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1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13 th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X O PENSAMENTO FEMINISTA AFRICANO E A CARTA DOS PRINCÍPIOS FEMINISTAS PARA AS FEMINISTAS AFRICANAS Florita Cuhanga António Telo 1 Resumo: Tendo como foco os feminismos trago nesta reflexão notas sobre o movimento feminista em África introduzindo a Carta de Princípios Feministas para as Feministas Africanas. Atendendo as realidades diversificadas e contextualizadas, o texto traz uma visão crítica ao feminismo “hegemônico”, os desafios presentes e futuros das mulheres em África. Avaliando as tensões entre um movimento interno, intelectual e ativista atuante, que interage com outros externos, é possível observar a produção e o posicionamento das pesquisadoras africanas relativamente à “questão das mulheres” em África. Palavras-chave: África. Mulheres. Feminismo. Carta Feminista Africana. INTRODUÇÃO O feminismo hoje se assume como um tema relativamente caro para mim, por dois motivos em particular: primeiro por minha dificuldade em compreender/aceitar a predominância dos discursos, que costumo chamar de hegemônicos - teorias do Norte - baseadas em suas experiências locais, ainda utilizadas como referência universal, principalmente pela academia; e por outro lado, enquanto ativista angolana inserida na academia e vivenciando a realidade de grande parte das mulheres no continente africano a sul do Saara, particularmente Luanda onde resido, atribuo forte valor as iniciativas diárias das mulheres, que em meu entender se configura um feminismo dinâmico e, atuante com o qual a própria academia ainda tem dificuldades em interagir, mais do que integrar. Apesar da heterogeneidade do continente africano, existem muitas realidades comuns a grande parte dos seus países, com destaque para a situação das mulheres. Longe de constituírem uma particularidade das mulheres africanas, temas como a pobreza extrema, a violência, o HIV/AIDS, a mortalidade materna, os fundamentalismos religiosos e culturais, as práticas locais atentatórias à sua integridade física e mental, a gravidez e casamento precoce, têm sido mais destacados pela literatura mundial, passando a imagem de que no continente não existe produção académica e resistências a estas mazelas. 1 Doutoranda em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, gênero e feminismo pela Universidade Federal da Bahia PPGNEIM. Mestra em Direitos Humanos pela Universidade Federal da Paraíba. Licenciada em Direito pela Universidade Agostinho Neto em Luanda/Angola. Membra fundadora do primeiro Colectivo Feminista Angolano Ondjango Feminista. Membra Fundadora e Vice-Presidente da Associação Angolana Observatório de Políticas Públicas na Perspectiva de Género. Membra do Grupo de Pesquisa GIR@ da UFBA, do Grupo de Pesquisa LES da UFRB. Colunista do jornal virtual Correio Angolense. Nascida em Angola na província do Uíge.

O PENSAMENTO FEMINISTA AFRICANO E A CARTA …...um sentido crítico, particularmente sobre aspectos culturais, religiosos e políticos que impactam diretamente sobretudo em suas vidas

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

O PENSAMENTO FEMINISTA AFRICANO E A CARTA DOS PRINCÍPIOS

FEMINISTAS PARA AS FEMINISTAS AFRICANAS

Florita Cuhanga António Telo1

Resumo: Tendo como foco os feminismos trago nesta reflexão notas sobre o movimento feminista

em África introduzindo a Carta de Princípios Feministas para as Feministas Africanas. Atendendo

as realidades diversificadas e contextualizadas, o texto traz uma visão crítica ao feminismo

“hegemônico”, os desafios presentes e futuros das mulheres em África. Avaliando as tensões entre

um movimento interno, intelectual e ativista atuante, que interage com outros externos, é possível

observar a produção e o posicionamento das pesquisadoras africanas relativamente à “questão das

mulheres” em África.

Palavras-chave: África. Mulheres. Feminismo. Carta Feminista Africana.

