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O QUE É VALOR PARA A ENGENHARIA E ANÁLISE DO VALOR? (*)
André A. Abramczuk
RESUMO
Apresenta-se aqui uma proposta de definição operacional de valor adequada para
a prática da Engenharia e Análise do Valor (EAV). Espera-se que essa definição
operacional contribua para eliminar a proliferação de conceitos discrepantes e de
diferentes definições operacionais de valor que se encontram em textos e
manuais especializados.
1. INTRODUÇÃO
Manuais de Engenharia e Análise do Valor (EAV) são unânimes na afirmação de
que a base teórico-filosófica da EAV é constituída pelos conceitos de função,
custo e valor. Não são unânimes, contudo, a respeito do que deva ser
compreendido sob essas palavras nem das noções a que essas palavras se
referem. As maiores discrepâncias envolvem os conceitos de custo e de valor e as
correspondentes definições operacionais. Analisadas do ponto de vista lógico, a
maioria das definições operacionais apresentadas nesses manuais contém
inconsistências no aspecto prático e principalmente no aspecto teórico-filosófico.
Dessa crítica não se livram nem mesmo autores de renome no campo da EAV,
que GREEN (1997) considera imaturos do ponto de vista teórico-filosófico.
Estendendo e complementando as ideias de ABRAMCZUK (2005), esse artigo
oferece uma definição operacional de valor adequada para a prática da EAV e
logicamente consistente do ponto de vista teórico-filosófico.
2. A PALAVRA E O CONCEITO
Valor é palavra com múltiplos significados. O dicionário Houaiss da língua
portuguesa registra-lhe vinte e uma acepções no singular, três no plural. Valor faz
parte de uma família de palavras – valência, valente, valer, valia etc. – todas com
raiz na palavra latina valere (ser forte, estar bem, ter méritos).
(*) Elaborado para o XI Seminário Mineiro de Engenharia e Análise do Valor aplicada a
Empreendimentos. ASSENDER (Associação dos Engenheiros do DER/MG); ABEAV (Associação
Brasileira de Engenharia e Análise do Valor). Belo Horizonte (MG, Brasil): 18. maio, 2010.
Na Antiguidade o termo era empregado no campo das atividades econômicas para
designar a qualidade que faz com que uma mercadoria seja objeto de preferência
ou de escolha, e por metáfora passou a designar a qualidade de qualquer objeto
de preferência ou de escolha também no campo da moral e da ética. Embora uma
doutrina de valores tenha sido elaborada já pelos filósofos estóicos na Grécia, uma
teoria de valores no sentido moderno do termo (qualidade de algo que “vale”
independentemente de “ser” e de “realidade”) teve origem somente no crepúsculo
do século XIX, sob o nome de Axiologia (literalmente, teoria dos valores).1
3. O VALOR ECONÕMICO
De todos os valores que as teorias axiológicas levam em consideração, às ciências
econômicas interessa somente o valor econômico (JENSEN, 2005; NORTH, 1992).
O ano de 1776 é geralmente considerado o ano do advento das ciências
econômicas, com a publicação da obra de Adam Smith (1723-1790), An Inquiry
into the Nature and Causes of the Wealth of Nations. Nessa obra Adam Smith faz
referência a duas espécies de valor, valor de uso e valor de troca. O valor de
troca de um objeto é o poder de compra de outros objetos que a posse desse
objeto representa, o valor de uso de um objeto é sua utilidade.2
Entendendo a utilidade de um objeto de acordo de acordo com o conceito de
utilidade enunciado por Thomas Hobbes (1588-1679), Adam Smith fez contraste
entre os valores de uso e de troca da água e de diamantes, formulando o
paradoxo do valor: as coisas que têm maior valor de uso têm geralmente pouco
ou nenhum valor de troca e, pelo contrário, coisas que têm o maior valor de troca
têm pouco ou nenhum valor de uso.
Numa tentativa de eliminar o paradoxo do valor, David Ricardo (1772-1823)
estabeleceu que a utilidade não serve como medida do valor de troca, embora lhe
1 Para quem tiver interesse em se aprofundar na análise da questão sob aspecto teórico-filosófico,
recomenda-se ver de início o tratamento sucinto dado ao tema por ABBAGNANO (2000), FUNK
(2001) e REALE (1995).
2 Adam Smith, Riqueza das Nações (2 vol.s). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1987.
Tradução da 6a. edição de An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations.
