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8 MISSISSIPIANO A Formação Poti é a unidade litoestratigráfica do Mississipiano que marca o início de recuo dos ma- res interiores, com interrupção das ligações com a Bacia do Amazonas. O intervalo deposicional com- preende uma idade que está preservada apenas nestas duas bacias brasileiras. A possibilidade de existência de carvão nesta unidade, fornecida por indícios em afloramentos com folhelhos carbonáceos, e uma pequena flora carbonífera foi pesquisada por várias décadas. Contudo, os resultados foram negativos e as cau- sas estão na própria dinâmica da bacia, que so- freu soerguimento, entre o Mississipiano e Pensil- vaniano 8.1 Histórico A primeira referência ao nome Poti foi feita por Lis- boa (1914) para designar folhelhos carbonáceos que afloram no rio Poti. A designação litoestratigrá- fica foi proposta por Paiva & Miranda (1937a). Duar- te (1936) e Kegel (1954) registraram na seção infe- rior da Formação Poti uma fauna marinha pouco di- versificada, composta de biválvios e um braquió- podo inarticulado. A flora descoberta na sondagem 125 realizada em 1933, pelo SGM, em Teresina, Piauí, foi estuda- da preliminarmente por Oliveira (1934, 1935). As ocorrências registradas nas camadas superiores da Formação Poti foram descritas por Dolianiti (1954, 1980) e datadas no Mississipiano (Mississi- piano). Nesses trabalhos as afinidades euro-ameri- canas da flora foram ressaltadas. Em nova etapa, as pesquisas nas associações tafoflorísticas, foram iniciadas por Rösler & Ciguel (1985), e as revisões sistemáticas, estão nos traba- lhos de Iannuzzi (1994 e 1996) e Iannuzzi & Rösler (1991, 1993 e1997). A separação da Formação Poti em dois membros foi proposta inicialmente por Mesner & Wooldridge (1964). Esta divisão foi adotada nos relatórios da CPRM para as pesquisas de carvão e mapeamento de superfície (Cruz et al., 1973a e 1973b; Leite et al., 1975; Lima & Leite, 1978). Della Fávera (1990), pelo estudo da Estratigrafia de Seqüências, identificou na seqüência devo- no-mississipiana, intervalos que correspondem ao topo da Formação Longá e à porção basal da For- mação Poti, e na seqüência mississipiana, o inter- valo que compreende o topo da Formação Poti. Góes (1995) pela análise de fácies em superfície e subsuperfície reconheceu na Formação Poti um conjunto de parasseqüências e seus ambientes deposicionais. Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís – 66 –

Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís · Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís –68– Figura 8.1 – Formação Poti. Seqüência do

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MISSISSIPIANO

A Formação Poti é a unidade litoestratigráfica doMississipiano que marca o início de recuo dos ma-res interiores, com interrupção das ligações com aBacia do Amazonas. O intervalo deposicional com-preende uma idade que está preservada apenasnestas duas bacias brasileiras.

A possibilidade de existência de carvão nestaunidade, fornecida por indícios em afloramentoscom folhelhos carbonáceos, e uma pequena floracarbonífera foi pesquisada por várias décadas.Contudo, os resultados foram negativos e as cau-sas estão na própria dinâmica da bacia, que so-freu soerguimento, entre o Mississipiano e Pensil-vaniano

8.1 Histórico

A primeira referência ao nome Poti foi feita por Lis-boa (1914) para designar folhelhos carbonáceosque afloram no rio Poti. A designação litoestratigrá-fica foi proposta por Paiva & Miranda (1937a). Duar-te (1936) e Kegel (1954) registraram na seção infe-rior da Formação Poti uma fauna marinha pouco di-versificada, composta de biválvios e um braquió-podo inarticulado.

A flora descoberta na sondagem 125 realizadaem 1933, pelo SGM, em Teresina, Piauí, foi estuda-

da preliminarmente por Oliveira (1934, 1935). Asocorrências registradas nas camadas superioresda Formação Poti foram descritas por Dolianiti(1954, 1980) e datadas no Mississipiano (Mississi-piano). Nesses trabalhos as afinidades euro-ameri-canas da flora foram ressaltadas.

