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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE …...os cenários e as estratégias de promoção da igualdade racial. Acreditamos que os estudos que lançam olhar para as ações educativas

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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

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MOVIMENTO NEGRO E PRÁTICAS ANTIRRACISTAS: PROPOSTAS, IMPLEMENTAÇÃO PEDAGÓGICA E COTIDIANO ESCOLAR

Autora: Claudete de Castro Rech1

Orientadora: Sônia Maria dos Santos Marques2

Resumo: O estudo Educação e movimentos sociais: práticas antirracistas propostas pelo movimento negro a partir de 1950 tem objetivo de compreender os Movimentos Sociais Negros como agentes no espaço público brasileiro, e entender os princípios que fundamentam suas ações, a identificar as práticas, os cenários e as estratégias de promoção da igualdade racial. Acreditamos que os estudos que lançam olhar para as ações educativas das organizações, tanto podem colaborar para disseminar práticas antirracistas na escola, quanto para, dialogar com os movimentos sociais, tomando por base as discussões que permeia o espaço escolar. No desenvolvimento da Unidade Didática partimos da investigação dos conhecimentos históricos prévios dos discentes, posteriormente ao diagnóstico, estabelecemos problematizações com questionamentos provocativos voltados à investigação histórica articulando leituras e narrativas sobre a temática. Propusemos hipóteses sobre as possíveis influências desencadeadoras dos problemas sociais vivenciados pelos negros no passado e a forma como a sociedade atualiza tais processos. A intervenção propôs a identificação do processo histórico que resultou nos movimentos de contestação da ordem vigentes no Brasil, contribuindo para mudanças importantes nas políticas públicas em vigor no Brasil. Nas ações percebemos que os estudantes acolheram bem a proposta, ainda que fosse visível certa resistência visto que as representações dominantes de raça e etnia alocam os negros em lugares subalternos. Assim, ampliaram-se as possibilidades para o reconhecimento das relações de poder imbricadas nas relações sociais e criaram-se possibilidades de intervenção pedagógica que postule a construção de novas interações sociais. Para as ações e reflexões nos valemos dos aportes teórico-metodológicos de Santos (2007), Adão (2007), Ribeiro (1995) dentre outros.

Palavras-chave: Educação e movimentos sociais; Práticas antirracistas; Movimento Negro.

1 Graduada em História, Especialista em Metodologia do Ensino de Geografia, Professora da

Rede Estadual de Ensino, atualmente participante do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE 2013/2014. 2

Graduação em História, Mestrado e Doutorado em Educação. Professora Adjunta na

Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Campus de Francisco Beltrão.

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1. Introdução

No artigo sistematizamos o processo pedagógico realizado com os

estudantes do 9º ano do Colégio Estadual Humberto de Campos – Ensino

Fundamental, Médio e Profissionalizante no Município de Santo Antonio do

Sudoeste, Paraná.

Os estudantes estiveram em contato com a temática relacionada às

questões étnico-raciais numa perspectiva de análise acerca dos Movimentos

Sociais Negros no Brasil no que se refere ás ações educativas que

contribuíssem no combate as práticas racistas que estigmatizam os afro-

brasileiros na sociedade. Sabendo das origens multirraciais do povo brasileiro,

no entanto tais comportamentos, ainda presentes no cotidiano não considera

com igualdade a contribuição dos diferentes grupos étnicos para a constituição

da nacionalidade.

Desta forma, a proposta de constituir uma prática voltada para a análise

e discussão das questões étnico-raciais e, por consequência do racismo como,

resultando na herança histórica de preconceito, desigualdade racial que

constituíram por séculos a sociedade. Assim, o estudo os Movimentos Sociais

Negros pode contribuir para formar, nos estudantes, novos significados e

ampliar a compreensão sobre a inserção das demandas da população negra

nas agendas de governo, bem como nos espaços de poder e prestígio no

Brasil.

As práticas educativas antirracistas empreendidas pelos movimentos

sociais negros no Brasil a partir de 1950, objeto deste artigo, parte do

levantamento dos efeitos das ações que as organizações negras exerceram e

exercem nas políticas públicas, nas reivindicações por igualdade de direitos

agenda política nacional.

As referências que subsidiaram as análises foram os Cadernos

Temáticos: Educando para as relações Étnico-Raciais I e II, (2008); os estudos

de Adão (2007), Santos (2007), Ribeiro (2005), dentre outros.

