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O Teatro Do Absurdo de Slavoj Zizek

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O Teatro Do Absurdo de Slavoj Zizek

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Fernando Luis Schuler

o TEATRO DO ABSURDODE SLAVOJ ZIZEK

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o artigo que segue procura esboçar al-gumas ideias sobre uma ética da atividadeintelectual. A leitura da obra de Zizek, emespecial seus dois últimos livros publicadosno Brasil, Vivendo ofim dos tempos e Em de-fesa das causas perdidas, funciona como umaespécie de campo de batalha. Encontro emZizek o paradigma do oposto daquilo quedefendo como uma perspectiva ética davida intelectual, da prática do texto ana-lítico, em especial no que diz respeito aoterreno da política. Alguém poderia retru-car dizendo que nada disso interessa ou dizrespeito a Zizek,que não passa de um ideó-logo,de modo que não há muito sentido emlhe exigir rigor, método ou mesmo algumapego à verdade. Sendo este o caso, o textoque segue não faz nenhum sentido. De fatofiquei em dúvida se valia a pena investir al-gum tempo analisando um escritor comoZizek. Não cheguei a uma boa conclusão.De todo modo, fui em frente.

Zizekconcentra-se na tese de que o ca-pitalismo está em estado terminal. Em seupenúltimo livro, Em defesa das causas perdi-das, os motivos do fim do capitalismo eramessencialmente a crise financeira, e andavaem voga falar da crise na Grécia. O tempopassou, O capitalismo não acabou e Zizekpublicou um novo livro, Vivmdo afim dostempos. O livro vai na mesma direção, asse-gurando que o capitalismo está à beira do"zero apocalíptico". A Grécia e a crise fi-nanceira saíram de cena, surgindo uma novalista de razões: a "crise ecológica, a revoluçãobiogenética, o crescimento vertiginoso dasexclusões e divisões sociais e as contradiçõesdo próprio sistema"

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A lista me pareceu incompleta. Zizeknão explica porque a revolução biogenéticaseria mais ameaçadora do que a nanotecno-logia ou a revolução robótica, ou quem sabeos recentes avanços da exploração em Marte.O livro traz uma série de exemplos de tecno-logias com riscos apocalípticos muito alémdo campo biogenético. A cada tecnologiamencionada, a pergunta é sempre a mesma:o que está por trás disso?, suspeita que surgemesmo em relação apequenos modernismostecnológicos; tomemos o caso da inteligén-cia artificial. Em geral, vemos como positivoo aumento da capacidade de processamentodos computadores e sua capacidade de re-solver nossos problemas no trabalho e no diaa dia. Zizek olha mais adiante e nos alerta:"Eles se comunicarão, tomarão decisões etc.,e nos apresentarão apenas os resultados desua interação." "Elesll

, obviamente, são oscomputadores. Fiquei em dúvida sobre o"etc.". Do que mais seriam capazes os comu-tadores? Zizek nos dá um exemplo: "quan-do tiramos dinheiro de um caixa eletrõnico,ele informa ao computador do banco, quemanda a informação por e-mail ao nossocomputador". Diante deste exemplo, fiqueipensativo. Há bancos mais avançados que jápermitem ao cliente solicitar a suspensão doenvio de e-mails. Casualmente, é o caso dainstituição com a qual trabalho. Fui adiante.

Em outro alerta, Zizek nos informa queassistiu a uma reportagem da CNN mos-trando que "macacos com sensores implan-tados no cérebro aprenderam a controlar umbraço robótico com o pensamento, usando-opara comer frutas e marshmellow". As pes-quisas são conduzidas por uma equipe da

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bus,Universidade de Pittsburgh liderada pelo de argumentação? Reúne um punhado de rari:Dr. Andrew Schwartz. Essa leitura me pro- dados dispersos (evita séries estatísticas), um

