Plantas Medicinais -MB

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    Plantas Medicinais

    3 e d i o

    Mara Zlia de Almeida

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    Plantas MedicinaisMara Zlia de Almeida

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    UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

    Reitor

    Dora Leal Rosa

    Vice Reitor

    Luiz Rogrio Bastos Leal

    EDITORA DA UFBA

    Diretora

    Flvia M. Garcia Rosa

    CONSELHO EDITORIAL

    Titulares

    ngelo Szaniecki Perret SerpaCaiuby Alves da CostaCharbel Nio El-HaniDante Eustachio Lucchesi RamacciottiJos Texeira Cavalcante FilhoAlberto Brum Novaes

    Suplentes

    Evelina de Carvalho de S Hoisel

    Cleise Furtado MendesMaria Vidal de Negreiros Camargo

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    Plantas MedicinaisMara Zlia de Almeida

    3 Edio

    EDUFBASalvador-BA

    2011

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    Copyright 2000 by Mara Zlia de Almeida

    2003 - 2 ed.

    2011 - 3 ed.Direitos para esta edio cedidos Edufba.

    Feito o depsito legal.

    Projeto grfico- Amanda Santana da Silva

    Capa- Matheus Menezes

    Reviso tcnica- Jos Fernando Oliveira Costa

    Reviso Bibliogrfica- Raoni Avan de Almeida Barbosa e Tarso Fontes

    Normalizao- Humberto Fonseca de Freitas

    Reviso- Susane Barros

    Sistema de Bibliotecas - UFBA

    Almeida, Mara Zlia de. Plantas medicinais / Mara Zlia de Almeida. - 3. ed. - Salvador : EDUFBA, 2011. 221 p.

    ISBN 978-85-232-07865-7

    1. Plantas medicinais. 2. Plantas medicinais - Aspectos religiosos. 3. Ervas - Usoteraputico. 4. Botnica - Classificao. I. Ttulo.

    CDD - 615.532

    Editora filiada :

    EDITORA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

    Rua Baro de Geremoabo s/n Campus de Ondina

    CEP: 40170-290 Salvador-BA

    Tel/fax: (71)3263-6164www.edufba.ufba.br

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    s minhas bisavs Anita, Cena e Amlia, s avs Rosa e Zlia, minha

    adorada me Cida; todas portadoras de herana cultural etnomdica e

    ancestral, mulheres mestias, grandes curandeiras urbanas, matriarcas que

    me ensinaram a importncia da mulher na arte de curar os males do corpo e

    da alma. Ao meu filho Raoni, que conviveu durante toda a sua infncia com

    livros e papis, aprendendo a ser tolerante com uma me sempre ocupada.

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    Agradecimentos

    Devo comear agradecendo a meus deuses, a todos aqueles que

    povoaram minha vida, que contriburam para o crescimento do meu co-

    nhecimento cientfico, para a minha felicidade pessoal, para os momen-

    tos difceis de reflexo e decises. Uma histria de vida, muito trabalho,

    inmeras dificuldades e indescritveis prazeres.

    Retomo minha histria recente e devo agradecer minha in-

    substituvel mestra, Dr. Maria Auxiliadora Coelho Kaplan, que muito

    mais que orientadora foi amiga, me, parceira, sem deixar vacilar a batu-

    ta de mestre, transmitindo conhecimentos de forma maestral acompa-

    nhando minha trajetria cientfica at hoje (2011).

    Ao amigo-irmo-filho Paulo Leda, pelas boas sugestes, parce-ria, vivncia e atualizao constante nesse universo dinmico das plan-

    tas medicinais.

    As amigas Suzana e Gilda Leito, pela amizade. Em especial a

    Gilda pelos convites de orientaes na UFRJ.

    Ao amigo Joo Carlos Silva do Jardim Botnico do Rio de Janeiro

    pelas boas horas de harmonia e alegria.

    amiga Yara Britto do Jardim Botnico do Rio de Janeiro pelo

    incentivo concluso dessa terceira edio e muitos outros incentivos.

    professora Nina Cludia pela boa parceria.

    Aos amigos Ademariza Fontes, Natrcio Pinto e Ben Barboza,

    que me colocaram na boca o sabor de morar na Bahia.

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    comadre-irm farmacutica Celeste Oliveira, por ser amiga de

    todas as horas.

    Famlia Diamantino, que me acolheu nos momentos de dificul-dade e compartilhou os prazerosos.

    Ao professor Eudes Velozo, companheiro de algumas conquis-

    tas cientficas. Parceiro do Farmcia da Terra e de muitas outras lutas

    ideolgicas.

    Aos amigos, colegas, alunos e bolsistas do programa Farmcia

    da Terra/UFBA.

    diretora da Faculdade de Farmcia/UFBA, Prof. Mara Spnola.

    Ao Prof. Ajax Atta e ao Prof. Marcelo Castilho pela oportunidade

    de ao no Mestrado em Farmcia da UFBA.

    curadora do Herbrio A. L. C./UFBA, Prof Lenise Guedes.

    Ao Prof. Dr. Jos Fernando Costa pela amizade e sugestes para

    a terceira edio.

    amiga, farmacutica e companheira de trabalho, Mayara

    Queiroz pela competncia e perseverana. Aos farmacuticos e parcei-

    ros Antdio Reis Filho e Ingrid Guttierrez.

    Jussara Cony pelo belo prefcio dessa terceira edio.

    Aos queridos bolsistas do Farmcia da Terra, Andr, Flora e

    Halide, sempre atentos s nossas necessidades cotidianas.

    Ao meu pai (in memorian) por ter me ensinado a ser uma mulher

    forte e ao meu companheiro Franklin.

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    Ao amigo e orientando farmacutico Daniel Cardoso, pelo com-

    panheirismo e atualizao do texto de Colnia,Alpinia zerumbet, vegetal

    objeto de seu mestrado.

    Ao farmacutico Marcos Vincius Sales Teixeira que cedeu infor-

    maes tcnicas sobre o ch Verde, tema de sua monografia de fim de

    curso.

    Ao acadmico de farmcia, e sobrinho, Tarso Fontes, pela reviso

    bibliogrfica.

    Ao acadmico de farmcia Raoni Avan, pela reviso bibliogrfi-

    ca e apoio em inmeras outras questes emergenciais que surgiram ao

    trmino dessa edio.

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    Sumrio

    Prefcio 13

    Apresentao 27

    Plantas Medicinais:

    abordagem histrico contempornea 33

    A cura do corpo e da alma 67

    Almanaque 145

    ndice das espcies vegetais citadas na obra 209

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    Prefcio

    O segredo no correr atrs das borboletas. cuidar do jardim para que elas venham at voc.

    Mrio Quintana

    Quando Mara Zlia me solicitou que fosse autora desse Prefcio,me presenteou com a honra e o desafio. E, mais, abriu as asas para que

    pudessem voar em reflexes, no tempo e no espao, sobre o significado

    da resistncia dominao e de seus atores, individuais e coletivos, da

    relao dialtica entre os conhecimentos, da cincia e tecnologia como

    fatores de libertao dos povos, do direito escolha no processo de in-

    verso de uma perversa lgica: a de privilegiar a doena que patrocina

    lucros a poucos em detrimento da sade que patrocina qualidade de

    vida a todos.

    Mara Zlia, profissional, cidad, militante, mulher do seu tempo

    histrico e que carrega em si saberes e fazeres ancestrais, vem contribuir,

    com sua dedicao, com uma obra de valor inestimvel para com nossa

    biodiversidade, patrimnio desse Brasil que toma o rumo do desenvol-

    vimento econmico, ambientalmente sustentvel, numa perspectiva de

    uma nova era para a humanidade.

    Assim, sua participao, na atualidade, na resistncia milenar

    que nos permite a viso de que haver futuro, forjada na simbiose de so-

    nhos e realizaes, antigos como a humanidade, que resgatam valores,

    saberes, vivncias e vem sendo construdos em etapas que, ao longo do

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    processo histrico, permeiam as relaes polticas, econmicas, sociais,

    culturais, ambientais e espirituais dos povos, nos induz a uma sntese

    que se inicia pelo que Mara Zlia e tantos de ns, homens e mulheres

    desse tempo, alm de sedimentarmos convices, vamos elaborando

    propostas, aes, polticas, prticas cotidianas, escrevendo, publicando,

    participando, unificando propsitos... enfim, fazendo histria... porque,

    os que se movem, constroem a histria...

    E segue pela primeira convico de que preciso reverter a l-

    gica, baseada na dependncia, onde o medicamento surge como ins-

    trumento de dominao tcnica, econmica e cultural. E que, para isso,

    um dos caminhos a seguir o de transformarmos em deciso poltica de

    governo o que a sociedade constri, almeja e necessita.

    O que foi concretizado, na atual etapa do Projeto Nacional de

    Desenvolvimento atravs da elaborao da Poltica Nacional de Plantas

    Medicinais e Fitoterpicos que, em resumo, efetua a aliana entre a nossabiodiversidade e a formao de pessoas para o desenvolvimento de tec-

    nologias que viabilizem uma importante opo teraputica , ampliando

    o acesso aos medicamentos, com humanizao, qualidade, segurana

    e eficcia. Num processo que abrange desde a cadeia produtiva at a

    implementao da Fitoterapia no SUS.

    E partimos de convices outras que, com aes concretas deprofissionais como a que chamamos Professora Mara Zlia, pois mestra

    pelo saber, fazer e compromissos com transformaes, temos adquiri-

    do em nossa prtica cotidiana de que nossas Universidades dispem

    de recursos estruturais e humanos para realizar estudos e pesquisas, a

    partir do potencial das regies, na perspectiva de se constiturem em

    celeiros dessa cultura. E de que o valor econmico de nossas plantas

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    de extrema magnitude e a nossa autonomia para gerir nossos recur-

    sos naturais somente ser respeitada quando tomarmos a deciso de

    valorizar e integrar nossos conhecimentos tradicional e acadmico e

    de implementar Redes de Cooperao Tcnica e Cientfica, formando

    e capacitando para o desenvolvimento e produo de Tecnologias de

    Inovao, agregando valor ao saber dos povos.

    Essas convices, que tiveram sua elaborao a partir de reflexes

    com amplos setores da sociedade, onde se destaca essa capacidade bra-

    sileira de resistir dominao e aos entraves libertao, me permite, ao

    elaborar esse Prefcio, afirmar que Mara Zlia, sempre presente com seu

    conhecimento, adquirido em andares universitrios em simbiose com

    andares na vida, nos processos dessa construo coletiva, parte inte-

    grante, com sua obra, na elaborao e ao para que a Poltica Nacional

    de Plantas Medicinais e Fitoterpicos, sob a Coordenao do Ministrio

    da Sade, inserida na Poltica de Assistncia Farmacutica, como parte

    integrante do SUS, tenha sedimentao em princpios como:

    - a contribuio para o nosso desenvolvimento sustentvel e a

    soberania do Brasil;

    - a construo efetiva do Sistema nico de Sade e de suas po-

    lticas setoriais;

    - o uso e preservao de nossos recursos naturais e a manuten-o do patrimnio gentico nacional;

    - a relao dialtica entre os saberes tradicional e acadmico, co-

    locando por terra o falso antagonismo que serve dominao;

    - a garantia de trabalho e gerao de renda.

