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Tradução Fátima Ragageles PEDRO ARRUPE TESTEMUNHA DO SÉCULO XX PROFETA PARA O SÉCULO XXI 4 ª EDIçãO

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traduçãoFátima Ragageles

PEDRO ARRUPETESTEMUNHA DO SÉCULO XXPROFETA PARA O SÉCULO XXI

4ª edição

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Título originalArrupe, Testigo del Siglo XX, Profeta del Siglo XXI © Editorial Mensajero – Grupo de Comunicación

Loyola, 2016 (2ª edição)ISBN: 978-84-271-3866-7

Capa e execução gráficaAtelier Mam Design|Madalena Azevedo Mendes

Impressão e acabamentosPapelmunde

Depósito legal473497/20

ISBN978-972-39-0906-7

TraduçãoFátima Ragageles

RevisãoAntónio Coelho, s.j.

ConsultorFrancisco Pires Lopes, s.j.

1ª edição2003

4ª ediçãoAgosto de 2020

Com todas as licenças necessárias

©SECRETARIADO NACIONAL

DO APOSTOLADO DA ORAÇÃORua S. Barnabé, 32 – 4710-309 BRAGA | Tel.: 253 689 440

www.redemundialdeoracaodopapa.pt | [email protected]

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íNdice

apresentação da terceira edição | 13Dário Pedroso, s.j.

Ver mais longe | 15Vasco Pinto de Magalhães, s.j.

a primeira edição portuguesa de Pedro Arrupe | 19 introdução | 23

1. o dia sem hora | 292. as aventuras de Peru | 39

Finalmenteummenino!•Oprimeiroadeus•UniversitárioemMadrid

• Oprimeirocontactocomainjustiça•MatriculadoemMedicina

3. de médico a jesuíta | 61Tudoescuro•Milagreinterior•Adecisão•AcaminhodeLoiola

4. Renascer em loiola | 79Omestre,umbascoenxuto•El disco de Arrupe•Oof íciodeanjo da guarda

• Daspiadasàmística•AmigosnoSenhor•Umpressentimento

5. tudo é horizonte | 93Votoaumapotênciaestrangeira•Umexiladofeliz•Missasdemaisdeduas

horas•Atéaooutroladodomar•Américaaovivo

6. de cleveland a Yokohama | 115Emprisõesdesegurançamáxima•AchorardiantedeYokohama

7. aquele Japão incrível | 129OJapãonãoéassim• Hana ga takai desu ne.Quegrandenariz!•Debraços

ao alto no cimo do Fuji

8. um pároco singular | 141NaparóquiadeXavier•Ohomemdosseteinstrumentos•Asubtilalma

japonesa•Oeuprofundodozen

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9. luz no cárcere | 155Espiãointernacional•Numaceladespojada•Umcativocativante•Esta

noiteénoitedeNatal•Devoltaaolar

10. o mestre | 173Oinfinitonumachávenadechá•Noviciadoemtempodeguerra•Perfildeummestre•Transmitirumavivência

11. a bomba | 191OperaçãoManhattan•Opika-don•Umhospitalimprovisado• Desertodecinzas•MissaporHiroxima•Umsacodeácidobórico•Força,padre!•Patologiaradiactiva•AssombrasdeHiroxima•Explosãodeumanova era

12. condenados a viver | 217Hirohitodeixadeserdeus•Aqueimarcadáveres•Comoseotempofossetodomeu•Livrosemjaponês•Ondenuncaestás•Observaapessoae depois prega

13. líder de um pequeno mundo | 235Aprendamasregrasdobasebol•Temaeternidadeparadescansar!• Conferênciasdeumamigo•Nolugardooutro•AColinadosMártires• AcusadoemRoma

14. um geral para o concílio | 257Umpapadetransição•Umbrindeprofético•Naprimeirapágina•EmdefesadeTeilhard•Frenteafrentecomopapa•Féparaoano2000•ComofundadordaOpusDei•Noviciadodegeral•Aquimetens

15. os conflituosos anos 60 | 291Eradecontestação•Iluminaroaggiornamento •CartaparaaAméricaLatina• ViagemàÍndia•ContraoracismonosEstadosUnidos•NoBrasildedomHélder•VentosnovosemMedellin•TensõesnoVaticano