Em nova etapa, as pesquisas nas associaçõestafoflorísticas, foram iniciadas por Rösler & Ciguel(1985), e as revisões sistemáticas, estão nos traba-lhos de Iannuzzi (1994 e 1996) e Iannuzzi & Rösler(1991, 1993 e1997).

A separação da Formação Poti em dois membrosfoi proposta inicialmente por Mesner & Wooldridge(1964). Esta divisão foi adotada nos relatórios daCPRM para as pesquisas de carvão e mapeamentode superfície (Cruz et al., 1973a e 1973b; Leite etal., 1975; Lima & Leite, 1978).

Della Fávera (1990), pelo estudo da Estratigrafiade Seqüências, identificou na seqüência devo-no-mississipiana, intervalos que correspondem aotopo da Formação Longá e à porção basal da For-mação Poti, e na seqüência mississipiana, o inter-valo que compreende o topo da Formação Poti.Góes (1995) pela análise de fácies em superfície esubsuperfície reconheceu na Formação Poti umconjunto de parasseqüências e seus ambientesdeposicionais.

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8.2 Área de Ocorrência

Os arenitos da Formação Poti afloram nas bor-das leste e oeste da bacia, com os estratos orienta-dos norte-sul, e infletidos para sudeste e sudoeste,acompanhando o atual contorno da bacia. Na re-gião sul é recoberto por sedimentos da Bacia San-franciscana, e a norte por sedimentos mesozóicose cenozóicos. A maior parte das ocorrências de flo-ra está registrada na borda leste da bacia.

A espessura máxima de 320 metros foi indicadapor Góes & Feijó (1994).

8.3 Geocronologia e Idade

Na Formação Poti foram indicadas por microfós-seis as idades Tournaisiano (mais antiga) e Viseano(mais nova) (Daemon, 1974; Lima & Leite, 1978;Sundaram et al., 1981; Quadros, 1982). Loboziak etal. (1992), estudando material de poços daPETROBRAS localizados no centro da bacia, deter-minaram na coluna de sedimentos da FormaçãoPoti idades que estariam apenas restritas ao Tour-naisiano. Na atualização de dados da bacia, Góes& Feijó (1994) utilizaram a datação de Tournaisiano.

Contudo, no material coletado no topo da forma-ção na borda leste, existem indicações de ocorrên-cia do Viseano. Esta idade está registrada em níveiscarbonosos, em amostras de subsuperfície estuda-das por Norma M. Costa Cruz para os projetos decarvão (Cruz et al., 1973a, 1973b), e de superfície,onde Iannuzzi (1994) estudou os palinomorfos as-sociados aos espécimens vegetais, datando-os noViseano Superior.

A flora inicialmente datada como Pensilvaniano(Oliveira, 1934 e 1935), foi colocada por Dolianiti noMississipiano (1954). Esta datação foi confirmadapor Rigby (1969) que sugeriu o Neomississipiano.Pelo grau evolutivo, as estruturas vegetativas e fér-teis da flora correspondem às formas registradasna região euro-americana entre o Mississipiano (Vi-seano) e início do Pensilvaniano. Esta idade maisnova foi atribuída por Rocha Campos & Archan-gelsky (1985) à flora Poti. Entretanto, as afinidadesdevonianas dos componentes da flora foram men-cionadas por Rösler & Ciguel (1985).

8.4 Sedimentação

A Formação Poti é dividida em dois membros. Osdepósitos inferiores são constituídos por arenitosmédios, cinza-esbranquiçados, com lâminas es-parsas de siltito cinza-claro, interpretados como

marinho raso. Os superiores são arenitos com inter-calações de lâminas de siltitos e folhelhos carbono-sos, restos vegetais, interpretados como de ambi-entes fluviodeltaicos (Mesner & Wooldridge, 1964;Cruz et al., 1973b; Leite et al., 1975 e Lima & Leite,1978).