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    Hoje 26 de dezembro de 2010. Um dia aps o Natal e s vspe-

    ras de um Novo Ano que chega na perspectiva concreta de promissores

    avanos para o Brasil, que nos instigam e desafiam, na complexidade do

    mundo em que vivemos.

    Mara Zlia, com essa obra fruto de momentos de dedicao, de

    estudo, de algumas incertezas e de construdas convices, de relaes

    amorosas e respeitosas com nossa biodiversidade e nossa diversidade

    tnica e cultural maiores e mais belas riquezas de nosso pas, o novo!!!

    O sempre novo que surge da resistncia, da perseverana e doamor. E est, graas ao que nos abenoa, protege e impulsiona, alicera-

    da na Bioqumica da Esperana, que nos faz pacientes e firmes para que

    nossas plantas medicinais continuem sendo sementes na efetivao de

    um caminho que garanta a vitria da civilizao aquela civilizao que

    estar calcada na vitria da Vida.

    Enfim, uma cuidadora de jardins... para que as borboletas noscheguem em eternas e sempre bem-vindas metamorfoses.

    Jussara Cony*

    * Farmacutica, Especialista em Tecnologia de Medicamentos e em Tecnologia

    de Alimentos. Mestre em Cincias Farmacuticas, com formao na Faculdade de Far-

    mcia da UFRGS. Funcionria da mesma Universidade, nas Faculdades de Medicina ede Farmcia. Vereadora em Porto Alegre (1983 a 1988, Deputada Estadual por quatro

    mandatos no RS (1991 a 2006), tendo desempenhado o cargo de Vice-Presidente da

    Comisso de Sade e Meio Ambiente e de Coordenadora do Frum pela Vida - Projeto

    Plantas Vivas (1998 a 2006). Diretora-Superintendente do Grupo Hospitalar Conceio

    do MS, no RS (2007 a 2010), participando, como tal, da Comisso Executiva do MS/SC-

    TIE - Programa Nacional para a Implantao da Poltica Nacional de Plantas Medicinais e

    Fitoterpicos. A partir de 01/01/2011 ocupar o cargo de Secretria de Meio Ambiente

    do Estado do Rio Grande do Sul, no governo eleito, liderado por Tarso Genro.

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    Prefcio

    ( 2 edio)

    A preocupao de Mara Zlia quanto educao em/sobre plan-

    tas medicinais h muito excede as limitadas paredes da academia. So

    filhos desta benfazeja preocupao seus muitos cursos de extenso, sua

    atuao junto a comunidades diversas e a transformao de parte desua Tese de Doutorado neste livro.

    Qualquer estudo srio sobre plantas medicinais tem que ser in-

    terdisciplinar, j que o assunto multifacetado, abrange vrias cincias

    (ocidentais ou no) e envolve questes ticas, sociais e econmicas. Na

    primeira parte deste livro, admirvel a organizao da abordagem his-

    trico-contempornea que trata todos os aspectos principais. A cura

    do corpo e da alma um raro e salutar exemplo de trnsito/dilogo en-

    tre concepes mdicas baseadas em tramas culturais diferentes, belo

    exemplo de Etnofarmacologia. So preciosos os glossrios, as dicas e to-

    dos os detalhes que dizem no apenas do saber abrangente da autora,

    como do aspecto Nan de sua personalidade. Finalmente o almana-

    que, ah! o almanaque. Que bom reviver esses tempos e de maneira toqualificada.

    Como se no bastassem a beleza da ilustrao, a leitura do livro

    agradvel e acessvel, sem ser superficial. Seu verdadeiro valor educativo

    est calcado na qualidade da informao apresentada e na capacidade

    de induzir o leitor a procurar mais informao, mais saber, melhor fazer.

    Esta , em realidade, a essncia do fazer pesquisa. Da o valor cientfico

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    do livro (o que cientfico o que permite ser testado) e sua utilidade

    em reinos diversos.

    Quando tive a sorte de estar no lugar certo na hora certa e, porisso, ganhar o ltimo exemplar do ento disputado Plantas Medicinais,

    cuja primeira edio foi lanado por ocasio do XVI Simpsio de Plantas

    Medicinais do Brasil, Mara Zlia foi logo me avisando o livro era, de fato,

    uma livra. A dedicatria a bisavs, avs e me, a beleza do livro, os cui-

    dados com detalhes e o carter generoso (como o so as mes, como

    Mara Zlia) deste livro, talvez justifiquem a em princpio inusitada

    questo do gnero da obra. Como o livro induz o pensar, questionar e

    pesquisar, trata-se da obra fadada a gerar filhos uma livra prenhe! E

    pensando nelas e nisso tudo, que este texto tem que acabar com Od Ia!

    Prof. Dr. Elaine Elisabetsky

    UFRGS/Sociedade Internacional de Etnofarmacologia

    Setembro 2001

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    Notas da autora

    para a 3 edio

    Em agosto de 2000, quando estvamos nas revises finais da pri-

    meira edio desse livro, ainda tnhamos novas informaes, bibliogra-

    fias para serem acrescentadas e dvidas de como as pessoas receberiam

    a miscelnia que elaboramos com informaes tcnicas, dicas, receitas eo resgate de tradies ritualsticas.

    A reao das pessoas, tanto do mundo acadmico como interes-

    sados em geral pelo tema, foi extremamente gratificante. O livro logo

    ganhou o apelido de livra. A primeira edio esgotou-se em pouco tem-

    po, a segunda tambm. Fomos contemplados no edital FAPESB/2010

    para apoio a publicaes e comeamos a reviso e atualizao para que

    nossa livra produzisse mais rebentos.

    Nesses 10 anos inmeras foram as novidades. Costumamos dizer

    entre o grupo que: no Farmcia da Terra as coisas acontecem em casca-

    ta. Muitos dos meus meninos se foram, colaram grau e esto cursando

    ps-graduao, so professores universitrios, todos bem classificados

    em concursos pblicos para a carreira docente, outros de imediato esta-

    vam empregados (na Bahia e em outros estados do pas). E chegaram os

    novos filhos, acadmicos de graduao e de ps- graduao, bolsistas e

    voluntrios.

    As instituies parceiras tambm se renovaram. Projetos no

    Litoral Norte da Bahia com o Instituto de Hospitalidade, o Instituto

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    Souza Cruz e SEBRAE, num trabalho belssimo junto ao Programa de

    Desenvolvimento Sustentvel da Costa dos Coqueiros. Nesse e em

    outros projetos Conhecemos pessoas mpares, que guardam suas tra-

    dies e as repassam com toda a dignidade. Demonstram a alegria de

    viver a partir dos recursos que a natureza pode oferecer, tais como mat-

    ria prima para o artesanato, o alimento, cosmticos e remdios caseiros

    com plantas medicinais.

    Estamos aprendendo, em cada localidade que desenvolvemos

    nossos projetos, a saborear as delcias de um saboroso feijo temperado

    com quii e orelha de maroto, de peixe com coentro de rigor, galinha

    de quintal com corante de urucum e alfavaquinha de galinha. Sucos de

    biri-biri, siriguela, mangaba,doces de caju, groselha e jaca. Chs de ca-

    pim santo, de caapeba ou alum para auxiliar a digesto. Para cicatrizar

    nossos ferimentos, banhar com ch morno de Nego N ou com folhas

    de Tapa Buraco. Aprendemos a tomar um banho de Agarradinho para

    atrair paixes ou ainda a usar folhas de Magnopirol ou de Samba emP para curar nossas dores no corpo aps um dia de longas caminhadas!

    Entre 2005 e 2010 fomos contemplados fomos contemplados

    com a participao no Instituto do Milnio do Semi-rido-IMSEAR e na

    rede Nordestina de Biotecnologia-RENORBIO, em ambas coordenamos

    o sub- projeto de Etnobiologia com as atenes voltadas para o semi-

    -rido brasileiro, para as espcies das famlias botnicas abundantes

    nesse bioma, com foco no potencial de bioatividade dessas plantas. O

    projeto RENORBIO originou um livro editado pela EDUFBA em 2010, de-

    nominado Plantas Medicinais no Semirido: Conhecimentos Populares

    e Acadmicos.

    Participamos de outros projetos na Chapada Diamantina, em

    reas quilombolas, com recursos da Secretaria de Polticas de Promoo

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    da Igualdade Racial-SEPPIR. No recncavo baiano, em So Francisco do

    Conde estamos em atividade no projeto para melhoria de Sade da

    Populao Negra com recursos do municpio e Fundao de Pesquisa

    do Estado da Bahia-FAPESB. Com fomento do Fundo Nacional de Sade-

    FNS e Secretaria da Gesto Participativa do Ministrio da sade, inicia-

    mos uma proposta de cultivo de plantas medicinais, aromticas e ritu-

    alsticas em terreiro de origem Banto, no Manso Dandalungua, na rea

    metropolitana de Salvador. Realizamos algumas consultorias, a mais re-

    cente no baixo sul da Bahia, em 4 municpios situados em reas de rema-

    nescentes de Mata Atlntica. Esse projeto foi financiado pelo Ministriode Agricultura Pecuria e Abastecimento (MAPA) sob a coordenao da

    Casa Jovem/Fundao Odebrecht.

    Esses foram trabalhos longos, sempre em parceria com o Herbrio

    Alexandre Leal Costa do Instituto de Biologia da UFBA-ALC/UFBA. aes

    esto nos proporcionando a oportunidade de termos um banco de da-

    dos com uma diretriz em etnopesquisa. O grande encantamento dessesprojetos est na oportunidade de trabalhar em equipe multidisciplinar,

    com uma seqncia (abordagem etnodirigida, coleta, identificao, pro-

    duo de extratos com o perfil fitoqumico e ensaios biolgicos). Tudo

    que sempre foi sonhado para um trabalho srio, voltado para a busca

    racional de fitofrmacos.

