10
11 Observava, falava pouco, dava as fotos e ouvi muito. Tim, Rei “Festeiro” por vários anos, falou-me a importância do trabalho de registro do Congado: Não adianta eu querê passa pra você, meu exemplo, e de repente, você fica sabendo de tudo isso e fica quieta, não dá continuidade à festa, porque o intuito maior é dar continuidade a festa, não deixar acabar. 1.2.2.Metodologia dos Inventários Os inventários contidos nesse trabalho foram produzidos por Fabíola Benfica Marra que a seguir esclarece a sua trajetória ao executar esse trabalho. Segundo ela, o convite para fazer o inventário dos ternos de Congado de Uberlândia partiu de Anderson Ferreira – Diretor de Memória e Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura de Uberlândia - no mês de agosto de 2006. Quando aceitei o convite, recebi extenso material para pesquisa: o dossiê do tombamento do Quilombo do Ambrósio, formulários de tombamento de patrimônio histórico material do município, algumas fichas com início de registro de alguns ternos e as diretrizes para procedimento do registro do patrimônio cultural imaterial. O primeiro trabalho foi de adaptação destes formulários à realidade do Congado. Aproveitei o formulário de estruturas arquitetônicas e urbanísticas para registrar os quartéis. Existia um formulário para registro de oratório que foi adaptado para o registro dos estandartes, bandeiras e bastões. Realizei pesquisa na internet para buscar referências para as informações complementares, principalmente do oratório, do estandarte e do bastão, elaborando um texto dialogando com as informações obtidas junto aos capitães de Congado. Na Festa em Louvor à Nossa Senhora do Rosário, em outubro de 2006, antes mesmo de assinar convênio com a prefeitura iniciei o registro da festa, fotografando os ternos, buscando registrar principalmente estandarte, bandeira e bastões. Após assinado o convênio com a prefeitura iniciei o trabalho de campo, fazendo visitas aos quartéis dos ternos para registrar o terno, o quartel, a(s) bandeira(s), o(s) estandarte(s), o(s) bastão(ões) e o(s) oratório(s). O registro era previamente agendado, por telefone ou em reuniões semanais da Irmandade do Rosário ou em visita i n t r o d u ç ã o

parte 01 de 02 - PAG 1 a 136 - uberlandia.mg.gov.br · de estruturas arquitetônicas e urbanísticas para registrar os quartéis. ... tratado como Sertões. As picadas de Pium e Jacuí,

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11

Observava, falava

pouco, dava as fotos e ouvi

muito. Tim, Rei “Festeiro” por

vários anos, falou-me a

importância do trabalho de

registro do Congado: Não

adianta eu querê passa pra

você, meu exemplo, e de

repente, você fica sabendo

de tudo isso e fica quieta,

não dá continuidade à festa,

porque o intuito maior é dar

continuidade a festa, não

deixar acabar.

1.2.2.Metodologia

dos Inventários

Os inventár ios

contidos nesse trabalho foram

produzidos por Fabíola

Benfica Marra que a seguir

esclarece a sua trajetória ao

executar esse trabalho.

Segundo ela, o convite para

fazer o inventário dos ternos

de Congado de Uberlândia

partiu de Anderson Ferreira –

Diretor de Memória e

Patrimônio Histórico da

Secretaria Municipal de

Cultura de Uberlândia -

no mês de agosto de

2006. Quando aceitei o

convite, recebi extenso

material para pesquisa:

o dossiê do tombamento

do Quilombo do

Ambrósio, formulários de tombamento de patrimônio histórico

material do município, algumas fichas com início de registro de

alguns ternos e as diretrizes para procedimento do registro do

patrimônio cultural imaterial. O primeiro trabalho foi de adaptação

destes formulários à realidade do Congado. Aproveitei o formulário

de estruturas arquitetônicas e urbanísticas para registrar os quartéis.