London: Methuen, 1950.
seja essencial; bens que possuem utilidade vão buscar o valor de troca em sua
escassez e na quantidade de trabalho necessária para sua obtenção.3
Causa de problemas para os economistas clássicos, o paradoxo do valor não
existe para os economistas neoclássicos, que dele se desfizeram (ou o
contornaram!) por meio de abandonar a noção de utilidade de Adam Smith e
substituí-la por outra noção. De acordo com esta, existem duas espécies de
utilidade, ou de valor de uso: utilidade intrínseca (ou valor de uso objetivo) e
utilidade extrínseca (ou valor de uso subjetivo). Nesse novo entendimento, a
utilidade intrínseca é definida como propriedade inerente ao objeto (por exemplo,
o poder calorífico do carvão, a potência de um motor elétrico etc.), enquanto a
utilidade extrínseca, exterior ao objeto, é definida como a importância que
alguém atribui ao objeto como meio para alcançar um fim, obter um benefício por
meio de sua posse e utilização. Um objeto com a mesma utilidade intrínseca pode
ter diferentes utilidades extrínsecas para diferentes pessoas.4
É a utilidade extrínseca o elemento determinante do valor de troca. Este,
inicialmente vinculado a relações entre pessoas, atualmente é uma noção que
envolve somente relações entre coisas, mais especificamente entre mercadorias.5
Adam Smith definiu o valor de troca de um objeto como o poder de compra de
outros objetos que a posse desse objeto representa.6 Atualmente é comum ler
3 David Ricardo, Princípios de Economia Política e de Tributação. Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian, 1983. Tradução do texto inglês intituladoThe Principles of Political Economy and
Taxation. London: J. M. Dent & Sons, 1965.
4 Vilfredo Pareto (1848-1923) criou a palavra ofelimidade (do grego Ωφέλιμος: útil, vantajoso,
proveitoso) e a utilizou no lugar de utilidade, buscando exprimir com ela um conceito de
valoração totalmente subjetiva, sem as conotações dadas à palavra utilidade pelas concepções
de Hobbes adotadas por Adam Smith. Com ofelimidade Pareto designava o caráter de uma coisa
qualquer que corresponde ao nosso desejo, algo com valor de troca, mas não necessariamente
útil para a saúde e a sobrevivência das pessoas (cocaína, por exemplo!). Atualmente a palavra
raramente aparece na literatura econômica.
5 BOURGUIGNON (2005) apresenta uma análise das conseqüências sociais da transformação da
noção de valor de troca como relação entre pessoas para a atual noção como relação entre
coisas.
6 Adam Smith, op. cit.
em manuais de ciências econômicas que o valor de troca de um objeto é sua
equivalência quantitativa estabelecida comparativamente com outros objetos, isto
é, a quantidade de determinado produto que alguém está disposto a dar em troca
de determinada quantidade de outro produto que deseja obter. Uma pergunta a
que esses manuais não dão resposta é, contudo, quais os critérios comparativos
que levam à determinação das equivalências quantitativas dos produtos
envolvidos na permuta, isto é, seus preços relativos (essa questão é denominada
“o problema da transformação” nos compêndios de economia marxista).
Tanto os economistas clássicos quanto os economistas neoclássicos admitem que
o valor de troca de um produto representa sua utilidade econômica, isto é, o
poder de compra de outros produtos que a posse desse produto representa, a
característica que faz com que ele seja uma mercadoria. Na troca de mercadorias
permutam-se utilidades extrínsecas; esta é um valor de uso subjetivo que
determina a escala de preferências de acordo com a qual as pessoas ordenam
meios e fins que lhes são oferecidos para escolha e permuta, uma vez que não
podem dispor de todos os meios para alcançar todos os fins.7
Mas a permuta não é de idênticas utilidades extrínsecas; os agentes envolvidos
numa permuta atribuem menor importância àquilo que estão dispostos a dar em
troca do que àquilo que desejam obter por meio da troca. Vale perguntar, então:
Qual o critério em que alguém se fundamenta para atribuir dada importância ao
produto que está disposto a dar em troca e comparar essa importância com a
importância de outro produto que deseja possuir e utilizar Resposta: Da
comparação que faz entre os desconfortos e privações em que incorreu para
obter o objeto a cuja posse está disposto a renunciar e a compensação que
espera obter com a utilidade extrínseca do produto que deseja obter pela troca.
Os desconfortos e privações em que alguém incorre na expectativa de uma
compensação constituem um custo. O custo de um produto de que alguém tem
posse é, então, o montante de recursos de qualquer natureza de que abriu mão
para obter o produto na expectativa de utilizá-lo como meio para atender a um
propósito. O propósito a que o produto deve atender é sua utilidade extrínseca. É
a antevisão do produto como meio para atender a dado propósito que determina
7 Discussão mais extensa e profunda desse ponto encontra-se em MISES (1995).
se a obtenção do produto compensa o custo de sua obtenção. Em outras
palavras, o valor de um produto é resultado de um julgamento subjetivo
fundamentado na relação compensação/custo. O lavrador que cultiva batatas
incorre em custos ao se dedicar a cuidar da lavoura por intervalo de tempo
relativamente longo entre semear a terra e colher os frutos de seu trabalho e, se
assim o faz, é porque tem a expectativa de, no fim desse intervalo de tempo, ter
uma compensação: dispor de alimento para si e sua família e, em épocas
favoráveis, de um excedente de produção que utilizará como mercadoria para
permutar por outros produtos que tal excedente lhe permita obter.