16. Na cratera de um vulcão | 323Reacçãoconservadora•ÀconquistadeEspanha•Explosãocriadora• Condecoradocomoengraxador•Osínodosobreajustiça•Deuséalegre• Fogocerrado

17. a grande opção | 353Aagendadeumgeral•Rumoresdedemissãoeoutrascampanhas•Opapaesclarece•Ostop daSantaSé•Opçãopelajustiça

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18. Perfil de uma águia | 375DiantedascâmarasdaRAI•JesusCristoétudo•Possuídoporumamissão• Rasgosdealma•Comooutroqualquer•Oúltimoasairqueapaguealuz• Bodasdeouro

19. a renúncia | 413OdiscursopóstumodeJoãoPauloI•Temadepré-conclave•Asurpresadonovopapa•BoasnotíciasdePuebla•Ogritodosrefugiados•Arenúncia• Premoniçãodaprova

20. Silêncio | 441Asúltimascartas•Ocantodocisne•Agrandeprova•Diáriosobreumdoente•Confidênciasdeumdoente•Despedidadeumgeral•Umaluzno vazio

epílogo – Profeta do século XXi | 509Comofuturonamedula•AsferidasdoTerceiroMundo•Juventudeemestiçagem•Compromissodesangue•Amulher,aEuropaeaIgreja • Oúltimosegredo

Sejam bons | 521Notas | 523

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Aos refugiados, aos excluídos e aos toxicodependentes do mundo inteiro, a quem Pedro Arrupe dedicou as últimas energias e projectos.

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aPReSeNtação da teRceiRa edição

Dário Pedroso, s.j.

EstemagníficolivrodograndeescritorPedroMiguelLamet,jesuíta,colo-cadiantedenós,deummodovivo,empolgante,maravilhoso,sério,histórico,bem documentado, a pessoa e a obra do padre Pedro arrupe, que foi geral da companhia de Jesus. É uma leitura saborosa, que nos mergulha a alma, a inteligência,ocoraçãonomistériodapessoaedavida,damissãoedasanti-dade de Pedro arrupe. uma história rica, como era rico o coração do padre arrupe, uma história cheia de dimensões prodigiosas, de uma inteligência in-vulgar e de um coração de apóstolo, uma história onde se sente pulsar o amor aJesus,àIgreja,àCompanhia,àhumanidade.

Pedro arrupe fica para a história da companhia de Jesus, como seu membro,comomissionárionoJapão,comosuperiorgeral.MasficatambémcomomarconahistóriadaIgreja,sobretudoapósoConcílioVaticanoII.Àsvezesincompreendidoecaluniado,poucoaceiteporalguns,comoéprópriodos profetas que têm a lucidez de rasgar caminhos e de apontar novas metas, quesãomovidospelosoprodoEspíritoquequerfazernovastodasascoisas,o padre arrupe foi um homem e sacerdote providencial, escolhido por deuspara diversas missões, nas quais deus e os homens se cruzaram de um modomaravilhoso e rico. Homem para a história da igreja, que ajudou, a sua queri-da Mãe igreja, a rasgar horizontes de verdade e de justiça, de modernidade, deserviço aos mais pobres e desprotegidos, de renovação pós-conciliar. Homempara a história da humanidade, desde a sua experiência vivida com alma ecoraçãoemHiroshima,naexplosãodabombaatómica,atéàsrelaçõescomhomens e mulheres de todos os continentes, que o amavam e apreciavam,como pastor e pai, como mentor e arauto de um mundo novo.

o padre arrupe tinha um segredo, que o autor do livro, Pedro Miguel lamet, soube bem colocar sobre o candelabro: a paixão por Jesus. Quan-doumdia lheperguntaram:“Parasi,queméJesus?”,arespostanãose fezesperar:“Paramim,JesuséTudo”.Efoi,deverdade,assimnavidadopadrearrupe: Jesus era tudo – seu Mestre, seu Rei e Senhor, seu amigo, seu con-fidente,seuTesouro,seuAmado,seuRedentor,suaLuzesuaForça.Daíque passasse, de dia e de noite, muitas horas em oração, dialogando com o seu Jesus.

