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O PAPEL DO PSICÓLOGO NA ELABORAÇÃO DO LUTO Luciana Russo O psicólogo tem um importante papel no que concerne à elaboração do luto, seja ele Antecipatório ou pós-morte. No caso do Luto Antecipatório, em que há uma perda anunciada, temos um campo possível de atuação do psicólogo, tendo em vista que este fato certamente ocasionará grande dor e sofrimento para a pessoa que está à espera da própria finitude, assim como para as pessoas que convivem com aquele que está diante de uma morte iminente. Nesse contexto, cabe ao psicólogo, independente de qual seja sua linha de atuação, auxiliar o enlutado a conviver da melhor maneira possível com essa realidade, minimizando sua dor e possibilitando que a pessoa tenha uma melhor qualidade de vida. Segundo Fonseca (2004), no Luto Antecipatório o Psicólogo pode assessorar a família de diversas maneiras, tais como: esclarecer dúvidas práticas a respeito da situação que ela está vivendo, ajudá-la no que diz respeito a compartilhar sentimentos, angústias, medos, dúvidas, auxiliá-la no esclarecimento de aspectos não verbalizados e no planejamento atual e futuro assim como propiciar importantes despedidas. Sua atuação pode também facilitar o processo de tomada de decisões, apoiar a família para lidar com as emoções presentes no contexto de morte e separação, auxiliar a eventual equipe de saúde envolvida com o paciente terminal para que esta possa lidar melhor com a frustração e, sobretudo, colaborar para que o tratamento oferecido à pessoa em fase terminal respeite sua dignidade e produza qualidade de vida. Fonseca (2004) também ressalta que os Psicólogos que trabalham com pacientes e suas famílias no Luto Antecipatório precisam considerar suas próprias experiências e sentimentos sobre a perda, além, é claro, de ser imprescindível, nesse trabalho, respeitar a cultura, crenças, valores e religiosidade de cada paciente e/ou família. De acordo com Worden (1998), o principal objetivo na terapia do processo de Luto Antecipatório é ajudar o enlutado a, entre outros:

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O PAPEL DO PSICÓLOGO NA ELABORAÇÃO DO LUTO

Luciana Russo

O psicólogo tem um importante papel no que concerne à elaboração do luto, seja

ele Antecipatório ou pós-morte.

No caso do Luto Antecipatório, em que há uma perda anunciada, temos um

campo possível de atuação do psicólogo, tendo em vista que este fato certamente

ocasionará grande dor e sofrimento para a pessoa que está à espera da própria finitude,

assim como para as pessoas que convivem com aquele que está diante de uma morte

iminente.

Nesse contexto, cabe ao psicólogo, independente de qual seja sua linha de

atuação, auxiliar o enlutado a conviver da melhor maneira possível com essa realidade,

minimizando sua dor e possibilitando que a pessoa tenha uma melhor qualidade de vida.

Segundo Fonseca (2004), no Luto Antecipatório o Psicólogo pode assessorar a

família de diversas maneiras, tais como: esclarecer dúvidas práticas a respeito da

situação que ela está vivendo, ajudá-la no que diz respeito a compartilhar sentimentos,

angústias, medos, dúvidas, auxiliá-la no esclarecimento de aspectos não verbalizados e

no planejamento atual e futuro assim como propiciar importantes despedidas.

Sua atuação pode também facilitar o processo de tomada de decisões, apoiar a

família para lidar com as emoções presentes no contexto de morte e separação, auxiliar

a eventual equipe de saúde envolvida com o paciente terminal para que esta possa lidar

melhor com a frustração e, sobretudo, colaborar para que o tratamento oferecido à

pessoa em fase terminal respeite sua dignidade e produza qualidade de vida.

Fonseca (2004) também ressalta que os Psicólogos que trabalham com pacientes

e suas famílias no Luto Antecipatório precisam considerar suas próprias experiências e

sentimentos sobre a perda, além, é claro, de ser imprescindível, nesse trabalho, respeitar

a cultura, crenças, valores e religiosidade de cada paciente e/ou família.