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Nesse contexto, chama atenção às diferentes situações que aparecem

nas discussões atuais: silenciamentos, negação, neutralidade, convicções

equivocadas sobre a realidade, insensibilidade e até mesmo omissão das

autoridades a cerca do racismo. A descrição dessas questões pode provocar

desmobilizações, no entanto, neste contexto, se abre novas possibilidades de

ampliação dos espaços de luta e organização social. Nesse sentido, os

conteúdos estruturantes para o trabalho pedagógico se pautaram nas relações

de poder que os sujeitos estão envolvidos e na forma como empreendem

ações no campo político, social e cultural. Assim, o estudo do tema proposto

contribuiu para reunir condições de identificação do processo histórico que

resultou nos movimentos de contestação da ordem política, socioeconômica e

cultural vigentes no Brasil e que provocou mudanças importantes, sobretudo

para a população negra. A partir dessa percepção, se ampliam as

possibilidades para o reconhecimento das relações de poder existentes nos

processos históricos, viabilizando a intervenção pedagógica e a construção de

novas possibilidades de interação social.

2. Educação e Movimentos Sociais Negros: A problemática do racismo e

da desigualdade racial

A identificação e compreensão dos princípios que fundamentam a

unidade dos movimentos sociais no enfrentamento ao racismo e a

desigualdade racial é fundamental para a realização de uma atividade de

intervenção pedagógica que pretenda abordar essa temática de forma

qualitativa. Sendo assim, é importante demarcar que, no desenvolvimento das

ações uma noção central foi à demarcação do conceito de raça como

construção social conforme está consolidada nas discussões de vários

estudiosos da temática (Santos, 2007, Adão, 207, dentre outros).

Sabemos que a compreensão das estruturas e das ações empreendidas

nos Movimentos Sociais Negros no Brasil podem oferecer subsídios

importantes para pensar uma educação democrática, pois, como podemos ler

nos Cadernos Temáticos, Educando para as relações étnico-raciais II: História-

Paraná, (2008) “a educação transmite cultura, assim, ela se reserva o direito de

dizer o que é cultura. Cabe, antes de qualquer coisa, perguntarmos qual

educação, para quem e para que”. (PARANÁc, 2008, p.89)

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Dessa forma, acreditamos que os estudos que lançam olhar para as

ações educativas empreendidas pelo movimento social negro tanto podem

colaborar para disseminar práticas educativas antirracistas na escola quanto

para, por vezes, dialogar com os movimentos sociais tomando por base as

discussões que permeiam o espaço escolar.

Isso é significativo, por porque na sociedade brasileira atual são muitos

os movimentos sociais ativos no processo de reivindicação de direitos e

inserção dessa pauta na política nacional. Nesse sentido, nos voltamos para

compreender os movimentos sociais negros de uma pergunta básica que

orientou o projeto de pesquisa e a implementação didática: Quais as ações

educativas antirracistas empreendidas pelo movimento social negro

brasileiro a partir de 1950? Para complementar o problema investigamos as

seguintes questões de pesquisa: Quais princípios que embasam essas

organizações? Qual a dimensão que a pauta educacional ocupa nesses

movimentos e como compreendiam sua importância? Quais as ações

educativas mobilizadas pelo movimento negro no Paraná?

Uma das questões que apareceu como significativa é a autoimagem do

negro brasileiro, conforme podemos ver no exemplo a seguir: um jogador de

futebol, negro, brasileiro, ao ser questionado por um repórter sobre as

manifestações de racismo em estádios europeus, respondeu: “Acho que todos

os negros sofrem. Eu, que sou branco, sofro com tamanha ignorância”

(PARANÁb, 2008, p. 23). A resposta do jogador faz ver o quão complexas são

as questões de identidade e identificação no Brasil. Sabemos que a

autoatribuição é um componente significativo na identificação na qual o sujeito

se aproxima de uma origem étnica, tomando-a como elemento componente de

sua identidade. Da mesma forma havemos de reconhecer que em uma

sociedade na qual as questões étnicas estão fortemente hierarquizadas alguns

sujeitos, para fugir desse processo de opressão, aderem a identidades que

parecem ter “maior valor social”. Assim, muitas vezes, ao ascender

socialmente, o indivíduo desvia-se da etnia que considera que o inferioriza.

Para continuarmos a discussão, poderíamos nos perguntar: como se

produz o discurso do atleta em questão? De acordo com a DCE, (2008) de

história, é comum nos depararmos com estereótipos nos livros didáticos,

principalmente nas abordagens da História do Brasil, nas quais os negros

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aparecem em situações de escravidão e sofrimento, como passivos e

incapazes de manifestar resistência à opressão que lhe foi imposta. Desta

forma, o sujeito foge dessa identidade que considera que o diminui. Nesse

contexto, a educação tem papel central para gerar novas possibilidades de

interpretação.

Diante do exposto, esboçamos questionamentos sobre como os jovens

estudantes negros, irão reconhecer-se quanto ao pertencimento étnico? Quem

sentirá empatia para reconhecer-se como negro quando as imagens

observados nas ilustrações e narrativas dos livros trazem representações

estereotipadas? Quem se perceberá mobilizado a conhecer a terra e história

dos afro-brasileiros e africanos se persistirem as representações

historicamente constituídas? Quais as possibilidades de avançarmos para

desconstruir estereótipos e engendrarmos novas percepções e relações com o

Outro?