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Algunsdosseustextosmaisíntimos,algumasdassuasorações,revelambemesta centralidade. Pedro arrupe, um sacerdote apaixonado por Jesus, vivendo ao jeito de inácio de loiola, a quem o porteiro do mosteiro de Montserrat definiu:“coxo,baixo,masloucoporCristo”.OpadreArrupeaprendeucomSantoInácioaserum“loucoporCristo”easuavidaeobraodemonstramdeummodoinvulgar,rico,impregnadodemuitasfacetasmaravilhosas,evangé-licas,bebidasnosExercíciosEspirituaisdeSantoInácio.

Nãoteráchegadoahoradepensarmaisasérioedeummodomaisdeter-minadoemtratardacausadecanonizaçãodePedroArrupe?Decolocarnosaltares, com a voz autorizada da Mãe igreja, este cristão e este sacerdote que, cativado por Jesus, viveu para ele, para a companhia e para a igreja, de um modo admirável, em serviço dedicado, em doação total, em generosa e con-tínuaoblação,atéaoholocaustodosúltimosanos,mergulhadosemgrandessofrimentoseemcomunhãocomJesusCrucificado?Todososquecomelecontactaram mais de perto, todos os que ouviram os seus conselhos, apre-ciaram a sua vida e a sua longa via sacra, todos os que beneficiaram do amor dedicado do seu coração, todos os que se sentiram empolgados pelo fogo da sua paixão por Jesus, todos os que sentiram as suas vidas de náufragos salvas pela sua mão de pai e pastor, todos os que beneficiaram do seu calor humano edasuacaridadeevangélica,todososquedescobriramnassuasconferênciase nos seus escritos uma sábia orientação para as suas vidas... todos sentiam que estavam diante de um santo. o padre arrupe foi um homem de deus, não sópelasuapiedadeeoraçãopessoal,mastambémnaacçãoconcretadasuavida apaixonada por cristo que gritava a todos o evangelho de Jesus, pelo seu modo de viver e de amar, de servir e de se doar aos outros.

esta terceira edição, com novos textos de Pedro Miguel lamet, mais fotos, mais riqueza literária, coloca diante de nós a vida e a obra de Pedro arrupe de um modo ainda mais vivo, mais apaixonado, mais empolgante. estas páginas contagiam-nos, fazem-nos bem. ajudam a descobrir e a admirar mais e mais a alma e o coração do grande homem e do sacerdote insigne que foi o padre Arrupe.EstádeparabénsonossoilustreamigoPedroMiguelLamet,comoestãodeparabénsasduasEditorasquelevarampordianteapublicaçãodestaterceira edição. Que esta obra, agora enriquecida, possa ajudar a conhecer melhoropadreArrupeesirvaparaa“maiorglóriadeDeus”,ajudando-nosatodosa“emtudoamareservir”.

8 de Dezembro de 2010

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VeR MaiS loNGe

Vasco Pinto de Magalhães, s.j.

Por fim, mas sempre a tempo, a vida fascinante de Pedro arrupe. Nãotemosainda,nemninguémpodeter,umanoçãoglobaldainfluên-cia de arrupe na história contemporânea. Quem pretender entender melhor as convulsões e as oportunidades do tempo presente, bem como quem se interessar pelos anos 60 e pelos anos 70 não pode passar-lhe ao lado. como se enganaria quem dissesse: “É apenas mais um sacerdote católico, influente, talvez?, umpolémico e original superior-geral dosjesuítasnosanosquentesqueseseguiramaoConcílioVaticanoII!”Masa sua vida e a sua obra são muito mais importantes do que se possa pen-sar para a nossa vida cultural, espiritual e social, são indispensáveis para ver com olhos de ver, hoje, as relações entre a igreja e o mundo, e agora podem ser saboreadas em português. o original castelhano vai em nove edições, sempre procuradas.

Oautor,PedroMiguelLamet,éconhecidopelasuavastaobraemvários registos, desde a poesia ao ensaio, passando pelo romance e pela colunadeactualidadesemváriasrevistas,eéparticularmentenotávelpela originalidade das suas biografias, quer actualizando figuras tão an-tigas como inácio de loiola quer descodificando personalidades actuais como João Paulo ii. Mais que contar-nos uma vida, faz-nos entrar nos seus segredos.

