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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

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PESSOA COM DEFICIÊNCIA VISUAL: relações interpessoais no ambiente escolar

Autora: Ivonethe de Almeida Gonçalves1

Orientadora: Vera Lúcia Ruiz Rodrigues da Silva2

Resumo

Este artigo é produto de atividades realizadas no Plano de Desenvolvimento Educacional (PDE) da Secretaria de Estado da Educação do Paraná, cujo objetivo foi realizar reflexões a respeito da Pessoa com Deficiência Visual: relações interpessoais no ambiente escolar. Consiste no fomento de formação à equipe pedagógica do Colégio Estadual Professora Júlia Wanderley - Ensino Fundamental e Médio, sob a perspectiva da Teoria Histórico-Cultural que possibilita compreender a concepção de pessoa com deficiência. A importância deste tema justifica-se pelo fato de que a inclusão escolar não é uma realidade em todas as escolas, pois os atendimentos assegurados pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (BRASIL, 1996), constata-se que os alunos deparam-se com muitas dificuldades no cotidiano, nos ambientes que frequentam e mais especificamente no ambiente escolar. Portanto, esse artigo trata dos profissionais da educação, os quais têm que aprimorar na prática docente, logo, evidenciam-se a importância do entendimento e a pesquisa sobre este assunto. Com essa perspectiva, foi possível o aprimoramento de estudos, possibilitando esta reflexão na escola como espaço de formação da equipe escolar e discussão no Grupo de Trabalho em Rede - GTR. A metodologia usada foi de análise e debate de textos científicos e documentos legais, bem como a elaboração de propostas pedagógicas inclusivas, proporcionando ao grupo de professores reflexão sobre a relação interpessoal da pessoa com deficiência visual, deixando de lado a ideia de que a deficiência é um obstáculo intransponível, e crer num trabalho que leve a pessoa cega à validez social.

Palavras-chave: Psicologia histórico-cultural; Deficiência Visual; Educação Especial; Inclusão Escolar; Relações Interpessoais.

1 Graduada em Letras–Inglês com especialização em Língua Portuguesa e Educação Especial

Inclusiva. Professora da Rede Pública do Estado do Paraná. Aluna do Programa de Desenvolvimento da Educação – PDE, sétima turma 2013/2014. 2 Professora orientadora. Pedagoga. Mestre em Educação. Coordenadora do Programa Institucional

de Ações Relativas às Pessoas com Necessidades Especiais (PEE) da Unioeste. Membro do Fórum Estadual e Municipal em Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência de Cascavel.

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1 Introdução

O tema deste projeto é: Pessoa com Deficiência Visual: relações

interpessoais no ambiente escolar. A pesquisa foi desenvolvida de acordo com a

proposta de capacitação do PDE – Programa de Educação Educacional e surgiu a

partir da ideia do colega de trabalho in memoriam, Alfredo Roberto de Carvalho, uma

pessoa cega que trabalhava no mesmo local o qual eu faço parte, CAP - Centro de

Apoio Pedagógico para Atendimento às Pessoas com Deficiência Visual. Alfredo

Roberto percebia a necessidade tanto no seu trabalho quanto nos diversos espaços

sociais de mais orientação das pessoas que enxergam e a importância de que se

relacionem com pessoas cegas e de baixa visão. É evidente a concepção

equivocada a respeito da pessoa com deficiência visual que existe nestes ambientes

como consequência da visão tradicional organicista da incapacidade da deficiência.

Assim, fez-se necessário ressaltar que o homem é compreendido enquanto um ser

social, o qual é determinado e capaz de determinantes alterações no meio em que

vive.

O trabalho no PDE foi desenvolvido a partir da sistematização da

fundamentação teórica, do planejamento e da aplicação ou intervenção, por meio de

curso de formação junto aos professores. O mesmo propõe-se a discutir e debater

as concepções e formas de tratamento historicamente postas às pessoas com

deficiência visual, os processos de ensino-aprendizagem, a fundamentação teórica

da Psicologia Histórica- Cultural na teoria vigotskiana, além da definição de

deficiência visual e como se relacionar com a pessoa com deficiência visual.

A efetivação da intervenção junto aos cursistas ocorreu prioritariamente para

a prática de intervenção pedagógica e o aprofundamento de conhecimentos teóricos

sobre concepções de Vigotski. Os cursos ocorreram com a participação dos

professores, pedagogos, diretores, agente educacional I e II, estagiários das

universidades e outros da comunidade escolar, e tinham como objetivo central o

reconhecimento e a valorização da diversidade como características inerentes a

cada pessoa e/ou grupo social. Os encontros ocorreram no colégio, onde os

conteúdos elencados foram trabalhados com slides, explicação teórica, debates,

troca de experiência, apresentação de materiais, dinâmicas, vídeos e também a

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participação de um profissional da área em cada encontro com uma fala sobre o

conteúdo trabalhado.

