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O semiárido cheio de vida na casa da família Pia Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Ano 8 • nº 1971 Sobral Julho/2014 cuidadosamente atendidos com o mecanismo de gotejamento, chamado de "técnica de irrigação de salvação", feito com o auxílio de uma garrafa d'água PET furada que goteja contínua e lentamente. O processo é simples, custo zero (já que a garrafa pode ser reciclada) e a técnica evita o desperdício de água. No espaço maior do quintal, uma variedade enorme de encher os olhos. Macaxeiras, cenouras, alfaces (bem verdinhas!), couves, chuchus, pimentões, repolho, mamão, coco e uma infinidade de outros frutos. ara chegar à casa de Luiz Pia e Jandira não tem erro. É só ir até o final da Pestrada de terra que segue cortando o morro do Barro Alto, em Sobral. Na região conhecida pelos moradores como Contendas. O caminho vai se enchendo de verde e o clima ameniza, ainda que o inverno tenha sido de pouca chuva e a seca dos últimos anos tenha deixado suas marcas. Mas no quintal da família nem parece que a seca perdura. A terra brota vida por todo lado. Atrás da casa uma bananeira se impõe com os cachos fartos ainda verdes. No cantinho reservado para o pomar tem cheiro verde, hortelã, pimenta, cebolinha e tomate. Os pés mais necessitados de água são Essa fartura toda, diz Luiz, é graças à água acumulada nas cisternas que tem em casa. “Se nós não tivéssemos hoje uma cisterna dessas, a gente tava passando necessidade”. Ele comemora as cisternas de placa de 16 e 52 mil litros cheias, ainda que o céu tenha baixado pouca chuva para a terra esse ano. Aí foi que comprovou para o Tio Augusto (o vizinho), que as cisternas davam certo. Ele, que não botava fé de jeito nenhum. Muitos moradores dali ainda duvidam, assim como seu Augusto. O Luiz Pia, desde que implantou as cisternas em casa, passou a ajudar na articulação da comunidade como voluntário, para tentar garantir que todo mundo da região tenha suas cisternas em casa e não sofram depois com a falta de água. Ele tem como argumento de incentivo a própria experiência. São as cisternas de placa que tem garantido a produção e o sustento da família do Pia. Desde dezembro, tem verdura na mesa sem precisar comprar nada. Só de tomate já chegaram a colher 14kg em uma semana. Quintal produtivo da família Pia Jandira e Luiz mostrando a fartura do quintal

O Semiárido cheio de vida na casa da família Pia

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Um quintal de encher os olhos de tanta diversidade de frutas e frutos que Luiz, Jandira e os filhos fizeram brotar na terra. Com a instalação de cisternas pelo P1+2, a família conseguiu garantir água para o consumo e para deixar o quintal rico o ano todo. Muitas verduras, hortaliças, eles já nem compram. O cultivo dá para o consumo próprio e muitas vezes para a venda.

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Page 1: O Semiárido cheio de vida na casa da família Pia

O semiárido cheio de vida na casa da família Pia

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Ano 8 • nº 1971

Sobral

Julho/2014

cuidadosamente atendidos com o mecanismo de gotejamento, chamado de "técnica de irrigação de salvação", feito com o auxílio de uma garrafa d'água PET furada que goteja contínua e lentamente. O processo é simples, custo zero (já que a garrafa pode ser reciclada) e a técnica evita o desperdício de água. No espaço maior do quintal, uma variedade enorme de encher os olhos. Macaxeiras, cenouras, alfaces (bem verdinhas!), couves, chuchus, pimentões, repolho, mamão, coco e uma infinidade de outros frutos.

ara chegar à casa de Luiz Pia e Jandira não tem erro. É só ir até o final da Pestrada de terra que segue cortando o

morro do Barro Alto, em Sobral. Na região conhecida pelos moradores como Contendas. O caminho vai se enchendo de verde e o clima ameniza, ainda que o inverno tenha sido de pouca chuva e a seca dos últimos anos tenha deixado suas marcas.