Existia um formulário para registro de oratório que foi adaptado para

o registro dos estandartes, bandeiras e bastões. Realizei pesquisa

na internet para buscar referências para as informações

complementares, principalmente do oratório, do estandarte e do

bastão, elaborando um texto dialogando com as informações obtidas

junto aos capitães de Congado. Na Festa em Louvor à Nossa

Senhora do Rosário, em outubro de 2006, antes mesmo de assinar

convênio com a prefeitura iniciei o registro da festa, fotografando os

ternos, buscando registrar principalmente estandarte, bandeira e

bastões. Após assinado o convênio com a prefeitura iniciei o trabalho

de campo, fazendo visitas aos quartéis dos ternos para registrar o

terno, o quartel, a(s) bandeira(s), o(s) estandarte(s), o(s) bastão(ões)

e o(s) oratório(s). O registro era previamente agendado, por telefone

ou em reuniões semanais da Irmandade do Rosário ou em visita

in trodu ção

12

prévia ao quartel. Em alguns ternos foram necessárias várias visitas

para conseguir fazer efetivamente o registro, os objetivos da pesquisa

foram expostos aos capitães e madrinhas e em apenas um foi

desautorizado o pedido de inventário, ficando incompleto o registro

do terno Moçambique Guardiões de São Benedito. Intempéries

climáticas dificultaram os inventários

principalmente nos meses de janeiro à

março. Alguns ternos estão atualmente

sem quartel fixo, outros guardavam

bandeira ou estandarte ou oratório em

residência distante do quartel,

inviabilizando o registro. O oratório do

terno Catupé Azul e Branco de Nossa Senhora do Rosário e São

Benedito foi destruído em um incêndio e o terno de Congado Beira-

mar não possui oratório por não realizar novenas e leilões de campanha.

O trabalho de campo consistia em entrevista sobre o histórico dos

ternos, quartéis e de seus elementos rituais, captação de fotografias,

desenhos de plantas baixas dos quartéis e medidas dos oratórios,

estandartes, bandeiras, bastões e quartéis. Consegui concluir os

trabalhos de campo dos vinte e seis (26) ternos da cidade em julho de

2007, uma média de três ternos por mês. Os manuscritos das plantas

baixas dos quartéis foram entregues no dia 01 de agosto de 2007

para prefeitura repassar à Paginar Serviços de Arquitetura, Urbanismo

e Paisagismo Ltda proceder à digitalização. A atividade que requer

maior dedicação, concentração e empenho é o chamado trabalho de

gabinete. Transportar para os formulários as informações obtidas no

trabalho de campo, transformar manuscritos de entrevistas em textos

coerentes. A dificuldade é maior por ter que conciliar o curto tempo

para entrega do trabalho à prefeitura e o compromisso ético da

profissão do antropólogo com a

comunidade pesquisada e a

responsabilidade de registrar da

maneira mais completa possível

uma manifestação de variadas

facetas. Fabiola é graduada no

bacharelado em Ciências

Sociais pela Univ ersidade

Federal de Uberlândia/MG em

2003 e publicou através do Fundo

de Incentivo à Cultura da

Secretaria da Cul tura de

Uberlândia, um catálogo (em

anexo) sobre a sua pesquisa

sobre o Congado de Uberlândia

intitulado Álbum de Família Afro-

Descendente. O álbum recolhe

fotografias antigas dos acervos

pessoais dos ternos de Congado

da região, além de apresentar

algumas análises de parentesco

dos ternos. (contato:

[email protected])

13

$�%�&��'

14

2.1. Informe histórico do TriânguloMineiro e Alto Paranaíba

A História da região do sudoeste de Minas Gerais se dá no

início do século XIX, em um momento tardio de povoamento em

comparação com o centro do estado ou com o l i toral.

Economicamente, pode-se dividir nos períodos do ouro, dos

boiadeiros, da construção da ferrovia, indústria e, por último, serviços.

No entanto, a história de nenhuma região se resume aos ciclos

econômicos fechado como os apontados acima.

A peculiaridade da povoação da região reside no fato de

haver uma população negra anterior ao povoamento feito pelos

brancos, à qual se agruparam aos recém chegados escravos dos

generalistas do século XIX. Os generalistas eram famílias que,

normalmente, vinham da região aurífera de Minas Gerais com todas

suas posses, procurando novos aluviões de ouro e terras para se

instalarem, em direção centrífuga, foram eles que ocuparam as terras

ao sudoeste e fizeram os primeiros povoados. Ao mesmo tempo que

surgiam esses povoados no Triangulo Mineiro e Alto Paranaíba

surgiam os primeiros Compromissos das Irmandades do Rosário,

composta pelos escravos recém

chegados e pelos antigos moradores

dos quilombos da região.

