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[PeloEstado] - O que poderia ter sido diferente para os catarinenses na greve dos caminhoneiros? Cosme Polêse - Os catarinenses poderiam ter continuado rodando com seus carros e utilizando seus fogões e chuveiros em casa sem a preocupação que o gás acabasse. Para quem já consome gás natu- ral, estas não foram preocupações durante os dez dias de paralisa- ção. Calculamos 100.000 consumi- dores beneficiados com o gás em rede diretamente. Se o gás natural fosse uma opção para o transporte pesado, como na Europa, a quali- dade do ar das cidades seria me- lhor, as tarifas de ônibus seriam mais baratas e não haveria crise de abastecimento. [PE] - Qual o investimento e o tempo necessários para que o es- tado chegue à condição ideal de distribuição de gás natural? Polêse - Hoje nós calculamos que a construção de cada quilômetro de rede custa aproximadamente um milhão de reais. Nós já temos mais de 1.100 quilômetros de rede no estado e, mesmo assim, aten- demos majoritariamente a por- ção Leste, indo até Rio do Sul. É claro que pensamos em levar a rede a todas as regiões, mas é preciso pensar em alternativas mais rápidas do que a implan- tação de redes para que todos os catarinenses tenham acesso ao gás natural. É a condição ideal. Em rede de distribuição, calculamos aproximadamente R$ 2 bilhões de investimentos, o que garantiria o atendimento de todas as regiões e as cidades com maior demanda pelo insumo. Mas dependemos de recursos federais em gasodutos de transporte, e o Plano de Ex- pansão da Malha de Transporte (Pemat), do Ministério de Minas e Energia, não nos dá grande espe- rança de que teremos no curto ou A crise serviu para mostrar o grande valor do GNV, seja pela economia ou pela vantagem do fornecimento contínuo. PeloEstado Entrevista COSME POLÊSE Nas duas últimas semana, o país inteiro praticamente parou. Santa Catarina também sofreu as consequências da paralisação dos transportadores de cargas. Alimentos, medicamentos, ração para os animais, oxigênio para os hospitais e produtos de toda ordem simplesmente deixaram de circular. O desabastecimento veio rápido e o caos ganhou contornos ainda mais graves quando o combustível, gasolina e etanol, desapareceram das bombas, assim como os botijões de gás cheios desapareceram das distribuidoras. Enquanto isso, os clientes da Companhia de Gás de Santa Catarina, a SCGÁS, experimentaram menos limitações do que o restante da população. As frotas de táxi e dos aplicativos de transporte urbano caíram quase que pela metade. Circularam apenas os que já usam o gás natural veicular (GNV), uma aternativa para quem dependia do transporte coletivo, que também teve circulação suspensa. Para o presidente da Companhia, Cosme Polêse, que concedeu essa entrevista exclusiva para falar do cenário caótico que se instalou, os efeitos da greve poderiam ter sido bem menos graves se a dependência dos combustíveis tradicionais fosse menor: “Os catarinenses poderiam ter continuado rodando com seus carros e utilizando seus fogões e chuveiros em casa sem a preocupação que o gás acabasse.” médio prazo uma infraestrutura capaz de universalizar o acesso ao gás natural. [PE] - O que impede que esse pla- no se efetive? Polêse - Nossa capacidade de ve- locidade em investimento. É uma escolha estratégica e regulatória que depende do Estado. Uma tari- fa competitiva como temos hoje – operamos com o gás natural mais barato do Brasil – significa poster- gação de investimentos. Entendo que devemos achar um equilíbrio que leva a SCGÁS a poder investir no mínimo R$ 100 milhões por ano em implantação de rede de infraes- trutura de gás natural para a dis- tribuição a novas regiões e cidades. [PE] - Que apoio a SCGÁS recebe do governo estadual? É suficiente? Polêse - O governo do Estado nos deu tudo. A concessão pública dos serviços de distribuição e as tarifas com as margens para in- vestimento. Precisamos que ele seja um articulador de todos os interesses para que dialoguemos da melhor forma com o mercado e a sociedade. Precisamos compre- ender os múltiplos interesses para atendê-los e ninguém melhor que Estado para nortear estes passos que apontam para as regiões que precisam de novos investimentos. Aonde o gás chega, leva junto desenvolvimento e qualidade de vida. Os locais em que não chega, são punidos. Logo, o gás natural deve estar em todos os lugares. [PE] - A SCGÁS é uma companhia lucrativa, autossustentável? Polêse - Desde o início da opera- ção, a SCGÁS sempre foi uma companhia lucrativa, mas que, na minha ótica, deveria ter investido muito mais. Por diversas contin- gências e, em especial, o gargalo no reajuste da nossa margem de distribuição, registramos um pre- juízo de R$ 46 milhões em 2017 e nosso planejamento aponta para metade deste prejuízo em 2018. Esta curva deve ser revertida em 2019 com os avanços regulatórios necessários. [PE] - Qual a situação de Santa Catarina na comparação com ou- tros estados no que diz respeito ao gás natural? Polêse - Atualmente, a SCGÁS é a segunda maior distribuidora do país em número de municípios atendidos, e Santa Catarina é o terceiro estado em extensão de rede, indústrias e postos de GNV atendidos. Em termos geográficos, nosso estado se assemelha muito com Portugal. Eles têm uma po- pulação um pouco maior, enquan- to nosso atendimento industrial é superior, mas as soluções para interiorização são parecidas. Logi- camente, eles estão muito à nossa frente, tanto que o modelo de re- des isoladas, que está sendo cons- truído em Lages e pretendemos utilizar em outras localidades, foi importado de Portugal. [PE] - Como está o projeto de tor- nar as frotas municipais abasteci- das por GNV? Polêse - Isto depende dos municí- pios. Temos a oferta de um com- bustível altamente econômico e as ferramentas ideais para os inves- timentos necessários por meio de projeto especial da Agência de Fo- mento do Estado (Badesc). Vemos hoje muitos taxistas e motoristas de aplicativos optarem pelo GNV. Ele é novamente o combustível da moda, crescendo mais de 7% em 2017 na relação com o ano anterior. [PE] - Qual a preocupação com a “corrida” às oficinas de adaptação de veículos para o uso de GNV, mo- tivada pela greve? Polêse - Não existe preocupação. Apesar de se tratar de um momen- to excepcional, ficamos felizes em saber que mais motoristas rodarão utilizando o gás natural, que é mais econômico e agride menos o meio ambiente que os combustíveis lí- quidos. Parece que a procura por convertedoras aumentou 20% nes- tes dias, segundo a ACOI (Associa- ção Catarinense dos Organismos de Inspeção), e nós ficamos con- tentes com isso. A crise serviu para mostrar o grande valor do GNV, seja pela economia ou pela van- tagem do fornecimento contínuo. [PE] - Aliás, ainda tem muita confusão quanto às diferenças de GNV e GLP. Como explicar isso para a população leiga? Polêse - De fato, muita gente ainda não consegue diferenciar e o erro acontece até por parte da impren- sa. O gás natural tem origem na decomposição de materiais fósseis no interior da terra. Já o GLP, o gás liquefeito de petróleo, provém do refino de petróleo. Ainda nestes termos, o gás natural é mais segu- ro, porque é mais leve que o ar e se dissipa facilmente, ao contrário do que chamamos popularmente de gás de cozinha. Além disso, o gás natural é entregue através de rede canalizada, o que dispensa transporte rodoviário e estrutura de estocagem. Quanto ao preço, principalmente pela atual política de preços aplicada ao GLP, o gás natural mostra-se cada vez mais como uma solução vantajosa. [PE] - Hoje, qual a relação de vantagens do gás natural em rela- ção a outros combustíveis? Polêse - Como combustível, ele é mais competitivo que os seus principais concorrentes, seja para indústria, comércio, serviços, resi- dências ou automóveis. Talvez a única exceção neste sentido seja o carvão, que, por outro lado, agride muito mais o meio ambiente. Em termos de redução da poluição, aliás, o gás natural é o combustí- vel fóssil que menos afeta a natu- reza, tanto que é tratado como a ponte para as energias renováveis nas nações desenvolvidas. Estu- dos da nossa Gerência de Tecnolo- gia apontam, por exemplo, que o uso de gás natural reduz a emissão de gases poluentes em 90%. Já em 2012, outro estudo constatou que a conversão ao uso do gás na- tural dos clientes que atendíamos na época fez com que 11 milhões de toneladas de dióxido de carbo- no deixassem de ser liberadas na atmosfera, o que corresponde ao efeito de 20,3 milhões de árvores, quase 20 mil campos de futebol. Um terceiro aspecto diz respeito ao conforto da entrega via rede canalizada, já que não é preciso se preocupar com reposição e es- toque. Até a mobilidade urbana melhora! É que o gás canalizado elimina a necessidade de circula- ção de 500 caminhões por dia em nossas vias públicas. “Operamos com o gás natural mais barato do Brasil” Por Andréa Leonora Foto: Divulgação SCGÁS [email protected] Extensão da rede 1,1 mil km Regiões atendidas Norte, Vale e Alto Vale do Itajaí, Grande Florianópolis e Sul Clientes 12,3 mil - 268 indústrias - 134 postos - 281 comércios - 11,6 mil residências