    A partir de 2006 novos marcos regulatrios brasileiros apoiam

    e fomentam o uso seguro e racional de plantas medicinais e fitoterpi-

    cos: a Poltica Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterpicos (PNPMF),

    Decreto n. 5.813, 22/06/06, o Programa Nacional de Plantas Medicinais

    e Fitoterpicos, portaria interministerial n. 2.960 de 9/12/08 e a Poltica

    Nacional de Prticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no SUS,

    Decreto n. 971, de 03/05/06. A fim de adequar os marcos legais para

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    a implantao da fitoterapia no SUS, em 2008 a ANVISA coloca em vi-

    gor a Instruo NormativaIN/05, com uma lista de 36 plantas para fins

    medicinais. Em 2010 temos a publicao pela ANVISA das RDC n10 de

    10/03/2010, sobre a venda de drogas vegetais rasuradas, sobre os regis-

    tros de fitoterpicos, a RDC n.14 de 05/04/2010. Ainda em 2010, foram

    publicadas a 5 Edio da Farmacopia Brasileira e a Consulta Pblica

    do Formulrio Teraputico Fitoterpico Nacional. A Diretoria de assis-

    tncia Farmacutica do MS publicou a RENISUS/2009 - Relao Nacional

    de Plantas de Interesse ao SUS, com 71 espcies vegetais que devem ter

    seus estudos priorizados para garantir a eficcia e segurana no uso dasmesmas. Em 20 de abril de 2010 foi instituda a Farmcia Viva no mbito

    do Sistema nico de Sade atravs da Portaria 886. As Farmcias Vivas,

    no contexto da Poltica Nacional de Assistncia Farmacutica, dever

    realizar todas as etapas, desde o cultivo, a coleta, o processamento e o

    armazenamento de plantas medicinais e fitoterpicos.

    Diante de tantas inovaes e avanos para o fortalecimento daFitoterapia, aqui na Bahia o Farmcia da Terra e o FITOBAHIA, ncleo da

    Secretaria Estadual de Sade da Bahia/SESAB, se fez presente com des-

    taque nacional, participando de vrios grupos de trabalho e elaborao

    de projetos, o ltimo deles referente a capacitao dos servidores do

    SUS na Ateno Bsica para a implantao dos Servios de Fitoterapia

    nas Unidades de Sade da Famlia, projeto em parceria com o Ncleo deEnsino a Distncia-NEAD da Escola de Enfermagem UFBA, com o apoio

    da DASF/MS e Fiocruz.

    O Programa de Ps Graduao em Farmcia da Faculdade de

    Farmcia da UFBA, tem nos proporcionado a oportunidade de orientar

    pesquisas com plantas medicinais com potencial teraputico, formando

    uma boa equipe e gerando produtos para a ponta, o servio.

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    As nossas aes sempre envolvem muitos estudantes de gradu-

    ao e relao com as disciplinas de Fitoterapia e a Atividade Curricular

    em Comunidade (ACC), denominada Busca Racional de Frmacos de

    Origem Vegetal, com o apoio da Pr-Reitoria de Extenso que atravs

    dessa iniciativa facilitou aos professores e alunos voltados para o social,

    a possibilidade de exercer seu compromisso de cidadania.

    Assim para atualizarmos os contedos dessa terceira edio con-

    tamos com os alunos de graduao e ps, os parceiros internos e externos,

    de muita vivencia em campo. Foi difcil controlar essa grande bola de neve

    que o amplo universo dos conhecimentos sobre plantas medicinais, ain-

    da temos muito para repartir e divulgar mas por enquanto ficamos com

    essa terceira edio revisada e ampliada dentro de limites possveis.

    Agradecemos a Fundao de Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB)

    e a Editora da Universidade Federal da Bahia (EDUFBA), pela oportunidade.

    Fica cristalino que o tema plantas medicinais complexo, riqussi-mo, polmico e contempla inmeras vertentes, temas intrincados que se

    permeiam e mudam o perfil em velocidade assustadora. Cada um deles po-

    deria ser objeto de um livro distinto, sempre como centro Plantas para Fins

    Medicinais. Nesse momento estamos lanando todas essas novas informa-

    es como atualizao para a terceira edio desse livro, mas fica o enorme

    desafio de continuar estudando e socializando o conhecimento. Sempre !

    Prof. Dr. Mara Zlia de Almeida

    Salvador, 23.07.0220:30hLua Cheia

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    Prefcio

    ( 1 edio)

    Grande tem sido o interesse despertado pelo estudo dos produ-

    tos naturais, em particular das plantas medicinais, neste final de sculo.

    Muitas so as publicaes abordando diferentes aspectos sobre o uso

    das plantas medicinais. Algumas enfocam, basicamente, o uso popular,resgatando o conhecimento prprio das prticas tradicionais da medi-

    cina natural. Outras, abordam o conhecimento cientfico justificando a

    eficcia do uso das plantas na presena de substncias ativas, que, por

    vezes, no explicariam totalmente o seu emprego.

    A presente publicao guarda importncia fundamental ao

    tentar reunir os diversos aspectos que envolvem o conhecimento dasplantas como fonte de cura. A autora, utilizando uma linguagem bas-

    tante acessvel, tanto para leigos como para estudantes e profissionais

    da rea, passeia com maestria abordando e relacionando as diferentes

    faces no estudo das plantas medicinais utilizadas no Brasil, em particular

    na Bahia.

    Ao abordar assunto de tamanho interesse popular e cientfico,

    a autora procura, com sucesso, enfocar o carter religioso e supersticio-

    so, fortemente presente na populao brasileira, decorrente da herana

    africana e indgena, percebida com maior intensidade na Regio Sul e

    Sudeste, sem prejuzo das informaes de cunho cientfico coligadas

    por reviso na literatura.

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    Desnecessrio afirmar a riqueza da presente obra. A forma ino-

    vadora encontrada pela autora para conciliar o popular e o cientfico,

    tornando a leitura agradvel e interessante, a destaca em relao a ou-

    tras obras similares.

    O livro aborda de forma clara, dentre outros aspectos referentes

    importncia da etnofarmacologia, etnomedicina e inova, sobremanei-

    ra, em relao a publicaes do gnero quando insere o captulo intitu-

    lado ALMANAQUE, no qual relata aspectos prticos/populares no uso

    das plantas medicinais.

    Prof. Juceni Pereira DavidDoutora em Qumica de Produtos Naturais.

    Prof. Edna Maura Prata de ArajoMestre em Qumica e Farmacologia de Produtos Naturais.

    Prof. Lidrcia Cavalcanti R. C. SilvaDoutora em Quimca de Produtos Naturais.

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    Apresentao

    A motivao para escrever esse livro surgiu em 1990, a partir

    do compromisso social e tico de publicar de maneira ampla, de for-

    ma que ultrapassasse os muros da universidade, os resultados obti-

    dos em vrios trabalhos de campo. Inicialmente, com acadmicos do

    Curso de Farmcia da UFBA, em atividades didticas da disciplina de

    Farmacognosia II e III e, posteriormente, com os resultados obtidos

    em muitos projetos de pesquisa e extenso no Programa de Extenso

    Permanente Farmcia da Terra. Essa publicao foi implementada tam-

    bm com o banco de dados e pesquisas resultantes da elaborao da

    tese de Doutorado da autora, bem como das orientaes de disserta-

    es de mestrado desenvolvidas pela mesma.

    A proposta de realizar uma documentao literria para o co-

    nhecimento das plantas como fonte de cura, sob a tica da religiosidade

    afro-baiana, objetivou colaborar com a preservao e multiplicao das

    informaes obtidas em trabalhos comunitrios, com o devido respeito

    s tradies dessa herana cultural africana na medicina do Brasil. A vi-

    so do homem, como ser integral, respeitado em seu momento de fra-

    gilidade, quando algum mal de origem psquica ou somtica lhe aflige,destaca-se como a principal tica para o entendimento desse trabalho.

    A autora sentiu-se muito vontade ao caminhar entre mundos

    to distanciados pela sociedade: as prticas mdicas acadmicas, a vi-

    so convencional da cura e a vertente tradicional ritualstica. Vive nesses

    dois mundos, a realidade do Aye(terra) e do Orm (mundo dos orixs)

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    como Professora Universitria e descendente de Yalorixs. Foi criada

    dentro de uma comunidade-terreiro. Dessa forma, aprendeu a decodi-

    ficar os segredos das folhas e a compreender a importncia dos princ-

    pios bioativos de origem vegetal. Esses universos to ambguos foramunidos numa mesma esfera a fim de demonstrar a lgica popular sem

    perder a seriedade cientfica.

    As indicaes teraputicas tradicionais (prticas no-alopticas)

    indicam plantas para fins medicinais que extrapolam em muito a tera-

    putica convencional (alopatia), assumindo, em determinados momen-

    tos, um carter mstico, embasado em crenas culturais inerentes ao

    grupo tnico. Assim, na maior parte das doenas, o processo de cura

    no regido apenas pelo princpio farmacolgico do recurso natural uti-

    lizado, mas tambm por crenas prprias dessa cultura, que resistem h

    geraes, garantindo a sade dos seus descendentes.

    Conforme citaes em literatura especializada, ainda difcil es-

    timar com preciso a grandeza da biodiversidade brasileira. Entretanto,

    afirma-se que o Brasil possui a maior diversidade gentica vegetal do

    planeta. Apesar do potencial para a busca de novos fitofrmacos ser

    inegvel, estima-se que menos de 10% da flora nacional foi estudada

    com fins fitoqumicos e farmacolgicos, visando a avaliao das proprie-

    dades teraputicas. Encontram-se registradas no Ministrio da Sade,

    para comercializao com propsitos medicinais, cerca de 600 drogasvegetais de um total de aproximadamente 1.000 espcies que possuem

    a validao de suas atividades biolgicas e de seus princpios bioativos

    avaliados cientificamente.

    Inmeras plantas indicadas para fins medicinais possuem farta bi-

    bliografia sobre seus princpios bioativos e so os testes farmacolgicos

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    clnicos e pr-clnicos dos mesmos que validam sua eficcia e segurana.

    A anlise epistemolgica realizada a partir do banco de dados, oriun-

    do de vrios trabalhos de campo, permitiu traar um perfil botnico e

    epidemiolgico de doenas, atravs das plantas mais indicadas parafins medicinais no pas. Estas esto includas em famlias botnicas, das

    quais as mais indicadas so: Asteraceae, Lamiaceae e Leguminoseae.

    Percebe-se a predominncia de espcies com hbito herbceo e arbus-

    tivo. As classes de metablitos especiais presentes em maior frequncia

    so: alcalides, terpenides, flavonides, taninos e cumarinas.

    Uma outra viso importante que deve ser abordada resulta da

    experincia prpria em etnofarmacologia. Trata-se da necessidade pre-

    mente de uma ao conjunta e urgente no campo da assistncia far-

    macutica. Nota-se, nas observaes participantes e nos resultados

    de entrevistas, um sem nmero de aes populares em sade que

    necessitam de otimizao urgente, outras que, em eminncia de per-

    da, precisam ser resgatadas dentro de seu contexto etnobotnico eetnofarmacolgico.

    Orientados pela certeza da possibilidade de unio entre a ver-

    tente popular/emprica e os conhecimentos acadmicos/cientficos, e

    de que vivel a otimizao de prticas populares em sade, acredita-se

    que esses escritos apontem para o fortalecimento do elo entre o saber

    popular e o cientfico, numa coexistncia simbitica, tendo como obje-tivo a melhoria da qualidade de vida como instrumento de cidadania.

