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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE ESCOLA DE ENGENHARIA DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO LABORATÓRIO DE TECNOLOGIA, GESTÃO DE NEGÓCIOS E MEIO AMBIENTE MESTRADO PROFISSIONAL EM SISTEMAS DE GESTÃO MIRELLA MARCHITO CONDÉ PERFIL EMPREENDEDOR E INOVAÇÃO: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO SOBRE AS PEQUENAS EMPRESAS DO ARRANJO PRODUTIVO LOCAL DE NOVA FRIBURGO Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Sistemas de Gestão da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre em Sistemas de Gestão. Área de Concentração: Organizações e Estratégia. Linha de Pesquisa: Sistema de Gestão da Responsabilidade Social e Sustentabilidade. Orientador: Prof. Eduardo Rodrigues Gomes, D.Sc. Niterói 2013

PERFIL EMPREENDEDOR E INOVAÇÃO: UM ESTUDO … Mirella... · ainda em sala de aula, os caminhos para a estruturação do projeto de pesquisa ... Tabela 3 Escala de Likert: intensidade

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

    ESCOLA DE ENGENHARIA

    DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA DE PRODUO

    LABORATRIO DE TECNOLOGIA, GESTO DE NEGCIOS E MEIO AMBIENTE

    MESTRADO PROFISSIONAL EM SISTEMAS DE GESTO

    MIRELLA MARCHITO COND

    PERFIL EMPREENDEDOR E INOVAO: UM ESTUDO EXPLORATRIO SOBRE

    AS PEQUENAS EMPRESAS DO ARRANJO PRODUTIVO LOCAL DE

    NOVA FRIBURGO

    Dissertao apresentada ao Curso de Mestrado em Sistemas de Gesto da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para obteno do Grau de Mestre em Sistemas de Gesto. rea de Concentrao: Organizaes e Estratgia. Linha de Pesquisa: Sistema de Gesto da Responsabilidade Social e Sustentabilidade.

    Orientador:

    Prof. Eduardo Rodrigues Gomes, D.Sc.

    Niteri

    2013

  • C745 Cond, Mirella Marchito.

    Perfil empreendedor e inovao: um estudo exploratrio sobre a experincia das pequenas empresas do arranjo produtivo local de Nova Friburgo / Mirella Marchito Cond. Niteri, RJ: 2013. 129 f. : il.

    Dissertao (Mestrado em Sistemas de Gesto) Universidade Federal Fluminense, 2013.

    Orientador: Eduardo Rodrigues Gomes.

    1. Empreendedorismo. 2. Responsabilidade social. 3. Inovao. 4. Pequenas empresas. I. Ttulo.

    CDD 658.11

  • Dedico este trabalho

    Aos meus pais, que me outorgaram a oportunidade de aprender e a liberdade para

    escolher, minha irm e sobrinha que me possibilitaram a vivncia do amor fraterno,

    e a todos os meus familiares e amigos que me apoiaram do incio ao fim deste

    projeto de vida.

  • AGRADECIMENTOS

    Aos meus familiares pelo apoio incondicional embalando-me em vibraes de amor.

    Ao meu amigo e lder Amrico Diniz Neto, por ter acreditado no meu sonho e

    contribudo com sua crtica inteligente e construtiva, me ajudando a avanar sempre.

    Ao querido Professor Eduardo Gomes, meu nobre orientador, por ter me aceito

    como sua orientanda, e com sua vocao mpar para a docncia, transformou esta

    longa caminhada em um aprazvel passeio. A voc minha gratido eterna.

    Aos professores e funcionrios do LATEC pelo apoio fundamental para esta

    conquista.

    Aos queridos amigos do mestrado, companheiros de jornada que tanto contriburam

    com seus pontos de vista, ajudando-me na construo de quem sou, e me

    inspirando para o porvir.

    Professora Maria Alice Nunes Costa, com a qual tive a oportunidade de encontrar,

    ainda em sala de aula, os caminhos para a estruturao do projeto de pesquisa

    acadmica, introduzindo-me no processo reflexivo inerente pesquisa acadmica.

    Ao querido Professor Cid Alledi, por ter me lembrado que somos um ser integral, e

    por este motivo mesmo, o propsito que nos move intrnseco vida, seja esta

    familiar, acadmica ou profissional.

    A todos os professores que passaram pela minha vida, impulsionando-me por meio

    do saber a agir proativamente em busca dos meus ideais.

    A Deus, que me abriu todas as portas para realizar este sonho, proporcionando-me

    o equilbrio fsico, mental e emocional e igualmente me inspirando por meio das

    palavras de Chico Xavier a acreditar que embora ningum possa voltar atrs e fazer

    um novo comeo, qualquer um pode comear agora e fazer um novo fim. Eu escolhi

    fazer um novo fim.

  • O esprito empresarial transcende a prtica de negcios.

    uma espcie distinta da ao humana que deriva de negcios,

    mas pode operar em qualquer rea da atividade humana. O

    empreendedorismo tambm um exerccio bsico de

    responsabilidade social. Como o mundo natural e o avano do

    refluxo de recursos de tecnologia, cada vez mais a humanidade

    vai viver pela sua inteligncia. Inovao sozinha no ser

    suficiente. Ns precisaremos de pessoas que saibam como

    implementar novas idias e torn-las acessveis a grandes

    populaes. Vamos ter de construir e manter uma sociedade

    mais empreendedora.

    William Scott Green

  • RESUMO

    A presente pesquisa busca promover um estudo sobre as empresas de confeco que compem o arranjo produtivo local de moda de Nova Friburgo/RJ, mais especificamente as Empresas de Pequeno Porte (EPP). Busca responder a questo se o perfil empreendedor propicia inovaes nos processos das pequenas empresas instaladas em arranjos produtivos locais. O estudo sobre as prticas do empreendedorismo no arranjo produtivo local de moda em Nova Friburgo/RJ, investigando a existncia de atitudes empreendedoras e a ocorrncia de inovao incremental nas pequenas empresas, tem como objetivo principal pesquisar a correlao entre o empreendedorismo no nvel ttico e as inovaes em processos, como resultado do comportamento empreendedor. Constitui-se em uma pesquisa exploratria, utilizando-se de entrevista estruturada para a coleta de dados qualitativos, incluindo-se, ainda, a descrio da populao e a amostra selecionada para a realizao da mesma. Por fim, apresenta a tabulao e anlise dos dados obtidos, intencionando proporcionar maior conhecimento sobre o fenmeno em pauta, cuja anlise dos resultados sugere a inexistncia de relao causal entre o perfil empreendedor e a inovao.

    Palavras-chave: Responsabilidade Social.Empreendedorismo. Inovao. Pequenas

    Empresas.

  • ABSTRACT

    This research seeks to promote a study on the production companies that make up the local productive arrangement fashion Nova Friburgo / RJ, specifically the Small Businesses (EPP). Seeks to answer the question whether the entrepreneurial profile provides innovations in processes of small companies located in local clusters. The study of entrepreneurship practices in the local productive fashion arrangement in Nova Friburgo / RJ, investigating the existence of entrepreneurial attitudes and the occurrence of incremental innovation in small companies, has as main objective to study the correlation between entrepreneurship at the tactical level and innovations in processes as a result of entrepreneurial behavior. It is in an exploratory research, using structured interviews to collect qualitative data, including also the description of the population and the sample selected to perform the same. Finally, it shows the tabulation and analysis of data, intending to provide greater understanding of the phenomenon in question, whose analysis of the results suggests that there is no causal relationship between the entrepreneurial and innovation.

    Keywords: Social Responsibility. Entrepreneurship. Innovation. Small Business.

  • LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 Evoluo do Perfil Profissional 28

    Figura 2 Alinhamento dos Objetivos Organizacionais 35

    Figura 3 Caractersticas Atitudinais do Empreendedor 44

    Figura 4 Condies Bsicas para Prtica Intraempreendedora 46

    Figura 5 Modalidades e Variaes do Empreendedorismo Corporativo 47

    Figura 6 O modelo GEM 51

    Figura 7 As principais funes da inovao 60

    Figura 8 O Campo das Polticas de Inovao 62

    Figura 9 Efeitos da Inovao 63

    Figura 10 Vias de Inovao X Tipos de Inovao 67

    Figura 11 Competncias da empresa inovadora 68

    Figura 12 Localizao de Nova Friburgo 70

    Figura 13 Percentual de estabelecimentos por tamanho 72

  • LISTA DE QUADROS

    Quadro 1 Pesquisa GEM Brasil 2001-2008 32

    Quadro 2 Organizao Tradicional X Organizao Intraempreendedora 48

    Quadro 3 Critrios de Competitividade no Sculo XX 61

    Quadro 4 Definies de Arranjo Produtivo Local 78

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 Indicadores Socioeconmicos por Municpios: Serrana I,

    2010

    71

    Tabela 2 Nmero de estabelecimentos por setor e tamanho da

    empresa: Estado do Rio de Janeiro, Serrana e Municpios,

    2011

    72

    Tabela 3 Escala de Likert: intensidade do perfil empreendedor 83

    Tabela 4 Intervalo de pontos: caractersticas do perfil empreendedor 84

    Tabela 5 Classificao Nacional da Atividade Econmica - CNAE 84

    Tabela 6 Classificao do Porte das Empresas RAIS 85

    Tabela 7 Nmero de Funcionrios das Pequenas Empresas

    Respondentes

    86

    Tabela 8 Caracterizao do Entrevistado: Gnero, Idade, Cargo 86

    Tabela 9 Escala de Likert: intensidade do perfil empreendedor do nvel

    ttico

    87

    Tabela 10 Intervalo de pontos: caractersticas do perfil empreendedor

    do nvel ttico

    87

    Tabela 11 Distribuio dos pontos por caractersticas do perfil

    empreendedor por empresa

    88

    Tabela 12 Distribuio dos pontos por caractersticas do perfil

    empreendedor por cargo

    89

    Tabela 13 Distribuio dos pontos por caracterstica do comportamento

    empreendedor

    90

    Tabela 14 Estrutura Hierrquica x Nmero de Funcionrios 91

    Tabela 15 Impacto das inovaes em processos: iniciativas de melhoria

    contnua

    92

    Tabela 16 Problemas e obstculos s inovaes 93

    Tabela 17 Justificativas para a ausncia de inovao em 2012 94

    Tabela 18 Grau de importncia dos fatores endgenos e exgenos

    sobre as atividades inovativas

    94

    Tabela 19 Inovaes organizacionais: atividades com melhorias

    contnuas

    95

  • LISTA DE SIGLAS

    APL Arranjo Produtivo Local

    CNAE Classificao Nacional da Atividade Econmica

    DIEESE Departamento Intersindical de Estatstica e Estudos Socioeconmicos

    EPP Empresa de Pequeno Porte

    EUA Estados Unidos da Amrica

    GEM Global Entrepreneurship Monitor

    IBAM Instituto Brasileiro de Administrao Municipal

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    IBICT Instituto Brasileiro de Informao em Cincia e Tecnologia