I vacou um leve incômodo nacionalista, vis- menciona os riscos envolvidos e debita a queto que o brasileiro Miguel Nicolelis reali- responsabilidade na conta da peste priva- umza pesquisas na mesma direção. Há muitas tis ta-capitalista. Numa variação estilística, não, equipes trabalhando mundo afora. O foco substitui dados por exemplos. Exemplos de quecentral é desenvolver neuropróteses para que as coisas não vão acabar bem. O méto- COITamputados e pessoas com paralisia. Há in- do permite, no limite, demonstrar qualquercontáveis matérias sobre isto em revistas e coisa. No seu caso, a conclusão permanece put,na internet. Zizek percebe algo estranho constante: caminhamos para o apocalipse. nol<nisso tudo: "Pesquisas recentes indicam o Zizek desconfia dos experimentos de cibefato estranho de que agéncias de defesa se- realidade expandida. Toma como exemplocretas dos Estados Unidos estão envolvidas o projeto do sixthsense, desenvolvido peloem um amplo projeto de longo prazo para MIT Media Lab. A ideia é acoplar um sen-desenvolver meios de controlar as emoções sor a um smartphone, de modo que a pessoae as atitudes humanas."Ele não informa que possa apontar o aparelho para um objetopesquisas são essas, qual sua relação com as qualquer e receber informações mais deta-pesquisas de neuropróteses,e quais são essas Ihadas sobre ele. O sujeito está passeando noagéncias. Pode-se suspeitar que sejam pés- Museu do Louvre, aponta o sensor para asimas agéncias secretas, visto que Zizek já Mona Lisa e surge uma ficha de dados sobresabe de tudo. Ele percebe claramente que o quadro, projetada em um plano virtual. Dehá muita gente pesquisando sobre cérebro, maneira rudimentar, os museus já fazem istoe este é um tema perigoso. Qyem pode nos com seus sistemas de áudio guia. O projetogarantir que isso não será usado para apagar é amplamente conhecido. Zizek percebe aía memória de vítimas de rortura? Parece ir- uma ameaça: "quando um racista encontrarefutável. Zizek conclui: "o ideal que regula com um árabe pobre na rua, ele não 'se pro-esse processo é o controle total do passado e jeta' de certo modo no árabe e 'vê' nele rodos ço cdo futuro em nível psíquico". os seus preconceitos contra os árabes?" E dad

Zizek é reconhecidamente um escri- logo a conclusão: é por isso que o sixthsellSe é pro!tor prolixo 0á escreveu mais de 60 livros, uma ameaça ideológica, visto que o aparelho seu'

t e a velocidade se mantém). Neste ritmo, é "imita e materializa o mecanismo ideológi- em}bastante previsível que lhe falte tempo para co do reconhecimento ... ".Tentei descobrir ça, I

tpesquisar qualquer assunto com mais pro- que diferença faria o sujeito racista estar ou merfundidade, e que ele tenda a se socorrer dos não com o aparelho ligado ao cruzar com Ziz'

1sites de notícias para captar a informação o árabe. Sem o aparelho, ele já é racista. O polide que necessita. Seus livros funcionam, de aparelhinho iria projetar informações ainda seucerto modo, ao ritmo da internet, migrando mais racistas? Se estivesse conectado à inter- ser (com rapidez de um tema a outro. O método net, o mais provável é que os dados fossem

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do um catálogo de fornecedores de serviçosde nuvem na internet. Mesmo desconside-rando a mentirinha, o que ele está sugerin-do? Ele quer abrir o mercado para muitasempresas ou pensa que o serviço deveria seroferecido pelo governo? Esta última opçãome faz lembrar do Brasil nos anos 1970.Te-ríamos uma espécie de "Nuvembrás". Sendoo ciberespaço global, quem sabe a ONU seencarregaria do assunto, mas aí teríamos ou-tro problema: quem controla a ONU? Zizeknos pediria para primeiro democratizá-la.Acho que não daria certo.

Há milhares de empresas oferecendoserviços de nuvem. O Brasil anda cheiodelas. Se eu contratar a Locaweb para ar-mazenar meus dados, e ela subir muito opreço, troCOpara o UOL Host,e assim pordiante. Não dá pra fazer isto na Eslovênia?De onde Zizek tirou a ide ia de que as em-presas manipulam os preços como querem?E o que significa dar uma "torção específicaà universalidade" por razões comerciais eideológicas? Imaginei a moça do cal!centada empresa ligando para Zizek. Do outrolado da linha, de retruca: "Nem pensar,vocês fazem uma torção tecnoabstrata dauniversalidade concreta!" Impassível, eladevolve: "Pois não, senhor, vamos estar en-caminhando sua reclamação."

Empresas fazem seu marketing, ven-dem seus serviços. As pessoas decidem secompram ou não. Qyeimei meus neuróniospara saber como uma empresa faria umatorção ideológica da universalidade. Umahipótese: ela teria um programa que rejeita-ria um texto anticapitalista de Zizek. Difícilacontecer uma coisa dessas. Você pode en-

Os apologistas apresentam a computação emnuvem como o próximo passo lógico da "evo-lução natural" do ciberespaço, e embora demaneira tecnológico-abstrata seja verdadeiro,não há nada "natural"no fato de que duas outrês empresas, em posiçãO quase monopolisu,além de determinar os preços a seu bel-prazer,também possam filtrar os programas que ofere-cem, d~ndoa essa "universalidade" uma torçãoespecífica que depende de interesses comerciaise ideológicos. É verdade que a computação emnuvem oferece aos usuários uma riqueza inaudi-ta de opções, mas essa liberdade de escolha nãoé mantida pela escolha de um provedor. com oqual ternos cada vez menos liberdade?

