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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAI – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS-CEJURS CURSO DE DIREITO – NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA O RECONHECIMENTO JURÍDICO DO AFETO COMO FUNDAMENTO DO INSTITUTO DA ADOÇÃO ANA CLÁUDIA TEODORO Itajaí (SC),novembro de 2008.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAI – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS-CEJURS CURSO DE DIREITO – NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA

O RECONHECIMENTO JURÍDICO DO AFETO COMO FUNDAMENTO DO INSTITUTO DA ADOÇÃO

ANA CLÁUDIA TEODORO

Itajaí (SC),novembro de 2008.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAI – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURS CURSO DE DIREITO – NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA

O RECONHECIMENTO JURÍDICO DO AFETO COMO FUNDAMENTO DO INSTITUTO DA ADOÇÃO

ANA CLÁUDIA TEODORO

Monografia submetida à Universidade

do Vale do Itajaí – UNIVALI, como

requisito parcial à obtenção do grau de

Bacharel em Direito.

Orientadora: Profª. Drª. Maria da Graça Santos Dias

Itajaí (SC), novembro de 2008.

MEUS AGRADECIMENTOS

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Primeiramente aos meus pais, por todo esforço e

dedicação para tornarem este momento possível

e inesquecível; para que este sonho fosse

realizado, e por sempre acreditarem que eu seria

capaz de vencer esta batalha. Aos meus irmãos,

pelo apoio dado durante toda esta trajetória de

vida dentro da faculdade;

A minha querida Professora orientadora Maria da

graça Santos Dias, que com muito carinho,

paciência e principalmente conhecimento, me

ajudou para o desenvolvimento deste trabalho;

Ao meu namorado Guilherme, pela paciência e

compreensão em todos os meus momentos de

ausência;

Aos meus amigos, pessoas maravilhosas que

pude conhecer nesta etapa da minha vida, e que

independente da distância, e do rumo que as

vidas tomarão jamais as esquecerei;

E jamais poderia esquecer de agradecer minha

família biológica, meu pai, sua esposa e meus

irmãos, que acompanharam a minha evolução e

sempre acreditaram em mim, a eles meu imenso

carinho e grande admiração.

DEDICATÓRIA

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Aos meus pais: Celeste (in memorian) e Leodeti, que

mesmo sendo meus pais adotivos, me criaram com todo

amor e carinho, sem nenhuma distinção. E foi com base

neste amor que me inspirei para demonstrar o verdadeiro

valor do amor e do afeto. E sei que apesar da ausência de

meu pai, ele estará sempre junto de minha mãe, me

orientando para que este sonho não acabe aqui.

Pai, sei que você ao lado do Senhor, estará tão

feliz quanto eu, pois este sonho era tão esperado

por você também. Dedico a você todo este meu

trabalho e esforço, que fiz em nosso nome: meu,

seu e de mamãe.

E dedico também ao grande amor de minha vida,

meu filho Nicholas, que apesar de ser tão

pequenino, sempre esteve ao meu lado, nem que

fosse para me distrair, mais sempre me dando

muita alegria e força.

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“não fostes vós que me escolhestes, mais fui eu que vos escolhi a vós”. (CRISTO disse a seus apóstolos).

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

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Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí (SC), novembro de 2008.

Ana Cláudia Teodoro

Graduanda

PÁGINA DE APROVAÇÃO

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A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale

do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Ana Cláudia Teodoro, sob o título

O reconhecimento jurídico do Afeto como fundamento do instituto da Adoção, foi

submetida em 21 de novembro de 2008, à banca examinadora composta pelos

seguintes professores: Maria da Graça Santos Dias (Orientadora) e Profº Zenildo

Bodnar (Examinador) e aprovada com a nota ______(_______________).

Itajaí (SC), novembro de 2008

Profª. Drª. Maria da Graça Santos Dias

Orientadora e Presidente da Banca

Antônio Augusto Lapa

Coordenação da Monografia

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à compreensão do seu

trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Adoção: ato jurídico pelo qual se estabelece independentemente do fato natural

da procriação, o vínculo de filiação, ligado principalmente pelos laços de afeto, por

se tratar de um ato de amor 1.

Adotando: ”Criança ou adolescente, cuja idade máxima seja de dezoito anos,

salvo se já estiver sob a guarda ou tutela dos adotantes”2 .

Adotante: “Pessoa capaz, independente de estado civil, podendo ser viúva,

solteira, casada, divorciada, separada ou concubina” 3.

Afeto: “Afeição por alguém; inclinação, simpatia, amizade, amor” 4. O afeto é, portanto, uma

qualidade vivencial e é, conseqüentemente, o significado emocional daquilo que a

pessoa está vivendo naquele momento.

Filiação sócio-afetiva: “a constância social da relação entre pais e filhos,

caracterizando uma paternidade que existe, não pelo simples fato biológico ou por

força de presunção legal, mas em decorrência de uma convivência afetiva” 5.

1 GOMES, Orlando, Direito de Família, 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 369.

2 BRASIL, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente art. 40. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil/LEIS/L8069.htm > 17 de agosto de 2008.

3 BRASIL, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente art. 42. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil/LEIS/L8069.htm > 17 de agosto de 2008. 4 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Séc. XXI: O dicionário da língua portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.

5 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. 4. ed.rev. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.

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Posse de estado de filho: “é o exercício de fato representado pela aparência de

um estado, donde se presume sua existência, de tal forma que ela permite provar

a filiação de afeto” 6.

6 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. Memória Jurídica Editora: São Paulo, 2001. p. 103.

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SUMÁRIO

SUMÁRIO........................................................................................................................10

CAPÍTULO 1....................................................................................................................3 ADOÇÃO......................................................................................................................3 1.1 ADOÇÃO: A QUESTÃO CONCEITUAL...................................................................3 1.2 HISTÓRICO DA ADOÇÃO ......................................................................................5 1.3 A ADOÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO..................................................................7 1.4 FUNÇÃO SOCIAL DO INSTITUTO DA ADOÇÃO.................................................. 10 1.5 REQUISITOS DA ADOÇÃO.................................................................................. 13 1.5.1 DOS QUE PODEM ADOTAR..................................................................................... 13 1.5.1.1 IDADE DO ADOTANTE ......................................................................................... 13 1.5.1.2 ESTADO CIVIL DO ADOTANTE.............................................................................. 15 1.5.1.3 ADOÇÃO PÓSTUMA ........................................................................................... 16 1.5.1.4 ADOÇÃO POR TUTOR OU CURADOR .................................................................... 16 1.5.1.5 ADOÇÃO POR ESTRANGEIROS ............................................................................ 17 1.5.2 DOS QUE PODEM SER ADOTADOS.......................................................................... 19 1.5.2.1 IDADE DO ADOTANDO ........................................................................................ 19 1.5.2.2 CONSENTIMENTO DO ADOTANDO, DE SEUS PAIS OU REPRESENTANTE LEGAL ........ 20 1.5.2.3 ESTÁGIO DE CONVIVÊNCIA ................................................................................. 22 1.5.2.4 VANTAGENS DA ADOÇÃO ................................................................................... 23 1.6 EFEITOS DA ADOÇÃO......................................................................................... 24 1.6.1 EFEITOS PESSOAIS .............................................................................................. 24 1.6.1.1 DESLIGAMENTO DA FAMÍLIA BIOLÓGICA ............................................................... 24 1.6.1.2 IRREVOGABILIDADE ........................................................................................... 25 1.6.1.3 NOME E PRENOME DO ADOTADO ........................................................................ 26 1.6.2 EFEITOS MATERIAIS ............................................................................................. 26 1.6.2.1 DIREITO SUCESSÓRIO ....................................................................................... 26 1.6.2.2 OBRIGAÇÃO ALIMENTAR .................................................................................... 27 1.7 ADOÇÃO À BRASILEIRA E A VERDADE DO REGISTRO CIVIL .......................... 29 CAPITULO 2.................................................................................................................. 32 A POSSE DE ESTADO DE FILHO.............................................................................. 32 2.1 CONCEITO E ELEMENTOS CARACTERIZADORES........................................... 32 2.1.1 CONCEITO DE POSSE DE ESTADO NA QUESTÃO DA FILIAÇÃO E SUA PRESENÇA NO ORDENAMENTO JURÍDICO .............................................................................................. 33 2.3 ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DA POSSE DE ESTADO DE FILHO.................. 36 2.3.1. NOME................................................................................................................. 38 2.3.2. TRATO ............................................................................................................... 38 2.3.3. FAMA ................................................................................................................. 39 2.4 A RECEPÇÃO DA POSSE DE ESTADO DE FILHO NO SISTEMA JURÍDICO

BRASILEIRO .............................................................................................................. 40 2.5.1 O EQUILÍBRIO DAS VERDADES: ABERTURA PARA A FILIAÇÃO SÓCIO-AFETIVA ............. 43 CAPÍTULO 3.................................................................................................................. 49

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A FAMÍLIA SÓCIO-AFETIVA NO DIREITO BRASILEIRO ........................................... 49 3.1 O AFETO .............................................................................................................. 49 3.2 UMA REFLEXAO DA PSICANALISE SOBRE O AFETUAL ................................... 51 3.3 A FILIAÇÃO QUE SE CONSTRÓI: FILIAÇÀO SOCIO-AFETIVA ........................... 55 3.4 FILIAÇÃO ADOTIVA: FILIAÇÃO DE AMOR .......................................................... 59 3.5 AFETIVIDADE COMO DIREITO E DEVER JURÍDICO.......................................... 63 3.6 A FILIAÇÃO AFETIVA COM FUNDAMENTAÇÃO CONSTITUCIONAL E NO

CÓDIGO CIVIL ........................................................................................................... 65 3.6.1 A FILIAÇÃO SÓCIO-AFETIVA E O POSICIONAMENTO DAS JURISPRUDÊNCIAS ACERCA DESTA QUESTÃO........................................................................................................... 66 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................ 69 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ..................................................................... 72

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RESUMO

O objeto desta monografia consiste no estudo do Afeto enquanto

referência do Instituto da Adoção, e da possibilidade de seu reconhecimento como Direito

Fundamental, considerando-o como fundamento necessário para a obtenção do vínculo

jurídico da filiação. Num primeiro momento, tem-se a preocupação com o exame das

origens, da natureza jurídica, e dos aspectos formais e requisitos da Adoção, bem como

com a análise do procedimento previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente, com

fundamento nas doutrinas e nas jurisprudências pátrias. Como não se poderia deixar de

abordar, também, a posse de estado de filho. Com isso não se pretende desprezar o

caráter biológico da filiação, mas apontar um novo fundamento de atribuição de

paternidade. A paternidade sócio-afetiva é um subsistema dentro do sistema jurídico,

fundado no Afeto, ultrapassando o sentido de genitor para o sentido de pai. Constitui o

objetivo deste trabalho, a análise da importância do Afeto para a constituição da família.

Neste contexto verifica-se que a Constituição da República Federativa do Brasil/1988,

reconhece a família como um espaço de afeto entre seus membros. Assim é plenamente

possível reconhecer o afeto como um valor de caráter também jurídico.

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INTRODUÇÃO

A presente monografia foi desenvolvida no campo da Ciência

Jurídica, com área de concentração em Direito de Família, especificamente analisando

o Afeto enquanto referência no Instituto da Adoção, com base no que dispõe a

Constituição da república federativa do Brasil/1988, Código Civil/2002, e o Estatuto da

Criança e do Adolescente, bem, assim, no pensamento dominante da Doutrina e da

Jurisprudência.

Esta pesquisa tem como objeto o estudo do valor jurídico do

afeto no instituto da adoção e, como objetivos; institucional: produzir uma monografia

para a obtenção do grau de bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí –

UNIVALI; geral: analisar o instituto da adoção a partir do Estatuto da Criança e do

Adolescente, da Constituição da República Federativa do Brasil/1988, do Código

Civil/2002 e de doutrinadores; específicos: analisar o procedimento da adoção, e a

importância do afeto como base para a constituição de uma família adotiva.

A pesquisa foi desenvolvida tendo como base as seguintes

hipóteses:a) o afeto constitui um referente fundamental para a habilitação da adoção

na legislação brasileira em vigor; b) a filiação baseada no afeto permite a posse de

estado de filho; c) a filiação sócio-afetiva tem

reconhecimento jurídico.

O tema escolhido para a presente pesquisa tem relevância em

decorrência das transformações sociais ocorridas no Brasil, notadamente com a

Constituição da República Federativa do Brasil/1988 e o Novo Código Civil /2002, que

reconhecem os direitos e obrigações, de todos os filhos, independentemente de sua

procedência e pelo reconhecimento do afeto nas entidades familiares, principalmente

na família que não possui vínculo sangüíneo.

A presente monografia está dividida em três capítulos, cada

qual contendo seus sub-capítulos.

No primeiro capítulo, tem-se a questão conceitual da adoção; a

evolução histórica no direito brasileiro; a função social e os requisitos para adotar; a

questão dos efeitos pessoais e materiais e todo um relato de como ocorre o estágio da

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2

convivência para que seja deferida a adoção e as vantagens que traz tal instituto para

uma família.

No segundo capítulo busca-se conceituar a posse de estado de

filho, demonstrando a sua presença no ordenamento jurídico, a sua importância e a

presença do afeto para a caracterização de tal instituto.

A posse de estado de filho está inteiramente ligada com a

convivência baseada no amor e nos laços de afeto, demonstrando então que a

paternidade é algo que se constrói.

No terceiro e último capítulo, os estudos foram concentrados

na formação da família afetiva, demonstrando o fundamento constitucional e no

Código Civil. Abordando também que a filiação adotiva não se trata apenas de um ato

solene, mais sim, da construção da relação de amor entre pessoa que não são ligadas

biologicamente. Conseqüentemente o afeto é um direito e dever jurídico que a filiação

pode concretizar.

O método escolhido para a realização deste trabalho

monográfico foi o indutivo, que segundo Pasold7, (...) “se opera com coleta de

elementos que são reunidos concatenados para caracterizar o tema pesquisado”.

Nas considerações finais, será apresentada breve síntese de

cada capítulo e demonstrado que as hipóteses básicas da pesquisa foram ou não

confirmadas.

7 PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p. 92.

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Capítulo 1

ADOÇÃO

1.1 ADOÇÃO: A QUESTÃO CONCEITUAL

A definição de adoção pode ser encontrada de diversas

formas, tendo em vista o contexto histórico da época.

Ab initio, a origem etimológica do termo adoção vem do latim

adoptio e quer dizer “ato ou efeito de adotar” 8.

Por sua vez, Omar Gama Ben Kauss9, ressalta que duas

eram as definições de adoção no Direito Romano, uma sendo do Baixo Império,

“adoção é o ato legítimo pelo qual alguém perfilha filho que não gerou” e outra do

período Justiniano, onde “adoção é o ato solene pelo qual se admite em lugar de

filho quem por natureza não é”.

Veja-se, também, a definição de Clóvis Beviláqua10, que nos

traz Silvio Rodrigues, segundo o qual a adoção: “ato civil pelo qual alguém aceita

um estranho, na qualidade de filho”.

Para Silvio Rodrigues11, esta definição não é adequada

porque é o adotante, em geral, que toma iniciativa do ato de adotar, considerando

“que a adoção é ato do adotante pelo qual o traz, para sua família e na condição

de filho, pessoa que lhe é estranha”.

8 LUFT, Pedro Celso. Luft, Lya. Dicionário escolar Luft da língua portuguesa. 1. ed. São Paulo, SP: Ática, 2005. p. 11.

9 KAUSS, Omar Gama Bem. A Adoção no Código Civil e no Estatuto da Criança e do Adolescente. 2. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1993. p. 7.

10 BEVILÁQUA, Clóvis in Silvio Rodrigues, Direito Civil: direito de família. V 6. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 380.

11 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. V 6. 27 ed. Atual. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 380.

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4

Arnoldo Wald12 define a adoção “(...) como um ato jurídico

solene em virtude do qual a vontade dos particulares, com a permissão da lei,

cria, entre pessoas naturalmente estranhas uma à outra, relações análogas às

oriundas da filiação legítima”.

Para Maria Helena Diniz13 “a adoção é um ato jurídico pelo

qual, observados os requisitos legais, alguém estabelece, independente de

qualquer relação de parentesco consangüíneo ou afim, um vínculo fictício de

filiação, trazendo para sua família, na condição de filho pessoa que, geralmente,

lhe é estranho”.

Já, Caio Mário da Silva Pereira14 trata o assunto de forma

mais objetiva, “como o ato que dá nascimento a uma relação jurídica de

parentesco meramente civil entre adotante e adotado, e tem finalidade de

propiciar filiação a quem não tem de seu próprio sangue”.

Orlando Gomes15, a define de forma adequada aos dias de

hoje, em consonância também com o Estatuto da Criança e do Adolescente,

como sendo “ato jurídico pelo qual se estabelece independentemente do fato

natural da procriação, o vínculo de filiação”.