Como a Secretaria de Educação no Estado do Paraná, citada nos

documentos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (BRASIL, 1996), vem

trabalhando em uma concepção histórico-cultural de homem e de educação, é

necessário que haja suporte teórico-metodológico pautado nesses mesmos

fundamentos, a fim de que se busquem novos métodos, estratégias e recursos que

favoreçam a relação interpessoal. O objetivo é que se contribua com a melhoria das

condições de educação para a pessoa com deficiência visual em consequência de

terem asseguradas as necessidades educacionais específicas. A pessoa com

deficiência também precisa se relacionar com todos no ambiente escolar e ter

participação efetiva na escola e na sociedade.

Atender às necessidades especiais desses alunos supõe-se, portanto,

contribuir para a mudança da concepção na escola, a adequação do espaço físico,

da escola aos conteúdos curriculares e à dinâmica das relações humanas presentes

no ambiente educacional, o qual promove desenvolvimento cognitivo, social e

educacional pelo processo de ensino e aprendizagem de conhecimentos científicos.

2 Relação Interpessoal na Perspectiva Vigotskiana

No Brasil, a educação das pessoas cegas também passou pelas fases

históricas apontadas por Vigotski, cujo início foi no período imperial. Passou por

diversas modificações e reestruturações e, na atualidade, está pautada na Política

Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, que prevê

alternativas de atendimento educacional e prioriza a inclusão3 escolar. Dentre as

alternativas, destacamos: classe comum com apoio de serviços especializados, sala

de recursos na rede regular de ensino, ensino itinerante, classe especial na rede

3 Para efeito deste artigo, compreende-se como “inclusão” a necessidade de prover o acesso à (...).

Por exemplo: a questão da inclusão educacional refere-se à necessidade de assegurar as condições educacionais específicas para o aluno que necessita deste serviço, objetivando acesso ao conhecimento científico em sala de aula e à superação das barreiras atitudinais. Por outro lado, a inclusão escolar, além da necessidade de assegurar estas especificidades, apresenta também as questões de superar as barreiras físicas.

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regular de ensino, escola ou centro de educação especial, classe hospitalar,

atendimento domiciliar e ainda conta com o Centro de Apoio Pedagógico para

Atendimento às Pessoas com Deficiência Visual – CAP.

Já no Estado do Paraná, salvo algumas exceções de algumas escolas criadas

recentemente denominadas de Educação Básica na Modalidade de Educação 11

Especial4, como: Escola Professor Osny Macedo Saldanha - Ensino Fundamental,

na Modalidade Educação Especial Curitiba; Escola Professora Julita - Ensino

Fundamental, na Modalidade Educação Especial - Guarapuava; Escola Professor

Carlos Neufert - Ensino Fundamental, na Modalidade Educação Especial -

Jacarezinho; Escola Chico Xavier - Ensino Fundamental, na Modalidade Educação

Especial - Londrina; Escola Professor Orlando Chaves - Educação Infantil e Ensino

Fundamental, na Modalidade Educação Especial – Curitiba e Escola Hermann

Gorgen - Ensino Fundamental, na Modalidade Educação Especial – Curitiba5, o

aluno com deficiência visual, cego e com baixa visão, frequenta a rede regular de

ensino e pode ter o apoio em Salas de Recursos Multifuncionais por meio do

Atendimento Educacional Especializado – AEE, nos Centros de Atendimentos

Especializados à Deficiência Visual – CAEDVs. Como já referenciado, contam

também com os serviços de cinco Centros de Apoio Pedagógico para Atendimento à

Pessoa com Deficiência Visual – CAPs, que produzem materiais em Braille e

contribuem para formação de seus professores, dentre outros serviços oferecidos.

Tendo como base os estudos realizados pelos pesquisadores Carvalho,

Rocha e Silva (2006, p.15-17), podemos constatar que a educação das pessoas

cegas passou por um processo idêntico ao das outras deficiências. De acordo com o

período, as crenças, as concepções, os conceitos foram modificados.

Na Idade Média, entre os Séculos V – XV, com o advento do Cristianismo, as

pessoas com deficiência6 passaram a ser alvo de proteção, caridade e compaixão.

Ao mesmo tempo, há uma tentativa de se explicar a deficiência ou pela expiação de

4 O Estado do Paraná sempre teve o atendimento da pessoa com deficiência visual no Ensino

Regular, exceto os alunos cegos matriculados no Instituto Paranaense de Cegos, que foi fundado em 1939, sendo a escola especial institucionalizada em 1940. Mais recentemente, nos ajustes da política de inclusão, o Estado transformou instituições de educação especial em Escolas de Educação Básica na Modalidade de Educação Especial, a princípio na área intelectual e mais recentemente na área visual. 5 Dados fornecidos por e-mail pelo Departamento de Educação Especial e Inclusão – DEEIN.

6 Sassaki (2003, IN: SILVA, 2013, p. 24) informa que, após 1981, as nomenclaturas começaram a

sofrer mudanças e passou-se a utilizar expressões tais como “deficiente” e “pessoa deficiente”. A partir de meados de 1990, os documentos oficiais e a sociedade civil começaram a usar o termo “pessoa com deficiência”.