A computação em nuvem é um servi-ço de armazenamento e processamento dedados. Em vez de guardar dados e baixarprogramas ou aplicativos no disco rígido doseu próprio computador, você contrata umaempresa para fazê-lo, por razões de seguran-ça, mobilidade ou porque necessita de maismemória do que seu computador oferece.Zizek diz que duas ou três empresas mono-polizam o mercado e "filtram programas aseu bel-prazer". Mentira pueril, que podeser desmascarada simplesmente consultan-

buscados na Wikipédia, o que até melho-raria a situação do árabe pobre. Imagineium aparelhinho programado por Zizek. Oque ele projetaria se alguém cruzasse comum sujeito de um grupo político do qual elenão gosta? Melhor nem pensar. E mesmoque isso fizesse algum sentido, qual a relaçãocom o fim do capitalismo?

Zizek volta suas baterias contra a com-putação em nuvem, que seria mais uma tec-nologia a serviço da marcha privatista dociberespaço global. Afirma ele::le

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cheguei à descoberta do fogo, e percebi queseria cansativo para os leitores. Em seu livrorecente, Abwldallu: Ih,future is b,tI" thallJOu thillk, Peter Diamandis expõe a tese deque assistiremos, nos próximos vinte anos,a um progresso tecnológico equivalente aoobtido pela humanidade nos dois últimosséculos. Diamandis argumenta que estamosingressando em uma era de abundância. Eletalvez exagere, mas a percepção geral de cien-tistas e historiadores é de que vivemos tem-pos bastante promissores.! Zizek caminhana contramão. Podemos achar graça, mas édificil assegurar que ele esteja errado.

O mesmo não ocorre quando ele tra-ta da outra ordem de razões para o fim docapitalismo: o "crescimento assombroso daexclusão e das divisões sociais". Zizek sus-tenta seu argumento com a premissa de quea situação social do planeta tem piorado nes-tes tempos de globalização econômica. Estaé uma tese bastante corriqueira no catastro-fismo intelectual contemporâneo. E segura-mente falsa. Escolhamos algum critério. Apobreza vem diminuindo rapidamente noplaneta desde os anos 1980. O número depessoas vivendo com menos de U$ 1,25 aodia caiu de pouco mais de 50%, em 1981,para 15%, atualmente.2 15% é inaceitável,mas do que estamos falando mesmo? Esta-

1 Ver Shapiro. Robert. Fu/ur(CaJl: How Suprrpow(rJ, Po-pulaliom, and Globalization IVi/!Chanl/ /h( Woy YouLiv(and IVor..t.St.Martins Press, 2008.

2 Chand)'. Laurence e Gertz, GeofTrey. "Poverty in Num-bers: The Chan~ing State ofGlobal Poverty from 2005 to2015", Global Economyand Deve10pment Program in theBrookings Institution.

A frase poderia servir como epígrafe dolivro. Uma síntese da tese de Zizek. Ele estádizendo o seguinte: a China censura a internet,bloqueia o Google e outros sites de busca,pôe blogueiros na cadeia. Mas que ninguémcritique: no capitalismo é "de certo modo" amesma coisa, porque aqui vocês usam em-presas de nuvem para armazenar seus dados.

A crítica de Zizek aos avanços da tecno-logia caberia em qualquer momento da his-tória.Toda criança brasileira sabe do desgos-to de Santos Dumont com o uso que se fezda aviação, e o fim trágico que deu à própriavida. Fiquei tentado a elencar avanços tec-nológicos cruciais ao longo da história, comseus respectivos riscos, mas rapidamente

Os partidários da abt:rtura gostam de criticara China pela tentativa de controlar o acesso àinternet, mas nós não estamos nos tornandouma China, com nossas funções em "nuvem"de certo modo semelhantes ao Estado chinês?

tupir dezenas de nuvens californianas compalestras de Zizek (o YouTube está cheiodelas) que ninguém o importunará. Se divul-gar uma tese racista, aí sim você terá um pro-blema (com razão). Fiquei igualmente sementender a frase final. Por que diabos temos"cada vez menos liberdade" com o provedorque escolhemos? Seríamos gradativamentecontrolados pelas nuvens computacionaisque contratamos? Lembrei da série Plall,tadosMacacos, a que assistia na adolescência.Primeiro criamos as feras, e um belo dia elasassumem o comando. Zizek realmente pa-rece pensar isto sobre robôs e computadores.