Se, no período Imperial, o

governo lançou tentáculos pelos

povoados dos Sertões do sudoeste

de Minas; na época colonial, a coroa

portuguesa também teve olhos para

a região, conhecida, então, como

Campo Grande. Nesse momento,

os Sertões das Gerais não eram

habitados somente pelos índios

bugres e caiapós, mas também

por negros fugidos aquilombados.

O foco da ação da coroa

portuguesa, no século XVIII, foi

direcionado para políticas de

apoio aos capitães do mato, que,

ao findarem com os quilombos,

recebiam as terras submetidas

como sesmarias.

O trajeto que inicialmente

era conhecido como terra do

Campo Grande passa a ser

tratado como Sertões. As

picadas de Pium e Jacuí, que

faziam com que o ouro

escorresse das mãos dos

portugueses, começam a ser

15

h istória

vigiadas pelos capitães de mato.

Em 1741, o foco da ação

do governo da capitania estava

dirigido à Comarca de Rio das

Mortes, onde o Quilombo do

Ambrósio chamava atenção

das autoridades,

principalmente pelas

dimensões que ganhara. O

primeiro ataque a esse

quilombo foi em 1746, sob

comando do capitão do

mato José Ribeiro Guimarães.

Depois da primeira dispersão dos

qui lombolas, houv e outra

expedição em 1753 e mais uma

em 1756, esta comandada por

Francisco Ferreira Fontes. A

expedição ao Campo Grande do

Mestre de Campo, Regente e

Guarda Mor Inácio Correia

Pamplona, em 1769 eliminou

vários quilombos e inclusive o

Ambrosio (Manuscrito, Biblioteca

Nacional). Vinte e sete quilombos

encontravam se na região (hoje

Alto São Francisco e Alto

Paranaíba) – Gondu, Kalunga,

Quebra Sê, Boa Vista, Paiol,

Cascalho, Ambrósio (distrito de Cristais/

MG), Ouro Fala, Pedras, Goiabeiras,

Oopeo, Boa Vista, Nova Angola, Pinhão,

Caeté, Zondu, Cala Boca, Careca e outros

nove localizados nos arredores de

Patrocínio, São Gonçalo, Mammi, Ajudá,

Indaa, Pernaiba e Marcela e Ambrósio

(distrito de Ibiá/MG). Bambuí foi o último

remanescente, destruído em 1781

(Martins, 1995).

Os quilombolas escolhiam sua

localização de acordo com os

elementos oferecidos pelo ambiente

buscando áreas que lhes possibilitasse

a permanência (agricultura e pecuária

de subsistência, assaltos às tropas de

comerciantes e v iajantes e

contrabando) e a defesa da

comunidade. O caso do Quilombo do Ambrósio, na zona rural de Ibiá/

MG, pode se verificar essa toponímia. A área é tombada pelo Patrimônio

Histórico (laudo IPHAN 004/98) desde 1998.

Dando seqüência à política de povoamento, no século XIX, as

diretrizes governamentais começavam com a redefinição das

comarcas, a criação das freguesias e a contagem das populações

locais. Se, até então, a capitania de Minas Gerais se dividia em 4

comarcas (Vila Rica, Rio das Mortes, Sabará e Serro-Frio), ao longo

do século XIX, a configuração geopolítica se transformou até constituir

o que se conhece no século XX. Em 1815, em parte da Comarca de

Rio das Mortes, foi criada a Comarca de Paracatu, que abrangeu toda

16

a região oriental do Rio São Francisco até Goiás. A Carta Régia de

1816, assinada por D. João VI, anexava definitivamente a Minas Gerais

o Julgado de Desemboque. Começaram os incentivos para a ocupação

das terras de quilombo de Serra do Salitre, Salitre, Serra Negra,

Marrecas, Brumado (atual Patrocínio) e Araxá. O Sertão da Farinha

Podre (hoje, referente às terras que vão do vale do rio Paraíba até Sul

de Goiás, onde se localiza Uberlândia) foi uma das últimas regiões a

serem povoadas. Por causa de sua localização geográfica, o Sertão

da Farinha Podre passou a ser um entreposto para os avanços das

bandeiras. Local de descanso e comércio de tropas, na rota de tropeiros

e mineradores em direção a Goiás e Mato Grosso eram encontrados

grande quantidade de mantimento apodrecido que era deixado nas

picadas por quilombolas, indígenas e bandeirantes que acreditavam

na volta encontrá-lo.

