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1 ORIGEM E DESENVOLVIMENTO DA ESCOLA EM CICLOS NO BRASIL Introdução Este trabalho analisa a emergência e desenvolvimento da organização da escolaridade em ciclos no Brasil. Embora o termo ‘ciclo’ tenha surgido no cenário das políticas educacionais em 1984, com a implantação do Ciclo Básico de Alfabetização (CBA) na rede estadual de São Paulo, a idéia de eliminar a reprovação nas séries iniciais não é recente. As evidências históricas mostram que o debate em torno da criação de políticas de não-reprovação iniciou-se no final da década de 1910. Mostram também que as experiências pioneiras iniciaram-se no final da década de 50. A análise da literatura mostra que os textos que tratam da história dos ciclos têm apresentado uma descrição cronológica das discussões e programas enfatizando de forma incipiente a formação e desenvolvimento do discurso desta política. Assim, este trabalho analisa a origem e desenvolvimento do discurso da organização da escolaridade em ciclos, tendo como referencial teórico as idéias de Stephen Ball (Ball, 1990, 1994) sobre política como texto e como discurso e ainda o conceito de recontextualização do discurso, explicitado por Bernstein no contexto da teoria do dispositivo pedagógico (Bernstein, 1990, 1996). 1 - Referencial teórico 1.1 - Política como texto e política como discurso De acordo com Ball (1990), o discurso oferece uma forma particular e pertinente de entender a formação de uma política. Para ele, na análise do processo de elaboração de políticas é necessário considerar política como texto e como discurso. Política como texto implica entender que as políticas são representações codificadas de forma complexa por meio de lutas, compromissos, interpretações e reinterpretações. As políticas são, também, decodificadas de forma complexa uma vez que os envolvidos nas políticas educacionais interpretam os textos das políticas de forma múltipla e diversa porque a pluralidade de leitores produz, necessariamente, uma pluralidade de leituras. Política como discurso exige uma análise sobre o significado das proposições e palavras utilizadas nos textos das políticas, pois tais palavras e proposições estabelecem limites sobre o que é permitido aos atores pensar e podem ter o efeito de distribuir ‘voz’ uma

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ORIGEM E DESENVOLVIMENTO DA ESCOLA EM CICLOS NO BRASIL

Introdução

Este trabalho analisa a emergência e desenvolvimento da organização da

escolaridade em ciclos no Brasil. Embora o termo ‘ciclo’ tenha surgido no cenário das

políticas educacionais em 1984, com a implantação do Ciclo Básico de Alfabetização

(CBA) na rede estadual de São Paulo, a idéia de eliminar a reprovação nas séries iniciais

não é recente. As evidências históricas mostram que o debate em torno da criação de

políticas de não-reprovação iniciou-se no final da década de 1910. Mostram também

que as experiências pioneiras iniciaram-se no final da década de 50.

A análise da literatura mostra que os textos que tratam da história dos ciclos têm

apresentado uma descrição cronológica das discussões e programas enfatizando de

forma incipiente a formação e desenvolvimento do discurso desta política. Assim, este

trabalho analisa a origem e desenvolvimento do discurso da organização da escolaridade

em ciclos, tendo como referencial teórico as idéias de Stephen Ball (Ball, 1990, 1994)

sobre política como texto e como discurso e ainda o conceito de recontextualização do

discurso, explicitado por Bernstein no contexto da teoria do dispositivo pedagógico

(Bernstein, 1990, 1996).

1 - Referencial teórico

1.1 - Política como texto e política como discurso

De acordo com Ball (1990), o discurso oferece uma forma particular e pertinente

de entender a formação de uma política. Para ele, na análise do processo de elaboração

de políticas é necessário considerar política como texto e como discurso. Política como

texto implica entender que as políticas são representações codificadas de forma

complexa por meio de lutas, compromissos, interpretações e reinterpretações. As

políticas são, também, decodificadas de forma complexa uma vez que os envolvidos nas

políticas educacionais interpretam os textos das políticas de forma múltipla e diversa

porque a pluralidade de leitores produz, necessariamente, uma pluralidade de leituras.

Política como discurso exige uma análise sobre o significado das proposições e palavras

utilizadas nos textos das políticas, pois tais palavras e proposições estabelecem limites

sobre o que é permitido aos atores pensar e podem ter o efeito de distribuir ‘voz’ uma

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vez que certas vozes podem ser ouvidas como mais significativas ou legítimas. Os

discursos estão relacionados à história, poder e interesses. Além disso, freqüentemente,

os discursos não são apenas o que parecem ser em sua superfície.

Política como texto e política como discurso são conceitos complementares. Ball

(1994) sugere que a política como discurso enfatiza os limites impostos pelo discurso

enquanto que a política como texto enfatiza o papel do leitor e suas diferentes leituras e

interpretações dos textos das políticas.

1.2 - O conceito de recontextualização do discurso de Bernstein

A explanação de Bernstein sobre os princípios gerais pelos quais os

conhecimentos e discursos são produzidos, recontextualizados e reproduzidos contribui

para compreender e analisar como as políticas são configuradas e re-configuradas nos

contextos nacionais e locais. Esta explanação foi desenvolvida por Bernstein (1996) no

contexto da teoria do dispositivo pedagógico, originalmente elaborada como um modelo

para analisar os processos pelos quais uma disciplina específica (ou uma área de saber

específica) é convertida ou pedagogizada para constituir o conhecimento escolar, o

currículo, conteúdos e relações a serem transmitidas. As regras do dispositivo

pedagógico são: distributivas, recontextualizadoras e avaliativas e estão relacionadas

aos campos de produção do conhecimento, recontextualização e reprodução.