O contato inferior com a Formação Longá é con-cordante e o contato superior com a Formação Piauí énitidamente discordante, marcado por superfícieserosivas (Aguiar, 1971; Schobbenhaus et al., 1984;Della Fávera, 1990; Lima Filho, 1992).

Na seqüência devono-mississipiana, o primeirointervalo transgressivo corresponde à FormaçãoLongá inferior, seguido pelo intervalo regressivocompreendido pelo topo da Formação Longá epela porção basal da Formação Poti. A seqüênciamississipiana corresponde ao topo da FormaçãoPoti compreendendo um sistema transgressivocom lobos sigmoidais deltaicos e tempestíticos(Della Fávera, 1990).

Góes (1995) apresentou um trabalho detalha-do com análise de fácies, em superfície e subsu-perfície da Formação Poti. Por correlações emsubsuperfície reconheceu um conjunto de trêsparasseqüências. Nos afloramentos foram identi-ficados depósitos fluviais (granodecrescênciaascendente) e de plataforma com tempestades(pelitos laminados, lamas de offshore, estratifi-cações cruzadas hummockys). As estruturas lin-sen (Figura 8.1) correspondem às áreas de depó-sitos litorâneos e marinhos rasos de uma costa re-cortada por baías, deltas e estuários.

Os restos vegetais ocorrem em afloramentoscom arenitos finos tabulares com laminação pla-no-paralela, com sucessão de perfurações por raí-zes de plantas (Iannuzzi, 1994). São interpretadoscomo barras de areia emersas fixando a vegetaçãoterrestre, na antiga linha de costa (Figura 8.2). Inter-calam camadas de folhelhos laminados que seriamdepósitos de lagos ou lagunas portando os frag-mentos vegetais (Figura 8.3). Os fragmentos derestos vegetais depositados sobre as superfíciesonduladas entre as camadas com laminações pa-ralelas, por vezes com wavy e linsen e climbling rip-ples estão bem preservados (Figura 8.4). Indicamque estes restos sofreram pouco transporte e foramdepositados por ação de pequenas correntes juntoaos bancos de areias marginais. São regiões daplanície costeira com um sistema de ilha-barreiracom fácies de barra e lagunares (Rainson, 1979).

Estes são ambientes concordantes com o pro-cesso regressivo da tendência de continenta-lização na Formação Poti.

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Figura 8.1 – Formação Poti. Seqüência do topo com arenitos e siltitos com estruturas linsen.Localidade: na rodovia BR-23, distante 8km a leste de Floriano, Piauí.

Figura 8.2 – Formação Poti. Arenitos finos com laminação plano-paralela, com sucessão de perfurações porraízes de plantas. Interpretados como barras de areia emersas fixando a vegetação terrestre.

Localidade: Fazenda Curral de Pedra, Monsenhor Gil. Rodovia BR-316, km 63, Piauí.

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Figura 8.3 – Formação Poti. Arenitos finos com laminação plano-paralela, tabulares.Intercalam camadas de folhelhos laminados.

Localidade: Fazenda Curral de Pedra, Monsenhor Gil. Rodovia BR-316, km 63, Piauí.

Figura 8.4 – Perfil composto da Fazenda Curral da Pedra, município de Monsenhor Gill, Piauí (Iannuzzi, 1994).Fragmentos de restos vegetais depositados entre camadas com laminações paralelas.

Região de planície costeira com fácies de barra e lagunas.

8.5 Fósseis

8.5.1 Microfósseis

Os microfósseis (esporomorfos) ocorrem ao lon-go de todo o pacote de sedimentos e indicam o in-tervalo de idade que varia do Tournaisiano ao Visea-no (Daemon, 1974; Quadros, 1982).

