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Onde está o gato preto?
Filosofia Acadêmica, Filosofia Clínica e Coaching Ontológico
para líderes e educadores
Prof. Dr. Marcello Árias Dias Danucalov
Introdução
“O truque da filosofia é começar por algo tão simples que ninguém ache digno de nota
e terminar por algo tão complexo que ninguém entenda”
Bertrand Russell
Encontros Filosóficos
Este livro foi gestado nos últimos seis anos e confesso que tive certa dificuldade
para terminá-lo, pois sempre me parecia faltar algo, abordar mais um tema, desenvolver
as ideias de outro autor, inserir um novo capítulo, etc. Meu orientador de mestrado, Dr.
Antonio Carlos da Silva, costumava me chamar de “antibiótico de largo espectro” -
termo utilizado em medicina para denominar medicamentos que combatem muitos tipos
de bactérias -, e com isso ressaltava a minha dedicação e inclinação para estudar vários
assuntos. Se por um lado obter vários conhecimentos para mim era bom, por outro,
dificultaria o estabelecimento do foco necessário para construir uma carreira acadêmica;
- meu objetivo naquele momento. Mesmo para escrever um livro, dizia Antonio, é
necessário ter capacidade de síntese e objetividade. Umberto Eco também fala a mesma
coisa em seu livro Como se faz uma tese: “é preciso parar de escrever em algum
momento!” (ECO, 2000). Contudo, essa “antibiotiquice de largo espectro” não foi
suficientemente contida, e acabei transitando por distintos campos do saber em minha
trajetória profissional. No início de minha vida produtiva exerci a carreira de surfista
profissional, e confesso que hoje ainda pego minhas ondinhas. Trabalhei como
mergulhador profissional em plataformas de petróleo. Graduei-me em educação física.
Atuei ao lado de pedagogos no ensino de crianças em fase pré-escolar. Ministrei aulas
de musculação, natação, ginástica, yoga, meditação e de capoeira. Coordenei centros
esportivos e academias de ginástica. Especializei-me em fisiologia humana e do
exercício e trabalhei como fisiologista e preparador físico de atletas de maratona, surfe,
triátlon, karatê, entre outros, inclusive de paratletas - Jogos Paraolímpicos de Atlanta em
1996, na Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP/EPM. Concluí um mestrado no
Departamento de Farmacologia e um Doutorado em Ciências no Departamento de
Psicobiologia. Atuei também com biofeedback e gerenciamento do estresse. Atualmente
sou professor universitário, atividade que exerço há trinta anos, tanto nos cursos
atrelados às ciências naturais: - medicina, fisioterapia, enfermagem, educação física -,
como naqueles ligados às ciências sociais: - administração, processos gerenciais, entre
outros. Nos últimos doze anos também venho atuando como consultor da área
corporativa, desenvolvendo trabalhos nas áreas do Coaching Ontológico, comunicação,
mediação de conflitos e Ética. Logo, os conselhos do professor Antônio Carlos não
foram seguidos com muito esmero. Pois, admito que, minha trajetória profissional é um
tanto quanto generalista para quem, supostamente, buscava especializar-se em um
determinado assunto. Todavia, há alguns anos entendi que me especializei - mesmo sem
saber - na área de comportamento humano. Percebi que apesar de ter realizado muitas
atividades distintas, grande parte delas esteve relacionada com o desenvolvimento e
aprendizagem de pessoas. Lidar com o ser humano pressupõe entender seus desejos,
frustrações, anseios, expectativas, assim como os sempre desafiadores exercícios de
convivência com aqueles que nos cercam. Hoje percebo que esta experiência em
múltiplos campos do saber me auxiliou na montagem de um quebra cabeças que retrata
uma pequena parte da complexidade da vida e do comportamento dos seres humanos.
No entanto, de todas as áreas que visitei, uma delas é especialmente cara para mim, pois
foi por meio da mesma que aprendi a perspectivizar meu próprio pensar. Esta área é a
Filosofia.
A palavra Filosofia é originária do verbo grego philosophein, que significa amar
- philia - a sabedoria - sophia - ou ainda, a busca amorosa pela verdade, dependente da
corajosa reflexão e do pensar acerca da vida, do mundo, do universo, das relações, das
interseções entre distintas consciências. Na concepção de Buzzi (1983, p.11), “Pensar,
na significação etimológica do termo, quer dizer sopesar, pôr na balança para avaliar o
peso de alguma coisa”. Filosofar é, em suma, aprender a pensar. É responsabilizar-se
pelas atitudes deliberadas, mas com certa subserviência intelectual, tão comum àquele
ser que coexiste com a dúvida, e tão rara aos propagadores das verdades imperativas
que garantem sucesso em toda e qualquer circunstância. O filósofo nutre admiração
pelas incongruências da realidade e enfrenta as com autonomia, ponderando o reflexo
de suas ações na coletividade, pensando como sua tarefa impacta a sua vida e a vida
sistêmica que está ao seu redor.
O termo autonomia é proveniente do grego e composto por duas palavras, autós
e nómos. A primeira nos remete à ideia de independência e a segunda faz referência à
norma, regra. Sendo assim, um ser autônomo estabelece por si só as regras e
metodologias que fará uso para conceder sentido para sua existência. Um ser autônomo
constrói seus próprios saberes. Cria suas trajetórias. Contudo, essa criação não é feita a
partir do nada. Filósofos partem do que se sabe sobre a realidade para, posteriormente,
analisar os fundamentos dessa mesma realidade, criticá-la e colocá-la em dúvida por
meio de perguntas importunas, abrindo assim as portas para futuras possibilidades
interpretativas. A Filosofia tem sido edificada com base nos questionamentos das
práticas políticas, das conquistas da Ciência, da aplicação das novas tecnologias, dos
dilemas enfrentados pela Ética, dos desafios econômicos, entre outros. Em suma, como
afirmam Pacheco e Nesi (2007), a Filosofia é uma disciplina criativa:
[...] A criatividade está relacionada com a nossa capacidade de gerar novas
explicações e realidades, de criar o novo. É a atitude ou atividade criadora. A
criatividade representa um passo posterior em relação à crítica. Se, ao criticar,
questionamos e julgamos as explicações sobre o nosso mundo, então, agora estamos
preparados para desenvolver a criatividade, ao propor uma ‘nova’ explicação sobre o
mundo (PACHECO E NESSI, 2007, p. 25).
A criatividade necessita de um tempo dilatado para se manifestar, uma vez que,
mudanças demandam tempo. Não se aprende um novo idioma em dois dias, não se
conquista uma nova profissão em um mês, não se absorve uma nova competência em
quatro horas de informações superficiais, mesmo que sejam embaladas pelas pirotecnias
das, cada vez mais comuns, palestras motivacionais, tão conhecidas dentro do universo
corporativo e do segmento da autoajuda, tentando vender propostas milagrosas não nos
concedendo tempo de colocá-las à prova com um pensamento mais crítico e abalizado.