De acordo com Worden (1998), o principal objetivo na terapia do processo de

Luto Antecipatório é ajudar o enlutado a, entre outros:

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• Atualizar-se e aceitar a perda iminente, auxiliando-o a falar sobre a mesma e as

circunstâncias que as envolvem.

• Identificar e expressar sentimentos relacionados à perda em potencial.

• Aprender a viver sem a pessoa que está por morrer.

• Saber como agir nas datas significativas que envolvem a pessoa que está por

morrer.

• Entender seu jeito de enfrentamento diante à doença.

No que diz respeito ao luto pós-morte, existe uma técnica denominada

Aconselhamento do Luto. Para Worden (1998), essa técnica consiste em ajudar as

pessoas a facilitar o luto normal para uma conclusão saudável das tarefas do luto em um

razoável período de tempo e tem por objetivo:

• Aumentar a realidade da perda.

• Ajudar a pessoa a lidar com os afetos expressos e latentes.

• Auxiliar a pessoa a superar vários obstáculos para se reajustar depois da morte.

• Encorajar a pessoa a dizer um adeus adequado e a sentir confortável a reinvestir

novamente na sua vida.

O Aconselhamento do Luto não é uma tarefa designada somente aos Psicólogos

e, segundo Parkes (1980), existem três tipos básicos de Aconselhamento do Luto, sendo

o primeiro um serviço realizado por médicos, psicólogos, enfermeiros e assistentes

sociais que dão apoio a uma pessoa que passou por uma perda significativa. O segundo

tipo envolve aqueles serviços nos quais voluntários são selecionados, treinados e

apoiados por profissionais e o terceiro tipo de serviço inclui grupos de auto-ajuda nas

quais pessoas enlutadas oferecem ajuda para outras pessoas enlutadas com ou sem apoio

de profissionais.

Worden (1998) descreveu as três abordagens básicas do Aconselhamento do

Luto, sendo que a primeira sugere um aconselhamento a todas as pessoas,

principalmente à família na qual ocorreu a morte, pois, essa filosofia considera a morte

um fato muito traumático para as pessoas envolvidas.

A segunda filosofia afirma que algumas pessoas necessitarão de ajuda em seu

luto, mas irão esperar até que tenham alguma dificuldade, o que exige que os indivíduos

vivenciem um grau de estresse antes que a ajuda seja oferecida.

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A terceira filosofia está baseada no modelo preventivo, em que as pessoas que

mais provavelmente terão dificuldades após a perda recebem uma intervenção precoce,

a fim de impedir uma reação de luto não resolvida.

Importante ressaltar que independente de qual seja a filosofia do

Aconselhamento do Luto, existem alguns procedimentos e princípios que o tornam mais

eficaz, ajudando o enlutado a elaborar a perda. Worden (1998) descreveu os princípios a

seguir:

• Princípio Um: Ajudar a pessoa que ficou a se dar conta da perda -

Tornar a pessoa mais ciente de que a perda realmente ocorreu, que a pessoa está

morte e não vai mais retornar. Os que ficaram devem aceitar essa realidade de forma

que possam lidar com o impacto emocional da perda. Para ajudar a pessoa a

reconhecer a morte efetivamente, uma das melhores formas é ajudá-la a falar sobre a

perda, como, por exemplo, falar onde e como a morte ocorreu, quem lhe deu a

notícia, onde ela estava quando ficou sabendo, aconselhá-la a visitar o túmulo, entre

outras coisas.

• Princípio Dois: Ajudar a pessoa que fica a identificar e expressar seus

sentimentos – Muitos clientes procuram o Aconselhamento do Luto porque buscam

um alívio imediato para a dor e ajudá-los a elaborar a dor é a maior parte da

intervenção, sendo que os sentimentos mais problemáticos para as pessoas são:

raiva, culpa, ansiedade e desamparo. É importante não deixar o cliente com esses

sentimentos negativos, mas ajudá-lo a encontrar um melhor equilíbrio entre os

sentimentos negativos e positivos que ele tem pela pessoa que faleceu. Para isso

pode ser utilizada a técnica de Psicodrama, por exemplo.