Loboziak et al. (1992) revisaram o zoneamento pali-noestratigráfico proposto por Daemon (1974), aplican-do o zoneamento de miósporos da Europa Ocidentalem material de três furos da PETROBRAS. Determina-ram, na Formação Poti, a idade Tournaisiano. O ma-terial encontrado compreende as espécies Spelaetri-letes pretiosus, Raistrickia clavata, Colatisporites de-corus, Prolyspora rugulosa. Esta datação é aceita porGóes & Feijó (1994) no trabalho de atualização de da-dos da bacia.

Iannuzzi (1994) examinou amostras procedentesdos níveis da paleoflora encontrando uma primeiraassociação com os palinomorfos – Punctatispori-tes, Laevigatosporites, Foveosporites, Apiculatis-porites, Botryococcus, Verrucosisporites, Auroras-pora. Como forma-guia ocorreu em baixa freqüên-cia, apenas o Verrucosisporites 2411 indicando Vi-seano.

A matéria orgânica do tipo lenhosa indica uma in-fluência terrestre nos depósitos. Também foi en-contrada a alga Botryococcus de águas doces a nomáximo, salobras.

Na associação de esporos identificada nas len-tes carbonosas que correspondem a deposiçãoem ambiente de baixa energia, há dominância deesporos triletes lisos, seguidos por proporção de-crescente de formas apiculadas, verrucosas e frag-mentos de colônias de Botryococcus.

Os esporos lisos são vinculados a grupos de ve-getais higrófilos (psilófitas, licófitas, articuladas efetos verdadeiros), que viviam às margens dos cor-pos d’água.

8.5.2 Flora

A flora da Formação Poti foi inicialmente estuda-da por Oliveira (1934 e 1935). Em pesquisas poste-riores, Dolianiti (1954) descreveu e classificou amaior parte das formas atualmente conhecidas, da-tando-as no Mississipiano e estabelecendo suasrelações com a flora euro-americana. Dolianiti(1962) descreveu Cyclostigma brasiliensis, ocor-rente da borda oeste da bacia, porém Iannuzzi (inf.verbal) situa este material na Formação Pedra deFogo, de idade permiana. Em complemento, Dolia-

niti (1972) fez menções à flora da Formação Potipara comparação e análise da evolução paleoflo-rística.

O estudo e a revisão sistemática da flora de pe-queno porte composta por vegetação herbácea earbustiva foram realizados por Iannuzzi (1994) (Fi-gura 8.5). Engloba o material resultante de novascoletas e o descrito (Dolianiti, 1954, 1962 e 1980;Rigby, 1969; Rösler & Ciguel, 1985).

Com este estudo taxonômico dos gêneros com-preendendo fragmentos de folhagens preservadospor impressão/compressão, o número de espéciesdescritas foi reduzido.

A flora revela a existência de endemismo emnível específico e genérico; mostrada pelosgêneros Paulophyton e Kegelidium estabelecidospor Dolianiti (1954). Além do reestudo da espécie-tipo Paulophyton sommeri, um novo material foireferido a Paulophyton sp 1 e redescrito o pequenoarbusto Kegelidium lamegoi.

As novas combinações taxonômicas propostassão Diplothmema gothanica (Dolianiti), Adiantitessp., e nova espécie do gênero Triphyllopteris.

O material de Rhacopteris sp. (Dolianiti, 1980) foiincluído no gênero Nothorhacopteris do Gondwanada Argentina.

Iannuzzi (1994 e 1996), no reexame das amos-tras da sondagem 125 (Teresina, Piauí), identificoupela primeira vez, cúpulas, órgãos reprodutoresdas plantas. Foram referidas com dúvida a Stam-nostoma sp., do Mississipiano da região euro-ame-ricana.

8.5.3 Fauna

A fauna é restrita em níveis na parte inferior daFormação Poti onde está densamente acumulada.Kegel (1954) diferenciou sete espécies do biválvioEdmondia, que fornecem indicações marinhas esão relacionadas com formas ocorrentes na Europae na América do Norte (Figura 8.6). Dos vertebra-dos há descrito um espinho do peixe condricte Xe-nacanthus e restos de Paleoniscidae (Duarte, 1936;Santos & Salgado, 1970).