Para Bernstein (1996), quando se fala sobre mudanças educacionais, produção

do discurso pedagógico, constituição do conhecimento escolar (conhecimentos a serem

transmitidos) e relações a serem transmitidas na escola, três campos devem ser

considerados: (a) o campo da produção do conhecimento, no qual os novos

conhecimentos são construídos (a Física, por exemplo); (b) o campo da

recontextualização, no qual os discursos do campo da produção são apropriados e, em

seguida, transformados em discurso e recomendações pedagógicas e, (c) o campo da

reprodução no qual os textos criados no campo de recontextualização (currículos, livros

didáticos etc) são transformados em procedimentos de ensino e partilhados na sala de

aula. Esses três campos estão relacionados às três regras do dispositivo pedagógico:

distributiva, recontextualizadora e avaliativa. Essas três regras estão hierarquicamente

relacionadas, de forma que as regras recontextualizadoras derivam das regras

distributivas e as regras avaliativas derivam das regras recontextualizadoras. Há, deste

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modo, uma necessária inter-relação entre estas regras e há também relações de poder

entre elas.

A função das regras distributivas é regular o poder entre os grupos sociais pela

distribuição de diferentes formas de conhecimento e assim constituir diferentes

orientações aos significados e identidades pedagógicas. As regras recontextualizadoras

regulam a formação de discursos pedagógicos específicos. Por meio da

recontextualização, o discurso se move de seu lugar original de produção para um outro

lugar onde é alterado e relacionado com outros discursos. As regras avaliativas estão

preocupadas em reconhecer o que conta como aquisição válida do discurso instrucional

(conteúdos curriculares) e do discurso regulativo (conduta social, caráter e modos).

Bernstein (1996) explica que a recontextualização se dá dentro e entre dois

campos recontextualizadores: o campo recontextualizador oficial (CRO) e o campo de

recontextualização pedagógica (CRP). O primeiro é criado e dominado pelo Estado e o

segundo é constituído por pedagogos em escolas, faculdades, setores de educação de

universidades, periódicos especializados, fundações privadas de pesquisa. Essa

apropriação e recontextualização do conhecimento para fins educacionais se dá por

meio de dois conjuntos de princípios. O primeiro, deslocação, indica que existe sempre

uma apropriação seletiva do conhecimento e do discurso do campo da produção. O

segundo, relocação, aponta para o fato de que quando o conhecimento e o discurso do

campo da produção são trazidos para o campo da recontextualização, ficam sujeitos às

transformações ideológicas devido aos diversos interesses especializados e/ou políticos

cujos conflitos estruturam o campo da recontextualização. Bernstein (1996) explica que,

sempre que o discurso se move, há espaço para a ideologia atuar.

A noção de recontextualização do conhecimento e dos discursos no campo

recontextualizador oficial e pedagógico contribui para se compreender como as políticas

são recebidas ou emprestadas de outros contextos e recontextualizadas de acordo com as

arquiteturas nacionais (constituídas por aspectos políticos, ideológicos e culturais). No

processo de recontextualização, as políticas são reinterpretadas e adaptadas ao contexto.

Os objetivos e a retórica da política podem também sofrer uma mudança neste processo.

A noção de recontextualização é também útil para se analisar as políticas de modo

comparativo e global, exigindo do pesquisador a busca dos nexos da política com o

contexto global e internacional mais amplo. Com base no referencial explicitado acima,

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este trabalho apresenta uma análise da emergência e desenvolvimento do discurso da

organização da escolaridade em ciclos no Brasil.

2 - O desenvolvimento do discurso da política

No Brasil, o termo ‘escola em ciclos’ começou a ser empregado na década de

1980. No entanto, o discurso desta política envolve um longo processo de

recontextualização. Os elementos chave do discurso da política e as mudanças

discursivas são apresentados na Tabela 1.

O discurso da política emergiu e desenvolveu-se dentro do CRO, estabelecendo

uma permanente interação com o CRP. Ao longo do tempo, diferentes termos e uma

variedade de argumentos foram usados para justificar a importância desta política para o

sistema educacional público. Alguns conceitos foram excluídos da retórica da política

(por exemplo, ‘promoção em massa’ e ‘promoção automática’) enquanto outros foram

reafirmados (por exemplo, o conceito de ‘aprendizagem contínua’ que estava subjacente

nas políticas denominadas ‘organização em níveis’, ‘sistema de avanços progressivos’

ou ‘promoção por rendimento efetivo’ – as quais serão discutidas posteriormente).

Além disto, algumas vezes ocorreu uma clara separação entre o discurso do

CRO e CRP e outras vezes houve a convergência do discurso de ambos os campos. O

nível de autonomia do CRP também variou durante o processo de desenvolvimento do

discurso da política.

No desenvolvimento do discurso desta política três estágios foram identificados.

O primeiro refere-se aos antecedentes da emergência da organização da escola em ciclos

(1918-1984). O segundo é a emergência das políticas de organização da escola em

ciclos nos anos 80 e a terceiro refere-se ao processo de recontextualização do discurso

da política nos anos 1990.