INTRODUÇÃO

O feminismo hoje se assume como um tema relativamente caro para mim, por dois motivos

em particular: primeiro por minha dificuldade em compreender/aceitar a predominância dos

discursos, que costumo chamar de hegemônicos - teorias do Norte - baseadas em suas experiências

locais, ainda utilizadas como referência universal, principalmente pela academia; e por outro lado,

enquanto ativista angolana inserida na academia e vivenciando a realidade de grande parte das

mulheres no continente africano a sul do Saara, particularmente Luanda onde resido, atribuo forte

valor as iniciativas diárias das mulheres, que em meu entender se configura um feminismo

dinâmico e, atuante com o qual a própria academia ainda tem dificuldades em interagir, mais do que

integrar.

Apesar da heterogeneidade do continente africano, existem muitas realidades comuns a

grande parte dos seus países, com destaque para a situação das mulheres. Longe de constituírem

uma particularidade das mulheres africanas, temas como a pobreza extrema, a violência, o

HIV/AIDS, a mortalidade materna, os fundamentalismos religiosos e culturais, as práticas locais

atentatórias à sua integridade física e mental, a gravidez e casamento precoce, têm sido mais

destacados pela literatura mundial, passando a imagem de que no continente não existe produção

académica e resistências a estas mazelas.

1 Doutoranda em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, gênero e feminismo pela Universidade Federal da Bahia –

PPGNEIM. Mestra em Direitos Humanos pela Universidade Federal da Paraíba. Licenciada em Direito pela

Universidade Agostinho Neto em Luanda/Angola. Membra fundadora do primeiro Colectivo Feminista Angolano

Ondjango Feminista. Membra Fundadora e Vice-Presidente da Associação Angolana Observatório de Políticas Públicas

na Perspectiva de Género. Membra do Grupo de Pesquisa GIR@ da UFBA, do Grupo de Pesquisa LES da UFRB.

Colunista do jornal virtual Correio Angolense. Nascida em Angola na província do Uíge.

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Este trabalho pretende apresentar alguns aspectos do pensamento feminista africano a

produção científica de conhecimentos que todos os dias brotam da superfície das realidades

africanas focando especificamente a Carta Africana de Princípios Feministas.

Primeiramente faço uma resumida reflexão em torno do que é o feminismo africano,

destacando o pensamento acadêmico de determinadas feministas africanas dentro e fora do

continente. Em seguida apresento a necessidade de se nomear feminista e antes disso se identificar

como africana constituindo um ato político afirmativo. Posteriormente, faço um link com a Carta,

destacando a importância teórica-prática no que tange aos subsídios relevantes ao desenvolvimento

das ideias e estratégias feministas africanas, para além de ser um mecanismo de responsabilização

para as organizações feministas e uma ferramenta básica a utilizar para monitorar o seu próprio

desenvolvimento institucional.

As minhas impressões à guisa de conclusão representam os meus pontos de vista

relativamente a totalidade das discussões apresentadas ao longo do texto bem como alguns desafios

que o movimento ainda enfrenta no contexto africano.

2. FEMINISMO AFRICANO: CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS

Para MacFadden (2001, p. 51-52) um ponto de partida útil para qualquer discussão do

feminismo em África é defini-lo como sendo fundamentalmente a luta das mulheres contra o

controle patriarcal e a sua exclusão. As mulheres africanas têm se engajado nesta luta quer como

indivíduos quer em coletividades, há milênios.

Este engajamento, prossegue MacFadden, é a mais antiga expressão da resistência contra a

injustiça na narrativa humana, embora menos conhecida ou reconhecida. A luta contra a

apropriação de sua integridade e personalidade certamente não se restringe às chamadas sociedades

desenvolvidas, nem é peculiar às experiências de mulheres que estão fixas em uma determinada

localização geográfica do planeta.

Filomina Steady (1981) define o feminismo africano como um movimento que enfatiza a

autonomia feminina e a cooperação; a natureza em detrimento da cultura; a centralidade das

crianças, a maternidade múltipla e consanguinidade.