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[PeloEstado] - O que poderia ter sido diferente para os catarinenses na greve dos caminhoneiros?Cosme Polêse - Os catarinenses poderiam ter continuado rodando com seus carros e utilizando seus fogões e chuveiros em casa sem a preocupação que o gás acabasse. Para quem já consome gás natu-ral, estas não foram preocupações durante os dez dias de paralisa-ção. Calculamos 100.000 consumi-dores beneficiados com o gás em rede diretamente. Se o gás natural fosse uma opção para o transporte pesado, como na Europa, a quali-dade do ar das cidades seria me-lhor, as tarifas de ônibus seriam mais baratas e não haveria crise de abastecimento. [PE] - Qual o investimento e o tempo necessários para que o es-tado chegue à condição ideal de distribuição de gás natural?Polêse - Hoje nós calculamos que a construção de cada quilômetro de rede custa aproximadamente um milhão de reais. Nós já temos mais de 1.100 quilômetros de rede no estado e, mesmo assim, aten-demos majoritariamente a por-ção Leste, indo até Rio do Sul. É claro que pensamos em levar a rede a todas as regiões, mas é preciso pensar em alternativas mais rápidas do que a implan-tação de redes para que todos os catarinenses tenham acesso ao gás natural. É a condição ideal. Em rede de distribuição, calculamos aproximadamente R$ 2 bilhões de investimentos, o que garantiria o atendimento de todas as regiões e as cidades com maior demanda pelo insumo. Mas dependemos de recursos federais em gasodutos de transporte, e o Plano de Ex-pansão da Malha de Transporte (Pemat), do Ministério de Minas e Energia, não nos dá grande espe-rança de que teremos no curto ou

