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Rev. Ciênc. Admin., Fortaleza, v. 14, n. 2 , p. 324-337, dez. 2008. 324 1 Introdução Em uma sociedade empreendedora, constantemente estimulando o espírito empreendedor, os indivíduos considerados empreendedores enfrentam enormes desafios, que precisam explorar como uma oportunidades, transformando o aprendizado de empreender na arte de gerar resultados concretos, com disciplina e persistência. Esses indivíduos impulsionam a Economia, provendo novos bens de consumo e inovadores métodos de produção. (DRUCKER, 2003; SCHUMPETER,1982;TIMMONS, 1989). O perfil do potencial empreendedor e seu impacto na gestão dos pequenos negócios Entrepreneurial potential profile measurement and its impact on small business performance Mara Regina Veit 1 , Cid Gonçalves Filho 2 Resumo O tema Empreendedorismo tem sido amplamente debatido e difundido no ambiente acadêmico e empresarial, por meio de publicações, casos práticos e exemplos de empreendedores bem sucedidos em sua trajetória empresarial. No que pese o mesmo com o crescente interesse sobre o assunto, existe uma carência significativa de instrumentos considerados válidos, que possam mensurar esse perfil de modo a contribuir para estudos quantitativos em diversas dimensões. Considerando esse cenário e a importância do tema, foi elaborado este estudo para identificar os principais fatores que compõem o perfil do potencial empreendedor. Para a pesquisa foram aplicados 965 questionários, com empresários de pequenas empresas do estado de Minas Gerais. Os resultados da survey demonstraram elementos significativos sobre o perfil do empreendedor, sobre a empresa e o negócio. A escala PPE (Perfil do Potencial Empreendedor) foi considerada válida pelos testes aplicados e, no modelo estrutural, verificou-se que os oito fatores que compõem o perfil empreendedor foram responsáveis por explicar 25% do desempenho das empresas, considerado muito relevante. Os principais resultados e considerações sobre esta pesquisa são apresentados neste artigo. Palavras-chave: Empreendedorismo. Perfil empreendedor. Potencial empresário. Pequenas empresas. Negócios. Abstract The entrepreneurship issue has been widely spread within both academic and business environment by means of publications, practical cases and examples from successful entrepreneurs along their business carreer/undertaking. In spite of the increasing interest on the issue there is a significant necesssity of valid instruments which can measure such profile in order to contribute to quantitative studies on several levels. Considering this scenario and the importance of the issue this study was designed to identify the main factors that comprise the potential entrepreneur profile. In order to achieve that goal, 965 questionnaires were applied with small entrepreneurs of Minas Gerais, Brazil. The survey results showed significant elements concerning the entrepreneur profile, the company and the business. The PPE (Potential Entrepreneur Profile) scale was considered valid by the applied tests and the structural model showed that eight factors which comprise the entrepreneur profile were responsible for explaining 25% of business perfomance, which was considered relevant. This article presents the main results and some reflection on this research. Keywords: Entrepreneurship. Profile entrepreneur. Potential businessman. Small companies. Business. 1 Mestre em Administração – Universidade FUMEC –MG. Gerente de Atendimento ao Empreendedor – Sebrae MG Av. Barão Homem de Melo, 329 – 7º andar – Nova Suíça . CEP 30.460-090 - Belo Horizonte-MG [email protected] e [email protected] 2 Doutor em Administração – UFMG. Professor de Mestrado – Universidade FUMEC- MG Av. Afonso Pena, 3880 – Cruzeiro. CEP 30.130-009 - Belo Horizonte - MG cfi[email protected] e [email protected]

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Rev. Ciênc. Admin., Fortaleza, v. 14, n. 2 , p. 324-337, dez. 2008.324

Mara Regina Veit e Cid Gonçalves Filho

1 Introdução

Em uma sociedade empreendedora, constantemente estimulando o espírito empreendedor, os indivíduos considerados empreendedores enfrentam enormes desafios, que precisam explorar como uma oportunidades, transformando o aprendizado de empreender na arte de gerar resultados concretos, com disciplina e persistência. Esses indivíduos impulsionam a Economia, provendo novos bens de consumo e inovadores métodos de produção. (DRUCKER, 2003; SCHUMPETER,1982;TIMMONS, 1989).

O perfil do potencial empreendedor e seu impacto na gestão dos pequenos negócios

Entrepreneurial potential profile measurement and its impact on small business performance

Mara Regina Veit1, Cid Gonçalves Filho2

ResumoO tema Empreendedorismo tem sido amplamente debatido e difundido no ambiente acadêmico e empresarial, por meio de publicações, casos práticos e exemplos de empreendedores bem sucedidos em sua trajetória empresarial. No que pese o mesmo com o crescente interesse sobre o assunto, existe uma carência significativa de instrumentos considerados válidos, que possam mensurar esse perfil de modo a contribuir para estudos quantitativos em diversas dimensões. Considerando esse cenário e a importância do tema, foi elaborado este estudo para identificar os principais fatores que compõem o perfil do potencial empreendedor. Para a pesquisa foram aplicados 965 questionários, com empresários de pequenas empresas do estado de Minas Gerais. Os resultados da survey demonstraram elementos significativos sobre o perfil do empreendedor, sobre a empresa e o negócio. A escala PPE (Perfil do Potencial Empreendedor) foi considerada válida pelos testes aplicados e, no modelo estrutural, verificou-se que os oito fatores que compõem o perfil empreendedor foram responsáveis por explicar 25% do desempenho das empresas, considerado muito relevante. Os principais resultados e considerações sobre esta pesquisa são apresentados neste artigo.