Em sua perspectiva, o discurso feminista africano, embora deva muito ao movimento

feminista global, preocupa-se em delinear essas inquietações que são peculiares à situação africana.

Ele também questiona as características de culturas tradicionais africanas sem as “maldizer”,

entendendo que elas podem ser vistas de forma diferente, por diferentes classes de mulheres.

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Este movimento é uma práxis política que na visão de Amina Mama (SALO, 2001, p. 58)

emana de uma análise muito convincente de condições políticas, econômicas e sociais que forma a

vida das mulheres africanas. Estes movimentos são autônomos e surgem para corrigir as injustiças

de gênero visando a transformação e ou mudança das relações de gênero opressivas.

O movimento de mulheres/feminista em África atua em prol de políticas de gênero focadas

nas mulheres, visando trabalhar a transformação das sociedades africanas em três níveis, descritos

por Mama: 1) da subjetividade; 2) das nossas vidas e relacionamentos pessoais e; 3) da economia

política. A libertação das mulheres exige abordar a injustiça de gênero em todo o seu percurso, ao

nível micro e macro da política, não se afastando de qualquer nível de luta.

Para o pensamento feminista africano pesquisa e ativismo caminham de mãos dadas.

Embasada na concepção de que o feminismo é um movimento ativista e teórico e, neste âmbito,

como ativismo e como corpo de ideias, ressaltam a necessidade de uma transformação positiva da

sociedade de tal forma que as mulheres não sejam marginalizadas, mas sim tratadas como cidadãs

de pleno direito em todas as esferas da vida (MEKGWE, 2008).

2.1 Africanas e Feministas

Por experiencia própria, nomear-se feminista hoje ainda gera muito debate e resistência por

arte da sociedade como um todo, esta é a realidade não apenas de países africanos, mas também de

outras partes do mundo.

Molara Ogundipe Leslie (1987) salienta a necessidade das feministas africanas assim se auto

definirem, pois, a mulher africana precisa estar consciente não só do fato de que ela é uma mulher,

mas também que ela é uma pessoa africana e de terceiro mundo. Como uma africana, a mulher

precisa estar consciente do contexto em que a sua postura feminista é formada, ou seja, ela deveria,

além de apontar as falhas da sua cultura, tomar cuidado para não parecer estar apoiando à

ocidentalização em detrimento de seus próprios costumes africanos.

O fantasma de “seguir ou imitar o ocidente” está presente em todo o percurso do movimento

de mulheres africanas, no qual se enquadra também o feminista. Durante muito tempo, as feministas

africanas foram definidas como sendo “desleais” e “inautênticas” por levantarem a bandeira do

feminismo e se auto identificarem como feministas, considerado como um ultraje diante daquilo

que são tidos como valores e princípios africanos.

Ao longo dos tempos, diversas africanas têm se empenhado no processo de análise, pesquisa

e ativismo em prol das mulheres, refletindo a partir das suas próprias realidades, e desenvolvendo

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um sentido crítico, particularmente sobre aspectos culturais, religiosos e políticos que impactam

diretamente sobretudo em suas vidas.

Por isso, concordo com MacFadden quando diz que excluir séculos de resistência das

mulheres em África, Ásia, América Latina e Caribe e outras partes do mundo, fora da Europa e

América do Norte – porque as mulheres brancas tiveram oportunidade de falar e escrever sobre as

suas lutas de uma forma que é mais universalmente acessível - é no mínimo ridículo.

3 A CARTA DOS PRINCÍPIOS FEMINISTAS PARA AS FEMINISTAS

AFRICANAS

A Carta dos Princípios Feministas para as Feministas Africanas, doravante a Carta2 foi

adotada em Novembro de 2006, na Capital do Gana, Accra, como documento final do Fórum

Africano Feminista que reuniu centenas de ativistas feministas africanas em África e na diáspora,

empenhadas em diferentes níveis de engajamento dentro deste movimento e teve o intuito de refletir

acerca de uma base coletiva e traçar formas de fortalecer e crescer o movimento feminista no

continente.