    Optou-se por estruturar a presente obra em trs mdulos: o pri-

    meiro, que situa o uso de plantas medicinais na histria da humanidade;

    o segundo, denominado a Cura do Corpo e da Alma, no qual foram ela-

    boradas 16 monografias considerando o aspecto popular-religioso de

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    um grupo social e suas crenas, abordando aspectos tcnico-cientficos;

    e um terceiro, o Almanaque, assim intitulado devido variedade de in-

    formaes nele reunidas, a maioria delas oriundas de dvidas e consul-

    tas anotadas em cursos de extenso, aulas e consultorias.

    Para a elaborao desta publicao, contou-se com parcerias ins-

    titucionais e pessoais, como o Herbrio Alexandre Leal Costa, do Instituto

    de Biologia da UFBA, sua atual curadora, Prof. Lenise S. Guedes e da an-

    terior, Prof. Letcia Scardino. De professoras da matria Farmacognosia,

    como a Prof. Edna Prata, que iniciou com a autora, o Levantamento da

    Flora Medicinal Comercializada na Cidade de Salvador. Essa pesquisa deu

    origem primeira ordenao de dados, reproduzida como brochura,

    em 1990, com o apoio financeiro do Conselho Regional de Farmcia/

    BA. Esses dados foram o embrio desse livro; a Prof. Helna Clia R.

    Passinho, que iniciou os cursos comunitrios do Farmcia da Terra, em

    1996, num projeto em parceria com o Servio Social do Mosteiro de So

    Bento resultando hoje, no Programa de Extenso Permanente Farmciada Terra; a Prof. Juceni David, do Laboratrio de Pesquisa de Produtos

    Naturais, parceira em projetos voltados para o estudo Fitoqumico de

    Plantas Medicinais. As Profas. Lidrcia C. R. C. Silva e Maria de Lourdes S.

    e Silva, da disciplina Farmacotcnica, parceiras em cursos de extenso

    e nos projetos de Produo de Fitoterpicos e Fitocosmticos. O Prof.

    Humberto Ribeiro Moraes, vice-coordenador do Programa e idealiza-dor junto com a autora, da implantao da disciplina Fitofrmacos e

    Fitoterpicos, ministrada pelos mesmos, no curso de Farmcia da UFBA.

    Contou-se tambm com a colaborao constante da Pr-Reitoria

    de Extenso/UFBA, atravs do seu Pr-Reitor, Prof. Dr. Paulo Lima, que

    apoiou os trabalhos comunitrios atravs do Programa UFBA em Campo.

    Em alguns projetos, obteve-se a parceria da EBDA em assessorias

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    agronmica e botnica. Mantm-se a constante colaborao cientfica,

    no referente a drogas vegetais, com a Prof. Eliane Carvalho e o Prof. Dr.

    Leandro Machado Rocha da Universidade Federal Fluminense, com o far-

    macutico Leonardo Lucchetti da FIOCRUZ/INCQS, com o Prof. Dr. JosMaria Barbosa e Prof. Dr. Marcelo Sobral, do Laboratrio de Tecnologia

    Farmacutica da Universidade Federal da Paraba, parceiros em projeto

    PRONEX. A Prof. Dr. Maria Auxiliadora Kaplan, da Universidade Federal

    do Rio de Janeiro/NPPN, consultora e orientadora da tese de doutorado

    da autora. O apoio financeiro para a pesquisa e elaborao da primei-

    ra edio dessa obra deve-se ao CADCT/SEPLANTEC, que acreditandona importncia de documentar as questes de sade e etnias, verten-

    tes que traam um representativo perfil do povo baiano, viabilizou o

    projeto.

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    Plantas Medicinaisabordagem

    histrico-contempornea

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    A origem do conhecimento do homem sobre as virtudes das

    plantas confunde-se com sua prpria histria. Certamente surgiu, me-

    dida que tentava suprir suas necessidades bsicas, atravs das casuali-

    dades, tentativas e observaes, conjunto de fatores que constituem oempirismo. O homem primitivo dependia fundamentalmente da natu-

    reza para a sua sobrevivncia e utilizou-se principalmente das plantas

    medicinais para curar-se. No decorrer de sua evoluo surgiram novas

    terapias. Entretanto, at 1828, quando Friedrich Wohler sintetizou a ureia

    a partir de uma substncia inorgnica, o cianato de amnio, o homem

    no conhecia como origem de matria orgnica qualquer fonte que nofosse vegetal, animal ou mineral. Isso significa que praticamente com

    exceo do sculo XX, toda a histria da cura encontra-se intimamente

    ligada s plantas medicinais e aos recursos minerais. Acredita-se que o

    registro mais antigo de todos o Pen Tsao, de 2800 a.C., escrito pelo her-

    borista chins Shen Numg, que descreve o uso de centenas de plantas

    medicinais na cura de vrias molstias.A eficcia das drogas de origem vegetal fato desde as mais

    remotas civilizaes, na chamada Matriz Geogrfica da civilizao oci-

    dental: o quadrante noroeste que envolvia Europa (Mar Mediterrneo),

    frica Setentrional (Vale do Rio Nilo), sia Ocidental (Mesopotmia) e as

    regies entre os rios Tigre e Eufrates.

    Os egpcios, sob a proteo de Imhotep, o Deus da cura, e asapincia de seus inmeros sacerdotes, muitos com funes mdicas

    definidas, tornaram-se famosos pelos seus conhecimentos com os in-

    censos, as resinas, as gomas e mucilagens que faziam parte da arte da

    mumificao.

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    O egiptlogo alemo Yorg Ebers, no final do sculo XIX, ocasio-

    nalmente teve acesso a um longo papiro datado de aproximadamen-

    te 1500 a.C., que aps traduo passou para a histria como Papiro de

    Ebers, um dos mais importantes documentos da cultura mdica. O Papiroinicia com a audaciosa frase Aqui comea o livro da produo dos rem-

    dios para todas as partes do corpo humano ...

    Dessa forma o mundo tomou cincia de uma Farmacopeia egp-

    cia contendo a descrio de espcies vegetais como a Mirra, de uso

    adstringente e anti-inflamatrio, o ltex do Olbano, para inflamaes

    bucais, Sndalo como antidiarrico. A papoula, fonte do pio, morfina,codena e papaverina era conhecida como sedativo, antiespasmdico,

    chamado de remdio para acabar com a choradeira.

    Muitas drogas usadas no Egito vinham de outras regies.

    Naquela poca, o comrcio de drogas vegetais era intenso e as cidades

    do Reino de Sab , no extremo sudoeste do deserto arbico, ganharam

    fama pelos seus jardins paradisacos onde cresciam ervas milagrosas. Os

    sabeus, at 1000 a.C., promoviam caravanas frequentes ao Egito para

    comercializar incensos, mirra, outros gneros da famlia burseraceae e

    outras espcies asiticas atravs do porto de Gherr, hoje Golfo Prsico.

    Dessa forma, novas drogas como cinamomo, pimenta da Malsia, gen-

    gibre, rom, clamo aromtico e os alos da ilha de Socotra (Ilha do

    Oceano ndico localizada ao sul da Arbia, atualmente protetorado daRepblica do Imen) chegaram ao Egito e ao Mediterrneo. Outras plan-

    tas vieram da ilha grega de Creta para o Egito. Os cretenses dominaram

    o mar e o comrcio no Mediterrneo at 2000 a.C., entre as espcies cita-

    das acima esto o aafro, a slvia e o arbusto de Chipre, de cujas cascas

    e folhas se faziam a Henna, que tingia as unhas e os cabelos das egp-

    cias. Paralelamente, a exemplo do que ocorreu no Egito, os sumrios,

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    prximo ao terceiro milnio a.C., detinham conhecimentos que foram

    repassados para a humanidade atravs de escrita cuneiforme, em placas

    de argila. Dessas placas, vrias receitas foram traduzidas como o uso da

    beladona, fonte de atropina; do cnhamo da ndia chamado Quinabu,a Cannabis sativa L.indicada para dores em geral, bronquite e insnia. Em

    uma dessas placas h a descrio da coleta do GIL, que significa prazer.

    uma referncia coleta e uso ritual da papoula, Papaver somniferum L.

    O herbrio assrio tambm dispunha de muitos frmacos tais como mei-

    mendro, mandrgora, junco e tomilho. A ndia, provavelmente, comer-

    cializava drogas vegetais desde 2500 a.C., seu maior legado est citadona tradio dos sbios Vidia, no imprio do Vale do rio Indo, a Noroeste

    da ndia, onde hoje o Paquisto.

    Os primeiros tratados mdicos de grande importncia so de

    aproximadamente 500 a.C., o Taxaraca-Samhita e Susruta-Samhita,

    provveis precursores do sistema UNANI de medicina rabe. Estes sis-

    temas teraputicos so certamente a origem inspiradora da medicinahipocrtica grega, conhecida como a me da medicina ocidental.

    Os antigos mdicos hindus, conheciam uma droga poderosa de-

    vido forma semilunar de seus frutos, usados contra cefaleia e angstia.

    Eram chamados de remdio para homens tristes. Essa droga posterior-

    mente conquistou o mercado farmacutico mundial nos meados do s-

    culo XX como hipotensora e calmante, a Rauwolfia serpentina L., fontede reserpina.

    Durante as chamadas civilizaes clssicas, as drogas vegetais

    comeam a ser registradas de forma sistemtica. Na Grcia, Pedacius

    Dioscrides escreveu a obra que foi posteriormente traduzida para o

    Latim por humanistas do sculo XV, chamada De Matria Mdicaque por

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    mais de 1500 anos, durante o perodo greco-romano e na Idade Mdia,

    foi considerada a bblia de mdicos e farmacuticos. Dioscrides des-

    creveu a origem, caractersticas e usos em teraputica de mais de 500

    drogas vegetais, aproximadamente 100 drogas de origem animal e ou-tras tantas de origem mineral. Acredita-se que a matria-mdica, trans-

    formada em disciplina didtica, deu origem moderna Farmacognosia.

    Aps a queda do Imprio Romano, a Europa atravessou um longo pero-

    do de obscurantismo cientfico entre os sculos V e XV, a chamada Idade

    Mdia. De forma paralela, nesse perodo, o mundo rabe emergiu com

    grande atividade cientfica sendo acrescido de alguns conhecimentosde origem indiana. Dessa forma, surge a Medicina rabe, destacando-se

    o mdico Avicena e as suas famosas flores como teraputica para os ma-

    les cardacos. Atravs da pennsula Ibrica, os conhecimentos rabes

    ganharam toda a Europa. Muitas drogas, novas para a poca, foram in-

    troduzidas na teraputica europeia: canela, limo, noz-moscada, sene,

    tamarindo e cnfora so algumas das mais importantes.

    As descobertas geogrficas, ao final do sculo XV, com a aber-

    tura das rotas martimas para as ndias e para a Amrica trouxeram o

    conhecimento de outros vegetais como o coco, o ch preto e o caf,

    iniciando uma nova era para o estudo de fitofrmacos.