Palavras-chave: Empreendedorismo. Perfil empreendedor. Potencial empresário. Pequenas empresas. Negócios.

AbstractThe entrepreneurship issue has been widely spread within both academic and business environment by means of publications, practical cases and examples from successful entrepreneurs along their business carreer/undertaking. In spite of the increasing interest on the issue there is a significant necesssity of valid instruments which can measure such profile in order to contribute to quantitative studies on several levels. Considering this scenario and the importance of the issue this study was designed to identify the main factors that comprise the potential entrepreneur profile. In order to achieve that goal, 965 questionnaires were applied with small entrepreneurs of Minas Gerais, Brazil. The survey results showed significant elements concerning the entrepreneur profile, the company and the business. The PPE (Potential Entrepreneur Profile) scale was considered valid by the applied tests and the structural model showed that eight factors which comprise the entrepreneur profile were responsible for explaining 25% of business perfomance, which was considered relevant. This article presents the main results and some reflection on this research.

Keywords: Entrepreneurship. Profile entrepreneur. Potential businessman. Small companies. Business.

1 Mestre em Administração – Universidade FUMEC –MG. Gerente de Atendimento ao Empreendedor – Sebrae MG Av. Barão Homem de Melo, 329 – 7º andar – Nova Suíça . CEP 30.460-090 - Belo Horizonte-MG – [email protected] e [email protected] Doutor em Administração – UFMG. Professor de Mestrado – Universidade FUMEC- MG Av. Afonso Pena, 3880 – Cruzeiro. CEP 30.130-009 - Belo Horizonte - MG [email protected] e [email protected]

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O perfil do potencial empreendedor e seu impacto na gestão dos pequenos negócios

Uma parcela significativa de estudos científicos sobre o tema busca analisar o comportamento empreendedor, procurando identificar comportamentos, ações e atitudes, que o diferenciam do ser humano “normal”, estruturando características pessoais de sucesso que norteiam aqueles que desejam trabalhar por conta própria. É cada vez mais crescente o número de estudos e pesquisas realizadas na tentativa de entender as forças psicológicas e sociológicas que movem o empreendedor de sucesso. Cada pesquisador, usando uma lógica e uma metodologia estabelecidas em seus próprios campos de estudo, tem direcionado esforços significativos na identificação das características empreendedoras. Pode-se destacar autores que iniciaram as primeiras pesquisas sobre o comportamento empreendedor, como McClelland (1961), que desenvolveu uma pesquisa aplicada e identificou uma dezena de características do comportamento empreendedor, comuns às pessoas triunfadoras; Schumpeter (1982), que destaca a figura do empreendedor associado ao risco, à inovação e ao lucro e Mintzberg (2001), que propõe a relação entre o empreendedorismo e o processo da estratégia do negócio.

Se tentássemos conhecer a mente do empreendedor, como ele pensa, age, executa e transforma a sua história abstrata em fato real, por meio de estudos aplicados, veríamos que é possível criar atributos que permitem identificar semelhanças e diferenças entre os empreendedores pesquisados, estabelecendo índices que, quando analisados e comparados, contribuirão para a criação de parâmetros de análise e interpretação do potencial empreendedor. (TIMMONS, 1989).

O conjunto de abordagens, provido de diferentes autores, sobre o tema empreendedorismo, não tem conseguido formar uma compreensão integradora a respeito do significado plausível de quem, de fato, é o empreendedor. É difícil distinguir suas características diferenciais, sua percepção das oportunidades e dos riscos inerentes a elas; as escolhas estratégicas e a maneira como faz a alocação de recursos na formação do empreendimento. A falta de conformidade também tem impedido o progresso dos pesquisadores no sentido de construir uma teoria mais sólida na área, bem como o impacto que a postura empreendedora exerce sobre o desempenho organizacional. (FILION, 1990; DORNELAS, 2001, DOLABELA, 2004).

Com o objetivo de compreender e averiguar em como o perfil do potencial empreendedor impacta no resultado do desempenho de um pequeno negócio, foi desenvolvida esta pesquisa, contando com a participação de 965 empresários donos de pequenas empresas em Minas Gerais, o que possibilitou os seguintes procedimentos:

a) construção e validação de uma escala de mensuração do potencial empreendedor ;

b) análise do impacto do índice identificado no desempenho das pequenas empresas pesquisadas;

c) identificação de elementos e fatores que compõem o perfil do potencial empreendedor;

d) estabelecimento de um índice que mensure o perfil do potencial empreendedor no cenário brasileiro, a partir de um estudo no contexto estadual;

2 Revisão de literatura

2.1 Pequenas empresas

Pesquisas realizadas pelo SEBRAE –(Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas, (2004), demonstram que as pequenas empresas representam 98% do número total de empresas existentes no país e 59% da ocupação da mão-de-obra, sendo responsáveis por 48% da produção nacional e 21% do produto interno bruto, reforçando a tese de que a pequena empresa é responsável, diretamente, pelas taxas de emprego e pela produção nacional, contribuindo, de forma significativa, com o crescimento e com o desenvolvimento econômico do país. Outros dados demonstram que a taxa de mortalidade dos pequeno negócios, nos dois primeiros anos de existência, atinge 45%. (SEBRAE, 2004).