8.6 Paleogeografia

No Mississipiano, a sedimentação continuoucondicionada aos eixos deposicionais controladospelo Lineamento Transbrasiliano Picos-Santa Inês(Cunha, 1986), sob controle estratigráfico da varia-ção do nível do mar.

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1 Paulophyton sommeri

Dolianiti, 1954.Localidade: Sondagem 125,Teresina, Piauí.Coleção: DG-USP 4460.

2 Kegelidium lamegoi

Dolianiti, 1954.Localidade: Fazenda Curraldas Pedras. BR-316 km 63,próximo a Monsenhor Gil,Piauí.Coleção: DGM 1019-Pb.

3 Diplothmema gothanica

(Dolianiti, 1954).Localidade: Sondagem 125.Teresina, Piauí.Coleção: DGM 682-Pb.

4 Triphyllopteris sp.Localidade: Riacho doRoncador, Barra do Lança,Piauí.Coleção: DGM 1681-Pb.

5 Stamnostoma sp.

Localidade: Sondagem 125Teresina, Piauí.Coleção: DGM 1006-Pb.

6 Adiantites sp.Localidade: Fazenda Curraldas Pedras. BR-316 km 63,próximo a Monsenhor Gil,Piauí.Coleção: DGM 1914-Pb.

Figura 8.5 – Flora da Formação Poti (segundo Iannuzzi, 1994).

Um mar interior (seaway) conectava as baciasdo Parnaíba, Amazonas com o Cráton Oeste Africa-no, e eram ligados ao paleoceano do Tétis (DellaFávera, 1990).

Os sedimentos da parte inferior da FormaçãoPoti indicam sistemas de superposição fluvial, so-bre os da Formação Longá. Nestes sedimentosarenosos houve posteriormente o abandono deltai-co, com retrabalhamento marinho, em mares detempestade. Os depósitos superiores apresentamcaracterísticas para maior proximidade da linha decosta sob influência de maré.

Nas regiões litorâneas, em ambientes flu-viodeltaicos com progradação na linha de costa,ocorrem os folhelhos carbonosos e a flora terrestre.Indicam a influência da subsidência local, além davariação do nível do mar (Cruz et al., 1973b).

Evidências de tectonismo na parte superior daFormação Poti estão assinaladas por Góes(1995), que identificou canais fluviais entrelaça-dos em contato com sedimentos de maré, inter-pretados como uma paleodrenagem com rápidoafogamento, onde a tectônica predominou sobrea eustasia.

Este evento precede à discordância erosivaidentificada entre o Mississipiano e o Pensilvanianodesde o primeiro trabalho de integração da bacia(Mesner & Wooldridge, 1964). Pelo mapa de con-torno estrutural do topo da Formação Poti/base daFormação Piauí apresentado por Cruz et al.(1973b), é mostrado o soerguimento de blocos naborda sul da bacia.

Representa o arqueamento do Alto do Parnaíbaregistrado por Castelo Branco & Coimbra (1984), eque é correlacionado por Góes & Feijó (1994) aoevento geológico global, a Orogenia Eoherciniana.

8.7 Eventos Biológicos

Os dois eventos biológicos são as ocorrênciasde: invertebrados marinhos relacionados com atransgressão na base da formação e a flora terres-tre, relacionada com condições continentais dafase de progradação, na parte superior da forma-ção.

Os mecanismos alocíclicos de deriva, clima e va-riação do nível do mar influenciaram os bioeventossob aspecto regional, global e local. Houve cone-xão com o paleoceano de Tétis, comprovado pelogênero cosmopolita dos biválvios marinhos. A ele-vação do nível do mar propiciou a abertura de no-vas passagens, e com a geração de espaço

deposicional foram criados novos biótopos. Fo-ram os habitats favoráveis à colonização de fau-nas do hemisfério norte, como evidenciado porEdmondia.