    IBQP Instituto Brasileiro da Qualidade e Produtividade

    IETS Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade

    MDIC Ministrio do Desenvolvimento, Indstria e Comrcio Exterior

    MPE Micro e Pequena Empresa

    MTE Ministrio do Trabalho e Emprego

    OCDE Organizao para a Cooperao e o Desenvolvimento Econmico

    PE Pequena Empresa

    P&D Pesquisa e Desenvolvimento

    PIB Produto Interno Bruto

    PINTEC Pesquisa Industrial de Inovao Tecnolgica

    PNUD Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento

    QT Qualidade Total

    RAIS Relao Anual de Informaes Sociais

    SEBRAE Servio Brasileiro de Apoio s Micro e Pequenas Empresas

    SINDVEST Sindicato das Indstrias de Vesturio de Nova Friburgo e Regio

    TEA Taxa de Empreendedores Individuais

    UNCTAD United Nations Conference on Trade and Development

  • SUMRIO

    1 INTRODUO 13 1.1 FORMULAO DA SITUAO-PROBLEMA 15 1.2 OBJETIVO GERAL 16 1.3 OBJETIVOS ESPECFICOS 17 1.4 JUSTIFICATIVA 17 1.5 LIMITAES DA PESQUISA 17 1.6 ESTRUTURA DA DISSERTAO 18 2 REFERENCIAL TERICO 19 2.1 EMPREENDEDORISMO E DESENVOLVIMENTO

    ECONMICO 19

    2.1.1 Aspectos da Atividade Econmica Mundial 19 2.2 PERFIL EMPREENDEDOR: UM ALICERCE DA INOVAO 34 2.2.1 Marco Terico 36 2.2.2 Dilogo entre as Teorias e Conceitos 38 2.2.2.1 Entrepreneurial Way 41 2.2.2.2 Intraempreendedorismo: uma vertente do perfil empreendedor 45 2.3 INOVAO PARA COMPETITIVIDADE NO SCULO XXI 52 2.3.1 O Paradigma da Inovao no Ambiente Negocial 60 2.3.2 Inovao e Competio 63 2.3.2.1 Tipos de Inovao 65 3 ESTUDO DE CASO 70 3.1 O MUNICPIO 70 3.2 A HISTRIA 73 3.3 O ARRANJO PRODUTIVO LOCAL 75 4 METODOLOGIA DA PESQUISA 81 4.1 TIPO DE PESQUISA 81 4.2 POPULAO E AMOSTRA 84 4.3 ANLISE DOS RESULTADOS 85 4.4 QUALIFICAO DAS EMPRESAS E DOS ENTREVISTADOS 85 4.5 BLOCO 1 QUALIFICAO DO PERFIL EMPREENDEDOR 86 4.6 BLOCO 2 QUALIFICAO DA INOVAO 92 4.7 DISCUSSO DOS RESULTADOS 96

    5 CONCLUSES E SUGESTES DE NOVAS PESQUISAS 112 5.1 CONCLUSES 112 5.2 INDICAES DE NOVAS PESQUISAS 113 REFERNCIAS 115 APENDICES 124 APNDICE A - QUESTIONRIO 124 APNDICE B GRADE DE REFERNCIA PARA ANLISE

    DO PERFIL EMPREENDEDOR 128

  • 13

    1 INTRODUO

    Os sistemas de gesto, intrinsecamente ligados produo capitalista

    instaurada na Revoluo Industrial, impulsionaram no apenas o surgimento das

    escolas de administrao como tambm a anlise e o aperfeioamento das teorias

    elaboradas no meio acadmico na busca constante pela produtividade,

    competitividade, e contemporaneamente, sustentabilidade (DORNELAS, 2008;

    DRUCKER, 2003; FILION, 1999; HASHIMOTO, 2006;).

    Com o advento do comrcio global, manter-se competitivo se tornou

    sobremaneira desafiador, mediante uma competio que deixa de ser

    exclusivamente dentro das prprias fronteiras (SCHUMPETER,1982) , sejam estas

    de um bairro, cidade ou pas, e passa a ser transnacional. A urgncia do capital

    introduziu no ambiente dos negcios o modelo just in time onde o conceito de tempo

    real provocou impacto expressivo na dinmica empresarial, interferindo diretamente

    na gesto dos recursos.

    Observa-se no sculo XX a experimentao de pesquisadores sob mltiplas

    abordagens, entre as quais Frederick Taylor introduz o ganho de produtividade pela

    racionalizao do processo produtivo com a sistematizao das operaes,

    enquanto Henri Fayol enfatizou a flexibilidade administrativa, experincia e

    conhecimentos tcitos na coordenao de esforos coletivos para o alcance de

    objetivos comuns, em detrimento de teorias e rigidez na execuo do trabalho. A

    evoluo destes experimentos possibilitou o surgimento das condies favorveis

    para o que hoje se considera a abordagem holstica, integrando os trs elos

    (financeiro, material e humano) e colocando o elemento humano em igualdade de

    importncia no sistema produtivo. Desde ento, uma diversidade de teorias,

    metodologias e tecnologias gerenciais se sucedem como ondas no oceano da

    administrao, em busca do melhor resultado para o capital.

    O empreendedorismo, considerado por muitos como a prxima onda, emerge do

    pensamento intelectual com a publicao de artigos e livros na dcada de 1980

    (DRUCKER, 1986; PINCHOT, 1989), quando ento o tema estava relacionado a

    uma habilidade para poucos. Contudo, sua origem como experimento data da

    dcada de 1960 quando David McClelland, psiclogo da Universidade de Harvard,

    nos Estados Unidos, identificou em empresrios de sucesso um elemento

    psicolgico marcante por ele intitulado motivao da realizao ou impulso para

  • 14

    melhorar (McCLELLAND, 1967). Partindo deste pressuposto McClelland

    desenvolveu e testou at o final dos anos 1970, em mais de 40 pases, o

    treinamento da motivao para a realizao, objetivando melhorar esta caracterstica

    e torn-la aplicvel no ambiente empresarial. A proposta original de McClelland

    apresentou resultados positivos na criao e ampliao de empresas, e, passou a

    ser a base, em meados dos anos 1980, para o aprimoramento do comportamento

    empreendedor, com a disseminao de suametodologia ao redor do mundo por

    meio do UNCTAD United Nations Conference on Trade and Development,

    traduzido para o portugus como Programa das Naes Unidas para o

    Desenvolvimento (LEITE; MELO, 2008).

    No mbito das cincias exatas, Joseph Schumpeter, economista austraco que se

    estabelece em Harvard aps a Primeira Guerra Mundial, apresenta o antagonismo

    entre progresso e destruio criativa, imputando o progresso ao das empresas

    inovadoras por meio da figura do empreendedor. Segundo Schumpeter apud Degen

    (1989, p. 9):

    O empreendedor o agente do processo de destruio criativa. o impulso fundamental que aciona e mantm em marcha o motor capitalista, constantemente criando novos produtos, novos mercados e, implacavelmente, sobrepondo-se aos antigos mtodos menos eficientes e mais caros.

    A conjuno das bases tericas de McClelland (1967) s de Schumpeter

    (1982) fundamentam o enquadramento do empreendedorismo sob as ticas

    comportamental e instrumental, possibilitando a abordagem da inovao como um

    atributo do comportamento do empreendedor, definido por Filion (1999) como uma

    pessoa que empenha toda sua energia na inovao e no crescimento,

    manifestando-se, ou com a criao de empresas ou desenvolvendo alguma coisa

    completamente nova em uma empresa pr-existente o intraempreendedorismo.

    Eis o ponto de que trata o intraempreendedorismo e se constitui no foco de

    pesquisa deste projeto, cuja problematizao est pautada na correlao entre a

    influncia do perfil empreendedor nas empresas participantes de arranjos produtivos

    locais e as inovaes em processos que resultaram do intraempreendedorismo.

    exatamente sobre este aspecto que contextualizamos o tema desta

    pesquisa, partindo a investigao da existncia do perfil empreendedor no nvel

  • 15

    ttico das Empresas de Pequeno Porte - EPPs, da identificao da inovao

    incremental, ambos contribuindo para a competitividade empresarial, buscando

    estabelecer parmetros para impulsionar a atividade econmica no ambiente das

    pequenas empresas por meio dos seus recursos internos.

    1.1 FORMULAO DA SITUAO-PROBLEMA

    No Brasil, o universo das micro e pequenas empresas representa o

    contingente de 99%do nmero absoluto de negcios instalados, segundo

    informaes do Servio de Apoio s Micro e Pequenas Empresas instituio

    privada sem fins lucrativos que tem a misso de promover a competitividade e o

    desenvolvimento sustentvel dos empreendimentos de micro e pequeno porte. Por

    intermdio de monitoramento, o SEBRAE apurou no levantamento realizado em

    2007 um aumento de 51% em 2002 para 78% em 2005 de empresas que

    mantiveram suas atividades por mais de dois anos, uma marca significativa quando

    considerado os levantamentos anteriores (acesso em 31/03/11).

    Conforme informaes disponibilizadas na pesquisa Fatores Condicionantes e

    Taxa de Mortalidade das MPE (VOX POPULI, 2005, p. 7), no perodo 2003-2005

    foram abertas no Estado do Rio de Janeiro 27.598 MPE Micro e Pequenas

    Empresas, das quais 25.832 enquadradas como Microempresa e 1.545 como

    empresas de Pequeno Porte, e em cuja estratificao, constatou-se o fechamento

    de 77 das 412 empresas da amostra, ou seja, 19% das MPEs abertas no Estado do

    Rio de Janeiro entre 2003 e 2005 no ultrapassaram o segundo ano de vida.

    A srie histrica 2000-2010 produzida pelo GEM Global Entrepreneurship

    Monitordemonstra evoluo da qualidade tanto dos empreendedores brasileiros

    quanto das empresas instaladas no pas no decorrer das 12edies. O relatrio

    2010 no s apresenta o Brasil com a maior Taxa de Empreendedores em Estgio

    Inicial (TEA) dentre os pases membros do G20 participantes desta pesquisa, com

    17,5% (IBQP, 2010, p. 36), como evidencia as condies macroeconmicas

    favorveis resultantes da estabilidade produzida pelo controle da inflao,

    crescimento econmico e aumento do poder aquisitivo da populao. Todavia,

  • 16

    constata tambm que a inovao ainda incipiente (IBQP, 2010, p. 23) acabando

    por impactar na competitividade e longevidade das pequenas empresas.

    Farah Jnior (2001, p. 14) relata a necessidade da evoluo e ampliao da

    capacidade competitiva individual e coletiva das MPEs, visando sua permanncia e

    disputa no mercado, agora mais concorrido em funo do avano da globalizao.

    Segundo o autor, a dependncia da competitividade do tecido empresarial est

    relacionada tanto a variveis exgenas quanto endgenas s unidades de produo,

    e que nem sempre so passveis de mudanas no curto prazo.

    A presente pesquisa busca promover um estudo nas empresas de confeco

    que compem o arranjo produtivo local de moda de Nova Friburgo/RJ, mais

    especificamente as empresas de pequeno porte EPP, respondendo ao problema:

    o perfil empreendedor propicia inovaes nos processos das pequenas empresas

    instaladas em arranjos produtivos locais?

    Em funo da temtica proposta e da experincia a ser avaliada nesta

    pesquisa, sugerida a seguinte questo norteadora:

    1) A incidncia das caractersticas do comportamento empreendedor no

    nvel ttico da organizao indutora de inovao incremental nas empresas de

    pequeno porte?