E, por fim, como traz Antônio Chaves16, lembrando o

pensamento de Vieira: “O filho por natureza ama-se porque é filho; o filho por

adoção é filho porque se ama”.

De acordo com a maioria dos conceitos acima citados, todos

são categóricos, ao afirmar que a adoção é uma relação familiar, com finalidade

de criar um vínculo civil.

12 WALD, Arnold, O novo direito de familia. 14. ed. São Paulo, SP: Saraiva, 2002. p. 217. 13 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: direito de família. São Paulo: Saraiva 2005. v. 5, p. 484. 14 PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de direito civil. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981. v. 5, p. 261. 15 GOMES, Orlando, Direito de Família, 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 369. 16 CHAVES, Antônio, Adoção. Belo Horizonte: Del Rey, 1995 p.24.

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5

Nos dias de hoje, a adoção tem por finalidade proporcionar,

à criança ou ao adolescente, desamparados moral e materialmente, uma filiação

civil com formação de um ambiente familiar, dando-lhes a oportunidade de

tornarem-se cidadãos, civilmente respeitados. Usando outras palavras, “atender

às reais necessidades da criança, dando-lhe uma família, onde ela se sinta

acolhida, protegida, segura e amada” 17.

Cabe destacar, que o processo de adoção inicia-se com os

pais biológicos, que independente do motivo abandonam ou abrem mão de seus

filhos, estes passam às mãos de profissionais que cuidam para que a criança seja

adotada, por fim, os pais adotivos se dispõem a propiciar a esta criança uma

família.

O instituto sofre uma evolução histórica, que será abordada

a seguir.

1.2 HISTÓRICO DA ADOÇÃO

Desde os tempos mais remotos, o homem e a mulher

possuem a ânsia de perpetuar sua espécie, dando continuidade à família, e ao

seu nome. A natureza biológica, entretanto, é negada a alguns indivíduos. Assim,

a partir desta premissa foi iniciada uma nova forma de filiação, através do instituto

da adoção18.

Segundo descreve Fustel de Coulanges19, na Antiguidade,

para os povos da Grécia e da Roma antiga, a adoção atende aos anseios de

ordem religiosa, pois o povoado acredita que os vivos são protegidos pelos

mortos, e que, os mortos dependem dos rituais fúnebres de seus descendentes

para terem tranqüilidade.

17 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. Curitiba: Juruá, 2003. p. 26. 18 COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. Tradução de Jean Melville. São Paulo: Martin Claret, 2002. p. 58-59. 19 COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. p. 59.

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6

Como menciona Eunice Ferreira Rodrigues Granato20 “a

religião só podia propagar-se pela geração. O pai transmitia a vida ao filho e, ao

mesmo tempo, a sua crença, o seu culto, o direito de manter o lar, de oferecer o

repasto fúnebre, de pronunciar as fórmulas da oração”.

Assim, a família que não possuía filhos encontrava na

adoção uma alternativa para que suas crenças se propagassem por suas

gerações21.

A adoção começa a se fundir em Roma, tornando-se algo

mais sentimental, deixando de lado o contexto religioso, fazendo com que casais

estéreis adotassem22 .

No Código de Hamurabi23 (1728-1686 a.C), o instituto da

adoção está disposto em nove artigos, sendo do artigo 185 ao 193, mostrando

mais uma vez o objetivo satisfatório do adotante24 .

XI - ADOÇÃO, OFENSAS AOS PAIS, SUBSTITUIÇÃO DE

CRIANÇA

185º - Se alguém dá seu nome a uma criança e a cria como filho,

este adotado não poderá mais ser reclamado.

186º - Se alguém adota como filho um menino e depois que o

adotou ele se revolta contra seu pai adotivo e sua mãe, este

adotado deverá voltar à sua casa paterna.

187º - O filho de um dissoluto a serviço da Corte ou de uma

meretriz não pode ser reclamado.

188º - Se o membro de uma corporação operária, (operário) toma

para criar um menino e lhe ensina o seu ofício, este não pode

mais ser reclamado.

20 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil.p. 31. 21 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p. 31. 22 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: parte geral. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004.v. 1. p 98 23 Disponível em: http://www.culturabrasil.pro.br/zip/hamurabi.pdf > 10 de agosto de 2008. 24 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p. 32.

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7

189º - Se ele não lhe ensinou o seu ofício, o adotado pode voltar à

sua casa paterna.

190º - Se alguém não considera entre seus filhos aquele que

tomou e criou como filho, o adotado pode voltar à sua casa

paterna.

191º - Se alguém que tomou e criou um menino como seu filho,

põe sua casa e tem filhos e quer renegar o adotado, o filho adotivo

não deverá ir-se embora. O pai adotivo lhe deverá dar do próximo

patrimônio um terço da sua quota de filho e então ele deverá

afastar-se. Do campo, do horto e da casa não deverá dar-lhe

nada.

192º - Se o filho de um dissoluto ou de uma meretriz diz a seu pai

adotivo ou a sua mãe adotiva: "tu não és meu pai ou minha mãe",

dever-se-á cortar-lhe a língua.

193º - Se o filho de um dissoluto ou de uma meretriz aspira voltar

à casa paterna, se afasta do pai adotivo e da mãe adotiva e volta

à sua casa paterna, se lhe deverão arrancar os olhos.

194º - Se alguém dá seu filho a ama de leite e o filho morre nas

mãos dela, mas a ama sem ciência do pai e da mãe aleita um

outro menino, se lhe deverá convencê-la de que ela sem ciência

do pai e da mãe aleitou um outro menino e cortar-lhe o seio.

195º - Se um filho espanca seu pai se lhe deverão decepar as

mãos.

Encerrando a breve introdução histórica a respeito do Instituto

da Adoção, cabe-se analisar sua história no Direito Brasileiro.

1.3 A ADOÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO

Após adentrar na evolução histórica sobre a origem remota

da adoção, cabe referir sobre a evolução histórica do instituto da adoção no

Brasil. Este instituto entra no direito pátrio com as características que apresenta

no direito português, e que resiste ao direito romano 25.

No Brasil com a promulgação do Código Civil, Lei n° 3071 de

1916, o instituto da adoção foi disciplinado nos artigos 368 a 378. A lei era

25 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil.p. 32.

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destinada a pessoas com mais de 50 (cinqüenta) anos, com uma diferença de

idade entre adotante e adotado de 18 (dezoito) anos, bem como a inexistência de

filhos consangüíneos dos adotantes. Ademais, com respeito à sucessão, se

ficasse comprovado que havia um filho concebido no momento da adoção, o

adotado nada herdaria 26.

Diante disto, claro era o caráter eminentemente privado do

instituto, pois o enfoque era dar um filho para suprir a falta que a natureza criara

numa família27.

Entretanto, o Código Civil sofreu neste instituto as primeiras

alterações introduzidas pela Lei nº. 3.133 de 8 de maio de 1957 que alterou cinco

artigos daquele diploma legal. A partir daí, podia-se adotar aos 30 (trinta) anos,

desde que a diferença de idade entre adotante e adotado fosse de 16 (dezesseis)

anos. Impõe, também, aos casais um prazo de cinco anos após o casamento para

adotar, bem como inclui um artigo que preceituava que se o adotante tivesse

filhos, o vínculo da adoção não se estenderia ao da sucessão hereditária, dando

ensejo ao entendimento que, no que tange à sucessão, filho adotivo não era

filho28 .

O dispositivo na alteração da Lei n° 3.133/57 quanto ao

direito sucessório, vigeu até a Constituição de 1988, cujo artigo 227, parágrafo 6°,

equiparou os filhos adotivos aos consangüíneos para quaisquer efeitos29.

Uma segunda mudança no campo do instituto foi a criação

da legitimação adotiva pela Lei n° 4.655 de 2 de junho de 1965. Conforme nos

ensina Silvio Rodrigues: “tratava de instituto que tirava algo da adoção e algo da

legitimação, pois, como naquela, estabelecia um liame de parentesco de primeiro

26 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p. 43-44. 27 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p. 44. 28 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p. 44. 29 WEBER, Lídia n. Pais e Filhos por Adoção no Brasil: características, expectativas e sentimentos. Curitiba: Juruá, 2001. p.52.

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grau, em linha reta entre adotante e adotado, e, como na legitimação, este

parentesco era igual ao que liga o pai ao filho consangüíneo”30.

Numa seqüência cronológica, vê-se a Lei n° 6.697 de 10 de

outubro de 1979, que instituiu o Código de Menores. Este veio substituir a

legitimação adotiva pela adoção plena 31.

Assim, teve-se no Brasil, nesta época, a adoção simples

disciplinada pelo Código Civil, que estabelecia um parentesco civil entre adotante

e adotado, entretanto revogável se as partes assim acordassem e não extinguia

os direitos e obrigações do parentesco natural. Por outro lado, tinha-se a adoção

plena, muito mais abrangente que a outra, conferindo ao adotado direitos como se

fosse filho biológico, apagando toda ligação com a família natural, alterando,

inclusive, o assento de nascimento no Cartório de Registro32.

E por último, a grande inovação foi em 13 de julho de 1990

com a Lei n° 8.069, o Estatuto da Criança e do Adolescente, que revogou o

Código de Menores e regulou num só instituto a adoção de menores de 18

(dezoito) anos, extinguindo a distinção de até então, entre adoção simples e

adoção plena. Hoje, a adoção da criança e do adolescente é sempre plena33.

Segundo Silvio Rodrigues34:

A grande modificação trazida pelo Estatuto da Criança e do

Adolescente é de que nas adoções de menores de 18 anos não

existe mais adoção simples ou adoção plena, já que todas

passaram a ser plenas. Ou seja, só há adoção, que gera todos os

efeitos da antiga adoção plena .

30 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 6. p. 379 31 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p. 47. 32 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. p. 379 33 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p. 109. 34 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. p. 379.

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A obrigatoriedade de todas as adoções serem resolvidas via

processo judicial, inclusive a de maiores de 18 anos, entrou em vigor pela Lei

10.406 (Código Civil) 35 a partir de 10/1/2002, que expressa que o interessado não

poderá mais se valer de escritura pública. Desta forma leciona o autor Silvio

Rodrigues36 “Ao contrário do que acontecia com a adoção simples, que se

aperfeiçoava por singela escritura pública (Código Civil, art. 375), a adoção atual

envolve a intervenção do Poder Judiciário”.

Entretanto, o Código Civil de 2002 apenas reproduziu alguns

artigos do Estatuto da Criança e do Adolescente, com o intuito de adequar as

modificações no ordenamento jurídico. Sendo assim, as regras do Código Civil,

apenas serão aplicadas quando forem incompatíveis com a lei estatutária, por se

tratar apenas dos interesses das crianças e adolescentes37.

Em face do aprimoramento da legislação que regulamenta a

adoção, observa-se a importância desse instituto no contexto da sociedade

brasileira, objeto da análise a seguir.

1.4 FUNÇÃO SOCIAL DO INSTITUTO DA ADOÇÃO

Para a formação de uma sociedade equilibrada, a família é o

fundamento básico, pois ela é a base estrutural para o desenvolvimento da

criança, proporcionando uma educação e uma criação que a ampare e defenda,

cuidando e resguardando seus interesses38.

É no âmbito familiar que ocorre a sociabilização da criança

projetando-a para a sociedade. Para Liborni Siqueira39 “uma sólida estrutura

familiar é o grande segredo de estrutura social”.

35 BRASIL, Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Novo Código Civil. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm> 17 de agosto de 2008. 36 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. p. 388. 37 GUIMARÃES, Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda. 2. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2003. p.33. 38 GUIMARÃES, Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda. p. 5. 39 SIQUEIRA, Liborni (coord.). Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. Rio de Janeiro: Forense, 1991. p.12.

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A função social da família tem por princípio a igualdade entre

os cônjuges e os filhos, independente que sejam consangüíneos ou não. Mesmo

os filhos havidos fora do casamento, possuem os mesmos direitos e

qualificações, sendo proibida qualquer discriminação relativa à filiação.

As atribuições de responsabilidades aos pais são relativas

ao crescimento e o amparo de seus filhos, pelo fato de deterem o poder familiar,

que segundo Giovane Serra Azul Guimarães40 :

Compreende as disposições legais reguladoras das faculdades e

dos deveres atribuídos aos pais que rejam a pessoa e os bens

dos filhos menores. Os atributos do poder familiar, como a guarda,

podem ser parcialmente confiados a outras pessoas que não os

pais, mas, em sua inteireza, é indelegável e irrenunciável. É

transferido dos pais biológicos aos adotivos e, em caso de morte

destes, não se restaura o poder daqueles.

Na Constituição da República Federativa do Brasil /1988 41

estão assegurados os direitos fundamentais, entre eles os direitos à vida famíliar,

assegurados às crianças e aos adolescentes. Assim são deveres dos pais:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar

à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à

vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à

profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade

e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo

de toda forma de negligência, discriminação, exploração,

violência, crueldade e opressão.

§ 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por

adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas

quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

Está evidenciado também que a família não se constitui

apenas através do casamento, considerando ainda, a comunidade formada por

qualquer dos pais e seus descendentes e, para efeito de proteção do Estado, a

40 GUIMARÃES, Giovane Serra Azul. Adoção, tutela e guarda. p. 9. 41 BRASIL, Constituição da República Federativa. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm > 17 de agosto de 2008.

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união estável entre homem e mulher também é considerada (art. 226, §3º,

Constituição) 42.

Está claro na norma constitucional quanto ao dever do

Estado e da comunidade como um todo em proporcionar aos jovens direitos

essenciais para seu pleno desenvolvimento, sendo sua aplicabilidade imediata,

garantindo a igualdade, sem que haja qualquer prejuízo ao filho adotivo. Assim:

“O dever de prestar assistência configura-se um múnus imposto primeiramente à

família adotiva. Inexistente ou malformada esta cabe subsidiariamente à

sociedade e ao estado promover a assistência à infância e à juventude “43.

O Estado é também responsável pela assistência social às

crianças e aos adolescentes, inclusive no que tange à adoção, promovendo

programas de incentivo.

O Estatuto44 rege também o direito do ambiente familiar

equilibrado, além dos direitos acima mencionados:

Art. 19. Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e

educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família

substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em

ambiente livre da presença de pessoas dependentes de

substâncias entorpecentes.

Art. 20. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou

por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas

quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

Sendo assim, é nítida a realidade social dos direitos da

criança, devendo ela ser criada e educada no seio familiar e excepcionalmente,

em família substituta, mas sempre em família. A desestruturação e o abandono

42 BRASIL, Constituição da República Federativa. Art. 226. A família, base da sociedade tem especial proteção do Estado, § 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm > 17 de agosto de 2008. 43 LUZ, Valdemar P. da. Curso de direito de família, Caxias do Sul: Mundo Jurídico, 1996. p. 27. 44 BRASIL, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm > 17 de agosto de 2008.

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são as fontes de carência material e emocional da criança, ficando evidente que é

indispensável uma convivência familiar sadia45.

Desta forma, está assegurado, que as crianças quando

afastadas de seus pais naturais, independente de motivo, têm garantido, pela

legislação pátria, o direito a uma convivência familiar saudável e digna.

Observa-se que as transformações sociais influenciam nos

direitos da criança, inclusive, no tocante aos requisitos da adoção, que iremos

apreciar.

1.5 REQUISITOS DA ADOÇÃO

Os requisitos relativos aos sujeitos da relação adotiva,

identificam-se com o processo judicial. O Estatuto da Criança e do Adolescente

em seus artigos 40 á 52 dispõe sobre os requisitos necessários ao adotante e ao

adotado.

1.5.1 Dos que podem adotar

1.5.1.1 Idade do adotante

O adotante deverá ter a idade igual ou superior a vinte e um

anos, de acordo com o comando do artigo 42, do Estatuto da Criança e do

Adolescente: “Podem adotar os maiores de vinte e um anos, independentemente

de estado civil “46.

Verifica-se que com o advento do Código Civil, Lei 10.406,

de 2002, a maioridade foi reduzida para dezoito anos de idade, porém, o Estatuto

Criança e do Adolescente permaneceu inalterado.

Todavia, Silva Pereira 47 assevera:

45 SIQUEIRA, Liborni (coord.). Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. p.13. 46 BRASIL, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm > 17 de agosto de 2008. 47 PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de direito civil: direito de família. 5v. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 401

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O parágrafo único do art. 161848, sempre em consonância com a

diminuição da capacidade civil, manteve idêntica orientação. Cabe, portanto, ao juiz, apurar se a medida é conveniente ao

adotando.

No entendimento de Rizzardo49: “parece óbvio que o limite

de dezoito anos não é suficiente para o adotante ter consciência plena de seu ato,

embora antingida a maior idade”.

Como preconiza o artigo 42, §3º, do Estatuto50, o adotante

deve contar com, pelo menos 16 anos a mais que o adotando.

Para a adoção estatutária, o adotando deve ser criança ou

adolescente, e a época do pedido, deverão ter no máximo dezoito anos, salvo a

hipótese de já se encontrar sob a guarda ou tutela dos adotantes51.