Os questionamentos encaminham uma constatação, corroborada por

Paranáb, (2008): “via de regra a África é representada como um lugar atrasado,

primitivo, sujo, inóspito, cheio de animais ferozes, enfim, um lugar onde o

Tarzan e o Fantasma andavam tentando civilizar e proteger” (PARANÁb, 2008,

p. 23). Assim, é compreensível que no momento de autoidentificação o sujeito

seja levado a desviar daquilo que para ele representa uma origem que

pretende esquecer.

Dessa forma, a temática apresentada no artigo contribui para a reflexão

sobre o racismo no Brasil, a exclusão social e desigualdade racial. Pois

sabemos que “apesar de tantos anos de afirmação desse princípio

internacional no Brasil os negros continuam à margem, sobrevivendo das

migalhas do sistema, mal morando, mal comendo, mal estudando, mal vivendo”

(PARANÁb, 2008, p.18).

A reflexão voltada às práticas sociais com vista à superação do racismo,

através de ações educativas no ambiente escolar, parte do reconhecimento das

diferenças étnico-raciais que caracterizam a população brasileira. A

compreensão da identidade, e da formação multiétnica da nação, pode

contribuir para atitudes proativas de acolhimento e empatia à medida que

ocorre a valorização das lutas empreendidas pelo movimento negro.

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Nas sociedades de democracias liberais, o reconhecimento das identidades dos grupos sociais se constitui numa justificativa para o acesso aos direitos individuais e coletivos específicos. Pela via da identidade os grupos, adquirem direitos conservando seus valores particulares e específicos (PARANÁa, 2008, p. 89).

Em relação à luta dos negros, Santos, (2007) enfatiza que, são através

dos movimentos sociais organizados nas mais variadas configurações,

associações, motivações, aspirações e maneiras de elaboração das pautas de

reivindicações que os grupos agem. Tal posição evidencia a importância das

manifestações de resistência às relações de poder hegemônicas, exigindo o

reconhecimento e a valorização da população negra, sobretudo no que se

refere à garantia do acesso a educação.

O Movimento Social Negro, que já vinha lutando nas sombras pelo reconhecimento do valor do povo negro e pela adoção de políticas de combate ao racismo, encontra nesses imperativos legais, forças e alento para impulsionar a luta (PARANÁb, 2008, p.18).

Assim, os esforços resultaram em políticas públicas, o que reforça a

convicção de que tratar das lutas dos sujeitos históricos, possui relevância no

que tange a superação das desigualdades raciais. Nesse contexto a educação

representa para a população negra a possibilidade de ascender socialmente,

as políticas públicas de ações afirmativas, reparatórias da histórica omissão do

estado brasileiro, representam o impulso para a promoção da inserção cidadã e

do acesso às igualdades de oportunidades. A justificativa de tal escolha para

projetos na área educacional aconteceu por que, conforme Santos (2007, p.70)

“a educação poderia levar à conquista de habilitação para uma vida profissional

digna, tornando-se um passaporte para a ascensão social e até mesmo de

instrumento de luta”.

Desse modo, surgem novas possibilidades na ocupação dos espaços

sociais de prestígio e de formação intelectual, condizentes com a diversidade

étnico-racial, do país, porém, Santos, (2007) diz que, muitos são os críticos que

se contrapõem as reivindicações por políticas públicas de ações afirmativas

para a população negra no Brasil. O autor apresenta a contradição vivida pelos

intelectuais negros: de um lado, identificam a existência do racismo, de outro,

no momento de materializar essas percepções e transformá-las em políticas

públicas, produzem silenciamentos que reforçam a exclusão social.

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3. O negro no Brasil: Organização e Resistência

Partindo da concepção de que o racismo no Brasil trata-se de uma

construção histórica, percebemos que de acordo com Santos, (2007) no

período escravista, a reivindicação era pela liberdade, já no pós- abolição, a

luta dos escravos libertos, por meio do movimento negro, passou a ser pela

educação formal. Outra forma de manifestação de resistência coletiva, foram

os quilombos, entendidos como locais nos quais se dirigiram os escravos que

obtinham êxito nas fugas, sendo que, na sociedade colonial ajuntamentos a

partir de cinco integrantes já era visto como um quilombo. Alguns de

organização simples, outros como o de Palmares que atingiu uma dimensão

demográfica considerável no século XVII chegando a ter em torno de vinte mil

habitantes e, portanto, com uma organização complexa de administração e

organização da vida cotidiana.