De acordo com a pesquisa realizada pelo SEBRAE Minas (2004), nas empresas constituídas na Junta Comercial de Minas Gerais, nos anos 2002, 2001 e 2000, a taxa de mortalidade encontrada é de 45%, para aquelas com até dois anos de existência; 50% no caso de estabelecimentos com até três anos de existência e, 47% não permanecem no mercado por mais de quatro anos, conforme dados comparativos na tabela 1.

Tabela 1 Taxa de Mortalidade de Pequenas Empresas Minas Gerais, Região Sudeste e Brasil

Ano de Constituição Minas Gerais % Sudeste % Brasil %2002 45,0 48,9 49,42001 50,0 56,7 56,42000 47,4 61,1 59,9

Fonte: Boletim Fatores Condicionantes e Taxa de Mortalidade de Empresas. Sebrae, 2004.

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Mara Regina Veit e Cid Gonçalves Filho

2.2 O potencial empreendedor

Nos últimos anos, inúmeros estudos buscaram identificar o perfil empreendedor por meio de investigação e pesquisas empíricas realizadas no meio acadêmico e empresarial. Em 1961, McClelland iniciou seus estudos sobre o tema do empreendedorismo, aplicado uma survey com empreendedores de 32 países. Foi utilizado um teste de avaliação motivacional, - o T.A.T (-Thematic Aperception Test) e testes de resolução de problemas, cujos resultados demonstraram que o indivíduo empreendedor possui uma estrutura motivacional diferenciada, pela presença marcante de uma necessidade específica: a necessidade de realização.

O economista Schumpeter (1982) foi um dos primeiros pensadores, que no início do século XX, procurou traduzir o sentido do empreendedorismo, quando descreveu a contribuição dos empreendedores na formação da riqueza como o processo de destruição criativa. O autor afirma que a essência do empreendedorismo está na percepção e na exploração de novas oportunidades, no âmbito dos negócios, utilizando recursos de maneira inovadora. Para o autor, sem inovação não há empreendedores; sem investimentos, não há retorno de capital e o capitalismo não se propulsiona. Neste contexto os economistas passaram a ver os empreendedores como sendo desbravadores de oportunidades de negócios, criadores de empresas e corajosos corredores de risco.

Carland (1996) e sua equipe de pesquisadores identificaram três características maiores na personalidade empreendedora: a propensão a assumir riscos, a preferência pela inovação e pela criatividade e a necessidade de realização. Esses três fatores integrados, identificados na pesquisa CEI (Carland Entrepreneurship Index,) compõem o perfil do empreendedor por ele percebido. Sua compreensão tem fundamentado a construção de pesquisas sobre o potencial empreendedor. (CARLAND, 1996). Carland, Carland e Hoy (1992) desenvolveram um instrumento para medir o potencial empreendedor de um indivíduo, medido pelo CEI – (Carland Entrepreneurship Index,) que vem sendo aprimorado e aplicado em outros grupos de pesquisa. Os autores concluíram que o empreendedorismo é uma integração de cinco elementos: necessidade de realização, criatividade, propensão à inovação, ao risco e à postura estratégica, relacionada como a busca de oportunidade.

A pesquisa GEM – (Global Entrepreneurship Monitor,) aplicada em 35 países, desde o ano de 2000, procura identificar a TEA – (Taxa de Empreendedorismo), nos países participantes, considerando os motivos que levam os empreendedores a empreenderem, seja por necessidade e ou oportunidade. Também são verificadas as condições de competitividade entre os países, os fatores que contribuem para a atividade empreendedora e as políticas públicas que estimulam a atividade empresarial. O Brasil, que participa do grupo, tem ocupado as seguintes posições, em relação aos países: 2006 – 5º ; 2005 – 7º, 2004 – 7º; ;2003 –6º; 2002-7º; 2001-8: (SEBRAE/GEM 2001 a 2006).

Ao analisar o perfil dos empreendedores, em seus estudos e pesquisas, Timmons (1998), descreve que a mente do empreendedor possui um criativo e inovador gerenciamento de habilidades e conhecimento para os negócios. Esses atributos distinguem os empreendedores uns dos outros, como os inventores, os promotores, gerentes em geral, burocratas e administradores.

3 Modelo hipotético e a metodologia da pesquisa ppe

Observando-se os estudos realizados por Carland e Carland (1996), sobre o potencial empreendedor, e outros autores pesquisados, foi proposto, para a pesquisa, o seguinte modelo hipotético,demonstrado na figura 1.

Figura 1: Modelo Hipotético de Pesquisa Fonte: os autores

Descreve-se, então, a hipótese nula e alternativa do modelo:H0,1: Não existe uma relação linear positiva entre o potencial empreendedor e o desempenho de pequenas empresas.H1,1: Existe uma relação linear positiva entre o potencial empreendedor e o desempenho de pequenas empresas

PERFILPOTENCIAL

EMPREENDEDOR

DESEMPENHODO NEGÓCIO

H1

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O perfil do potencial empreendedor e seu impacto na gestão dos pequenos negócios

3.1 O método

A pesquisa foi organizada em duas fases distintas. A primeira, considerada exploratória, fez uso de uma abordagem qualitativa, aplicando revisão de literatura e entrevistas com empreendedores, especialistas e estudiosos do tema. A segunda fase teve como foco o desenvolvimento de uma survey (quantitativa), aplicada utilizando três modalidades distintas: a) por meio do correio; b) por meio do contato direto com os empresários nos pontos de atendimento SEBRAE MG; c) pela internet.