• Princípio Três: Ajudar a viver sem a pessoa falecida – Ajudar a pessoa a

se acostumar com a perda, facilitando sua habilidade de viver sem a pessoa falecida

e de tomar decisões de forma independente. Para isso, o conselheiro deve utilizar

uma abordagem de solução de problemas.

• Princípio Quatro: Facilitar o reposicionamento emocional da pessoa

que faleceu – Facilitando o reposicionamento emocional, o conselheiro pode ajudar

a pessoa a encontrar um novo lugar em sua vida para a pessoa amada perdida. Um

lugar que irá permitir à pessoa a continuar a viver e a formar novos relacionamentos.

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• Princípio Cinco: Fornecer tempo para o luto – O luto requer tempo

porque é um processo gradual de cortar laços, assim, o conselheiro necessita ver o

papel de quem intervém como aquele que, por necessidade, pode se alongar algumas

vezes, embora os contatos reais possam não ser assíduos.

• Princípio Seis: Interpretar o comportamento normal – Trata-se da

compreensão e interpretação de comportamentos normais no luto. Depois de uma

perda significativa muitas pessoas têm a sensação de que vão enlouquecer, porém, se

o conselheiro tem uma compreensão clara do que é o luto normal, ele poderá

reassegura à pessoa enlutada sobre a normalidade dessas sensações.

• Princípio Sete: fazer concessões às diferenças individuais – As pessoas

respondem de formas diferentes diante do luto e é importante não esperar de todas as

pessoas enlutadas que tenham um luto igual e mesmo que seja difícil para os

familiares entenderem que uma pessoa tenha respostas ao luto diferentes do resto da

família, cabe ao conselheiro ajudá-los a compreender e respeitar essa diferença.

• Princípio Oito: oferecer apoio continuado – O bom aconselhamento

exige um apoio continuado, diferente da terapia do luto, que enfoca mais um período

de tempo específico, com o Aconselhamento do Luto os próprios conselheiros

podem ficar disponíveis para a pessoa enlutada e para a família durante os períodos

mais críticos pelo menos durante o primeiro ano depois da morte. Uma boa forma de

apoio continuado que pode ser oferecido é por meio de participação em grupos.

• Princípio Nove: Examinar defesas e estilos de lidar com o problema –

Ajuda aos clientes para que eles reconheçam suas defesas e estilo de lidar com o

problema e isso é feito de forma mais fácil depois de criada uma confiança entre o

cliente e o conselheiro. O conselheiro pode chamar a atenção para esses estilos e

ajudar o cliente a avaliar sua eficácia.

• Princípio Dez: identificar a patologia e encaminhar - Identificar o

problema e saber quando encaminhar. Uma pessoa fazendo o Acompanhamento do

Luto deve ser capaz de identificar a existência de patologia que tenha sido

desencadeada pela perda, já que tais dificuldades exigem técnicas especiais,

intervenções e uma compreensão psicodinâmica.

Wordem (1998) descreveu também algumas técnicas úteis que podem ser

utilizadas no Aconselhamento do Luto, são elas:

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• Linguagem evocativa: O conselheiro pode usar palavras difíceis para

evocar sentimentos, como, por exemplo, falar “Seu filho morreu” em vez de

“Você perdeu seu filho”.

• Utilizar símbolos: Pedir para a pessoa enluada trazer fotos da pessoa que

faleceu para as sessões de aconselhamento.

• Escrever: Fazer um diário de sua experiência de luto ou escrever poesias

pode facilitar a expressão de sentimentos e dar um significado pessoa à

experiência de perda.

• Desenhar: Como o escrever, desenhar figuras que revelem os

sentimentos e experiências da pessoa enlutada com aquela que faleceu também

pode ser útil, que funciona tanto com crianças como com adultos.

• Encenação: Ajudar a pessoa enlutada a encenar várias situações em que

ela tem medo ou sente-se inadequada é uma das formas de desenvolver

habilidades.