Segundo Santos (2007), no período pós-abolição houve revoltas contra o

racismo no Brasil, protagonizadas pelos negros como a Revolta da Chibata em

novembro de 1910. A reação dos marinheiros negros era dirigida aos oficiais

que ao fazerem uso de violentos castigos físicos (chibata), má alimentação e

baixos salários, demonstravam desprezo aos marinheiros. Assim, esses

oficiais, cheios de ódio e motivados por sentimentos racistas atentavam contra

a dignidade e os direitos humanos dos marinheiros negros, que numa das

primeiras manifestações públicas de resistência contra o racismo no pós-

abolição, confrontaram a ordem vigente fazendo o enfrentamento na luta contra

a discriminação racial. Nesse sentido é expressivo à afirmação de que “os

Direitos Humanos abrem espaços, ratificam e simbolizam a luta e ação social”

(ADÃO, 2007, p. 48).

Para Santos (2007), as demonstrações de resistência contra o racismo

se diferenciaram quanto à linguagem, ações e formas de distribuição dos bens

materiais e simbólicos. O uso do jornal foi o principal meio de comunicação

encontrado para noticiar eventos sociais das associações posteriormente,

novos jornais passaram a divulgar, denunciar e expor à sociedade as questões

que laceravam o corpo social. Para Santos, (2007, p.70) “mesmo sob

divergências, havia uma reivindicação nos jornais negros que se tornou um

consenso entre os diretores e editores desses jornais: a necessidade de

educação formal para a população afro-brasileira”.

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Como podemos verificar, o uso de jornais passa, com o tempo, a

representar um meio que será utilizado para atender as demandas

relacionadas à intersecção entre questões raciais e educativas. Nesse

contexto, as reivindicações por acesso a educação formal eram abordagem

consensual entre os agentes do meio editorial dos jornais. Os sujeitos, editores

e grupos sociais que representavam, entendiam que a superação da herança

do tempo da escravidão seria superada pela educação, pois representava

condição imprescindível de inserção à vida em sociedade.

Portanto, para Santos (2007), o dinamismo de ideias e opiniões dos

jornais negros resultou na criação da Frente Negra Brasileira (FNB), no ano de

1931, transformando-se, em 1936, em partido político de representação e

divulgação, pois “a partir de sua fundação, a Frente Negra Brasileira

transformou-se numa referência importante para os afro-brasileiros de quase

todo o Brasil, tendo entre seus fins a ressocialização dos negros brasileiros”

(SANTOS, 2007, p.75). O significado histórico dessa organização ainda é

pouco conhecido pelos educadores na Educação Básica, no entanto,

[...] pode-se afirmar que os Movimentos Sociais Negros sabem da importância da educação formal para os negros e para outros grupos sócio raciais de baixa renda lograrem os seus objetivos e serem tratados como cidadãos de direito e de fato na sociedade (SANTOS, 2007, p. 82).

A busca por espaço de participação na sociedade, de acordo com

Santos (2007) levou, a partir de 1944, a criação, no Rio de Janeiro, do Teatro

Experimental do Negro por Abdias do Nascimento, com o objetivo de

enfrentamento a discriminação racial e a superação da visão eurocêntrica

impregnada na cultura brasileira. Também, o movimento empreendido pelo

Teatro Experimental Negro, contribuiu para com o processo de desconstrução

do mito da democracia racial no Brasil resultante de uma visão de mundo do

branco sobre a problemática racial.

Essa instituição foi uma das organizações negras mais importantes para a luta anti-racismo no período da chamada Segunda República (1945-1964), visto que foi também fundada para protestar contra a discriminação racial, formar atores e dramaturgos negros capazes de ler a realidade racial do Brasil, bem como resgatar a herança africana na sociedade brasileira, que naquela época era negada e relegada pelo eurocentrismo da chamada cultura brasileira (SANTOS, 2007, p. 87).

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O Teatro Experimental Negro (TEN) existiu e atuou, segundo Santos,

(2007) até a década de 1960, na esfera cultural contribuindo para ações

afirmativas direcionadas a valorização da identidade negra e da educação do

grupo negro e da sociedade, fator imprescindível para unir consciências e

fortalecer grupos sociais oprimidos no enfrentamento ao quadro de

discriminação racial. A função social desta organização pode ser demarcada

pela afirmação que diz que “assim, o processo de educação formal, como

aprender a ler e a escrever, de muitos de seus integrantes torna-se primordial

para o TEN” (SANTOS, 2007, p. 88).

O Teatro Experimental Negro delineou ações educativas no sentido de

elucidar à população negra as relações de dominação e as possibilidades

resistência. A luta pela valorização cultural e ampliação das propostas

educativas colabora para ampliar os espaços profissionais ou como fator de

mobilidade social. É nesse contexto que “o TEN passou a oferecer cursos de

alfabetização e cultura geral para os seus integrantes ou para aqueles (as)

trabalhadores (as) e desempregados (as) que o procuravam” (SANTOS, 2007,

p. 88).