3.2 A amostra

A população pesquisada abrangeu a participação de 965 empresários de pequenas empresas juridicamente constituídas localizadas em diferentes regiões do Estado de Minas Gerais, Brasil, tendo participado das atividades e projetos do Sebrae Minas.

3.3 O instrumento de pesquisa

O questionário do pesquisa foi elaborado com 105 questões estruturadas, a partir de várias etapas, que compreenderam, na fase inicial uma revisão de literatura de autores reconhecidos , como McClelland (1961), Schumpeter (1982), Timmons (1989), Carland (1996), Filion (1999), Mintzberg (2001), Dornelas (2001), Drucker (2003), e pesquisas existentes sobre o tema, com empresários e empreendedores pelo Sebrae e GEM (2001 a 2006) e K (2002). Em seguida, uma lista dos construtos e itens foi submetida a um grupo de especialistas em empreendedorismo, que ajudaram a aprimorar o instrumento da pesquisa. Após a análise de conteúdo, foi realizado um pré-teste com 35 respondentes, empresários das empresas, que contribuíram para aprimorar e validar o instrumento que na última etapa, foi aplicado em toda a amostra.

4 Resultados

4.1 Análise de dados e a fidedignidade do instrumento

A princípio, buscou-se realizar uma análise preliminar, para verificação de pressupostos de análise dos dados ausentes, outliers, linearidade e normalidade. No que se refere à amostra , observou-se que 67% dos empreendedores pesquisados eram homens, e 33% mulheres, sendo que 70% dos respondentes possuem idade variando de 21 a 40 anos. Cerca de 57% são casados e 57% têm filhos. Verifica-se que 37% investiu até US$ 2.000 no negócio e 14% aplicou valores acima de US$ 25.000, sendo que a origem dos recursos investidos foram 30% próprios e pessoais e 13% provenientes da família. A maior parte dos empresários criou empresas societárias somandose 37% com foco no setor de serviços em 51% no setor de comércio. Observa-se que 75% das empresas criadas têm até 5 funcionários e 53% abriram seus negócios por vislumbrarem uma, oportunidade e somente 37% por necessidade de renda.

Para Netemeyer et al. (2003), a primeira etapa de avaliação da fidedignidade de um instrumento é a verificação da dimensionalidade das medidas, em que se deve encontrar os construtos subjacentes à massa de dados analisada. Também observou-se as condições para aplicação da análise fatorial, se eram adequadas, por meio de um resultado significativo no teste de esfericidade de Bartlett e uma medida KMO superior a 0,70 (TABACHNICK e FIDEL, 2001).

Partindo da premissa de que os fatores subjacentes representam aspectos diferenciados do comportamento empreendedor, aplicou-se a rotação oblíqua na interpretação dos dados (direct oblimin) no intuito de simplificar a estrutura fatorial e possibilitar a interpretação dos dados (HAIR et al., 1998). Finalmente, lembrando que muitos itens inseridos na análise tratavam de indicadores invertidos, da escala de diferencial semântico adotada por Carland e Carland (1996), buscou-se minimizar a redundância, por meio da exclusão daqueles que, claramente, não acrescentavam a validade de face e conteúdo das medidas, por se tratarem de indicadores antônimos que carregavam nos mesmos fatores. Após a exclusão dos itens menos relevantes e dos que não apresentavam cargas significativas (superiores a 0,25), foi possível encontrar uma solução fatorial de oito dimensões, apresentada na tabela 2 e 3.

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Rev. Ciênc. Admin., Fortaleza, v. 14, n. 2 , p. 324-337, dez. 2008.328

Mara Regina Veit e Cid Gonçalves Filho

Fonte: dados da pesquisa. OBS: Medida KMO = 0,884; teste de esfericidade de Bartllet significativo (p<0,001). Na tabela são apresentadas somente as cargas com valores superiores à 0,25. Os fatores explicam 46% da variância total dos dados. Itens marcados com (I) forma invertidos e itens marcados com (N) tem seu sentido na direção usual.

Tabela 2 Análise Fatorial Exploratória: Perfil do Potencial Empreendedor

INDICADORESFATOR

1 2 3 4 5 6 7 8

v77) Confio na minha capacidade de enfrentar e superar os desafios e os obstáculos. 0,71

v72) Tenho capacidade para lidar com as incertezas e riscos. 0,70

v71) Confio na minha competência para empreender como fonte do sucesso deste negócio. 0,64

v80) Trabalho incansavelmente na busca de realização do meu sonho de empreender minhas idéias. 0,53

v75) Busco novas soluções e inovações para atender as necessidades de clientes. 0,52

v79) Mantenho meus objetivos com foco mesmo diante de resultados inicialmente não são satisfatórios. 0,49

v69) Utilizo a rede de contatos pessoais para atingir meus objetivos. 0,48

v70) Tenho responsabilidade na conclusão dos trabalhos dentro das metas e prazos estipulados. 0,46

v68) Ajo de forma pró-ativa antes de ser pressionado pelas circunstâncias ou ameaças. 0,43

v74) Assumo a responsabilidade pela resolução de problemas que possam prejudicar o desempenho deste negócio. 0,42

v76) Atuo em equipe com meus funcionários nas tarefas para cumprir os prazos. 0,42 -0,33