    Acredita-se que a incorporao dos parmetros intraempreendedores para a

    inovao na estrutura das Empresas de Pequeno Porte poder contribuir para que o

    segmento empresarial brasileiro evolua para o nvel de maturidade dos pases

    desenvolvidos (SOUZA NETO, 2003), deixando no passado a longa permanncia no

    rol dos pases emergentes. A seguir so detalhados os objetivos desta pesquisa,

    suas limitaes, justificativa e estrutura de apresentao da dissertao.

    1.2 OBJETIVO GERAL

    Analisar se a ocorrncia do perfil empreendedor (McCLELLAND, 1967) no

    nvel ttico, resulta ou no em inovao enquanto melhoria de processo, em

    pequenas empresas instaladas em APLs.

  • 17

    1.3 OBJETIVOS ESPECFICOS

    a) Identificar a existncia das caractersticas empreendedoras no nvel

    ttico, configurando o intraempreendedorismo.

    b) Verificar se o intraempreendedorismo resulta em inovao incremental

    nas empresas de pequeno porte.

    c) Verificar o grau de importncia de variveis exgenas e endgenas que

    dificultam a inovao em empresas de pequeno porte.

    1.4 JUSTIFICATIVA

    Ao verificar a correlao entre o perfil empreendedor do nvel ttico com a

    efetiva inovao nos processos, espera-se contribuir para a compreenso dos

    fatores causadores da inovao no mbito das Empresas de Pequeno Porte - EPP.

    Assim contextualizado, o empreendedorismo se justifica como uma caracterstica de

    comportamento que interfere positivamente na competitividade das EPPs, e por

    meio do intraempreendedorismo, proporciona melhoria no desempenho das

    empresas de pequeno porte, se a ocorrncia do comportamento empreendedor na

    fora produtiva resultar em inovao. Os questionrios utilizados na pesquisa so

    instrumentos reais de avaliao, e, ao serem aplicados, colaboram com o

    mapeamento das foras e fraquezas das organizaes.

    1.5 LIMITAES DA PESQUISA

    As entrevistas realizar-se-o nas pequenas empresas integrantes do setor

    industrial do Arranjo Produtivo Local de Moda do municpio de Nova Friburgo,

    localizado na Regio Serrana do Estado do Rio de Janeiro. O nvel ttico, no que

    tange particularizao desta pesquisa, foi caracterizado por quatro cargos pr-

    definidos pelo pesquisador: scio-gerente, gerente, supervisor, outro.

    A opo pela aplicao deste estudo em um APL, definido por Borin (2006, p.

    70) como aglomeraes territoriais de agentes econmicos, polticos e sociais

    com foco em um conjunto especfico de atividades econmicas que apresentam

  • 18

    vnculos, mesmo que incipientes, d-se pela conformao relativamente

    homognea das empresas e a possibilidade de interface equitativa com as

    instituies pblicas e privadas de fomento. Tal delimitao torna-se relevante

    principalmente para o entendimento dos parmetros econmicos e dos potenciais

    internos da comunidade onde se estabelece o APL, visto que, segundo o Instituto

    Brasileiro de Administrao Municipal IBAM (2006, p. 8), dentre as escalas de

    desenvolvimento local (regional, municipal e comunitrio) no municpio que est a

    escala administrativo-territorial qual esto associados os atores locais e onde se

    concretizam as iniciativas econmicas, objeto de estudo desta pesquisa.

    1.6 ESTRUTURA DA DISSERTAO

    Essa dissertao est organizada em cinco captulos, a fim de facilitar o

    entendimento do tema proposto.

    Captulo 1 Descreve a contextualizao do tema da pesquisa, sua

    importncia, seus objetivos gerais e especficos, a justificativa para o

    desenvolvimento da mesma, bem como suas limitaes, incluindo-se, ainda, a forma

    como est estruturada essa dissertao.

    Captulo 2 Apresenta o referencial terico dos principais construtos do tema

    da pesquisa perfil empreendedor e inovao, iniciando pela exposio das ideias

    subtradas da pesquisa bibliomtrica s principais bases de artigos acadmicos,

    seguindo-se dos enfoques de estudiosos por meio da reviso da literatura.

    Captulo 3 Apresenta o estudo de caso.

    Captulo 4 Contm a metodologia de pesquisa adotada para o

    desenvolvimento dessa dissertao. Trata-se de uma pesquisa exploratria,

    utilizando-se de entrevista estruturada para a coleta de dados qualitativos, incluindo-

    se, ainda, a descrio da populao e a amostra selecionada para a realizao da

    mesma e relata os resultados obtidos no estudo e suas anlises.

    Captulo 5 Apresenta as concluses e recomendaes para futuros estudos.

  • 19

    2 REFERENCIAL TERICO

    Neste captulo ser apresentada a fundamentao terica desta pesquisa,

    onde, por meio de pesquisa bibliomtrica selecionaram-se os artigos que

    estruturaram a fundamentao terica das reas de interesse em questo,

    conduzindo em seguida exposio dos principais construtos dessa dissertao, a

    saber: perfil empreendedor e inovao. A abordagem destes construtos foi

    complementada com pesquisas a peridicos, dissertaes, teses e livros

    acadmicos relacionados aos temas.

    2.1 EMPREENDEDORISMO E DESENVOLVIMENTO ECONMICO

    2.1.1 Aspectos da atividade econmica mundial

    Marco inconteste na histria da sociedade moderna, a Revoluo Industrial

    nos idos de 1850 alterou toda a dinmica das relaes de produo com a

    desvinculao da disponibilidade de luz solar para viabilizar as atividades produtivas.

    As alternativas de energia como leo de baleia e carvo mineral, esclarece Souza

    (2006, p. 8), alm de caras e precrias no atendiam ao anseio da indstria

    nascente: o mundo demandava luz e na esteira desta carncia floresceu a moderna

    indstria do petrleo. Todavia, Souza destaca que a produo insipiente restrita

    Europa at ento (dois mil barris/ano em 1857 e quatro mil barris/ano em 1858) ala

    novos patamares em 1859, com a perfurao do primeiro poo em territrio norte-

    americano pelo Coronel Edwin Drake, na Pensilvnia, alcanando a produo de 20

    barris/dia, dando incio explorao comercial do petrleo.

    A partir de ento, novas transformaes na indstria se sucedem,

    especialmente na Inglaterra nos idos de 1860, configurando a Segunda Revoluo

    Industrial, reconhecida posteriormente como a Era do ao e da eletricidade. A

    transformao do ferro em ao, permitindo a produo em larga escala deste

    minrio e a substituio do vapor pela eletricidade, possibilitada pelo dnamo,

    tornam-se as principais invenes desta etapa do capitalismo. Tambm neste

  • 20

    perodo, a intensificao da utilizao do petrleo viabiliza a criao do motor de

    combusto interna criando condies para a inveno do automvel e do avio.

    Os avanos se sucedem em diversas instncias das cincias, fazendo surgir

    as escolas e teorias organizacionais, emergindo neste contexto, o mtodo de gesto

    de Frederick Taylor cujo objetivo era tornar o trabalhador mais produtivo pautado em

    princpios bsicos de diviso do trabalho, na padronizao das tarefas e na

    separao entre planejamento e execuo (TENRIO, 1994).

    As invenes da Segunda Revoluo Industrial propiciaram a Henry Ford os

    recursos tecnolgicos que impulsionariam o desenvolvimento de um novo sistema

    produtivo o Fordismo onde a conjugao dos avanos tecnolgicos com o

    mtodo de gesto de trabalho Taylorista desencadearia no processo de obteno e

    acumulao do capital que vigoraria no mundo at a dcada de 1970 (HARVEY,

    1992). Com a linha de montagem de automveis inspirada em um processo utilizado

    em frigorficos, Ford cria a produo padronizada, transformando a indstria

    automobilstica norte-americana em um marco.Neste nterim, o petrleo, at ento

    utilizado como matria-prima para a atividade econmica fabril, passa a ser

    demandado como combustvel para o produto final da indstria fordista o

    automvel, provocando reflexos no preo e no mercado como um todo, at que duas

    grandes crises se estabelecem, em 1973 e em 1979 consecutivamente (FARAH

    JNIOR, 2000).

    Farah Jnior (2000, p.46) relata que os sistemas capitalistas europeu e norte-

    americano passam a apresentar sinais de dificuldade na manuteno do

    crescimento j na primeira crise em 1973, e complementa que a queda da

    produtividade do trabalho e a reduo da capacidade financeira dos governos nos

    pases centrais em manter o Welfare State j estavam sendo percebidos desde a

    dcada de 1960. Observou-se mais tarde que as concesses feitas pelo capital em

    relao ao trabalho com a constituio do Welfare State, estavam vinculadas a

    interesses diversos, sobretudo na Europa Ocidental, dentre estes a manuteno do

    sistema de produo fordista, a imposio disciplinar sobre as lutas polticas e

    sindicais dos partidos de esquerda, e a incorporao dos trabalhadores ao mercado

    consumidor de bens e servios, sendo este ltimo a principal motivao nos Estados

    Unidos.

  • 21

    O cenrio de confronto entre trabalho e capital somado ao declnio do estado

    de bem-estar social tornou-se profcuo para o descontrole inflacional, que seguido

    de elevada reduo do consumo, resultou em queda nos investimentos e aumento

    da crise.

    Neste perodo da histria em que a economia encontrava-se aquecida pela

    grande circulao do dinheiro resultante do pleno emprego, o aumento concomitante

    da inflao e do custo do petrleo provocou a queda na produo, e por extenso na

    renda do trabalhador, dando incio a uma crise econmica estrutural que foi

    potencializada pelo aumento das taxas de juros nos mercados financeiros

    internacionais.

    Este fenmeno de estagnao econmica associado a alta de preos ficou

    conhecido como estagflao, relata Farah Jnior (2000), e caracterizou o tempo em

    que o capitalismo e sua ordem econmica vigente fraquejaram mediante os

    problemas recorrentes nas principais economias mundiais, representado pelas

    sucessivas quedas no investimento, no nvel do emprego e consequentemente, do

    PIB. Segundo Pindyck e Rubinfeld,

    No decorrer do perodo posterior 2 guerra mundial, dois aspectos tm se mostrado particularmente incmodos para os norte-americanos. Em primeiro lugar, nos Estados Unidos, o crescimento da produtividade tem ocorrido de forma menos rpida que na maioria das outras naes desenvolvidas. Em segundo lugar, para todas as naes desenvolvidas, o crescimento da produtividade nos ltimos vinte anos tem sido substancialmente mais baixo do que havia sido no perodo anterior. (PINDYCK; RUBINFELD, 1994, p. 231)

    A reestruturao produtiva passa a existir principalmente nos setores bsicos

    de produo e de trabalho por meio do surgimento de novos parmetros ideolgicos

    nas esferas da gesto (estratgico), na organizao da produo (ttico) e no

    trabalho (operacional). No obstante o assolamento da crise nas economias

    ocidentais na dcada de 1970, especialmente sobre os mercados europeu e norte-

    americano, este mesmo perodo proporcionou elevados ganhos de produtividade e

    competitividade para empresas japonesas e alems, em funo da reorganizao

    estrutural que estas realizaram ao incorporar inovaes tecnolgicas nos trs nveis

    organizacionais (FARAH JNIOR, 2000).