Naverdade,maisqueodiscursoeareflexão,importaogestoqueilumina, a palavra criativa e a atitude integradora. Há gestos que criam laços e são marcos históricos, há palavras que abrem horizontes, há atitudes que superam crises e nos situam num mundo melhor. Pedro arrupe, o padre arrupe, foi homem do mundo e homem da igreja, al-

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guémqueatravessoucomintensidadedeluzededorasegundametadedoséculoXXdeixandoumrastodeesperançarealistaeoptimista,ofe-recendo instrumentos para a construção de uma humanidade mais justa e mais verdadeira.

Olivroquetemosemmãoséexplosivo.Explosãoéaboametáforaqueoautornospropõeparaestavida.Oespíritodeféedeserviçoqueaanimoufazsaltarapazquevenceosmedos,fazendotambémrebentaremcadaumasgrandesinterrogações.Quesentidofazafénestemun-do?Quenosépedido,comohumanos,comocrentes?Vejacomo.

o autor leva-nos pelos corredores interiores e pelos corredores ex-teriores dos afectos, das convicções e do discernimento dos apelos de Deusnosgritosdahumanidadequetecemavidadaquelesquepodía-mosedevíamostercomoossantosdonossotempo.Éocaso.

a narrativa de Pedro Miguel lamet tem, entre outras, duas grandes virtudes, faz-nosentrarevestirumadadaépocahistóricasemperdernada da nossa linguagem actual. talvez por isso a sua escrita seja tão interrogativa. Não precisando de fazer perguntas, leva-nos a participar, a corresponder.

entrando no texto vamo-nos dando conta, gradualmente ou por pequenas explosões, das marcas e da transformação deixada por Pedro arrupe na cultura cristã e na vida da igreja, nas relações com outros credos e na história do mundo. Vale a pena percebê-lo. Quando em 1965 chegou a Roma, vindo do Japão, este missionário reconhecido e admirado, nascido em Bilbau e tendo vivido antes nos eua, não era mais que um de tantos que vinham participar na eleição do novo su-perior-geraldos jesuítas.Ostemposeramdeenormeagitaçãoemu-dança,osfamososanos60.AIgrejaacabavadeviverograndeConcílioEcuménicoVaticanoIIeagorahaviaqueoadaptareadoptaremtodosossentidosàvidaeàmissãoeclesial.Arrupefoieleito,eleitoparaavida,poisassiménaCompanhiadeJesus.Nasuareduzidabagagemtraziaum relógio parado! Sim, o padre arrupe estava, vivia em Hiroxima, na-quela mesma hora, naquele local em que rebentou a bomba atómica!... eoseurelógio,comotantasvidas,parou!Estaéaparáboladasuavida.Umchoque,umaparagem,umaviragemqueéumrecomeço,umahoranova.Assimfoiparaele,porváriasvezes.Comoéqueumfimdomun-dopodedarlugaraoutromundoquesecretamentejácomeçava?Qual

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VER mAis longE

éafibradaquelesquesearriscamquandoparecesóhaverferramentasgastas?

“Omundoavançamesmosemnós,”disseele,“denósdependequeavanceconnosco!”Assimincentivavaumdiaosjesuítasaocompromis-sonaféenajustiça,avisandoqueestasnãopodemserseparadas.

Eraumhomemdeprofundaintimidademística,emconcretíssimoscompromissos práticos. Quando o tecto de casa caiu em estilhaços e contemplouacidadereduzidaapó,eleeosseusrapazes,osjovensjesuí-tas japoneses que sob a sua orientação faziam o noviciado, arregaçando asmangas, transformaram aquela casa-espaçono hospital possível e,com poucos mais meios que o consolo, curavam o curável e iam pelas ruas queimar restos mortais... Pode dizer-se que pela mão e pela palavra de arrupe esta parábola da vida estilhaçada e refeita na sua globalidade sefoitornandoabandeiraprogramáticadofuturodosjesuítas.Féejus-tiça,serviçodaféepromoçãodajustiçasãoindissociáveiseinadiáveis.Mascomo?Ecomqueentusiasmoparaunsesuspeitaparaoutros...Ocaminhofoirealmentedif ícileconfrontado,dentroeforadaCompanhiadeJesus,entreospoderespolíticosecomaprópriaSantaSé.Masumaverdadeira onda de choque positiva e transformadora foi crescendo.

encontrei-o pela primeira vez, pessoalmente, numa das suas visi-tasaPortugal,emBraga,reunindoosjesuítasestudantesaindanãosa-cerdotes. a sua presença simples era simultaneamente pacificadora e mobilizadora. Respondia aos entusiasmos juvenis com muito humor e sabedoria. “Hay que estudiar, hay que estudiar!”Asuaimensaactividadefoisempreacompanhadadelongashorasdereflexãoecontemplação,sentadoàjaponesa.