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O perfil do potencial empreendedor e seu impacto na gestão dos pequenos negócios

Tabela 3 Análise Fatorial Exploratória: Perfil do Potencial Empreendedor

INDICADORESFATOR

1 2 3 4 5 6 7 8V37) Eu penso que procedimentos operacionais padrões são cruciais . (I) 0,73

V1) Ter os objetivos deste negócio por escrito é crucial (N) -0,47 v67) Ser sistemático nas definição de procedimentos é crucial para aprimorar o negócio. -0,44

V15) Um plano deve ser escrito para ser efetivo. (N) -0,28 V30) Eu penso que sou uma pessoa imaginativa (N) 0,79 V44) Eu prefiro pessoas que são imaginativas. (N) 0,49 V4) Eu gosto de pensar que sou uma pessoa criativa (N) 0,41 v38) Eu aprecio o desafio de inventar mais do que qualquer coisa. (N) 0,29 0,26

v48) Minha vida real é fora deste negócio, com minha família e amigos. (I) 0,53

v21) Minhas prioridades incluem muitas coisas fora este negócio. (I) 0,45

v47) Meus objetivos pessoais giram em torno deste negócio. (N) 0,41

v22) Uma das coisas mais importantes na minha vida é este negócio. (N) 0,40

v52) Se você quer exceder a concorrência, você tem que assumir alguns riscos. (N) 0,81

v60) Se eu quero que este negócio cresça preciso assumir alguns riscos. (N) 0,68

v26) As pessoas que trabalham para mim gostam de mim. (I) 0,71

v58) As pessoas pensam em mim como alguém fácil de se relacionar. (I) 0,53

v64) Eu me preocupo com os sentimentos das pessoas que trabalham para mim. (I) 0,44

V23) Eu sou uma pessoa que gosta de pensar e planejar. (N) 0,59

v12) Eu gosto de abordar as situações de uma perspectiva analítica. (N) 0,54

v9) A coisa mais importante que eu faço para este negócio é planejar. (N) 0,43

v34) Eu procuro estabelecer procedimentos padrões para que as coisas sejam feitas certas. (I) 0,29 -0,38

V36) Eu penso que é importante ser lógico. (N) 0,35 V14) Eu não descansarei até que sejamos os melhores (N) 0,42v49) Eu adoro a idéia de tentar ser mais esperto que os concorrentes. (N) 0,39

v31) O desafio de ter sucesso é tão importante quanto ganhar dinheiro. (N) 0,25

Fonte: Dados da pesquisa -2006.

OBS: Medida KMO = 0,895; teste de esfericidade de Bartllet significativo (p<0,001). Na tabela são apresentadas somente as cargas com valores superiores a 0,25. Os fatores explicam 51% da variância total dos dados.

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Mara Regina Veit e Cid Gonçalves Filho

Nota-se que um total de oito fatores foi extraído na AFE deste estudo, constrastando em alguns pontos como os autores pesquisados, na tabela 4.

O primeiro fator aponta para a postura pro ativa; presença da autoconfiança na estratégia dos empreendedores, sendo denominados de competência estratégica. Cabe lembrar que o fator aqui demonstrado é, notavelmente, diferente da postura estratégica obtida por Carland e Carland (1996), até mesmo porque é composto por indicadores extraídos de outras fontes da literatura, que não o CEI. O segundo fator demonstra o grau de formalização de procedimento e planos, por parte do empreendedor, sendo denominado de planejamento formal. O terceiro foi fora denominado de inovação, sendo também similar ao obtido originalmente por Carland e Carland (1996) e Inácio Jr. (2002). O quarto fator extraído em correspondência com o grau em que o negócio representa um aspecto central na vida do empreendedor, em detrimento de sua família e outras atividades extras do trabalho, denominado de dedicação. O quinto fator extraído representa aquelas facetas de disposição e aceitação do risco dos negócios, sendo considerado o fator risco, encontrado pelos autores em seu estudo original. O sexto fator extraído corresponde ao grau em que o empreendedor tem facilidade de relacionamento com seus funcionários e outros membros do seu círculo profissional, sendo denominado de relacionamento. O sétimo fator aponta para a afinidade do empreendedor para com o processo de planejamento formal e o pensamento analítico do negócio, sendo denominado de pensamento analítico. Por fim, o oitavo fator aponta para o grau em que o empreendedor vê o desafio para sucesso do negócio, como se atuasse como meta de realização pessoal, sendo denominado de desafio.

Acredita-se terem sido obtidas evidências de uma dimensionalidade mais robusta do ponto de vista estatístico e conceitual das escalas propostas. Etapas subseqüentes de validação serão empreendidas para verificar as demais propriedades psicométricas das escalas. A partir desse ponto, passou-se a explorar a dimensionalidade da escala de desempenho do negócio, definida na tabela 5.

Tabela 4 Fatores que compõem o PPE – Perfil do Potencial Empreendedor

Ordem FATORES DO PPE

01 Competência Estratégica02 Planejamento Formal03 Inovação04 Dedicação05 Risco06 Relacionamento07 Pensamento Analítico08 Desafio

Fonte: Dados da pesquisa - 2006.

Fonte: Dados da pesquisa-2006.