A Filosofia tem esta incumbência. Sendo ela mais formal, seu compromisso está
voltado para um pensar que se afasta do senso comum. Ampara-se na lógica dos
discursos e na validade dos argumentos apresentados por aquele que defende certo
ponto de vista. Sendo assim, para que um pensamento possa ser chamado de filosófico,
é necessário que ele satisfaça uma sequência de reivindicações. Saviani (2002) aponta
três:
A radicalidade: a Filosofia necessita que o assunto a ser considerado seja
colocado em termos radicais. Isso significa que é preciso que se atinjam as raízes da
questão. É necessário o exame apurado de seus fundamentos;
A rigorosidade: deve-se refletir com exatidão e rigor, de forma sistemática,
segundo métodos definidos;
A totalidade: espera-se que a questão não seja abordada de modo parcial, e sim
em uma perspectiva sistêmica, complexa, relacionando-a com os demais aspectos do
contexto em que está inserida. Somente procedendo desta forma é que teremos uma
maior probabilidade de atingir um conhecimento que transcenda o ponto de vista inicial.
Meus primeiros contatos com a Filosofia datam de minha infância, tendo sido
meu pai o maior responsável por este encontro. A partir daí fui, de maneira autodidata,
realizando leituras esporádicas e ocasionais. Somente voltei a ter um contato mais
próximo e organizado com a Filosofia há dez anos, quando conheci as bases teóricas da
Ontologia da Linguagem, que amparam as práticas daquilo que ficou conhecido como
Coaching Ontológico. Os doutores Fernando Flores e Rafael Echeverría são os
responsáveis pelo desenvolvimento e solidificação de parte das ideias que apresentarei
no decorrer desta obra. Todavia, cabem aqui alguns comentários. O Coaching
Ontológico é uma prática bastante conhecida no mundo corporativo, principalmente nos
países de língua espanhola. Seu objetivo principal é auxiliar líderes e gestores a tomar
melhores decisões em seu dia a dia, ainda que nos últimos anos essa escola tenha sido
procurada por pessoas advindas de outras áreas, como a da saúde, do esporte e da
educação. O facilitador do processo de Coaching Ontológico - comumente chamado de
coach -, deve se abster de vários comportamentos enquanto conduz suas sessões ou
encontros com seu cliente - também chamado de coachee. Ele não deve aconselhar,
orientar, conduzir raciocínios, opinar etc. Sua tarefa principal é ajudar seu cliente a
pensar melhor suas questões, e isso é feito por meio de perguntas provocativas dirigidas
ao seu cliente com responsabilidade, comedimento, parcimônia e em circunstâncias
adequadas. Tenho atuado com Coaching Ontológico há bastante tempo, inclusive
conduzido muitas pós-graduações nesta área. Sendo assim, as referências que são feitas
aos processos de Coaching nesta obra, dizem respeito a essa escola em particular, pois é
a única que faz uso da Filosofia para amparar seus pressupostos. Entretanto, meu
contato com a Filosofia não se resumiu a esses dois aspectos. Enquanto trabalhava em
meu doutorado, cursei paralelamente um bacharelado em Filosofia, e meu último, e
talvez mais profícuo flerte com o pensamento filosófico, veio do meu encontro com a
Filosofia Clínica.
A utilização da Filosofia com intuitos terapêuticos não é novidade, e muitas
pessoas têm procurado auxílio de um filósofo clínico, pois creem que o pensamento
filosófico possa auxiliá-las a conjecturar sobre suas questões pessoais e,
consequentemente, ajudá-las a refletir sobre a maneira como lidam com seus problemas.
O filósofo brasileiro Lúcio Packter foi um dos precursores daquilo que hoje
compreendemos como Filosofia Clínica. Todavia, meu contato com essa área se deu por
intermédio de uma de suas alunas, a Dra. Monica Aiub. Packter, juntamente com outros
profissionais que utilizam a Filosofia de maneira terapêutica pelo mundo a fora, criou
uma metodologia e resgatou o conceito de clínica como possibilidade da Filosofia. A
Filosofia Clínica afirma ter valor terapêutico, ainda que não seja uma psicoterapia. Na
clínica filosófica o que se almeja é tornar acessível a metodologia e o conhecimento
filosófico ao público leigo, ajudando-o a utilizar o potencial prático da Filosofia como
recurso para expandir sua capacidade reflexiva com vistas a solucionar suas questões
existenciais.
Grande parte do trabalho do filósofo clínico é provocar a reflexão, palavra
oriunda do verbo latino reflectere, cujo significado é voltar atrás. Logo, não se pode
filosofar – nem academicamente, nem tampouco em clínica, sem que haja abertura para
rever pontos de vistas, sem estar disposto a se colocar em diferentes patamares de
observação dos fenômenos investigados. É necessário reconsiderar os dados
disponíveis, revisar, reanalisar, buscar novos dados ou mesmo reinterpretar velhos
conceitos à luz de novas articulações. Para isso é necessário dar vazão à crítica, palavra
oriunda do idioma grego e que deriva de krisis, cujo significado é purificação,
desenvolvimento. Logo, deve-se purificar o pensamento para desenvolver novas
maneiras de fruir o mundo.
Minhas conversas filosóficas com papai, certo grau de autodidatismo, a Filosofia
Acadêmica, o Coaching Ontológico e a Filosofia Clínica, produziram o que há de
Filosofia em mim, assim como algumas crenças que nutro, como a ideia de que ajudar a
pensar a vida com radicalidade, rigorosidade e totalidade seja um dos principais
diferenciais dos grandes professores ou dos líderes mais inspiradores. Acredito que
muito mais do que ensinar o passo a passo do sucesso ou vender propostas
pasteurizadas do bem agir e bem viver; provocar criticamente a reflexão no seu
interlocutor ainda é uma conduta atraente e que pode fazer a diferença na vida de muitas
pessoas.
Autoajuda: Simplificações em Demasia?
Nutro a opinião que nos últimos trinta anos temos sido vítimas de uma
gigantesca quantidade de propostas simplificadoras da complexidade da vida, como
aquelas advindas das literaturas de autoajuda que, em minha opinião diminuem a
capacidade reflexiva do ser humano. Nutro também a crença de que parte do nosso
sucesso individual depende da habilidade de conceder sentido e significado ao mundo
que nos rodeia, assim como aos encontros e às conjunturas que determinam nossa
estrutura de pensamento, mesmo que cheguemos à conclusão de que a vida não tem
sentido. Creio também, que esta significação, ainda que singular, não se conquiste tão
facilmente. Propostas existenciais que garantam certezas, deveriam ser vistas com um
pouco mais de cautela e ressalva, pois elas parecem ser um tanto quanto ingênuas,
quando não charlatanescas e infantilizadas. Entretanto, assumo que já me deixei seduzir
por algumas dessas pospostas, e não foram poucas as ocasiões em que me converti de
corpo e alma. Em meu caminhar não faltaram palpiteiros, gurus, adivinhos,
conselheiros, profetas, magos, e toda a sorte de cidadãos propagadores de certezas e
professadores da verdade. Sinto também que em momentos cruciais da minha vida,
faltou-me alguém que me auxiliasse a refletir com mais profundidade e vigor as
potenciais consequências de minhas condutas, de minhas possibilidades alternativas, de
minhas escolhas. Minhas decisões mais insensatas e que mais me envergonham foram
tomadas na mais profunda solidão deliberativa ou impelidas por assentir cegamente aos
conselhos de pessoas que, provavelmente, não sabiam que suas falas poderiam, ao
serem levadas em consideração, produzir consequências tão devastadoras. Aprendi a
pensar tardiamente.
