O Que é Economia Ecológica

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O que Economia Ecolgica

O que Economia Ecolgica?

No final dos anos 60 e anos 70, a emergncia do movimento ambientalista e o choque do petrleo fizeram dos recursos naturais, da energia e do ambiente em geral um tema de importncia econmica, social e poltica, o qual pode ser chamado Questo Ambiental. Esta trouxe a crtica ao modelo de desenvolvimento econmico vigente, apontando para um conflito, seno uma possvel incompatibilidade, entre crescimento econmico e preservao dos recursos ambientais, e que tal conflito, em ltima instncia traria limites continuidade do prprio crescimento econmico. Assim, a crtica ambientalista, surgida inicialmente nos meios cientficos e ambientalistas, vai progressivamente adentrando o campo da cincia econmica, dado ser o funcionamento do sistema econmico o objeto central da crtica. Neste processo, de grande destaque o impacto do Clube de Roma, com a publicao de The Limits to Growth, o Relatrio Meadows, de 1972. Tal trabalho aponta para um cenrio catastrfico de impossibilidade de perpetuao do crescimento econmico devido exausto dos recursos ambientais por ele acarretada, levantando assim proposta de um crescimento econmico zero. O debate passa ento a polarizar-se entre esta posio de crescimento zero - conhecida por neo-malthusiana - e posies desenvolvimentistas de direito ao crescimento (defendida pelo pases do terceiro mundo), indo desaguar na Conferncia da UNCED em Estocolmo em 1972. Nesta, como terceira-via, desenvolve-se a tese do Ecodesenvolvimento, segundo a qual desenvolvimento econmico e preservao ambiental no so incompatveis, mas, ao contrrio, so interdependentes para um efetivo desenvolvimento. Esta tese vem a desenvolver-se na proposio do Desenvolvimento Sustentvel, que adquire sua forma mais consolidada no Relatrio Brundtland de 1987 (Our Common Future), segundo a qual o Desenvolvimento deve ser entendido pela eficincia econmica, equilbrio ambiental e tambm pela eqidade social. De um modo geral, Desenvolvimento Sustentvel hoje ponto de passagem obrigatria no debate econmico, representando o ponto maior da penetrao da Questo Ambiental na Economia.

Nesta crtica ambientalista do final dos anos 60 e anos 70, que colocou a Questo Ambiental e do Desenvolvimento Sustentvel na ordem do dia da agenda inclusive do mainstream econmico, est justamente a raiz do que veio posteriormente a constituir-se enquanto a Economia Ecolgica. Esta crtica ambientalista origina-se no terreno das cincias fsicas e biolgicas, onde a partir de diferentes disciplinas e especialidades relacionadas s questes ambientais, ecolgicas e energticas veio-se progressivamente ao longo do tempo desenvolvendo anlises do funcionamento do sistema econmico e das inter-relaes entre este e o sistema ambiental. Afora o impacto de The Limits to Growth, alguns trabalhos clssicos e seminais, tanto de economistas quanto no-economistas, surgem no perodo, promovendo forte impacto nos meios acadmicos e ambientalistas, como The Economics of the Coming Spaceship Earth (1966) de Kenneth Boulding, The Entropy Law and the Economic Process (1971), de Nicholas Georgescu-Roegen, On Economics as a Life Science (1968) de Herman Daly, Environment, Power and Society (1971), de Howard Odum, entre outros. De tais autores provm uma linha de raciocnio crtico ao atual processo de crescimento econmico com base nos princpios e conceitos biofsicos ambientais e ecolgicos envolvidos, o que levou naturalmente a que estes princpios entrassem na discusso em torno da prpria natureza do processo econmico e de suas relaes com os recursos ambientais. Deste modo, veio constituindo-se um campo prprio de anlise do sistema econmico, apoiado em conceitos e ferramentas biofsico-ecolgicos, denominado bioeconomics, o qual veio produzindo abordagens e resultados diferenciados (e mesmo divergentes) dos encontrados pelas teorias econmicas convencionais.