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Tabela 1 – Elementos chave referentes ao desenvolvimento do discurso da organização da

escolaridade em ciclos no Brasil

Período Elementos chave Retórica da política (justificativas)

1918/1921 Promoção em massa

(CRO)

- reduzir as taxas de reprovação e o desperdício de

recursos financeiros

- a promoção de todos os alunos era necessária

devido a falta de vagas (ensino primário)

Década de

1950

Promoção automática

(CRO + CRP)

- reduzir as taxas de reprovação e o desperdício de

recursos financeiros

- aumentar o número de vagas nas escolas

- estabelecer um padrão de organização escolar mais

moderno, utilizado em países mais desenvolvidos

De 1958 a

1984

Experiências pioneiras de

políticas de não retenção

(CRO)

- reduzir as taxas de reprovação e evasão

- eliminar a reprovação (pelo menos nos primeiros

anos do ensino primário)

A partir de

1984

Ciclo Básico de

Alfabetização

(CRO + CRP)

- reduzir as taxas de reprovação e evasão

- oferecer mais tempo para a aprendizagem dos

alunos (afrouxamento das regras de seqüenciação –

Bernstein)

- democratizar a escola e o acesso ao conhecimento

- melhorar a qualidade do ensino na escola púbica e

reduzir a seletividade

- incorporar, nas práticas pedagógicas, os avanços

da Psicologia, psicolingüística, sociolingüística,

metodologia da alfabetização etc.

A partir de

1992

Versão progressista da

política:

Ciclos de Aprendizagem e

Ciclos de Formação

(CRO + CRP)

- diminuir a seletividade do sistema escolar

- democratizar a escola e o acesso ao conhecimento

- oferecer mais tempo para a aprendizagem (ciclos

mais longos, sem reprovação dentro deles)

- reduzir as taxas de reprovação e evasão

- melhorar a qualidade da educação

- mudar radicalmente a estrutura da escola e do

sistema de promoção dos alunos, o currículo, a

avaliação e o estilo de ensino (experiências mais

radicais).

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2.1 – Antecedentes (1918-1984)

Nesta seção, três aspectos serão considerados como antecedentes: (a) a geração

do discurso: as primeiras críticas à reprovação e as propostas de ‘promoção em massa’ e

‘promoção automática’; (b) as discussões sobre a promoção automática dentro do CRO

e CRP (décadas de 1950 e 1960) e (c) as experiências pioneiras das políticas de não-

reprovação.

2.1.1 – A geração do discurso da política

Até 1890, as escolas brasileiras eram não-seriadas. As escolas geralmente

tinham uma única classe, composta por alunos de diferentes idades. Esta classe poderia

ser dividida em grupos de acordo com o nível de aprendizagem dos alunos e os

professores ensinavam alunos de diferentes níveis dentro de uma mesma classe. As

classes funcionavam na casa do professor ou espaços adaptados da comunidade,

fazendas ou igrejas (Souza, 1998; Faria Filho, 2000). Além das escolas públicas havia

também escolas particulares chamadas de ‘instituições domésticas’.

O sistema seriado e o sistema de promoção dos alunos de uma série para outra

de acordo com o nível de desempenho surgiram no Brasil em 1890 com a criação dos

grupos escolares inicialmente em São Paulo (Souza, 1998). Nos grupos escolares havia

a educação primária completa (quatro anos) e um currículo enciclopédico enriquecido.

A implementação dos grupos escolares era uma questão central do período republicano

que estava em seu estágio inicial. Dentro do discurso daqueles que implementaram o

novo regime, depois da Proclamação da República, era necessário construir uma nação

baseada nos valores relacionados ao mundo moderno daquele período. Ao adotar o

sistema seriado o Brasil estava seguindo as tendências de países mais avançados e

estava implementando um modelo que estava sendo disseminado ao redor do mundo.

O novo modelo de organização escolar, por meio da implementação dos grupos

escolares, foi rapidamente disseminado para outros estados brasileiros1. Políticos e

autoridades educacionais defendiam a criação dos grupos escolares como uma estratégia

para organizar o ensino de forma mais homogênea, padronizada e uniforme (Souza,

1998). Além disso, os grupos escolares foram considerados adequados para organizar a

educação pública de massa no contexto da expansão do acesso da população à escola.

O regime seriado e o sistema de promoção baseada no desempenho dos alunos

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rapidamente produziram novos problemas: as taxas de reprovação e evasão. Ao longo

do tempo estas questões tornaram-se graves no sistema educacional brasileiro que,

historicamente, tem acumulado altos índices de aprovação e reprovação.

De acordo com Almeida Júnior (1957), os inconvenientes das reprovações no

curso primário levaram autoridades educacionais paulistas preconizarem, nas décadas

de 1910 e 1920, a promoção de todos os alunos. Em 1918, Sampaio Dória aconselhou o

seguinte: “promover do primeiro para o segundo período todos os alunos que tivessem

tido o benefício de um ano escolar, só podendo os atrasados repetir o ano, se não houver

candidatos aos lugares que ficariam ocupados” (apud, p. 9). Em 1921, Oscar Thompson,

diretor-geral do ensino, recomendou a “promoção em massa”. Assim, o discurso foi

gerado dentro do CRO quando as autoridades educacionais propuseram a ‘promoção

em massa’ devido aos elevados índices de reprovação e falta de vagas nas escolas.

Embora a pesquisa e publicações na área de educação tenham crescido mais

visivelmente a partir de 1944, com a criação da Revista Brasileira de Estudos

Pedagógicos (RBEP), Kessel (1954) e Almeida Júnior (1957) citam alguns estudos

sobre reprovação e retenção nos anos 30 e 40. No entanto, não há evidências de que as

propostas de ‘promoção em massa’ tenham sido discutidas. Estas questões apareceram

com bastante vigor na década de 1950 e começo da década de 60.

2.1.2 – Discussões sobre promoção automática na década de 1950 e 60

Na década de 50 e início dos anos 60 a promoção automática foi bastante

debatida. A RBEP foi o principal veículo utilizado pelos campos oficial e pedagógico

para disseminar e discutir a idéia da promoção automática. Nesta revista, sete artigos

foram publicados nos anos 50.