A crise serviu para mostrar o grande valor do GNV, seja pela economia ou pela vantagem do fornecimento contínuo. PeloEstado

Entrevista COSME POLÊSE

Nas duas últimas semana, o país inteiro praticamente parou. Santa Catarina também sofreu as consequências da paralisação dos transportadores de cargas. Alimentos, medicamentos, ração para os animais, oxigênio para os hospitais e produtos de toda ordem simplesmente deixaram de circular. O desabastecimento veio rápido e o caos ganhou contornos ainda mais graves quando o combustível, gasolina e etanol, desapareceram das bombas, assim como os botijões de gás cheios desapareceram das distribuidoras. Enquanto isso, os clientes da Companhia de Gás de Santa Catarina, a SCGÁS, experimentaram menos limitações do que o restante da população. As frotas de táxi e dos aplicativos de transporte urbano caíram quase que pela metade. Circularam apenas os que já usam o gás natural veicular (GNV), uma aternativa para quem dependia do transporte coletivo, que também teve circulação suspensa. Para o presidente da Companhia, Cosme Polêse, que concedeu essa entrevista exclusiva para falar do cenário caótico que se instalou, os efeitos da greve poderiam ter sido bem menos graves se a dependência dos combustíveis tradicionais fosse menor: “Os catarinenses poderiam ter continuado rodando com seus carros e utilizando seus fogões e chuveiros em casa sem a preocupação que o gás acabasse.”

médio prazo uma infraestrutura capaz de universalizar o acesso ao gás natural. [PE] - O que impede que esse pla-no se efetive?Polêse - Nossa capacidade de ve-locidade em investimento. É uma escolha estratégica e regulatória que depende do Estado. Uma tari-fa competitiva como temos hoje – operamos com o gás natural mais barato do Brasil – significa poster-gação de investimentos. Entendo que devemos achar um equilíbrio que leva a SCGÁS a poder investir no mínimo R$ 100 milhões por ano em implantação de rede de infraes-trutura de gás natural para a dis-tribuição a novas regiões e cidades. [PE] - Que apoio a SCGÁS recebe do governo estadual? É suficiente?Polêse - O governo do Estado nos deu tudo. A concessão pública dos serviços de distribuição e as tarifas com as margens para in-vestimento. Precisamos que ele seja um articulador de todos os interesses para que dialoguemos da melhor forma com o mercado e a sociedade. Precisamos compre-ender os múltiplos interesses para atendê-los e ninguém melhor que Estado para nortear estes passos que apontam para as regiões que precisam de novos investimentos. Aonde o gás chega, leva junto desenvolvimento e qualidade de vida. Os locais em que não chega, são punidos. Logo, o gás natural deve estar em todos os lugares. [PE] - A SCGÁS é uma companhia lucrativa, autossustentável? Polêse - Desde o início da opera-ção, a SCGÁS sempre foi uma companhia lucrativa, mas que, na minha ótica, deveria ter investido muito mais. Por diversas contin-gências e, em especial, o gargalo no reajuste da nossa margem de