No segundo bioevento para colonização do am-biente terrestre, o evento geológico local represen-tado por áreas de progradação com subsidênciafoi fundamental. A influência terrestre é confirmadapela matéria orgânica lenhosa, e esporos dos gru-pos de vegetais higrófilos (psilófitas, licófitas, arti-culadas e fetos verdadeiros), que viveram às mar-gens dos corpos d’água (Iannuzzi, 1994).

A flora de parentesco euro-americano, pela com-posição é correlacionada com o reino florístico Pa-racas, de clima temperado que ocorre no sul doPeru. Representa uma expansão para o sul destaprovíncia biogeográfica, possivelmente pela ame-nização de clima para temperado, uma vez quehouve o distanciamento do supercontinente em re-lação ao pólo, durante o processo de deriva.

8.8 Tafonomia

Os dois eventos biológicos identificados repre-sentam sistemas tafonômicos distintos.

O primeiro é um nível de concentração de con-chas de biválvios, que segundo Kegel (1954) estásituado na parte basal da formação, em horizontes5 a 10 metros acima do contato Longá/Poti. São de-pósitos de plataforma marinha, relacionados comuma transgressão e acumulados como tempestitosproximais.

As conchas referidas a Edmondia estão concen-tradas e cimentadas por arenito de granulação mui-to grossa. Abaixo ocorre, em contraste, um nível dearenito de granulação fina a média, o que sugereentre os dois níveis, uma brusca diferença entre osprocessos hidrodinâmicos, com maior agitação daágua nos níveis de maior granulometria. O nível dasconchas é revestido de uma película de óxido deferro, indicativo de um hardground, e parada na se-dimentação (Figura 8.7).

O material original que constituiu as conchasestá dissolvido. As unidades registradas se apre-sentam como moldes internos de valvas isoladasdireitas e esquerdas, em igual proporção e volta-das para cima. Parte do material se apresenta comas valvas unidas. Mostram que, no processo tafo-nômico, primeiro as conchas foram acumuladassem exposição e transporte. Posteriormente, porressedimentação, sofreram deslocamento nosubstrato e enterramento.

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Mississipiano

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Figura 8.6 – Fauna da Formação Poti.

1 Edmondia obliquata Kegel, 1953Localidade: Campo Maior, Piauí.Coleção: DGM 4393-I.

2 Edmondia corpulenta Kegel, 1954Localidade: Campo Maior, Piauí.Coleção: DGM 4394-I.

3 Edmondia dequechi Kegel, 1954Localidade: Campo Maior, Piauí.Coleção: DGM 4392-I.

Figura 8.7 – Placa com conchas de Edmondia. Localidade: Serra de Campo Maior, Campo Maior,Piauí. Coleção DGM.

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Nos processos sofridos pelos exemplares con-servados após seu enterramento inicial, isto é, afossildiagênese, as conchas originais devem tersido dissolvidas após a ressedimentação. Se o fos-sem antes, os moldes teriam se dissolvido no pro-cesso de erosão e suspensão, durante a agitaçãodos sedimentos pelos fortes fluxos que geraram aconcentração das conchas.

O segundo sistema tafonômico compreende asocorrências da flora, relacionadas com condiçõescontinentais da fase de progradação, na parte su-perior da formação. O material composto por frag-mentos de frondes, caules e frutificações preserva-dos por compressão e/ou impressão, contém nor-malmente restos de películas carbonosas, sem cu-tículas ou estruturas anatômicas. A conservação foipropiciada pela acumulação próxima à fonte, poisas plantas delicadas conservaram a estrutura ana-tômica.

As perfurações por raízes de plantas estão pre-servadas por acumulação in situ, nas camadas dearenitos das barras emersas associadas aos folhe-lhos laminados com os fragmentos vegetais. Por-tanto, decorrem de entidades paleobiológicas eu-dêmicas, isto é, que viveram e se reproduziram naárea (conceito de Fernández López, 1986-87).