Como representantes do CRO, Anísio Teixeira (1954, 1957) e o então Presidente

Juscelino Kubitschek (1956) defendiam a promoção automática. O artigo de Wilson

(1954), uma descrição do sistema de promoção por idade utilizado na Inglaterra,

reforçava os argumentos de Teixeira e Kubitscheck.

Para Teixeira (1954), a implantação da promoção automática era uma

necessidade devido aos altos índices de reprovação2. Ele acreditava que a promoção

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automática reduziria as taxas de reprovação e evasão e garantiria mais vagas para as

novas gerações. Para ele, o sistema de ensino, desde o 1° ano primário, funcionava de

maneira altamente seletiva.

Em seu artigo, Kubitscheck (1957)3 destacava o sucesso da promoção

automática em outros países, estabelecendo a relação entre promoção automática e

progresso. Para ele, a adoção da promoção automática reduziria a seletividade da escola

e o desperdício de recursos financeiros.

Enquanto no CRO havia o consenso de que a promoção automática seria

benéfica, no CRP existiam algumas ressalvas sobre a validade da implementação da

promoção automática. Almeida Júnior (1957) e Leite (1959) eram favoráveis à

promoção automática. Apesar disso, eles apontaram potenciais problemas e cuidados

que deveriam ser tomados tais como a preparação de professores e a melhoria da infra-

estrutura das escolas. Almeida Júnior (1957), de forma mais explícita, temia que a

medida fosse implementada sem a necessária melhoria da infra-estrutura das escolas e

sem investimentos na formação dos professores. Pereira (1958) discordava da promoção

automática.

Em seu artigo, Almeida Júnior (1957) relatou sua participação na Conferência

Regional Latino-Americana sobre Educação Primária, Gratuita e Obrigatória,

promovida pela UNESCO, em Lima (Peru), em 1956. Almeida Júnior (1957)

considerava que nem a promoção em massa nem a promoção por idade cronológica

seriam satisfatórias para o caso brasileiro. Para ele, antes de implantar a promoção

automática, algumas ações de melhoria da escola primária faziam-se necessárias:

implantar a obrigatoriedade escolar, o aperfeiçoamento de professores e a revisão do

conceito de educação primária. Para ele, a promoção deveria ser o resultado da

‘excelência da escola’.

Leite (1959) argumenta que a reprovação é inútil e produz conseqüências

desastrosas. Ele defendia a organização de um currículo adequado ao desenvolvimento

do aluno e a promoção automática (entendida por ele como promoção por idade). A

introdução da promoção automática implicaria uma transformação radical, “na medida

em que se transformam os seus objetivos básicos, na medida em que os professores e

alunos passarão a viver em torno de outros valores e aspirações” (p. 29).

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Para Pereira (1958), o sucesso da promoção automática nos Estados Unidos e

Inglaterra foi possível em virtude da infra-estrutura já disponível nas escolas. Ele

considerava que os elevados índices de reprovação refletiam as condições precárias de

funcionamento das escolas primárias (condições materiais, organização, currículo,

pessoal docente, situação sócio-econômica dos alunos etc). Deste modo, a introdução da

promoção automática seria uma precária tentativa de solucionar os problemas do ensino.

A opinião de Pereira (1958) conflitava com o discurso oficial que defendia a

implementação da promoção automática como uma medida ideal para superar os índices

de reprovação e o desperdício de recursos financeiros.

A promoção automática parecia ser particularmente interessante para o CRO

uma vez que representava economia de recursos financeiros (desperdiçados pela

reprovação) e a possibilidade de obtenção de maior eficiência do sistema educacional

que era considerado altamente seletivo e ineficaz. As discussões do CRP contribuíram

para a antecipação de problemas potenciais e das condições necessárias para a

implantação desta política. Ao defenderem a promoção automática, os representantes de

ambos os campos (CRO e CRP) emprestavam idéias de países desenvolvidos, levando

em consideração as recomendações da UNESCO e, ao mesmo tempo, adaptando estas

idéias para o contexto brasileiro.

A partir de 1960 a discussão em torno da promoção automática tornou-se menos

freqüente. Revisando a literatura dos anos 60, somente três publicações relacionadas à

promoção automática foram localizadas (Moreira, 1960; Morais, 1962 e Lima, 1965),

todos representando o CRP. Lima (1965) defendia radicalmente a eliminação dos

exames e do sistema seriado. Morais (1962) era favorável à promoção automática, mas

destacava que ela precisava ser implantada de forma cuidadosa. Moreira (1960), ao

invés de defender a promoção automática sugeria o desenvolvimento de inovações tais

como a revisão do currículo da escola primária, a preparação de materiais pedagógicos,

um intensivo programa de formação de professores e inovações nas técnicas

pedagógicas.

Na década de 50 e início da década de 60, quando o Brasil vivia um período de

ampla democracia, o debate em torno da promoção automática foi intenso nos campos

oficial e pedagógico. Em contraste, durante os anos 1970 e começo dos anos 80, não há

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indícios de que a questão da promoção automática tenha sido discutida. O que poderia

ser deduzido é que o discurso oficial centralizador e prescritivo do regime militar

limitou e enfraqueceu o debate educacional e, por conseqüência, a autonomia do CRP.

No entanto, é importante mencionar que a Lei n° 5692/71, aprovada durante aquele

regime, permitia a implantação dos ‘avanços progressivos’, cuja implantação no Estado

de Santa Catarina iniciou-se em 1969/70.