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pecados ou como um passaporte para o reino dos céus. Surgem, naquele período,

com o objetivo de dar assistência e proteção às pessoas com deficiência, as

primeiras instituições asilares (BRASIL, 2001, p. 24.).

Mais tarde, na Idade Moderna, Séculos XV-XVIII, com a evolução da ciência,

surgem as primeiras iniciativas de se tentar educar as pessoas com deficiência sob

o enfoque no sistema orgânico. Essa perspectiva estava centrada na capacidade da

percepção visual, auditiva e as deficiências físicas. Nessa lógica, por muito tempo, a

educação trabalhou com a surdez tentando fazer com que os surdos falassem, e

assim a apropriação do conhecimento foi secundarizada para o mesmo.

Em relação aos cegos, as iniciativas que se tem conhecimento datam do

Século XVI, com o médico italiano Girolínia Cardono, o qual descobriu que o tato era

a via de aprendizado da leitura para essas pessoas. No século XVIII, Valentin Haüy

desenvolveu um método educacional para os cegos, um sistema de letras em relevo

que possibilitava que fossem alfabetizadas, mas apenas tendo acesso à leitura, pois

esse sistema não possibilitava a escrita. Em 1784, Haüy inaugurou, em Paris, a

primeira escola para cegos - Instituto Real dos Jovens Cegos - onde aplicou seu

método. A descoberta de Haüy seguiu como proposta educacional até 1825 quando

o Sistema Braille foi oficialmente reconhecido como forma de leitura e escrita para

as pessoas com deficiência visual (BRASIL, 2001; SILVA, 1987).

No Brasil, a história da educação dos cegos ganhou força com José Álvares

de Azevedo, quando retornou de Paris. Jovem cego que estudou no Instituto dos

Meninos Cegos de Paris e que, ao retornar, ensinou o Sistema Braille à filha de um

médico da corte, Adele. A menina foi levada à presença do imperador D. Pedro II por

Dr. Sigaud e pelo Barão do Bom Retiro. Após esse fato, ocorreu a criação de uma

escola para cegos no Brasil, o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, em 17 de

setembro 1854, primeira escola para atendimento aos cegos na América Latina, hoje

Instituto Benjamin Constant (BRASIL, 2001).

Sobre a criação deste instituto, Jannuzzi (2006, p. 20-21) destaca que em

1874 eram atendidos 35 alunos cegos em um universo, em 1872, de 15.848 cegos

no País. Para essa pesquisadora, em uma sociedade agrária e iletrada, à época,

provavelmente o objetivo de se educar uma minoria de cegos foi motivado por

interesses políticos e particulares, inclusive vínculos familiares ligados à corte. Ainda

sobre o processo histórico da pessoa cega, SIERRA destaca como Vigotski

descreveu esse período:

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Por meio de uma retrospectiva histórica, Vigotski mostrou como se deu a passagem da visão popular para outra concepção acerca dessa temática que, na Antiguidade e na Idade Média, era sustentada por fundamentos religiosos e não pela experiência dos próprios cegos. Estes eram vistos com certo misticismo; a cegueira poderia ser um grande infortúnio, um castigo dos céus ou até mesmo uma dádiva divina. Existiam sentimentos contraditórios sobre essas pessoas: ou eram temidos ou endeusados; muitos consideravam os cegos, pessoas iluminadas, sábias, pois acreditavam que tinham uma vida interior mais rica. Do misticismo da Antiguidade e da Idade Média, constitui-se, com a Idade Moderna, a visão biológica e mais tarde a sócio psicológica, que abre a possibilidade à experiência e ao conhecimento (SIERRA, 2005, p. 41).

De acordo com Vigotski, o desenvolvimento da pessoa com deficiência estava

fundamentado com outros pressupostos teóricos que não estavam centrados no

aspecto biológico. Com essa nova perspectiva educacional, ocorreu um marco

importante na vida das pessoas cegas. Essa teoria possibilitou maior compreensão

do desenvolvimento dos processos psicológicos superiores, a qual explicita as

potencialidades desses, cujas possibilidades são como as de qualquer pessoa no

que tange à capacidade de se apropriar do conhecimento científico, da vida social,

da cultura. Esse pode, portanto, tornar-se uma pessoa produtiva e participativa, de

pleno valor no aspecto social.

É esse acesso à cultura, ao conhecimento que pretendo que se materialize.

Consciente de que isso ocorrerá somente pelo acesso à educação da pessoa com

deficiência visual, pela compreensão da pessoa sem deficiência, do que essa

condição humana e como devem se relacionar com elas. A escola de Vigotski

procurou trazer a compreensão de como os indivíduos com algum ‘defeito’ e/ou

deficiência se desenvolvem, e Barroco lembra-nos da Escola de Vigotski e afirma:

[...]

olho para a Escola de Vigotski não como uma possibilidade de reedição, mas como recurso para compreender os caminhos tomados na defesa do atendimento educacional aos indivíduos que se desenvolvem, porém com percursos diferentes da grande maioria. Entendo, assim, que é preciso tomar emprestado dessa escola psicológica soviética o espírito de lucidez presente na teorização e proposição prático-metodológica (BARROCO, 2007, p. 21).

