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PAULO ORÓSIO E A HISTORIAE ADVERSUS PAGANOS: A TRANSMISSÃO E RECEPCÇÃO DA OBRA HISTORIOGRAFICA E APOLOGÉTICA. GABRIELLA TORRES DE OLIVEIRA 1 Paulo Orósio foi um autor ibérico e presbítero da Igreja de Bracara Augusta no século V d. C. Acredita-se que tenha nascido por volta dos anos de 380 385 d. C, cálculo realizado a partir de comentários escritos por Agostinho de Hipona, para Jerônimo, nas Epístolas 166 e 169, em que fala de Orósio como um jovem que tem idade para ser seu filho. Acerca de sua origem é necessário apontar a existência de quatro teorias, relativas a região de nascimento, que seriam: Braga, Terragona, Brigantia e Bretanha. Cada uma dessas teorias baseia-se em escritos acerca de Orósio, ou de trechos encontrados em sua fonte mais conhecida, Historiae adversus paganos ou o Commonitorum de errore. A teoria mais bem fundamentada é a de Bracara Augusta, cujas principais fontes são as cartas de Agostinho, Ep. 166 e 169, a Ep. Ad. Palchonium 6-8 e a obra orosiana Commonitoruim. A teoria de Terragona, baseia-se principalmente em passagens de Historiae adversus paganos (VII, 22) devido a sua afirmação “nossa Terragona”. Quanto as teorias referentes a Brigantia e a Bretanha, são modernas e baseadas nos escritos de Orósio em Historiae (I). Dois pesquisadores se destacam nesta possibilidade, Lippold (1976) e Janvier (1982). Ambos utilizam as descrições geográficas de Orósio a fim de tentar identificar a origem dele, sendo, por isso, o livro I de Historiae extremamente importante. Quanto a versão Bretã, em 1990, Arnaud-Lindet, na versão francesa da obra Historiae, atenta a possibilidade, utilizando também um aprofundamento geográfico das narrativas Orosianas do livro I. Referente a família e a educação de Paulo Orósio, não sabemos muito, porém, ao analisarmos suas obras, se torna nítida sua formação tanto no sentido clássico com instruções na Paidéia greco-romana quanto no sentido cristão, com o conhecimento das sagradas escrituras. Sendo assim, deduzimos que pertencia a uma família abastada(MARTINEZ, 2013, p. 3). 1 Mestranda em História pelo Programa de Pós-Graduação em História Social das Relações Políticas pela Universidade Federal do Espírito Santo, sob a orientação do Prof. Dr. Belchior Monteiro Lima Neto e bolsista CAPES.

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PAULO ORÓSIO E A HISTORIAE ADVERSUS PAGANOS: A TRANSMISSÃO E

RECEPCÇÃO DA OBRA HISTORIOGRAFICA E APOLOGÉTICA.

GABRIELLA TORRES DE OLIVEIRA1

Paulo Orósio foi um autor ibérico e presbítero da Igreja de Bracara Augusta no século

V d. C. Acredita-se que tenha nascido por volta dos anos de 380 – 385 d. C, cálculo realizado

a partir de comentários escritos por Agostinho de Hipona, para Jerônimo, nas Epístolas 166 e

169, em que fala de Orósio como um jovem que tem idade para ser seu filho.

Acerca de sua origem é necessário apontar a existência de quatro teorias, relativas a

região de nascimento, que seriam: Braga, Terragona, Brigantia e Bretanha. Cada uma dessas

teorias baseia-se em escritos acerca de Orósio, ou de trechos encontrados em sua fonte mais

conhecida, Historiae adversus paganos ou o Commonitorum de errore. A teoria mais bem

fundamentada é a de Bracara Augusta, cujas principais fontes são as cartas de Agostinho, Ep.

166 e 169, a Ep. Ad. Palchonium 6-8 e a obra orosiana Commonitoruim.

A teoria de Terragona, baseia-se principalmente em passagens de Historiae adversus

paganos (VII, 22) devido a sua afirmação “nossa Terragona”. Quanto as teorias referentes a

Brigantia e a Bretanha, são modernas e baseadas nos escritos de Orósio em Historiae (I). Dois

pesquisadores se destacam nesta possibilidade, Lippold (1976) e Janvier (1982). Ambos

utilizam as descrições geográficas de Orósio a fim de tentar identificar a origem dele, sendo,

por isso, o livro I de Historiae extremamente importante. Quanto a versão Bretã, em 1990,

Arnaud-Lindet, na versão francesa da obra Historiae, atenta a possibilidade, utilizando também

um aprofundamento geográfico das narrativas Orosianas do livro I.