Acerca da diferença de idade entre adotante e adotado

Rodrigues 52 aduz:

Como efeito a regra se inspira na idéia de que a adoção procura

imitar a natureza, e que, assim, mister se faz estabelecer entre as

partes, que vão assumir as posições de pai e filho, uma diferença

que as situe em gerações diversas.

Portanto, a adoção deve tanto quanto possível imitar a

natureza, visando constituir uma nova e verdadeira família, aproximando assim o

instituto jurídico da verdadeira filiação natural.

48 BRASIL, Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Novo Código Civil, Art. 1.618 – Só a pessoa maior de 18 (dezoito) anos pode adotar. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil/LEIS/L8069.htm> 17 de agosto de 2008. 49 RIZZARDO, Arnold. Direito de família. Rio de Janeiro. Aide, 2004, p. 54. 50 BRASIL, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Art. 42. Podem adotar os maiores de vinte e um anos, independentemente de estado civil. § 3º O adotante há de ser, pelo menos, dezesseis anos mais velho do que o adotando. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm > 17 de agosto de 2008. 51 BANDEIRA, Marcos. Adoção na pratica forense. Ilheus: Editus, 2001, p. 39. 52 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. p. 384.

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1.5.1.2 Estado civil do adotante

O Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece na parte

final do caput do art. 42, que independe do estado civil de quem pretende adotar

uma criança ou adolescente.

É notória a presença de que há liberdade quanto ao estado

civil daquele que pretende adotar, pois, de acordo com Rodrigues53, foram

trazidas inovações quanto à legitimidade para adotar:

[...] destacando-se entre elas a possibilidade de a pessoa casada

ou concubinada adotar um filho de seu consorte, ou companheiro,

sem afetar o liame de parentesco, e portanto o pátrio poder de

seus ascendentes consangüíneos.

Poderão também adotar, os separados judicialmente e os

divorciados, desde que conjuntamente acordem sobre a guarda e direito de

visitas, sem descartar que o estágio de convivência terá que ser iniciado durante

a constância do relacionamento, conforme se refere o artigo 42, §4º, do Estatuto

da Criança e do Adolescente54.

Verifica-se, assim, que a permanência de tais requisitos no

Estatuto, visa a proteção da criança, que deverá ficar isento as conseqüências do

divórcio ou separação judicial.

Neste sentido Venosa 55 diz que:

Não há qualquer restrição quanto ao estado civil do adotando:

pode ser solteiro, divorciado, separado judicialmente, viúvo,

concunbino. A adoção, como percebemos, pode ser singular ou

conjunta. A adoção é admitida por casal em matrimônio ou em

união estável, entidade familiar reconhecida constitucionalmente.

Tal concordância visa conservar o carinho desenvolvido pelo

adotado durante o período da união do casal.

53 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. p. 381. 54 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume VI: direito de família. 4. ed. São Paulo: Saraiva 2007. p.349. 55 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil. 2004.p.335.

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1.5.1.3 Adoção Póstuma

Este tipo de adoção ocorre quando, após a iniciação do

processo de adoção, o adotante vem a falecer antes da prolatação da sentença.

O Estatuto neste caso instituiu que: “art. 45 §5º [...] poderá ser deferida ao

adotante que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso

do procedimento, antes de prolatada a sentença “56. Neste sentido Granato57

dispõe:

Uma pessoa decidiu adotar uma criança, encontro-a, levou-a para

seu lar, iniciando o processo e o estágio de convivência e, por

uma fatalidade, é colhida pela morte. Com o processo de adoção

já em curso, é justo que o desejo do falecido possa ser realizado,

legalmente [...].

Repara-se que mesmo com o falecimento de um dos

cônjuges, a manifestação de vontade do falecido é suficiente para que o processo

seja realizado. A Manifestação tanto poderá ser escrita quanto verbal, não sendo

inequívoca, e que todos os procedimentos já estejam instaurados e

consequentemente em andamento 58 .

Nos termos do art. 47, §6º: “A adoção produz seus efeitos a

partir do trânsito em julgado da sentença, exceto na hipótese prevista no art. 42, §

5º, caso em que terá força retroativa à data do óbito”59. A de se ressaltar que,

neste caso, além de todo o andamento processual, com todas as provas

produzidas, a ênfase estará na prova testemunhal.

1.5.1.4 Adoção por tutor ou curador

O tutor ou o curador, são administradores de bens de uma

determinada criança ou adolescente, sendo assim, antes de assumir a condição

56 BRASIL, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm > 17 de agosto de 2008. 57 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p. 88. 58 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Estatuto da criança e do adolescente comentado. 4. ed. São Paulo: Saraiva. 1998. p. 65. 59 BRASIL, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm > 09 de setembro de 2008.

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de pai, eles terão que prestar contas da administração dos bens. O artigo 44 é

claro ao esclarecer quanto a essa comprovação da administração dos bens:

“Enquanto não der conta de sua administração e saldar o seu alcance, não pode

o tutor ou o curador adotar o pupilo ou o curatelado” 60 .

Neste sentido Kauss 61 preleciona:

Adquirir o pátrio poder, sem antes demonstrar essa lisura, seria

admitir que jamais poder-se-ia apurar a boa ou ruim administração

para anteceder o pátrio poder que conferirá a adoção. [...] Poder-

se-ia até pôr em dúvida a sinceridade do pedido de adoção, se

não estaria ele a ocultar inconfessável alcance nos bens do

menor, afinal tudo sepultado pela filiação advinda.

Observa-se que isto serve de proteção dos bens do menor,

para evitar que o tutor ou curador aproprie-se indevidamente, por isto a exigência

da prestação de contas, para enfim formalizar a adoção.

1.5.1.5 Adoção por estrangeiros

Este tipo de adoção ocorre quando estrangeiros procuram

crianças brasileiras. Para melhor entender o que o Estatuto62 rege quanto à

adoção internacional, far-se-á a transcrição do artigo 51 e 52:

Art. 51 Cuidando-se de pedido de adoção formulado por

estrangeiro residente ou domiciliado fora do País, observar-se-á o

disposto no art. 31.

§ 1º O candidato deverá comprovar, mediante documento

expedido pela autoridade competente do respectivo domicílio,

estar devidamente habilitado à adoção, consoante as leis do seu

60 BRASIL, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm > 09 de setembro de 2008. 61 KAUSS, Omar Gama Bem. A Adoção no Código Civil e no Estatuto da Criança e do Adolescente. 2. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1993. 62 BRASIL, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm > 09 de setembro de 2008.

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país, bem como apresentar estudo psicossocial elaborado por

agência especializada e credenciada no país de origem.

§ 2º A autoridade judiciária, de ofício ou a requerimento do

Ministério Público, poderá determinar a apresentação do texto

pertinente à legislação estrangeira, acompanhado de prova da

respectiva vigência.

§ 3º Os documentos em língua estrangeira serão juntados aos

autos, devidamente autenticados pela autoridade consular,

observados os tratados e convenções internacionais, e

acompanhados da respectiva tradução, por tradutor público

juramentado.

§ 4º Antes de consumada a adoção não será permitida a saída do

adotando do território nacional.

Art. 52. A adoção internacional poderá ser condicionada a estudo

prévio e análise de uma comissão estadual judiciária de adoção,

que fornecerá o respectivo laudo de habilitação para instruir o

processo competente.

Parágrafo único. Competirá à comissão manter registro

centralizado de interessados estrangeiros em adoção.

Para a adoção internacional deverá ser constituída uma

Comissão Estadual Judiciária, sendo ela a responsável por elaborar um laudo,

servindo a mesma como referência que instruirá o processo de adoção63.

No Estatuto a Comissão é presidida pelo Corregedor Geral

da Justiça e mais cinco membros, que são: um juiz da Vara da Infância e

Juventude da Comarca da Capital; um Procurador da justiça; um representante da

Ordem dos Advogados do Brasil – Secção de Santa Catarina; um representante

do Conselho Regional de Psicologia e um representante do Conselho Regional de

Serviço Social 64 .

No Estado de Santa Catarina, a Comissão Estadual

Judiciária de Adoção adveio da Resolução nº. 001/93.

63 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p.364. 64 CEJA, Santa Catarina: Comissão Estadual Judiciária de Adoção. Adoção em Santa Catarina. 2002.

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1.5.2 Dos que podem ser adotados

1.5.2.1 Idade do adotando

No que dispõe o art. 40 do Estatuto da Criança e do

Adolescente 65 : “O adotando deve contar com, no máximo, dezoito anos à data

do pedido, salvo se já estiver sob a guarda ou tutela dos adotantes”.

Mas com a vigência do Novo Código Civil, a menor idade

cessa aos dezoito anos completos. Se o pedido de adoção for feito após os

dezoito anos completos, o adotante deverá seguir as regras do novo Código Civil

e não mais do Estatuto 66.

Entretanto, abre-se uma exceção, quando ocorrer que o

adotando já encontrar-se sob a guarda ou tutela dos adotantes, assim nos rege a

segunda parte do art. 40 do Estatuto67 .

Observa-se que neste dispositivo legal não há referência de

limite de idade para o pedido de adoção, pois já que o adotante possui a guarda

ou a tutela , é incontestável que tal pedido deverá ser feito antes do adotando

completar vinte e um anos 68 .

Ao dispor o art. 2º parágrafo único do Estatuto que:

Art. 2º “Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa

até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre

doze e dezoito anos de idade; nos casos expressos em lei, aplica-

se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito e

vinte e um anos de idade.”

O Estatuto reafirma, que somente em casos excepcionais previstos em

lei aplica-se o Estatuto entre pessoas de dezoito e vinte e um anos, sendo óbvio também que

65 BRASIL, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm > 09 de setembro de 2008. 66 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. Volume VI: direito de família. 3. ed.rev., e atual. São Paulo, SP: Saraiva 2007. p. 353. 67 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p. 73. 68 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p. 73.

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nada mais poderá ser requerido após os dezoito anos, pois ninguém mais ficaria sobre a guarda

ou tutela de outra pessoa 69

.

1.5.2.2 Consentimento do adotando, de seus pais ou representante Legal

De acordo com o art. 45, § 2º do Estatuto:

Art. 45. A adoção depende do consentimento dos pais ou do

representante legal do adotando.

§ 2º. Em se tratando de adotando maior de doze anos de idade,

será também necessário o seu consentimento.

Nota-se que o depoimento do menor é importante para o

andamento do processo, mais não será somente com base nele que o Juiz

prolatará sua sentença, pois serão juntadas outras provas.

Neste entendimento KAUSS 70 diz que:

Entretanto, esse consentimento deve ter um valor relativo a

apreciação a ser feita pelo juiz na sentença. A sua concordância,

por si só, não deverá representar o deferimento ou o

indeferimento da adoção. O § 2º do art. 45 não pode ter uma

interpretação divorciada daquela que se deve dar ao art. 43 71 que

representa o ideal do sistema.

Ao nos referirmos sobre a concordância dos pais, o art. 45

§1º do Estatuto72, dispõe que quando os pais forem desconhecidos ou destituídos

do pátrio poder, esta anuência será dispensada 73 .

69 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p. 74. 70 KAUSS, Omar Gama Bem. A Adoção no Código Civil e no Estatuto da Criança e do Adolescente. p.54 71 BRASIL, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Art. 43. A adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm > 09 de setembro de 2008. 72 BRASIL, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm > 09 de setembro de 2008. 73 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p.75

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21

Em relação ao pátrio poder o art. 21 do Estatuto da Criança

e do Adolescente74 estabelece que:

O pátrio poder será exercido, em igualdade de condições, pelo pai

e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil,

assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de

discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a

solução da divergência.

Mas em relação à expressão “pátrio poder”, o Código Civil,

substituiu-a por “poder familiar”, como pode-se observar no art. 1631 : “Durante o

casamento e a união estável, compete o poder familiar aos pais, na falta ou no

impedimento de um deles, o outro exercerá com exclusividade”75.

O poder familiar poderá ser cessado pela Justiça, se ocorrer

alguma das hipóteses elencadas no Estatuto76:

O art. 24 A perda e a suspensão do pátrio poder serão

decretadas judicialmente, em procedimento contraditório,

nos casos previstos na legislação civil, bem como na

hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e

obrigações a que alude o art. 2277 .

Da mesma maneira que o consentimento do adotando não é

essencial, o consentimento exigido do representante legal ou dos pais não funda-

se em motivos legítimos 78.

O que ocorre de fato é que independente de os pais não

concordarem com a adoção, se seus deveres como pais não estão sendo

74 BRASIL, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm > 09 de setembro de 2008. 75 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: direito de família. p. 514. 76 BRASIL, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm > 09 de setembro de 2008. 77 BRASIL, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm > 09 de setembro de 2008. 78 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p. 78

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cumpridos, como o dever de sustento, de guarda e educação dos filhos menores,

terão o poder familiar cessado, sendo assim o consentimento será dispensado, de

acordo com o art. 45, §1º do Estatuto79 .

Conclui-se, então, que os pais que não cumprem com seu

dever, perdem o seu direito.

1.5.2.3 Estágio de convivência

O estágio de convivência do adotante com o adotado está

previsto no art. 46 e seus parágrafos do Estatuto 80.

Art. 46. A adoção será precedida de estágio de convivência com a

criança ou adolescente, pelo prazo que a autoridade judiciária

fixar, observadas as peculiaridades do caso.

§ 1º O estágio de convivência poderá ser dispensado se o

adotando não tiver mais de um ano de idade ou se, qualquer que

seja a sua idade, já estiver na companhia do adotante durante

tempo suficiente para se poder avaliar a conveniência da

constituição do vínculo.

§ 2º Em caso de adoção por estrangeiro residente ou domiciliado

fora do País, o estágio de convivência, cumprido no território

nacional, será de no mínimo quinze dias para crianças de até dois

anos de idade, e de no mínimo trinta dias quando se tratar de

adotando acima de dois anos de idade.

Para avaliar o tempo de convivência da adoção, o Estatuto deixa a

critério do juiz, para que ele faça fixação atendendo a peculiaridade de cada caso, assim como

este estágio poderá ser dispensado quando se tratar de uma criança com menos de um ano de

idade ou, quando o adotando já estiver convivendo com os adotantes81

.

79 BRASIL, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Art. 45. A adoção depende do consentimento dos pais ou do representante legal do adotando. § 1º. O consentimento será dispensado em relação à criança ou adolescente cujos pais sejam desconhecidos ou tenham sido destituídos do pátrio poder. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm > 09 de setembro de 2008. 80 BRASIL, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm > 09 de setembro de 2008.

81 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p. 81

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23

Esta convivência serve para que se possa avaliar a adaptação do

adotando com os adotantes, tratando-se de um período experimental. Dessa forma afirma

Granato82

:

É de grande importância esse tempo de experiência, porque,

constituindo um período de adaptação do adotando e adotantes à

nova forma de vida, afasta adoções precipitadas que geram

situações irreversíveis e de sofrimento para todos os envolvidos.

1.5.2.4 Vantagens da adoção

São inúmeras as vantagens em nosso ordenamento jurídico,

tanto para o adotante quanto para o adotado. Este instituto exerce uma função

benéfica social, de fortalecimento da família.

Neste sentido, Snick83 leciona que:

A adoção atende a fins nobres e satisfaz a interesses sociais

relevantes; é um instituto de caráter filantrópico, de tendência

nitidamente humanitária, e de fins altamente assistenciais.

Protegendo a infância, tem por objetivo estabelecer, de um lado,

uma nova família e, de .outro, fortalecer a própria família.

A presença de filhos na vida de um casal é fundamental,

mesmo não sendo filhos naturais, ajudam a conservar os valore morais e

religiosos da vida em comum.

Pelo estudo já feito, verifica-se que o Estatuto da Criança e

do Adolescente visa atender ao interesse do adotando. Neste sentido o art. 43

desta Lei é bem claro ao descrever que: “a adoção será deferida quando

apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos“.

Com relação ao adotado, irá ganhar uma nova família. A

falta de uma família pode trazer inúmeros problemas para criança, que muitas

vezes foi abandonada ou que sofreu agressões de seus pais naturais.

82 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p. 81 83 SZNICK, Valdir. Adoção: direito de família, guarda de menores, tutela, pátrio poder, adoção internacional. 3 ed. São Paulo: Universitária de Direito, 1999. p. 109.

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1.6 EFEITOS DA ADOÇÃO

Os efeitos decorrentes da Adoção são diversos, tanto de

cunho pessoal quanto matérias. O efeito de ordem pessoal refere-se ao vínculo

de filiação, expressa na Constituição Federal, segundo a qual se cria um

parentesco com a família do adotante, tendo o total desligamento da família

biológica e a irrevogabilidade e o uso patronímico do adotante pela criança. Já o

que se trata de ordem material, refere-se a aquisição do direito sucessório, a

obrigação alimentícia, o usufruto e a administração dos bens do adotado, pelo

adotante84.