Vigotski nos auxilia na compreensão do processo de transformar um sujeito

natural em sujeito social. Em se tratando de pessoas cegas, ele explica o

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desenvolvimento das potencialidades deste sujeito, não pela debilidade ou defeito,

mas pela psicologia do cego e por explicar como os homens formam a sua conduta

propriamente humana. E que essa transformação ocorre pela mediação da atividade

levando-o à apropriação de conhecimentos tácitos e científicos.

Vigotski (1997) não se contentou com as explicações dadas até então sobre a

cegueira. Foi além e tentou compreender o significado social e individual que a

cegueira pode causar como também a forma dessas pessoas viverem sem o sentido

da visão. Para ele, a psicologia do cego está dirigida à superação do defeito por

meio de sua compensação social, com o auxílio do conhecimento das pessoas mais

experientes. A linguagem é o principal instrumento de comunicação, e é pela palavra

que a cegueira é vencida, no sentido de apropriação de informações, conhecimento

científico e interação social, ou seja, nas palavras de Vigotski, “a palavra vence a

cegueira”. Ainda sobre a cegueira, esse teórico afirma:

Cegueira não é apenas a falta da visão, meramente a ausência da visão (o defeito de um órgão específico), senão que assim mesmo provoca uma grande reorganização de todas as forças do organismo e da personalidade. A cegueira, ao criar uma formação peculiar de personalidade, reanima novas forças, altera as direções normais das funções e, de uma forma criadora e orgânica, refaz e forma a psique da pessoa. Portanto, a cegueira não é somente um defeito, uma debilidade, senão também, em certo sentido, uma fonte de manifestação das capacidades, uma força (por estranho e paradoxal que seja!) (VIGOTSKI, 1997, p. 74)

7.

Segundo esse pesquisador russo, o defeito por si só não decide o destino da

personalidade, senão as consequências sociais e sua relação sócio psicológica.

Segundo a abordagem psicológica, a deficiência não é vista como defeito e/ou

limitação, mas como fonte geradora de energia motriz, a qual pode levar a

constituição de uma superestrutura psíquica capaz de reorganizar toda vida da

pessoa, tornando-a alguém de plena valia social.

Se algum órgão, devido à deficiência morfológica ou funcional, não consegue cumprir inteiramente seu trabalho, então o sistema nervoso central e o aparato psíquico assumem a tarefa de compensar o funcionamento insuficiente do órgão, criando sobre este ou sobre a função

7 A referência de Vigotski (1997) é da tradução do grupo de estudos Educação da Pessoa com

Deficiência em Vigotski/Unioeste/PEE, da obra de VIGOTSKI, L. S. Fundamentos de Defectologia. Tomo V. Obras completas. Havana: Editorial Pueblo y Educación, 1997.

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uma superestrutura psíquica que tende a garantir o organismo no ponto fraco ameaçado (VIGOTSKI, 1997, p. 77).

Os limites impostos e os conflitos gerados pelo defeito e as necessidades que

advêm da falta de um dos sentidos, no caso em questão a visão, geram o

desenvolvimento pelas vias sociais graças à participação da pessoa com deficiência

na sociedade ou comunidade, na qual está inserida, pois de acordo com Vigotski,

[...] este conflito origina grandes possibilidades e estímulos para a supercompensação. O defeito se converte, desta maneira, no ponto de partida e na força motriz principal do desenvolvimento psíquico da personalidade. Se a luta conclui com a vitória para o organismo, então não somente vencem as dificuldades originadas pelo defeito, senão se eleva em seu próprio desenvolvimento a um nível superior criando do defeito uma capacidade (VIGOTSKI, 1997, p. 77-78).

Assim, a deficiência deixa de ser um empecilho para o processo de

aprendizagem e desenvolvimento da pessoa que a possui, para tornar-se a sua

força impulsionadora. Para tanto, a educação da criança com diferentes defeitos não

pode ser mantida em ambiente segregado, dentro de espaços limitadores, que

reforçam o defeito e não geram a força motriz para a compensação, a superação e o

processo da supercompensação. É preciso educar a criança com defeito em

sociedade e para a sociedade. Cabe a essa educação, de acordo com Vigotski, [...]

[...] não atenuar as dificuldades que surgem do defeito, mas tencionar todas as forças para sua compensação, apresentar somente as tarefas e em uma ordem que respondam ao caráter gradual do processo de formação de toda a personalidade sob um novo ponto de vista (VIGOTSKI, 1997, p. 46).

É importante para o cego que, durante sua formação, esse possa desenvolver

funções que superem o defeito, e busque soluções e formas favoráveis para o pleno

desenvolvimento do mesmo como meios para vencer o isolamento e a superação da

limitação, do defeito do organismo. A partir de uma mediação eficiente transforma-se

a debilidade em força motriz para o desenvolvimento.

