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Francisco Carlos Cardoso de Campos Horácio Pereira de Faria Max André dos Santos Planejamento e avaliação das ações em saúde 2 a Edição

planejamento - estimativa rápida

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  • Francisco Carlos Cardoso de Campos

    Horcio Pereira de Faria

    Max Andr dos Santos

    Planejamento e avaliao das aes

    em sade

    2a Edio

  • Belo HorizonteNescon UFMG

    Coopmed2010

    Francisco Carlos Cardoso de Campos

    Horcio Pereira de Faria

    Max Andr dos Santos

    Planejamento e avaliao das aes

    em sade

    2 edio

  • A reproduo deste material didtico recebeu apoio financeiro do BNDES

    Campos, Francisco Carlos Cardoso de C186p Planejamento e avaliao das aes em sade/Francisco Carlos Cardoso de Campos, Horcio Pereira de Faria, Max Andr dos Santos. - 2 ed. - Belo Horizonte: Nescon/UFMG, Coopmed, 2010. 114p. : il., 22x27cm.

    Pblicoaquesedestina:Profissionaisdasadeligados estratgiadaSadedaFamlia. ISBN: 978-85-7825-030-0

    1. Planejamento em sade/mtodos. 2. Tcnicas de Planejamento.3.DiretrizesparaoPlanejamentoemSade.4.DiagnsticodaSituaoemSade.5.AvaliaoemSade.6.SadedaFamlia. 7. Servios Bsicos de Sade. I. Faria, Horcio Pereira. II. Santos, Max Andr dos. II. Ncleo de Educao em Sade Coletiva daFaculdadedeMedicina/UFMG(Nescon).IV.Ttulo.

    NLM: WA 540 CDU: 614

    2010, Ncleo de Educao em Sade Coletiva da Faculdade de Medicina/UFMG (Nescon)

    A reproduo total ou parcial do contedo desta publicao permitida desde que seja citada a fonte e a finalidade no seja comercial. Os crditos devero ser atribudos aos respectivos autores.

    Universidade Federal de Minas GeraisReitor: Ronaldo Tadu Pena

    Vice-Reitora: Heloisa Maria Murgel Starling

    Pr-Reitoria de Ps-GraduaoPr-Reitora: Elizabeth Ribeiro da Silva

    Pr-Reitoria de ExtensoPr-Reitora: ngela Imaculada Loureiro de Freitas DalbenPr-Reitora Adjunta: Paula Cambraia de Mendona Vianna

    Centro de Apoio Educao a Distncia (CAED) e UAB/UFMGCoordenadora: Ione Maria Ferreira de Oliveira

    Ctedra da UNESCO de Educao a DistnciaCoordenadora: Rosilene Horta Tavares

    Escola de EnfermagemDiretora: Marlia Alves

    Vice-Diretora: Andra Gazzinelli Corra de Oliveira

    Faculdade de EducaoDiretora: Antnia Vitria Soares AranhaVice-Diretor: Orlando Gomes de Aguiar Jnior

    Faculdade de MedicinaDiretor: Francisco Jos PennaVice-Diretor: Tarcizo Afonso Nunes

    Faculdade de OdontologiaDiretor: Evandro Neves AbdoVice-Diretora: Andra Maria Duarte Vargas

    Ncleo de Educao em Sade Coletiva da Faculdade de Medicina / UFMG (Nescon)Coordenador em exerccio: Edison Jos Corra

    Produo EditorialEditora Coopmed

    Diretor Editorial: Davidson Pires de Lima

    Projeto GrficoMarco Severo, Rachel Barreto e Romero Ronconi

    FotosFiocruz Multimagens | www.flickr.com

    Reviso de provaZirlene Lemos

  • Sumrio

    Apresentao dos autores .................................................................................................... 4

    Apresentao - Curso de Especializao em Ateno Bsica em Sade da Famlia Programa gora .................................................................................... 5

    Apresentao da Unidade Didtica I ................................................................................... 6

    Introduo ao mdulo ......................................................................................................... 13

    Seo 1 | Planejamento em sade ..................................................................................... 15

    Parte 1 - Aspectos gerais do planejamento ...................................................................... 17

    Parte 2 - Mtodos de planejamento em sade ................................................................ 21

    Parte 3 - O Planejamento Estratgico Situacional (PES) ................................................... 23

    Seo 2 | Diagnstico situacional em sade ..................................................................... 33

    Parte 1 - O mtodo da Estimativa Rpida ......................................................................... 37

    Seo 3 | Elaborao do plano de ao ............................................................................. 57

    Seo 4 | Monitoramento e avaliao das aes de sade na Ateno Bsica Sade .........81

    Parte 1 - Avaliao e monitoramento: conceitos ............................................................... 83

    Parte 2 - Modelo terico ou Modelo lgico ...................................................................... 85

    Referncias ........................................................................................................................... 89

    Apndice A Sntese do diagnstico situacional da Equipe Verde de Sade da Famlia Vila Formosa - Municpio de Curupira ................................................. 91

  • Apresentao dos autores

    Francisco Carlos Cardoso de Campos

    Mdico pela Faculdade de Cincias Mdicas de Minas Gerais. Mestre em Administrao pelo Centro de Ps-Graduao e Pesquisas em Administrao da Facul-dade de Cincias Econmicas da Universidade Federal de Minas Gerais (CEPEAD/FACE/UFMG). Especialista em Medicina Preventiva e Social pelo Curso de Espe-cializao em Medicina Social/Departamento de Medi-cina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (CEMS/DMPS/FM/UFMG). Pesquisador do Ncleo de Educao em Sade Coletiva (Nescon).

    Max Andr dos Santos

    Horcio Pereira de Faria

    Mdico pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Especialista em Medicina Social. Mestre em Sade Ocupacional. Professor Assistente do Departamento de Medi-cina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina da UFMG. Pesquisador do Ncleo de Educao em Sade Coletiva Nescon. Membro do Ncleo de Estudos de Sade e Paz/Departamento de Medi-cina Preventiva e Social e do Grupo de Estudos de Sade do Trabalhador Rural (GESTRU).

    Mdico pela Faculdade de Medicina da UFMG. Espe-cialista em Medicina Social. Pesquisador do Ncleo de Educao em Sade Coletiva Nescon. Mdico regulador da Central de Internao/Belo Horizonte. Assessor da Gerncia de Planejamento da Secretaria de Sade do municpio de Belo Horizonte.

  • ApresentaoCurso de Especializao em Ateno Bsica em Sade da Famlia

    Programa gora

    Para informaes detalhadas consulte: www.nescon.medicina.ufmg/agora

    O Curso de Especializao em Ateno Bsica em Sade da Famlia (CEABSF), na modalidade a distncia, uma realizao da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), por meio do Ncleo de Educao em Sade Coletiva/Faculdade de Medicina, com a participao da Faculdade de Odontologia e Escola de Enfermagem e da Ctedra da UNESCO de Ensino a Distncia/Faculdade de Educao. Essa iniciativa apoiada pelo Ministrio da Sade Secre-taria de Gesto do Trabalho e da Educao em Sade (SGTES)/ Universidade Aberta do SUS (UNASUS) , pelo Ministrio da Educao Sistema Universidade Aberta do Brasil/ Secretaria de Educao a Distncia (UAB/SEED) e pelo Banco Nacional de Desenvolvi-mento Econmico e Social (BNDES).

    O curso integra o Programa gora, do Nescon, e, de forma interdisciplinar, interdepartamental, interu-nidades e interinstitucional articula aes de ensino pesquisa extenso. O Programa, alm do CEABSF, atua na formao de tutores, no apoio ao desenvolvi-mento de mtodos, tcnicas e contedos correlacio-nados educao a distncia e na cooperao com iniciativas semelhantes.

    Direcionado a mdicos, enfermeiros e cirurgies-dentistas integrantes de equipes de Sade da Famlia,

    o Curso tem seu sistema instrucional baseado na estratgia de Educao a Distncia. Esse sistema composto por um conjunto de Cadernos de Estudo e outras mdias disponibilizadas tanto em DVD mdulos e outros textos, e vdeos , como na Internet por meio de ferramentas de consulta e de interati-vidade, como chats e fruns. Todos so instrumentos facilitadores dos processos de aprendizagem e tutoria, nos momentos presenciais e a distncia.

    Esse Caderno de Estudo, como os demais que compem o CEABSF, o resultado do trabalho interdis-ciplinar de profissionais da UFMG e de outras universi-dades, e do Servio. Os autores so especialistas em suas reas e representam tanto a experincia acad-mica, acumulada no desenvolvimento de projetos de formao, capacitao e educao permanente em sade, como a vivncia profissional. Todo o material do sistema instrucional do CEABSF est disponvel, para acesso pblico, na biblioteca Virtual do Curso.

    A perspectiva que esse Curso de Especia-lizao cumpra seu importante papel na quali-ficao dos profissionais de sade, com vistas consolidao da estratgia da Sade da Famlia e no desenvolvimento de um Sistema nico de Sade, universal e com maior grau de eqidade.

  • 6Apresentao da Unidade Didtica I

    A primeira unidade didtica do Curso de Especializao em Ateno Bsica em Sade da Famlia est formada por quatro mdulos ou disci-plinas, a saber:

    Mdulo 1 Processo de trabalho em sadeMdulo 2 Modelo assistencial e Ateno Bsica SadeMdulo 3 Planejamento e avaliao das aes em sadeMdulo 4 Prticas educativas em Ateno Bsica Sade. Tecnolo-

    gias para abordagem ao indivduo, famlia e comunidade.

    O foco da discusso desta unidade o processo de trabalho da equipe de Sade da Famlia (SF) no contexto da implementao do Sistema nico de Sade (SUS) e da reorganizao da ateno bsica em sade (ABS) tendo como base a estratgia de Sade da Famlia. Desta forma, o nosso cenrio o SUS e os atores principais so os profissionais que atuam na ateno bsica de sade, em especial aqueles que compem as equipes de Sade da Famlia (SF) e de Sade Bucal (SB).

    ObservaoDenominamos equipe de Sade da Famlia tanto a equipe bsica da estratgia de Sade da Famlia enfermeiro, mdico, auxiliar de enfermagem e agente comunitrio quanto a equipe de sade bucal cirurgio-dentista, auxiliar de sade bucal e tcnico de sade bucal.

    Esperamos, a partir dos textos e das atividades propostas, das discusses com os seus tutores e dos encontros presenciais, proporcionar uma reflexo crtica sobre a organizao do trabalho das equipes de SF e fornecer elementos para possvel aprimoramento no processo de trabalho. A expectativa de que esta unidade possa contribuir para a consolidao de uma mudana real do modelo assistencial em conformidade com os princpios e as diretrizes do SUS.

  • 7Iniciamos esta reflexo com a afirmao de que a nossa atuao se faz a partir de modelos, ou seja, o nosso modo de agir sempre orientado por algumas concepes do que deve ser e do que no deve ser, nos diferentes mbitos e realidades.

