Os Druídas Sacerdotes – Xamãs dos Celtas

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  • 8/7/2019 Os Drudas Sacerdotes Xams dos Celtas

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    "Os Drudas", SacerdotesXams dos CeltasPor Alan Impelliceri - Diretor de Nova Acrpole na Irlanda

    Muitas das informaes que temos sobre os druidas vieram dos gregos e romanos. Estesficaram profundamente impressionados, de modo favorvel e ao mesmo tempo desfavorvel,por seu dramtico sacerdcio. Seu prprio e original nome, druwides, quer dizer "os quevem mais alm", denominao que poderia aludir a vises profticas, a uma qualidadeclarividente, ou mais antiga "viso xamnica durante o vo".

    Conta-se que o Rei Ailill, da Bretanha, enviou o seu druida Mac Roth para averiguar ondeestavam se reunindo os exrcitos do Ulster (Irlanda) e que Mac Roth voou sobre eles eobservou seus movimentos sobre uma grande rea do terreno.Entretanto, para uma comprovao mais convencional de suas misses, devemos nos referirao irmo de Csar e s notcias que deu a seus compatriotas: "Os druidas realizam culto aosseus Deuses, regulam os sacrifcios pblicos e privados e editam normas sobre todas asquestes religiosas. Muitos jovens vo at eles em busca de instruo. So mantidos comgrande honra pelo povo e atuam como juzes praticamente em todos os conflitos, seja entretribos ou entre indivduos; quando se comete algum crime, ao ocorrer um assassinato ou aosurgir uma disputa por herana ou fronteira, so eles que opinam sobre o assunto eassinalam a compensao."

    Cr-se que a doutrina druida surgiu na Bretanha e, a partir desta, foi introduzida na Glia.Ainda hoje, aqueles que querem fazer um estudo profundo sobre o tema geralmente vo ata Bretanha.Os druidas estavam dispensados do servio militar e no pagavam impostos como os outroscidados. Naturalmente, esses importantes privilgios eram muito atraentes; muitos seapresentavam voluntariamente para estudar esta cincia, e outros eram enviados por seuspais e familiares.

    Dizem que os alunos deviam memorizar um grande nmero de versos, tanto que alguns

    levavam at vinte anos de estudos. Uma lio que lhes exigia um verdadeiro esforo deassimilao era a noo de que a alma no perece, mas que, depois da morte, passa a umoutro corpo; os druidas pensavam que esse era o melhor incentivo para o valor, porqueensina o homem a no temer a morte. Mantinham longas discusses sobre os corposcelestes e seus movimentos, o tamanho do Universo e da Terra, a constituio fsica domundo e o poder e as caractersticas dos deuses; os jovens eram instrudos em todas essasmatrias.O grego Diodoro Sculo considerava-os grandes filsofos no que se refere a assuntos dereligio, e Plnio escreve que eles eram "adivinhos e fsicos", parte de um grupo mais amploa que denominava "magos".

    Os druidas eram versados em todos os estudos e tinham o dom da profecia; eram mestresde feitiaria e de magia e podiam produzir brumas misteriosas, mudar de aparncia e fazer

    outros encantamentos quando fosse necessrio. Tambm podiam impor o geis, uma espciede tabu mgico que era, ao mesmo tempo, uma ordem e uma proibio, e no podia sertransgredido sem se incorrer em pena de morte ou em desonra.Ward Rutherford, em seu livro Los Druidas, adverte que eles no eram sacerdotes ordinriose acredita que a pessoa que os romanos tomaram como um sacerdote seria mesmo umchefe local, que s vezes era considerado DeusReiSacerdote. Se est certo esse autor eos druidas no eram meros sacerdotes, ento estamos diante de uma tradioextraordinria, que perdurou durante vrios milnios, de xams-sacerdotes-magos, umgrupo de homens que vagavam livremente sem que fossem impedidos por quaisquer limitestribais.

    Possuam conhecimentos de Cincia, Matemtica, Botnica, Medicina e Astronomia; eramencarregados da nomeao dos reis (o rei velho era, com freqncia, morto ritualmente

    antes que fosse eleito um novo); faziam sacrifcios rituais; ensinavam oralmente umadoutrina secreta, bem como conhecimentos tradicionais, terminantemente proibidos deserem escritos. Possuam um poder misterioso que o grego Larcio compara com os magos

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    persas, com os caldeus da Babilnia e da Assria e com as sementes do hindusmo.Rutherford assinala tambm que o termo "mgico", tal como era usado ento, designava umpossuidor de sabedoria. Os magos eram conhecidos como os "sbios", e esse aspecto dofenmeno druida o que falta freqentemente nas consideraes modernas.