A compreensão incorreta da psicologia do defeito talvez tenha sido uma das

causas do fracasso da educação tradicional dos cegos. A validez social é um ponto

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importante e, segundo esse autor soviético, é o objetivo maior da educação, já que

todos os processos da supercompensação estão dirigidos à conquista da posição

social. Na realidade, são questões de desenvolvimento prático da pedagogia, a qual

depende de muitos fatores, pois as potencialidades desenvolvidas no processo

educacional, informal ou formal, tanto nas crianças normais quanto nas cegas. W.

Stern (apud VIGOTSKI, 1997, p. 145) afirma que “o que não destrói a pessoa serve

para torná-la forte”; que de uma debilidade ou defeito surge a força e que também

das insuficiências as capacidades.

Apresentamos até o momento alguns apontamentos teóricos assentados em

Vigotski por considerar importante a forma de como este pesquisador encaminhou e

defendeu o processo educacional da pessoa cega. Esse demonstrou o quanto a

cegueira não é impedimento para que o cego aprenda e se desenvolva como as

demais pessoas. Também trouxemos informações de como é realizado o

atendimento da pessoa com deficiência visual no Brasil e no Estado do Paraná. E

para dar maior sustentação teórica, também lembramos Heller (1972), pesquisadora

que apesar de não tratar especificamente da educação de cegos, segue na mesma

direção de Vigotski e Barroco, quanto à defesa do pleno desenvolvimento de todos.

Esse respaldo teórico permite-me defender a importância de as pessoas

compreenderem a especificidade da cegueira e de como se relacionar com pessoas

com deficiência visual.

2.1 Deficiência visual

Após uma breve reflexão sobre as questões do desenvolvimento do cego na

perspectiva Vigotskiana e de como pesquisadores da escola soviética compreendem

a educação das pessoas com e sem deficiência, constatou-se a necessidade de se

trabalhar o conceito sobre o que venha a ser a deficiência visual. Masi (2002), na

introdução de um material elaborado para o “Programa Nacional de Apoio à

Educação de Deficientes Visuais”, refere-se à deficiência como qualquer perda ou

anormalidade da estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica, que pode

resultar uma limitação ou incapacidade no desempenho normal de determinada

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atividade que, dependendo de idade, sexo, fatores sociais e culturais, pode se

constituir em uma deficiência. Conforme a autora [...],

[...] uma doença ou trauma na estrutura e funcionamento do sistema visual

pode provocar no indivíduo a incapacidade de ‟ver ou de ver bem”, acarretando limitações ou impedimentos quanto à aquisição de conceitos, acesso direto à palavra escrita, à orientação e mobilidade independente, à interação social e ao controle do ambiente, o que poderá trazer atrasos no desenvolvimento normal (MASI, 2002, p. 7).

Ainda de acordo com Masi (2002, p. 7), a criança com deficiência visual

necessitará de apoio seja de professores especializados, de adaptações curriculares

e/ou materiais adicionais de ensino, para que alcance um nível de desenvolvimento

proporcional às suas capacidades.

Quando alguém se refere à área da deficiência visual, faz-se necessário

esclarecer que essa é dividida em dois grupos: o das pessoas cegas e o das

pessoas com baixa visão e que ainda, de acordo com documentos pesquisados, há

uma classificação clínica e uma educacional.

A Escala Optométrica Decimal de Snellen permite que tenhamos uma noção

da condição visual tanto das pessoas cegas quanto das pessoas com baixa visão, o

quanto a pessoa enxerga e o que ela enxerga. Por isso, para a realização do

trabalho com os alunos com deficiência visual, é importante que o professor tenha o

laudo com a classificação clínica, médica, para se informar da condição visual de

seu aluno. Todavia, ele não irá centrar-se na acuidade visual da pessoa, mas dará

ênfase às potencialidades do aluno, no que ele pode vir a fazer. Sua intervenção

pedagógica será norteada para que o aluno desenvolva habilidades em variadas

atividades cotidianas, como orientação e mobilidade, em sua vida acadêmica e

outras. Portanto, as classificações se complementam para auxiliar o trabalho do

professor.

2.2 Materiais ópticos e não ópticos e o uso da tecnologia para alunos cegos e

de baixa visão

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Trabalhar com alunos com deficiência visual já não é caso de desespero

sobre o quê, e como trabalhar, pois o professor tem acesso aos instrumentos

ópticos, que são equipamentos construídos para auxiliar a visualização do que seria

difícil ou impossível de enxergar sem eles. Isso envolve o trabalho do professor de

apoio, especializado na área visual para adaptação de material e também algumas

observações necessárias de acordo com necessidades específicas tais como:

diferenças individuais, faixa etária, interesses e habilidades que vão determinar os

tipos de adaptações e procedimentos adequados.