Com a introdução da moeda como referência comum para as transações
comerciais, a compensação que o ofertante de um produto espera receber por
ofertá-lo no mercado é o preço por que espera vender o produto. Para o
ofertante o valor do produto é representado, então, pela relação preço/custo.
Além de referência comum para trocas de mercadorias, a moeda se presta ao
papel de unidade de conta para o cálculo dos custos. Com isso se tem que o valor
do produto para seu ofertante, expresso pela relação preço/custo, é uma relação
entre unidades monetárias.8
Quem busca adquirir algum produto no mercado busca obter uma satisfação que
a posse e utilização do produto possam lhe proporcionar. Para o adquirente do
produto, o preço que deve pagar ao ofertante é uma parcela dos dispêndios em
que incorre para adquirir o produto, na expectativa de auferir por meio de sua
posse e utilização uma satisfação, um benefício. O montante de dispêndios em
que o adquirente incorre para adquirir o produto representa o custo de aquisição
do produto, do qual o preço é uma parcela. Para o adquirente do produto o valor
do produto é representado igualmente pela relação compensação /custo, mais
especificamente por
valor = benefício ÷ custo de aquisição
8 A introdução da moeda é, portanto, um fator determinante da transformação da noção
econômica de custo em noção contábil. Para detalhes sobre as diferenças entre essas noções
recomenda-se ver <http://www.willamette.edu/~fthompso/pubfin/Cost_Analysis.html>.
Quem adquire um produto não leva em consideração somente o custo de
aquisição do produto, mas também os custos em que irá incorrer para utilizar o
produto como meio para atingir um fim. A antevisão desse custo de utilização do
produto como meio para atender a dado propósito certamente serve de
referência para determinar se a aquisição do produto compensa não somente o
custo de sua aquisição, mas também o custo de sua utilização. Em outras
palavras, a utilidade extrínseca do produto para o seu adquirente, ou o valor de
uso subjetivo, leva em conta julgamentos fundamentados não somente na
relação benefício/custo de aquisição, mas também na relação benefício/custo de
utilização.
Do lado do ofertante do produto o valor agregado por diferença é expresso em
unidades monetárias e o índice de valor agregado é um quociente entre grandezas
de mesma espécie, do lado do adquirente do produto as relações benefício/custo
de aquisição e benefício/custo de utilização envolvem o benefício. Enquanto este
não for resultado de uma definição operacional que o faça grandeza mensurável,
as relações benefício/custo de aquisição e benefício/custo de utilização têm
significado puramente subjetivo, não se prestando para nenhum cálculo
matemático.
A definição do valor de troca pela relação benefício/custo pode ser generalizada
para o lado do ofertante de um produto e para o lado do adquirente potencial
desse produto, posto que ao numerador podem se atribuir diferentes significados
(KHALIFA; 2004). A natureza do valor de troca é determinada pela natureza do
custo (custo de produção, de aquisição, utilização etc.). É, todavia, indiscutível que
entre valor e custo existe uma relação inversa, se o benefício for constante: menor
o custo, maior o valor.
4. O VALOR NA EAV
A concepção de valor integrada aos fundamentos da Value Analysis por Lawrence
D. Miles é a de que o valor “(...) é determinado por duas considerações:
desempenho e custo” (MILES, 1989, p. 6).9 O desempenho a que Miles se refere é
o desempenho da função, o que faz com que o valor de interesse para a EAV seja:
9 No original: This best value is determined by two considerations: performance and cost. O itálico
é do original.
valor = desempenho da função ÷ custo
O desempenho da função pode ser extrínseco ou intrínseco. Se intrínseco, isto é,
efeito mensurável de acordo com padrões constantes e procedimentos uniformes,
conhecidos, aceitos e compartilhados por toda uma comunidade de especialistas,
então o valor decorre de uma relação numérica que exprime um valor absoluto,
composto por um número e uma unidade de medida.