Pelos motivos explicitados acima, pode ser que, o contato com as ideias
filosóficas, a participação em processos de Coaching Ontológico, ou os encontros de
Filosofia Clínica, se bem conduzidos, podem ajudar muitas pessoas a determinar o que;
onde, como, e quando gostariam de realizar em suas vidas, auxiliando-as a viver a vida
boa, mas nunca garantindo o atingir dessa vida boa; a vida que vale a pena viver, sem
grandes arrependimentos e sem grandes amarguras. Cada uma dessas atividades tem
peculiaridades e alcances distintos, e um dos objetivos do livro que agora você tem em
mãos é tentar esclarecer algumas dessas peculiaridades, indicando os pontos de
convergência, assim como momentos em que esses saberes tendem a se distanciar uns
dos outros. Também tenho como meta deixar claro que o contato com os autores que
dão suporte à Filosofia Acadêmica, assim como as bases teóricas e práticas do
Coaching Ontológico e da Filosofia Clínica podem ser úteis até mesmo para aqueles
indivíduos que não querem atuar como filósofos acadêmicos, coaches ontológicos ou
filósofos clínicos, mas intencionam especializar-se nessas áreas com vistas a adquirir
um alargamento de suas capacidades reflexivas que possa beneficiá-los em suas
atividades de docência ou liderança.
A Filosofia Acadêmica, a Filosofia Clínica e o Coaching Ontológico guardam -
cada um à sua maneira -, o potencial de serem dinamizadores do pensamento ético que,
como veremos, nos auxilia na deliberação da melhor das vidas a ser vivida e,
consequentemente, convivida. Todavia, com relação ao Coaching é preciso certa
cautela, pois, nem todas as práticas atualmente descritas como Coaching tem sintonia
com os pressupostos do exercício filosófico, onde se respeita o livre pensar e a livre
escolha. Conselhos advindos de “gurus” do mundo corporativo, algumas formas de
consultorias, práticas “new age”, e até afirmações advindas da física quântica são
comumente embaladas no mesmo pacote do que hoje se denomina de Coaching. Nesses
casos, o Coaching pouca ou nenhuma relação guarda com a Filosofia.
Em suas origens, a Filosofia foi ensinada nas ruas, discutida nos salões, atrelada
ao dia a dia das pessoas. No entanto, na medida em que o pensamento filosófico foi
sendo desenvolvido, suas questões passaram a ser respondidas de forma cada vez mais
elaborada, impondo grande desafio àqueles que almejassem compreendê-las.
Paralelamente a isso, os países que foram vitimados por governos ditatoriais sofreram
com a extinção das disciplinas de Filosofia e Sociologia dos currículos escolares e
universitários, bem como, as corrosivas políticas de censura ao livre pensar. Isso
dificultou o encontro com grandes pensadores, impedindo que muitas pessoas
aprendessem a pensar com mais radicalidade. É possível que isso tenha colaborado para
o surgimento do interesse na literatura de autoajuda? Talvez.
A literatura de autoajuda não é necessariamente ruim. Conheço algumas pessoas
que deram os primeiros passos em direção a boas mudanças na vida tendo como ponto
desencadeador dessas mudanças obras de autoajuda. Eu as li em inúmeros momentos de
minha vida, e em alguns deles a leitura foi salutar. Todavia, é necessário certo
comedimento quando lidamos com ideias que muitas vezes podem simplificar em
demasia a complexidade das relações humanas, colocando em risco nossos processos
deliberativos e gerando resultados muitas vezes negativos em termos existenciais. Em
um mundo onde a mudança é a regra, certezas podem ser armadilhas.
Certa noite eu jantava com uma amiga filósofa e ela me perguntou: “Você quer
ouvir uma piadinha de filósofo?”. Depois de ouvir a piadinha - que de fato tem maiores
chances de ser compreendida por filósofos - fui tomado pelo desejo de escrever um livro
sobre gatos pretos. O livro materializou-se. Está em suas mãos. E você, já encontrou
gatos pretos?
A Ética estuda os princípios e as condutas humanas destinadas a alcançar a vida boa e a
convivência pacífica entre os diferentes. A Metafísica almeja responder às seguintes
questões: O mundo teve ou não um começo? O mundo sempre existiu ou foi criado? A
alma humana é imortal ou mortal? Já a Teologia, todos devem saber, devota-se ao estudo
de Deus e das doutrinas religiosas. Sabendo isso, responda: Qual é a diferença entre a
Ética, a Metafísica e a Teologia?
A Ética é uma pessoa, dentro de um quarto escuro, procurando um gato preto, e o gato
ESTÁ lá.
A Metafísica é uma pessoa, dentro de um quarto escuro, procurando um gato preto, e o
gato NÃO está lá.
A Teologia é uma pessoa, dentro de um quarto escuro, procurando um gato preto, o
gato NÃO está lá, e a pessoa brada alegre e saltitante: “Eu encontrei! Eu encontrei!”.
Pois é, no palco da autoajuda, e infelizmente também no campo do Coaching,
encontramos os mais diversos tipos de artistas, desde profissionais bem intencionados,
até tiranos da fé alheia. Todavia, algo em comum pode ser apreciado nos últimos: a
crença em “propostas milagrosas” que asseguram sucesso, na medida em que divinizam
suas metodologias, afirmando que o gatinho preto está no quarto, e alguns mais
delirantes garantem tê-lo encontrado, ainda que o bichano esteja vagando distante
pelos telhados da vida. O que esses autores e profissionais se esquecem de inserir em
suas equações da boa vida, são as variáveis do acaso; da pluralidade dos contextos em
que a existência se legitima; da complexidade das relações humanas e da singularidade
de cada ser pensante. Graças às personagens que atuam no campo das certezas,
propagaram-se, como fala Clóvis de Barros Filho - um professor que muito prezo e
admiro -, as literaturas de aeroporto e seus títulos engraçados: Dez lições para ser feliz!;
Liderança eficaz em cinco passos!; Os dez hábitos universais dos vencedores!; O abc
da realização afetiva do casal!; Leia o livro, mude sua vida e seja feliz!; O poder do
agora!; O poder da intuição;! O poder do silêncio;! O poder da PNL!; O poder da
coragem!; O poder dos quietos!; O poder da escolha!; O poder de delegar!; O poder
do hábito!; Isso sem falar das famosas sequências do tipo: O segredo desvendado; O
segredo do segredo desvendado, e; Compreendendo o segredo do segredo desvendado.
A Filosofia Morreu?
É quase certo que buscamos a mesma coisa: sermos felizes. Mas temos que
enfrentar desafios para encontrar esses fugazes momentos de alegria e satisfação.