OBS: Medida KMO = 0,872; teste de esfericidade de Bartllet significativo (p<0,001). Na tabela são apresentadas somente as cargas com valores superiores à 0,25. Os fatores explicam 57% da variância total dos dados.

Tabela 5 Análise Fatorial Exploratória: Desempenho no Negócio

INDICADORESFATOR

1A empresa tem apresentado crescimento na participação de mercado 0,86A empresa tem alcançado uma posição competitiva frente à concorrência 0,83A empresa tem alcançado crescimento dos lucros no último período 0,82A empresa tem obtido retorno sobre o capital ou recursos investidos no negócio. 0,76A empresa tem demonstrado capacidade de manter os clientes leais e fiéis 0,67A empresa tem capacidade para atrair novos clientes no mercado. 0,63A empresa tem investido em inovação e tecnologia no desenvolvimento de produtos e serviços 0,60A empresa possui informações/pesquisas sobre produtos e serviços similares no mercado 0,53

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O perfil do potencial empreendedor e seu impacto na gestão dos pequenos negócios

Para verificar o possível impacto de observações influentes sobre os resultados da AFE, tratou-se de fazer uma análise, considerando a exclusão dos casos considerados aberrantes. Nesta análise, observou-se que os fatores formados, tanto para a escala do Perfil do Potencial Empreendedor quanto para a escala de desempenho organizacional, permaneceram estáveis na solução, sem outliers, exceção feita ao fator inovação, que teve uma carga cruzada de alguns indicadores com o fator planejamento formal. De fato, considera-se essa mudança trivial e, de modo a não prejudicar a generalização dos resultados, preferiu-se analisar os resultados considerando aqueles extremos. Em suma, pode-se, nesse tópico, apresentar evidências acerca da dimensionalidade das escalas empregadas.

Todos, no Alpha, tiveram valores acima de 0,6, aceitáveis para estudos exploratórios (NETEMEYER et al., 2003), exceto dois fatores - dedicação e desafio , com valores de 0,5. Tal fato sugere a necessidade de mais estudos para aprimorar a mensuração destes dois fatores, com possível inclusão de novos itens. Aplicou-se a lógica de avaliação da adequação das medidas também para o construto desempenho, obtendo-se um Alpha de Cronbach de 0,8891.

Quanto à escala de perfil empreendedor, é possível perceber que todos os indicadores das respectivas escalas apresentavam validade convergente, segundo os critérios de significância das cargas fatoriais proposto por Bagozzi et al, (1991). Pelos mesmos critérios pode-se dizer que os construtos relacionados ao Perfil Empreendedor têm validade convergente, pois suas cargas apresentam valores significativos com as dimensões dessa escala.

4.2 Considerações sobre a mensuração do PPE

De modo a analisar, inicialmente os resultados, apresenta-se a tabela 6 com a avaliação da confiabilidade dos construtos, e a tabela 7, com médias dos fatores do PPE (Perfil do Potencial Empreendedor).

Tabela 6 Avaliação da confiabilidade dos construtos: Perfil Potencial do Empreendedor.

INDICADORES MÉDIA1 VARIÂNCIA2 CORREL.3 R24 ALFA DEL.5

Competência Estratégica =0,8617V77 (N) 87,6910 100,0516 0,6709 0,5182 0,8455V72 (N) 88,4689 93,9040 0,6302 0,4480 0,8441V71 (N) 87,8938 97,4335 0,6335 0,4802 0,8451V75 (N) 87,6119 101,5950 0,6168 0,4411 0,8488V80 (N) 87,9300 96,5998 0,6251 0,4380 0,8452V74 (N) 87,9851 99,6854 0,5028 0,2982 0,8536V79 (N) 88,3874 94,7296 0,5284 0,3355 0,8529V70 (N) 87,8337 99,5478 0,5676 0,3804 0,8496V76 (N) 87,7183 101,5585 0,5550 0,3708 0,8512V69 (N) 88,7560 91,0435 0,5212 0,3155 0,8570V68 (N) 88,9622 92,8226 0,5028 0,2946 0,8575Risco =0,7244V52 (N) 9,0342 1,5891 0,5707 0,3257 .V60 (N) 8,8143 1,9396 0,5707 0,3257 .Inovação =0,6313V30 (N) 22,1640 24,1539 0,4838 0,2647 0,5070V44 (N) 23,0619 23,5789 0,4398 0,2204 0,5413V4 (N) 21,5345 28,9761 0,3739 0,1688 0,5889V38 (N) 22,6202 26,7839 0,3557 0,1333 0,6015Planejamento Formal =0,5974V37 (N) 24,2891 21,9111 0,4480 0,2125 0,4702V1 (N) 23,4133 23,8051 0,4226 0,2024 0,4960V67 (N) 25,0112 21,6735 0,3391 0,1313 0,5681V15 (N) 23,5780 26,1452 0,3199 0,1230 0,5676

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Observações: 1) média da escala, caso o item seja excluído; 2) variância da escala, caso o item seja excluído; 3) Correlação média inter item corrigida; 4) R2 múltiplo; 5) limite inferior do valor alfa; caso o item seja apagado. Valores em negrito indicam que haveria melhorias na confiabilidade das escalas, caso os itens fossem excluídos. Itens marcados com (N) têm sentido na direção normal e, itens marcados com (I), foram invertidos antes de entrarem na análise.