    Em nossa atuao profissional no diferente, nossa atividade, as tcnicas, os recursos diagnsticos e os instrumentos que utilizamos condizem com alguma ideia do que devemos fazer em nossa profisso em cada situao, em cada realidade.

    Todos ns sabemos que essas concepes, tanto na vida em geral como no trabalho, apresentam uma marcante diversidade. No entanto, em nosso cotidiano da vida e do trabalho temos dificuldades para refletir sobre o modo como estamos agindo. s vezes fazemos as coisas de forma mais ou menos automtica, guiados pela nossa intuio ou pelo senso comum. Assim sendo, nossas atitudes podem no ser as mais adequadas, podem no ser as mais eficazes e, consequentemente, no conduzir aos resultados que desejamos. Porm, de algum modo, a realidade sempre bate nossa porta, pedindo-nos para refletir melhor, para avaliar critica-mente o que temos feito em face dos resultados que temos obtido.

    Muitas vezes a nossa reao frente a essa situao se manifesta apenas na forma da insatisfao, da frustrao, do desapontamento. Certamente, esses sentimentos aparecem porque no temos os elementos para compreender o que inadequado no nosso trabalho e fazer as devidas correes de rumo. Nesse caso, podemos dizer que nos faltam os instru-mentos para realizarmos a reflexo crtica e promovermos as transforma-es necessrias que nos levem a melhorar a nossa atuao e, assim, obter melhores resultados.

    No caso do setor sade, surgem, cotidianamente, situaes de muita complexidade, envolvendo uma diversidade de relaes e com alta presso por resultados. Lidar com as demandas e necessidades de indivduos, famlias e comunidades requer, entre outras coisas, instrumentos tambm complexos, para que faamos intervenes e avaliaes adequadas.

    Ao longo deste caderno de estudos voc conhecer a equipe de Sade da Famlia Equipe Verde do bairro de Vila Formosa, do Municpio de Curupira, denominada, a partir de agora, apenas de Equipe Verde. Trata-se de uma equipe fictcia que estamos utilizando como recurso didtico para subsidiar os estudos e compreenso dos temas abordados, aproximando-se do cotidiano do trabalho das equipes de Sade da Famlia. Vamos ento apresentao dessa equipe e do territrio onde ela atua.

  • 8Municpio de CurupiraCurupira uma cidade com cerca de 80.000 habitantes, que teve um crescimento popula-cional importante nas duas ltimas dcadas em funo do xodo rural ocorrido na regio e da instalao de algumas indstrias (con-feces). Como em vrias cidades brasilei-ras, esse crescimento no foi acompanhado do correspondente crescimento econmico, de infraestrutura e muito menos de desenvol-vimento social. Devido sua situao geogr-fica estratgica, tem sido utilizada na rota do trfico de drogas (maconha) do Nordeste para o Sudeste, com todas as consequncias des-se fato: violncia e aumento do consumo de drogas. A cidade vive basicamente da agricul-tura (soja), de uma incipiente indstria, de agri-cultura e pecuria de subsistncia em franco declnio e do plantio de tomate e batata, cuja produo, em sua quase totalidade encami-nhada para a Central de Abastecimento (CEA-SA). A atividade poltica partidria polarizada entre dois grupos polticos tradicionais que se revezam frente da administrao municipal ao longo de dcadas. Algumas lideranas no-vas tm aparecido e conseguido, por interm-dio da Cmara de Vereadores, fazer um con-traponto s prticas polticas tradicionais de cunho clientelista/assistencialista. A cidade sempre teve forte tradio na rea cultural e movimenta a regio com o seu festival de m-sica e, ainda, preserva suas festas religiosas e seus grupos de congado. Na rea de sade, a cidade sede da microrregio, sendo refern-cia para consultas e exames de mdia comple-xidade, atendimento de urgncia e emergn-cia e o cuidado hospitalar, embora a estrutura do seu sistema de sade deixe muito a dese-jar. H aproximadamente cinco anos o muni-cpio adotou a estratgia de Sade da Fam-lia para a reorganizao da ateno bsica e conta hoje com 12 equipes na zona urbana e trs na zona rural cobrindo 70% da populao. Um grande problema no desenvolvimento da estratgia da SF, em que pese a uma remu-nerao superior mdia do mercado, a ro-tatividade dos profissionais de sade, particu-larmente de mdicos.

    Comunidade de Vila Formosa Vila Formosa uma comunidade de cerca de 6.500 habitantes e fica na periferia de Curu-pira, tendo se formado principalmente a par-tir do xodo rural ocorrido na dcada de 70 em funo do avano do plantio de soja por grandes empresas, com a consequente re-duo da agricultura familiar de subsistncia. Hoje a populao empregada vive basicamen-te do trabalho nas empresas rurais que plan-tam soja, do plantio de tomate e batata que acontece em pequenas propriedades rurais re-manescentes localizadas na periferia da cida-de, da prestao de servios e da economia informal. alto o nmero de desempregados e subempregados. A estrutura de saneamen-to bsico na comunidade deixa muito a dese-jar, principalmente no que se refere rede de esgoto sanitrio e coleta de lixo. Parte sig-nificativa da comunidade vive em moradias bastante precrias. O analfabetismo elevado principalmente entre os maiores de 40 anos, assim como a evaso escolar entre menores de 14 anos. Nas ltimas administraes tem havido algum investimento pblico na comu-nidade (escola, centro de sade, creche, asi-lo, etc.) em funo da presso da associao comunitria, que bastante ativa. Existem v-rias iniciativas de trabalho na comunidade por parte da igreja e ONGs. Esses trabalhos esto bastante dispersos e desintegrados e, em sua maioria, voltados para crianas, adolescentes e mes. A populao conserva hbitos e cos-tumes prprios da populao rural brasileira e gosta de comemorar as festas religiosas, em particular as festas juninas. Em Vila Formosa trabalham duas equipes de Sade da Famlia a Equipe Verde e a Equipe Amarela.

    A unidade de sade da Equipe VerdeA unidade de Sade da Famlia de Vila Formo-sa 1, que abriga a Equipe Verde, foi inaugurada h cerca de 10 anos e est situada na rua prin-cipal do bairro que faz a ligao com o centro da cidade. Trata-se de uma casa alugada que foi adaptada para ser uma unidade de sade. A casa antiga, porm bem conservada. Sua

  • 9Jos Antnio R., 18 anos, solteiro, estu-dante e agente comunitrio de sade da microrea 2, com 160 famlias cadastradas. o primeiro trabalho de Jos Antnio, que pretende continuar os estudos e tentar o vestibular para servio social.

    Aline F.S., 25 anos, casada, 2 filhos, agen-te comunitria de sade da microrea 3, com 170 famlias cadastradas. Aline estu-dou at a 2 srie do segundo grau e inter-rompeu os estudos quando ficou grvida de seu primeiro filho. Trabalhou anterior-mente em um restaurante como cozinhei-ra e participa ativamente da associao de moradores da comunidade. Tem facilidade para falar em pblico e ainda no perdeu as esperanas de retomar os estudos algum dia e, talvez, se tornar uma auxiliar de en-fermagem.

    Snia Maria P.C., 20 anos, solteira, agente comunitria de sade da microrea 4, com 150 famlias cadastradas. Snia proce-dente da zona rural onde morava e estudou at a 4a srie do primeiro grau, quando teve que abandonar os estudos pela dificuldade de acesso escola e para ajudar a famlia na roa, que ainda vive at hoje do plantio de tomate e batata principalmente.

    Marco Antnio P., 45 anos, solteiro, agen-te comunitrio de sade da microrea 5, com 200 famlias. Marco uma pessoa tranquila e muito conhecida na cidade e sempre participa das aes desenvolvidas pela comunidade.

    Joana de S.P., 48 anos, solteira, um filho, auxiliar de enfermagem. Joana trabalhou mais de 15 anos em hospital e h trs anos foi aprovada na seleo e iniciou suas ati-vidades no PSF, mantendo um planto no hospital local no final de semana.

    Renata C.T., 29 anos, solteira, mdica. Formada h quatro anos decidiu viver a experincia do PSF para depois fazer resi-dncia (Ginecologia e Obstetrcia). Traba-

    rea pode ser considerada inadequada, consi-derando-se a demanda e a populao coberta (3.100 pessoas), embora o espao fsico seja muito bem aproveitado. A rea destinada re-cepo pequena, razo pela qual nos hor-rios de pico de atendimento (manh) cria-se certo tumulto na unidade. Isto dificulta sobre-maneira o atendimento e motivo de insatisfa-o de usurios e profissionais de sade. No existe espao nem cadeiras para todos e mui-tos tm que aguardar o atendimento em p. Essa situao sempre lembrada nas discus-ses sobre humanizao do atendimento. No existe sala de reunies, por isso a equipe utili-za o quintal, sombra de um grande abacatei-ro, o que bastante agradvel quando faz ca-lor, mas quando chove um problema. As reunies com a comunidade (os grupos operativos, por exemplo) so realizadas no sa-lo da associao de moradores que fica ao lado da unidade de sade. Houve, porm, mo-mentos quando as relaes da equipe de sade com a diretoria da associao no eram as mais amistosas em que as reunies acon-teciam no salo da igreja, que fica um pouco distante da unidade de sade. A populao tem muito apreo pela unidade de sade, fruto de anos de luta da associao.A unidade atualmente est bem equipada e con-ta com os recursos adequados para o trabalho da equipe, porm at o final da ltima administrao funcionava sem mesa ginecolgica, glicosmetro, nebulizador e instrumental cirrgico para peque-nas cirurgias e curativos. A falta desses materiais constituiu um foco de tenso importante entre a equipe de sade, a coordenao do PSF e o ges-tor municipal da sade.

    Equipe VerdeA equipe verde formada pelos profissionais apresentados a seguir:

    Mariana L.S., 28 anos, solteira, agente co-munitria de sade da microrea 1, com 180 famlias cadastradas. Mariana estudou at a 8a srie e trabalhava em uma peque-na confeco como costureira antes de tra-balhar como ACS.

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    lhou por trs anos no municpio vizinho, de onde saiu porque o novo prefeito desativou o PSF que havia sido implantado por seu adversrio poltico. Participa da atual equi-pe h nove meses substituindo o mdico anterior, que saiu porque o novo secretrio de sade estava exigindo o cumprimento das oito horas dirias de trabalho.

    Pedro Henrique S.J., 32 anos, enfermeiro, solteiro. Pedro trabalha em Sade da Fam-lia h oito anos, tendo sido coordenador da ateno bsica quando da implantao da estratgia de Sade da Famlia no munic-pio. Saiu da coordenao na mudana da administrao e desde ento atua na Equi-pe Verde. No princpio teve algumas dificul-dades na relao com o atual coordenador, que no foram totalmente superadas.

    Cludia de O.C., 23 anos, cirurgi-dentis-ta. Cludia recm-formada e este seu primeiro emprego aps sua formatura. De-cidiu trabalhar com a ateno bsica aps o seu estgio rural realizado em um pequeno municpio no norte de Minas Gerais. uma pessoa muito dinmica e cheia de planos.