2.1.3 – Experiências pioneiras de políticas de não-retenção (1958-1984)

Embora as discussões da década de 50 tenham sido sobre promoção automática,

este conceito não foi usado nas experiências pioneiras. Essas experiências receberam

diferentes designações, tais como: avanços progressivos, organização em níveis,

promoção por rendimento efetivo. Em algumas experiências o termo promoção

automática foi deliberadamente evitado (Antunha, 1962). A literatura mostra que, desde

a emergência das discussões sobre promoção automática, muitos professores têm

rejeitado esta proposta e atribuído ao termo uma significado negativo (Antunha, 1962;

Ambrosetti, 1989). Muitos professores e o público em geral consideram que as políticas

de ‘promoção automática’ contribuem para o rebaixamento da qualidade de ensino e

que alunos podem ser promovidos sem o domínio de conteúdos básicos.

De 1958 a 1984 várias experiências de não-retenção foram desenvolvidas no

Brasil. A tabela abaixo mostra as principais e mais abrangentes:

Tabela 2 – Experiências pioneiras de políticas de não-reprovação no Brasil (1958-1984)

Período Programa Localização 1958 – ? Reforma da Educação Primária Estado do Rio Grande do Sul 1959 – 1962 Promoção por rendimento efetivo Grupo Escolar Experimental –

Secretaria da Educação do Estado de São Paulo

1968 - ? Organização em níveis Estado de Pernambuco 1969 – 1971 Organização em níveis Estado de São Paulo – Rede Estadual 1970-1984 Sistema de Avanços Progressivos Estado de Santa Catarina – Rede

Estadual 1979-1984 Bloco Único Estado do Rio de Janeiro

A primeira experiência de política de não-reprovação que se tem notícia foi a

reforma da educação primária implementada no estado do Rio Grande do Sul, a partir

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de 1958. A organização das classes regulares (alunos ingressantes) obedecia um critério

misto no qual eram considerados a idade cronológica do aluno e seu grau de maturidade

(por meio do teste ABC). Para os alunos que já se encontravam na escola, a organização

das classes considerava a idade cronológica e o rendimento escolar. Os alunos acima de

8 anos que ingressavam na escola eram colocados em classes de recuperação que eram

também organizadas por idade. Nesta experiência, o sistema de reprovação foi

substituído por um sistema de classificação do aluno de acordo com a idade cronológica

e o rendimento escolar. Ao invés de serem reprovados, eram promovidos e

freqüentavam classes chamadas classes de recuperação (Revista do Ensino, 1960). Há

evidências de que até 1960 esta experiência ainda estava sendo desenvolvida (Revista

do Ensino, 1960).

A segunda experiência foi a ‘promoção por rendimento efetivo’ implementada a

partir de 1959, apenas no grupo Escolar Experimental, mantido pela Secretaria de

Educação do Estado de São Paulo. De acordo com Antunha (1962), o interesse da

Secretaria em aplicar esta política emergiu da Conferência proferida pelo Prof. Almeida

Júnior no I Congresso Estadual de Educação, realizado em Ribeirão Preto (1956). Nesta

conferência, Almeida Júnior discutiu a viabilidade da promoção automática para a

escola paulista, cujo texto foi publicado em 1957 na RBEP (Almeida Júnior, 1957).

Antunha (1962) explica que ao invés de promoção automática optou-se por utilizar a

expressão ‘promoção por rendimento efetivo’. Nesta política, a passagem da criança de

um ano para o outro se fazia pelo critério de idade cronológica e a localização da

criança no grupo-classe se fazia de acordo com o rendimento apresentado pela criança.

Desta forma, as provas e exames eram meios de verificação da aprendizagem, revisão

dos conteúdos curriculares ou de reagrupamento e reorganização das classes, mas nunca

critérios de promoção ou reprovação dos alunos. Durante o ano letivo os alunos podiam

ser remanejados para classes mais adiantadas, de acordo com o progresso dos alunos. A

autora considerava que esta política aumentaria as vagas na escola, mas não levaria a

uma diminuição dos gastos com a educação, pois o abandono da reprovação aumenta os

gastos (construções, material escolar, salários etc).

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Em 1968 a ‘Organização em níveis’ foi adotada em Pernambuco (Britto, 1993;

Barretto e Mitrulis, 2001). Neste programa, a reprovação foi eliminada nas séries

iniciais do ensino primário que foram divididos em seis níveis. Nestes quatro anos, os

alunos deveriam atingir, pelo menos, os quatro primeiros níveis. Foi um programa de

ampliação do tempo para aprendizagem por meio da reestruturação do currículo e

eliminação da reprovação.

De 1969 a 1971, a ‘Organização em níveis’ foi implementada no Estado de São

Paulo como parte da reforma do ensino primário. Neste programa, a retenção foi

eliminada na 1ª e 3ª séries do curso primário (Arelaro, 1988; Ambrosetti, 1989;

Monteiro, 1996). De acordo com Ambrosetti (1989), muitos professores discordavam

desta política e a consideravam uma estratégia de promoção automática. A mesma

autora ainda explica que esta política resultou no aumento do número de classes nas

quais a reprovação era permitida (2ª e 4ª) e a concentração de alunos com maiores

dificuldades de aprendizagem nas classes chamadas ‘classes lentas’ ou 2° ano “de

mentira” (p. 29).