    A noo bsica do entendimento de substncias responsveis

    pela atividade farmacolgica e a resposta teraputica como potencialcaracterstico de uma certa espcie vegetal, creditada a Paracelso. Este

    fsico suo, no incio do sculo XVI, comeou a praticar a extrao de

    substncias a partir de drogas at ento consideradas como indispen-

    sveis, as quais denominou de Quinta Essentia. A Quinta Essncia pro-

    vavelmente a primeira noo de princpio bioativo.

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    Entretanto, somente ao final do sculo XVIII tornou-se vivel

    uma proposta cientfica slida para o uso de fitofrmacos, a partir do

    isolamento e estudo de metablitos especiais. As primeiras substncias

    qumicas foram isoladas de extratos vegetais quando os cidos orgni-cos: oxlico, mlico e tartrico foram separados e identificados. A partir

    da, no incio do sculo XIX, vrias foram as substncias bioativas isola-

    das: narcotina e morfina do pio; estricnina de Strychnus nux-vomica;

    quinina de Cinchona; cafena de Coffea. Os primeiros heterosdeos, sa-

    licina e digitalina, ainda so desse sculo. Data tambm do incio do s-

    culo XIX, um novo aspecto do estudo de plantas medicinais, atravs dodesenvolvimento da fisiologia e da farmacologia experimental.

    Em 1809, foram descritos os primeiros trabalhos sobre os efeitos

    txicos de Strychnus em animais de laboratrio. Entretanto, atribudo

    a Claude Bernard o mrito de estudar atravs de ensaios de laborat-

    rio com animais, a atividade de plantas indicadas empiricamente para

    fins medicinais e usadas na medicina popular, definindo sua forma deao sistmica. Nessas anlises experimentais, comearam-se a tes-

    tar substncias bioativas, isoladas de extratos vegetais, iniciando uma

    nova viso de aplicao teraputica. Sendo assim, pode-se sugerir que

    etnomedicina, farmacologia e qumica de produtos naturais caminham

    juntas desde o incio do sculo XIX, tendo atravs do desenvolvimento

    cientfico, sofrido diferenciaes e especializao a partir de uma cincianica, a matria mdica. Dessa forma, adquiriu caractersticas prprias.

    Hoje, na virada do sculo XX, os pesquisadores de reas afins procuram

    valorizar as aes multidisciplinares e multiprofissionais como priorida-

    de para o estudo cientfico na busca racional de princpios bioativos.

    Muitas drogas vieram da antigidade e atravs dos sculos so-

    breviveram aos diferentes hbitos culturais. Na Grcia, em 800 a.C.,

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    o poeta Homero, na Odisseia, narra que Helena servia a Telmaco

    quando esse se sentia triste pela lembrana de Ulisses... uma poo de

    esquecimento retirada da seiva da dormideira. Em vrias pinturas, da-

    tadas da Idade Mdia, existem referncias Mandrgora, planta mgicausada como anestsico em cirurgias apesar de sua conhecida toxidez.

    Sua raiz antropomorfa e bifurcada, lembrando duas pernas, atravs da

    Teoria das Assinaturas, contribuiu muito para a fama de planta msti-

    ca e afrodisaca. Na comdia satrica Mandrgola, em 1515, Maquiavel

    ridicularizou a hipocrisia do clero, a corrupo na Itlia renascentis-

    ta. No centro da trama est a Mandrgora, erva mgica fecundante.Sheakspeare, citou a mandrgora nas falas dos personagens Julieta e

    Clepatra. Muitas so as lendas com essa planta, sempre presente nas

    frmulas dos filtros de amor, nos unguentos das bruxas, nos rituais que

    proporcionariam prazer, fertilidade e felicidade eterna.

    Preciosos conhecimentos perderam-se no decorrer da

    histria das civilizaes, extintas por fenmenos naturais, migraese, principalmente, pela ocorrncia das invases gregas, romanas,

    muulmanas e pelas colonizaes europeias, que impuseram seus

    costumes, alterando realidades socioculturais e econmicas. No Brasil,

    o conhecimento dos ndios, dos africanos e de seus descendentes est

    desaparecendo em decorrncia da imposio de hbitos culturais

    importados de outros pases, havendo um risco iminente de se perderessa importante memria cultural.

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    O uso de plantas medicinaisno Brasil e suas origens

    A pesquisa etnofarmacolgica, vertente relativamente nova do

    estudo de plantas medicinais, vem sendo reconhecida como um dos

    melhores caminhos para a descoberta de novas drogas, orientando os

    estudos de laboratrio no direcionamento de uma determinada aoteraputica, reduzindo significativamente os investimentos em tempo

    e dinheiro.

    O vocbulo etnofarmacologia, como um termo cientfico, surgiu

    em 1967, em um Simpsio Internacional em So Francisco nos Estados

    Unidos. Neste, foram abordados os aspectos histrico, cultural, antropo-

    lgico, botnico, qumico e farmacolgico de drogas psicoativas. A deno-minao ganhou definitivamente status de cincia a partir do surgimento

    doJournal of Ethnopharmacologyem 1979. Em 1981, Bruhn e Holmstedt

    descreveram a etnofarmacologia como O conhecimento multidiscipli-

    nar de agentes biologicamente ativos, tradicionalmente estudados ou

    observados pelo homem. Desenvolvendo esse conceito sob a tica de

    seu significado cultural, independente do pensamento cartesiano a res-peito da ao de drogas, o levantamento de dados etnofarmacolgicos

    prope que a atitude do pesquisador seja ampla e receptiva, sem ideias

    preconcebidas sobre sade e doena e que a atitude em relao aos

    agentes farmacologicamente ativos ocorra numa perspectiva cultural

    e histrica. Sendo assim, os objetos de estudo da etnofarmacologia,

    so as informaes coletadas dentro de uma determinada populao

    lt l t d fi id ( t i ) E l l d i i

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    42

    culturalmente definida (grupo tnico). Em geral, alm dos minerais e

    produtos de origem animal, os remdios de origem vegetal produzi-

    dos pelo homem, no so mais consideradas plantas medicinais in na-

    turae sim uma certa espcie vegetal manipulada e ingerida de maneiraespecfica para uma determinada finalidade teraputica. A partir dessa

    concepo, as informaes etnofarmacolgicas so usadas como ponto

    de partida para o delineamento experimental, que objetiva o estudo da

    espcie como um frmaco em potencial, ou seja, qual ao farmacol-

    gica tem o maior potencial de revelar dados que validem a indicao

    popular.Sendo assim, de acordo com a RDC n. 14, publicada em 05 de

    abril de 2010, da Agencia Nacional de Vigilncia Sanitria (ANVISA),

    planta medicinal: espcie vegetal, cultivada ou no, utilizada com

    propsitos teraputicos. Derivado vegetal: produto da extrao de

    planta medicinal in naturaou da droga vegetal podendo ocorrer na for-

    ma de extrato, tintura, alcoolatura, leo fixo e voltil, cera, exsudato eoutros derivados. Matria-prima vegetal: compreende a planta medi-

    cinal, a droga vegetal ou o derivado vegetal. So considerados medica-

    mentos fitoterpicos os obtidos com emprego exclusivo de matrias-

    -primas ativas vegetais, cuja eficcia e segurana so validadas por meio

    de levantamentos etnofarmacolgicos, de utilizao, documentaes

    tecnocientficas ou evidncias clnicas. De acordo com as definiesfarmacotcnicas, considera-se medicamento, todo produto farmacu-

    tico empregado para modificar ou explorar sistemas fisiolgicos ou

    estados patolgicos, em benefcio da pessoa a quem se administra,

    com finalidade profiltica, curativa, paliativa ou de diagnstico (OMS),

    como, por exemplo, o uso de um analgsico com o propsito de aliviar

    uma dor. Denomina-se remdio todos os meios fsicos, qumicos ou

    psicolgicos atravs dos quais se procura o restabelecimento da sade

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    psicolgicos atravs dos quais se procura o restabelecimento da sade .

    Exemplificando: o uso de arruda nas rezas e o banho de sal grosso, am-

    bos contra mau-olhado.

    Reafirma-se a importncia do entendimento dos conceitos de

    sade, doena e remdio da populao abordada, pois tais conceitos

    so variveis em cada cultura e, portanto, necessrio levar em conside-

    rao o contexto no qual uma determinada planta considerada como

    medicamento. Para uma doena culturalmente definida, o remdio in-

    dicado poder ser eficaz apenas naquele momento cultural, ritualstico.

    Porm, pouco provvel que tenha um princpio bioativo que possaser utilizado com aplicabilidade universal. Somente atravs da descodi-

    ficao por correlao entre os conceitos de nosso sistema biomdico

    convencional e os conceitos da medicina tradicional, torna-se possvel

    propor hipteses de trabalho experimental viveis a fim de otimizar a

    eficincia dos estudos que objetivem o desenvolvimento de novas dro-

    gas ou preparaes teraputicas teis.As pesquisas etnofarmacolgica e etnobotnica no Brasil so

    assuntos controvertidos, considerados por alguns um grande desafio. A to

    cobiada flora brasileira e sua famosa biodiversidade, constituda de um infi-

    nito nmero de espcies vegetais, vem sendo progressivamente destru-

    da, perdendo-se tambm as informaes sobre plantas medicinais tro-

    picais, conhecimentos etnomdicos to ricos e distintos e seus diversosmatizes, sendo eles de origem africana, indgena e europeia.

    No Brasil, so consideradas cinco regies em abundncia de es-

    pcies medicinais: Floresta Amaznica, Mata Atlntica, Pantanal Mato-

    grossense, Cerrado e Caatinga. Algumas dessas regies possuem plan-

    tas medicinais indicadas popularmente, das quais ainda no foram reali-

    zados estudo qumico, farmacolgico ou toxicolgico.

    A herana africana

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    A herana africana

    Os levantamentos etnomdicos realizados, demonstram a forteinfluncia da herana cultural africana na medicina popular do Brasil,

    principalmente no norte, nordeste e sudeste do pas. A manuteno da

    herana africana em vrios mbitos socioculturais brasileiros , antes de

    tudo, uma forma de resistncia de uma camada mestia da populao.

    Com a vinda dos africanos para o Brasil, aps trs sculos de

    trfico escravo, muitas foram as espcies vegetais trazidas, substitudaspor outras de morfologia externa semelhante, enquanto algumas foram

    levadas daqui para o continente africano. No processo histrico brasilei-

    ro, os negros realizaram um duplo trabalho; transplantaram um sistema

    de classificao botnica da frica e introjetaram as plantas nativas do

    Brasil na sua cultura, atravs de seu efeito mdico simblico. Sendo as-

    sim, ao incorporarem-se ao novo habitat e s novas condies sociais,algumas plantas indispensveis aos rituais de sade foram substitudas

    Entre as plantas trazidas para o Brasil e que aqui mantm seus

    nomes em Yorub citam-se: ob (Cola acuminataSchott e Endl.), da fa-

    mlia Sterculiaceae; orob (Garcinia colaHeckel), famlia Guttiferae; fava

    de Aridam (Tetrapleura tetrapteraPaub), famlia Leguminosae; e akk

    (Newbouldia leavisSeem), famlia Bignoniaceae.