A parte mais sugestiva do parágrafo, noentanto, surge no final:

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mos dizendo que, nas últimas três décadas,justamente nesses anos da globalização eco-nômica, mais de um bilhão de pessoas ultra-passou a linha da extrema pobreza,ganhan-do novas perspectivas de vida. O fenômenoocorre, em ritmos diferentes, em todos oscontinentes. Jeffrey Sachs chamou o nossotempo de era da convergência. Em menosde três décadas,o PIB dos Brics irá superar odo G 7. Isto significa maior equilíbrio global.Ou não? Poderíamos falar de longevidade,erradicação de doenças, acesso à educação.Fora nossos cabelos, hoje mais ralos e gri-salhos, e nosso eventual mau humor, o quetornou o mundo um lugar pior para se vi-ver nas últimas duas ou trés décadas? Zizekpoderia explicitar seus critérios, argumen-tar, tentar demonstrar, por tais e tais razões,que o mundo vem piorando e está à beira doprecipício. Não o faz. Prefere a saída fácil derecolher fatos ao bel-prazer e dar a tudo umcolorido enragé.

Zizek não é propriamente um menti-roso, em quem pese seu livro esteja repletode mentirinhas. A certa altura de Vivendo o

fim dos tempos, ele trata da guerra do ShindoRenmei, no Brasil dos anos 1940. A históriafoi magistralmente narrada por FernandoMorais em Corações sujos. A disputa diziarespeito à divisão, na comunidade japonesade São Paulo, entre os "derrotistas" e "vi to-ristas" . Os primeiros reconheciam e os se-gundos se recusavam a acreditar na derrotado Japão na Segunda Grande Guerra. Zi-zek escreve que a guerra causou milharesde mortos e que o Estado deportou para oJapão os principais vitoristas. Ora, os mor-tos foram vinte e três, e ninguém foi depor-

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tado para o Japão. Zizek teria contado umamentira consciente, como faziam os jornai-zinhos que Shindo Renmei publicava, comnotícias da vitória doJapão? Ou seria apenasum descuido, quem sabe na expectativa deque pouca gente leria o livro no Brasil?

Considero Zizek menos um mentirosodo que um bu/lshi//er, no sentido que HarryFrankfurt atribuiu ao conceito em seu livroOn Bu/lshit. Um bu/lshi//ernão é um menti-roso, mas um sujeito que escreve sem muitapreocupação em verificar se o que está di-zendo é verdade. Uma bullshít pode ser ape-nas um errinho factual, como o de ShindoRemnei,ou uma alusão conspiratória a neu-ropróteses e computação nas nuvens.

o efeito verdade

Zizek tem uma estratégia de defe-sa sui generis contra qualquer acusação deinconsistência. Ele dirá que rigorosamentenão pode ser criticado, visto que construiuum conceito próprio de verdade. Logo naapresentação de seu livro, ele esclarece que"a verdade que tratamos aqui não é a ver-dade objetiva" (Zizek, 2012, p. 14). A frasefunciona como uma espécie de aviso: ueuescrever alguma coisa que não corrtsponda aos

fatos, danem-u osfatos. Zizek criou O que elechama de "verdade autorreferencial". Tra-ta-se de uma verdade avaliada "não por suaprecisão factual, mas pelo modo como afetaa posição subjetiva da enunciação". A coisafunciona mais ou menos assim: pode ser quenão haja efetivamente nenhum problemacom a biogenética, mas se todos acredita-

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considerar os fatos, assim como nossos atosde fala devem guardar alguma conexão coma realidade". Isso seria impossível, e pensoque o mesmo ocorreu a Gra)'.

Alguns parágrafos adiante, Gray pare-ce ter perdido a sobriedade e chama Zizekde "prolixo, academicamente ardiloso, dadoao jogo de palavras, vazio e circense". Seumelhor momento é quando compara o textode Zizek ao conhecido caso Sokal. Como ésabido, o flsico Alan Sokal enviou um arti-go-paródia completamente nomeme para arevista de estudos pós-modernos SocialTexl,em 1996. a texto tinha como título "Trans-gredindo as fronteiras: rumo a um. herme-nêutica transformativa da gravidade quân-tica" e era repleto de jargões pós-modernos,que agradavam aos editores da revista,aind.que não tivessem o menor fundamento.