Dedicação =0,4905V48 (I) 19,8069 26,0911 0,2848 0,0896 0,4244V47 (N) 17,5002 30,4235 0,3072 0,1459 0,4047V22 (N) 17,9064 30,2155 0,3027 0,1446 0,4073V21 (I) 20,6218 27,9180 0,2622 0,0798 0,4435Relacionamento =0,6013V26 (I) 2,8528 7,0136 0,5134 0,2638 0,3415V58 (I) 2,7378 6,6293 0,4066 0,1924 0,5247V64 (I) 3,5886 9,6864 0,3365 0,1360 0,6012Pensamento Analítico =0,6827V23 (N) 33,3578 24,7384 0,5333 0,2876 0,5995V12 (N) 34,1329 23,2100 0,4641 0,2308 0,6198V34 (N) 33,7998 24,1695 0,4279 0,2120 0,6362V36 (N) 33,4399 26,2477 0,4215 0,1989 0,6412V9 (N) 34,2822 22,4856 0,3836 0,1683 0,6677Desafio =0,4775V14 (N) 15,4561 15,9956 0,3393 0,1203 0,3281V49 (N) 16,8084 11,2141 0,2885 0,0848 0,4421V 31 (N) 15,4705 16,4195 0,2994 0,1005 0,3845

Tabela 7 Médias dos Construtos do PPE

CONSTRUTOS N Mínimo Maximo Média DesvioCompetência estratégica 965 4,38 10,00 8,76 1,01Risco 965 5,00 10,00 8,93 1,17Inovação 965 1,04 10,00 7,41 1,63Planejamento formal 965 1,45 10,00 7,99 1,54Dedicação 965 1,11 10,00 6,85 1,65Relacionamento 965 3,73 10,00 8,38 1,35Pensamento Analítico 965 3,28 10,00 8,43 1,20Desafio 965 1,65 10,00 7,93 1,72

Fonte: Dados da pesquisa - 2006.

Observa-se que os construtos risco, competência estratégica, pensamento analítico, empatia, planejamento formal, desafio e inovação, demonstram as maiores médias. Isto significa que os empreendedores tendem a ter maior prevalência desses traços, o que pode indicar o perfil básico dos empresários.

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O perfil do potencial empreendedor e seu impacto na gestão dos pequenos negócios

A baixa média do construto dedicação pode indicar que, ao menos para esses empresários, abrir mão da família e dos demais objetivos de vida não é um fato muito comum, isto é, tais empresários têm outras atividades e interesses que vão além do sucesso daquele negócio. De fato, isso pode indicar que a busca de equilíbrio entre trabalho e família, profissão e lazer, seja relativamente comum entre eles.

Além disso, buscou-se identificar quais fatores são determinantes do perfil empreendedor, bem como de suas dimensões particulares. Para tal, recorreu-se, nos casos apresentados em seqüência, à correlação não paramétrica de spearman , devido a sua maior robustez em casos extremos nas variáveis analisadas e, porque algumas variáveis são claramente ordinais, tais como o faturamento bruto das empresas (PESTANA e GAGEIRO, 2003). Usando tal perspectiva, foi possível fazer a avaliação da relação entre os fatores e as variáveis das empresas estudadas e analisadas.

4.3 Avaliação da relação entre o ppe e o desempenho do negócio

Para avaliar o modelo de pesquisa, utilizou-se a Modelagem de Equações Estruturais, pois a técnica tem a capacidade de lidar com erros de mensuração e relações entre construtos, em uma única análise. Para testar o modelo global, obteve-se uma amostra agregada de 965 casos, para um total de 97 parâmetros livres, o que indica um total de 9,94 observações na amostra, para cada parâmetro estimado no modelo. O modelo testado na pesquisa, utilizando somente as estruturas fatoriais, representado na figura 2.

Figura 2 Resultados da avaliação do impacto do PPE sobre o desempenho

PERFIL DOPOTENCIAL

EMPREENDEDOR

DESEMPENHODO NEGÓCIO

R2=0,25

??

0,50

VALOR

0,830,820,83

0,050,050,050,19297

ÍNDICE

2

g.lSig.

2/g.lGFIAGFIPGFINFIRFI

VALOR

3135,248930,00

3,510,870,850,780,780,77

ÍNDICE

IFITLICFI

RMSEARMSEALORMSEAHI

PCLOSEHFIVEHONE 306

Fonte: Dados da pesquisa - 2006

Obs: A carga padronizada é significativa ao nível de 0,01%.

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Os itens que compartilham mais variância com seus construtos recebem maior peso no cálculo dessas médias, de modo a refletir a maior importância desses para a mensuração do construto proposto. Através deste resultado, foi possível identificar quais das dimensões pesam mais para esse construto, bem como relatar a média global do PPE, que identificou o percentual de 8,130 para o Perfil do Potencial Empreendedor, entre os construtos definidos, que individualmente demonstraram em média, o seguinte resultado. (tabela 9.)

Observações: 1) média da escala caso o item seja excluído; 2) variância da escala caso o item seja excluído; 3) Correlação média inter item corrigida; 4) R2 múltiplo; 5) limite inferior do valor alfa caso o item seja apagado, valores em negrito indicam que haveria melhorias na confiabilidade das escalas caso os itens fossem excluídos.

TABELA 8 Avaliação da confiabilidade do construto desempenho do negócio.