    Aps a abolio, o chamado refluxo migratrio de africanos e

    seus descendentes levou para a frica: milho, guin, pinho branco, ba-

    tata doce, fumo e algumas espcies de Annona (pinha, fruta de conde,

    graviola). Espcies africanas como a mamona, dend, quiabo, inhames,

    tamarineiro e jaqueira, bem adaptadas, tornaram-se espontneas.

    Em 1942 na primeira edio de Brancos e Pretos na Bahia Pierson

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    Em 1942, na primeira edio de Brancos e Pretos na Bahia, Pierson

    j registrava a perda do mundo mental africano pelos seus descenden-

    tes e a crescente assimilao dos padres culturais europeus. Este regis-

    tro foi facilmente justificado pela escolarizao e outros meios de difu-so de cultura europia dominante, afastando-se das crenas e prticas

    de seus antepassados. Entretanto, se os africanos e seus descendentes

    mestios se europeizaram atravs dos sculos, no Brasil, houve um re-

    verso onde o forte amarelo do dend tingiu as louas portuguesas de

    Macau servidas nos sobrados dos senhores. O ritmo que se ouvia nos

    sales foi assenzalando-se e recebendo novos compassos. Essa acul-turao (bilateral) pode ser tambm observada na medicina tradicio-

    nal brasileira, principalmente na Bahia, Rio de Janeiro, Minas Gerais e

    Maranho.

    Na regio metropolitana do Rio de Janeiro e de Salvador, obser-

    vou-se um intenso consumo de espcies vegetais atravs dos terreiros

    de religio afro-brasileira. Nestes, os Babalorixs e Yalorixs (sacerdotes),portadores de conhecimento etnomdico respeitvel, prescrevem o uso

    das folhas, razes, sementes e cascas para fins medicinais, banhos, ebs e

    outros propsitos ritualsticos. Essas plantas so geralmente obtidas nas

    barracas de mercados populares e de vendedores ambulantes denomi-

    nados erveiros de rua.

    Pode-se dizer, portanto, que o uso popular de plantas medici-nais nessas condies, constitui um complexo sistema de sade no

    oficial em que participam erveiros, centros religiosos e comunidade.

    Durante muitos anos, esse sistema paralelo de teraputica foi duramen-

    te criticado pela sociedade e at mesmo alvo de perseguio policial.

    Pode-se ilustrar o fato com antigos recortes de jornais como a manche-

    te do Dirio de Notcias de Salvador de 09 de maio de 1905: Rapariga

    de famlia enlouquece com a beberagem de Jurema no Candombl.

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    de famlia enlouquece com a beberagem de Jurema no Candombl .

    Informaes obtidas no recncavo baiano afirmam que o guin (Petiveria

    alliaceae, L.) da famlia Phytolacacceae, tinha como sinonmia popular o

    nome Amansa-senhor. Este nome, deve-se ao fato de ser preparada porescravos domsticos sob a forma de ch e misturada s refeies dos

    senhores e feitores, causando sonolncia e, portanto, tornando-os mais

    brandos na convivncia diria. Estudos farmacolgicos pr-clnicos mais

    recentes, confirmam a ao da Petiveria alliaceaeL. sobre o sistema ner-

    voso central.

    Atualmente, alguns pesquisadores agrupam as manifestaesde cura originadas nas crenas e costumes de origem africana como

    Teraputica Yorub. So considerados Yorub aqueles cuja origem

    est localizada no sudoeste da Nigria. No Brasil, so conhecidos como

    Nag. Na verdade, quanto origem, no h uma distino clara no re-

    ferente teraputica. O principal referencial a filosofia do tratamento,

    sempre diretamente relacionada com as tradies ritualsticas.As crenas Yorub esto associadas com as prticas de cura na-

    tural. As questes fisiolgicas raramente esto dissociadas da cura es-

    piritual e da concepo de vida e de morte. As plantas esto sempre

    presentes atravs do uso das folhas, razes, frutos e das rvores de vrias

    representaes simblicas, bem como outros elementos naturais, inse-

    tos, cinzas, ossos, ovos e muitos outros objetos utilizados para a cura epreveno de doenas. Uma pessoa doente ao beber um ch de uma

    determinada folha, deve sorver acreditando no somente nas proprie-

    dades medicinais qumicas e/ou farmacolgicas da planta, mas tambm

    no seu poder mgico ou espiritual. O pensamento Yorub traz a crena

    no ancestral e em outros espritos e deuses diretamente envolvidos no

    processo de cura.

    De acordo com a mitologia Yorub, plantas e outros elementos

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    g , p

    teraputicos e alimentcios so riquezas que os deuses proporcionam

    ao homem. As solues para os problemas em geral e os diagnsticos

    das doenas, so indicados principalmente pelos orculos, como porexemplo, o jogo de If ou de bzios. Acredita-se que consultando os

    jogos divinatrios obtm-se os conselhos do grande mestre Orunmila.

    A misso de Orunmila na terra usando de sua mais alta autorida-

    de e sapincia, revelar conhecimentos e conceder alguns pequenos

    poderes aos homens. A medicina vegetal vista como um dom divino.

    Quem segue e conhece os seus ensinamentos poder curar com plan-tas e palavras rituais os homens e mulheres doentes que chegarem ao

    seu caminho.

    De acordo com a lenda, Ossanyin e Orunmila eram filhos dos

    mesmos pais. Entretanto, uma guerra os separou e foram criados sem

    se conhecerem. Muitos anos depois, Ossanyin foi enviado para abrir as

    matas e arar a terra para o homem aprender a cultivar. Ele no pde re-cusar essa misso porque nesse tempo era o nico homem que poderia

    ter a capacidade de identificar a existncia e a importncia das plantas

    medicinais e outras ervas encantadas indicadas por Orunmila. Sendo

    assim, enquanto Ossanyin se especializou em plantas, Orunmila, atra-

    vs do jogo de If, indicava os diagnsticos e a origem dos sintomas.

    Orunmila e Ossanyin, segundo as tradies, foram os primeiros a conhe-cerem e curarem as pessoas com plantas medicinais nas terras Yorub.

    Acredita-se que seus seguidores divulgaram as maravilhas das ervas e

    dos tratamentos medicinais tradicionais pelo mundo afora, de gerao

    em gerao.

    Pode-se definir a medicina de origem Yorub como uma sntese

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    de todos os conhecimentos, explicveis ou no, luz da medicina oci-

    dental hipocrtica (convencional), usados em diagnstico, preveno e

    eliminao de distrbios fsicos, mentais ou sociais repassados s gera-es verbalmente ou de qualquer outra forma.

    Atravs dessa definio terica, pode-se avaliar porque os defu-

    madores, as Limpezas, Ebs de Sade e Sacudimentos, os banhos de

    ervas, de Ab, de mar e de cachoeira, as preces, os cnticos e danas

    so consideradas, em conjunto, aes teraputicas. Essas, so considera-

    das no mesmo nvel de importncia dos medicamentos de origem vege-tal de ao sistmica pelo doente afligido por males fsicos mentais ou

    espirituais. Todas essas aes so consideradas remdios objetivando

    a cura.

    Alguns estudiosos do assunto sugerem um sistema classificat-

    rio de sintomas e doenas baseado em relaes simblicas entre o cor-

    po, os Orixs, seus arqutipos e suas histrias (Itans).

    Orixs, Sade e Doena

    Os diagnsticos na maioria das vezes, como citados anterior-

    mente, resultam da consulta aos orculos (jogos divinatrios) que de-

    terminam os sintomas, identificam os males e orientam os procedimen-

    tos de cura. Podem-se observar duas grandes categorias de doenas: os

    distrbios que se apresentam sob forma de desordem fsica, que podem

    ocorrer ou no no iniciado e que so relacionados com a atuao das

    divindades principais do indivduo. A segunda categoria compreende

    as doenas endmicas em geral como varola, gripe, resultante da ao

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    genrica do orix Obalua e Omol, considerados como os senhores da

    vida e da morte, sincretizados por So Lzaro e So Roque, chamados

    mdicos dos pobres. Alguns observadores ressaltam que, em se tra-tando de iniciados, a sintomatologia pode exprimir a marca ou sinal de

    sua divindade principal ou de um Orix que faa parte de seu carrego

    de santo. Sendo assim, as doenas de pele (varola, catapora, rubola,

    sarampo e outras como coqueluche, caxumba e tuberculose) so de

    responsabilidade de Obalua e Omol. O vitiligo, porm, atribudo a

    Oxumar, assim como a erisipela a Nan, o que pode talvez ser explica-do pelos laos de parentesco mtico entre essas trs divindades (Nan,

    a me de Obalua e Oxumar). As doenas venreas femininas, a fal-

    ta ou excesso de regras menstruais, abortos, infertilidade e os demais

    distrbios includos na categoria de doenas de senhoras ou doenas

    da barriga, constituem apelos ou marcas de Iemanj e Oxum, ligadas

    ao elemento gua, feminilidade e maternidade. Observa-se que em

    quase todas as oferendas para Oxum colocam-se ovos, smbolos da fer-

    tilidade. A esse Orix, cabe tambm o restabelecimento das doenas

    de crianas.

    A impotncia e a fertilidade masculinas aparecem ligadas a

    Xang e a Exu, divindades viris do elemento fogo, sendo geralmente

    indicadas garrafadas cujos componentes em geral so plantas com ca-

    ractersticas afrodisacas e estimulantes.

    Os distrbios respiratrios e os problemas de viso so atribu-

    dos s divindades femininas Ians e Oxum. Sugere-se que tal relao

    tenha origem no fato de Oxum ser considerada a padroeira da adivi-

    nhao, dos jogos de bzios, sendo seus iniciados vistos como os me-

    lhores adivinhos ou olhadores). J Ians, ligada ao elemento ar, por ser

    a dona dos ventos, do movimento, da fora controle dos elementos,

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    imprime sua marca em seus filhos transgressores, sobretudo atravs de

    afeces do sistema respiratrio tais como asma, falta de ar, enfisemas

    e outros males.Os distrbios emocionais, as doenas da cabea e manifesta-

    es de loucura, aparecem associados especialmente a Oxssi (elemen-

    to terra), considerado o dono de todas as cabeas nos Candombls

    Ketu, podendo tambm ser atribudos a Ossanyim, o dono das folhas

    e mais raramente a Ians, a quem tambm associada a ninfomania.

    Os males do fgado e vescula, as lceras estomacais e as enxa-

    quecas so vistos tambm como sinais de Oxssi, algumas vezes perce-

    bidas como marcas de seu filho Loguned. A magreza constitui uma

    das caractersticas arquetpicas desses Orixs, sendo o emagrecimento

    a eles atribudos. J a obesidade apresenta-se relacionada tanto s iabs

    Iemanj e Oxum, como ao orix masculino Xang, todos associados em

    suas respectivas histrias, ao acmulo de riqueza material e gulodice.Os ferimentos e danos produzidos por instrumentos cortantes ou desas-

    tres automobilsticos so associados a Ogum (elemento terra), patrono

    do ferro e do progresso tecnolgico. As queimaduras, no entanto, so de

    responsabilidade de Xang e Exu, divindades do elemento fogo.