1.6.1 Efeitos pessoais

1.6.1.1 Desligamento da família biológica

O primeiro efeito é o desligamento da família biológica,

adquirindo um novo vínculo de filiação com os pais adotivos, bem como, o

parentesco com a sua família. Vale ressaltar que mesmo com a morte dos pais

adotivos, não é restabelecido o vínculo originário com os pais biológicos85.

Ensina-nos LUZ 86 que:

(...) Rompimento automático dos vínculos de sangue, eis que

desliga o adotado de qualquer vínculo com os pais e parentes de

sangue, salvo no tocante aos impedimentos patrimoniais (art. 41.

ECA: art. 1.626 do novo CC). Tanto é assim, que mesmo na

hipótese de falecimento de adotante, os pais naturais não terão

restabelecido o pátrio poder (art. 49)”.

A adoção atribui aos adotados a condição de filhos legítimos

com os mesmos deveres e direitos, ressalvados os direitos matrimoniais, que são

aqueles absolutamente nulos e com infração de proibição legal, que estão

previstos nos incisos do art. 1.521 do Código Civil de 2002:

Não podem casar:

84 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil.p.13 85 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p.358. 86 LUZ, Valdemar P. da. Curso de direito de família. p. 218

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I - os descendentes com os descendentes, seja o parentesco

natural ou civil;[..]

III – o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado

com quem foi do adotante;

IV – os irmãos, unilaterais ou bilaterais e demais colaterais, até o

terceiro grau inclusive;

V – o adotado com o filho do adotante; [...]

Assim nos disciplina VENOSA 87:

Embora a lei iguale todos os direitos do adotado e insira-o

integralmente na família do adotante, ressalva os impedimentos

matrimoniais. O impedimento matrimonial, por força do parentesco

biológico, é irremovível na esteira das razões morais, éticas e

genéticas. Nesse diapasão, os impedimentos atingem o adotado

com relação a ambas as famílias, a adotante e a biológica.

Fica demonstrado então, que o único vínculo jurídico que o

adotado possui com a família biológica, trata-se do impedimento matrimonial.

1.6.1.2 Irrevogabilidade

Após o trânsito em julgado concedendo a adoção, esta

passa a ser irrevogável, ou seja, tornando-se totalmente de cunho irreversível.

Nesse diapasão Sznick 88 caracteriza que:

A adoção passa a ser irrevogável, depois do trânsito em julgado,

como aliás, determina o art. 47, § 6º, do Estatuto, expressamente.

E o trânsito e julgado, como é evidente, ocorre antes da

transcrição da sentença judicial, conforme o art. 47, caput , do

mesmo Estatuto. Inscrita no Registro Civil, supõe-se o trânsito em

julgado, produzindo, a partir daí, todos os efeitos, inclusive a

irrevogabilidade.

87 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil. p. 219 88 SZNICK, Valdir. Adoção: direito de família, guarda de menores, tutela, pátrio poder, adoção internacional. p. 398.

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1.6.1.3 Nome e prenome do adotado

Com a sentença, e, mediante mandado, será transcrito no

registro civil o vínculo de filiação, onde constará o nome dos adotantes como pais,

e ainda seus ascendentes, permitindo a mudança do prenome do adotado89.

Este registro tem o condão de cancelar o anterior, se o tiver,

conforme determina o art. 47 do Estatuto: “O vínculo da adoção constitui-se por

sentença judicial, que será inscrita no registro civil mediante mandado do qual não

se fornecerá certidão”. E o art. 227, § 6º da Constituição:

[...] § 6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou

por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas

quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

O Código Civil também prevê tal medida, que está

mencionada no art. 1627: ”A decisão confere ao adotado o sobrenome do

adotante, podendo determinar a modificação de seu prenome, se menor, a pedido

do adotante ou do adotado”.

1.6.2 Efeitos Materiais

Entre os efeitos materiais da adoção destacam-se:

1.6.2.1 Direito Sucessório

O filho adotivo possui todos os direitos, inclusive os

sucessórios, e para afirmar este direito, a Constituição Federal e o Estatuto da

Criança e do Adolescente protegem o direito do adotado90.

89 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p.360.

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No Estatuto da Criança e do Adolescente encontramos no

art. 20 : “Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão

os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações

discriminatórias relativas à filiação”; e na Constituição Federal, tal direito é regido

pelo art. 227, § 6º, como já mencionado anteriormente.

Quando ocorre uma adoção unilateral, onde um dos

cônjuges ou concumbinos adota o filho do outro, será gerado um vínculo de

filiação entre o adotado e o cônjuge ou concumbino, assim, quando um dos

adotantes vire a falecer, ocorrerá à vocação hereditária 91.

Tal hipótese está fundamentada no art.41, § 1º do Estatuto:

Art. 40 A adoção atribui a condição de filho ao adotado, com os

mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-o de

qualquer vínculo com pais e parentes, salvo os impedimentos

matrimoniais.

§ 1º Se um dos cônjuges ou concubinos adota o filho do outro,

mantêm-se os vínculos de filiação entre o adotado e o cônjuge ou

concubino do adotante e os respectivos parentes.

Está claro que não existe qualquer desigualdade entre filhos, no que se

refere ao direito sucessório.

1.6.2.2 Obrigação alimentar

A obrigação de prestar alimentos é recíproca, sendo este

direito assegurado pelo artigo 227, §6 da Constituição Federal, que garante a

indispensável obrigação dos pais com a criança ou adolescente ao dever de

sustento, habitação, vestuário, atendimento médico e, nos casos dos menores,

instrução e educação “92.

90 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p.361. 91 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p. 92 92 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p. 73.

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Ilustra essa lição a observação de Rodrigues: ‘quando se

fala em alimentos fala-se no direito de exigi-lo e na obrigação de prestá-los,

marcando, deste modo, o caráter assistencial do instituto “93.

Sendo assim, com a adoção concretizada, rompem-se os

laços de parentesco com a família biológica, sendo eles transferidos aos

adotantes e seus parentes, inclusive no que tange a obrigação alimentar.

1.6.2.3 Administração e usufruto dos bens do adotado

Fica evidente, que com a sentença de adoção, gerando a

filiação do adotado, ele passa a possuir os mesmos direitos que o filho biológico.

Como conseqüência, cabe aos pais administrar e usufruir dos bens do adotado,

como diz o art. 1. 689 do Código Civil94:

Art. 1.689 - O pai e a mãe, enquanto no exercício do poder

familiar:

I – são usufrutuários dos bens dos filhos

II – têm a administração dos bens dos filhos menores sob sua

autoridade.

Também é o entendimento de Rodrigues95

:

Na administração os pais devem zelar pela preservação do

patrimônio de que cuidam, não podendo praticar atos que

impliquem alienação direta ou indireta de bens, ou dos quais

possa resultar uma diminuição patrimonial.

Deste modo, os efeitos advindos da adoção consolidam-se

de forma igualitária com o advento da Constituição Federal em 1988, todavia de

forma muito intensa com a chegada do Estatuto da Criança e do Adolescente,

sendo que este ressalta os direitos especiais e específicos das crianças e

adolescentes.

93 RODRIGUES, Silvio, Direito Civil. p. 419 94 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p. 94. 95 RODRIGUES, Silvio, Direito Civil. p. 406

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Abordamos até aqui a adoção comum, e, em seguida será

abordada outro tipo de adoção, conhecida por “adoção à brasileira”.

1.7 ADOÇÃO À BRASILEIRA E A VERDADE DO REGISTRO CIVIL

A adoção à brasileira é o nome dado ao ato decorrido de

uma declaração falsa, mais totalmente consciente de paternidade e maternidade

de criança nascida de outra mulher, casada ou não, sem observância das

exigências legais para a adoção 96.

Tal atitude é movida pelos declarantes, com a vontade de

integrar uma criança ao seu seio familiar, consequentemente trata-se de uma

ação generosa 97.

Essa modalidade de adoção é a mais comum do que se

imagina, pelo fato da burocracia que existe para adotar, no que tange ao valor de

um processo desse e a demora processual 98.

Apesar de ser feito de forma ilegal, tudo o que a criança ou o

adolescente precisam, e que está contido na Constituição da República

Federativa do Brasil/1988, é atendido pela família que ampara esta criança para

ela obter uma convivência familiar. De um lado observa-se que todos os requisitos

da Constituição estão preenchidos e, de outro, o procedimento legal que não foi

atendido 99.

A Constituição da República Federativa do Brasil/1988100

colhe o compromisso da solidariedade, da fraternidade, do bem-estar, da

96 LOBO, Paulo Luiz Netto. Direito ao estado de filiação e direito à origem genética. p 512. 97 LOBO, Paulo Luiz Netto. Direito ao estado de filiação e direito à origem genética. p 512. 98 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção, doutrina e prática: com abordagem do Novo Código Civil. p.131. 99 LOBO, Paulo Luiz Netto. Direito ao estado de filiação e direito à origem genética. p 512. 100 BRASIL, Constituição da República Federativa. Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm > 17 de agosto de 2008.

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30

segurança, da liberdade e outros. Estas opções valoram muito mais para uma

idéia da paternidade fundada no amor e no serviço do que para a sua submissão

aos determinismos biológicos 101.

João Baptista Villela102 expõe o seguinte exemplo: que

quando a criança é registrada, mais não por seu procriador genético,

necessariamente seu registro não conteria uma falsidade.

Continua o autor103:

Verdade e falsidade no registro civil e na biologia têm parâmetros

diferentes. Um registro é sempre verdadeiro se tiver conciliado

com o fato jurídico que lhe deu origem. E é sempre falso na

condição contrária. A chamada verdade biológica, se for o caso de

invocá-la ou faze-la prevalecer, tem um diverso teatro de

operações: o das definições judiciais ou extrajudiciais. Para que

chegue ao registro tem de converter-se em fato jurídico, o que, no

tocante à natureza da filiação, supõe sempre um ato de vontade –

pessoa, se for do declarante; política, se for da autoridade – e,

portanto, um exercício de liberdade. Um cidadão que comparece

espontaneamente a um cartório e registra, como seu filho, uma

vida nova que veio ao mundo, não necessita qualquer

comprovação genética para ter sua declaração admitida.

A justificativa para que seja exigido todo o procedimento

legal, é exclusivamente para zelar a proteção da criança ou adolescente, para se

evitar tráfico de menores de idade, abuso sexual, trabalho infantil, falsidade

ideológica104. Este tipo de conduta é penalmente tipificada pelo artigo 242 do

Código Penal105.

101 LOBO, Paulo Luiz Netto. Direito ao estado de filiação e direito à origem genética. p 512. 102 VILLELA, João Baptista. Revista brasileira de direito de família, Revista Forense, Rio de Janeiro, jul. / set. 1993, no 71. p. 138-139. 103 VILLELA, João Baptista. Revista brasileira de direito de família, p. 138-139. 104 Disponível em: www.ambitojuridico.com.br. > 15 de outubro de 2008. 105 BRASIL, Decreto-Lei 2.848, 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Art. 242. Dar parto alheio como próprio; ocultar recém-nascido ou substituí-lo, suprimindo ou alterando direito inerente ao estado civil: Pena - reclusão, de dois a seis anos. Parágrafo único. Se o crime é praticado por motivo de reconhecida nobreza: Pena - detenção, de um a dois anos. Disponível em

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Contrapondo-se a verdade biologia está a verdade socio-

afetiva, surgindo então, o instituto da posse do estado de filho, que valoriza as

relações de afeto na convivência entre os pais e seus rebentos, caracterizando-se

a paternidade afetiva, que será demonstrado no próximo capítulo.

http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaTextoIntegral.action?id=75524 < 15 de outubro de 2008.

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Capitulo 2

A POSSE DE ESTADO DE FILHO

2.1 CONCEITO E ELEMENTOS CARACTERIZADORES

Antes de adentrar no conceito de estado de filho, cabe

examinar o conceito de estado de pessoa, porque todo o indivíduo possui

complexo de qualidades, que integram sua personalidade106.

Segundo Boeira 107 estado de pessoa é “a qualidade que

adere, imediatamente, ao sujeito e que a ela não é pertinente em razão de ser

titular de um direito subjetivo”.

Para a pessoa se fixar na sociedade, ela necessita de

tributos, que constituem fontes de direitos e de obrigações, fornecendo

características personativas, pelas quais se identifica uma pessoa 108.

Interessa saber também o status de filho, que pode ser

revelado pela posse de estado, entende-se estado de uma pessoa como

leciona Gomes109:

a posição jurídica da qual deriva um conjunto de direitos e

obrigações. Todo indivíduo tem direito a determinado estado,

que não se identifica a qualquer relação jurídica, embora nas

diversas posições jurídicas em que pode encontrar-se trave

relações jurídicas com outras pessoas.

106 BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de Paternidade – posse de estado de filho – paternidade socioafetiva. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999. p. 57. 107 BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de Paternidade – posse de estado de filho – paternidade socioafetiva. p. 57. 108 BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de Paternidade – posse de estado de filho – paternidade socioafetiva. p. 57. 109 GOMES, Orlando. Direito de família. p.193.

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2.1.1 Conceito de posse de Estado na questão da filiação e sua presença no ordenamento jurídico

O estado de filiação pode decorrer de um fato, como o do

nascimento ou de um ato jurídico, sendo também irrenunciável e imprescritível,

não admitindo transação 110.

A ação de investigação de paternidade pode ser movida

contra o pai ou seus herdeiros em qualquer tempo, e o filho em qualquer

momento pode reclamar um estado que tem direito, por isso que é

imprescritível 111.

Não esquecendo também, que, o estado de filho fora do

casamento, possui a prova da certidão, que é averbada por sentença

declaratória ou de ato espontâneo de reconhecimento. Sendo assim, uma vez

declarada a filiação através de sentença, o filho adquire estado de filiação

jurídica, conseqüentemente adquirirá o nome do pai112.

Orlando Gomes113 informa que “a posse de estado de

filho constitui-se por um conjunto de circunstâncias capazes de exteriorizar a

condição de filho legítimo do casal que cria e educa”.

Segundo Nogueira114 pode-se conceituar o estado de filho

“como sendo o exercício de fato representado pela aparência de um estado,

donde se presume sua existência, de tal forma que ela permite provar a filiação

de afeto.”

Não se pode esquecer que, a posse de estado se

constitui na base sociológica da filiação, necessitando que o ordenamento

110 BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de Paternidade – posse de estado de filho – paternidade socioafetiva. p. 58. 111 BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de Paternidade – posse de estado de filho – paternidade socioafetiva. p. 59. 112 BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de Paternidade – posse de estado de filho – paternidade socioafetiva. p. 59. 113 GOMES, Orlando. Direito de família. p.31. 114 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. Memória Jurídica Editora: São Paulo, 2001. p. 103.

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jurídico aceite a posse como um caráter jurídico, como já fazem as legislações

que o configuram como elemento constitutivo da filiação115.

Após o advento da Constituição Federal de 1988, que

reformou profundamente o instituto da filiação, adotando um sistema unificado

e, por isso, acabando com qualquer discriminação em relação aos filhos, cabe

agora ao ordenamento jurídico encontrar meios sustentáveis para reconhecer a

paternidade mais condizente com a realidade daqueles que a procuram, dentre

as três linhas que a compõe: a paternidade jurídica, a biológica e a sócio-

afetiva 116.

Nesta busca incessante, por encontrar subsídios

probatórios suficientes para estabelecer a paternidade sócio-afetiva, é que

ganha destaque o instituto da posse de estado de filho, no tocante ao

estabelecimento da filiação extramatrimonial, que valoriza, sobretudo, as

relações de afeto, caracterizando-se não só pelo fator biológico ou por uma

presunção legal e sim, por uma intensa convivência entre pai e filho117.

Cumpre ressaltar, que na paternidade sócio-afetiva, pai

não é apenas aquele ligado por um laço biológico e sim, aquele ligado pelos

intensos e inesgotáveis laços de afeto, ou seja, pai é aquele que cuida,

protege, educa, alimenta, que participa intensamente do crescimento físico,

intelectual e moral da criança, dando-lhe o suporte necessário para que se

desenvolva como ser humano, "eis aqui o fundamento de validade da noção de

posse de estado de filho, a valorização das relações calcadas no afeto 118".

Entretanto, o Direito Brasileiro não faz referência expressa

ao instituto da posse de estado de filho, diferentemente de outros países, que

inseriram tal instituto em sua legislação de forma expressa.

115 BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de Paternidade – posse de estado de filho – paternidade socioafetiva. p. 61.. 116 DELINSKI, Julie Cristine. O novo direito da filiação. São Paulo:Dialética, 1997. p. 38. 117 DELINSKI, Julie Cristine. O novo direito da filiação. p. 38 118 DELINSKI, Julie Cristine. O novo direito da filiação. p. 39.

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2.2 SENTIDO E IMPORTÂNCIA DA POSSE DE ESTADO DE FILHO

O sistema clássico de estabelecimento da paternidade era

exclusivamente matrimonializado, fundado na presunção pater is est, ou seja,

era pai o marido da mãe 119.