  • 22

    O que se caracteriza como problema para uma parcela dos pases

    industrializados, reverte-se em oportunidade para as empresas que ousaram na

    gesto, explcita ou intuitivamente, optando por novas formas de organizao da

    produo. Somaram-se a este fator, o contnuo desenvolvimento de tecnologias e o

    acelerado processo de internacionalizao do capital que impactou todas as

    interfaces scio-econmicas em nvel global. Farah Jnior (2000, p. 48) ressalta que,

    apesar do processo de globalizao remontar revoluo industrial inglesa do

    sculo XVIII, os sintomas da crise do capitalismo na dcada de 1970 representam

    uma ruptura com o modelo econmico anterior, apresentando como elemento

    causal desta ruptura o esgotamento do modelo fordista de produo e seu

    embasamento em padres de produo e consumo de massa, ilusoriamente

    amparados pelo sistema de acumulao subsidiado pelo Welfare State.

    Neste nterim, Rezende Filho (1997) explica que a interferncia da ao

    estatal auxiliava a manuteno da economia em crescimento, pois a garantia em

    investimentos nas reas social e em infraestrutura imputavam ao Estado a

    manuteno do sistema capitalista, impedindo que se acumulassem prejuzos ou

    ocorressem crises, enquanto suas sociedades passariam a gozar de um melhor

    padro de vida e de um menor nvel de desemprego (REZENDE FILHO, 1997, p.

    305).

    Complementarmente, Harvey (1992) enfatiza que as dificuldades no

    enfrentamento crise do petrleo encontraram seu pior obstculo na inflexibilidade

    do sistema fordista, pois

    Havia problemas com a rigidez dos investimentos em capital fixo de larga escala e de longo prazo em sistema de produo em massa que impediam a flexibilidade de planejamento e presumiam crescimento estvel em mercados de consumo invariantes. Havia problemas de rigidez nos mercados, na alocao e nos contratos de trabalho. Por trs de toda a rigidez especfica de cada rea estava a configurao indomvel e aparentemente fixa do poder poltico e relaes recprocas que unia o grande trabalho, grande capital e o grande governo no que parecia cada vez mais uma defesa disfuncional de interesses escusos definidos de maneira to estrita que solapavam, em vez de garantir a acumulao do capital. (HARVEY, 1992, p. 135-136)

    Conforme demonstrado por Harvey, a crise do fordismo ocorreu nas esferas

    scio-econmicas, polticas, diplomticas, impactando a dinmica de

    desenvolvimento mundial.

  • 23

    Em meio a toda adversidade instalada, surge um redirecionamento produtivo

    registrado essencialmente nos setores bsicos de produo e de trabalho, e em

    1962 comea a ser implantado aquele que ser considerado o principal modelo de

    reestruturao contemporneo, o toyotismo. Em contraposio ao fordismo, cuja

    produo que determina a demanda (ZEN; FRACASSO, 2008), o toyotismo que

    possui como caracterstica central a produo do necessrio no menor tempo,

    constri um modelo de processo onde a produtividade o resultado da melhor

    organizao dos recursos humanos e materiais adequados demanda. Desta

    forma, todos os setores da fbrica doravante voltam-se para diferenciao e

    qualidade dos produtos, vislumbrando o atendimento das expectativas do cliente

    (CASTRO; LEITE, 1994; HIRATA, 1998). Inaugura-se a a Era do just-in-time.

    O toyotismo passa a ser o responsvel por relevantes movimentos no

    universo empresarial mediante a necessria adaptao a mquinas multifuncionais,

    exigindo dos trabalhadores flexibilidade e polivalncia, bem como responsabilizando-

    os, individualmente, pelo sucesso ou insucesso da empresa, dada a autonomia em

    vigor (LEITE; MELO, 2008).

    Nesta conjuntura, o just-in-time veio para instalar no ambiente uma

    competio embasada em desempenho, atribuindo mais valia a quem produz melhor

    e mais rpido. Outro aspecto no menos importante a insero do Japo na

    competio pelos mercados automobilsticos americano e europeu, instituindo uma

    nova lgica econmica global e, sobretudo, introduzindo os parmetros da terceira

    revoluo industrial, cujo salto quantitativo e qualitativo englobou, entre outros

    aspectos, investimentos em tecnologia (notadamente a robtica), a flexibilizao da

    produo, a necessidade da qualificao da mo de obra, e, sobretudo, o carter

    transnacional dos negcios, originado na oferta e ampliado posteriormente para a

    produo (CASTRO; LEITE, 1994).

    Contudo, a partir do toyotismo, se verifica a instalao do ambiente de

    inovao que busca perenemente respostas aos desafios da economia, da

    tecnologia, da comunicao e das fontes de energia, instaurando-se um processo

    contnuo de antecipao de solues que viabilizem o alcance da melhor

    lucratividade (LEITE; MELO, 2008).

    neste cenrio de premncia na celeridade da transformao de produtos e

    processos que surge o ambiente propcio disseminao da inovao, pois,

  • 24

    conforme Arbix (2010, p. 169), inveno e inovao esto conectadas por um

    continuum, e exemplifica: em reas avanadas acontecem com tal frequncia e

    velocidade que nem sempre fcil distinguir uma da outra, como nos laboratrios de

    nano e biotecnologia.

    Arbix (2010), assim como Schumpeter (1982), enfatiza que a inovao um

    atributo intrnseco estratgia de desenvolvimento, inclusive das naes, quando

    afirma que:

    Gerada em ambiente cada vez mais globalizado, destaca-se atualmente como uma das mais significativas fontes do bom desempenho econmico das naes. Com diferentes formatos, dimenses e caractersticas, os processos de inovao geram aumento de produtividade, empregos de melhor qualidade e elevao do nvel de bem-estar, alm de auxiliar no enfrentamento de todos os desafios ligados ao meio ambiente. Nos pases mais avanados difcil encontrar algum documento de governo ou declarao de empresrio que no faa meno s suas potencialidades, tidas atualmente como crticas para a elevao da produtividade e da competitividade das economias contemporneas. (ARBIX, 2010, p. 168)

    Neste contexto, ao final do sculo XX a inovao incorporada

    compulsoriamente como um relevante fator crtico de sucesso (DRUCKER, 1986;

    VAN DE VEN; ANGLE; POOLE, 2000), juntamente com a sustentabilidade, atingindo

    sem exceo a gesto das organizaes, das grandes s pequenas empresas,

    vindo a aumentar consideravelmente a complexidade desta nova lgica econmica

    mundial (FREEMAN, 1975).

    A contemporaneidade inaugura uma nova era, onde a preocupao com a

    criao de empresas que consigam subsistir velocidade da mudana imposta pela

    globalizao torna-se fator crtico de sucesso, e a busca pela reduo do alto ndice

    de falncia de novos negcios constitui-se em um dos motivos pelos quais este tema

    assume uma abrangncia crescente no mbito do governo, das entidades de classe,

    de instituies de apoio e da prpria academia (FILION, 1999; DORNELAS, 2008,

    PINCHOT; PELLMAN, 2004), fazendo com que o empreendedorismo seja

    considerado uma alternativa factvel para a sustentabilidade das empresas no sculo

    XXI.

    A indicao de que o empreendedorismo se configurou como um importante

    fenmeno scio-econmico do final do sculo XX descende do seu carter

    multidisciplinar e transversal no domnio da pesquisa cientfica, onde so

  • 25

    observados enfoques e abordagens que perpassam pela medicina, psicologia,

    sociologia, filosofia, poltica, economia e administrao, entre outras reas das

    cincias. Mediante o envolvimento de elevado nmero de pesquisadores com o

    tema, surgem variados axiomas que formaro o pilar de sustentao da teoria

    empreendedora, ento emergente.

    Visando orientar os estudos por perspectivas, Cunningham e Lischeron

    (1991) catalogaram seis escolas de pensamento caracterizando-as por atributo, a

    saber: a escola bibliogrfica, a escola psicolgica, a escola clssica, a escola da

    administrao, a escola da liderana e por fim, a escola corporativa.

    Os professores da Harvard Business School, Stenvenson e Jarillo (1990),

    propem os estudos de empreendedorismo sob trs abordagens. Na primeira,

    elaborada pelos economistas, o interesse transcende o empreendedor e suas aes,

    concentrando-se nos resultados que as aes empreendedoras geram. Neste

    contexto insere-se o pensamento economicista de Schumpeter (1982) revelando a

    importncia dos empreendedores para criao do novo (seja este um produto, um

    processo ou um mercado), onde, por meio da integrao do conceito de

    empreendedorismo com a inovao, ocorre o desenvolvimento econmico.

    Na segunda, sugerida por psiclogos e socilogos, a nfase no

    empreendedor como indivduo decorre de uma anlise do seu passado, suas

    motivaes, seu ambiente e seus valores. A teoria comportamental de David

    McClelland (1967) integra este conjunto, e fundamenta-se no resultado de suas

    pesquisas onde est apontado que a necessidade de realizao o elemento

    central da motivao nas pessoas empreendedoras.

    Em sua anlise, McClelland (1967) alm de revelar que os empreendedores

    mal sucedidos tm carncia de realizao, identifica as caractersticas que os

    impulsiona, dentre elas: iniciativa, persistncia, saber aproveitar as oportunidades,

    qualidade, eficincia, comprometimento, disposio para correr riscos de forma

    calculada, persuaso, independncia, autoconfiana, alm de trabalharem buscando

    informaes e estabelecendo redes de contatos, planejando e acompanhando os

    resultados.

    A terceira abordagem instituda por administradores e correlaciona-se com o

    conhecimento sobre a amplitude das habilidades gerenciais e administrativas, ou

  • 26

    seja, em como os empreendedores apreendem seus objetivos, quais so os

    mtodos, tcnicas e ferramentas utilizadas, como ocorre o processo de tomada de

    deciso, ou seja, em como lidam e resolvem seus problemas.

    Hashimoto (2006) faz referncia essncia do empreendedorismo de

    Longenecker et al. (1998), que, segundo os pesquisadores americanos atribuda a

    trs elementos intrnsecos atividade empreendedora: a inovao, o risco e a

    autonomia.

    Segundo Dornelas (2008) e em convergncia com o pensamento de

    McClelland (1967), o empreendedorismo no se configura como uma nova teoria

    administrativa pensada para resolver os problemas empresariais. Ao contrrio,

    apresenta-se como uma forma de comportamento que engloba processos

    organizacionais permitindo empresa trabalhar em busca de um objetivo comum, ou

    seja, alinhado misso e viso empresarial, identificando novas oportunidades por

    meio da sistematizao de aes internas focadas na inovao. O pensamento de

    Dornelas hbrido, tornando-se aderente tanto aos princpios de Stenvenson e

    Jarillo quanto aos ideais de Longenecker e Schoen.

    Filion (1999), Drucker (2003) e Shapero (1980) afirmam que criatividade e

    inovao conduzem os empreendedores a um movimento contnuo de mudanas

    que visa o crescimento e desenvolvimento de seus negcios, cuja organizao dos

    recursos de forma inovadora resulta em uma nova empresa.