Nos últimos anos, as construções de hidrelétricas têm

destruído paulatinamente os vestígios arqueológicos destes quilombos

que geralmente escolhiam áreas estratégicas próximas aos rios para

se instalar.

2.2. Histórico do Município

O Sertão da Farinha Podre, como era denominada a região

do Triangulo Mineiro, teve iniciada a sua ocupação no século XIX,

apesar de ser uma região já conhecida pelos bandeirantes que por ali

passavam e iam ocupar outras paragens. O território brasileiro foi

povoado a partir do litoral. Os portugueses chegaram às costas brasi-

leiras e ali permaneceram por algum tempo. A floresta determinava

enormes dificuldades à expansão da ocupação portuguesa. Somente

no século XVII, os habitantes da

Capitania de São Vicente come-

çaram a exploração do interior e

para isso criavam expedições que

utilizavam como via os rios e os

caminhos que seguiam as trilhas

indígenas. Estas expedições bus-

cavam inicialmente a captura de

índios. Nesta empreitada os des-

bravadores chegaram até Minas

Gerais e encontraram o ouro e

pedras preciosas. O percurso era

feito de forma a permitir o plantio

de mandioca, milho, abóbora, fei-

jão e batata. Construíam ranchos

que tinham como finalidade a cri-

ação de um espaço que seria

aproveitado durante o retorno da

expedição. Esta forma de admi-

nistrar a viagem era conhecido

como a “marcha paulista”.

Após a descoberta do

ouro nas Minas Gerais, os

paulistas e os emboabas entra-

ram em conflito. Emboabas era a

denominação dada aos homens

que vieram do nordeste para ex-

plorar o ouro encontrado pelos

17

h istória

bandeirantes. A guerra afastou

grande parte dos paulistas do tão

sonhado Sabarabuçu - região

constituída pela Bacia do Rio das

Velhas. Hoje podemos dizer que

compreendem as atuais cidades

de Belo Horizonte, Sabará, Nova

Lima, Raposos, Rio Acima,

Caeté, Ouro Preto, Cachoeira do

Campo, então circunscritas no

perímetro da citada Ba-

cia. A conhecida Guer-

ra dos Emboabas esti-

mulou e ensejou a ida

dos sertanejos para o

oeste.

O caminho

para o oeste já era uti-

lizado pelos bandeiran-

tes desde meados do

século XVII quando di-

versas bandeiras bus-

caram gentios para es-

cravizarem. Como eram seguido-

res da “marcha paulista” várias pa-

radas foram estabelecidas no tra-

jeto que ligava a Piratininga (São

Paulo) a Vila Boa (Goiás Velho).

Os índios da região dos goiases, na maioria caiapós, eram de índole

guerreira e não aceitavam com facilidade a escravidão, muito menos

a presença dos paulistas em seu território. Em razão da belicosidade

dos caiapós, a passagem para a Vila Boa se tornou perigosa, dificul-

tando sobremaneira a colonização da região. Os índios atacavam

qualquer um que passasse em seu território e já nas primeiras déca-

das do século XVIII às bandeiras começaram a sofrer os primeiros

ataques. A solução do problema veio com a contratação pela Coroa

do bandeirante Antônio Pires de Campos para pôr fim àquela guerra,

por meio da civilização dos bugres ou o seu extermínio.

Mapa antigo com parte do tra-

çado original da Estrada dos Goiases

(em amarelo), concebida para integrar

um conjunto de vias construídas no

sentido meridional, ligando a foz do Rio

da Prata a São Paulo, esta a Goiás e

o Planalto Central a Belém. Fonte:

Embrapa Monitoramento por satélite,

1998. Disponível em: <http://www

.comciencia.br/reportagens/goiases/

goiases1.htm> Acesso em: 26 fev.

2007, 20:00.

