aqueles que deixam de se arrepender no fim da vida, têm-se arriscada a salvação,

porque dificilmente se salvam. Então, para Vieira, fazeis agora aquilo que dizeis que haveis de

fazer depois.

Conclusão

Os Sermões do Advento acabam sendo uma “unidade de quatro partes”, pois um

complementa o outro. Na Primeira Dominga, o Padre dá início sobre o tema que será discutido

no decorrer dos sermões, na Segunda e na Terceira ele mostra as consequências do primeiro

sermão, que são muito atuais no nosso cotidiano, e por último a Quarta Dominga que é a

conclusão do tema que foi trabalhado nos anteriores. É recorrente o aparecimento de certas

11 “Se (o farei) um dia mais tarde, porque não já?” (NT)

Page 13: O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António ... · O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António Vieira Claudia Letícia Pivetti de Carli (UFFS) Resumo:

frases nos sermões, pois é uma forma de complementar o sentido da frase e deixar mais

convincente o discurso do Padre, para o convencimento do leitor/ouvinte. E assim é o jogo

retórico do António Vieira.

O jesuíta não utilizou as fases da Retórica Aristotélica na ordem como foi postulado por

Aristóteles, pois como visto no sermão da Primeira Dominga ele não começa com o exórdio e

sim com a narração juntamente com a tese. A todo momento ele articula as provas com a

narração para deixar deixar bem explicativo o seu discurso e conseguir alcançar seu objetivo,

o convencimento dos ouvintes/leitores.

Em todos seus sermões, não somente dos Adventos, o padre busca uma “manifestação

divina” em seus auditores, a retórica e a estética acabam sendo mais um efeito e multiplicação

dessas “manifestações”, são a partir delas que o luso-brasileiro tenta alcançar o seu objetivo.

Conforme Pécora (1944, p. 42) é impossível fazer uma análise mais profunda da retórica nos

sermões do padre se não examinar o valor do divino que tanto Vieira discute. Não é cabível

falar sobre a retórica em seus sermões se não entender cada premissa, cada exemplos, cada

engrenagem que seu discurso necessita para funcionar.

Bibliografia

ARISTÓTELES [384-322 a.C]. Retórica. 2 ed., revista . [Obras completas de Aristóteles.

Coordenação: António Pedro Mesquita. Tradução e notas: Manuel Alexandre Junior, Paulo

Page 14: O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António ... · O jogo retórico nos sermões do advento, do padre António Vieira Claudia Letícia Pivetti de Carli (UFFS) Resumo:

Farmhouse Alberto e Abel do Nascimento Pena]. Lisboa: Centro de Filosofia da Universidade

de Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2005.

ALMEIDA JUNIOR, Licinio Nascimento. Conjecturas para uma Retórica do Design

[Gráfico]. 2009. 423 f. Tese (Doutorado em Design) - Departamento de Artes & Design,

Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2009.

GENESIS. In: BÍBLIA Sagrada. São Paulo: Paulus, 1990. Cap. 42, vers. 9, p. 55.

JÓ. In: BÍBLIA Sagrada. São Paulo: Paulus: Paulus, 1990. Cap. 13, vers. 27, p. 614.

JOÃO. In: BÍBLIA Sagrada. São Paulo: Paulus, 1990. Cap. 1, vers. 19-23, pp. 1291-1292.

LUCAS. In: BÍBLIA Sagrada. São Paulo: Paulus, 1990. Cap. 23, vers. 1-25, pp. 1285-1286.

MATEUS. In: BÍBLIA Sagrada. São Paulo: Paulus, 1990. Cap. 11, pp. 1193-1194.

________. In: BÍBLIA Sagrada. São Paulo: Paulus, 1990. Cap. 27, vers. 37, p. 1218.

PÉCORA, Alcir. Teatro do Sacramento: a unidade teológico-retórico-política dos sermões

de Antônio Vieira. Campinas: Edusp/Editora da Unicamp, 1944, pp. 39-67.

SARAIVA, Antonio José. O discurso engenhoso. São Paulo: Perspectiva, 1980.

TOBIAS. In: BÍBLIA Sagrada. São Paulo: Paulus, 1990. Cap. 5, vers. 11-16, pp. 506-507.

VIEIRA, António. Sermões do Advento, do Natal e da Epifania. São Paulo: Edições Loyola,

2014. (Obras completas, t. II, v. I).