Os recursos ópticos são lentes ou recursos que possibilitam a ampliação de

imagens e a visualização de objetos que favorecem o uso da visão residual para

longe e para perto. São lupas de mão e de apoio, óculos bifocais ou monoculares e

telescópios, que não devem ser confundidos com óculos comuns. Eles deverão ser

específicos para cada pessoa. A prescrição é da competência do oftalmologista, que

definirá quais os objetos mais adequados à condição visual do aluno.

Os auxílios ópticos para perto são: óculos com lentes especiais, lupas

manuais ou de apoio que possibilitam o aumento do material de leitura. Para longe,

o sistema telescópio, que favorece a visualização de pessoas ou de objetos

distantes e podem ser monoculares ou binoculares.

Os recursos não ópticos são conseguidos a partir de pequenas modificações

das condições ambientais, nas quais o aluno se encontra. Por outro lado, o

desempenho visual e as condições do educando podem melhorar seu

funcionamento visual de acordo com adaptações simples e específicas.

Atualmente, são necessários muitos recursos tecnológicos disponíveis que

facilitem as atividades para o professor e o aluno, os quais possibilitam a

comunicação e o acesso ao conhecimento. A Tecnologia Assistiva, conforme

conceito proposto pelo Comitê de Ajudas Técnicas (CAT) da Secretaria de Direitos

Humanos da Presidência da República,

é uma área do conhecimento, de característica interdisciplinar, que engloba produtos, recursos, metodologias, estratégias, práticas e serviços que objetivam promover a funcionalidade, relacionada à atividade e participação de pessoas com deficiência, incapacidade ou mobilidade reduzida, visando à sua autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão social (CAT, Ata da Reunião VII, SDH/PR, 2007).

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Para o aluno de baixa acuidade visual, a informática dispõe de vários

programas que foram desenvolvidos e adequados para ele.

Programa de sintetizador de voz, como: Sistema Dosvox (direcionado para o

aluno cego), leitor de tela e o MEC DAISY. Existem também a digitação de textos, a

leitura na tela com fonte ampliada, a visualização de imagens ampliadas e o uso da

internet. As tecnologias assistivas disponíveis podem ser consideradas um meio de

inclusão e proporcionam à pessoa com deficiência visual mais qualidade na

aprendizagem.

2.3 Comunicação e relação interpessoal do aluno com deficiência visual no

ambiente escolar na perspectiva Vigotskiana

Para nos relacionarmos bem com as pessoas, precisamos saber como

comunicar claramente nossos pensamentos e objetivos, dando espaço para a

interação e troca de saberes. O ponto de partida no ensino de como se relacionar

com a pessoa com deficiência visual deve ser o entendimento de que existe uma

diferença fundamental entre esta aptidão nos seres humanos e nos demais seres

vivos que se movem. Enquanto os primeiros se orientam e se movem a partir do

processo de apropriação do legado histórico da humanidade, os últimos o fazem

através do processo de adaptação ao mundo em que vivem.

A diferença entre o processo de adaptação, no sentido em que este termo é empregado para os animais, e o processo de apropriação é a seguinte: a adaptação biológica é um processo de modificação das faculdades e caracteres específicos do sujeito e do seu comportamento inato, modificação provocada pelas exigências do meio. A apropriação é um processo que tem por resultado a reprodução pelo indivíduo de caracteres, faculdades e modos de comportamento humanos formados historicamente. Por outros termos, é o processo graças ao qual se produz na criança o que, no animal, é devido à hereditariedade: a transmissão ao indivíduo das aquisições do desenvolvimento da espécie (LEONTIEV, 1978, p. 320).

Mediante o supramencionado, o homem se desenvolve frente à apropriação

de conhecimentos e cultura do mundo circundante; dentre esses estão pessoas

cegas e com baixa visão. Na relação da pessoa com deficiência visual, a orientação

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de como se relacionar com o vidente deve ser compreendida como sendo o

processo que envolve uma reorganização psíquica e, como consequência, dos

sentidos remanescentes bem como de possíveis resíduos visuais, que permitam ao

indivíduo estabelecer sua posição no meio em que vive e se relacionar de forma

satisfatória com o mesmo. Ela deve ser entendida como um processo amplo e

flexível, composto por um conjunto de capacidades motoras, cognitivas, afetivas,

sociais e por um elenco de técnicas, tais como: OM – Orientação e Mobilidade,

AVAS – Atividades de Vida Autônoma e Social, apropriadas e específicas que

permitem à pessoa com deficiência visual conhecer, relacionar-se e deslocar-se de

forma independente a satisfazer suas necessidades sociais.

Na educação de pessoas com deficiência, assim como na de qualquer outro

educando, é necessário que o educador compreenda as condições sociais e

econômicas de vida daquele, as pessoas com quem o mesmo interage, a qualidade

das interações e as situações de aprendizagem que já conheceu. "É importante

conhecer não só o defeito que tem afetado uma criança, mas que criança tem tal

defeito” (VIGOTSKI, 1995, p. 104).