    A criatividade dos empreendedores, segundo Peter Drucker (1986), nasce do

    comprometimento com o exerccio constante da inovao, que, em se constituindo

    numa prtica sistemtica, provm de duas fontes: internas (ocorrncias inesperadas,

    incongruncias, processos necessrios, mudanas na indstria e no mercado) e

    externas (mudanas demogrficas, mudanas de percepo e novo conhecimento).

    O ponto comum a todas elas, conforme Drucker (2003) a relevncia da

    informao, desta forma, quanto maior o aproveitamento das informaes que

    chegam organizao e quanto mais sistematizada sua busca e disseminao,

    maior a probabilidade de se aproveitar as oportunidades de inovao.

    Ao analisar o comportamento dos empreendedores em relao inovao,

    Drucker diz que:

  • 27

    A inovao o instrumento especfico dos empreendedores, o meio pelo qual eles exploram a mudana como uma oportunidade para um negcio diferente ou um servio. Os empreendedores precisam buscar, de forma deliberada, as fontes de inovao, as mudanas, e seus sintomas que indicam oportunidades para que uma inovao tenha xito. (DRUCKER, 2003, p. 25)

    multiplicidade de conceitos e definies sobre empreendedorismo

    produzidos nas ltimas dcadas, torna-se relevante agregar sua origem, reportada

    Idade Mdia, quando o termo empreendedor passa a ser a alcunha do encarregado

    de projetos de produo em grande escala (FILION, 1999). Com o passar do tempo,

    no Sculo XII, o empreendedor era a pessoa que assumia riscos de lucro (ou

    prejuzo) em contratos de valor fixo com o governo. Contudo, etmologicamente a

    palavra francesa entrepreneur significa aquele que est entreou intermedirio.

    No obstante a complementaridade dos enfoques discorridos anteriormente, a

    definio de Bateman e Snell (1998) explicita com clareza a funo intermediria do

    entrepreneur, pois aquele que est entre a oportunidade e o mercado quem

    identifica o valor e transforma (processo ou produto) para atender a demanda. Neste

    nterim, os autores identificam como principais caractersticas e habilidades para o

    sucesso do empreendedor a autoconfiana, a excelncia, a liderana, a criatividade,

    a motivao e a tolerncia a incertezas e riscos.

    A convergncia observada entre os pesquisadores se encontra na tratativa do

    empreendedorismo como uma conseqncia dos novos paradigmas de relaes

    sociais e polticas, em cujo contexto est a organizao, e no apenas como uma

    resposta ao encolhimento do nvel de emprego (IBQP, 2012), seja como reflexo da

    expanso tecnolgica, seja pelo excedente na oferta de mo de obra.

    As pessoas compartilham o ambiente de mudanas em todas as pocas da

    atividade econmica, entretanto, verifica-se na prtica que os impactos e as

    expectativas sobre os trabalhadores evoluram do tangvel para o intangvel de

    forma substancial nos ltimos cem anos, conforme constatado por Sennet (1999) e

    demonstrado na figura 1.

  • 28

    Figura 1 Evoluo do Perfil Profissional

    Fonte: Adaptado de Senett (1999, p. 9 e 25).

    Em meio s incertezas no ambiente de negcios, especialmente nas trs

    ltimas dcadas do sculo XX, as empresas encontraram no empreendedorismo

    uma nova forma de agir, desenvolver e identificar conhecimentos e oportunidades

    produzindo mais valia para todas as partes. No se trata, pois, de uma metodologia

    que ganha espao nas organizaes, mas antes, constitui-se num movimento que

    nasce no interior das empresas, , portanto, endgeno, e posteriormente obtm um

    corpo metodolgico conceitual.

    Paulatinamente, os fundamentos do empreendedorismo at ento

    direcionados apenas para aquele que se dispe a correr risco o empresrioganha

    especial ateno dentro das organizaes, quando ao analisar as empresas com

    foco em inovao, pesquisadores de variadas instituies identificaram a recorrncia

    dos comportamentos empreendedores nas equipes internas das empresas, e

    passam ento a buscar a compreenso do que, no futuro, ir se consolidar como

    intraempreendedorismo.

    Dornelas (2008), no apndice A da primeira edio da sua obra

    Empreendedorismo Corporativo, disponibiliza uma smula de terminologias e

    autores, dentre os quais destacamos a seguir:

    Corporate Entrepreneurship:

  • 29

    Empreendedorismo corporativo envolve o emprego da iniciativa dos nveis mais inferiores da organizao para se desenvolver algo novo. Uma inovao que criada por subordinados sem que tenha sido requisitada, ou seja, inesperada, mesmo que dada a permisso pela alta gerncia para faz-la. (VESPER, 1984)

    Internal Corporate Entrepreneurship:

    Empreendedorismo corporativo interno refere-se a todas as atividades empreendedoras formalizadas dentro de uma organizao existente. As atividades formalizadas so aquelas que recebem recursos da organizao com o propsito de buscar a inovao: desenvolvimento de novos produtos, melhorias de produtos, novos mtodos ou procedimentos. (SCHOLLHAMMER, 1982)

    J com o cognome intrapreneurship, Dornelas (2008) apresenta a teoria de

    Nielson, Peters e Hisrich acerca do desenvolvimento de mercados internos e

    relativamente pequenos em uma grande empresa, por meio da implementao de

    unidades independentes destinadas a criar, testar internamente e expandir ou

    melhorar seus servios, tecnologias e mtodos, diferentemente do

    empreendedorismo ligado a novas unidades de negcios com o objetivo especfico

    de desenvolver aes lucrativas em mercados externos empresa em grandes

    empresas, apregoado at ento.

    Pinchot (1989) entende intrapreneurship enquanto um atributo de

    determinados membros de uma empresa, cuja motivao est em realizar, e por

    meio desta realizao gerar lucro.

    Intra-empreendedores so os sonhadores que fazem acontecer. Aqueles que assumem a responsabilidade de criar e inovar dentro de qualquer tipo de organizao. Eles podem ser os criadores ou inventores, mas so sempre os sonhadores que entendem como transformar uma idia em algo real e lucrativo.

    Empreendedores corporativos ou intraempreendedores so, pois, segundo

    Dornelas (2008, p. 38) os indivduos ou grupos de indivduos, agindo

    independentemente ou como parte do sistema corporativo, os quais criam as novas

    organizaes ou instigam a renovao ou inovao dentro de uma organizao

    existente.

  • 30

    Se as definies que envolvem o intraempreendedorismo so novidades,

    igualmente nova para a organizao se torna a tomada de deciso, seja esta no

    nvel estratgico, ttico ou operacional. Desta forma, Costa, Cericato e Melo (2007)

    defende que na empresa empreendedora, o compartilhamento da tomada de

    deciso com o corpo funcional que produz o ambiente de mudanas, criao e

    desenvolvimento de novos negcios, otimizando recursos, processos e resultados.

    O pensamento de Dornelas complementa este raciocnio, quando afirma que o

    intraempreendedorismo acontece quando a estratgia alinhada competncia

    central (recursos, mtodos competitivos e escopo das operaes) corecompetence

    perpassa por todos os nveis e estruturas da organizao.

    Sobre este ponto, ou seja, sobre o empoderamento de todos os nveis para a

    tomada de deciso, Peter Drucker (1999) infere afirmando que o autogerenciamento

    implica uma mudana radical nos pensamentos e aes de todos, pois requer que

    cada funcionrio pense e se comporte como um executivo, e por este motivo

    mesmo, caracteriza-se como uma revoluo em assuntos humanos. Drucker

    enftico quando preconiza a premncia do empreendedor auto-gerencivel assim

    como da gerncia movida pela inovao, enfatizada nesta pesquisa.

    A notoriedade conquistada cientificamente ultrapassa as fronteiras das

    universidades e ganha importncia na medio das evidncias e dos reflexos do

    empreendedorismo sobre a atividade econmica, e o prximo passo acontece com a

    consolidao de um sistema de anlise do empreendedorismo sobre as naes.

    Com este intuito, no final do sculo passado estrutura-se o projeto de

    pesquisa Global Entrepreneurship Monitor GEM, coordenado internacionalmente

    por um consrcio composto pelo Babson College, Universidad Del Desarrollo,

    Reykjavk University, London Business School e Global Entrepreneurship Research

    Association (Gera), e operacionalizado na esfera nacional pelo Instituto Brasileiro da

    Qualidade e Produtividade (IBQP).

    O projeto GEM abrange cerca de 50 pases em diferentes estgios na escala

    de classificao econmica, e nos revela aps mais de 10 anos de pesquisa que a

    riqueza gerada e medida pelo PIB possui correlao direta com aatividade

    empreendedora, sendo esta atividade mensurada pelo nmero de pessoas dentro

    da populao adulta de um determinado pas envolvida na criao de novos

  • 31

    negcios (IBQP, 2010, p. 5), e cuja identificao ocorre por meio de pesquisa

    quantitativa com uma populao na faixa etria entre 18 e 64 anos.

    Conforme relatrio GEM (IBQP, 2012, p. 7), em 2012 o Brasil ocupou a quarta

    posio do contingente de 69 pases que integraram a pesquisa, nmero este que

    varia a cada edio de acordo com a entrada e sada dos pases participantes. Com

    a fora de trabalho estimada pelo IBGE em 126milhes de pessoas, com idade entre

    18 e 64 anos, o Brasil apresentou uma taxa de empreendedores de 30,2% onde

    aproximadamente 18 milhes de pessoas estavam envolvidas na criao ou

    administrao de algum negcio com menos de trs anos e meio de vida, e outros

    18 milhes de pessoas qualificadas como empreendedores estabelecidos, ou seja,

    frente da administrao de um negcio com mais de trs anos e meio de existncia

    (IBQP, 2012, p. 11).

    Dados apresentados no Relatrio Executivo de 2008 (IBQP, 2008, p.5)

    demonstraram que em 2001, o Brasil possua 65% de empreendedores nascentes

    para 35% de empreendedores novos, e em 2008 foram 24% de empreendedores

    nascentes para 76% de empreendedores novos, inverso proporcional originada em

    2003, e crescente desde ento.

    Na srie de pesquisas GEM, o Brasil alcanou em 2008 pela primeira vez a

    razo de dois empreendedores por oportunidade para cada empreendedor por

    necessidade, resultado este que d indicaes da evoluo brasileira na longa

    escada de desenvolvimento de pases como os Estados Unidos e Frana,

    respectivamente com 6,86 e 8,35 empreendedores por oportunidade para cada um

    por necessidade. Em 2010, para cada empreendedor por necessidade havia, no

    Brasil, outros 2,1 que empreenderam por oportunidade, valor este muito prximo

    mdia dos pases que participaram do ltimo levantamento, que foi de 2,2

    empreendedores por oportunidade para cada um por necessidade (IBQP, 2010,

    p.40).

    importante ressaltar que a temtica motivao para empreender foi

    inserida na pesquisa em 2002, e desde ento vem sendo monitorada anualmente,

    por meio da classificao dos empreendedores orientados por: oportunidade,

    quando motivados pela percepo de um nicho de mercado em potencial; ou

    necessidade, quando motivados pela falta de alternativa satisfatria de trabalho e

    renda. A primeira reflete o lado positivo da atividade empreendedora nos pases,

  • 32

    afirma o relatrio executivo, pois representa a poro de empreendedores que

    iniciou sua atividade para melhorar sua condio de vida ao observar uma

    oportunidade para empreender (IBQP, 2008, p.6). Na segunda categoria

    encontram-se as pessoas que empreendem como uma opo para a subsistncia, e

    nesse caso, o empreendedorismo considerado uma ferramenta para o

    desenvolvimento.