Referente a família e a educação de Paulo Orósio, não sabemos muito, porém, ao

analisarmos suas obras, se torna nítida sua formação tanto no sentido clássico – com instruções

na Paidéia greco-romana – quanto no sentido cristão, com o conhecimento das sagradas

escrituras. “Sendo assim, deduzimos que pertencia a uma família abastada” (MARTINEZ,

2013, p. 3).

1 Mestranda em História pelo Programa de Pós-Graduação em História Social das Relações Políticas pela

Universidade Federal do Espírito Santo, sob a orientação do Prof. Dr. Belchior Monteiro Lima Neto e bolsista

CAPES.

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As escrituras de Orósio acabam se destacando quando o mesmo se envolve na polêmica

gerada pela doutrina de Pelágio e também por sua busca por ensinamentos de Agostinho de

Hipona. O presbítero bracaraense participou ativamente na polêmica doutrinaria e buscou

completar sua formação exegética com Agostinho, no Norte da África, mas esteve em contato

com outros doutores da Igreja, a exemplo de Jerônimo, em Belém.

É importante destacar que grande parte do que conhecemos acerca de Orósio vem de

sua viagem à África. Orósio, já no início do século V, era presbítero de Igreja Bracaraense,

uma região que enfrentou invasões bárbaras entre 409-141. Como não sabemos todas as

informações e datas acerca da vida de Orósio antes de se encontrar com Agostinho, nos

deparamos novamente com várias hipóteses, justamente para que possamos tentar formar uma

linearidade dos fatos.

Fink-Errera (1950) adentra na hipótese, segundo a qual, Orósio chega à África em 410,

estuda com Agostinho por cinco anos e em 415 viaja para se encontrar com Jerônimo. Corsini

(1968, p. 19) aponta a chegada de Orósio na África em 414, fundamentando-se principalmente

na datação da obra de Agostinho Ad. Orosium.

Em Hipona, Orósio inicia seus estudos com auxílio do bispo Agostinho, e existe a

possibilidade de ser durante esse período que inicia sua formação nos estudos historiográficos,

justamente por ser parte da bibliografia selecionada pelo bispo para que fosse lida e que eram

necessárias na escrita do De civitate Dei.

Orósio realiza algumas viagens, Martinez Cavero (2002, p. 22) nos apresenta a sucessão

cronológica dos eventos, lembrando que a data segura é a concílio de Jerusalém, as outras datas

são conjecturas:

1. 409-414: Invasão germânica na Hispânia. Saída de Braga e viajem à Hipona;

2. 414-: Orósio chega a Hipona. Escreve o Commonitorium;

3. 415: Viajem à Palestina. Passagem por Belém. Participação na Assembleia de

Jerusalém. Redação do Liber apologeticus. Partida da Palestina (inverno de 415-

416)

4. 416-417: Regresso à África: Cartago, Hipona (primavera de 416). Redação das

Historiae adversus paganos.

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5. 417: Tentativa de retornar à Hispânia. Deposita as relíquias de S. Estevão em

Baleares. Desaparecimento de Orósio.

A história de vida de Orósio se encerra após a finalização de Historiae. Ele

simplesmente desaparece e não restam notícias a seu respeito. Existe a hipótese de que Orósio

tentou regressar à Espanha após entregar sua obra, porém, devido dificuldades durante a

viagem, ele aparece em Menorca, e após isso, mais nenhuma informação circula acerca do

presbítero hispano, o que pode significar que acabou morrendo na viagem. Além disso, a

própria relação entre Orosio e Agostinho esfria, e apenas em sua obra Retractiones menciona

sua relação com Orósio.

Dado este breve relato acerca da vida e trajetória de Orósio, passaremos agora para o

contexto do século V, período que a obra Historiae adversus paganos foi produzido, pois foi

marcado por transformações políticas, econômicas, sociais e principalmente religiosas.

Existiam muitos desafios militares referentes as invasões “bárbaras”, principalmente em regiões

em que a autoridade Imperial se enfraquecia.