Esta abordagem bioeconmica veio posteriormente a consolidar-se enquanto a base da hoje denominada Economia Ecolgica. Apesar de suas motivaes e fundamentaes remontarem assim ao prprio desenvolvimento da Questo Ambiental, a Economia Ecolgica vai apenas consolidar-se enquanto corrente mais efetivamente nos anos 80, com a fundao da International Society for Ecological Economics (ISEE) em 1988 e com a criao da revista Ecological Economics em 1989.

A Economia Ecolgica funda-se no princpio de que o funcionamento do sistema econmico, considerado nas escalas temporal e espacial mais amplas, deve ser compreendido tendo-se em vista as condies do mundo biofsico sobre o qual este se realiza, uma vez que deste que derivam a energia e matrias-prima para o prprio funcionamento da economia. Uma vez que o processo econmico um processo tambm fsico, as relaes fsicas no podem deixar de fazer parte da anlise do sistema econmico, o que a tornaria incompleta. Com isso, a natureza do problema envolve elementos tanto econmicos quanto biofsicos. Por sinal, o descaso ou pouca relevncia atribuda aos atributos biofsicos da economia nos modelos da economia convencional veio sendo assim um principal ponto de crtica e motivao da Economia Ecolgica.

A Economia Ecolgica conforma-se assim a partir deste reconhecimento maior da importncia da conexo entre o sistema econmico e o ambiente natural, e decorrentemente carrega o propsito de integrar-se analiticamente os componentes do sistema econmico com os do sistema ambiental, procurando-se assim compreender seu funcionamento comum. Deste modo, distinguindo-se tanto da economia convencional quanto da ecologia convencional, a Economia Ecolgica define-se assim enquanto um campo transdisciplinar o qual busca a integrao entre as disciplinas da economia e ecologia, e demais disciplinas correlacionadas, para uma anlise integrada dos dois sistemas. Neste sentido, a Economia Ecolgica no rejeita os conceitos e instrumentos da economia convencional e da ecologia convencional, e ir utiliz-los sempre que estes se fizerem necessrios, mas reconhece a insuficincia destes para o propsito de uma anlise integrada, apontando para a necessidade do desenvolvimento de novos conceitos e instrumentos.

Deste modo, por ser um campo pluralista transdisciplinar, na Economia Ecolgica encontram-se diversas (e mesmo divergentes) abordagens, ora se aproximando mais da economia, ora mais da ecologia. Diversas so as formas propostas de incorporao dos princpios biofsicos, assim como tambm so diversos os princpios econmicos elencados e diversas as formas de mediao propostas, o que faz com que a Economia Ecolgica mostre-se como um campo heterogneo dentro de seu propsito comum.

Apesar de sua heterogeneidade, neste seu propsito comum alguns aspectos so de reconhecimento geral como elementos unificadores. Um destes encontra-se no reconhecimento de que, para o entendimento do funcionamento do sistema econmico e de suas relaes com os recursos ambientais, fundamental a compreenso de seus fluxos e balanos materiais e energticos, o que coloca em posio de importncia central os princpios biofsicos, especialmente os princpios termodinmicos - Lei da Conservao (Primeira Lei da Termodinmica) e Lei de Entropia (Segunda Lei da Termodinmica).

Outro aspecto est em que, em seu esforo de compatibilizao entre economia e ecologia, a questo que se coloca para a Economia Ecolgica est justamente na busca da determinao da sustentabilidade desta interao, delineando-se as condies de estabilidade das diversas funes ecolgicas, particularmente a capacidade do ambiente em oferecer recursos naturais para o funcionamento do sistema econmico e em absorver seus rejeitos, ou seja, delineando-se em que medida as restries ambientais podem ou no constituir efetivamente limites ao crescimento econmico. Neste particular, a Economia Ecolgica no partilha do ceticismo pessimista alarmista ecolgico, que v tais limites como iminentes e intransponveis, pois ela reconhece que o progresso tecnolgico constantemente promove a superao de limites naturais pelo aumento de eficincia e pela substituio de recursos exaurveis por renovveis. Tampouco a Economia Ecolgica partilha do otimismo tecnolgico, o qual entende as restries naturais como um problema menor, pois estas sempre ho de ser superadas pela tecnologia, pois a Economia Ecolgica reconhece que o progresso tecnolgico de fato se d, mas apenas dentro de certos limites fisicamente possveis. Assim, a Economia Ecolgica no adota nenhuma posio a priori quanto a existncia ou no de limites ambientais ao crescimento econmico, adotando sim uma posio de ceticismo prudente, a qual busca justamente delimitar as escalas em que as restries ambientais podem constituir limites efetivos s atividades econmicas.