Mas no quintal da família nem parece que a seca perdura. A terra brota vida por todo lado. Atrás da casa uma bananeira se impõe com os cachos fartos ainda verdes. No cantinho reservado para o pomar tem cheiro verde, hortelã, pimenta, cebolinha e tomate. Os pés mais necessitados de água são

Essa fartura toda, diz Luiz, é graças à água acumulada nas cisternas que tem em casa. “Se nós não tivéssemos hoje uma cisterna dessas, a gente tava passando necessidade”. Ele comemora as cisternas de placa de 16 e 52 mil litros cheias, ainda que o céu tenha baixado pouca chuva para a terra esse ano. Aí foi que comprovou para o Tio Augusto (o vizinho), que as cisternas davam certo. Ele, que não botava fé de jeito nenhum. Muitos moradores dali ainda duvidam, assim como seu Augusto. O Luiz Pia, desde que implantou as cisternas em casa, passou a ajudar na articulação da comunidade como voluntário, para tentar garantir que todo mundo da região tenha suas cisternas em casa e não sofram depois com a falta de água. Ele tem como argumento de incentivo a própria experiência. São as cisternas de placa que tem garantido a produção e o sustento da família do Pia. Desde dezembro, tem verdura na mesa sem precisar comprar nada. Só de tomate já chegaram a colher 14kg em uma semana.

Quintal produtivo da família Pia

Jandira e Luiz mostrando a fartura do quintal

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Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Articulação Semiárido Brasileiro – Ceará

RealizaçãoApoio

Depois de de 35 anos, de tentativas fora da roça (trabalhou como ajudante de cozinha no Rio de Janeiro, tentou a vida em Brasília, tudo na ilusão de uma vida melhor), Luiz Pia agradece a vida que tem. Hoje faz parte do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Sobral e fundou, há pouco mais de um ano, junto com os companheiros da região, uma associação comunitária do Sítio Contenda Jordão, do qual é o vice-presidente.

Jandira, por sua vez, cuida junto com o companheiro, os filhos, e os parentes na casa e quintal vizinho, do plantio de frutas e verduras. Nos momentos de descanso gosta de passar o tempo com o artesanato, familiarizada desde os tempos de menina. Mostra os suportes de garrafa que faz com a palha trançada. A habilidade é tanta que nãoprecisa nem focar os olhos no trabalho para dar conta do resultado bem feito. Ali, nas Contendas, não falta trabalho, não falta fartura, e não falta esperança de ver o povo todo convivendo tão bem com o semiárido como na casa de Jandira, Luiz, Maicaeli e Marcilei. Ali, sem dúvidas, é um belo lugar para se viver.

“Mas a vida no campo melhorou demais. Antes a necessidade era tão grande que, durante o trabalho na roça, um dos meus irmãos voltava pra casa com algumas mandiocas, ralava e retornava a roça pra que os outros comessem a mandioca com leite de cabra. E passavam o dia trabalhando só com isso na barriga”. O Luiz vive ali no mesmo chão desde sempre. Já Jandira, teve que atravessar justo o morro de Santo Antônio - que da casa se avista -, para se juntar com o Luiz Pia. Da união vieram Micaeli e Marcilei, hoje com 12 e 17 anos. Marcilei se dedica aos estudos porque o vestibular está perto. Quer cursar odontologia. Mas ainda que os interesses para o futuro sejam outros, Marcilei dedica um tempo para ajudar os pais na produção do quintal, assim como a Micaeli.

Enquanto vê o filho pensando em prolongar os estudos, conta das únicas aulas que teve de alfabetização na casa da professora que morava na vizinhança. Naquela época, e distante das escolas, sem transporte, as crianças trabalhavam muito mais do que estudavam. Lembra muito bem que o começo da vida na roça foi como uma brincadeira. Afinal de contas, tinha apenas 8 anos de idade. Até que se cansou; mas já não pôde mais deixar de brincar. “Você se maltrata demais. Você faz pela necessidade”.

Cisterna calçadão na casa da família do Luiz Pia

Técnica de irrigação de salvação