O ensino da relação interpessoal da pessoa cega com a pessoa que enxerga

é de suma importância tanto no ambiente escolar como em qualquer outro espaço

seja ele familiar ou social. O tabu até aqui mantido pela maioria das pessoas que

enxergam é o de que a pessoa com deficiência visual deve permanecer sempre

limitada a um espaço físico seguro, livre de qualquer possibilidade de arranhões,

quedas, tropeços, batidas ou qualquer outro risco. Elas esquecem que esse é o dia-

a-dia da pessoa com ou sem comprometimento visual que brinca, trabalha, explora o

ambiente, se conhece e se reconhece nas atividades. A maioria das famílias das

pessoas com deficiência visual fica muito preocupada em dar condição para que as

mesmas se locomovam sozinhas. Por conseguinte, não lhes deixam desenvolver

determinadas atividades e lhes tiram a condição de conhecer, por si, outros

ambientes e outras atividades. Assim, surge a superproteção por parte daqueles

com quem convivem e com isso, elas crescem com medo do mundo e tornam-se

pessoas receosas, passivas e sem iniciativa, consequentemente isso dificultará o

pleno desenvolvimento, de uma forma ou de outra, de cada um desses indivíduos.

Em se tratando da relação interpessoal da pessoa com deficiência visual no

convívio com professores e equipe técnica da escola, essa interação é de grande

importância, pois na maioria das vezes é no ambiente escolar que a pessoa com

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deficiência vai expandir suas relações sociais. São criados novos vínculos e a partir

deste contato haverá possibilidades de construirmos com elas regras a serem

seguidas, discutidas e respeitadas igualmente por todos, pois tanto para a pessoa

cega como para aquela que enxerga, a compreensão e a assimilação das regras de

convivência são fundamentais.

Vale lembrar, porém que, nas relações humanas, as situações de ‘inclusão’

social trazem efeitos diferentes a cada um que as vivencia; daí ser igualmente

importante considerar o que as discussões teóricas têm trazido para a melhor

compreensão das peculiaridades de que se revestem e suas implicações na vida de

todos.

3 Implementação da Unidade Didática na Escola

A produção didático-pedagógica implementada com o título Pessoa com

Deficiência Visual: relações interpessoais no ambiente escolar, apresentadas na

forma Unidade Didática foi realizada no Colégio Estadual Júlia Wanderley, localizado

na cidade de Cascavel. É de fácil acesso à rede de transporte urbano, portanto,

facilita a participação dos alunos na escola. Não somente daqueles matriculados no

ensino regular do colégio, mas também dos colégios de bairros vizinhos. A

intervenção pedagógica proposta foi executada no 1° semestre de 2014, dividida em

três encontros, com a participação de professores, direção, pedagogos, agentes

educacionais I e II. Abrange toda a equipe técnica da escola bem como estagiários

do último ano de Letras da FAG – Faculdade Assis Gurgacz e coordenadores de

catequese da Igreja Católica da Diocese de Cascavel.

O trabalho foi enfatizado na concepção histórico-cultural Vigotskiana, por

ser, atualmente, aquela que mais explica o fenômeno da deficiência visual e por

entender que seu aspecto principal é de natureza social, condicionado por fatores

sociais, políticos, econômicos e culturais. Toma o defeito como elemento importante

no processo de compensação e pode converter-se, desta maneira, no ponto de

partida e na força motriz principal do desenvolvimento psíquico da personalidade,

pois deixa de lado a ideia de que a deficiência é um obstáculo intransponível.

Ao abordar este assunto, com os textos reflexivos sobre o processo histórico

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da cegueira, concepções e tratamentos, podem-se perceber indignação e reação

dos participantes, tanto referente à implementação na escola quanto aos cursistas

do GTR. A alegação é a de que as escolas ainda não estão preparadas para receber

a pessoa com deficiência visual. Assim, a aceitação passa a ser uma das grandes

dificuldades que essa pessoa encontra ao chegar ao âmbito escolar. Por isso, o

trabalho da inclusão deve ser realizado com toda a comunidade escolar, pois

oportuniza e oferece formação acessível para que o aluno sinta-se acolhido, já que

ele só terá sucesso na integração escolar com a ajuda e participação efetiva da

família, do envolvimento e compromisso de professores qualificados.

Outro elemento importantíssimo estudado foi sobre o quê vem a ser a

deficiência visual. O objetivo é esclarecer aos participantes a sua classificação na

cegueira e na baixa visão tanto na área clínica como na educacional.

Salientamos que essa limitação na capacidade de apropriação do

conhecimento em relação à pessoa cega e de baixa visão pode ocorrer quando as

condições educacionais específicas desse alunado não são atendidas ou

asseguradas e que a criança com deficiência visual é aquela que irá necessitar de

apoio de professores especializados e adaptações. Os cursistas comentaram sobre

a importância da aplicação do teste do snellen nas escolas logo no início do ano,

para que assim, não pecam sobre o aprendizado do aluno. Pois, muitas vezes, tais

alunos são avaliados por déficit de atenção, desinteresse, dentre outros fatos e, na

verdade, o problema poderá ser a questão visual.