Desastres naturais se somavam à instabilidade do Império, terremotos e epidemias

virulentas atingiam a região, essa combinação letal de problemas levou o Império a beira do

Colapso (MARTIN, 2014, p. 221). Os romanos, seguidores da religião tradicional, possuíam

respostas próprias acerca dos motivos destes acontecimentos:

Crentes da religião romana tradicional explicavam esses tempos terríveis seguindo a

tradição: os deuses do Estado estavam zangados, [...] uma possibilidade obvia

parecia ser a presença crescente de cristãos que negavam a existência dos deuses de

Roma e se recusavam a participar do culto a eles. (MARTIN, 2014, p. 224)

Para as classes dirigentes romanas adeptas do culto tradicional, somente os cultos

oficiais mereciam o nome de religio, forma de relacionar-se (religare) a sociedade e o Estado

com a divindade, sendo as demais religiões consideradas superstitio (TEJA, 2003, p. 299).

“Dentro desta lógica, o fato de os cristãos não participarem das cerimônias religiosas

pagãs e de não reconhecerem seus deuses era considerada a causa da alteração da pax deorum”

(ALONSO VENERO, 2012, p. 285). A pax deorum era extremamente importante para a

sociedade romana, referindo-se à situação de concórdia entre os homens e os deuses, que

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garantiriam saúde, prosperidade e proteção ao Império. Sendo assim, a não realização dos

rituais do culto tradicional, teria como resultado um Império abandonado e fadado ao fracasso.

Um evento muito importante, e que corrobora ainda mais estes fatos contra os cristãos,

foi o Saque de 410, à cidade de Roma, por Alarico e seu exército godo. Neste momento os

pagãos fortaleceram a culpabilização cristã, que responderam culpando os pagãos. Para os

pagãos, houve uma ruptura com a pax deorum, e para os cristãos, a culpa pagã advinha do fato

de não adorarem ao Deus único e ainda praticarem rituais de sangue aos deuses, enfurecendo a

divindade cristã.

Neste cenário, Agostinho de Hipona pede que Orósio escreva uma obra instrumental, a

ideia era ser um complemento de sua obra De civitate Dei. A redação seria limitada às guerras,

epidemias, fomes, terremotos, inundações, erupções vulcânicas, tormentas que ocorreram no

Império Romano. Como sabemos, Orósio acaba tomando outro rumo na escrita, decidiu

elaborar sete livros, indo além do catálogo pedido por Agostinho.

A obra Historiae foi a mais importante de Orósio, iniciou-se em 416 sendo

provavelmente que tenha sido finalizada antes do outono de 417 (Hist. adv. pag. VII, 43, 10-

12). Orósio finaliza o livro sem mencionar a conquista da Espanha pelo rei Visigodo Valia, e

este é um fator levado em consideração para considerarmos a data de 417 como a data de

finalização da obra. Outro fato importante de se destacar é a maior presença de fontes clássicas

na obra, do que cristãs, mostrando justamente a preocupação de Orósio em dialogar com os

pagãos.2

A obra está engajada na polêmica anticristã, Orósio se preocupou não apenas em contar

a história do Império Romano, mas traçou a história da humanidade com base nos principais

eventos, e assim, respondia as acusações dos pagãos, principalmente nas que se referiam a

responsabilizar os cristãos pela decadência do Império e até mesmo afirmando que o Deus

cristão não era capaz de manter Roma. Orósio, desta maneira, organiza sua obra (antes da

formação de Roma, depois da formação de Roma até Cristo e, por final, depois de Cristo) e

procurou demonstrar para os pagãos uma história cronológica da humanidade, comprovando

que existiam desgraças nos séculos antecessores ao cristianismo, rebatendo os questionamentos

2 Entre as fontes clássicas utilizadas por Orósio em Historiae adversus paganos encontra-se Heródoto, Políbio,

Tito Lívio, Apiano. Para uma análise das fontes consultadas por Orósio, recomendamos a leitura de Fink-Errera

(1995, p. 510-513) e Lacroix (1965, p. 60).

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e afirmações pagãs, e enfatizando que o tempo em que viviam era uma época de paz e harmonia

sob a Christiana Tempora.

O passado para Orósio pode ser considerado um instrumento, pois o utiliza para discutir

não apenas os eventos ocorridos, mas também busca elucidar o que eles representam para a

história da humanidade. Existem marcos importantes em Historiae, como, por exemplo, o

pecado original de Adão e o nascimento de Cristo durante o reinado de Augusto,3 no Livro VII.

Ele divide, desta maneira, a história da humanidade em dois tempos, a Tempora Antigua e a

Tempora Christiana, sendo este último justamente marcado no contexto político do Império

Romano.