A experiência mais longa de não-retenção foi o “Sistema de Avanços

Progressivos” em Santa Catarina, de 1970 a 1984. Foi implementado em todas as

escolas na 1ª e 5ª séries, atingindo gradualmente todas as séries do ensino de 1° grau.

em 1973 este sistema atingia todas as séries. A reprovação era prevista apenas no final

da 4ª e da 8ª série e os alunos reprovados eram colocados em classes de recuperação.

somente um ano. De acordo com Auras (1988) este programa foi implantado sem a

adequada infraestrutura, resultando na “deterioração do ensino nas escolas públicas. Na

prática, os alunos eram promovidos, automaticamente, para as séries seguintes. Deste

modo, alunos praticamente não-alfabetizados concluíam o 1° Grau” (p. 165). De acordo

com Pereira et al (1984) este programa não resolveu o problema da retenção e evasão e

diminuiu a qualidade do ensino. Koch (1995) considera que objetivo desta política foi

reduzir as taxas de reprovação e recursos financeiros. Confirmando outros estudos (Sena

e Medeiros, 1984; Trivinõs et al, 1994), Koch (1995) aponta que os resultados desta

políticas foram limitados.

De 1979 a 1984 o ‘Bloco Único’ foi implementado no Estado do Rio de Janeiro.

Neste programa, a retenção foi eliminada na 1ª série com o objetivo de assegurar a

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continuidade dos alunos no processo de alfabetização.

Com exceção da experiência desenvolvida em Santa Catarina, as demais

experiências tiveram curta duração. As evidências de pesquisa sobre tais programas

oferecem elementos para concluir que, de modo geral, estes programas foram

implementados ‘de cima para baixo’ (de forma impositiva); as estratégias de formação

continuada de professores foram insuficientes e descontínuas; em muitas escolas não

havia a infra-estrutura adequada e necessária; as séries nas quais a reprovação era

possível acumulavam altas taxas de reprovação; as classes tornavam-se bastante

heterogêneas e os professores apresentavam dificuldades em trabalhar com tais classes.

Estes experimentos, no entanto, foram relevantes para subsidiar os campos oficial e

pedagógico sobre como implementar políticas de não-reprovação que constituíram uma

das principais inovações da educação brasileira nos anos 80.

2.2 – A emergência da escola em ciclos nos anos 80: o Ciclo Básico de Alfabetização

Como indicado anteriormente, o termo ciclo apareceu em 1984 com a

implementação do Ciclo Básico de Alfabetização na rede estadual paulista. De acordo

com alguns autores, o Ciclo Básico possuía algumas características semelhantes da

“Organização em níveis” implementada no mesmo estado de 1969 a 1971, tais como: a

eliminação da reprovação, remanejamento de alunos, respeito às diferenças individuais

dos alunos e ainda a participação do Prof. José Mário P. Azanha em ambas as propostas

(Arelaro, 1988; Ambrosetti, 1989; Monteiro, 1996). Seguindo várias características da

proposta de São Paulo, o Ciclo Básico foi implementado em Minas Gerais (1985), Pará

(1987), Paraná (1988), Goiás (1988) e Rio de Janeiro (1993).

O Ciclo Básico reunia os dois primeiros anos do ensino fundamental, eliminado

a reprovação na passagem do 1° para o 2° ano, com o objetivo de proporcionar aos

alunos mais tempo para a aprendizagem e ainda reduzir as taxas de reprovação e evasão.

Geralmente, nestes estados, algumas medidas complementares eram criadas tais como

estudos complementares para crianças com dificuldades de aprendizagem (ou que

precisam de maior tempo para a aprendizagem), reestruturação curricular, formação

continuada dos professores e melhoria das condições de trabalho nas escolas.

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O Ciclo Básico emergiu como uma política inovadora no contexto da

redemocratização do país no final do regime militar. Nas eleições de 1982, os partidos

de oposição venceram as eleições em 10 dos 26 estados brasileiros, incluindo os mais

populosos e desenvolvidos tais como São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Paraná.

Este fato permitiu que grupos mais progressistas conseguissem maior influência no

processo de elaboração de políticas educacionais. No contexto de redemocratização,

alguns governos assumiram o compromisso de implantar mudanças educacionais que

incluíam, entre outras medidas, a participação dos professores na elaboração de

políticas, maior investimento na capacitação de professores, melhoria da qualidade de

ensino e políticas voltadas à redução da reprovação e evasão.

No Ciclo Básico, o discurso da não-reprovação e da importância da continuidade

da aprendizagem (sem reprovações, pelo menos nos dois anos iniciais) permaneceu e

novos elementos foram acrescentados. Primeiro, a relevância de garantir aos alunos

‘mais tempo’ para aprender foi reforçada. Segundo, esta política enfatizava a

abordagem centrada na criança no que se refere ao estilo de ensino (abordagem

construtivista do processo de alfabetização), avaliação dos alunos e pareceres de

avaliação. Considerando o conjunto destas medidas, pode-se afirmar que a implantação

do Ciclo Básico representou uma transição de uma pedagogia visível (com suas regras

fortes de seqüenciamento e compassamento) para uma pedagogia invisível4. É

importante também observar que as justificativas para implementar esta política

deixaram de lado as razões econômicas e passaram a considerar outros motivos tais

como a redução da reprovação e evasão, a melhoria da qualidade do ensino e ainda a

democratização da escola.

O discurso da política nos anos 80 desenvolveu-se principalmente dentro do

campo oficial. No entanto, em vários estados, a participação de intelectuais,

pesquisadores e professores universitários foi intensa. Deste modo, a construção do

discurso em torno da escola em ciclo (a partir da experiência do Ciclo Básico) e da

retórica desta política, ocorreu numa interação permanente entre os campos de

recontextualização oficial e pedagógica.

Pelo fato de ser a primeira experiência de organização da escola em ciclos

implementada em larga escala e de ter sido bastante explorado em pesquisas oficiais e

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acadêmicas, o Ciclo Básico de Alfabetização tornou-se uma referência para a expansão

do ciclo para os demais anos do ensino fundamental nos anos 90 bem como para a

incorporação dos ciclos como uma das modalidades de organização do ensino na LDB

de 1996.