Na sequência da implementação deste projeto outro tema estudado tratou

dos recursos disponíveis aos alunos cegos e de baixa visão: os materiais ópticos e

não ópticos e o uso da tecnologia. A importância desses instrumentos construídos

para auxiliar a visualização do que seria difícil ou impossível de enxergar sem eles.

Isso envolve o trabalho do professor de apoio especializado na área visual para

adaptação de material e também algumas observações necessárias de acordo com

necessidades específicas tais como: diferenças individuais, faixa etária, interesses e

habilidades que vão determinar os tipos de adaptações e procedimentos adequados.

Atualmente, os recursos tecnológicos disponíveis facilitam as atividades para

o professor e o aluno porque possibilitam a comunicação e o acesso ao

conhecimento. Houve grande interesse e participação quanto a este assunto e

muitos desconheciam tais materiais e não sabiam como utilizá-los. Assim, foi

possível compreender que a pessoa com deficiência visual pode ser integrada

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dentro do convívio escolar e mesmo com limitações poder aprender e fazer tanto

quanto a pessoa que enxerga.

Como parte principal desta implementação, foram trabalhadas a

comunicação e a relação interpessoal do aluno com deficiência visual no ambiente

escolar em que se percebe que, para nos relacionarmos bem com as pessoas

precisamos saber como comunicar claramente nossos pensamentos e objetivos. É

preciso dar espaço para a interação e a troca de saberes e que o ponto de partida

deve ser o entendimento de que existe uma diferença fundamental entre esta

aptidão nos seres humanos e nos demais seres vivos que se movem. Enquanto os

primeiros se orientam e se movem a partir do processo de apropriação do legado

histórico da humanidade, os últimos o fazem através do processo de adaptação ao

mundo em que vivem.

Em se tratando da relação interpessoal da pessoa com deficiência visual no

convívio com professores e a equipe técnica da escola, tal interação é de grande

importância, pois, na maioria das vezes, é no ambiente escolar que a pessoa com

deficiência vai expandir suas relações sociais. Ela cria novos vínculos onde, a partir

deste contato, haverá possibilidades de construirmos com elas regras a serem

seguidas, discutidas e respeitadas igualmente por todos, pois tanto para a pessoa

cega, como para a que enxerga, a compreensão e a assimilação das regras de

convivência são fundamentais. Houve troca de experiências e fatos vivenciados no

dia a dia sobre este assunto, algumas práticas de como se relacionar com a pessoa

cega seja no convívio escolar ou em qualquer outro lugar. Foram tiradas dúvidas

diretamente com o professor convidado para o encontro, o qual é uma pessoa cega.

Assim, pôde-se ter maior clareza de como saber se relacionar com a pessoa com

deficiência visual.

Os resultados dessa intervenção foram registrados em comentários

apresentados pelos professores participantes. De modo geral, o aproveitamento foi

avaliado como muito bom. Foi indicada a necessidade de realização de outros

momentos pelo grupo como o propiciado por estes encontros do PDE. Também

foram levantadas sugestões de continuidade de eventos como esse; dentre eles, a

possibilidade de que se ampliasse para outras escolas e outros profissionais este

tipo de trabalho, aprimoramento dos estudos de caso trazidos da realidade de cada

participante e a elaboração de planejamentos, programas de atividades e materiais

mais adequados às necessidades de cada um. São importantes também a

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preparação mais consistente e o acompanhamento do processo de inclusão na

busca por resultados mais significativos. Concluiu-se, portanto, que o professor

precisa ser mediador, conhecer seu aluno para encorajá-lo a refletir sobre suas

ações e, assim, construir e reconstruir seus conhecimentos em interação com o

meio.

4 Considerações Finais

Nesta reflexão sobre a relação interpessoal da pessoa com deficiência no

convívio escolar, o presente trabalho buscou possibilitar a compreensão mais ampla

acerca da formação de docentes e de toda a equipe técnica da escola.

Considerando que conjugar teoria e prática, fundamentadas dentro de uma

perspectiva histórico-crítica, possa contribuir de modo significativo para que cada

educador consiga, a princípio, redimensionar seu conhecimento e sua práxis, a fim

de, consequentemente, dimensionar e superar as dificuldades e contradições

detectadas no processo de implementação da inclusão educacional.

O emprego da tecnologia, as conferências e a disponibilização dos recursos

utilizados para sua divulgação, os trabalhos do Grupo de Trabalho em Rede/GTR e

a intervenção realizada junto aos professores em sua realidade de ação tornaram

viável a socialização do conhecimento deste trabalho. Foram também consideradas

as possibilidades de debates e trocas entre grupos diversificados. Esperamos que

com os estudos desenvolvidos na implementação do PDE, dentro da perspectiva

Vigotskiana, os professores utilizem instrumentos mediadores diferenciados para

levar o aluno a se apropriar dos conhecimentos escolares, contribuindo para a

prática, assim como para a atuação de outros profissionais da educação no

processo ensino aprendizagem.

6 Referências

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