Comenta Luiz Edson Fachin120

que:

(...) muitas vezes, não passava pelos muros da verdade

jurídica a busca da verdade biológica, menos ainda a da

verdade sócio-afetiva, a não ser nos limites estreitos previstos

pelo próprio sistema no seio da ‘contestação’ privativa da

paternidade.

Em contrapartida, a verdade biológica veio a superar o

sistema clássico, donde se permite buscar a descendência genética, sendo que

a certeza chega a 99% (noventa e nove por cento), colocando em cheque a

verdade jurídica121.

Dentre a paternidade jurídica e a biológica, uma realidade

ficava à margem da legislação, a paternidade sócio-afetiva, ou seja, aquela que

demonstra a intensa relação entre pai e filho.

Neste sentido, contrabalançando a verdade biológica e a

sócio-afetiva, é que surge o instituto da posse de estado de filho, valorizando-

se a afectio, o caráter sociológico da filiação 122. É na posse de estado de filho

que se vê caracterizada a paternidade de afeto.

Entende-se a posse de estado de filho como sendo:

uma relação afetiva, íntima e duradoura, caracterizada pela

reputação frente a terceiros como se filho fosse, e pelo tratamento existente na relação paterno-filial, em que há o

119 FACHIN, Luiz Edson, Coordenador. Averiguação e investigação da paternidade extramatrimonial: comentários à Lei nº 8.560/92. Curitiba: Genesis, 1995. p. 65. 120 FACHIN, Luiz Edson, Coordenador. Averiguação e investigação da paternidade extramatrimonial: comentários à Lei nº 8.560/92. p. 65. 121 DELINSKI, Julie Cristine. O novo direito da filiação. p. 49. 122 FACHIN, Luiz Edson, Coordenador. Averiguação e investigação da paternidade extramatrimonial: comentários à Lei nº 8.560/92. p. 65.

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chamamento de filho e a aceitação do chamamento de pai

123."

A importância de tal instituto se revela quando da

existência de conflitos de paternidade, especialmente quando da filiação extra-

matrimonial, como por exemplo, nos casos em que as relações de afeto entre

pai e filho não condizem com a paternidade jurídica, ou ainda quando

comprovada a paternidade biológica, mas a existência de posse de estado de

filho se dá com um terceiro, que não o pai genético. Em todos esses casos,

assume importância primordial a posse de estado de filho, valorizando-se a

afectio, a verdade sociológica. É a verdade sócio-afetiva ganhando o abrigo do

Direito 124.

Todavia, como será abordado no próximo capítulo do

trabalho, nosso ordenamento jurídico ainda não elevou a posse de estado de

filho como elemento constitutivo da filiação nos casos de estabelecimento de

paternidade extramatrimonial.

2.3 ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DA POSSE DE ESTADO DE FILHO

Os elementos que podem constituir o instituto da posse

de estado de filho são determinados pela doutrina como sendo o nome

("nomem"), o trato ("tractatus") e a fama ("fama") 125. Porém, como bem diz o

professor Luiz Edson Fachin, "é sabido que estes são os principais dados

formadores daquele conceito, mas nem a doutrina nem o legislador se arriscam

em dar um rol completo ou definição acabada dos fatos aptos a constituí-lo 126”.

Necessário, portanto, que se faça um exame delicado

destes elementos em cada caso concreto, pois, no caso do homem e a mulher

casados, fácil é a exteriorização da posse de estado de filho, entretanto, no

123 BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de Paternidade – posse de estado de filho – paternidade socioafetiva. p. 60. 124 BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de Paternidade – posse de estado de filho – paternidade socioafetiva. p. 60. 125 FACHIN, Luiz Edson. Da paternidade – relação sócio biológica e afetiva. Belo horizonte: Del Rey Editora. 1996. p. 126. 126 FACHIN, Luiz Edson. Estabelecimento da filiação e da paternidade presumida. Porto Alegre: Sérgio A. Fabris Editor. 1992. p. 156.

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caso de filiação adulterina a matre, por exemplo, esta publicidade do filho é um

processo mais complicado, porém, os mesmos podem o tratar igual ou até

mais intensivamente como seu filho do que aqueles que são casados.

A doutrina, verificando estas realidades sociais, entende

que o fato do filho não utilizar o nome do suposto pai, não impede que seja

determinada a posse de estado de filho, colocando como principais elementos

o trato e a fama, que por si só podem bastar para o estabelecimento da

paternidade, dependendo do estudo individualizado de cada caso 127.

Comenta Delinski128 que:

Importa lembrar que não se podem estabelecer conceitos

apriorísticos do trato e da fama. É necessário estudar cada

caso em particular. A determinação deles decorre das

circunstâncias que rodeiam as situações fáticas. Até mesmo a

posição social e o grau de educação das pessoas envolvidas

são fatores que se devem considerar para a configuração e

para a tipificação desses dois elementos essenciais.

O autor José Bernardo Ramos Boeira129 ressalva a

importância da duração, ou seja, "que o fator ‘tempo’ condiciona, ao mesmo

tempo, a existência e a força da posse de estado." E vai mais longe quando

afirma que: "mais que todos os outros elementos, a duração é característica da

posse de estado, ou seja, a condição de existência da posse de estado”.

Passa-se, então a análise destes elementos, que

constituem o instituto da posse de estado de filho.

127 DELINSKI, Julie Cristine. O novo direito da filiação. p. 45. 128 DELINSKI, Julie Cristine. O novo direito da filiação. p. 45. 129 BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de Paternidade – posse de estado de filho – paternidade socioafetiva. p. 65.

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2.3.1. Nome

No que diz respeito ao primeiro elemento, o nome, este se

caracteriza pelo uso do nome da família do suposto pai por seu pretenso filho.

Isto é, a atribuição do nome do pai ao seu filho130.

Entretanto, a doutrina não dá maior importância a este

elemento, dizendo não sê-lo essencial para a configuração da posse de estado

de filho, visto que, muitas vezes, o filho não utiliza o nome de seu pai, porém,

restam caracterizados os outros dois elementos, quais sejam, o trato e a fama,

sendo que a ausência do primeiro não pode ser considerada capaz de

determinar a desfiguração da posse de estado de filho 131.

2.3.2. Trato

Em relação ao trato, este resulta do tratamento

dispensado à pessoa, à criação, à educação, enfim, que o presumido pai a

tenha tratado como seu filho132.

É considerado elemento objetivo, porque se caracteriza

pelo comportamento do pretenso pai em relação ao suposto filho. Pode-se,

assim, reconhecê-lo, pela assistência material e moral dada ao filho, como por

exemplo, o carinho, os cuidados, o afeto, a educação, a saúde, comuns a todos

os pais no tocante aos seus filhos.

Neste aspecto, podem subsistir as assistências material e

moral, ou então somente a material, ou a moral. Pois, para a caracterização

deste elemento deve-se levar em consideração a situação pessoal do suposto

pai, quer dizer, pode ocorrer que o pai não tenha condições econômicas para

prestar assistência ou então que o filho dela não necessite. No caso da

130 BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de Paternidade – posse de estado de filho – paternidade socioafetiva. p. 63. 131 DELINSKI, Julie Cristine. O novo direito da filiação. p. 44 132 BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de Paternidade – posse de estado de filho – paternidade socioafetiva. p. 63.

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assistência moral, o pai pode ter dificuldades em expressar seus sentimentos

ao filho, seja por temperamento, seja por conveniência133.

Destarte, o uso do termo "filho" e do termo "pai", não são

necessários. O que deve ser valorizado é o amor, o carinho, a educação e tudo

mais que um pai dispensa a um filho.

2.3.3. Fama

A fama é a exteriorização desse estado da pessoa para o

público, isto é, que a sociedade conheça a pessoa como sendo filho

daquela134.

Diz-se que é "o lado propriamente social da posse de

estado135." Diante das atitudes do suposto pai em relação ao seu pretenso

filho, as pessoas criaram a convicção de que se trata mesmo de pai e filho. Diz

Pimenta136 que: "trata-se de um reconhecimento do laço da filiação pelo meio

social e familiar, isto é, para utilizar a expressão legal, pelo público".

Tais pessoas, que formam o denominado "público",

podem ser os vizinhos, amigos, empregados e, até mesmo, os parentes dos

interessados, que mesmo podendo ser contraditados, não deixam de ter sua

importância. Neste aspecto, cumpre ressaltar que o as expressões "dizem",

"ouvi dizer", "parece", não bastam para restar caracterizada a fama, sendo

necessário convicção destas acerca da relação paterno-filial.

Segundo Luiz Edson Fachin137:

Várias foram as diretrizes que nortearam a reforma francesa,

quais sejam, a idéia de igualdade entre os diversos tipos de

filiação, sejam naturais ou legítimas; o abrigo da verdade

133 MOURA, Mauro Aguiar de. Tratado prático de filiação. 2. ed. Rio de Janeiro: Aide Editora, 1984. p. 527. 134 BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de Paternidade – posse de estado de filho – paternidade socioafetiva. p. 63. 135 MOURA, Mauro Aguiar de. Tratado prático de filiação. p. 527. 136 PIMENTA, José da Costa. Filiação. Coimbra Editora, 1986. p. 164. 137 FACHIN, Luiz Edson. Estabelecimento da filiação e da paternidade presumida. p. 75.

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biológica, sem, contudo, deixar de lado a verdade afetiva; a

atenuação da presunção pater is est, tendo-se admitido a prova

livre da contestação da paternidade; o fim do monopólio marital

acerca da negação da paternidade e, a idéia de que o conflito

entre a paternidade legítima já estabelecida e a filiação natural,

resolve-se em favor desta, com a utilização da noção da posse

de estado de filho.

Este elemento também é objetivo, pois trata de uma

filiação reconhecida pela sociedade.

2.4 A RECEPÇÃO DA POSSE DE ESTADO DE FILHO NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO

Apesar da revelada importância do instituto da posse de

estado de filho no que tange ao estabelecimento da paternidade

extramatrimonial, referida noção exerce apenas um papel secundário, qual

seja, de revelar a verdade biológica da paternidade, especialmente no direito

brasileiro 138.

Tal tratamento legislativo dado ao referido instituto deixa

enormes lacunas em nosso ordenamento jurídico, pois se vê que a forma de

estabelecimento de paternidade em que se fundamenta nosso direito positivo,

está muito longe de alcançar a realidade apresentada pela sociedade do final

do século XX e início do século XXI, deixando de atender as verdadeiras

necessidades dos indivíduos, que cada vez mais buscam relações fundadas na

afectio 139.

Comenta Maria Cláudia Brauner140:

No entanto, com o desejo de reconhecer a todos o direito a

uma vida familiar, não poderíamos esquecer de atribuir um

expressivo valor à posse de estado de filho, pois quando os

laços criados pelo afeto e pela dedicação se asseveram mais

138 DELINSKI, Julie Cristine. O novo direito da filiação. p. 81 139 BRAUNER, Maria. Cláudia Crespo. Considerações sobre a filiação extramatrimonial em direito de família francês e brasileiro. Revista da Faculdade de Direito, a. 27, n. 27, Curitiba, 1992/93. p. 79,. 140 BRAUNER, Maria. Cláudia Crespo. Considerações sobre a filiação extramatrimonial em direito de família francês e brasileiro. p. 79.

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importante que os laços sangüíneos, significa que, portanto,

estes elementos exteriorizam com fidelidade a idéia de laços

familiares e devem ser devidamente considerados.

Neste tocante, papel fundamental exerce o aplicador do

direito, tendo em vista que será ele o responsável em demonstrar o caminho a

ser seguido pelo legislador na busca da paternidade 141.

Diz Luiz Edson Fachin142 que. ".. na apreciação dos casos

concretos os interesses da criança podem orientar o caminho a ser adotado

pelo julgador." Assim, nas palavras do doutrinador José Bernardo Ramos

Boeira143:

Uma vez incorporada ao sistema, a noção de posse de estado

de filho informaria positiva ou negativamente, fazendo cessar a

presunção pater is est, quando a realidade sócio-afetiva

estivesse determinando uma paternidade diversa daquela,

inicialmente disposta pelo sistema .

Conforme será analisado no próximo subtítulo, verifica-se

que, somente com a utilização da noção de posse de estado de filho no

sistema jurídico a de se conseguir solucionar os conflitos de paternidade de

filiação extramatrimonial, tendo em vista a realidade atual do conceito de

família, fundada em laços de afetividade, a chamada "família sociológica", que

leva ao reconhecimento da paternidade sócio-afetiva.

2.5 A POSSE DE ESTADO DE FILHO E NOVOS VALORES PARA A

FAMÍLIA: DA COMUNIDADE DE SANGUE À COMUNIDADE DE AFETO

Ressalte-se que, mais do que nunca, o afeto possui

grande relevância jurídica, especialmente no que diz respeito às relações de

família, sendo entendido como razão de sua própria existência, diferentemente,

141 DELINSKI, Julie Cristine. O novo direito da filiação. p. 81. 142 In ALVIM, Teresa Arruda, (coord.). Repertório de jurisprudência e doutrina sobre direito de família: aspectos constitucionais, civis e processuais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1995. v. 2. p. 183. 143 BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de Paternidade – posse de estado de filho – paternidade socioafetiva. p. 112.

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como já visto, das relações tradicionais, nas quais a “afectio” era presumida,

determinada por uma situação jurídica pré-estabelecida, fazendo com que nem

sempre existisse no âmbito da família 144.

O sentido da paternidade surge então em três formas: a

paternidade jurídica, determinada pela presunção “pater is est”, a paternidade

biológica, que nos tempos atuais é revelada através do exame de DNA e, a

paternidade sócio-afetiva, aquela fundada nos laços de afeto, cuja construção

se dá diariamente, com pequenas doses de amor, de carinho e cuidados

dispensados ao filho145.

No que tange a paternidade jurídica, estabelecida através

da presunção “pater is est”, conforme já analisado, vimos que esta só fazia

sentido em uma sociedade essencialmente patriarcal e matrimonializada, em

que se exigia a fidelidade da mulher, garantidora, desta forma, da certeza e

segurança quando do estabelecimento da filiação146.

O autor Paulo Luiz Netto Lobo147 explica esta situação:

A família patriarcal perpassou a história deste país e marcou,

profundamente, a formação do homem brasileiro. Suas funções

mais evidentes eram econômico-patrimoniais, políticas,

procracionais e religiosas. A função de realização da

comunidade afetiva, que passou a ser determinante ao final do

Século XX, era secundária. A filiação biológica, desde que

originada na família matrimonializada, era imprescindível para o

cumprimento dessas funções e papéis notadamente de

preservação da unidade patrimonial.

144 BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de Paternidade – posse de estado de filho – paternidade socioafetiva. p. 27. 145 ALMEIDA, Maria Christina de. Investigação de paternidade e DNA: aspectos polêmicos. p. 156. 146 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Princípio jurídico da afetividade na filiação. Princípio jurídico da afetividade na filiação. Jus Navigandi, Teresina, a. 4, n. 41, mai. 2000. Disponível em: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=527> 09 setembro 2008. 147 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Princípio jurídico da afetividade na filiação. Princípio jurídico da afetividade na filiação. Jus Navigandi, Teresina, a. 4, n. 41, mai. 2000. Disponível em: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=527> 09 setembro 2008.

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A respeito da paternidade biológica, esta também não é

mais suficiente, pois a certeza absoluta de origem genética não pode ser vista

como único valor dentro do campo do estabelecimento da paternidade, pois é

certo que a identidade genética não se confunde com a identidade da filiação,

formada pelas relações de afeto, que o ser humano constrói entre a liberdade e

o desejo 148.

E, a paternidade sócio-afetiva surge então como sendo

aquela emergente da construção afetiva, através da convivência diária, do

carinho e cuidados dispensados à pessoa. Surge dentro do conceito mais atual

de família, ou seja, de família sociológica, unida pelo amor, onde se busca mais

a felicidade de seus integrantes.

Entretanto, nem sempre é tarefa simples estabelecer a

paternidade, tendo em vista que não raras vezes existirá um confronto entre as

três, quais sejam a jurídica, a biológica e a sócio-afetiva. E o que se busca com

este trabalho é demonstrar a importância da noção de posse de estado de filho

para a solução deste conflito, como será analisado a seguir.

2.5.1 O equilíbrio das verdades: abertura para a filiação sócio-afetiva

Neste último tópico, pretende-se demonstrar que a busca

pelo equilíbrio entre a valoração da verdade biológica e a necessidade de se

respeitar a verdade sócio-afetiva pode se dar através da utilização da noção de

posse de estado de filho, haja vista, a experiência estrangeira ter demonstrado

sua valiosa contribuição quando dos conflitos de estabelecimento da

paternidade 149.