    Gilda M.S., 22 anos, tcnica de sade bucal. Gilda trabalha como TSB h trs anos, tem o 2 grau completo e pensa em retomar os es-tudos e tentar fazer uma faculdade.

    Maria das Dores P., 20 anos, auxiliar de sade bucal. Trabalha como ASB desde a implantao da equipe; muito habilidosa e gosta muito do seu trabalho.

    Jos R.S., 40 anos, educador. Jos tem formao em educao e j trabalhou em vrios setores da Secretaria Municipal de Educao, sendo responsvel durante al-guns anos pelo programa de alfabetizao de adultos. Com a implantao do PSF no municpio, comeou uma parceria com o setor sade. Com a entrada do novo se-cretrio municipal de educao, pediu para trabalhar junto s equipes de Sade da Fa-mlia, fazendo uma ponte entre a sade e

    a educao. No momento trabalha em dois projetos de educao e sade. Um projeto junto escola do bairro Vila Formosa e ou-tro junto ao assentamento do MST.

    Funcionamento da unidade de sade A unidade de sade funciona de 7:30 s 18:00 ho-ras. Para tanto, necessrio o apoio dos agentes comunitrios, que se revezam durante a semana, segundo uma escala, em atividades relacionadas assistncia como recepo e arquivo, sempre e quando esto presentes na unidade o auxiliar de enfermagem e/ou o enfermeiro. Isso tem sido motivo de algumas discusses, principalmente entre o enfermeiro da equipe e o coordenador de ateno bsica, que justifica a necessidade de se utilizar o trabalho dos ACSs nessas atividades, pela dificuldade de contratao de outro auxiliar de enfermagem. Existe uma solicitao da comu-nidade para que o atendimento seja estendido at as 21:00 horas, pelo menos em alguns dias da semana. Essa demanda se justifica, segundo a comunidade, entre outros motivos, pelo fato de existirem muitos trabalhadores rurais que retor-nam do trabalho no final da tarde e, por isto, tm dificuldade de acesso unidade de sade. Essa questo j foi objeto de vrias reunies entre a equipe e a associao, porm at o momento no existe proposta de soluo.

    O dia-a-dia da Equipe VerdeO tempo da Equipe Verde est ocupado quase que exclusivamente com as atividades de aten-dimento demanda espontnea (maior parte) e a alguns programas como sade bucal, pr-natal, puericultura, preventivo de cncer de mama e ginecolgico, atendimento individual a hiperten-sos e diabticos e acompanhamento a crianas desnutridas. A equipe j tentou desenvolver ou-tras aes de sade como, por exemplo, criao de uma horta comunitria, grupo de hipertensos e diabticos, grupos de caminhada, que, com o tempo, se mostraram pouco frutferas. No incio, essas iniciativas conseguiram despertar algum interesse da comunidade, mas logo as pessoas sumiam e o trabalho morria. Em relao aos grupos de hipertensos e diabticos, a equipe re-solveu condicionar a troca das receitas parti-cipao nas reunies, fato que provocou alguns

  • 11

    Nessa apresentao, a Equipe Verde j reve-lou um pouco dos problemas que ela enfrenta e tambm da forma como ela trabalha. Neste sentido, um dos primeiros passos desta uni-dade didtica ser uma reflexo sobre o seu processo de trabalho (e de sua equipe). Este exerccio inicial dever acompanhar todo o de-senvolvimento deste primeiro mdulo, que tra-ta especificamente do processo de trabalho e que continuar nos demais mdulos.

    Para um bom aproveitamento em seus estu-dos, importante que voc faa todas as ati-vidades, leia os textos complementares, parti-cipe e contribua nas discusses nos fruns e dos encontros presenciais. Finalmente, espe-ramos que voc explore esta unidade didtica com a compreenso de que ela apenas mais um momento no seu processo de desenvolvi-mento e qualificao (e de sua equipe).

    questionamentos por parte da populao e de al-guns membros da prpria equipe e que no mu-dou qualitativamente a participao nas reunies. A falta de um projeto e de uma avaliao mais sis-temtica do trabalho tem sido motivo de alguns conflitos entre os membros da equipe. Uma quei-xa geral a falta de tempo por causa da demanda de atendimento. Com o passar dos anos, essa si-tuao e a falta de perspectivas de mudanas tm provocado muito desgaste na equipe. O grupo fi-cou um pouco animado com a possibilidade da mdica, do enfermeiro e da cirurgi-dentista par-ticiparem do curso de especializao em Sade da Famlia. A novidade foi comunicada durante a ltima reunio da equipe sombra do abacateiro, num final de tarde de sexta-feira.

    E ento, o que voc achou da Equipe Verde? Em que ela se assemelha e em que ela se diferencia da sua equipe?

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    Introduo ao mduloPlanejamento e avaliao das aes em sade

    O desafio representado pela implementao do SUS exige cada vez mais a utilizao de ferramentas e tecnologias que facilitem a identificao dos prin-cipais problemas de sade de nossas comunidades e a definio de interven-es eficientes e eficazes. Uma dessas ferramentas , sem dvida alguma, o planejamento.

    Este mdulo tem como objetivo a discusso do processo do planejamento em sade, desde a identificao dos problemas de sade at o monitoramento e avaliao das aes nesse setor, e de sua importncia como instrumento para a reorganizao do processo de trabalho da equipe de Sade da Famlia.

    O mdulo est composto de quatro sees:Seo 1 Planejamento em sadeSeo 2 Diagnstico situacional em sadeSeo 3 Elaborao do plano de ao Seo 4 Monitoramento e avaliao das aes de sade na Ateno

    Bsica Sade

    Esperamos que voc participe ativamente, leia os textos sugeridos, realize todas as atividades propostas e participe dos fruns de discusso.

    Sabemos que planejar um exerccio contnuo na nossa vida, portanto, vamos comear nossa conversa com uma reflexo sobre a utilizao do planejamento em nosso dia-a-dia.

    Foto: www.flickr.com

  • 14

    A partir dessa cena, podemos refletir sobre vrios aspectos do planeja-mento e isso que faremos nas sees seguintes.

    Atividade 1

    Descreva o planejamento de uma festa. Identifique os passos ou etapas que

    foram cumpridas no planejamento e elabore um conceito de planejamento.

    Guarde em seu portflio. Consulte, no cronograma da disciplina, os outros

    encaminhamentos para esta atividade.

    Esperamos que esta atividade tenha estimulado voc para o estudo do

    tema, reafirmado a sua percepo quanto utilizao do planejamento em

    todos os momentos de seu cotidiano pessoal, na maioria das vezes no o

    fazendo de maneira sistematizada. No entanto, na organizao do nosso

    trabalho imprescindvel faz-lo de forma intencional e sistematizada.

    Vejamos o que a Equipe Verde pensa disso, acompanhando uma discus-

    so desses nossos colegas.

    Mapa contextual

    Cena 1: Equipe discute a necessidade do planejamento

    Cenrio: reunio da equipe no quintal do centro de sade sombra do abaca-teiro, pessoas sentadas em bancos e cadeiras, uma pessoa sentada frente de uma mesa com um caderno.

    Renata: Olha, gente, acho que estamos precisando discutir melhor como enfrentar os problemas de sade aqui da comunidade.Marco Antnio: Eu concordo com voc e j falei e vou repetir mais de uma vez: se a gente quer resultado diferente do nosso trabalho, precisamos fazer as coisas diferente. Mas o que est faltando pra gente mudar de fato o rumo das coisas?

    Aline: Eu tambm estou sentindo falta de dar uma mexida. Eu gosto muito de trabalhar nesta equipe. Aqui ningum foge do trabalho, mas eu sinto que poderamos fazer mais.

    Snia: , eu estou cansada de ficar apagando incndio. Ser que no podemos ter pelo menos um ou dois projetos mais de mdio e longo prazos?

    Pedro: Acho que voc matou a charada, Snia. Ns precisamos de projetos de mais longo prazo, pra gente sair um pouco da rotina. Mas acho que tem que ser um pra resolver problemas mais complicados, alguma coisa que seja realmente um desafio. Temos que sair da inrcia.

    Jos Ribeiro: Eu concordo, mas pra isto ns temos que planejar bem.Renata: Pois , gente, por coincidncia, ns vamos comear o mdulo de planejamento do nosso curso. Quem sabe isto pode nos dar uma luz...

  • Seo 1Planejamento em sade

  • 16

    Nesta seo, vamos iniciar a nossa reflexo sobre o planejamento em sade com o objetivo geral de discutir a importncia do planejamento no trabalho das equipes de sade e a necessidade de trabalh-lo como um processo, contando, para tal, com um mtodo de planejamento. Ao final da seo, esperamos que voc seja capaz de:

    Identificar aspectos gerais do planejamento em sade.Discutir conceitos de planejamento.Conhecer as principais diferenas entre os mtodos de planeja-

    mento estudados.Elaborar um Planejamento Estratgico Situacional - PES.

    importante que voc participe ativamente de todas as atividades desta seo, pois ela ser fundamental para o desenvolvimento das sees seguintes. Iniciaremos nosso trabalho enfocando os aspectos mais gerais do planejamento e posteriormente situaremos essa discusso no campo da sade.

  • 17

    1Parte

    Aspectos gerais do planejamento

    Nesta primeira parte, a partir de algumas perguntas e respostas, pretendemos situar a questo do planejamento como uma atividade que est incorporada na vida de todos ns e de sua importncia para resolver, de forma mais eficiente e eficaz, os problemas de nosso dia-a-dia.

    1.1 | Por que precisamos planejar?

    Tendo feito uma rpida reflexo sobre o planejamento no seu cotidiano, certamente pode-se perceber que o ato de planejar inerente ao ser humano. Com mais ou com menos grau de conscincia, todos ns plane-jamos. Por exemplo: planeja-se uma viagem, uma festa, a compra de uma casa, atravessar uma rua movimentada, etc.

    Se pensarmos mais um pouco, veremos que h condies que nos obrigam a planejar. Por exemplo, o oramento domstico. Por que ser que somos obrigados a planej-lo? Por uma razo muito simples: o que temos para gastar , normalmente, menos que nossas necessidades ou expectativas. Essa uma ocorrncia muito frequente na vida: os recursos so menos que as demandas e isto nos obriga a planejar, caso contrrio, vamos usar mal o pouco recurso que temos ou, o que pior, vamos contrair dvidas, pagar juros, etc., etc.

    Mas ser que apenas por esta razo que planejamos? Por uma mera questo de economia de recursos? No. Planejamos tambm, e prin-cipalmente, porque queremos alcanar objetivos. Aqui cabe a seguinte pergunta: ser que possvel alcanarmos objetivos sem planejar? Se pensarmos bem, veremos que . Mas, depende de sorte. S que, neste caso, certamente h menos chances de alcanarmos os objetivos e menos ainda quando queremos alcanar um objetivo coletivamente.