Esta iniciativa do Fórum Feminista Africano (FFA)3 envolveu grupos de mulheres,

individualidades, ativistas, pesquisadoras, ONGs, associações e outras instituições, para

deliberarem, como refere a Carta, sobre as questões de interesse fundamental para o movimento,

desenvolvido a partir da crescente preocupação de que os esforços para promover os direitos das

mulheres no continente estavam sob sérias ameaças de vários grupos/organizações.

A realização do Fórum assim como a adoção da Carta surge num contexto peculiar para o

continente, e especialmente para os direitos das mulheres em África.

Nesta altura o movimento de mulheres no continente parecia ter perdido o seu foco e

direção, aliado a um crescer dos fundamentalismos religiosos, étnicos e culturais,

que se desenvolveram inclusive dentro do movimento de mulheres. Ao mesmo

tempo novos atores retirados de comunidades de mulheres marginalizadas, como

as/os ativistas de direitos lésbicas e bissexuais, mulheres com deficiência e

profissionais do sexo surgiram para exigir maior autonomia, responsabilidade e

representação dos seus problemas entre o movimento das mulheres tradicionais

(IMAM, 2009, tradução nossa).

2 Este documento está acessível apenas em inglês, todas as transcrições foram traduzidas de forma livre. 3 O Fórum Feminista Africano, em inglês The African Feminist Forum, é uma conferência bienal que reúne ativistas

feministas africanas para deliberarem sobre questões de interesse fundamental para o movimento. Foi criado por um

grupo de ativistas feministas visando o desenvolvimento de um espaço autônomo para as feministas do continente

refletir internamente sobre a arquitetura atual e para o avanço dos direitos das mulheres, bem como avaliar e

desenvolver estratégias para enfrentar os desafios externos que recaiem sobre o movimento. O primeiro encontro

ocorreu em novembro de 2006, em Accra, Gana. In: <http://africanfeministforum.com/background/>. Acesso em: 01 de

abr. 2014.

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Esta abertura das demandas não foi característica particular deste período, mas é de realçar a

ênfase maior quanto a questão das chamadas minorias sexuais e das mulheres com deficiência.

Dentro do movimento de mulheres, as respostas a estas demandas muitas vezes foram

reacionárias e fundamentalistas, inclusive de muitas pessoas dentro do movimento de mulheres.

Assim, a necessidade de incluir estes grupos, bem como o ataque à pandemia da AIDS,

agravando o empobrecimento, o aumento da violência contra as mulheres e meninas, juntamente

com o fato de que os financiamentos para as questões dos direitos das mulheres têm vindo a

diminuir de forma constante ao longo dos anos, colocou em causa a influência do movimento das

mulheres no continente, que parecia estar em declínio (IMAM, 2009, tradução nossa).

Outrossim, a iniciativa surge também, em função dos ataques constantes que o movimento

feminista africano passou a sofrer, provenientes de dentro e fora do continente, como assevera

Ayesha Imam (2009, tradução nossa) argumentos ásperos sobre o que constitui o feminismo e / ou

feminismo Africano com calúnias que apelavam para o regionalismo ou nacionalismo (e acusações

do mesmo tipo), a intolerância, ataques pessoais etc.

É nesta conjuntura que surge e se desenvolve o Fórum Feminista Africano que atualmente

incentiva e apoia a realização de outros fóruns em países africanos. Neste sentido, já foram

realizados quatro fóruns feministas nacionais, em Angola, no Gana, na Nigéria e no Uganda,

estabelecidos para envolver e engajar a participação e a reflexão nacional e local mais ampla.

3.1 Noção

Para Ayesha Imam (2009 tradução livre) a Carta é uma declaração de nossos padrões de

responsabilidade e auto-regulação e tem sido usada como princípio para inclusão em nosso espaço

autônomo feminista. Constitui, assim, uma declaração com caráter vinculativo para todas as

ativistas feministas, movimentos feministas e outras instituições empenhadas na causa dos direitos

humanos das mulheres desde que aceitem e reconheçam os seus princípios.