Orósio buscou organizar sua cronologia baseada em Eusébio de Cesaréia, traduzida do

latim e continuada até o ano de 378 por Jerônimo, acrescentou ideias universalistas de seu

pensamento de história e que auxiliaram, junto do conhecimento geográfico, a desenvolver a

Teoria dos Quatro Impérios.4

Acerca da estrutura da obra, é a primeira escritura que segue a característica de história

universal cristã, justamente pela preocupação de Orósio em relatar acerca da história da

humanidade, o que também pode ser interpretado como a história do plano original de Deus. A

divisão de Historiae possui um caráter escatológico, em sete livros, e coincide com os sete dias

de criação do mundo narrado em Gênesis. Além disso, Orósio é otimista em relação a sua

concepção histórica, sua preocupação é demonstrar os benefícios dos tempos cristãos, e

principalmente, como o tempo presente é muito melhor que o passado. A religião cristã é a

única esperança para que existam tempos melhores para a humanidade. A narrativa de um

futuro cristão é justamente interligada com a concepção orosiana da Teoria dos Quatro

3 Hist. I, 5-6: “De Adão, o primeiro homem, ao rei Nino, chamado “o Grande”, momento em que Abraão nasceu,

três mil anos se passaram centro e oitenta e quatro anos, que foram omitidos ou ignorados por todos os

historiadores. De Nino, ou se você preferir, de Abraão a César Augusto, ou seja, ao nascimento de Cristo, que

ocorreu no quadragésimo segundo ano do Império de César, quando, depois de fazer as pazes com as entregas,

os portões do templo de Janus estavam fechados e as guerras cessaram em todo o mundo, são contados dois mil

e quinze anos”. 4 Sob influência de Jerônimo, Orósio constrói a Teoria dos Quatro Reinos Universais, que será fundamental em

sua análise histórica. Baseada na profecia bíblica de Daniel, Orósio a modifica, baseando sua interpretação não

apenas do conhecimento cronológico, mas também geográficos, criando sua própria visão acerca das sucessões

dos quatro impérios, que seriam: Babilônia, Cartago, Macedônia e Roma. Roma recolhe a herança da Babilônia

e, depois de terríveis confrontos com impérios considerados intermediários, o macedônico e o cartaginês, consegue

unificar todo o poder em uma pessoa só, César Augusto, em cuja época o nascimento de Cristo inicia uma nova

era.

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Impérios, pois apenas o cristianismo garantiria a humanidade a chance de vivenciar uma nova

ordem de paz e concórdia.

Mesmo que Orósio, como dito anteriormente, utilizasse da história para corroborar seus

argumentos, por um longo tempo perdurou a ideia de que o autor não se encaixava no perfil de

historiador, e por consequência, sua obra Historiae adversus paganos não poderia ser lida como

uma fonte historiográfica. E neste momento analisaremos o gênero literário da obra, a fim de

entendermos melhor a fonte e a visão que se tinha do autor.

Os estudos tradicionais ligados a Orósio sempre foram marcados pela sua aproximação

com Agostinho de Hipona, sendo assim, a classificação da obra orosiana era de caráter

teológico. Historiae ficou marcado como a concretização final da teologia agostiniana, De

civitate Dei. Por este motivo, historiadores como Goetz (1952), tinham por ideia central

comprovar que Orósio poderia ser considerado um teólogo da história, pois a teologia tinha

mais peso que a escrita historiográfica. Essa ideia foi muito embasada na própria estrutura de

organização que Orósio utilizou ao escrever Historiae, a cronologia baseada desde a Criação

do mundo até o advento da Salvação Final.

Outra crítica recorrente a Orósio, é a de que ele não cumpria premissas básicas para ser

considerado um historiador, que é a verdade e a imparcialidade. Neste aspecto, alguns fatores

interferem para que esta afirmação ocorra: primeiro, baseada nas duas outras obras produzidas

por Orósio, que possuem caráter religioso, e apenas Historiae com perspectiva historiográfica;

segundo, mesmo que possua uma estrutura histórica, a religiosa ainda se mantém fortemente,

justamente por ter como objetivo responder aos pagãos, sendo assim, uma obra apologética.

Foi em meados do século XX que surgiram novas interpretações acerca da escrita

orosiana, e principalmente, de desagregar a imagem do autor a de Agostinho de Hipona. Benoit

Lacroix (1965) enfatizou justamente a originalidade da escrita de Orósio, e que

independentemente de Agostinho de ter sido o mentor, não interferiu nas escrituras orosiana,

cada um mantém características distintas, comprovando que Orósio não era tão dependente de

Agostinho, como antes se pensava. Um exemplo da originalidade de Orósio é a forma pela

qual ele narra o presente, seu otimismo frente aos acontecimentos, mesmo quando referência o

saque de Roma de 410, e sempre destaca o cristianismo como fator preponderante de alcance

da paz, não apenas para o plano espiritual, mas para o futuro do próprio mundo terreno.