    Por outro lado, podemos nos perguntar: o planejamento nos garante

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    alcanar os objetivos? Obviamente que no. No h certeza em planeja-mento, ele apenas aumenta nossa probabilidade de termos sucesso. E quanto melhor planejarmos, mais chance temos de atingir os objetivos.Ao se pensar em planejamento,

    preciso ter em mente que o ato de planejar algo inerente ao ser humano, ou seja, em nosso coti-diano todos ns o fazemos, at mesmo sem o percebermos. O ato de planejar importante porque permite melhor aprovei-tamento do nosso tempo e dos nossos recursos, aumentando as chances de alcanarmos os nos-sos objetivos.

    Para refletir...

    Se estivermos convencidos de que preciso planejar, a prxima pergunta a ser feita :

    1.2 | Por que necessitamos de um mtodo de planejamento?

    O planejamento cotidiano, na maioria das vezes, feito de forma intuitiva ou pouco sistematizada. Quando se pretende alcanar objetivos complexos e, mais, de faz-lo coletivamente, torna-se ainda mais evidente no s o quanto importante planejar, como , tambm, imprescindvel contar com um mtodo de planejamento.

    preciso um mtodo de planejamento que possibilite a compreenso e o compartilhamento de uma mesma linguagem (conceitos bsicos, terminologia, instrumentos utilizados, etc.); que seja capaz de contribuir para o dilogo e para efetiva participao de todos aqueles envolvidos na formulao e na operacionalizao de um plano.

    Portanto, se no contarmos com um mtodo, torna-se praticamente invivel, principalmente em organizaes mais complexas (como as gover-namentais), que o processo de planejamento possa ser institucionalizado, com participao de todos os nveis.

    Quando planejamos alcanar objetivos complexos e queremos faz-lo de forma participativa, compartilhando diferentes saberes (interdisciplinaridade) e diferentes aes (intersetorialidade), necessariamente precisamos trabalhar com um mtodo de planejamento.

    Se estivermos cientes da importncia de trabalhar com um mtodo de planejamento, temos uma prxima pergunta a ser feita.

  • 19

    1.3 | Qual a diferena entre o planejamento e o plano?

    O professor Chorny (1998) diz que planejamento no fazer plano e, segundo Matus (1989): o plano um produto momentneo de um processo de planejamento. Funciona como um instrumento para, em determinados momentos, permitir o compartilhamento e/ou a negociao dos projetos elaborados. O plano nunca est acabado, mas tem que estar sempre pronto, para orientar a ao da equipe que planeja.

    Assim, um processo de planejamento no aquele em que (geralmente uma vez ao ano) se elabora um documento (o plano) para ser apresentado e no necessariamente executado (provavelmente engavetado).

    Esse documento necessrio, pois deve servir como referncia para o acompanhamento da execuo das aes, a correo de rumos e a avaliao dos resultados alcanados em relao aos objetivos propostos, provocando, assim, um movimento processual do planejamento.

    1.4 | Por que o planejamento deve ser um processo permanente?

    Basta pensar que, quase sempre, principalmente no setor governamental, est-se perseguindo objetivos em situaes em que h menos recursos que necessidades. A essa constatao soma-se o fato de que as situaes a serem enfrentadas so dinmicas, sofrendo constantes transformaes. Ou seja, planeja-se em situaes nas quais a incerteza sempre estar presente.

    Portanto, planejar passa a ser uma necessidade cotidiana, um processo permanente para que se possa garantir direcionalidade s aes desenvol-vidas, corrigindo rumos, enfrentando imprevistos e buscando-se sempre caminhar em direo aos objetivos que se quer alcanar.

    Sempre estamos planejando em situaes dinmicas que sofrem constantes transformaes. Portanto, fundamental estabelecer um processo perma-nente de planejamento que d conta de corrigir os rumos e manter a direciona-lidade das aes desenvolvidas em relao aos objetivos a serem alcanados.

    At aqui fizemos algumas reflexes que nos permitiram perceber a importncia de planejar, de faz-lo com um mtodo e tambm como um processo permanente. Cabe, agora, considerarmos algumas outras questes ou mesmo pressupostos sobre os quais precisamos ter clareza.

    Se concordarmos que o planejamento uma ferramenta fundamental para administrar situaes cotidianas que ocorrem no processo de trabalho, preci-samos ter clareza sobre como se pretende gerenciar determinada organizao.

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    Sendo assim, torna-se indispensvel definir e decidir sobre o modelo de gesto; consequentemente, o modelo de planejamento a ser adotado deve, necessariamente, ser coerente com o modelo de gesto.

    1.5 | Conceito de planejamento

    Podemos nos perguntar: o planejamento um pensar ou um agir? Muitos diro que um pensar. Mas, na verdade, so as duas coisas. Ou seja, uma ao pensada. um pensar antes de agir. O contrrio de planejar improvisar. A ao improvisada aquela sobre a qual no tivemos tempo de pensar previamente, pois fomos pegos de surpresa. Ou seja, so as aes voltadas para os imprevistos. o famoso apagar incndios.

    Pode-se dizer, de um modo bastante simplificado, que planejar simplesmente pensar antes e durante a ao. Segundo Matus (1989; 1993), o planejamento um clculo que precede e preside a ao.

    Se planejar um refletir antes de agir, onde fica ento o limite entre a mera reflexo prvia e o planejamento propriamente dito?

    Para Matus (1989; 1993), h muita diferena entre um clculo pobre, imediatista, que no projeta o futuro, feito intuitivamente, no-sistematizado, com viso parcial da realidade e aquele que considera o futuro de modo consistente, partindo de uma viso do presente, que trabalha com um clculo sistematizado, apoiado por teorias e mtodos e tem uma viso mais global, analisando a situao de modo articulado.

    Portanto, o planejamento deve ser um clculo situacional e sistemtico capaz de articular o imediato (presente) com o futuro. O plano, como um clculo, no nem puramente tcnico, nem puramente poltico e muito menos nico. Devemos considerar tanto as propostas dos especialistas (ou o ponto de vista tcnico-cientfico) como tambm as diferentes vises ou pontos de vistas dos polticos, que captam a realidade buscando realizar seus projetos ou compromissos, assim como propostas oriundas da prpria comunidade que, em ltima anlise, que sofre com os problemas que o planejamento pretende resolver.

    Planejar pensar antes, durante e depois de agir. Envolve o raciocnio (a razo) e, portanto, pode-se entender que o planejamento um clculo (racional) que precede (antes) e preside (durante e depois) a ao. um clculo sistemtico que articula a situao imediata e o futuro, apoiado por teorias e mtodos.

    Uma vez entendido o que o planejamento e qual sua importncia para resolver problemas e atingir objetivos, vamos agora iniciar nossa discusso sobre o mtodo de planejamento.

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    Mtodos de planejamento em sade

    No texto anterior, iniciamos uma conversa sobre planejamento. Vimos que planejar pensar antes e durante uma ao, que um clculo. Mas, qual o clculo que fazemos ao planejar? De maneira geral, calculamos os objetivos a serem alcanados a partir da situao em que nos encon-tramos, do caminho ou das aes que teremos de fazer para alcanar esses objetivos e com quais recursos precisamos contar. Isto o planejamento.

    No entanto, existem diferentes maneiras de planejar. Ou seja, existem distintos modelos ou mtodos de planejamento. importante conhec-los para escolher aquele mais adequado ao nosso modelo assistencial de sade e, por conseguinte, ao modelo de gesto que adotamos.

    Para nossa discusso, vamos nos referir a apenas dois mtodos, o norma-tivo e o estratgico. O que significa planejar normativamente ou estrategica-mente? Quais so as diferenas fundamentais entre esses dois mtodos?

    O planejamento normativo surgiu na Amrica Latina, na dcada de 1960. Duas instituies, a Organizao Pan-Americana de Sade (OPAS) e o Centro de Estudos do Desenvolvimento da Universidade Central da Venezuela (CENDES), elaboraram um mtodo de planejamento para a sade, que ficou conhecido como mtodo CENDES/OPAS (1965).

    Segundo Lgia Giovanella (1990), para a elaborao desse mtodo foi realizada uma transposio para a sade do planejamento econmico normativo, vigente na Amrica Latina desde a dcada de 1940. Surge como resultado de um mtodo de planejamento no qual a realidade deve funcionar como norma e cujo objetivo otimizar os ganhos econmicos obtidos com sade e/ou diminuir os custos da ateno, sendo a escolha de prioridades feita a partir da relao custo/benefcio. Nesse mtodo, a formulao do plano inicia-se com a realizao de um diagnstico. A partir do diagnstico faz-se uma seleo de prioridades, definem-se as aes e os recursos com o intuito de alcanar mais eficincia nas aes de sade.

    Essa uma proposta tecnocrtica, na qual o planejador, baseado em seus conhecimentos tcnicos neutros, faz o plano e estabelece as prio-

    2Parte

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    ridades. um mtodo normativo e economicista, em que a norma tem como fundamento principal a relao custo-benefcio. Por ser um mtodo normativo, considera-se que apenas um ator planeja com plenos poderes, supondo-se sempre que existe o consenso ou o quase-consenso. Descon-sideram-se, ento, os conflitos e os diferentes interesses existentes e, ao faz-lo, no se considera a variabilidade e a complexidade da realidade. Dessa forma, como a anlise da realidade incompleta, sua utilizao para elaborao de intervenes limitada. Tornam-se, apenas, planos ador-mecidos no interior das gavetas. Em decorrncia dessas caractersticas, o mtodo CENDES/OPAS caiu em descrdito ea prpria OPAS (1965) admitiu o fracasso do mesmo.

    Na dcada de 1970, surgiram, na Amrica Latina, as diferentes correntes do planejamento estratgico. Neste curso, trabalharemos com uma metodologia de planejamento mais leve, que procura simpli-ficar, facilitar e agilizar a operacionalizao de um processo de plane-jamento estratgico.

    O mtodo de planejamento estratgico que escolhemos toma como ponto de partida o texto do Prof. Lus Carlos de Oliveira Ceclio (1997), da Unicamp, intitulado: Uma sistematizao e discusso de tecnologia leve de planejamento estratgico aplicada ao setor governamental. Alm desse texto, tambm adota como referncia o Planejamento Estratgico Situacional - PES, desenvolvido pelo chileno Carlos Matus (1989; 1993), e o Planejamento de projetos orientado por objetivos, traduzido do alemo Zielorientiente Projektplanung - ZOPP, desenvolvido pelo Deustsche Gesellchaft Fr Tecnische GTZ (2007) da Alemanha.

    No item seguinte veremos com mais detalhes o Planejamento Estrat-gico Situacional (PES), o seu desenvolvimento e os seus conceitos bsicos.

  • 23

    O Planejamento Estratgico Situacional - PES

    3.1 | Desenvolvimento

    O PES foi desenvolvido pelo Prof. Carlos Matus, Ministro da Economia (e assessor direto) do governo de Salvador Allende, o ento Presidente do Chile. Para Matus (1989; 1993), planejar como preparar-se para a ao. E, para agir, fundamental investir no aumento da capacidade de governar. Para tanto, o autor prope a formao de (por ele denominados) tcnico-polticos, os quais devem ser capazes de viabilizar, com competncia, um modo de ser cotidianamente governo.