Na sua perspectiva, ela foi desenvolvida por e para feministas que são africanas, e não

porque as mulheres africanas sentem que estes princípios são ou deveriam ser peculiares à África.

Apesar de ser direcionada para feministas, a Carta constitui um ponto de partida mais ou

menos consensual, para grupos de mulheres ou individualmente consideradas, quer se assumam ou

não como feministas, desde que defendam a causa das mulheres, visando oferecer balizas para o

desenvolvimento de estratégias, pesquisas, modus operandi, monitoramento e avaliação de suas

atividades.

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Pese embora não tenha caráter jurídico obrigatório, seus princípios representam a base ética

sob a qual deve assentar os alicerces da construção do movimento feminista em África, funcionando

ainda como um “mecanismo de responsabilização para a organização feminista, sendo por isso,

desenvolvida como uma ferramenta que as organizações de mulheres podem utilizar para monitorar

o seu próprio desenvolvimento institucional” (A CARTA, 2006).

O fato de ser um instrumento elaborado coletivamente constitui uma ferramenta

fundamental de construção do movimento, salienta Ahikire (2014, p.7 tradução nossa),

particularmente em torno do desejo de afirmar o compromisso com os princípios feministas e traçar

um curso para fortalecer e fazer crescer o movimento feminista no continente.

A Carta vem dar outra energia e reafirmar o feminismo africano em suas múltiplas

dimensões. De muitas maneiras, ela definiu inverter as dinâmicas conservadoras que trabalham para

minar a margem da crítica do feminismo Africano, criando um senso de urgência sobre a

necessidade de o movimento feminista: reafirmar e re-energizar-se - assevera Ahikire (IDEM,

tradução nossa).

3.2 Caracterização

A Carta de Princípios contém seis pontos e começa por se identificar como sendo um

documento inspiracional e aspiracional, que define os valores coletivos entendidos como chave para

o trabalho e a vida das feministas africanas. De igual modo, traça a mudança que quer ser vista nas

comunidades e também como ela pode ser alcançada.

Além disso, enuncia as responsabilidades individuais e coletivas para com o movimento e,

destes para com as/os outras/os dentro do movimento, reafirmando o dever de defender e respeitar

os direitos de todas as mulheres sem distinção, com o compromisso de proteger o legado das

antepassadas feministas africanas que fizeram numerosos sacrifícios, para que todas as africanas

pudessem ter maior autonomia.

Os pontos seguintes discorrem sobre o que vem estabelecido na Carta e em alguns itens eu

coloco os meus pontos de vista, porém, ele reproduz a maior parte do tempo ipsis literis o seu

conteúdo, originalmente em inglês e traduzido de forma livre.

1.º DESIGNAR A NÓS MESMAS COMO FEMINISTAS

No Preâmbulo da Carta as ativistas feministas africanas se posicionam quanto ao lugar a

partir do qual constroem sua ação e as suas falas, afirmando em conjunto que,

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“Nós nos definimos e nos nomeamos publicamente como feministas [...]; reconhecemos

que o trabalho de lutar pelos direitos das mulheres é profundamente político, e o processo

de nomeação é político também. A escolha por nomear a nós mesmas como feministas

nos coloca em uma posição ideológica aberta.” (tradução nossa).

Por isso, esta nomeação implica a politização da luta pelos direitos das mulheres,

questionando a legitimidade das estruturas que mantêm as mulheres subjugadas, ao mesmo tempo

desenvolvendo as ferramentas para análise e a ação transformadora.

Implica ainda o reconhecimento que as identidades são múltiplas e variadas enquanto

feministas africanas, reitera a Carta, somos africanas - vivemos em África e, mesmo quando

vivemos em outros lugares, o nosso foco está nas vidas das mulheres africanas no continente. Por

isso mesmo, a nossa identidade feminista não é qualificada, com “se”, “mas”, ou “porém”. Nós

somos feministas. Ponto final.”