    As doenas do sistema circulatrio e cardiovasculares esto rela-

    cionadas aos Orixs primordiais da criao: Oxal, Nan e Iemanj. A es-ses deuses esto ainda associadas as inchaes, reumatismos e artroses.

    Os distrbios e dores renais, assim como o reumatismo, so vistos como

    males de velhos, sendo atribudos a Oxal e Nan, percebendo-se a

    uma relao com a senilidade desses Orixs.

    Doenas recentemente reconhecidas so tambm classificadas,

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    a AIDS por exemplo considerada um flagelo caracterstico do Orix

    Ossanyim, provavelmente devido relao desse Deus com a cura de

    enfermidades graves, mesmo as mais mrbidas.Para complementar o entendimento dos procedimentos da cha-

    mada Teraputica Yorub preciso entender sem ideia preconcebida os

    conceitos de doena, sade e remdio; a importncia dos arqutipos re-

    lacionados aos deuses do panteo africano para o sistema classificatrio

    de sintomas e doenas; as prticas de sade (remdios, rituais de limpe-

    za e purificao) e seus respectivos simbolismos. importante afirmarque o paciente, nessas aes de sade, visto como indivduo, agente

    de sua prpria cura, com identidade prpria, figura mpar de uma hist-

    ria de vida emocional, social e ancestral.

    Deve-se considerar que os servios institucionais de sade, em

    geral, para uma faixa ampla da populao urbana, o ltimo elo de uma

    cadeia em busca do restabelecimento da sade. As prticas teraputicasde origem afro-brasileira so opes amplamente utilizadas e divulga-

    das por veculos de comunicao de massa como programas de rdio,

    revistas populares, panfletos distribudos em vias pblicas e outros. Na

    verdade, uma questo de sade individual e coletiva para a qual deve-

    se estar atento.

    A herana indgena

    Embora nos ltimos anos tenham sido realizadas inmeras

    pesquisas com plantas teis, biologicamente ativas, desde 1979, os

    pesquisadores Gottlieb e Mors alertam para a crescente necessidade

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    de agir com presteza pois os avanos da sociedade moderna e o con-

    sequente desflorestamento, destruram o habitat de muitas espcies

    vegetais. A primeira descrio metdica das plantas utilizadas com finsmedicinais pela populao indgena no Brasil atribuda a William Pies,

    mdico da expedio dirigida por Maurcio de Nassau ao nordeste do

    Brasil durante a ocupao holandesa (1630-1654). Na poca, foram des-

    critas a ipecacuanha, o jaborandi e o tabaco. Alguns anos mais tarde,

    a misso cientfica trazida ao Brasil pela princesa Leopoldina seria de

    grande importncia cientfica para o pas. Durante essa misso, o bo-

    tnico Karl Friedrich Phillip Von Martius, documentou em detalhes a

    flora brasileira. Em 1847, a convite de Von Martius, chegou ao Brasil o

    farmacutico Theodor Peckholt, que acredita-se ter analisado mais de

    6000 plantas, tendo publicado os resultados do seu trabalho em mais

    de 150 artigos cientficos. Atribui-se a Peckholt o primeiro isolamento e

    descrio de uma substncia qumica bioativa, a agoniadina, extrada

    das cascas de agoniada.

    Uma outra importante aquisio para a teraputica, obtida a

    partir das pesquisas etnofarmacolgicas com grupos indgenas, foram

    os curares. Os curares so os famosos venenos para flechas, usadas pelos

    ndios da Amrica do Sul. Apesar de serem incuos por via oral, uma

    s gota injetada na corrente sangunea paralisa a vtima sem mat-la.

    Os curares naturais podem ser divididos em duas classes: os curares de

    tubo, conservados em canos de bambu e os curares de cabaa, guar-

    dados em cabaas ou vasilhames de barro. So encontrados em dife-

    rentes zonas geogrficas, com origem botnica, composio qumica e

    empregos diferentes. Os curares e seus derivados naturais e sintticos

    ainda hoje so usados como anestsicos locais ou relaxantes musculares

    pr-anestsicos. Durante muitos anos a ateno dos pesquisadores em

    f l i l d A i b d d

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    etnofarmacologia esteve voltada para a Amaznia, em busca de produ-

    tos psicoativos de origem vegetal. Nessa busca, tornaram-se conhecidas

    vrias drogas utilizadas pelos indgenas, principalmente nos momentosritualsticos. Entre as mais estudadas por grupos de psicofarmacologia

    experimental no Brasil, esto: Maquira scherophyllaC. C. Berg. (famlia

    Moraceae) conhecida como rap dos ndios. Da famlia Myristicaceae,

    vrias espcies de Virola, algumas utilizadas na preparao de um po-

    tente rap alucingeno que utilizado em cerimnia anual pelos n-

    dios Waika na regio do rio Totob, em Roraima. Justicia pectoralisJacq

    (Acanthaceae), mais um dos constituintes desse rap, conhecida no

    Nordeste do Brasil como chamb, encontra-se em vrias receitas de xa-

    ropes com atividade broncodilatadora. Uma poo indgena conheci-

    da como Yopo, de uso distribudo por vrias tribos da Amrica do Sul

    e entre essas os nativos da Amaznia brasileira, preparada a partir da

    Piptadenia peregrina L., da famlia Leguminosae, cuja qumica estudada

    acusa a presena de bufotenina e outras triptaminas de reconhecida

    atividade psicoativa. Alm dessas, vale citar a Banisteriopsis caapi Spr.,

    famlia Malpighiaceae e Psychotria viridisR. et P., da famlia Rubiaceae,

    ambas utilizadas na beberagem do Santo Daime, de reconhecida ao

    narctica. Os constituintes principais dessa preparao so os alcalides

    b-carbolnicos, harmina, harmalina e tetraidrohaluruina e outros princ-

    pios txicos bem conhecidos, como a triptamina.

    Recentemente, os costumes de algumas tribos indgenas como

    Pataxs, Kaiaps, Tiriyos e Tenharins, foram estudados por pesquisa-

    dores em etnofarmacologia. Os resultados revelam ampla experincia

    em plantas medicinais. O contato com o homem branco resultou num

    processo de aculturao crescente das tribos indgenas. Apesar da

    implantao de postos mdicos instalados nestas reservas, instituindo

    a medicina convencional ainda possvel resgatar em algumas tribos

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    a medicina convencional, ainda possvel resgatar, em algumas tribos,

    uma ampla experincia com plantas medicinais. Entre essas, esto pre-

    sentes na teraputica nacional a Caapeba (Piper umbellatum), o Abajer(Chrisobalanus sp.), o Urucum (Bixa orellana), o Guaran (Paulinia cupa-

    na.), de uso internacional como complemento alimentar, energtico; a

    Copaba (Copaifera officinalis) e a Andiroba (Carapa guyanensis), dessas

    duas ltimas, so extrados leos de reconhecida atividade nas afeces

    de pele. Alm dessas, destaca-se a Marapuama (Acanthis virilis), que ad-

    quiriu interesse internacional pela propagada atividade afrodisaca.

    Outras heranas culturais

    Outras heranas culturais em medicina popular, tais como, as de

    origem oriental e europeia, so mais acentuadas, no Sul e Sudeste doBrasil, fato explicvel pela forte presena de imigrantes dessas origens

    em tais regies. Algumas plantas europeias adaptaram-se e difundi-

    ram-se na medicina e culinria regionais. Por exemplo, a erva-cidreira

    (Melissa officinallis), a erva-doce (Foeniculum vulgare), o manjerico

    (Ocimum sp.), o alecrim (Rosmarinus officinalis), o anis-verde (Pimpinella

    anisum) e o louro (Laurus nobilis). Vale lembrar que no Nordeste do

    Brasil, denomina-se erva-cidreira algumas espcies de Lippia sp. Famlia

    Verbenaceae. O mesmo tem ocorrido com espcies de origem asitica

    como o gengibre (Zingiber officinallis), a raiz forte (Wassabia japonica), a

    canela (Cinnamomum zeylanicum) e o popular cravinho da ndia (Eugenia

    caryophyllata). Uma outra vertente de introduo de drogas vegetais

    nos hbitos teraputicos brasileiros foi aquela oriunda de pesquisa e

    experincias bem sucedidas em outros pases. Essas, com plantas de

    fitoqumica estudada e efeitos farmacolgicos reconhecidos Com o

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    fitoqumica estudada e efeitos farmacolgicos reconhecidos. Com o

    crescimento da credibilidade da fitoterapia e do mercado farmacuti-

    co neste setor, no final dos anos 1990, foi popularizado o uso de esp-cies como o Ginco (Ginkgo biloba), o Hiprico (Hypericum perforatum), a

    Equincea (Echinacea purpurea) e a Kava-Kava (Piper methysticum).

    A importncia daquimiossistemtica

    Embora a triagem etnomdica seja considerada de grande im-

    portncia para a descodificao cientfica, ou seja, possa orientar sele-

    tivamente os testes farmacolgicos pr-clnicos e a busca racional de

    princpios ativos, Gottlieb (1982), um dos pioneiros nas proposies de

    teorias quimiossistemticas, props que a evoluo micromolecular, a

    sistemtica e a ecologia, fossem os caminhos racionais, com base cien-

    tfica para a descoberta de novas substncias naturais teis. Suas afirma-

    tivas esto baseadas nas seguintes razes:

    Na Amrica do Sul, a possibilidade de se obterem novas informa-

    es nas populaes indgenas sobre plantas teis para fins me-

    dicinais muito remota e a aculturao de povos primitivos tem

    sido muito rpida. Apesar de todos os conhecimentos adquiridos

    com fascinantes aspectos histricos, as populaes indgenas for-

    neceram muito pouco, numa pequena proporo em relao ao

    grande nmero de espcies teis. O nmero de plantas contendo

    substncias com potencial atividade biolgica, teraputica e pro-

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    p g , p p

    priedades farmacolgicas no estudadas enorme.

    Fica clara a necessidade urgente de novas possibilidades pararespaldar a pesquisa de princpios biologicamente ativos na base do

    conhecimento quimiossistemtico. Faz-se necessrio esclarecer as rela-

    es entre cincia e empirismo, conhecer as fronteiras entre os conhe-

    cimentos acadmico e o popular etnomdico. Com esse propsito,

    de fundamental importncia a anlise das pesquisas de plantas medi-

    cinais nos seus diversos aspectos: qumico, farmacolgico, botnico esocioantropolgico.

    As diretrizes da OMS e

    normatizaes para uso eestudo no Brasil

    A orientao da Organizao Mundial de Sade (OMS) fazer a

    conexo entre a medicina tradicional emprica e a medicina cientfica.