Como já visto a paternidade não é um dado, algo

determinado, não se podendo estabelecer por presunção derivada da norma

legal ou então somente pela descendência genética, pois, antes de tudo, a

148 LÔBO, Paulo Luiz Netto. A repersonalização das relações de família In BITTAR, C. A. (Coord.). O Direito de Família e a Constituição de 1988. São Paulo: Saraiva 1989. p. 2. 149 OLIVEIRA, José Lamartine Côrrea de; MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de direito de família. 3ª edição. Curitiba: Juruá, 1999. p. 50.

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paternidade é algo que se constrói com o afeto que se funda esta relação,

residindo antes no serviço e amor que na procriação 150.

Zeno Veloso151 demonstra muito bem esta relação em

suas palavras:

Quem acolhe, protege, educa, orienta, repreende, veste,

alimenta quem ama e cria uma criança, é pai. Pai de fato, mas,

sem dúvida, pai. O "pai de criação" tem posse de estado com

relação a seu "filho de criação." Há nesta relação uma

realidade sociológica e afetiva que o direito tem de enxergar e

socorrer. O que cria, o que fica no lugar do pai, tem direitos e

deveres para com a criança, observado o que for melhor para

os interesses desta.

Assim, a busca pelo equilíbrio das verdades biológica e

sócio-afetiva deve sempre priorizar o interesse da criança, pois será ela quem

sofrerá diretamente as conseqüências de uma solução que não encontra

respaldo na realidade por ela vivida.

Por isso mesmo, é que mais uma vez ressalta-se que a

verdade biológica deve ser vista com cautela, fugindo do euforismo dos

avanços da medicina, que hoje trazem em seus exames alto grau de certeza

em relação à descendência genética, pois, do contrário, estar-se-á deixando a

mercê os sentimentos das pessoas envolvidas no caso concreto152.

Nas palavras de Zeno Veloso153:

Não seria razoável e justo, podendo ocasionar a maior desagregação familiar, trocar, simplesmente, o pater is est quem nuptiae demonstrant por um modernoso pater is est quem sanguis demonstrat .

Sobre esta questão, destaca-se o pensamento de Rodrigo

da Cunha Pereira154:

150 VELOZO, Zeno. Direito brasileiro da filiação e paternidade. São Paulo: Editora Malheiros, 1997. p. 214. 151 VELOZO, Zeno. Direito brasileiro da filiação e paternidade. p. 215. 152 VELOZO, Zeno. Direito brasileiro da filiação e paternidade. p. 219. 153 VELOZO, Zeno. Direito brasileiro da filiação e paternidade. p. 219.

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Toda a estrutura do Direito para averiguação da paternidade

está assentada nos laços biológicos da paternidade. Com a

evolução do conhecimento científico isto ficou facilitado, já que

se pode saber quem é o genitor, pelo método do DNA.

Por outro lado, com o avanço do conhecimento "psi"

podemos verificar que a paternidade não é um fato da natureza, mas antes, um

fato cultural. Em outras palavras, paternidade é uma função exercida, ou um

lugar ocupado por alguém que não é necessariamente o pai biológico. Neste

sentido, o lugar de pai pode ser ocupado por outra pessoa como o irmão, o

avô, o namorado etc 155.

E continua:

O Direito brasileiro já deveria ter entendido que por mais que

se queira atribuir uma paternidade pela via do laço biológico,

ele jamais conseguirá impor que o genitor se torne o pai. O

alcance desta investigação limita-se na maioria das vezes,

como já estabeleceu a lei francesa, para os fins de subsídios.

Com isto, podemos entender que a Constituição brasileira de

1988, ao interferir no sistema de filiação, está a um passo do

entendimento da paternidade em seu sentido mais profundo e

real. Ela está acima dos laços sangüíneos. Um pai, mesmo

biológico, se não adotar seu filho, jamais será o pai. Por isto

podemos dizer que a verdadeira paternidade é adotiva e está

ligada à função, escolha, enfim, ao Desejo156.

A paternidade biológica, em determinados casos, coincide

com a paternidade sócio-afetiva. Entretanto, confrontando-se as duas, esta

pode preponderar sobre aquela, tendo em vista que revela muito mais do que

laços de sangue, revela laços de afeto entre pai e filho 157.

154 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. In PEREIRA, Tânia da Silva. (coord.). O melhor interesse da criança: um debate interdisciplinar. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 580. 155 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. In PEREIRA, Tânia da Silva. (coord.). O melhor interesse da criança: um debate interdisciplinar. p. 580. 156 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. In PEREIRA, Tânia da Silva. (coord.). O melhor interesse da criança: um debate interdisciplinar. p. 580. 157 DELINSKI, Julie Cristine. O novo direito da filiação. p. 81.

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Deve-se, para tanto, dar especial importância aos

princípios estampados na Constituição Federal de 1988, que prioriza, acima de

tudo, a dignidade da pessoa humana, "que começa a conquistar importância

social e a adquirir valorização jurídica à paternidade, que também passa a ser

vista por sua concepção cultural, com efeito fático sustentado na afeição e não

apenas na verdade biológica.”.

Vê-se esta transformação muito claramente nas regras

que priorizam a criança, em especial no Estatuto da Criança e do Adolescente,

atendendo, sempre, o seu melhor interesse. E um dos maiores interesses e

direito da criança é, sem qualquer dúvida, a de ter um ‘Pai’, é a busca por uma

paternidade fundada essencialmente nos laços de afeto e amor, na paternidade

construída e vivida diariamente por pai e filho, consolidando, assim, uma

família feliz 158.

É neste sentido que surge a importância de acolhermos

em nosso ordenamento jurídico a noção de posse de estado de filho, como

forma de solução para os conflitos de paternidade que batem às portas do

Poder Judiciário, utilizando-a como verdadeira causa de pedir e elemento

constitutivo da filiação.

Como exemplo, cita-se a presente decisão, que, embora

trata da denominada "adoção a brasileira", consagra a verdade da filiação

sócio-afetiva, decorrente do princípio constitucional da dignidade da pessoa

humana.

Negatória de paternidade. "Adoção a brasileira." Confronto

entre a verdade biológica e a sócio-afetiva. Tutela da dignidade

da pessoa humana. Procedência. Decisão reformada. 1. A

ação negatória de paternidade é imprescritível, na esteira do

entendimento consagrado na sumula 149 do STF, já que a

demanda versa sobre o estado da pessoa, que é emanação do

direito da personalidade. 2. No confronto entre a verdade

biológica, atestada em exame de DNA, e a verdade sócio-

158 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. In PEREIRA, Tânia da Silva. (coord.). O melhor interesse da criança: um debate interdisciplinar. p. 582.

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afetiva, decorrente da denominada "adoção a brasileira" (isto é,

da situação de um casal ter registrado, com outro nome,

menor, como se deles filho fosse) e que perdura por quase

quarenta anos, há de prevalecer a solução que melhor tutele a

dignidade da pessoa humana. 3. A paternidade sócio-afetiva,

estando baseada na tendência de personificação do Direito

Civil, vê a família como instrumento de realização do ser

humano; aniquilar a pessoa do apelante, apagando-lhe todo o

histórico de vida e condição social, em razão de aspectos

formais inerentes a irregular "adoção a brasileira", não tutelaria

a dignidade humana, nem faria justiça ao caso concreto, mas,

ao contrário, por critérios meramente formais, proteger-se-ia as

artimanhas, os ilícitos e as negligências em benefício do

próprio apelado. Decisão: Unânime: negar provimento aos

agravos (TJPR. 2ª C. Ap Cível 0108417900. Rel: Accácio

Cambi. 12.12.01).

Desta forma, precisamos adequar as normas jurídicas

existentes em nosso ordenamento jurídico com a realidade vivida pela

sociedade neste novo século, como bem demonstra Rodrigo da Cunha

Pereira159 em suas palavras:

O desafio do terceiro milênio será a reaprendizagem da

organização da polis, considerando que não é possível pensar

o Estado sem seu núcleo básico, a família. Não é possível este

núcleo básico sem o lugar Estruturante do Pai. Teremos que

reaprender, então, diante das novas formas de família, e nesse

novo contexto social, o que é um pai, pois já sabemos que a

ausência dele pode ser desestruturante para o sujeito.

Assim, na busca do equilíbrio destas verdades para o

estabelecimento da paternidade, deve-se ter como base fundamental os novos

valores inerentes ao conceito de família trazidos pela Constituição Federal de

159 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. In PEREIRA, Tânia da Silva. (coord.). O melhor interesse da criança: um debate interdisciplinar. 1999. p. 582.

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1988, como também pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, os quais

apontam para a valorização da paternidade sócio-afetiva160.

Do ponto de vista jurídico atual, a sócio-afetividade não

somente vem sendo aceito como também vem sendo aplicado, levando em

conta principalmente o interesse da criança, assunto que será abordado no

próximo capítulo.

160 MADALENO, Rolf. Novas perspectivas no direito de família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000. p. 40.

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Capítulo 3

A FAMÍLIA SÓCIO-AFETIVA NO DIREITO BRASILEIRO

3.1 O AFETO

Uma das consideráveis mudanças no seio familiar, é a

drástica redução no número de filhos, dando margem a um relacionamento

mais próximo entre seus membros, permitindo uma maior relação de afeto,

sendo assim a família deixou de ser apenas um centro de produção161.

Carbonera162 entende que “somente podem ser dignas e

iguais as pessoas que respeitam as outras, e isto acontece de forma voluntária

quando se unem em virtude de afeto”.

Para Maffesoli163 o afeto está em toda a relação fundada no

prazer de ser e de estar junto com o outro.

As famílias passaram a ser constituídas à margem do

direito, um exemplo clássico é a união estável, mesmo não sendo conhecida

antes da Constituição Federal de 1988, ela não deixou de ser reconhecida. O

sentimento ganhou força onde antes havia o predomínio da lógica contratual.

O afeto é um elemento fundamental das relações familiares

e de próprios interesses de pessoas envolvidas na situação,

independentemente da intervenção de outrem.

A partir disto o afeto deixa de ser interesse

exclusivamente privado e entra na seara jurídica, confirmando assim sua

161 CARBONERA, Silvana Maria. O papel jurídico do afeto nas relações de família In: FACHIN, Luiz Edson (coord). Repensando Fundamentos do Direito Civil Brasileiro Contemporâneo. Rio de Janeiro: Renovar, 1998, p.296. 162 CARBONERA, Silvana Maria. O papel jurídico do afeto nas relações de família. p. 296. 163 MAFFESOLI, Michel. O Tempo das tribos: o declínio do individualismo nas sociedades pós-modernas. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária. 2006. p. 137/138.

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importância como um relevante valor jurídico. Maria Barenice Dias164 escreve:

“... amplo é o espectro do afeto, mola propulsora do mundo e que fatalmente

acaba por gerar conseqüências que necessitam se integrar ao sistema

normativo legal”.

Atualmente os julgadores do direito de família, estão

cientes do valor do afeto nas relações familiares, conforme jurisprudências

relacionadas:

EMENTA: DIREITO DE FAMÍLIA - ECA - ADOÇÃO -

ENTREGA DE MENOR COM POUCOS MESES DE VIDA

MEDIANTE GUARDA A FAMÍLIA SUBSTITUTA POR

DELIBERAÇÃO DOS PAIS BIOLÓGICOS - AUSÊNCIA DE

CONVÍVIO MÍNIMO PARA A MANUTENÇÃO DE VÍNCULOS

AFETIVOS ENTRE A CRIANÇA E SEUS GENITORES -

ABANDONO PSICOLÓGICO CONFIGURADO - LAÇOS

FAMILIARES ESTABELECIDOS COM OS PRETENSOS

ADOTANTES - EXTINÇÃO DO PODER FAMILIAR - ADOÇÃO

DEFERIDA - RECURSO DESPROVIDO 1. Configura-se o

abandono psicológico dos pais biológicos que entregam o filho,

mediante guarda, à família substituta e não conservam nem

mantêm o mínimo de convívio necessário para a estabilidade

dos vínculos afetivos durante sua criação e desenvolvimento.

2. Deve ser deferida a adoção ao casal que detém a guarda do

adotando adolescente desde que ele tinha poucos meses de

vida e desde então provê toda gama de obrigações que se

impõe aos pais, sendo-lhe conferidos educação, alimentação,

lazer e, sobretudo, carinho familiar (TJSC. 2ª C. Ap Cível 2003.012201-0. Rel: Marcus Túlio. 28.05.2004).

Para Carbonera165 o afeto é um novo elemento a ser

considerado judicialmente, que:

Ganhou dimensões significativas um elemento que

anteriormente estava à sombra: o sentimento. E, com ele, a

noção de afeto, tomada como um elemento propulsor da

relação familiar, revelador do desejo de estar junto à outra

pessoa ou pessoas, se faz presente.

164 DIAS, Maria Berenice. Efeitos patrimoniais das relações de afeto. Repertorio IOB de Jurisprudência, 15/97, caderno 3, p. 301. 165 CARBONERA, Silvana Maria. O papel jurídico do afeto nas relações de família. p. 286.

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Carbonera166 complementa: “embora continuem existindo

famílias nos moldes patriarcais, a recepção de outras formas abriu espaço para

famílias fundadas no afeto e no desejo de estar junto, formando uma

comunhão de vida e fazendo com que este seja seu elemento central”.

A afetividade nas entidades familiares foi juriscizada

quando leva em conta “os desejos de seus membros em satisfazer seus

interesses de realização afetiva e crescimento pessoal”167.

Perlingieri168 complementa; “O merecimento de tutela da

familia não diz respeito exclusivamente às relações de sangue, mas,

sobretudo, aquelas afetivas que se traduzem em uma comunhão espiritual e de

vida”.

3.2 UMA REFLEXAO DA PSICANALISE SOBRE O AFETUAL

Entende-se que quando o ordenamento jurídico não é o

suficiente para responder certas questões, a mesma deve ser procurada em

outras bases da sabedoria, entre uma delas a psicanálise169.

Julien170 traz à tona que a época contemporânea valoriza o

bem-estar. O bem estar seria o que é útil, ou o que interessa.

Segundo Julien171, a função do pai, nas famílias

tradicionais, fundadas na autoridade paterna, é transmitir ao filho a lei do dever.

A modernidade viu a destituição do pai como autor da lei do dever. Reflete:

166 CARBONERA, Silvana Maria. O papel jurídico do afeto nas relações de família. p. 295. 167 CARBONERA, Silvana Maria. O papel jurídico do afeto nas relações de família. p. 290. 168 PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil – Introdução ao Direito Civil Constitucional. 2 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 244. 169 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Família, direitos humanos, psicanálise e inclusão social. Revista Brasileira de Direito de Família. Porto Alegre: IBDFAM: Síntese, v. 4, n. 16, p.8, jan-mar. 2003. 170 JULIEN, Philippe. Abandonarás teu pai e tua mãe. Tradução Procópio Abreu. Rio de Janeiro: Companhia de Freud, 2000. p. 23. 171 JULIEN, Philippe. Abandonarás teu pai e tua mãe. p. 25.

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Parece que nos dias de hoje, com a desaparição do limite que

evocávamos, o que constitui autoridade vem, simultaneamente,

faltar. No que era nossa cultura, a conjunção entre lugar da

autoridade e lugar do sagrado parecia natural. O lugar da

autoridade era simultaneamente o lugar do esconderijo da

divindade e justamente o lugar de onde os mandamentos

podiam se autorizar. A conjunção não era problema para

ninguém; é por isso, alias, que durante séculos o poder foi

teológico-político. A política era fundamentalmente teológica,

pois o poder, por delegação, vinha de Deus.

Para Julien172 o esvaziamento da figura da autoridade do

pai implica também o fim do político:

A vida política está desértica, não há a criança e adolescente

concepção ideológica ou mesmo utópica, nem palavra de

ordem, nem projeto. Não há mais programa político se

transformam em gestores, a ponto de, muito logicamente, um

grande povo como o povo italiano colocar no poder aquele que

é apresentado como homem de negócio. Tudo isso parece

muito razoável: se ele souber gerir bem seus negócios, por que

não saberia gerir os de seus pais?

A partir de então o filho deverá obedecer ao seu pai, não

apenas porque ele é a autoridade suprema da família, mas sim porque “a lei

moral se impõe por si mesma, e não em razão daquele que a enuncia”173.

Adentrando neste assunto, Julien174 diz que a relação

entre o privado e o publico na Modernidade toma a forma de uma disjunção

entre conjugalidade e parentalidade, sendo um dos elementos que levam ao

declínio da autoridade paterna. Acrescenta ainda:

O século XX pensa antes que essa relação não pode ser

deixada ao arbítrio da mãe, nem ao pai. Em nome do bem do

filho, vem então tomar lugar, sob figuras diversas, um terceiro

social: o professor, a pediatra, a psicóloga, a assistente social,

o juiz da criança e do adolescente, o juiz das varas da família.

172 JULIEN, Philippe. Abandonarás teu pai e tua mãe. p. 26. 173 JULIEN, Philippe. Abandonarás teu pai e tua mãe. p. 27. 174 JULIEN, Philippe. Abandonarás teu pai e tua mãe. p. 15.

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(...) quando mais a conjugalidade é privada, mais a

parentalidade é publica.