E assim as mulheres africanas feministas marcam de forma explicita os seus propósitos

assumindo de forma inequívoca o caráter político da sua luta assim como a defesa dos direitos das

mulheres independente da sua condição.

2º NOSSA COMPREENSÃO DO FEMINISMO E DO PATRIARCADO

A Carta afirma que o patriarcado é um sistema de autoridade masculina que legitima a

opressão das mulheres através de instituições políticas, sociais, econômicas, legais, culturais,

religiosas e militares. A compreensão do feminismo africano coloca as estruturas de relações e

sistemas sociais patriarcais que estão embutidos em outras estruturas opressivas e exploradoras no

centro das suas análises.

Nestes termos, o acesso e controle dos homens sob os recursos e recompensas dentro das

esferas privada e pública se legitima nesta ideologia de dominação masculina. Contudo, o

patriarcado varia no tempo e no espaço, o que significa que ele muda ao longo do tempo e varia de

acordo a classe, a raça, as relações e as estruturas étnicas, religiosas e global-imperiais.

Entretanto, nas conjunturas atuais, o patriarcado não muda simplesmente de acordo com

esses fatores, mas está inter-relacionado com e informa as relações de classe, raça, etnia, religião e

imperialismo global. Assim, desafiá-lo de forma eficaz requer também desafiar outros sistemas de

opressão e exploração que frequentemente se apoiam mutuamente.

A compreensão do patriarcado é crucial porque fornece as feministas uma estrutura para

expressar a totalidade das relações de opressão e de exploração que afetam as mulheres africanas. A

ideologia patriarcal permite e legitima a estruturação de cada aspecto da vida das africanas/os

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através do estabelecimento da estrutura por meio da qual a sociedade define e vê homens e

mulheres e constrói a supremacia masculina.

Por isso, refere a Carta, constitui tarefa ideológica enquanto feministas entender o sistema e

como tarefa política, acabar com ele. Reiterando que o foco é lutar contra o patriarcado como um

sistema, ao invés de lutar contra homens ou mulheres individuais.

“Portanto, como feministas definimos o nosso trabalho como um investimento de energias

individuais e institucionais na luta contra as formas de opressão patriarcal e exploração.”

3º NOSSA IDENTIDADE COMO FEMINISTAS AFRICANAS

Enquanto ativistas que vêm de/trabalham/vivem em África, reivindicam o direito e o espaço

para serem feministas africanas. A Carta reconhece não haver identidade homogênea como

feministas – por isso, celebra e reconhece a diversidade e o compromisso comum de uma agenda

transformadora para as sociedades africanas e as mulheres africanas em particular. Isto é o que dá a

elas uma identidade feminista comum.

Há o reconhecimento explícito de que as lutas das feministas africanas estão

inextricavelmente ligadas ao passado comum do continente – em seus diversos contextos, pré-

colonial, escravidão, colonização, lutas de libertação, neocolonialismo, globalização, etc.

Os estados modernos africanos foram construídos à custa de feministas africanas que

lutaram ao lado dos homens para a libertação do continente. Portanto, à medida que se criam os

novos Estados africanos neste milênio, também se criam novas identidades para as mulheres

africanas, identidades como cidadãs de pleno direito, livres de opressão patriarcal, com direitos de

acesso, posse e controle sobre os recursos e aos seus próprios corpos além de utilizar aspectos

positivos das suas culturas de forma libertadora e estimuladora.

Assim, as feministas africanas reconhecem as suas histórias pré-colonial e pós-colonial e

herstories e estas exigem a adoção de medidas especiais em favor de determinadas mulheres

africanas em diferentes contextos.