Dilemas existenciais têm estado sempre presentes em nossa vida, ainda que imersos em
uma camada singular de verniz cultural. Mas, ao final da equação, o que quase todos
nós buscamos é a felicidade mesmo, quer na família; no trabalho; na sociedade ou
mesmo dentro de uma caverna, meditando na imensidão do Himalaia. Entretanto, qual a
estratégia mais adequada para ser feliz? Existirá uma única, como o filme O Segredo
nos propõe? A Filosofia tem sido um pouco mais parcimoniosa perante tais
prerrogativas, pois muitas são as propostas para o atingimento da vida boa, mas muitos
também são os obstáculos encontrados sobre da autoestrada que nos promete conseguir
tal façanha. Filosofar pressupõe certa submissão intelectual, comum aos que coexistem
com a dúvida, e rara àqueles que se vangloriam do encontro com o gatinho preto e
propagam verdades divinizadas na forma de imperativos que garantem sucesso em toda
e qualquer circunstância. Mas há quem discorde deste meu ponto de vista. Muitas
pessoas afirmam que a Filosofia morreu. Outras tantas acreditam que, ainda que viva, o
saber filosófico não nos é mais útil, pois outros saberes - como aqueles advindos das
Ciências -, o substituíram, tornando-o desnecessário e ultrapassado. Todavia, apesar
dessas afirmações, e da invasão dos pensamentos rasos e não abalizados em nossa
sociedade, nos últimos anos é possível notar certo movimento de retorno e
popularização da Filosofia. Muitos pensadores têm feito esforços para reconciliar a
Filosofia com o grande público. Arthur Meucci; Clóvis de Barros Filho; Lúcio Packter;
Monica Aiub; Mario Sérgio Cortela; Luiz Felipe Pondé; Julio Pompeu; Lou Marinoff;
Allain de Botton; Jule Evans; Jostein Gaarder; Luc Ferry; Michael J. Sandel; José
Maurício de Carvalho; César Mendes da Costa e Marc Sautet são alguns exemplos. Este
último nos convida a refletir sobre a necessidade do pensar filosófico em seu livro Um
café para Sócrates:
Pode ser que a filosofia tenha ficado estéril. Mas estará por isso morta? E será que a
esterilidade é fatal? Fala-se muito, ultimamente, em ética e moral, deplora-se a
corrupção dos políticos e dos homens de negócio, fica-se assustado com a extensão da
miséria excludente, do tráfico de drogas, da selvageria das guerras interétnicas e do
fanatismo religioso, invoca-se a solidariedade, o dever de intervenção, fica-se inquieto
com os trabalhos laboratoriais no campo das armas químicas e no da genética... Acima
de tudo, tenta-se não perder a cabeça e conservar o sangue frio. E, para consegui-lo, que
é que se faz? Acaso se faz astrofísica, microbiologia? Antropologia, sociologia,
psicopatologia? Economia política? Ou será que fazemos filosofia? Quando procuramos
descobrir o que não funciona bem na cidade, o que destrói a democracia, o que
compromete a justiça, a liberdade, a igualdade, em suma, as relações entre os cidadãos,
aquilo que impele os homens a se odiarem e a se matarem uns aos outros, quando
estendemos esse exame ao conjunto das nações, a ponto de considerar o destino da
humanidade inteira, que é que estamos fazendo? Na verdade, teremos algum dia tantas
razões para filosofar? (SAUTET, 2012, p.10).
Para um bom observador é possível notar grande movimentação em núcleos
culturais e livrarias no desenvolvimento de cafés filosóficos, ou seja, encontros
populares onde se discutem temas relativos às questões existenciais mais prementes.
Fora isso, a inegável necessidade de pensar a vida e as relações intersubjetivas também
tem influenciado o universo das grandes corporações, que começa a admitir a presença
de filósofos em seus corpos administrativos, quer seja como palestrante, consultor ou
mesmo membro de conselhos diretivos.
Passamos a vida deliberando, fazendo escolhas. Viver é escolher. A necessidade
de escolher bem, tem sido uma peça fundamental para o motor do pensamento
filosófico. Assim nasceu a Filosofia no ocidente. Esta ambição genuinamente humana
de decodificar o Cosmos, a coletividade e a si próprio não é somente uma mera
veleidade. Em nós, curiosidade e necessidade andam juntas. O ser humano não
consegue viver pautado apenas em seus instintos. Ele tem uma gigantesca necessidade
de criar-se a si mesmo a cada instante. O ser humano não nasce plenamente constituído.
Como nos dizia Sartre: precisamos viver para nos construir gradativamente uma vez que
“a existência precede a essência”. Esta fragilidade é o que diferencia o homem dos
animais e, por mais contraditório que possa parecer, é esta fragilidade a nossa maior
fortaleza. O homem pode ser mais. Ele quer abarcar a vida, realizá-la. O ser humano é
um ser por fazer-se, um vir a ser, um recriar-se a cada dia. Para tanto, se vê
invariavelmente frente a dúvidas que o impelem a realizar escolhas. Viver é escolher.
Todavia leitor/a, quais têm sido as suas escolhas mais singulares? Nos últimos anos
muitas pessoas afirmam que estamos passando por uma crise Ética, ou seja, uma crise
de escolhas. Mas, admirando a contemporaneidade com olhos mais atentos podemos
perceber a quantidade de deliberações pessoais que muitos de nós têm delegado a
terceiros. O personal trainer delibera por nós e para nós qual melhor exercício a fazer; o
nutricionista delibera o que devemos colocar em nosso prato; o designer de interiores
escolhe os quadros com o quais devemos decorar a nossa casa; os críticos de cinema
decidem quais filmes deveremos assistir; a mídia e a classe dominante escolhem o
padrão estético que devemos considerar como belo; o professor de visão estreita decide
o livro que devemos ler; a tecnologia delibera sobre os celulares e computadores mais
adequados para suprir nossas necessidades; a astrologia afirma como devemos conduzir
nosso dia; o profissional de feng shui decide em qual posição devem ficar nossas
estantes, nossas cômodas e nossa escrivaninha; e os autores de autoajuda deliberam
sobre os passos que devemos dar para sermos líderes eficazes, amantes bem sucedidos,
pais alinhados com as mais recentes propostas educacionais desenvolvidas por doutores
em pedagogia, entre outros assuntos da pauta desses sábios gurus. Sobra pouco para
nós! Eu, você, toda a humanidade, somos frutos das nossas escolhas, e muitas vezes
escolhemos não escolher. Decidimos delegar a outrem a responsabilidade que muitas
vezes poderia ser nossa. É óbvio que nem todas as nossas escolhas poderão ser
conscientes e livremente deliberadas. Nossa liberdade tem as dimensões das nossas
possibilidades e probabilidades de efetuar escolhas. Deliberamos com consciência
quando pensamos, ponderamos, interpretamos nossas emoções, nossos afetos.
Escolhemos com consciência quando nos colocamos no lugar do outro, quando levamos
em consideração as alegrias e tristezas que produziremos no outro como resultado de
nossas condutas morais. Ter consciência é condição imperativa para ser responsável;
para falar na primeira pessoa e responsabilizar-se por seus afetos. O ser humano pode
agir com o intuito de compreender e transformar o mundo. Ao menos o seu mundo, e
isso é denominado em Filosofia de práxis, que é a unidade entre reflexão e ação, tão
cara para aquele ser que pensa, como para aquele que ajuda a pensar: profissionais de
Coaching com base ontológica, filósofos acadêmicos, filósofos clínicos, professores e
líderes com inclinações e propensões ao pensar filosófico. Pensar a vida torna-se, então,
um imperativo para aumentar a probabilidade de tê-la bem sucedida e para evitar
arrependimentos tardios por ter se deixado levar pela vida ao embalo dos pagodes de
Zeca Pagodinho, “[...] deixa a vida me levar, vida leva eu...”.