    Esse governar cotidiano enfocado por Matus em dois sentidos:

    Governar (maisculo) tem o significado de estar no poder do Estado, no exerccio de algum cargo no aparelho do Estado.

    governar (minsculo) tem o significado de que todas as foras sociais governam, ou seja, podem e devem planejar intervenes inteligentes sobre os fatos sociais;

    3Parte

    Foto: www.flickr.com

  • 24

    Outros trs aspectos enfocados por Matus so tambm importantes para a melhor compreenso dos fundamentos tericos do PES. So eles:

    O projeto de governo refere-se ao plano que uma equipe se prope a realizar para alcanar seus objetivos;

    a governabilidade diz respeito s variveis ou recursos que a equipe controla ou no e que so necessrios para implementar seu plano;

    a capacidade de governo diz respeito experincia e acu-mulao de conhecimentos que uma equipe domina e que so necessrios para a implementao de seu plano. Esses trs pon-tos devem ser vistos numa inter-relao dinmica.

    Para representar graficamente essa inter-relao, Matus utiliza a figura de um tringulo por ele denominado: Tringulo de Governo, cujos vrtices correspondem aos trs aspectos comentados nos pargrafos anteriores: o projeto de governo, a governabilidade e a capacidade de governo. Vejamos na representao grfica a seguir:

    Figura 1 - Tringulo do Governo

    A anlise sobre o equilbrio entre os trs vrtices do tringulo permite avaliar quais so os pontos fracos de um processo de gesto, orientando, com mais clareza, o processo de tomada de decises sobre as intervenes necessrias. Isto , se preciso definir melhor o projeto e/ou se preciso aumentar a governabilidade e/ou a capacidade de governo.

    O Tringulo de Governo procura refletir como essa relao dinmica e inter-dependente. Desse modo, por exemplo, podem acontecer situaes em que: uma equipe tem baixa governabilidade para realizar seu projeto, porm, conta com a alta capacidade de governo, o que pode permitir-lhe acumular recursos que aumentem sua governabilidade em nveis suficientes para que seu projeto se realize; ou uma equipe, apesar de possuir alta governabilidade, pode ficar isolada e impotente para realizar o seu projeto, por contar com pouca ou quase nenhuma capacidade de governo ou no possuir um projeto adequado aos problemas que devem ser enfrentados, ou ambos.

    Projeto de Governo

    Governabilidade Capacidade de Governo

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    Esse tipo de anlise deixa mais claro por que, para Matus, to funda-mental que um mtodo de planejamento seja capaz de contribuir para aumentar a capacidade de governo e a governabilidade.

    3.2 | Conceitos bsicos do PES

    Cada mtodo de planejamento utiliza terminologias e est embasado em conceitos que lhe so prprios. Apreender essas terminologias e conceitos importante tanto para o domnio do mtodo em si quanto para facilitar a comunicao entre os diferentes atores que participam do processo de planejamento.

    3.2.1 O conceito de estratgia

    Estratgia vem do grego estratego e era utilizado para denominar os generais que comandavam as guerras na Grcia antiga. Geralmente, a palavra estratgia nos remete ideia da existncia de conflito.

    Por que o planejamento deve ser estratgico e associado ideia de conflito ou de disputa?

    Porque quando estamos diante de uma situao qualquer ou de um problema qualquer, geralmente, existem diversos atores sociais com diferentes vises, propsitos, interesses e compromissos relacionados a essa situao ou problema. So essas diferenas que colocam a possi-bilidade de conflitos. Existindo conflitos, preciso que se raciocine estra-tegicamente para que os objetivos estabelecidos sejam alcanados. No se pode cometer o grave erro de pensar que s ns estamos planejando ou que o outro tambm pensa como eu.

    Atividade 2

    Considere que sua equipe tenha um projeto que tem como seu objetivo

    central aumentar a adeso dos hipertensos ao tratamento medicamentoso

    prescrito e aos hbitos de vida mais saudveis. Elabore texto analisando as

    possibilidades de sucesso do projeto, considerando a governabilidade e a

    capacidade de governo da equipe.

    Guarde em seu portflio. Consulte, no cronograma, os outros encaminha-

    mentos solicitados para esta atividade.

    Rotinas

  • 26

    Podemos identificar dois tipos de estratgias:

    As estratgias de longo prazo esto relacionadas a algo importante ou indispensvel, um objetivo futuro e transcendente a ser perseguido. Geralmente, utilizada para explorar o futuro, num horizonte de tempo de longo prazo, estabelecendo direo e sentido para um processo de mudana num perodo de cerca de 20 a 30 anos.

    Estratgias de curto/mdio prazo esto relacionadas soluo de questes mais imediatas e urgentes. So importantes e devem estar articuladas com as estratgias de longo prazo. Aqui, busca-se um trajeto rumo ao futuro. A pergunta agora passa a ser: como avanar na direo do que se busca alcanar?

    Podemos entender que estratgia , basicamente, uma maneira de construir viabilidade para um plano elaborado, visando alcanar determinados objetivos.

    Um grupo que planeja aes contrrias implantao de uma indstria em um determinado municpio, pelos seus riscos ambientais e, consequentemente, sade de sua populao, deve levar em considerao que existem vrios outros atores interessados na questo que podem ter posies diferentes, tais como: a populao desempregada que v nesse projeto a possibilidade de conseguir um emprego, o prefeito que quer aumentar a arrecadao de impostos, o dono do capital que busca iseno de impostos.

    3.2.2 O conceito de situao

    Para Matus (1989; 1993), o conceito de situao expressa a condio a partir da qual os indivduos ou grupos interpretam e explicam uma reali-dade. Portanto, uma situao pressupe a existncia de atores sociais que interpretam e explicam a realidade, estando, portanto, estabelecida a possibilidade de conflitos, j que os atores envolvidos podem ter interesses e objetivos diferentes. Portanto, uma situao pode ser compreendida como um espao socialmente produzido no qual ns desempenhamos um papel e intervimos da mesma forma que outros.

    Entende-se que num processo de planejamento a leitura da realidade daquele que planeja apenas uma das possveis leituras dessa realidade. Por isso, fundamental que sejam devidamente consideradas as interpre-taes da realidade formuladas por outros atores sociais, o que pode exigir a formulao de estratgias para superar possveis conflitos.

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    Essa reflexo ajuda a perceber que uma explicao ou anlise sobre determinada situao depende necessariamente de:

    Quem explica; Para que explica;A partir de qual posio explica;Em face de quais outros explica.

    Diferentemente do planejamento tradicional, que considera possvel haver um conhecimento nico e objetivo da realidade, para o PES, o conhecimento e a explicao da realidade dependem da insero de cada ator e, logo, so sempre parciais e mltiplos.

    Assim, uma explicao situacional sempre feita por ns ou por eles, como atores sociais. Torna-se, ento, muito importante distinguir a minha explicao daquela que tenta dar conta da explicao do outro, lembrando, tambm, que um mesmo ator pode, partindo de uma mesma realidade, perceber diferentes situaes, visando a diferentes propsitos.

    Uma situao constitui-se num espao de produo social. Uma deter-minada situao expressa a condio, a partir da qual indivduos ou grupos interpretam e intervm nessa realidade.

    Consequentemente:Uma anlise situacional o conhecimento sobre o modo como produzida determinada situao. Essa explicao ou anlise sempre parcial e mltipla. Necessariamente, ela dependente de quem analisa, para que analisa, a partir de qual posio e frente a quem constri essa anlise.

    3.2.3 O conceito de ator social

    Matus (1989; 1993) define ator social como um coletivo de pessoas ou, no seu extremo, uma personalidade que, atuando em determinada realidade, capaz de transform-la. Para tanto, fundamental que esse ator tenha:

    O controle sobre recursos relevantes;uma organizao minimamente estvel; eum projeto para intervir nessa realidade.

    O Planejamento Estratgico Situacional - PES, a partir de seus funda-mentos e mtodo, prope o desenvolvimento do planejamento como

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    um processo participativo. Sendo assim, possibilita a incorporao dos pontos de vista dos vrios setores sociais, incluindo a populao, e que os diferentes atores sociais explicitem suas demandas, propostas e estra-tgias de soluo, numa perspectiva de negociao dos diversos inte-resses em jogo. Essa participao enriquece o processo de planejamento, criando coresponsabilidade dos atores com a efetivao do plano de ao, dando mais legitimidade e, mesmo, viabilidade poltica ao plano.

    Portanto, o conceito de ator social muito importante. Ou seja, ter clareza de quem o ator que planeja e de quais outros atores que esto tambm envolvidos na situao fundamental para o sucesso do plano. tambm fundamental considerar que cada ator v e atua sobre a realidade a partir de percepes diferentes, o que torna necessria uma ao central (no centralizadora, mas aglutinadora) capaz de construir uma coerncia global entre as aes parciais dos diversos atores sociais.

    Um ator social definido como um coletivo de pessoas ou, no seu extremo, uma personalidade que, atuando em determinada situao, capaz de transform-la. Para tanto, fundamental que o ator tenha: um projeto de inter-veno, o controle ou capacidade de mobilizar os recursos necessrios ao plano e uma organizao minimamente estvel para execut-lo.

    Atividade 3

    Uma equipe de sade pode achar que os principais problemas de uma

    comunidade, por seu impacto no perfil de mortalidade e por suas complica-

    es, so o diabetes e a hipertenso arterial. Em funo desses problemas,

    mobilizam grande parte de sua energia, mas sentem que a comunidade

    no lhes d a devida importncia. Pode ocorrer que essa comunidade se

    sinta mais incomodada e afetada com a dificuldade de acesso gua, com

    o desemprego e a violncia. Como lidar com uma situao como essa?

    Vamos discutir esta questo no frum.

    Web

  • 29

    3.2.4 O conceito de problema

    Outro conceito fundamental para a elaborao de uma anlise situa-cional num processo de planejamento o conceito de problema. De modo geral, um problema pode ser definido como a discrepncia entre uma situ-ao real e uma situao ideal ou desejada. Entretanto, uma situao s problematizada quando um ator a define como inaceitvel e, ao mesmo tempo, como passvel de ser transformada na direo desejada.

    Portanto, um problema pode ser entendido como um obstculo que impede determinado ator de alcanar seus objetivos. Sendo assim, um problema autoreferido e dependente da perspectiva de quem o iden-tifica. Em determinadas situaes, o que um problema para um ator pode ser oportunidade para outros. Recuperando a discusso realizada no Mdulo 1 sobre processo de trabalho, podemos dizer que os problemas so, em realidade, o objeto do nosso trabalho.

    Entretanto, os problemas no so do mesmo tipo, isto , existem aqueles mais ou menos complexos, de difcil ou fcil soluo. Cabe, ento, perguntar: quais tipos de problemas um processo de planejamento deveria trabalhar?

    Para responder a essa questo, vamos considerar dois tipos de cate-gorizao dos problemas. Uma primeira prope que os problemas sejam considerados como:

    1. Problemas estruturados: so aqueles cujas variveis que o compem e as relaes entre elas so suficientemente conhecidas. As solues para enfrent-los so consensuais. Exemplo: preveno e controle do sarampo.