Sejam dois produtos, A e B, que desempenham a mesma função. Para cada um
deles ter-se-á:
(valor)A = (desempenho da função)A / (custo)A
(valor)B = (desempenho da função)B / (custo)B
Se os custos forem da mesma espécie (custo de produção, de aquisição, de
utilização etc.), então é possível determinar um valor relativo (de produção, de
aquisição, de utilização etc.) resultante da comparação de ambos os valores
absolutos. O valor do desempenho da função pelo produto A relativamente ao
valor do desempenho da função pelo produto B será, então, um número
adimensional dado por
(valor)A/B = (valor)A ÷ (valor)B
(valor)A/B = (desempenho da função)A
(custo)B
(desempenho da função)B (custo)A
Se o desempenho da função pelo produto A for exatamente idêntico ao
desempenho da função pelo produto B, e somente nessa condição, ter-se-á:
(valor)A/B = (custo)B /(custo)A
Esta a definição simplificada de valor adotada por Miles; em suas considerações,
além de induzir a ideia de que valor e custo são a mesma coisa, ele se refere
somente a esse valor relativo: “Sendo valor uma grandeza relativa e não absoluta,
é a comparação que deve ser utilizada na determinação do valor de funções”
(MILES, 1989, p. 40).10
10 No original: Value being a relative rather than an absolute measure, the comparison approach
must be used in evaluating functions.
Ao considerar o valor como relação entre custos de objetos que apresentam
idêntico desempenho de função, Miles não teve necessidade de sugerir
procedimentos para a determinação quantitativa do desempenho da função. Na
prática há, contudo, situações em que associar um número ao desempenho da
função é primordial para uma decisão. Seja o exemplo de um automóvel que pode
usar como combustível gasolina ou álcool carburante. Seja o rendimento do veículo
com gasolina igual a 14 quilômetros por litro e 12 quilômetros por litro com álcool
carburante. Se o preço do litro da gasolina for R$ 2,94, qual pode ser o preço
máximo do álcool, para que seja mais vantajoso abastecer o veículo com álcool em
vez de com gasolina? Para definir esse preço máximo do álcool carburante é
necessário levar em conta o desempenho do veículo com gasolina e o desempenho
com álcool. Fazendo
desempenho com gasolina
preço do álcool = 1
desempenho com álcool preço da gasolina
determina-se que o preço máximo do álcool deve ser inferior a R$ 2,52 por litro.11
Outro exemplo é por que lâmpadas fluorescentes são vistas como mais
“econômicas” que lâmpadas incandescentes. A explicação está no custo de
utilização do desempenho da função. Uma lâmpada fluorescente tem eficiência
energética de 60 lumens por watt, uma lâmpada incandescente tem eficiência
energética de 15 lumens por watt. O preço da unidade de energia elétrica
(R$/kWh) é o mesmo para ambas as lâmpadas, mas a relação 60/15 indica que
com a lâmpada fluorescente se obtêm maior fluxo luminoso por unidade monetária
despendida com energia elétrica do que com uma lâmpada incandescente. Esta
necessita de quatro vezes mais energia por unidade de tempo que uma lâmpada
fluorescente para produzir o mesmo fluxo luminoso.
Ambos os exemplos consideraram situações em que valor foi determinado pelas
características de desempenho da função e os correspondentes custos. Podem,
contudo, ocorrer situações em que o valor deva envolver outras considerações. Por
exemplo, uma lâmpada fluorescente A tem a mesma eficiência energética (60
lumens/watt) que outra (lâmpada B) e ambas consomem 20 watts. O preço da
11 Isso vale desde que os custos de utilização da gasolina e do álcool sejam idênticos.
lâmpada A é R$ 11,30, o preço da lâmpada B é R$ 12,70. Qual das lâmpadas é
mais vantajoso comprar? Seguramente as pessoas dirão que a lâmpada A. Mas, se
a expectativa de vida útil da lâmpada A é de seis mil horas e a da lâmpada B é de
oito mil horas, qual delas é mais vantajoso comprar?
Os exemplos acima fizeram comparações entre dois produtos. Quando a
comparação envolver mais de dois produtos por meio de seus valores relativos,
deve-se escolher o valor absoluto de um dos produtos como referência para
determinar os valores relativos de todos os produtos. O valor relativo do produto
de referência será igual á unidade. Para exemplo usam-se a seguir dados
referentes a cinco marcas de café solúvel comercializadas em embalagens de
vidro. Os preços foram coletados num supermercado.
café peso líquido
(gramas) preço (R$)
A 50 3,44
B 50 3,79
C 50 3,29
D 50 2,99
E 100 6,99
F 100 5,69
G 100 6,79
H 100 5,85
I 200 11,99
J 200 11,99
Considerando idênticos desempenhos da função por parte de todos os cafés (isto
é, com idênticos volumes de granulado de café solúvel se produzem idênticos
volumes de bebida), o valor absoluto de aquisição de cada café é dado pela divisão
do peso líquido pelo preço.