Para Julien175, “assim que nasce um filho, o casal cruza a

fronteira entre o privado e o público ao reconhece-lo legalmente e obtém, em

troca uma autoridade parental”.

O filho pode abandonar a família de origem para formar

sua família, assim diz a lei do interdito do incesto, que corresponde à lei do

desejo, segundo Julien176.

Julien ainda explica que assim que o filho percebe o desejo

que ocorre entre os pais, surge o seu desejo. Esse tipo de desejo é limitado

pelos próprio pais, fazendo que os filhos percebam os limites de desejo entre

eles177.

A estruturação psíquica da Família é essencial para a

formação do filho, preparando-o para relacionar-se com toda a sociedade,

fazendo com que não importe se quem exerceu a função de pai e mãe foram

ascendentes biológico ou não 178.

O ser humano em suas relações precisa identificar se o

desenvolvimento da família se dará através da vivência da ambivalência afetiva

originária, ou seja, o amor179 e ódio. E é na família que aprendemos e

elaboramos esses sentimentos180.

175 JULIEN, Philippe. Abandonarás teu pai e tua mãe. p. 18. 176 JULIEN, Philippe. Abandonarás teu pai e tua mãe. p. 31/45. 177 JULIEN, Philippe. Abandonarás teu pai e tua mãe. p. 47/48. 178 JULIEN, Philippe. Abandonarás teu pai e tua mãe. p.48. 179 Amar é constituir um Todo de que o outro e si mesmo fazem parte. Não é apenas a união que importa, mas a unidade de uma única Totalidade de que “tu” e “eu” são os elementos. In: JULIEN, Philippe. Abandonarás teu pai e tua mãe. p. 33. 180 JULIEN, Philippe. Abandonarás teu pai e tua mãe. p. 49

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Para Giselle Groeninga181 :

Se existe direito é porque existe o esquerdo, o torto; se existe a

lei é porque existe o desejo; para a psicanálise, o sujeito está

assujeitado a outra lógica, às leis regidas pelo inconsciente e

pelo desejo, pelos nossos impulsos, impulsos da sexualidade

e, friso, também de agressividade. Impulsos que desordenam o

que tentamos, até certo ponto, em vão ordenar.

E continua Groeninga 182:

Para o Direito, a proposta é que a subjetividade posa encontrar

uma via de reinscrição na compreensão da relação entre os

indivíduos, sujeitos e operadores do Direito, com a lei, e, por

sua vez, resgatar o significado simbólico desta e a origem de

sua legitimidade psíquica, que lhe conferem subjetiva e

objetivamente, o poder e a autoridade. Os caminhos passam

pela minoração da distância não só entre o Direito e a

Psicanálise, mas em relação a outras disciplinas e à

coletividade.

A família é um sistema de relações que se traduz em

conceitos e preconceitos, idéias e ideais, sonhos e realizações183 .

O afeto teve seu inicio no Direito por meio do que lhe era

excluído, as relações de filiação e a adoção abriram caminho para essas

relações, porque o que não estava enquadrado legalmente era excluído, mais

essas relações de sentimento foram exercendo um tipo de pressão, e cada vez

mais foi se compreendendo esta ligação do sentimento e do afeto 184.

181 GROENINGA, Giselle Câmara. Direito e Psicanálise – um novo horizonte epistemológico. In: Afeto, Ética, Família e o Novo Código Civil. Coordenação: Rodrigo da Cunha Pereira. Belo Horizonte: del Rey, 2004. p. 256. 182 GROENINGA, Giselle Câmara. Direito e Psicanálise – um novo horizonte epistemológico. p. 256. 183 GROENINGA, Giselle Câmara. Direito e Psicanálise – um novo horizonte epistemológico. p. 258. 184 GROENINGA, Giselle Câmara. Direito e Psicanálise – um novo horizonte epistemológico. p. 259.

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Giselle Groeninga185 reflete sobre o seguinte:

A função da família está mais alem do amor, está em

possibilitar as vivências afetivas de forma segura, balizando

amor e agressividade, inclusive para que as utilizemos como

matéria-prima da empatia, capital social por excelência.

Diante disto, cabe analisar as formas de família fundadas

no afeto existentes.

3.3 A FILIAÇÃO QUE SE CONSTRÓI: FILIAÇÀO SOCIO-AFETIVA

O estado de filho afetivo vale aqui mais uma vez frisar,

revela, conforme ensinamentos de Maria Berenice Dias186 :

(...) a constância social da relação entre pais e filhos,

caracterizando uma paternidade que existe, não pelo simples

fato biológico ou por força de presunção legal, mas em

decorrência de uma convivência afetiva.

O valor do relacionamento entre pai e filho se baseia em

afeto, que se faz em um olhar amoroso, em pegá-lo no colo, protegê-lo e

afagá-lo. Isto mostra que os laços sanguíneos exercem papel secundário para

a determinação da paternidade, sendo assim a filiação é um vinculo que se cria

e não que se determina187.

São dois os momentos que se referem à filiação: a filiação

fisiológica determina a filiação biológica e, o psicológico é que determina a

filiação afetiva. Mesmo a criança possuindo seus pais biológicos, eles podem

ser ausentes nas necessidades psicológicas, tornando-se extremamente

estranhos 188.

185 GROENINGA, Giselle Câmara. Direito e Psicanálise – um novo horizonte epistemológico. p. 260. 186 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. 4. ed. E ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 31. 187 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.85 188 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.86.

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Para Rodrigo da Cunha Pereira189 o que determina a

constituição de família é sua estrutura psíquica, onde o importante é o lugar

que cada membro da família ocupa, de filho, de pai ou de mãe, esclarece ainda

que o pai e a mãe, não precisam ser necessariamente biológicos. Qualquer

pessoa poderá ocupar a maternidade, desde que exerça a função. Um instituto

milenar, para provar tal informação é a adoção. E acrescenta: “o que é

essencial para a formação do ser, para torná-lo sujeito e capaz de estabelecer

laço social, é que alguém ocupe, em seu imaginário, o lugar simbólico de pai e

de mãe “190.

No convívio amoroso é que se faz verdadeiros pais e

filhos, neste laço familiar, nesta vivência diária, onde pais e filhos crescem

juntos, estão inclusos também os sentimentos de raiva, de brigar, de se

entender, impaciência e amor, e é nesse compasso que o convívio da

paternidade se faz 191.

Para Elisabeth Badinter192 a maternidade não é dada de

forma instintiva à mulher, e sim, construída, assim a doutrinadora discorre:

Pode existir ou não existir, ser e desaparecer. Mostrar-se forte

ou frágil. Preferir um filho ou entregar-se a todos, ou entrega-

los todos. Tudo depende da mãe, de sua história e da História.

Não há uma lei universal nesta matéria. O amor materno não é

inerente às mulheres. É adicional.

Percebe-se que são três as vertentes da filiação: a filiação

jurídica, a biológica e a sócio-afetiva. O ideal seria a união de todas as

espécies de filiação, mais em alguns casos, são conflitantes. Neste caso, há a

189 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de Família uma abordagem psicanalítica. Belo Horizonte: Del Rey, 1997. p. 62. 190 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de Família uma abordagem psicanalítica. 1997. p. 63. 191 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.88. 192 BADINTER, Elisabeth. Um amor conquistado: o mito do amor materno. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985, p. 367.

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necessidade da valoração da filiação que decorre do afeto, fundada na verdade

sócio-afetiva193.

Assim, encontramos no texto constitucional 194 a

igualdade estabelecida entre os filhos, sejam eles biológicos ou não. Desta

forma, o atual diploma não comporta nenhuma forma de exclusão entre os

filhos, retirando destes qualquer possível “etiqueta” que lhes pudesse ser

atribuída. Por isso, poder-se afirmar que o Direito de Família, hoje, encontra-se

reedificado na “tábua axiológica constitucional ”195.

Embora não disposto expressamente em nossos diplomas

legais, através de uma interpretação extensiva e teleológica dos mesmos torna-

se possível encontrar a afetividade elevada à categoria de princípio jurídico 196.

O art. 1593 do Código Civil/02 é exemplo claro disso, ao rezar que “o

parentesco é natural ou civil, conforme resulte da consangüinidade ou outra

origem.” Fachin197 pronuncia-se a respeito do tema:

193 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.88. 194 BRASIL, Constituição da República Federativa. Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 4º - Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. § 5º - A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte de estrangeiros. § 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm > 17 de agosto de 2008. 195 Expressão muito bem utilizada por Roberto Paulino em artigo publicado na Revista Brasileira de Direito de Família. (ALBUQUERQUE JÚNIOR. Roberto Paulino. A filiação socioafetiva no Direito Brasileiro e a impossibilidade de sua desconstituição posterior. Revista Brasileira de Direito de Família, v. 8, n 39, 2007, p.53) 196 Com relação a isso, bem expõe Fachin ao afirmar que “Ancorado nos princípios constitucionais, o direito de família constitucionalizado não deve ter como horizonte final o texto constitucional expresso. Por isso sustentamos o direito para além do novo Código Civil. Os princípios constitucionais desbordam das regras codificadas e neles a hermenêutica familiar do século XXI poderá encontrar abrigo e luz.” (FACHIN, Luiz Edson. Direito Além do Novo Código Civil. Revista Brasileira de Direito de Família, v. 5, n 17, 2003, p. 35) 197 FACHIN, Luiz Edson. Boletim do Instituto Brasileiro de Direito de Família, n 19, mar/abr, 2003, p. 3.

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O contido no art. 1593 permite, sem dúvida, a construção da

paternidade socioafetiva ao referir-se a diversas origens de

parentesco. Dele se infere que o parentesco pode derivar do

laço de sangue, do vínculo adotivo ou de outra origem, como

prevê expressamente. Não sendo a paternidade fundada na

consangüinidade ou no parentesco civil, o legislador se referiu,

por certo, à relação socioafetiva. É possível, então, agora à luz

dessa hermenêutica construtiva do Código Civil, sustentar que

há, também, um nascimento socioafetivo, suscetível de fundar

um assento e respectiva certidão de nascimento. Mesmo no

reducionismo desatualizado do novo Código é possível

garimpar tal horizonte, que pode frutificar por meio de uma

hermenêutica construtiva, sistemática e principiológica.

Reiterando posicionamento anteriormente firmado, “a

verdade sócio-afetiva da filiação se revela na posse do estado de filho, que

oferece os necessários parâmetros para o reconhecimento da relação de

filiação”198.

Deste modo, ainda que timidamente, o elemento sócio-

afetivo da filiação “(...) reflete a verdade jurídica que está para além do

biologismo, sendo essencial para o estabelecimento da filiação”199. Mesmo

porque, conforme expõe José Sebastião de Oliveira200:

(...) os integrantes das famílias, não obstante a intensa

liberdade com que mantém seus relacionamentos, buscam

cada dia mais o fortalecimento da reciprocidade dos seus

sentimentos. Esse amálgama dos laços familiares é

representado pela afetividade. Essa razão não vem de

nenhuma estrutura legislativa codificada.

A filiação sócio-afetiva baseia-se no sentimento, que

decorre de uma construção diária, não por mero laço genético. O vínculo de

sangue e de afeto são duas verdades que nem sempre andam juntas, por isso

198 FACHIN, Luiz Edson. Direito de Família: elementos críticos à luz do Novo Código Civil Brasileiro, 2ª ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 23. 199 FACHIN, Luiz Edson. Direito de Família: elementos críticos à luz do Novo Código Civil Brasileiro. p. 20. 200 OLIVEIRA, José Sebastião de. Fundamentos constitucionais do Direito de Família. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 233.

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nem sempre o vínculo biológico está ligado ao afeto com uma criança, mais

sim a dedicação e o cuidado diário com ela 201.

É ilusório ao pensar que o amor de um filho é ligado aos

laços de sangue, pois há casos de pais biológicos que maltratam seus filhos,

que os rejeitam e os desprezam. A relação de filiação é construída pelos laços

de afeto, onde o amor e o acolhimento são peças fundamentais para a

formação do vinculo202.

Desta forma, como diz Nogueira 203: “nem sempre aqueles

que procriam uma criança são os que a criam. A adoção e as procriações

artificiais são exemplos bem presentes dessa realidade”.

3.4 FILIAÇÃO ADOTIVA: FILIAÇÃO DE AMOR

Para a formação de uma família é suficiente a união de

um homem e de uma mulher, sendo que a maioria dos casais necessita a

presença de um filho. Mais existe um número significativo de casais que não

podem realizar tal desejo de forma natural, buscando outras formas, como a

fertilização artificial e a adoção204.

Além de casais que não podem ter filhos e adotam

crianças, há ainda aqueles que já possuem filhos biológicos e que adotam

também. A adoção oferece à criança a possibilidade de pertencer ao núcleo

familiar, possuindo um teto, pão e afeto205.

Atualmente a adoção significa perpetuar laços jurídicos de

filiação. Esse laço significa muito mais do que adquirir vínculo hereditário, sem

201 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.89. 202 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.90. 203 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.90. 204 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.90. 205 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.90.

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sentido como principal é a afetividade. Na adoção o afeto possui maior força,

sendo que o estabelecimento dessa relação familiar é decorrente de uma

opção, pois se trata de um desafio amoroso, que se cria um vinculo de

escolha206.

O afeto tem extrema relevância jurídica, e a adoção está

aí para acabar com qualquer dúvida, pois se trata de um vínculo jurídico de

forma voluntária, onde o afeto deve figurar de forma recíproca entre os

componentes que a integram207.

A adoção jamais deve ser tratada como paternidade de

segunda classe, e, João Baptista Villela208 defende tal argumento:

Ao contrário suplanta, em origem a biológica, pelo seu maior

teor de determinação. Não será mesmo demais afirmar,

tomadas em conta as grandes linhas evolutivas do direito de

família, que a adoção prefigura a paternidade do futuro, por

excelência enraizada no exercício da liberdade. Somente ao

pai adotivo é dada a faculdade de um dia poder repetir aos

seus filhos o que CRISTO disse a seus apóstolos: “não fostes

vós que me escolhestes, mais fui eu que vos escolhi a vós.

A adoção é a prova real de que o vínculo consangüíneo

não é prioridade, mais sim o amor e a afeição sedimentada na convivência. A

paternidade adotiva é a filiação querida e vivida209.

Como aduz Maria Tereza Maldonado210:

Há pessoas que têm a possibilidade de gestar e dar à luz, mais

não tem de criar; há pessoas que têm a possibilidade de

206 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.91. 207 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.90. 208 VILLELA, João Baptista. Desglobalização da paternidade. Revista Forense, Rio de Janeiro, jul. / set. 1993, nº.71, p. 50. 209 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.91. 210 MALDONADO, Maria Tereza. Os caminhos do coração: pais e filhos adotivos. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 26.

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acolher e acompanhar amorosamente o crescimento da

criança, embora não tenha podido gerá-la.

Amor não nasce com o nascimento da criança, ele é algo

que brota no quotidiano, cuidando da alimentação, do banho, da febre,

alegrando-se com os primeiros passos e palavras, enfim, nos momentos bons

e difíceis.

Neste sentido sustenta Sérgio Gischkow Pereira211 que:

(...) a paternidade é conceito não só genético ou biológico, mas

psicológico, moral e sócio-cultural. Em grande número de

ocasiões o vínculo biológico não transcende a ele mesmo e

revela-se completo e patológico o fracasso da relação de

paternidade sob o prisma humano, social e ético. Em

contrapartida, múltiplas situações de ausência de ligação

biológica geram e mostram relação afetiva, em nível de

paternidade, saudável, produtiva, responsável. E os milhões de

casos de paternidade biológica não desejada? Por outro lado, a

paternidade oriunda da adoção é plenamente consciente e

desejada.

É dupla a função da adoção, função pessoal e social, a

função pessoal é a de possibilitar filhos a quem a natureza não permitiu, e a

função social é de oferecer as crianças abandonadas um lar afetivo, que seus

pais biológicos não lhes deram212.

A paternidade é uma opção e não uma imposição, é

assim que existem verdadeiros pais, que amam alguém carente e que está

disposto a receber este carinho, independente de vínculo genético213.

Como aduz João Baptista Villela214 :

211 PEREIRA, Sérgio Gischkow. Algumas considerações sobre a nova adoção. Revista dos Tribunais, São Paulo, 1992, no. 682, p.65. 212 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.93. 213 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.93. 214 VILLELA, João Baptista. Desglobalização da paternidade. Revista Forense, 1993, nº. 71, p. 50.

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A desglobalização da paternidade, que é, ao mesmo tempo,um

fato e uma vocação, rasga importantíssimas aberturas sociais.

Em momento particularmente difícil, quando o mundo

atravessa aguda crise de afetividade, e dentro dele o país sofre

com seus milhões de crianças em abandono de diferentes

graus e espécies, a consciência de que a paternidade é opção

e exercício, e não mercê ou fatalidade, pode levar a uma feliz

aproximação entre os que têm e precisam dar e os que não

têm e precisam receber.