Um outro aspecto de reconhecimento geral est em que, justamente pela complexidade da interao entre economia e ambiente e pela busca da sustentabilidade desta interao para a eqidade com as geraes futuras, a Economia Ecolgica entende ser insuficiente o tratamento das questes ambientais apenas pela internalizao das externalidades tal como definidas pela economia neoclssica, ou seja, enquanto custos sociais dados pelas preferncias subjetivas dos indivduos e para os quais apenas no h um mercado. Nada implica que a otimizao de custos-benefcios com a incluso destas externalidades conduza a uma utilizao sustentvel dos recursos ambientais. Otimalidade no significa sustentabilidade; a menos se fosse possvel conhecer-se toda a complexidade das relaes do homem com a natureza e tambm os desejos e direitos das geraes futuras. A Economia Ecolgica entende que na interao entre o sistema econmico e o ambiente h relaes fundamentais cujos valores no so possveis de ser apreendidos a partir da precificao pelas preferncias dos indivduos, tais como as trocas materiais e energticas entre a economia e o ambiente - onde os recursos entram no sistema econmico como bens gratuitos lquidos e saem como custos lquidos para o ambiente -, como a importncia da biodiversidade para a estabilidade biogeoqumica global e para utilizao direta (conhecida ou potencial) pelo homem, ou como as assimetrias sociais na utilizao dos recursos ambientais, tanto entre diferentes naes e diferentes camadas das populaes em uma mesma gerao quanto entre as geraes atuais e as futuras.

De maneira geral, em sua diversidade interior pode-se encontrar na Economia Ecolgica posies que variam de um extremo mais prximo ecologia convencional a outro extremo mais prximo economia convencional de extrao neoclssica. Assim, de um lado vai-se encontrar na Economia Ecolgica abordagens que utilizam-se de formulaes e ferramentas da economia ambiental e economia dos recursos naturais neoclssicas, baseadas que so na valorao dos bens e servios ambientais a partir das preferncias e utilidades dos indivduos, expressas em termos monetrios. De outro lado, vai-se encontrar abordagens que buscam realizar anlises do sistema econmico a partir de critrios estritamente ecolgicos, para isso utilizando a energia como unidade geral de anlise do sistema, o que levou autores como Odum e seus seguidores a proporem uma teoria do valor-energia. Entre estes dois extremos, h contudo uma gama de autores que, em linha com as idias de Georgescu-Roegen, utilizam centralmente os princpios biofsicos (especialmente os termodinmicos), sem contudo entenderem que a dimenso social da economia possa ser reduzida a estes ou energia para sua compreenso. Neste sentido, destacam-se por exemplo os trabalhos de Norgaard, que atravs do conceito de coevoluo prope um marco terico o qual compreende o processo evolutivo da economia como o produto de uma interao de mtua determinao entre as foras dinmicas sociais e as foras dinmicas entrpicas naturais.

Enfim, a Economia Ecolgica um campo disciplinar ainda relativamente bastante novo, que vem encontrado um desenvolvimento bastante rpido e intenso, abrindo vrios caminhos de investigao e buscando amadurecer e consolidar sua estrutura analtica terica e seus instrumentos e ferramentas. Contudo, este um esforo que demanda ainda muito trabalho e cooperao daqueles que, no apenas na comunidade acadmica mas tambm nas instituies gestoras de polticas, nas organizaes no-governamentais e no meio empresarial, nos nveis local, regional, nacional e internacional, dediquem-se busca de uma equao de Sustentabilidade no desenvolvimento econmico com o meio-ambiente.

Maurcio de Carvalho AmazonasEx-presidente da Sociedade Brasileira de Economia Ecolgica (1999/2001)http://www.nepam.unicamp.br/ecoeco/tela_princ.html

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