café peso líquido
(gramas) preço (R$)
valor absoluto
(gramas/R$)
A 50 3,44 14,53
B 50 3,79 13,19
C 50 3,29 15,20
D 50 2,99 16,72
E 100 6,99 14,31
F 100 5,69 17,57
G 100 6,79 14,73
H 100 5,85 17,09
I 200 11,99 16,68
J 200 11,99 16,68
Para o cálculo dos valores relativos, escolhe-se um dos valores absolutos como
referência. A tabela a seguir apresenta os resultados relativamente ao valor
absoluto do café A.12
café valor absoluto
(gramas/R$) valor relativo
A 14,53 1
B 13,19 0,908
C 15,20 1,046
D 16,72 1,151
E 14,31 0,985
F 17,57 1,209
G 14,73 1,014
H 17,09 1,176
I 16,68 1,148
J 16,68 1,148
Classificando os cafés por ordem crescente dos valores relativos, tem-se:
café valor absoluto valor relativo
12 A escolha recaiu sobre o café A por ser o primeiro da tabela.
(gramas/R$)
B 13,19 0,908
E 14,31 0,985
A 14,53 1
G 14,73 1,014
C 15,20 1,046
I 16,68 1,148
J 16,68 1,148
D 16,72 1,151
H 17,09 1,176
F 17,57 1,209
A ordenação dos cafés pelos valores relativos não se altera se para o cálculo
destes for escolhido como referência o valor absoluto de outro café.
5. CONCLUSÃO
A partir da concepção de valor de troca como relação entre um benefício e o custo
em que se incorre para obtê-lo, estabeleceu-se a definição operacional de valor de
interesse para a EAV, o valor da função:
valor da função = desempenho da função ÷ custo
Definido um procedimento para determinar o desempenho da função em termos
numéricos, esse valor será uma grandeza derivada constituída por um número e
uma unidade de medida e denominado valor absoluto.
Numa decisão em que o valor absoluto (e não apenas o custo) seja o único
critério de escolha entre alternativas de desempenho de uma função, deveria ser
questão fora de dúvida que a alternativa que apresentasse o maior valor absoluto
fosse a preferida. Embora verdade em princípio, isso pode não ser verdade na
prática, onde requisitos e restrições das mais variadas naturezas podem impor
outra escolha que não a recomendada pela lógica dos números – o que não
invalida a lógica dos números (KHALIFA, 2004).
Dados dois produtos, A e B, que desempenham a mesma função, o valor do
desempenho da função pelo produto A relativamente ao valor do desempenho da
função pelo produto B é dado por
(valor relativo)AB = (valor absoluto de A) /(valor absoluto de B).
Posto que relação entre grandezas de mesma espécie, o valor relativo é um
número adimensional.
Como não existe uma referência universal de valor absoluto, na prática é
necessário certo cuidado ao apresentar dados fundamentados em valores
relativos. Se, para o cálculo dos valores relativos de um conjunto de valores
absolutos, for escolhido como valor de referência o menor dos valores absolutos,
haverá um valor relativo igual à unidade e os demais serão superiores à unidade;
se for escolhido o maior valor absoluto, haverá um valor relativo igual à unidade e
os demais serão inferiores à unidade; se for escolhido um valor absoluto
intermediário (como no caso dos cafés), haverá um valor relativo igual à unidade,
alguns superiores à unidade e outros inferiores. Isso implica que se deve
mencionar o valor absoluto utilizado como referência para a elaboração de uma
tabela de valores relativos, desde que não haja motivos de força maior que o
impeçam.
Esse artigo deixa em aberto a questão de como determinar o valor da função
quando o desempenho for extrínseco, caso das funções de estima e simbólicas,
como definidas em ABRAMCZUK (2005).
REFERÊNCIAS
ABBAGNANO, N. Dicionário de Filosofia [Dizionario di Filosofia, 1971]. 4ª. ed.
São Paulo: Marins Fontes, 2000.
ABRAMCZUK, A. A. Engenharia e Análise do Valor para cientistas,
empresários e cia. São Paulo: Scortecci, 2005.
BOURGUIGNON, A. Management accounting and value creation: the profit and
loss of reification. Critical Perspectives on Accounting. Vol. 16, No. 4,
2005, pp. 353-389.
FUNK, K. What is a Worldview? Disponível em
<http://web.engr.oregonstate.edu/~funkk/>, 2001. Acesso em 10. mar. 2010.
GREEN. S. D. New directions in value management. Proc. of Hong Kong Institute
of Value Management International Conference: Effective Change through
Value Management. Hong Kong, November 12-13, 1997. 8pp.
JENSEN, P. A. Value concepts and value based collaboration in building projects.
Proc. of CIB W096 Architectural Management, 'Special Meeting' on Designing
Value: New Directions in Architectural Management. Technical University of
Denmark, Kgs. Lyngby, November 2-4, 2005. 8pp.