A busca de igualdade racial e de descolonização intelectual, visando à construção de uma real democracia racial para os negros, pode ser vista explicitamente nas propostas da Convenção Nacional do Negro Brasileiro, realizada em 1945 em São Paulo e em 1946 no Rio de Janeiro (SANTOS, 2007, p. 92).

Assim, para Santos, (2007) na sequência outras propostas à valorização

da imagem histórica do negro se efetivam através da Lei 10.639/03 de 09 de

janeiro de 2003. Lei esta, que torna obrigatória o ensino da História e Cultura

Afro-brasileira e Africana em todas as escolas da Educação Básica do Brasil.

A fundação do Grupo Palmares, de acordo com Santos, (2007) de atuação

em meados de 1971 no Rio Grande do Sul, contribuiu para com o Movimento

Negro Unificado. Partiu dessa iniciativa a proposta de fazer do dia 20 de

novembro como o Dia Nacional da Consciência Negra, data que marca o dia da

morte de Zumbi que foi um grande líder do Quilombo dos Palmares.

Percebe-se então que o Movimento Negro Unificado obteve, na década

de 1980, ainda sob o regime militar, avanços em termos de politização nas

lutas empreendidas, ampliando os debates e mobilizando entidades negras do

Brasil. Porém, há algo que permaneceu latente como foco prioritário de

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mobilização, a educação formal. A participação na elaboração da constituição

promulgada em 1988, os movimentos sociais negros apresentaram

proposições contendo reivindicações, sobretudo para a educação.

De acordo com Santos, (2007) as conquistas dos movimentos sociais

negros no campo da educação se deram pela inclusão nos currículos

escolares, em todos os níveis, a temática da História e Cultura Afro-brasileira e

Africana. Na esfera cultural, o dia 20 de novembro foi considerado Dia Nacional

da Consciência Negra.

No campo da educação, as reivindicações apresentadas solicitavam

entre outros, a inclusão das temáticas que abordavam as relações étnico-

raciais nos currículos escolares em todos os níveis e modalidades de ensino.

Também solicitavam a democratização quanto à escolha dos ocupantes nas

escolas públicas por meio de processo eleitoral junto à comunidade escolar e a

proibição de material de leitura fazendo apologia a práticas discriminatórias de

religião, raça ou cor.

Para Santos, (2007) Abdias do Nascimento foi, enquanto parlamentar,

um aguerrido defensor da causa negra junto ao Congresso Nacional Brasileiro

na década de 1980, pois tratava a questão racial com exclusividade em sua

agenda política. Cabe aqui destacar as reivindicações de participação do

analfabeto nas eleições. Tal medida impactou positivamente a população negra

à qual era negado o acesso ao voto por ser uma parcela da população vitimada

por altas taxas de analfabetismo.

Ainda segundo Santos (2007), dentre as reivindicações de Abdias do

Nascimento na educação destacou-se a solicitação por políticas afirmativas de

caráter compensatório, como bolsas de estudo para estudantes negros em

todos os níveis.

Tais questões mobilizavam os movimentos sociais negros e as propostas

educativas. Esse fato pode ser observado na organização de eventos nos

quais essa temática é central, como podemos exemplificar nos temas

escolhidos para o VIII Encontro de Negros do Norte e Nordeste em 1988. O

evento tinha como objetivos debater temas relacionados à prática docente

através do uso de manuais didáticos, os quais persistiam em abordagens

eurocêntricas; organização curricular e bullying contra alunos negros no espaço

escolar. A forma como eram abordadas as temáticas representavam entrave à

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emancipação intelectual, pois mantinham a educação atrelada aos valores

europeus hegemônicos sem questionar a identidade étnico-racial e histórica

dos negros brasileiros.

A Marcha Zumbi dos Palmares Contra o Racismo, pela Cidadania e a

Vida, na segunda metade da década de 1990, apontava a necessidade da

melhoria na qualidade da educação, eliminação da discriminação racial,

acompanhamento das produções didáticas a serem trabalhadas nas escolas

públicas, permanentes programas de formação docente para redimensionar

abordagens da questão racial numa perspectiva de valorização cultural da

diversidade racial e do enfrentamento de situações que configurem atos de

discriminação racial, bem como a implantação de políticas de ação afirmativa

como bolsas auxílio para estudantes negros como forma de evitar a evasão

escolar dos jovens e políticas afirmativas que ampliem o acesso dos negros ao

ensino profissionalizante e superior público.

Segundo Santos, (2007) a atuação de alguns parlamentares como

Benedita da Silva, Abdias do Nascimento, Paulo Paim e Luiz Alberto que

marcaram representatividade da população negra e foram decisivos para a

materialização de políticas públicas focadas na questão racial. O debate foi

ampliado por vozes que se somam e argumentam em favor dos direitos de

cidadania do negro na esfera política brasileira, a exemplo das cotas para

negros nas universidades públicas.

Em 1996 foi criado o Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), para a

valorização da população negra com objetivos explícitos de promoção da

igualdade racial.