Um bom "aplicativo de filosofiapós-moderna" pode fazer milagres. Zizekparece ter desses no seu computador quandoescreve que "precisamos de uma noção maisradical de sujeito proletário, um sujeito re-duzido ao ponto evanescente do cogilocarte-siano, privado de seu conteúdo substancial"(Zizek, 2012, p. 196). A frase contém umjogo de palavras tal que o leitor fica em dúvi-da: "isto não quer dizer nada, ou não entendidireito?" Ele pode arriscar uma mterpreta-ção. Há interpretações para todos os gostos.Há que se captar o sentido poético do texto,não é mesmo? Foi aí que o pessoal da SocialTexl se deu mal.

Gray poderia ter ido mais longe. Apósa publicação de sua paródia pós-moderna,Sokal publicou um artigo na revista LínguaFranca revelando o caráter fraudulento do

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rem que o problema existe, ele logicamentepassa a existir.

a mesmo funciona com o capitalismo:ainda que o sistema não esteja nos estertores,se todo mundo acreditar na tese zizekiana,quem sabe ele vá mesmo pelos ares? Tome-mos o exemplo de Marx: a "prova" de queo marxismo correspondia à verdade é dadapelo entusiasmo revolucionário que des-pertou (ou ainda desperta) no proletaria-do e que o conduz à revolução. a mesmo,imagino, deveria valer para o liberalismo. Setodos acreditarem na tese de Fuku)'ama, ahistória poderia de fato terminar. Temos aío que ele chama de "efeito-verdade". A filo-sofia funcionaria como o amor: da mesmaforma como só enxergamos o objeto amo-roso quando estamos apaixonados, só pode-mos enxergar a verdade zizekiana quandoestivcnnos suficientemente embevecidosda crença nela. Ao invés do "ver para crer",devemos adotar o <lacreditar para ver".

John Gra)', assim como eu, deu-se otrabalho de escrever uma crítica a Zizek.No início do texto, Gray trata da ideia da"verdade autorreferencial" e parece, comoum bom e sóbrio acadêmico, levar a sérioos argumentos de Zizek. Afirma que seuscríticos deveriam compreender seus equí-vocos e omissões históricas, VIsto que "aocontrário de Marx, ele não pretende funda-mentar suas teorias em uma leitura da his-tória baseada em fatos". Além de dispensara filosofia da ideia de verdade, dispensa ahistória dos fatos. Lendo estas coisas, per-cebi estar diante de um argumento incon-testável. De fato, não faria sentido dizer:"Zizek está errado, a história não pode des-

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'5 atosocom texto. No texto, ele explicita o propósito de ela mesmo, a ideia de efeito-verdade: se ospenso seu experimento: leitores compram seus livros e acreditam no

que ele escreve, quem dirá que aquilo tudopare- a que me preocupa é a proliferação, não só não é verdade? O verdadeiro Zizek podeZizek

de um pensamento notlStnu e desleixado peraté mesmo ser o sátiro (o falso Zikek), masu, mas de um tipo particular de pensamentosua obra se converte em "verdade" dado o

,.dado nOtlStnu e desleixado: o que nega a existênciaI. Seu de realidades objetivas, ou (quando desafiado) engajamento que produz. Zizek, diz Gray,texto admite sua existência, mas releva sua impor- ajustou a prática intelectual à fluidez, ao

tância prática.3lmoê "dinamismo compulsivo e sem propósito"uni- do mercado. Tornou-se uma celebridade

Jara a A crítica de Sokal dirige-se precisa- pós-moderna. Não é o único, pensei.'Tex!, mente ao tipo de texto praticado por Zizek. Para finalizar este texto, algumas ob-rans- A recusa da realidade objetiva, da verdade servações sobre as ideias políticas de Zizek.rme- objetiva ou do pensamento objetivo, funda- Grayobservou que Zizekcritica o capitalis-uân- mentado em alguma demonstração fática mo sem, porém, propor nada parecido comrnos, (passível de teste, comparação, refutação). uma alternativa. Afirma não ter encontra-linda O texto feito de frases obscuras, doses ge- do uma única página, nas mais de mil que

nerosas de nonsense entremeadas de jargão compõem o livro Le55than Nothing: Hegel;afia esquerdista. Para escapar ele mesmo da re- and the Shadow o/Dia/ectica/ Materia/ism,:izek tórica relativista, Sokal esclarece que não se em que Zizek se preocupe em definir, afinalIndo trata de um problema "político", revelando de contas, no que consiste a sua utopia. Ficomais ser ele mesmo um sujeito de "esquerda". Diz imaginando o que Gray espera de Zizek. ,I) re- apenas que pretende ser de esquerda a partir Qye apresentasse um modelo de contratolrte- de argumentos racionais, não apesar deles. político? Um modelo de instituições,comocial" Gray orienta-se no mesmo sentido da fez Hayek, com sua demarquia? Isto im-um crítica de Sokal, mas propõe uma questão: plicaria supor um Zizek preocupado com