O bandeirante Antônio Pires

de Campos era possuidor de larga experiência em aldear silvícolas;

fez fama em razão de seu vitorioso trabalho na região de Goiás Ve-

lho. Casado com Sebastiana Leite da Silva com quem teve quatro

filhos conhecidos: Manoel de Campos Bicudo, Coronel Antônio Pires

de Campos, Salvador Jorge Pires e Luiza Leme. Diante da demanda

18

vitoriosa contra os caiapós, seus filhos homens se estabeleceram na

região do triângulo. Em 1741, a família do bandeirante construiu a

Aldeia de Rio das Pedras, onde hoje está edificada a cidade de Cas-

calho Rico, nas terras entre o Rio Grande e o Paranaíba. Na mesma

época, um veio de ouro foi encontrado e motivou o surgimento do

povoado de Desemboque que na época atraiu outros bandeirantes.

Nos arredores, desenvolveram-se as aldeias de Santana e Pissarrão.

No Triângulo, o Rio Paranaíba é o que faz a divida de Minas

com Goiás e o Rio Grande marca a fronteira com São Paulo. Assim,

as terras de Antônio Pires de Campos ocupavam toda a região do

“nariz” de Minas. Fonte: http://www.ambientebrasil. com.br/estadual/

hidrografia/hmg.html

A razão do triângulo mineiro ter sido conhecido como Sertão

da Farinha Podre tem referência aos alimentos que apodreciam com

facilidade na localidade. O povoamento se iniciou com a formação de

pequenos grupos populacionais esparsos e criados em meados do

século XVIII. O mais importante deles no século XVIII era Desembo-

que, que se tornou julgado em 1766.

No início do século XIX, o Triângulo Mineiro ainda pertencia à

Província de Goiás e sofria com ataques indígenas. Inúmeras tentati-

vas foram feitas para tomar posse dos inexplorados campos além da

estrada bandeirante.

Os lugares que ela compreende, eram incultos, e desertos até 1807, e apenasconhecida a estrada, que a atravessa de São Paulo a Goiás, onde residiam algunsíndios, que tinham saído da Aldeia de Santa Ana, os quais nunca tiveram ânimode alongar-se para algum dos lados da mesma estrada, nem ao menos meialégua, como depois se conheceu pelas culturas sempre vizinhas as suas habita-ções: então Januário Luís da Silva, Pedro Gonçalves da Silva, José GonçalvesEleno, Manoel Francisco, Manuel Bernardes Ferreira e outros moradores naFreguesia do Desemboque entraram até a distância de algumas léguas de Sertão,e descobrindo lindas campinas, e ótimos matos, apossaram algumas Fazendas,e voltaram tanto por falta de mantimentos, como pelo terror, que lhe inspiravao Gentio Caiapó, cujo vestígio encontraram em diversas partes.1

Por meio do alvará de 04/

04/1816 o Triangulo Mineiro pas-

sou a pertencer, então, à Provín-

cia de Minas, Comarca de

Paracatu, mudando a delimitação

da divisa entre Minas e Goiás. A

div isa passou a ser do Rio

Paranaíba, ao invés do Rio Gran-

de, como era anteriormente. Se-

gundo Saint-Hilaire, a nova fron-

teira era uma reivindicação anti-

ga daquelas populações. Os ha-

bitantes da região não se senti-

am pertencentes à Província de

Goiás, tanto pela falta de assis-

tência do governo, como da ca-

rência de um posto governamen-

tal mais próximo.

1 HISTÓRIA Topográfica da Freguesia do Uberaba. Revista do Arquivo Público Mineiro, v.1, abr./jun., ano 1896.

19

h istória

A mudança para a Província de

Minas propiciou ao Triangulo Mi-

neiro um aumento da população

através do surgimento de vários

novos povoados. Consta que no

início do século XIX, várias famíli-

as se mudaram para o Sertão da

Farinha Podre em virtude dos ín-

dios caiapós terem seguido para

Goiás. No início do século XIX,

Província de Goiás realizou uma

migração em massa dos habitan-

tes dos aldeamentos do Triângu-

lo Mineiro para Nova Beira, na

ilha do Bananal .“Não demorou muito e o governa-dor de Goiás ordenou a criação de

um aldeamento denominado de Nova Beira composto inicialmente por 700 indí-genas dos sexos masculino e feminino. Próximo ao aldeamento foi criado o presí-dio de São Pedro do Sul. Para esse presídio foi enviada uma expedição compostapor 135 pessoas. O governador José de Almeida Vasconcelos justificava a criaçãodo presídio, dizendo que pretendia vigiar e proteger o novo aldeamento contra asinvestidas dos grupos indígenas inimigos dos Karajá, principalmente os Xavante,Kaiapó e Akroá. Na realidade o estabelecimento militar garantia ao governo dacapitania de Goiás o domínio dos povos conquistados através da imposição daforça. Para inspetor geral do presídio foi nomeado o ouvidor Antônio José Cabralde Almeida.”2