Assim, a implementação de Políticas Públicas de Ações Afirmativas brasileira são desencadeadas com a criação do Grupo de Trabalho Interministerial para a valorização da População Negra (GTI), no governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, do Partido Social Democrata Brasileiro – PSDB (1995-2002), que teve como objetivo colocar definitivamente a questão da população negra na agenda nacional (ADÃO, 2007, p. 67).

De acordo com Santos, (2007) por serem oriundas dos movimentos

sociais negros, as Políticas Públicas de Ações Afirmativas são resultantes de

estratégias que evidenciam o seu aparelhamento técnico e político. Assim, se

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fortalece a convicção de que a pressão popular por políticas públicas podem

resultar em mudanças, em favor dos seus beneficiários.

Nesse sentido, o então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, ao

iniciar seu mandato, em 2003, expôs em discurso que o reconheceu

oficialmente o racismo e suas implicações socioeconômicas para a população

negra e criou nesse mesmo ano a Secretaria Especial de Política e Promoção

da Igualdade Racial (SEPPIR) com vistas à promoção da justiça social e racial

em nosso país.

O atual governo brasileiro – liderado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores (PT), que tomou posse em janeiro de 2003 – ineditamente, desencadeou e, paulatinamente, está delineando uma proposta de Políticas Públicas de Ações Afirmativas para a população negra brasileira, o que é, simultaneamente, fruto das lutas, reivindicações e, atualmente, da presença política e executiva de militantes do Movimento Negro brasileiro nesse governo. Essa proposta materializou-se, em especial, através da Secretaria Especial de Política e Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República – SEPPIR/PR, criada em 2003, com status de ministério. Atualmente, apresenta um grande foco no Ministério da Educação – MEC: na Secretaria de Educação Superior – SeSu, com o “Programa Universidade Para Todos – ProUni” e as Políticas de Cotas nas Universidades Públicas e na Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade – SECAD, a partir da criação e da implementação do “Programa Diversidade na Universidade” (ADÃO, 2007, p. 42-43).

Neste período, as proposições dos movimentos sociais negros se

concretizaram na organização de políticas públicas voltadas às demandas da

população negra, sobretudo no campo da educação, da qual destaca-se a

implementação das cotas nas universidades públicas.

Os movimentos sociais negros reuniram uma gama diversa de atores

militantes, pertencentes a grupos ou a organizações negras fizeram, mesmo

diante de tempos e cenários mais hostis, florescer seus anseios na forma de

políticas públicas de ação afirmativa. Assim mantiveram-se engajados na

defesa da promoção da igualdade racial material nas relações raciais,

sobretudo na educação, apesar dos obstáculos e desafios ao reconhecimento

das lutas históricas, permanecem constituindo possibilidades de gerar novos

espaços de poder no Brasil.

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4. Relato da experiência

A busca pela compreensão das relações que se estabelecem entre as

práticas educativas antirracistas e as ações dos Movimentos Sociais Negros no

Brasil, concebidos como agentes no espaço público brasileiro direcionou o

olhar para o entendimento quanto aos princípios que fundamentaram as ações

e a identificação das práticas, os cenários e as estratégias de promoção

educativas.

Dessa forma, os estudantes matriculados no 9º anos do Ensino

Fundamental, representando o público-alvo de implementação do estudo

demonstraram compreensão quanto à proposta da temática ao externarem por

meio das atividades e as apresentações que o estudo despertou significados

importantes para com os objetivos propostos. Alguns desvios de atenção e

concentração ocorreram em momentos pontuais no decorrer da

implementação, mas que foram corrigidos através da abertura de canais de

diálogo com os estudantes de forma que os mesmos puderam expressar

sentimentos e percepções sobre a temática e as ações a serem desenvolvidas

de forma a mobilizá-los novamente para o estudo.

Assim, partir da investigação dos conhecimentos históricos prévios dos

estudantes foi uma das decisões pedagógicas que assumimos com o intuito de

estabelecer levantamento diagnóstico das concepções culturais que já fazem

parte do universo vivido pelos jovens e que subsidiaram a prática docente em

relação a proposta do estudo da temática e dos conhecimentos historicamente

construídos pela sociedade.

Por conseguinte, a problematização apresentada na forma de

questionamentos contribui para instigar as ações de investigação articuladas

pelas leituras de textos, imagens e narrativas históricas. Assim, a intervenção

propôs a identificação do processo histórico que resultou nos movimentos de

contestação da ordem vigente no Brasil, contribuindo para mudanças

importantes no que se refere à organização e participação do negro nos

movimentos sociais. Á vista disto, as ações propostas ampliaram as

possibilidades para o reconhecimento das relações de poder que permeiam as

relações raciais.