O esmero com a vida deveria acompanhar o ser humano, pois na sua ausência
corremos o risco de ver manifestos os arrependimentos; o desmazelo; a negligência e a
indiferença, potentes deflagradores da melancolia, contemporaneamente chamada de
depressão. O desleixo em pensar a vida é o oposto da atitude filosófica. A indiferença é
o depauperamento da Ética. Caçar-se a si mesmo com liberdade deliberativa é o que nos
diferencia dos seres que conseguem sobreviver tendo como único instrumento seus
instintos, e a Filosofia pode ser uma grande parceira nesta jornada de caça pela vida
boa.
Caçador de Mim
Por tanto amor
Por tanta emoção
A vida me fez assim
Doce ou atroz
Manso ou feroz
Eu caçador de mim
Preso a canções
Entregue a paixões
Que nunca tiveram fim
Vou me encontrar
Longe do meu lugar
Eu, caçador de mim
Nada a temer senão o correr da luta
Nada a fazer senão esquecer o medo
Abrir o peito a força, numa procura
Fugir às armadilhas da mata escura
Longe se vai
Sonhando demais
Mas onde se chega assim
Vou descobrir
O que me faz sentir
Eu, caçador de mim.
Letra e música de Sérgio Magrão e Luis Carlos Sá. Interpretação imortalizada na voz de Milton
Nascimento.
Será Possível Encontrar o Gato Preto?
Como não poderia deixar de ser, meus objetivos com esta obra são múltiplos,
ainda que tenha me esforçado por conter minha já comentada “antibiotiquice de largo
espectro”. Almejo discorrer sobre as relações entre a Filosofia Acadêmica, a Filosofia
Clínica e o Coaching Ontológico, pontuando suas aproximações e seus distanciamentos
circunstanciais. No decorrer do texto apontarei para alguns aspectos dessas abordagens
que podem auxiliar líderes e professores em geral a exercer suas importantes atividades
profissionais com mais prudência, ampliando suas percepções dos temas abordados e
afim de ajudá-los a desenvolver um pensamento ainda mais crítico e abalizado, para que
possam responder por conta própria a questão mais premente deste livro: Será que é
possível encontrar o gato preto?
É imperativo que fique claro a você leitor/a que este não é um livro sobre a
história da Filosofia. Também não é um livro técnico sobre Filosofia Clínica e nem
tampouco um manual de Coaching Ontológico. Contudo, esta obra poderá servir como
uma pequena introdução a todas essas áreas, norteando o estudo daqueles que se
interessam por elas. Outro ponto que deve ser entendido é que evitarei utilizar o termo
filósofo para identificar os líderes e os professores que tenham “postura filosófica”,
pois, parto do pressuposto que as atividades de um filósofo acadêmico transcendem a
utilização do pensar filosoficamente o nosso cotidiano. Também não os chamarei de
coaches ontológicos e muito menos de filósofos clínicos, pois estas são denominações
utilizadas para definir profissionais que atuam com esses saberes de maneira formal e
rigidamente estruturada, o que definitivamente, também não é o caso. Sendo assim,
sempre que minha intenção for, fazer alusão a um profissional, seja ele um professor ou
um líder que se ampare no pensamento filosófico para exercer sua função com mais
comedimento e de maneira abalizada e crítica, farei uso do termo filósofo coach, com
intuito de diferenciá-los dos filósofos acadêmicos, dos coaches profissionais, dos
filósofos clínicos e também dos líderes, professores e gestores que, em seu dia a dia,
não têm o hábito de amparar suas condutas profissionais no pensamento filosófico.
Logo, a designação de filósofo coach será utilizada para definir aquele profissional que
entrou em contato com os pensamentos dos filósofos acadêmicos, ou com a Filosofia
Clínica, ou ainda com as bases teóricas da Ontologia da Linguagem e do Coaching
Ontológico, com vistas a fazer uso de parte de seus saberes sempre que tenha a intenção
de patrocinar em si, em outro sujeito ou em grupos e equipes, posturas que facilitem a
livre reflexão, a abertura para o diálogo, o pensamento crítico, e a argumentação sólida,
e o pensamento complexo.
As Subdivisões da Filosofia
No decorrer do texto apresentarei a você, leitor/a, algumas das áreas da
Filosofia, tais como a Antropologia Filosófica, que tem como função tentar responder
a clássica pergunta “O que é o homem?”. É inegável que a visão que o homem faz de si
está presente na complexa equação que origina suas crenças e que orienta suas escolhas.
Assim, o conhecimento dos pressupostos da Antropologia Filosófica pode colaborar e
ser de grande valia aos filósofos coaches que lidam com os modelos mentais dos
indivíduos que compõem grupos e equipes diversas.
A História da Filosofia nos auxiliará nos estudos dos seus distintos momentos;
de seus proponentes, de seus temas e das dificuldades que tentou resolver; das
afinidades e distanciamentos entre o pensamento filosófico e as condições políticas,
econômicas, sociais e culturais de uma sociedade; das transformações de concepção do
que seja a Filosofia e de sua função. Para o nosso filósofo coach, mergulhar no universo
da História da Filosofia é alimentar-se de informações sistêmicas e que desnudam parte
do gênio investigativo e do pensamento humano. Os fatos e personagens desta história
podem nutrir sua capacidade de investigar a maneira como as pessoas que lidam
observam o mundo.
A Metafísica investiga o que está além do mundo físico. Originou-se na tradição
clássica, mais precisamente com Aristóteles, que a designava Filosofia Primeira, algo
parecido ao que hoje se entende por Ontologia, que é o estudo da origem dos seres, de
suas essências. Esta área filosófica abarca os conceitos sobre a realidade, o ser, o
imutável, a verdade suprema, bem como as ponderações filosóficas e teológicas sobre a
causa primeira. Fique atento/a leitor/a, pois este assunto norteará grande parte das
reflexões que estão por vir.
A Lógica tem interesse na formulação de argumentos que atinjam resultados
válidos. Para isso, diversos pensadores trabalharam na análise das estruturas dos
raciocínios, organizando-os, interpretando-os e classificando-os. A análise lógica das
construções do pensamento e da fala ilumina potenciais falhas do processo de
investigação e explicitação da realidade e das crenças, e pode ser uma ferramenta útil ao
nosso filósofo coach.
Intimamente associada à Lógica está a Filosofia da Linguagem que tem como
objeto de estudo a manifestação da linguagem do homem, seus signos, seus
significados, seus alcances, suas limitações. Desde o início do século XX, a Filosofia da
Linguagem é uma das principais áreas da Filosofia. Sua importância para nosso filósofo
coach pode ser resumida nas ideias contidas na filosofia de Wittgenstein. Ele afirma que
muitas das questões e proposições dos filósofos provêm de não entendermos a lógica de
nossa linguagem. Segundo ele, não é de admirar que os problemas mais profundos não
sejam propriamente problemas.
A Teoria do Conhecimento e a Epistemologia embora difiram em alguns
aspectos quanto as suas intenções, - não me aprofundarei nesta questão - investigam
quais são os problemas oriundos da relação entre o sujeito e o objeto do conhecimento,
bem como as condições do conhecimento verdadeiro e os tipos de conhecimento.