    Quando Roma conquistou as Glias, no ltimo sculo antes de Cristo, o que Csar temeu

    foram os druidas e suas influncias. Acreditava na possibilidade de fracasso caso essessbios se unissem contra ele. Em conseqncia, introduziu medidas repressivas, e osdruidas foram forados a fugir para regies remotas, como Inglaterra, Irlanda e Gales, ondeno seriam incomodados.O modo de vida celta continuou na Irlanda at o sculo XVI (mesclado com o cristianismo), eexistem indcios de que alguns druidas conservaram sua influncia ao menos at o sculoXVII; acredita-se ter So Patrcio falado com um deles. Entretanto, por volta do sculo X,desapareceram para sempre.

    O XAM REDESCOBERTO

    Os druidas no surgiram de improviso. Suas origens no s estavam ligadas antiga ndia,mas tambm eram o resultado de uma vasta tradio que remonta idade da pedra ouquem sabe antes. A deidade, o homem e a terra eram sentidos como um s, o "trs em um",que viria a ser tambm um tema celta. O sentimento em relao terra penetrava por meiode foras divinas, e a unio expressa em cada folha e em cada pedra era to real para osceltas como foi para os povos mais antigos. Tambm se fez presente um certo sentido deunidade com a vida animal. De acordo com Anne Ross, escritora que trata sobre os druidasem suas obras, o famoso druida Mac Roth vestia "...a pele de um touro pardo sem chifres,um chapu de plumas de pssaros pintadas e asas, com as quais realizava um voxamnico." A partir disso, podemos estar seguros de que o xamanismo ainda estava sendopraticado, e que o touro representava o animal guardio com o qual o Xam em questo seidentificava.

    Podemos recordar aqui o papel do Xam e o seu significado. O Xam era o que trazia oconhecimento das muitas dimenses do ser. Por meio de sua "viagem" ou "vo", incutia emseus seguidores a noo de que todas as coisas tm seu ser, tanto nesta dimenso da vida

    diria como em outras, de cuja existncia no se teriam apercebido totalmente. O Xam erao exemplo vivo de algum que podia mover-se de um nvel de conscincia a outro, e suaautoridade baseava-se nesse poder.

    A identidade do Xam com um animal sagrado foi bem documentada na poca dos celtas.Em muitas histrias, o Xam convertia-se em touro, cervo, porco, lebre, pssaro ou peixe e,com essa natureza, entrava no "estado de sonhar", em que os aspectos de animal e Deusexistentes no homem se unificam e emergem em uma esfera fora do tempo. A tradio deter um animal como guardio permanecia profundamente enraizada na conscincia celta, e oheri confiava nesse poder. Isso representava sua outra dimenso, e a ajuda emanadadessa fora era, amide, uma expresso de agradecimento pelo respeito a ela manifestado.

    Os celtas tambm utilizaram a arte para representar os animais como guardies dos

    espritos. Na Bretanha, o porco era um animal popular, aparecendo nos escudos (comoprotetor) e nos penachos, e sozinho nas pequenas imagens. Na Ibria, grandes pedrasesculpidas como porcos foram colocadas dentro dos castelos fortificados. O cavalo e o touroforam animais tambm inspiradores de fortes sentimentos. Em funo do "sonho do touro"do druida, um touro branco foi sacrificado em Tara, na Irlanda, durante a escolha de um rei.Uma esttua de um touro de trs chifres foi encontrada na Maiden Castle, enquanto que naGlia cultuava-se o porco de trs chifres. Os poetas irlandeses dos primeiros temposportavam mantos xamnicos e plumas de aves para mostrar sua afinidade com algunspssaros em particular, possivelmente tomados como guardies dos espritos.

    REENCARNAO

    A crena celta na reencarnao estava implcita em sua despreocupada atitude perante a

    morte, o que constitua um ensinamento druida. Os celtas asseguravam com firmeza que amorte era uma simples pausa de uma longa vida e, conseqentemente, lhe tinham muitopouco temor, segundo o testemunho de Csar: "As almas no morrem, mas passam, depois

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    da morte fsica, de um corpo a outro; e essa crena de morte da alma, assim como o prpriotemor morte, esto, por eles mesmos, descartados, o que, asseguram, o maior incentivopara infundir valor".A doutrina celta da reencarnao est bem descrita por Taliesin, o poetaguerreiro, naBatalha dos Arboles. O mesmo assegurava ter vivido muitas e variadas vidas, seja comohumano, seja como animal, e ter presenciado a maioria dos grandes acontecimentos da

    histria da Irlanda.Assim declara:

    Eu tive muitos corposAntes de conseguir uma forma agradvelEu fui uma gota no arEu fui uma estrela brilhanteEu fui uma ponte para transporrio de trs leitosEu viajei como uma guiaEu fui um barco no mar.