Essa migração e a criação do aldeamento de Nova Beira não

implicam necessariamente no afastamento dos índios da região do

Triângulo Mineiro. Mas como a colonização do Sertão da Farinha

Podre teve inicio no primeiro quartel do século XIX, acreditamos que a

região tenha sofrido menos ataques dos indígenas, em especial de

tribos caiapós. Assim, podemos concluir que foi durante o primeiro

quartel do século XIX que começaram a surgir um numero maior de

povoados na região, entre eles São Pedro de Uberabinha. Ainda não

tinha recebido esse nome, mas famílias já se fixavam às margens do

rio Uberabinha. Ele se originou a partir da concessão de sesmarias a

João Pereira da Rocha e aos

irmãos Carrijo.

Não sabemos ao

certo a árvore genealógica de

João Pereira da Rocha por-

que encontramos em fontes

diferentes a menção aos ca-

sais Luiz Lobo Leite Pereira

e Iria da Fonseca de Oliveira

e Cel João Lobo Leite Perei-

ra e Teresa da Silva Ávila

Figueiredo como seus pais.2 APOLINÁRIO, Juciene Ricarte. Os Akroá e outros povos indígenas nas Fronteiras do Sertão: as práticas das políticas indígena eindigenista no norte da capitania de Goiás - Século XVIII. 269p. 2005. Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-Graduaçãoem História da Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2005.

20

Também encontramos duas possíveis esposas, Francisca Alves Rabel

e Genoveva Alves de Rezende. Sendo filho de um casal ou de outro,

sabemos que as duas famílias têm origem em Santarém - Brasil e

Portugal. Segundo Lopes, João Pereira da Rocha era casado com

Francisca Alves Rabelo, mas talvez tenha sido casado com as duas,

em primeiras e segundas núpcias. Ele foi o fundador das Fazendas

São Francisco, em 1821, e em seguida a do Salto no Sertão da

Farinha Podre e seu nome - Pereira - se espalhou pela região onde

hoje é Uberlândia.

Os irmãos Carrijo se mudaram para o Triângulo após a ação

heróica de Antônio Eustáquio da Silva e Oliveira em entrar no sertão

dos caiapós e enfrentar onças e serpentes. Eles compraram as ter-

ras de José Diogo da Cunha e do próprio João Pereira da Rocha e se

mudaram com suas famílias, escravos e animais para as margens do

rio Uberabinha. Ali construíram a capela e uma banqueta para abas-

tecer de água as áreas mais al-

tas. Eles eram Fesliberto Alves

Carrijo, Luiz Alves Carrijo e Antô-

nio Alves Carrijo e Francisco Alves

Carrijo. Suas terras eram compre-

endidas pelas fazendas da Ten-

da, Campo Alegre, Lage,

Marimbondo e do Rio das Velhas.

A população ribeirinha e

os fazendeiros dos arredores de

São Pedro da Barra, entronca-

mento entre o Ribeirão São Pedro

e o rio Uberabinha, resolveram

construir uma capela. Em 1842,

Felisberto Alves Carrijo e Francis-

co Alves Pereira, filho de João

Pereira da Rocha, foram escolhi-

dos pela comunidade para se res-

ponsabilizarem pela definição do

local apropriado para a constru-

ção da capela. Em 1846, pedi-

ram autorização às autoridades

eclesiásticas e recebendo-a, pre-

ocuparam-se com o terreno para

fazê-la. O terreno pertencia à fa-

zenda do Salto, de propriedade

da viúva de João Pereira da Ro-

cha. Ficava no encontro do Ribei-

rão São Pedro com o Córrego das

Fazenda São Francisco.Fonte: http://br.geocities.com/osoriogon calves/new page3.htm