KHALIFA, A. S. Customer value: a review of recent literature and an integrative
configuration. Management Decision. Vol. 42, No. 5, 2004. pp. 645-666.
MILES. L. D. Techniques of Value Analysis and Engineering. 3rd. ed.
Northbrook, Ill: Lawrence D. Miles Value Foundation, 1989.
MISES, L. von. Ação humana: um tratado de economia [Human action: a
treatise on economics, 1949, 1966]. Trad. Donald Stewart Jr. – 2. ed. – Rio de
Janeiro: Instituto Liberal, 1995.
NORTH, G. The Coase theorem: a study in economic epistemology. Tyler,
TX: Institute for Christian Economics, 1992.
REALE, G. História da Filosofia Antiga [Storia della filosofia antica, in cinque
volumi, 1975-1980]. São Paulo: Loyola, 1995. Obra em 5 volumes.
APÊNDICE
O que é definição operacional?
Definição operacional é um processo de transformação de um conceito abstrato
em grandeza empiricamente observável e mensurável. Ou seja, definição
operacional é a descrição de algo em termos de um processo específico ou de um
conjunto de testes de validação para determinar a existência e a quantidade desse
algo. As propriedades de um objeto descritas dessa maneira devem ser acessíveis,
de modo que um número indeterminado de pessoas possa repetir
independentemente e à vontade o processo ou os testes de validação.
Essa noção de definição operacional tem origem nas ideias enunciadas em 1914
pelo cientista britânico Percy Williams Bridgman (1882-1961) sob o rótulo de
operacionalização. Esta consiste em definir um conceito difuso de tal modo que
seja mensurável na forma de variáveis identificáveis de acordo com observações
específicas. Em sentido mais amplo, a operacionalização consiste em um processo
de especificação da extensão de um conceito.
Apesar das controvérsias filosóficas suscitadas pelas ideias de Bridgman, a noção de
definição operacional tornou-se fundamental para todas as ciências, além de ter
grande utilidade prática nas engenharias. Em seus escritos sobre qualidade, por
exemplo, W. Edwards Deming dá especial importância à utilização da definição
operacional em todos os acordos e contratos de negócios. É de Deming a noção de
definição operacional como procedimento que as partes envolvidas e afetadas
concordam em utilizar como forma de traduzir um conceito em mensuração de
alguma natureza (V. DEMING, W. E. Out of the crisis. Cambridge, MA: MIT Center
for Advanced Engineering Study, 1986. pp. 276-296).
André A. Abramczuk
O QUE É VALOR
PARA A
ENGENHARIA E ANÁLISE DO VALOR?
Belo Horizonte, MG: 18. maio, 2010.
I. DIGRESSÃO FILOSÓFICA
II. O QUE HÁ NUMA PALAVRA
III. O VALOR NA EAV
I
DIGRESSÃO FILOSÓFICA
WELTANSCHAUUNG
worldview
visão de mundo
cosmovisão
FUNK, K.
Os elementos da cosmovisão de uma pessoa, suas crenças sobre certos
aspectos da realidade, dependem de sua
•epistemologia: crenças sobre a natureza e as fontes do conhecimento.
•metafísica: crenças sobre a natureza última da realidade.
•cosmologia: crenças sobre as origens e a natureza do universo, da
vida e do ser humano em especial.
•teleologia: crenças sobre o significado e o propósito do universo,
de seus elementos inanimados e de vida em todas as
suas formas.
•teologia: crenças sobre a existência e natureza de uma
divindade.
•antropologia: crenças sobre a natureza e o propósito do ser humano
em geral e de sua própria pessoa em particular.
•axiologia: crenças sobre a natureza do valor, sobre o que é bom e
mau, certo e errado.
JENSEN, P. A.
Como conceito, valor tem muitos e diferentes significados e usos. Há uma
diferença básica entre valor no singular, que expressa a importância de
algo, e valores no plural, que tem relação com crenças pessoais e
comportamento social.
A partir dos estudos de escritos pertinentes estabeleceram-se as seguintes
categorias de valor:
1. Valores religiosos – valores como sistema de crenças transcendentais
2. Valores comportamentais – valores de moral e de ética
3. Valor econômico – valor como troca
4. Valor de uso – valor como utilidade
5. Valor cultural – valor como significado e signo
6. Valor de percepção – valor como experiência
AXIOLOGIA
• Teoria ou estudo dos valores,
primariamente dos valores intrínsecos
(como os éticos, estéticos e religiosos),
mas também dos valores instrumentais
(como os econômicos) com referência
particular à maneira por que podem ser
conhecidos e experimentados, sua
natureza, espécie e ontologia.