    O canto de Amergin, um poeta muito antigo, parece ir na mesma linha, mas com aprofundidade ampliada de que "ele formava parte da natureza de outras coisas e de outrascriaturas, e de que isto o uniu totalmente ao Universo, em completa paz espiritual e superiorsabedoria".Eu sou o vento que sopra sobre o mar,Eu sou a onda do mar,Eu sou a profundidade do mar,Eu sou o touro das sete batalhas,Eu sou uma guia sobre a rocha,Eu sou uma lgrima do sol,Eu sou um hbil marinheiro,Eu sou valoroso como o javali,Eu sou um lago no vale,Eu sou palavra de sabedoria,Eu sou espada afiada ameaando um exrcito,

    Eu sou o Deus que ilumina a cabea,Eu sou aquele que projeta luz entre as montanhas,Eu sou aquele que antecipa as fases da lua,Eu sou aquele que ensina onde se pe o sol.

    Graves assinala que os versos mais comuns, "eu fui" ou "eu sou", tambm se referem aociclo anual e contm sries completas de smbolos para todo o ano, ainda quedeliberadamente confusos, com o objetivo de que o segredo no fosse descoberto.Entretanto, como uma s a deidade responsvel por todo o ciclo anual, podemos estarseguros de que o poetadeus quem est descrevendo a existncia de seu modo particular.

    To sutil fluidez desconcertou os lgicos romanos e, desde ento, tem confundido muitosestudantes, porque no concorda com os conceitos latinos e semticos. Os celtas entendiam

    suas prprias vidas e mesmo o Universo como guiados pelo simples movimento interno.Desse modo, no acreditavam na dualidade entre bem e mal, no havia lugares como oinferno nem uma justia que se administra depois da morte.

    O yin e o yang chins, tambm representados pelo branco e preto, so pares primrios eativos, tais como o masculino e o feminino, o eu e o outro. Quando esses dois princpiosopostos esto perfeitamente equilibrados, produz-se uma energia harmoniosa chamada chi;quando se encontram em desequilbrio, opera uma fora chamada cha, indicadora de que asenergias se separam e no esto em movimento. Os celtas eram conscientes de umanecessidade inata do chi, o que pode ser a causa de terem os druidas realizado todas assuas cerimnias ao ar livre, prximo gua e entre as rvores.

    Seria intil pretendermos buscar entre os celtas, sutis e de idias rpidas, algo to

    formalizado e estruturado como um princpio ou uma refinada doutrina da reencarnao. Osceltas viviam suas crenas e no as materializavam em objetos concretos. Seu conceito detempo no era o nosso, seja em relao vida ou morte. O trovador breto comearia

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    sempre: "Era uma vez, quando o tempo no existia, e ento...". Eles viviam de acordo comos mitos, que "no o relato dos feitos, seno o prprio desenvolvimento dos feitos". Seusmitos podiam ser compreendidos em qualquer nvel, segundo a capacidade do ouvinte,como um completo conto de fadas, uma mudana de forma com um objetivo mgico, umavisita a outros mundos ou uma unio com a deidade.

    O NMERO TRSPossidnio de Apamia diz que os druidas "ensinaram muitas coisas aos nobres da Gliaem um perodo de instruo que podia durar at vinte anos, reunindo-se em segredo emuma caverna, em longnquos bosques ou vales". Csar acrescenta que os druidasensinavam em trades versos de trs sentenas ou frases. Essa tradio manteve-se naIrlanda at a conquista inglesa.O nmero trs era de uma importncia obsessiva para os celtas. H deusas e deuses detrs cabeas. As deusas da colheita as Matronas so sempre representadas em trades,da mesma forma que o malvado Morrigan.Os heris tambm podem aparecer trs vezes na mesma aventura, com diferentes nomes esob diferentes personagens, produzindo tal confuso que uma tentao abandonar-se ahistria completamente irritado. Para nosso mundo materialista, a magia esquiva, irracional emutante dos celtas est fora de lugar, e s quando afastamos nossos limites e nospermitimos existir em uma dimenso mais intangvel aparece algo dessa magia.

    Talvez o mais elevado significado dos deuses de trs rostos e da grande reverncia pelonmero trs relacione-se com a crena encontrada tambm no anlogo hindusmo. Neste,os trs deuses chamados Brahma, Vishnu e Shiva formam uma trade que representa trsaspectos da Suprema Realidade. Brahma o criador, Vishnu, o conservador e Shiva, odestruidor do mundo, sendo necessrio este ltimo para a nova criao. Podemos encontraras trs atividades em nossas vidas. O ciclo completo da existncia, simbolizado por umatrindade divina, comum em muitas religies antigas. O smbolo celta para o "trs em um"era o triskele, uma espiral bidirecional similar ao yin e yang, mas com uma terceira espiralacrescida, a qual foi chamada pelos alquimistas "o Fogo Secreto". O triskele era um smboloarquetpico de grande poder e foi representado em todo o mundo celta.