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Por fim, Serafin Bodelón (1997) nos fala justamente que Historiae adversus paganos

pode ser compreendida no limiar da história com a teologia:

Vários são os problemas discutidos sobre Orósio e especialmente sobre sua obra

principal, os sete livros das Histórias contra os pagãos. Seu título já sugere muito,

não apenas são livros de história, mas também são contra os pagãos. Foi discutido

se esta obra é historiográfica ou se é um tratado apologético; pois bem, é ambas as

coisas de uma vez e seu caráter apologético foi deixado claro desde o momento em

que seu autor definiu “contra os pagãos”. Foi-se abordado o problema de se tratar

de uma obra puramente histórica ou se é, em algumas vezes, uma obra de certo

caráter teológico. Desde o instante em que se buscam as causas do acontecer

histórico na vontade divina, é clara a tendência a teologia; é, em suma, a questão do

providencialismo histórico próprio da historiografia cristã. E ele conduziu demais a

certas doses de otimismo relativo, e que a vontade divina não pode conduzir o

acontecimento histórico a maus destinos, mas a um simples cumprimento dos planos

divinos que já eram pré-estabelecido

Ainda segundo Bodelón (1997) destaca, é que longe daquela medida que pressupõe a

imparcialidade, precisa e necessária no cultivo do gênero histórico, Orósio mantem uma posição

lógica, e antes mesmo de escrever Historiae adversus paganos, tomou partido cristão. Algo

notável em seu trabalho é justamente a forma pela qual Orósio acabou modificando a concepção

de história, para utiliza-la como defesa do cristianismo frente aos ataques pagãos. E aqui

destaco a própria influência de Cícero em Orósio, segue-se a fala de Bodelón (1997, p. 60):

Cícero colocou a imparcialidade como a ideia central do gênero histórico, mas

Orósio destaca como ideia central o providencialismo motivacional. Deus é o motor

da história e tudo o que aconteceu foi planejado por Ele. Os prodígios que embelezam

a obra de Orósio são um exemplo evidente desse providencialismo, que ocorre em

outros autores que também são seguidores das diretrizes providencialistas para a

concepção da história, como Idácio de Chaves ou Julián de Toledo. Em grande parte,

essa nova concepção de História em Orósio é uma herança agostiniana. Orósio leu

os dez primeiros livros de De civitate Dei, que tiveram uma influência notável nos

Historiae adversus paganos de Orósio os demais livros do De civitate Dei são

subsequentes à obra orosiana.

Para compreendermos melhor o papel do historiador na Antiguidade e também

posicionarmos a narrativa orosiana no gênero historiográfico, achamos necessária a leitura de

Fraçois Hartog (2013), que nos traz a perspectiva de que o historiador pode se desprender do

presente, criado pelo olhar distanciado, e este distanciamento auxilia a ver não apenas o

próximo, mas um quadro mais completo dos eventos. Destaco aqui a descrição do conceito de

Regime de Historicidade que o autor destaca em sua obra:

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Retenhamos aqui que o termo expressa a forma da condição histórica, a maneira

como um indivíduo ou uma coletividade se instaura e se desenvolve no tempo. É

legítimo, observarão, falar de historicidade antes da formação do conceito moderno

de histórica, entre o fim do século XVIII e início do século XIX? Sim, se por

“historicidade” se entender esta experiência primeira de estrangement, de distância

de si para si mesmo que, justamente, as categorias de passado, presente e futuro

permitem apreender e dizer, ordenando-a e dando-lhe sentido. Assim, remontando

bastante, até Homero, é a experiência que Ulisses faz diante do bardo cantando suas

façanhas: ele se encontra repentinamente confrontado com a incapacidade de unir o

Ulisses glorioso que ele era (aquele que tomou Troia) ao náufrago que perdeu tudo,

até seu nome, que ele é agora. Falta-lhe justamente a categoria de passado, que

permitiria reconhecer-se neste outro que é, no entanto, ele mesmo. É também, no

início do século V, a experiência (diferente) relatada por Santo Agostinho. Lançado

em sua grande meditação sobre o tempo, no livro XI das Confissões, ele se encontra

inicialmente incapaz de dizer, não um tempo abstrato, mas esse tempo que é ele, sob

esses três modos (presente do passado), a atenção (presente do presente) e a

expectativa (presente do futuro). Podemos nos servir da noção de regimes de

historicidade antes ou independentemente da formulação posterior do conceito

moderno de história (HARTOG, 2013, p. 12).