    Assegurar que os medicamentos base de plantas no sejam refutados

    por puro preconceito mas tambm que no sejam aceitos como verda-

    de absoluta e sem questionamentos. Recomenda-se uma atitude racio-

    nal crtica. A tendncia nas ltimas dcadas adotar o estudo cientfico

    das plantas j conhecidas pelas sociedades primitivas. Dessa forma, o

    estudo acadmico da chamada medicina popular vem desmistificando

    a questo do uso de plantas medicinais, retomando o inventrio de re-

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    a questo do uso de plantas medicinais, retomando o inventrio de re

    cursos teraputicos naturais entre os quais as plantas curativas ocupam

    lugar de destaque. A teraputica moderna emprega grande nmero desubstncias que embora sejam obtidas na sua maioria por intermdio

    de sntese, muitas foram originalmente isoladas de espcies vegetais.

    O estudo cientfico de plantas medicinais constitui um dos pro-

    gramas prioritrios da OMS, desde seu programa Sade para Todos no

    Ano 2000. Segundo estimativa da OMS, 80% da populao mundial usa

    principalmente plantas medicinais tradicionais (populares) para suprirsuas necessidades de assistncia mdica primria (OMS, 1978). Nos

    pases desenvolvidos, as drogas de origem vegetal tambm desem-

    penham importante papel. Nos Estados Unidos, por exemplo, 25 % de

    todas as receitas mdicas prescritas entre 1959 e 1980 continham extra-

    tos vegetais ou princpios ativos obtidos de plantas superiores (Diviso

    Angiospermae).O Brasil possui competncia em todas as reas da cincia rela-

    cionadas com o estudo de plantas medicinais. As bases legais para a re-

    gulamentao da fitoterapia tm sido objeto de diversas resolues e

    portarias.

    A Resoluo n. 30.43, de 1987, da World Health Assembly (WHA)

    recomenda, com insistncia aos pases em desenvolvimento, a usa-rem os seus sistemas tradicionais de medicina. J a Resolu n. 3133,

    de 1978, da instituio acima referida, faz um apelo para a aborda-

    gem ampla do tema plantas medicinais. No Brasil, a Portaria n. 212, de

    1989, do Ministrio da Sade, no item 2.4.2 define o estudo das plantas

    como uma prioridade da investigao em sade. A Resoluo CIPLAN

    n. 08/88, normatiza a implantao da Fitoterapia nos servios de Sade

    nas Unidades Federais bem como a disciplina Fitoterapia nos currculos

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    p p

    de cursos da rea de sade.

    A Portaria n. 212, de 2 de setembro de 1991, j referida, definecomo reas prioritrias em plantas medicinais:

    a) Estudos de identificao, avaliao e controle de preparaes

    fitoterpicas oficiais e de uso popular generalizado.

    b) Estudos botnicos, farmacotcnicos e qumicos de prepara-

    o fitoterpica, com vistas a definies de mtodos de preparo, dosea-

    mento de princpios ativos e controle da qualidade.

    c) Desenvolvimento de ensaios farmacotcnicos para avaliao

    das propriedades teraputicas das preparaes farmacuticas de uso

    popular obtidas de plantas medicinais.

    d) Esquadrinhamento farmacolgico e fitoqumico de espcies

    selecionadas da flora brasileira e outros produtos.

    O projeto CEME, surgido em 1982, propunha-se a estudar farma-

    cologicamente as plantas indicadas para fins medicinais no Brasil. Foi

    iniciado com 21 espcies, que foram selecionadas a partir das indicaes

    populares, da ampla distribuio geogrfica e da importncia social de

    ao teraputica indicada. A divulgao dos resultados obtidos desses

    estudos foi precria, embora os comits tivessem recomendado a de-voluo dos conhecimentos populao. Havia, na poca, a proposta

    de incluso das espcies medicinais estudadas na Relao Nacional de

    Medicamentos Essenciais (RENAME), o que no ocorreu.

    O pas demorou a adotar poltica para os medicamentos fitote-

    rpicos e plantas in natura, bem como uma legislao especfica para o

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    g

    comrcio e registro de drogas vegetais e fitoterpicos.

    Nos ltimos anos vrios marcos regulatrios tm apoiado efomentado o uso seguro e racional de plantas medicinais e fitoterpi-

    cos: a Poltica Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterpicos (PNPMF),

    o Decreto n. 5.813, de 22 de junho de 2006, o Programa Nacional de

    Plantas Medicinais e Fitoterpicos, a Portaria Interministerial n. 2.960,

    de 09 de dezembro de 2008, a Poltica Nacional de Prticas Integrativas

    e Complementares (PNPIC) no SUS, e o Decreto n. 971, de 03 de maiode 2006. Em 2008 a ANVISA publicou a Resoluo que aborda orien-

    taes para o registro simplicado de Drogas Vegetais, a Instruo

    Normativa IN-05, com 36 plantas consideradas teraputicas para

    uso humano. Ainda em 2008 tivemos a publicao da RDC para Boas

    Prticas de Manipulao, que em seu anexo VI, tem as Boas Prticas para

    Manipulao de Fitoterpicos. Em 2010 a ANVISA, lanou as Resolues

    RDC 10 de 10 de maro de 2010 sobre as drogas vegetais , com alegao

    de uso e restries e a RDC 14 de 05 abril de 2010 com as normas para

    registro de fitoterpicos. A quinta edio da Farmacopeia Brasileira, foi

    publicada no Dirio Oficial da Unio em 24 de novembro de 2010 com o

    Controle de Qualidade para 54 drogas vegetais. Outro grande avano foi

    a elaborao do Formulrio Teraputico Nacional Fitoterpico colocado

    para consulta pblica pela CP 73, em julho de 2010, com as formulaes

    padronizadas. O Ministrio da Sade publicou a Relao Nacional de

    Plantas de Interesse ao SUS (RENISUS), em 2009, com 71 espcies vege-

    tais que apresentam estudos na literatura especializada. Foram oficiali-

    zadas tambm as Farmcias Vivas, pelo Decreto n. 5.813 de 22 de junho

    de 2010, com normas para o cultivo e as oficinas farmacuticas. Muitos

    desses marcos legais contemplam diretrizes que destacam a importn-

    cia da valorizao do conhecimento tradicional e o respeito s prticas

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    culturais de cura e manuteno da sade.

    No estado da Bahia, como parte da Poltica de Medicamentos,estamos iniciando a implantao da Fitoterapia no SUS pelo FITOBAHIA

    da Secretaria Estadual de Sade com consultoria do Farmcia da Terra

    UFBA.

    Apesar de todas essas normatizaes, a realidade atual catica,

    pode-se encontrar com facilidade em farmcias, supermercados, lojas

    de produtos naturais, barracas de mercados populares, erveiros de ruae outros locais inusitados, todos os tipos de tens vegetais sem qualquer

    padronizao legal ou cientfica. O mercado de produtos naturais est

    em franca expanso no Brasil e no exterior. As farmcias e lojinhas que

    vendem produtos naturais, exibem propagandas caras e bem elabora-

    das de panaceias milagrosas, que no atendem s especificaes legais.

    As Resolues RDC 14 de 05/04/2010 e RDC, 10 de 10/03/2010,

    ANVISA, embora venham preencher uma lacuna nos critrios cientficos

    de controle de qualidade, eficcia e toxidez das drogas vegetais, trazem

    no seu bojo a grande dificuldade de serem executados em tempo vi-

    vel todos os procedimentos tcnicos exigidos. Durante muitos anos,

    vrias pesquisas foram realizadas nas reas de qumica, farmacologia,

    botnica e toxicologia de plantas usadas para fins medicinais no Brasil.Entretanto, essas informaes encontram-se dispersas em peridicos,

    revistas cientficas e anais de simpsios.

    Alguns autores tm abordado a questo das plantas medicinais

    sob os aspectos poltico, filosfico e metodolgico. Acredita-se que

    a pesquisa em plantas medicinais tem recebido cada vez ais suporte

    financeiro dos governos, de acordo com as diretrizes da OMS. Uma das

    principais razes, certamente, o fato das pesquisas at ento finan-

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    ciadas, apresentaram poucos resultados prticos, isto , no chegaram

    a novas drogas, no foram desenvolvidos novos medicamentos. Umanova droga vegetal at transformar-se em medicamento demora de 5 a

    10 anos e custa muitos milhes de dlares.

    Seguindo as diretrizes da OMS para a metodologia do estudo

    de plantas medicinais, os pontos essenciais so: pureza e identificao

    botnica da espcie vegetal; provas de sua eficcia e segurana; identi-

    ficao de seus princpios ativos, anlise e padronizao das partes daplanta considerando os fatores contaminantes que devem ser evitados

    durante o perodo de estabilizao, secagem e armazenamento.

    A RDC n.14/2010 da ANVISA, segue orientaes tcnico-cient-

    ficas para garantir a eficcia e a reprodutibilidade da atividade de um

    fitoterpico. Esta, objetiva estabelecer a padronizao de estudos sob os

    aspectos antropolgico, botnico, qumico e farmacolgico pr-clnicoe clnico.

    A pesquisa etnofarmacolgica, reconhecida como um dos cami-

    nhos para a descoberta de novas drogas, precisa ser considerada nos

    seus diversos aspectos, como citado anteriormente. necessrio levar

    em considerao as caractersticas inerentes aos grupos tnicos pesqui-

    sados, bem como seus conceitos de doenas e remdios, alm da ob-servao de formas farmacuticas indicadas, principalmente as mistu-

    ras em preparaes como xaropes, garrafadas e chs. Dependendo dos

    interesses dos pesquisadores, os testes de laboratrio so direcionados

    para a pesquisa de substncias isoladas e purificadas; para a avaliao

    farmacolgica dos extratos e suas fraes; para testes pr-clnicos e

    clnicos nas preparaes galnicas manipuladas a partir de tinturas e

    para os testes farmacolgicos com os chamados remdios de folha, os

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    chs e outros remdios caseiros de amplo uso popular.

    Para a pesquisa de princpios bioativos foram usados durantemuitas dcadas a escolha das plantas medicinais ao acaso como tam-

    bm atravs de mtodos de laboratrio seguindo abordagem fito-

    qumica e fitoqumica tradicional, ambos proporcionando resultados

    demorados. Algumas tentativas foram complementadas com ensaios

    farmacolgicos.

    Uma outra opo para critrio de escolha das espcies o m-todo quimiossistemtico, em que as espcies vegetais so selecionadas

    de acordo com as categorias qumicas das substncias no taxon. Dessa

    forma, utilizando alguns princpios de evoluo micromolecular, torna-

    -se possvel propr os perfis qumicos das famlias botnicas, propor-

    cionando ao pesquisador uma seleo racional na busca de princpios

    bioativos. Sendo assim, acredita-se que a unio da etnofarmacologia eda quimiotaxonomia deva ser considerada como uma nova viso para a

    busca racional de novos frmacos. Uma cincia em complementao

    outra, como prticas propeduticas levaro num futuro prximo agi-

    lizao do processo de conhecimento e uso teraputico-cientfico de

    drogas de origem vegetal.

    Referncias

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