Acertaalturasentiuquesuamissãoestavaconcluídaeque,apesardaregrajesuíticadeterumsuperior-geralvitalício,deviaresignar.Maso papaJoãoPauloIInãoaceitouarenúncia,instalando-seumclimadecrise. estava-se em 1980 e o padre arrupe tinha setenta e três anos. Noano seguinte, no regresso de uma das suas viagens, sofreu uma trom-bose. de novo explodiu a bomba na sua vida! e, como comenta o nossoautor,paroudenovoorelógio!Masorelógiointeriorésempresurpre-endente.Eaquelehomemexplosivoviu-sereduzidoaosilêncioeàimo-bilidade no seu quartinho em Roma. Foi então que Pedro Miguel lametpôdevisitá-lodemoradamenteecaptar,porentreadif ícilcomunicação

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de uma fala muito afectada, um precioso testemunho de memórias e santidade.Assimforampassadososúltimosnoveanos,queelepróprioassim exprimia: “terrible, es terrible”,masquesimultaneamenterevelamsegredosdesabedoriadevidaedeexperiênciamística.“Semprefuiumhomem feliz, sempre estive contente”, confessava, então, comentandoos grandes desafios da sua missão. “Nunca encontrei diferença entre a dimensão espiritual e a dimensão humana, deus está na essência huma-na.”Eapropósitodoseumododedescansar,sorriucomvontadeedisse:“o meu hobby eraestarcomaspessoas.”

Pedro Miguel lamet consegue dar-nos, sem favor do biografado e deummodoesclarecedor,oretratodinâmicodeumaépocadaIgrejae do mundo tão rica como tem sido a nossa, ajudando a descodificá-la; dá-nosaconheceralguémquenosensinaaviverfazendofuturo,anãocair na tentação de querer enfrentar o futuro com respostas do passa-do...

este livro deixará quem o ler agradecido, ao autor em primeiro lugar, eàsEdiçõesTenacitaseaoApostoladodaOração,quenosoferecemeste testemunho em português, mas sobretudo ao padre arrupe. ele, nas suasvisitasaPortugal,deixavasempremarcasindeléveisdeamizadeeserviço. em coimbra, em 1980, perante os estudantes que ruidosamente o saudavam,nãofezmaisqueretribuirentoandovelhascançõesdoPaísBasco.Deoutravez(e istoéaindamais impressionante!),atravessan-do lisboa, reparou que estava a passar na Praça Marquês de Pombal epediu para parar o carro. Saiu, atravessou e, ajoelhando-se na base daestátua, ali ficou em oração... decerto meditava nessa outra bomba queum dia fizera suprimir, por quarenta anos, a companhia de Jesus. Masela(eele)aliestava.

17 de Setembro de 2004

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a PRiMeiRa edição PoRtuGueSa de PEdRo ARRuPE

Pedro Miguel Lamet, s.j.

uma eloquente imagem, que vale sempre mais que mil palavras, ser-viriaporsimesmadeapresentaçãoàediçãoportuguesadestabiografiadePedroArrupe,refiro-meàfotografiaemquesepodeveroentãoge-raldosjesuítasporocasiãodeumadassuasvisitasaLisboa,ajoelhadodiante da imponente estátua do Marquês de Pombal, enquanto, com a cabeça inclinada, reza humildemente em frente do maior inimigo que a companhia de Jesus teve em Portugal em toda a sua história, o gover-nantequeexpulsouaordemdopaísecontribuiuparaasuasupressãopor clemente XiV.

assim era Pedro arrupe, um homem de coração grande, um cristão universaleumjesuítadegestosproféticosqueseadiantouaoseutempo.e por esta mesma razão constitui para mim uma enorme satisfação ver agorapublicadaahistóriadasuavidaemlínguaportuguesa,alínguadeumpaísestreitamenteligadoaonascimentoeàdifusãodaCompanhiadeJesus,umpaísqueopadreArrupe(seiqueéassimporqueelemodisseexplicitamente)amavaprofundamente.