O conceito de Regime de Historicidade é importante ao historiador, que lida com a ideia

de tempo em seu trabalho, mas também a fim de compreender como uma sociedade entende e

trata seu passado e presente. Além disso, é um instrumento que auxilia o historiador a conceber

não apenas o tempo, mas todos os tempos, principalmente quando falamos de crise do tempo,

como, por exemplo, as articulações do passado, presente e futuro.

É importante destacar que todas as sociedades possuem uma história, independente do

grau existente de historicidade, existem vários fatores que interferem na forma pela qual elas

não apenas se enxergam, mas como sentem e interpretam sua própria história, seja ela relativa

aos eventos do passado ou do presente.

Em um outro trabalho, Hartog (1995), explica um pouco mais acerca dos historiadores

e da utilização da memória, e ele exemplifica este caso, com Tucídides. “Se os historiadores

sempre estiveram relacionados com a memória, também sempre suspeitaram dela. Tucídides

já a recusava como não confiável: ela esquece, deforma, obedece a uma economia do prazer”

(HARTOG, 1995). Quando lemos Orósio percebemos justamente como ele utiliza da memória

como fim retórico, é um instrumento muito importante ao dialogar com os pagãos, pois é ela

que garante a aproximação com os leitores, principalmente por formar os componentes

emotivos, racionais e históricos. E assim que adiciona sua perspectiva histórica, Orósio busca

tornar compreensivo o contexto de transformações imperiais e a própria disputa entre pagãos e

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cristãos no século V, além disso, reforça que os tempos do presente, com o cristianismo, são

mais pacíficos, do que os tempos anteriores a Cristo. Por conseguinte, acreditamos que a obra

Historiae adversus paganos é uma obra histórica, mas também apologética.

Após a apresentação dos dados biográficos e historiográficos, trataremos agora da

transmissão e recepção da fonte Historiae adversus paganos. Este é um processo importante,

não apenas por nos permitir compreendermos mais acerca do modo pelo qual a fonte chegou

até nós, na atualidade, mas também a recepção da mesma em diferentes localidades, seus

manuscritos, interpretações e traduções. Porém, é importante salientar, que ainda existem

lapsos de informações acerca da história da trajetória da documentação.

Iniciaremos com a perspectiva árabe, da qual possuímos maiores informações. Segundo

Adel SidArus (2016) á Historiae têm um forte impacto na época árabe-islâmica, justamente por

ser uma das obras com maior repercussão na passagem da Antiga à Baixa Idade Média

Europeia, sendo utilizada principalmente como fonte para a interpretação e conhecimento da

Antiguidade, com destaque de seu caráter geográfico e descrições dos diferentes povos e

histórias anteriores à Roma. Não à toa, é possível encontrar cerca de 200 manuscritos e 26

incunábulos ainda existes de Historiae adversus paganos.

Muitos pensam que a repercussão da obra orosiana seria importante apenas para o

mundo cristão e ocidental, mas os árabes da região de Córdoba notaram a importância da obra

e a traduziram em conjunto com a obra de Dioscórides. O caráter universalista da esrita

histórica de Orósio fez com que fosse muito bem recebida pelos árabes, principalmente na

época áurea da literatura copto-árabe, justamente pelas referências religiosas ao

providencialismo divino. O responsável pela tradução foi o muçulmano Qásim ibn Asbagh e o

cristão Walib ibn Khazuyrán, além de ter sido citada e referenciada por Ibn Khaldún (1332-

1406).

Ainda existem muitas informações em análise acerca da chegada de Historiae em

Córdoba, por uma comitiva bizantina enviada ao califa cordobes Adberramá III, no ano de 949

d.C., justamente por haver discrepâncias referentes às datações da entrega da obra de Orósio e

que são importantes para a compreensão da introdução da obra, na versão árabe, durante o

califado. Existe a teoria baseada no relato de Ibn Yulyul, de que remete a comitiva bizantina,