úvi- e se Zizek fosse ele mesmo um sátiro, espé- abstrações jurídicas. Quase acho graça,ndi cie de mestre da "autoparódia"? Neste caso dessa ideia. Imaginemos Zizek refu tandoeta- (respondo eu) Zizek seria um gênio, visto a teoria da justiça de Rawls, ou sugerindo;t05. desempenhar simultaneamente o papel do algum modelo alternativo ao da democra-:xto, Sokal falso e do verdadeiro. Gray parece cia parlamentar.,dai realmente levar a sério esta hipótese. O texto De [.,to, Zizek não se dá ao menor tra-

de Zizek pode ser "a reiteração interminá- balho de explicitar como funcionaria a sua ..

.pós vel de uma visão essencialmente vazia", mas utopia anticapitalista. Ainda assim, parece[na, é um sucesso de público. Sua obra realiza, perfeitamente possível saber do que ele está'gua falando. Não acho que Zizek seja. inocente, do em relação ao tipo de política que defende,

lSokal, 1996.4 PhisiciJt Expt:rimt:nf wifhSocia/ Studit:s. e suas incursões militantes ao redor do pla-

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bespierre e Lênin não eram tipos que agempor impulso, e cada qual, em seu tempo, foisaudado como modelo de virtude. Mas en-tão suas escolhas são extra morais, ainda quenão imorais? Inútil prosseguir. Mais umavez, estamos diante de uma performan-ce fraseológica. O texto deve funcionar demodo que tudo pareça uma sofisticada me-táfora. Retirado o palavrório, o que ele nospede para acreditar? Qyem sabe a respostaestá nos sans cu!!o!es que ilustram a capa dolivro, conduzindo cabeças certadas na pon-ta de varas. Isto até seria fácil. Mas entâodevemos reeditar o terror revolucionário?Dependendo da situação, basta dizer: llão, éapenas uma metáfora. Ninguém mais tem sensode humor? Há um segredo para se ler Zizeksem constrangimentos: fazer de conta queentendemos qualquer coisa, sem fazer mui-tas perguntas.

Roland Barthes dizia que o apaixonadocarrega sempre um quéde ridículo. Zizek nãofoge à regra, com o detalhe de que O objetode sua paixão poderia fazê-lo, se alguém olevasse a sério, um sujeito perigoso. Há pas-sagens criativas. Em uma delas, ele explicauma das virtudes revolucionárias: a crençana independência do sujeito transcendentalem relação aos indivíduos empíricos. Umaespécie de crença suprema da política radi-cal, sua "loucura inumana", expressão quegosta de usar. Para exemplificar tal virtude,ele recorre a um discurso em que Che Gue-vara, em meio à crise dos mísseis, em 1962,sugere a alternativa da guerra atômica: "eleelogiou adisposição heroica do povo cubanode correr o risco de seu próprio fim". Ideiacuriosa. Então O povo cubano ofereceu-se

neta dão conta disso. Tomemos as ideias deseu Em defesa das causas perdidas. O livro éuma homenagem a uma turma bem conhe-cida. Retratos de alguns deles povoavam osazulejos da cozinha do nosso apartamento,para o desespero de minha irmã, quando eutinha lá meus 17 ou 18 anos. Falamos deSaintJust, passando por Lénin, Stalin, Mao,até Fidel e Che Guevara. Hitler ficou fora dalista por muito pouco. Ele tinha um "proble-ma":não ter sido "suficientemente violento".O nazismo não foi "suficientemente radical,não ousou perturbar a estrutura básica doespaço social capitalista moderno". Por isso"teve que se concentrar em um inimigo ex-terno inventado, os judeus". Zizek lamenta.Hitler foi um sujeito corajoso, mas do ladoerrado. Errou na escolha da "esséncia" a serdestruída. Escolheu os judeus,o certo seria ocapitalismo. Foi um mau terrorista.