2.3 – A recontextualização do discurso nos anos 1990

Nos anos 90, o discurso da política foi recontextualizado no campo oficial de

diferentes formas. De um lado, os ciclos foram incorporados por algumas

administrações e partidos políticos, constituindo a versão progressista da política

(programas denominados Ciclos de aprendizagem ou Ciclos de formação). Por outro

lado, os ciclos foram incorporados de forma conservadora, gerando o Regime de

Progressão Continuada. Na Lei n° 9394/96 tanto os ciclos quanto a progressão

continuada foram incluídos como possibilidades de organização do sistema educacional.

Versão progressista

A versão progressista dos ciclos no Brasil abrange dois tipos de políticas: os ciclos de

aprendizagem e os ciclos de formação. Enquanto os ciclos de aprendizagem baseiam-se

na promoção por idade e propõem rupturas menos radicais no que se refere ao currículo,

avaliação, metodologia e organização, os ciclos de formação baseiam-se nos ciclos de

desenvolvimento humano (infância, puberdade, adolescência) e propõem mudanças

mais radicais no sistema de ensino e de organização escolar.5

A versão progressista do discurso da política iniciou-se em 1992 com a

implementação do Projeto Ciclos de Aprendizagem, envolvendo os oito anos do ensino

fundamental, na Rede Municipal de São Paulo. A implementação dos ciclos foi

antecedida por uma série de outras mudanças implementadas por uma administração do

Partido dos Trabalhadores. O Projeto Ciclos de Aprendizagem em São Paulo pode ser

considerado a semente de uma visão mais ampla e radical da organização da

escolaridade em ciclos que se fortaleceu nos anos 90. Segundo Alavarse (2002), a

implementação deste projeto foi influenciado pelas discussões sobre a reforma do

sistema educacional francês, iniciada em 1989. Segundo ele, um dos principais

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documentos da reforma francesa circulou entre os formuladores da proposta dos ciclos e

alguns trechos foram incorporados na exposição de motivos do Regimento Comum das

escolas de São Paulo, em 1991.

No Brasil, após a implantação dos ciclos de aprendizagem nas escolas

municipais de São Paulo, outras experiências surgiram em cidades administradas pelo

Partido dos Trabalhadores, tais como em Belo Horizonte (1995), Porto alegre (1996),

Distrito Federal (1997), Belém (1997), Blumenau (1997), Chapecó (1998), Caxias

(1998), Vitória da Conquista (1998), Ipatinga (2001), Ponta Grossa (2001), Criciúma

(2003) entre outras. Em alguns destes municípios implantaram-se ciclos de formação e

em outras, ciclos de aprendizagem.

No decorrer do tempo, a organização da escolaridade em ciclos tornou-se uma

espécie de ‘marca registrada’ do PT, entendida como uma medida essencial para superar

o fracasso escolar e uma oportunidade de construir um projeto alternativo de educação.

Os projetos desenvolvidos em Belo Horizonte e Porto Alegre tornaram-se conhecidos e

influenciaram a definição de políticas similares em outras cidades.

Ao mesmo tempo, outros partidos políticos também implantaram políticas de

ciclos. É o caso do Estado do Ceará (a partir de 1998) e Mato Grosso (a partir de 2000),

administrados pelo PSDB; Niterói (a partir de 1999), administrada pelo PDT e Curitiba

(1999), administrada pelo PFL.

Esta versão progressista emergiu dentro de condições políticas e ideológicas

específicas. A proposta dos ciclos de aprendizagem (1992) coadunava-se com as

intenções do PT de implementar políticas progressistas, melhorar a qualidade de ensino

e reduzir as taxas de reprovação e evasão. Programas nacionais que já estavam em

desenvolvimento (CBA) e experiências internacionais (implantação da escola em ciclos

na França) forneceram elementos para a formação do primeiro programa de Ciclos de

Aprendizagem no Brasil.

Nesta versão progressista, a continuidade dos alunos no processo de

aprendizagem permaneceu como um dos princípios centrais da política e outros

princípios foram incluídos: os ciclos como uma forma de diminuir a seletividade e

exclusão e uma alternativa de democratização da escola e do acesso ao conhecimento.

Os campos oficial e pedagógico têm considerado que a escola em ciclos é uma

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política inovadora e positiva pois elimina ou diminui significativamente a reprovação,

oportuniza aos alunos um maior tempo para a aprendizagem e permite aos profissionais

da educação avançarem em suas concepções e práticas. Desde os anos 1990, não tem

havido uma separação clara entre os campos oficial e pedagógico. Há uma visão quase

consensual de que os ciclos são válidos e que devem ser mantidos e aperfeiçoados, bem

como implantados em redes que ainda utilizam a seriação.

Versão conservadora

A versão conservadora do discurso da política refere-se à emergência do Regime de

Progressão Continuada na Nova LDB (1996). O artigo 23 da Lei n° 9394/96 diz que a

educação básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos,

alternância regular de períodos de estudo, grupos não-seriados entre outras modalidades.

O regime de progressão continuada foi incluído no parágrafo 2° do Art. 32: “Os

estabelecimentos que utilizam a progressão regular por série podem adotar no ensino

fundamental o regime de progressão continuada, sem prejuízo da avaliação do processo

de ensino-aprendizagem, observadas as normas do respectivo sistema de ensino”.

(Brasil, 1996).