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porém a data apresentada da chegada desta comitiva é 949 d.C., 5 porém o imperador bizantino

era Constantino VII Porfitogéneto, e não Romano I, que havia sido deposto no ano de 944 d.C.,

e nem tão pouco Romano II, que esteve no poder entre os anos de 959-963 d.C., o que nos leva

a hipótese de que talvez Abn Yulyul tivesse se enganado quanto a à data da chegada dos

enviados bizantinos.6

Acerca das traduções da obra, Levi Della Vida (1954) apresenta-nos a hipótese de que

existiam duas traduções em meados do século X d.C., realizadas em Córdoba: uma advinda de

um manuscrito espanhol; e outra de um manuscrito bizantino. Durante a Idade Média, Historiae

adversus paganos gozou de uma extraordinária difusão, e isso se deu por ter sido um dos poucos

autores latinos da Antiguidade traduzidos para o árabe. E um fator de destaque é que os

trabalhos em oficinas imperiais, com escritos enciclopédicos e códigos, eram considerados

produtos culturais adequados para seres enviados como presentes, principalmente envolvendo

relações diplomáticas. Segundo Roberto Gascón (2004, p. 219) “a maneira a determinar que

obras históricas poderiam ser enviadas a Córdoba, como presente para os califas omeyas, o

caminho mais seguro seria o de examinar qual era o ambiente historiográfico na corte bizantina

em meados do século X d.C. Fora do ambiente intelectual árabe e bizantino, Historiae foi

traduzido e lido e outras regiões.

David Ross (1995) afirma em Illustrated manuscript of Orosius, que até hoje mais de

200 manuscritos de Historiae sobreviveram, e pelo menos vinte e cinco edições “Durante a

Idade Média, a obra de Orósio permaneceu como o livro de história universal padrão e nenhuma

biblioteca monástica, escolar ou universitária poderia se dar ao luxo de ficar sem uma cópia”

(ROSS,1995 p. 35). O trabalho de David Ross (1995) acerca dos manuscritos orosiano é bem

interessante, pois ele vem da perspectiva das ilustrações presentes nas folhas, o que auxiliou

em hipóteses acerca do local de circulação dos manuscritos e como eram utilizados.

5 Luis Molina (1984) relata que na realidade Historiae chega em Córdoba antes do ano de 944, provavelmente

durante o reinado de Romano I, e isso explicaria como Qasim Asbag, interviu no próprio trabalho de tradução da

obra. 6 Levi Della Vita (1954) formula a hipótese baseado no fato de que a confusão da troca dos nomes dos

imperadores por Ibn Yulyul, ocorreu porque em 945 d.C., Romano II foi associado ao trono por seu pai

Constantino VII. Gascón (2004) já reitera que o problema na realidade não seria a datação e nem a questão dos

imperadores, mas que provavelmente que Historiae não chegou com a comitiva, mas antes, da data, já que para a

tradução de Historiae ter sido realizada por Qasim, deveria estar em Córdoba antes do ano de 948 d.C., ou do

ano 337 de Hégire, por causa de sua idade avançada.

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Ilustrar os manuscritos não seria apenas um trabalho caro para o estudo dos eruditos,

mas também não seria uma escolha inicial, já que as preferências para ilustrações se davam para

textos bíblicos ou litúrgicos. Desse modo, David Ross (1995) aponta que apenas quatro

manuscritos de Historiae podem ser corretamente ligados a um trabalho completo de ilustração.

O primeiro manuscrito é o intitulado Vaticanus latinus 3340, cada capítulo dele contém

rubricas em vermelho claro, e são mais numerosas que a edição de Zangemeister ou de St. Gall,

o manuscrito 624 do século IX. O manuscrito encontra-se danificado, atualmente, e não esta

completo, o texto que inicia a obra é do Livro LL. Pertencia ao bibliógrafo Fulvio Orsini, no

final do século XVI, e entrou na biblioteca do Vaticano em 1602. O manuscrito chega no

Vaticano após a morte de Orsini, com disposição testamentária de 1602 e escritura em seu

inventário. “Orosio foi numerado nesse documento e assim descrito: Paulo Orosio, di lettera

longobarda, historiato, antichissimo, coperto di corame lionato, em foglio (ROSS, 1995, p.

38). Por sim, vale ressaltar que as ilustrações foram realizadas entre os século XI e XII, e

foram feitos de forma simples, já o texto foi traduzido diretamente do latim.

O segundo manuscrito de Orósio está na biblioteca Laurentiana em Florença, e é

denominado manuscrito PI. 65, nº 37, tendo sido escrito a mão em um pergaminho datado do

século XIV, e possui um breve relato da vida de Orósio, porém não possuímos informações

antecessoras a entrada na biblioteca. “Ainda acerca deste mesmo manuscrito, foi encadernado

em couro vermelho trabalhado, recoberto em marrom com uma etiqueta de pergaminho,

Orosius de calamitatibus mundi, e uma placa de latão dos braços Medici nas costas e na frente”

(ROSS, 1995, p. 47).