Na implementação percebemos que os educandos ainda estão

acostumados com dinâmicas mais autoritárias e que, ao propormos formas

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variadas de atividades, em um primeiro momento reagiram, atribuindo pouco

significado que era proposto. Percebemos que havia certa dificuldade de

debater sobre as questões envolvendo o racismo e as desigualdades raciais no

Brasil, no entanto, no momento da exposição dos resultados dos trabalhos,

houve mudanças qualitativas acerca da percepção e relevância do tema.

Ao visualizarem o conjunto das ações admiraram suas produções e de,

alguma forma, criaram nova sensibilidade sobre a questão e sobre o que fora

proposto. O estudo da temática nos pareceu desafiador, pois em muitos

momentos, pudemos perceber como é presente, em muitos sujeitos, a negação

a cerca do racismo, bem como visões estereotipadas do negro no Brasil

demonstrou que, a escola precisa desempenhar sua função social de

democratização do acesso aos conteúdos culturais historicamente construídos.

Nesse sentido, práticas educativas antirracistas necessitam de avanços

no espaço escolar no que diz respeito á ações que contribuam ao incentivo da

leitura e para que possam orientar sobre a importância dos movimentos sociais

negros no Brasil. Tais organizações sociais atuam historicamente entendendo

que a educação, aliada aos movimentos sociais, podem representar importante

ferramenta para a construção de novos significados sobre os processos

históricos.

Considerações finais

A abordagem de temáticas relacionadas aos Movimentos Sociais Negros

no Brasil, contribuiu para enfatizar a importância da educação nas conquistas

pela igualdade racial, pois a Constituição quando estabelece o princípio da

igualdade, o faz de maneira formal. Daí a importância de trazer essa discussão

para o cotidiano e para as práticas educativas.

Tais práticas representam as ações resultantes dos esforços

empreendidos pelos Movimentos Sociais Negros com vistas à justiça social.

Nas atividades, propusemos o tema e abrimos o assunto para que os alunos

debatessem e contassem suas experiências em relação ao preconceito. As,

conversas, possibilitaram o conhecimento do Outro e a empatia entre os

estudantes que se perceberam como sujeitos participativos do processo e

reconheceram responsabilidade social sobre suas decisões e ações.

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Acreditamos que a adoção de práticas educativas antirracistas

incorporadas às ações em sala de aula, representaram instrumentos capazes

de promover transformações coletivas e estruturais na sociedade, uma vez que

a educação tem como prerrogativa a formação de cidadãos que, muito além de

se sentirem parte do mundo, sintam-se capazes de atuar nele.

Ao implementarmos o estudo podemos afirmar a relevância em se

trabalhar com os educandos a medida que salientamos a necessidade de

solucionar as problemáticas de ensino que envolviam questões étnico-raciais a

partir do espaço escolar e como reflexo disso, na sociedade. A partir da

experiência podemos afirmar que o debate na escola se faz necessário para o

reconhecimento acerca da existência do racismo, pois partindo desse olhar se

pode reivindicar políticas públicas em prol da construção de uma sociedade

que preze por princípios de valorização da pluralidade cultural que nos constitui

como nação.

Ao avaliarmos o processo de implementação e os estudos de temáticas

relacionadas à diversidade étnico-racial podemos afirmar que estas contribuem

para romper com abordagens pautadas no eurocentrismo, à medida que

lançam olhares para outras visões de cultura e da sociedade. Ao

aprofundamento dos conhecimentos sobre as questões raciais, permitiu

perceber a importância da participação dos sujeitos no processo social e da

mesma forma demarcar o significado do envolvimento social para as mudanças

em prol da construção de uma sociedade mais democrática. Por acreditarmos

na ação transformadora dos movimentos sociais, é que buscamos na temática

a possibilidade de proposição de análise das lutas dessas organizações na

efetivação de expectativas envolvendo os desejos de muitos sujeitos sociais

que individualmente não alcançariam ou não transformariam a realidade.

As atividades propostas foram organizadas em dois eixos centrais:

Primeiro, “O negro no Brasil: conhecimento e cotidiano”, implementou ações

de investigação dos conhecimentos históricos prévios dos estudantes e

partindo desse diagnóstico, a problematização contendo questionamentos de

caráter provocativo voltado a instigação para a investigação fundamentada nas

leituras de textos históricos e, na busca pela contextualização dos processos

que resultaram nos movimentos de contestação das estruturas política, social,

econômica e culturalmente construídos no Brasil, contribuindo para mudanças

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sociais necessárias , sobretudo para a população negra. A partir dessa

percepção ampliam-se as possibilidades para o reconhecimento das relações

de poder existentes nos processos históricos, viabilizando a intervenção

pedagógica e a construção de novas possibilidades de interação social.