Preocupam-se com as maneiras com as quais o sujeito tenta conhecer o mundo que o
cerca, apropriando-se dele. Em uma sociedade cada vez mais pautada em certezas
advindas das já citadas “fórmulas mágicas” de resolução de problemas, questionar a
maneira como nos apropriamos do mundo que nos cerca, pode ser uma ação eficaz para
expandir nossa capacidade perceptiva, transformando-nos em observadores mais atentos
às múltiplas possibilidades de interpretar aquilo que julgamos ser a “verdade do
mundo”.
A Filosofia Política estuda muitos assuntos que permeiam o universo do
filósofo coach: a relação entre a política do cotidiano e o exercício do poder; os limites
da autoridade; a violência efetiva ou velada; a coerção social e as imposições morais; a
origem das normas morais, das ideias conservadoras ou mesmo revolucionárias. Foram
os filósofos que investigaram as forças que geram, mantém e destroem o Estado e,
consequentemente, as relações entre seus cidadãos. Ao procurar entender a política,
conjecturando sobre a luta pelo poder, assim como sobre as instituições por meio das
quais se conquista e exerce este mesmo poder, pensadores como Platão, Locke, Hume,
Hobbes, Maquiavel, Spinoza, produziram colossais tratados sobre a natureza humana,
que ainda hoje podem ser de grande utilidade quando o assunto é a liderança.
De todas as áreas da Filosofia, a Ética ou Filosofia Moral será nosso eixo
norteador em busca da resposta para a questão que dá nome a este livro. Segundo
Danilo Marcondes, a Ética é:
[...] Uma das áreas que maior interesse desperta no campo da filosofia, sobretudo
porque diz respeito diretamente a nossa experiência cotidiana, levando-nos a uma
reflexão sobre os valores que adotamos, o sentido dos atos que praticamos e a maneira
pela qual tomamos decisões e assumimos responsabilidade em nossa vida
(MARCONDES, 2007, p.9).
Etimologicamente, a palavra “ética” origina-se do termo grego ethos, que significa o
conjunto de costumes, hábitos e valores de uma determinada sociedade ou cultura. Os
romanos o traduziram para o termo latino mos, moris (que mantém o significado de
ethos), dos quais provém moralis, que deu origem à palavra moral em português
(MARCONDES, 2007, p.9).
Logo, Ética e Moral são a mesma coisa? Sim e não. Apesar dos termos serem
sinônimos, aos poucos foi se estabelecendo na sociedade uma diferenciação entre eles.
Veja o que nos ensina Roger-Pol Droit em seu pequeno, mas elucidativo livro Ética:
uma primeira conversa:
Na época moderna, considerou-se com frequência que o termo “moral” pudesse estar
reservado ao tipo de normas e valores herdados do passado e da tradição, ou então da
religião. “Moral” especializou-se mais ou menos no sentido daquilo que “é
transmitido”, como código de comportamentos e juízos já constituídos, mais ou menos
cristalizados. Nesse sentido, aceitamos ou rejeitamos a moral de uma família ou de um
meio, seguimos os preceitos que a caracterizam ou os transgredimos. A moral parece
constituir um conjunto fixo e acabado de normas e regras.
Hoje, ao contrário, o termo “ética” é empregado principalmente para os campos em que
as normas e regras de comportamento estão por ser construídas, inventadas, forjadas por
meio de uma reflexão que é geralmente coletiva.
[...] Em resumo, se nós quisermos distinguir os dois termos, “moral” seria referente às
normas herdadas, “ética”, às normas em construção. “Moral” designaria principalmente
os valores existentes e transmitidos; “ética”, o trabalho de elaboração ou de ajuste
necessário em face das mudanças em curso (DROIT, 2012, p.18-19).
Neste livro, utilizarei os termos Ética e Moral como sinônimos, mas em algumas
ocasiões será necessário assumir a diferença pontuada acima por Roger-Pol Droit.
Todavia, deixarei claro a você leitor quando isso for necessário.
A Ética somente poderá ser definida como tal se houver possibilidade de
deliberação livre. Quando houver repressão, coerção, coibição ou medo envolvido no
ato da decisão, não se poderá classificá-la como Ética. O professor Clóvis de Barros
Filho costuma exemplificar isto em suas aulas usando como exemplo a utilização de
câmeras de fiscalização no trânsito ou àquelas colocadas em salas de aula. Seus
defensores afirmam que as primeiras, moralizam o tráfico, e as segundas ajudam a
moralizar o comportamento dos alunos. O já citado professor Clóvis - assim como
muitos outros pensadores da Ética - discorda, pois, sempre que uma ação for realizada
tendo como referência o medo de uma punição futura, ela não será livre, e não sendo
livre, Ética também não o será. Câmeras de trânsito podem melhorar o tráfego e evitar
acidentes, isso é indiscutível, mas, em contrapartida, desmoralizam-no. O mesmo se
pode afirmar das câmeras colocadas em salas de aula. Com esta ação, abstém-se do
diálogo e da problematização da convivência, privando os alunos de uma educação
Moral sólida em detrimento da atitude menos trabalhosa: a punição do estudante. O
resultado é sempre desanimador, pois a ação estimula um comportamento cínico,
dissimulado. Comporta-se de uma maneira na frente das câmeras e de outra quando se
está atrás dela. Estimula-se o engodo e a trapaça. Nada pior para uma sociedade tão
carente de educação, mas que caminha no sentido avesso às suas premissas mais
básicas.
Qual Vida Vale Mais?
Talvez não seja errado afirmar que sempre que temos mais de uma opção de
escolha, tendemos a optar por aquela que nos é a melhor, ou seja, a de maior valor. Por
exemplo, sempre que aplico uma prova aos meus alunos tenho o desafio de valorá-las, e
faço isso atribuindo a eles uma nota - geralmente entre zero e dez pontos. Todavia, a
nota que concedo aos meus alunos não é aleatória, pois me amparo em alguns critérios
pré-estabelecidos. No momento da correção levo comigo um gabarito perfeito. A prova
nota dez está em minhas mãos, e em posse dela posso decidir o valor das provas de
meus alunos. Com isso meu trabalho de escolha fica amplamente facilitado. No entanto,
nem toda tomada de decisão é tão simples assim. Quando a coisa complica entraremos
no complexo mundo da Axiologia.
A Axiologia é a área da Filosofia que estuda os valores quando os
compreendemos no sentido Ético ou Moral, ainda que muitos estudiosos creiam ser
equivocado afirmar que a Axiologia seja uma área da Filosofia, uma vez que a Ética já
se ocuparia do estudo dos valores. Controvérsias à parte, o estudo dos valores é
imprescindível para o nosso filósofo coach, não pelo fato de ter que atribuir notas a
alunos, mas por um motivo mais sofisticado: caberá a ele atribuir nota às diferentes
vidas que poderá viver, e caberá a ele, também, ajudar pessoas a pensar com mais
sagacidade esta intrigante questão. Coaches, filósofos clínicos e filósofos coaches lidam
diariamente com desafios éticos. Conjecturam sobre o comportamento humano e as
noções que tecemos sobre o bem e o mal, o certo e o errado, o justo e o injusto.
Presenciamos o desenrolar da Ética e do estudo dos valores quando, por exemplo, um
aluno escolhe sua futura carreira na fase pré-vestibular; um cliente toma uma decisão
difícil durante um processo de Coaching; ou uma equipe de trabalho decide enfrentar
um desafio corporativo lançando mão de uma, dentre dezenas de estratégias possíveis.