As ilustrações são muito importantes como instrumentos de maior compreensão da obra

orosiana, mas, salientamos que a maioria dos manuscritos de Historiae adversus paganos não

sobreviveram, o que dificulta possíveis conclusões. As ilustrações encontradas nos manuscritos

demonstram que possivelmente os próprios leitores de Orósio aproveitaram as margens das

obras, para desenhar e ilustrar o texto, já que não foram encontrados evidencias de

financiamentos ou até mesmo de preocupação, envolvendo ilustrar a obra em si.

É importante destacar o trabalho de tradução anglo-saxão de Historiae, pois foi realizada

pelo rei Alfred de Wessex (849-899 d.C.), em seu programa cultural de trabalho com obras

clássicas, a exemplo de Solilóquios de Agostinho. Janet Bately (1980) afirma que a tradução

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realizada da obra orosiana segue um padrão de paráfrase, causando alterações consideradas

radicais ao sentido original da obra em latim. A ordem da escrita do livro se manteve, porém

algumas seções foram reescritas, a autora conclui que ao trabalhar Historiae desta forma, foi

feito um exercício de polêmica, usando material histórico para um levantamento da história do

mundo do ponto de vista cristão.

Esse processo foi muito importante, pois seguia, como dito anteriormente, o programa

cultural do rei Alfred, e é o motivo principal, para entendermos a preocupação do tradutor e

suas escolhas do que permaneceria na tradução, e também como seria escrito, sempre buscando

manter os episódios de relevância histórica. O aspecto militar que Orósio descreveu em sua

obra, foi reestruturado, em seções temáticas, facilitando a leitura, já que visava as necessidades

dos leitores, e o que lhes era importante saber. Exemplo principal é referente a Alexandre, o

Grande, onde a reestruturação envolveu o corpo textual, mas também colocando o personagem

como um modelo exemplas do que um líder deve ou não fazer quando se está no poder. Quanto

a esta questão da importância da visão religiosa e militar para Alfred, e que é exposto pelo

tradutor, Khalaf (2013, p.207-208) nos explica que:

Se devidamente reorganizada, a perspectiva religiosa da fonte constitui um ponto

adequado para começar a propor uma crônica do mundo onde os lados espiritual e

militar da história possam encontrar seu lugar. A redução das polêmicas de Orosius,

mas ao mesmo tempo a retenção geral de seus comentários, sugere o desejo do

tradutor de desviar a atenção do leitor para fatos históricos que não devem ser

desprovidos de uma interpretação moral. Em conclusão, o OEO reflete a

preocupação de Alfred em criar uma nação por espada e oração. Essa intenção é

uma das razões fundamentais que levaram o rei à promoção do avivamento e a

criação dessas traduções para o benefício de sua corte (KHALAF, 2013, P. 207-208).

Podemos concluir, após todas as informações apresentadas, que foi um processo longo

de transmissão das obras orosianas, e destacamos aqui o difícil itinerário percorrido pelas fontes

antigas. Historiae adversus paganos foi alvo de diversas cópias, traduções e transcrições que

perpassaram séculos e cabe a nós não olharmos inocentemente para a fonte. Os eventos e

escritos do passado não chegam até o presente de forma imutável, são saberes constituídos por

escolhas e possibilidades de trabalho, principalmente das respostas que escolhemos obter com

a rememoração do passado.

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Orósio se preocupou com o presente, e o passado foi utilizado para justamente

demonstrar sua importância, e mais ainda, de traçar uma perspectiva positiva para o futuro do

mundo, com a segunda vinda de Cristo. Mesmo que seja um cristão escrevendo uma história

universal, ele nunca deixou de frisar seus objetivos por trás dos livros, suas defesas, suas

compreensões de mundo e suas interpretações dos eventos. Historiae adversus paganos foi

escrita em um período conturbado do Império Romano, mas utilizada em vários momentos

posteriores com outras finalidades, a problematização da fonte além de possível, é realizada até

os tempos atuais. Devido as inúmeras temáticas presentes em cada livro, e ao lermos

criticamente Historiae, reconhecendo suas limitações e valorizando as inúmeras possibilidades

de trabalho, damos voz a um historiador cristão importante e temos a chance de enxergarmos

como o próprio papel e a própria identidade do historiador, muda através o tempo, e

principalmente, de como, nossos trabalhos, poderão ser interpretados e utilizados das formas

mais variadas, no futuro.

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