    2. Problemas quase-estruturados: caracterizam-se por serem bastante complexos, traduzindo-se em acentuadas dificuldades para seu enfrentamento:

    S possvel identificar algumas das variveis que o compem e precisar algumas das relaes entre essas variveis;

    suas causas so de difcil identificao (so multicausados);no so vistos como um problema por todos os atores;as solues apontadas so situacionais, significando que algumas

    solues so boas para alguns e no o so para outros (so ms); portanto, as solues no so vistas como as mesmas por todos;

    so problemas produzidos no processo social e precisam ser en-frentados com base na elaborao de um plano de ao.

  • 30

    Uma segunda categorizao prope que os problemas sejam conside-rados como:

    1- Problemas intermedirios: so aqueles vividos no cotidiano da organizao. Causam interferncias na qualidade final dos produtos ou dos servios prestados pela organizao.

    2- Problemas finais (ou terminais): so aqueles vividos diretamente pelos clientes ou usurios da organizao. Eles devem ser o alvo do plane-jamento porque, para enfrentar problemas terminais, inevitavelmente, deve-se enfrentar os problemas intermedirios que interferem ou so causadores dos problemas finais.

    Voltando questo anterior: quais tipos de problemas um processo de planejamento deveria trabalhar?. Temos de considerar que o processo de planejamento envolve razovel gasto de energia por parte da equipe e, portanto, de tempo. De maneira geral, devemos planejar as intervenes sobre os problemas quase-estruturados e ao mesmo tempo finalsticos. Os demais problemas, via de regra, conseguimos enfrentar na nossa rotina de programao.

    importante que os conceitos anteriormente relacionados estra-tgia, situao, ator social e problema fiquem bem claros, porque sero muito utilizados na discusso que faremos dos momentos do processo de planejamento nas sees seguintes deste Mdulo.

    3.2 | Os momentos do processo de planejamento

    Todo mtodo de planejamento apresenta, no seu desenvolvimento, passos ou etapas como uma sequncia lgica de aes ou atividades. Ao propor a ideia de momentos do processo de planejamento, Matus (1989; 1993) pretende contrapor a ideia de etapas adotadas no planejamento tradicional e compreendidas como fases estanques, numa sequncia rgida. Os momentos constituem uma dinmica permanente e dialtica, ora predominando uma lgica, ora outra. Matus identifica quatro momentos que caracterizam o processo de planejamento estratgico situacional, que so apresentados a seguir.

  • 31

    Momento explicativo: busca-se conhecer a situao atual, procuran-do identificar, priorizar e analisar seus problemas. Apesar das seme-lhanas desse momento com o chamado diagnstico tradicional, aqui se considera a existncia de outros atores, que tm explicaes diversas sobre os problemas, impossibilitando a construo de uma leitura nica e objetiva da realidade.

    Momento normativo: quando so formuladas solues para o enfrentamento dos problemas identificados, priorizados e anali-sados no momento explicativo, que podemos entender como o momento de elaborao de propostas de soluo.

    Momento estratgico: busca-se, aqui, analisar e construir viabili-dade para as propostas de soluo elaboradas, formulando estra-tgias para se alcanarem os objetivos traados.

    Momento ttico-operacional: o momento de execuo do plano. Aqui devem ser definidos e implementados o modelo de gesto e os instrumentos para acompanhamento e avaliao do plano.

    Esses momentos, apesar de suas especificidades, encontram-se intima-mente articulados na prtica do planejamento, constituindo uma relao de complementaridade, dando-lhe carter processual e dinmico. Ou seja, a todo o momento estamos revisando nossa situao, a evoluo dos nossos problemas e suas explicaes e, a partir dessa evoluo, revisando nossas intervenes e nossas aes para viabilizar essas intervenes, assim como a sua implementao e a avaliao dos seus resultados prticos.

    Nesta seo buscamos aproxim-lo da reflexo sobre planejamento, explorando alguns conceitos bsicos pertinentes a este processo e apre-sentando, em linhas gerais, o mtodo do PES. Na prxima seo iremos discutir a importncia do diagnstico situacional em sade, buscando orient-lo para a elaborao do diagnstico de sua rea de abrangncia.

  • 32

  • Seo 2Diagnstico situacional em sade

  • 34

    Nesta seo, nosso objetivo principal discutir a importncia do diag-nstico da situao de sade na rea de abrangncia das equipes de sade da famlia, tanto para a definio das aes a serem implementadas a fim de enfrentar os problemas identificados, quanto para avaliar a eficincia e a eficcia dessas aes. Discutiremos, tambm, a importncia da infor-mao para a realizao do diagnstico e apresentaremos o mtodo da Estimativa Rpida para elaborao do diagnstico situacional. importante ressaltar que esta seo tem carter bastante prtico porque voc ter como produto final a consolidao do diagnstico situacional de sua rea de abrangncia, que voc vem construindo desde o Mdulo 1. Para isso, fundamental que voc leia os textos e realize com muito empenho o diagnstico de sua rea, pois este ser utilizado na seo seguinte.

    Antes de iniciarmos a nossa discusso sobre diagnstico, impor-tante que seja entendida a importncia da informao, pois esta constitui uma matria-prima fundamental para a elaborao de qualquer diagnstico, seja ele individual ou coletivo. Como ponto de partida para esta discusso, propomos a realizao da seguinte atividade:

    Atividade 4

    Leia o texto PORQUEM OS SINOS DDOOBBRRAAMM?, apresentado a

    seguir e logo aps faa as atividades solicitadas.

    1- Elabore uma interpretao sobre a situao apresentada no texto.

    2- Liste quais informaes foram utilizadas para elaborar essa

    interpretao.

    3- Liste quais dados foram utilizados para elaborar essa interpretao.

    4- Elabore uma definio para informao.

    5- Elabore uma definio para dado.

    Guarde em seu portflio. Consulte, no cronograma, os outros encaminha-

    mentos solicitados para esta atividade.

    Rotinas

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    PORQUEM OS SINOS DDOOBBRRAAMM?

    Os sinos chamavam para a primeira missa do dia e ele ali, de cueca

    na mo. Literalmente. A moa tomava banho e o gosto de cigarros na

    boca anunciava que a farra tinha ido alm, muito alm de suas posses.

    A aliana na mo esquerda, aquele carpete manchado e aquele

    champanhe pela metade na cabeceira da cama mal arrumada comea-

    ram a embrulhar seu estmago.

    Lembrou-se de Vincius de Moraes, da mulher, do filho que ainda no

    veio... A gravata apertou-lhe um n na garganta e o palet deixava ver

    pequenas manchas de batom.

    As meias haviam sumido, procurou-as por entre os travesseiros e

    almofadas que no reconhecia. Passando pela sala clara, viu a cortina

    aberta. Olhou a rua deserta e ouviu mais uma vez os sinos tocando.

    Pensou em sua carreira, nos amigos, na famlia, pensou em tudo.

    Como sair dali com aquele barulho do chuveiro aberto e a voz suave

    cantarolando no banheiro?

    O peito comeou a doer, os sinos a tocar e seu corao disparou.

    Pegou os documentos, ajeitou a roupa, acendeu mais um cigarro e, j

    na porta da sala, ouviu uma voz feminina: Moo, j lavei o banheiro, o

    senhor j pode entrar!

    E os sinos dobraram de vez.

    (Conto extrado do livro Viu, Querida? PRAXEDES, Malluh. Grifo,1995.)

    Como voc deve ter percebido a partir da atividade anterior, nem sempre conseguimos uma explicao clara ou um diagnstico preciso das situaes que enfrentamos no nosso dia-a-dia.

    Em parte, isto se deve falta de informao ou de dados que nos auxi-liem a fechar nosso diagnstico. Para constatar a importncia da informao no diagnstico, s observar as dificuldades de um profissional de sade que trabalha em um servio de urgncia quando ele presta assistncia a um paciente inconsciente e desacompanhado. Nestes casos, as nicas informaes que temos so aquelas que conseguimos com o exame fsico e com os exames complementares, j que a histria do paciente impossvel de ser obtida.

    A realizao de um diagnstico situacional em sade de uma comunidade implica termos acesso ou produzirmos informao de qualidade e, para isso, precisamos saber trabalhar e entender de sistemas de informao, base de dados, construo de indicadores, etc. Como as equipes de sade da famlia lidam com essas questes no seu cotidiano? Para responder a essa pergunta, procure sistematizar no seu mapa contextual a atividade a seguir.

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    Atividade 5

    Atividade 6

    Reflita sobre o uso da informao em seu contexto de trabalho e responda

    s questes abaixo:

    1- Qual o papel da informao no processo de planejamento?

    2- Como a sua equipe tem utilizado a informao?

    3- Quais informaes e base de dados a equipe mais utiliza e com que

    frequncia?

    4- Qual o grau de confiabilidade dessas informaes? Por qu?

    Guarde no seu portflio. Consulte, no cronograma, os outros encami-

    nhamentos solicitados para esta atividade.

    Com base nas informaes do texto, prepare um roteiro para elaborao

    do diagnstico situacional de seu territrio, definindo os indicadores e as

    possveis fontes de informao e suas limitaes.

    Guarde no seu portflio. Consulte, no cronograma, os outros encaminhamentos

    solicitados para esta atividade

    Mapa contextual

    Mapa contextual

    Considerando a importncia desta temtica e a necessidade de apro-fundarmos na mesma, antes de seguirmos adiante, voc dever ler o texto complementar Sistema de Informao em Sade: conceitos fundamentais e organizao que se encontra disponvel na biblioteca virtual.

    Antes de partirmos para a elaborao do diagnstico situacional da rea de abrangncia de sua equipe, vamos apresentar um mtodo utilizado para a realizao de um diagnstico situacional. importante salientar que esse mtodo deve ser utilizado na perspectiva de um planejamento parti-cipativo e, portanto, imprescindvel que toda a equipe de sade esteja envolvida e, sempre que possvel, envolver pessoas da comunidade.

  • 37

    O mtodo da Estimativa Rpida

    A palavra diagnstico quer dizer atravs do conhecimento. Portanto, o desafio levantar dados, transform-los em informao para produzir conhecimento que subsidie o planejamento. O planejamento um mediador entre o conhecimento e a ao.

    Mas, o que exatamente precisamos conhecer do territrio onde atuamos? Certamente precisamos conhecer os problemas de sade mais importantes, suas causas e suas consequncias. Um dos desafios do processo de plane-jamento em sade diz respeito capacidade do grupo que est planejando de identificar, descrever e explicar os principais problemas de sade num determi-nado territrio, buscando definir prioridades quanto s solues para reduzir esses problemas e elaborando um plano de ao baseado nessas prioridades.

    Como na maioria das situaes no se dispe de muito tempo e/ou dinheiro para coletar informaes necessrias para a elaborao de um plano de ao, um mtodo que oferea resultados rpidos, que seja capaz de avaliar os aspectos qualitativos e quantitativos dos problemas de sade com custo mnimo, certamente valioso.