..., então valor é
propriedade inerente
ao objeto, eterna e
universalmente
constante.
objetivo subjetivo
..., então valor é
referência eterna e
universalmente
válida, determinada
por um sujeito.
..., então valor é
propriedade
dinâmica do objeto,
podendo mudar
no tempo
e no espaço.
..., então valor é a
importância
atribuída a algo por
um sujeito,
em dado tempo e
em determinado lugar.
absoluto
relativo
Se valor é
e
FUNK, K. What is a Worldview?
O sentido do mundo deve estar fora dele. No mundo tudo é como é e acontece como acontece; no mundo não há valor e se houvesse, não teria valor algum. Se houver valor que tenha valor, então deve permanecer fora de todos os acontecimentos e fora das coisas como elas são, pois os acontecimentos e os modos de ser das coisas são acidentais.
Ludwig Wittgenstein, Tractatus Logico-Philosophicus, prop. 6.41.
II
O QUE HÁ NUMA PALAVRA
What's in a name?
That which we call a rose
By any other word would smell as sweet.
“The Most Excellent and Lamentable Tragedy of
Romeo and Juliet” (II, i: 85-86)
CONCEITO
com referente
sem referente
GRANDEZA
GRANDEZA UNIDADE DE MEDIDA
procedimento
de
medição
DEFINIÇÃO OPERACIONAL
Nas ciências econômicas:
VALOR DE USO
VALOR DE TROCA
VALOR DE USO
• OBJETIVO – ou UTILIDADE INTRÍNSECA
• SUBJETIVO – ou UTILIDADE EXTRÍNSECA (ou ofelimidade)
UTILIDADE INTRÍNSECA
• valor de uso objetivo, valor intrínseco:
– Propriedade inerente à natureza do objeto, que lhe confere a capacidade de produzir um efeito mensurável de acordo com critérios objetivos e intersubjetivos, isto é, em conformidade com padrões constantes e procedimentos uniformes, conhecidos, aceitos e compartilhados por toda uma comunidade de especialistas.
UTILIDADE EXTRÍNSECA
• valor de uso subjetivo, valor extrínseco:
– Importância que alguém atribui aos serviços que pode obter com a posse e utilização de um objeto.
– Importância atribuída a um objeto cuja posse e utilização o fazem meio adequado para alcançar um fim, obter um benefício..
utilidade intrínseca utilidade extrínseca
efeito que um
objeto tem
capacidade de
produzir
consecução de um
propósito humano
Um objeto pode ter capacidade de produzir um efeito mensurável de acordo com critérios objetivos e intersubjetivos, mas não ter nenhuma utilidade extrínseca em dado estágio do conhecimento humano.
VALOR DE TROCA
• Poder de aquisição de outros objetos que a
posse de determinado objeto representa.
• Equivalência quantitativa de um objeto
estabelecida comparativamente com outros
objetos.
• quantidade de determinada mercadoria que
alguém está disposto a dar em troca de
determinada quantidade de outra mercadoria
que deseja obter.
• MERCADORIAS: A, B, ..., N
• QUANTIDADES: n, m, ..., t (m³, kg etc.)
VALOR DE TROCA:
n.A = m.B = ... = t.N
• Troca implica comparação.
• Troca de mercadorias implica transação bilateral.
• O objeto da transação é a utilidade extrínseca das
mercadorias.
• Uma transação ocorre somente quando quem dá
uma mercadoria A em troca de uma mercadoria B
atribui menor utilidade extrínseca à mercadoria A
do que à mercadoria B e reciprocamente.
• Consequentemente, uma transação ocorre somente
quando ambas as partes envolvidas consideram
que obtêm um ganho com a transação.
UMA RESPOSTA PLAUSÍVEL:
Da comparação que faz entre a utilidade extrínseca do produto que deseja obter pela troca e a compensação que espera pelos desconfortos e privações em que incorreu para obter o objeto a cuja posse está disposto a renunciar.
PERGUNTA:
Como alguém atribui um valor de troca para o produto que está disposto a dar em troca
CUSTO: desconfortos e privações em que alguém incorre para obter o objeto a cuja posse está disposto a renunciar em troca de outro objeto.
PREÇO:compensação que alguém espera pelos desconfortos e privações em que incorreu para obter o objeto a cuja posse está disposto a renunciar em troca de outro objeto.
COLOCANDO EM TERMOS DE DINHEIRO
PARA QUEM VENDE...
Preço:
montante de dinheiro que deseja receber em troca do custo em que incorreu para colocar a mercadoria em oferta no mercado.
valor de troca = preço / custoprd
custoprd = custo de “produção”
PARA QUEM COMPRA...