• Reestruturação cognitiva: Considerando que os pensamentos influenciam

os sentimentos, o papel do conselheiro é o de ajudar a pessoa a diminuir os

sentimentos disfóricos desencadeados por pensamentos irracionais.

• Livro de memórias: este livro pode incluir histórias sobre fatos da família

e coisas dignas de ser lembradas. Essa atividade pode ajudar a família a pensar

sobre o passado e eventualmente chorar por uma imagem mais realista do

falecido.

• Imagem dirigida: Ajudar a pessoa a imaginar aquela que faleceu, tanto de

olhos fechados ou visualizando sua presença numa cadeira vazia e depois

estimulando-a a dizer à pessoa que faleceu o que ela precisa.

Existe também uma técnica específica para auxiliar a pessoa que vivencia um

luto patológico, a Terapia do Luto, que objetiva identificar e resolver os conflitos de

separação que impedem a conclusão das tarefas de luto nas pessoas cujo luto está

ausente, retardado, excessivo ou prolongado.

Worden (2008) destacou alguns procedimentos utilizados na Terapia do Luto:

Listar doenças físicas: Se o paciente apresenta um sintoma físico, a terapia do

luto não deve ser iniciada, a não ser que haja exclusão de uma doença física subjacente

ao sintoma.

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Fazer o contrato e estabelecer a aliança terapêutica: Temporariamente, o

terapeuta torna-se o substituto daquele que morreu, e ajuda a pessoa com atitudes de

esperança e conforto.

Reviver lembranças da pessoa que faleceu: É muito importante começar a fazer

um trabalho com base em lembranças positivas que irão ajudar o paciente a vivenciar

seus afetos mais negativos.

Avaliar quais das quatro tarefas do luto não foram completadas: O terapeuta

deverá identificar qual ou quais etapas do luto não foram completadas e auxiliar o

paciente na aquisição de recursos para vivenciar cada uma delas, até que todas sejam

vivenciadas.

Lidar com o afeto ou falta de afeto estimulado pelas lembranças: O terapeuta

deverá ajudar o paciente a entrar em contato com seus sentimentos de raiva, fazendo-o

compreender que eles não impedem os sentimentos positivos.

Explorar e diminuir a tensão entre os objetos de ligação: Na Terapia do Luto

pode-se encontrar casos nos quais objetos de ligação desempenham um papel na

irresolução do luto. Estes são objetos simbólicos que a pessoa enlutada mantém para

fornecer um meio pelo qual o relacionamento com a pessoa falecida possa ser mantido

externamente.

Reconhecer o caráter definitivo da perda: Importante ajudar o paciente a avaliar

por que não podem reconhecer o caráter definitivo da perda.

Lidar com a fantasia de lidar o luto: Fazer com que o paciente explore suas

fantasias do que seria completar o luto ou o que seria o luto para eles.

Ajudar o paciente a dar um adeus final: O adeus pode ser gradual ao longo da

terapia. Em cada sessão o paciente é estimulado a dizer um adeus temporário para a

pessoa falecida, até que seja dito o adeus final, na medida em que a terapia se dirige

para uma conclusão.

Os teóricos que desenvolveram tais técnicas e as utilizaram em suas experiências

profissionais, como Worden, Parkes e Fonseca, dizem que o cuidado ao enlutado, seja

no Luto Antecipatório ou luto pós-morte normal ou patológico são de grande valia, pois,

auxilia a pessoa e/ou sua família na aquisição de recursos para vivenciar as etapas do

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luto, de maneira que seus sentimentos sejam melhor elaborados, além de ajudar a pessoa

a aprender a viver sem o falecido e a reorganizar e retomar sua vida.

A partir das técnicas e procedimentos mencionados e listados nesse capítulo,

podemos concluir o quanto é importante o papel do psicólogo numa situação de luto,

uma vez que este profissional é o mais bem preparado, devido sua formação acadêmica,

a atuar com essa demanda e oferecer ao enlutado a possibilidade de seguir com sua vida

da maneira menos dolorosa possível.

Terapia do Luto - Autor: J. William Worden (1998)

Luto Antecipatório - Autor: José Paulo da Fonseca (2004)