Ao reconhecer as conquistas históricas e significativas que foram feitas pelo Movimento de

Mulheres Africanas ao longo dos últimos 40 anos, elas reivindicam também esses ganhos como

feministas africanas, pois, os mesmos aconteceram porque feministas africanas abriram o

caminho, nos diversos níveis, da base ao topo. Elas construíram estratégias, organizaram redes,

entraram em greve e marcharam em protesto, ao mesmo tempo em que fizeram pesquisas, análises,

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lobbying, fortalecimento institucional construindo tudo o que levou os Estados, empregadores e

instituições a reconhecerem a individualidade das mulheres, bem como suas potencialidades.

Como feministas africanas, consideram-se também parte de um movimento feminista

mundial contra a opressão patriarcal em todas as suas manifestações. As suas experiências estão

ligadas a de mulheres em outras partes do mundo com as quais partilham solidariedade e apoio ao

longo dos anos.

Assim, ao mesmo tempo em que afirmam o espaço enquanto feministas africanas, também

se inspiram em suas antepassadas feministas que abriram caminho e tornaram possível afirmar os

direitos das mulheres africanas. Invocando a memória destas mulheres cujos nomes dificilmente

estão registrados em quaisquer livros de história, é um um insulto profundo afirmar que o

feminismo foi importado do Ocidente para África.

“Nós reafirmamos a longa e rica tradição de resistência das mulheres africanas ao

patriarcado em África”.

Doravante, as feministas africanas reivindicam o direito de teorizar, escrever, formular

estratégias e falar de ou sobre si mesmas, enquanto feministas africanas.

4º ÉTICA INDIVIDUAL

Neste ponto, foram definidos os princípios éticos a serem incorporados pelas feministas

individualmente consideradas, baseado no compromisso de acreditar na igualdade de gênero. Entre

outros eu destaco os seguintes:

a) Indivisibilidade, inalienabilidade e universalidade dos direitos humanos das mulheres;

b) Liberdade de escolha e autonomia em relação às questões de integridade corporais

incluindo os direitos reprodutivos, aborto, identidade e orientação sexual;

c) Engajamento crítico com os discursos de religião, cultura, tradição e domesticidade com

foco na centralidade dos direitos das mulheres.

5º ÉTICA INSTITUCIONAL

Direcionada as organizações feministas, ou lideradas por feministas, a Carta formula os

princípios básicos que devem guiar a sua práxis, quer seja em relação ao ambiente interno, como

externo, com outras organizações ou instituições, feministas ou não. Entre eles destaco:

Promover a abertura, transparência, igualdade e responsabilidade nas instituições e

organizações lideradas por feministas;

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Esforçar-se para fundamentar o ativismo com análise teórica e conectar a prática de ativismo

com a compreensão teórica do feminismo africano;

Criar e manter organizações feministas para promover a liderança das mulheres.

Neste item a Carta assevera que as organizações e redes de mulheres devem ser conduzidas e

geridas por mulheres, constituindo assim um princípio básico neste âmbito. Sendo por isso mesmo,

uma contradição de princípios de liderança feminista, ter homens na liderança, gestão e como porta-

vozes de organizações de mulheres.

6º LIDERANÇA FEMINISTA

Finalmente, são enunciados os compromissos que devem ser executados por todas as

feministas em matéria de liderança, particularmente as que ocupam cargos de direção.

Razão pela qual, como líderes do movimento feminista, a Carta reconhece que a ação

feminista tem popularizado a noção de mulheres como líderes e, enquanto líderes feministas estão

comprometidas a fazer uma diferença crucial neste espaço, com base no entendimento de que a

qualidade da liderança das mulheres é ainda mais importante do que o número. Por isso assumem o

compromisso de:

Ampliar e fortalecer uma rede multigeracional e associação de líderes feministas em todo o

continente;

Assegurar que o movimento feminista seja reconhecido como órgão legítimo de

representação para as mulheres em posições de liderança;

Assegurar tempo para responder de forma competente, credível e fiável a outras feministas

que necessitam de solidariedade e apoio, seja político, prático ou emocional.