Em todas essas situações estaremos escolhendo vidas supostamente mais valorosas e
deixando de viver inúmeras outras que julgamos ter valor menor. Logo, estaremos no
coração da Ética quando fazemos as seguintes perguntas: Qual escolha é a mais
adequada neste momento?; O que ganho se decidir trilhar o caminho A e não o B?; O
que perco indo em direção de A ou de B?; Como o sistema no qual estou inserido será
afetado pela minha escolha?; O que este sistema poderá perder?; O que poderá ganhar?;
Como esta escolha afetará a minha vida nos próximos anos? Porém, nem sempre nos
fazemos essas perguntas nos momentos de deliberação, e o preço por agir desta maneira
pode ser amargo. Arrependimentos, amarguras, remorsos e melancolias são comuns
àqueles que agem por impulso. Sendo assim, a Ética ou a Filosofia Moral pode nos
ajudar em pelo menos dois aspectos. O primeiro diz respeito às conjecturas que faz
sobre os códigos e sistemas morais elaborados ao longo de nossa história, assim como
seus impactos em nossa trajetória existencial. O segundo relaciona-se à organização dos
princípios de vida ou valores de conduta capazes de nos orientar para uma ação
eticamente correta durante processos deliberativos - ainda que isso seja discutível e
complexo. Se levarmos em consideração a diferenciação dos termos comentada mais
acima, o primeiro aspecto estaria relacionado à Moral, e o segundo a Ética.
Independente da cultura em que se esteja inserido, sempre será possível
encontrar ideias que definem o que é considerado importante, válido e desejável para
uma dada comunidade. Tais ideias refletem os princípios ou valores transmitidos de
geração em geração, ou seja, os códigos morais que concedem sentido e direção aos
agentes sociais que compõe essa comunidade e ajudam a erigir uma determinada
cultura. A monogamia é um exemplo de valor encontrado na maioria das sociedades
ocidentais (GIDDENS, 2005, p.39). Sendo assim, as normas de conduta instituem
comportamentos que refletem os valores de uma cultura. Na sociedade, os valores dão
origem às normas e essas estabelecem a maneira pela qual se espera que os membros de
uma comunidade se comportem. Por exemplo, a maioria dos alunos na Grã-Bretanha se
sentiria ofendida ao encontrar um colega “colando” em uma avaliação qualquer, pois
em sua cultura copiar a resposta de outro aluno fere os valores da igualdade de
oportunidade, respeito às regras e trabalho duro para atingimento de metas. Por sua vez,
estudantes russos ficariam surpresos diante do sentimento dos colegas britânicos, pois
amparar outro colega para que seja bem sucedido em um exame são ações que refletem
o valor que os russos dão à solução coletiva de problemas (GIDDENS, 2005, p.39).
Porém, nem sempre os valores de uma sociedade - Moral - refletem os valores
do indivíduo - Ética, e nutro a opinião de que investigar com profundidade nossos
valores é um passo imprescindível para que possamos escolher a vida que mais vale a
pena vivermos. A vida boa tem que fazer sentido para o vivente, e para mais ninguém.
Por isso, quero convidá-lo/a investigar os termos “significado” e “propósito”. Pense em
você sentado/a em um restaurante com um cardápio em mãos. Agora responda: Qual o
seu propósito neste momento? Arrisco a dizer que é ter uma boa refeição. Correto? E
qual o significado do cardápio que tem em mãos? Auxiliá-lo/a na escolha da refeição.
Todavia, imagine-se abrindo o cardápio e percebendo que ele está escrito em um idioma
que você desconhece. Imediatamente o cardápio perderá o significado, mas seu
propósito permanecerá com você. Posso hipotetizar outra situação. O cardápio pode
estar escrito em português, e você pode perceber o significado dele, ainda que este
significado não esteja a serviço de nenhum propósito, pois agora você não deseja uma
refeição, uma vez que esta somente acompanhando um amigo ao restaurante. Logo,
significados podem ser ações que nos auxiliam no atingimento de metas, na realização
de propósitos. Percebemos que determinadas ações que fazemos são significativas para
que possamos atingir nossos propósitos, mas também temos a capacidade de identificar
ações significativas para a conquista de metas que não sejam as nossas. Por isso somos
seres empáticos. Como coach ontológico tenho atendido uma grande quantidade de
clientes que se mostram angustiados com a falta de propósito em suas vidas. Muitos
parecem confundir “significados” com “propósitos”. Se voltarmos ao nosso restaurante,
o exemplo bizarro que simbolizaria isso seria você devorando o cardápio ao invés de
degustar uma refeição. Você já se perguntou qual propósito de sua vida? Já analisou
com parcimônia “os porquês” de suas ações no mundo? Saberia dizer com clareza a
qual propósito suas ações estão a serviço? Infelizmente, muitos de nós não temos
resposta para essas questões, e outros tantos, principalmente com o passar dos anos,
angustiam-se com esta situação. Um antídoto possível para isso é filosofar. Pensar
propósitos de ações é função de profissionais que orientam suas condutas por meio da
Filosofia. Ajudam a estabelecer estratégias, pensar em ações adequadas, valorar
condutas. Significado, estratégia e valores meios passam a ser sinônimos nesta
complexa equação do bem viver. Atingir propósitos torna-se dependente da adequação
das condutas, e para adequá-las é prudente investigar os valores que as nortearão.
Valores meios a serviço de um valor fim, de um propósito maior, de uma missão de
vida, do atingimento de uma identidade singular.
Quais valores têm norteado suas condutas com vistas ao atingimento da vida
boa? Respeito; Lealdade; Companheirismo; Amizade; Dinheiro; Resultado; Prazer;
Obediência; Disciplina; Comiseração; Ternura; Generosidade; Consumo; Força;
Aprendizagem Contínua; Sexo; Responsabilidade; Segurança; Liberdade; Fé; Família;
Perseverança; Transparência; Honestidade; Perdão; Fidelidade; Individualidade;
Igualdade; Meritocracia; Paz; Diversão; Conexão; Não Violência; Tolerância;
Laicidade; Religiosidade; Sinceridade; Esperança; Cooperação; Foco; Competição;
Comprometimento; Amor; Criatividade; Bondade; Empatia; Partilha; Tradição; Alegria;
Doação; Serenidade; Gratidão; Esperança; Humildade; Orgulho; Identidade;
Crescimento; Serviço; Carinho; Abertura; Comunicação; Repouso; Misericórdia;
Altruísmo; Transcendência; Estima; Desprendimento; Acolhimento; Justiça; Confiança;
Entusiasmo; Cuidado; Diálogo; Flexibilidade; Imparcialidade; Vontade; Determinação;
Coragem; Assertividade; Agilidade; Conhecimento; Compreensão; Entusiasmo;
Compromisso; Inovação; Maturidade; Humor; Organização; Beleza; Equilíbrio;
Parcimônia; Comedimento etc. A lista vai ao infinito. Todavia, é preciso escolher, pois
somente por meio desta escolha estaremos afirmando para o mundo, e para nós mesmos,
quem somos, quem queremos ser, quem não somos e quem não queremos ser.