O texto “Quem são os negros brasileiros”, foi trabalhado de forma que

fosse possível um olhar sobre as desigualdades raciais a partir da análise de

alguns indicadores sociais no que se refere a composição étnica da população

brasileira e a identificação de como o IBGE trabalha no senso o qual

compreende as categorias pretas e pardas com base na autodeclaração das

pessoas, para representar uma realidade distinta da dos brancos, realidade

esta, que só se torna possível observar quando se compara os indicadores

sociais e econômicos entre a população negra e branca. Após a leitura e

análise do texto, os estudantes organizados em grupos, desenvolveram formas

de representação do quadro de desigualdade racial evidenciado nos dados

estatísticos de forma a apontar ações socioculturais e políticas que são

consideradas necessárias para a conquista da igualdade racial no Brasil.

Segundo, “Organização e Resistência”, contribuiu para a análise, ao

sistematizar temas sobre a dimensão que a pauta educacional ocupava e

ocupa nos movimentos e como compreendiam sua importância. O texto “Teatro

Experimental do Negro (TEN)” foi articulado à proposta de aprofundamento do

tema por meio da brincadeira “escravos de Jó”, no qual contribuiu para o

entendimento de que haviam constantes manifestações de resistência dos

negros, nas relações de trabalho e poder ao qual eram submetidos durante o

período escravocrata. Também dentre as atividades implementadas, houveram

propostas de análise de temas ligados a evidenciar algumas organizações do

movimento social negro como Movimento Unificado Contra a Discriminação

Racial – MUCDR, Grupo Palmares, Agentes de Pastoral Negros (APNs) e

como atividade de aprofundamento a confecção da Boneca Abayomi. Foram

dedicadas igual importância e atenção às reflexões sobre Abdias do

Nascimento, para os movimentos sociais negros, propondo releitura por meio

de pesquisa e organização de quadro-mural. Sobre a Marcha Zumbi dos

Palmares contra o Racismo, pela Cidadania e a Vida, bem como, a influência

da III Conferência Mundial Contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia

e Intolerância Correlata, foram feitas atividades de leitura e compreensão,

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buscando sintetizar os objetivos dos importantes eventos históricos

mencionados, na forma de cartazes para compor o quadro-mural em

construção visando sua efetivação ao término do estudo. O aprofundamento da

análise das leituras deu-se na proposta de estudo em grupos na qual os

estudantes, assim organizados, desenvolveram pesquisa sobre ações

educativas antirracistas propostas pelos movimentos sociais negros no Paraná.

A autoimagem do Negro como componente de identidade contribuiu para a

fase conclusiva de implementação da proposta didático-pedagógica uma vez

que, trouxe texto que direcionava o olhar dos sujeitos envolvidos no processo,

para o incentivo ao respeito à diversidade racial por meio do reconhecimento

de que a herança africana é fundamental na formação cultural brasileira e

paranaense.

Como forma de organizar a divulgação dos trabalhos, os murais

principais e de circulação no espaço da escola, foram cuidadosamente

escolhidos para abrigar os resultados dos trabalhos desenvolvidos ao longo do

processo, e sintetizado, para apreciação da comunidade escolar.

Tais práticas demonstraram a riqueza de historicizar sobre a temática

proposta no presente estudo, enquanto conquista daqueles que se

encontravam na condição de excluídos dos projetos de sociedade, através das

práticas educativas antirracistas propostas pelos movimentos sociais negros,

fica evidente que trata-se de ações emancipatórias e que contestam o status

quo.

Nesse sentido, o olhar pretérito às práticas implementadas e as reações

dos estudantes e comunidade escolar, permitem afirmar que é possível que a

temática constitua organicamente o currículo e os conteúdos escolares. Assim,

a implementação desses conteúdos, por meio do estudo de textos, que

embasaram as discussões bem como a utilização de metodologias

diversificadas, oportunizou momentos de interação e a obtenção de resultados

positivos no que se refere aos objetivos estabelecidos nas ações propostas.

As organizações que se caracterizam por suas ações voltadas às

questões raciais, perceberam que a educação aliada aos movimentos sociais

negros se traduz em importantes ferramentas para a construção de novas

visões sobre os processos históricos de mudança na sociedade, em favor de

segmentos que se encontram em situação de exclusão social. Portanto, nos

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parece importante, a elaboração de ações, na mobilização de tempos e

espaços escolares, de forma a promover o encontro de saberes socialmente

construído a partir da vivência dos estudantes no meio social com os saberes

historicamente construídos pela sociedade, sistematizados na escola em seu

processo de transposição didático-pedagógica.

REFERÊNCIAS

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_______c. Secretaria de Estado da Educação – SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO. Educando para as Relações Étnico-Raciais II. Curitiba: Secretaria da Educação, 2008.

RIBEIRO, Darci. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. 2ª ed. 26ª reimpressão. Schwarcz LTDA. São Paulo, 1995.

SANTOS, Sales Augusto dos. Movimentos negros, educação e ações afirmativas. Brasília. Universidade de Brasília, 2007. 554 p. Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Brasília, Brasília, 2007.