    A continuidade da atividade empreendedora demonstrada pelo aumento do

    tempo de durao da empresa impacta diretamente o conjunto da economia

    brasileira, tanto do ponto de vista da atividade, com o aumento de 4,1 milhes de

    MPEs no ano de 2000 para 5,7 milhes de MPEs em 2008, como no incremento da

    empregabilidade de 8,6 milhes para 13,1 milhes no mesmo perodo. No obstante

    tal resultado estar relacionado ao amplo perodo de estabilidade macroeconmica

    brasileira, a melhora apontada pelo DIEESE (2010) constatada pela participao

    dos empreendimentos novos no empreendedorismo brasileiro, tendo se mantido e

    se difundido por todo o sistema econmico produtivo nacional, constitudo em 99%

    por micro e pequenas empresas (SEBRAE acesso em 31/03/11).

    A representatividade das MPEs na economia nacional justifica desta forma, a

    pliade de instituies governamentais e no governamentais que se dedicam a

    compreender as particularidades deste universo, destacando-se neste contexto a

    rpida adaptao metodolgica do GEM, cujos enfoques e perspectivas vm se

    alinhando ao longo dos anos ao contexto econmico global, e como se constata no

    quadro 1, a temtica da inovao introduzida no relatrio de 2005 e o

    intraempreendedorismo em 2008:

    Quadro 1 Pesquisa GEM Brasil 2001-2008

    2001

    Principais taxas.

    Condies para empreender.

    Motivao para empreender.

    Dados comparativos entre pases.

    Caractersticas do empreendimentos.

    2002

    Empreendedorismo de alto potencial de crescimento.

    Relao entre empreendedorismo e crescimento econmico dos pases.

    Fontes de recursos para empreender.

    Investidores informais.

  • 33

    2003

    Contextualizao detalhada a partir de pesquisas secundrias.

    Tpicos especiais: investidores em capital de risco no Brasil e novos habitats do

    empreendedorismo e a questo de gnero.

    Proposies para a melhoria do empreendedorismo no Brasil.

    2004

    Correlaes entre o empreendedorismo e a economia global.

    Caracterizao dos grupos de pases segundo renda per capita.

    Mentalidade empreendedora no Brasil.

    Empreendedorismo social.

    2005

    Caracterizao dos empreendedores estabelecidos.

    Detalhamento dos estudos comparativos com outros pases.

    A inovao no empreendedorismo no Brasil.

    O negcio na composio da renda do empreendedor.

    Expectativa de gerao de emprego e insero internacional.

    Busca de orientao e aconselhamento pelo empreendedor.

    Resumo das atividades dos demais pases participantes da pesquisa GEM.

    2006

    Clculo do potencial de inovao dos empreendimentos.

    Identificao do empreendedorismo brasileiro.

    Polticas e programas educacionais voltados ao empreendedor.

    Descontinuidade dos negcios no Brasil.

    Implicaes para formuladores de polticas pblicas.

    2007

    Empreendedorismo brasileiro em perspectiva comparada.

    Financiamento ao empreendedorismo no Brasil.

    Aspectos socioculturais da atividade empreendedora no Brasil sob perspectiva comparada.

    Acesso informao e tecnologia pelo empreendedor brasileiro.

    Razes para a descontinuidade dos negcios no Brasil.

    Empreendedores em srie.

    Descrio de programas voltados ao empreendedorismo.

    2008

    Absoro de inovaes na sociedade brasileira.

    Redes de relacionamento e de informaes do empreendedor.

    Intraempreendedorismo.

    Educao e capacitao para o empreendedorismo no Brasil.

    Fonte: IBQP (2010, p. 5).

    A inquietao provocada pelo empreendedorismo e pela administrao

    empreendedora gera uma perspectiva que ultrapassa as caractersticas endgenas

    de um negcio e instiga uma investigao aprofundada tanto do empreendedor

    (aquele que cria e transforma organizaes), quanto da prpria sociedade. Faz-se

    mister uma interpretao holstica que integre os elementos e suas interfaces,

  • 34

    apurando-se o resultado que est sendo produzido, conforme defendido por

    Schumpeter (1982), e instrumentalizado pelo GEM.

    No por acaso a criao de uma ferramenta de medio e acompanhamento

    se d aps a exploso de estudos conduzidos na dcada de 1980 e seguintes,

    objetivando elucidar a relao entre o insucesso das grandes corporaes (at ento

    improvvel) e o interesse emergente pelo empreendedorismo.

    Neste nterim, torna-se relevante registrar que a instaurao das micro e

    pequenas empresas MPEs na economia brasileira, ressalvadas as

    particularidades de cada economia, representa o mesmo movimento que ocorreu

    nos Estados Unidos aps a recesso de 1975quando ento ocorreu o fechamento

    de grandes empresas ou sua reestruturao em unidades menores (HASHIMOTO,

    2006). A reorganizao nos mercados produtivos e financeiros, e a migrao da

    nfase do setor produtivo da indstria para o setor de servios (DRUCKER, 1986;

    MORICOCHI; GONALVES, 1994; REZENDE FILHO, 1997), viriam a se firmar

    como o prenncio de um novo tempo, fechando o ciclo iniciado na Revoluo

    Industrial e se configurando como a lgica econmica do sculo vindouro.

    2.2 PERFIL EMPREENDEDOR: UM ALICERCE DA INOVAO

    A celeridade da mudana nos tempos hodiernos, inicialmente atribuda ao

    avano ininterrupto de novas tecnologias, estabelece como parmetros para o

    ambiente organizacional a interdependncia na globalizao, a necessidadde de agir

    prontamente e ser flexvel, o aproveitamento de novas tecnologias e o trabalho em

    rede (GASALLA, 1999). Sob esta perspectiva, Gasalla afirma que cenrios

    paradoxais e complexos demandam profissionais com mltiplas habilidades, que

    possuam capacidade para manter o equilbrio mediante o gerenciamento desta

    interdependncia, e afirma:

    Estamos, pois, diante de uma nova revoluo nas empresas. J no se trata de as organizaes determinarem como as pessoas vo trabalhar. Agora so as pessoas que iro determinar o modo como uma organizao deve trabalhar. Poderamos dizer que a organizao em si j no existe e que o que h o organizar-se continuamente. Essa evoluo impulsionada pelas pessoas que buscam um futuro a todo o momento: os intra-empreendedores. So eles que vo impulsionar esse fluir da organizao,

  • 35

    que tem de se mover em mercados cada vez mais volteis e com limites cada vez mais esfumados.

    Em uma abordagem complementar, Filion (2004, p. 72) defende que em

    aes baseadas em processos visionrios, empregados e dirigentes que querem

    continuar operando em certo nvel de eficincia e efetividade devem desenvolver

    suas prprias estruturas de ao, visto que, sob sua tica, comum que os

    objetivos organizacionais estejam representados pela misso, mas nem sempre

    fcil de serem compreendidos e transpostos para a prtica.

    No mbito da estratgia empresarial Mintzberg (2003) produziu ensaios sobre

    transferncia de poder e delegao em estruturas informais, aperfeioando

    construtos sobre a descentralizao horizontal onde a maior participao do

    indivduo no processo em que se encontrava inserido foi observada nas hierarquias

    organizacionais mais flexveis.

    Corroborando com Gasalla (1999) e Mintzberg (2003), Machado e Zotes

    (2005) analisam em sua pesquisa, fatores crticos de sucesso em empresas

    orientadas para a competitividade cujas estratgias empresariais tornam

    congruentes o potencial criativo do indivduo e a permanente necessidade de

    inovao dos produtos e servios. Os pesquisadores propem a construo e/ou

    adoo de mtodos que permitam a inferncia do funcionrio no sistema produtivo,

    independentemente da sua funo na escala hierrquica, estruturando a empresa

    para o alinhamento dos objetivos do indivduo empreendedor o intraempreendedor

    com os da organizao, conforme figura 2:

    Figura 2 - Alinhamento dos Objetivos Organizacionais

    Fonte: Machado e Zotes (2005, p. 8).

  • 36

    Desta forma, Machado e Zotes (2005) reiteram que o indivduo

    empreendedor, por possuir a necessidade de explicitar sua criatividade, produz

    inovao no nvel em que se encontra inserido, por ser inerente sua personalidade

    a motivao para a realizao achievement motivation (McCLELLAND, 1967),

    concluindo que o poder de criao e inovao de tais funcionrios pode constituir-se

    em vantagem competitiva nas empresas que se propuserem a estimular a sinergia

    derivativa da gesto participativa, agregando valor aos meios e aos fins. Neste

    nterim, o setor de P & D deixa de existir isoladamente e passa a coexistir, a permear

    toda a organizao, possibilitando que cada funcionrio deixe de ser um recurso

    humano esttico na sua funo e passe a produzir valor, a inovar continuamente no

    processo produtivo ou na idealizao de produtos, tornando-se corresponsvel pelo

    sucesso organizacional.

    2.2.1 Marco terico

    Diferentemente de variados campos da pesquisa cientfica que possuem

    marco terico bem definido quanto idealizao do conceito e sua respectiva

    localizao no tempo e no espao, a reviso da literatura demonstra que a gnese

    da terminologia entrepreneurship atribuda a pessoas, locais e argumentos

    distintos.

    Filion (1999), em sua busca pela conceituao do termo ao longo da histria

    das civilizaes, observou que o empreendedor descrito de maneira diferente a

    cada sculo, sendo sua origem francesa reportada ao sculo XII em associao

    quele que incentivava brigas (VRIN, 1982 apud FILION, 1999, p. 452).

    Segundo Cunha (apud SCHIMIDT; BOHNENBERG, 2009), a palavra

    empreender imprehendere no latim medieval tem origem anteriormente ao

    sculo XV e possui dentre seus significados: tentar desempenhar uma atividade ou

    tarefa; pr em execuo.

    Encontra-se em Martinelli (1994, p. 476) a informao de que no sculo XVI o

    termo entrepreneur fazia referncia ao capito que contratava soldados

    mercenrios para servir ao rei. De maneira semelhante, Filion (1999, p. 18) relata

  • 37

    tratar-se da pessoa que assumia a responsabilidade de dirigir uma ao militar.

    Avanando no tempo, Martinelli (1994) identifica no sculo XVIII uma nova aplicao

    para a terminologia, sendo os entrepreneurs os atores econmicos que introduziam

    novas tcnicas agrcolas ou arriscavam seu capital na indstria, enquanto Filion

    (1999) revela uma definio similar, de pessoas que criavam e produziam projetos

    ou empreendimentos.