A partir da aprovação da LDB, os Conselhos Estaduais de Educação de vários

estados regulamentaram este regime. A partir de 1998, esta política vem sendo

implantada em redes estaduais e municipais. Em alguns casos, experiências que

nasceram como ciclos de aprendizagem, foram transformadas em regime de progressão

continuada, como ocorreu, por exemplo, na rede municipal de São Paulo (1998). No

regime de progressão continuada, as séries convencionais são mantidas e a reprovação é

eliminada em algumas séries, geralmente na 4ª e na 8ª. Embora este regime possa ser

considerado como organização em ciclos, é importante apontar as diferenças entre os

ciclos e a progressão continuada. Enquanto os programas de ciclos de aprendizagem e

ciclos de formação propõem mudanças mais radicais no contexto escolar, no currículo,

avaliação, organização da escola e formação continuada de professores, o regime de

progressão continuada tem sido criticado por ser uma política que tem por objetivo

diminuir a reprovação e evasão e acelerar a passagem dos alunos no ensino fundamental

(Fontana, 2000; Viégas, 2002). Alguns autores têm apontado o regime de progressão

continuada como uma política neoliberal e conservadora (Bahia, 2002; Freitas, 2003).

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Os Parâmetros Curriculares Nacionais, publicados e distribuídos em 1997 e 1998

pelo Ministério da Educação sugerem a divisão dos oito anos do ensino fundamental em

quatro ciclos de dois anos cada. Este documento, na verdade, não rompe com a idéia de

seriação e a proposta apresentada aproxima-se mais do regime de progressão continuada

do que dos ciclos de aprendizagem ou ciclos de formação. Embora poucos sistemas de

ensino tenham adotado a sugestão dos PCNs, é importante destacar que o discurso

oficial do Ministério da Educação estava disseminando a versão conservadora. O

Governo Lula, iniciado em 2003, não apresentou uma opinião clara e explícita a

respeito dos ciclos.

Conclusão

O conceito de recontextualização do discurso contribuiu para analisar a

emergência e desenvolvimento da organização da escolaridade em ciclos no Brasil de

forma mais ampla e ofereceu elementos para se compreender as diferenças entre ciclos

(ciclos de aprendizagem e ciclos de formação) e ainda entre ciclos e progressão

continuada. Os conceitos de CRO e CRP permitiram uma análise de como os ciclos têm

sido aceitos e recontextualizados dentro destes dois campos.

No que se refere aos ciclos de aprendizagem e ciclos de formação há um maior

consenso nos campos oficial e pedagógico sobre a sua validade. Na vasta literatura

sobre ciclos, há apenas dois autores que de forma explícita opõem-se aos ciclos (Demo,

1998; Grossi, 2004). Embora existam trabalhos que analisam os ciclos numa perspectiva

crítica, vários trabalhos apenas legitimam experiências. Por outro lado, no que se refere

à progressão continuada, há uma separação entre os campos oficial e pedagógico.

Enquanto o campo oficial procura destacar os benefícios da progressão continuada, a

maioria dos trabalhos acadêmicos (CRP) tem apontado contradições da política e

limitações de seus resultados no que se refere à concentração de reprovação nas séries

finais do ciclo de progressão continuada ou no que se refere nível baixo de

conhecimentos dos alunos deste regime (Fontana, 2000; Frehse, 2001; Bahia, 2002).

A despeito das diferenças entre ciclos e progressão continuada, a maioria dos

estudos não faz a distinção entre estas políticas. A alternativa que este trabalho

apresenta é a de que os ciclos e a progressão continuada integram uma mesma formação

discursiva, mas são políticas diferenciadas e que considerá-las políticas similares parece

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inadequado tendo em vista o caráter progressista e o conservador nela subjacentes.

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1 No Paraná, o primeiro grupo escolar foi inaugurado em 1903 (Bencostta, 2001) e no Estado de Minas Gerais em 1906 (Faria Filho, 2000). em São Paulo, Paraná e Minas Gerais os grupos escolares começaram a ser construídos nas capitais e, num segundo estágio, nas cidades do interior. 2 Em 1938, 58% dos alunos matriculados na 1ª série não atingiram a 2ª série em 1939. Além disso, somente 4% dos alunos completavam o ensino primário em 4 anos sem nenhuma reprovação (Kessel apud Teixeira, 1954). 3 Originalmente, foi um discurso de formatura das alunas do Instituto de Educação de Belo Horizonte. 4 Pedagogias visíveis e invisíveis são conceitos de Basil Bernstein (Bernstein, 1990). 5 Há diferenças entre ciclos de aprendizagem e ciclos de formação. Nos ciclos de aprendizagem os grupos são organizados com base na idade dos alunos; ao final dos ciclos de 2 ou 3 anos, os alunos que não atingiram os objetivos do ciclo podem ser reprovados. O processo de reestruturação curricular as mudanças propostas para a metodologia do ensino são mais brandas. Além da influência da experiência do Projeto Ciclos de aprendizagem (rede municipal de São Paulo, de 1992 a 1998), os textos de Phillipe Perrenoud e Mônica Thurler têm sido a principal referência para as experiências de ciclos de aprendizagem.

Nos ciclos de formação geralmente não há reprovação de alunos ao longo do ensino fundamental. A reestruturação curricular é mais profunda e, em várias experiências, metodologias específicas são definidas (no Projeto Escola Plural, projetos de trabalho; na Escola Cidadã, complexos temáticos). A base teórica dos ciclos de formação é constituída pelos textos de Miguel Arroyo, Elvira Souza Lima e Andréa Krug, bem como pela experiência e publicações da Escola Plural (Belo Horizonte) e da Escola Cidadã (Porto Alegre).