INDICADORES MÉDIA1 VARIÂNCIA2 CORREL.3 R24 ALFA DEL.5

Desempenho do Negócio c=0,8891V81 53,7966 143,0298 0,6252 0,4388 0,8792V82 53,2551 146,8088 0,5953 0,4152 0,8822V83 54,3785 132,5413 0,6977 0,6569 0,8717V84 54,4967 127,5329 0,7594 0,7359 0,8651V85 54,0803 128,3740 0,7945 0,7138 0,8617V86 53,8819 130,9392 0,7774 0,6576 0,8639V87 53,8631 137,2239 0,5789 0,4010 0,8840V88 54,3361 138,4558 0,5160 0,3220 0,8914

Fonte: Dados da pesquisa 2006

Tabela 9 Média dos fatores do PPE

Fatores PPE Média DescritivoRisco 8,930 Disposição e aceitação do risco nos negóciosCompetência Estratégica 8,760 Postura pró-ativa e autoconfiança na estratégia

Pensamento Analítico 8,430 Afinidade com o processo de planejamento e análise do negó-cio e mercado

Relacionamento 8,380 Facilidade para relacionar-se com funcionários, círculo profis-sional, clientes

Planejamento Formal 7,990 Formalização de procedimento, planos e metasDesafio 7,930 Meta de realização pessoal

Inovação 7,410 Desenvolvimento de produtos e serviços com criatividade para o mercado

Dedicação 6,850 Aspecto central e pessoal na vida do empresário relacionado ao negócio

Considerando as variáveis que compõem a PPE, pode-se dizer que tal construto tem um impacto razoável sobre o desempenho das empresas, conforme relatado pelos empresários. De fato o construto PPE foi capaz de explicar aproximadamente 25% da variância do desempenho das empresas e do negócio. Assim, o modelo obteve resultados satisfatórios, conseguindo atingir patamares moderados de aos nos índices apresentados na tabela 8

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O perfil do potencial empreendedor e seu impacto na gestão dos pequenos negócios

Os resultados da pesquisa também estabeleceram uma comparaçação com relação aos fatores do PPE, por gênero, demonstrado, na figura 9.

Denota-se que as médias, por gênero, são bastante similares, mas duas diferenças foram apontadas pelo teste mann-whitney (p<0,05). Em primeiro lugar aponta-se que as mulheres se consideram mais simpáticas, se comparadas aos homens, o que pode ser reflexo da natureza feminina, de maior preocupação com os sentimentos e relacionamentos. Por outro lado, percebe-se que, eentre as empresárias pesquisadas, o desafio é mais forte que entre os homens, isto é, estariam sendo mais motivadas e desafiadas a fazer o empreendimento crescer do que o observado em relação ao sexo masculino.

Conclusão

Estudos e pesquisas vêm sendo realizados com o intuito de se identificar os aspectos relacionados aos resultados e ao desempenho das empresas no contexto gerencial. Mas, poucas, incursões no tema se, encontram estruturadas em bases que associam o perfil do empreendedor ao desempenho na gestão do negócio, buscando explicar o quanto esta integração impacta no sucesso do empreendimento.

As principais limitações deste trabalho exploratório centram-se no fato de se tratar de uma amostra aplicada ao contexto das pequenas empresas do estado de Minas Gerais. Desta forma, refinamentos nas escalas e pesquisas subseqüentes são fortemente recomendadas para dar maior sustentação aos estudos. Por outro lado, alguns pontos e considerações gerados podem ser significativos para a melhoria da gestão de empreendimentos, uma vez que os empreendedores, com a utilização do instrumento PPE, podem avaliar seu perfil, habilidades e deficiências de forma individual ou em grupos aprimorando aqueles fatores que geram maior impacto na natureza do empreendimento.

Assim sendo, sugere-se a realização de outras pesquisas complementares e posteriores a este estudo que possam explicar os 75% da variância não relacionada ao PPE e que são aspectos antecedentes e contributivos do desempenho do negócio.

Este estudo, portanto, pretende colaborar para o desenvolvimento do tema e para a construção de um modelo que identifique o índice do perfil do potencial empreendedor brasileiro e o seu impacto no desempenho dos pequenos negócios, conforme proposto na figura 4 .

5,44

7,39

6,88

8,33

8,37

8,03

7,93

7,67

8,82

5,52

7,44

7,85

6,87

8,49

8,55

8,32

8,01

7,65

8,72

8,06

0 2 4 6 8 10

Competência estratégica

Risco

Inovação

Planejamento formal

Dedicação

Empatia

Pensamento Analítico

Desafio

PPE

Desempenho

Masculino Feminino

Figura 9 Comparação das médias dos fatores do PPE por gênero.

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Entende-se que o desenvolvimento e aprimoramento do modelo e da escala do PPE, bem como sua mensuração, pode contribuir, de modo significativo, para o crescimento dos pequenos negócios se for possível estabelecer e validar, cada vez mais, a razão contributiva desses fatores para sucesso do empreendimento.

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Figura 4 Proposta: Modelo do Perfil do Potencial Empreendedor e impacto no desempenho do negócio Fonte: o autor

% Desempenhodo Neg ócio

Índice doPPE

Fatores PPE

1. Competência Estrat égica2. Risco3. Inova ção4. Planejamento Formal5. Dedica ção6. Relacionamento7. Desafio8. Pensamento Anal í tico

Percentis PPE

Muito AltoAltoMédioBaixoMuito Baixo

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Recebido: 11/10/2006 Aprovado: 25/02/2008