    Um modo de se obterem essas informaes fazendo uma Estima-tiva Rpida, com uma equipe composta de tcnicos da sade e/ou de outros setores e representantes da populao, examinando os registros existentes, entrevistando informantes importantes e fazendo observa-es sobre as condies da vida da comunidade que se quer conhecer. Portanto, a Estimativa Rpida um mtodo utilizado para elaborao de um diagnstico de sade de determinado territrio.

    Como vamos explicar mais adiante neste texto, o mtodo de Estimativa Rpida no novo, nem a nica tcnica possvel para se obterem as infor-maes necessrias ao processo de planejamento. Suas principais vantagens relacionam-se ao fato de ser uma abordagem bastante rpida e eficiente nos custos, como tambm por contribuir para a participao da comunidade e facilitar o trabalho intersetorial.

    1Parte

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    A Estimativa Rpida constitui um modo de se obterem informaes sobre um conjunto de problemas e dos recursos potenciais para o seu enfrentamento, num curto perodo de tempo e sem altos gastos, consti-tuindo importante ferramenta para apoiar um processo de planejamento participativo. Seu objetivo envolver a populao na identificao das suas necessidades e problemas e tambm os atores sociais autoridades municipais, organizaes governamentais e no-governamentais, etc. que controlam recursos para o enfrentamento dos problemas.

    Para nossos propsitos, a Estimativa Rpida torna-se o primeiro passo de um processo de planejamento que busca definir as intervenes necessrias para o enfrentamento dos problemas de sade de uma populao especfica.

    O termo rpida refere-se ao tempo gasto para a coleta e anlise dos dados. Esse tempo deve ser o mnimo necessrio para a coleta de dados no campo e anlise destes.

    Muitos consideram a Estimativa Rpida semelhante fotografia de uma paisagem que nos mostra uma colina, um rio e um vale, mas no consegue mostrar a altura da colina, a profundidade do rio e a extenso do vale.

    Pode-se dizer que a Estimativa Rpida:

    Identifica, principalmente, quais so os problemas de uma comu-nidade, no definindo, na maioria das vezes, quantas pessoas so afetadas por esses problemas.

    No um mtodo que possibilita uma viso mais profunda dos problemas de uma rea geogrfica especfica ou sobre determi-nado problema de sade.

    A estimativa um mtodo de coleta e de anlise de informaes que subsidiam a elaborao de um plano de ao.

    Foto: www.flickr.com

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    importante compreender as limitaes do mtodo. A Estimativa Rpida no :

    Uma pesquisa que quantifica o tamanho dos problemas. Depois que os problemas foram identificados e priorizados, outro estudo para a quantificao do problema pode ser necessrio.

    Uma coleo de entrevistas baseadas na opinio de pessoas da populao. Na Estimativa Rpida, os informantes so escolhidos porque ocupam uma posio na comunidade que os habilita a representar pontos de vista de um grupo ou de grupos populacio-nais. A coleta adicional de opinies da populao (uma amostra) aumentaria significativamente o tempo do processo.

    Uma base de comparao dos problemas em diferentes reas, na mesma municipalidade ou em relao a outros municpios. A Estimativa Rpida especfica para a situao para a qual se est planejando. Colocando-se como o primeiro passo num processo de planejamento, no pode ser encarada como uma coleo de dados fora desse contexto. Pode, contudo, acentuar os problemas comuns e ser uma diretriz para aes em outras comunidades ou em outros grupos de outras cidades.

    1.1 | Princpios que apoiam a Estimativa Rpida

    A Estimativa Rpida apoia-se em trs princpios:

    1. Coletar somente os dados pertinentes e necessrios, porque este o nico modo pelo qual se pode fazer uma avaliao rpida. Os da-dos no devem ser coletados pelo fato de estarem facilmente dispo-nveis ou porque poderiam eventualmente ser utilizados. A estimativa se invalida se os dados no so coletados rapidamente, passando a requerer muito mais tempo para serem analisados.

    2. Obter informaes que possam refletir as condies e as

    especificidades locais, adaptando as investigaes para esse fim. Assim, numa entrevista, as perguntas devero considerar a realidade e os valores locais. Por exemplo, ao se avaliar a renda familiar em reas de baixa renda onde o desemprego alto, per-guntar sobre as faixas salariais informa muito pouco sobre uma populao cuja maioria no recebe salrios.

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    3. Envolver a populao na realizao da Estimativa Rpida. Nas experincias daqueles que trabalharam em reas urbanas de baixa renda, este princpio tem mais um desdobramento, o da necessidade de envolver a populao na definio dos seus problemas e na busca das solues pertinentes e no apenas fornecer informaes para que os planificadores as usem visando obter a aceitao para uma interveno sanitria pr-determinada. Nos casos em que as interven-es funcionaram, embora numa escala pequena, isto ocorreu porque pessoas da comunidade e os profissionais de sade planejaram em conjunto as atividades necessrias para melhorar as condies de sade de determinada populao.

    Princpios da Estimativa Rpida

    1- No coletar dados excessivos ou desnecessrios.2- Adaptar as investigaes para que elas reflitam as condies e especifici-dades locais.3- Envolver as pessoas da populao tanto na definio de seus problemas quanto na identificao das possveis solues.

    1.2 | Fontes de coleta de dados

    Os dados levantados pelo mtodo da Estimativa Rpida so coletados em trs fontes principais:

    Nos registros escritos existentes ou fontes secundrias;em entrevistas com informantes-chave, utilizando roteiros ou

    questionrios curtos;na observao ativa da rea.

    Com os dados coletados por estes meios, possvel descrever o perfil da populao, embora um tanto superficialmente, e identificar seus problemas e suas prioridades.

    Para ser eficaz, a Estimativa Rpida depende da equipe desenvolver algumas atitudes e habilidades. A primeira a determinao para encon-trar, acompanhar e, em seguida, examinar criticamente os registros escritos existentes. A segunda a disposio de aprender com a popu-lao local e utilizar os recursos locais. A terceira ser capaz de escutar atentamente durante as entrevistas e tambm as conversas informais. A

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    quarta manter-se atento e observar o ambiente procura de pistas sobre as causas dos problemas e potenciais recursos para a sua soluo. A estas quatro poderamos acrescentar uma quinta, que usar o bom senso na anlise das informaes. Se as concluses no refletem o conhecimento profissional e/ou sua experincia tcnica, ento se torna necessrio reexa-minar a interpretao dos dados.

    1.3 | Atitudes e habilidades necessrias para o de-senvolvimento da Estimativa Rpida

    Para o desenvolvimento adequado de um diagnstico utilizando o mtodo da Estimativa Rpida, importante que a equipe atente para alguns aspectos que devem ser considerados e, se necessrio, ser objetos de discusso entre a equipe.

    Determinao para descobrir e examinar registros escritos.Disposio para aprender com a gente local e usar os recursos locais.Ouvir atentamente durante as entrevistas e as conversas informais.Ateno e sensibilidade a tudo que possa ser observado diretamente.Uso do bom senso na anlise das informaes.

    No desenvolvimento do mtodo, podemos identificar os seguintes passos:

    1.4 | Elaborao de perfis de planejamento

    Perfil de planejamento uma descrio da situao da sade das pessoas que vivem numa rea geograficamente definida e que pode servir como referncia para identificar as intervenes necessrias para melhorar essa situao, principalmente para as populaes de baixa renda.

    Para isso, considera:

    As necessidades, estruturas, capacidades e envolvimento da populao;

    o ambiente fsico e socioeconmico;a disponibilidade de servios de sade, ambientais e sociais;a poltica de sade do governo.

  • 42

    A elaborao dos perfis de planejamento apresenta as seguintes caractersticas:

    Baseia-se nas necessidades identificadas pela populao; elaborado com base nas informaes obtidas em dilogos estabele-

    cidos entre os tcnicos e membros da populao; preparado com o reconhecimento de que as populaes, principal-

    mente as urbanas, muitas vezes sofrem mudanas relativamente rpidas e, portanto, o perfil reflete a situao de determinado momento. Em outras palavras, os perfis mudam.

    Considerando os aspectos anteriormente mencionados, cabe dizer que esse mtodo no uma lista de verificao das informaes de que se necessita para a elaborao de um diagnstico. Trata-se, sobretudo, de uma abordagem sobre o processo de obteno de dados, que permite a produo de informaes de forma participativa, embora incompletas, teis para a identificao dos problemas e seus determinantes, para a defi-nio das prioridades e das intervenes necessrias para a sua soluo.

    As experincias, particularmente em reas urbanas, sugerem que para se desenvolver um plano de ao consistente, o perfil de planejamento deve contemplar os seguintes blocos de informao que esto sinteti-zados no esquema seguinte:

    Figura 1 - Blocos de informaes para um perfil de planejamento.

    A base da pirmide constituda pelas informaes sobre as estru-turas, interesses e capacidade de agir da populao. Como o processo de planejamento baseia-se no envolvimento e na contribuio concreta da populao para elaborao de um plano de ao, essas informaes so necessrias para que se possa conhecer o quanto as lideranas, as orga-nizaes e as estruturas comunitrias so fortes ou fracas, procurando analisar o potencial de atuao delas.

    Servios de sadeServios ambientais

    Ambiente fsico Ambiente socioeconmico

    Poltica de sade

    Perfil de doenas

    Servios sociais

    Organizao e estruturada populao

    Composio dapopulao

    Capacidade de aoda populao

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    O segundo nvel procura descrever os fatores socioeconmicos, sanitrios e ambientais que influenciam a sade da populao. Aqui, as informaes so necessrias para que se possa investigar os potenciais e as barreiras existentes para os melhoramentos comunitrios.

    As informaes sobre o ambiente fsico procuram descrever as princi-pais ameaas sade, buscando identificar fatores ambientais, tais como: poluio, superpopulao, reas de desmoronamento, etc.

    As informaes sobre os aspectos sociais focalizam-se nas crenas e valores que podem facilitar ou impedir mudanas de comportamento. Uma anlise dos aspectos econmicos busca conhecer a renda, a escolaridade, o perfil de ocupao e as oportunidades econmicas dos vrios grupos populacionais.

    O terceiro nvel refere-se obteno de informaes sobre a exis-tncia, a cobertura, o acesso e a aceitabilidade dos servios, incluindo: servios de sade; servios ambientais (como abastecimento de gua, coleta de lixo, etc.) e servios sociais (como creches, escolas e outros).

    O quarto nvel refere-se s polticas sociais formuladas pelos nveis nacional, estadual e municipal. Informaes sobre essas polticas, em particular sobre as polticas de sade, podem permitir avaliar se os gover-nantes esto comprometidos com a ateno sade. Com apoio gover-namental forte, os melhoramentos nas condies de sade da populao podem contar com o respaldo necessrio para avanar com mais rapidez e sem muitas resistncias polticas.

    Podemos dizer que esses quatro nveis de anlise de uma realidade contemplam, por um lado, o levantamento dos problemas e necessidades da comunidade e, por outro, os recursos existentes e as intervenes em curso voltadas para satisfazer essas necessidades.