Preço:montante de dinheiro que está disposto a desembolsar em troca do benefício que espera obter com a posse e utilização da mercadoria.
valor = benefício / preço
DUAS ESPECIES DE VALOR, PARA QUEM COMPRA:
valor de troca = benefício / custo de aquisição
custo de aquisição = preço de compra
+
custos associados à compra
valor de utilização = benefício / custo de utilização
SE
para quem vende
VALOR DE TROCA = PREÇO / CUSTOprd
para quem compra
VALOR DE TROCA = BENEFÍCIO / CUSTOaq
ENTÃO
valor de troca NÃO É preço.
III
O VALOR NA EAV
= worth / cost
= price / worth
= function / cost
= (function + quality) / cost
VALUE
= importance / cost
The relative worth of something as measured by its
qualities or by the esteem in which it is held.
A concept encompassing three other terms – function, worth,
and cost. One should remember that value is always defined
by the user or customer (not by the producer or seller).
The relationship between the worth or utility of an item
(expressed in monetary terms) and the actual monetary cost of
the item.
A measurement of the worth of a specific product or service by a
customer.
VALUE
The lowest life-cycle cost to achieve the required function.
“value”: the lowest cost that would provide a function
with the qualities and specifications with which the
customer wants it to operate.
value = “value” / cost
A measure of how well the end product meets the involved
essential needs and the added desires of those that have a voice
in the product selection or its use.
The lowest cost that is required to produce or obtain an
essential function of an item or service.
Least expensive method of performing the basic function.
The lowest cost to reliably achieve the required function.
WORTH
The appropriate cost of a specified function under
specified conditions.
PROPOSTA
custo totalcusto
projetado
custo
básico
perdas e desperdícios
custos
desnecessários
valor da função
• RELAÇÃO ENTRE A UTILIDADE DA
FUNÇÃO DE UM OBJETO E O CUSTO
DA FUNÇÃO.
VALOR DE FUNÇÃO INTRÍNSECA
• Para o fabricante:
DESEMPENHO DA FUNÇÃO___
CUSTO DE PRODUÇÃO DA FUNÇÃO
• Para o comprador:
DESEMPENHO DA FUNÇÃO____
CUSTO DE AQUISIÇÃO DA FUNÇÃO
VALOR DA FUNÇÃO
VALOR ABSOLUTO:
DESEMPENHO
CUSTO
VALOR RELATIVO:
VFa/b = VFa / VFb
VFa = valor absoluto da função no objeto “a”
VFb = valor absoluto da função no objeto “b”
Café
embalagem 50 g
preço (R$) valor absoluto
(g/R$)
1 2,89 17,30
2 2,95 16,94
3 2,32 21,55
4 2,19 22,83
5 2,75 18,18
6 2,55 19,61
maior
menor
menor
maior
0,6
0,7
0,8
0,9
1
1,1
1,2
1,3
1,4
1 2 3 4 5 6 7
menor valor absoluto:
16,94 g/R$
maior valor absoluto:
22,83 g/R$
valor absoluto:
18,18 g/R$
UTILIZAÇÃO
• Ato ou efeito de utilizar (algo).
• Ação destinada a aplicar à consecução de
um propósito o efeito que um objeto é
capaz de produzir.
• Serviço que o desempenho de uma
função tem capacidade de prestar.
iluminar ambiente de trabalho
PRODUZIR LUZ
Como ...? Para que ...?
CUSTO DE UTILIZAÇÃO
Montante de recursos despendidos
para obter os serviços
proporcionados pelo desempenho
de uma função.– Corresponde somente aos custos
variáveis de utilização da função.
– Interessa a quem adquire e utiliza a
função.
VALOR DE UTILIZAÇÃO
VALOR ABSOLUTO:
DESEMPENHO DA FUNÇÃO
CUSTO DE UTILIZAÇÃO
VALOR RELATIVO:
VUa/b = VUa / VUb
VUa = valor absoluto de utilização da função do objeto “a”
VUb = valor absoluto de utilização da função do objeto “b”
lâmpada modelo A B
potência de operação (watt) 20 20
custo de aquisição (R$) 2,67 2,81
eficiência energética (lumens/watt) 35 35
vida útil (horas) 5000 7000
valor de aquisição da função (lm/R$) ~262 ~249
valor de aquisição da utilização (h/R$) ~1873 ~2491
provisão para reposição (R$/1000 h) 0,53 0,40
motor modelo A B
potência aparente (kVA) 100 100
custo de aquisição (R$ 1000) 4,26 4,89
Fator de potência (cos) 0,85 0,89
Potência útil (kW) 85 89
Valor de aquisição da função (W/R$) 19,95 18,20
Valor relativo da aquisição da função 1,108 1
Custo de utilização (1/cos) 1,176 1,124