Zizek recua na história e faz um elogiodo terror jacobino. Os jacobinos exerceramo que chama de violéncia divina. Na tenta-tiva de explicar o que isto significa, ele dizse tratar de "uma decisão (matar, arriscar ouperder a própria vida) tomada em absolutasolidão, sem nenhuma cobertura do grandeOutro. Embora seja extramoral, não é imo-ral". Sentença típica do estilo zizekiano, masvamos lá: em se tratando de uma decisão to-mada em nome da justiça (ou, como gosta deacentuar Zizek, em nome da Verdade com"V" maiúsculo) por que ela não seria moral?Ilegal talvez, mas que importância teria a le-galidade em uma discussão como essa? Podea decisão de matar ou ser morto, de destruirou ser destruído, ser "extramoral"? O que éexatamente uma decisão extramoral? Ro-

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para morrer tostado na guerra atômica? Fi-zeram uma enquete? Não exatamente. Paraque perder tempo com um punhado de eusempíricos cubanos, quando o sujeito trans-cendentaljá havia se manifestado? (No caso,o Comandante Fidel, a quem Kruschev nãodeu bola ao preferir negociar pacificamentecom o Presidente Kennedy.)

Aqui há um truque comum no textode Zizek, que consiste em citar ícones da"política radical" como "prova" do próprioargumento radical. De fato, a retórica to-talitária carrega todos os elementos ima-gináveis do apelo ao "inumano". O maiscomum, para qualquer tiranete (seja de queideologia for), é falar com alguma desen-voltura em nome da história. Q!1anto maisabstrato, grandioso e distante dos sujeitosempíricos, tanto melhor. Então apareceSaintJust com suas frases de botequim: "oque produz o bem geral é sempre terrível".A fraseologia de SaintJust levou ao resul-tado que conhecemos (que incluiu, no final,seu próprio pescoço). O problema é: citarheróis que amamos serve como uma provadas ideias que amamos?

Em outra passagem ilustrativa, Zizekrefere-se a outro de seus heróis. Diz que "nosjulgamentos stalinistas, as vítimas foramresponsabilizadas por determinados atos,forçadas a confessar ... Em resumo, emborapossa parecer obsceno (e foi, de fato), elasforam tratadas como sujeitos éticos autôno-mos .. .n. O sujeito cai em desgraça por ummotivo qualquer, é preso, torturado até maisnão poder, assina uma confissão, é morto,enxovalhado e logo apagado da história. Zi-zek, não obstante, nos assegura que ele ao

menos foi tratado como um "sujeito éticoautônomo". Ao menos isso.

Zizek escreve coisas desse tipo pordiversas razôes. Uma delas é que o custo ézero. Ele sabe que vive em uma democracia,que pode dizer qualquer coisa, e que jamaisenfrentará um julgamento stalinista. Podecircular livremente pregando a "hipótese co-munista". O pessoal assiste à palestra, se di-verte e vai comer uma pizza. Enquanto isto,Liu Xiaobo permanece numa prisão chinesanão hipotética. Há momentos em que preci-samos decidir sobre o que vamos rir e sobre oque não vamos achar graça. Isso diz respeitoà ética da atividade intelectual. O discursode Zizek pode ser irrelevante, mas isso nãoo torna menos eticamente delituoso, nosdois sentidos definidos por Weber.' Comoprática científica (histórica ou sociológica),desdenha de qualquer base factual verificá-vel; como discurso político, é irresponsávelquanto às consequências que poderia pro-vocar, se alguém lhe desse ouvidos.

Como disse Gray, Zizek não gasta nemuma página explicando como seria sua uto-pia política. Nem seria preciso. O terror é,por definição, o espaço da não forma na po-lítica. HannahArendt bem observou a dife-rença entre a linguagem dos revolucionáriosfranceses e a dos pais fundadores dos Esta-dos Unidos da América. De um lado, a re-tórica abstrata e grandiloquente do destinohumano, da necessidade histórica (que tan-to parece encantar Zizek em suas citaçôesbíblicas de Robespierre, Saint Just); de ou-

~ Ver"Aciência como vocaçào" e ~A política como vocação.,

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tro, O discurso calmo e objetivo sobre comoorganizar as instituições. Suas limitações,riscos e a melhor maneira de superá-los.De um lado, a grande tragédia (ainda quedramaturgicamente insuperável) que levaà ditadura napoleõnica; de outro, a serena ebem-sucedida construção da república. Zi-zek, naturalmente, cala-se para esta última edeclara sua paixão pela primeira.

Zizek é um perfeito clone tardio datradição revolucionária. Ele não pode serobjetivamente um revolucionário, visto nãoexistir revolução em curso. Poderia tentarencontrar alguma, talvez na selva colombia-na, ou uma em estado avançado, como naCoreia do Norte. Intuo que Zizek escapa-ria dizendo se tratar exemplos imperfeitosde revolução, não suficientemente radicais.Para um revolucionário universitário, todarevolução realmente existente será sempreimperfeita. Zizek poderia dizer que na ver-dade está envolvido em algo muito mais am-plo, quem sabe na grande revolução mun-dial. É muito mais responsabilidade, aindaque inegavelmente mais seguro.