a presente biografia, depois de nove edições em espanhol e de tra-duções em vários idiomas, aparece em Portugal num momento oportu-no. a passagem dos anos, longe de obscurecer ou entregar ao esqueci-mento a figura do padre arrupe, valoriza-a cada vez mais. as intuições que teve, os seus escritos, as decisões que tomou e os acontecimentos da suavida,quesuperamomarcoestritamentejesuíticoeatéeclesiástico,tornam-se um testemunho numa sociedade que se preocupa cada vez mais com os direitos humanos, a paz e a justiça e são confirmados pela histórianocomeçodoséculoXXI.

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Por outro lado constitui para mim uma satisfação o facto de este livro aparecer depois do excelente acolhimento que teve a versão portu-guesa do meu romance histórico sobre inácio de loiola, o Cavaleiro das duas Bandeiras, publicado por esta mesma editora, que esgotou três ediçõesemmenosdeumano.NãoéumacoincidênciaquesepubliqueaseguiràquelelivroabiografiadopadreArrupe,outrobascouniver-sal,que realizouumareleiturado fundadordos jesuítasparaonossotempo.ComInáciodeLoiolaogénero literáriodoromance,comumpretendido rigor histórico, sabendo que já há muitas e boas biografias, ajuda a recriar e a reviver o passado, com arrupe, dada a proximidade e acomplexidadepolémicadasuapersonalidade,eraprecisoumabiogra-fia com documentação e achegas de dados e de fontes rigorosos. devo acrescentar que esta edição se encontra actualizada com os dados mais recentes.

Quero aproveitar a oportunidade para agradecer em primeiro lugar aos meus leitores portugueses aquele acolhimento e a publicação deste novo livro. o seu aparecimento em Portugal teve origem numa conferên-cia que proferi em Fátima sobre Pedro arrupe, onde, confrontado com o pedidodosmeusouvintes,lanceiempúblicoodesafioaoeditor,Joãoazevedo Mendes, ali presente, que o acolheu com o entusiasmo e a dedi-caçãoqueocaracterizam.Hojeestelivroéumarealidadegraçastambémao padre Vasco Pinto de Magalhães, um companheiro com quem, comojesuítaehomemdonossotempo,mesintoidentificadoequeumavezmais teve a gentileza de apoiar a sua publicação e de o prefaciar.

Queria expressar igualmente a minha gratidão ao padre Manuel MorujãoeaoirmãoAméricoNunes,doApostoladodaOração,editoradosjesuítasportuguesaseco-editoradolivro,comaTenacitas,peloseuinteresse epela imprescindível colaboração; à valiosa epaciente revi-são da terminologia especializada levado a cabo por antónio coelho, s.j., e especialmente a Fátima Ragageles, autora da excelente tradução –sei que nela há algo mais que muito profissionalismo e trabalho, há umgrandecarinhoparacomopadreArrupe.Porúltimonãoqueriadeixarde referir a inês Vaz Pinto, das cVX de Portugal, pelo seu empenho emqueolivroestejahojeàdisposiçãodosleitoresportugueses.

o optimismo e a alegria de Pedro arrupe impressionavam todos quantos tiveram a felicidade de o conhecer pessoalmente. Nestes tem-

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A Edição PoRTuguEsA dE “PEdRo ARRuPE”

pos em que uma certa atonia e uma depressão difusa e colectiva pa-recem contaminar a nossa sociedade, e por vezes mesmo os próprios crentes, a biografia do padre arrupe pode contribuir para recuperar a esperança.Aolongodosanostenhorecebidomúltiplostestemunhosoucartas de pessoas que me confessaram espontaneamente que a história destehomemdefé,generosoecomprometido,lhesmudouavida,oupelomenosasajudouavê-lacomoutrosolhos.Eéprecisamenteestacapacidade de esperança que gostaria de desejar aqui a todos os meus amigoseaosleitoresdelínguaportuguesa.Seaencontraremnestelivronãoseráporméritomeu,massimdoprópriodon Pedro, que revive e se comunicaatravésdestaspáginas.

31 de Julho de 2004

Pedro Arrupe ajoelhado junto à estátua do Marquês de Pombal, em Lisboa (1980).