    Na narrativa de Gasalla (1999), os prenunciadores da abordagem no contexto

    da atividade empresarial e da liderana, foram o francs Cantillon e o ingls Stewart

    no sculo XVIII, sendo imputada a Cantillon a alcunha do neologismo entrepreneur,

    cujo significado literal, conforme nota, empreendedor e no empresrio (chef

    denterprise). Na viso do economista Richard Cantillon (LVESQUE, 2004; ZEN;

    FRACASSO, 2008), o empreendedor capitalista caracteriza-se pela capacidade de

    enfrentar o desafio do risco imposto pela economia de mercado atravs do uso da

    racionalidade, mediante a natureza da incerteza.

    Nota-se que a partir do sculo XVIII a evoluo do termo ocorre

    perifericamente atividade empresarial, e no sculo XIX com o surgimento da

    Escola Empreendedora, que o economista Jean-Batiste Say (apud DRUCKER,

    1986) relaciona o empreendedor com o indivduo que transfere recursos econmicos

    de um setor com baixa produtividade para outro com produtividade superior,

    aproximando-se do parmetro estabelecido para os dias atuais.

    No sculo XX, a aluso figura do entrepreneur ressurge com a produo

    intelectual do economista austraco Joseph A. Schumpeter, quando ento associa o

    empreendedor ao desenvolvimento econmico no livro Capitalismo, socialismo e

    democracia, publicado em 1942. Schumpeter (1982), em sua anlise sobre o

    sistema econmico vigente - o capitalismo - introduz o conceito de destruio

    criativa fundamentando-se no princpio que a criao do novo depende da

    destruio do velho, e ao agente propulsor deste movimento ele denomina

    empreendedor.

    Enquanto o pensamento economicista de Schumpeter ganha repercusso

    mundial ao relacionar o desenvolvimento econmico inovao seja pela

    introduo de novos recursos ou pela combinao diferenciada dos recursos

    produtivos j existentes em meados do sculo XX a teoria empreendedora comea

    a ser observada por outras reas das cincias, e no mbito comportamental, o

  • 38

    psiclogo norteamericano David McClelland estabelece como entrepreneurship a

    atitude psicolgica materializada pelo desejo de iniciar, desenvolver e concretizar

    um projeto, um sonho (LEITE; MELO, 2008, p. 37), caracterizando o perfil

    empreendedor a ser observado nesta pesquisa.

    2.2.2 Dilogo entre as teorias e conceitos

    Diante das diversas origens e interpretaes, Leite e Melo (2008, p. 37) no

    artigo A naturalizao do empreendedor ponderam que o termo entrepreneur foi

    traduzido para o portugus como empresrio, todavia, as pesquisadoras ressaltam

    que a terminologia vem sendo ressignificada, no contexto brasileiro, para

    empresrio bem-sucedido ou com qualidades especiais.

    Birkinshaw (2000) assevera que a atividade empreendedora

    entrepreneurship representa a ao de criar um novo produto, servio, negcio ou

    modelos de negcios, enquanto Schein (1985, p. 30) afirma tratar-se da criao de

    algo novo, envolvendo a motivao para superar obstculos, propenso por aceitar

    riscos e desejo de elevao pessoal e qualquer objetivo a ser alcanado.

    Ser empreendedor tornou-se um neologismo para referir-se quele que

    realiza que produz novas idias, resgatando o construto advindo do latim

    imprehendere: pr em execuo. Nas palavras de Filion (1999, p. 19), um

    empreendedor uma pessoa que imagina, desenvolve e realiza vises, ou seja,

    extrapola o desejo e parte para ao.

    A definio hodierna de entrepreneur e a distino entre empreendedor e

    capitalista so contribuies que emergiram com a Revoluo Industrial, iniciada em

    fins do sculo XVIII, cujas mudanas impetradas no ambiente empresarial

    interferiram radicalmente na cultura ocidental (ZEN; FRACASSO, 2008). O processo

    decisrio do empreendedor de outrora era baseado na maximizao dos lucros

    obtidos com a melhor conformao do acesso aos insumos, ao trabalho e

    tecnologia (TIGRE, 1998). Naquele contexto, o capitalista estava circunscrito ao

    investimento de seus recursos financeiros mediante a anlise da perspectiva de

    altas taxas de retorno sobre o capital investido atualmente denominado investidor

    de risco. Schumpeter (1982) reafirma a importncia da distino de Say entre

  • 39

    empreendedor (servio que emprega o capital) e capitalista (servio que empresta o

    capital).

    Neste perodo extremamente profcuo ao desenvolvimento de teorias

    econmicas que se originam as teorias da administrao pautadas pelo paradigma

    fordista da produtividade, e que, mais tarde, foram transpostas para as teorias

    clssicas da administrao (ZEN; FRACASSO, 2008).

    Com o surgimento da escola empreendedora propagada pelo economista

    francs Jean-Batiste Say no incio do sculo XIX, o pensamento economicista passa

    a considerar a interpretao peculiar deste pensador sobre o empreendedorismo,

    pois segundo Drucker (1986), na tica de Say a funo precpua do empresrio a

    conciliao dos fatores produtivos, e o carter empreendedor desta ao

    considerado na primeira vez em que ocorre a combinao dos fatores, pois ao

    instalar-se na rotina de trabalho, torna-se um processo operacional como outro

    qualquer na manuteno da organizao.

    A contribuio de Say incontestvel para a ampliao dos horizontes da

    cincia econmica, no obstante no ter sido suficiente para inferir na viso clssica

    da economia, fundamentada at ento na busca de um modelo de equilbrio advindo

    da otimizao dos recursos existentes, sem, contudo, considerar o

    empreendedorismo dentre os recursos. Decorridos mais de um sculo de avano no

    tempo, Drucker (1986, p. 18) afirma que Todo economista sabe que o

    empreendedor importante e provoca impacto. Entretanto, para os economistas o

    empreender um evento meta-econmico, algo que influencia profundamente, e,

    deveras, molda a economia sem fazer parte dela.

    Nos dizeres de Drucker (1986), apreende-se a concepo do empreendedor

    como um agente ativo sobre a economia, cuja inovao decorrente de sua

    interveno impacta substancialmente todo o sistema, apesar deste mesmo sistema

    no reconhec-lo o empreendedor como parte integrante.

    Com viso antagnica economia tradicional, porm convergente com os

    posteriores ensaios de Drucker (1999, 2003), Schumpeter (1982) apregoa que o

    dinamismo do desequilbrio provocado pelo empreendedor inovador que impe

    novos parmetros realidade e torna a prtica econmica saudvel no modelo

    capitalista. Desta forma, configura-se a relao causal onde o efeito, tangibilizado

  • 40

    pelo desenvolvimento econmico em decorrncia da identificao/aproveitamento

    das oportunidades e da inovao, possui sua causa no empreendedor - aquele que

    age intencionalmente na introduo de novos produtos, servios, processos,

    recursos ou materiais - e que ao destruir a ordem econmica, assinala o que

    Schumpeter denomina destruio criativa.

    Extrapolando a perspectiva econmica at ento abordada, descortina-se no

    mbito das cincias humanas uma nova perspectiva denominada

    comportamentalista, onde o entrepreneurship se contextualiza pela atitude

    psicolgica materializada pelo desejo de iniciar, desenvolver e concretizar um

    projeto, um sonho. Diante desta perspectiva, reafirma-se o entendimento do

    empreendedorismo como algo que transcende o campo dos negcios e da

    economia (SOUZA NETO, 2003, p. 112), pois que a ao econmica torna-se uma

    consequncia do tipo de comportamento do entrepreneur. Leite e Melo (2008)

    esclarecem que o termo deixa ento de ser traduzido por empresrio, sendo agora

    compreendido como empreendedor.

    O psiclogo David McClelland quem surge com o primeiro mtodo para

    medir a intensidade da motivao, demonstrando a diferena entre pessoas que

    manifestam o desejo de realizao e pessoas que vivem a obrigao da realizao

    (LEITE; MELO, 2008). McClelland (1967) assegura que o modo empreendedor

    entrepreneurialway um atributo do ser empreendedor, e por este motivo

    encontrado nas atividades econmicas como em qualquer outra desempenhada pelo

    indivduo empreendedor. A experimentao de suas pesquisas ao redor do mundo

    proporcionou a McClelland o mapeamento dos fatores que possibilitam a formao

    de empreendedores, traando uma comparao entre pases (McCLELLAND, 1967,

    p. 207), assim como descrevendo o empreendedor essencialmente por sua estrutura

    motivacional, marcada especificamente pela necessidade de realizao. Para

    McClelland, a necessidade de realizao achieving a fora motriz da ao

    empreendedora (SOUZA NETO, 2003, p. 115).

    Destarte, Zen e Fracasso reiteram a inexistncia de analogia entre ser

    empreendedor e ser inventor, visto que a inovao promovida pelo empreendedor

    resultante da sua capacidade individual de introduzir a inveno na indstria e,

    assim, produzir inovao: a fabricao de um novo bem; a introduo de um mtodo

    de produo; a abertura de um novo negcio e o ingresso em um novo mercado; a

  • 41

    conquista de uma nova fonte de matria-prima ou de produtos semi-acabados; o

    estabelecimento de um novo modelo de gesto organizacional (ZEN; FRACASSO,

    2008, p. 142).

    Doravante compreende-se o empreendedorismo como uma dimenso do

    comportamento (McCLELLAND, 1967; SOUZA NETO, 2003; LEITE; MELO, 2008),

    possibilitando-se a clara diferenciao entre a funo de empreendedores e

    gerentes: os primeiros inovam e podem estar alocados em qualquer instncia da

    organizao;os segundos administram sem necessariamente inovar e esto

    vinculados hierarquicamente na estrutura organizacional (ZEN; FRACASSO, 2008),

    ocorrendo, no raro, mudana de conduta de empreendedores alados a funo

    gerencial, agindo a partir de ento como gerentes e no mais como

    empreendedores (SCHUMPETER, 1982).

    O campo de pesquisa sobre empreendedorismo, vinculado inicialmente

    apenas aos impactos sobre a atividade econmica, caracteriza-se, como exposto

    anteriormente, tanto pela amplitude quanto pela multidisciplinaridade das

    abordagens cientficas nas suas variadas reas de interface, a saber: indivduo,

    equipe, organizao, indstria e comunidade (FERNANDES; SANTOS, 2008;

    GARTNER, 2001).

    Complementarmente, Brush et al. (2003) refora que a temtica do

    empreendedorismo como pauta acadmica abrange do nascimento da organizao

    sua transformao e interferncia na cadeia produtiva da indstria em que se

    encontra inserida, instituindo-se como premissa o comportamento individual de

    identificao e criao de oportunidades, sendo a identificao de tal

    comportamento individual no interior da organizao - intrapreneurship - o objeto

    de estudo desta pesquisa.

    2.2.2.1 Entrepreneurial Way

    Pinchot (1989) faz referncia ao intrapreneuring como uma alternativa

    encontrada por algumas organizaes para manterem a caracterstica

    empreendedora que as originou, evitando cair na armadilha da estagnao que

    acarretou, no sculo XX, o declnio de grandes empresas, em decorrncia da queda

  • 42

    na competitividade ocasionada pela baixa capacidade de inovar. Tal estagnao foi

    atribuda, entre outras causas, s estruturas organizacionais rgidas que impediam a

    livre circulao das ideias (FILION, 2004; MACHADO; ZOTES, 2005; PINCHOT;

    PELMANN, 2004; TANURE; GHOSHAL, 2006), restritas poca aos setores de

    Pesquisa e Desenvolvimento P & D.