A Complexidade dos Valores
A complexidade e suas decorrências são os alicerces do chamado “pensamento
complexo” ou “teoria da complexidade”, exposto e parcialmente desenvolvido por
autores como Warren Weaver, Gaston Bachelard, Anthony Wilden e Edgar Morin, que
vê o mundo como um todo indissociável e sugere uma abordagem multidisciplinar e
multirreferenciada para a construção do conhecimento. A complexidade contrapõe-se
aos pensamentos simplistas amparados em uma causalidade linear, ou seja, “isso é
assim por causa daquilo”. A complexidade tem uma visão orgânica do mundo e
investiga as redes de acontecimentos que dão origem ou fim aos fenômenos observados.
Esta forma de investigação tem influenciado muitos campos do saber, tais como a
Matemática, a Física, a Biologia, a Sociologia, a Meteorologia, a Medicina, entre outras.
A Filosofia também tem sido fortemente impactada pelo pensamento complexo, e a
Ética não poderia ficar de fora desta investigação. Segundo Edgar Morin “Quando se
trata de obedecer a um dever simples e evidente, o problema não é ético, mas ter a
coragem, a força e a vontade de realizar seu dever. O problema ético surge quando dois
deveres antagônicos se impõem” (MORIN, 2011, p.47). Ou seja, escolher entre um bem
e um mal é fácil, o problema se instaura quando temos que decidir entre dois bens ou
dois males. A contradição está sempre presente no pensamento complexo, e a Ética não
escapa a este dilema. Por mais que desejemos, não há - como querem os autores de
autoajuda -, soluções categóricas e simplistas que possam ser adequadas em todas as
circunstâncias. Imperativos éticos antagônicos surgem frequentemente em nossa vida,
determinando conflitos de deveres que podem nos levar a situações angustiantes. “As
grandes dificuldades éticas estão menos numa insuficiência do que num excesso de
imperativos” (MORIN, 2011, p.47). Acompanhe:
Existem contradições éticas entre dois “bens” a promover e entre dois males sem que se
saiba qual é o pior. Indiquei que podia haver antagonismo entre a ética para o indivíduo
e a ética para a sociedade. Deve-se destacar também, como mostra o teorema de Arrow,
a impossibilidade de harmonizar completamente o bem individual e o bem coletivo, a
impossibilidade de agregar um interesse coletivo a partir de interesses individuais,
assim como de definir uma felicidade coletiva a partir do conjunto de felicidades
individuais. Em geral, podemos concluir pela impossibilidade de estabelecer um
algoritmo de otimização nos problemas humanos, ou seja, pela impossibilidade de
conceber e garantir um bem soberano. Com efeito, a busca de otimização ultrapassa
todo potencial de investigação disponível e, finalmente, otimiza a busca de otimização.
Devemos limitar-nos a elaborar soluções “satisfatórias”, as do mal menor? (MORIN,
2011, p.48).
Como vimos, é muito comum entre as literaturas simplistas os títulos que
apregoam “o poder” de determinados valores, como o poder do amor; da generosidade;
do hábito; da paciência; da persuasão; da meditação; do perdão; do silêncio; do agora;
da tolerância etc. Contudo, a maneira como tais livros são escritos faz vistas grossas às
contradições inerentes a toda complexidade do existir. “Há contradição na tolerância.
Até que ponto se deve tolerar aquilo que pode destruir a tolerância? Quando a
democracia esta em perigo, a tolerância pode tornar-se suicida” (MORIN, 2011, p.47).
O sociólogo Max Weber afirma que estamos todos submetidos a uma multiplicidade de
deveres e passamos a vida reféns de um forçoso politeísmo de valores - uns entrando em
conflito com outros (MORIN, 2011, p.48). Desfruta-se da segurança de um emprego
público, mas reclama-se da falta de liberdade para gerenciar uma agenda diária flexível.
Logo, responda: Qual valor vale mais, liberdade ou segurança? Defende-se com unhas e
dentes o valor transparência, mas luta-se pela manutenção da privacidade individual e
coletiva. Os conflitos éticos vão ao infinito: respeito versus prazer; disciplina versus
diversão; inovação versus tradição; confiança versus desconfiança. Eu sei, você está se
perguntando se a desconfiança é um valor. Sim! É óbvio que sim. A Filosofia não é
hipócrita nem tampouco está a serviço daquilo que Luiz Felipe Pondé chama de “a
praga do politicamente correto” (PONDÉ, 2012). Logo, abdique da desconfiança em sua
vida e perceba como ela se transformará em uma vida muito mais trabalhosa,
desafiadora e potencialmente entristecedora. É somente uma questão de bom senso.
Morin continua:
[...] Enfim, há um conflito inerente e muito profundo no seio da finalidade ética, pois a
realidade humana comporta três instâncias: indivíduo, sociedade, espécie; finalidade
ética é, então, trinitária. Assim, necessitamos de um dever egocêntrico para viver pelo
qual cada um é para si mesmo centro de referência e de preferência. Temos um dever
genocêntrico pelo qual – genitores, prole, família, clã – constituem o centro de
referência e de preferências. Temos um dever sociocêntrico pelo qual nossa sociedade
se impõe como centro de referência e de preferência (MORIN, 2011, p.48).
[...] Esses deveres são complementares, mas embora surjam ao mesmo tempo, tornam-
se antagônicos (MORIN, 2011, p.48).
O filme A missão do gerente de recursos humanos representou Israel no Oscar
2010. Na película, um gerente de RH da maior empresa panificadora de Jerusalém vive
uma sucessão de conflitos em sua vida. Ele se separou da sua mulher e, apesar de gostar
muito de sua filha, sabe que tem sido um pai ausente e deseja reverter esta situação.
Todavia, depois de mais uma promessa de resgate de proximidade com sua filha, uma
de suas funcionárias morre em um atentado terrorista, e ele é designado para
acompanhar o cadáver da moça até sua terra natal, a Rússia. Contudo, o cumprimento
deste dever profissional, cívico e humano pressupõe o descumprimento da promessa
feita à sua filha. A complexidade da Ética se impõe soberana produzindo a angústia
existencial tão comum àqueles que gozam da liberdade deliberativa, mas que necessitam
pagar o preço das escolhas que realizam. Edgar Morin nos alerta:
A incerteza ética depende não somente da ecologia da ação (uma boa intenção não pode
produzir o mal?), das contradições éticas, das ilusões do espírito humano, mas também
do aspecto trinitário pelo qual a autoética, a socioética e a antropoética são, ao mesmo
tempo, complementares, concorrentes e antagônicas. Deve-se em cada ocasião
estabelecer uma prioridade e fazer uma escolha (aposta) (MORIN, 2011, p.57).
[...] Onde está a justiça? (A cada um conforme seus méritos? A cada um conforme as
suas necessidades?) Onde está a verdade ética superior? Lei? Castigo? Misericórdia?
Perdão? (MORIN, 2011, p.58). [...] Onde está verdadeiramente o bem? Na obediência à
lei (moral bíblica)? Na virtude (moral aristotélica)? No amor (moral paulina)? Na
insubmissão? (MORIN, 2011, p.58).
Todas essas perguntas têm sido balizadoras de parte do pensar filosófico, e
espero que você não tenha esquecido de que iniciei esta introdução pontuando um dos
objetivos deste livro. Sendo assim, acrescento às perguntas acima, aquela que deu
origem ao título deste livro: Onde está o gato preto?
Marcello Árias Dias Danucalov
Santos, XX, de XXXXXXX, de 2017
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