8.9 Paleoecologia/AntigosEcossistemas

Os paleoambientes e fósseis representam doisdiferentes tipos de comunidades: a primeira é umacomunidade bentônica de plataforma marinharasa, e a segunda uma comunidade florística emambiente terrestre litorâneo.

COMUNIDADE BENTÔNICA DE PLATAFORMAMARINHA RASA - No modelo de fácies para ostempestitos (Della Fávera, 1990), os sedimentos degranulometria de grânulos a grossos são transpor-tados nos surtos de tempestade, quando o mar lo-cal está mais alto. Estes são depositados na basedos tempestitos nas fases transgressivas. As con-chas são as partículas mais grossas, e foram trans-portadas e depositadas distante de seu ambientede vida.

Os biválvios que pertencem ao gênero marinhoEdmondia, apresentam as características funcio-nais de biválvios isomiários, com charneira fina esem dente, sem marcas da edentação de um sinuspalial. Foram sésseis, e deveriam viver com as con-chas semi-enterradas no substrato, em comunida-des de plataforma rasa. De acordo com Kotzian &

Simões (1997), este gênero teria o hábito escava-dor raso, e vivia em fundos arenosos e firmes, emambientes de média energia.

COMUNIDADE FLORÍSTICA EM AMBIENTETERRESTRE LITORÂNEO - Os fitofósseis interpre-tados como acumulação in situ, indicam a coloniza-ção do ambiente terrestre, em intervalo progradan-te. As fácies sedimentares de ilha-barreira são as-sociadas de um sistema deposicional transicional.

Na reconstituição do antigo ecossistema (Figura8.8) estão as formas de hábito psilofít ico(Paulophyton e Kegelidium) consideradas comohigrófilas, colonizadoras de margens lacustres ouestuarinas. As frondes do tipo Diplothmema,Adiantites, Nothorhacopteris e Triphyllopteris sãorelacionadas a ambientes higro-mesófilos, emáreas proximais ao longo dos corpos d’água.

8.10 Paleobiogeografia

PROVÍNCIA PALEOFITOGEOGRÁFICA - A florada Formação Poti, por suas afinidades representauma extensão para leste do Reino Paracas, existen-te durante o Carbonífero do Peru. Este reino expres-sa uma zona paleoflorística de clima temperado/quente, situado entre os reinos Tetiano (ou Eu-ro-Americano) e o Gondwanico.

A flora da Formação Poti compreende umaunidade intermediária, com gêneros que a situaentre os reinos Gondwanico e Euro-Americano. Nacomposição, possui gêneros cosmopolitas, taiscomo, Adiantites, Diplothmema e Triphyllopteris;outros restritos ao Gondwana, como Paulophyton eNothorhacopteris, e um exclusivo desta flora,Kegelidium.

8.11 Paleoclima

A interpretação para um clima temperado a frio,seco a árido, nas condições existentes durante o Mis-sissipiano, é fornecida pelas características da paleo-flora (Iannuzzi, 1994). Incluem a baixa diversidade,com elevado número de indivíduos por táxon, peque-no porte dos exemplares com tamanho situado entreherbáceo e arbustivo, e o caráter das frondes conten-do folhagens de limbos resistentes a coriáceos.

Condições periglaciais durante a deposição daFormação Poti foram sugeridas pelos dados litoló-gicos observados por Lima & Leite (1978), Caputo& Crowell (1985) e Della Fávera (1990). Entretanto,Góes (1995) que exaustivamente analisou os pro-cessos deposicionais da formação, em superfície e

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subsuperfície, concluiu não ter encontrado evidên-cias de sedimentação de origem glacial.

8.12 Deriva

A ocorrência da flora Poti é uma inferência paleo-climática para latitudes temperadas. Indica que a

Região Norte do Brasil e também do superconti-nente, no Mississipiano, havia alcançado as latitu-des médias. Esta evidência é corroborada pelossedimentos clásticos e ausência de sedimentosquímicos. Por estes elementos, é deduzido que osupercontinente estava localizado ainda a uma re-lativa distância da linha do Equador.

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