AS MINHAS IMPRESSÕES À GUISA DE CONCLUSÃO

As epistemologias produzidas a partir do Sul, nomeadamente, por mulheres africanas,

representam, em meu entender, não uma alternativa ao pensamento tido como hegemônico, mas se

afirmam como diferentes propostas de análise dos conhecimentos, outras visões de mundo que

ainda são estereotipadas, quando não subalternizadas, pelo mundo acadêmico de forma geral.

Existe um trabalho intenso de pesquisadoras africanas em torno desta temática, com

destaque para Chikwenye Ogunyemi (1984), Ifi Amadiume (1987); Molara Ogundipe-Leslie

(1985), Catherine Acholonu (1995), Oyeronke Oyewumi (1997).

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Em sua teleologia, as teorias feministas africanas, incluindo o movimento de mulheres, se

organizam no sentido de incluir uma visão multi e intersdisciplinar das realidades do continente

africano, desde a situação das mulheres no espaço urbano ao desafio de integrar a demanda de

grupos periféricos e rurais, assim como as diversidades sexuais, as mulheres com necessidades

especiais.

Se o movimento de mulheres /feminista africano em algum momento se confundiu como um

movimento anti-ocidente, a sua trajetória demonstra cada vez mais, as suas preocupações em olhar

para as particularidades africanas presentes e passadas, e extrair propostas para um futuro que

abarque a ampla diversidade de gêneros, sexuais, de classe e localização geográfica.

E neste sentido, a Carta Africana de Princípios Feministas veio firmar um posicionamento

ideológico nítido das feministas africanas que a construíram e das que se identificaram com ela,

teorizando, definindo estratégias, identificando os pontos tensos da exploração, reivindicando o

espaço, no passado e no presente, negado a várias mulheres africanas. Ao mesmo tempo em que se

preocupa com a necessidade de criação e fortalecimento de organizações, coletivos, associações,

feministas.

O Fórum Feminista Africano é um movimento da sociedade civil que, preocupado com a

situação das mulheres assumiu a vanguarda em prol da defesa de um feminismo aplicado as

realidades africanas. E assume uma postura concreta, como a de se assumirem feministas, o apoio

ao direito ao corpo de todas as mulheres, o reconhecimento das minorias sexuais, o apelo à

solidariedade entre elas e a necessidade de dialogar com outros movimentos feministas e de

mulheres, ao mesmo tempo reconhecendo as suas ancestralidades africanas.

Ainda existe o grande desafio de mobilização e conscientização de mais mulheres rurais e

ou camponesas, que residem em áreas de baixa renda e de difícil acesso, e as não alfabetizadas na

língua oficial (colonial) da maioria dos países.

Em meu entender não precisamos ser todas feministas, mas devemos nos engajar pela

mudança da realidade das mulheres africanas, sendo ou não feminista.

Finalmente, os efeitos do movimento de mulheres/feminista Africano são irreversíveis, e

Silvia Tamale (2004, p.27) resume muito bem ao afirmar que a atual reação contra os movimentos

dos direitos das mulheres no continente africano tem sido, indubitavelmente, desencadeada pelo

fato de que a posição das mulheres na família e na sociedade africana deixou de ser uma afirmação

para tornar-se uma pergunta aberta na melhor das hipóteses e, na pior delas, uma grande ameaça ao

patriarcado.

Page 12: O PENSAMENTO FEMINISTA AFRICANO E A CARTA …...um sentido crítico, particularmente sobre aspectos culturais, religiosos e políticos que impactam diretamente sobretudo em suas vidas

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

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African feminist thinking and the the Charter of Feminist Principles for African Feminists

Abstract: Focusing on feminisms I bring in this reflection notes on the feminist movement in

Africa introducing the Charter of Feminist Principles for African Feminists. Given the diverse and

contextualized realities, the text brings a critical view of "hegemonic" feminism, the present and

future challenges of women in Africa. Assessing the tensions between an active internal, intellectual

and activist movement, which interacts with other external movements, it is possible to observe the

production and positioning of African researchers on the "women's issue" in Africa.

Keywords: Africa - Women - Feminism - African Feminist Charter