Muitas vezes um filho biológico não é desejado, oposto do

que ocorre na adoção. Pois ela segue o principio da liberdade, por ser uma

paternidade pensada, desejada e escolhida, pode ser igual à biológica ou até

superior, dado o seu teor de autodeterminação215.

Ressalta-se que se a afetividade não for recíproca, não há

como haver uma vinculação afetiva, sendo assim, não configura a filiação216.

A adoção é um instituto que regulamenta as relações de

cunho afetivo e social, são pessoas capazes de transmitir igualdade,

fraternidade e amor217.

Magnificamente nos diz Jacqueline Nogueira218:

As mãos quentes que acariciam uma criança, transbordando

de emoção, não têm nacionalidade. Lar é lar, cama é cama,

leite é leite, pão é pão e afeto é afeto, em qualquer lugar do

mundo, quando se coloca nos gestos, nos lábios e no coração

esse sentimento nobre que se chama amor.

A linguagem do afeto é universal, por isso, para a criança

não importa quem vai dizer isto a ela, se vai ser em outra língua, ou se não são

215 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.94. 216 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.95. 217 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.95. 218 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.95.

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seus pais de sangue ou se não tem a sua cor. Porque histórias de adoção são

histórias de amor, construídas com responsabilidade, fraternidade e afeto219.

3.5 AFETIVIDADE COMO DIREITO E DEVER JURÍDICO

Os juristas procuram explicar as relações familiares

contemporâneas, que são fundadas no afeto, desaparecendo, então, suas

funções tradicionais. Além disso, o afeto não é algo biológico, e sim algo que

devirá de uma convivência220.

O desafio é colocado para os juristas que lidam com o

direito de família, pois cabe a eles ter a capacidade de ver e conhecer as

pessoas em toda a sua dimensão ontológica, a ela subordinando as

considerações de caráter biológico ou patrimonial221.

Como leciona Eduardo de Oliveira Leite222:

(...) as indagações doutrinárias mais recentes têm insistido, de

forma cada vez mais freqüente e firme, que a filiação não é

somente fundada sobre os laços de sangue; o vinculo

sangüíneo determina, para a grande maioria dos pais, um laço

fundado sobre a vontade de aceitação dos filhos. Logo a

vontade individual é a seqüência ou complemento necessário

do vinculo biológico.

Homenageando a filiação sócio-afetiva, em promissora

linha de tendência da jurisprudência brasileira, assim decidiu o Tribunal de

Justiça do Rio Grande do Sul:

EMENTA: FILHO DE CRIAÇÃO. ADOÇÃO. SOCIOAFETIVIDADE. No que tange à filiação, para que uma situação de fato seja considerada como realidade social (socioafetividade), é necessário que esteja efetivamente consolidada. A posse do estado de filho liga-se à finalidade de

219 NOGUEIRA, Jacqueline Filgueras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como valor jurídico. p.95. 220 LOBO, Paulo Luiz Netto. Direito e Psicanálise – um novo horizonte epistemológico. In: Direito ao estado de filiação e direito à origem genética. Coordenação: Rodrigo da Cunha Pereira. Belo Horizonte: del Rey, 2004. p513. 221 LOBO, Paulo Luiz Netto. Direito ao estado de filiação e direito à origem genética. p 513. 222 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações artificiais e o direito, p. 203.

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trazer para o mundo jurídico uma verdade social. Diante do caso concreto, restará ao juiz o mister de julgar a ocorrência ou não de posse de estado, revelando quem efetivamente são os pais. A apelada fez questão de excluir o apelante de sua herança. A condição de filho de criação não gera qualquer efeito patrimonial, nem viabilidade de reconhecimento de adoção de fato. APELO DESPROVIDO. (TJRS. 8ª. C. Ap. C. 70007016710. Rel. Des. Rui Portanova. 13.11.03.).

O Superior Tribunal de Justiça, também possui o

seguinte entendimento a respeito do assunto:

RECONHECIMENTO DE FILIAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO SANGÜÍNEA ENTRE AS PARTES. IRRELEVÂNCIA. DIANTE DO VÍNCULO SÓCIO-AFETIVO.

- Merece reforma o acórdão que, ao julgar embargos de

declaração, impõe multa com amparo no art. 538, par. único,

CPC se o recurso não apresenta caráter modificativo e se foi

interposto com expressa finalidade de prequestionar.

Inteligência da Súmula 98, STJ. - O reconhecimento de

paternidade é válido se reflete a existência duradoura do

vínculo sócio-afetivo entre pais e filhos. A ausência de vínculo

biológico é fato que por si só não revela a falsidade da

declaração de vontade consubstanciada no ato do

reconhecimento. A relação sócio-afetiva é fato que não pode

ser, e não é, desconhecido pelo Direito. Inexistência de

nulidade do assento lançado em registro civil. - O STJ vem

dando prioridade ao critério biológico para o reconhecimento

da filiação naquelas circunstâncias em que há dissenso

familiar, onde a relação sócio-afetiva desapareceu ou nunca

existiu. Não se pode impor os deveres de cuidado, de carinho

e de sustento a alguém que, não sendo o pai biológico,

também não deseja ser pai sócio-afetivo. A contrario sensu,

se o afeto persiste de forma que pais e filhos constroem uma

relação de mútuo auxílio, respeito e amparo, é acertado

desconsiderar o vínculo meramente sanguíneo, para

reconhecer a existência de filiação jurídica. Recurso

conhecido e provido. (STJ. 3ª. C. REsp. 878941. Rel. Des.

Nancy Andrighi 21.08.07).

Para todo este pensamento de doutrinadores e juristas

existe base e fundamento constitucional e legislativo.

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3.6 A FILIAÇÃO AFETIVA COM FUNDAMENTAÇÃO CONSTITUCIONAL E

NO CÓDIGO CIVIL

Quanto a fundamentação constitucional para a questão da

filiação, a Constituição 223 não fundamenta apenas na filiação biológica, mais

sim de maneira geral, assim transcreve o texto legal:

Art. 227 É dever da família, da sociedade e do Estado

assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade,

o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer,

à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à

liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de

colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,

exploração, violência, crueldade e opressão.

§4º A lei punirá severamente o abuso, a violência e a

exploração sexual da criança e do adolescente.

§5º A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da

lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por

parte de estrangeiros.

§6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por

adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas

quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

Art. 229 Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos

menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar

os pais na velhice, carência ou enfermidade.

Art. 230 A família, a sociedade e o Estado têm o dever de

amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na

comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e

garantindo-lhes o direito à vida.

Não há qualquer fundamento na Constituição que faça

distinção quanto ao tipo de filiação. O que na realidade ocorre é a interpretação

equivocada, que tem tratado tal assunto como mera casualidade, sendo que o

223 BRASIL, Constituição da República Federativa. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm > 17 de agosto de 2008.

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paradigma da filiação vem se transformando. As relações familiares nunca

tiveram como essência a origem genética, desde o direito anterior 224.

No Código Civil, é tratada a filiação de forma igual

também, quebrando qualquer barreira discriminatória da legitimidade, fundada

na consangüinidade e matrimonialidade225. Assim regem os seguintes artigos

do Código Civil:

Art. 1.596 Os filhos, havidos ou não da relação de casamento,

ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações,

proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à

filiação.

Art. 1.593 O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de

consangüinidade ou outra origem.

Tais artigos são superadores e inclusivos quanto ao

parentesco, não colocando distinção em filiação, e tratando o parentesco

natural, independendo de sua origem.

3.6.1 A filiação sócio-afetiva e o posicionamento das jurisprudências

acerca desta questão

São diversos os tipos de filiação sócio-afetiva, e é neste

tópico que será demonstrado o posicionamento jurisprudencial a respeito de tal

assunto.

A primeira jurisprudência colhida foi do Tribunal de Justiça

de Santa Catarina:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE ADOÇÃO -

AUTORES NÃO INCLUÍDOS NO CADASTRO DE ADOÇÃO

DA COMARCA - FORMALISMO LEGAL QUE NÃO PODE

SOBREPUJAR AOS INTERESSES DO MENOR - LAÇOS

FAMILIARES ESTABELECIDOS COM OS PRETENSOS

ADOTANTES - SUPREMACIA DOS INTERESSES E BEM-

ESTAR DO INFANTE - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO

DESPROVIDO. "Embora a inscrição no cadastro de

224 LOBO, Paulo Luiz Netto. Direito ao estado de filiação e direito à origem genética. p 515. 225 LOBO, Paulo Luiz Netto. Direito ao estado de filiação e direito à origem genética. p 515.

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interessados à adoção seja uma exigência legal, a sua

ausência não pode ser óbice ao deferimento da adoção, uma

vez que o formalismo legal não pode se sobrepor aos

interesses do infante, ainda mais quando este já tenha

consolidado laços de afeto com os adotantes e todas as

demais situações lhe são plenamente favoráveis”. (TJSC. 2ª. C.

Ap. C. 2006.037697-6. Rel. Des. José Mazoni. 08.02.2007).

O nosso Tribunal reconheceu o lado afetual do caso, e

demonstrou que mesmo que as exigências legais não foram cumpridas, isto

não foi contrário ao interesse do infante. Segue o acórdão:

Como bem ponderou o ilustre Promotor de Justiça, é

inquestionável a possibilidade de deferimento da adoção diante

da inexistência de cadastro. A inscrição em cadastro de

adotando não se erige em requisito para a adoção. Portanto, o

fato dos Apelados não se encontrarem cadastrados não é

empecilho ao deferimento da medida, pois o cadastro não

contém comando absoluto, podendo ser a ordem quebrada

sempre que for do interesse da criança, que é o que ocorre nos

presentes autos, em que o vínculo entre adotantes e adotado já

está materializado. Retirar a criança do convívio dos Apelados

é que poderia ocasionar um enorme prejuízo à formação do

infante.

Outro caso semelhante no Tribunal de Justiça de São

Paulo:

Ementa: Negatória de paternidade - Improcedência -

Insurgência do autor - Alegada ocorrência de vício do

consentimento - Inconsistência - Hipótese em que

caracterizada típica "adoção à brasileira" - Reconhecimento,

portanto, irrevogável e irretratável - Ademais, os estudos social

e psicológico revelaram a existência de vínculo socioafetivo

entre as partes - Menor que não pode ser desapossado de seu

estado de filho simplesmente em razão das ingerências entre

sua genitora e o autor - Verdade socioafetiva que sobrepuja à

biológica - Sentença mantida - Recurso improvido. (TJSP. 8ª.

C. Ap. C. 5349554100. Rel. Des. Joaquim Garcia.

08.10.2008.).

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Ainda mais uma Jurisprudência acerca do tema em

estudo:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. INVESTIGAÇÃO DE

PATERNIDADE. FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA COM OS PAIS

ADOTIVOS. Mantém-se a sentença que reconheceu a

impossibilidade jurídica do pedido do autor de investigar a sua

paternidade, se ele próprio reconhece que foi criado como filho

pela família adotiva, configurando, assim, a filiação socioafetiva

com os pais registrais, a qual se sobrepõe à verdade/filiação

biológica. Apelação desprovida. (TJRS. 2ª. C. Ap. C.

70022758924. Rel. Des. José Ataídes Siqueira Trindade.

05.06.2008)

Tais decisões afirmam a importância e a possibilidade dos

laços de afeto ampararem a adoção de crianças, as quais foram entregues

pelos seus genitores.

Acertado o entendimento, compreende-se que as

relações entre pais e filhos evoluíram, deixando de lado um pouco o

autoritarismo, mais obtendo uma relação maior de afeto, solidariedade e

vontade de possuir alguém como filho.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente monografia procurou abordar o tema da Adoção,

e o reconhecimento desta filiação sócio-afetiva pelo Direto brasileiro. O trabalho

desenvolveu-se a partir do Estatuto da Criança e do Adolescente, da Constituição

da república Federativa do Brasil/1988 e do Código Civil.

Na tentativa de desenvolver um raciocínio lógico e, entender

a importância do afeto para o instituto da Adoção, este trabalho foi dividido em

três capítulos, subdividido em seus sub-capítulos.

Após a conceituação do instituto, traz-se uma breve incursão

histórica, mencionando que na Antiguidade a Adoção era usada apenas para

beneficiar aqueles que não possuíam descendentes, como forma de evitar o

desaparecimento do culto familiar, para que suas crenças se propagassem por

suas gerações, o que acabava evidenciando o caráter puramente negocial do ato.

No Brasil, na vigência do Código Civil de 1.916, a Adoção

era tratada de uma forma limitada, pois previa a desigualdade entre o filho adotivo

e o filho biológico, fazendo com que na sucessão hereditária fosse excluído o filho

adotivo caso o adotante já possuísse filhos ao tempo da Adoção. A lei também

era destinada a pessoas com mais de cinqüenta anos, obtendo uma diferença de

dezoito anos entre o adotante e o adotado.

A lei 3.133/57 introduziu alterações ao Código Civil de 1916,

mudando a idade do adotando, para trinta anos e a diferença de idade entre

adotando e adotado passou a ser de dezesseis anos, impondo também que os

adotantes estivessem, pelo menos, cinco anos casados. Quanto à sucessão

hereditária, entretanto, permaneceu a exclusão do adotado se os adotantes

possuíssem filhos biológicos. A sucessão passou a ser reconhecida apenas pela

Constituição da Republica Federativa do Brasil/1988 preceituando a igualdade

entre as filiações biológicas e não biológicas.

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A evolução ocorreu gradativamente, então segue-se uma

cronologia. A lei 4.655/65 institui a legitimação adotiva, que já em 1979, pela lei

6.697/79, substitui a legitimação adotiva pela adoção plena, conforme o Código

de Menores. Mais a grande inovação ocorreu em 13 de julho de 1990, com a

criação da lei 8.069, Estatuto da Criança e do Adolescente, que revogou o Código

de Menores, passando assim todas as adoções sendo plenas.

Quanto à função social do Instituto, cabe mencionar que a

família é o fundamento básico para a estrutura de uma criança, independente d e

qualquer circunstância a criança ou adolescente detém o direito da convivência

familiar.

Outra questão que merece consideração são os requisitos

para adotar, que há diferença de idade entre o Código Civil de 2002, que limita a

idade de dezoito anos para quem quer adotar, e o Estatuto da Criança e do

Adolescente que aumenta para vinte e um anos a idade do adotante. Muitos são

os entendimentos quanto a este assunto, mais a maioria dos doutrinadores

prefere usar a idade estabelecida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, por

achar uma idade mais madura e possibilitar maior chance da pessoa ter

conseguido estabilidade financeira.

O primeiro capítulo seguiu então dos requisitos necessários

pelos adotantes e adotados, estabelecido pelo Estatuto da Criança e do

Adolescente, sendo também demonstrado a vantagem de tal instituto. Foi

encerrado com o tópico da “adoção à brasileira”, que revela o caráter afetual

dessa adoção.

Nesta linha de raciocínio a respeito do afeto, abordou-se no

segundo capítulo a questão da posse de estado de filho, que é baseada no afeto,

na convivência familiar. O Direito Brasileiro não faz referência expressa, o que o

difere de outros países.

A paternidade funda-se no afeto que há entre pai e filho, e

neste sentido já temos entendimento jurisprudencial, reconhecendo juridicamente

o valor do afeto.

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Como ultima explanação, o terceiro capítulo enfoca a família

sócio-afetiva, considerando-se o afeto, um relevante valor jurídico. Para melhor

entendimento, foi levantada toda uma questão reflexiva e conceitual sobre o afeto,

e seu valor dentro no instituto familiar.

Não podendo, também, deixar de mencionar o quanto a

adoção é baseada neste afeto, que possibilita casais darem amor a uma criança,

e uma criança a dar amor aos pais, independente de sua consangüinidade, pois a

consangüinidade não é prioridade na relação familiar.

Retomando as hipóteses da pesquisa, verificou-se que a

hipótese (a) restou esclarecida, conforme demonstrada seus requisitos perante o

Estatuto da Criança e do Adolescente, o Código Civil/2002 e a Constituição da

República Federativa do Brasil/1988.

Em relação à hipótese (b) ficou comprovada a necessidade

do afeto para o caráter da posse de estado de filho, independente de nossa

legislação não mencionar tal instituto, obtivemos jurisprudências que reconhecem

a posse.

A última hipótese trabalhada restou confirmada, pois o afeto

na filiação sócio-afetiva possui fundamento e reconhecimento jurídico,

demonstrando que a família é algo que se constrói e não que se adquire, tendo

por base o afeto, o amor e as qualificações estabelecidas em nossa Constituição

Federal, no Código Civil e no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Os doutrinadores pátrios, bem como nossa jurisprudência,

revelam o reconhecimento do afeto enquanto um valor fundamental da Família, e

no instituto da Adoção.

Portanto, o julgador deve, nos casos em que se tratar de

adoção, utilizar-se sempre do caráter afetual como valor jurídico, de uma forma

sábia e consciente para dirimir as questões relativas à filiação.

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