De todo modo, ele se pretende um re-volucionário para destruir esta civilizaçãoem estado terminal, cujo vértice central éo que ele chama pejorativamente de "ideo-logia dos direitos humanos". É curioso, vis-to que a tradição dos direitos humanos temsido, ela mesma, o produto de sucessivas re-voluções. Muito recentemente, Mandela li-derou uma dessas revoluções. Há, portanto,revolucionários em ambos os lados da tradi-ção dos direitos humanos. Talvez ninguémsintetize tão bem esta grande tradição revo-lucionária, na modernidade, como Thomas

Paine. Paine sempre esteve no lugar em queas revoluções de fato aconteciam. Em 1776,incendiou as colônias americanas com oseu "Senso Comum". Colocou o pescoçoem risco na guerra revolucionária contraseu país de origem, a Inglaterra. De voltaao velho mundo, escreveu 0.<direitos doshomem, respondendo a Burke e sua criticaconservadora à Revolução Francesa. É per-seguido, atravessa o canal e é eleito depu-tado na Convenção francesa. Aproxima-sedos jacobinos, com a determinação sincerade levar o aprendizado republicano, colhi-do na América, à revolução. Seu primeiroembate com Danton dá-se em função desua defesa de um judiciário independente.Combate a destruição dos direitos civis e aemergência do terror, até o fim patético em9 Termidor. Termina preso durante todo oano de 1794, e apenas por um lance de sortenão acaba na guilhotina.

Trazer à tona a memória de Paine éuma forma de lembrar quem somos e quan-to nos custou erguer uma civilização fun-dada em direitos. Zizek nos propõe umaquestão: a civilização dos direitos humanosou a hipótese do terror? Ambas imperfeitas.Nem as democracias liberais respeitam su-ficientemente os direitos humanos, nem atradição do terror tem sido suficientemen-te radical, nos ensina Zizek. De qualquerforma, esta é a opção, e a escolha de Zizeké clara. Pouco mais de dois séculos atrás,.Paine se viu diante da mesma questão. Comuma diferença: ele de fato vivia uma revo-lução. Suas escolhas não eram retóricas esim a diferença entre a vida e a morte. Suaopção é igualmente bem conhecida.

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FERNANDO lUIS SCHUlER 97

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Paine viveu entre dois mundos. À "es-querda" na Inglaterra de Burke, e à "direita"na França de Robespierre. Ao cabo, cuspidode ambos, intelectual de lugar nenhum. Ar-risco dizer que é neste lugar nenhum, nestemeio de caminho, que nasce a tradição maisgenerosa da política moderna. Contraria-mente ao que supõe Zizek, não é "nossa" aherança do terror. Nossa é a tradição querepudiou o terror e recusou a fraude de jus-tificara crime com a ideologia. Nosso é o ca-minho trilhado por Paine e depois por Mill,no século XIX, e pela tradição liberal igua-litarista, de Bobbio, Rawls e Sen, no nossatempo. Um caminho que não abre mão daideia da justiça e que não trata os direitoshumanos como uma ideologia.

Q;Ianto a Zizek e sua turma, sempre mevem a pergunta: por que não abrem um par-que temático? Seria menos confortável doque a vida que levam hoje, animais domes-ticados que são, terroristas fora de época,condenados a vociferar em auditórios ale-gres mundo afora. Por que não investem odinheiro que ganham comprando uma áreade terra bem grande, reúnem-se todos e im-plantam ali uma espécie de Truman Showtotalitário? Os cenários poderiam variar.Em um ano, viveriam em Paris, no auge doterror; em outro, como camponeses na re-volução cultural de Mao. A cada temporadase revezariam na fantasia do grande ditador.Lénin, Stalin, Mao, PaI Pot e, por que não,quebrar o tédio, vez por outra, com a turmado "lado errado", Idi Amin, Mussolini etc.Dançarão como sam cullotes, espetando ca-beças de borracha, e fantasiados como Cha-plin, em O Grande Ditador. Q;Iem sabe até

um final pasoliniano, para quem recorda de120 dias de Sodoma. Por que não fazem isso,mostram alguma coragem, e deixam os co-vardes eus empíricos viverem tranquilos nomundo real, com seus pequenos direitos e,quiçá, visitando museus com seus aparelhi-nhos sixthseme?

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Fernando Luis schuler é doutor em Filosofia e mestre

em Ciências politicas pela UFRGS. É diretor do Ibmec.

no Rio de Janeiro. e curador do Projeto Fronteiras do

Pensamento.

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