    Fotos: www.flickr.com

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    1.5 | Preparao da Estimativa Rpida

    A melhor maneira de se fazer uma Estimativa Rpida para a identifi-cao de problemas de sade de grupos populacionais com uma equipe multiprofissional e intersetorial e com participao da comunidade.

    1.5.1 Diretrizes para a coleta e anlise dos dados

    A Estimativa Rpida parte do processo de planejamento e, portanto, a definio das informaes necessrias para subsidiar a elaborao de um plano de ao e o modo de obt-las so parte crucial desse processo. A deciso sobre quais informaes devem ser obtidas e como elas devem ser coletadas cabe equipe local que est planejando.

    Perguntas a serem feitas (ou definio das informaes necessrias)

    Para definir quais informaes so necessrias, preciso fazer uma srie de perguntas listando as variveis capazes de refletir as condies de vida de um determinado territrio. Essas perguntas, que buscam refletir a situao local, devem ser formuladas durante uma oficina de preparao do trabalho de campo e devem referir-se apenas quelas informaes consideradas perti-nentes. Para tal, devem-se considerar as seguintes diretrizes:

    Primeiramente, deve ser elaborada uma lista com as informaes necessrias (perguntas sobre o territrio), baseada nos debates durante a oficina, feitos pela equipe que est planejando; se a res-posta a uma pergunta no contribui para o perfil de planejamento, ento a pergunta no deve ser feita;

    a seguir, deve-se decidir sobre as fontes (entrevista, observao e/ou registros existentes) que sero utilizadas para obteno des-sas informaes.

    Pode-se coletar informaes sobre os seguintes temas:

    Informaes sobre a populao

    Composio da populao (por sexo, por faixa etria);organizao e estruturas (grupos e suas relaes);capacidade de ao da populao (mobilizao, atuao conjunta,

    etc.).

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    Informaes sobre o ambiente (fsico e socioeconmico) e o

    perfil de doenas

    Ambiente fsico: habitao, saneamento, ocupao do solo, pavi-mentao etc.;

    ambiente socioeconmico: nvel de escolaridade, renda, insero no mercado de trabalho etc.;

    perfil de doenas: principais causas da morbimortalidade.

    Informaes sobre os servios

    Servios de sade e ambientais: acessibilidade, cobertura, qualidade;

    servios sociais: creches, centros sociais, escolas, reas de re-creao, etc.

    Informaes sobre a poltica de sade

    Vontade poltica;evoluo da poltica do governo local em relao sade e proble-

    mas a ela relacionados;oramentos.

    Aps a definio das informaes necessrias, deve-se construir um quadro contendo a informao e as possveis fontes.

    Quadro 1 Informaes e fontes necessrias construo de um plano de ao.

    Informao Fontes

    Entrevista Observao Registros

    Condies de moradia Sim Sim Prefeitura/IPTU

    Renda familiar Sim - IBGE

    Abastecimento e armazenamento de gua Sim Sim Companhia de gua, IBGE

    Mortalidade Sim - Secretaria de Sade, SIM

    Com base neste quadro, possvel identificar:

    Documentos a serem examinados;os temas que devem ser abordados nas entrevistas;o que deve constar no roteiro para observao da rea.

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    1.5.2 Desenvolvimento do cronograma de trabalho

    Uma vez definidas as informaes e dados a serem coletados, deve-se decidir sobre quantos e quais informantes-chave (trabalhadores da equipe de sade, lderes comunitrios, lderes religiosos, organizaes comuni-trias, trabalhadores das escolas, moradores antigos, comerciantes, lide-ranas informais, etc.) sero entrevistados. Alm disso, devemos estimar quantas horas de trabalho dos participantes do processo sero necess-rias para as entrevistas.

    1.5.3 Desenvolvimento de roteiros para entrevistas semiestruturadas

    Embora os registros existentes possam fornecer dados quantitativos sobre as condies de vida de uma populao, os dados qualitativos so essenciais para fins de planejamento. Os primeiros, muitas vezes, mascaram as diferenas existentes na comunidade e por certo no acen-tuam em profundidade os problemas de grupos especficos.

    As entrevistas semiestruturadas com informantes-chave podem ser a base para se preparar um plano fundamentado nos problemas percebidos pela populao, procurando garantir o envolvimento desta na proposio das solues.

    Uma entrevista semiestruturada um dilogo orientado e conduzido de maneira suficientemente informal para que o informante possa intro-duzir assuntos ou aspectos que o entrevistador no esperava. Este tipo de entrevista extremamente apropriado para uma Estimativa Rpida porque os assuntos sobre os quais se procura obter dados so geralmente complexos, exigindo respostas mais qualitativas do que quantitativas.

    1.5.4 Sugestes para identificao dos informantes-chave

    Consideram-se informantes-chave aquelas pessoas que supostamente tm informaes relevantes sobre as condies de vida da populao ou de parte desta. Deve-se considerar as especificidades locais para definir os informantes mais importantes. A seguir, apresenta-se uma lista com sugestes para a identificao desse tipo de informante.

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    Sugestes de informantes-chave

    Trabalhadores dos equipamentos pblicos locais (servios de sade, escolas, creches, etc.);

    lderes comunitrios: diretores de organizaes comunitrias, lderes religiosos, lideranas de grupos femininos ou de jovens, etc.;

    comerciantes, donos de estabelecimentos de diverso, donos de farmcias;

    organizaes no-governamentais que atuam na regio;curandeiros, benzedeiras, parteiras, etc.

    Lembre-se: esta lista deve considerar a especificidade de cada contexto.

    Deve-se ter em mente as questes culturais ao se formular as perguntas.Deve-se tambm encontrar maneiras aceitveis para abordar assuntos que em geral no so discutidos de maneira franca.

    1.5.5 Recomendaes para formulao de perguntas

    As perguntas para as entrevistas com os informante-chave devem ser previamente preparadas. Em sua maioria, devem ser abertas, isto , devem ser perguntas que estimulem o entrevistado a respon-der de modo livre;

    cada pergunta deve referir-se a uma nica ideia, ser formulada com palavras simples e claras e ser to curta quanto possvel;

    se a pergunta for mal compreendida inicialmente, deve-se repeti-la de forma mais clara;

    deve-se evitar perguntas que influenciem a resposta (por exem-plo: voc no acha que as enfermeiras deveriam visitar as casas dos moradores com mais frequncia?);

    Perguntas que usam negativas (por exemplo: no verdade que...) tambm devem ser evitadas, por estimularem respostas positivas.

  • 48

    1.5.6 Organizao do roteiro para entrevista

    Na introduo do questionrio deve haver uma explicao sobre a razo da entrevista e sobre quem a est solicitando. Tambm se deve observar os seguintes aspectos:

    Ter um compromisso, que deve ser rigorosamente cumprido, de que os questionrios preenchidos sero tratados confiden-cialmente e que as declaraes mencionadas no relatrio final permanecero no anonimato. Essa informao no precisa ser includa no questionrio propriamente dito, podendo ser forne-cida numa folha separada.

    O roteiro deve conter dados para identificao do informante-chave. Este pode incluir: nome, sexo, idade, funo ou posio que ocupa na comunidade, etc. Tambm deve incluir a data, hora e a durao da entrevista, alm do nome do(s) entrevistador(es). Essas informaes podem ser teis no momento de anlise das entrevistas.

    O roteiro deve comear com as perguntas menos controvertidas para deixar o informante vontade e criar um clima de confiana.

    Uma vez iniciada uma linha de perguntas, deve-se elaborar o roteiro de forma que a entrevista flua.

    No necessrio preparar roteiros especficos para cada tipo de informante-chave. As vantagens de se utilizar um nico roteiro para todas as entrevistas so: poupar tempo na preparao do roteiro e, mais importante, obter respostas sobre um mesmo assunto, de pessoas diferentes.

    Foto: www.flickr.com

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    Na prtica, as observaes e as entrevistas so feitas ao mesmo tempo, aproveitando-se a ida a campo para as entrevistas para tambm se fazer a observao.

    No se esquecer de deixar espao suficiente para anotar as respostas.

    Uma vez preparado o roteiro, a equipe deve test-lo, preferencial-mente com pessoas com perfil semelhante quelas que sero entrevistadas. preciso fazer um pr-teste e rever o roteiro, no que for necessrio, pelas seguintes razes:

    a. Muitas vezes acontece que as perguntas esto claras para quem as formulou, mas so vagas e/ou incompreensveis para os entrevistados. Se o roteiro no for previamente testado, a coleta dos dados pode revelar-se um esforo intil;

    b. s vezes as perguntas so interpretadas de forma diferente do esperado e/ou so de difcil compreenso para o entrevistado. As perguntas que apresentarem esse tipo de problema devem ser revistas e o roteiro deve ser novamente testado;

    c. o pr-teste permite equipe avaliar quanto tempo cada infor-mante demorar para responder ao questionrio, contribuindo para a elaborao do cronograma de trabalho. Os membros do grupo tambm tero oportunidade de testar suas habilidades na conduo da entrevista.

    1.5.7 Habilidades necessrias para a realizao de entrevistas semiestruturadas

    Para que a entrevista semiestruturada seja produtiva, o entrevistador precisa ter algumas habilidades. A mais importante a capacidade de deixar o informante vontade e angariar sua confiana. Em essncia, consegue-se isto se o entrevistador estiver verdadeiramente interessado na tarefa e em aprender com o informante.

    Igualmente importante a prtica de boas maneiras na saudao, apresentando-se e dizendo ao informante qual a finalidade da entrevista. Esta pode ser um primeiro contato de uma relao que ser constante e, portanto, deve ser completada num clima amistoso e corts.

    A formulao das perguntas ou a maneira como elas so feitas no deve subtender qualquer crtica ao informante. As perguntas como por que devem ser usadas com parcimnia. Se usadas com muita frequ-

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    ncia, elas tendem a colocar o informante na defensiva, detendo o fluxo de informaes.

    O entrevistador deve dedicar-se audio ativa, ou seja, deve verificar com o informante se ele compreendeu corretamente os pontos impor-tantes apresentados; deve pedir a ele que esclarea ou d mais detalhes sobre questes importantes, buscando obter o mximo de especificidade, evitando dvidas no momento de anlise dos dados.

    Essas habilidades para entrevistar requerem prtica e, para aqueles cujo trabalho habitual no as exige, preciso esforo consciente para adquiri-las.

    Durante a entrevista, os pontos-chave devem ser anotados no local especfico do roteiro. No se deve tentar anotar tudo o que dito. As notas devem ser ampliadas o mais breve possvel aps a entrevista, quando o contedo da mesma ainda estiver fresco na memria do entrevistador. Se for preciso obter declaraes verbais, estas devem ser escritas na ntegra, durante a entrevista.

    1.5.8 Observao ativa

    Em uma observao ativa, podemos observar:O ambiente fsico do seu territrio. Problemas de saneamento, coleta de

    lixo, vias pblicas, condies de moradia e outros podem ser observados e servir para validar determinadas questes no momento da anlise dos dados.

    Os servios oferecidos: sade, habitao, educao, buscando-se perceber como tais servios so administrados. Mantm-se registros? A equipe est disponvel e entusiasmada? H boa s