distribuição, registramos um pre-juízo de R$ 46 milhões em 2017 e nosso planejamento aponta para metade deste prejuízo em 2018. Esta curva deve ser revertida em 2019 com os avanços regulatórios necessários. [PE] - Qual a situação de Santa Catarina na comparação com ou-tros estados no que diz respeito ao gás natural?Polêse - Atualmente, a SCGÁS é a segunda maior distribuidora do país em número de municípios atendidos, e Santa Catarina é o terceiro estado em extensão de rede, indústrias e postos de GNV atendidos. Em termos geográficos, nosso estado se assemelha muito com Portugal. Eles têm uma po-pulação um pouco maior, enquan-to nosso atendimento industrial é superior, mas as soluções para interiorização são parecidas. Logi-camente, eles estão muito à nossa frente, tanto que o modelo de re-des isoladas, que está sendo cons-truído em Lages e pretendemos utilizar em outras localidades, foi importado de Portugal. [PE] - Como está o projeto de tor-nar as frotas municipais abasteci-das por GNV?Polêse - Isto depende dos municí-pios. Temos a oferta de um com-bustível altamente econômico e as ferramentas ideais para os inves-timentos necessários por meio de projeto especial da Agência de Fo-mento do Estado (Badesc). Vemos hoje muitos taxistas e motoristas de aplicativos optarem pelo GNV. Ele é novamente o combustível da moda, crescendo mais de 7% em 2017 na relação com o ano anterior.

[PE] - Qual a preocupação com a “corrida” às oficinas de adaptação de veículos para o uso de GNV, mo-tivada pela greve?

Polêse - Não existe preocupação. Apesar de se tratar de um momen-to excepcional, ficamos felizes em saber que mais motoristas rodarão utilizando o gás natural, que é mais econômico e agride menos o meio ambiente que os combustíveis lí-quidos. Parece que a procura por convertedoras aumentou 20% nes-tes dias, segundo a ACOI (Associa-ção Catarinense dos Organismos de Inspeção), e nós ficamos con-tentes com isso. A crise serviu para mostrar o grande valor do GNV, seja pela economia ou pela van-tagem do fornecimento contínuo. [PE] - Aliás, ainda tem muita confusão quanto às diferenças de GNV e GLP. Como explicar isso para a população leiga?Polêse - De fato, muita gente ainda não consegue diferenciar e o erro acontece até por parte da impren-sa. O gás natural tem origem na decomposição de materiais fósseis no interior da terra. Já o GLP, o gás liquefeito de petróleo, provém do refino de petróleo. Ainda nestes termos, o gás natural é mais segu-ro, porque é mais leve que o ar e se dissipa facilmente, ao contrário do que chamamos popularmente de gás de cozinha. Além disso, o gás natural é entregue através de rede canalizada, o que dispensa transporte rodoviário e estrutura de estocagem. Quanto ao preço, principalmente pela atual política de preços aplicada ao GLP, o gás natural mostra-se cada vez mais como uma solução vantajosa. [PE] - Hoje, qual a relação de vantagens do gás natural em rela-ção a outros combustíveis?Polêse - Como combustível, ele é mais competitivo que os seus principais concorrentes, seja para indústria, comércio, serviços, resi-dências ou automóveis. Talvez a única exceção neste sentido seja o

carvão, que, por outro lado, agride muito mais o meio ambiente. Em termos de redução da poluição, aliás, o gás natural é o combustí-vel fóssil que menos afeta a natu-reza, tanto que é tratado como a ponte para as energias renováveis nas nações desenvolvidas. Estu-dos da nossa Gerência de Tecnolo-gia apontam, por exemplo, que o uso de gás natural reduz a emissão de gases poluentes em 90%. Já em 2012, outro estudo constatou que a conversão ao uso do gás na-tural dos clientes que atendíamos na época fez com que 11 milhões de toneladas de dióxido de carbo-no deixassem de ser liberadas na atmosfera, o que corresponde ao efeito de 20,3 milhões de árvores, quase 20 mil campos de futebol. Um terceiro aspecto diz respeito ao conforto da entrega via rede canalizada, já que não é preciso se preocupar com reposição e es-toque. Até a mobilidade urbana melhora! É que o gás canalizado elimina a necessidade de circula-ção de 500 caminhões por dia em nossas vias públicas.

“Operamos com o gás natural mais barato do Brasil”

Por Andréa LeonoraFoto: Divulgação SCGÁ[email protected]

Extensão da rede• 1,1 mil kmRegiões atendidas• Norte, Vale e Alto

Vale do Itajaí, Grande Florianópolis e Sul

Clientes• 12,3 mil - 268 indústrias - 134 postos - 281 comércios - 11,6 mil residências