    Na obra Empreendedorismo Corporativo, Dornelas (2008) apresenta um

    conjunto de definies sobre empreendedorismo e suas derivaes, onde se

    observa uma grande concentrao terica acerca da temtica no perodo 1980-

    2000, e sob a alcunha corporate entrepreneurship a primeira referncia encontrada

    em sua obra de Burgelman, em 1983:

    Empreendedorismo corporativo refere-se ao processo pelo qual as empresas se envolvem na diversificao atravs de desenvolvimentos internos. Tal diversificao requer combinaes de novos recursos para ampliar a ao da empresa a outras reas, ou mesmo s suas atuais reas, de atuao, correspondendo ao conjunto de oportunidades que a empresa est buscando (BURGELMAN, 1983 apud DORNELAS, 2008, apndice A)

    Com a evoluo da terminologia para intrapreneurship, utilizada em 1985

    tanto por Pinchot, quanto por Nielson, Peters e Hirish (DORNELAS, 2008), institui-se

    a corrente de pensamento intraempreendedora que vem sendo elaborada desde

    ento.

    Antes, contudo, de um aprofundamento na vertente intra do

    empreendedorismo, torna-se relevante ratificar que o entrepreneurship, em

    essncia, caracteriza-se pela identificao de oportunidades de negcios, e,

    corroborando com a teoria comportamentalista de McClelland (1967), Leite e Melo

    (2008) afirmam que empreender um processo subjetivo condicionado habilidade

    dos indivduos em detectar as oportunidades, sendo a habilidade o elemento

    comum a empreendedores e intraempreendedores. Partindo dos experimentos de

    David McClelland acerca da motivao para a realizao (achieving motivation), as

    pesquisadoras confirmam que os indivduos com necessidade de realizao tendem

    a buscar sempre o aperfeioamento e o progresso constantes (LEITE; MELO, 2008,

    p. 37), pois so impulsionados pela sensao eminente de xito.

    Pautado neste princpio, Bom ngelo (apud CHIE, 2007, p. 53) assinala trs

    caractersticas que desvelam a aptido empreendedora:

  • 43

    Vontade e habilidade para criar algo absolutamente indito e que possa

    melhorar as condies de vida da famlia, da empresa, da comunidade local

    ou da humanidade;

    Capacidade de encontrar novas utilidades para velhas idias. O objeto dessa

    ao de reciclagem deve resultar em benefcio coletivo;

    Talento para melhorar a eficincia de um sistema, processo ou produto,

    tornando-o mais econmico, acessvel e tecnicamente superior.

    Pinchot (1989, p. 26) igualmente no distingue o comportamento de ambos.

    Ao contrrio, afirma que os intraempreendedores, assim como os empreendedores,

    no so necessariamente inventores de novos produtos ou servios. Sua

    contribuio est em tomar novas ideias ou mesmo prottipos e transform-los em

    realidades lucrativas.

    Sob este prisma, o fato de um indivduo detentor de tais caractersticas no

    ter a iniciativa de abrir uma empresa o qualifica como intraempreendedor, visto que

    a motivao para a ao caracteriza-se pela busca contnua por oportunidades

    criando ou inovando dentro da empresa onde colabora, configurando o que Hirish e

    Peters (2004) conceituam como empreendedorismo dentro de uma estrutura

    empresarial existente, enquanto as mesmas caractersticas associadas ao de

    viabilizar o negcio tornam-se predicado do empreendedor.

    Filion (2004, p. 66), no ensaio Entendendo os Intraempreendedores como

    Visionistas, enfatiza novamente a eqidade dos atributos de intra e entrepreneurs,

    destacando como resultado de suas pesquisas que eles desenvolvem uma

    orientao, ou viso, que indica o que dever ser feito. Esta realidade projetada a

    posteriori a viso capaz de proporcionar o encadeamento das etapas de

    realizao do projeto, retroalimentando continuamente os dois extremos da

    inovao, quais sejam: o indivduo empreendedor (entrepreneur ou intrapreneur) e a

    competitividade do negcio, conforme representado na figura 4.

    O Babson College instituio pesquisadora e disseminadora do

    empreendedorismo reitera que o empreendedorismo um modelo de pensar e

    agir obcecado pela oportunidade, holstico na abordagem e cuja liderana

    equilibrada pela proposta de criao de valor (apud DORNELAS, 2008, p. 41).

  • 44

    Os pressupostos abordados anteriormente associados ao conjunto de

    caractersticas reunido no levantamento realizado por Schmidt e Bohnenberger

    (2009) no artigo Perfil Empreendedor e Desempenho Organizacional, expressam

    as caractersticas atitudinais que qualificam o empreendedor, expostas na figura 3, e

    que sero utilizadas como base para a pesquisa de campo deste trabalho.

    Figura 3 Caractersticas Atitudinais do Empreendedor

    Fonte: Adaptado de Schmidt e Bohnenberger (2009, p. 455).

    Assim contextualizado, o intraempreendedorismo, na tica de Machado e

    Zotes (2005), versa sobre a instalao efetiva de um sistema organizacional onde os

  • 45

    funcionrios tenham liberdade para propor, criar ou inovar como o faria no

    empreendedorismo de startup, ou seja, de criao de novas empresas (DORNELAS,

    2008). Tais preceitos so claramente expostos por Hirish e Peters (2002, p. 61):

    A corporao tradicional de natureza hierrquica, com procedimentos, sistemas de relatrios, linhas de autoridade e de responsabilidade, de instrues e mecanismos de controle estabelecidos. Esses sustentam a cultura corporativa atual e no estimulam a criao de novos empreendimentos. A cultura de uma empresa intra-empreendedora est em contraste com esse modelo. Em vez de uma estrutura hierrquica, uma atmosfera intra-empreendedora possui uma estrutura organizacional plana com vrias redes, equipes, patrocinadores e mentores.

    Conclui-se que a essncia de intra e entrepreneurs equivalente (PINCHOT,

    1989; FILION, 2004), sendo o espao onde inovam o que os distingue, e, portanto,

    isto leva concluso de que as diferenas qualitativas entre o intraempreendedor e

    o empreendedor so irrelevantes (BARINI FILHO; CARDOSO 2003, p. 9).

    2.2.2.2 Intraempreendedorismo: uma vertente do perfil empreendedor

    A fluidez do modo empreendedor entrepreneurial way no interior da

    organizao pressupe a transposio dos valores empreendedores da alta direo

    (KREISER; MARINO; WEAVER, 2002) para os demais nveis organizacionais,

    criando condies para que a cultura intraempreendedora se instaure e se viabilize.

    Convergem para esta mesma linha de argumentao estudos empricos que

    correlacionam a orientao empreendedora liderana dos executivos (SADLER-

    SMITH et al., 2003; TARABISHY et al., 2005), contudo, na reviso terica de Bull e

    Willard (1993) que so apontadas quatro condies propulsoras da prtica do

    intraempreendedorismo:

  • 46

    Figura 4 Condies Bsicas para Prtica Intraempreendedora

    Fonte: adaptado de Bull e Willard (1993, p. 188).

    A figura quatro promove a interligao do estado da arte com o estado da

    prtica, ao integrar os fundamentos de McClelland (motivao para a ao e

    autoconfiana) aos de Filion (viso que impulsiona ao) perpassando pelo xito

    abordado por Leite e Melo (benefcio). Observa-se ainda que, alm dos aspectos

    intrnsecos ao ser empreendedor, dois elementos esto relacionados ao ambiente:

    o saber-fazer (know-how), que pode ser uma conquista anterior ou permanente tanto

    do indivduo quanto da organizao, e o suporte tangibilizado pelos recursos (fsicos

    e materiais) que impactam no desempenho das atividades.

    Percebe-se desta forma, que o aumento da participao do indivduo no

    processo organizacional tornou-se a base da orientao empreendedora que viria a

    diferir as empresas empreendedoras das demais (FERNANDES; SANTOS, 2008),

    sendo observado por Miller e Friesen (1982) que a nfase em inovao o que as

    torna proeminentes. Por sua vez, Hitt, Ireland e Hoskisson (1999) constataram nas

    organizaes com forte orientao empreendedora, maior habilidade para passar

    pela instabilidade do ambiente, revertendo em seu benefcio, ameaas em

    oportunidades.

    Intrapreneurship e corporate venturing so modalidades do

    empreendedorismo corporativo, e a definio de ambos converge para a

    identificao, desenvolvimento, captura e implementao de novas oportunidades de

    Conforto e sustentao

    para realizao de esforos, ou que reduzem o desconforto de

    algum empenho.

  • 47

    negcio (DORNELAS, 2008; SHANE; VENKATARAMAN, 2000). Todavia, se

    aparentemente os conceitos se assemelham, observa-se na prtica a existncia da

    distino de caracteres entre ambos, o que vem a contribuir para um melhor

    enquadramento metodolgico do tema, cuja variao est basicamente associada

    ao ambiente: se a mudana exgena, consorcia-se estratgia de negcios; se

    endgena, refere-se renovao estratgica ou inovao (DORNELAS, 2008),

    onde est contextualizada a presente pesquisa.

    A figura cinco se constitui em uma representao dos tipos de

    empreendedorismo corporativo encontrados nas organizaes corporate venturing

    e intrapreneurship e concomitantemente apresenta os componentes e os

    desdobramentos destas que so as suas duas principais expresses.

    O corporate venturing, conforme se verificar adiante, correlaciona-se com a

    concepo de algo novo e independente que possui um conjunto de preceitos

    prprios, sem vnculo com a estrutura preexistente da organizao que o produziu.

    O resultado do corporate venturing ser a criao de um novo negcio (DORNELAS,

    2008; FILION, 1999), excluindo-se esta configurao do escopo da presente

    pesquisa.

  • 48

    Figura 5 Modalidades e Variaes do Empreendedorismo Corporativo

    Fonte: Adaptado de Dornelas (2008, p. 39 e p. 40).

    Entretanto, no intrapreneurship, existem claras diferenas de contexto, e as

    inovaes que ocorrem na corporao resultam da associao das caractersticas

    organizacionais com as individuais, conforme mencionado anteriormente por

    Machado e Zotes (2005), onde os funcionrios, ao identificarem oportunidades no

    ambiente, tm outorgado a autonomia para implementar projetos (FILION, 2004)

    assumindo o gerenciamento dos riscos (DRUCKER, 1986, 1999), buscando os

    retornos e as recompensas preconizados por Bull e Willard (1993), no obstante

    estar submetido s regras do sistema corporativo (DORNELAS, 2008).

    Hashimoto (2006, p. 82), na sua anlise sobre o desenvolvimento das teorias

    organizacionais, prope um quadro resumo com as diferenas essenciais entre

    empresas tradicionais e intraempreendedoras, possibilitando a visualizao dos

    fundamentos que compem os dois tipos de organizaes, auxiliando na

    caracterizao da pesquisa em questo:

    Quadro 2 Organizao Tradicional x Or